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no que te convém
e em mim explode
afoga e dissolve
todo teu corpo
é porto
nesse mar de vai e vem.
***
Lilith
Invoco-te
em meus sonhos
para que me tomes mais uma vez 49
Não como virgem
mas como puta
Não como deusa
mas como tua
Invoco-te
rezo para teus santos
cubro-me de mantos azuis
como Maria
para que em mim surja
Um prazer bastardo
Uma luz divina
Invoco-te
em minha pele
Um sacrifício em atrito
em sangue, gozo e cuspe
A poção da paixão
para encarnar-te
e poder viver sem ti
***
Poder avistar-te
Mar
Entre a solidão
Concreta das ruas
É poder abrir-me
À completude
De suas cores
Que navegando-me
Não sei pintar
Tento escrever
50 E só sei amar
No verde sereno
Azul imenso
Na onda que é vento
No tempo da lua
No cheiro que abraça
E abrasa meu peito
Saber que posso avistar-te
Habitar-te no fundo
Ainda que não peixe
Ainda que gente
Ainda que em sonho
Escrever-te
Mar
É sempre um dever
De minhas escamas
Retraídas em arrepio
E de minhas lembranças
Insistentes, aquarianas
Na existência solar
Desses mares azuis
E nos sentimentos imersos
No asfalto quente
***
***
52
***
***
Nunca me perguntei
porque o céu era azul
e o sangue era vermelho
as cores me surpreendem não pelo nome
mas pelo gosto
como quando lambemos a calda de morango
de um céu azul quase roxo
ou de tanto gostar de tudo
que eu quase engoli teu rosto
as cores me surpreendem não pelo nome
mas pelo gosto
como aquela noite em que eu escolhi 53
a melhor casa pra fatiar e comer
com a mente lilás dos meus sonhos
as cores me surpreendem não pelo nome
mas pelo gosto
e apesar de serem da luz só um engano
derretem em mim
como teus lábios úmidos
***
caroline santos
juízo final
***
entrelinhas e reticências
Escapo
na aterrissagem do olho sobre a nuca
que se insinua feito palavra lânguida
eu penso, me chupa
me lambe, lambe a lambida minha
encharca comigo
o ouvido
e esses verbos absurdos de prazer
que dançam e dançam 55
nus sobre a pele aquecida
abre a boca
pra que eu penetre
com poesia fervida
que me escorre pelo pescoço
feito soluço
ritmado - um ah! ah!
sorria agora, mostre os dentes
se abra, me abro
e assista
eles tocam-se
despretensiosamente coléricos
com mil tentáculos
escapo
o olho entorpecido
se fecha, se abre
umedecido
segue o fluxo dos risos
estou fora de mim
e finjo controlar o magma
transbordando
entre as coxas
entrelinhas
entre no meio das coxas
intumescido
pulsando reticências. . .
***
abutre
***
carnívora
*** 57
prece pagã
***
Anunciação
Clarão.
***
Fogo
***
Carne de carnaval
Dedos de carnavais
quantos carnavais ela esfregará seu frevo em mim?
Rodopiando, ciganeando seus olhares de flecha
sobre este corpo em estado de choque!
Há algo nela que não me pertence
que não me cabe
que não me deixa entrar
e é justamente o que me fascina, não tê-la nunca
sentir-nos sempre escorregadia, umedecida
sempre pisoteada pelo bombear de sua percussão em meus pelos
que se oriçam e se levantam para vê-la passar
para que ela passeie a mão em mim, indo e vindo
(espero que ela sempre venha)
ai que abestalhamento
doce e incerto 59
de dar lambidas no pescoço suado e achar gostoso
***
Lambidas
metalinguagem
a língua da palavra habitada
a língua na língua das primeiras causas
com quantas línguas anunciaste aquele verbo ao pé do ouvido
em quantas línguas a tua saliva encontrou morada
se derramando
garganta adentro
***
Ser tão
***
Ploft
***
***
63
Transbordar e expandir
Todo o deslimite
hipertrofia
engasgada com o gozo
na ponta da língua
desenfreado desejo
e na rua o horror
meu corpo é uma bandeira que hasteio
e deixo flamejar
nos bueiros da cidade
cada esquina
em cada prece com os dedos cruzados
e no pico, por cima da cegueira
ele dança, o corpo, é meu
e dança e sua e sua e sua
sou sua
toda lágrima virou suor
quando eu levanto a mão é um ato
uma anunciação
a palavra do absurdo
o absurdo das horas
todas as horas em que disse não
foram contabilizadas, mensuradas
e agora esquecidas
entre as mãos
me escorre a vida
do ventre profundo
que habitas
e tem poros e pelos e saliva, terra fecunda
da vida estéril fiz poesia
delírios, devaneios e desvarios
extraordinários grunhidos e gemidos e sussurros
dos mudos orgasmos
que ritmado agora grito
64 quebramos a barreira da matéria e do mistério
***
maíra dal’maz
***
sem título
mãos-suspense
***
“quem hoje é vivo corre perigo” (Xangai)
§
ouço na música a solidão do vaqueiro
entre os bois
§
matança devia ser uma palavra bonita,
na verdade,
como lembrança
***
“Violinos: seda encrespada, queixas de mulher à noite sozinha.”
