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NA ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA
A ABORDAGEM MULTIPROFISSIONAL
NA ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA
Org.
Tatiana Lins Carvalho
Carolina da Cunha Correia
Recife
UPE-EDUPE, 2019
UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO – UPE
REITOR Pedro Henrique Falcão
VICE-REITOR Dra. Socorro Cavalcanti
A154
A Abordagem Multiprofissional na Esclerose Lateral Amiotrófica.
[recurso eletrônico] / Tatiana Lins Carvalho, Carolina da Cunha
Correia (Orgs.). – Recife: EDUPE, 2018.
146 p.
Ebook: PDF
Disponível em: http://www.edupe.com.br/
Introdução
Epidemiologia
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pseudopolineurítica e espástica, variante de Mills (fraqueza dimidiada),
formas monomélicas e formas bulbares (JAWDAT et al., 2015).
Na tabela 1, encontram-se sinais e sintomas clínicos que podem ajudar
na suspeita do diagnóstico.
Tabela 1. Alguns sinais e sintomas de envolvimento de NMS e NMI na ELA.
Espasticidade Hipotonia
Clônus Fasciculações
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estudos clínicos. Segundo este critério, as regiões de acometimento
são: bulbar, cervical, torácica e lombosacra (BROOKS et al., 2000).
Quadro 1 - Critérios Diagnósticos da ELA segundo El Escorial revisado
Achados neurofisiológicos
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tempo de condução central (potenciais evocados motores) também
podem demonstrar acometimento das vias descendentes motoras. Na
ENMG é fundamental a detecção de desnervação ativa, representada
sobretudo por fibrilações, ondas agudas positivas, fasciculações;
demonstradas em 3 segmentos.
Achados na neuroimagem
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• Eletroforese de proteínas
• Provas de doenças vasculíticas relacionadas ao colágeno
• Dosagem de imunoglobulinas IgA, IgG e IgM
• Hormônios tireoidianos e paratiroidiano
• Dosagem de vitamina B12 e folato
• Testes de doenças infecciosas: sífilis, HIV, HTLV, hepatite B e C
• Marcadores tumorais: Alfa feto proteínas, CEA, CA 15-3, CA
19.9, CA 125, PSA
• Análise do líquido cefalorraquiano
• Em caso de história de exposição ocupacional: chumbo, mer-
cúrio, alumínio e cobre
• Ressonância nuclear magnética do crânio, coluna cervical e
transição crânio cervical
• Estudo Eletroneuromiográfico
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O descobrimento de outros genes nas formas familiares, tais como
Matrin 3, C9orf72, CHCHD10, tem contribuído na compreensão
das vias envolvidas no processo neurodegenerativo e nas variabilidades
fenotípicas da doença; sobretudo no que concerne à idade de início e
seu prognóstico (LI; WU, 2016).
Mesmo nas formas esporádicas da ELA, já foram identificados
genes em até 25% dos casos, em algumas séries (CADY et al., 2014).
A identificação destes genes ajuda na compreensão dos mecanismos
envolvidos na patogênese da ELA, sua variabilidade fenotípica e
estimularam algumas tentativas terapêuticas.
São fatores de risco associados com a doença: idade de início, sexo
masculino e história familiar de ELA.
Outros fatores são especulados com potencial associação com a ELA,
tais como fumo, exercício físico extenuante, TCE, câncer, exposição
ocupacional a campo magnético, metais pesados ou pesticidas, mas esta
análise é baseada em relatos de casos havendo crítica na literatura, uma
vez que sua associação não se repetiu em outros indivíduos expostos
aos mesmos fatores (WANG et al., 2017).
Um dos mecanismos patogênicos mais defendidos e suportados
por evidências é o papel excitotóxico mediado pelo glutamato,
resultando em lesão neuronal e ativação de substâncias que mantêm o
processo degenerativo progressivo. Entretanto, outros fatores também
estão envolvidos, como o influxo de cálcio, estresse oxidativo, dano
mitocondrial e da junção neuromuscular.
Curiosamente, a hipercolesterolemia, o uso de estatina e
imunossupressores foram citados como fatores de diminuição de
risco para ELA; entretanto esses achados não se repetiram em outros
estudos (RIVA et al., 2016).
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Expectativas terapêuticas
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na manutenção da qualidade de vida e melhora na sobrevida (CHIÒ
et al., 2004).
A ventilação não invasiva através do uso de bipap está associada
com melhora significativa da expectativa e qualidade de vida. Dentre
os suportes que podem predizer a sobrevida e evolução funcional,
estão a Fisioterapia respiratória e a orientação nutricional.
As possibilidades de cuidados sintomáticos abrangem também o
suporte à dor e às câimbras, fonoterapia, intervenções nos aspectos
psicológicos, alívio dos distúrbios do sono e medidas de adaptação
funcional com terapeuta ocupacional.
Todos estes aspectos serão avaliados individualmente neste livro e
temos convicção de que enquanto esperamos novas terapias eficazes e
que retardem ou recuperem funcionalmente estes pacientes, o suporte
interdisciplinar traz maior conforto e segurança, melhora a relação entre
os diversos atores envolvidos no processo de cuidar e nos proporciona
reflexões sobre os aspectos dos limites terapêuticos e de finitude da
vida.
22
Referências
23
LI, Hong-fu; WU, Zhi-ying. Genotype-phenotype correlations of
amyotrophic lateral sclerosis. Translational Neurodegeneration,
[s.l.], v. 5, n. 1, p.1-10, 3 fev. 2016.
24
SABATELLI, M. et al. Natural history of young-adult amyotrophic
lateral sclerosis. Neurology, Rome, v. 12, n. 71, p.876-881, 2008.
25
2 - DISTÚRBIOS DO SONO NA ELA
Clélia Maria Ribeiro Franco
A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é considerada doença
neurodegenerativa progressiva, havendo envolvimento do neurônio
motor ao nível central e periférico, sendo estudada dentro do grupo
de doenças neuromusculares (HARMS; BALOH, 2013; WOOD-
ALLUM; SHAW, 2010).
Segundo George e Guilleminault (2005), O sono é um estado de
vulnerabilidade para pessoas com doenças neuromusculares, ao ponto
que as alterações fisiológicas na ventilação sono REM-relacionadas são
agravadas pela fraqueza muscular. Assim, indivíduos acometidos pela
ELA estão no grupo de risco de desenvolvimento de distúrbios do
sono, pelo fato das incapacidades motoras, comuns nestes pacientes,
piorarem durante o sono (GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005; LO
COCO et al., 2011).
Em estágios da doença onde haja já alguma fraqueza da musculatura
respiratória, principalmente quando há fraqueza do diafragma, surgem
distúrbios respiratórios do sono, em especial a hipoventilação com
hipoxemia/dessaturação de oxigênio em sono, além dos eventos de apneias
obstrutivas e mistas, particularmente no sono REM (sono onde ocorre
os movimentos rápidos dos olhos ou Rapid Eyes Movement). Quase
que invariavelmente, estes pacientes necessitarão de suporte ventilatório
em sono (CULEBRAS, 2005; GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005;
LO COCO et al., 2011).
Além disso, pacientes com ELA podem sofrer fragmentação
do sono e queda na sua eficiência por outros motivos, tais como
ansiedade, depressão, dor, sialorréia excessiva e engasgos noturnos,
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câimbras e incapacidade de mudança postural no leito (GEORGE;
GUILLEMINAULT, 2005; LO COCO et al., 2011).
A fisiopatologia dos distúrbios respiratórios em sono sofridos pelos
indivíduos com ELA envolve fatores múltiplos, tais como o surgimento
de fraqueza do músculo diafragma, a sensibilidade reduzida ao gás
carbônico durante o sono, atonia muscular típica da fase REM -
quando até uma fadiga leve de musculatura respiratória se manifesta,
surgindo maior dessaturação de O2 em sono. Também a presença de
doença pulmonar restritiva, decorrente da fraqueza da parede torácica
e das microatelectasias – por hipoventilação crônica e retenção de
secreções são fatores contribuintes para a má ventilação em sono dos
pacientes com doença neuromuscular (CULEBRAS, 2005; GEORGE;
GUILLEMINAULT, 2005; LO COCO et al., 2011). Infelizmente,
apenas em torno de 2% dos pacientes com ELA são questionados quanto
à presença de queixas referentes a distúrbios respiratórios em sono.
E estes, quando presentes, irão impactar negativamente na evolução
clínica destes indivíduos, contribuindo para agravamento da morbi-
mortalidade (CULEBRAS, 2005; GEORGE; GUILLEMINAULT,
2005; HARDIMAN; BERG; KIERNAN, 2011; LO COCO et al.,
2011). Anormalidade respiratória em sono pode ser um sinal precoce
de disfunção ventilatória nos pacientes com ELA (TSARA et al.,
2010).
Estudo com 28 pacientes com ELA, publicado em 2010 por Tsara
et al. (2010), com tempo de diagnóstico de doença variando entre
1-48 meses, não havendo obesos nem casos de DPOC no grupo,
encontraram disfunção bulbar em 30%, dispneia leve a moderada em
39% e capacidade vital forçada (CVF) menor que 80% em 78% dos
pacientes. Nestes pacientes, distúrbio respiratório em sono (DRS) do
tipo apneia obstrutiva do sono, com Índice de Apneia-Hiponeia (IAH)
entre 5-83 eventos/hora, ocorreu em 67%, enquanto a hipoxemia
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em sono afetou todo o grupo estudado, com saturação de O2 entre
61-90%. Os autores consideram que o estudo da função pulmonar
diurna sozinha não tem valor preditivo para detectar DRS.
Desta forma, havendo envolvimento da musculatura bulbar e/ou
diafragmática, a ocorrência de DRS é provável e sintomas de alerta
costumam surgir, tais como fadiga e sonolência excessiva diurna,
fragmentação do sono – sono com muitos despertares – insônia,
cefaleia matinal e sensação de sono não-reparador. Na vigência de
um ou mais destes sintomas, a polissonografia noturna deveria ser
realizada para detectar o mais precoce possível o DSR, possibilitando
a busca por instituir o tratamento com suporte ventilatório em sono,
evitando complicações decorrentes da privação de sono e hipoxemia
noturna recorrente (JENNUM; SANTAMARIA, 2007).
Já em 1999, Aboussouan e Lewis, chamavam atenção para
a interferência de via dupla entre o sono de má qualidade e a má
ventilação, impactando ambas negativamente na qualidade de vida, em
pacientes com ELA. Estes autores reforçam que o prejuízo desta danosa
interação vai muito além da potencial sonolência excessiva diurna
(SED), lembrando que, mesmo em indivíduos saudáveis, a privação
de sono tem sido considerada um fator de impacto negativo nos testes
espirométricos e de resistência muscular, com diminuição na resposta
ventilatória à hipercapnia (ABOUSSOUAN; LEWIS, 1999). A privação
crônica de sono por hipoxemia noturna leva a várias complicações,
tais como: Hipertensão Pulmonar - Cor Pulmonale, SED, desatenção,
disfunção cognitiva e do humor, arritmias cardíacas, policitemia, com
redução na qualidade de vida e sobrevida (ABOUSSOUAN; LEWIS,
1999; GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005; WOOD-ALLUM;
SHAW, 2010).
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Investigação e orientação:
29
da capacidade vital forçada menor que 40% e/ou PCo2 >45 mmHg,
a polissonografia (PSG) noturna está indicada (CULEBRAS, 2005;
HARDIMAN; BERG; KIERNAN, 2011; LO COCO et al., 2011).
Estudos para avaliar queixas relativas ou mesmo a qualidade do
sono de pacientes com ELA, utilizando questionários padronizados, tais
como Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI) e a Epworth Sleepiness
Scale (LO COCO et al., 2011) ou estudos armados com polissonografia
noturna (TSARA et al., 2010), têm mostrado má qualidade do sono
e alterações em sua arquitetura, tais como o aumento da latência
NREM e dos despertares, redução percentual da fase 3 do sono NREM
(sono N3 ou sono de ondas delta ou sono profundo) e da fase REM,
redução do tempo total de sono (TTS) e de sua eficiência. Também
são descritas a ocorrência de apneias obstrutivas e mistas em sono,
hipoxemia relacionada ao sono – com dessaturação de O2 (considerada
como queda da Sat O2 < 88% em adultos e < 90% em crianças) de
forma sustentada (por mais de 5 minutos) ou fásica (episódica) e
aumento de movimentos periódicos de membros em sono (PLMS).
