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FUNDAMENTOS

DA LÍNGUA
PORTUGUESA

Asafe Cortina
Comunicação,
linguagem e leitura
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Identificar os elementos da comunicação e sua função no processo


comunicativo.
„„ Relacionar os tipos de linguagem existentes e suas características.
„„ Caracterizar o processo de leitura e suas especificidades.

Introdução
Neste capítulo, você vai estudar sobre comunicação, linguagem e leitura.
Primeiramente, serão apresentados o conceito e as diferentes abordagens
sobre o que é a comunicação, levando em conta os tipos distintos de
comunicação e observando quais são os componentes que pertencem ao
processo comunicativo; sempre relacionando o tópico com a linguagem
e a língua; duas ideias que embora pareçam sinônimas, mas apresentam
significações diferentes.
Logo em seguida, as definições sobre a linguagem, suas diferentes
abordagens e perspectivas, tipos, funções e propósitos serão apresen-
tadas. Por fim, serão estudados o conceito de leitura e quais são os pro-
cessos que a envolvem, tanto pela perspectiva textual quanto pelas
perspectivas cognitivas, comunicacionais, culturais e etc.
2 Comunicação, linguagem e leitura

Comunicação: definições, princípios e funções


Quando pensamos em “comunicação”, não há dificuldade em entender o seu
significado, uma vez que essa palavra é bastante comum na língua portuguesa
e é algo “utilizado” e “feito” todos os dias.

“A comunicação confunde-se com a própria vida. Temos tanta consciência


de que nos comunicamos como a de que respiramos ou andamos. Somente
percebemos a sua essencial importância quando, por acidente ou doença,
perdemos a capacidade de nos comunicar.” (BORDENAVE, 1986).

Contudo, quando se pede para alguém definir comunicação, parece não


haver um consenso.
O conceito será analisado de duas maneiras: pela origem da palavra e pelo
significado apontado por algumas obras lexicográficas. A partir disso, será
possível conhecer os princípios de alguns teóricos da comunicação e entender
algumas de suas definições, tipos, princípios e funções.
Ao estudar a origem da palavra “comunicação”, aprende-se que ela ter
origem de duas palavras do latim communis, que significa “comum”, e commu-
nicare, que significa “participar, fazer, tornar comum”. Entretanto, “comum”
não é o primeiro conceito que vem à mente quando se pensa em comunicação.
Então, por que a palavra deriva de “comum” na língua latina? Porque quando
se comunica com alguém, é estabelecido algo em comum entre transmissor e o
receptor; esse “algo em comum” pode ser a língua, o conteúdo, a forma, etc.;
mas para que haja comunicação, é preciso que exista algo em comum entre
o emissor e receptor (também chamados de locutor e interlocutor de acordo
com diferentes perspectivas teóricas). Da mesma forma, quando emitimos uma
mensagem a alguém, ela se torna o “algo em comum” entre nós e o receptor.
Agora, veja algumas acepções dadas por obras lexicográficas (dicionários)
sobre a palavra “comunicação”. Observe que serão tratadas somente as de-
finições que interessam a este capítulo, sem que sejam aprofundadas outras
definições lexicográficas/terminológicas relacionadas a outras áreas:

Comunicação
1. Informação; participação; aviso. 2. Transmissão. 3. Notícia. [...] 5. Ligação. [...]
7. Relações. [...] 9. Comunicação social: conjunto dos órgãos de difusão de notícias
(imprensa, rádio, televisão). 10. Prática ou campo de estudo que se debruça sobre
a informação, a sua transmissão, captação e impacto social (FERREIRA, 2014).
Comunicação
Comunicação, linguagem e leitura 3

1. Ato ou efeito de comunicar (-se). 2. Ato que envolve a transmissão e a recep-


ção de mensagens entre o transmissor e o receptor, através da linguagem oral,
escrita ou gestual, por meio de sistemas convencionados de signos e símbolos.
3. O conteúdo da mensagem transmitida. 4. Transmissão de uma mensagem a
outrem. 5. Exposição oral ou escrita sobre determinado assunto, geralmente
de cunho científico, político, econômico, etc. 6. Ato de conversar ou de trocar
informações verbais. 7. Nota, carta ou qualquer outro tipo de comunicado
através da linguagem escrita. 8. Comunicado oral ou escrito sobre algo; aviso.
[...] 10. União ou ligação entre duas ou mais coisas (MICHAELIS, 2014).

As definições apresentadas pelos dois dicionários têm em comum os conceitos


que sempre apresentam alguma forma de relação e algum tipo de mensagem, infor-
mação ou dado que é transmitido entre aquele que transmite e aquele que recebe.
Ora, portanto, é possível pensar na comunicação como um processo social
e natural que tem o objetivo de transmitir um pensamento, um desejo, um
impulso ou uma ação (transformados em mensagens) entre um participante
e outro. Dessa maneira, sabe-se que a comunicação é responsável pela orga-
nização das interações, bem como pela troca de informações, disseminação
de conhecimento e qualquer outra ação que necessite de uma mutualidade
(novamente o “comum” da origem latina) entre os participantes.
A menos que algum indivíduo deseje se mudar para uma ilha deserta e viver
sozinho (e, ainda assim, ele poderá se comunicar consigo mesmo), a vida em
sociedade requer constantes interações. Essas interações não precisam ocorrer
diretamente entre duas pessoas. Quando estamos dirigindo, por exemplo, e
avistamos uma placa de “PARE” à nossa frente, recebemos uma mensagem,
portanto, houve uma comunicação.
Embora a comunicação tenha sido feita entre um objeto inanimado e uma
pessoa, na verdade a mensagem comunicada sobre a necessidade de parar naquele
determinado ponto da estrada não foi passada apenas pela sinalização, pois a
comunicação ocorreu entre a instituição responsável por determinar que havia
necessidade de uma placa “PARE” naquele ponto e o motorista. Percebemos que a
comunicação, então, é a responsável e é a interface para qualquer interação humana.
Embora o conceito de “comunicação” tenha se tornado bastante amplo com o
tempo, a origem da palavra sugere alguns conceitos que delimitam o seu sentido:

1. comunicação é, primeiramente, um processo social; portanto, envolve


o ser humano;
2. é um fenômeno objetivo, que envolve a transmissão de uma mensagem
entre um transmissor e um receptor;
3. é um processo ativo que tem uma finalidade: persuadir, informar,
influenciar, obter resposta, emocionar, etc.;
4 Comunicação, linguagem e leitura

4. é, quase sempre, multidirecional, uma vez que existe uma alternância


de posições entre transmissor e receptor, isto é, a cada nova mensagem
transmitida, uma das pessoas envolvidas no processo comunicativo
assume o papel de ora transmissor, ora receptor;
5. o processo ocorre em três etapas, sendo elas: emissão, transmissão e recep-
ção. Alguns teóricos, por sua vez, inserem às etapas um processo anterior
à emissão, que é a “formulação” do que será transmitido e um posterior à
recepção, que consideram como “processamento” da mensagem recebida.

