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A ABORDAGEM MULTIPROFISSIONAL

NA ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA
A ABORDAGEM MULTIPROFISSIONAL
NA ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA

Org.
Tatiana Lins Carvalho
Carolina da Cunha Correia

Recife
UPE-EDUPE, 2019
UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO – UPE
REITOR Pedro Henrique Falcão
VICE-REITOR Dra. Socorro Cavalcanti

EDITORA UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO – EDUPE


CONSELHO EDITORIAL
Profa. Dra. Adriana de Farias Gehrer
Prof. Dr. Amaury de Medeiros
Prof. Dr. Alexandre Gusmão
Prof. Dr. Álvaro Vieira de Mello
Profa. Dra. Ana Célia O. dos Santos
Profa. Dra. Aronita Rosenblatt
Prof. Dr. Belmiro do Egito
Prof. Dr. Carlos Alberto Domingos do Nascimento

GERENTE CIENTÍFICO Prof. Karl Schurster


COORDENADORA Profa. Sandra Simone Moraes de Araújo
PROJETO GRÁFICO Derek Schelling
REVISORA GRAMATICAL Conceição Maria Carvalho Paes

A abordagem multiprofissional na esclerose lateral amiotrófica

Número ISBN: 978-85-7856-215-1


Formato Ebook: PDF

Todos os direitos reservados.


É proibida a reprodução deste livro com fins comerciais sem
prévia autorização dos autores e da EDUPE.

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)


Campus Mata Norte CMN/UPE
Biblioteca Mons. Petronilo Pedrosa

A154
A Abordagem Multiprofissional na Esclerose Lateral Amiotrófica.
[recurso eletrônico] / Tatiana Lins Carvalho, Carolina da Cunha
Correia (Orgs.). – Recife: EDUPE, 2018.
146 p.
Ebook: PDF
Disponível em: http://www.edupe.com.br/

1. ELA. 2. Doença Neurodegenerativa. 3. Equipe Interdisciplinar.


I. Carvalho, Tatiana Lins (Org.). II. Correia, Carolina da Cunha.
(Org.). IV.Título.

CDD 23th ed. – 610


Rosa Cristina - CRB4/1841
Autoria:

Alessandra Barbosa da Silva


Nutricionista pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);
Pós-Graduada no Programa de Residência em Cuidados Paliativos em
Saúde – Huoc / UPE.
E-mail: alessandraa.nut@gmail.com

Allan Delano Urbano Cunha


Fisioterapeuta pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);
Especialista em Terapia Intensiva Pediátrica e Neonatologia (FCR-RJ);
Mestre em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento (UFPE);
Fisioterapeuta da Equipe de Esclerose Lateral Amiotrófica do Huoc
- UPE.
E-mail: allanduc@gmail.com / elahuoc@gmail.com

Ana Célia Oliveira dos Santos


Professora Associada, Livre Docente do Instituto de Ciências Bioló-
gicas (ICB) da Universidade de Pernambuco (UPE).
E-mail: ana.oliveira@upe.br

Carolina da Cunha Correia


Professora Adjunta da Disciplina de Neurologia da Faculdade de
Ciências Médicas- Universidade de Pernambuco (UPE);
Professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde –
Universidade de Pernambuco (UPE);
Neurologista pela Universidade de São Paulo (FMRP-USP);
Coordenadora do Ambulatório de Doenças Neuromusculares do
Hospital Universitário Oswaldo Cruz – UPE;
Coordenadora do Laboratório de Biópsia Muscular do Hospital
Universitário Oswaldo Cruz – UPE.
E-mail: carolina.cunha@upe.br

Clélia Maria Ribeiro Franco


Neurologista pela ABN e Unifesp; Mestre em Neurologia pela Unifesp;
Doutora em Neuropsiquiatria pela UFPE; Certificada em Medicina
do Sono pela ABSono e SBNC; Assistente nos Ambulatórios do Sono
do HC-UFPE e do Huoc – UPE.
E-mail: clelianeuro@gmail.com

Deise Gonçalves do Nascimento


Farmacêutica pelo Centro Universitário Maurício de Nassau (UNI-
NASSAU); Pós-Graduada no Programa de Residência em Cuidados
Paliativos em Saúde – Huoc / UPE.
E-mail: deisegsp@gmail.com

Gabriela Serejo Martins da Silva


Psicóloga pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Es-
pecialista em Psicologia Hospitalar (Fafire); Psicóloga no Hospital
Universitário Oswaldo Cruz (Huoc) - UPE; Psicóloga da Equipe de
Esclerose Lateral Amiotrófica do Huoc - UPE.
E-mail: gabrielasms@hotmail.com / elahuoc@gmail.com

Gerluce Araujo Silva de Souza Monteiro


Enfermeira Estomaterapeuta, Socorrista e Acupunturista. Atua como
responsável pela Comissão de Curativos do Hospital Universitário
Oswaldo Cruz – UPE. Enfermeira do Serviço de Atendimento Móvel
de Urgência SAMU – Recife. Desenvolve trabalhos relacionados às
ações de Educação em Saúde, Acupuntura e Docência.
E-mail: gerlucearaujo@hotmail.com
Ilka Veras Falcão
Mestre em Saúde Pública, professora Adjunta do Departamento de
Terapia Ocupacional, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
E-mail: ilkafalcao.ufpe@gmail.com

José Anchieta de Brito


Doutor em Biociências pela Universidade Federal Rural de Pernam-
buco (UFRPE), Professor adjunto da Universidade de Pernambuco,
Coordenador da Residência Multiprofissional em Cuidados Paliativos
em Saúde – Huoc / UPE.
E-mail: anchietabrito@gmail.com

Julianelly Alves Biserra


Cirurgiã Dentista pela Universidade de Pernambuco (UPE); Pós-
Graduada no Programa de Residência em Cuidados Paliativos em
Saúde – Huoc / UPE.
E-mail: julianelly.alves@gmail.com

Karla Maria Bandeira


Formada em Serviço Social e Mestre em Serviço Social pela UFPE,
é Assistente Social da Promotoria do Idoso do Ministério Público de
Pernambuco e do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc), onde
atualmente responde pela Gerência da Divisão de Serviço Social.
E-mail: kas0540@hotmail.com
Lilian Maria Sanguinett de Almeida
Terapeuta ocupacional pela Universidade Federal de Pernambuco.
E-mail: sanguinett@hotmail.com

Luiz Eduardo Correia Miranda


Médico do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc) da Universidade
de Pernambuco (UPE).
E-mail: lecmiranda@gmail.com

Marcel Rolland Ciro da Penha


Médico do Serviço de Endoscopia do Hospital Universitário Oswaldo
Cruz (Huoc) da Universidade de Pernambuco (UPE). Professor do
curso de Medicina da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap).
E-mail: rollandmarcel95@gmail.com

Mirla Oliveira Santos Medeiros


Fonoaudióloga pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);
Pós-Graduada no Programa de Residência em Cuidados Paliativos em
Saúde – Huoc / UPE.
E-mail: mirlamedeiros@hotmail.com

Mônica Moreira Dias da Cruz


Especialista em Saúde da Família (Facisa/PB) e em Saúde Pública
(CPqAM/Fiocruz), Mestre em Saúde Coletiva - FOP/UPE.
E-mail: m.m.cruz@hotmail.com

Noemi Salazar de Araújo


Terapeuta ocupacional pela Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE); Especialista em Terapia Ocupacional na Clínica do Enve-
lhecimento (UFPE); Formação no Método Neuroevolutivo Bobath
básico e avançado; Terapeuta ocupacional da Unidade de Cuidados
Paliativos do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc) - UPE;
Terapeuta ocupacional da Equipe de Esclerose Lateral Amiotrófica
do Huoc - UPE.
E-mail: noemisalazar@gmail.com / elahuoc@gmail.com

Patrícia Oliveira Luna


Fonoaudióloga pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap);
Especialista em Voz (Unifran-SP); Fonoaudióloga no Hospital
Universitário Oswaldo Cruz (Huoc) - UPE e na Prefeitura da Cidade
do Recife; Fonoaudióloga da Equipe de Esclerose Lateral Amiotrófica
do Huoc -UPE.
E-mail: paty22luna@gmail.com / elahuoc@gmail.com

Rebeca de Vasconcelos Barbosa


Graduada em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE); Pós Graduada em Direito Público pela Faculdade Maurício
de Nassau (FMN) e em Direito Constitucional pela Universidade
Anhanguera; Defensora Pública Federal (área de atuação: ofício geral).
E-mail: beca_vb@yahoo.com.br

Tatiana Lins Carvalho


Terapeuta ocupacional pela Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE); Especialista em Gerontologia (FIR) e em Neuropsicologia
Clínica (FMN); Mestra em Ciências da Saúde (UPE); Terapeuta
ocupacional no Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc) - UPE;
Terapeuta ocupacional da Equipe de Esclerose Lateral Amiotrófica do
Huoc - UPE.
E-mail: tatiana.carvalho@upe.br / elahuoc@gmail.com
PREFÁCIO
O que aprendemos com a Esclerose Lateral Amiotrófica?
Sempre que atendemos pessoas com Esclerose Lateral Amiotrófica
(ELA), temos a certeza que enfrentaremos uma jornada difícil do ponto
de vista físico, emocional e social, além de uma grande expectativa
pelo surgimento de novos tratamentos efetivos que mudem o curso
da doença.
Apesar das inúmeras barreiras impostas pela ELA, conviver com
essas pessoas é saber que, a cada encontro, o aprendizado nos fará crescer
profissionalmente, porém, principalmente, pessoalmente! Reflexões
brotam constantemente nos forçando a entender que conhecer e
respeitar nossos limites são fundamentais, que devemos administrar
e valorizar melhor nosso tempo, que dificuldades e conquistas devem
ser compartilhadas, que não precisamos sempre de palavras para nos
comunicar (um olhar muitas vezes nos transmite tudo em questão de
segundos) e que o silêncio e o toque muitas vezes se fazem necessários!
A ELA é uma doença de muitas perguntas e poucas respostas. Esta
situação traz sentimentos de ambiguidade... por um lado, em certos
momentos, deixa-nos de mãos atadas, tristes pelo sofrimento alheio;
do outro nos dá energia, impulsionando-nos a querer descobrir mais.
Este livro abordará vários aspectos comuns na prática dos profissionais
de Saúde que lidam com pessoas com ELA. Esperamos poder ajudá-
los nesta jornada.

Carolina da Cunha Correia


Tatiana Lins Carvalho
SUMÁRIO

PARTE I - ASPECTOS INERENTES À ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA

1 - ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA - INVESTIGAÇÃO 14


E EXPECTATIVA TERAPÊUTICA
2 - DISTÚRBIOS DO SONO NA ELA 26
3 - QUANDO INICIAR O SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO INVASIVO NA ELA 34
4 - A ATUAÇÃO DA TERAPIA OCUPACIONAL NA 42
ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
5 - A FONOAUDIOLOGIA NA EQUIPE INTERDISCIPLINAR DE ATENDIMENTO 48
A PESSOAS COM ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
6 - NUTRIÇÃO NA ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA 58
7 - A GASTROSTOMIA ENDOSCÓPICA 66
8 - A INTERVENÇÃO DA EQUIPE INTERDISCIPLINAR: SOMANDO 84
AÇÕES E APRENDENDO COM O OUTRO
9 - CUIDADOS PALIATIVOS EM PESSOAS COM 94
ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
10 - PERFIL DE UM GRUPO DE CUIDADORES DE PESSOAS COM 102
ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
PARTE II - ASPECTOS ADICIONAIS À ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA

11 - LESÃO POR PRESSÃO EM pessoas com ESCLEROSE 114


LATERAL AMIOTRÓFICA (ELA)
12 - ABORDAGEM ODONTOLÓGICA ÀS PESSOAS COM 124
ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
13 - DIREITO À SAÚDE – JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS – 133
DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS PARA TRATAMENTO DA ELA
14 - O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL JUNTO AOS PACIENTES E FAMILIARES 141
NO TRATAMENTO DE DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS NO SUS
PARTE I
ASPECTOS INERENTES À ESCLEROSE
LATERAL AMIOTRÓFICA
1 - ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA - INVESTIGAÇÃO E EXPECTATIVA
TERAPÊUTICA
Carolina da Cunha Correia

Introdução

A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é a mais comum dentre as


doenças incluídas no grupo das desordens do neurônio motor, um
grupo de síndromes clínicas neurodegenerativas caracterizadas por
morte neuronal no córtex motor, tronco encefálico, dos axônios das
vias descendentes motoras e no corno ventral da medula espinhal
(WIJESEKERA; LEIGH, 2009). Possui evolução progressiva, com
degeneração dos neurônios motores superiores (NMS) e inferiores
(NMI), cujos sinais e sintomas mais comuns são atrofia, fasciculação,
fraqueza e espasticidade; levando a uma paralisia global progressiva
que culmina com insuficiência respiratória, principal causa de morte
(PALERMO; LIMA; ALVARENGA, 2009; ROWLAND, 1998;
WIJESEKERA; LEIGH, 2009). Apesar dos avanços na compreensão
de fatores ambientais e genéticos; as terapias específicas modificadoras
de prognóstico permanecem limitadas.

Epidemiologia

A taxa de prevalência da ELA mundial é de aproximadamente 3 a 8


casos por 100.000 habitantes e a incidência é em torno de 2 por 100.000
habitantes, sendo assim considerada uma doença rara. Acomete mais
homens do que mulheres e, nas apresentações mais clássicas (formas
esporádicas), inicia-se após a sexta década e possui uma sobrevida
14
média de 3 a 5 anos; entretanto a expectativa de vida pode ser mais
elevada nos jovens e influenciada por fatores genéticos (ROWLAND,
1998; SABATELLI et al., 2008; WIJESEKERA; LEIGH, 2009).
Anteriormente estimava-se que cerca de 90% dos casos eram
esporádicos e apenas 10% de origem familiar, mas os avanços na
identificação de novos genes (principalmente nas expansões do
cromossomo 9 -C9ORF72 e mutações da TARDBP) demonstrou
que esta estimativa supera os 10% em algumas séries.

Diagnóstico clínico da ELA

O protótipo de achados clínicos na ELA é o envolvimento


simultâneo de sinais de neurônio motor superior (NMS) e neurônio
motor inferior (NMI) em um mesmo segmento, iniciando-se numa
região do neuroeixo e progredindo para outras regiões.
Devido ao curso progressivo e não reconhecimento dos sinais e
sintomas da ELA há descrição de retardo diagnóstico que pode chegar a
12 meses (ou até mais, dependendo do tempo de espera para avaliação
pelo neurologista) (CHIEIA et al., 2010).
Na nossa experiência com os pacientes com ELA, cerca de 60%
dos pacientes iniciam sintomas nos membros superiores, sendo a
fraqueza e atrofia as mais marcantes; a mão apresenta um aspecto
muito sugestivo chamado de “split hand”, sendo caracterizada por
uma dissociação da atrofia dos músculos da região tenar e hipotenar
(MENON; KIERNAN; VUCIC, 2014); associando-se os sinais de
NMS, que incluem exaltação de reflexos profundos, sinal de Hoffmann,
Trömner, entre outros.
Outras formas descritas incluem: fraqueza distal, iniciada nos
membros inferiores, a qual foi subdividida por Patrikios nas apresentações

15
pseudopolineurítica e espástica, variante de Mills (fraqueza dimidiada),
formas monomélicas e formas bulbares (JAWDAT et al., 2015).
Na tabela 1, encontram-se sinais e sintomas clínicos que podem ajudar
na suspeita do diagnóstico.
Tabela 1. Alguns sinais e sintomas de envolvimento de NMS e NMI na ELA.

Neurônio motor superior Neurônio motor inferior

Espasticidade Hipotonia

Diminuição ou abolição de reflexos


Exaltação de reflexos
profundos

Sinal de Hoffmann Câimbras

Sinal de Babinski Fraqueza

Clônus Fasciculações

Afeto pseudobulbar Atrofia

Critérios para o Diagnóstico

Neurologistas especialistas no manejo de ELA e em nome da


Federação Mundial de Neurologia se reuniram pela primeira vez na
cidade de San Lorenzo del Escorial, próximo a Madri para definir
os critérios diagnósticos de ELA em 1994. Em 1999, esses critérios
foram revisados na Airlie House, Virginia, EUA, gerando os chamados
critérios revisados do El Escorial (quadro 1), onde ELA é dividida em
categorias diagnósticas: ELA clinicamente definida, provável, provável
com suporte laboratorial (Eletromiografia) e possível; sendo sua maior
contribuição o auxílio nos níveis de certeza diagnóstica e o uso em

16
estudos clínicos. Segundo este critério, as regiões de acometimento
são: bulbar, cervical, torácica e lombosacra (BROOKS et al., 2000).
Quadro 1 - Critérios Diagnósticos da ELA segundo El Escorial revisado

ELA clinicamente definida Sinais de NMS + NMI em 3 regiões

ELA provável NMS + NMI em 2 regiões

NMS/NMI 1 região + EMG com


ELA provável + suporte laboratorial
desnervação em mais de 1 região

ELA possível NMS + NMI em 1 região

Com a descrição de novas síndromes clínicas, passamos a identificar


na ELA síndromes que extrapolam os antigos aspectos puramente
motores da doença e que antes eram ditos como critérios de exclusão
diagnóstica. Tais formas são conhecidas como uma categoria especial,
na qual são reconhecidas alterações cognitivas em até 50% dos casos,
caracterizadas por anormalidades do controle esfincteriano, funções
executivas, comportamentais, de linguagem, memória e demência
fronto-temporal. Em casos mais extremos, também são citadas alterações
Parkinsonianas, disautonômicas, entre outras (FRIEDLAND et
al., 2012; MCCLUSKEY et al., 2014; PICCIONE et al., 2015).
Obviamente estes aspectos não são centrais para guiar o diagnóstico
da doença, mas a sua presença não deve ser motivo de incertezas ou
retardo na sua definição.

Achados neurofisiológicos

O diagnóstico de ELA deve ser baseado nos achados clínicos


(anamnese e exame físico) e na eletroneuromiografia. Alterações no

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tempo de condução central (potenciais evocados motores) também
podem demonstrar acometimento das vias descendentes motoras. Na
ENMG é fundamental a detecção de desnervação ativa, representada
sobretudo por fibrilações, ondas agudas positivas, fasciculações;
demonstradas em 3 segmentos.

Achados na neuroimagem

Conforme discutimos anteriormente, a Ressonância Nuclear


Magnética (RNM) de coluna cervical e de encéfalo servem para
descartar outras etiologias de doenças, principalmente síndromes de
compressão medular. A RNM de encéfalo também é importante para
demonstrar o envolvimento das vias motoras descendentes (hipersinal,
especialmente na sequência T2 e Flair, estando presente em uma
percentagem significativa dos pacientes).

Protocolo de investigação da ELA

A preocupação em excluir síndromes que mimetizem a ELA é


obrigatória, uma vez que o retardo em terapias tratáveis produziria
fortes implicações para o paciente e o neurologista. Desta forma, é
essencial, no primeiro momento, excluir condições similares com
protocolos de investigação definidos.
Fazem parte do arsenal de investigação:

• Exames bioquímicos gerais e hematológicos


• VHS, PCR
• Urina-análise
• CK, aldolase, AST, ALT, DHL

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• Eletroforese de proteínas
• Provas de doenças vasculíticas relacionadas ao colágeno
• Dosagem de imunoglobulinas IgA, IgG e IgM
• Hormônios tireoidianos e paratiroidiano
• Dosagem de vitamina B12 e folato
• Testes de doenças infecciosas: sífilis, HIV, HTLV, hepatite B e C
• Marcadores tumorais: Alfa feto proteínas, CEA, CA 15-3, CA
19.9, CA 125, PSA
• Análise do líquido cefalorraquiano
• Em caso de história de exposição ocupacional: chumbo, mer-
cúrio, alumínio e cobre
• Ressonância nuclear magnética do crânio, coluna cervical e
transição crânio cervical
• Estudo Eletroneuromiográfico

Alguns mecanismos propostos da doença

Avanços no entendimento da patogênese da ELA sugerem que a


doença resulte da interação de fatores genéticos e ambientais exógenos.
Após 1993, quando houve a identificação na mutação do gene da
SOD1 nas formas autossômicas dominantes, mais de 30 outros genes
já foram relacionados à doença (TOVAR-Y-ROMO; SANTA-CRUZ;
TAPIA, 2009).
A identificação da proteína TDP-43 e da mutação do gene da
TARDBP contribuíram na identificação da associação da ELA com
a demência fronto-temporal, ajudando a expandir o espectro clínico
da doença (FRIEDLAND et al., 2012).

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O descobrimento de outros genes nas formas familiares, tais como
Matrin 3, C9orf72, CHCHD10, tem contribuído na compreensão
das vias envolvidas no processo neurodegenerativo e nas variabilidades
fenotípicas da doença; sobretudo no que concerne à idade de início e
seu prognóstico (LI; WU, 2016).
Mesmo nas formas esporádicas da ELA, já foram identificados
genes em até 25% dos casos, em algumas séries (CADY et al., 2014).
A identificação destes genes ajuda na compreensão dos mecanismos
envolvidos na patogênese da ELA, sua variabilidade fenotípica e
estimularam algumas tentativas terapêuticas.
São fatores de risco associados com a doença: idade de início, sexo
masculino e história familiar de ELA.
Outros fatores são especulados com potencial associação com a ELA,
tais como fumo, exercício físico extenuante, TCE, câncer, exposição
ocupacional a campo magnético, metais pesados ou pesticidas, mas esta
análise é baseada em relatos de casos havendo crítica na literatura, uma
vez que sua associação não se repetiu em outros indivíduos expostos
aos mesmos fatores (WANG et al., 2017).
Um dos mecanismos patogênicos mais defendidos e suportados
por evidências é o papel excitotóxico mediado pelo glutamato,
resultando em lesão neuronal e ativação de substâncias que mantêm o
processo degenerativo progressivo. Entretanto, outros fatores também
estão envolvidos, como o influxo de cálcio, estresse oxidativo, dano
mitocondrial e da junção neuromuscular.
Curiosamente, a hipercolesterolemia, o uso de estatina e
imunossupressores foram citados como fatores de diminuição de
risco para ELA; entretanto esses achados não se repetiram em outros
estudos (RIVA et al., 2016).

