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INTRODUÇÃO

Muito tem sido falado, nos últimos anos, sobre a democracia como
construtora de uma sociedade mais igualitária e justa, já que a ampla participação
política, teoricamente, facilitaria o alcance do bem comum. No Brasil, essa ideia
ganhou força, sobretudo, a partir da derrubada do regime militar e a maior abertura
das estruturas estatais, bem como com o direito ao voto em eleições diretas.

Nesse contexto, ficou muito em voga o conceito de cidadania, principalmente


com a retomada do sufrágio, este agora universal, consolidado pela promulgação da
Constituição Federal de 1988, apelidada de Constituição Cidadã. Essa era a
expressão do pensamento de que o exercício de votar garantiria liberdade,
segurança, desenvolvimento econômico, emprego e justiça social.

Não obstante, constatou-se que mesmo com o fim da ditadura, muitos dos
problemas cruciais de nossa sociedade, a exemplo da violência urbana, do
analfabetismo e do desemprego, não foram sanados, ao contrário das expectativas
levantadas. Ficou claro que inexiste relação estreita e direta da abertura ao voto
popular com a instituição de um governo hábil para atender as necessidades básicas
do povo.

A noção de cidadania plena, com a integração de liberdade, participação e


igualdade para todos, é algo inatingível, mas tem sido parâmetro para medir a
qualidade da cidadania em cada país, num dado momento histórico. Costuma-se
desdobrá-la, para a formulação desse parâmetro, em direitos civis, políticos e
sociais, tendo a sua plenitude na conjunção desses três grupos.

Os direitos civis correspondem às questões fundamentais à vida em


sociedade, como as garantias de liberdade, de propriedade e igualdade perante a
lei. O aspecto político abrange, sobretudo, o direito ao voto e configuração de
instituições políticas (como os partidos), de modo a melhor representar a população.
Já os direitos sociais são colocados na perspectiva de reduzir os excessos de
desigualdade, buscando proporcionar um mínimo de bem-estar para todos.

No Brasil, a dimensão social ganhou destaque sobre as demais, face às


profundas disparidades entre grupos e camadas de pessoas, fruto do processo de
formação do país, desde os tempos de colonização portuguesa. A História nos ajuda
a entender como foram estabelecidas essas desigualdades e a trilha tortuosa que a
cidadania brasileira tomou ao longo dos anos.

CAPÍTULO I – PRIMEIROS PASSOS


A herança colonial deixara marcas importantes para a construção de uma
identidade nacional (ex.: unidade territorial, linguística e religiosa), porém com um
quadro social bastante prejudicado, diante do ambiente escravocrata, latifundiário e
monocultor que imperou no Brasil durante a dominação portuguesa. Vivia-se sob um
Estado absolutista, com uma população predominantemente analfabeta, o que
comprometeu seriamente a participação popular na conjuntura política dos primeiros
anos após a independência.

Pode-se afirmar, dessa maneira, que inexistia pátria ou cidadania brasileira na


época. Apenas se dava uma nova forma de organizar as instituições políticas, sem o
controle pleno da coroa portuguesa. Não havia sentimento de nacionalidade,
tampouco de pertencimento ou consciência coletiva, mas era mantida a
estratificação social própria do período colonial.

Isso é comprovado pela ampla influência do senhor de engenho nas regiões


produtoras de açúcar, bem como do proprietário de minas de extração de ouro,
destacando-se politicamente em relação aos outros habitantes. Além disso, a
escravidão era disseminada como uma atividade lucrativa e necessária para o
sustento de muitos. A única fonte de renda para algumas viúvas se encontrava na
locação de escravos para diversos serviços.

Todos os que pudessem eram donos de escravos: os funcionários públicos, o


próprio Estado, as ordens religiosas, os padres. Inclusive os libertos, uma vez
alforriados, adquiriam os próprios escravos. Estes notoriamente não eram cidadãos,
pois indispunham de direitos civis, como a liberdade, a integridade física e a própria
vida; a lei os considerava propriedade do senhor, de modo semelhante aos animais.