A mais recente Classificação Internacional dos Distúrbios do Sono
(International Classification of Sleep Disorders) de 2014 classifica
a hipoxemia relacionada ao sono quando a saturação de O2 estiver
< 90% por no mínimo 5 minutos com um nadir mínimo de 85%
ou se a saturação de O2 estiver < 90% por 30% ou mais do TTS.
A síndrome da hipoxemia ou hipoventilação relacionada ao sono
parece ser a alteração respiratória mais comum em pacientes com ELA
(GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005; LO COCO et al., 2011;
TSARA et al., 2010). A avaliação do paciente com ELA sempre deverá
ser multidisciplinar e aqui, no âmbito dos distúrbios do sono, o alvo
terapêutico busca restaurar a arquitetura do sono e melhorar a qualidade
de vida. Assim, tratar dores, desconfortos posturais ou ao decúbito
devem ser lembrados. A queixa diurna de SED em geral é resolvida
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com o tratamento do distúrbio do sono causador da fragmentação do
mesmo. Em casos de sonolência diurna residual, o psicoestimulante
modafinila pode ser útil, a partir de cuidadosa avaliação médica. As
parassonias NREM, do tipo sonambulismo e terror noturno costumam
responder ao uso de hipnóticos sedativos, mas só devem ser prescritos
após avaliação e correção de distúrbio ventilatório em sono, pois caso
este exista, pode agravar com uso de sedação (CULEBRAS, 2005).
No caso das apneias centrais ou hipoventilação em sono com
dessaturação de O2, pode ser necessário a suplementação de O2 em
sono, redução farmacológica do sono REM, Fisioterapia respiratória com
treinamento de musculatura inspiratória e ventilação assistida, BiPAP e
servos (BARTHLEN; LANGE, 2000; CULEBRAS, 2005; GEORGE;
GUILLEMINAULT, 2005; RADUNOVIć; MITSUMOTO; LEIGH,
2007).
Já na confirmação da Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono (SAOS),
quando a PSG detecta um IAH > 5/hora com paciente sintomático
ou um IAH > 15/hora, há indicação de tratamento (AMERICAN
ACADEMY OF SLEEP MEDICINE, 2014; BARTHLEN; LANGE,
2000; CULEBRAS, 2005; GEORGE; GUILLEMINAULT, 2005;
RADUNOVIć; MITSUMOTO; LEIGH, 2007; WOOD-ALLUM;
SHAW, 2010). A Fisioterapia respiratória é muito importante no
suporte ventilatório e a correção de alterações craniofaciais – caso
existam - pode ajudar. Entretanto, o tratamento padrão para SAOS
é o uso dos PAP (pressão positiva em vias aéreas superiores), sejam
CPAP ou BiPAP, a depender da necessidade do paciente, de acordo
com a complexidade do distúrbio ventilatório em sono.
31
Referências:
32
HARMS, Matthew B.; BALOH, Robert H.. Clinical
Neurogenetics. Neurologic Clinics, [s.l.], v. 31, n. 4, p.929-950,
nov. 2013.
33
3 - QUANDO INICIAR O SUPORTE VENTILATÓRIO NÃO INVASIVO NA ELA.
Allan Delano Urbano Cunha
A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é uma doença do neurônio
motor superior e inferior acometendo diretamente a musculatura axial
e respiratória, levando a um acometimento diafragmático importante,
independente do nível de comprometimento bulbar ou axial. Bach e
colaboradores já preconizavam o uso da ventilação não invasiva como
modo ventilatório de suporte à vida e com impacto direto na sobrevida
do paciente, principalmente com suporte através da traqueostomia,
a fim de evitar complicações relacionadas com broncoaspiração. Mas
em que fase o suporte ventilatório deve começar e quais os sinais e
sintomas (Quadro 1) que demonstram a necessidade de utilizar a
ventilação não invasiva inicialmente por algumas horas, depois durante
24h e de maneira intermitente (BACH et al., 2010; LECHTZIN et
al., 2007)?
Quadro 1 - Sintomas de Hipoventilação na ordem de frequência de aparecimento
Ordem Sintomas
1º Fadiga
2º Dispneia
4º Sonolência diurna
7º Dificuldade de concentração
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8º Pesadelos relacionados à dificuldade respiratória
14º Depressão
20º Obesidade
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oxigênio é uma medida de proteção à vida (AMIB E SBPT, 2013;
GUYTON; HALL, 2011).
O comprometimento relacionado à fraqueza da musculatura
respiratória, principalmente o diafragma, tem como consequência
a hipoventilação e aumento da pressão de gás carbônico, porém o
controle da respiração no organismo faz com que os receptores de CO2
dos seios carotídeos estimulem o aumento da frequência respiratória e
uma compensação com aumento dos níveis de bicarbonato mantendo
o PH sanguíneo em níveis normais. A musculatura é originalmente
fraca e o esforço respiratório se torna evidente. Com a piora do
quadro, pode ocorrer insuficiência/falência respiratória, porém o que
o paciente necessita é melhorar as trocas gasosas; neste caso, o suporte
de oxigênio pode ser fatal, pois altera o mecanismo compensatório
desenvolvido pelo aumento dos níveis de CO2, bicarbonato e do
controle central da respiração (GUYTON; HALL, 2011; PÁDUA;
ALVARES; MARTINEZ, 2003).
Após o diagnóstico do paciente, é recomendada uma consulta inicial
com o fisioterapeuta a fim de mensurar sua condição respiratória com
avaliação de sinais e sintomas e a presença de redução das capacidades
pulmonares e, de posse deste diagnóstico, iniciar o tratamento específico.
A avaliação é composta por uma parte subjetiva que direciona as queixas
do paciente com as características da ELA, realizam-se também outros
tratamentos como Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Hidroterapia,
Fisioterapia motora, medicamentoso ou suplementação nutricional,
e a partir daí vêm as análises da capacidade vital, do pico de fluxo
expiratório forçado e da tosse e a saturação de oxigênio periférico. A
medida de CO2 periférico de forma não invasiva seria valiosa, porém
não é comum nos Ambulatórios e Enfermarias, apenas em UTI; no
caso de paciente internado, pode-se realizar a análise sanguínea direta
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através da gasimetria arterial (GUYTON; HALL, 2011; PÁDUA;
ALVARES; MARTINEZ, 2003).
Podemos descrever o quadro 2, de acordo com os resultados da
fórmula abaixo:
Valor predito da capacidade vital para homens depende da fórmula:
CV = 0,05211 - 0,022 x idade - 3,60 x altura (cm) e para mulheres:
CV = 0,4111 - 0,018 x idade - 2,69 x altura (cm).
Maior que 50% do valor predito Indicação de exercícios com AMBU e indicar
polissonografia
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Classificando os pacientes nos grupos acima, o próximo passo é
avaliar se eles têm capacidade de comparecer ao Ambulatório para
realizar Fisioterapia respiratória ou se seria incluído em programas de
acompanhamento domiciliar; dependendo se existir na região em que
reside esse tipo de programa. Como esses pacientes são amparados pela
lei federal, esta garante ao portador de doenças raras o recebimento
sem custo do BIPAP, porém o aparelho proposto neste projeto não
prevê a sua utilização como suporte à vida e sim no período de algumas
horas por dia. Os aparelhos de ventilação não invasiva fornecidos
são inadequados para pacientes com comprometimento respiratório
avançado (BACH; HON, 2010).
O objetivo da Fisioterapia respiratória é evitar as complicações
pulmonares que são consequências da fraqueza respiratória e,
principalmente, prevenindo estes efeitos, uma das formas é o aumento
do volume pulmonar evitando atelectasias. Inicialmente utiliza-se o
AMBU enquanto não se tem condições de utilizar o BIPAP para maior
conforto respiratório e melhorar a qualidade do sono e, desta forma,
seguir vivendo enquanto conseguem tolerar a ventilação não invasiva,
pois o próprio avançar da doença exige medidas mais firmes para conviver
com a insuficiência respiratória podendo evoluir para um quadro de
falência respiratória. Chega então o momento de decidir a respeito
de quais medidas vão ser tomadas para manter a vida deste paciente,
até que ponto foi conversado sobre as modalidades terapêuticas para
seu caso nesta fase como, por exemplo, a traqueostomia, a ventilação
invasiva e a vida acamado e totalmente dependente (BACH; HON,
2010; BACH et al., 2013).
Neste momento, a equipe deve passar as opções terapêuticas para
o paciente e a família e, a partir destas informações, devem ser feitas as
escolhas de como deverá ser o desfecho da sua história, sua relação com
a morte, se acredita em Deus, para tentar tornar este momento menos
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doloroso. A Fisioterapia busca medidas para reduzir o desconforto
respiratório de acordo com as decisões da equipe, com o paciente e
com a família, evitando sensação de fadiga respiratória e sofrimentos
evitáveis nos momentos críticos da falência respiratória.
Quando surge a falência, dois caminhos podem ser seguidos: um
deles é a continuidade do suporte ventilatório agora de maneira contínua
e invasiva visto que a VNI não mais alivia o desconforto respiratório,
este fato pode ocorrer como observou Andersen et al. (2016). Eles
avaliaram a mobilidade das cordas vocais e perceberam que os pacientes
de comprometimento bulbar e pseudobulbar não apresentaram boa
resposta a VNI devido à incoordenação nesta estrutura. Desta forma,
a opção para manter a expansibilidade pulmonar seria a traqueostomia
de maneira precoce. O paciente com a via aérea artificial estaria seguro
e protegido em relação à broncoaspiração e poderia usar a VNI de
forma eficaz. Porém, como geralmente acontece a falência após a
infecção respiratória, a ventilação pode se tornar definitiva se a pressão
inspiratória máxima e a capacidade vital forem próximas de zero. Neste
caso, a ventilação de forma contínua e de suporte à vida é indicada.
Já os pacientes que optam por não fazer uso da via aérea artificial,
continuam na VNI até sua musculatura tolerar. Quando não mais
conseguir gerar troca gasosa e manutenção da CV, o paciente é sedado
e espera o momento do colapso total junto de seus familiares. A
decisão é muito difícil e envolve a escolha do paciente em relação a
sua sobrevivência. No Brasil, cada vez mais, a vontade do paciente
vem sendo seguida.
39
Referências
40
LECHTZIN, Noah et al. Early use of non‐invasive ventilation
prolongs survival in subjects with ALS. Amyotrophic Lateral
Sclerosis, [S.I.], v. 8, n. 3, p.185-188, jan. 2007.
41
4 - A ATUAÇÃO DA TERAPIA OCUPACIONAL NA ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA
Noemi Salazar de Araújo
42
o objetivo é a otimização dos componentes comprometidos, melhora
dos níveis de independência nas áreas do desempenho e a adaptação
dos contextos ambientais para proporcionar ao indivíduo adoecido
a realização da função de maneira plena e segura. Na fase avançada
da doença, o objetivo do tratamento passa a ser direcionado mais ao
cuidador, com orientações para a continuidade da assistência com
segurança e eficiência (COPPERMAN; FORWELL; HUGOS, 2005).
Tendo conhecimento da metodologia utilizada e objetivos
junto a esta clientela, o terapeuta ocupacional inicia o processo de
avaliação que consiste em uma entrevista inicial na qual são coletados
dados de identificação, perfil ocupacional, interesses e as habilidades
remanescentes. Em seguida são aplicadas escalas funcionais como a
Escala de Funcionalidade na Esclerose Lateral Amiotrófica Revisada
(ALSFRS- R) e a Medida de Independência Funcional (MIF).
A ALSFRS-R é um inventário funcional específico para pacientes
com ELA, composto por doze itens que estão subdivididos em quatro
áreas como alimentação, autocuidado, deambulação e comunicação. É
um questionário que funciona como indicativo prognóstico da doença
(GUEDES et al., 2010).
Outra escala utilizada é a MIF. Trata-se de uma escala de funcionalidade
global amplamente utilizada na área de reabilitação. São avaliados
dezoito itens que são divididos em cuidados pessoais, controle dos
esfíncteres, mobilidade, locomoção, comunicação e cognição social. A
aplicação da escala é feita tanto por observação direta do desempenho
das atividades como por entrevista feita com o paciente e com o
cuidador (RIBERTO et al., 2004).