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Expectativas terapêuticas

Várias classes medicamentosas já foram tentadas na ELA, mas as


terapias inibidoras do glutamato foram as que mais se destacaram.
Entretanto, apenas o Riluzol demonstrou benefícios modestos no
prolongamento na sobrevida dos pacientes.
Topiramato, gabapentina e lamotrigina também foram utilizadas,
porém sem evidência de eficácia (RIVA et al., 2016).
A metilcobalamina intramuscular na dose de 50 mg, duas vezes
por semana; tem sido mais recentemente utilizada. Esta forma
metabolicamente mais ativa no sistema nervoso central tem demonstrado
algum benefício neuroprotetor em modelo animal e em poucos estudos
clínicos; com desfecho de maior prolongamento na sobrevida, sobretudo
nos que a utilizam no primeiro ano de doença.
Mais recentemente foi aprovado pelo FDA ( agência reguladora
Americana), o uso do Edaravone; entretanto, sua eficácia ainda carece de
estudos adicionais, motivando a sua não incorporação na comunidade
Européia. O Edaravone possui efeito anti-oxidante que já foi testado
em outras doenças como Parkinson e AVC. Na ELA há críticas aos
resultados sugestivos de ganho funcional, pois a análise baseou-se em
um subgrupo de pacientes com doença em fase inicial e com capacidade
vital forçada ainda preservada. O tempo de observação curta dos
seus efeitos, a ausência de informações sobre o impacto desta terapia
na sobrevida dos pacientes; aliados ao alto custo da medicação, são
outros fatores que ainda não permitiram a inclusão de sua indicação
nas diretrizes Brasileiras.
Na ausência de tratamento curativo, o enfoque tem sido no controle
dos sintomas. Estas medidas, suportadas pela ação de uma equipe
com enfoque interdisciplinar, têm demonstrado resultados positivos

21
na manutenção da qualidade de vida e melhora na sobrevida (CHIÒ
et al., 2004).
A ventilação não invasiva através do uso de bipap está associada
com melhora significativa da expectativa e qualidade de vida. Dentre
os suportes que podem predizer a sobrevida e evolução funcional,
estão a Fisioterapia respiratória e a orientação nutricional.
As possibilidades de cuidados sintomáticos abrangem também o
suporte à dor e às câimbras, fonoterapia, intervenções nos aspectos
psicológicos, alívio dos distúrbios do sono e medidas de adaptação
funcional com terapeuta ocupacional.
Todos estes aspectos serão avaliados individualmente neste livro e
temos convicção de que enquanto esperamos novas terapias eficazes e
que retardem ou recuperem funcionalmente estes pacientes, o suporte
interdisciplinar traz maior conforto e segurança, melhora a relação entre
os diversos atores envolvidos no processo de cuidar e nos proporciona
reflexões sobre os aspectos dos limites terapêuticos e de finitude da
vida.

22
Referências

BROOKS, B et al. El Escorial revisited: revised criteria for the


diagnosis of amyotrophic lateral sclerosis. Amyotroph Lateral
Scler Other Motor Neuron Disord., Madison, v. 5, n. 1, p.293-
299, 2000.

CADY, Janet et al. Amyotrophic lateral sclerosis onset is influenced


by the burden of rare variants in known amyotrophic lateral sclerosis
genes. Annals Of Neurology, [s.l.], v. 77, n. 1, p.100-113, 27 nov.
2014.

CHIEIA, Marco et al. Amyotrophic lateral sclerosis: considerations


on diagnostic criteria. Arquivo de Neuropsiquiatria, São Paulo,
v. 6, n. 68, p.837-842, 2010.

CHIÒ, A et al. A cross sectional study on determinants of quality


of life in ALS. J Neurol Neurosurg Psychiatry, Torino, v. 11, n.
75, p.1597-1601, 2004.

FRIEDLAND, Robert P. et al. Behavioral Variant Frontotemporal


Lobar Degeneration with Amyotrophic Lateral Sclerosis with a
Chromosome 9p21 Hexanucleotide Repeat. Frontiers In Neurology,
[s.l.], v. 3, p.1-5, 2012.

JAWDAT, Omar et al. Amyotrophic Lateral Sclerosis Regional


Variants (Brachial Amyotrophic Diplegia, Leg Amyotrophic Diplegia,
and Isolated Bulbar Amyotrophic Lateral Sclerosis). Neurologic
Clinics, [s.l.], v. 33, n. 4, p.775-785, nov. 2015.

23
LI, Hong-fu; WU, Zhi-ying. Genotype-phenotype correlations of
amyotrophic lateral sclerosis. Translational Neurodegeneration,
[s.l.], v. 5, n. 1, p.1-10, 3 fev. 2016.

MCCLUSKEY, Leo et al. ALS-Plus syndrome: Non-pyramidal


features in a large ALS cohort. Journal Of The Neurological
Sciences, [s.l.], v. 345, n. 1-2, p.118-124, out. 2014.

MENON, Parvathi; KIERNAN, Matthew C.; VUCIC, Steve. ALS


pathophysiology: Insights from the split-hand phenomenon. Clinical
Neurophysiology, [s.l.], v. 125, n. 1, p.186-193, jan. 2014.

PALERMO, Simone; LIMA, José Mauro Braz de; ALVARENGA,


Regina Papais. Epidemiologia da Esclerose Lateral Amiotrófica -
Europa/América do Norte/América Do Sul/Ásia: discrepâncias e
similaridades. Revista Brasileira de Neurologia, Rio de Janeiro,
v. 2, n. 45, p.5-10, 2009.

PICCIONE, Ezequiel A. et al. Autonomic system and amyotrophic


lateral sclerosis. Muscle & Nerve, [s.l.], v. 51, n. 5, p.676-679, 31
mar. 2015.

RIVA, Nilo et al. Recent advances in amyotrophic lateral


sclerosis. Journal Of Neurology, [s.l.], v. 263, n. 6, p.1241-1254,
30 mar. 2016.

ROWLAND, Lewis P. Diagnosis of amyotrophic lateral


sclerosis. Journal Of The Neurological Sciences, [s.l.], v. 160,
p.6-24, out. 1998.

24
SABATELLI, M. et al. Natural history of young-adult amyotrophic
lateral sclerosis. Neurology, Rome, v. 12, n. 71, p.876-881, 2008.

TOVAR-Y-ROMO, Luis B; SANTA-CRUZ, Luz; TAPIA, Ricardo.


Experimental models for the study of neurodegeneration in
amyotrophic lateral sclerosis. Molecular Neurodegeneration,
[s.l.], v. 4, n. 1, p.1-13, 2009.

WANG, Ming-dong et al. Identification of risk factors associated


with onset and progression of amyotrophic lateral sclerosis using
systematic review and meta-analysis. Neurotoxicology, [s.l.], v.
61, p.101-130, jul. 2017.

WIJESEKERA, Lokesh C; LEIGH, P Nigel. Amyotrophic lateral


sclerosis. Orphanet Journal Of Rare Diseases, [s.l.], v. 4, n. 1,
p.1-22, 2009.

25
2 - DISTÚRBIOS DO SONO NA ELA
Clélia Maria Ribeiro Franco
A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é considerada doença
neurodegenerativa progressiva, havendo envolvimento do neurônio
motor ao nível central e periférico, sendo estudada dentro do grupo
de doenças neuromusculares (HARMS; BALOH, 2013; WOOD-
ALLUM; SHAW, 2010).
Segundo George e Guilleminault (2005), O sono é um estado de
vulnerabilidade para pessoas com doenças neuromusculares, ao ponto
que as alterações fisiológicas na ventilação sono REM-relacionadas são
agravadas pela fraqueza muscular. Assim, indivíduos acometidos pela
ELA estão no grupo de risco de desenvolvimento de distúrbios do
sono, pelo fato das incapacidades motoras, comuns nestes pacientes,
piorarem durante o sono (GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005; LO
COCO et al., 2011).
Em estágios da doença onde haja já alguma fraqueza da musculatura
respiratória, principalmente quando há fraqueza do diafragma, surgem
distúrbios respiratórios do sono, em especial a hipoventilação com
hipoxemia/dessaturação de oxigênio em sono, além dos eventos de apneias
obstrutivas e mistas, particularmente no sono REM (sono onde ocorre
os movimentos rápidos dos olhos ou Rapid Eyes Movement). Quase
que invariavelmente, estes pacientes necessitarão de suporte ventilatório
em sono (CULEBRAS, 2005; GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005;
LO COCO et al., 2011).
Além disso, pacientes com ELA podem sofrer fragmentação
do sono e queda na sua eficiência por outros motivos, tais como
ansiedade, depressão, dor, sialorréia excessiva e engasgos noturnos,

26
câimbras e incapacidade de mudança postural no leito (GEORGE;
GUILLEMINAULT, 2005; LO COCO et al., 2011).
A fisiopatologia dos distúrbios respiratórios em sono sofridos pelos
indivíduos com ELA envolve fatores múltiplos, tais como o surgimento
de fraqueza do músculo diafragma, a sensibilidade reduzida ao gás
carbônico durante o sono, atonia muscular típica da fase REM -
quando até uma fadiga leve de musculatura respiratória se manifesta,
surgindo maior dessaturação de O2 em sono. Também a presença de
doença pulmonar restritiva, decorrente da fraqueza da parede torácica
e das microatelectasias – por hipoventilação crônica e retenção de
secreções são fatores contribuintes para a má ventilação em sono dos
pacientes com doença neuromuscular (CULEBRAS, 2005; GEORGE;
GUILLEMINAULT, 2005; LO COCO et al., 2011). Infelizmente,
apenas em torno de 2% dos pacientes com ELA são questionados quanto
à presença de queixas referentes a distúrbios respiratórios em sono.
E estes, quando presentes, irão impactar negativamente na evolução
clínica destes indivíduos, contribuindo para agravamento da morbi-
mortalidade (CULEBRAS, 2005; GEORGE; GUILLEMINAULT,
2005; HARDIMAN; BERG; KIERNAN, 2011; LO COCO et al.,
2011). Anormalidade respiratória em sono pode ser um sinal precoce
de disfunção ventilatória nos pacientes com ELA (TSARA et al.,
2010).
Estudo com 28 pacientes com ELA, publicado em 2010 por Tsara
et al. (2010), com tempo de diagnóstico de doença variando entre
1-48 meses, não havendo obesos nem casos de DPOC no grupo,
encontraram disfunção bulbar em 30%, dispneia leve a moderada em
39% e capacidade vital forçada (CVF) menor que 80% em 78% dos
pacientes. Nestes pacientes, distúrbio respiratório em sono (DRS) do
tipo apneia obstrutiva do sono, com Índice de Apneia-Hiponeia (IAH)
entre 5-83 eventos/hora, ocorreu em 67%, enquanto a hipoxemia

27
em sono afetou todo o grupo estudado, com saturação de O2 entre
61-90%. Os autores consideram que o estudo da função pulmonar
diurna sozinha não tem valor preditivo para detectar DRS.
Desta forma, havendo envolvimento da musculatura bulbar e/ou
diafragmática, a ocorrência de DRS é provável e sintomas de alerta
costumam surgir, tais como fadiga e sonolência excessiva diurna,
fragmentação do sono – sono com muitos despertares – insônia,
cefaleia matinal e sensação de sono não-reparador. Na vigência de
um ou mais destes sintomas, a polissonografia noturna deveria ser
realizada para detectar o mais precoce possível o DSR, possibilitando
a busca por instituir o tratamento com suporte ventilatório em sono,
evitando complicações decorrentes da privação de sono e hipoxemia
noturna recorrente (JENNUM; SANTAMARIA, 2007).
Já em 1999, Aboussouan e Lewis, chamavam atenção para
a interferência de via dupla entre o sono de má qualidade e a má
ventilação, impactando ambas negativamente na qualidade de vida, em
pacientes com ELA. Estes autores reforçam que o prejuízo desta danosa
interação vai muito além da potencial sonolência excessiva diurna
(SED), lembrando que, mesmo em indivíduos saudáveis, a privação
de sono tem sido considerada um fator de impacto negativo nos testes
espirométricos e de resistência muscular, com diminuição na resposta
ventilatória à hipercapnia (ABOUSSOUAN; LEWIS, 1999). A privação
crônica de sono por hipoxemia noturna leva a várias complicações,
tais como: Hipertensão Pulmonar - Cor Pulmonale, SED, desatenção,
disfunção cognitiva e do humor, arritmias cardíacas, policitemia, com
redução na qualidade de vida e sobrevida (ABOUSSOUAN; LEWIS,
1999; GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005; WOOD-ALLUM;
SHAW, 2010).

28
Investigação e orientação:

Na ELA, em alguns casos, o distúrbio respiratório noturno


relacionado ao sono pode ocorrer em desproporção à gravidade do
comprometimento neuromuscular (CULEBRAS, 2005). Avaliação do
sono é recomendada de rotina para pacientes que apresentem sinais
diurnos ou noturnos sugestivos de má qualidade do sono ou de que
haja algum distúrbio do sono, principalmente na suspeita de falência
respiratória noturna (BARTHLEN; LANGE, 2000; CULEBRAS, 2005;
HARDIMAN; BERG; KIERNAN, 2011; JENNUM; SANTAMARIA,
2007; TSARA et al., 2010).
As queixas diurnas e noturnas devem ser ativamente inquiridas a
cada consulta ou avaliação, permitindo investigação precoce, na busca
de instituição de tratamento específico e prevenção de complicações
decorrentes da privação crônica do sono e/ou hipoxemia noturna que,
se ocorrentes, muito prejudica a qualidade de vida. Como queixas
noturnas, devem ser perguntadas sobre a qualidade do sono do paciente,
se há fragmentação, insônia, pausas respiratórias, ronco ou respiração
ruidosa, disautonomias noturnas – tais como sudorese excessiva,
palpitações ou noctúria (frequência aumentada da diurese); e ainda
comportamentos atípicos que sugiram parassonias NREM, tais como
sonilóquio, terror noturno, despertar confusional e sonambulismo, que
podem ressurgir ou terem sua frequência aumentada em estados clínicos
onde o sono é de má qualidade (AMERICAN ACADEMY OF SLEEP
MEDICINE, 2014; CULEBRAS, 2005). Já no questionamento de
queixas diurnas, devemos investigar se há SED, fadiga, comportamento
automático (como se estivesse “desligado” do ambiente), dores de
cabeça matinais, sintomas cardiovasculares, disfunções no estado
metabólico, da cognição, do humor ou da imunidade. Também quando
a avaliação da função pulmonar e gases sanguíneos mostrarem queda

29
da capacidade vital forçada menor que 40% e/ou PCo2 >45 mmHg,
a polissonografia (PSG) noturna está indicada (CULEBRAS, 2005;
HARDIMAN; BERG; KIERNAN, 2011; LO COCO et al., 2011).
Estudos para avaliar queixas relativas ou mesmo a qualidade do
sono de pacientes com ELA, utilizando questionários padronizados, tais
como Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI) e a Epworth Sleepiness
Scale (LO COCO et al., 2011) ou estudos armados com polissonografia
noturna (TSARA et al., 2010), têm mostrado má qualidade do sono
e alterações em sua arquitetura, tais como o aumento da latência
NREM e dos despertares, redução percentual da fase 3 do sono NREM
(sono N3 ou sono de ondas delta ou sono profundo) e da fase REM,
redução do tempo total de sono (TTS) e de sua eficiência. Também
são descritas a ocorrência de apneias obstrutivas e mistas em sono,
hipoxemia relacionada ao sono – com dessaturação de O2 (considerada
como queda da Sat O2 < 88% em adultos e < 90% em crianças) de
forma sustentada (por mais de 5 minutos) ou fásica (episódica) e
aumento de movimentos periódicos de membros em sono (PLMS).
A mais recente Classificação Internacional dos Distúrbios do Sono
(International Classification of Sleep Disorders) de 2014 classifica
a hipoxemia relacionada ao sono quando a saturação de O2 estiver
< 90% por no mínimo 5 minutos com um nadir mínimo de 85%
ou se a saturação de O2 estiver < 90% por 30% ou mais do TTS.
A síndrome da hipoxemia ou hipoventilação relacionada ao sono
parece ser a alteração respiratória mais comum em pacientes com ELA
(GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005; LO COCO et al., 2011;
TSARA et al., 2010). A avaliação do paciente com ELA sempre deverá
ser multidisciplinar e aqui, no âmbito dos distúrbios do sono, o alvo
terapêutico busca restaurar a arquitetura do sono e melhorar a qualidade
de vida. Assim, tratar dores, desconfortos posturais ou ao decúbito
devem ser lembrados. A queixa diurna de SED em geral é resolvida

30
com o tratamento do distúrbio do sono causador da fragmentação do
mesmo. Em casos de sonolência diurna residual, o psicoestimulante
modafinila pode ser útil, a partir de cuidadosa avaliação médica. As
parassonias NREM, do tipo sonambulismo e terror noturno costumam
responder ao uso de hipnóticos sedativos, mas só devem ser prescritos
após avaliação e correção de distúrbio ventilatório em sono, pois caso
este exista, pode agravar com uso de sedação (CULEBRAS, 2005).
No caso das apneias centrais ou hipoventilação em sono com
dessaturação de O2, pode ser necessário a suplementação de O2 em
sono, redução farmacológica do sono REM, Fisioterapia respiratória com
treinamento de musculatura inspiratória e ventilação assistida, BiPAP e
servos (BARTHLEN; LANGE, 2000; CULEBRAS, 2005; GEORGE;
GUILLEMINAULT, 2005; RADUNOVIć; MITSUMOTO; LEIGH,
2007).
Já na confirmação da Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono (SAOS),
quando a PSG detecta um IAH > 5/hora com paciente sintomático
ou um IAH > 15/hora, há indicação de tratamento (AMERICAN
ACADEMY OF SLEEP MEDICINE, 2014; BARTHLEN; LANGE,
2000; CULEBRAS, 2005; GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005;
RADUNOVIć; MITSUMOTO; LEIGH, 2007; WOOD-ALLUM;
SHAW, 2010). A Fisioterapia respiratória é muito importante no
suporte ventilatório e a correção de alterações craniofaciais – caso
existam - pode ajudar. Entretanto, o tratamento padrão para SAOS
é o uso dos PAP (pressão positiva em vias aéreas superiores), sejam
CPAP ou BiPAP, a depender da necessidade do paciente, de acordo
com a complexidade do distúrbio ventilatório em sono.

31
Referências:

ABOUSSOUAN, Loutfi S.; LEWIS, Richard A. Sleep, respiration


and ALS. Journal Of The Neurological Sciences, [s.l.], v. 164, n.
1, p.1-2, mar. 1999.

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Of Sleep Medicine, 2014.

BARTHLEN, G. M.; LANGE, D. J.. Unexpectedly severe sleep


and respiratory pathology in patients with amyotrophic lateral
sclerosis. European Journal Of Neurology, [s.l.], v. 7, n. 3, p.299-
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32
HARMS, Matthew B.; BALOH, Robert H.. Clinical
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TSARA, V et al. Respiratory function in amyotrophic lateral sclerosis


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WOOD-ALLUM, C; SHAW, Pj. Motor neurone disease: a practical


update on diagnosis and management. Clin Med, [si], v. 3, n. 10,
p.252-258, 2010.

33
3 - QUANDO INICIAR O SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO INVASIVO NA ELA.
Allan Delano Urbano Cunha
A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença do neurônio
motor superior e inferior acometendo diretamente a musculatura axial
e respiratória, levando a um acometimento diafragmático importante,
independente do nível de comprometimento bulbar ou axial. Bach e
colaboradores já preconizavam o uso da ventilação não invasiva como
modo ventilatório de suporte à vida e com impacto direto na sobrevida
do paciente, principalmente com suporte através da traqueostomia,
a fim de evitar complicações relacionadas com broncoaspiração. Mas
em que fase o suporte ventilatório deve começar e quais os sinais e
sintomas (Quadro 1) que demonstram a necessidade de utilizar a
ventilação não invasiva inicialmente por algumas horas, depois durante
24h e de maneira intermitente (BACH et al., 2010; LECHTZIN et
al., 2007)?
Quadro 1 - Sintomas de Hipoventilação na ordem de frequência de aparecimento

Ordem Sintomas

1º Fadiga

2º Dispneia

3º Cefaleia matinal ou contínua

4º Sonolência diurna

5º Despertar noturno frequente com dispneia e taquicardia

6º Dificuldade para engolir

7º Dificuldade de concentração

34
8º Pesadelos relacionados à dificuldade respiratória

9º Sinais e sintomas de insuficiência cardíaca de causa respiratória

10º Edema de membros inferiores

11º Irritabilidade, Ansiedade

12º Enurese noturna

13º Alteração da função intelectual

14º Depressão

15º Diminuição da libido

16º Perda de peso excessiva

17º Dor muscular

18º Redução da memória

19º Dificuldade de eliminar secreções

20º Obesidade

Fonte: Adaptado de Bach (1998).

O comprometimento respiratório pode acontecer de duas formas:


resultante de doenças da via aérea ou dos pulmões, como a doença
pulmonar obstrutiva crônica, que se caracteriza por retenção de CO2
por dificuldade de trocas gasosas e devido à reação inflamatória do
parênquima pulmonar; já a fraqueza muscular, caracteriza-se por
hipóxia, redução dos níveis de oxigênio e valores das pressões de CO2
normal ou abaixo apresentando como consequência a insuficiência
e após falência respiratória aguda (IRpA). Neste caso, o suporte de

35
oxigênio é uma medida de proteção à vida (AMIB E SBPT, 2013;
GUYTON; HALL, 2011).
O comprometimento relacionado à fraqueza da musculatura
respiratória, principalmente o diafragma, tem como consequência
a hipoventilação e aumento da pressão de gás carbônico, porém o
controle da respiração no organismo faz com que os receptores de CO2
dos seios carotídeos estimulem o aumento da frequência respiratória e
uma compensação com aumento dos níveis de bicarbonato mantendo
o PH sanguíneo em níveis normais. A musculatura é originalmente
fraca e o esforço respiratório se torna evidente. Com a piora do
quadro, pode ocorrer insuficiência/falência respiratória, porém o que
o paciente necessita é melhorar as trocas gasosas; neste caso, o suporte
de oxigênio pode ser fatal, pois altera o mecanismo compensatório
desenvolvido pelo aumento dos níveis de CO2, bicarbonato e do
controle central da respiração (GUYTON; HALL, 2011; PÁDUA;
ALVARES; MARTINEZ, 2003).
Após o diagnóstico do paciente, é recomendada uma consulta inicial
com o fisioterapeuta a fim de mensurar sua condição respiratória com
avaliação de sinais e sintomas e a presença de redução das capacidades
pulmonares e, de posse deste diagnóstico, iniciar o tratamento específico.
A avaliação é composta por uma parte subjetiva que direciona as queixas
do paciente com as características da ELA, realizam-se também outros
tratamentos como Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Hidroterapia,
Fisioterapia motora, medicamentoso ou suplementação nutricional,
e a partir daí vêm as análises da capacidade vital, do pico de fluxo
expiratório forçado e da tosse e a saturação de oxigênio periférico. A
medida de CO2 periférico de forma não invasiva seria valiosa, porém
não é comum nos Ambulatórios e Enfermarias, apenas em UTI; no
caso de paciente internado, pode-se realizar a análise sanguínea direta

36
através da gasimetria arterial (GUYTON; HALL, 2011; PÁDUA;
ALVARES; MARTINEZ, 2003).
Podemos descrever o quadro 2, de acordo com os resultados da
fórmula abaixo:
Valor predito da capacidade vital para homens depende da fórmula:
CV = 0,05211 - 0,022 x idade - 3,60 x altura (cm) e para mulheres:
CV = 0,4111 - 0,018 x idade - 2,69 x altura (cm).

