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ADRIANA AKEMI KIKUCHI CALZAVARA

PLANEJAMENTO DO ESTUDO PARA A PERFORMANCE:


ETAPAS E ESTRUTURAÇÃO

Londrina 0
2014
ADRIANA AKEMI KIKUCHI CALZAVARA

PLANEJAMENTO DO ESTUDO PARA A PERFORMANCE:


ETAPAS E ESTRUTURAÇÃO

Artigo de Conclusão de Curso apresentado ao


Departamento de Música e Teatro da Universidade
Estadual de Londrina, como requisito parcial à
obtenção do título de especialista em Música –
Performance - Piano

Orientador: Prof. Me. Jailton Paulo de Jesus Santana

Londrina 1
2014
PLANEJAMENTO DO ESTUDO PARA A PERFORMANCE: ETAPAS E
ESTRUTURAÇÃO

Adriana Akemi Kikuchi Calzavara 1


Jailton Paulo de Jesus Santana 2

RESUMO: Este artigo propõe expor uma visão global do planejamento do estudo para a
performance, através do levantamento de etapas que podem ser consideradas na estruturação
deste planejamento e de estratégias de estudo com foco no piano, com base em sugestões da
literatura (considerando o que foi escrito sobre este tema em publicações brasileiras dos
últimos dez anos) e na experiência de um profissional que atua como pianista e docente na
área de práticas interpretativas. Entendemos que a articulação entre a literatura e a vivência do
profissional lançaram luz sobre a importância do conhecimento das várias etapas e estratégias
de estudo no momento de estruturar o planejamento do estudo para a performance, bem como
na compreensão de que devem ser consideradas as características individuais para garantir a
eficiência deste planejamento.

Palavras-chave: Performance. Estudo do piano. Preparação de repertório.

ABSTRACT: This article propose expose a global view of the planning study for
performance, by surveying stages that can be considered in the planning and structuring of
this and study strategies focusing on piano, based on suggestions from literature (considering
what was written about this theme in Brazilian publications in the last ten years) and
experience of a professional who acts as a pianist and teacher in the area of performance
practice. We understand that the relationship between literature and the experience of
professional, highlighted the importance of knowledge of the various stages and study
strategies at the time of structuring the planning study for the performance as well as the
understanding that should be considered individual characteristics for ensure the efficiency of
this planning.

keywords: Performance. Piano study. Repertoire preparation.

1. INTRODUÇÃO:

Quando se fala sobre o repertório erudito para piano, a cada nova obra a ser
interpretada, nós músicos (pianistas) nos deparamos com a sensação de ter um longo caminho
a percorrer desde o início do estudo até o momento da performance (a apresentação pública da
obra). Por muito tempo, a área de interpretação musical e performance foi conduzida de
1
Discente do Curso de Pós-Graduação Em Música – Performance - Piano.
2
Docente orientador do Curso de Pós-Graduação Em Música – Performance - Piano.
1
maneira empírica, isso desde o processo de formação do instrumentista, orientado por
professores que na maioria das vezes reproduziam o modelo educacional utilizado em sua
própria formação. Com a inclusão da música na pós-graduação strictu sensu, que segundo
Volpe (2010, p.16) ocorreu em 1980 na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a
área de práticas interpretativas começou a contribuir com a produção científica, mas levou
consigo algumas consequências dessa tradição baseada no pragmatismo.
Essa época também coincide com o avanço da área de psicologia cognitiva, que
possibilitaram a realização de pesquisas empíricas dentro da temática da performance
musical. Segundo Kaminsky (2012) o aumento significativo de pesquisas sobre a preparação
da performance ocorreu durante a segunda metade do século XX. A partir daí a pesquisa em
performance musical começa a adentrar outras áreas do conhecimento como a psicologia e as
neurociências.
Grosso (2006) considera que a área de práticas interpretativas sofreu o peso de uma
tradição onde as performances eram construídas mais pela imitação, intuição e pelo método
de tentativa e erro. Mas argumenta que na atualidade podemos contar com o apoio de um
pensamento estruturado, pesquisas, procedimentos e abordagens experimentais, para
fundamentar as nossas escolhas referentes a essa área.
Observando as falas destes autores, podemos dizer houve uma mudança de
concepção em relação à área de práticas interpretativas, na medida em que se saiu do
pragmatismo e passou a ser considerada tanto a possibilidade como a importância da
realização de pesquisas nessa área.
Mesmo com essa mudança de concepção e com o aumento da produção intelectual
nessa área, Borém (2006, p.51) afirma que “ainda predomina a prática instrumental repetitiva,
exaustiva, aleatória e não consciente, onde os erros muitas vezes não são antecipados ou
controlados”. E o mesmo autor considera que ainda hoje ocorre um descompasso entre a
quantidade e a qualidade da pesquisa realizada na área das práticas interpretativas e as outras
áreas de música (BORÉM, 2012, p.160). Segundo Monteiro (2011, p.1270), esta realidade
pode ser justificada se levarmos em conta que:

A entrada da música na academia é relativamente recente, e a consequente


necessidade de se seguir os critérios de produção bibliográfica aos quais são
submetidas outras áreas de conhecimento tropeça na falta de exemplos de trabalhos
dessa natureza, tendo em vista a pouca tradição de intérpretes registrarem as etapas
de preparação e estudo pelas quais passam durante o aprendizado de uma obra,
assim como suas conclusões.

