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Ano 1, Nº 2

Produzida por Pastores da Igreja Evangélica Luterana do Brasil

- A Epifania e suas opor- - Música - Três Reis Ma- - A Natureza Missioná- - A Onipotência de
tunidades, 42 gos, 78 ria da Igreja, 4 Deus e a Universalida-
- Epifania - Sermão, - Liturgia para o Culto - A TV como veículo de de da Graça no Livro de
38 de Natal, 83 evangelização na Igreja Jonas, 69
- A Estrela - simbologia Evangélica Luterana do
cristã, 77 Brasil, 23
Apresentação da Revista
EXPEDIENTE
Publicação mensal de pastores da Igreja
Eletrônica Teologia & Prática
Evangélica Luterana do Brasil (IELB) não oficial. A revista Teologia&Prática é uma iniciativa de pastores da
Tem como propósito divulgar textos teológicos/ Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB). Ela não tem caráter
pastorais, inéditos ou não, produzidos por oficial. Seu objetivo básico é coletar e compartilhar bimestral-
pastores da IELB, recuperar textos teológicos
mente, de forma organizada, via Internet, textos teológicos/pas-
escritos no passado e que não estão disponíveis
na Internet, divulgar de forma mais abrangente torais, inéditos ou não, produzidos por pastores da IELB e que
a teologia evangélica luterana confessional e a regularmente circulam em listas da Igreja. Além disso, procura
reflexão teológica na IELB, e ser uma ferramenta recuperar textos teológicos escritos no passado e que não estão
prática para as atividades ministeriais em disponíveis na Internet. Um objetivo subjacente é a intenção de
suas diferentes áreas. Os conteúdos são de
divulgar de forma mais abrangente a teologia evangélica lute-
responsabilidade dos seus autores.
rana confessional e a reflexão teológica na IELB. Além de pos-
Colaboradores desta edição: sibilitar a reflexão teológica, a revista quer ser uma ferramenta
Comissão de Culto da IELB; David Karnopp; prática para as atividades ministeriais em suas diferentes áreas.
Dieter J. Jagnow; Élvio Nei Figur; Heldo
Bredow; Horst Kuchenbecker; Jarbas
Hoffimann; Marcos Schmidt; Mário Rafael Critérios
Yudi Fukue; Maximiliano W. Silva; Rony
Ricardo Marquardt; Waldyr Hoffmann. 1. A produção da revista é coordenada por voluntários. Um (ou mais) editor
é responsável para que exista um mínimo de organização na diferentes
Imagens: fases do processo.
As imagens usadas nesta publicação são de livre 2. A revista é fechada em PDF e carregada em um depósito da Internet, de
acesso na Internet. Caso contrário aparecerá, ao onde poderá ser baixada livremente.
3. A revista tem circulação bimestral. Não há um número fixo de páginas.
lado da imagem, a referência ao seu autor.
4. Um blogue serve de apoio para as edições, a fim de possibilitar a sua
Coordenadores: divulgação pelos mecanismos de busca da Internet.
Rev. Dieter Joel Jagnow (editor) 5. A revista é aberta a todos os pastores da IELB interessados em compar-
Rev. David Karnopp tilhar seus textos (meditações, estudos homiléticos, sermões, resenhas,
Rev. Jarbas Hoffimann ensaios, etc.), inéditos ou não. Cada autor é responsável pelo seu texto
Rev. Mário Rafael Yudi Fukue (doutrinária, gramática e ortograficamente). Os textos devem ser enviados
ao editor.
Rev. Waldyr Hoffmann
Nota: O editor pode recusar — ou solicitar que seja revisado — algum
Diagramador: texto, caso julgue que ele afronte a doutrina da IELB. Para tanto, se neces-
Rev. Jarbas Hoffimann sário, conta com voluntários para a avaliação. Não serão utilizados textos
de conteúdo político-partidário, que promovam o ódio ou a discriminação
diagramador.RT@gmail.com ou que firam os princípios e valores da Igreja.
6. A publicação dos textos enviados não é imediata. Existe uma tentativa de
Blogue se ter variação de conteúdos em uma edição e em edições subsequentes.
http://www.revistateologia.blogspot.com O editor informa ao autor a situação de cada texto recebido.
7. Há uma pauta mínima, no sentido de se buscar conteúdos que de alguma
Twitter forma abordem questões pontuais (exemplo: Reforma, eleições, Natal). A
@revistateologia
pauta completa é determinada de acordo com as colaborações recebidas,
conforme a ordem de chegada.
Colaborações: 8. O organograma de produção é este:
Os textos a serem publicados na revista devem
a) Lançamento: até o dia 25 do segundo mês da edição
ser enviados ao editor
b) Preparação / Diagramação: do dia 1 ao dia 20 do segundo mês da edi-
Contato/Editor: ção
revistateologia@gmail.com c) Recebimento dos textos: até o dia 20 do primeiro mês da edição