Do outro extremo da pirâmide social, os proprietários de terras também não


poderiam ser classificados como cidadãos. Às vezes exerciam funções do próprio
Estado, principalmente no tocante à justiça, porque chegavam a decidir conforme o
seu arbítrio as situações em que o poder real não se mostrava capaz de interferir,
criando uma espécie de juiz leigo.
Entre esses dois polos, restava uma camada de pessoas livres, dependente
dos latifundiários para morar, defender-se dos abusos do governo e de outros
proprietários, além de garantir trabalho. Havia claramente falta de condições
adequadas para o exercício e luta pelos direitos civis, sobretudo à educação, tão
negligenciada naquele momento.

Em 1872, cinquenta anos passados da independência, apenas 16% da


população era alfabetizada, evidenciando o completo desinteresse da administração
e dos senhores de escravos em proporcionar um amplo acesso à informação e,
assim, difundir uma “arma cívica”. Da mesma maneira, o ensino superior foi
implantado tardiamente no Brasil (apenas em 1808, com a chegada da Coroa), o
que deflagra a dependência intelectual externa do país.

Por conseguinte, não havia sociedade política durante a Colônia e nos


primeiros anos pós-emancipação. Os direitos civis eram gozados por poucos, menos
ainda os que usufruíam dos direitos políticos, enquanto nem se falava ainda dos
direitos sociais, pois esse tipo de assistência estava a cargo da Igreja e de
particulares.

Até as manifestações cívicas estavam imbuídas de interesses locais e


privados e, em geral, entre setores dominantes ou contra abusos do governo. As
poucas insurreições populares do Brasil colônia, como a Revolta dos Alfaiates e
Revolução Pernambucana, não caminharam em direção à construção de uma
identidade nacional, a qual pudesse motivar a independência em relação a Portugal.

Essa independência, aliás, foi proporcionada pela negociação entre a elite


nacional, a coroa portuguesa e a Inglaterra. Embora existissem participantes mais
radicais, a maior parte do movimento aceitou a emancipação negociada, com a
manutenção da monarquia e da casa de Bragança atuando sobre o país.

As elites temiam que manifestações mais efusivas pudessem acarretar


mudanças sociais profundas, a exemplo do ocorrido no Haiti, onde os escravos se
rebelaram, declararam a independência e expulsaram a população branca. A
participação popular no Brasil não teve influência decisiva nesse processo, tanto que
em províncias mais distantes do foco do movimento as notícias só chegaram cerca
de três meses depois.
A Constituição de 1824 (a primeira do Brasil independente), então, enquadrou
como cidadãos, sobretudo no quesito dos direitos políticos, as mesmas figuras que
mantiveram a hegemonia na sociedade colonial. Mais de 85% deles eram
analfabetos, inclusive a maioria dos grandes proprietários rurais, inaptos a ler um
jornal, uma carta, ou mesmo as resoluções do governo.

Mesmo que a participação no sufrágio fosse bastante liberal para a época (em
1872, votavam cerca de 13% da população adulta masculina), o exercício do voto,
na prática, não representava a garantia de um direito do cidadão, mas a manutenção
do domínio político local. As eleições eram fraudulentas, violentas, fruto de um
controle quase coercitivo dos políticos sobre seus eleitores.

Nos locais onde a dependência em relação aos governantes era menor


(principalmente nas cidades), comumente se convencia o votante a partir da
concessão de benefícios pessoais, como uma roupa nova, um chapéu novo, um
dinheiro fácil, etc. O poder de barganha do eleitor aumentava ao longo do tempo,
tornando o voto cada vez mais “caro”.

Foi motivada, por essa razão, a mudança de 1881, na qual foram proibidos de
votar os analfabetos, restringindo os aptos a esse exercício conforme a condição
econômica (200 mil-réis anuais como renda mínima) e tornava o voto facultativo.
Dessa forma, era mantida a segurança para a perpetuação das elites no poder, sem
a necessidade de utilizar os meios dispendiosos de controle do eleitorado de
outrora.