Após coletados os dados, o terapeuta traça o plano de tratamento
em concordância com as necessidades e prioridades do paciente.
Na intervenção com ênfase nos componentes físicos, o terapeuta
lançará mão de exercícios de alongamento e atividades que favoreçam
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a mobilização, destreza, coordenação, objetivando a otimização dos
componentes comprometidos. A prescrição de atividades junto a
pacientes com ELA deve ser feita de forma criteriosa, sempre intercalando
momentos de repouso, já que a realização exagerada de exercícios e/ou
atividades geram espasmos musculares, fazendo com que o paciente
fadigue rapidamente. A intervenção deve ser reavaliada com frequência,
pois a doença tem como uma de suas características principais a rápida
perda da função motora, necessitando que o terapeuta tenha muita
flexibilidade em seu raciocínio clínico (SILVA et al., 2014).
Alguns pacientes com ELA podem evoluir com alterações cognitivas
e/ou comportamentais sendo necessária uma intervenção sistematizada.
Nessas situações, o terapeuta irá estimular os componentes afetados
através de atividades terapêuticas e utilizar estratégias compensatórias
para reduzir os efeitos deste comprometimento na funcionalidade.
Por ser uma doença de evolução rápida, o indivíduo passa por várias
fases emocionais que interferem diretamente em sua autoestima. O
terapeuta ocupacional poderá atuar no fortalecimento da segurança
pessoal, promovendo a melhora psicossocial.
As intervenções nas áreas do DO devem considerar a conservação
de energia e a simplificação das tarefas. O treino das atividades de
vida diária deve ser guiado para o mínimo uso possível de grandes
grupos musculares (cinturas escapular e pélvica e tronco). Realização
de atividades na posição sentada como tomar banho, calçar sapatos,
vestir camisa, colocação de objetos de uso pessoal na altura das mãos
são algumas dessas técnicas que também devem ser orientadas ao
cuidador para supervisão das atividades quando houver necessidade
(COPPERMAN; FORWELL; HUGOS, 2005; RIBERTO et al.,
2004).
Uma outra abordagem possível junto a essa clientela é a utilização de
recursos de tecnologia assistiva, entendida como o conjunto de recursos
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utilizados para melhorar a funcionalidade de pessoas com deficiência
(SILVA et al., 2014).
Nesse contexto, o profissional dispõe de grande variedade de
equipamentos, sempre considerando a fase da doença em que o indivíduo
se encontra, a simplicidade, aceitação e o nível de tolerância quanto
ao uso desses dispositivos para alcançar eficácia do tratamento. Uso de
adaptações, órteses, bengalas, cadeira de rodas e recursos que facilitem
a comunicação são alguns exemplos.
Um dos recursos de tecnologia assistiva mais prescritos para essa
clientela são as órteses. Trata-se de dispositivos aplicados externamente
ao corpo podendo ser usados para estabilizar ou imobilizar, prevenir ou
corrigir deformidades, preservar e aumentar a mobilidade e promover
a função. Estudos recentes relatam que o uso desta tecnologia em
pacientes com ELA traz ganhos funcionais e prevenção de contraturas
(IVY; SMITH; MATERI, 2014; VAN PETTEN; ÁVILA; LIMA,
2014; VELLOSO; JARDIM, 2006).
Em fases mais avançadas da doença, o terapeuta irá treinar e/ou
orientar o uso desses equipamentos com o cuidador para otimizar
a segurança do paciente, favorecer o posicionamento correto e a
integridade da pele, facilitar a comunicação, realizar transferências
e permitir a mobilidade através de equipamentos adequados (IVY;
SMITH; MATERI, 2014; SILVA et al., 2014; TANAKA et al., 2013).
Sendo assim, o terapeuta ocupacional busca a melhoria das condições
funcionais dos pacientes com Esclerose Lateral Amiotrófica, considerando
o ser em sua integralidade, buscando sempre a melhor qualidade de
vida deste indivíduo.
45
Referências
46
TANAKA, Kazunari et al. Timely manner application of hand
orthoses to patients with amyotrophic lateral sclerosis: A case
report. Prosthetics And Orthotics International, Osaka, v. 38,
n. 3, p.239-242, 30 maio 2013.
47
5 - A FONOAUDIOLOGIA NA EQUIPE INTERDISCIPLINAR DE ATENDIMENTO
A PESSOAS COM ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Patrícia Oliveira Luna
Não existe nenhuma terapia que possa estacionar ou levar à cura
da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), mas há um grande número
de estratégias para o controle da sintomatologia e gerenciamento das
capacidades existentes.
O tratamento interdisciplinar visa prevenir as complicações
provenientes da paralisia e fraqueza muscular na maior parte do tempo
e melhorar, em algum aspecto, a saúde e a auto-estima. Deve estar
disponível para todos os pacientes com ELA, uma vez que melhoram
prognóstico e qualidade de vida (PONTES et al., 2010).
A fraqueza muscular é uma marca da ELA e ocorre inicialmente em
cerca de 60% dos pacientes. É caracterizada por amiotrofia, redução
de força muscular e fasciculações. As mãos e os pés podem ser afetados
primeiro. Caso a fraqueza e paralisia comprometam a inervação dos
músculos bulbares ou nas vias de controle do trato córtico-bulbar, a
doença evoluirá afetando a fala, deglutição, a mastigação e por fim a
respiração. Na ELA, 30% dos pacientes começam com sintomas bulbares
que incluem disfagia, disartria e alterações fonatórias (PONTES et
al., 2010).
As funções sensitivas, os movimentos oculares voluntários e as
funções sexual, intestinal e urinária estão preservadas (MORIM;
ROCHA; ALMEIDA, 2006). As pessoas com ELA têm consciência
da progressão da doença e de que esta não tem cura, o que em alguns
casos, conduz a quadros depressivos.
O objetivo do tratamento fonoaudiológico é manter, pelo maior
tempo possível, a funcionalidade da fala, mastigação, deglutição e voz
48
e criar estratégias de comunicação alternativa quando a comunicação
oral não é eficaz. Os objetivos da reabilitação são traçados dentro
de critérios individuais, dependendo como o curso e apresentação
clínica da doença estão no momento. Utiliza exercícios de coordenação
fono-respiratória e mobilidade labial e lingual, e técnicas e manobras
posturais que enfocam as diferentes fases da deglutição, para melhorar
o controle oral e facilitar a passagem do bolo alimentar, sempre tendo
o cuidado de não ocasionar fadiga (PONTES et al., 2010).
Disfagia
49
da duração da fase voluntária da deglutição, incluindo as alterações
motoras de língua, parece ser uma das maiores contribuições para a
disfagia.
O escape precoce é mais frequente com líquidos ralos e a maior
causa de aspiração traqueal, mesmo em estágios precoces da doença e
com alterações leves da musculatura oral. Resíduos faríngeos são mais
comumente observados na consistência pastosa e sólida, e pode causar
penetração laríngea e aspiração traqueal pós-deglutição.
O prejuízo da habilidade de deglutir usualmente inclui a redução
do fechamento do reflexo glótico para que disfagia e aspiração ocorram
concomitantemente. A aspiração pode se manifestar somente através
de uma tosse seca, que aumenta durante as refeições.
A disfunção do neurônio motor inferior causa fraqueza da
musculatura lingual e velo-faríngea, o que interfere na formação do
bolo alimentar e deglutição de líquidos, assim como escape nasal e
fraqueza faríngea. A disfunção do neurônio motor superior produz
espasmos no músculo cricofaríngeo ou o seu fechamento prematuro,
resultando em resíduos na faringe. Os sintomas incluem sialorréia e
dificuldade para iniciar a deglutição na disfunção do neurônio motor
inferior (NMI), ou disfagia com engasgos no neurônio motor superior
(NMS) (JACOBI; LEVY; CORREA, 2004).
Com a evolução da doença, muitos pacientes desenvolvem
uma disfagia severa, com rápida perda de peso e fraqueza acelerada,
necessitando de um cateter alimentar. É mais efetivo para os pacientes
com ELA o cateter de gastrostomia endoscópica percutânea (PEG). O
uso de sonda nasogástrica (SNG) para alimentação deve se restringir
à curta duração ou quando os procedimentos PEG ou gastrostomia
radiológica percutânea (PRG) indicados não forem possíveis. A
decisão é realizada pela equipe médica com apoio das equipes de
Fonoaudiologia, Fisioterapia respiratória, Psicologia e Nutrição. É
50
indicada para pacientes que apresentam perda progressiva de peso
(<10%), alimentação demorada e com fadiga excessiva, tosse durante
a alimentação e dificuldade para deglutir medicamentos (FONSECA,
2010).
A indicação da via alternativa colabora na qualidade de vida desses
pacientes, assim como, no aumento da sobrevida, na diminuição do
risco de complicações clínicas, como exemplo as broncoaspirações
e consequentes pneumonias (VIANA; ALVARENGA, 2015). O
procedimento precoce é o mais recomendado, pois adiá-lo para uma
fase tardia implica em riscos, que vai aumentando com o declínio da
função respiratória (maior risco CVF<50%) (SALVIONI; STANICH;
SHINTAKU, 2009; XEREZ, 2008).
Vale salientar que os cuidados nutricionais devem ser realizados desde
estágios precoces da doença, incluindo alterações das consistências,
viscosidade e elasticidade dos alimentos; suplementação ou alterações
nutricionais (SALVIONI; STANICH; SHINTAKU, 2009).
A perda de peso é de etiologia multifatorial. Isso significa que os pacientes
com ELA podem ter um gasto calórico aumentado, mesmo em vigência
de adequada ingestão calórico-protéica. Esse hipermetabolismo pode
estar relacionado a questões respiratórias, tabagismo, fasciculações,
espasticidade, uso de riluzol e alterações mitocondriais; sendo a teoria
relacionada ao gasto respiratório, a mais convincente até o momento
(SALVIONI; STANICH; SHINTAKU, 2009).
51
Disartria
52
Disfonia
Dispneia
53
ocasionando o risco de uma aspiração traqueal (CHIAPETTA; ODA,
2004).
O diagnóstico precoce do envolvimento muscular respiratório
em doentes com ELA pode auxiliar na escolha mais adequada: uso de
ventilação não invasiva ou traqueostomia, e dos cuidados paliativos
antes que ocorra falência respiratória (CHIAPETTA; ODA, 2004).
54
Conclusão
55
Referências
56
Neurociências, Rio de Janeiro, v. 23, n. 02, p.173-181, 30 jun.
2015.
57
6 - NUTRIÇÃO NA ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Alessandra Barbosa da Silva, Ana Célia Oliveira dos Santos
58
A literatura relata que a ELA cursa com incidência de desnutrição
de 15 a 55%, um valor elevado que pode aumentar com a progressão da
doença. Vale ressaltar que também é visto que a presença da desnutrição
é um indicador de risco relativo de morte em 7,7 vezes e que este risco
pode aumentar em 30% a cada 5% de perda de peso (MARIN et al.,
2010). Considerando o estado nutricional como fator influenciador
do prognóstico do paciente com ELA, a instituição de uma Terapia
Nutricional adequada, monitoramento nutricional e metabólico,
exerce um papel fundamental e deve ser implementada no momento
do diagnóstico da doença (DESPORT et al., 1999; MUSCARITOLI
et al., 2012).
O plano terapêutico nutricional vai muito além da prescrição
dietética. A conduta deve ser realizada junto ao paciente, informando
quanto à via de alimentação mais adequada (seja ela oral, mista, sonda
nasal ou por gastrostomia), mudanças da consistência da dieta, busca
pela valorização de sabores, preservação da autonomia do paciente,
hidratação, associação de estratégias de deglutição orientadas pela
equipe de fonoaudiologia, orientações de acordo com as necessidades
específicas, uso de suporte nutricional associado e suplementação de
micronutrientes, quando necessários. Nesse contexto, o plano alimentar
visa manter ou melhorar o estado nutricional, evitando a desnutrição e
suas complicações, além de buscar a melhora da função física, qualidade
de vida e sobrevida desses pacientes (BRAUN; OSECHECK; JOYCE,
2012).
