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me tem

no que te convém
e em mim explode
afoga e dissolve
todo teu corpo
é porto
nesse mar de vai e vem.

***

Lilith

Invoco-te
em meus sonhos
para que me tomes mais uma vez 49
Não como virgem
mas como puta
Não como deusa
mas como tua

Invoco-te
rezo para teus santos
cubro-me de mantos azuis
como Maria
para que em mim surja
Um prazer bastardo
Uma luz divina

Invoco-te
em minha pele
Um sacrifício em atrito
em sangue, gozo e cuspe
A poção da paixão
para encarnar-te
e poder viver sem ti

***

Poder avistar-te
Mar
Entre a solidão
Concreta das ruas
É poder abrir-me
À completude
De suas cores
Que navegando-me
Não sei pintar
Tento escrever
50 E só sei amar
No verde sereno
Azul imenso
Na onda que é vento
No tempo da lua
No cheiro que abraça
E abrasa meu peito
Saber que posso avistar-te
Habitar-te no fundo
Ainda que não peixe
Ainda que gente
Ainda que em sonho
Escrever-te
Mar
É sempre um dever
De minhas escamas
Retraídas em arrepio
E de minhas lembranças
Insistentes, aquarianas
Na existência solar
Desses mares azuis
E nos sentimentos imersos
No asfalto quente

***

todas as pintas de sol


todos os fantasmas
palhas de coqueiro ao vento
tudo que eu quis e não sabia
tudo que eu soube depois que não quis
e toda essa vida
que em meu corpo responde por:
arrepios, tatuagens, vícios
pelos remexidos em lençóis
coleção de resquícios
as roupas que eu levo pra todo lugar
porque não tenho casco
minhas conchas de feitiço 51
de me fazer em miragens
salvam todo meu sentido
saudade, cidade, som
todas as coisas em mim
tem um dom
de se fazerem paisagens

***

Vi você a tarde pela janela


andando um andar acima do mar
seu pano de esquentar era pra espantar o sol
e eu corria os olhos pra ver
se as rodas alcançavam seu vestido
me despedi pelo vidro
e agora você entrou e sentou
cinco bancos de distância
alguém do seu lado que eu não quero conhecer
e eu implorando pra sorte que da próxima vez
podem ser uns dois bancos
quem sabe lhe vejo na praia
nós moramos no mesmo bairro
essa cabeça no seu colo não me importo
levanto e demoro cada passo pra poder lhe ver mais
quando passo pela catraca você está atrás
encosta em meu braço
por que não me leva logo!
me pede desculpa
e eu sorrio querendo dar meu telefone
ou saber seu nome tanto faz
desço e você vira na rua de trás
e eu meio bêbada
com essa sensação de que sempre chego atrasada
amor de ônibus não deveria ter ponto final

52
***

acordei com saudade de me sentir estrangeira


entre a porcelana e a solução final para as uvas
eu bebo a chuva e sonho
com fantasmas do velho mundo
com cães cobras e vulvas
com amigas jardins e lares
meus sonhos são como filmes
que eu tenho medo de assistir mas não de encenar
meu tempo é como uma sala de espera
sempre cheia de barulhos disfarçados
parecendo conversas de calçada
grande segredos em banho maria
ah Maria se eu pudesse!
eu te amaria mesmo pra morrer
pra sonhar com mais jardins da realeza
pra me cobrir com mais água desta fonte
amaria qualquer um que me dissesse
porque eu sonho tanto
e que me fizesse viver mais do que dormir

***

Nunca me perguntei
porque o céu era azul
e o sangue era vermelho
as cores me surpreendem não pelo nome
mas pelo gosto
como quando lambemos a calda de morango
de um céu azul quase roxo
ou de tanto gostar de tudo
que eu quase engoli teu rosto
as cores me surpreendem não pelo nome
mas pelo gosto
como aquela noite em que eu escolhi 53
a melhor casa pra fatiar e comer
com a mente lilás dos meus sonhos
as cores me surpreendem não pelo nome
mas pelo gosto
e apesar de serem da luz só um engano
derretem em mim
como teus lábios úmidos

***
caroline santos

juízo final

Nojo é um verbo que tirei do meu calendário


assumi o escárnio que os outros descartam em mim e
escarro
cada cusparada é fecunda
Sou a palavra aberta, encruzilhada na América
de becos, vielas, ruas asfaltadas e esgotos a céu aberto
tudo queima perto da linha do equador
e minha pele morena reluz melanina de sabor intenso
O olho permanece aberto
habitando cada palavra desse vocabulário
54 que transgride e assopra e grita
vocabulário mitológico, serpentes, medusas e Harpocrate
Eros me acerta certeiro no clitóris
Eu sou o horror de cada boca salivante que não beijei
anunciada pela trombeta do apocalipse
e a pomba gira e revira meus olhos pra me vestir de
vermelho
boca e sexo, a língua afiada
Essa cidade é um deserto de almas vivas e desabitadas
Deus não me pune, mas me deu o inferno
e eu não salvo ninguém
o céu é um condomínio fechado de fichas marcadas
Mas quando a pele arde e me olham torto
entortado mundo dos outros
eu lembro que gemer alto é gostoso
e a benção de todos os santos eu levo no pescoço
Na quaresma tive uma anunciação divina
a natureza dizia ‘seja!!! minha filha
como poesia intrauterina e ria e ensine os outros a rir
também’
agora estou em paz, com deus e o diabo
pelo meu corpo, pela alma e pelo tempo
até o fim das eras.