2
No início do texto foi feita uma analogia, comparando o processo de estudo à
performance de uma obra musical com um caminho. Podemos afirmar que o mesmo não é
trilhado por uma trajetória definida, e nem alcança o mesmo ponto de chegada. Isso ocorre
porque, como afirma Barros (2008), o resultado final do processo de preparação de um
repertório pianístico que culmina com sua apresentação depende incondicionalmente do
trabalho precedente, que segundo Guerchfeld (apud MILANI; SANTIAGO, 2010, p.145-146)
possui várias etapas.
A esse respeito, Schmalfeldt (apud MILANI; SANTIAGO, 2010, p.158) também
afirma que “a realidade da performance força uma realização de escolhas que devem ser feitas
dentre alternativas apropriadas para cada questão dada”. Falando sobre o mesmo assunto, a
preparação de uma obra até a performance, Monteiro (2011, p.1270) afirma que é um
processo pessoal e portanto diferente pra cada indivíduo. Segundo o autor:

Há desde os que se ocupam em refletir muito sobre suas escolhas, até aqueles que
não o fazem com tanta intensidade; há os que se dedicam mais ou menos às questões
motoras; aqueles que estudam em demasia ou menos do que gostariam; os que
assumem mais ou menos riscos, etc. Não obstante, quaisquer que sejam as
características de cada um, o resultado final é sempre fruto de escolhas sucessivas.
Cada ato presente em uma performance exclui a possibilidade de inúmeros outros,
“melhores”, “piores” ou apenas “diferentes”, mesmo que minimamente distintos
(MONTEIRO, 2011, p.1270).

Consideramos então o caminho do estudo à performance como tendo diversas


bifurcações. A cada etapa deste caminho, devemos fazer escolhas, que irão levar a novas
etapas e novas escolhas, sendo que das decisões tomadas dentre as diversas opções depende a
qualidade da nossa performance final: o ponto de chegada será um tipo de performance
diferente em cada caso.
Ao levarmos em conta tudo o que foi exposto até o momento, podemos observar que
temos dois pontos importantes a serem considerados. O primeiro é o fato de que somos
herdeiros de uma tradição em que as performances eram construídas mais de maneira prática
do que com auxílio de alguma fundamentação científica, característica que perpassa ainda
hoje a nossa realidade. O segundo são as considerações acerca da relação entre o processo de
estruturação de um plano de performance (seleção de etapas) e as escolhas realizadas dentre
alternativas para cada etapa com a qualidade dessa performance ao final.
Considerando estes dois pontos, percebemos que no decorrer deste processo, seja na
estruturação desse planejamento, no momento de elencar elementos importantes que serão
considerados como etapas, ou mesmo na hora de justificar escolhas, dentre as alternativas

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possíveis para cada uma destas etapas, muitas dúvidas podem surgir. Monteiro (2011, p.1270)
afirma que: “quando presenciamos uma performance musical, o que testemunhamos é o
resultado final de todo um processo de estudo e preparação que nem sempre deixa rastros
claros de suas várias etapas”.
Para este artigo, estamos nos referindo à performance como o momento da
apresentação pública da obra, em acordo com o conceito proposto por Zumthor (apud
ALMEIDA, 2011, p.64) referindo-se à poesia: “performance é o ato presente e imediato de
comunicação e materialização de um enunciado poético, ato que requer além do texto – e
portanto de seu(s) autor(es) – intérprete e ouvinte”. Já o termo planejamento do estudo para a
performance está considerando o processo de preparação de uma obra musical, desde o
primeiro contato até o momento da apresentação pública.
Olhando por essa perspectiva, vejo que existe uma lacuna que justifica um trabalho
de pesquisa com o objetivo de lançar luz sobre o planejamento do estudo para a performance
no piano, com base em sugestões da literatura e o depoimento de um profissional que atue
tanto como pianista como na docência dentro da área de práticas interpretativas, e portanto
tem ampla experiência em lidar com esse assunto, seja pela sua própria prática ou por ter que
trabalhar isso com os alunos.
Algumas questões vão ser consideradas ao longo deste artigo. Que etapas são
importantes por proporcionar fundamentação e coerência para a performance? Quais são as
estratégias que comprovadamente podem tornar o estudo mais eficaz (no sentido de trazer um
melhor resultado em um período menor de tempo)? O que diz a literatura a esse respeito? E o
profissional, de que forma estrutura o planejamento de sua própria performance? E como trata
disso com seus alunos?

2. METODOLOGIA

A metodologia escolhida para este artigo foi a abordagem qualitativa de caráter


exploratório, com a finalidade de proporcionar e interligar informações sobre o planejamento
da performance, vindas da literatura e da experiência de um pianista e docente que lida com o
assunto.
Os procedimentos técnicos escolhidos foram dois. Primeiramente realizou-se o
levantamento bibliográfico das sugestões, ideias e experiências de autores reconhecidos no
campo dessa pesquisa. A seguir, a pesquisa de campo, tendo como instrumento de