Leitura na Internet: e-mail: revistateologia@gmail.com


www.scribd/revistateologia blogue: http://revistateologia.blogspot.com
tuíter: http://twitter.com/revistateologia
- A Água - biblicamente falando, 58
- A Epifania e suas oportunidades, 42
- A Estrela - simbologia cristã, 77
- A Natureza Missionária da Igreja, 4
- A Onipotência de Deus e a Universalidade da Graça no Livro de Jonas, 69
- A TV como veículo de evangelização na Igreja Evangélica Luterana do Brasil, 23
- Deus continua manifestando a sua glória através da Igreja, 60
- Direto ao ponto, 87
- e-mail de Lutero — A Reforma da Igreja Cristã, 63
- Epifania - Sermão, 38
- Litúrgica: Culto de Natal, 83
- Música - Três Reis Magos, 78
- Nasceu o Salvador, 46
Missão Rev. Rony Ricardo Marquardt

A Natureza Missionária da

E sta afirmação dá destaque a um dos aspectos prin-


cipais da natureza ímpar da Igreja Cristã: ou ela é
missionária ou deixa de ser Igreja. Qual é a essência da
Escrituras Sagradas respostas para que a Igreja desem-
penhe com fidelidade sua missão, consciente de que
natureza da Igreja? De onde procede a sua particulari- foi chamada para ser sal, luz e fermento para todas as
dade? Qual seu papel no plano de Deus? nações.
Na busca de respostas a estas questões, faz-se neces-
sária uma análise do conceito de missão no Antigo e 1. A Base Bíblica
no Novo Testamento, para que Deus, em sua palavra,
mostre a realidade e importância desta missão, e como
ela foi levada a efeito pelo povo de Deus da antiga e 1.1. A Missão no Antigo Testamento
da nova aliança. Como Israel efetuou a sua missão no
Os capítulos iniciais da Bíblia, Gênesis 1 a 11, pos-
período vétero-testamentário? Como interpretar os
suem um significado especial para a teologia da missão.
mandatos missionários de Jesus? Qual foi a ação dos
Mostram a origem de todas as nações e o relacionamen-
discípulos e do apóstolo Paulo com relação à missão? A
to de Deus com as mesmas. Estes capítulos servem de
Escritura Sagrada evidencia um plano divino de ação, a
pano de fundo para descrever a atividade salvífica de
fim de o evangelho da salvação atingir todas as nações?
Deus.2
Uma rápida passagem por Lutero e seus escritos
Estes registros bíblicos são um claro testemunho,
mostrará, igualmente, a importância que ele atribuiu à
em meio às nações pagãs, do plano divino de salvação,
missão da Igreja, destacando-a como uma das impor-
e contestam a existência dos deuses das nações, mos-
tantes e imprescindíveis funções da Igreja de Cristo.
trando que o Deus de Israel é um Deus histórico, que
Lutero tem sido acusado de não ter dado importância
age na e através da história para trazer salvação. Isto
nem destaque à natureza missionária da Igreja1. Será
proporcionou ao povo de Israel a consciência de que,
isto verdadeiro? O que Lutero tem a dizer sobre a ativi-
em sua vida, estava presente o Deus Criador de todas
dade e a natureza missionárias da Igreja?
as coisas, o Eterno, que permanece para sempre e que
O exame da dimensão missionária da Igreja e dos
age historicamente. Evidencia-se, assim, que a história
desafios atuais à Igreja missionária evidenciará como o
da criação do mundo e das nações acontece pela deter-
poder de Deus continua em ação na sua Igreja, como e
minação do Senhor e, por isso, serve de pano de fundo
por que meios o evangelho da salvação em Jesus Cristo
para a sua atividade salvífica em Israel e, através dele, em
continua a ser “o poder de Deus para a salvação de todo
todas as nações.
aquele que crê” (Rm 1.16). Quais são os desafios que a
Além disso, a universalidade do proto-evangelho de
Igreja de hoje enfrenta na sua proclamação do evange-
Gênesis 3.15 é básica à revelação do Antigo Testamen-
lho? Como vencer estas barreiras?
to, pois apresenta a promessa universal de salvação. “É
Com isto em mente, o presente estudo busca nas
o leitmotif soteriológico... e o princípio hermenêutico
1. WARNECK, Gustav. Abriss einer Geschichte der Protestantis- que governa a interpretação do Antigo Testamento”.3
chen Missionen von der Reformation bis auf die Gegenwart.
6. ed. Berlin: Martin Warneck, 1900, p. 9. LATOURETTE, Ken- 2. BLAUW, Johannes. A Natureza Missionária da Igreja. Jovelino
neth Scott.Three Centuries of Advance. In: A History of the Ex- Pereira Ramos, trad. São Paulo: ASTE, 1979, p. 19.
pansion of Christianity. New York/London: Harper & Brothers, 3. PETERS, George W. A Biblical Theology of Missions. Chicago:
1939, v. 3, p. 24. Moody Press, 1972, p. 86.