***

entrelinhas e reticências

Escapo
na aterrissagem do olho sobre a nuca
que se insinua feito palavra lânguida
eu penso, me chupa
me lambe, lambe a lambida minha
encharca comigo
o ouvido
e esses verbos absurdos de prazer
que dançam e dançam 55
nus sobre a pele aquecida
abre a boca
pra que eu penetre
com poesia fervida
que me escorre pelo pescoço
feito soluço
ritmado - um ah! ah!
sorria agora, mostre os dentes
se abra, me abro
e assista
eles tocam-se
despretensiosamente coléricos
com mil tentáculos
escapo
o olho entorpecido
se fecha, se abre
umedecido
segue o fluxo dos risos
estou fora de mim
e finjo controlar o magma
transbordando
entre as coxas
entrelinhas
entre no meio das coxas
intumescido
pulsando reticências. . .

***

abutre

Venho perseguindo ratos medíocres


espíritos zombeteiros bêbados
56 venho caindo na graça dos esgotos a céu aberto
meu coração é uma viela
e faz tempo que o carro do lixo não passa por lá
Estão amontoados todos os corpos que amei
já sem vida
sobrepostos, empilhados um sobre o outro
e as lágrimas que um dia chorei por eles tornaram-se
chorume
A escuridão me fascina tanto que não há luz nos
caminhos que
persigo
tenho uma fome corrosiva por todas as mentiras
compro mentiras, pago com o corpo por elas
Saio farejando em busca de uma sobrevida
de um moribundo
porque sei que assim não teremos muito tempo juntos
que eu me machucaria com o fim já próximo
Eu vivo com os fins, o começo é só uma lembrança
distante
um sonho supérfluo
porque o meu amor é aquele de febres e solidões
não sou melhor que um abutre

***

carnívora

Me come sem tirar os ossos, me engole enquanto ainda


respiro, com os dentes cerrados sorri, sem haver mastigado
um só pedaço de minha carne, sem haver gasto um só
dente, me deglute pela saliva, gastando a língua no gosto de
nos transformar em um só corpo, em um só desejo, o de ser
também o outro.

antropofagia no amor e outros hábitos alimentares

*** 57

prece pagã

Pagando pelo meu paganismo


há uma filosofia que não atinjo
de um corpo hedonista
vil e viril
eu que tenho um corpo marcado pelos trópicos de câncer e
capricórnio
oro em línguas
e tenho um mapa astral kármico
marcado pelo movimento retrógrado dos quadris
habitam em mim as sete chaves e conchavos
que não abrem nenhuma porta
mas me abrem como uma fenda no espaço
eu sou a bênção de um deus feminino
que me presenteia com orações extraordinárias
e proteção intergaláctica
na próxima encarnação não venho como Buda ou Jesus Cristo
venho novamente como mulher
pra semear mais uma gota de sangue sob esta terra fecunda

***

Anunciação

Ela anuncia minha chegada, eu, relâmpago de fogo, alumiando


o céu em escuridão, que em mim retém as moléculas
salivantes de chuva, eu anuncio a tempestade e os pesadelos,
com assombroso estrondo luminoso, me perseguem os céus
mais pesados, pra eu poder sair me rasgando, inflamando o
extraordinário. Ao meu lado trovões e furacões se despedindo
da melancolia dos dias todos que se guardam sem atingir
ninguém de horror, eu que ando entre a imensidão e dela
58 tenho medo, tive de aprender a ser luz.

Clarão.

***

Fogo

Se com escrita de sangue falo e fogo


apazígua no coração uma tempestade de magma espesso e veloz
como toque aveludado numa noite febril de Abril
abriu a vala da consciência e fez um oco pra se arder
o fogo da língua, céu da boca em chamas
a palavra se escorrendo, derretendo sob a pele nua
fogo-fátuo de minhas entranhas

***
Carne de carnaval

Dedos de carnavais
quantos carnavais ela esfregará seu frevo em mim?
Rodopiando, ciganeando seus olhares de flecha
sobre este corpo em estado de choque!
Há algo nela que não me pertence
que não me cabe
que não me deixa entrar
e é justamente o que me fascina, não tê-la nunca
sentir-nos sempre escorregadia, umedecida
sempre pisoteada pelo bombear de sua percussão em meus pelos
que se oriçam e se levantam para vê-la passar
para que ela passeie a mão em mim, indo e vindo
(espero que ela sempre venha)
ai que abestalhamento
doce e incerto 59
de dar lambidas no pescoço suado e achar gostoso

***

Lambidas

metalinguagem
a língua da palavra habitada
a língua na língua das primeiras causas
com quantas línguas anunciaste aquele verbo ao pé do ouvido
em quantas línguas a tua saliva encontrou morada
se derramando
garganta adentro

***
Ser tão

Quantos sertões eu preciso atravessar pros teus olhos virarem


mar?