Quadro 2 – Valores da capacidade vital e medidas terapêuticas

Valor da capacidade vital Medida terapêutica

Maior que 50% do valor predito Indicação de exercícios com AMBU e indicar
polissonografia

Menor que 50% do valor predito Indicação de BIPAP à noite no mínimo.

Relacionado com o pico de fluxo expiratório forçado seguimos


a seguinte diretriz do quadro 3:
Quadro 3 – Valores do pico de fluxo expiratório forçado e medidas terapêuticas

Valores do pico de fluxo Medidas terapêuticas


expiratório e da tosse

Maior que 360L/min Normal, tosse eficaz.

270-360L/min Leve, tosse com auxílio.

160-270L/min Moderado, uso de máquina da tosse se infecção.

Menor que 160L/min Grave, uso diário de máquina da tosse para


remoção de secreções.

Fonte: Diretrizes brasileiras de ventilação mecânica (LECHTZIN et al., 2007).

37
Classificando os pacientes nos grupos acima, o próximo passo é
avaliar se eles têm capacidade de comparecer ao Ambulatório para
realizar Fisioterapia respiratória ou se seria incluído em programas de
acompanhamento domiciliar; dependendo se existir na região em que
reside esse tipo de programa. Como esses pacientes são amparados pela
lei federal, esta garante ao portador de doenças raras o recebimento
sem custo do BIPAP, porém o aparelho proposto neste projeto não
prevê a sua utilização como suporte à vida e sim no período de algumas
horas por dia. Os aparelhos de ventilação não invasiva fornecidos
são inadequados para pacientes com comprometimento respiratório
avançado (BACH; HON, 2010).
O objetivo da Fisioterapia respiratória é evitar as complicações
pulmonares que são consequências da fraqueza respiratória e,
principalmente, prevenindo estes efeitos, uma das formas é o aumento
do volume pulmonar evitando atelectasias. Inicialmente utiliza-se o
AMBU enquanto não se tem condições de utilizar o BIPAP para maior
conforto respiratório e melhorar a qualidade do sono e, desta forma,
seguir vivendo enquanto conseguem tolerar a ventilação não invasiva,
pois o próprio avançar da doença exige medidas mais firmes para conviver
com a insuficiência respiratória podendo evoluir para um quadro de
falência respiratória. Chega então o momento de decidir a respeito
de quais medidas vão ser tomadas para manter a vida deste paciente,
até que ponto foi conversado sobre as modalidades terapêuticas para
seu caso nesta fase como, por exemplo, a traqueostomia, a ventilação
invasiva e a vida acamado e totalmente dependente (BACH; HON,
2010; BACH et al., 2013).
Neste momento, a equipe deve passar as opções terapêuticas para
o paciente e a família e, a partir destas informações, devem ser feitas as
escolhas de como deverá ser o desfecho da sua história, sua relação com
a morte, se acredita em Deus, para tentar tornar este momento menos

38
doloroso. A Fisioterapia busca medidas para reduzir o desconforto
respiratório de acordo com as decisões da equipe, com o paciente e
com a família, evitando sensação de fadiga respiratória e sofrimentos
evitáveis nos momentos críticos da falência respiratória.
Quando surge a falência, dois caminhos podem ser seguidos: um
deles é a continuidade do suporte ventilatório agora de maneira contínua
e invasiva visto que a VNI não mais alivia o desconforto respiratório,
este fato pode ocorrer como observou Andersen et al. (2016). Eles
avaliaram a mobilidade das cordas vocais e perceberam que os pacientes
de comprometimento bulbar e pseudobulbar não apresentaram boa
resposta a VNI devido à incoordenação nesta estrutura. Desta forma,
a opção para manter a expansibilidade pulmonar seria a traqueostomia
de maneira precoce. O paciente com a via aérea artificial estaria seguro
e protegido em relação à broncoaspiração e poderia usar a VNI de
forma eficaz. Porém, como geralmente acontece a falência após a
infecção respiratória, a ventilação pode se tornar definitiva se a pressão
inspiratória máxima e a capacidade vital forem próximas de zero. Neste
caso, a ventilação de forma contínua e de suporte à vida é indicada.
Já os pacientes que optam por não fazer uso da via aérea artificial,
continuam na VNI até sua musculatura tolerar. Quando não mais
conseguir gerar troca gasosa e manutenção da CV, o paciente é sedado
e espera o momento do colapso total junto de seus familiares. A
decisão é muito difícil e envolve a escolha do paciente em relação a
sua sobrevivência. No Brasil, cada vez mais, a vontade do paciente
vem sendo seguida.

39
Referências

AMIB E SBPT (Org.). Diretrizes brasileiras de Ventilação


Mecânica. [S.I.]: Associação de Medicina Intensiva Brasileira e
Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, 2013. 96p.

ANDERSEN, Tiina et al. Laryngeal response patterns influence


the efficacy of mechanical assisted cough in amyotrophic lateral
sclerosis. Thorax, [S.I.], v. 72, n. 3, p.221-229, 12 maio 2016.

BACH, John R. Guide to Evaluation and Management of


Neuromuscular Disease. [S.I.]: Hanley & Belfus, 1998. 200 p.

BACH, John R.; HON, Alice. Amyotrophic Lateral Sclerosis. American


Journal Of Physical Medicine & Rehabilitation, [S.I.], v. 89, n.
5, p.412-414, maio 2010.

BACH, John R et al. Extubation of Patients With Neuromuscular


Weakness. Chest, [S.I.], v. 137, n. 5, p.1033-1039, maio 2010.

BACH, John R. et al. Changing Trends in the Management of


End-Stage Neuromuscular Respiratory Muscle Failure. American
Journal Of Physical Medicine & Rehabilitation, [S.I.], v. 92, n.
3, p.267-277, mar. 2013.

GUYTON, John E.; HALL, Arthur C.. Regulação da respiração.


In: GUYTON, John E.; HALL, Arthur C.. Tratado de Fisiologia
Médica. 12. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. Cap. 41. p. 531-
538.

40
LECHTZIN, Noah et al. Early use of non‐invasive ventilation
prolongs survival in subjects with ALS. Amyotrophic Lateral
Sclerosis, [S.I.], v. 8, n. 3, p.185-188, jan. 2007.

PÁDUA, Adriana Inacio; ALVARES, Flávia; MARTINEZ, José


Antônio Baddini. INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA. Medicina,
Ribeirão Preto, v. 36, n. 2/4, p.205-213, 30 dez. 2003.

41
4 - A ATUAÇÃO DA TERAPIA OCUPACIONAL NA ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA
Noemi Salazar de Araújo

A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença


neurodegenerativa grave e incapacitante e suas manifestações causam
declínio funcional progressivo, interferindo no bem estar físico e
emocional e na percepção de vida produtiva dos indivíduos acometidos
(SILVA et al., 2014).
O declínio funcional está diretamente ligado à realização das atividades
cotidianas, sendo o terapeuta ocupacional o profissional habilitado para
intervir nesse contexto. Sua atuação se dá nos componentes, áreas e
contextos do desempenho ocupacional, atuando desde a fase inicial
da doença nas Unidades de Internamento e/ou acompanhamento
ambulatorial, até a fase avançada na qual se faz necessária a realização
de visitas domiciliares (COPPERMAN; FORWELL; HUGOS, 2005).
Por desempenho ocupacional (DO) entende-se a interação pessoa
(componentes do DO: físicos, cognitivos e emocionais), ambiente
(contextos do DO: elementos físicos, sociais, culturais e institucionais)
e ocupação (áreas do DO: classificadas em autocuidado, produtividade
e lazer) (MAGALHÃES; CARDOSO; MAGALHÃES, 2009).
O modelo canadense do desempenho ocupacional e a prática baseada
no cliente são as bases metodológicas que norteiam a intervenção
nesse contexto, considerando as habilidades e os interesses da pessoa
no desenvolvimento de papéis e tarefas rotineiras (GUEDES et al.,
2010).
Os objetivos do terapeuta ocupacional junto a essa clientela
dependem da fase da doença em que se encontram. Nas fases iniciais,

42
o objetivo é a otimização dos componentes comprometidos, melhora
dos níveis de independência nas áreas do desempenho e a adaptação
dos contextos ambientais para proporcionar ao indivíduo adoecido
a realização da função de maneira plena e segura. Na fase avançada
da doença, o objetivo do tratamento passa a ser direcionado mais ao
cuidador, com orientações para a continuidade da assistência com
segurança e eficiência (COPPERMAN; FORWELL; HUGOS, 2005).
Tendo conhecimento da metodologia utilizada e objetivos
junto a esta clientela, o terapeuta ocupacional inicia o processo de
avaliação que consiste em uma entrevista inicial na qual são coletados
dados de identificação, perfil ocupacional, interesses e as habilidades
remanescentes. Em seguida são aplicadas escalas funcionais como a
Escala de Funcionalidade na Esclerose Lateral Amiotrófica Revisada
(ALSFRS- R) e a Medida de Independência Funcional (MIF).
A ALSFRS-R é um inventário funcional específico para pacientes
com ELA, composto por doze itens que estão subdivididos em quatro
áreas como alimentação, autocuidado, deambulação e comunicação. É
um questionário que funciona como indicativo prognóstico da doença
(GUEDES et al., 2010).
Outra escala utilizada é a MIF. Trata-se de uma escala de funcionalidade
global amplamente utilizada na área de reabilitação. São avaliados
dezoito itens que são divididos em cuidados pessoais, controle dos
esfíncteres, mobilidade, locomoção, comunicação e cognição social. A
aplicação da escala é feita tanto por observação direta do desempenho
das atividades como por entrevista feita com o paciente e com o
cuidador (RIBERTO et al., 2004).
Após coletados os dados, o terapeuta traça o plano de tratamento
em concordância com as necessidades e prioridades do paciente.
Na intervenção com ênfase nos componentes físicos, o terapeuta
lançará mão de exercícios de alongamento e atividades que favoreçam

43
a mobilização, destreza, coordenação, objetivando a otimização dos
componentes comprometidos. A prescrição de atividades junto a
pacientes com ELA deve ser feita de forma criteriosa, sempre intercalando
momentos de repouso, já que a realização exagerada de exercícios e/ou
atividades geram espasmos musculares, fazendo com que o paciente
fadigue rapidamente. A intervenção deve ser reavaliada com frequência,
pois a doença tem como uma de suas características principais a rápida
perda da função motora, necessitando que o terapeuta tenha muita
flexibilidade em seu raciocínio clínico (SILVA et al., 2014).
Alguns pacientes com ELA podem evoluir com alterações cognitivas
e/ou comportamentais sendo necessária uma intervenção sistematizada.
Nessas situações, o terapeuta irá estimular os componentes afetados
através de atividades terapêuticas e utilizar estratégias compensatórias
para reduzir os efeitos deste comprometimento na funcionalidade.
Por ser uma doença de evolução rápida, o indivíduo passa por várias
fases emocionais que interferem diretamente em sua autoestima. O
terapeuta ocupacional poderá atuar no fortalecimento da segurança
pessoal, promovendo a melhora psicossocial.
As intervenções nas áreas do DO devem considerar a conservação
de energia e a simplificação das tarefas. O treino das atividades de
vida diária deve ser guiado para o mínimo uso possível de grandes
grupos musculares (cinturas escapular e pélvica e tronco). Realização
de atividades na posição sentada como tomar banho, calçar sapatos,
vestir camisa, colocação de objetos de uso pessoal na altura das mãos
são algumas dessas técnicas que também devem ser orientadas ao
cuidador para supervisão das atividades quando houver necessidade
(COPPERMAN; FORWELL; HUGOS, 2005; RIBERTO et al.,
2004).
Uma outra abordagem possível junto a essa clientela é a utilização de
recursos de tecnologia assistiva, entendida como o conjunto de recursos

44
utilizados para melhorar a funcionalidade de pessoas com deficiência
(SILVA et al., 2014).
Nesse contexto, o profissional dispõe de grande variedade de
equipamentos, sempre considerando a fase da doença em que o indivíduo
se encontra, a simplicidade, aceitação e o nível de tolerância quanto
ao uso desses dispositivos para alcançar eficácia do tratamento. Uso de
adaptações, órteses, bengalas, cadeira de rodas e recursos que facilitem
a comunicação são alguns exemplos.
Um dos recursos de tecnologia assistiva mais prescritos para essa
clientela são as órteses. Trata-se de dispositivos aplicados externamente
ao corpo podendo ser usados para estabilizar ou imobilizar, prevenir ou
corrigir deformidades, preservar e aumentar a mobilidade e promover
a função. Estudos recentes relatam que o uso desta tecnologia em
pacientes com ELA traz ganhos funcionais e prevenção de contraturas
(IVY; SMITH; MATERI, 2014; VAN PETTEN; ÁVILA; LIMA,
2014; VELLOSO; JARDIM, 2006).
Em fases mais avançadas da doença, o terapeuta irá treinar e/ou
orientar o uso desses equipamentos com o cuidador para otimizar
a segurança do paciente, favorecer o posicionamento correto e a
integridade da pele, facilitar a comunicação, realizar transferências
e permitir a mobilidade através de equipamentos adequados (IVY;
SMITH; MATERI, 2014; SILVA et al., 2014; TANAKA et al., 2013).
Sendo assim, o terapeuta ocupacional busca a melhoria das condições
funcionais dos pacientes com Esclerose Lateral Amiotrófica, considerando
o ser em sua integralidade, buscando sempre a melhor qualidade de
vida deste indivíduo.

45
Referências

COPPERMAN, Lf; FORWELL, Sj; HUGOS, L. Doenças


Neurodegenerativas. In: TROMBLY, Ca; RADOMSKI, Mv. Terapia
Ocupacional para as disfunções físicas. 5. ed. São Paulo: Santos
Editora, 2005. p. 855-884.

GUEDES, Keyte et al. Cross-cultural adaptation and validation of als


Functional Rating Scale-Revised in Portuguese language. Arquivos
de Neuro-psiquiatria, São Paulo, v. 68, n. 1, p.44-47, fev. 2010.

IVY, Cindy C.; SMITH, Susan M.; MATERI, Miranda M. Upper


Extremity Orthoses Use in Amyotrophic Lateral Sclerosis/Motor
Neuron Disease: Three Case Reports. Hand, Arizona, v. 9, n. 4,
p.543-550, 18 mar. 2014.

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MAGALHÃES, Lívia de Castro (Org.). Medida canadense de
desempenho ocupacional (COPM). Belo Horizonte: Ufmg, 2009.
63 p.

RIBERTO, Marcelo et al. Validation of the Brazilian version of


Functional Independence Measure. Acta Fisiátrica, São Paulo, v.
11, n. 2, p.1-5, 2004.

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funcional e qualidade de vida de pacientes com esclerose lateral
amiotrófica em Natal. Cadernos de Terapia Ocupacional da
Ufscar, São Carlos, v. 22, n. 3, p.507-513, 2014.

46
TANAKA, Kazunari et al. Timely manner application of hand
orthoses to patients with amyotrophic lateral sclerosis: A case
report. Prosthetics And Orthotics International, Osaka, v. 38,
n. 3, p.239-242, 30 maio 2013.

VAN PETTEN, Adriana Maria Valladão Novais; ÁVILA, Antônio


Ferreira; LIMA, Cynthia Girundi da Silva e. Efeito do uso de órtese
de punho na função manual. Cadernos de Terapia Ocupacional
da Ufscar, São Carlos, v. 22, n. 1, p.79-87, 2014.

VELLOSO, M; JARDIM, Jr. Funcionalidade do paciente com


doença pulmonar obstrutiva crônica e técnicas de conservação de
energia. J Bras. Pneumologia, São Paulo, v. 6, n. 32, p.580-586,
2006.

47
5 - A FONOAUDIOLOGIA NA EQUIPE INTERDISCIPLINAR DE ATENDIMENTO
A PESSOAS COM ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Patrícia Oliveira Luna
Não existe nenhuma terapia que possa estacionar ou levar à cura
da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), mas há um grande número
de estratégias para o controle da sintomatologia e gerenciamento das
capacidades existentes.
O tratamento interdisciplinar visa prevenir as complicações
provenientes da paralisia e fraqueza muscular na maior parte do tempo
e melhorar, em algum aspecto, a saúde e a auto-estima. Deve estar
disponível para todos os pacientes com ELA, uma vez que melhoram
prognóstico e qualidade de vida (PONTES et al., 2010).
A fraqueza muscular é uma marca da ELA e ocorre inicialmente em
cerca de 60% dos pacientes. É caracterizada por amiotrofia, redução
de força muscular e fasciculações. As mãos e os pés podem ser afetados
primeiro. Caso a fraqueza e paralisia comprometam a inervação dos
músculos bulbares ou nas vias de controle do trato córtico-bulbar, a
doença evoluirá afetando a fala, deglutição, a mastigação e por fim a
respiração. Na ELA, 30% dos pacientes começam com sintomas bulbares
que incluem disfagia, disartria e alterações fonatórias (PONTES et
al., 2010).
As funções sensitivas, os movimentos oculares voluntários e as
funções sexual, intestinal e urinária estão preservadas (MORIM;
ROCHA; ALMEIDA, 2006). As pessoas com ELA têm consciência
da progressão da doença e de que esta não tem cura, o que em alguns
casos, conduz a quadros depressivos.
O objetivo do tratamento fonoaudiológico é manter, pelo maior
tempo possível, a funcionalidade da fala, mastigação, deglutição e voz
48
e criar estratégias de comunicação alternativa quando a comunicação
oral não é eficaz. Os objetivos da reabilitação são traçados dentro
de critérios individuais, dependendo como o curso e apresentação
clínica da doença estão no momento. Utiliza exercícios de coordenação
fono-respiratória e mobilidade labial e lingual, e técnicas e manobras
posturais que enfocam as diferentes fases da deglutição, para melhorar
o controle oral e facilitar a passagem do bolo alimentar, sempre tendo
o cuidado de não ocasionar fadiga (PONTES et al., 2010).

Disfagia

A disfagia é um dos mais importantes problemas enfrentados


na ELA, não sendo incomum como um sintoma inicial da doença
(paralisia bulbar ou pseudobulbar), ou aparecer após vários meses,
com envolvimento orofaríngeo nas fases mais avançadas (PONTES
et al., 2010).
O diagnóstico de disfagia pode ser feito pelo fonoaudiólogo
através de técnicas não invasivas: observação clínica, avaliação das
estruturas orais e alimentação monitorados muitas vezes através da
ausculta cervical (realizada com estetoscópio) e/ou oximetria de pulso.
A partir dos resultados obtidos pode ser necessária a solicitação de um
exame complementar, através da videofluoroscopia e manometria,
mesmo antes de os sintomas bulbares ou dificuldades de deglutição
se apresentarem clinicamente. A disfagia e o relato de pneumonia
aspirativa são, usualmente, os maiores prejuízos para a qualidade de vida,
em adição ao risco de desnutrição e desidratação. No entanto, faltam
estudos que expliquem claramente os mecanismos neurofisiológicos
da disfagia na ELA (JACOBI; LEVY; CORREA, 2004).
A Disfagia na ELA é caracterizada por um prejuízo na fase oral da
deglutição, o qual tem um impacto direto na fase faríngea. O aumento

49
da duração da fase voluntária da deglutição, incluindo as alterações
motoras de língua, parece ser uma das maiores contribuições para a
disfagia.
O escape precoce é mais frequente com líquidos ralos e a maior
causa de aspiração traqueal, mesmo em estágios precoces da doença e
com alterações leves da musculatura oral. Resíduos faríngeos são mais
comumente observados na consistência pastosa e sólida, e pode causar
penetração laríngea e aspiração traqueal pós-deglutição.
O prejuízo da habilidade de deglutir usualmente inclui a redução
do fechamento do reflexo glótico para que disfagia e aspiração ocorram
concomitantemente. A aspiração pode se manifestar somente através
de uma tosse seca, que aumenta durante as refeições.
A disfunção do neurônio motor inferior causa fraqueza da
musculatura lingual e velo-faríngea, o que interfere na formação do
bolo alimentar e deglutição de líquidos, assim como escape nasal e
fraqueza faríngea. A disfunção do neurônio motor superior produz
espasmos no músculo cricofaríngeo ou o seu fechamento prematuro,
resultando em resíduos na faringe. Os sintomas incluem sialorréia e
dificuldade para iniciar a deglutição na disfunção do neurônio motor
inferior (NMI), ou disfagia com engasgos no neurônio motor superior
(NMS) (JACOBI; LEVY; CORREA, 2004).
Com a evolução da doença, muitos pacientes desenvolvem
uma disfagia severa, com rápida perda de peso e fraqueza acelerada,
necessitando de um cateter alimentar. É mais efetivo para os pacientes
com ELA o cateter de gastrostomia endoscópica percutânea (PEG). O
uso de sonda nasogástrica (SNG) para alimentação deve se restringir
à curta duração ou quando os procedimentos PEG ou gastrostomia
radiológica percutânea (PRG) indicados não forem possíveis. A
decisão é realizada pela equipe médica com apoio das equipes de
Fonoaudiologia, Fisioterapia respiratória, Psicologia e Nutrição. É

50
indicada para pacientes que apresentam perda progressiva de peso
(<10%), alimentação demorada e com fadiga excessiva, tosse durante
a alimentação e dificuldade para deglutir medicamentos (FONSECA,
2010).
A indicação da via alternativa colabora na qualidade de vida desses
pacientes, assim como, no aumento da sobrevida, na diminuição do
risco de complicações clínicas, como exemplo as broncoaspirações
e consequentes pneumonias (VIANA; ALVARENGA, 2015). O
procedimento precoce é o mais recomendado, pois adiá-lo para uma
fase tardia implica em riscos, que vai aumentando com o declínio da
função respiratória (maior risco CVF<50%) (SALVIONI; STANICH;
SHINTAKU, 2009; XEREZ, 2008).
Vale salientar que os cuidados nutricionais devem ser realizados desde
estágios precoces da doença, incluindo alterações das consistências,
viscosidade e elasticidade dos alimentos; suplementação ou alterações
nutricionais (SALVIONI; STANICH; SHINTAKU, 2009).
A perda de peso é de etiologia multifatorial. Isso significa que os pacientes
com ELA podem ter um gasto calórico aumentado, mesmo em vigência
de adequada ingestão calórico-protéica. Esse hipermetabolismo pode
estar relacionado a questões respiratórias, tabagismo, fasciculações,
espasticidade, uso de riluzol e alterações mitocondriais; sendo a teoria
relacionada ao gasto respiratório, a mais convincente até o momento
(SALVIONI; STANICH; SHINTAKU, 2009).