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levantamento de dados a entrevista.
O passo a passo metodológico foi o seguinte:
a) Levantamento dos trabalhos que falam sobre o planejamento da performance
ou algum de seus elementos, em publicações brasileiras dos últimos dez anos. Foram
levados em consideração: artigos publicados nas revistas científicas de música - Per Musi,
Opus,Música Hodie, Debates, Ictus, Brasiliana, Colóquio e Claves; alguns trabalhos de
pesquisa (teses e dissertações) na área de práticas interpretativas; anais da ANPPOM
(Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Música), do SIMCAM (Simpósio de
Cognição e Artes Musicais) e do SIMPOM (Simpósio Brasileiro de Pós-Graduandos em
Música).
b) Deste levantamento, foram elencadas as etapas consideradas importantes no
planejamento da performance, inclusive utilizando para denominar as etapas a terminologia
dos próprios autores, quando for o caso. A explanação sobre a literatura foi feita por itens, a
partir das sugestões levantadas sendo assim, não há uma organização das etapas em ordem
cronológica, nem a necessidade de incluir todas elas na estruturação do plano de estudo. Em
relação às estratégias de estudo, foram consideradas somente as que se referem ao piano.
c) Levantamento de dados a respeito do planejamento do estudo para a
performance, realizado através de entrevista aplicada a um pianista e docente da área de
práticas interpretativas.
d) Análise dos dados obtidos, discussão e conclusões.

3. PESQUISAS SOBRE O PLANEJAMENTO DA PERFORMANCE

Dos trabalhos que discorrem sobre o tema de interesse deste artigo, alguns falam
especificamente sobre o planejamento do estudo para a performance, outros focam em algum
ponto deste processo.
Os trabalhos mais específicos, que descrevem de alguma maneira as etapas
percorridas dentro da preparação completa de uma obra, desde o primeiro contato até a
performance, são os seguintes (utilizando as terminologias dos autores):
a) Santiago et al (2009) - Não falam sobre uma obra específica, mas elencam as
etapas dentro do processo de construção da performance: Aquecimento (considerando como
“aquecimento” tanto exercícios de alongamento como exercícios de técnica, como escalas,
arpejos, etc); Análise (incluindo análise de elementos formais e estruturais bem como a
contextualização da obra); Estruturação do pensamento (seriam exemplos de estruturação do
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pensamento: a utilização da forma como fonte de observação de semelhanças e contrastes; a
estruturação harmônica,o fraseado, contorno melódico e os ritmos; o reconhecimento da
forma, dentre outros) e o Enfrentamento de dificuldades (seriam as estratégias de estudo)
b) Monteiro (2011) - Neste trabalho, as etapas elencadas pelo autor são: Leitura
da partitura em seus mínimos detalhes; Domínio das dificuldades técnicas; Memorização;
Escuta de gravações da obra (como estratégia de amadurecimento da obra); Leitura de
bibliografia sobre a obra; Análise.
c) Kaminsky (2012) - Para este autor, as etapas presentes na construção de uma
performance musical são: Definição de metas e objetivos (para as sessões de estudo);
Agendamento e planejamento (como um plano de estudos diário ou semanal, para atingir o
objetivo pretendido, por exemplo); Escolha das digitações (o instrumento a que se refere a
pesquisa é o violão); Resolução das dificuldades motoras (seriam as estratégias de estudo) e
Memorização.
Outros autores ainda falam sobre a construção da performance em nível de expertise.
Segundo Alves (2013, p. 58) o termo expertise está relacionado à capacidade de desempenhar
uma tarefa particular com alto grau de desempenho e qualidade, sendo que a expertise em
música “pode ser construída a partir de ‘prática deliberada’ qualitativa e quantitativamente
eficiente, com metas bem elaboradas, objetivos específicos e um plano global de visão dos
resultados, com a finalidade de aprimorar os resultados da performance”, tudo isso ao longo
de anos de estudo intensivo.
No presente artigo, conforme explicitado anteriormente considerou-se o
planejamento do estudo para a performance em um espaço de tempo relativamente curto, que
seria a preparação de uma obra, desde o contato inicial até o momento da apresentação. Mas
olhando por outra perspectiva, considerando a somatória do trabalho realizado no estudo de
várias obras, a longo prazo, podemos dizer que muitas das etapas apresentadas neste trabalho
contribuem sim para a preparação/construção de uma performance de alto nível, ou expertise.
Os trabalhos que falam sobre este assunto são os seguintes:
a) Barros (2008) - Não traça um planejamento para uma obra específica, mas faz
um levantamento de estratégias de estudo utilizadas na prática pianística, sua construção,
aplicação e efeitos, a partir de evidências empíricas ou teorizadas por especialistas na área.
b) Moreira (2013) - Utiliza Barros (2008) para construir seu referencial teórico,
considerando, portanto, as mesmas etapas.
c) Alves (2013)- Fala sobre motivação, metacognição, autorregulação e prática

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deliberada.
Dos trabalhos levantados, existem alguns que não falam sobre um planejamento
completo, mas focam em algum ponto deste processo. Destes, foram elencados aspectos
considerados pelos autores como importantes no processo de estudo de uma obra musical, e
que poderiam ser considerados também como etapas na estruturação de um plano de estudo
para a performance.
As etapas descritas abaixo, portanto, foram elencadas dentre todos os tipos de
trabalhos descritos anteriormente. As estratégias de estudo foram reunidas e consideradas
como uma única etapa, sendo consideradas somente as que se referem ao piano.

4. ETAPAS

4.1 EXERCÍCIOS DE AQUECIMENTO (TÉCNICO-MECÂNICOS)

Esta etapa e a próxima utilizam o termo “aquecimento”, mas com diferentes


significados. Ray e Andreola (2005, p.24) afirmam que:

No meio musical é comum que se use o termo “aquecimento” referindo-se a


exercícios de técnica organizados em grau de dificuldade crescente. Tais exercícios
têm o objetivo de preparar a musculatura e a concentração do performer para suas
atividades rotineiras, quais sejam, estudar isoladamente, ensaiar com seu grupo,
apresentar-se em público ou para seu professor (aula). Quantas vezes ouvimos
recomendações para que sempre façamos um aquecimento antes de uma sessão de
estudo? Poucos músicos se dão conta que estes exercícios não “aquecem” a
musculatura, pelo contrário, eles apenas a colocam em uso com certa moderação,
porém, sem preparo.