.Com a proclamação da República e a descentralização do poder em estados,


facilitou-se a consolidação de oligarquias estaduais, apoiadas em partidos únicos.
Assim, ficou difícil o êxito de qualquer oposição política, já que eram envolvidos
praticamente todas as figuras de autoridade de um dado contexto local no mesmo
grupo.

O coronelismo, na Primeira República, deu a tônica do cenário político


brasileiro. Como herança da Guarda Nacional do Império, o coronel ganhou grande
destaque na articulação política de sua localidade, em associação com o governador
do estado, e este com o Presidente da República. As oligarquias de São Paulo e de
Minas Gerais mantiveram-se durante muito tempo na hegemonia do poder nacional,
até a Revolução de 1930.

No âmbito dos direitos civis, uma grande barreira foi a escravidão. Dentre os
países ocidentais de tradição cristã, o Brasil foi o último a declarar a abolição. A
prática escravista era tão difundida que mesmo os libertos chegaram a adquirir os
próprios escravos. Os reflexos dessa cultura se manifestam até hoje, sobretudo na
falta de assistência aos libertos após a promulgação da Lei áurea.

Outro fator que prejudicou a expansão da cidadania foi a grande propriedade


rural. O latifúndio muitas vezes funcionou como um pequeno Estado dentro do
território brasileiro. Alguns afirmavam que a lei tinha fim na porteira da propriedade,
deflagrando o poder arbitrário e paralelo ao ordenamento oficial demonstrado pelos
coronéis e fazendeiros.

No contexto urbano, a vinda dos imigrantes europeus favoreceu a formação


dos primeiros sindicatos e das lutas trabalhistas. Nota-se nesse contexto a
afirmação de determinados direitos civis, como os de organização coletiva,
manifestação popular, livre escolha do trabalho e greve, mas o próprio choque de
interesses dentro do movimento operário e repressão das elites evitaram que tais
conquistas pudessem avançar na esfera política. Assim, retardou-se a participação
ativa, no campo eleitoral, dessas camadas sociais até a república pós-revolução de
1930.

Diante da precariedade dos direitos civis e políticos, não há como falar em


efetividade das garantias sociais. O trabalho nesse âmbito estava restrito a
entidades particulares, sobretudo as instituições religiosas e de caridade, já que o
governo pouco cogitava a execução de ações afirmativas para o combate às
desigualdades alarmantes da época.

A legislação trabalhista progredia vagarosamente, com a desconfiança de


muitos políticos sobre legitimidade dessa questão. Primeiro, houve o
reconhecimento dos sindicatos como representantes legítimos dos trabalhadores,
seguido da proteção contra acidentes de trabalho e das primeiras instituições
previdenciárias, começando pelos funcionários da União, nos anos 1920.
Logo, alguns pensadores, diante do quadro analisado, chegaram a concluir
que inexistia um povo brasileiro, como escreveu o francês Louis Couty. De fato, não
havia uma população politicamente organizada, um eleitorado forte e esclarecido,
dada a pobre educação de que a grande massa dispunha até então.

Contudo, alguns movimentos políticos começaram a indicar, mesmo que de


forma dispersa, a configuração de uma cidadania ativa. O abolicionismo do final do
Segundo Reinado, por exemplo, envolveu diversos setores da sociedade, desde
membros da elite, passando por profissionais, liberais, até os próprios escravos.

Manifestações pontuais de caráter social (a exemplo da Cabanagem e da


Revolta dos Malês) marcaram o período regencial e o governo de Dom Pedro II.
Mesmo que não representassem o anseio pela construção de uma identidade
nacional, seria insensato dizer que se distanciam da luta pela cidadania, embora
locais e sem envolver os mecanismos formais de participação política.

Um patriotismo embrionário era manifesto na Guerra do Paraguai, na união


pelo combate a um inimigo externo. A bandeira brasileira aparecia pela primeira vez
em jornais, buscava-se a formação de heróis nacionais, aproveitando o contexto
militar para gerar um senso de pertencimento à nação, a qual até então era “um
arquipélago de várias províncias”.