51
Disartria

Inicialmente, o doente com ELA pode apresentar uma disartria


predominantemente flácida ou espástica. No entanto, em estágios
mais avançados da doença, é comum verificar-se uma disartria mista.
A disartria flácida é consequência de uma lesão no neurônio motor
inferior. Podem ser causadas por lesão nos nervos cranianos ou disfunção
nos nervos espinhais. Os nervos cranianos que podem ser acometidos
e que causam a disartria flácida são o trigêmeo (V) - responsável pela
inervação da mandíbula; vago (X) - responsável pela inervação dos
músculos da laringe e véu palatino; hipoglosso (XII) - reponsável pela
inervação dos músculos da língua e da boca. Ocorrendo como sintomas:
hipotonia, fraqueza, atrofia e fasciculações (CHIAPETTA; ODA,
2004). A voz apresenta-se hipernasal, soprosa, rouca, com intensidade
reduzida e frequência grave. Ocorre imprecisão articulatória, tosse
fraca e ineficaz.
A disartria espástica resulta de uma lesão no neurônio motor superior
bilateral, ocorrendo comprometimento bilateral das vias piramidais e
extrapiramidais. Com a evolução da doença, ocorre a disartria mista,
com comprometimento dos neurônios motores inferior e superior. A
fala disártrica na ELA é caracterizada por lentidão, fraqueza, imprecisão
articulatória e incoordenação do sistema estomatognático. A fala torna-
se lenta e laboriosa, progrendindo para disartria grave e supressão da
fala, mantendo somente sons vegetativos (CHIAPETTA; ODA, 2004).
Outros meios de comunicação passam a ser necessários: comunicação
alternativa, comunicação gráfica, simbólica e/ou computadorizada
(sistema de varredura de códigos), facilitando a comunicação do
paciente com a equipe, familiares e demais pessoas (XEREZ, 2008).

52
Disfonia

O principal sintoma vocal num indivíduo com ELA é a rouquidão.


No entanto, outras alterações vocais estão presentes: voz tensa, soprosa,
áspera, hipernasal, pitch grave, intensidade diminuída e monótona,
prosódia reduzida e tremor.
A avaliação da qualidade vocal pode ser feita através de avaliações
objetivas e subjetivas, que nos fornecem informações importantes
para determinar a intervenção, de modo a melhorar as capacidades
comunicativas do paciente com ELA (CHIAPETTA; ODA, 2004).
Na forma bulbar da ELA, a voz e/ou dificuldades de deglutição são
sempre os sintomas iniciais da doença.

Dispneia

A respiração está diretamente relacionada com a fonação e a proteção


das vias aéreas durante a deglutição, assim como com a prevenção
do acúmulo de secreções brônquicas na região da laringe. Qualquer
alteração que ocorra pode comprometer o sincronismo necessário
entre os mecanismos aerodinâmicos e mioelásticos, levando a uma
incoordenação (CHIAPETTA; ODA, 2004).
A dispneia ocorre devido à fraqueza progressiva dos músculos
da respiração, pelo que há acúmulo de dióxido de carbono (CO2) e
dessaturação de oxigênio (O2). Este quadro conduz a cefaleias matinais,
distúrbios do sono, sudorese, sonolência diurna, fadiga, medo, ansiedade
e pânico.
A eliminação das secreções brônquicas e a proteção das vias aéreas
superiores tornam-se mais difíceis devido à fraqueza dos músculos da
expiração. A tosse não gera pressão suficiente para a limpeza aérea,

53
ocasionando o risco de uma aspiração traqueal (CHIAPETTA; ODA,
2004).
O diagnóstico precoce do envolvimento muscular respiratório
em doentes com ELA pode auxiliar na escolha mais adequada: uso de
ventilação não invasiva ou traqueostomia, e dos cuidados paliativos
antes que ocorra falência respiratória (CHIAPETTA; ODA, 2004).

Gerenciamento fonoaudiológico nos distúrbios da fala e deglutição


na ELA

A atuação fonoaudiológica é essencial, uma vez que durante a evolução


da doença as disfunções progressivas da musculatura orofaringolaringeal
e respiratória afetam o paciente, resultando em disartria, dispneia,
disfonia e disfagia. Tais alterações, se não forem tratadas no curso da
doença, podem levar o paciente a desenvolver deficiência nutricional,
desidratação e complicações pulmonares em decorrência da aspiração
traqueal.
A terapia fonoaudiológica tem por objetivo manter o maior tempo
possível a funcionalidade da fala, mastigação, deglutição e voz. Consiste
em procedimentos e estratégias compensatórias através de exercícios
miofuncionais que não acarretem fadiga e do aprendizado de técnicas
que estimulam a propriocepção oral, alterações posturais e manobras
de deglutição. Quando o paciente estiver anártrico, procura-se criar
estratégias de comunicação alternativa.
A terapia deve ser realizada com um planejamento personalizado e
concomitante ao monitoramento periódico, através de exames específicos
tais como a videoendoscopia e/ou videofluoroscopia da deglutição,
a fim de preservar a alimentação por via oral o maior tempo possível
com critérios de segurança.

54
Conclusão

Considerando que áreas afetadas pela patologia incluem: fala


(articulação verbal-oral, voz e respiração), motricidade orofacial e
deglutição é fundamental o acompanhamento do fonoaudiólogo ao
paciente com ELA em todos os estágios da doença, a fim de criar
estratégias de reabilitação, adaptação e melhora da qualidade de vida.
A detecção precoce desses distúrbios permite ao fonoaudiólogo
avaliar os prejuízos funcionais e traçar metas realistas de reabilitação
junto ao paciente, familiares e equipe interdisciplinar.

55
Referências

CHIAPETTA, A; ODA, A. Doenças neuromusculares. In:


FERREIRA, L; BEFI-LOPES, D; LIMONGI, S. Tratado de
Fonoaudiologia. São Paulo: Roca, 2004. p. 330-342.

FONSECA, LA. Proposta de um conteúdo de orientações


emergenciais para profissionais da saúde que assistem pacientes
com esclerose lateral amiotrófica. 2010. 51 f. Monografia - Curso
de Medicina, Escola Paulista de Medicina, Unifesp, São Paulo, 2010.

JACOBI, Js; LEVY, Ds; CORREA, L. Disfagia: avaliação e


tratamento. Rio de Janeiro: Editora Revinter, 2004. 408 p.

MORIM, L; ROCHA, J; ALMEIDA, AFP. Intervenção da terapêutica


da fala na Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). Cadernos de
Comunicação e Linguagem, [S.I.], p.119-130, 2006.

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Lateral Amiotrófica: Revisão de literatura. Rev Neurocienc, Niterói,
v. 1, n. 18, p.69-73, 2010.

SALVIONI, Ccs; STANICH, P; SHINTAKU, Rco. Importância do


atendimento multidisciplinar a pacientes com doença do neurônio
motor/esclerose lateral amiotrófica. Conscientiae Saúde, São Paulo,
v. 2, n. 8, p.211-217, 2009.

VIANA, Simone; ALVARENGA, Regina. Oropharyngeal


manifestations in Amyotrophic Lateral Sclerosis.  Revista

56
Neurociências, Rio de Janeiro, v. 23, n. 02, p.173-181, 30 jun.
2015.

XEREZ, Dr. Reabilitação na Esclerose lateral amiotrófica: revisão


de literatura. Acta Fisiatr, Rio de Janeiro, v. 3, n. 15, p.182-188,
2008.

57
6 - NUTRIÇÃO NA ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Alessandra Barbosa da Silva, Ana Célia Oliveira dos Santos

Os alimentos são utilizados pelo organismo para fornecer os


nutrientes necessários ao metabolismo, mantendo a integridade, o
crescimento e renovação dos tecidos, além de fornecer energia necessária
para todas as atividades celulares. Uma boa alimentação deve fazer parte
da rotina de todas as pessoas, independentemente da condição geral,
pois contribui para manutenção da saúde, prevenção e tratamento
de doenças. O estado nutricional de um indivíduo é resultante do
balanço entre o fornecimento de nutrientes através dos alimentos e as
necessidades orgânicas, que por sua vez são influenciadas por diversos
fatores, inclusive pela condição de saúde do indivíduo.
A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença
neurodegenerativa, com prognóstico desfavorável e tratamento paliativo,
sendo o suporte nutricional um componente do tratamento para
pacientes com ELA, tendo em vista que o alcance de um melhor
estado nutricional está associado às taxas mais lentas de progressão da
doença. É evidente a existência de múltiplas barreiras para alcançar a
conservação de um estado nutricional para pessoas que vivem com ELA.
Considerando a elevada frequência de desnutrição e sua forte influência
sobre o prognóstico do paciente acometido, torna-se imprescindível
a terapia nutricional precoce como parte integrante do tratamento,
a fim de obter melhores resultados e proporcionar qualidade de vida
a essas pessoas. As dificuldades comumente encontradas incluem
disfagia, hipermetabolismo, hipometabolismo, fraqueza da extremidade
superior, saciedade precoce, prisão de ventre, depressão e perda de
apetite (BRAUN; OSECHECK; JOYCE, 2012; MUSCARITOLI et
al., 2012).

58
A literatura relata que a ELA cursa com incidência de desnutrição
de 15 a 55%, um valor elevado que pode aumentar com a progressão da
doença. Vale ressaltar que também é visto que a presença da desnutrição
é um indicador de risco relativo de morte em 7,7 vezes e que este risco
pode aumentar em 30% a cada 5% de perda de peso (MARIN et al.,
2010). Considerando o estado nutricional como fator influenciador
do prognóstico do paciente com ELA, a instituição de uma Terapia
Nutricional adequada, monitoramento nutricional e metabólico,
exerce um papel fundamental e deve ser implementada no momento
do diagnóstico da doença (DESPORT et al., 1999; MUSCARITOLI
et al., 2012).
O plano terapêutico nutricional vai muito além da prescrição
dietética. A conduta deve ser realizada junto ao paciente, informando
quanto à via de alimentação mais adequada (seja ela oral, mista, sonda
nasal ou por gastrostomia), mudanças da consistência da dieta, busca
pela valorização de sabores, preservação da autonomia do paciente,
hidratação, associação de estratégias de deglutição orientadas pela
equipe de fonoaudiologia, orientações de acordo com as necessidades
específicas, uso de suporte nutricional associado e suplementação de
micronutrientes, quando necessários. Nesse contexto, o plano alimentar
visa manter ou melhorar o estado nutricional, evitando a desnutrição e
suas complicações, além de buscar a melhora da função física, qualidade
de vida e sobrevida desses pacientes (BRAUN; OSECHECK; JOYCE,
2012).
Hipóteses têm sido desenvolvidas para explicar o hipermetabolismo
na ELA; dentre elas, destacam-se o maior esforço respiratório devido
à atrofia muscular ocasionada pela doença e pelo desequilíbrio
funcional das mitocôndrias com a diminuição da produção de energia
(MUSCARITOLI et al., 2012). Estudos apontam que pacientes com
ELA apresentam elevação do Gasto Energético de Repouso (GER)

59
em cerca de 10%, quando comparados a uma população saudável
da mesma faixa etária e sexo. Ainda não se tem clareza sobre essa
causa, porém há evidências que apontam que o hipermetabolismo seja
uma consequência do aumento da demanda muscular de nutrientes
(BRAUN; OSECHECK; JOYCE, 2012; MUSCARITOLI et al.,
2012).
Pacientes com ELA podem apresentar alterações no metabolismo
dos carboidratos, cursando com intolerância à glicose e resistência
insulínica, em consequência da diminuição da massa muscular
funcional e do armazenamento de glicogênio muscular. No entanto,
essas alterações podem ser multifatoriais, requerendo mais investigações
(MUSCARITOLI et al., 2012).
Em relação aos lipídios, dietas com alto teor de gorduras têm mostrado
efeito positivo na redução da perda de peso, devido a sua elevada densidade
energética (BRAUN; OSECHECK; JOYCE, 2012). A maior oferta
de lipídios parece ser fator protetor para esses pacientes, prolongando
significativamente sua sobrevida. Entretanto, é importante que a
qualidade dos lipídios ofertados seja considerada de forma a valorizar
as gorduras monoinsaturadas e polinsaturadas (MUSCARITOLI et
al., 2012).
É comum esses pacientes apresentarem constipação intestinal,
sendo agravada pelo baixo consumo de fibras e pela baixa ingestão
de líquidos devido à disfagia. Vale destacar a importância do aporte
hídrico meio à disfagia frequente. Em alguns casos, essa adequação
só é alcançada quando o paciente faz uso da nutrição enteral, onde a
oferta de água ocorre pela sonda de alimentação. O uso de espessantes
comerciais é indicado quando não se tem a Terapia Nutricional Enteral
(TNE) instituída (MUSCARITOLI et al., 2012).
Em contrapartida, quando o paciente faz uso da nutrição enteral,
a oferta de fibras na dieta enteral pode ser inferior à recomendada,

60
sobretudo se a dieta for artesanal ou industrializada sem fibras. Nesses
casos, o uso de módulos de fibras podem ser utilizados, assim como a
suplementação de simbióticos (MUSCARITOLI et al., 2012).
As recomendações de micronutrientes na ELA ainda estão sendo
estudadas, não havendo, portanto, consenso sobre as necessidades diárias
específicas de vitaminas e minerais para esses pacientes. Nesse sentido,
recomenda-se que no mínimo a Ingestão Diária Recomendada (RDA
- Recommended Dietary Allowances) de micronutrientes estabelecida
para a população sadia, seja alcançada através da dieta (PADOVANI
et al., 2006). O uso de suplementos pode ser indicado caso não seja
possível a adequação pela dieta. Embora cerca de 75% dos pacientes
com ELA façam uso de suplementos com micronutrientes, não há
evidência clara que essa conduta promova reversão da doença ou
prolongue a sobrevida (BRAUN; OSECHECK; JOYCE, 2012).
Ao considerar as necessidades hídricas dos pacientes com ELA,
deve-se avaliar sua capacidade de deglutição. A desidratação pode
ocasionar ou agravar a constipação intestinal; assim, fazem parte da
conduta orientações quanto à ingestão de líquidos, teor de fibras na
dieta, consistência das preparações, orientação de técnicas de deglutição
e massagem abdominal (GREENWOOD, 2013).
O uso da TNE nesses pacientes é bem comum devido à presença
constante de disfagia, do hipermetabolismo e da desnutrição acentuada.
Como critérios para a indicação da TNE nos pacientes com ELA,
utilizam-se os seguintes parâmetros: baixa ingestão alimentar (<75%
do Valor Calórico Total (VCT)), Índice de Massa Corporal (IMC)
abaixo de 18,5 kg/m2 ou uma perda de peso acima de 10%. Em caso de
pacientes idosos utiliza-se um IMC abaixo de 22 kg/m2 (LIPSCHITZ,
1994).
As possíveis vias de acesso para a TN são: oral, enteral e parenteral.
A via oral é a mais fisiológica e, portanto, a preferencial. Todavia, na

61
prática clínica, existem algumas situações onde o paciente não pode ou
não consegue se alimentar adequadamente por essa via. Nesses casos, a
nutrição enteral torna-se essencial na manutenção ou na recuperação
do estado nutricional do paciente. A nutrição parenteral, por outro
lado, apesar de ter suas indicações, deve ser a última via de escolha,
quer pelo seu alto custo, quer pelo maior risco de infecções (DRUYAN
et al., 2011).
Comumente, as vias de acesso mais encontradas nesses pacientes são
a nasogástrica e a Gastrostomia Endoscópica Percutânea (PEG). Embora
pareça não haver diferenças entre mortalidade ou eficácia comparando
essas duas vias de acesso, sabe-se que a sonda nasogástrica é indicada
para curtos períodos (<4 semanas), enquanto que a gastrostomia é
indicada para períodos mais longos (>4 semanas). Como os pacientes
de ELA cursam com um quadro progressivo e irreversível, o uso da
nutrição enteral não seria temporário, mas prolongado, deixando clara
a indicação preferencial pela PEG (GOMES JUNIOR et al., 2010).
Em concordância, nos pacientes com ELA, a PEG contribui para
o aumento da sobrevida e a melhora do estado nutricional, mediante
diminuição da perda de peso e aumento do IMC (MUSCARITOLI
et al., 2012). Embora a PEG seja a via mais eleita é necessário avaliar o
quadro respiratório desses, antes de realizar o procedimento (DRUYAN
et al., 2011).
A colocação da PEG pode ser influenciada pelo prejuízo progressivo
da capacidade respiratória, uma vez que os pacientes são sedados
durante esse procedimento. Nesse sentido, é importante manter o
acompanhamento nutricional trimestral, realizar a detecção precoce da
disfagia e a avaliação sistemática da Capacidade Vital Forçada (CVF)
desses pacientes, pontos que devem ser discutidos numa perspectiva
interdisciplinar. Na ELA, a PEG terá baixo risco quando realizada
em pacientes que apresentem uma CVF > 50%. Nos casos de uma

62
CVF < 30%, a PEG já seria um procedimento de alto risco, sendo
indicado nesse contexto uma ingestão alimentar conforme aceitação,
a hidratação intravenosa e a colocação de uma sonda nasogástrica para
alimentação paliativa (GREENWOOD, 2013; MILLER et al., 2009).
Além dos fatores inerentes à função pulmonar, é importante ressaltar
que o uso da TNE não elimina a ingestão por via oral, mas é um meio
importante para atingir as necessidades nutricionais e hídricas do
paciente, além de ajudar na administração de medicamentos (DRUYAN
et al., 2011).
A literatura relata efeito positivo, principalmente, no ganho ponderal
com a suplementação de aminoácidos de cadeia ramificada (AACR)
para pacientes com ELA (BONGIOANNI; CORBIANCO; DINI,
2013). No entanto, os resultados destas pesquisas são divergentes e
aceita-se que o consumo adequado de alimentos protéicos, fontes
desses aminoácidos, deve ser priorizado na alimentação destas pessoas,
respeitando as recomendações estabelecidas, pois o consumo excessivo
e crônico de AACR pode contribuir para a piora na progressão da
doença, provavelmente devido a estes serem precursores do glutamato
(MILAGRES et al., 2014).
A atenção nutricional é parte do acompanhamento de pessoas com
ELA e pode contribuir para reduzir as complicações da doença, quando
um esquema de intervenção nutricional precoce é bem estabelecido.

63
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65
7 - A GASTROSTOMIA ENDOSCÓPICA
Luiz Eduardo Correia Miranda, Marcel Rolland Ciro da Penha
Manter alimentados pacientes que não são capazes de deglutir
por via oral o próprio alimento é um dos desafios do tratamento
médico. Pacientes são incapazes de se alimentar por conta própria em
razão de sequelas neurológicas, de trauma, tumores, acidente vascular
cerebral, doenças degenerativas ou apenas como consequência da idade
avançada. Também são incapazes os pacientes com determinados tipos
de tumores e aqueles com doenças neuromusculares. Até 1980 esses
pacientes foram alimentados por uma sonda passada pelo nariz até o
estômago, ou por meio de um tubo colocado no estômago e exteriorizado
através da parede abdominal, procedimento realizado por cirurgia e
nomeado gastrostomia. A partir de 1980 a gastrostomia passou a ser
realizada com auxílio da endoscopia digestiva, sem a necessidade de
abrir cirurgicamente o abdome do paciente, procedimento conhecido
como gastrostomia endoscópica.
O objetivo desse capítulo é descrever o procedimento de gastrostomia
endoscópica, suas indicações e contra-indicações e suas complicações.

Indicações

A gastrostomia endoscópica está indicada para alimentar pacientes


que são incapazes, por qualquer motivo que seja, de se alimentar por
via oral e que possuem o tracto digestivo pérvio e funcionante. Para os
pacientes nessas condições e que necessitam do suporte nutricional por
curtos períodos de tempo, a alimentação pode ser oferecida por sonda
naso-entérica. Pacientes com contra-indicação para o procedimento
ou com impossibilidade de concluir a endoscopia digestiva alta podem
ser submetidos à gastrostomia cirúrgica. Há indicações raras como a
66
descompressão do tracto digestivo em pacientes obstruídos, controles
de fístulas digestivas proximais, entre outras, mas que fogem ao escopo
dessa publicação.

Contra-indicações absolutas
• Necessidade de suporte nutricional enteral por curto período de tempo;
• Tracto digestivo doente, não pérvio ou não funcionante em razão de doenças
inflamatórias, traumas, neoplasias, doenças vasculares ou congênitas;
• Pacientes em fase terminal de doença incurável;
• Paciente hemodinamicamente instável ou em sepse;
• Características anatômicas ou doenças que sejam impedimento para a técnica, por
exemplo, o estômago intra-torácico em grande hérnia hiatal;
• Celulite da parede abdominal anterior;

Contra-indicações relativas:
• Hérnia incisional da parede abdominal anterior ou hérnia ventral;
• Varizes abdominais secundárias a hipertensão portal;
• Ascite de moderado a grande volume;
• Gestação avançada;
• Paciente com quadro de agitação psicomotora que não pode ser controlado ou
contido;
• Condições sócio-educacionais que não sejam suficientes para os cuidados com a
gastrostomia;

Técnica

Embora haja quem defenda que o procedimento possa ser feito


por um único profissional, rotineiramente é conduzido por dois
profissionais, sendo um endoscopista e um cirurgião. Eventualmente,
um anestesista é chamado para garantir a via aérea e a ventilação do
paciente durante a sedação, especialmente naqueles pacientes mais
frágeis. O procedimento pode ser realizado em sala de endoscopia

67
que atenda às exigências previstas na legislação brasileira ou em sala
de bloco cirúrgico e é conduzido sob sedação venosa e anestesia local
no ponto de punção abdominal. O paciente deve ter monitorização
quanto à oximetria de pulso, frequência e ritmo cardíaco e pressão
arterial e receber uma dose endovenosa de antibiótico profilaticamente
antes do início do procedimento, normalmente uma cefalosporina de
primeira geração. São necessárias oito horas de jejum.
Há dois métodos principais para a realização do procedimento.
Ambos os métodos possuem variações descritas, mas em essência
podem ser assim resumidos:

1) Técnica por tração


É a mais comumente realizada em nosso meio. Em resumo, mediante
observação endoscópica, uma punção é feita no estômago através da
parede abdominal usando uma agulha longa e calibrosa (foto 1),
comumente um abocath número 16. Por essa agulha é passado um fio
guia, que é capturado pelo endoscopista e exteriorizado pela boca do
doente. A esse guia é atada uma sonda de gastrostomia. Um auxiliar
ou o próprio endoscopista traciona o fio guia pela parede abdominal
(foto 2), levando a sonda desde a boca até o estômago, exteriorizando-a
pela parede abdominal. Um aparato de silicone em forma de disco na
extremidade final da sonda impede que ela seja tracionada para fora do
estômago (fotos 3 e 4). Um segundo aparato de silicone é colocado
externamente, mantendo a sonda fixa à parede abdominal (foto 5) e o
estômago justaposto à parede abdominal interna. Cria-se assim, uma
fístula entre o estômago e o meio externo por onde o doente pode ser
alimentado. Essa fístula é composta por um orifício interno (gástrico),
um trajeto através da parede abdominal e um orifício externo (cutâneo,
(foto 5).