Neste material serão utilizados os termos sinônimos para transmissor/receptor, emis-


sor/receptor ou locutor/interlocutor nas nomenclaturas definidas pelas teorias da
comunicação.
Além disso, serão abordadas minuciosamente as diferentes acepções sobre as
mensagens transmitidas entre locutor e interlocutor. O termo “mensagem” será utilizado
como tudo que é transmitido entre os participantes do processo comunicativo, sendo
ela um dado, uma informação, uma sinalização, etc.

É importante mencionar que para que se tenha comunicação, é necessário


que haja um objetivo, um propósito e a racionalidade para que se tome por
necessário que a mensagem elaborada seja comunicada e transmitida a um
receptor específico. É uma ação pensada. Portanto, quando estamos na rua e
vemos o céu carregado de nuvens pretas, não existe um processo comunicativo
entre nós e o céu – porque ele não tem um objetivo e uma racionalidade de avisar
para as pessoas “olha só, pega teu guarda-chuva porque vai chover”. Algumas
pessoas, obviamente, consideram que possa ser um processo comunicativo
entre Deus e o homem – mas neste material vamos considerar a comunicação
estrita e unicamente como processo humano.
Existem, obviamente, diferentes tipos de comunicação. Vamos tentar
abordá-las de forma resumida abaixo:

„„ Direta ou indireta
■ Direta é quando o emissor e o receptor trocam mensagens de forma
direta, sem nenhum intermediário.
Comunicação, linguagem e leitura 5

■ Indireta é quando há um intermediário entre o emissor e o receptor,


por exemplo, um telefone, computador, carta, livro, etc.
„„ De acordo com a quantidade de pessoas
■ Intrapessoal: a comunicação é feita por uma pessoa consigo mesma
(como escrever em um diário, em um blog, colocar lembretes no
celular, etc.).
■ Interpessoal: a comunicação é realizada entre duas pessoas.
■ Intergrupal: a comunicação é transmitida entre grupos (turmas de
escola, partidos políticos, etc.).
■ Intragrupal: a comunicação é realizada entre mais de duas pessoas
(grupo de mensagens em redes sociais, conversa entre grupos de amigos,
etc.).
■ Em massa: comunicação em que uma mensagem é transmitida
de um emissor para um grupo (como mensagens transmitidas na
televisão ou rádio).
„„ De acordo com a direcionalidade
■ Unidirecional: quando uma mensagem é transmitida e não há resposta
(por não haver necessidade ou objetivo do receptor em responder).
■ Bidirecional: quando existe uma participação equivalente entre
receptor e emissor e os participantes assumem o papel de ora receptor,
ora emissor em uma troca de mensagens.
„„ De acordo com os sentidos e os tipos de mensagens
■ Visual: quando recursos visuais são utilizados para a transmissão
das mensagens (sinalização, gestos, desenhos, etc.).
■ Auditiva: quando a mensagem é transmitida por meio de sons (fala,
música, sirene, etc.).
■ Tátil: quando é realizada por meio do toque (abraços, beijos, leitura
em braile).
■ Olfativa: bastante comum entre os animais (reconhecimento de um
odor para ensinar o que é um tipo de tempero, percepção de um certo
perfume para comunicar uma venda, etc.).
■ Gustativa: quando o paladar é envolvido para que uma mensagem
seja comunicada (como provar uma comida para demonstrar que é
doce ou salgada).

Existem, obviamente, outras classificações para os diferentes tipos de


comunicação, como: pessoal, profissional, aberta, fechada, pública, secreta,
etc., cujos nomes são suficientes para o entendimento.
6 Comunicação, linguagem e leitura

Outra abordagem importante para os estudos sobre a comunicação se refere


aos modelos de representação prototípica de uma comunicação. O modelo
mais comum e canônico é aquele que define três componentes essenciais da
comunicação:

1. o emissor – é o indivíduo com racionalidade e que deseja transmitir


uma mensagem com um certo objetivo.
2. a mensagem – aquilo que é transmitido para um receptor.
3. o receptor – é o indivíduo com a capacidade de receber a mensagem
transmitida, decodificá-la, processá-la e agir (ou deixar de agir) sob ela.

Um modelo mais elaborado adiciona outros três elementos ao modelo


canônico, sendo eles:

4. o canal – é o meio de transmissão da mensagem.


5. o código – é o conjunto de signos utilizados para a formulação da
mensagem.
6. o contexto – situação ou objetivo em que a situação comunicativa está
inserida.