Hipóteses têm sido desenvolvidas para explicar o hipermetabolismo
na ELA; dentre elas, destacam-se o maior esforço respiratório devido
à atrofia muscular ocasionada pela doença e pelo desequilíbrio
funcional das mitocôndrias com a diminuição da produção de energia
(MUSCARITOLI et al., 2012). Estudos apontam que pacientes com
ELA apresentam elevação do Gasto Energético de Repouso (GER)
59
em cerca de 10%, quando comparados a uma população saudável
da mesma faixa etária e sexo. Ainda não se tem clareza sobre essa
causa, porém há evidências que apontam que o hipermetabolismo seja
uma consequência do aumento da demanda muscular de nutrientes
(BRAUN; OSECHECK; JOYCE, 2012; MUSCARITOLI et al.,
2012).
Pacientes com ELA podem apresentar alterações no metabolismo
dos carboidratos, cursando com intolerância à glicose e resistência
insulínica, em consequência da diminuição da massa muscular
funcional e do armazenamento de glicogênio muscular. No entanto,
essas alterações podem ser multifatoriais, requerendo mais investigações
(MUSCARITOLI et al., 2012).
Em relação aos lipídios, dietas com alto teor de gorduras têm mostrado
efeito positivo na redução da perda de peso, devido a sua elevada densidade
energética (BRAUN; OSECHECK; JOYCE, 2012). A maior oferta
de lipídios parece ser fator protetor para esses pacientes, prolongando
significativamente sua sobrevida. Entretanto, é importante que a
qualidade dos lipídios ofertados seja considerada de forma a valorizar
as gorduras monoinsaturadas e polinsaturadas (MUSCARITOLI et
al., 2012).
É comum esses pacientes apresentarem constipação intestinal,
sendo agravada pelo baixo consumo de fibras e pela baixa ingestão
de líquidos devido à disfagia. Vale destacar a importância do aporte
hídrico meio à disfagia frequente. Em alguns casos, essa adequação
só é alcançada quando o paciente faz uso da nutrição enteral, onde a
oferta de água ocorre pela sonda de alimentação. O uso de espessantes
comerciais é indicado quando não se tem a Terapia Nutricional Enteral
(TNE) instituída (MUSCARITOLI et al., 2012).
Em contrapartida, quando o paciente faz uso da nutrição enteral,
a oferta de fibras na dieta enteral pode ser inferior à recomendada,
60
sobretudo se a dieta for artesanal ou industrializada sem fibras. Nesses
casos, o uso de módulos de fibras podem ser utilizados, assim como a
suplementação de simbióticos (MUSCARITOLI et al., 2012).
As recomendações de micronutrientes na ELA ainda estão sendo
estudadas, não havendo, portanto, consenso sobre as necessidades diárias
específicas de vitaminas e minerais para esses pacientes. Nesse sentido,
recomenda-se que no mínimo a Ingestão Diária Recomendada (RDA
- Recommended Dietary Allowances) de micronutrientes estabelecida
para a população sadia, seja alcançada através da dieta (PADOVANI
et al., 2006). O uso de suplementos pode ser indicado caso não seja
possível a adequação pela dieta. Embora cerca de 75% dos pacientes
com ELA façam uso de suplementos com micronutrientes, não há
evidência clara que essa conduta promova reversão da doença ou
prolongue a sobrevida (BRAUN; OSECHECK; JOYCE, 2012).
Ao considerar as necessidades hídricas dos pacientes com ELA,
deve-se avaliar sua capacidade de deglutição. A desidratação pode
ocasionar ou agravar a constipação intestinal; assim, fazem parte da
conduta orientações quanto à ingestão de líquidos, teor de fibras na
dieta, consistência das preparações, orientação de técnicas de deglutição
e massagem abdominal (GREENWOOD, 2013).
O uso da TNE nesses pacientes é bem comum devido à presença
constante de disfagia, do hipermetabolismo e da desnutrição acentuada.
Como critérios para a indicação da TNE nos pacientes com ELA,
utilizam-se os seguintes parâmetros: baixa ingestão alimentar (<75%
do Valor Calórico Total (VCT)), Índice de Massa Corporal (IMC)
abaixo de 18,5 kg/m2 ou uma perda de peso acima de 10%. Em caso de
pacientes idosos utiliza-se um IMC abaixo de 22 kg/m2 (LIPSCHITZ,
1994).
As possíveis vias de acesso para a TN são: oral, enteral e parenteral.
A via oral é a mais fisiológica e, portanto, a preferencial. Todavia, na
61
prática clínica, existem algumas situações onde o paciente não pode ou
não consegue se alimentar adequadamente por essa via. Nesses casos, a
nutrição enteral torna-se essencial na manutenção ou na recuperação
do estado nutricional do paciente. A nutrição parenteral, por outro
lado, apesar de ter suas indicações, deve ser a última via de escolha,
quer pelo seu alto custo, quer pelo maior risco de infecções (DRUYAN
et al., 2011).
Comumente, as vias de acesso mais encontradas nesses pacientes são
a nasogástrica e a Gastrostomia Endoscópica Percutânea (PEG). Embora
pareça não haver diferenças entre mortalidade ou eficácia comparando
essas duas vias de acesso, sabe-se que a sonda nasogástrica é indicada
para curtos períodos (<4 semanas), enquanto que a gastrostomia é
indicada para períodos mais longos (>4 semanas). Como os pacientes
de ELA cursam com um quadro progressivo e irreversível, o uso da
nutrição enteral não seria temporário, mas prolongado, deixando clara
a indicação preferencial pela PEG (GOMES JUNIOR et al., 2010).
Em concordância, nos pacientes com ELA, a PEG contribui para
o aumento da sobrevida e a melhora do estado nutricional, mediante
diminuição da perda de peso e aumento do IMC (MUSCARITOLI
et al., 2012). Embora a PEG seja a via mais eleita é necessário avaliar o
quadro respiratório desses, antes de realizar o procedimento (DRUYAN
et al., 2011).
A colocação da PEG pode ser influenciada pelo prejuízo progressivo
da capacidade respiratória, uma vez que os pacientes são sedados
durante esse procedimento. Nesse sentido, é importante manter o
acompanhamento nutricional trimestral, realizar a detecção precoce da
disfagia e a avaliação sistemática da Capacidade Vital Forçada (CVF)
desses pacientes, pontos que devem ser discutidos numa perspectiva
interdisciplinar. Na ELA, a PEG terá baixo risco quando realizada
em pacientes que apresentem uma CVF > 50%. Nos casos de uma
62
CVF < 30%, a PEG já seria um procedimento de alto risco, sendo
indicado nesse contexto uma ingestão alimentar conforme aceitação,
a hidratação intravenosa e a colocação de uma sonda nasogástrica para
alimentação paliativa (GREENWOOD, 2013; MILLER et al., 2009).
Além dos fatores inerentes à função pulmonar, é importante ressaltar
que o uso da TNE não elimina a ingestão por via oral, mas é um meio
importante para atingir as necessidades nutricionais e hídricas do
paciente, além de ajudar na administração de medicamentos (DRUYAN
et al., 2011).
A literatura relata efeito positivo, principalmente, no ganho ponderal
com a suplementação de aminoácidos de cadeia ramificada (AACR)
para pacientes com ELA (BONGIOANNI; CORBIANCO; DINI,
2013). No entanto, os resultados destas pesquisas são divergentes e
aceita-se que o consumo adequado de alimentos protéicos, fontes
desses aminoácidos, deve ser priorizado na alimentação destas pessoas,
respeitando as recomendações estabelecidas, pois o consumo excessivo
e crônico de AACR pode contribuir para a piora na progressão da
doença, provavelmente devido a estes serem precursores do glutamato
(MILAGRES et al., 2014).
A atenção nutricional é parte do acompanhamento de pessoas com
ELA e pode contribuir para reduzir as complicações da doença, quando
um esquema de intervenção nutricional precoce é bem estabelecido.
63
Referências
64
LIPSCHITZ, DA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim
Care, Arkansas, v. 1, n. 21, p.55-67, 1994.
65
7 - A GASTROSTOMIA ENDOSCÓPICA
Luiz Eduardo Correia Miranda, Marcel Rolland Ciro da Penha
Manter alimentados pacientes que não são capazes de deglutir
por via oral o próprio alimento é um dos desafios do tratamento
médico. Pacientes são incapazes de se alimentar por conta própria em
razão de sequelas neurológicas, de trauma, tumores, acidente vascular
cerebral, doenças degenerativas ou apenas como consequência da idade
avançada. Também são incapazes os pacientes com determinados tipos
de tumores e aqueles com doenças neuromusculares. Até 1980 esses
pacientes foram alimentados por uma sonda passada pelo nariz até o
estômago, ou por meio de um tubo colocado no estômago e exteriorizado
através da parede abdominal, procedimento realizado por cirurgia e
nomeado gastrostomia. A partir de 1980 a gastrostomia passou a ser
realizada com auxílio da endoscopia digestiva, sem a necessidade de
abrir cirurgicamente o abdome do paciente, procedimento conhecido
como gastrostomia endoscópica.
O objetivo desse capítulo é descrever o procedimento de gastrostomia
endoscópica, suas indicações e contra-indicações e suas complicações.
Indicações
Contra-indicações absolutas
• Necessidade de suporte nutricional enteral por curto período de tempo;
• Tracto digestivo doente, não pérvio ou não funcionante em razão de doenças
inflamatórias, traumas, neoplasias, doenças vasculares ou congênitas;
• Pacientes em fase terminal de doença incurável;
• Paciente hemodinamicamente instável ou em sepse;
• Características anatômicas ou doenças que sejam impedimento para a técnica, por
exemplo, o estômago intra-torácico em grande hérnia hiatal;
• Celulite da parede abdominal anterior;
Contra-indicações relativas:
• Hérnia incisional da parede abdominal anterior ou hérnia ventral;
• Varizes abdominais secundárias a hipertensão portal;
• Ascite de moderado a grande volume;
• Gestação avançada;
• Paciente com quadro de agitação psicomotora que não pode ser controlado ou
contido;
• Condições sócio-educacionais que não sejam suficientes para os cuidados com a
gastrostomia;
Técnica
67
que atenda às exigências previstas na legislação brasileira ou em sala
de bloco cirúrgico e é conduzido sob sedação venosa e anestesia local
no ponto de punção abdominal. O paciente deve ter monitorização
quanto à oximetria de pulso, frequência e ritmo cardíaco e pressão
arterial e receber uma dose endovenosa de antibiótico profilaticamente
antes do início do procedimento, normalmente uma cefalosporina de
primeira geração. São necessárias oito horas de jejum.
Há dois métodos principais para a realização do procedimento.
Ambos os métodos possuem variações descritas, mas em essência
podem ser assim resumidos:
68
Orifício externo
por onde a sonda
será tracionada.
Foto 5: Aparato externo de fixação da Foto 6: Kit industrial apropriado para rápida e
gastrostomia. Uma escala em centímetros segura colocação da gastrostomia endoscópica.
gravada na sonda permite estimar o quão Fonte: Elaborada pelos autores.
introduzida está a sonda no interior do
estômago.
Fonte: Elaborada pelos autores.
69
2) Por pulsão:
Mediante endoscopia digestiva alta o estômago é distendido com
ar, aproximando-o da parede abdominal anterior e puncionado com
agulha fina. Por essa agulha passa-se um fio guia curto que é capturado
dentro do estômago e mantido tensionado nessa posição. Pelo fio guia
é passada a sonda de gastrostomia, de fora para dentro do estômago,
onde é fixada de maneira semelhante ao método anterior. Por esse
método, a sonda é empurrada para o interior do estômago.
Qualquer que seja o método empregado, o ponto de punção da
parede abdominal é escolhido observando-se a região do abdome,
onde a luz do endoscópio no interior do estômago pode ser percebida
através da parede abdominal pelo cirurgião. Para ambos os métodos
existem kits comerciais mais ou menos completos ao custo aproximado
de US$ 200-300 (foto 6). Graças a esses recursos, o procedimento
pode ser feito em poucos minutos e com bastante segurança. Um
método artesanal com o uso de uma sonda tipo Foley número 24
pode eventualmente ser usado em situações de extrema carência de
recursos hospitalares.
A simplicidade do método, o seu baixo custo, baixa morbi-
mortalidade e principalmente o fato de ser bem tolerado pelos pacientes
ao contrário do tubo nasogástrico, fizeram da gastrostomia endoscópica
o método de escolha para pacientes que não podem se alimentar por
via oral por longo período de tempo.