68
Orifício externo
por onde a sonda
será tracionada.

Foto 1. A agulha introduzida através da Foto 2: A sonda de gastrostomia está introduzida


parede abdominal é capturada no interior na boca do doente e será tracionada pelo fio
do estômago pelo endoscopista. colocado no abdome.
Fonte: Elaborada pelos autores. Fonte: Elaborada pelos autores.

Foto 3: As duas extremidades da sonda


de gastrostomia endoscópica. Na parte Foto 4: O aparato interno de silicone impede
superior está o aparato de fixação que a sonda seja totalmente exteriorizada,
interna que mantém o estômago junto mantendo o estômago junto à parede
à parede gástrica. Na parte inferior está abdominal anterior. Visão do endoscopista.
a extremidade em alça que é atada ao fio Fonte: Elaborada pelos autores.
guia.
Fonte: Elaborada pelos autores.

Foto 5: Aparato externo de fixação da Foto 6: Kit industrial apropriado para rápida e
gastrostomia. Uma escala em centímetros segura colocação da gastrostomia endoscópica.
gravada na sonda permite estimar o quão Fonte: Elaborada pelos autores.
introduzida está a sonda no interior do
estômago.
Fonte: Elaborada pelos autores.

69
2) Por pulsão:
Mediante endoscopia digestiva alta o estômago é distendido com
ar, aproximando-o da parede abdominal anterior e puncionado com
agulha fina. Por essa agulha passa-se um fio guia curto que é capturado
dentro do estômago e mantido tensionado nessa posição. Pelo fio guia
é passada a sonda de gastrostomia, de fora para dentro do estômago,
onde é fixada de maneira semelhante ao método anterior. Por esse
método, a sonda é empurrada para o interior do estômago.
Qualquer que seja o método empregado, o ponto de punção da
parede abdominal é escolhido observando-se a região do abdome,
onde a luz do endoscópio no interior do estômago pode ser percebida
através da parede abdominal pelo cirurgião. Para ambos os métodos
existem kits comerciais mais ou menos completos ao custo aproximado
de US$ 200-300 (foto 6). Graças a esses recursos, o procedimento
pode ser feito em poucos minutos e com bastante segurança. Um
método artesanal com o uso de uma sonda tipo Foley número 24
pode eventualmente ser usado em situações de extrema carência de
recursos hospitalares.
A simplicidade do método, o seu baixo custo, baixa morbi-
mortalidade e principalmente o fato de ser bem tolerado pelos pacientes
ao contrário do tubo nasogástrico, fizeram da gastrostomia endoscópica
o método de escolha para pacientes que não podem se alimentar por
via oral por longo período de tempo.

Cuidados pós-operatórios imediatos:

Embora o procedimento seja seguro e simples, e haja embasamento


na literatura médica para recomendá-lo ambulatorialmente (com
liberação do uso da sonda após três ou quatro horas) complicações
graves são possíveis, por isso, na nossa experiência, temos como rotina
70
deixar a sonda aberta, em drenagem nas primeiras seis a doze horas e
somente iniciar o seu uso após esse período de observação clínica.
Durante os três primeiros dias, o aparato externo de silicone que
mantém a sonda fixa externamente deve estar bem ajustado próximo à
pele para garantir que o estômago esteja justaposto à parede abdominal.
Depois desse período, o estômago estará naturalmente aderido à parede
abdominal anterior e o aparato de silicone pode ser folgado em um
centímetro para evitar a síndrome de sepultamento do aparato interno,
discutida a seguir.
É natural que haja drenagem diária de mínima quantidade de
secreção inflamatória ao redor do orifício de saída da sonda. Basta a
higienização da ferida para controlar esse desconforto.

Complicações:

Além das complicações inerentes à endoscopia digestiva alta


em pacientes frágeis e à incisão cirúrgica, tais como sangramentos,
hematomas de parede, broncoaspiração, depressão respiratória induzida
por drogas, há as complicações próprias inerentes à realização ou
presença da gastrostomia.

Abscesso de parede abdominal.

É relativamente comum que, nos primeiros dias após o procedimento,


apareça abscesso de parede abdominal ao redor do local de exteriorização
da sonda de gastrostomia. Clinicamente, a complicação se manifesta
por edema, vermelhidão e calor ao redor do orifício cutâneo da
gastrostomia, eventualmente febre e dor e, finalmente, por drenagem de
coleção purulenta pelo orifício da gastrostomia. A drenagem da coleção
piogênica e o uso de antibióticos apropriados curam a complicação

71
sem necessidade de retirada da sonda de gastrostomia na maioria das
vezes;

Retirada inadvertida da sonda de gastrostomia.

O próprio paciente ou o seu cuidador podem inadvertidamente


tracionar a sonda de gastrostomia, exteriorizando-a completamente. Se o
acidente acontecer nos primeiros dias após o procedimento, pode haver
vazamento de conteúdo gástrico para o interior da cavidade abdominal
e grave peritonite. Essa situação demanda atenção médica imediata.
Se o acidente acontecer tardiamente não há riscos. O paciente deve
ser levado sem demora a um serviço de assistência médica apropriado
para que uma nova sonda seja colocada antes que a fístula cicatrize
totalmente;

Afrouxamento do aparato de fixação externa.

Durante os primeiros dias do pós-operatório, o aparato externo deve


estar bem próximo à pele. Em caso de relaxamento dele, o estômago
pode se afastar da parede abdominal anterior e haver vazamento de
conteúdo gástrico para o interior da cavidade peritoneal, causando
grave peritonite e eventualmente a morte do paciente. Para evitar essa
complicação, na nossa experiência, rotineiramente fixamos o aparato
externo à própria sonda e à pele do paciente com um ponto cirúrgico,
retirando-o após 72 horas;

Granuloma de corpo estranho ao redor do orifício cutâneo.

Complicação quase universal e tardia consiste em tecido avermelhado


e friável (tecido de granulação) ao redor do orifício cutâneo. Embora
cause desconforto à família, trata-se de uma reação do organismo à
72
presença da sonda e não oferece perigo ao doente. Quando grande
ou quando apresenta sangramento recorrente, esse tecido pode ser
desbridado pelo médico sem grandes dificuldades;

Dermatite ao redor do orifício cutâneo.

Causado pelo extravazamento de conteúdo gástrico pelo orifício


externo, deve ser tratado com métodos de barreira (curativos, pomadas)
e com o ajuste do oríficio externo à sonda de gastrostomia (Foto 7).

Foto 7: dermatite química ao redor de orifício externo


não cicatrizado após a retirada da sonda de gastrostomia.

Fonte: Elaborada pelos autores.

Perfuração ou obstrução intestinal

Essa grave complicação operatória ocorre raramente e é inevitável,


por maior que seja o esmero da técnica operatória. Acontece quando
uma alça intestinal, comumente o cólon transverso, se interpõe entre o
estômago e a parede abdominal no momento da punção do estômago
através da parede abdominal. A agulha e o fio guia passarão através da
alça intestinal e quando a sonda for tracionada, a alça intestinal ficará
presa entre o estômago e a parede abdominal. O resultado é a obstrução
do trânsito intestinal ou o vazamento de conteúdo intestinal para o

73
interior da cavidade abdominal. Essa grave complicação se manifesta
clinicamente nas primeiras seis a doze horas após o procedimento por
náuseas e vômitos, distensão e dor abdominal e exige atenção médica
imediata;

Síndrome de sepultamento do aparato interno:

Passados os primeiros dias pós-operatórios, o aparato externo junto


à pele deve ser afrouxado em um centímetro e a sonda ser diariamente
rodada em torno do seu eixo longitudinal, permitindo que fique
ligeiramente frouxa. Manter o aparato externo apertado permitirá que
o aparato interno seja lentamente expulso do interior do estômago,
ficando preso à parede abdominal e causando a cicatrização do orifício
gástrico e a perda da sonda de gastrostomia, situação que exige que
nova gastrostomia seja realizada;

Persistência da fístula gástrica após a retirada da sonda de


gastrostomia.

Trata-se de uma situação rara porque dificilmente o paciente volta
a ter condições de se alimentar por via oral, sendo a gastrostomia uma
solução definitiva. Quando é possível indicar a retirada da sonda
de gastrostomia, basta uma tração mais forte sobre a sonda, e ela
facilmente será exteriorizada sem necessidade de anestesia, sedação ou
cuidados especiais. Um curativo é colocado sobre o orifício cutâneo
e em poucos dias esse orifício naturalmente é cicatrizado e a fistula
fecha completamente. Em raras situações, a fístula não cicatrizará
perfeitamente e um contínuo escape de conteúdo gástrico poderá ser
notado, provocando dermatite química ao redor da fístula (foto 7).

74
O uso da sonda de gastrostomia

A sonda pode ser usada para a administração de dietas líquidas


enterais industriais ou artesanais, feitas no próprio domicílio do
doente, para a hidratação do doente e para a administração de drogas.
Eventualmente pode ser usada para descompressão gástrica. Após o
seu uso, a cada vez, deve ser lavada com água potável e limpa para
evitar que restos de alimentos ressecados se acumulem no seu lúmen
e causem a sua obstrução.

Troca da sonda de gastrostomia

O tempo de vida útil da sonda depende essencialmente dos cuidados


diários de limpeza. Se bem cuidada, uma sonda de silicone permanece
utilizável por aproximadamente um ano. Quando perder as suas
características de elasticidade, permeabilidade ou quando perfurada
e desgastada, pode ser facilmente substituída por uma nova, sem
necessidade de nova endoscopia e sem grandes complicações, uma
vez que é aproveitado o mesmo trajeto fistuloso. Um dispositivo mais
simples e que consiste de uma pequena peça de silicone colocada através
da fístula já formada sem necessidade de endoscopia pode substituir
a sonda original com vantagens.

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83
8 - A INTERVENÇÃO DA EQUIPE INTERDISCIPLINAR: SOMANDO AÇÕES
E APRENDENDO COM O OUTRO
Carolina da Cunha Correia
Allan Delano Urbano Cunha
Patrícia Oliveira Luna
Gabriela Serejo Martins da Silva
Tatiana Lins Carvalho

Trabalhar em equipe significa lidar com diferentes pessoas, habilidades


e conhecimentos para a resolução de uma situação em comum. A
importância da comunicação e do trabalho da equipe interdisciplinar
de Saúde determina a qualidade e a segurança na prestação de cuidados
ao indivíduo. Dessa forma, todos os membros devem compreender as
habilidades e potencialidades de cada um dos profissionais envolvidos
(NOGUEIRA; RODRIGUES, 2015).
A atuação interdisciplinar implica na construção de um conceito
tecido junto, de uma prática de inter-relação e interação entre as diversas
disciplinas, da articulação dos conhecimentos e, consequentemente, a
ampliação das fronteiras disciplinares, na qual a troca de saberes mostra
a interdependência e a necessidade entre as áreas de conhecimento
(CARPES et al., 2012).
Esse capítulo tem por objetivo narrar um caso clínico, no qual
houve a abordagem da Equipe ELA Huoc. O estudo apresentou parecer
favorável do Comitê de Ética em Pesquisa do Complexo Hospitalar
HUOC / PROCAPE – CAAE: 22415513.2.0000.5192 e a paciente
em questão assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e
o Termo de Autorização de Uso de Imagem.

84
Relato do Caso

X, mulher, 51 anos de idade, compareceu ao atendimento na


Neurologia apresentando há sete meses fraqueza iniciada nos Membros
Inferiores (MMII). Ao exame clínico foram observados sinais de
neurônio motor inferior e superior em segmentos bulbar, cervical
e lombossacral. Em seguida, foram solicitados exames laboratoriais
(Hemograma + VHS, Creatinina, uréia, ALT, AST, Eletroforese de
proteínas, T3, T4 e TSH, PTH, VDRL, HIV, HTLV, FAN, fator
reumatóide, Vitamina B12, Marcadores tumorais e LCR), de imagem
(Ressonância Magnética da região cervical e da junção crânio-cervical)
e a Eletroneuromiografia que fazem parte do protocolo para exclusão
de outras doenças. Não apresentava outras comorbidades e nem
antecedentes familiares. Com a confirmação do diagnóstico, o caso
foi discutido em equipe, sendo elaborado o seu Projeto Terapêutico
Singular (PTS). Foi iniciado o Riluzole de 50 mg, duas vezes ao dia;
a paciente passou a ser monitorada quanto à hematologia dos efeitos
colaterais e foi encaminhada para os demais membros da equipe
interdisciplinar.
X chegou ao serviço de Fisioterapia com comprometimento bulbar e
axial, alteração da marcha, da força nos quatro membros e apresentando
queixas respiratórias discretas. Havia redução da capacidade vital forçada
e nesta fase foi solicitado o AMBU para iniciar a terapia reexpansiva,
sendo orientada a realizar 10 repetições por dia sustentando a inspiração
em 2 ciclos por vez.
Com esta orientação, a paciente passou a vir ao ambulatório uma
vez por mês, revisava os exercícios e realizava sessão no mesmo dia.
Durante alguns meses, realizou este procedimento e neste período
apresentou piora do quadro motor, perdendo a capacidade de marcha

85
e apresentando redução dos volumes pulmonares; foi então solicitado
o BIPAP para dormir.
O objetivo da Fisioterapia Respiratória foi manter os volumes e
capacidades pulmonares, inicialmente através do AMBU e depois com
o uso do BIPAP, o mais precoce possível, para evitar complicações da
hipoventilação e da insuficiência respiratória restritiva com hipercapnia,
melhorando a qualidade do sono da paciente e suas trocas gasosas.
Dessa forma, poderia realizar suas atividades de vida diária e retardaria
a falência respiratória, condição na qual há total dependência da
ventilação, podendo ser indicada a traqueostomia.
Durante a avaliação fonoaudiológica, foram observados,
principalmente, os parâmetros de força, mobilidade e funcionalidade
das estruturas que compõem o sistema estomatognático e vocal:
- Lábios: apresentava tônus, força e mobilidade preservadas;
- Língua: manifestava diminuição de tônus e fasciculações. Conseguia
realizar movimentos de anteriorização, projeção e elevação. Não
conseguia vibrar;
- Bochechas: mobilidade e força prejudicadas, com amplitude de
movimento diminuída;
- Véu palatino: elevação insuficiente, com nasalidade compensatória;
- Voz: hipernasal, com valores de sustentação de vogais na média de
15 segundos, mas já sem conseguir realizar a sustentação dos fonemas
fricativos S e Z;
- Articulação: fala lentificada, com imprecisão articulatória dos fonemas
fricativos e prosódia prejudicada. No entanto, ainda inteligível para o
processo de comunicação;
- Mastigação: pouca lateralização de mandíbula, com predomínio do
padrão vertical. Relatava dor em região de masseteres;
- Deglutição: disfagia para líquidos, com engasgos esporádicos. Nível
6 da escala de FOIS;

86
- Tosse: forte e eficaz.
Com a evolução do quadro, foram observadas as seguintes
características:
- Diminuição da força e mobilidade de bochechas, lábios e língua;
-Aumento da imprecisão articulatória, com consequente diminuição
da inteligibilidade da fala;
- Prosódia extremamente prejudicada, com prejuízo da compreensão
da fala pelo ouvinte;
- Articulação lenta e laborosa;
- Diminuição do tempo de emissão de vogais sustentadas, com valores
abaixo de 10 segundos, com aumento da fadiga, nasalidade e soprosidade
vocal;
- Disfagia para alimentos líquidos e sólidos, alimentando-se
exclusivamente da consistência pastosa fina e utilizando espessante
para líquidos. Estando no nível 4 da escala de FOIS;
- Tosse: fraca e ineficaz, com diminuição da força e adução glóticas.
Orientações para exercícios, manobras compensatórias, posturais
e adaptações na consistência e padrão da dieta foram feitas junto à
paciente e cuidadores. Em função do aumento da sialorreia, também
passou a utilizar atropina em gotas na cavidade oral.
X foi acompanhada por quase um ano na Psicologia. Houve
preocupação pelo fato de estar recomeçando um processo terapêutico,
pois a paciente já vinha sendo atendida por outra colega. Preocupação
porque várias situações teriam que ser revistas. Situações já exploradas e
ultrapassadas ou não. Foi encontrada então uma mulher bem cuidada,
vaidosa, maquiada, sorridente e muito disponível a um trabalho
psicoterapêutico.
Atender um indivíduo com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA),
assim como em todas as doenças limitantes e incapacitantes, mais
especificamente as neurodegenerativas, configura-se em processo às

87
vezes longo, muitas vezes não, mas, com certeza, de muito sofrimento.
Lidar com a impotência causa muita angústia e com a finitude muito
medo. Como atender um ser humano que assiste sua independência ir
embora paulatinamente? Como acolher essa dor e esse medo e devolver
algo reconfortante?
Kübler-ross (1998) em seu livro Sobre a morte e o morrer, nos fala
sobre estágios pelos quais os pacientes terminais podem passar, são eles:
Negação/isolamento, raiva, barganha, depressão, aceitação e esperança.
Não há uma ordem para vivenciá-las e nem todos passam por todas
as fases. Cada indivíduo experimenta cada estágio de acordo com o
seu aparato emocional.
Na paciente, foi encontrada aceitação e muita esperança, apesar da
plena consciência de que a possibilidade de vencer a ELA era remota,
para não dizer impossível, o que nos reporta a uma aceitação imbuída
de esperança.
Até mesmo os mais conformados, os mais realistas, deixavam aberta a
possibilidade de alguma cura, de que fosse descoberto um novo produto,
ou de que tivesse “êxito um projeto recente de pesquisa. (KÜBLER-
ROSS, 1998, p. 144)

X era uma mulher muito ativa. Com a descoberta da ELA os


sintomas que levaram à investigação do diagnóstico foram se agravando
aos poucos. Primeiro os membros inferiores, em seguida os superiores,
a voz, a deglutição.
Kovács4 faz alusão às perdas decorrentes de doenças incapacitantes
ou acidentes, como forma de morte simbólica, a morte de partes
de si como pessoa ativa e perda do outro, caracterizada pela perda e
separação de familiares, pessoas próximas e queridas. Tais perdas são
diárias e conscientes.

88
Existiram momentos de muita reflexão, emoção, dor, tristeza,
sonho e esperança. Não havia lamentos, mas existiam perguntas:
Por quê? foi uma delas, mas que logo se transformou em Para quê?.
Devido a sua religiosidade, via os acontecimentos com o propósito,
não sabia qual, mas criava, sentia que tinha que haver. Dessa forma, a
vida apenas parecia se esvair do seu corpo porque o seu espírito estava
sempre vívido.
No início das sessões de Terapia Ocupacional, X apresentava muitos
questionamentos e muitas dúvidas, tornando os encontros sempre
momentos para reflexões. Seu desempenho ocupacional foi avaliado e
junto à paciente foram eleitas metas a curto, médio e longo prazo. Os
instrumentos aplicados possibilitaram uma visão global da paciente,
de forma objetiva, somada à percepção subjetiva durante a terapia.
As escalas utilizadas averiguaram funcionalidade – Escala Funcional
Revisada da Esclerose Lateral Amiotrófica: ALSFRS-R (GUEDES
et al., 2010), sintomas depressivos e ansiosos – Escala Hospitalar de
Ansiedade e Depressão: HADS (BOTEGA et al., 1995), qualidade
de vida – Questionário de Avaliação da Esclerose Lateral Amiotrófica:
ALSAQ-40 (PAVAN et al., 2010) e percepção da doença – Questionário
Breve de Percepção da Doença: BRIEF-IPQ (NOGUEIRA, 2012).
X apresentava sua autonomia preservada, porém demonstrava
dependência para as Atividades Avançadas de Vida Diária (AAVD) e
semidependência para as Atividades Instrumentais e Básicas de Vida
Diária (AIVD e ABVD). Com o passar dos meses, as limitações motora
e respiratória foram evoluindo, deixando-a dependente também nas
AIVD e ABVD, apesar de continuar gerindo sua vida.
A participação da família foi crucial para o bem-estar de X;
cuidadores bem envolvidos e que tentavam também se cuidar para
colaborar da melhor forma. Havia um revezamento entre os familiares

89
para acompanhar a paciente durante as consultas da equipe, como
também participavam dos encontros no grupo de cuidadores.
A curto prazo, houve o treino cognitivo (tendo em vista que a
paciente apresentava queixas de esquecimento decorrentes do seu estado
emocional), estruturação de rotina, correções posturais, controle de
câimbras em membros superiores (através de adaptações em utensílios
para alimentação) e orientações sobre conservação de energia durante
a realização das suas atividades diárias.
A médio prazo, foram realizadas mudanças ambientais com adaptações
de móveis para garantir segurança, permanência da conservação de
energia durante os movimentos e posturas adequadas para evitar dor.
A longo prazo, fomos em busca da concretização de um dos seus
projetos de vida: escrever um livro. Durante as sessões foi eleito o
tema da escrita e planejadas as etapas. À medida que o projeto era
desenvolvido, uma diversidade de sentimentos eram colocados em prova
e assim, discutidos na terapia. X tinha escolhido narrar a descoberta
da sua doença como forma de ajudar outras pessoas que receberam o
mesmo diagnóstico ou que ainda estavam em peregrinação. O livro
tornou-se então um projeto com proporções bem maiores, pois além
de ajudar outras pessoas e a si mesma, a paciente teve a confirmação
do quanto ela era querida e respeitada em seu meio. A comunidade
em que residia, como também seus amigos e amigas se uniram para
que pudesse ocorrer a publicação.
O livro foi lançado em um Simpósio organizado pela Equipe ELA
Huoc e, apesar da dificuldade para escrever, X pôde autografar sua obra.
Este foi o último momento de encontro da paciente com a equipe. Já
não andava, nem falava com clareza; mas, como sempre, estava bem
cuidada e arrumada. Bem mais debilitada, porém com aquele mesmo
olhar repleto de vida.