Existem diversos modelos a respeito da comunicação e transmissão da mensagem


que se baseiam em objetivos e pressupostos teóricos diferentes.
Shannon e Weaver (1963), por exemplo, apresentam um modelo bastante conhecido
com cinco elementos: fonte de informação, transmissor, fonte de ruído, receptor e
destinatário.
Por serem engenheiros de telecomunicações, suas maiores preocupações eram
relacionadas sobre a forma como a mensagem era transmitida com o objetivo de
resolver problemas técnicos – por conseguinte, o modelo apresentado pelos dois
autores pode não ser considerado apropriado para outras situações comunicativas.
Leia mais em Valente (2010) sobre os modelos de comunicações listados abaixo:
„„ modelo linear de Lasswell;
„„ modelo interpessoal de Schramm;
„„ modelo circular de Jean Cloutier;
„„ modelo geral de comunicação de Gerbner;
„„ modelo de comunicação em massa de Schramm;
„„ modelo de processos de comunicação em massa de Maletzke;
„„ modelos culturais de Edgar Morin e de Abraham Moles.
Comunicação, linguagem e leitura 7

Ao tratarmos de comunicação, também é substancial que abordemos, ainda


que brevemente, as máximas comunicacionais de Grice (1957, 1975). Portanto,
vamos considerar os principais pontos dessa teoria:

As máximas comunicacionais de Grice


Grice (1957, 1975) defende que existe um conjunto de regras (que ele denomina
de máximas) que devem ser respeitadas para qualquer ato comunicacional e
que são as bases para o princípio da colaboração. De acordo com o autor, para
que haja uma comunicação eficiente, deve existir uma cooperação entre os
participantes da emissão/recepção de mensagens. Essas máximas podem ser
entendidas como norteadores do comportamento linguístico do emissor e que,
caso sejam desrespeitadas (a menos que se tenha um objetivo para que alguma
máxima seja propositalmente quebrada), podem prejudicar o ato comunicativo.
Essas máximas são:

„„ Máxima da qualidade — preza que a mensagem seja a mais verdadeira


possível, sem afirmações sobre o que se acredita que seja falso e sem po-
sicionamentos sobre o que não temos provas/conhecimento o suficiente
para corroborar a veracidade. Leve em consideração o diálogo abaixo:

A: — Oscar Wilde é o autor do Orgulho e Preconceito?


B: — Não.
Se B respondesse “não sei”, ou alguma resposta que fosse positiva, ele
estaria violando a máxima da qualidade.
Obviamente, existem situações em que essa máxima é propositalmente
violada, como, por exemplo, em ironias e metáforas.

„„ Máxima da quantidade — defende que a mensagem transmitida (in-


formação passada a alguém) não seja nem menos, nem mais informa-
tiva do que ela precisa ser para alcançar os objetivos daquela situação
comunicacional. Observe o diálogo a seguir:

Atendente (enquanto preenche um formulário): — Qual a sua cidade natal?


Cliente: — Porto Alegre, que é onde tem o Guaíba e é a cidade onde nasceu
a cantora Elis Regina.
As informações “que é onde tem o Guaíba” e “é a cidade onde nasceu a
cantora Elis Regina” quebram a máxima da quantidade, porque o objetivo
8 Comunicação, linguagem e leitura

comunicacional dessa interação específica era apenas preencher um formulário


com o nome de uma cidade, sem que houvesse necessidade de explicações
extras sobre o local.

„„ Máxima da relevância — objetiva que a contribuição para a situação


comunicacional seja relevante e pertinente ao objetivo da interação.
Tome por exemplo a seguinte conversa:

A: — Preciso de ajuda para comprar um computador novo.


B: — Posso te encontrar na loja às 12 horas.
Uma resposta que não tivesse qualquer relação e pertinência à primeira
mensagem comunicada por A quebraria a máxima da relevância. Por exemplo,
se B respondesse “Amanhã vai ter um show do U2”, ele estaria violando a
máxima da relevância, porque nessa situação comunicacional a informação
sobre o show do U2 é completamente irrelevante para a necessidade de A, que
é de alguém que o ajude a escolher um computador novo.

„„ Máxima de modo — esclarece que a mensagem deve ser clara, sem


ambiguidade e comunicada de forma breve e organizada.

Para Grice (1957, 1975), essas máximas são as principais organizadoras


de qualquer situação comunicativa e suas violações só podem ocorrer quando
for para um objetivo proposital de uma determinada situação, como para
confundir propositalmente alguém, ou para tentar fugir de uma resposta, etc.
Tendo abordado os conceitos sobre comunicação, suas formas, princípios,
modelos e teorias de aporte, podemos chegar à conclusão de que ela é um obje-
tivo da linguagem, que envolve a transmissão da mensagem de forma racional
e objetiva e pode se manifestar de diferentes formas. Não podemos esquecer
que o principal fundamentador da comunicação é a interação proposital, uma
vez que exista comunicação, sempre tem um objetivo ou uma necessidade para
que ela seja colocada em prática. Por conseguinte, o céu carregado de nuvens
não se comunica com um ser humano, uma vez que não existe a racionalidade
e a intenção do céu em alertar a pessoa sobre o comportamento climático.
Contudo, um aceno, uma carta, um sorriso, uma conversa e, algumas vezes,
até mesmo o silêncio, podem ser considerados formas de comunicação.
A comunicação acontece por meio da linguagem e também (mas não
exclusivamente) da língua. Portanto, a seguir vamos estudar os conceitos de
linguagem e língua, suas diferenças e objetivos.
Comunicação, linguagem e leitura 9

Linguagem: conceitos e tipos


A definição do que consiste linguagem é um assunto amplamente discutido
nos estudos linguísticos. Algumas teorias tratam de linguagem como sinônimo
de língua. Outras, como a defendida por Saussure (1975) (considerado o pai
da linguística moderna), apresentam uma distinção bastante clara sobre os
dois conceitos. Com base nessa definição, que defende uma diferença entre
linguagem e língua, é que decorreremos sobre o assunto nesta parte do material.
Imagine que você é uma turista brasileira, falante somente da língua
portuguesa e que está de férias nos Estados Unidos. Em um determinado
dia, enquanto você está dirigindo pelas ruas de Wisconsin, ouve uma sirene
e visualiza, pelo espelho retrovisor, luzes piscando dispostas em cima de
um veículo branco e vermelho. Você sabe que as sirenes, as luzes e o tipo
de veículo indicam algum tipo de emergência e supõe que deve dar espaço
na rodovia para que aquele automóvel passe. Contudo, quando você engata
a marcha para dar partida no seu carro, você olha para frente e vê que há
um semáforo com uma luz vermelha ligada. Você sabe, então, que não pode
avançar e ultrapassar o sinal vermelho. Entretanto, você observa que a rodovia
à frente está sem movimento, percebe que não há barulho de nenhum veículo
se aproximando e que a ambulância está próxima; então, você toma a decisão
de passar o sinal vermelho apenas para dar espaço. Ao fazer isso, você nota
que existe uma placa branca na calçada com uma cruz vermelha e o texto
0,5 miles abaixo do desenho. Logo, você reconhece o significado do símbolo
daquela cruz vermelha e embora possa não entender numericamente o que
0,5 miles representa em distância, você entende que aquela placa comunica
que há um hospital um pouco a frente. Com isso, você fica aliviada que a
ambulância está próxima de um local de socorro.
O parágrafo acima traz exemplos de elementos que são considerados como
pertencentes à linguagem (e em alguns determinados casos, também à língua).
Embora, no exemplo, você não seja falante da língua inglesa e esteja nos Esta-
dos Unidos, vários recursos visuais e auditivos comunicaram as mensagens
necessárias para que você compreendesse uma determinada situação e agisse
em consequência dela. No caso do exemplo, vemos os dois tipos de definições
principais a respeito da linguagem (que serão posteriormente discutidas): os
diferentes elementos que comunicam mensagens e a capacidade da motorista
de identificar essas mensagens.
10 Comunicação, linguagem e leitura