Barros (2008) utilizando o termo “aquecimento” com essa significação, traz em seu
trabalho um questionamento em relação a real necessidade de sempre iniciar o estudo com
exercícios técnico-motores e aponta uma lacuna no sentido de não haver pesquisas que
comparem a diferença entre fazer exercícios técnicos, como escalas e arpejos no início da
seção de estudo, ou escolher os exercícios técnicos de acordo com os desafios do repertório
proposto e estudá-los paralelamente ao trabalho do repertório.

4.2 EXERCÍCIOS DE AQUECIMENTO, ALONGAMENTO, RELAXAMENTO E DE


FINALIZAÇÃO DO ESTUDO

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Aqui utilizando o termo aquecimento para falar sobre exercícios que efetivamente
causam aumento do fluxo sanguíneo, aquecendo a musculatura.
Póvoas et al (2012) abordam a valorização mas ao mesmo tempo a falta de
informação sobre esses tipos de exercício, que acabem sendo realizados de maneira incorreta,
causando vários tipos de lesão. O alongamento é fundamental para o pianista, mas deve ser
feito sempre depois do aquecimento, tanto antes como depois do estudo. E devem ser feitos
dentro do limite de flexibilidade articular, pois senão causam lesões, como quando a base de
um osso comprime a do outro por exemplo.
Ray e Andreola (2005) além das mesmas recomendações acima, lembram ainda que
o alongamento deve ser executado devagar, evitando movimentos bruscos, mantendo a
posição por 10 a 30 segundos. As sessões de alongamento podem ser divididas, antes, durante
e após a prática. Neste mesmo trabalho as autoras indicam uma série de exercícios, sites
recomendados e uma lista de estudos brasileiros que falam sobre o assunto.
O objetivo do aquecimento e do alongamento seria, portanto, auxiliar na prevenção
de lesões. Williamon (apud BARROS, 2008, p.172) e Perry (apud BARROS) discorrem sobre
este assunto, com várias dicas que podem ajudar nesta prevenção.

4.3 CONTEXTUALIZAÇÃO E ANÁLISE

Segundo Winter (2006), a interpretação de uma obra musical pressupõe a realização


de escolhas e através desse conjunto de escolhas adotadas o intérprete propõe diferentes
interpretações para uma mesma obra, influindo na mensagem transmitida.

Para que essas escolhas sejam fundamentadas, é necessário embasá-las em um


conjunto de conhecimentos sobre a obra a ser estudada, sejam elas teóricas
instrumentais, histórico-sociais, estilísticas, analíticas, baseadas em práticas
interpretativas de época, organológicas, iconográficas, etc (WINTER, 2006, p.67)

Dos trabalhos levantados, muitos se tratam de análises de uma determinada obra,


para fins de interpretação e performance. Não caberia neste artigo citar todos os tipos de
análises realizadas, então a alternativa foi citar autores que se referiram à importância da
análise dentro do contexto da preparação de uma obra.
Todos os quatro participantes da pesquisa de Alves (2013, p.58) e dois, dos três
participantes da pesquisa de Moreira (2013, p.51 e 68) afirmaram analisar as obras no
processo de preparação de suas performances. Essa análise tanto pode ser estrutural, inclusive

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com o objetivo de facilitar a memorização, como pode ser uma análise no sentido de mapear
os pontos difíceis aos quais devem ser aplicadas diferentes estratégias de estudo. Moreira
(2013, p. 43) cita Chaffin e Lemieux para afirmar que a análise da estrutura formal da obra
traz uma “visão panorâmica da performance”, contribuindo para a organização do estudo.
Winter (2006, p.69) acredita que a análise “fornece princípios objetivos pelos quais a
execução pode ser informada, contribuindo na solução de problemas específicos de
interpretação”. O autor (Winter, 2006, p.69) cita Berry ao afirmar que “a experiência musical
é mais rica quando elementos funcionais de forma, continuidade, vitalidade e direção tenham
sido claramente discernidos na análise e interpretados como uma base para a consciência
intelectual que precisa embasar interpretações verdadeiramente esclarecedoras”. Haveria
então um diálogo e uma complementariedade entre análise e performance, sendo a análise da
estrutura musical a ferramenta para as decisões a serem tomadas, configurando a
“performance estruturalmente informada” de Cook e Everist (apud WINTER, 2006, p.69).