Ainda que o federalismo da Primeira República tenha fortalecido as


oligarquias estaduais e voltado os interesses da população para as questões locais,
as lutas citadas preparavam o Brasil para mudanças significativas no cenário político
e social. A Revolução de 1930 traria à tona a importância não apenas da unidade
geográfica, mas também da coesão entre as diferentes regiões do país para a
construção de um sentimento nacional.

CAPÍTULO II – MARCHA ACELERADA


Na passagem para os anos 1920, a Primeira República começou a entrar em
crise e teve sua ordem econômica e social questionada. Fatores externos como a
Primeira Guerra e a Quebra da Bolsa de Nova Iorque fizeram decair os preços
internacionais do café e puseram em cheque o domínio da elite agrária.
Internamente, movimentos cívicos, como o tenentismo, buscavam combater a
hegemonia das oligarquias da época.
Até que nas eleições de 1930 o desacordo entre as cúpulas políticas de São
Paulo levou à ruptura da aliança entre ambas, as quais lançaram candidatos
distintos para o pleito. Do lado paulista, havia a figura de Júlio Prestes,
representando a continuidade da conjuntura social dos anos anteriores, enquanto os
mineiros lançavam a candidatura de Getúlio Vargas, importante político gaúcho,
tendo como vice-presidente João Pessoa, da Paraíba, compondo assim a Aliança
Liberal.

O resultado do pleito acabou por favorecer a Prestes, mas um fato inesperado


ocasionou o início de uma reviravolta. João pessoa havia sido assassinado por um
rival político local, e o ocorrido acarretou grande alarido por parte dos opositores
derrotados, repercutindo se o governo recém-eleito não possuía relação com o caso.

As forças militares dos movimentos da década anterior foram requisitadas


pelos setores mais radicais da Aliança Liberal, no intuito de depor o então presidente
e instaurar o governo revolucionário. Sem grandes batalhas, caía a Primeira
República, com a ascensão de Vargas ao poder.

Formatar um governo nacional forte, na busca de enfraquecer as oligarquias


estaduais, era o sentimento dos revoltosos. Apesar da origem oligárquica do novo
presidente, a aliança com os movimentos militares e o rompimento com a elite
paulista levaram-no a implementar medidas que configuravam importantes
mudanças no quadro político e social.

Foi fundado o Ministério do Trabalho, diversos direitos sociais foram


concedidos durante a era Vargas, tais como férias, décimo-terceiro salário e jornada
de oito horas. Pela primeira vez, as mulheres puderam votar (nas eleições de 1932),
de modo secreto, novidade que representou um fundamental avanço no combate à
manipulação dos votantes pelos candidatos.

Contudo, interpelaram-se significativas barreiras à evolução dos direitos civis,


sobretudo à liberdade e à prerrogativa de organização de matriz ideológica. O
governo varguista não se mostrou, desde o início, muito afável à democracia; os
primeiros anos se deram sob o caráter de intervenção federal sobre os estados, até
que as elites (principalmente a paulista) se organizassem num movimento que
cobrasse a instituição de um regime constitucional.
Além disso, embora ocorresse um expressivo crescimento da quantidade e da
participação dos sindicatos, estes eram controlados pelo governo, sobretudo após o
início do Estado Novo, regime com aspectos semelhantes ao fascismo. Logo, eles
funcionavam mais como órgãos técnico-consultivos do que propriamente como
entidades representativas de classe.

A censura foi amplamente praticada durante o período estadonovista. Os


meios de comunicação e arte tiveram sua liberdade seriamente comprometida, na
tentativa governista de manter a opinião pública sempre a seu favor. Esse excessivo
controle, somado à ruína dos regimes fascistas com o fim da Segunda Guerra
Mundial, culminaria na dissolução do sistema imposto.

Mesmo com os contrapontos levantados, a figura de Vargas foi importante na


construção de um sentimento nacional, com a fundação de empresas públicas em
setores estratégicos da economia (sobretudo na indústria pesada) e programas de
geração de empregos. Ele foi o primeiro grande político a direcionar medidas para a
garantia de direitos para a classe trabalhadora, mesmo que fosse sob uma
concepção paternalista.