Entre os elementos visuais do exemplo, podemos perceber que um veículo


branco e vermelho com luzes piscando na parte de cima representam – em
diversos países – uma ambulância. Um semáforo com uma luz vermelha ligada
simboliza a impossibilidade de avançar em uma rodovia. Uma placa com uma
cruz vermelha pode significar a indicação de um hospital nas redondezas. A
legenda da placa, com um certo número e uma palavra, representam a distância
entre aquele ponto e outro. Embora a motorista possa não compreender a distân-
cia com precisão (uma vez que nos Estados Unidos utilizam milhas, enquanto
no Brasil utilizamos quilômetros), ela consegue compreender que ali existe
um indicativo e uma informação importante para aquele determinado cenário.
Entre os elementos auditivos, o som da sirene indica a aproximação de
algum tipo de veículo que trabalha com emergências; o silêncio na rodovia,
ao perceber que não haveria nenhum carro se aproximando na estrada em
frente ao sinal vermelho, indica a possibilidade de desobedecer a regra do
sinal vermelho para dar passagem para a ambulância. Portanto, o silêncio
também pode comunicar.
Podemos perceber, com esse exemplo, que a linguagem tem a função
principal de comunicar e que ela não está – necessariamente – atrelada a
uma língua específica; ou seja, as línguas trabalham para a linguagem e são
uma forma de manifestação da linguagem, mas a língua é um componente
da linguagem e não comporta todas as possibilidades dela.
Saussure (1975) entende linguagem como uma faculdade fornecida pela
natureza; isto é, ela é uma capacidade humana (e até animal) de se comunicar
e de passar uma mensagem. A linguagem, por conseguinte, independe de um
único canal e forma – ou seja, não está atrelada e fixa à língua, mas é vista
como uma “entidade” maior do que a língua – que passa a ser vista como
uma “ferramenta” organizadora e sistêmica dessa faculdade comunicacional.
A ler a situação do exemplo da turista dirigindo nos Estados Unidos,
percebe-se que os seus conhecimentos sobre a língua portuguesa e a pré-
-determinação feita por ela certamente o fizeram estranhar o uso de substan-
tivos, adjetivos e pronomes femininos (turista brasileira, aliviada, motorista,
ela) em vez de substantivos masculinos que — via de regra — é o que a língua
determina e espera para uma generalização e exemplificação. Esse conceito e
“regra” fazem parte do conjunto da língua (e não da linguagem), que é enten-
dida como um sistema de regras, definições, conjuntos lexicais e gramaticais
que servem como organizador do pensamento e da faculdade da linguagem.
Comunicação, linguagem e leitura 11

Em resumo, a linguagem é tudo aquilo que comunica, podendo ser visual,


auditiva, sensorial e não necessariamente apenas verbal. Pode-se dizer que a
linguagem surgiu antes da língua e que está presente em todos os momentos
dos nossos dias, mesmo quando a língua se ausenta.
Um dos primeiros exemplos de linguagem são os gestos. Sabemos que
em muitos países, o dedo indicador em frente à boca sinaliza um pedido de
silêncio. Entendemos, também, que uma mão estendida com a palma voltada
para a pessoa em frente significa “pare”, que o dedo polegar para cima é uma
afirmação, que balançar a cabeça para cima e para baixo significa “sim”, en-
quanto para os lados, que comunicar o “não”. Contudo, é preciso observar que
os gestos, muitas vezes, acabam tendo uma interface com a cultura e podem
ter significados diferentes em consequência disso. Um exemplo é a comuni-
cação do “sim” e do “não” com a cabeça. Na Bulgária, as significações dos
movimentos da cabeça são o oposto dos quais estamos acostumados no Brasil.
Para os búlgaros, movimentar a cabeça para cima e para baixo significa “não”
e para os lados, “sim”. Outro exemplo é o gesto das mãos que utilizamos para
comunicar o número dois. No Brasil e em diversos outros países, normalmente
utilizamos a mão com a palma virada para quem nos enxerga quando queremos
dizer “dois”, como no exemplo da Figura 1. Já na Grã-Bretanha, esse gesto é
inapropriado e tão ofensivo quanto levantar o dedo do meio na nossa cultura.
Isso se deu porque o símbolo da forma como fazemos foi utilizado pelos rivais
da Inglaterra durante a guerra como forma de humilhação com base em um
determinado momento da batalha. Desde então, o nosso símbolo manual
para o número dois é visto como ofensivo para os britânicos. Se, portanto,
você está na Inglaterra e quer avisar a um amigo britânico que está distante
de você para que ele compre duas garrafas de refrigerante, você deve fazer o
sinal do número dois com a palma da mão virada para você, caso contrário,
há chances de você perder o refrigerante e o amigo.
12 Comunicação, linguagem e leitura

Figura 1. Forma como brasileiros representam o número dois com


as mãos.
Fonte: Sinseeho/Shutterstock.com.