Teu calor deixa minha terra fecunda,


tu é igual um cacto,
espinhoso por fora, mas suculento por dentro
tu mata minha sede quando nem comida eu tenho no buxo
ainda
Gente que trabalha o dia todo
quando chega a noite e a lua alumia, ainda faz poesia?
Teu coração nunca pus cercado, delimitava apenas com os
dedos
e te deixava avoar negro feito urubu
60 quando tinhas outras fomes
e só o que eu podia te oferecer era terra
Enquanto você ia, eu cuspia no chão, doava toda minha saliva
que era pra deixar tudo florido
e pra que tu voltasse de teus voos noturnos
E a gente se fundia, ardendo em febre, fazia suar o quarto
inteiro
ele respingava em nós!
Tu era o sol que me aquecia
e a lua que me fazia uivar feito lobisomem
na tua pele colhi as melhores frutas, me lambuzava
assim como quando a gente encontrava um açude
e a água dava pra beber.
Meu coração é quente feito mil sertões
e tuas raízes profundas.

***
Ploft

Acordei com uma secura na boca


um gosto amargo de ausências
uma dor cancerígena atravessava meu estômago
Ah! eu tenho um rombo, sou um buraco, uma vala
um poço sem eira nem beira
no fundo não tem nem água nem ouro, só lama!
Acordei assim meio atravessada, de supetão, já acordei sem ar
chupando pelas venta um ar que doía, o coração cambaleava.
Mas que porra é essa?
Nem eu sabia
Será pavor ao tédio, ansiedade, angústia ou paixão?
Nesse mundo de carroça de aço e barulho de ventilador
eu fico ariada, me confundo toda
as coisas que sinto, às vezes, parecem uma só!
Começam todas no estômago! 61
Mas que fome que eu tô!
Mas de comida não é não, provei por A + B
que quatro pão com manteiga pra quem é pequena como eu
bastava quisó, excedia
e a dor que lateja cortante, perfurava e tomava conta de mim!
E agora o que eu faço?
Rezei tudo de reza que conhecia
que na escola a gente era obrigado a saber
pedi com minhas palavras as rezas que não existiam
até me benzi 10 vezes, que 10 é número fechado
e eu não gosto quando termina em número ímpar não que fica
ruim pra dividir e contar direito eu nunca soube
Eu sentia que ia desaparecer sabe
passei a ter medo de acordar
e simplesmente ter desaparecido, assim
ploft!
Porque eu sentia que meu coração ia ficando pequeninim,
deste tamanhinho
e sem o coração eu não existo
podia até não desaparecer, mas ninguém ia me reconhecer,
nem eu, nem minha mãe, meu cachorro, meu piriquito, meu
vizinho...
Sem sentir eu não vivo, deus me livre ser dormente
dizem que tá dando em muita gente por aí né
mas em mim não pega não
aqui o coração lateja e sai matando cachorro a grito!!!
Mas já faz uma semana que acordei assim e não passa
de verdade, sejam sinceros comigo
é possível alguém sumir assim do nada, ploft?

***

62 Chumbo, flores e ouro

Um presente de chumbo, dado entre aços invertidos, que


convertem na divergência. Um pedaço de asfalto que
escarro pela boca me atravessava a garganta, abrigo da
minha voz fina e trêmula, por tanto aguentar pedrada,
quando insisto em continuar atravessando. Atravessa em
mim o eu profundo, tão inocente como quando sou apenas um
átomo. Sigo, carregando uma pele em erupção, me revestindo
de bolhas de fogo purulentas que cintilam, me abrigando de
flores e Atravessa em mim o eu profundo, tão inocente como
quando sou apenas um átomo. Sigo, carregando uma pele
em erupção, me revestindo de bolhas de fogo purulentas que
cintilam, me abrigando de flores e falso ouro e amuletos
mitológicos. Me presenteiam com maçãs apodrecidas, joga-
das ao chão enquanto caminho, como uma oferenda ao meu
escárnio, eu sou aquela que come ao lado de eva, o feminino é
o pecado original. Envergo e me aproximo tanto ao chão que
que penso que mais um passo e quebraria todos os meus
dentes, com essa força que me exorciza e me mantém
imaculada. Serpentes não atravessam meu ventre, intacto,
ele sangra. Como sangro em cada esquina, pavimentada
e rebocada, de azulejos coloridos e com buracos de balas,
atravessando a noite numa corrida assimétrica entre
minhas pernas e meus pensamentos. No meio, o medo,
me fazendo tropeçar. Mais um dia que gasto poesia
dentro, silenciosa, silenciada, se transformando em mim
feito corpo apodrecido e enterrado, mais um dia que vou
abrindo a bofetadas um outro caminho que me caiba.
Devolvo esse chumbo que me pesa o bolso e me estanca,
sigo atravessando.

