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ENSINO FUNDAMENTAL
Introdução
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o uso da língua e sua função na interlocução devam ser a tônica do processo educativo
em se tratando do ensino da língua materna.
Como já foi dito, o Ensino Fundamental não é lugar de discussões
metalingüísticas e muito menos de prescrições gramaticais, mas, se o objetivo é
proporcionar ao aluno situações que o levem a construir conhecimentos e formar
conceitos, nesse nível de ensino, a língua portuguesa deve ser tratada desde os seus
diversos usos, quer em termos de leitura, quer de produção, e o aporte teórico que pode
alicerçar essa concepção de ensino só poderá ser aquele inscrito na perspectiva
enunciativa da lingüística.
Dados os limites desse estudo, não se tem a pretensão de propor soluções
definitivas para o problema detectado, mas apenas elencar algumas reflexões que
poderão contribuir para que o ensino de língua materna assuma sua principal função no
Ensino Fundamental: a de municiar o aprendiz com os mecanismos lingüísticos
necessários à compreensão e produção dos diversos gêneros discursivos presentes no
cotidiano de qualquer cidadão e daqueles gêneros de que se valem as demais disciplinas
curriculares para tratar o conhecimento.
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− a concretizar a idéia de liberdade, por ser capaz de conceber e fazer escolhas e poder
operar essas escolhas dentro dos meios interno e externo, avaliando-as e avaliando sua
própria operacionalização.1
1
SANTOS, PEREIRA e AZEVEDO, 2004, p. 14-15.
2
NANCZHAO, 1998, p. 257.
127
informal, a educação formal tem tempos e espaços definidos; ocorre por meio da criação
de ambientes de aprendizagem, antecipando necessidades e conflitos.
A educação formal passa a ser, então, um simulacro do processo educativo
informal, no sentido de que tenta reproduzir situações conflitivas na forma de situações
de aprendizagem, para que o sujeito conhecedor tenha acesso ao conhecimento social e
historicamente produzido.
Todo o processo educativo, seja ele formal ou informal, só é possível por meio
da linguagem e, mais especificamente, da língua oral ou escrita. Conhecimentos
matemáticos, físicos, químicos, geográficos, independentemente de terem uma
linguagem própria, um sistema de formalização e representação, são veiculados pela
educação, formal ou não, por meio do sistema lingüístico, da linguagem verbal, oral ou
escrita. Os questionamentos, as explicações, as definições, os exercícios didáticos têm
na linguagem verbal sua forma de expressão e o meio de decifração/compreensão de
símbolos, figuras e gráficos pertinentes às diversas áreas do conhecimento. Qualquer
que seja a forma de educação, da mais sistemática a mais espontânea, tem como veículo
mais utilizado a língua, justamente por ser ela o meio mais viável de transmissão de
informações e de processamento delas rumo à formação de conceitos e,
conseqüentemente, à construção do conhecimento.
Falando em conhecimento, este é outro conceito de base a ser aqui discutido,
pois de como o compreendemos e entendemos o ato de conhecer decorre a concepção
de ensino de língua proposta.
O conhecimento é visto aqui como o resultado, o produto do processamento, da
organização, enfim, da sistematização do conjunto de informações a que somos
expostos a todo instante ou a que nos expomos quando temos um problema a
solucionar. Essas informações chegam a nós de várias formas e por diversas vias, desde
o que é percebido sensorialmente até o que é intelectualmente captado ou acessado.
O que ocorre é que essas informações por si só não se constituem meios para a
solução de problemas, precisam ser inter-relacionadas para assumir a configuração de
conhecimento construído e, então, poder ser adaptadas, ressignificadas e aplicadas,
como instrumentos de resolução, a situações que se colocam como problemas.
3
MORIN, 2002, p. 16 e 18.
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soluções para outras situações conflitivas. A cada evento que se apresenta ao sujeito
cognoscente, ele localiza e mobiliza o que já assimilou a respeito, ressignifica e
reconstrói o conhecimento que já possui e, buscando novas informações, realizando
novas interações, incorpora novas redes de relações ao seu conhecimento prévio,
ampliando-o, redimensionando-o e/ou sedimentando-o para a solução de novos
problemas.
Assim, sucessiva e recursivamente, o conhecimento vai sendo construído,
aprofundado, alargado, e o sujeito vai se tornando mais autônomo, mais senhor de suas
interpretações e ações sobre o mundo e sobre si mesmo.