Com base nos exemplos citados acima, vamos, agora, abordar duas defi-
nições para linguagem:

1. Linguagem é a faculdade mental para a aquisição e o emprego de dife-


rentes formas e sistemas utilizados para a comunicação. Essa capacidade
permite que o ser humano desenvolva e se aproprie de diferentes formas
e sistemas (como as línguas, as sinalizações, etc.) para estabelecer uma
comunicação com outros. Ela difere da linguagem dos animais porque
a linguagem humana se desenvolve e se desdobra com a racionalidade
a respeito dela, permitindo que o ser humano crie e manipule sistemas
que expressem infinitas possibilidades linguísticas – diferente da lin-
guagem de comunicação animal que somente exerce funções limitadas.
Comunicação, linguagem e leitura 13

Uma das maiores discussões entre os estudos da linguagem é em torno da forma


como os seres humanos “adquirem” a linguagem.
Alguns estudiosos defendem que a adquirimos por meio da imitação – ou seja,
quando nascemos adquirimos a linguagem por meio de um processo de observação,
em que “aprendemos” com outras pessoas como a linguagem deve ser utilizada.
Alguns estudos refutam essa teoria por demonstrar exemplos em que um deter-
minado comportamento da linguagem foi adquirido por uma criança sem que ela
houvesse sido exposta a um exemplo.
Outros estudos afirmam que somos condicionados a desenvolver a habilidade da
linguagem por uma necessidade. O condicionamento e a exposição nos ensinam a
desenvolver a linguagem.
Ainda há aqueles que defendem o inatismo, afirmando que a linguagem é uma habi-
lidade inata, ou seja, já nascemos programados com a faculdade mental da linguagem
e que a desenvolvemos com o passar do tempo. Esse desenvolvimento provém de
uma capacidade que nos é inata, não de uma construção desde os princípios dessa
habilidade.

2. Linguagem é qualquer sistema/elemento que permite que se estabeleça


uma comunicação, servindo como uma função social e levando em
consideração todas as manifestações que possam ser utilizadas para
expressar uma mensagem. De acordo com esse processo de pensamento,
podemos entender que a linguagem é tudo aquilo que comunica.
Além dos gestos, entre os exemplos de linguagem, podemos pensar em:
■ desenhos, pinturas e esculturas — como a rupestre, que existia antes
de qualquer língua ser formulada;
■ expressões faciais e corporais — como sorrisos, lágrimas e abraços
que comunicam quase sempre a mesma coisa em qualquer país do
mundo;
■ música — que pode alterar emoções, fazer chorar, criar memórias,
inquietar, etc., independente da língua em que a letra é cantada (ou
até mesmo da ausência de letras);
■ ícones, símbolos e placas — como as de trânsito, de computadores,
de livros, etc;
■ sons — como gritos, suspiros, apitos, etc., que podem comunicar
diversas mensagens;
■ cores — como os semáforos, por exemplo;
■ língua — português, inglês, italiano, etc.
14 Comunicação, linguagem e leitura

A partir das delimitações dos conceitos de linguagem e dos exemplos


dados acima, podemos perceber que existem diferentes tipos de linguagem
que se dividem de acordo com o tipo de “materialização” da mensagem e que
podem ser categorizados da seguinte forma:
Linguagem verbal: é aquela que utiliza a verbalização para a comunicação,
ou seja, que ocorre por meio da fala ou da escrita utilizando palavras, como,
por exemplo, uma conversação, uma informação transmitida pela televisão,
uma publicação em redes sociais que utilize texto ou som, uma mensagem
de texto, etc.
Linguagem não verbal: é aquela que não utiliza verbalização (palavras)
para transmitir uma mensagem, de forma que não acontece nem por meio da
fala, nem da escrita. Entre os exemplos de linguagens não verbais estão as
placas de trânsito, a linguagem corporal, as expressões faciais, etc.
Linguagem mista: é a que mistura a linguagem verbal e não verbal; ou
seja, transmite uma mensagem utilizando recursos verbais e recursos não
verbais, como placas de sinalização com um símbolo e texto, músicas ou
histórias em quadrinhos.
Linguagem artificial: é o tipo de linguagem criada por alguém ou por
um grupo que é desenvolvida para um fim específico, em que os elementos
da linguagem natural podem ser inseridos, como, por exemplo, as linguagens
de programação de software.
Além dos diferentes tipos de linguagem, ela também pode cumprir distintas
funções, de acordo com o objetivo do emissor e/ou do tipo de mensagem. O
modelo mais clássico das funções da linguagem foi proposto por Jakobson
em 1960.

As funções da linguagem de Jakobson


De acordo com Jakobson (1960), existem seis funções de linguagens principais
que regem qualquer situação comunicativa. São elas:

„„ Função referencial (denotativa): é aquela que enfatiza e dá importância


ao referente de uma mensagem, transmitindo informações sobre esse
referente. Exemplos: textos jornalísticos ou científicos.
„„ Função emotiva (expressiva): é o tipo de função em que o emissor
explicita suas emoções, opiniões, sentimentos, crença. O maior foco
dessa função é o emissor. Exemplos: cartas ou letras de música.
Comunicação, linguagem e leitura 15

„„ Função conativa (apelativa): é a que tem como objetivo persuadir/


convencer o receptor da mensagem. Exemplo: textos publicitários.
„„ Função fática: é aquela que inicia ou termina uma interação conver-
sacional, que tem como foco a relação entre o emissor e o receptor.
Exemplos: saudações e cumprimentos.
„„ Função metalinguística: função que utiliza a linguagem para falar da
própria linguagem, quando o código linguístico é utilizado para falar
sobre o código linguístico. Exemplos: gramáticas e textos explicativos
sobre algum componente da língua.
„„ Função poética: quando a forma estética é importante para a mensagem
e há uma preocupação na forma como a mensagem será transmitida,
tal como o uso de figuras de linguagem, rimas, etc. Exemplos: poesias,
letras de música, mensagens publicitárias, etc.