***

63
Transbordar e expandir

Todo o deslimite
hipertrofia
engasgada com o gozo
na ponta da língua
desenfreado desejo
e na rua o horror
meu corpo é uma bandeira que hasteio
e deixo flamejar
nos bueiros da cidade
cada esquina
em cada prece com os dedos cruzados
e no pico, por cima da cegueira
ele dança, o corpo, é meu
e dança e sua e sua e sua
sou sua
toda lágrima virou suor
quando eu levanto a mão é um ato
uma anunciação
a palavra do absurdo
o absurdo das horas
todas as horas em que disse não
foram contabilizadas, mensuradas
e agora esquecidas
entre as mãos
me escorre a vida
do ventre profundo
que habitas
e tem poros e pelos e saliva, terra fecunda
da vida estéril fiz poesia
delírios, devaneios e desvarios
extraordinários grunhidos e gemidos e sussurros
dos mudos orgasmos
que ritmado agora grito
64 quebramos a barreira da matéria e do mistério

***
maíra dal’maz

tema para o corpo de h. ao dormir

sobre os espasmos, os que há tempos não sinto


(eram no meu lábio superior)
você, então, teve primeiro na pálpebra
(sobretudo você tem em seu corpo inteiro)
antes dos blackouts

mas, desde então,


quando as noites juntaram-se
surgiram:
mãos que imitam movimento de despertar 65
pernas que parecem estar a ponto de largada

(você fala que é reflexo da evolução, do alerta primata em


cair da árvore)

sinto toda sua circulação quando abraço suas costas


e encosto o entremeio nariz-lábio a noroeste, perto do
sinal de carne, intermitente
até os rios de tuas bacias hidrográficas
(e eis o real aviso: as quedas d’água)
desaguarem na planície-algodão

e só fluírem em seu curso calmo, vivo,


criador d’uma rota
até o R.E.M.

***
sem título

lendo chaya, a mulher que só tinha o nome e karma


sifilítico desviado
e sendo exposta a todo esse íntimo
à luz, com pressa de se colocar pensando
e descrevendo o não-ser
ou o ser lírico que fala só dos aflitos

eu, tentando escrever um poema em que fosse


lido como música e que me
mostrasse poeta
de sentimentos e angústias

eu, frustrada com meu poema

66 pois entre as baratas, cemitérios e sonhos com embates


meus e um red nose na rua do baldo
só penso nas unhas da embaladora do supermercado
e como elas devem estar nos poemas

mãos-suspense

toda embaladora de presentes de supermercado tem as


unhas longas, pintadas com glitter sobre algum tom
róseo

que ditam a maestria dos usos de durex

tal qual todas as que embalaram os brinquedos da minha


infância

e hoje embalam sagatibas ouro

***
“quem hoje é vivo corre perigo” (Xangai)

§
ouço na música a solidão do vaqueiro
entre os bois

a estrela solitária no anel de xangai

e essa vergonha de ser do litoral


que só tenho o mar

(não tenho mais garimpos ao redor,


terra de leis douradas
onde pessoas somem e o sol continua nascendo)
67
também tenho o vinho e o vento batendo
na mesa de centro
vento que imita esse mar distante da matança

desde quando o amor sentava nas cadeiras


com almofadas que lembram a Amazônia, longas
corridas livres de animais

§
matança devia ser uma palavra bonita,
na verdade,

como lembrança

***
“Violinos: seda encrespada, queixas de mulher à noite sozinha.”
(M. Darwish)

“...esta noche angustiosa


llena de dualismos”
(A. Pizarnik)

consummatum est:
há solidão em qualquer não-litoral
e por quando passo trêsquatrocinco dias
componho o hábito teu

esquartejo as frutas
recriando teu vulto na cozinha
68
eu como,
pelo menos,
tua sombra

***

filha de estradas, onde emaranham-se juremas e cactos


deixo h. para ver freadas, enquanto ele, calmo,
compõe poemas pós modernos para tentar decorar meu
número de celular
ou acerta despertadores para um pouco mais tarde

presos aos limites da derme, não alcançamos o bliss assim


tão fácil
sobram tentativas de rompê-la, quando já ultrapassadas no
que escuto longe em silêncio com sinatra
because I’ve got you under my skin
ou lembro de histórias do ero-guro
lá em dois sozinhos

como acordar para a ordem moderna?

***

sem título

existem tantos outros fracassos


a considerar
que apenas o de não ser o faroleiro
do farol de mãe luiza

como a tristeza de ana c com trintaium anos: 69


sua metástase moral

como as mortes diversas em hebrom


pela capital prometida
o suicídio em massa dos zelotas em massada

o oriente médio
...

existem outros fracassos


além de passar na via costeira
vivendo o delírio de acender a luz-guia náutica
em vez de ir para casa

mas ir pra casa

e
existem tantas casas...
***

depois de sílvia

sentir a permissão para alcançar uma emoção


coisa há muito esquecida
nas paixões e seus ímpetos de objetos quebrados,
como os vasos lançados das janelas,
acender o círio d’um santo
e rezar longas preces a essas paixões descuidadas:

o que entocam os poetas no cano que leva o fundo


dos seus vasos de banheiros sujos
depois de cervejas, cigarros e som?