Como diz Luckesi (1989, p. 47-48),
4
BEZERRA, 2002, p. 38.
129
Se a linguagem é o instrumento fundamental do processo de conhecer e se o
conhecer pressupõe o aprender, a linguagem desempenha na aprendizagem função
igualmente essencial, como mediadora das relações entre o sujeito e o objeto a
conhecer.
Nesse sentido, quando se pensa uma proposta para o ensino de língua materna,
outro conceito de base a ser repensado é o de aprendizagem. É preciso saber como se
entende o processo de aprendizagem, como se aprende, para poder conceber uma
proposta de ensino, uma vez que o ensino só tem sentido se pensado da perspectiva do
aprender.
Não há espaço aqui para analisarmos todas as formas de aprendizagem,
restringir-nos-emos, pois, à aprendizagem formal, sistematizada, escolar.
Se o ato de conhecer pressupõe a construção de uma rede de informações
interconectadas, faz-se necessário aprender a tecer essa rede. A aprendizagem, aqui, é
vista como o desenvolvimento de competências/habilidades essenciais ao ato de
conhecer como as de observar, comparar, classificar, analisar, sintetizar, interpretar,
criticar, descobrir, estabelecer relações. Outra vez, o desenvolvimento de tais
competências/habilidades tem como principal ferramenta a linguagem e,
essencialmente, a linguagem verbal. Desde a mais simples observação até a construção
da mais complexa rede de relações tem na verbalização o maior instrumento de
representação/sistematização/consolidação.
Segundo Piaget, aprender é diferente de conhecer. Aprender, para o autor, é
saber realizar, ao passo que conhecer é compreender e distinguir as relações necessárias,
é atribuir significado às coisas. Nesse sentido, aprender diz respeito mais aos
procedimentos e às estratégias empregadas pelo sujeito para agir sobre o objeto de
conhecimento e decifrá-lo ou ressignificá-lo.
Novamente, aqui, torna-se essencial a consciência sobre esses procedimentos:
aprender a aprender, pois, é fundamental para o aprimoramento das estratégias
pressupostas pelo conhecer. A meta-aprendizagem, assim como a metacognição, é
fundamental para assegurar ao sujeito a autonomia do seu desenvolvimento, uma vez
que lhe permite otimizar processos e redimensionar estratégias em função do objeto a
conhecer.
A aprendizagem resulta de construções efetivadas pelo sujeito cognoscente por
meio de estágios de reflexão, remanejamento e remontagem das percepções que
ocorrem na ação sobre o mundo e na interação com outras pessoas5. A aprendizagem é
resultado de um processo de interação entre o mundo do sujeito e o mundo do objeto,
por uma integração ativada pelas ações do sujeito6.
A aprendizagem, por decorrência, só acontece à proporção que o aluno age sobre
os conteúdos específicos e, desafiado por situações problematizadoras, tem suas
próprias estruturas de pensamento previamente construídas ou em construção. E, ainda,
pelo desenvolvimento de competências/habilidades, mantém uma relação ativa como o
conhecimento, relação essa que produz transformações no sujeito cognoscente e no
próprio objeto cognoscível.
No entanto, a aprendizagem não pode ser vista como um fenômeno unicamente
individual. Se o ser humano é aqui entendido como um ser essencialmente social, só se
pode compreender a aprendizagem como resultado de um constante processo de
interação, não apenas do sujeito com o objeto a conhecer, mas do sujeito com outros
5
MORAES, 2000, p. 200.
6
Id. Ib.
130
sujeitos. No caso específico do ensino formal, a aprendizagem decorre
fundamentalmente das interações aluno-professor e aluno-aluno.
Segundo Wood7, a teoria vigotskiana atribui ao sucesso alcançado pela
cooperação a base da aprendizagem e do desenvolvimento. A instrução, tanto formal
como informal, em contextos sociais variados, realizada por colegas, familiares, amigos
e professores dotados de maior conhecimento, é o principal veículo de transmissão
cultural do conhecimento. O conhecimento encontra-se inscrito nas ações, no trabalho,
nas brincadeiras, na tecnologia, na literatura, nas artes e na fala dos membros de uma
sociedade. E apenas por meio da interação com os representantes de vários grupos
sociais e culturais é que o sujeito poderá adquirir, incorporar e desenvolver
posteriormente aquele conhecimento. Ou seja, é através das múltiplas inter-relações que
o indivíduo mantém com os diferentes grupos sociais que vai construindo seu
conhecimento e incorporando valores, crenças e atitudes que compõem a cultura e que,
por sua vez, fazem-na perpetuar-se.
