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A partir das considerações que temos feito sobre a ideia de historicidade em Heidegger, a
pergunta que precisamos fazer é: quais os seus possíveis desdobramentos em relação à
pesquisa história-historiográfica?
Uma dimensão importante do artigo é o chamado ético que o autor faz para que a
perspectiva de autonomização da HH possa se cumprir. Ressalta a importância de se
configurar uma comunidade de intelectuais necessária para sustentar esse projeto disciplinar.
A resposta a essa questão passa, segundo o autor, pela ideia de historicidade, cujo sentido é
extraído a partir de Ser e Tempo
o Mais à frente, Heidegger dirá que o “acontecer próprio” da presença se realiza como
decisão antecipadora – isto é, a resolução do Dasein de, em antecedendo a si
mesmo, sair de seu estado cotidiano e impessoal para assumir o seu estar-lançado
próprio e finito, e então projetar-se para as suas próprias possibilidades de ser.
o Esse movimento é chamado por Heidegger de retomada (ou repetição). É essa noção
de retomada que fundamenta, segundo Heidegger, uma compreensão da
historicidade em sentido próprio.
o Na retomada, o Dasein transmite-se a si mesmo para reassumir o legado de sua
própria história (não apenas a nível individual, mas também coletivo, já que Dasein é
sempre ser-com). Voltaremos a este ponto mais a frente.
Mas antes de falar da historicidade própria, vamos falar um pouco sobre a historicidade
“imprópria”.
Segundo o filósofo, essa concepção parte da ideia de que o homem é um ente simplesmente
dado “no tempo”, este entendido como se fosse um plano espacial externo e homogêneo,
algo distinto dele mesmo.
De acordo com Heidegger, essas concepções sobre a historicidade são derivações impróprias
da historicidade em sentido próprio.
Por isso, a historicidade própria e imprópria implicam (e são suportadas) por duas
concepções distintas do tempo
Mas como temos vimos, “existência” não se confunde com “indivíduo”. Em Ser e Tempo, a
historicidade própria revela-se como destino (ou seja, a transmissão das possibilidades
legadas pela própria existência).
No entanto, o verdadeiro poder da historicidade própria da presença revela-se como destino
ou envio comum, isto é, o acontecer de sua comunidade, de sua geração.
Como já ressaltamos, essa posição quer mostrar que é somente porque a existência é
histórica que ela pode se dar uma historiografia, que não necessariamente deve assumir a
forma científica-acadêmica.
o Isso significa, portanto, que as condições que permitem a escrita da história não são
apenas de ordem epistemológica, política ou social, mas também ontológico-
existencial.
“Como a historicidade própria não é um privilégio de uma ciência histórica, mas algo
inscrito no próprio ser do homem, uma história da historiografia como analítica da
historicidade não pode se limitar a uma história da ciência histórica. Uma analítica da
historicidade deverá investigar as condições, formas e funções das “aberturas
historiográficas da história”, e essas aberturas são sempre produzidas em uma tensão entre
suas condições estruturais e os eventos. Assim, tal analítica teria como uma de suas
principais funções desobstruir a historiografia de sua impropriedade, ou, dito de outra forma,
colaborar para recolocar o historiador frente ao fenômeno da história por meio da
desnaturalização das representações e objetos históricos que se acumulam como resultado da
própria ciência; lembrar, enfim, ao historiador que nossa relação com o passado, embora
necessariamente mediada por representações reificadas, tem outra fonte mais fundamental, a
própria experiência da história” (p.42).
Ora, não seria então o caso de se tomar a memória – e as apresentações históricas guiadas
pela recordação-esquecimento – como um objeto privilegiado para a aplicação dessas
considerações teóricas?