90
Quando questionam à equipe quem foi X, a resposta se torna
única: era mãe, avó, filha, profissional, parceira, esposa. Coordenava
grupos de adolescentes e de mulheres, ensinando-lhes artesanato com
recicláveis. Era Agente de Saúde, uma mulher atuante, ciente dos seus
direitos e consciente dos seus desejos. Uma pessoa que nos ensinou a
respeitar nossos limites, mas não nos tornar prisioneiros deles!

91
Referências:

BOTEGA, Neury J. et al. Transtornos do humor em enfermaria de


clínica médica e validação de escala de medida (HAD) de ansiedade
e depressão. Revista de Saúde Pública, Campinas, v. 29, n. 5,
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CARPES, Adriana Dornelles et al. A construção do conhecimento


interdisciplinar em saúde. Disciplinarum Scientia, Santa Maria,
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GUEDES, Keyte et al. Cross-cultural adaptation and validation of als


Functional Rating Scale-Revised in Portuguese language. Arquivos
de Neuro-psiquiatria, São Paulo, v. 68, n. 1, p.44-47, fev. 2010.

KÓVACS, Maria Júlia. Pacientes em estágio avançado da doença,


a dor da perda e da morte. In: CARVALHO, Maria Margarida M
J de (Org.). Dor: Um estudo multidisciplinar. 2. ed. São Paulo:
Summus, 1999. p. 313-337.

KÜBLER-ROSS, Elisabeth. Sobre a morte e o morrer: O que os


doentes terminais têm para nos ensinar a médicos, enfermeiros,
religiosos e aos próprios parentes. 8. ed. São Paulo: Martins
Fontes, 1998. 299 p.

NOGUEIRA, Graziela Sousa. Adaptação e validação do Brief


Illness Perception Questionnaire (Brief IPQ) para a cultura
brasileira. 2012. 86 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Psicologia
da Saúde, Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, Brasília,
2012.

92
NOGUEIRA, Jane Walkiria da Silva; RODRIGUES, Maria Cristina
Soares. Comunicação efetiva no trabalho em equipe em saúde: um
desafio para a segurança do paciente. Cogitare Enfermagem, [s.l.],
v. 20, n. 3, p.636-640, 23 set. 2015.

PAVAN, Karina et al. Validation of the Amyotrophic Lateral Sclerosis


Assessment Questionnaire (ALSAQ-40) scale in the portuguese
language. Arquivos de Neuro-psiquiatria, São Paulo, v. 68, n. 1,
p.48-51, fev. 2010.

93
9 - CUIDADOS PALIATIVOS EM PESSOAS COM ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA
Deise Gonçalves do Nascimento
José Anchieta de Brito
Mirla Oliveira Santos Medeiros

O Cuidado é uma prática frequente que compõe a rotina dos


profissionais de saúde, cuidadores e familiares, formando uma rede
de apoio aos pacientes que possuem doença crônica que ameaça a
vida, em particular a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). Essa é uma
doença de cunho neurodegenerativo, progressivo e limitante, sem
possibilidade terapêutica de cura e que necessita de intenso cuidado.
Paliar, portanto, constitui-se como um componente relevante para tratar
sintomaticamente os pacientes, a partir do momento do diagnóstico até
a morte, possibilitando a formação de vínculo entre equipe, paciente,
familiares e cuidadores (BLACKHALL, 2012; KIERNAN, 2015;
OLIVEIRA; PEREIRA, 2009).
A Medicina paliativa possui caráter peculiar, pois é norteada
por princípios que perpassam os aspectos biológicos da doença e
vai além, individualizando as condutas terapêuticas e, ao mesmo
tempo, reconhecendo que protocolos muitas vezes são insuficientes
na identificação dos aspectos subjetivos e inerentes ao significado da
vida do sujeito adoecido. Aspectos nos quais devem ser valorizados
a experiência de vida, valores culturais e sentimentais, carregados
de esperança e vontade de viver e que em muitas vezes confronta
prognósticos já estabelecidos, provocando e desafiando o tempo
(OLIVEIRA; PEREIRA, 2009; ORSINI et al., 2011).

94
Assim sendo, o Termo Cuidado Paliativo (CP) já difundido no
Canadá, foi adotado em 1990, pela OMS, sendo revisado e substituído
em 2002 e mantido até os dias atuais como sendo uma abordagem que
promove a melhoria da qualidade de vida dos pacientes e das famílias
que enfrentam problemas relacionados a doenças ameaçadoras da vida.
Isso acontece através da prevenção, alívio do sofrimento e por meio da
identificação precoce, avaliação e tratamento preciso da dor e outros
sintomas de ordem física, psicossocial e espiritual (CREMESP, 2008;
MACIEL; RODRIGUES; NAYLOR, 2006; WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2002).
O CP prioriza o alívio e o conforto dos sintomas, preferencialmente
se estes ainda não forem perceptíveis. O conhecimento da patologia,
a avaliação precoce e a integração equipe-paciente-família fazem
com que essa realidade seja possível. Durante o curso da doença a
capacidade de comunicar-se é essencial para manutenção da autonomia
do paciente, sendo a escuta uma ferramenta na implementação do
cuidado. Os sinais e sintomas apresentados pelo paciente com ELA são
mensagens que precisam ser decodificadas e interpretadas no tempo
certo (CONNOLLY; GALVIN; HARDIMAN, 2015; DALVA, 2012;
ORSINI et al., 2011).
O paciente com ELA pode apresentar uma variedade de sintomas,
tais como: dor, sarcopenia, hiporreflexia, hipotonia, fraqueza muscular,
fadiga, fasciculações, espasticidade, estresse psicossocial, distúrbios do
sono, disartria, disfagia, sialorréia, labilidade emocional e disfunção
respiratória. Portanto a necessidade da atuação de uma equipe
multidisciplinar em cuidados paliativos, quando bem treinada, contribui
de forma efetiva para o alívio dos sintomas, de modo a facilitar a
compreensão da família/paciente acerca da possibilidade de uma boa
qualidade de morte, buscando reduzir iatrogenias, possibilitando o
alívio do sofrimento de qualquer natureza e auxiliando na tomada de

95
decisões difíceis (DALVA, 2012; MARTINS et al., 2013; ROCHA
et al., 2013; SOUZA et al., 2015).

Princípios dos Cuidados Paliativos

Os conhecimentos científicos da Medicina, produzidos para atuação


das demais especialidades e que também norteiam as possibilidades de
intervenções terapêuticas e clínicas são base para a atuação em Cuidados
Paliativos. Entretanto a abordagem de uma equipe multiprofissional
em Cuidados Paliativos possui seus princípios norteadores, sendo
estabelecido pela OMS desde 1986.
O Cuidado Paliativo tem como finalidade prover o alívio da dor
de qualquer natureza e outros sintomas que causam desconforto ao
paciente; reafirmar a vida e entender a morte como processo orgânico,
sem antecipar ou adiar seu curso; unir aspectos espirituais, psicológicos
e clínicos de que necessitam o paciente com o intuito de destituir
um modelo de cuidado fragmentado; oferecer aos pacientes métodos
de assistência que os ajudem a viver tão ativos quanto possível até o
momento da sua morte; apoiar a família de forma interdisciplinar para
que esta conviva com a doença do paciente da melhor forma e em
seu próprio convívio; abordar aspectos relacionados ao luto, propor
aconselhamento e suporte sempre que necessário (CREMESP, 2008).

Princípios de controle dos sintomas na ELA

Diante da dificuldade que as equipes de saúde enfrentam para


estabelecer o prognóstico de pacientes em fases avançadas de doenças
graves, como por exemplo na ELA, se faz necessário a utilização de
ferramentas que permitam verificar a capacidade funcional do paciente,
mediante a avaliação das atividades de vida diária e suas limitações,
estando estas diretamente relacionadas com os níveis de sofrimento
96
enfrentado pelo paciente e seus familiares (CORREIA; CARLO,
2012).
Em cuidados paliativos, o manejo e controle dos sintomas
constituem-se o ponto de fundamental importância no acompanhamento
dos pacientes, sendo a dor, na maioria das vezes, o sintoma mais
prevalente de todos. Compreende-se que a dor não se refere apenas
aos aspectos biológicos do sujeito adoecido, mas também aos aspectos
psicossociais e espirituais, os quais vêm sendo caracterizados como
“DOR TOTAL”, um conceito multidimensional, introduzido por
Cicely Saunders, precursora do movimento Hospice Moderno, que
tem como objetivo suprir as diferentes necessidades do paciente em
terminalidade (HENNEMANN-KRAUS, 2012).
O alívio dos sintomas, inclusive a dor, em pacientes com ELA
relaciona-se intimamente com a capacidade funcional destes, pois à
medida que a doença progride, técnicas e soluções diferentes devem
ser propostas para atingir o objetivo esperado. No desenvolver da
doença, o paciente com ELA apresenta uma intensa fragilidade e
um declínio de sua funcionalidade, sendo que, em sua fase final, os
principais acometimentos de pior prognóstico é o comprometimento
da capacidade respiratória e de deglutição (ANCP, 2009; NUNES et
al., 2011) e que devem ser abordadas no plano de cuidado.
Além das dificuldades de deambulação, comprometimento
nutricional importante e outras complicações que colocam a vida em
risco, o surgimento da dispneia em repouso, decorrente da diminuição
da capacidade respiratória do paciente com ELA, leva a necessidade
de BIPAP. Observa-se também nesses pacientes, certa dificuldade
em aceitar a ventilação artificial mesmo diante de um quadro de
insuficiência respiratória instalado (ANCP, 2009).
Lembrando que em Cuidados Paliativos, toda intervenção tem como
objetivo a melhoria dos sintomas que visa o conforto e a qualidade de

97
vida, as constantes reavaliações para ajuste de medicamentos e de todo o
plano de cuidado, com enfoque individualizado nas intervenções, suprir
as necessidades do paciente sempre reafirmando a vida e respeitando
o processo natural de morte (CREMESP, 2008).

As necessidades do paciente em fim de vida e seus familiares

Falar de morte é falar de insegurança, medos, urgência na resolução


de questões pessoais, conflitos, perdão e aproximação da religiosidade, na
busca da resposta sobre o que vem após a morte (CERVELIN; KRUSE,
2014). Os pacientes com doença avançada apresentam diferentes níveis
de sofrimento, e o prolongamento da vida artificial pode constituir-
se num retardo doloroso do processo de morte natural. A perda da
funcionalidade lenta e progressiva, nos pacientes com ELA, pode
permitir conscientizá-los da aproximação do processo de finitude, onde
alguns têm a oportunidade de resignificar-se (CREMESP, 2008).
No Brasil, assim como em alguns países ocidentais, a morte é vista
como um tabu. Dessa forma o preconceito impera e as dificuldades
socioculturais que permeiam este tema interferem não só no tratamento
adequado ao paciente em terminalidade, como também na comunicação.
Portanto, recomenda-se que em cuidados paliativos, ao invés da mentira
piedosa, a verdade lenta e progressiva deve ser utilizada. Assim, pacientes,
familiares e equipes de saúde devem tentar manter uma relação de
cuidado que transmite conforto e confiança (ANCP, 2009).

98
Referências

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World Health Organization, 2002.

101
10 - PERFIL DE UM GRUPO DE CUIDADORES DE PESSOAS COM ES-
CLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Lilian Maria Sanguinett de Almeida
Ilka Veras Falcão
Tatiana Lins Carvalho

Os sinais e sintomas clínicos, únicos e com padrões de progressão,


não compartilhados por outras doenças, é que provocam mudanças
consideráveis sobre o indivíduo com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)
e sua família. As limitações físicas que a doença estabelece ao indivíduo
o torna incapaz de manter-se em sua vida profissional, reduzindo
ainda mais sua participação social e, gradativamente, também o fará
não poder mais ser responsável pelo seu autocuidado (SEBASTIÃO;
ALBUQUERQUE, 2011).
É a progressão rápida da doença, que vai tornando o paciente
cada vez mais dependente de um cuidador, que é a pessoa que se
responsabiliza por auxiliar na realização das tarefas que a pessoa doente
não tem mais possibilidade de fazer, devido ao seu quadro. O cuidar,
mais do que um ato, é uma atitude, pois abrange um momento de
atenção e zelo, constitui uma atividade de ocupação, responsabilização
e envolvimento afetivo com o outro (FAVA; SILVA; SILVA, 2014;
GALLICHIO et al., 2002; NARDI; OLIVEIRA, 2008).
Tendo como objetivo caracterizar o perfil sociodemográfico de um
grupo de cuidadores, através da prevalência de respostas obtidas com
questionários aplicados a eles, foi realizado um estudo descritivo com
corte transversal. Foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa
da Universidade Federal de Pernambuco, sendo aprovado com CAAE
nº 38045914.0.0000.5208.

102
O questionário utilizado na pesquisa avaliou as variáveis
sociodemográficas e de condições de vida dos cuidadores. Este identificou
idade, sexo, grau de parentesco, coabitação com o paciente, escolaridade
e a pessoa responsável pela renda.
Há carência na literatura científica de estudos sobre a temática,
relacionando cuidadores especificamente de pessoas com ELA.

Grupo “Esperança para ELA”

O grupo de apoio denominado “Esperança para ELA” é composto


por cuidadores de pessoas com ELA, maiores de 18 anos. Esse é um
serviço oferecido em um Hospital Universitário em Recife/PE, iniciado
há 2 anos.
É um grupo aberto, com média de 15 cuidadores. Os encontros,
com periodicidade mensal e duração de 1h30m, acontecem no Setor de
Reabilitação do Hospital e são conduzidos por um dos 6 profissionais
que compõem a equipe, de acordo com o tema a ser discutido (2
terapeutas ocupacionais, 1 fisioterapeuta, 1 fonoaudióloga, 1 psicóloga
e 1 neurologista). Nesses, são abordados temas pré-estabelecidos pelos
participantes e dúvidas surgidas durante os encontros.
O grupo estudado foi composto por 8 cuidadores de pessoas com
ELA, que precisavam estar presentes em, no mínimo, dois encontros do
grupo de apoio a cuidadores “Esperança para ELA”, entre novembro
e dezembro/2014, quando o perfil do grupo estava em estudo.
Devido ao serviço ser recente e os cuidadores encontrarem dificuldade
em estar presentes em todos os encontros, por não ter quem os substitua,
houve número reduzido de participantes no estudo.
A caracterização sociodemográfica dos participantes da pesquisa
está apresentada na Tabela 1. Verifica-se então que o grupo “Esperança
para ELA” compõe-se majoritariamente de mulheres, sendo apenas

103
um dos entrevistados homem. Em relação ao grau de parentesco, três
são cônjuges dos pacientes, seguido de duas filhas e duas cunhadas.
Tradicionalmente, cuidar dos indivíduos que possuem alguma
incapacidade, principalmente daqueles que fazem parte do círculo
familiar, tem sido uma responsabilidade das mulheres (BOLSONI-
SILVA; PAIVA; BARBOSA, 2009; BURKE et al., 2015; MATOS et
al., 2011; PICHON et al., 2013; WEGNER; PEDRO, 2010), porém,
apesar da literatura corroborar com os achados do estudo, também se
sabe que o número de homens que desempenham o papel de cuidador
vem crescendo, deixando de participar apenas como provedor financeiro
(BORGES, 2003; DUCA; THUMÉ; HALLAL, 2011; MARQUES
et al., 2011).
Estudos que identificam o homem e marido como cuidador
(BORGHI et al., 2013; FALLER et al., 2012), observam que quando
é a mulher que adoece, o marido e filhos homens somente assumem a
função de cuidador se não houver uma mulher, geralmente uma filha,
para assumir esse papel. Os autores denominam o homem nesse caso
como “cuidado a revelia”, indicando que não foi uma opção. Essa
condição é explicada culturalmente pelo papel central atribuído à
mulher no cuidado e ainda porque, culturalmente, o homem possui
o papel de provedor e é quem assume tarefas extra-domiciliares como
comprar remédios, transportar para o serviço de saúde, pagar contas,
convênios e outras (SILVA; SANTANA, 2014; WEGNER; PEDRO,
2010).

104
Tabela 1: Caracterização sociodemográfica dos 8 cuidadores participantes do Grupo
Esperança para ELA, Recife/PE, novembro-dezembro/2014.

VARIÁVEL n (%)

SEXO
Masculino 1 (12,5)
Feminino 7 (87,5)

IDADE
Menos de 40 anos 3 (37,5)
40 a 59 anos 4 (50,0)
60 anos e mais 1 (12,5)

TIPO DE CUIDADOR
Informal
Cônjuge 3 (37,5)
Filha/filho 2 (25,0)
Cunhada 2 (25,0)
Formal 1 (12,5)

ESCOLARIDADE
Ens. Fund. Incompleto 1 (12,5)
Ens. Médio Completo 3 (37,5)
Ens. Superior Completo 3 (37,5)
Pós-graduação 1 (12,5)

POSSUEM RENDA
Cuidador - Gerador de renda 1 (12,5)
Paciente - Gerador de renda 3 (37,5)
Cuidador com renda independente 4 (50,0)

COABITA COM O PACIENTE


Sim 5 (62,5)
Não 3 (37,5)

105
Dentre os entrevistados, apenas uma se encaixava na categoria de
cuidadora formal (CF), contratada para cuidar. Dessa forma não residia
junto ao paciente e, ao fim do seu turno de trabalho, retornava a sua
própria casa. Outros 2 cuidadores, embora familiares, também não
residiam junto ao paciente. Portanto, dos 8 entrevistados, 5 coabitam
com os pacientes. Situação essa que pode gerar níveis elevados de tensão
pela grande exposição aos efeitos do processo de cuidar vivenciado
diariamente.
Para Andrade et al. (2009) e Fava, Silva e Silva (2014), com
relação à pessoa que cuida, a literatura mostra que há distinção entre
o cuidador formal, caracterizado como o profissional de saúde que
faz uma preparação acadêmica para tal e o cuidador informal, que
é o familiar ou amigo solicitado a fornecer cuidados ao paciente.
Segundo Duca, Thumé e Hallal (2011) e Silva e Santana (2014)
cerca de 90% dos cuidadores são familiares, amigos ou vizinhos, e
somente 10% correspondem aos chamados “cuidadores formais”, pagos
ou contratados. Ainda existindo o cuidador social, que conforme a
Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) (MTE, 2002) se refere
àqueles que cuidam a partir de objetivos estabelecidos por instituições
especializadas, ou responsáveis diretos, zelando pelo bem-estar, saúde,
alimentação, higiene pessoal, educação, cultura, recreação e lazer da
pessoa assistida (CREPALDI et al., 2006).
A necessidade de solicitar um cuidador formal pode partir de
algumas tendências da família atual, como o número cada vez menor de
filhos e o fato de que geralmente a maioria dos membros trabalha fora
de casa e contribui economicamente para a renda familiar, enquanto
que o processo de cuidado familiar sempre existiu. Entretanto, esse
papel só tem sido legitimado como tal mais recentemente. Assumir o
cuidado de um membro da família, que até então era independente,
pode suscitar inúmeros sentimentos paradoxais nas famílias, que

106
envolvem tanto retribuição e gratidão, quanto angústia, dúvidas e
raiva (BATISTA et al., 2013; SILVA; SANTANA, 2014).
Um aspecto importante destacado no estudo de Borges (2003), com
cuidadores de pacientes com ELA, e para o qual os profissionais devem
estar atentos é a qualidade anterior dos laços afetivos e familiares. A
autora alerta que mesmo diante de uma doença grave e incapacitante,
como a ELA, a solidariedade do cuidado nem sempre é espontânea
e pode ser difícil resgatar compromissos e afetos para o cuidado. Ser
cuidador, portanto, tem uma representação diferenciada para cada
pessoa.
Quanto ao parentesco, foram identificados: dois cônjuges, duas
filha(o)s e duas cunhada(o)s; um resultado praticamente equivalente.
Isso reflete também em dados da literatura, na qual o tipo de parentesco
constitui uma variável que tem apresentado resultados contraditórios
(BOLSONI-SILVA; PAIVA; BARBOSA, 2009; SALVIONI et al.,
2014).
O perfil do cuidador constitui-se em uma rede autônoma e geralmente
desintegrada dos serviços de saúde, carente de orientações e suporte
dos profissionais de saúde. Sendo assim, é de suma importância a
ampliação de ações que tenham o cuidador como sujeito principal, para
que essa atividade seja reconhecida e investida em práticas adequadas,
trazendo benefícios para quem cuida e quem é cuidado (NOLASCO,
2013).

107
Conclusão

Nesta perspectiva, este estudo se torna relevante, vez que a partir


de um perfil de cuidadores será possível a identificação de demandas
desses indivíduos, para que profissionais de saúde estabeleçam ações
que possam contribuir com a prevenção de agravos provenientes do
processo do cuidar de um familiar adoecido.
Assim, evidencia também que esses cuidadores necessitam de
suporte, tanto para ajudá-los no processo do cuidar, como para que
possam se instruir quanto às formas de realização dessa prática, de
maneira a evitar sobrecargas e efeitos negativos em suas dimensões
biopsicossociais.