O ato de conhecer pressupõe uma ação do sujeito sobre o objeto de
conhecimento, no sentido de compreendê-lo e decifrá-lo, processos que, por sua vez,
implicam o ato de refletir, já que nem todo o objeto de conhecimento está disponível
sensorialmente. É pela possibilidade de representar simbolicamente, ou seja, pela
linguagem, que o sujeito consegue abstrair, logo, analisar, hipotetizar, deduzir,
generalizar, transferir, projetar, acessar e processar informações, sistematizando-as e
incorporando-as na forma de conhecimento construído.
É pela linguagem que o homem se apropria do conhecimento. E é pelo
questionamento sobre a realidade (esta concebida como um ponto de vista do sujeito,
logo, individualmente percebida e compreendida) que o conhecedor conhece. Portanto,
é a língua que permite ao sujeito assumir uma atitude investigativa sobre o mundo,
questioná-lo e questionar o conhecimento produzido, e, assim, construir sobre ele seus
pontos de vista. É a língua o principal instrumento de tomada de consciência do mundo
pelo sujeito.
Para Wittgenstein e Foucault, a linguagem é atributiva, isso é, não há qualquer
correspondência estrita (necessária, em termos filosóficos) entre as palavras
(linguagem) e as coisas (mundo), mas que é pela linguagem que damos sentido às coisas
(ao mundo).
Conhecer nada mais é do que atribuir sentido ao que se nos apresenta; conhecer,
portanto, pressupõe a linguagem para tal atribuição de sentido. É por meio da linguagem
que o sujeito conhecedor age sobre o objeto a conhecer e, nessa ação, construindo
hipóteses e generalizações, confere sentido a ele, apropriando-se desse objeto e tomando
consciência do próprio processo de conhecê-lo, o que, conseqüentemente, lhe permitirá
decifrar novos objetos cognocíveis e implementar novas formas de conhecer.
De acordo com Vygotsky (1998), quando trata do processo de formação de
conceitos, o signo, ao mesmo tempo em que funciona como elemento mediador nesse
processo, afigura-se como sua síntese, uma vez que se torna a exteriorização, a
abstração, a formalização do próprio conceito formado. A linguagem, nesse sentido,
assume papel mediador e estruturante no processo de conhecer. É por meio dela, e mais
especificamente por meio da língua, que significamos e representamos o mundo que se
nos dá a conhecer.
7
1996, p. 45.
131
É a língua a responsável pela transformação do conhecimento em saber e em
saber-fazer, visto que ela possibilita a socialização de informações e o desenvolvimento
de habilidades que o raciocinar pressupõe. É pela propriedade de referir pela língua que
o sujeito se constitui, instaura o outro e constitui o mundo que o cerca.
As concepções até aqui discutidas formam o alicerce sem o que não seria
possível delinear uma proposta para o ensino de língua materna no Ensino Fundamental.
Somente quando se tem por base e se acredita que a função da língua é a de mediar o
processo de conhecer em qualquer área pode-se propor que o ensino de língua
configure-se como uma instrumentalização ao ato de transformar informações em
conhecimento e, posteriormente, outra vez por meio da língua, transformar esse
conhecimento construído em ferramenta para a solução de problemas que o viver e o
conviver impõem.
Assim sendo, é hora de repensarmos o ensino da língua materna desde essa
perspectiva: algumas concepções, algumas diretrizes, alguns redimensionamentos.
Se a educação formal é tida aqui como uma simulação dos processos de ensino e
aprendizagem desenvolvidos pela educação informal, o ensino da língua materna não
poderia ser concebido de outra forma. Assim, o ensino da língua portuguesa deveria
seguir na direção da aquisição da linguagem oral, no sentido de que essa modalidade da
língua é apreendida e aprendida em seu uso, pela interação do sujeito com outros que já
a detém. Ensinar língua materna, então, significa expor o sujeito aprendiz a diferentes
situações de emprego da língua, seja na modalidade escrita para aprendê-la, seja na
modalidade oral para aperfeiçoá-la.