(M. Darwish)
consummatum est:
há solidão em qualquer não-litoral
e por quando passo trêsquatrocinco dias
componho o hábito teu
esquartejo as frutas
recriando teu vulto na cozinha
68
eu como,
pelo menos,
tua sombra
***
***
sem título
o oriente médio
...
e
existem tantas casas...
***
depois de sílvia
70
sentir a permissão de jogar o corpo na estrada, ir até...
voltar a si e negar o arremesso
***
no máximo, à praia
***
bacamarte
***
a última:
um dueto com as vozes dele mesmo
a. é
resta um
73
***
a s. m.
ogiva
lembra-me dos meus piores temores
em comum
fundos sulcos
74 ***
igor barboà
A palavra
perdeu minha
infância. Daqui de cima
E agora o que acho, é que
tudo que escrevo lágrimas
e leio eu, só pesão pra baixo.
julgo sem
importância.
Nem sombra de
orvalhos
maduro é como estar 75
Era só o corpo
podre
era só
nos galhos.
a morte
A coragem se
A vida me impõe despontou
um pesar nesse segredo:
mesmo que eu não Lembrar
tenha balança: é uma questão
Despertar é leve, de medo.
mas cansa.
Ser tudo em todos
com a sede Cair
de um só. é deixar o corpo
A ser meu avô entender sozinho
aprendi com minha o ex
avó. ... passo.
Amanhecer
é quando
renasço pelo que me
findo.
Tinha olhos de
No duro e febril dizer
consorcio da tudo
madrugada de uma vez
fiz meu divorcio era tão calado
com o nada: ante vocês.
vou amanhecer um
sonho.
77
Partiu
foi buscar
eternamentos
na cacimba dos
instantes Corpo
com o balde dos essa limitação
momentos. fantástica
que faz a gente
perceber o quanto
a mente
é elástica.
Amar:
que jorra
na sede
onda.
Ler-mes quando
Corpo simples
Gozo plácido Isso de querer
Deus num ser
ou um ácido? se tornar
o exato amante
daquilo que ele é
... pra além de si
ainda vai te trazer
aqui.
É preciso ter
aquela festa no
pensamento A
Pois fora dele, há
coisa chuva
78
que o des’festa à me continua
todo momento. lhe caio
em pingos
sou meio da rua.
Lá
Doce
... Lá.
79
A pedra
é alguém
que trouxe tudo Faz por onde
pra fora. nunca errar
próprio endereço.
Gente
Pedra e ninguém é o que tem
tem um bocado de medo
agora. de se ver ao avesso.
Eu não duro,
enquanto pedra.
“Pessonhas”
A partir
a parte A certeza
que não somos é um pandeiro
perigosos, que eu toquei errado.
somos todos Aquela noite, sem
venenosos. dúvida:
a gente dançou um
bocado.
Pras coisas
de maior pulso
não tem discurso.
80
Poeta, um Muito
corre à míngua. bem,
O diabo lembra dois.
é ter o gesto
na língua.
A um matuto
da cidade
não adianta
muita
O que vai acontecer sofisticalidade:
não há Civilização
como ter é um canto perto
sido, duma padaria.
Há como tecer.
Há noites Há horas que nem
a primeira
Pelo que não venço letra
às vezes eu engato.
nada, é mais intenso Tem poema
do que a brasa que se faz, de fato.
do incenso.
Se tua simples
presença
é erotismo,
imagine
Intento então vestida.
81
muitas coisas
que nem tento
só no pensamento.