108
Referências

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PARTE II
ASPECTOS ADICIONAIS À ESCLEROSE
LATERAL AMIOTRÓFICA

113
11 - LESÃO POR PRESSÃO EM pessoas com ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA (ELA)
Gerluce Araújo Silva de Souza Monteiro
Na Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), os neurônios são degenerados
progressivamente fazendo com que a pessoa perca a capacidade de
realizar movimentos voluntários ao longo do tempo, com isso, ela
perde o movimento dos braços e pernas. A pressão constante exercida
no corpo pela cadeira e/ou pelo leito, forma lesões na pele e nos tecidos
subjacentes chamadas de lesões por pressão (LPP) anteriormente
chamadas de úlceras por pressão (UPP); vulgarmente e erroneamente
chamadas de escaras (que são placas enegrecidas decorrente da pressão
e/ou cisalhamento que pode ocorrer em qualquer área do corpo). São
definidas como lesões de pele ou partes moles originadas basicamente
de isquemia tecidual prolongada e causadas por fatores intrínsecos e
extrínsecos ao paciente, dependendo da profundidade da lesão, podem
levar a complicações como a osteomielite e a septicemia culminando
no óbito. Sua incidência e prevalência são altas, mobilizando paciente,
familiares e instituições de saúde. Os principais fatores para o seu
desenvolvimento são a pressão e a fricção, sendo sua prevenção mais
eficaz e economicamente viável que seu tratamento.
As LPP têm impacto negativo na vida diária dos pacientes acamados
e/ou com restrição de movimentos, podendo causar danos incalculáveis
em termos de dor e sofrimento, além do alto custo para a instituição
com internações e tratamentos.
A prevenção da LPP consiste em manter a pele seca, limpa e
hidratada; mudar a posição do paciente na cadeira e/ou no leito com
frequência e observar o surgimento de ferimentos e outras lesões
na pele. Apesar dos avanços científicos, tecnológicos e os recursos
114
utilizados para prevenção e tratamento das LPP, essa complicação
ainda representa uma importante causa de morbidade e mortalidade
de pacientes tratados nos hospitais e na assistência domiciliar.
Segundo as organizações internacionais European Pressure Ulcer
Advisory Panel and National Pressure Ulcer Advisory Panel (2014),
as LPP são definidas como uma lesão localizada na pele ou tecidos
adjacentes, normalmente sobre uma proeminência óssea, secundária
a um aumento da pressão externa ou pressão em combinação com
cisalhamento. Gradualmente, instala-se um processo isquêmico que
resulta em uma lesão na pele.
Irion (2005), relata que a compressão prejudica o fornecimento
de sangue ao tecido, levando à insuficiência vascular, anóxia do tecido
e morte das células. Qualquer posição mantida por um paciente
durante um longo período de tempo pode provocar lesão tecidual,
principalmente nas áreas que sobrepõe uma proeminência óssea, devido
à presença de pouco tecido subcutâneo nessas regiões. A compressão
nessas áreas diminui o fluxo sanguíneo local facilitando o surgimento
de lesão por isquemia tecidual e necrose.
Declair (2002), afirma que nos Estados Unidos em média 2,1
milhões de pessoas apresentam LPP no ano, equivalendo a um custo
hospitalar mensal de 4 a 7 mil dólares por paciente; ainda segundo a
autora, no Brasil não existem estatísticas do número de pacientes que
desenvolvem LPP, pois os casos não são registrados ou notificados a
um órgão responsável.
Santos (2007), reafirma que a real dimensão do problema dos
pacientes com LPP no Brasil ainda é desconhecida, visto que o registro
do agravo e a obtenção da taxa de ocorrência (prevalência e incidência)
ainda são pouco frequentes ou são subnotificados.
Segundo Costa (2003), as LPP têm prevalência e incidência elevada
nos tratamentos agudos e de longo prazo nos pacientes hospitalizados

115
e/ou acamados, pois as LPP podem se desenvolver em 24 horas ou
espaçar até 5 dias para sua manifestação.
Smeltzer e Bare (2005) informam que os pacientes de maior risco
para desenvolverem LPP são aqueles com dificuldades sensoriais ou
motoras, imobilidade, atrofia muscular (como ocorre nos pacientes
com ELA) e nos que apresentam redução do acolchoamento entre a
pele sobreposta e o osso subjacente.
Segundo Delisa e Gans (2002), o desenvolvimento das LPP são
multifatoriais, incluindo elementos internos e externos. Os fatores
internos são: idade, morbidade, estado nutricional, hidratação, condições
de mobilidade e nível de consciência. Os fatores externos são: pressão,
cisalhamento, fricção e umidade aos quais os pacientes estão submetidos
quando acamados ou em cadeiras. Outros fatores como traumatismos,
infecção, incontinência urinária e fecal, também contribuem para
aumentar, tanto a incidência, quanto o agravamento das LPP nesses
pacientes. Apesar da LPP ser um fenômeno multifatorial, as principais
variáveis envolvidas no seu desenvolvimento são o tempo e a intensidade
da pressão ou seja, pequena pressão por longos períodos ou grande
pressão por pouco tempo.
As autoras Delisa e Gans (2002) ainda informam que a pressão
capilar normal é de 32 mmHg, quando há uma pressão sobre as
proeminências ósseas em indivíduos acamados e/ou sentados, que
excede esse limite, o paciente desenvolve uma isquemia no local,
iniciando por uma hiperemia reativa, à medida que o corpo tenta
suprir o tecido carente de oxigênio. Os tecidos podem tolerar pressões
cíclicas muito mais altas que pressões constantes. Se a pressão for
aliviada intermitentemente a cada 3 a 5 minutos, pressões mais altas
podem ser toleradas.

116
Smeltzer e Bare (2005) afirmam que uma das metas mais importantes
para se obter uma boa recuperação do paciente é aliviar a pressão através
do reposicionamento frequente.

Fatores para o desenvolvimento das LPP

Segundo Smeltzer e Bare (2005) o cisalhamento é uma pressão


exercida quando o paciente é movido ou reposicionado na cama e/ou
cadeira repetidas vezes e, nesse movimento, a pele permanece aderida
ao lençol enquanto que o restante do corpo é empurrado para cima.
Devido a essa tração há a torção dos vasos sanguíneos e a interrupção
da microcirculação da pele do tecido subcutâneo.
Segundo Carvalho Filho e Papaléo Netto (2006), a fricção acontece
quando a pele se move contra uma superfície de apoio, ou seja, é a
força de duas superfícies movendo-se uma sobre a outra. A fricção pode
causar danos ao tecido quando o paciente é arrastado na cama, em
vez de ser levantado; isso faz com que a camada superficial de células
epiteliais seja retirada.
Jorge e Dantas (2003), relatam que a mobilidade está relacionada
ao nível de consciência e competência neurológica. É a capacidade do
paciente de aliviar a pressão através do movimento e contribuir para
seu bem estar físico e psíquico.
Delisa e Gans (2002), informam que a má nutrição é considerada
um dos fatores secundários para o desenvolvimento da LPP, porque
contribui para diminuir a tolerância do tecido à pressão.
Ainda segundo as autoras, os pacientes com ELA podem ter perda de
apetite frequente devido à doença e não conseguir comer por dificuldade
na deglutição (disfagia). Dessa forma, o paciente pode perder muito
peso e chegar à desnutrição. O suporte nutricional pode retardar a
perda de peso e a atrofia muscular.

117
Delisa e Gans (2002), inferem que com a Idade, ocorre mudança
na síntese de colágeno que resulta em tecido com diminuição na
força mecânica e aumento na rigidez. Essa mudança acarreta ainda
a redução da capacidade do tecido de distribuir a pressão mantida
sobre ele, levando a um comprometimento do fluxo sanguíneo e,
consequentemente, ao aumento do risco de LPP.
Morton et al. (2007) diz que a umidade (urina e fezes) quando
não é controlada causa maceração (amolecimento) da pele, tornando-
se fácil a compressão, a fricção e o cisalhamento.
Brasil (2002) e Costa (2003), evidencia que o Fumo (nicotina)
reduz a hemoglobina funcional e causa disfunção pulmonar, privando
os tecidos de oxigenação, ou seja, produz efeitos no fluxo sanguíneo
provocando vasoconstrição, favorecendo a diminuição do aporte de
oxigênio e nutrientes para as células, aumentando a adesão de plaquetas.
Segundo Smeltzer e Bare (2005), na elevação da temperatura
corporal (hipertermia), a cada 1ºC, temos um aumento de 10%
no metabolismo tecidual favorecendo à desvitalização do tecido,
provocando sudorese levando à maceração da pele.
Declair (2002), afirma que deve haver atenção dos profissionais
quanto ao uso de roupas inadequadas no paciente e o atrito em superfície
de suporte (colchões).
Segundo Delisa e Gans (2002), a alteração no nível de consciência
acarreta perda da habilidade do paciente em detectar sensações álgicas.
O portador de ELA não apresenta dificuldades cognitivas.
Segundo Santos (2007), os locais de maior risco para LPP são as
regiões: occipital, escapular, cotovelo, sacral, ísquiática, trocantérica,
crista ilíaca, joelho, maléolo e calcâneo.

118
Classificação das LPP

O National Pressure Ulcer Advisory Panel (NPUAP) é uma


organização norte-americana, sem fins lucrativos, dedicada à prevenção
e ao tratamento de LPP.
No dia 13 de abril de 2016, o NPUAP anunciou a mudança
na terminologia de Úlcera por Pressão para Lesão por Pressão e a
atualização da nomenclatura dos estágios do sistema de classificação
conforme consta a seguir:
LPP é um dano localizado na pele e/ou tecidos moles subjacentes,
geralmente sobre uma proeminência óssea ou relacionada ao uso de
dispositivo médico ou a outro artefato. A lesão pode se apresentar em
pele íntegra ou como úlcera aberta e pode ser dolorosa. A lesão ocorre
como resultado da pressão intensa e/ou prolongada em combinação
com o cisalhamento.

LPP Estágio 1: Pele íntegra com eritema que não embranquece

LPP Estágio 2: Perda da pele em sua espessura parcial com exposição


da derme. Pode também apresentar-se como uma bolha intacta
(preenchida com exsudato seroso) ou rompida. Os tecidos adiposos
e profundos não são visíveis.

LPP Estágio 3: Perda da pele em sua espessura total na qual a gordura


é visível e, frequentemente, tecido de granulação e epíbole (lesão com
bordas enroladas) estão presentes. Necrose de liquefação ou coagulação
pode estar visível. Pode ocorrer descolamento e túneis. Não há exposição
da fáscia, músculo, tendão, ligamento, cartilagem e/ou osso.

119
LPP Estágio 4: Perda da pele em sua espessura total e perda tissular
com exposição ou palpação direta da fáscia, músculo, tendão, ligamento,
cartilagem ou osso. Necrose de liquefação ou coagulação pode estar
visível. Epíbole, descolamento e/ou túneis ocorrem frequentemente.
Quando a necrose de liquefação ou coagulação prejudicar a identificação
da extensão da perda tissular, deve-se classificá-la como LPP não
classificável.

LPP Não Classificável: Perda da pele em sua espessura total e perda


tissular não visível porque está encoberta pela necrose de liquefação
ou coagulação.

LPP Tissular Profunda: Pele intacta ou não, com área localizada e


persistente, de coloração vermelha escura, marrom ou púrpura que
não embranquece. A separação epidérmica mostra lesão com leito
escurecido ou bolha com exsudato sanguinolento.

Definições adicionais:

LPP Relacionada a Dispositivo Médico - resulta do uso de dispositivos


criados e aplicados para fins diagnósticos e terapêuticos. Apresenta
o padrão ou forma do dispositivo. Essa lesão deve ser categorizada
usando o sistema de classificação de lesões por pressão.

LPP em Membrana Mucosa encontrada quando há histórico de


uso de dispositivos médicos no local do dano. Devido à anatomia do
tecido, essas lesões não podem ser categorizadas.
SANTOS (2007), informa que os pacientes com fatores de risco para
LPP (como os portadores de ELA), devem ser avaliados sistematicamente

120
quanto à integridade da pele, desde a admissão com o uso da Escala de
Braden até os cuidados estabelecidos através de um plano assistencial
pautado nas necessidades individuais.

Conclusão

Apesar da LPP ter relativa facilidade para se instalar e demora para


cicatrizar, ela pode ser prevenida portanto, o conhecimento por parte
dos profissionais, o entendimento da família das causas que levam
ao surgimento da LPP e a identificação dos fatores de risco são de
extrema importância objetivando implantar medidas de prevenção
eficazes para evitar a ocorrência das LPP, amenizar o agravamento,
assim como favorecer a cicatrização das já existentes.
Na prevenção e tratamento das LPP aos portadores de ELA, é
imprescindível realizar um plano de cuidado diário visando assistência
integral ao paciente, adotando técnicas para aliviar pressão nas áreas
de risco ou afetadas; hidratar a pele com creme barreira; desbridar
tecido necrótico; limpar a ferida (usar agentes tópicos e coberturas
apropriadas); prevenir infecções e fazer a manutenção da umidade do
leito da lesão.

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cirúrgico. 10ª ed. v.1. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.

123
12 - ABORDAGEM ODONTOLÓGICA ÀS PESSOAS COM ESCLEROSE
LATERAL AMIOTRÓFICA
Julianelly Alves Biserra
José Anchieta de Brito
Mônica Moreira Dias da Cruz

A atenção em saúde às pessoas com Esclerose Lateral Amiotrófica


(ELA) concentra-se nos cuidados paliativos e é determinada pelo alívio
de sintomas e manutenção do conforto, apresentando como um dos
componentes essenciais a abordagem e o tratamento das condições
bucais do indivíduo. Os cuidados paliativos em Odontologia abrangem
o manejo de pacientes com doença avançada ou progressiva, em virtude
do comprometimento da cavidade oral pela doença ou seu tratamento,
direta ou indiretamente, tendo como foco do atendimento a promoção
da qualidade de vida (ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS
PALIATIVOS, 2012).
Pacientes em cuidados paliativos apresentam inúmeras restrições
e comprometimento das funções orais, que aliadas ao estado geral
interferem no percurso do tratamento e dificultam a promoção do
conforto (ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS,
2012). O conhecimento das condições de saúde em pessoas com ELA,
de uma maneira integral e, em especial, da saúde bucal, deve ser parte
integrante das diferentes áreas de abordagem odontológica, dado que
os agravos que acometem a cavidade bucal interferem negativamente
na manutenção do bem estar (AUSTIN et al., 2011; TAY; HOWE;
BORROMEO, 2014).
Na prática do cuidado, as abordagens multiprofissionais constituem-
se como um componente fundamental na composição de propostas

124
terapêuticas integrais e efetivas, através da junção das diversas áreas de
atuação em saúde e suas formas de percepção individual (ACADEMIA
NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012; BLACKHALL,
2012). O cirurgião dentista, como parte integrante dessa prática, garante
a concretização de um cuidado em saúde bucal singular, fornecendo
intervenções próprias de sua área de atuação profissional, além de
cuidados de suporte que assegurem uma cavidade oral saudável, livre
de infecção e dor, contribuindo para o restabelecimento da saúde oral
e controle clínico de agravos (ASHER; ALFRED, 1993; SALVIONI
et al., 2009).

Manifestações orais

As pessoas com ELA apresentam uma perda gradual de força e


coordenação muscular, podendo incluir sintomas de origem bulbar
que posteriormente pioram e impossibilitam a realização de tarefas
rotineiras, representando um déficit nas suas capacidades funcionais,
com interferência no autocuidado (AUSTIN et al., 2011; SALVIONI
et al., 2009). Como consequência, destaca-se o aparecimento de
alterações na cavidade oral causadoras de modificações no padrão de
controle e de manutenção da saúde em geral.
As manifestações bucais podem surgir devido aos efeitos das
medicações administradas, à sialorréia, ao muco espesso e/ou à xerostomia.
Ainda, pessoas com o comprometimento bulbar normalmente
apresentam disartria, deteriorização da função respiratória, dificuldade
na mastigação e fraqueza nos músculos da deglutição, o que leva à
disfagia (PONTES et al., 2010; SALVIONI et al., 2009).
Conceitua-se disfagia como uma desordem no processo de deglutição
e/ou alimentação que normalmente se intensifica com a progressão da
doença (PONTES et al., 2010), podendo impossibilitar a ingestão de
125
alimentos pela cavidade oral. Caracteriza-se como uma das alterações
mais presentes e relevantes e é elucidada como um dos principais fatores
de risco na ocorrência de pneumonia por aspiração que, juntamente
com a má higiene bucal, favorece a colonização da orofaringe por micro-
organismos patogênicos, além de favorecer o acúmulo de saliva na
cavidade oral devido ao difícil controle da estase salivar (ACADEMIA
NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012; PONTES et
al., 2010).
A sialorréia é definida como o excesso de produção salivar,
manifestando-se nesses pacientes devido a um controle neuromuscular
deficiente dos músculos do palato, da face e da língua (MANRIQUE,
2005). Essa alteração acomete aproximadamente 50% das pessoas com
ELA, das quais 20% possuem a necessidade contínua de eliminação
da saliva. O acúmulo de saliva tipicamente produz o escorrimento
salivar e o engasgo, corroborando para o estigma social da doença,
conduzindo a constrangimentos e à dificuldade de integração social,
além de proporcionar limitações na realização de atividades motoras
orais, como na alimentação e na fala (MANRIQUE, 2005; NEVILLE
et al., 2009).
Atualmente existem variados tipos de tratamento para a manutenção
do controle salivar na cavidade oral, destacando drogas de efeitos
anticolinérgicos, radioterapia nas glândulas salivares, tratamento
cirúrgico dos ductos ou das próprias glândulas produtoras de saliva e
a aplicação de toxina botulínica tipo A (MANRIQUE, 2005).

Impactos sobre a saúde oral

As alterações decorrentes dos impactos produzidos pela doença


podem influenciar de maneira negativa a saúde oral, conduzindo à
instalação de problemas secundários, como desconforto, dor, dificuldade

126
na ingestão de alimentos, alteração da autoimagem, dificuldade na
transmissão de sentimentos e emoções via expressões faciais, além da
predisposição a desordens bucais (ACADEMIA NACIONAL DE
CUIDADOS PALIATIVOS, 2012).
O déficit de saúde bucal desses pacientes, geralmente, está
relacionado com a presença excessiva de placa bacteriana, interligado
ao surgimento da cárie e de problemas periodontais que podem
levar à perda dos elementos dentários (ACADEMIA NACIONAL
DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012). Os principais problemas
odontológicos encontrados correlacionam-se com a deficiência no
controle do biofilme bucal consequente das incapacidades motoras
adquiridas no decorrer da doença. Destacam-se ainda, a má adaptação
e higienização de próteses, as lesões traumáticas e o efeito de hábitos
bucais deletérios (ASHER; ALFRED, 1993; AUSTIN et al., 2011).
A redução da placa bacteriana e, consequentemente, o risco de
infecções provenientes da microbiota bucal, assim como a adoção de
medidas de higiene minimizam as complicações orais e trazem benefícios
ao estado geral do paciente, incluindo o conforto (ACADEMIA
NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012), além de
juntamente com a intervenção odontológica favorecer a prevenção e/ou
melhora da condição sistêmica, diminuindo a incidência de infecções
e outros acometimentos (RABELO; QUEIROZ; SANTOS, 2010),
minimizando a dor total desses pacientes.
A adequação do meio bucal no intuito de causar melhoria na
fisiologia do sistema estomatognático e, principalmente, a orientação aos
próprios pacientes, aos familiares e aos cuidadores, quanto à preservação
da higiene bucal, por meio de técnicas de higienização adequada são
atribuições do cirurgião dentista. O planejamento do tratamento e
a manutenção das condições clínicas devem antecipar-se aos futuros
problemas de saúde bucal (MIRANDA et al., 2010).

127
Para isso avalia-se a capacidade que o paciente tem na promoção do
autocuidado, a fim de se desenvolverem alternativas para melhorar
a escovação dos dentes, incluindo indicações específicas de escova
dental (escovas elétricas ou com adaptações), de cremes dentais, de
colutórios bucais e, se possuírem prótese, orientar quanto aos cuidados
e à higienização, no intuito de prevenir infecções bucais e sistêmicas
(AUSTIN et al., 2011).
Os cuidadores devem estar capacitados à responsabilidade diária de
higienização bucal e a assumirem um papel de investigador das principais
informações sintomáticas da forma mais objetiva possível, no intuito
de serem facilitadores e participantes do cuidado juntamente com os
profissionais responsáveis, estabelecendo uma relação de confiança e
vínculo (ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS,
2012; SALVIONI et al., 2009).

Abordagem odontológica

O principal modo de se prevenir os problemas bucais é a


promoção da saúde (ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS
PALIATIVOS, 2012). Logo, faz-se necessária a confirmação constante
de métodos preventivos de orientação e de ações clínicas, já que a
maior dificuldade do profissional nesse tipo de atenção é controlar
ou solucionar a sintomatologia dolorosa presente na maioria dos
casos e que é consequência, primordialmente, da falta de ações
odontológicas efetivas de prevenção (ACADEMIA NACIONAL
DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012; ASHER; ALFRED, 1993;
AUSTIN et al., 2011; TAY; HOWE; BORROMEO, 2014).
Um bom planejamento odontológico é caracterizado pelo
conhecimento acerca das principais necessidades de um indivíduo,
incluindo a coleta de informações quanto à história médica, às drogas
128
utilizadas, às atividades diárias e suas limitações (SALVIONI et al.,
2009), assim como pela construção de vínculos com demais profissionais
da saúde e familiares, tendo como intuito a eliminação de qualquer
fator possível determinante de dor, partindo das premissas que regem o
contexto multidisciplinar (ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS
PALIATIVOS, 2012; SALVIONI et al., 2009).

Modificações durante o tratamento

A ocorrência de disfagia em indivíduos com Esclerose Lateral


Amiotrófica implica na necessidade de alterações durante a execução
do tratamento odontológico. Modificações no posicionamento da
cadeira odontológica facilitam o controle do volume salivar em excesso
na cavidade oral, seja pela aspiração, com ajuda de um auxiliar, ou pela
posição semi supino, que evita engasgos e minimiza o desconforto.
Ademais, a preservação do controle salivar torna a cavidade oral
oportuna para a realização de procedimentos sem interferências do
meio, propiciando resultados clínicos satisfatórios, além de intervenções
mais cômodas (ASHER; ALFRED, 1993; AUSTIN et al., 2011).
A experiência de fraqueza muscular, espasticidade e hiper-reflexia
pode dificultar também a manutenção da abertura de boca por um
tempo suficiente para a execução de certas práticas odontológicas, sendo
aconselhada a realização de consultas curtas com intervalos, além do
recurso auxiliar de artefatos, como por exemplo, abridores de boca e
expansores bucais com o intuito de facilitar uma melhor visualização
do campo de trabalho, além de serem facilitadores para os familiares e
os cuidadores durante a realização de uma correta higiene da cavidade
oral (TAY; HOWE; BORROMEO, 2014).

Conclusão

129
Infelizmente as ações preventivas voltadas para promoção de saúde
e adequação do meio bucal em pacientes com ELA são escassas e
insuficientes, porém o cirurgião-dentista, como parte integrante de
uma linha de cuidado e atenção à saúde, tem como dever a busca
do conhecimento sobre os estágios e características da doença, além
de direcionar a atenção em saúde bucal de forma individualizada e
singular; uma vez que os agravos que acometem a cavidade bucal
podem proporcionar um declínio na qualidade de vida do paciente,
privando-o da ação do conforto e manutenção do bem estar.

130
Referências

ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS. Manual


de Cuidados Paliativos ANCP. 2. ed. Rio de Janeiro: Diagraphic,
2012. 320 p.

ASHER, RS; ALFRED, T. Dental management of long-term


amyotrophic lateral sclerosis: Case Report. Special Care In Dentistry,
[S.I.], v. 6, n. 13, p.241-4, 1993.

AUSTIN, Sarah et al. Dental treatment for a patient with motor


neurone disease completed under total intravenous anaesthesia: a
case report. Journal Of Disability And Oral Health, [S.I.], v. 3,
n. 12, p.124-7, 2011.