Hoje, as aulas de língua portuguesa estão direcionadas prioritariamente à
aquisição e ao desenvolvimento da língua escrita, quer em termos de compreensão
leitora, quer no que se refere à produção de textos. A língua oral é relegada a um
segundo plano ou nem sequer trabalhada, sendo inclusive “atrofiado” seu uso no
ambiente escolar, já que as interlocuções são limitadas e rigidamente supervisionadas, e
as intervenções dos professores sobre a oralidade dos alunos vão exclusivamente no
sentido da correção e, ainda, da correção com critérios do nível culto da modalidade
escrita.
Além disso, o ensino do português está muito longe de priorizar as situações de
uso efetivo da língua a ser aprendida/aprimorada; a descrição ou mesmo a normatização
do sistema lingüístico é o foco dos currículos na Educação Básica. A língua como
objeto de ensino é uma língua atemporal, fora de contexto, portanto, desprovida de
qualquer função, mas plenamente recheada de regras e normas, cuja infração é sempre
motivo de punição; é a língua sobre si mesma e por si mesma, sem qualquer vínculo
com as possibilidades reais de emprego e, menos ainda, sem qualquer possibilidade de
criação sobre ou de rompimento do sistema que é tido como restritivo e coercitivo; é
uma língua fossilizada, sem ninguém que a atualize, que a realize, que atribua sentido a
ela.
Ora, sabe-se bem que o sentido não está na língua, como entidade virtual, mas no
contexto de uso das formas da língua; é o discurso, como diz Ducrot, que doa sentido, é
na parole saussuriana que o dizer se faz dito e, portanto, pleno de sentido. Então, como
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conceber um ensino de língua que a artificializa, que suprime dela o que lhe confere
sentido? Como esperar que o aluno aprenda a usar uma língua, a sua língua, ensinando
suas formas e estruturas descontextualizadas, fora da situação enunciativa que a faz
“fazer” sentido?
Diante disso e da crença de que a língua é, além do principal instrumento de
interlocução dos seres humanos, o principal elemento mediador na formação de
conceitos e, conseqüentemente, da construção de saberes pelos sujeitos, o que se propõe
aqui é quase o inverso disso. É um ensino de língua materna (em que as modalidades
oral e escrita tenham o mesmo status e sejam constante e concomitantemente
trabalhadas) cujas bases sejam as situações enunciativas, os contextos de interlocução,
os diferentes objetivos dos locutores, os diversos perfis dos interlocutores.
Nossos professores de língua – seja por formação profissional, seja por falta de formação –
são muito atraídos pela descrição de língua e pelo ensino de gramática. Sempre fazemos
sucesso na formação de professores quando discutimos as características formais e de estilo
de um texto ou gênero, a partir de nossos instrumentos. Por outro lado, nossos alunos não
precisam ser gramáticos de texto e nem mesmo conhecer uma metalinguagem sofisticada.
Ao contrário, no Brasil, com seus acentuados problemas de iletrismo, a necessidade dos
alunos é de terem acesso letrado a textos (de opinião, literários, científicos, jornalísticos,
informativos, etc.) e de poderem fazer uma leitura crítica e cidadã desses textos.8
8
ROJO, p. 27.
9
Conceito situado pelo próprio autor no campo da parole saussuriana, significa o ato de enunciar, de exprimir,
transmitir pensamentos, sentimentos, etc. Bakhtin, segundo seu tradutor, usa indiscriminadamente os termos
enunciado e enunciação, sem distingüi-los.
10
BAKHTIN, 2003, p. 261-262. Grifos do autor.
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raciocínios e conceitos: definições, explicações, justificativas, questionamentos,
fórmulas, gráficos, mapas, esquemas, enfim, uma grande quantidade e diversidade de
gêneros discursivos aplicados às finalidades e necessidades de cada área e de cada
conceito trabalhado, analisado.
O sujeito aprendiz é exposto a essa multiplicidade de gêneros discursivos sem
que nenhuma instrumentalização lingüística lhe seja fornecida. A ideologia escolar tem
a falsa impressão de que o fundamental a ser ensinado é o conteúdo temático de cada
área, como se esse conteúdo não fosse veiculado por um conjunto de seqüências
discursivas próprias da área e que requerem domínio, por parte do sujeito cognoscente,
para que possam ser compreendidas e, então, aprendido, transferido e aplicado o
conteúdo que é por elas transmitido.