4.4 MEMORIZAÇÃO

Chaffin et al. (2012) fazem em seu trabalho uma diferenciação entre dois tipo de
memória: a memória por cadeias associativas e a memória de conteúdo endereçável. Explicam
que no processo de aprendizagem de uma nova obra musical, utilizamos espontaneamente a
memória por cadeias associativas, em que cada passagem executada ativa o seguimento da
próxima passagem. O problema é que ela é frágil, se houver uma pequena interrupção na
execução, a cadeia é quebrada e a falha da memória é completa, assim o músico terá de
começar de novo, do início da obra ou seção. Já a memorização deliberada conduz à memória
de conteúdo endereçável, que evita esse tipo de problema. Segundo o autor, esse tipo de
memória pode ser desenvolvido e funciona como uma rede de segurança, permitindo uma
recuperação no caso da falha da cadeia associativa causar uma interrupção da execução.
A memória de conteúdo endereçável funciona a partir da configuração de guias de
execução, que garantem uma continuidade da execução no caso da memória por cadeias
associativas falhar.
Wildt et al. (2005) compartilham a mesma opinião de Chaffin (2012) e Chaffin et al.
(2012), eles afirmam que a memória visual e cinestésica não são confiáveis no momento da
performance. Mas trabalham com a utilização de outro modelo de mapeamento, proposto por
Schokley, que é baseado em representações gráficas das estruturas musicais, que constituem

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esquemas de memorização. Este tipo de abordagem envolve o estudo da partitura longe do
instrumento e a confecção de mapas que destacam os elementos mais importantes da peça.

4.5 ESTRATÉGIAS DE ESTUDO

a) Estudo por repetições:

Segundo Chaffin (apud BARROs, 2008) a estratégia de separar trechos curtos e


trabalhar com repetições, visando a solução de problemas é eficiente se a repetição for
encarada de maneira consciente, com a atenção focada e tendo clareza dos objetivos
específicos a serem atingidos. Depois esses trechos curtos devem ser intercalados com seções
maiores.

b) Estudo através de seções musicais:

Barros (2008) explicita em seu trabalho as diversas maneiras de dividir uma obra
musical em seções para fins de estudo, todas extraídas da observação do estudo de pianistas
profissionais. Segundo os diferentes autores que realizaram essas observações em seus
trabalhos de pesquisa, todas estas estratégias foram consideradas como eficazes.
Divisão pelas complexidades técnico-motoras, que devem ser estudadas à maneira do
estudo por repetições, explicado anteriormente, até nivelar os trechos fáceis e difíceis. Divisão
baseada na estrutura formal, que possibilita ainda a sua utilização como guia de execução em
um trabalho de memorização, conforme já foi explicado. Ainda existem estudos que
demonstram que quanto mais cedo esse recurso era utilizado, melhor era a qualidade final da
execução. Divisão sem ater-se à forma ou estrutura, mas com partes selecionadas que fazem
sentido musical para o intérprete.
Para essa estratégia ser eficaz, existe a necessidade de estabelecer metas e objetivos,
identificando problemas e eliminando-os a cada seção de estudo, o que faz com que a
passagem musical seja rapidamente resolvida, evitando a protelação dos problemas e o
desenvolvimento de hábitos motores errados.

c) Estudo de mãos separadas e mãos juntas:

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Barros (2008) afirma que o estudo de mãos separadas constitui um dos temas de
pesquisa mais antigos dentro do planejamento da execução. Diversas pesquisas empíricas
classificam essa estratégia como uma das características que definem a prática de
instrumentistas de nível avançado, considerada eficaz pelos autores destas pesquisas.

d) Estudo em andamentos diferentes:

Segundo Barros (2008, p.161), essa estratégia “consiste em estudar uma obra musical
de mãos separadas e juntas, aplicando diferentes andamentos, do largo ao prestíssimo”.
Vários trabalhos realizados através da observação de músicos profissionais encontraram a
utilização desta estratégia.
Existem duas formas de se aplicar esta estratégia. Uma delas seria o aumento gradual
do andamento, desde o estudo bem lento até chegar na velocidade da execução final. O autor
é contra essa forma de utilização da estratégia, pois os movimentos de mãos e braços
utilizados na execução são completamente diferentes nos andamentos lentos dos rápidos.
Outra forma de aplicação desta estratégia seria o “estudo alternado dos andamentos
lento e rápido”. Ou seja, uma variação abrupta do andamento, em um estudo por seções
curtas. É mais eficaz e permite que desde o início o músico experimente a sensação da
velocidade final da execução, ao mesmo tempo em que permite observar elementos como
dedilhado, sonoridade e interpretação que ficariam de lado caso se optasse por esse estudo,
mas aplicado a trechos muito longos ou à peça inteira.

e) Estudo com metrônomo:

Para Barros (2008, p.166) o recurso de ir aumentando o andamento através do uso de


metrônomo deve ser utilizado para alcançar o andamento final da peça e não para corrigir
falhas. No entanto, este autor considera mais eficaz a utilização do estudo com variação
brusca do andamento, conforme explicado anteriormente. O uso do metrônomo deve ser feito
com cuidado, para que não leve a um estudo sem concentração (devido à característica
repetitiva do instrumento) e à automatização da interpretação, por não permitir a ligeira
variação de andamento necessária neste caso.

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e) Estudo com variantes rítmicas:

Consiste na aplicação de variações de ritmo ou articulação, utilizando notas


pontuadas, acentuações e ligaduras de notas, nos trechos que contêm dificuldades técnico-
motoras ou em escalas, arpejos e passagens em velocidade.
Barros afirma que existem autores que defendem e outros que se opõe ao estudo com
variantes rítmicas, mas não existem pesquisas abordando a eficácia desta estratégia. Mesmo
assim, podemos observar que é uma estratégia muito utilizada.

f) Estudo do dedilhado:

Chaffin et al. (apud BARROS, 2008) argumentam que a escolha do dedilhado é


fundamental e deve acontecer no início do processo de estudo da obra musical, mas levando
em consideração as características finais de velocidade e interpretação. Isso é importante
porque a memória motora se desenvolve imediatamente, tornando difícil a mudança de
dedilhado depois. O dedilhado é uma escolha pessoal e depende das características físicas
(tamanho das mãos e dedos), da escola pianística com que o músico se identifica, fatores
técnicos, intenções expressivas e interpretativas, padrões (como escalas e arpejos). Os
pianistas Jörg Demus, Alicia de Larrocha e o sujeito do estudo de caso de Miklaszewski (apud
Barros, 2008, p.170) enfatizaram também a importância da escolha, fixação e automatização
do dedilhado no processo de memorização da obra musical.

g) Estudo através de gravações de outros intérpretes:

Barros (2008) não concorda com a utilização dessa estratégia de estudo, por não
considerar as gravações como parâmetro interpretativo para as obras em estudo e acreditar
que elas podem comprometer o desenvolvimento da "personalidade" artística e da
individualidade interpretativa do músico. Para este autor esse recurso pode ser útil antes do
início da leitura da obra musical, principalmente no caso desta ser desconhecida, utilizando o
maior número possível de gravações, para se ter diversas abordagens interpretativas. E no
final do processo de aprendizagem, após o músico já ter elaborado suas próprias ideias
musicais, as gravações serviriam como comparação e não como modelo.
Apesar desta ressalva, é um recurso muito utilizado, visto que todos os participantes

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da pesquisa de Alves (2013) e da pesquisa de Moreira (2013) afirmaram recorrer a este
recurso na preparação de suas performances. Monteiro (2011, p.1271) afirma que a
confrontação de gravações se constitui num “instrumento de refinamento da escuta,
fundamental no amadurecimento de uma obra”. Em sua pesquisa, para o estudo de uma única
obra foram selecionadas 130 gravações de várias épocas para serem confrontadas, incluindo
intérpretes consagrados e jovens pianistas que postaram vídeos no site youtube.

h) Estudo através do registro em vídeo ou áudio da própria prática instrumental e da


execução:

Todos os participantes das pesquisas de Alves (2013, p.89) e Moreira (2013, p.48)
afirmaram utilizar a estratégia de registrar em vídeo ou áudio a sua própria execução, com a
finalidade de feedback e autoavaliação. Dessa maneira seria possível verificar o que realmente
rendeu o estudo, e também averiguar se há problemas que não haviam sido percebidos e
precisam ser corrigidos.

i) Estudo mental:

Todos os quatro participantes da pesquisa de Alves (2013) e dois dos três


participantes da pesquisa de Moreira (2013) relataram utilizar algum procedimento de
preparação mental em suas performances, tais como, planejamento, estudo objetivo e
detalhista, análise e correção dos erros para evitar gravar o erro na memória através da
repetição não consciente e a audição intrínseca da própria performance, o estudo longe do
instrumento.

5. ENTREVISTA

O objetivo da entrevista é ter um panorama de como uma pessoa com vasta


experiência no assunto em questão articula as etapas e estratégias (que, na literatura,
apareceram de forma desarticulada), na estruturação de um planejamento de estudo para a
performance. Para isso foram feitas a um docente e pianista profissional as seguintes
perguntas:

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1. O que pensa a respeito da preparação de uma nova obra, desde o contato inicial até o
momento da apresentação pública?
2. Que caminho percorre da leitura até a performance?
3. Que etapas e estratégias considera importantes no planejamento da performance?
4. Ao trabalhar com um aluno, as mesmas considerações podem ser aplicadas? O que
mudaria?

O entrevistado A! é docente na graduação e pós graduação, na área de práticas


interpretativas e atua também como pianista profissional, tanto como solista como em grupos
de câmera.
Respondeu às três primeiras perguntas referindo-se mais ao trabalho com os alunos,
portanto a quarta pergunta foi invertida, sendo então questionado o que mudaria em relação à
preparação de sua própria performance. A entrevista teve uma hora de duração e está aqui
bastante reduzida por se tratar de um artigo.
Em relação à preparação de uma nova obra, A! afirmou que é um processo que deve
ser talhado para cada aluno, pois deve se levar em consideração muitos fatores: características
como idade, formação e objetivos, áreas em que apresentam dificuldades, potencial,
maturidade musical, além de fatores da própria performance, como local em que vai ser
realizada, se vai ser ao vivo ou gravada, entre outros.
Respondendo qual o caminho percorre do estudo à performance, acha importante o
aluno, no início do estudo, conhecer o contexto no qual a obra está inserida. Partindo da ideia
de que a notação musical não dá conta de todos os elementos, por alguns não serem mesmo
passíveis de notação, A! argumenta que é necessário complementar as informações do texto
com a audição de obras que situem, sonoramente, a que está sendo estudada. Nunca a audição
da mesma obra, ao menos neste estágio da aprendizagem, pois isso traria uma série de
desvantagens, impedindo o que A! considere como um trabalho de ser “detetive” da própria
interpretação. Mas sim audições de outras obras do mesmo compositor, não necessariamente
obras para piano, mas de vários gêneros: concertos, obras sinfônicas, camerísticas, vocais. O
mesmo vale ao se tratar de danças ou obras folclóricas. Tudo isso serve como referência para
situar o aluno, para que ele saiba o que está procurando em termos sonoros. A! defende a ideia
de que é importante “saber o que se quer ouvir”. A partir do momento que se sabe o que se
quer ouvir, é possível colocar o aparato motor em funcionamento na busca daquele objetivo.
Outro ponto comentado por A! foi em relação ao estudo em si. Num primeiro
momento, no início do contato com a obra, ele não pede que o aluno venha com tudo

