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n. 1, p. 115 - 120, set./ dez., 1985.
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o objetivo deste artigo é analisar a dinâmica das dia à capitania do Rio de Janeiro. Seu principal
transformações ocorridas no Estado do Rio no pe centro urbano era a cidade do Rio de Janeiro, que,
ríodo compreendido entre 1889 e 1930, tendo co a partir de 1763, passou a sediar a administração
mo principal eixo de análise a luta empreendida portuguesa no Brasil.
pelas frações da classe dominante visando o con Com a promulgação do Ato Adicional em 1834,
trole do poder no Estado, bem como suas articula a cidade do Rio de Janeiro passou a constituir o
ções com a política nacional. Município Neutro da Corte, desvinculando-se da
Dentro dessa perspectiva, nossa proposta é não província do Rio de Janeiro. Se, por um lado, a
SÓ contribuir para um maior conhecimento da pro província deixava de abrigar a maior cidade, o
blemática específica do Rio de Janeiro, como tam principal porto e o centro político do Império, por
bém fornecer subsídios para um melhor entendi outro lado conquistava sua autonomia político
mento da implantação e funcionamento do federa administrativa. Essa autonomia, contudo, não foi
lismo na República Velha. suficiente para libertar a província do peso da cida
O tratamento dado à análise da problemática do de do Rio de Janeiro na sua vida política e econô
federalismo tem sido insuficiente e parcial, �ma mica. A extrema centralização imperial acentuava
vez que são poucos os estudos monográficos ou a relação de dependência da prov'Íncia para com a
regionais que esclarecem os intrincados aspectos capital, o que resultava no carreamento para a
das relações entre a União e os Estados. Corte de vultosos recursos econômicos e tributá�
A partir da década de 1970, foram publicados rios, além de permitir constante ingerência da Co
inúmeros trabalhos no campo da história regional, roa nos negócios fluminenses.
que forneceram contribuições importantes a essa A proclamação da República em 1889, ao pro
temática. Esses estudos se concentraram, em sua mover a descentralização político-administrativa
maioria, em Estados que desempenharam um papel no país, gerou expectativas de uma efetiva autono
de primeiro plano na condução do processo de in mia no agora Estado do Rio de Janeiro. A implan
dustrialização brasileira ou na definição da política tação da República federativa no Brasil coincidiu,
nacional como é ° caso de São Paulo e Rio Grande no Estado do Rio, com sérias dificuldades econô
do Sul, analisados por Joseph Love, e de Minas micas e financeiras que, em fins da década de
Gerais, por John Wirth - ou naqueles que exerce 1890, chegaram a uma situação-limite, muito em
ram alguma liderança em amplas regiões do país, hora esse quadro de crise tenha sido entremeado
como Pernambuco no nordeste, objeto de investi por breves conjunturas de recuperação. Além des
gação de Robert Levine 1. ses problemas de ordem econômica, o exercício,
O comportamento dos Estados que se situaram pelos fluminenses, da autonomia que o federalismo
à margem do eixo do poder vigente na República oferecia, foi dificultado, mais uma vez, pela proxi
Velha, contudo, ainda é bem pouco conhecido. midade da capital federal, a ponto de se tornar voz
Desempenhando um papel2 de menor relevância corrente que a política estadual era decidida na
na definição das linhas gerais do funcionamento da
Rua do Ouvidor.
política nacional, a problemática interna dos de O início da construção de Brasília no final da
mais Estados é ignorada ou interpretada a partir de década de 1950 deu origem a toda uma discussão
inferências oriundas dos modelos construídos para no sentido de reintegrar ao Estado a cidade do Rio
análise dos Estados dominantes, o que impede a de Janeiro, quando esta deixasse de sediar o Distri
recuperação da dinâmica própria daqueles Estados. to Federal. Contudo, a inauguração da nova capital
Embora as grandes decisões sejam tomadas nos em 1960 não teve como conseqüência imediata a
núcleos econômica e politicamente dominantes, é fusão, tendo a cidade do Rio de Janeiro se trans
importante detectar em que medida as propostas formado no Estado da Guanabara.
ditadas pelos interesses da política nacional foram Na década de 1970, o debate sobre a fusão foi
absorvidas ou tornaram-se objeto de resistência ou reativado. Aqueles que defendiam a medida centra
contestação. vam sua argumentação no esvaziamento econô
mico da Guanabara, que poderia ser superado atra
vés da criação de um novo pólo econômico via
o Municfpio Neutro da Corte fusão com o Estado do Rio. Finalmente, em 1975,
procedeu-se à fusão das duas unidades da federa
O Estado do Rio, a despeito de sua trajetória sUl ção.