70
sentir a permissão de jogar o corpo na estrada, ir até...
voltar a si e negar o arremesso

mas só depois do desvario


de quando sílvia me fala

***

para todas as crianças que fogem das guerras, civis,


diárias contra a fome, contra a sociedade que engole

os pequenos pés das crianças


como balançam

crianças nunca alcançam o chão


quando sentadas à mesa
e agitam seus pequenos pés
em tédio e expectativa

com curtos e frágeis passos,


as crianças nunca podem ir muito longe

no máximo, à praia

então, uma criança, na praia, brinca de pequenos zigue-zagues


de costas para o mar

desce-lhe o cansaço, certa hora, a praia enfada


então, os pés das crianças balançam vagarosos no colo, que
deveria ser da mãe
mas é do guarda
ceifam o ar sem escolha, tédio ou expectativa
71
nunca alcançarão o chão

***

bacamarte

em uma cidade na parahyba


existem nuvens dispostas de forma não usual nos idos deste
mês
tal qual a música progressiva nos anos 70
com uma coincidência de nomes
em tentativa de narrar todas as letras naquele mesmo céu
pequeno
sobre a cidade pequena,
como quando se buscam as diferenças
pela arte de esculpir coronhas
das armas dos grandes vilões do cinema
as nuvens:
estranhas como os arranjos de depois do fim
longas como o último entardecer
sobre pastos onde podem haver recordação d’algum país
de língua castelhana

nunca tive ciência d’um bar nesta cidade da parahyba


nem de nenhuma dos arredores
em que se pudesse iniciar uma briga,
puxar o gatilho

[aquele espaço entre o ar e a coronha esculpida


a coronha engordurada e
a marca no jeans do botão da carteira]

mirar o cano para cima:


72
um menino com estilingue
assiste a tudo
e brinca de assustar o céu

***

despedida pra fotografia de costas

a. tocando violão na beira de águas da frança


sem entender os idiomas, cores, frios
só, como um cantor de folk que veio antes do dylan
nesse tempo antes da queda da bastilha
e desarmado por espaços vazios e um olhar para longe

na fotografia de costas, a. é uma ilha

a. ensaiando uma desordem de acordes


tentando descobrir aquela melodia que esqueceu
pelo vinho francês tinto bordô
barato mas desacostumado
e sucumbe, então
à ordem de quem vem reger aquelas águas
oxum ou xangô

a. sozinho contra o céu na lembrança do sonho passado


com cabelos cada vez mais prateados como a lua
que deve continuar iluminando a orla para a. tocar a balada
de um homem que pede desculpas

a última:
um dueto com as vozes dele mesmo

a. é
resta um

73
***

“Quem diz dor diz segredo”


Alan Pauls

a s. m.

veste-se dessa sua presença


de lua nova -- expectativa
d’um mero devir de pranto
traduzindo-se num só corpo
(o projeto frágil de não poder consigo)

pode ser essa tua presença


(ameaça -- voz grave -- puro conceito de sentir demais)

ogiva
lembra-me dos meus piores temores
em comum

e entendo-me com essa lua nova


de trinta dias noutro canto
como a pele às justas peças

fundos sulcos

se à minha queda tu não vens

poetisa, por que não sobes?


the downstairs means nothing

74 ***
igor barboà

A palavra
perdeu minha
infância. Daqui de cima
E agora o que acho, é que
tudo que escrevo lágrimas
e leio eu, só pesão pra baixo.
julgo sem
importância.
Nem sombra de
orvalhos
maduro é como estar 75
Era só o corpo
podre
era só
nos galhos.
a morte

A coragem se
A vida me impõe despontou
um pesar nesse segredo:
mesmo que eu não Lembrar
tenha balança: é uma questão
Despertar é leve, de medo.
mas cansa.
Ser tudo em todos
com a sede Cair
de um só. é deixar o corpo
A ser meu avô entender sozinho
aprendi com minha o ex
avó. ... passo.
Amanhecer
é quando
renasço pelo que me
findo.

Esses querem foder


com tudo.
76
Aqueles, não
querem foder com
nada.
Mas por aqui, pra
andar bem
nem pelo meio da rua
nem em cima da calçada.
Rastro de acender
pavio
Um homem comum calmamente,
à dor arrisco meu fósforo
só pode viver no pelo meio fio.
seu conforto
estando vivo
depois de morto
... ou o contrário.
O vento dá Nem estilos
eu abro a asa nem estilhaços
um dia eu caminho
inda voo eu esmo, traços!
de volta pra casa!