Complicações:
71
sem necessidade de retirada da sonda de gastrostomia na maioria das
vezes;
73
interior da cavidade abdominal. Essa grave complicação se manifesta
clinicamente nas primeiras seis a doze horas após o procedimento por
náuseas e vômitos, distensão e dor abdominal e exige atenção médica
imediata;
74
O uso da sonda de gastrostomia
75
Para consultar...
76
COBELL, William J. et al. Feeding After Percutaneous Endoscopic
Gastrostomy: Experience of Early Versus Delayed Feeding. Southern
Medical Journal, [s.l.], v. 107, n. 5, p.308-311, maio 2014.
77
HO CS; YEE, AC; McPHERSON, R. Complications of surgical
and percutaneous nonendoscopic gastrostomy: review of 233
patients. Gastroenterology, Ontario, v. 5, n. 95, p.1206-1210,
1988.
I VAT U RY, R a o R . e t a l . I N T R A - A B D O M I N A L
HYPERTENSION AND THE ABDOMINAL COMPARTMENT
SYNDROME. Surgical Clinics Of North America, [s.l.], v. 77,
n. 4, p.783-800, ago. 1997.
78
Of Pediatric Gastroenterology And Nutrition, Lille, v. 59, n. 2,
p.172-176, ago. 2014.
79
LLANEZA, Pp et al. Percutaneous endoscopic gastrostomy: clinical
experience and follow-up. South Med J, Nashville, v. 3, n. 81,
p.321-324, 1988.
80
dementia. The American Journal Of Gastroenterology, [s.l.], v.
96, n. 1, p.250-250, jan. 2001.
81
hospitals in the United Kingdom. The American Journal Of
Gastroenterology, [s.l.], v. 97, n. 9, p.2239-2245, set. 2002.
82
VARNIER A, et al. Percutaneous endoscopic gastrostomy:
complications in the short and long-term follow-up and efficacy
on nutritional status. Eura Medicophys, [s.i.], v. 1, n. 42, p.23-
26, 2006.
83
8 - A INTERVENÇÃO DA EQUIPE INTERDISCIPLINAR: SOMANDO AÇÕES
E APRENDENDO COM O OUTRO
Carolina da Cunha Correia
Allan Delano Urbano Cunha
Patrícia Oliveira Luna
Gabriela Serejo Martins da Silva
Tatiana Lins Carvalho
84
Relato do Caso
85
e apresentando redução dos volumes pulmonares; foi então solicitado
o BIPAP para dormir.
O objetivo da Fisioterapia Respiratória foi manter os volumes e
capacidades pulmonares, inicialmente através do AMBU e depois com
o uso do BIPAP, o mais precoce possível, para evitar complicações da
hipoventilação e da insuficiência respiratória restritiva com hipercapnia,
melhorando a qualidade do sono da paciente e suas trocas gasosas.
Dessa forma, poderia realizar suas atividades de vida diária e retardaria
a falência respiratória, condição na qual há total dependência da
ventilação, podendo ser indicada a traqueostomia.
Durante a avaliação fonoaudiológica, foram observados,
principalmente, os parâmetros de força, mobilidade e funcionalidade
das estruturas que compõem o sistema estomatognático e vocal:
- Lábios: apresentava tônus, força e mobilidade preservadas;
- Língua: manifestava diminuição de tônus e fasciculações. Conseguia
realizar movimentos de anteriorização, projeção e elevação. Não
conseguia vibrar;
- Bochechas: mobilidade e força prejudicadas, com amplitude de
movimento diminuída;
- Véu palatino: elevação insuficiente, com nasalidade compensatória;
- Voz: hipernasal, com valores de sustentação de vogais na média de
15 segundos, mas já sem conseguir realizar a sustentação dos fonemas
fricativos S e Z;
- Articulação: fala lentificada, com imprecisão articulatória dos fonemas
fricativos e prosódia prejudicada. No entanto, ainda inteligível para o
processo de comunicação;
- Mastigação: pouca lateralização de mandíbula, com predomínio do
padrão vertical. Relatava dor em região de masseteres;
- Deglutição: disfagia para líquidos, com engasgos esporádicos. Nível
6 da escala de FOIS;
86
- Tosse: forte e eficaz.
Com a evolução do quadro, foram observadas as seguintes
características:
- Diminuição da força e mobilidade de bochechas, lábios e língua;
-Aumento da imprecisão articulatória, com consequente diminuição
da inteligibilidade da fala;
- Prosódia extremamente prejudicada, com prejuízo da compreensão
da fala pelo ouvinte;
- Articulação lenta e laborosa;
- Diminuição do tempo de emissão de vogais sustentadas, com valores
abaixo de 10 segundos, com aumento da fadiga, nasalidade e soprosidade
vocal;
- Disfagia para alimentos líquidos e sólidos, alimentando-se
exclusivamente da consistência pastosa fina e utilizando espessante
para líquidos. Estando no nível 4 da escala de FOIS;
- Tosse: fraca e ineficaz, com diminuição da força e adução glóticas.
Orientações para exercícios, manobras compensatórias, posturais
e adaptações na consistência e padrão da dieta foram feitas junto à
paciente e cuidadores. Em função do aumento da sialorreia, também
passou a utilizar atropina em gotas na cavidade oral.
X foi acompanhada por quase um ano na Psicologia. Houve
preocupação pelo fato de estar recomeçando um processo terapêutico,
pois a paciente já vinha sendo atendida por outra colega. Preocupação
porque várias situações teriam que ser revistas. Situações já exploradas e
ultrapassadas ou não. Foi encontrada então uma mulher bem cuidada,
vaidosa, maquiada, sorridente e muito disponível a um trabalho
psicoterapêutico.
Atender um indivíduo com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA),
assim como em todas as doenças limitantes e incapacitantes, mais
especificamente as neurodegenerativas, configura-se em processo às
87
vezes longo, muitas vezes não, mas, com certeza, de muito sofrimento.
Lidar com a impotência causa muita angústia e com a finitude muito
medo. Como atender um ser humano que assiste sua independência ir
embora paulatinamente? Como acolher essa dor e esse medo e devolver
algo reconfortante?
Kübler-ross (1998) em seu livro Sobre a morte e o morrer, nos fala
sobre estágios pelos quais os pacientes terminais podem passar, são eles:
Negação/isolamento, raiva, barganha, depressão, aceitação e esperança.
Não há uma ordem para vivenciá-las e nem todos passam por todas
as fases. Cada indivíduo experimenta cada estágio de acordo com o
seu aparato emocional.
Na paciente, foi encontrada aceitação e muita esperança, apesar da
plena consciência de que a possibilidade de vencer a ELA era remota,
para não dizer impossível, o que nos reporta a uma aceitação imbuída
de esperança.
Até mesmo os mais conformados, os mais realistas, deixavam aberta a
possibilidade de alguma cura, de que fosse descoberto um novo produto,
ou de que tivesse “êxito um projeto recente de pesquisa. (KÜBLER-
ROSS, 1998, p. 144)
88
Existiram momentos de muita reflexão, emoção, dor, tristeza,
sonho e esperança. Não havia lamentos, mas existiam perguntas:
Por quê? foi uma delas, mas que logo se transformou em Para quê?.
Devido a sua religiosidade, via os acontecimentos com o propósito,
não sabia qual, mas criava, sentia que tinha que haver. Dessa forma, a
vida apenas parecia se esvair do seu corpo porque o seu espírito estava
sempre vívido.
No início das sessões de Terapia Ocupacional, X apresentava muitos
questionamentos e muitas dúvidas, tornando os encontros sempre
momentos para reflexões. Seu desempenho ocupacional foi avaliado e
junto à paciente foram eleitas metas a curto, médio e longo prazo. Os
instrumentos aplicados possibilitaram uma visão global da paciente,
de forma objetiva, somada à percepção subjetiva durante a terapia.
As escalas utilizadas averiguaram funcionalidade – Escala Funcional
Revisada da Esclerose Lateral Amiotrófica: ALSFRS-R (GUEDES
et al., 2010), sintomas depressivos e ansiosos – Escala Hospitalar de
Ansiedade e Depressão: HADS (BOTEGA et al., 1995), qualidade
de vida – Questionário de Avaliação da Esclerose Lateral Amiotrófica:
ALSAQ-40 (PAVAN et al., 2010) e percepção da doença – Questionário
Breve de Percepção da Doença: BRIEF-IPQ (NOGUEIRA, 2012).
X apresentava sua autonomia preservada, porém demonstrava
dependência para as Atividades Avançadas de Vida Diária (AAVD) e
semidependência para as Atividades Instrumentais e Básicas de Vida
Diária (AIVD e ABVD). Com o passar dos meses, as limitações motora
e respiratória foram evoluindo, deixando-a dependente também nas
AIVD e ABVD, apesar de continuar gerindo sua vida.
A participação da família foi crucial para o bem-estar de X;
cuidadores bem envolvidos e que tentavam também se cuidar para
colaborar da melhor forma. Havia um revezamento entre os familiares
89
para acompanhar a paciente durante as consultas da equipe, como
também participavam dos encontros no grupo de cuidadores.
A curto prazo, houve o treino cognitivo (tendo em vista que a
paciente apresentava queixas de esquecimento decorrentes do seu estado
emocional), estruturação de rotina, correções posturais, controle de
câimbras em membros superiores (através de adaptações em utensílios
para alimentação) e orientações sobre conservação de energia durante
a realização das suas atividades diárias.
A médio prazo, foram realizadas mudanças ambientais com adaptações
de móveis para garantir segurança, permanência da conservação de
energia durante os movimentos e posturas adequadas para evitar dor.
A longo prazo, fomos em busca da concretização de um dos seus
projetos de vida: escrever um livro. Durante as sessões foi eleito o
tema da escrita e planejadas as etapas. À medida que o projeto era
desenvolvido, uma diversidade de sentimentos eram colocados em prova
e assim, discutidos na terapia. X tinha escolhido narrar a descoberta
da sua doença como forma de ajudar outras pessoas que receberam o
mesmo diagnóstico ou que ainda estavam em peregrinação. O livro
tornou-se então um projeto com proporções bem maiores, pois além
de ajudar outras pessoas e a si mesma, a paciente teve a confirmação
do quanto ela era querida e respeitada em seu meio. A comunidade
em que residia, como também seus amigos e amigas se uniram para
que pudesse ocorrer a publicação.
O livro foi lançado em um Simpósio organizado pela Equipe ELA
Huoc e, apesar da dificuldade para escrever, X pôde autografar sua obra.
Este foi o último momento de encontro da paciente com a equipe. Já
não andava, nem falava com clareza; mas, como sempre, estava bem
cuidada e arrumada. Bem mais debilitada, porém com aquele mesmo
olhar repleto de vida.
90
Quando questionam à equipe quem foi X, a resposta se torna
única: era mãe, avó, filha, profissional, parceira, esposa. Coordenava
grupos de adolescentes e de mulheres, ensinando-lhes artesanato com
recicláveis. Era Agente de Saúde, uma mulher atuante, ciente dos seus
direitos e consciente dos seus desejos. Uma pessoa que nos ensinou a
respeitar nossos limites, mas não nos tornar prisioneiros deles!
91
Referências:
92
NOGUEIRA, Jane Walkiria da Silva; RODRIGUES, Maria Cristina
Soares. Comunicação efetiva no trabalho em equipe em saúde: um
desafio para a segurança do paciente. Cogitare Enfermagem, [s.l.],
v. 20, n. 3, p.636-640, 23 set. 2015.
93
9 - CUIDADOS PALIATIVOS EM PESSOAS COM ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA
Deise Gonçalves do Nascimento
José Anchieta de Brito
Mirla Oliveira Santos Medeiros
94
Assim sendo, o Termo Cuidado Paliativo (CP) já difundido no
Canadá, foi adotado em 1990, pela OMS, sendo revisado e substituído
em 2002 e mantido até os dias atuais como sendo uma abordagem que
promove a melhoria da qualidade de vida dos pacientes e das famílias
que enfrentam problemas relacionados a doenças ameaçadoras da vida.
Isso acontece através da prevenção, alívio do sofrimento e por meio da
identificação precoce, avaliação e tratamento preciso da dor e outros
sintomas de ordem física, psicossocial e espiritual (CREMESP, 2008;
MACIEL; RODRIGUES; NAYLOR, 2006; WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2002).