A eleição de seu sucessor, Eurico Gaspar Dutra, teve ampla influência


varguista, pois contava com seu apoio, ratificado pelas massas. Anos depois, na
década de 1950, a fundação da Petrobras representou a luta pela consolidação de
uma indústria nacional forte, que não pudesse ficar a mercê dos interesses do
capital estrangeiro.

Concomitantemente, crescia o conflito de ideais entre as forças políticas,


criando um ambiente de tensão. Os mais liberais e representantes das classes altas
ensejaram uma maior abertura para investimentos de fora, sobretudo norte-
americanos, enquanto setores ligados à esquerda reivindicavam o avanço das
reformas implantadas pelo governo Vargas, como a ampliação de direitos ao
trabalhador rural e reforma agrária.

O período de Juscelino Kubitschek na presidência ainda conseguiu conter as


diversas requisições sob controle. Com uma gestão que priorizou o crescimento
acelerado da economia, o progresso por meio de obras de infraestrutura e a
abertura para o capital privado (nacional ou estrangeiro), JK garantiu certa
popularidade tal que pudesse concluir seu governo sem renunciar ou ser deposto.

Todavia, o quadro de tensão foi se agravando à medida que o país contraía


obrigações perante o FMI e aumentava sua dependência externa. Além disso, a
renúncia de Jânio Quadros – sucessor de Kubitschek – criou um ambiente de
intensa instabilidade política no país, sem contar a suposta aproximação do seu
vice, João Goulart, com o comunismo.

Dessa maneira, setores das Forças Armadas, junto às elites e organizações


conservadoras (a exemplo de parte da Igreja Católica), começaram a articulação
para a derrubada de Goulart, que assumira o posto presidencial após Quadros havê-
lo deixado. Receava-se a implantação de um regime socialista no Brasil, no
momento em que crescia a influência da União Soviética sobre movimentos
revolucionários na América Latina, como o ocorrido em Cuba.

Toda essa agitação culminou na deposição do então presidente e na tomada


do poder pelos militares. Era encerrado um período de importantes avanços, de
evolução e regressão da cidadania, ora com governos democráticos, ora com
regimes ditatoriais. Contudo, além das conquistas alcançadas (sobretudo na esfera
social), formava-se pela primeira vez um povo politicamente organizado, o qual
colocava as questões do país nas discussões importantes, em contraste com o
tempo do predomínio das oligarquias locais.

CAPÍTULO III – PASSO ATRÁS, PASSO ADIANTE


O fato de os militares assumirem diretamente o poder acarretou grande
surpresa para os grupos que ajudaram a fomentar o golpe. Dessa vez,
diferentemente do ocorrido na Proclamação da República e na Revolução de 1930,
as Forças Armadas compunham corpos políticos organizados, fruto da grande
agitação que caracterizara o Brasil dos anos anteriores e das influências ideológicas
atuantes no cenário geopolítico mundial.

O governo então instaurado significava o triunfo das correntes mais liberais do


Exército sobre os setores ligados ao marxismo, que ganharam força inclusive dentro
da própria instituição. A afirmação do poder militar promoveria a unidade da classe,
mesmo com o emprego de meios violentos para tanto, a exemplo da expulsão e da
reforma compulsória de oficiais, bem como da prisão dos opositores.

Direitos civis e políticos foram seriamente suprimidos em favor das medidas


de repressão. Esta se encontrou instrumentalizada pelos atos institucionais, os quais
abriram espaço legal para uma intensa concentração e manipulação do poder por
parte dos presidentes da nova ditadura. Massacrava-se, assim, a liberdade dos
indivíduos e das organizações de representação coletiva.

O ápice da repressão veio com a publicação do Ato Institucional nº 5 (AI-5),


em fins de 1968. Fechou-se temporariamente o Congresso, suspendeu-se o uso de
habeas corpus para crimes contra a segurança nacional, bem como se afastou a
apreciação judicial dos atos decorrentes do AI-5. Era deflagrada, dessa maneira, a
desestruturação do sistema de repartição de poderes em favor da supremacia do
Executivo.