Tinha olhos de
No duro e febril dizer
consorcio da tudo
madrugada de uma vez
fiz meu divorcio era tão calado
com o nada: ante vocês.
vou amanhecer um
sonho.
77
Partiu
foi buscar
eternamentos
na cacimba dos
instantes Corpo
com o balde dos essa limitação
momentos. fantástica
que faz a gente
perceber o quanto
a mente
é elástica.
Amar:
que jorra
na sede
onda.
Ler-mes quando

Corpo simples
Gozo plácido Isso de querer
Deus num ser
ou um ácido? se tornar
o exato amante
daquilo que ele é
... pra além de si
ainda vai te trazer
aqui.
É preciso ter
aquela festa no
pensamento A
Pois fora dele, há
coisa chuva
78
que o des’festa à me continua
todo momento. lhe caio
em pingos
sou meio da rua.

A beira de meu Aqui


juízo meu lugar
danço ao revés. por excelência
Fôlego, é coisa que A contradição
dá nos pés! entre os que vêm
e vão,
e a permanência.
Se o agora
não tá dando
Acerca da cerca lembra
ainda o tempo existe
que se perca de herdar o quando.
... dá a vista:
Limites.
Toda cerca
é um pulo pros
convites.
NÔMArDiz...


Doce
... Lá.
79

A pedra
é alguém
que trouxe tudo Faz por onde
pra fora. nunca errar
próprio endereço.
Gente
Pedra e ninguém é o que tem
tem um bocado de medo
agora. de se ver ao avesso.

Eu não duro,
enquanto pedra.
“Pessonhas”

A partir
a parte A certeza
que não somos é um pandeiro
perigosos, que eu toquei errado.
somos todos Aquela noite, sem
venenosos. dúvida:
a gente dançou um
bocado.

Pras coisas
de maior pulso
não tem discurso.
80
Poeta, um Muito
corre à míngua. bem,
O diabo lembra dois.
é ter o gesto
na língua.

A um matuto
da cidade
não adianta
muita
O que vai acontecer sofisticalidade:
não há Civilização
como ter é um canto perto
sido, duma padaria.
Há como tecer.
Há noites Há horas que nem
a primeira
Pelo que não venço letra
às vezes eu engato.
nada, é mais intenso Tem poema
do que a brasa que se faz, de fato.
do incenso.

Se tua simples
presença
é erotismo,
imagine
Intento então vestida.
81
muitas coisas
que nem tento
só no pensamento.

Acordei com isso

Chovia
e fazia sol
Tudo que nem você
é tão tudo ou nada, um sol e chuva
que em vez que
desse tudo demorei
eu vou querer um de pra entender.
cada.
Não sei você
mas no caso meu Literatura Subliminar
a melhor coisa Dialética
que alguém pode
se lembrar
é de que se Podem
esqueceu. o chamar
de mente rasa
mas ele trouxe, seu
mundo
Fotografei de casa.
a lua E quem entenderá
a comer-me sua razão
os próprios olhos sem nunca lhe bater
Retina é ela as portas... dá
de resto, o globo. percepção?
82
O silêncio
é um indício
da fala
houve só
... como se cala.

Ao sabor
de forças que nos
minam
algumas
verdadeiras coisas
só começam,
depois que às
terminam.
Nem tenha cuidado
Cintura Vem
é onde o vento e nos diz par.
apuro Que faço da gente
o rebolado. Impar despido.

“Passageiros”
De SI, Frações...
83
O vestido
é tão bonito O quarto de mim
que por seu dentro parte...
o vento, do inteiro.
venta um grito. É incomodo
Treme o tecido, me mas pelo menos não
balança. me cabe.
O corpo
é uma dança
chegando ao ponto
... de ônibus.

Quem faz sua


sombra
Sabe o que olha:
Sigo pássaros
Olho vistas Te ver
Eu sou onde você está. dura anos.
Mal te vi
e já foram-se
todos
... os meus planos.
Lembro o que me
esqueci.
Êis o primeiro passo
para ver de novo
o que nunca Sua poesia
vi. Foi esse crime:
Usar o elementar
Pra fazer ver o
84
sublime.

Não suporto
Ter chapéu
O sol
É minha saudade do Se for agora
céu. talvez o tempo me
guarde.
Talvez o vento me
conte.
Talvez minha
memória não pule da
ponte.
maluz

ancestralizada por palavras de outras mulheres


me tornei pesada e avulsa
mas forte
meu útero efervescente
burila as palavras para o poema

disperso meus passos nos paralelepípedos dessa cidade


perdida
com as pernas lisas
diluo os pedaços de meus malfeitores
derramando suor-amálgama

com os calcanhares friccionando o solo 85


esburaco
preparo o asfalto para a chegada de novas sementes

em espelhos com capas e títulos


desmancho-me
emparedada
reconstruo-me

o farfalhar de páginas brancas enfileiradas


vestem meu novo corpo

a cada velha deusa hospedada em minhas pálpebras


retiro novos significados
refaço meu idioma

***
transeunte

transeunte
tuas pernas descamam em meu caminho
de tudo o que deixas cair faço uma calça
para cobrir-me do que és as sobras