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estudado, mas sim que configure as ideias principais da obra, em termos de articulação,
andamento caráter, enfim, pensar no “jeito” que vai ter aquela ideia (que pode ser um sujeito,
um motivo, um tema). E que se realize o trabalho de contextualização mencionado acima. A!
complementa dizendo: “eu acredito muito nesta contextualização como ponto importante de
partida para decisões que vão acontecendo ao longo do caminho, tanto do ponto de vista de
análise da partitura, uma mistura de contexto, análise, conhecimento básico, personalidade do
aluno, enfim. E à medida que as coisas vão acontecendo, pensar também nas escolhas
relativas a andamento, respiração, frases, acústica do lugar que vai se tocar, tamanho do
teatro, se é pequeno ou grande, se vai ser gravado, se é ao vivo... tudo isso são fatores que
interferem na performance”.
Questionado sobre as etapas e estratégias que considera importantes no planejamento
da performance, A!, que já havia mencionado algumas na questão anterior, acrescentou e
comentou outras.
Sobre o aquecimento antes da prática, afirmou que já se sabem através de estudos
que o alongamento deve ser realizado depois da sessão de estudo. Esta não deve ser longa, em
torno de 50 min., dependendo do que está sendo estudado. Deve ser realizado o aquecimento
do ambiente se estiver muito frio. Afirma que se fosse fazer uma recomendação do ponto de
vista físico, seria a de sempre aquecer a mão antes de tocar e não realizar excesso de
repetições sem concentração, já que a carreira de pianista é longa e não devemos ser
causadores de nossas próprias lesões por hábitos de estudo errados. Já o aquecimento em si
considera como uma escolha pessoal. A! afirma que as escalas e arpejos passaram por um
período de negação, mas que voltaram, principalmente por contribuírem para a conformação
da mão e para configurações de gestalts (que conferem rapidez para a leitura e memorização),
características que atendem ao mercado de trabalho, onde o pianista geralmente é colaborador
e precisa aprender a música muito rápido. Outra alternativa, que ele prefere, seria começar o
estudo pelo próprio repertório, mas não pelas partes rápidas e nem as que exigem uma posição
mais aberta ou tensa das mãos. Por uma parte mais lenta e confortável.
Falando sobre memorização, A! afirmou que não considera que ela seja obrigatória,
mas que prefere tocar de memória. Lembrou que é preciso cuidar para que o processo de
memorização não se torne um “monstro”, a ponto de interferir negativamente na performance,
quando se está mais preocupado com a sequência do que foi memorizado do que com os
conteúdos expressivos a serem realizados. A! comenta que a memória que vai ajudar na hora
da performance é basicamente a memória digital, do estudo diário, que leva a não ter que

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pensar em todos os passos que estão acontecendo, proporcionando fluência. Mas fala da
importância de estabelecer marcadores que configurem pontos de apoio para a execução caso
a memória digital falhar, o que é comum. Memorizar seria pensar em vários aspectos:
estrutura, memória visual da partitura, do teclado, o som de um determinado intervalo, entre
outros. Tudo isso aliado a ferramentas, que são escolhas pessoais, e por isso não existe uma
receita que vale para todo mundo. A! lembra ainda que nenhuma estratégia de memorização é
infalível, e que o processo de memorização deve passar pela situações que simulem ou que
sejam a própria performance. As sugestões seriam se gravar, pois isso em si já simula uma
performance, e nunca fazer do evento mais importante a sua primeira aparição com aquela
peça. Isso é importante, pois tocar sendo observado gera uma mudança na nossa percepção
física e os movimentos ficam menos espontâneos.
A respeito das estratégias de estudo, A! afirmou que não há como generalizar, pois a
escolha destas estratégias depende de inúmeras variáveis. Lembrou que o objetivo das
estratégias é tornar o estudo mais eficaz, então elas devem ser escolhidas para resolver os
problemas, quando eles aparecem, de maneira inteligente. Comentou sobre a importância da
gravação da própria execução, com a finalidade de autoavaliação e autocorreção. Falou sobre
a importância do estudo com variantes rítmicas, para consolidar passagens difíceis. Sobre o
estudo em andamentos diferentes e escolhas como dedilhado, comentou: “é importante que a
gente já saiba mais ou menos o andamento que se quer, pelo menos aproximado, desde o
início do estudo, porque uma coisa é o que eu uso para correr e outra coisa é o que eu uso para
caminhar. São músculos diferentes, são movimentos diferentes. Então se eu fizer um arpejo
lento e acelerar esse arpejo, ele não vai ser feito do mesmo jeito. O andamento de uma peça é
crucial para essas escolhas. E estudar uma peça lenta não necessariamente vai me levar para o
andamento se o andamento é rápido. Então essas escolhas devem ser feitas considerando o
contexto”. A respeito do estudo com mãos separadas, lembrou que quando se juntam as mãos,
outra parte do cérebro é envolvida e, portanto, deve ser exercitada, Mas afirmou que gosta da
utilização dessa estratégia em todos os estágios de preparação da obra, “para trabalhar como
se fosse o maestro trabalhando com cada seção da orquestra”. Ou seja, trabalhar musicalmente
as vozes.
Em relação à concentração, A! deu duas sugestões, sendo que “uma é a estratégia
mental em relação ao que vai ser tocado, outra é a estratégia mental em relação ao ato de
tocar”. E afirmou: “se eu vou entrar no palco e tocar de cor, com partitura, concerto, musica
de câmara, o que for, eu preciso ouvir essa musica antes, eu não posso simplesmente começar