A censura foi amplamente praticada. Não havia liberdade de expressão,


tampouco de reunião, tanto que as primeiras greves do período eclodiram à margem
da estrutura sindical oficial, que se limitava a ações de assistência social. Os
partidos políticos foram extintos, dando lugar ao bipartidarismo formado pelo grupo
do governo (Arena) e por uma oposição (representada pelo MDB), controlada, no
intuito de conferir uma aparência mais democrática ao regime.

No campo econômico, os primeiros anos foram difíceis. A alta inflação


resultante da política de maciça intervenção estatal para acelerar o crescimento da
economia foi uma preocupação que causou grande corte de gastos da máquina
pública e redução do salário mínimo. Em virtude disso, os benefícios e garantias
sociais tiveram sua progressão prejudicada, diferentemente do ocorrido nas décadas
anteriores.

Apenas em 1968 o Brasil voltou a crescer de forma semelhante ao período de


Kubitschek, numa taxa anual variável entre 7% e 10%. Esse momento, conhecido
como “milagre econômico”, foi responsável por acrescentar certa popularidade à
ditadura, que desfrutou de relativo prestígio inclusive da classe trabalhadora,
sobretudo rural, pela melhoria das condições de labuta.
Junto a isso, o avanço na questão social foi retomado, com a unificação do
sistema previdenciário nacional e a inclusão dos empregados rurais, que até então
não contavam com aposentadoria e pensão. A aparente prosperidade pela qual o
país passava contribuiu para a disseminação da propaganda governista, baseada
num nacionalismo xenófobo, bem como para atenuar a supressão de direitos
políticos e civis.

Estes só voltaram a ter maior ênfase o início da gestão de Ernesto Geisel,


começando em 1974 um processo de abertura política. Revogou-se o AI-5 em 1978,
com o retorno de exilados políticos e anistia, além da extinção do bipartidarismo,
acarretando a fundação de novos partidos a partir de 1979.

A popularidade do regime militar dava sinais de decadência à medida que os


frutos do milagre econômico davam lugar à retração do crescimento e à inflação
galopante que começava a despontar na virada para os anos 1980. Configurava-se
dessa forma o cenário da transição para a redemocratização do país.

Um novo quadro de movimentos sindicais era construído. Antes, controlados


pelo Estado e comandados geralmente por políticos profissionais, agora tinham suas
lideranças partindo do “chão de fábrica”. Fortaleceram-se os operários das indústrias
de consumo duráveis (sobretudo a automobilística) e de bens de capital, a exemplo
de máquinas e equipamentos.

Além de partidos e sindicatos, a sociedade se organizou em manifestações


populares para a aceleração do progresso de redemocratização do país. A
campanha por eleições diretas para Presidente, que aconteceram em 1985, foi um
grande exemplo, apesar de o Congresso não acatar a proposta naquele momento.

Embora de forma indireta, foi eleito um presidente civil, Tancredo Neves (do
MDB), o primeiro desde 1960. Com sua morte antes da posse assumiu José Sarney,
fundador do Partido da Frente Liberal (PFL), ex-aliado dos militares. A ditadura
chegava ao fim, enquanto começava um tempo de imensos desafios para a
evolução da cidadania no Brasil.

CAPÍTULO IV – A CIDADANIA APÓS A REDEMOCRATIZAÇÃO


A retomada da democracia foi recebida com muito entusiasmo pelos
brasileiros, sobretudo após a mobilização ocorrida no movimento por eleições
diretas. Logo em 1986 foi formada a Assembleia Nacional Constituinte, que
consultou especialistas e procurou dialogar com setores organizados e
representativos da sociedade, no intuito de elaborar a nova Constituição com
expressão dos anseios populares naquele contexto.

Os direitos políticos foram ampliados, na medida em que concedia permissão


aos analfabetos para votarem e reduzia o limite mínimo de idade para o alistamento
eleitoral. Antes de 18 anos, esse limite passava agora para 16, tornando o voto
facultativo para os novos incluídos até atingirem a maioridade, quando aquele se
tornava obrigatório.