BLACKHALL, Leslie J. Amyotrophic lateral sclerosis and palliative


care: Where we are, and the road ahead.  Muscle & Nerve,
Charlottesville, v. 45, n. 3, p.311-318, 13 fev. 2012.

MANRIQUE, Dayse. Aplicação de toxina botulínica tipo A para


reduzir a saliva em pacientes com esclerose lateral amiotrófica. Revista
Brasileira de Otorrinolaringologia, [S.I.], v. 71, n. 5, p.566-569,
out. 2005.

MIRANDA, AF et al. Doença de Alzheimer: características e


orientações em odontologia. Rgo, Rev. Gaúch. Odontol, [s.i.], v.
1, n. 58, p.103-107, 2010.

NEVILLE, Bw et al. Patologia Oral e Maxilofacial. 2. ed. Rio de


Janeiro: Elsevier, 2009. 973 p.

131
PONTES, RT et al. Alterações da fonação e deglutição na Esclerose
Lateral Amiotrófica: Revisão de Literatura. Rev Neurocienc, [s.i.],
v. 1, n. 18, p.69-73, 2010.

RABELO, GD; QUEIROZ, CI; SANTOS, PSS. Atendimento


odontológico ao paciente em unidade de terapia intensiva. Arq
Med Hosp Cienc Med, São Paulo, v. 2, n. 55, p.67-70, 2010.

SALVIONI, Cristina Cleide dos Santos et al. Importância do


atendimento multidisciplinar a pacientes com doença no neurônio
motor/ esclerose lateral amiotrófica. Conscientiae Saúde, São
Paulo, v. 2, n. 8, p.211-217, 2009.

TAY, CM; HOWE, J; BORROMEO, GL. Oral health and dental


treatment needs of people with motor neurone disease. Australian
Dental Journal, [S.I.], v. 59, n. 3, p.309-313, 22 jul. 2014.

132
13 - DIREITO À SAÚDE – JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS –
DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS PARA TRATAMENTO DA ELA:
Rebeca de Vasconcelos Barbosa
A abrangência protetiva dada pela Constituição Federal para o
direito à saúde mantém a ideologia de máxima efetividade de direitos
fundamentais, isto porque traz como nortes a descentralização e o
atendimento sob forma universal, gratuita e integral.
A descentralização decorre da repartição de competências, assim é
que quaisquer dos entes políticos (União, Estados e Municípios) têm
o dever de efetivar o direito à saúde, regulamentando o tema, criando
políticas públicas e concretizando-as.
Além disso, o atendimento universal informa que deve ser prestado
a todos aqueles que estejam em território brasileiro, incluindo até os
estrangeiros que apenas estejam por breve estadia ou de passagem. A
gratuidade indica que os serviços de saúde são não-contra-prestacionais,
assim não é necessário cumprir qualquer encargo ou ter prévia adesão,
todos, indistintamente integram e são protegidos pelo sistema. Por
fim, a integralidade indica que a saúde deve ser plenamente coberta,
abrangendo todos os vieses que compõe seu sistema, seja por meio
de atendimentos médicos prestados em urgência ou de forma clínica,
seja por meio dos atendimentos laboratoriais, o fornecimento de
órteses, próteses; serviços de “home care” e, inclusive, o fornecimento
de medicamentos.
A regulamentação da matéria é efetivada pela Lei n 8080/90, de 19
de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento
dos serviços correspondentes e dá outras providências.

133
A Lei 8080/90 contempla o direito em comento dentro do rol
daqueles definidos como fundamentais, cuja execução depende da
formulação de políticas públicas. Ademais, trouxe a positivação
do conceito amplo de saúde para abranger as áreas relacionadas à
alimentação, à moradia, ao saneamento básico, ao meio ambiente,
ao trabalho, à renda, à educação, à atividade física, ao transporte, ao
lazer e ao acesso aos bens e serviços essenciais; além disso, abrange as
condições de bem-estar físico, mental e social do ser humano.
A atuação estatal no setor em epígrafe é feita por órgãos e entes
da Administração Pública federal, estadual, distrital e municipal, por
meio do Sistema Único de Saúde (SUS), podendo a iniciativa privada
atuar de forma complementar.
No capítulo VIII – Da assistência terapêutica e da incorporação
de tecnologia em saúde - a Lei nº 8080/90 estabelece que a assistência
terapêutica deve ser integral consistindo, dentre outros, na dispensação
de medicamentos. Com vistas a padronizar a forma em que se efetuará
essa dispensação, as prescrições médicas devem ser efetuadas por meio
de protocolo clínico e, na falta destes, far-se-á com base nas relações
de medicamentos instituídas pelo gestor federal do SUS.
A Portaria nº. 3916/98, do Ministério da Saúde, estabelece a
Política Nacional de Medicamentos, indicando a dispensação de
2 (duas) espécies de medicamentos: essenciais básicos e de caráter
excepcional. Aqueles são responsáveis por satisfazer as necessidades
de saúde prioritárias da população, das quais devem ser acessíveis em
todos os momentos. Correspondem aos medicamentos mais simples e
de menor custo, estando organizados em uma lista nacional, exemplos:
medicamentos para hipertensão e diabetes. Já as medicações de caráter
excepcional, destinam-se ao tratamento de patologias especificas, que
atingem número limitado de pacientes e que apresentam alto custo, seja

134
em razão do valor unitário, seja em virtude da utilização por período
prolongado, é o caso da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA).
Destaque-se que a Portaria SAS/MS nº 1151, de 11 de novembro
de 2015 traz de forma expressa o fármaco Riluzol como medicação
indicada para o tratamento da ELA. Além disso, entre todas as condutas
terapêuticas não farmacológicas, o suporte ventilatório não invasivo,
nas suas modalidades, é a que mais aumenta a sobrevida e a qualidade
de vida do paciente com ELA, sendo, portanto, indicado o BIPAP
(Bilevel Positive Airway Pressure) para tal finalidade.
Veja-se, portanto, que o Riluzol e o BIPAP são expressamente
indicados para o tratamento da patologia em comento, assim é que
nos casos em que os mesmos não são dispensados ao paciente pela via
administrativa, a via judicial revela-se medida justa que não invade a
esfera de competência dos Poderes Legislativo e Executivo, visto que
a decisão do administrador público já foi devidamente tomada e o
socorro ao Poder Judiciário deve-se unicamente à omissão injusta.
Destaca-se que a saúde é decisão política fundamental que deve
ser executada essencialmente pelos Poderes Executivo e Legislativo e
a dispensação de medicamentos é uma das formas de tornar efetivo o
mencionado direito. Também nos moldes já indicados, a dispensação
de medicamentos e a atualização da lista SUS são feitas nos termos
descritos em lei (Lei nº. 8080/90 c/com Portaria nº. 3916/98, do
Ministério da Saúde).
A matéria – medicamentos – está contemplada na Constituição
Federal e em leis, com contornos detidamente definidos, mesmo
assim é possível identificar inúmeras decisões judiciais relacionadas
ao tema em debate, visando garantir imediatamente a dispensação
de medicamentos e mediatamente (e de sobrelevada importância) o
direito à saúde.

135
A judicialização da dispensação de medicamento ocorre
essencialmente por duas razões: o medicamento não está na lista SUS
ou, mesmo estando na mencionada lista, não está disponível ao usuário.
Além disso, é possível a judicialização com vistas à atualização das
medicações contempladas na dita lista. Utilizam-se ações individuais
e ações coletivas para judicializar o tema em análise.
Veja-se que no caso das medicações para tratamento da ELA, a
regulamentação é clara e a falta de dispensação do Riluzol e do BiPAP,
releva-se como patente omissão estatal, pois a medicação indicada e
contemplada para a patologia antes indicada não está disponível para
o usuário.
Destaca-se, a título de esclarecimento, que o BIPAP não é uma
medicação no sentido técnico da Medicina, mas para fins de solicitação
pela via judicial é incluído como “medicamento” tendo em vista
contribuir para o tratamento do peticionante.
Nas contendas judiciais que envolvem dispensação de medicamentos,
visualizam-se basicamente 2 (dois) tópicos que indicam supostamente
conflitos de interesses; o primeiro corresponde ao cotejo entre as políticas
públicas e a separação de poderes e o segundo indica um choque entre
os princípios da reserva do possível e o mínimo existencial. Vejamos.
O princípio da Separação de Poderes idealizado por Aristóteles
e sistematizado por Montesquieu indica que o Estado apresenta
essencialmente os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, com
funções específicas.
As políticas públicas são definidas essencialmente pelos Poderes
Executivo e Legislativo, mas não são incomuns decisões judiciais,
principalmente proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, que define e
impõe a dispensação judicial de medicamentos. Essas decisões ocorrem,
sobretudo, porque os poderes responsáveis pela efetivação constitucional
quedaram-se inerte e, numa omissão que afronta direitos fundamentais,

136
aquele(s) que necessita(m) da dispensação de medicamentos para
garantir a saúde, provocam o Judiciário por meio da ação e, por isso,
este poder tem o dever de decidir, sempre com foco, em primeira
análise, no texto constitucional, com ênfase nos direitos fundamentais
e na dignidade da pessoa humana.
Assim, as atuações do Poder Judiciário, que diante das omissões
dos demais poderes dispensam medicamentos, se coadunam com a
Constituição Federal, sem que se possa alegar ofensa ao Princípio
basilar da Separação de Poderes.
A Fazenda Pública, nas ações que envolvem definição pela via judicial
de políticas públicas, utiliza-se largamente do princípio da reserva do
possível para negar as prestações requeridas; tal entendimento foi
importado do direito alemão, cunhado pelo Tribunal Constitucional.
Indica que o indivíduo somente poderá solicitar do Estado prestações
razoáveis, visto que os recursos carreados pelos cofres públicos são
limitados e, por isso, não devem ser utilizados para cobrir situações
particulares solicitadas pelos cidadãos, mas sim orientar-se à satisfação
da população como um todo.
O mínimo existencial, por sua vez, corresponde à essência vital
de proteção constitucional, que no contexto da CF/88 corresponde
aos direitos fundamentais, inseridos no contexto de contemplação
da dignidade da pessoa humana. Seu conceito não é legal, mas a
jurisprudência do STF casualmente indica-o como aqueles inerentes
a todo ser humano.
Além disso, é importante pontuar que mínimo existencial para
uma sociedade como a alemã não se compara ao que é indicado para
a insipiente sociedade brasileira, por isso, feitas as ponderações, com
razoabilidade e proporcionalidade, vê-se que saúde é, e, de outra forma,
não pode ser interpretada como mínimo existencial.

137
Considerando que princípios são mandados de otimização (ALEXY,
2008) e que na aplicação da Constituição Federal deve-se buscar a
máxima efetividade, pondera-se reserva do possível e mínimo existencial,
aquela se rendendo a este quando a matéria entabulada é a dispensação
judicial de medicamentos, visto que a proteção aos cofres públicos se
rende à efetivação da saúde, como forma de garantir a vida e de forma
digna.
Assim é que nos casos em que são negadas a dispensação do Riluzol
e do BiPAP para os pacientes acometidos pela ELA não há que se
falar em ofensa à Separação dos Poderes – pois o próprio detentor do
poder de definir as políticas públicas escolheu tais medicações para
o aludido tratamento, essa escolha se depreende do texto da Portaria
SAS/MS nº 1151, de 11 de novembro de 2015.
Além disso, não há que se falar em reserva do possível, pois o
mínimo existencial no presente caso é notório, como forma de proteger
o direito fundamental à saúde e garantir um tratamento digno, em
atenção ao princípio vetor do ordenamento jurídico nacional, qual
seja: dignidade da pessoa humana.
Ante todo o exposto, revela-se justo, cristalino e juridicamente correto
a dispensação do Riluzol e do BiPAP para os pacientes acometidos pela
ELA pela via judicial nos casos em que o Estado se nega a concedê-los
pela via administrativa.

138
Para consultar...

- Artigos
BARROSO, Lr. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade
democrática. [syn]thesis, Rio de Janeiro, v. 5, n. 1, p.1-29, 2012

BARROSO, Lr. Da falta de efetividade à judicialização excessiva:


direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros
para a atuação judicial. Revista de Direito da Procuradoria Geral
do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, p.1-37, _____

- Constituição
BRASIL. Constituição (1988). Constituição, de 5 de outubro de
1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília

- Lei
BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe Sobre As
Condições Para A Promoção, Proteção e Recuperação da Saúde, A
Organização e O Funcionamento dos Serviços Correspondentes
e Dá Outras Providências. Brasília

- Livros
ALEXY, R. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros,
2008. Tradução de: Virgílio Afonso da Silva.

ANDRADE, JCV. Os direitos fundamentais na constituição


portuguesa de 1976. 3. ed. Coimbra: Almedina, 2004.

BATISTELLA, C. Abordagens contemporâneas do conceito de


saúde. In: FONSECA, Af; CORBO, Ad (Org.). O território e o

139
processo saúde-doença. Rio de Janeiro: Epsjv, Fiocruz, 2007. p.
51-86

LENZA, P. Direito Constitucional Esquematizado. 15. ed. São


Paulo: Saraiva, 2013.

MARMELSTEIN, G. Curso de Direitos Fundamentais. 5. ed.


São Paulo: Atal, 2014.

MENDES, GF; COELHO, IM; BRANCO, PGG. Curso de


Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

SILVA, Va. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições


e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009.

- Portaria
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria SAS/MS nº 1151, de
2015. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas: Esclerose
Lateral Amiotrófica. [S.l], 11 nov. 2015.

- Sítios eletrônicos
www.stf.jus.br
www.stj.jus.br
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.
CDNIMO+EXISTENCIAL%29&base=baseAcordaos&url=http://
tinyurl.com/mtvd6va. Visitado em 02 de maio de 2015.

140
14 - O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL JUNTO AOS PACIENTES E FAMILIARES
NO TRATAMENTO DE DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS NO SUS
Karla Maria Bandeira

Atuar junto aos pacientes com doenças neurodegenerativas apresenta


ao/à assistente social muitos desafios visto que requer uma análise
muito mais ampla da realidade social desses sujeitos. Muitos deles são
desprovidos em termos socioeconômicos, que não se percebem como
pessoas titulares de direitos, já que a própria patologia os deprime e
desmotiva pelo tratamento imposto.
No desempenho de seu trabalho, o/a Assistente Social perceberá
que uma de suas principais intervenções será junto aos familiares destes
pacientes. Neste sentido o/a profissional precisa compreender que
atualmente a família tem sido responsabilizada e sobrecarregada com os
cuidados dos seus pacientes, assumindo, muitas vezes, atribuições que não
seriam suas, mas do poder público através dos/as profissionais de saúde.
Em outras situações, a família não se encontra apenas sobrecarregada,
como também abandonada à própria sorte, sem nenhum suporte do
poder público.
Os pacientes e familiares de forma recorrente procuram os/as
assistentes sociais para buscarem encaminhamentos e esclarecimentos
sobre direitos sociais, especificamente no caso do usuário com diagnóstico
de Esclerose Lateral Amiotrófica sem vínculo empregatício. Um
encaminhamento recorrente é para solicitação do BPC (Benefício
de Prestação Continuada), especialmente quando a doença já está
em estágio mais avançado. Além da avaliação médica, estes pacientes
precisam comprovar que não podem prover sua subsistência, nem
tê-la provida por seus familiares. O BPC é um benefício da política

141
de assistência social. Outra demanda recorrente é a articulação para
que os pacientes de ELA que não necessitam de cuidados hospitalares,
mas precisam de acompanhamento especializado em casa, solicitem
atendimento às Secretarias Municipais de Saúde, em sistema de atenção
domiciliar. Para tanto é necessário que o médico que acompanha
o paciente elabore laudo fundamentado, indicando os motivos da
necessidade do referido serviço.
A assistência domiciliar na área da saúde, hoje, já se constitui
como prática corrente e conhecida pelos profissionais da área, mas
assim como outras estratégias de atendimento, o que se percebe é a
falta de investimento por parte do poder público, mesmo que esta
modalidade de atendimento proporcione ao paciente permanecer
em seu ambiente doméstico, junto aos seus familiares e comunidade,
condição que acreditamos ser bastante positiva para o tratamento,
Para enfrentamento de dificuldades como a mencionada no parágrafo
anterior, é fundamental a articulação do assistente social conjuntamente
com os demais profissionais e familiares para garantir que o paciente
com diagnóstico de ELA possa realizar o tratamento mais adequado
possível.
Dentro da concepção de seguridade social, instituída pela Constituição
Federal de 1988, a saúde, notadamente, foi uma das áreas em que os
avanços constitucionais foram mais significativos. A referida norma
fundamental estabelece que “a saúde, no Brasil, é direito de todos e
dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas
que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário aos serviços para sua promoção, prevenção e
recuperação”. Um dos mais importantes princípios do Sistema Único
de Saúde (SUS) é a universalidade. Desta forma, pode-se afirmar
que todos os 204 milhões de Brasileiros dependem dele (utilizam-
no através de atendimento nos ESF (Estratégia Saúde da Família) e

142
PACS (Programa de Agentes Comunitários de Saúde), ou nas unidades
hospitalares, como também através do trabalho da vigilância sanitária
que inspeciona locais como: restaurantes, supermercados, salões de
beleza e etc (BRASIL, 1988).
O SUS no Brasil, apesar do caráter universal, recebe pouco
investimento, visto que são empregados apenas 3,6% do Produto
Interno Bruto (PIB) na sua manutenção, o menor percentual entre
os países que têm o mesmo sistema de saúde. Especialistas apontam
que para o sistema funcionar bem o ideal seria o país investir 8% do
PIB.
No âmbito da saúde pública, o que se percebe hoje é a existência de
dois projetos antagônicos, um em consonância com os ideais da Reforma
Sanitária e outro Privatista, que tem como maior expressão a expansão
deste setor dentro do SUS; como exemplo, temos a gestão de diversos
hospitais públicos por Organizações Sociais (OS). Uma das estratégias
de ação dos defensores do projeto privatista é a refilantropização das
políticas públicas, que nada mais é que a implementação de políticas
sociais, sob a orientação filantrópica, baseada na noção de dever moral
e na ação voluntária e benevolente, desconsiderando sua natureza de
políticas públicas, direito do cidadão e dever do Estado.
É no contexto da restauração do capital, na tentativa de superação da
crise do capital em crise, como Mészáros identifica, que as respostas à
questão social são modificadas pelo retrocesso posto pela égide neoliberal.
O acesso às políticas sociais passa a ser precarizado, mercantilizado e
reatualizado na mediação do favor, via voluntariado (SOARES, 2010).

Em meio a este cenário, uma pergunta é lançada: qual seria a razão


de um grupo privado assumir a gestão de um serviço público em saúde
que não seja o interesse econômico?
A área de saúde sempre foi um dos maiores espaços sócio-ocupacionais
do/a Assistente Social, porém no dia a dia de sua prática na saúde os/
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as assistentes sociais se veem desafiados/as a atuar dentro dos limites
e possibilidade de suas ações, especialmente porque usuários e demais
profissionais de saúde ainda desconhecem as principais atribuições
deste profissional na saúde, enviando demandas equivocadas, muitas
vezes de cunho assistencialista.
Assistente Social é a/o profissional que atua no campo das Políticas
Sociais com o compromisso de defesa e garantia dos Direitos Sociais
da população. O/a profissional deve ter concluído o curso de Serviço
Social, por Instituição devidamente reconhecida pelo Ministério da
Educação (MEC) e possuir inscrição no Conselho Regional de Serviço
Social - CRESS. A profissão é regida pela Lei Federal nº 8.662/93 que
estabelece suas competências e atribuições. De acordo com a Resolução
nº 218/97, do Conselho Nacional de Saúde, o/a Assistente Social
figura como uma das profissões da área da saúde.
Como profissional, historicamente o Serviço Social tem sua atenção
voltada para a compreensão da questão social. O/A Assistente social atua
frente às expressões da questão social, e possui atribuições de: realizar
estudos e pesquisas para avaliar a realidade social, além de produzir parecer
social e propor medidas e políticas sociais; planejar, elaborar e executar
planos, programas e projetos sociais; prestar assessoria e consultoria
às  instituições públicas e privadas e, também,  aos movimentos
sociais; orientar indivíduos e grupos, auxiliando na identificação
de recursos e proporcionando o acesso aos direitos sociais; realizar
estudos socioeconômicos com indivíduos e grupos para fins de acesso
a benefícios e serviços sociais (PERNAMBUCO, 2011).
Em sua trajetória, os/as profissionais da área têm participado e
trabalhado no debate das alternativas de enfrentamento de tais questões,
buscando, no âmbito da saúde, atuar de acordo com os princípios
discutidos e preconizados pelos defensores da reforma sanitária, como
também pelos dispostos no Código de Ética da profissão e pelos

144
parâmetros para Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde.
De acordo com este último documento ao/à Assistente Social compete:

• Democratizar as informações por meio de orientações (individuais


e coletivas) e/ou encaminhamentos quanto aos direitos sociais
da população usuária.
• Enfatizar os determinantes sociais da saúde dos usuários,
familiares e acompanhantes por meio das abordagens individual
e/ou grupal;
• Fortalecer os vínculos familiares, na perspectiva de incentivar
o usuário e sua família a se tornarem sujeitos do processo de
promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde.
• Elaborar estudos socioeconômicos dos usuários e suas famílias,
com vistas a subsidiar na construção de laudos e pareceres
sociais, na perspectiva de garantia de direitos e acesso aos
serviços de saúde.
• Mobilizar e incentivar os usuários e suas famílias para participar
no controle democrático dos serviços prestados (CFESS, 2010).

Sendo assim, compete ao/à Assistente Social pautar sua atuação na


elaboração de estratégias que busquem reforçar ou criar práticas que
colaborem na efetivação do direito à Saúde, orientando o/a paciente
de doenças neurodegenerativas e seus familiares para que possam ter
pleno acesso aos serviços e benefícios disponibilizados pelo poder
público, realizando os encaminhamentos necessários para a garantia
do tratamento de saúde.

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Referências

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República


Federativa do Brasil de 1988. 48. ed. Rio de Janeiro: Escala,
2006.

CFESS. Parâmetros para Atuação de Assistentes Sociais na


Política de Saúde. Brasília: [S.I.], 2010.

PERNAMBUCO. Sistematização das Ações dos/as Assistentes


Sociais do Hospital Universitário Oswaldo Cruz. (Divisão de
Serviço Social). Recife: Hospital Universitário Oswaldo Cruz,
2011.

SOARES, Raquel C. Contrarreforma na política de saúde e prática


profissional do Serviço Social nos anos 2000. In: MOTA, Ana
Elizabete (Org.). As ideologias da contrarreforma e o Serviço
Social. Recife: Editora Universitária UFPE, 2010. p. 337-382.

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