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e deixar o meu físico fazer sozinho, embalado por uma adrenalina que está circulando,
aumentou minha frequência cardíaca e que talvez já tenha alterado a minha percepção do
tempo já. Essa coisa de focar a atenção, pensar na música, pensar na frase, exercitar o foco, a
memória, isso é um exercício de performance”. A! lembrou que ficar nervoso é normal, mas
que isso também pode ser trabalhado com os alunos para não levar ao pânico, com uma
estratégia que seria ensaiar a performance. Fazer uma preparação ensaiando a performance
completa, inclusive respeitando a sequência das obras e os intervalos, pode dar uma segurança
a mais no momento do stress. E se porventura houver algum erro, que se pense pra frente,
pois no momento em que se fica pensando no que se errou, o cérebro não fica conectado com
o que está acontecendo, há uma falha na concentração.
Para A!, todo o processo de maturação da obra é dinâmico. “Passa por aquele
processo de se ouvir, como eu me ouço, o que eu estou fazendo. Será que o envolvimento
mecânico do tocar está me deixando obtuso em relação ao que eu estou produzindo? E a
vantagem de ter um professor é ter um ouvido distante, que diga: estou ouvindo isso que você
está fazendo e isso está ou não comunicando”.
Sobre o processo de preparação da sua própria performance, A! destacou o fato de
que sempre tem muito repertório a ser estudado, por causa de seus muitos compromissos
como pianista. Então mencionou que tem que planejar detalhadamente esse estudo de maneira
a ter tempo de trabalhar mais as partes difíceis, aplicando as estratégias de estudo. E
mencionou que acredita muito em um trabalho ético, no sentido de que “o que quer que seja
que você vai fazer, em qualquer situação, precisa ser tratado eticamente com a melhor
preparação que você puder dar”.

6. CONCLUSÃO

Este artigo pretendeu expor uma visão global do planejamento do estudo para a
performance, através do levantamento de etapas que podem ser consideradas na estruturação
deste planejamento, com base em sugestões da literatura (considerando o que foi escrito sobre
este tema em publicações brasileiras dos últimos dez anos: revistas científicas, anais e
também algumas teses de mestrado e doutorado) e na experiência de um profissional da área.
A opinião do profissional foi de vital importância para atingir o objetivo proposto,
considerando a excelência musical do entrevistado e a sua experiência como docente, na
orientação do planejamento das performances de seus alunos. Segundo Barros (2008, p.237),

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o músico profissional com nível de expertise atua como modelo da ação músico-instrumental
e de parâmetro para o ensino do instrumento. Sobre este assunto, Santiago (2007, p.24) afirma
ainda que “os hábitos de estudo dos indivíduos que apresentam performances de alto nível
podem revelar informações valiosas sobre as condições ideais para o aprendizado musical”.
Na fala do entrevistado, as etapas, que apareceram de forma estanque no
levantamento bibliográfico, ganham vida. Podemos observar como ele estabelece certa
cronologia e hierarquia entre elas, contextualiza e principalmente chama a atenção para o que
seria considerar o “todo”, a grande variedade de fatores que pode interferir na performance, e
também no seu planejamento. Discorrendo sobre este assunto, o entrevistado exibiu diversas
facetas do mesmo tema, que na literatura talvez não estivessem tão perceptíveis.
Falando sobre a performance de maneira geral, lembrou que vários fatores devem ser
considerados em sua preparação. Por exemplo: o tamanho e as características do local em que
a performance vai ser realizada, se vai ser ao vivo ou gravada, tudo isso interfere na maneira
com que devemos nos preparar para ela.
Em relação ao trabalho com os alunos, que estão ainda em fase de construção de uma
performance de alto nível, chamou a atenção para a etapa da contextualização, buscando criar
um referencial sonoro para que no momento do estudo, ao tocar cada obra, o aluno “saiba o
que quer ouvir” e vá à busca desse som. Afirmou também que a preparação de uma nova obra
é “um processo que deve ser talhado para cada aluno”. Isso porque ao considerarmos as
características de cada um, suas facilidades e dificuldades, podemos adequar o planejamento
do estudo para a performance de maneira que ele realmente cumpra sua função, que é a de
levar aos melhores resultados no menor espaço de tempo possível. Em relação a este mesmo
assunto, Barros (2008) afirma que o planejamento da execução instrumental deve levar em
conta o indivíduo, pois as características idiossincráticas interferem muito nos resultados,
reduzindo as chances de generalizações, e que o fato de tratar as técnicas de estudo como
fórmulas prontas pode não trazer resultados significativos.
Ao ser questionado sobre o seu próprio planejamento de estudo, surge outra faceta. O
entrevistado já sabe como a obra deve soar, quais estratégias de estudo vão trazer melhores
resultados, já possui amplo conhecimento e cultura musical. Então ele fala sobre a questão do
tempo. Tendo um vastíssimo repertório para estudar em pouco tempo, podemos observar que
o planejamento do estudo levando em conta este fator é justamente o que viabiliza a atuação
profissional do entrevistado, que ainda cita a questão ética de sempre preparar bem as obras
que se vai tocar.

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Considerando tudo o que foi dito acima, podemos então considerar que não há uma
“receita” para o planejamento do estudo para a performance. As sugestões levantadas da
literatura devem ser utilizadas de maneira a atender as especificidades de cada caso.

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