Chovia
e fazia sol
Tudo que nem você
é tão tudo ou nada, um sol e chuva
que em vez que
desse tudo demorei
eu vou querer um de pra entender.
cada.
Não sei você
mas no caso meu Literatura Subliminar
a melhor coisa Dialética
que alguém pode
se lembrar
é de que se Podem
esqueceu. o chamar
de mente rasa
mas ele trouxe, seu
mundo
Fotografei de casa.
a lua E quem entenderá
a comer-me sua razão
os próprios olhos sem nunca lhe bater
Retina é ela as portas... dá
de resto, o globo. percepção?
82
O silêncio
é um indício
da fala
houve só
... como se cala.
Ao sabor
de forças que nos
minam
algumas
verdadeiras coisas
só começam,
depois que às
terminam.
Nem tenha cuidado
Cintura Vem
é onde o vento e nos diz par.
apuro Que faço da gente
o rebolado. Impar despido.
“Passageiros”
De SI, Frações...
83
O vestido
é tão bonito O quarto de mim
que por seu dentro parte...
o vento, do inteiro.
venta um grito. É incomodo
Treme o tecido, me mas pelo menos não
balança. me cabe.
O corpo
é uma dança
chegando ao ponto
... de ônibus.
Não suporto
Ter chapéu
O sol
É minha saudade do Se for agora
céu. talvez o tempo me
guarde.
Talvez o vento me
conte.
Talvez minha
memória não pule da
ponte.
maluz
***
transeunte
transeunte
tuas pernas descamam em meu caminho
de tudo o que deixas cair faço uma calça
para cobrir-me do que és as sobras
transeunte, és um vampiro?
há um silêncio me esmagando desde que a tua existência
86 seduziu meus olhos
foi pra junto de teus livros, canetas e troco de passagens,
todo o meu caos
transeunte
quando desceres do ônibus, não te esqueças que cheguei
[cedo
e estou te esperando
para me devolveres a cor da pele e dos olhos das outras
pessoas
***
a brevidade da vida levou a perguntar
como continuar existindo
depois de borrado o alcance das visões
e as netas derramarem café nos cadernos
que ideia perguntar isso
depois de quarenta e cinco horas sem dormir
ainda hipnotizada pelas linhas das mãos
esquisita sala
nada entre a mobília combina
penso que materialmente 87
a consumação do sumiço se dará
com os móveis enfeitando a vitrine de um vuco-vuco no
Alecrim
e a biblioteca transferida para um sebo com queima de
estoque
- qualquer livro por três reais -
quando os herdeiros liquidarem até o último botão
***
***
eu oceano
me fiz
quando amarraram
a contemporaneidade
aos infinitos líquidos
de inconstância
o corpo
precisa de litros de água
88 o corpo é água
litros de sangue
abro as pernas
e circuitos de líquidos completam-se
***
coluna dói
deitada sobre espinhas crescidas
soul mais peixe que mulher
***
as tuas palavras
me dão borboletas de fogo no estômago
refluxo de passado
querendo voltar
bile afora
[mergulho em avessos] 89
***
***
90 ***
em hematomas
e com penas na garganta
espalho um odor ocre
os quartzos no bolso erguem uma religião própria
***
Respirar
***
Mesmo escondendo o fio que me liga a Eva e Adão,
e sem provar do fruto proibido,
fui expulsa do paraíso.
E de longe enxergo teus desejos escorrendo em vestes brancas,
seguindo em direção à terra,
que come os meus pés para saciar a alma
e fazer viva a promessa de que ao pó voltarei.
Ainda assim, tenho anjos cravados nas mãos
que levantam voo ao nascer o sol,
E em mim adormecem antes do cair da noite.
***
***
O povo quer festejar
riscar o céu com fogos e se enganar com várias cores
eu também quero desbotar o corpo
fazer língua de pincel
pra entender que às vezes o que se fala é o que falo
e deve ser engolido
O povo quer festejar fingir que está tudo bem
ouvir música cantar tom Jobim
eu também quero
falar mal dos poetas e dizer que Freud é louco
amar alguém do outro lado do país
O povo quer festejar
fazer releituras de qualquer texto
e ser chamado de artista
eu também quero ser artista
mas por entender Bataille
Sempre que me come
94 e escrever sobre isso porque é bom
O povo quer festejar
rezar pra senhora sorte e agradecer as luzes de natal
Eu também quero festejar com o povo pisando na própria cabeça.
***
***
Cristinas e Ana.
***
pedro lucas
1.