generis em termos político-administrativos, não Até o momento, as expectativas de formação de
tem sido alvo de um interesse maior por parte dos um novo pólo econômico dinâmico no novo Esta
estudiosos. Durante grande parte do período colo do do Rio não se concretizaram. Atualmente, di
nial, o território do atual Estado do Rio correspon- versos veículos de informações - imprensa, relató-
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ção federal. 1. LOVE, Joseph. O regio Doutorado, 1984, Mimeo,
A intervenção federal, exercida por Aurelino nalismo Gaúcho. São Pau 9. A articulação do nome
lo; Editora Perspectiva, de Ouintino Bocaiúva pode
Leal, significou, internamente, o desalojamento do
1975 e A locomotiva, São ser considerada como um
nilismo de todas as posições de que desfrutava no Paulo na federação brasilei marco inicial da dominação
quadro político estadual. Externamente, abriu ca ra. Rio de Janeiro, Paz e do nilismo no Estado. Essa
minho para o alinhamento do novo situacionismo Terra. WI RTH, John. O fiel fase incorporou as adminis·
fluminense em nível federal, o que fora uma rela da balança. Minas Gerais na trações do próprio Ouinti
federação brasileira. Rio de no (1900-1903', o 1.0 go
ção instável durante a preeeminência do nilismo.
Janeiro, Paz e Terra, 1982. verno Nilo (1904-19061. o
Essa guinada na trajetória política fluminense LEV INE, Robert. A velha 2,0 governo Nilo
parece indicar que, ao alijar os nilistas da luta pelo usina. Pernambuco na fede (1915-1917', o governo de
poder, a nova ordem diminuiu o nível dos confli ração brasileira. Rio de Ja· Raul Moraes Veiga
neiro, Paz e Terra, 1980. (1919·1922', além das
tos internos. Essa maior coesão política do Estado
2, Recentemente foi publi administrações de Backer e
seria, também) resultado do mais íntimo alinha cado, nessa linha, o traba Oliveira Botelho, que fo·
mento fluminense ao governo federal. lho de Souza, Teresinha Oli ram iniciadas sob a influên·
Em resumo, se o período de predomínio nilista va de, Impasses do federa cia do nilismo, a despeito
lismo brasileiro (Sergipe e a
pode ser compreendido como wn momento em do seu rompimento poste-
Revolta de Fausto Cardo· rior,
que a liderança estadual buscava ampliar a margem
sol. Rio de Janeiro, Paz e 10, LAMARÃO, Sérgio,
de manobra frente ao poder central e aos demais Terra, 1985. "A Ascensão do nilismo no
Estados, o período de hegemonia das forças feHcia 3. LEMOS, Renato. A im Rio de Janeiro". Documen·
nistas foi marcado pelo alinhamento mais estreito plantação de ordem repu to de trabalho CPDOC,
blicana no Estado do Rio_ 1985. Mimeo.
com aqueles mesmos Estados, notadamente São
Documento de trabalho. 11. RUSSEL, Robert,"Nilo
Paulo. O controle da máquina do Estado por esse CPOOC, 1985, Mimeo. Peçanha and Fluminense
grupo terá custado, assim, o preço de uma restri 4. LIMA SOBRINHO, Bar Politica". Tese de Doutora·
ção do campo da autonomia fluminense. bosa, Presença de Alberto do, University of New Me·
E verdade que, durante a República Velha, a Torres (sua vida e pens� xico, maio de 1974, p, 101
menta), Rio de Janeiro, a 107
prática do federalismo e do regionalismo pressupôs
Civilização Brasileira, 1968. 12. KORNIS, Mônica AI
um dado grau de independência entre os Estados. p. 220 meida."Os limites à domi·
Para o Estado do Rio, contudo, essa autonomia 5, O per(odo de hegemonia nação nilista", Documento
sempre foi obstada pela sua fraqueza econômica, de José Tomaz de PorciÚ'l1- de trabalho, CPDOC, 1985.
cuia em termos administra· Mimeo,
pelo fracionamento político dos seus grupos diri
tivos englobou seu próprio 13, F E R REIRA, Marieta
gentes e pela proximidade com o Distrito Federal, governo (1892·1894), o go· de Moraes. liA Reação Re
que estabelecia relações muito intensas entre os verno de Maur (cio ,Abreu publicana e seus reflexos
rumos da política nacional e estadual. (1895-1897', e o inIcio da na pol(tica fluminense",