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NA REDE FACEBOOK
RESUMO
1- Questões iniciais
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No decorrer deste texto utilizaremos como sinônimos os termos software e rede social para tratarmos do
Facebook, sem que com isto haja novas atribuições de sentidos.
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Kant Kritik der praktischen Vernunft. Edição da Academia, vol. V, p.8, trad. de Artur Morão, Lisboa,
Edições 70, 1986, p.16(KpV, V, 8;16)
mais detidamente. O grupo Professores de Pernambuco possuia na época da nossa
investida 26.382 membros, nele são discutidos temas referentes ao fazer pedagógico, ao
fazer laboral dos docentes bem como temas da atualidade. É um lugar onde as relações
alteritárias, exotópicas e dialógicas tomam forma e constituem a dinâmica do ser em
processo.
É fato que ao olhar para a rede social em questão, a primeira coisa que nos
chama a atenção diz respeito às questões referentes à alteridade que são, em análise,
frutos das interações do ser e que a mecânica do software possibilita 4. Ora, para
compreender isto pensemos em outro conceito que tomamos emprestado de Bakhtin,
trata-se do conceito de cronotopo5. O Facebook possibilita uma nova forma de
cronotopo, possibilita novas formas de relações sociais: “a recriação de um mundo
espaço-temporal adequado, um cronotopo novo para um homem novo, harmonioso,
inteiro, e de novas formas de relações humanas. Bakhtin (1998, p.283)”. Para
compreendermos isto imaginemos por um minuto a interface do Facebook, nela
verificamos vários espaços que em conjunto formam o todo.
Há um espaço para escrever algo, há um espaço onde é possível ver os membros,
há um espaço onde os membros podem responder a outros membros, há um espaço
onde membros do grupo podem convidar outras pessoas para participar do grupo, há
espaços para publicidade etc. De todos esses cronotopos, o que vai nos é o cronotopo
que proporciona um tipo particular de interação, ou seja, o cronotopo que funciona a
moda de um fórum de discussão, como verificamos em Souza (2016). Ao que tudo
indica, as relações que se estabelecem nesse cronotopo são de uma ordem diferente uma
vez que nele podemos ver surgir dentro da rede social Facebook relações que perpassam
pela alteridade (eu/tu). É neste espaço em que os atos discursivos ganham contornos.
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Alguns poderiam objetivar dizendo que a mecânica do software não permite nada, para esses diríamos
para olhar o tempo passado quando os softwares não possuíam interface gráfica, quando cada comando
era feito por linhas de códigos por um único sujeito e as interações aos moldes como conhecemos hoje
não existiam. Feito esse exercício é possível dizer que a evolução das interfaces e da mecânica permitiu o
aparecimento de interações variadas.
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Para mais detalhes a respeito do conceito foi trabalhado por Bakhtin na obra ‘The dialogic imagination’
([1975] 1988) e no ensaio ‘Forms of time and of the chronotope in the novel
os atos discursivos sobre o fazer docente, o discurso sobre o trabalho não está
circunscrito ao local de trabalho; 2- a alteridade é elemento constitutivo e direcionador
no âmbito da atividade; 3- o agir dialógico é imbuído por uma ação que está em
contraste com outros atos, com outros sujeitos e envolve vários aspectos, como os
psíquicos, identitários e sociais, como acentuou Bakhtin (1993); 4- o pensamento
participativo e o fazer docente é um ato responsável que tem na palavra a sua
materialização. Procuremos demonstrar como este ato discursivo pode ser
exemplificado através da ação linguageira sobre o trabalho. Para tanto, tal análise será
desencadeada pelas narrativas encontradas no grupo de professores. É importante
atentar que esse texto em nenhum momento está dissociado do próprio labor docente,
trata-se como veremos, de uma posição única ocupada pelo profissional e que no lugar
único da existência redige um pensamento acerca de sua atividade ou dos elementos
coercitivos que fazem parte de tal atividade.
A análise da primeira narrativa é iniciada por uma enunciação de um dos
membros do referido, grupo. Trata-se de uma enunciação sobre o Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação
(Fundeb), aqui é preciso fazer algumas considerações: o fato desta temática aparecer
dentro de um espaço de interlocução como o grupo de professores de Pernambuco
ocorre por ser o Fundeb uma receita enviada pela união aos municípios para que estes
possam aplicar em todas as etapas da educação básica. Além disto, o dinheiro do
financiamento também pode ser aplicado no pagamento dos professores e demais
profissionais de educação. Daí decorre o interesse dos membros do grupo por esta
temática. Observe a imagem 01
Imagem 01
É interessante notar que esta primeira enunciação sobre um ato de trabalho é
uma ação dialógica na qual o ser-evento provoca uma alteridade radical entre o eu e o
outro a ponto deste outro ir em direção a essa enunciação. Esse enunciação, como
veremos gera uma disputa de sentidos e ações na esfera dos atos executados na vida.
Isso coloca em evidência que a narrativa inicial é uma enunciação dialógica na medida
em que a partir delas há outras valorações a respeito do tema, conforme podemos ver na
imagem 02.
Imagem 02
Note que a primeira resposta à enunciação inicial diz respeito a uma pergunta:
"E ñ sobrou nada para o professor?". Esta primeira enunciação nos leva a apreensão
imediata de que a narrativa inicial acaba por desencadear uma resposta dialógica, ou
ainda, que os atos valorativos do ser, requerem a plenitude da palavra com todo seu
conceito (conteúdo) sua entonação (a atitude valorativa) e sua posição única como ato
responsável, como mostramos anteriormente. A segunda enunciação "Estou cada vez
mais querendo sair do estado. Infelizmente, a cada dia que passa está piorando e
muitos professores achando tudo ótimo. Não está dando pra mim" coloca em evidencia
o que está acentuado neste ato discursivo, ou seja, os valores éticos, profissionais e
existências. Trata-se de uma experiência única do ser que é corroborado
sequencialmente pelo terceiro ato discursivo, ou como chamamos, por um ato
responsível acionado pela memória da desvalorização profissional tão comum aos
docentes da rede pública estadual. Notemos que em nenhum momento o texto narrativo
que iniciou o debate dentro do grupo está dissociado da esfera do trabalho e do fazer
docente, é antes elemento para que as apreciações valorativas a respeito das práticas
docentes aconteçam, assim é que a orientação de um conteúdo-sentido sobre a atividade
de trabalho só pode ser desvelada quando levamos em consideração o ser-evento e sua
memória-trabalho.
6- Considerações Finais
Referências
COCKELL, F. F.; Perticarrari, D. Dando voz à fala dos trabalhadores: atividade real e
linguagem. Calidoscópio Vol. 6, n. 2, p. 69-75, mai/ago 2008.
FAÏTA, D. A linguagem como atividade. Uma conversa entre Daniel Faïta, Christine
Noël e Louis Durrive. In: SCHWARTZ, Y.; DURRIVE, L. (Org.). Trabalho &
ergologia: conversas sobre a atividade humana. 2010.