O breve entusiasmo decorrente do fim do regime militar deu lugar ao


desencanto da população com as instituições políticas, ao perceber que velhas
práticas haviam novamente entrado em cena, como a corrupção e o desvio de
finalidade na esfera pública. Apesar da democracia, o cidadão não se sentiu
representado pelos governantes, os quais usavam a política como meio de promover
os próprios interesses.

O descrédito com relação à classe política atingiu um ponto alto no processo


de impedimento do presidente Fernando Collor de Mello, o primeiro eleito de forma
direta após a redemocratização. A imagem messiânica de combate à indecência dos
representantes pretéritos, bem como de transparência e moralidade, foi
desconstruída a partir de seu envolvimento em esquema de extorsão de
empresários para financiamento de campanhas eleitorais.

A cassação de Collor representou não apenas a vitória do devido processo


legal para a retirada de governantes corruptos, mas também a evidência de um
avanço na democracia. Era conferida aos cidadãos a sensação de algum controle
exercido sobre seus representantes.

Outro aspecto a considerar, mesmo após a redemocratização, é o lento


avanço dos índices de qualidade de vida no país. Embora a Constituição de 1988
tenha sido a que mais integrou direitos sociais no seu texto, é notável a falta de
efetividade de vários deles, face às taxas de mortalidade infantil, analfabetismo e
desemprego.
Mesmo a criação de diversas estruturas de apoio ao cidadão, como os
Juizados Especiais de Pequenas Causas, não impediu a desconfiança com relação
à atuação do Estado. As polícias militares, por exemplo, despertam, por um lado, o
sendo de ineficácia na garantia da segurança pública, como também, por outro, o
medo de parte da população, ao contemplar o não raro aliciamento de oficiais no
crime organizado e as práticas abusivas cometidas durante suas operações.

Por fim, as imensas desigualdades ainda assolam o país. Enquanto um setor


composto por “doutores”, todos graduados, com altos cargos e prestígio parece se
colocar acima da lei, existe uma massa que aparenta ser mais profundamente
atingida pelos problemas decorrentes do nosso processo histórico de formação. São
pessoas que mal existem, sobrevivem abaixo da linha de pobreza, muitas vezes
aparecendo apenas no noticiário policial.

CONCLUSÃO
É lento, embora nítido, o progresso da cidadania brasileira e há muito o que
percorrer nessa jornada. Vemos o desespero dos pobres, dos desempregados, dos
analfabetos e semianalfabetos eclodir em problemas sociais graves, a exemplo da
violência urbana e a dependência química.

Na conjuntura política, há uma predominância da identificação popular com o


Executivo, herança do paternalismo exercido durante a era Vargas e, de certa forma,
na ditadura militar. O papel dos legisladores, muitas vezes, é restrito a intermediar
favores pessoais perante a Administração, em troca da confiança do eleitor.

Mesmo a luta por direitos assumiu caráter corporativista, no qual os


benefícios não são tratados como prerrogativa de todos, mas fruto da negociação de
categorias organizadas com o governo. São profissionais de diversos setores que
investem seu tempo em sindicalizar-se para a discussão de privilégios, evidenciando
uma fraca organização autônoma da sociedade para atingir o bem comum.

Por outro lado, os últimos tempos têm favorecido o surgimento de instituições,


fora da esfera estatal, que desenvolvem atividades de interesse público. Trata-se
das Organizações Não Governamentais (ONGs). Em colaboração com o Estado,
elas têm inovado ao tratar e solucionar problemas sociais, principalmente de
educação e direitos civis.
Sem dúvida a desigualdade social é o maior desafio para os próximos anos.
Se a escravidão durante séculos impediu o avanço da cidadania, negando direitos
como a liberdade e a participação política, a desigualdade inabilita boa parte da
população a ter boa educação, acesso a água potável e saneamento básico. A
saúde da democracia depende da erradicação desse mal, principalmente se
analisarmos que importantes progressos no aspecto social foram atingidos no
decorrer de regimes ditatoriais.

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