O CP prioriza o alívio e o conforto dos sintomas, preferencialmente
se estes ainda não forem perceptíveis. O conhecimento da patologia,
a avaliação precoce e a integração equipe-paciente-família fazem
com que essa realidade seja possível. Durante o curso da doença a
capacidade de comunicar-se é essencial para manutenção da autonomia
do paciente, sendo a escuta uma ferramenta na implementação do
cuidado. Os sinais e sintomas apresentados pelo paciente com ELA são
mensagens que precisam ser decodificadas e interpretadas no tempo
certo (CONNOLLY; GALVIN; HARDIMAN, 2015; DALVA, 2012;
ORSINI et al., 2011).
O paciente com ELA pode apresentar uma variedade de sintomas,
tais como: dor, sarcopenia, hiporreflexia, hipotonia, fraqueza muscular,
fadiga, fasciculações, espasticidade, estresse psicossocial, distúrbios do
sono, disartria, disfagia, sialorréia, labilidade emocional e disfunção
respiratória. Portanto a necessidade da atuação de uma equipe
multidisciplinar em cuidados paliativos, quando bem treinada, contribui
de forma efetiva para o alívio dos sintomas, de modo a facilitar a
compreensão da família/paciente acerca da possibilidade de uma boa
qualidade de morte, buscando reduzir iatrogenias, possibilitando o
alívio do sofrimento de qualquer natureza e auxiliando na tomada de
95
decisões difíceis (DALVA, 2012; MARTINS et al., 2013; ROCHA
et al., 2013; SOUZA et al., 2015).
97
vida, as constantes reavaliações para ajuste de medicamentos e de todo o
plano de cuidado, com enfoque individualizado nas intervenções, suprir
as necessidades do paciente sempre reafirmando a vida e respeitando
o processo natural de morte (CREMESP, 2008).
98
Referências
99
HENNEMANN-KRAUS, Lilian. Dor no Fim da Vida: Avaliar
para Tratar. Revista do Hospital Universitário Pedro Ernesto,
Rio de Janeiro, p.26-31, 2012.
100
ROCHA, KP et al. A importância de se conhecer a Esclerose Lateral
Amiotrofica (ELA): uma revisão bibliografica. In: XIII Safety,
Health and Environment World Congress, 2013, Porto. Porto:
Copec, 2013. p. 7 - 10.
101
10 - PERFIL DE UM GRUPO DE CUIDADORES DE PESSOAS COM ES-
CLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Lilian Maria Sanguinett de Almeida
Ilka Veras Falcão
Tatiana Lins Carvalho
102
O questionário utilizado na pesquisa avaliou as variáveis
sociodemográficas e de condições de vida dos cuidadores. Este identificou
idade, sexo, grau de parentesco, coabitação com o paciente, escolaridade
e a pessoa responsável pela renda.
Há carência na literatura científica de estudos sobre a temática,
relacionando cuidadores especificamente de pessoas com ELA.
103
um dos entrevistados homem. Em relação ao grau de parentesco, três
são cônjuges dos pacientes, seguido de duas filhas e duas cunhadas.
Tradicionalmente, cuidar dos indivíduos que possuem alguma
incapacidade, principalmente daqueles que fazem parte do círculo
familiar, tem sido uma responsabilidade das mulheres (BOLSONI-
SILVA; PAIVA; BARBOSA, 2009; BURKE et al., 2015; MATOS et
al., 2011; PICHON et al., 2013; WEGNER; PEDRO, 2010), porém,
apesar da literatura corroborar com os achados do estudo, também se
sabe que o número de homens que desempenham o papel de cuidador
vem crescendo, deixando de participar apenas como provedor financeiro
(BORGES, 2003; DUCA; THUMÉ; HALLAL, 2011; MARQUES
et al., 2011).
Estudos que identificam o homem e marido como cuidador
(BORGHI et al., 2013; FALLER et al., 2012), observam que quando
é a mulher que adoece, o marido e filhos homens somente assumem a
função de cuidador se não houver uma mulher, geralmente uma filha,
para assumir esse papel. Os autores denominam o homem nesse caso
como “cuidado a revelia”, indicando que não foi uma opção. Essa
condição é explicada culturalmente pelo papel central atribuído à
mulher no cuidado e ainda porque, culturalmente, o homem possui
o papel de provedor e é quem assume tarefas extra-domiciliares como
comprar remédios, transportar para o serviço de saúde, pagar contas,
convênios e outras (SILVA; SANTANA, 2014; WEGNER; PEDRO,
2010).
104
Tabela 1: Caracterização sociodemográfica dos 8 cuidadores participantes do Grupo
Esperança para ELA, Recife/PE, novembro-dezembro/2014.
VARIÁVEL n (%)
SEXO
Masculino 1 (12,5)
Feminino 7 (87,5)
IDADE
Menos de 40 anos 3 (37,5)
40 a 59 anos 4 (50,0)
60 anos e mais 1 (12,5)
TIPO DE CUIDADOR
Informal
Cônjuge 3 (37,5)
Filha/filho 2 (25,0)
Cunhada 2 (25,0)
Formal 1 (12,5)
ESCOLARIDADE
Ens. Fund. Incompleto 1 (12,5)
Ens. Médio Completo 3 (37,5)
Ens. Superior Completo 3 (37,5)
Pós-graduação 1 (12,5)
POSSUEM RENDA
Cuidador - Gerador de renda 1 (12,5)
Paciente - Gerador de renda 3 (37,5)
Cuidador com renda independente 4 (50,0)
105
Dentre os entrevistados, apenas uma se encaixava na categoria de
cuidadora formal (CF), contratada para cuidar. Dessa forma não residia
junto ao paciente e, ao fim do seu turno de trabalho, retornava a sua
própria casa. Outros 2 cuidadores, embora familiares, também não
residiam junto ao paciente. Portanto, dos 8 entrevistados, 5 coabitam
com os pacientes. Situação essa que pode gerar níveis elevados de tensão
pela grande exposição aos efeitos do processo de cuidar vivenciado
diariamente.
Para Andrade et al. (2009) e Fava, Silva e Silva (2014), com
relação à pessoa que cuida, a literatura mostra que há distinção entre
o cuidador formal, caracterizado como o profissional de saúde que
faz uma preparação acadêmica para tal e o cuidador informal, que
é o familiar ou amigo solicitado a fornecer cuidados ao paciente.
Segundo Duca, Thumé e Hallal (2011) e Silva e Santana (2014)
cerca de 90% dos cuidadores são familiares, amigos ou vizinhos, e
somente 10% correspondem aos chamados “cuidadores formais”, pagos
ou contratados. Ainda existindo o cuidador social, que conforme a
Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) (MTE, 2002) se refere
àqueles que cuidam a partir de objetivos estabelecidos por instituições
especializadas, ou responsáveis diretos, zelando pelo bem-estar, saúde,
alimentação, higiene pessoal, educação, cultura, recreação e lazer da
pessoa assistida (CREPALDI et al., 2006).
A necessidade de solicitar um cuidador formal pode partir de
algumas tendências da família atual, como o número cada vez menor de
filhos e o fato de que geralmente a maioria dos membros trabalha fora
de casa e contribui economicamente para a renda familiar, enquanto
que o processo de cuidado familiar sempre existiu. Entretanto, esse
papel só tem sido legitimado como tal mais recentemente. Assumir o
cuidado de um membro da família, que até então era independente,
pode suscitar inúmeros sentimentos paradoxais nas famílias, que
106
envolvem tanto retribuição e gratidão, quanto angústia, dúvidas e
raiva (BATISTA et al., 2013; SILVA; SANTANA, 2014).
Um aspecto importante destacado no estudo de Borges (2003), com
cuidadores de pacientes com ELA, e para o qual os profissionais devem
estar atentos é a qualidade anterior dos laços afetivos e familiares. A
autora alerta que mesmo diante de uma doença grave e incapacitante,
como a ELA, a solidariedade do cuidado nem sempre é espontânea
e pode ser difícil resgatar compromissos e afetos para o cuidado. Ser
cuidador, portanto, tem uma representação diferenciada para cada
pessoa.
Quanto ao parentesco, foram identificados: dois cônjuges, duas
filha(o)s e duas cunhada(o)s; um resultado praticamente equivalente.
Isso reflete também em dados da literatura, na qual o tipo de parentesco
constitui uma variável que tem apresentado resultados contraditórios
(BOLSONI-SILVA; PAIVA; BARBOSA, 2009; SALVIONI et al.,
2014).
O perfil do cuidador constitui-se em uma rede autônoma e geralmente
desintegrada dos serviços de saúde, carente de orientações e suporte
dos profissionais de saúde. Sendo assim, é de suma importância a
ampliação de ações que tenham o cuidador como sujeito principal, para
que essa atividade seja reconhecida e investida em práticas adequadas,
trazendo benefícios para quem cuida e quem é cuidado (NOLASCO,
2013).
107
Conclusão
108
Referências
109
CREPALDI, MA et al. A participação do pai nos cuidados da
criança, segundo a concepção das mães. Psicologia Estudada, [s.i.],
v. 3, n. 11, p.579-87, 2006.
110
MTE. Classificação Brasileira de Ocupações - CBO: Estrutura,
tábua de conversão e índice de títulos. Brasília: SPPE, v. 3, 2002.
215 p.
111
SILVA, Rosa MFM e; SANTANA, Rosimere F. Diagnóstico de
enfermagem: revisão integrativa. Revista Brasileira de Geriatria
e Gerontologia, Rio de Janeiro, v. 17, n. 4, p.887-896, dez. 2014.
113
11 - LESÃO POR PRESSÃO EM pessoas com ESCLEROSE LATERAL
AMIOTRÓFICA (ELA)
Gerluce Araújo Silva de Souza Monteiro
Na Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), os neurônios são degenerados
progressivamente fazendo com que a pessoa perca a capacidade de
realizar movimentos voluntários ao longo do tempo, com isso, ela
perde o movimento dos braços e pernas. A pressão constante exercida
no corpo pela cadeira e/ou pelo leito, forma lesões na pele e nos tecidos
subjacentes chamadas de lesões por pressão (LPP) anteriormente
chamadas de úlceras por pressão (UPP); vulgarmente e erroneamente
chamadas de escaras (que são placas enegrecidas decorrente da pressão
e/ou cisalhamento que pode ocorrer em qualquer área do corpo). São
definidas como lesões de pele ou partes moles originadas basicamente
de isquemia tecidual prolongada e causadas por fatores intrínsecos e
extrínsecos ao paciente, dependendo da profundidade da lesão, podem
levar a complicações como a osteomielite e a septicemia culminando
no óbito. Sua incidência e prevalência são altas, mobilizando paciente,
familiares e instituições de saúde. Os principais fatores para o seu
desenvolvimento são a pressão e a fricção, sendo sua prevenção mais
eficaz e economicamente viável que seu tratamento.
As LPP têm impacto negativo na vida diária dos pacientes acamados
e/ou com restrição de movimentos, podendo causar danos incalculáveis
em termos de dor e sofrimento, além do alto custo para a instituição
com internações e tratamentos.
A prevenção da LPP consiste em manter a pele seca, limpa e
hidratada; mudar a posição do paciente na cadeira e/ou no leito com
frequência e observar o surgimento de ferimentos e outras lesões
na pele. Apesar dos avanços científicos, tecnológicos e os recursos
114
utilizados para prevenção e tratamento das LPP, essa complicação
ainda representa uma importante causa de morbidade e mortalidade
de pacientes tratados nos hospitais e na assistência domiciliar.
Segundo as organizações internacionais European Pressure Ulcer
Advisory Panel and National Pressure Ulcer Advisory Panel (2014),
as LPP são definidas como uma lesão localizada na pele ou tecidos
adjacentes, normalmente sobre uma proeminência óssea, secundária
a um aumento da pressão externa ou pressão em combinação com
cisalhamento. Gradualmente, instala-se um processo isquêmico que
resulta em uma lesão na pele.
Irion (2005), relata que a compressão prejudica o fornecimento
de sangue ao tecido, levando à insuficiência vascular, anóxia do tecido
e morte das células. Qualquer posição mantida por um paciente
durante um longo período de tempo pode provocar lesão tecidual,
principalmente nas áreas que sobrepõe uma proeminência óssea, devido
à presença de pouco tecido subcutâneo nessas regiões. A compressão
nessas áreas diminui o fluxo sanguíneo local facilitando o surgimento
de lesão por isquemia tecidual e necrose.