Desde essa perspectiva, à educação formal cabe não só ensinar o conhecimento
produzido em cada área mas também instrumentalizar o aprendiz para que tenha acesso
a esses conhecimentos e seja capaz de apropriar-se deles para construir seus próprios
conceitos e produzir novos conhecimentos.
Particularmente, à disciplina de Língua Portuguesa fica uma dupla tarefa: a de
instrumentalizar o aluno para compreender e produzir os gêneros discursivos cotidianos,
orais ou escritos, dos mais informais aos mais formais; e a de instrumentalizá-lo
também para operar, quer em termos de leitura, quer de produção, com os gêneros
utilizados pelas outras disciplinas, desde aqueles próprios das várias áreas do
conhecimento até os que são didaticamente usados pelas disciplinas para acesso e
construção do conhecimento produzido, a saber: os relatórios, resumos, resenhas,
esquemas, etc.
Ainda conforme Bakhtin,
11
BAKHTIN, 2003, p.266.
134
toda prática de linguagem se dá numa situação (de comunicação, de enunciação, de
produção ou circulação) que é própria de uma determinada esfera social, em um dado
tempo e espaço históricos. Esta esfera neste tempo/espaço admite determinados
participantes (com relações específicas), temas e modalidades de linguagem e de mídia, e
não outros. Estes participantes articulam seus enunciados em gêneros específicos dessa
esfera e as propriedades composicionais e estilísticas desses enunciados em gêneros (forma
composicional, formas lingüísticas) serão dependentes das relações entre estes
participantes. Em especial, das apreciações de valor que estes façam sobe o tema e sobre
seus interlocutores.12
12
ROJO, p. 16-17.
13
BAKHTIN, 2003, p. 282-283.
14
Id. ib.
15
Id. ib.
135
como ferramentas pedagógicas para o ensino de língua materna, tipos textuais e gêneros
do discurso.
O autor16 diz usar a expressão tipo textual para designar uma espécie de
construção teórica definida pela natureza lingüística de sua composição (aspectos
lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas) e afirma que esses tipos abrangem
categorias como a narração, a exposição, a argumentação, a descrição e a injunção.
Já a expressão gêneros textuais (ou o que chamamos aqui gêneros discursivos) é
usada como uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que
encontramos em nossa vida e que apresentam características sócio-comunicativas
definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica.
Os gêneros, segundo ele, são inúmeros, e alguns exemplos seriam o telefonema, a carta
comercial, a carta pessoal, o romance, o bilhete, a reportagem jornalística, o horóscopo,
o artigo científico, a resenha, etc.
Por estar didaticamente muito bem posto, reproduziremos o quadro elaborado
pelo autor17 para expressar essa distinção.
16
2002, p. 22-23.
17
Id, p. 23.
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destinarem grande parte do período letivo ao ensino de narrações e descrições
(principalmente no Ensino Fundamental), suas estruturas, seus elementos, seus subtipos
e, a par disso, categorizações e classificações lexicais e sintáticas, forçando ambientes
de compreensão e produção de textos que se “enquadrem” nessa tipologia, como se um
texto real fosse puramente narrativo ou descritivo.
Nossa proposta é que, partindo das situações enunciativas que dão origem aos
diversos gêneros discursivos (quer aqueles presentes no cotidiano, quer aqueles de que
se valem as demais disciplinas curriculares), analisando a finalidade de cada gênero, seu
estilo, seu conteúdo, os tipos de texto (ou, mais especificamente, as seqüências
discursivas que os constituem) sejam trabalhados para explicitar a composição
característica de cada gênero, sua construção composicional, como define Bakhtin.
Nesse sentido, tanto a tipologia textual quanto os aspectos gramaticais – que
passam a ser vistos como mecanismos de coesão e coerência textuais, portanto de um
prisma descritivo e não mais prescritivo – serão trabalhados em função dos gêneros
discursivos ensinados, ou seja, o uso da língua em contextos similares aos reais
determinará o estudo do sistema lingüístico.
Conforme o próprio Bakhtin18,
A língua como sistema possui uma imensa reserva de recursos puramente lingüísticos para
exprimir o direcionamento formal: recursos lexicais, morfológicos [...], sintáticos [...].
Entretanto, eles só atingem direcionamento real no todo de um enunciado concreto.
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