eu olho teus lábios


cheios de ranhuras, gastos por mil páginas
quando voas alto pelos panos de tuas batas malandras
um coco roda as nossas palavras na tua vórtice voz

transeunte, és um vampiro?
há um silêncio me esmagando desde que a tua existência
86 seduziu meus olhos
foi pra junto de teus livros, canetas e troco de passagens,
todo o meu caos

e agora queimas pela cidade, nos filtros do teu cigarro


os olhares de quem passa te percebendo
tomando junto com as bebidas o que tens a dizer
desejo agora que tuas confissões
venham agasalhar-se em meus dedos
que pouco a pouco perdem a casca

transeunte
quando desceres do ônibus, não te esqueças que cheguei
[cedo
e estou te esperando
para me devolveres a cor da pele e dos olhos das outras
pessoas

***
a brevidade da vida levou a perguntar
como continuar existindo
depois de borrado o alcance das visões
e as netas derramarem café nos cadernos
que ideia perguntar isso
depois de quarenta e cinco horas sem dormir
ainda hipnotizada pelas linhas das mãos

eu não posso afirmar o que acontece


com um poema de cem anos
mas sempre terá centelhas de vida
em minhas gavetas

esquisita sala
nada entre a mobília combina
penso que materialmente 87
a consumação do sumiço se dará
com os móveis enfeitando a vitrine de um vuco-vuco no
Alecrim
e a biblioteca transferida para um sebo com queima de
estoque
- qualquer livro por três reais -
quando os herdeiros liquidarem até o último botão

***

passo por ruas absurdas


derretendo com a atmosfera rude
e o exagero que em mim agasalha-se

cultivo nas unhas o chão


que não varri na última semana
e agora me deito evocando oráculos
fazendo o espaço poético de sanatório
essa dislexia moral é mais voraz
que debruçar-se ao fogo

***

eu oceano
me fiz
quando amarraram
a contemporaneidade
aos infinitos líquidos
de inconstância

o corpo
precisa de litros de água
88 o corpo é água
litros de sangue
abro as pernas
e circuitos de líquidos completam-se

***

o céu virou carbono antes da noite


as telhas expurgam um pó preto
tornando-me relicário

líquidos festivos acendem febre na insônia


dormências desligam a mordida

a consciência desfoca o quarto


transmuta meu corpo em carcaça lunar
redigindo cartas e testamentos sem destinatários

mastigo os lápis e os fundos das canetas


esperando o próximo poema
a caneta estoura envenenando a língua
o poema se ausenta

coluna dói
deitada sobre espinhas crescidas
soul mais peixe que mulher

***

as tuas palavras
me dão borboletas de fogo no estômago
refluxo de passado
querendo voltar
bile afora

[mergulho em avessos] 89

te como com os olhos


pelas orelhas dos livros

espionagem de entrelinhas enquanto despe-se

***

analgésicos e chás tingem os fundos das xícaras

caminhos de ardores cruzam o corpo


cada poema morto
é um prego retirado com sangue

soníferos e almofadas passam os zíperes sobre a


[consciência
cada poema morto
é infecção interna
[versos e janelas abertas competem por espaços e
foguetes]

***

a inclemência da noite faz-te espada cega


aumentando minha pele

busco o irreal vestida de cenas fictícias


teu fantasmagórico holograma me convence

a inclemência da noite derruba muros


cria vândalos em seus seios fartos

90 ***

em hematomas
e com penas na garganta
espalho um odor ocre
os quartzos no bolso erguem uma religião própria

tudo é azul petróleo


ionara souza

Tem um útero na minha cabeça


pra ver passar o tempo se esfarelando de um avião sem asas
Carregado de mulheres que
Correm pra lua para encontrarem o sol
porque não sabem se amanhã será um dia para catar
laranjas
Você consegue enxergar depois das lágrimas?
Elas perguntam preenchendo almofadas
sempre que ouvem a virgem gemer
derramando ouro do clitóris
convidando anjos a visitarem sua fonte
Para roubar suas asas
E observá-los, homens
Enquanto saltam de penhascos. 91

***

Respirar

Sugar a terra pra dentro


sentir o chão desabar quando se esquece de passos
em dias ímpares
virar a página sem ler o livro
correr pro mar e se afogar em alguma poça
que encontrou antes de chegar
talvez a pedra no caminho que não estava lá
respirar voar sem sair do lugar sentindo
os pássaros saindo um a um até se esvaziar
criando um redemoinho ou ciranda para fazer criança
[brincar
engolir o céu de uma vez e alcançar o inferno com a mão
e ver que a ordem certas das coisas
caminha em passos de formigas quando fazem vida no
interior de um formigueiro.
mas o osso que sucumbi a carne é fixado em gente
e mundo se acaba em algum quarto de hospital
no verso de algum poeta
no fim de algum amor
Hoje é dia de chuva caminho sem saber dos passos não
sei mais dançar
O que me rasga a garganta é mudo
guardo nele
todas as lembranças que nunca tive do meu pai.
O que me rasga a garganta é mudo
e contém partículas de mim
guardadas naquele radiozinho de pilha com que
brincava aos cinco anos,
hoje, esquecido, dentro de uma
92 gaveta no armário da cozinha da minha mãe.
O que me rasga a garganta é mudo e também me rasga
a alma
e às vezes me aperta o âmago
até virar nó.
O que me rasga a garganta é mudo
e desatina a dor que Camões tanto falava
é mudo, mas as vezes cresce desordenadamente na
garganta do menino que
pede esmola em um sinal de trânsito cortando
a Prudente de Moraes com a Bernardo Vieira.
É mudo e desabrocha em flor de espinho
que carrego em meus pés
desde que gritei em lagrimas e o medico disse:
– Nasceu! é uma menina