Portanto, a linguagem tem duas principais definições (faculdade/habilidade


para a comunicação e qualquer forma/sistema que comunique) e ela pode ser
categorizada de acordo com o tipo de mensagem e pode exercer diferentes
tipos de função.
Uma das formas de manifestação da linguagem é por meio da língua, que
pode ser representada por meios sonoros e escritos. Entre a representação
escrita da língua, encontramos a prática da leitura, que serve tanto como
manifestação linguística quanto para a forma de comunicação e, também,
como meio de manutenção linguística – uma vez que a leitura permite acesso à
língua e, dessa forma, ajuda o leitor a desenvolver suas habilidades de língua,
de linguagem e de comunicação.

Leitura: definições e processos


O tópico leitura ao ser abordado, abre algumas possibilidades para a exploração
de diferentes perspectivas teóricas, pois podemos falar de leitura da perspectiva
cognitiva, da comunicacional, da inter- e intrapessoal, da metatextual, da
complexidade, da linguística, da cultural, da psicológica e assim por diante.
A leitura como processo cognitivo, comunicacional e linguístico será
apresentada aqui, privilegiando a interface entre linguagem, língua, comu-
nicação e texto que vai, de certa forma, tanger as outras faces sobre a leitura
que foram mencionadas.
16 Comunicação, linguagem e leitura

O conceito de leitura e de texto abordados aqui, refere-se à “leitura” como


o processo de interação entre leitor e um texto escrito; e o “texto”, como as
produções exclusivamente verbais escritas. Embora a linguística sistêmico
funcional de Halliday e Hasan (1989), por exemplo, considere como “texto” toda
e qualquer produção que carregue uma mensagem, nesse material trataremos
como texto somente os documentos/materiais escritos, como, por exemplo,
livros, cartas e essas palavras que estão sendo lidas neste exato momento.
Antes de mais nada, devemos ter alguns conhecimentos básicos que en-
volvem a leitura:

„„ a leitura é um processo – ou seja, ela é uma ação que envolve esforço


cognitivo, atenção e objetivo. Pode ser leitura para busca de informação,
para prazer, para estudos, etc.;
„„ esse processo é social, comunicativo, cognitivo, linguístico e cultural:
■ social e comunicativo porque embora a leitura possa ser, na maioria
das vezes, uma atividade individual e silenciosa, o texto, além de
ser uma mensagem, também é um canal de comunicação entre o
autor e o leitor. Embora a interação aconteça diretamente entre o
leitor e o texto, este serve, na verdade, como um canal. A situação
comunicativa ocorre entre o autor (por meio da mensagem) e o leitor;
■ cognitivo porque é necessário um conjunto de esforços e atividades
mentais tanto para a decodificação, quanto para a interpretação,
significação, etc. Esse conhecimento cognitivo vai além da alfabe-
tização. Podemos abordar outros níveis de leitura que ultrapassem
a capacidade de ler e identificar palavras. Um leitor pode ler um
texto inteiro sobre linfologia, por exemplo, e ser apto a identificar e
decodificar todas as palavras que compõe o texto, mas não conseguir
entender o sentido do texto. Logo, a leitura foi apenas a nível lexical;
a validade do nível semântico (significado) e do nível pragmático
(língua em uso) não foi atingida e, nesse caso, alguns teóricos afir-
mam que o processo de leitura não foi verdadeiro e/ou satisfatório
aos objetivos do texto;
Comunicação, linguagem e leitura 17

Embora a leitura seja, na maioria das vezes, uma atividade individual e silenciosa; ela
pode cumprir outros propósitos e ser realizada de outras formas.
Podemos ler não necessariamente só um texto. Alguns teóricos consideram que
podemos “ler” um gesto, um sorriso, a alegria nos olhos de uma criança que acabou
de ganhar um cachorrinho, a sorte nas linhas da mão de alguém, o futuro em uma
bola de cristal, etc.
A leitura pode também ser compartilhada, ou seja, não individual. Imagine a leitura
de um livro em um grupo, em que cada pessoa é responsável por uma parte do
texto, como o ensaio para uma peça, ou a “contação” de histórias. Ela não precisa ser
silenciosa; ou seja, considere que um professor pode, por exemplo, ler um conto para
a sua turma de alunos.
Portanto, existem diversos tipos e níveis de leitura que devemos considerar.

■ linguístico e cultural porque textos escritos apoiam-se, quase ex-


clusivamente, em uma representação material escrita de um sistema
linguístico. Esse sistema envolve a capacidade cognitiva e a interna-
lização das regras e componentes da língua para que o leitor possa,
eficientemente, interpretar e entender os significantes gráficos que
carregam significados. E cultural, porque a língua está intrinsica-
mente conectada à cultura.

A partir disso, temos uma ideia geral de que leitura é um processo com-
posto por subprocessos para a decodificação, identificação, interpretação
e manutenção de significados, com o objetivo de assimilar uma mensagem
transmitida por meio de um texto.
Essa definição aborda de forma geral (e um pouco superficial) o conceito
desse processo. Quando lemos, não acessamos a realidade diretamente; afinal,
se lemos a palavra casa, não estamos vendo diante dos nossos olhos uma casa,
mas um conjunto de letras que – de acordo com Saussure (1975) – formam
um signo que representa uma casa. Pela convenção do português, ao lermos
a palavra “casa”, essa combinação de quatro letras evoca à nossa mente uma
imagem mental e uma ideia do que é uma casa. Embora essa imagem mental
seja diferente para cada pessoa (para uma pessoa a imagem mental é uma casa
pequena amarela, enquanto para outra é uma casa grande e branca), podemos
concordar que existe uma convenção social e linguística de que casa nos
transmite a ideia de uma construção com a finalidade de moradia.
18 Comunicação, linguagem e leitura