Declair (2002), afirma que nos Estados Unidos em média 2,1
milhões de pessoas apresentam LPP no ano, equivalendo a um custo
hospitalar mensal de 4 a 7 mil dólares por paciente; ainda segundo a
autora, no Brasil não existem estatísticas do número de pacientes que
desenvolvem LPP, pois os casos não são registrados ou notificados a
um órgão responsável.
Santos (2007), reafirma que a real dimensão do problema dos
pacientes com LPP no Brasil ainda é desconhecida, visto que o registro
do agravo e a obtenção da taxa de ocorrência (prevalência e incidência)
ainda são pouco frequentes ou são subnotificados.
Segundo Costa (2003), as LPP têm prevalência e incidência elevada
nos tratamentos agudos e de longo prazo nos pacientes hospitalizados
115
e/ou acamados, pois as LPP podem se desenvolver em 24 horas ou
espaçar até 5 dias para sua manifestação.
Smeltzer e Bare (2005) informam que os pacientes de maior risco
para desenvolverem LPP são aqueles com dificuldades sensoriais ou
motoras, imobilidade, atrofia muscular (como ocorre nos pacientes
com ELA) e nos que apresentam redução do acolchoamento entre a
pele sobreposta e o osso subjacente.
Segundo Delisa e Gans (2002), o desenvolvimento das LPP são
multifatoriais, incluindo elementos internos e externos. Os fatores
internos são: idade, morbidade, estado nutricional, hidratação, condições
de mobilidade e nível de consciência. Os fatores externos são: pressão,
cisalhamento, fricção e umidade aos quais os pacientes estão submetidos
quando acamados ou em cadeiras. Outros fatores como traumatismos,
infecção, incontinência urinária e fecal, também contribuem para
aumentar, tanto a incidência, quanto o agravamento das LPP nesses
pacientes. Apesar da LPP ser um fenômeno multifatorial, as principais
variáveis envolvidas no seu desenvolvimento são o tempo e a intensidade
da pressão ou seja, pequena pressão por longos períodos ou grande
pressão por pouco tempo.
As autoras Delisa e Gans (2002) ainda informam que a pressão
capilar normal é de 32 mmHg, quando há uma pressão sobre as
proeminências ósseas em indivíduos acamados e/ou sentados, que
excede esse limite, o paciente desenvolve uma isquemia no local,
iniciando por uma hiperemia reativa, à medida que o corpo tenta
suprir o tecido carente de oxigênio. Os tecidos podem tolerar pressões
cíclicas muito mais altas que pressões constantes. Se a pressão for
aliviada intermitentemente a cada 3 a 5 minutos, pressões mais altas
podem ser toleradas.
116
Smeltzer e Bare (2005) afirmam que uma das metas mais importantes
para se obter uma boa recuperação do paciente é aliviar a pressão através
do reposicionamento frequente.
117
Delisa e Gans (2002), inferem que com a Idade, ocorre mudança
na síntese de colágeno que resulta em tecido com diminuição na
força mecânica e aumento na rigidez. Essa mudança acarreta ainda
a redução da capacidade do tecido de distribuir a pressão mantida
sobre ele, levando a um comprometimento do fluxo sanguíneo e,
consequentemente, ao aumento do risco de LPP.
Morton et al. (2007) diz que a umidade (urina e fezes) quando
não é controlada causa maceração (amolecimento) da pele, tornando-
se fácil a compressão, a fricção e o cisalhamento.
Brasil (2002) e Costa (2003), evidencia que o Fumo (nicotina)
reduz a hemoglobina funcional e causa disfunção pulmonar, privando
os tecidos de oxigenação, ou seja, produz efeitos no fluxo sanguíneo
provocando vasoconstrição, favorecendo a diminuição do aporte de
oxigênio e nutrientes para as células, aumentando a adesão de plaquetas.
Segundo Smeltzer e Bare (2005), na elevação da temperatura
corporal (hipertermia), a cada 1ºC, temos um aumento de 10%
no metabolismo tecidual favorecendo à desvitalização do tecido,
provocando sudorese levando à maceração da pele.
Declair (2002), afirma que deve haver atenção dos profissionais
quanto ao uso de roupas inadequadas no paciente e o atrito em superfície
de suporte (colchões).
Segundo Delisa e Gans (2002), a alteração no nível de consciência
acarreta perda da habilidade do paciente em detectar sensações álgicas.
O portador de ELA não apresenta dificuldades cognitivas.
Segundo Santos (2007), os locais de maior risco para LPP são as
regiões: occipital, escapular, cotovelo, sacral, ísquiática, trocantérica,
crista ilíaca, joelho, maléolo e calcâneo.
118
Classificação das LPP
119
LPP Estágio 4: Perda da pele em sua espessura total e perda tissular
com exposição ou palpação direta da fáscia, músculo, tendão, ligamento,
cartilagem ou osso. Necrose de liquefação ou coagulação pode estar
visível. Epíbole, descolamento e/ou túneis ocorrem frequentemente.
Quando a necrose de liquefação ou coagulação prejudicar a identificação
da extensão da perda tissular, deve-se classificá-la como LPP não
classificável.
Definições adicionais:
120
quanto à integridade da pele, desde a admissão com o uso da Escala de
Braden até os cuidados estabelecidos através de um plano assistencial
pautado nas necessidades individuais.
Conclusão
121
Referências
BACKES, D.S; GUEDES, S.M.B; RODRIGUES, Z.C. Prevenção
de úlceras de pressão: uma maneira barata e eficiente de cuidar.
Nursing. Rev. Técnica de enfermagem; Edição brasileira, São
Paulo, ano 2, n.9, p.22-27, fev. 1999.
122
JORGE, S.A.; DANTAS, S.R.P.E. Abordagem multiprofissional
do tratamento de feridas. São Paulo: Atheneu, 2003.
123
12 - ABORDAGEM ODONTOLÓGICA ÀS PESSOAS COM ESCLEROSE
LATERAL AMIOTRÓFICA
Julianelly Alves Biserra
José Anchieta de Brito
Mônica Moreira Dias da Cruz
124
terapêuticas integrais e efetivas, através da junção das diversas áreas de
atuação em saúde e suas formas de percepção individual (ACADEMIA
NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012; BLACKHALL,
2012). O cirurgião dentista, como parte integrante dessa prática, garante
a concretização de um cuidado em saúde bucal singular, fornecendo
intervenções próprias de sua área de atuação profissional, além de
cuidados de suporte que assegurem uma cavidade oral saudável, livre
de infecção e dor, contribuindo para o restabelecimento da saúde oral
e controle clínico de agravos (ASHER; ALFRED, 1993; SALVIONI
et al., 2009).
Manifestações orais
126
na ingestão de alimentos, alteração da autoimagem, dificuldade na
transmissão de sentimentos e emoções via expressões faciais, além da
predisposição a desordens bucais (ACADEMIA NACIONAL DE
CUIDADOS PALIATIVOS, 2012).
O déficit de saúde bucal desses pacientes, geralmente, está
relacionado com a presença excessiva de placa bacteriana, interligado
ao surgimento da cárie e de problemas periodontais que podem
levar à perda dos elementos dentários (ACADEMIA NACIONAL
DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012). Os principais problemas
odontológicos encontrados correlacionam-se com a deficiência no
controle do biofilme bucal consequente das incapacidades motoras
adquiridas no decorrer da doença. Destacam-se ainda, a má adaptação
e higienização de próteses, as lesões traumáticas e o efeito de hábitos
bucais deletérios (ASHER; ALFRED, 1993; AUSTIN et al., 2011).
A redução da placa bacteriana e, consequentemente, o risco de
infecções provenientes da microbiota bucal, assim como a adoção de
medidas de higiene minimizam as complicações orais e trazem benefícios
ao estado geral do paciente, incluindo o conforto (ACADEMIA
NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS, 2012), além de
juntamente com a intervenção odontológica favorecer a prevenção e/ou
melhora da condição sistêmica, diminuindo a incidência de infecções
e outros acometimentos (RABELO; QUEIROZ; SANTOS, 2010),
minimizando a dor total desses pacientes.
A adequação do meio bucal no intuito de causar melhoria na
fisiologia do sistema estomatognático e, principalmente, a orientação aos
próprios pacientes, aos familiares e aos cuidadores, quanto à preservação
da higiene bucal, por meio de técnicas de higienização adequada são
atribuições do cirurgião dentista. O planejamento do tratamento e
a manutenção das condições clínicas devem antecipar-se aos futuros
problemas de saúde bucal (MIRANDA et al., 2010).
127
Para isso avalia-se a capacidade que o paciente tem na promoção do
autocuidado, a fim de se desenvolverem alternativas para melhorar
a escovação dos dentes, incluindo indicações específicas de escova
dental (escovas elétricas ou com adaptações), de cremes dentais, de
colutórios bucais e, se possuírem prótese, orientar quanto aos cuidados
e à higienização, no intuito de prevenir infecções bucais e sistêmicas
(AUSTIN et al., 2011).
Os cuidadores devem estar capacitados à responsabilidade diária de
higienização bucal e a assumirem um papel de investigador das principais
informações sintomáticas da forma mais objetiva possível, no intuito
de serem facilitadores e participantes do cuidado juntamente com os
profissionais responsáveis, estabelecendo uma relação de confiança e
vínculo (ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS,
2012; SALVIONI et al., 2009).
Abordagem odontológica
Conclusão
129
Infelizmente as ações preventivas voltadas para promoção de saúde
e adequação do meio bucal em pacientes com ELA são escassas e
insuficientes, porém o cirurgião-dentista, como parte integrante de
uma linha de cuidado e atenção à saúde, tem como dever a busca
do conhecimento sobre os estágios e características da doença, além
de direcionar a atenção em saúde bucal de forma individualizada e
singular; uma vez que os agravos que acometem a cavidade bucal
podem proporcionar um declínio na qualidade de vida do paciente,
privando-o da ação do conforto e manutenção do bem estar.
130
Referências
131
PONTES, RT et al. Alterações da fonação e deglutição na Esclerose
Lateral Amiotrófica: Revisão de Literatura. Rev Neurocienc, [s.i.],
v. 1, n. 18, p.69-73, 2010.
132
13 - DIREITO À SAÚDE – JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS –
DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS PARA TRATAMENTO DA ELA:
Rebeca de Vasconcelos Barbosa
A abrangência protetiva dada pela Constituição Federal para o
direito à saúde mantém a ideologia de máxima efetividade de direitos
fundamentais, isto porque traz como nortes a descentralização e o
atendimento sob forma universal, gratuita e integral.
A descentralização decorre da repartição de competências, assim é
que quaisquer dos entes políticos (União, Estados e Municípios) têm
o dever de efetivar o direito à saúde, regulamentando o tema, criando
políticas públicas e concretizando-as.
Além disso, o atendimento universal informa que deve ser prestado
a todos aqueles que estejam em território brasileiro, incluindo até os
estrangeiros que apenas estejam por breve estadia ou de passagem. A
gratuidade indica que os serviços de saúde são não-contra-prestacionais,
assim não é necessário cumprir qualquer encargo ou ter prévia adesão,
todos, indistintamente integram e são protegidos pelo sistema. Por
fim, a integralidade indica que a saúde deve ser plenamente coberta,
abrangendo todos os vieses que compõe seu sistema, seja por meio
de atendimentos médicos prestados em urgência ou de forma clínica,
seja por meio dos atendimentos laboratoriais, o fornecimento de
órteses, próteses; serviços de “home care” e, inclusive, o fornecimento
de medicamentos.
A regulamentação da matéria é efetivada pela Lei n 8080/90, de 19
de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento
dos serviços correspondentes e dá outras providências.
133
A Lei 8080/90 contempla o direito em comento dentro do rol
daqueles definidos como fundamentais, cuja execução depende da
formulação de políticas públicas. Ademais, trouxe a positivação
do conceito amplo de saúde para abranger as áreas relacionadas à
alimentação, à moradia, ao saneamento básico, ao meio ambiente,
ao trabalho, à renda, à educação, à atividade física, ao transporte, ao
lazer e ao acesso aos bens e serviços essenciais; além disso, abrange as
condições de bem-estar físico, mental e social do ser humano.
A atuação estatal no setor em epígrafe é feita por órgãos e entes
da Administração Pública federal, estadual, distrital e municipal, por
meio do Sistema Único de Saúde (SUS), podendo a iniciativa privada
atuar de forma complementar.