***
Mesmo escondendo o fio que me liga a Eva e Adão,
e sem provar do fruto proibido,
fui expulsa do paraíso.
E de longe enxergo teus desejos escorrendo em vestes brancas,
seguindo em direção à terra,
que come os meus pés para saciar a alma
e fazer viva a promessa de que ao pó voltarei.
Ainda assim, tenho anjos cravados nas mãos
que levantam voo ao nascer o sol,
E em mim adormecem antes do cair da noite.

***

Mãe, não sou poeta

Eu não enxergo o futuro, 93


e se disser que lembro o passado:
É mentira.
Eu vejo um mar e ondas sonoras que me afogam.
Vejo um córrego que não alcança meus passos.
E deuses dançando sobre o peito daqueles que dizem ter fé.
Mamãe, irrito-me com decaídas e injeções dos vampiros
que me cercam
E com o veneno com que ofuscam as palavras dos sábios.
Há uma cinza cobrindo os olhos,
que não enxergamos o morro cobrir-se de ipê.
Há um rapaz dizendo que me ama enquanto goza
na minha coxa.
Há um gatilho desfazendo minhas palavras
E as águas já cobrem os meus pés.
Mamãe, não sou poeta
E ontem arranjei um amor que vai embora amanhã.

***
O povo quer festejar
riscar o céu com fogos e se enganar com várias cores
eu também quero desbotar o corpo
fazer língua de pincel
pra entender que às vezes o que se fala é o que falo
e deve ser engolido
O povo quer festejar fingir que está tudo bem
ouvir música cantar tom Jobim
eu também quero
falar mal dos poetas e dizer que Freud é louco
amar alguém do outro lado do país
O povo quer festejar
fazer releituras de qualquer texto
e ser chamado de artista
eu também quero ser artista
mas por entender Bataille
Sempre que me come
94 e escrever sobre isso porque é bom
O povo quer festejar
rezar pra senhora sorte e agradecer as luzes de natal
Eu também quero festejar com o povo pisando na própria cabeça.

***

Os peixes pescam homens e redes cobrem


os barcos que afundam antes de entrar no mar
areia enterra gente, madeiras, poetas e amores
você vê tudo ao contrario e não entende
porque sempre te perco nas folhas de papéis
e te encontro em poemas que não foram escritos.
Eu queria acreditar em deus.
Assim como você acredita.
Mas sempre que vejo algodões manchados
e o mundo se despindo em um colorido
que se perde no riso de um furacão.
Então aqui de fora do tempo os rabiscos (talvez de vida)
se apagam.
Marias e Josés criam sonhos
Um casal está olhando a lua e por ela agradecem
Você brinca de refazer a noite
E eu ainda acredito que deus não passa dos meus desejos.

***

Cristinas e Ana.

O que é alto e o que baixo se estou no centro e no centro


me perco de tudo e todos? Quais as indagações que ainda 95
não fiz ou não ouvi? O que é Deus se não meus desejos?
Fui tantas, que era apenas uma. Ou uma que queria ser
tantas? Reflexos. Em segundos, entre espelhos, retiro a
luva e me entrego à escuridão. O corpo dança em um só
movimento. Vento no rosto. O céu se aproxima e está
manchado de sangue. Por afrontamento do desejo, agora
sou linguagem figurada, tenho asas, voo em direção ao
chão. Sem contramão, via única. Pequenas partículas
que desaparecem nas sombras, poeira que cobre o sol de
Copacabana.

***
pedro lucas

Cânticos da Ribeira antes das 4 a.m.

1.

O rio se oferta ao rito


e passamos por ele sem deixar rastros
colares de pérolas, chaves perdidas,
flores de prata para a sagração da primavera,
e as manadas com seus elmos cheios de nada
bebem suas heinekens e fumam seus cigarros
96 parliament, também indicado para cocainômanos

O ofício da noite se permite vagar,


abrir uma cova no corpo da cidade doente,
inconsútil tela negra
como só um espelho negro
destrói a cor, o ânimo e transforma
sua violácea rosa
em pesadelo, a memória vazia
Sobra na nossa paisagem
a montanha ao longe
que não se permite um só grito
[monge no claustro infinito

rua chile, ancoradouro,


novena dilacerada

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