Dessa forma, o processo de leitura – que envolve a visão – nos faz olhar
para uma palavra e “enxergar” uma ideia, um objeto, uma ação, um conceito,
etc. Por conseguinte, o texto (e todos os seus componentes) serve como uma
ponte de acesso entre a realidade e o leitor.
Se a leitura é, então, uma ponte entre o leitor e a realidade, é preciso que o
leitor tenha conhecimento prévio dessa realidade. Esse conhecimento envolve a
capacidade linguística de decodificar os signos escritos e a capacidade mental
de conectar esses signos com seus referenciais no mundo real.
Voltamos a mencionar o exemplo da linfologia. Um leitor que não conhece
o significado da palavra linfologia fará apenas uma leitura a nível lexical (e
talvez morfológico e fonológico). Ele pode chegar à conclusão que é um tipo de
estudo, por saber que o sufixo -logia se refere ao “estudo de” em substantivos
da língua portuguesa. Contudo, se lhe falta o conhecimento da realidade
representada pela palavra linfologia (que é o estudo do sistema linfático), a
leitura não será eficiente porque o leitor não tem capacidade de interpretar o
código, e esse código não servirá como ponte entre ele e a realidade porque
a realidade é inexistente na mente do leitor. Alguns teóricos consideraram
que nem sequer existiu a leitura – apenas uma decodificação de um código.
Além da noção geral sobre o que é leitura, teóricos sugerem duas definições
estritas sobre leitura, sendo elas: a extração de significado de um texto e a
atribuição de significado ao texto.
Quando consideramos a leitura como extração de significado de um texto,
afirmamos que o significado está contido no texto e que o leitor precisa ativar
sua habilidade de leitura e seus conhecimentos prévios da realidade para
conseguir decodificar, interpretar e assimilar o conteúdo lido, de forma que
ele possa extrair e armazenar a única significação presente em um texto.
Ao tratarmos de leitura como processo de atribuição de significado, con-
sideramos que o significado está na mente do leitor e que os componentes
textuais apenas ativam em seu cérebro as imagens mentais necessárias para
que elas façam sentido e que esse sentido e significação podem ser diferentes
de acordo com cada leitor – uma vez que a realidade é vista de forma diferente
por cada pessoa.
É por causa dessa dicotomia extrair/atribuir que a definição sobre o que é
a leitura é bastante ampla e nunca completamente fechada. Para que possa-
mos aprofundar as ideias estabelecidas por extrair e por atribuir, precisamos
entender o que é significado e como podemos acessar esse significado. Essa é
uma fundamentação teórica destinada à linguística e que pode ser encontrada
e estudada na obra de Saussure (1975) – Curso de linguística geral.
Comunicação, linguagem e leitura 19

Portanto, consideraremos a interpretação de “significado” como a ideia e


a atribuição de um conceito da realidade a um determinado signo, símbolo,
código, sendo o “significado” considerado como: acepção, sentido ou valor
semântico de um determinado signo/código.
Quando aceitamos que a acepção de leitura é a extração de significado
de um texto, concordamos que cada texto apresente um significado específico
e completo – sendo de responsabilidade do leitor acessar o texto e retirar de
dentro dele “o que o autor quis dizer” e quais são as informações que o texto
traz. Dessa forma, se enfatiza a leitura não como um processo, mas como o
resultado final com base naquilo que foi extraído do texto. Contudo, afirmar
que ler é extrair significado limita muito o processo de leitura. Se “significado”
é uma forma de interpretação da realidade e “interpretação” é um processo
que embora limitado, seja individual, como é possível que um texto tenha
um significado limitado e único e seja extraído pelo leitor? Estamos, então,
esvaziando quaisquer possibilidades de múltiplas significações de um texto
ou de um segmento? Assumimos, dessa forma, que só pode haver um signi-
ficado atrelado a cada produção textual? E se em parte do texto o leitor não
conseguir achar o referencial da realidade ao ler uma palavra desconhecida,
então o sentido do texto não poderá ser extraído e a leitura se tornará inválida?
Obviamente não, pois um texto pode ter interpretações e significações dife-
rentes. Portanto, definir o processo de leitura como “extrator” de significado
é colocar a leitura em uma caixa bastante limitada e fechada.
Por outro lado, podemos também aceitar que leitura é a atribuição de
significado a um texto, admitindo que o significado não se encontra encerrado
no texto e que depende do leitor. Dessa maneira, um mesmo texto pode evocar
realidades diferentes e, por conseguinte, interpretações diferentes para cada
leitor. Esse fato está relacionado ao conhecimento de mundo e da realidade,
bem como ao conhecimento linguístico de cada pessoa ao ler um texto. A
interpretação e significação não são apenas a soma do significado de cada
uma das palavras do texto, mas a acepção da decodificação das palavras e a
ponte entre elas e o conceito de realidade que o leitor pode acessar. Portanto, a
compreensão de um texto não é entendida como um produto final, mas como
um processo que se constrói ao longo do acesso à leitura. Embora esse conceito
de “atribuição de significado” pareça ser mais satisfatório do que a primeiro,
ainda é limitado, porque se a construção de significado estiver apenas no
leitor, o texto jamais servirá como instrumento de instrução e apresentação
de realidades novas, deixando de exercer sua principal função. A leitura, além
de apresentar novos conceitos, também é uma das principais responsáveis
pela manutenção linguística e pelo ensino de palavras e estruturas. Logo, se
20 Comunicação, linguagem e leitura