No capítulo VIII – Da assistência terapêutica e da incorporação
de tecnologia em saúde - a Lei nº 8080/90 estabelece que a assistência
terapêutica deve ser integral consistindo, dentre outros, na dispensação
de medicamentos. Com vistas a padronizar a forma em que se efetuará
essa dispensação, as prescrições médicas devem ser efetuadas por meio
de protocolo clínico e, na falta destes, far-se-á com base nas relações
de medicamentos instituídas pelo gestor federal do SUS.
A Portaria nº. 3916/98, do Ministério da Saúde, estabelece a
Política Nacional de Medicamentos, indicando a dispensação de
2 (duas) espécies de medicamentos: essenciais básicos e de caráter
excepcional. Aqueles são responsáveis por satisfazer as necessidades
de saúde prioritárias da população, das quais devem ser acessíveis em
todos os momentos. Correspondem aos medicamentos mais simples e
de menor custo, estando organizados em uma lista nacional, exemplos:
medicamentos para hipertensão e diabetes. Já as medicações de caráter
excepcional, destinam-se ao tratamento de patologias especificas, que
atingem número limitado de pacientes e que apresentam alto custo, seja
134
em razão do valor unitário, seja em virtude da utilização por período
prolongado, é o caso da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA).
Destaque-se que a Portaria SAS/MS nº 1151, de 11 de novembro
de 2015 traz de forma expressa o fármaco Riluzol como medicação
indicada para o tratamento da ELA. Além disso, entre todas as condutas
terapêuticas não farmacológicas, o suporte ventilatório não invasivo,
nas suas modalidades, é a que mais aumenta a sobrevida e a qualidade
de vida do paciente com ELA, sendo, portanto, indicado o BIPAP
(Bilevel Positive Airway Pressure) para tal finalidade.
Veja-se, portanto, que o Riluzol e o BIPAP são expressamente
indicados para o tratamento da patologia em comento, assim é que
nos casos em que os mesmos não são dispensados ao paciente pela via
administrativa, a via judicial revela-se medida justa que não invade a
esfera de competência dos Poderes Legislativo e Executivo, visto que
a decisão do administrador público já foi devidamente tomada e o
socorro ao Poder Judiciário deve-se unicamente à omissão injusta.
Destaca-se que a saúde é decisão política fundamental que deve
ser executada essencialmente pelos Poderes Executivo e Legislativo e
a dispensação de medicamentos é uma das formas de tornar efetivo o
mencionado direito. Também nos moldes já indicados, a dispensação
de medicamentos e a atualização da lista SUS são feitas nos termos
descritos em lei (Lei nº. 8080/90 c/com Portaria nº. 3916/98, do
Ministério da Saúde).
A matéria – medicamentos – está contemplada na Constituição
Federal e em leis, com contornos detidamente definidos, mesmo
assim é possível identificar inúmeras decisões judiciais relacionadas
ao tema em debate, visando garantir imediatamente a dispensação
de medicamentos e mediatamente (e de sobrelevada importância) o
direito à saúde.
135
A judicialização da dispensação de medicamento ocorre
essencialmente por duas razões: o medicamento não está na lista SUS
ou, mesmo estando na mencionada lista, não está disponível ao usuário.
Além disso, é possível a judicialização com vistas à atualização das
medicações contempladas na dita lista. Utilizam-se ações individuais
e ações coletivas para judicializar o tema em análise.
Veja-se que no caso das medicações para tratamento da ELA, a
regulamentação é clara e a falta de dispensação do Riluzol e do BiPAP,
releva-se como patente omissão estatal, pois a medicação indicada e
contemplada para a patologia antes indicada não está disponível para
o usuário.
Destaca-se, a título de esclarecimento, que o BIPAP não é uma
medicação no sentido técnico da Medicina, mas para fins de solicitação
pela via judicial é incluído como “medicamento” tendo em vista
contribuir para o tratamento do peticionante.
Nas contendas judiciais que envolvem dispensação de medicamentos,
visualizam-se basicamente 2 (dois) tópicos que indicam supostamente
conflitos de interesses; o primeiro corresponde ao cotejo entre as políticas
públicas e a separação de poderes e o segundo indica um choque entre
os princípios da reserva do possível e o mínimo existencial. Vejamos.
O princípio da Separação de Poderes idealizado por Aristóteles
e sistematizado por Montesquieu indica que o Estado apresenta
essencialmente os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, com
funções específicas.
As políticas públicas são definidas essencialmente pelos Poderes
Executivo e Legislativo, mas não são incomuns decisões judiciais,
principalmente proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, que define e
impõe a dispensação judicial de medicamentos. Essas decisões ocorrem,
sobretudo, porque os poderes responsáveis pela efetivação constitucional
quedaram-se inerte e, numa omissão que afronta direitos fundamentais,
136
aquele(s) que necessita(m) da dispensação de medicamentos para
garantir a saúde, provocam o Judiciário por meio da ação e, por isso,
este poder tem o dever de decidir, sempre com foco, em primeira
análise, no texto constitucional, com ênfase nos direitos fundamentais
e na dignidade da pessoa humana.
Assim, as atuações do Poder Judiciário, que diante das omissões
dos demais poderes dispensam medicamentos, se coadunam com a
Constituição Federal, sem que se possa alegar ofensa ao Princípio
basilar da Separação de Poderes.
A Fazenda Pública, nas ações que envolvem definição pela via judicial
de políticas públicas, utiliza-se largamente do princípio da reserva do
possível para negar as prestações requeridas; tal entendimento foi
importado do direito alemão, cunhado pelo Tribunal Constitucional.
Indica que o indivíduo somente poderá solicitar do Estado prestações
razoáveis, visto que os recursos carreados pelos cofres públicos são
limitados e, por isso, não devem ser utilizados para cobrir situações
particulares solicitadas pelos cidadãos, mas sim orientar-se à satisfação
da população como um todo.
O mínimo existencial, por sua vez, corresponde à essência vital
de proteção constitucional, que no contexto da CF/88 corresponde
aos direitos fundamentais, inseridos no contexto de contemplação
da dignidade da pessoa humana. Seu conceito não é legal, mas a
jurisprudência do STF casualmente indica-o como aqueles inerentes
a todo ser humano.
Além disso, é importante pontuar que mínimo existencial para
uma sociedade como a alemã não se compara ao que é indicado para
a insipiente sociedade brasileira, por isso, feitas as ponderações, com
razoabilidade e proporcionalidade, vê-se que saúde é, e, de outra forma,
não pode ser interpretada como mínimo existencial.
137
Considerando que princípios são mandados de otimização (ALEXY,
2008) e que na aplicação da Constituição Federal deve-se buscar a
máxima efetividade, pondera-se reserva do possível e mínimo existencial,
aquela se rendendo a este quando a matéria entabulada é a dispensação
judicial de medicamentos, visto que a proteção aos cofres públicos se
rende à efetivação da saúde, como forma de garantir a vida e de forma
digna.
Assim é que nos casos em que são negadas a dispensação do Riluzol
e do BiPAP para os pacientes acometidos pela ELA não há que se
falar em ofensa à Separação dos Poderes – pois o próprio detentor do
poder de definir as políticas públicas escolheu tais medicações para
o aludido tratamento, essa escolha se depreende do texto da Portaria
SAS/MS nº 1151, de 11 de novembro de 2015.
Além disso, não há que se falar em reserva do possível, pois o
mínimo existencial no presente caso é notório, como forma de proteger
o direito fundamental à saúde e garantir um tratamento digno, em
atenção ao princípio vetor do ordenamento jurídico nacional, qual
seja: dignidade da pessoa humana.
Ante todo o exposto, revela-se justo, cristalino e juridicamente correto
a dispensação do Riluzol e do BiPAP para os pacientes acometidos pela
ELA pela via judicial nos casos em que o Estado se nega a concedê-los
pela via administrativa.
138
Para consultar...
- Artigos
BARROSO, Lr. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade
democrática. [syn]thesis, Rio de Janeiro, v. 5, n. 1, p.1-29, 2012
- Constituição
BRASIL. Constituição (1988). Constituição, de 5 de outubro de
1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília
- Lei
BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe Sobre As
Condições Para A Promoção, Proteção e Recuperação da Saúde, A
Organização e O Funcionamento dos Serviços Correspondentes
e Dá Outras Providências. Brasília
- Livros
ALEXY, R. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros,
2008. Tradução de: Virgílio Afonso da Silva.
139
processo saúde-doença. Rio de Janeiro: Epsjv, Fiocruz, 2007. p.
51-86
- Portaria
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria SAS/MS nº 1151, de
2015. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas: Esclerose
Lateral Amiotrófica. [S.l], 11 nov. 2015.
- Sítios eletrônicos
www.stf.jus.br
www.stj.jus.br
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.
CDNIMO+EXISTENCIAL%29&base=baseAcordaos&url=http://
tinyurl.com/mtvd6va. Visitado em 02 de maio de 2015.
140
14 - O PAPEL DO SERVIÇO SOCIAL JUNTO AOS PACIENTES E FAMILIARES
NO TRATAMENTO DE DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS NO SUS
Karla Maria Bandeira
141
de assistência social. Outra demanda recorrente é a articulação para
que os pacientes de ELA que não necessitam de cuidados hospitalares,
mas precisam de acompanhamento especializado em casa, solicitem
atendimento às Secretarias Municipais de Saúde, em sistema de atenção
domiciliar. Para tanto é necessário que o médico que acompanha
o paciente elabore laudo fundamentado, indicando os motivos da
necessidade do referido serviço.
A assistência domiciliar na área da saúde, hoje, já se constitui
como prática corrente e conhecida pelos profissionais da área, mas
assim como outras estratégias de atendimento, o que se percebe é a
falta de investimento por parte do poder público, mesmo que esta
modalidade de atendimento proporcione ao paciente permanecer
em seu ambiente doméstico, junto aos seus familiares e comunidade,
condição que acreditamos ser bastante positiva para o tratamento,
Para enfrentamento de dificuldades como a mencionada no parágrafo
anterior, é fundamental a articulação do assistente social conjuntamente
com os demais profissionais e familiares para garantir que o paciente
com diagnóstico de ELA possa realizar o tratamento mais adequado
possível.
Dentro da concepção de seguridade social, instituída pela Constituição
Federal de 1988, a saúde, notadamente, foi uma das áreas em que os
avanços constitucionais foram mais significativos. A referida norma
fundamental estabelece que “a saúde, no Brasil, é direito de todos e
dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas
que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário aos serviços para sua promoção, prevenção e
recuperação”. Um dos mais importantes princípios do Sistema Único
de Saúde (SUS) é a universalidade. Desta forma, pode-se afirmar
que todos os 204 milhões de Brasileiros dependem dele (utilizam-
no através de atendimento nos ESF (Estratégia Saúde da Família) e
142
PACS (Programa de Agentes Comunitários de Saúde), ou nas unidades
hospitalares, como também através do trabalho da vigilância sanitária
que inspeciona locais como: restaurantes, supermercados, salões de
beleza e etc (BRASIL, 1988).
O SUS no Brasil, apesar do caráter universal, recebe pouco
investimento, visto que são empregados apenas 3,6% do Produto
Interno Bruto (PIB) na sua manutenção, o menor percentual entre
os países que têm o mesmo sistema de saúde. Especialistas apontam
que para o sistema funcionar bem o ideal seria o país investir 8% do
PIB.
No âmbito da saúde pública, o que se percebe hoje é a existência de
dois projetos antagônicos, um em consonância com os ideais da Reforma
Sanitária e outro Privatista, que tem como maior expressão a expansão
deste setor dentro do SUS; como exemplo, temos a gestão de diversos
hospitais públicos por Organizações Sociais (OS). Uma das estratégias
de ação dos defensores do projeto privatista é a refilantropização das
políticas públicas, que nada mais é que a implementação de políticas
sociais, sob a orientação filantrópica, baseada na noção de dever moral
e na ação voluntária e benevolente, desconsiderando sua natureza de
políticas públicas, direito do cidadão e dever do Estado.
É no contexto da restauração do capital, na tentativa de superação da
crise do capital em crise, como Mészáros identifica, que as respostas à
questão social são modificadas pelo retrocesso posto pela égide neoliberal.
O acesso às políticas sociais passa a ser precarizado, mercantilizado e
reatualizado na mediação do favor, via voluntariado (SOARES, 2010).
144
parâmetros para Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde.
De acordo com este último documento ao/à Assistente Social compete:
145
Referências
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