assumíssemos que a leitura é um processo de atribuição de significado, um


texto jamais poderia ensinar o significado de uma palavra nova, como sabemos
que, na realidade, acontece.
Por isso, diante das limitações de ambos conceitos de leitura (extração/
atribuição), é preciso achar um meio-termo que satisfaça e tente explicar o
que é leitura; isto é, leitura é interação entre leitor e texto, de forma que a
extração e a atribuição e, por conseguinte, a significação – sejam processos
constantes e simultâneos, acessados e utilizados em momentos diferentes em
uma interação que envolve o leitor, o texto, o autor, a situação, o objetivo, o
conhecimento linguístico, a pluralidade de significações e o resultado do que
acontece durante o contato do leitor com o texto.
Por ser uma interação, é preciso que haja um objetivo do leitor diante do
texto. Esse objetivo pode ser natural e pessoal, como, por exemplo, a leitura por
prazer ou pela busca de informações, podendo também ser “forçada”, como,
por exemplo, a leitura exigida por um professor para uma determinada tarefa;
de uma forma ou de outra, sempre há um objetivo para a leitura.
Por haver essa intencionalidade, podemos compreender a leitura como um
conjunto de processos que ocorrem simultânea ou sequencialmente na interação
entre leitor-texto. Esses processos envolvem a ativação de conhecimentos
linguísticos, a evocação da realidade para a significação, a decodificação
dos signos escritos, etc. Portanto, dizer que o processo de leitura é simples
torna-se um erro bastante grande. A leitura é um processo de subprocessos
guiados para um determinado objetivo.
Ainda sobre a complexidade da leitura, podemos identificar pelo menos
três componentes que fazem parte desse processo, sendo eles: a habilidade
de enxergar (uma vez que para a leitura é necessário que o olho “passe” sobre
palavras), o conhecimento para decodificar e interpretar os códigos textuais
(a alfabetização e o conhecimento prévio da realidade) e o uso da memória de
trabalho – componente cerebral bastante ativo durante o processo de leitura e
que possibilita a manutenção da informação e conecta as ideias apresentadas
no texto com o acesso das informações já existentes na memória de longo
prazo para a construção de novos significados.
O processo de significação é tão complexo que poderíamos escrever um
livro sobre esse assunto, uma vez que o procedimento vai desde a interpretação
de cada letra, até a junção de letras para o reconhecimento dos morfemas, às
regras de formação de palavras, às possibilidades de combinações de palavras,
o conhecimento de aceitar construções textuais válidas e rejeitar anomalias
linguísticas, etc. Observe o que Leffa (1996, p. 20) diz sobre o processo lin-
guístico e cognitivo necessário para a leitura:
Comunicação, linguagem e leitura 21

Da palavra, o processo avança para o sintagma; do sintagma à unidade de


sentido, da unidade de sentido à frase – quando houver – e, assim por diante,
até esgotar o texto, que pode ser um conto, um poema, um romance, um
noticiário de jornal, um rótulo, um painel de propaganda, um horário de
avião, uma programação de televisão ou qualquer outra manifestação textual.

Em suma, a leitura pode ser considerada um fenômeno de interação entre


o leitor e o texto. O leitor, que possui habilidades e conhecimentos prévios
que são constantemente ativados durante o processo de leitura, interage com
um autor por meio de um canal-mensagem: o texto. Esse processo é uma
cadeia simultânea e sequencial de subprocessos altamente complexos em que
a interação é uma constante passagem de informações entre o texto e o leitor.
Desse assunto, é possível desdobrar diversos outros tópicos, tais como
a complexidade e a acessibilidade textual, as dificuldades cognitivas para
leitura, os transtornos de comportamento e leitura, a metatextualidade, etc.
Embora pareça simples, podemos concluir que a leitura é, na verdade, não só
crucial, mas também altamente complexa.

1. Quais são os três componentes a) A: — Qual sua idade? B: —


canônicos e essenciais 29 anos. (Máxima violada:
presentes em qualquer modelo Máxima de Relevância).
representativo de comunicação? b) A: — Quando é a prova de
a) Emissor, canal e receptor. Matemática? B: — Quarta-
b) Emissor, mensagem e ruído. feira. (Máxima violada:
c) Emissor, mensagem e receptor. Máxima de Modo).
d) Emissor, contexto e receptor. c) A: — Daniel Radcliffe é o
e) Mensagem, código e canal. ator que faz Harry Potter, né?
2. Dentre os diversos estudos sobre B: — Sim! (Máxima violada:
comunicação, um dos mais Máxima de Qualidade).
importantes é o das Máximas de d) A: — Qual sua idade? B: —
Grice, que define que existem Eu nasci em Porto Alegre,
quatro máximas (regras) que em fevereiro de 1989, tenho
devem ser observadas para que a 29 anos. (Máxima violada:
comunicação seja eficiente. Qual Máxima de Quantidade).
das alternativas abaixo apresenta e) A: — Eu não consigo entender
uma quebra de uma dessas essa parte da matéria. B: — Lê
máximas e qual a máxima violada? o capítulo 3 do livro. (Máxima
violada: Máxima da Relevância).
22 Comunicação, linguagem e leitura

3. Qual das alternativas melhor define d)


o conceito de Linguagem?
a) Uma faculdade/habilidade
adquirida somente por meio de
um processo de interação social.
b) Um sistema de convenções e)
e palavras utilizado por
um grupo de pessoas.
c) Uma área composta por
idiomas, como português,
inglês e espanhol.
d) Uma forma de comunicação
não-verbal.
e) Uma faculdade/habilidade 5. Qual alternativa apresenta uma
dada ao ser humano melhor definição para leitura?
para a comunicação. a) É uma atividade individual
4. Qual alternativa apresenta um e silenciosa.
tipo de linguagem mista? b) É um processo complexo de
a) subprocessos que podem
ocorrer simultaneamente e
sequencialmente. Esse processo
envolve aspectos sociais,
comunicativos, cognitivos,
linguísticos e culturais.
c) É um processo simples de
decodificação se códigos verbais.
b) d) É uma atividade unicamente de
extração de sentido de um texto.
e) É uma atividade unicamente
de atribuição de
significado a um texto.

c)
Comunicação, linguagem e leitura 23

BORDENAVE, J. O que é comunicação? São Paulo: Brasiliense, 1986.


FERREIRA, A. B. H. Mini dicionário Aurélio da língua portuguesa. Curitiba: Positivo, 2014.
GRICE, H. P. Logic and conversation. In: COLE, P.; Morgan, J. (Ed.). Pragmatics:syntax
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GRICE, H. P. Meaning. Philosophical Review, v. 66, p. 377-388, 1957.
HALLIDAY, M. A. K.; HASAN, R. Language, context and text. Oxford: Oxford University
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JAKOBSON, R. Lingüística e poética. In: JAKOBSON, R. Lingüística e comunicação. São
Paulo: Cultrix, 1960.
LEFFA, V. Aspectos de leitura. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1996.
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SHANNON, C.; WEAVER, W. The mathematical theory of communication. Champaign:
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VALENTE, S. Modelos de comunicação. [S.l.]: Instituto Piaget, 2010.

Leituras recomendadas
BENVENISTE, E. Categorias de pensamento e categorias de língua. In: BENVENISTE, E.
Problemas de linguística geral I. Campinas: Pontes, 2005. p. 68-80.
WOLF, M. Teorias das comunicações de massa. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

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