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Missão

que Deus usou para os seus propó-


sitos universais de salvação. Desta
forma, Israel como um todo possuía
a função sacerdotal — “vós me sereis
reino de sacerdotes e nação santa” (Êx
19.6) — e esta minoria escolhida foi
o instrumento de Deus para atingir a
maioria, a humanidade, as nações.7
Israel foi escolhido para que, vi-
vendo entre as nações, testemunhasse
os grandes feitos de Deus a elas. Estas
nações — goyim8 — são convidadas
a testemunharem os feitos de Deus
para com Israel e se tornarem parti-
cipantes da promessa de salvação,
reconhecendo o Deus de Israel como
O chamado de Abraão é o começo da restauração o único Deus de toda a terra (Sl 67;
da humanidade e da comunhão do homem com Deus. 93-100; 117).
Quando ele é chamado por Deus, passa a ser o repre- Israel foi chamado, em sua eleição por Javé, para
sentante da salvação divina, um testemunho às nações ser pregador e exemplo, profeta e sacerdote às na-
da salvação oferecida por Deus. A ordem tríplice de ções.
Deus a Abraão — “sai da tua terra”, “vai para a terra A presença ativa de Deus em Israel é sinal e garan-
que te mostrarei” e “sê tu uma bênção” (Gn 12.1-3) tia da Sua presença no mundo: e a presença de Is-
— coloca-o como um testemunho a peregrinar entre rael é, assim, contínuo apelo às nações do mundo.9
os povos pagãos, mostrando o poder e a misericórdia
de Yahweh. Esta declaração de Gênesis 12 é interpreta- O Antigo Testamento vê a missão como uma pos-
da pelo Novo Testamento como promessa de salvação sibilidade escatológica, pois a expectativa do Messias
para todos os povos e é colocada sob a luz cristológica tornou-se expectativa para todos os povos. Por isso, a
(Rm 4; Gl 3.6-18; Hb 11.8-19). A eleição de Abraão missão no Antigo Testamento acontece mais no senti-
e, por conseqüência, de Israel, deve ser vista à luz da do centrípeto do que centrífugo, isto é, as nações serão
revelação de Deus às nações.4 atraídas a Jerusalém e se dirigirão a ela, em vez de Israel
Este privilégio [a eleição] não foi estendido a Israel 7. PETERS, p. 87,89.
para que este ficasse inebriado com ele, mas para 8. A palavra gôy, e o plural goyim, tornou-se termo técnico para
que o reconhecesse como comissão. A eleição separa designar os gentios, enquanto `am é usada para o povo esco-
Israel das nações, para que ele possa servir a Deus lhido por Deus (2 Sm 1.12; Ez 36.20 - `am YHVH - povo de
Yahweh). Em Êxodo 33.13 gôy é usado para povo em geral
e revelar, de modo especial, a glória e a soberania e `am para o povo escolhido. Israel é o `am kadosh - povo
deste sobre a terra e, por fim, trazer todo o mundo santo (Dt 7.6). Isaías 9.1 também apresenta esta idéia com
a Deus.5 a expressão gelil ha-goyim - Galiléia dos gentios. No Novo
Testamento, é mantida esta diferenciação com os termos laos
- povo de Israel - e ethne - as nações que precisam ouvir o
A eleição de Israel não significa favoritismo da parte evangelho. Vide: CLEMENTS, Ronald E. “Gôy”. In: Theological
de Deus. O Antigo Testamento dá ênfase a Israel como Dictionary of the Old Testament. G. Johannes Botterweck e
povo de Deus, pois sua eleição “é questão de iniciativa Helmer Ringgren, ed. John T. Willis, trad. Grand Rapids: William
B. Eerdmans, 1975, v. 2, p. 426-433. BERTRAM, Georg e SCH-
divina, que tem como alvo o reconhecimento de Deus MIDT, Karl Ludwig. “Ethnos, Ethnikos”. In: Theological Dictio-
por todas as nações em todo o mundo”.6 nary of the New Testament. Gerhard Kittel, ed. Geoffrey W.
A escolha de Israel como servo foi a metodologia Bromiley, trad. Grand Rapids: William B. Eerdmans, 1964, v. 2,
p. 364-372. BIETENHARD, Hans. Povo. In: O Novo Dicionário
Internacional de Teologia do Novo Testamento. Colin Brown, ed.
4. BLAUW, p. 21-22. Gordon Chown, trad. 3. ed. São Paulo: Vida Nova, 1985, v. 3, p.
5.VRIEZEN,Th. C. apud BLAUW, p. 22. 613-625.
6. BLAUW, p. 23. 9. BLAUW, p. 28.

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ir às nações (Is 2.2-5). A vinda das nações é a resposta trangeiros igualmente mostra este fato, pois o Livro da
aos atos de Deus em Israel. A função de Israel é marcar Aliança garante aos estrangeiros muitos privilégios em
a presença de Deus em meio à humanidade.10 meio ao povo de Israel (Êx 12.48; Nm 9.14; Êx 22.21;
Diz Martin-Achard: Nm 15.14; Dt 1.16; 10.18; 29.11; 31.12).12
A Igreja não pode negar que Deus converte as na- Na era davídica, pelo uso dos Salmos, pode-se de-
ções, atuando no meio do Seu povo. A sua interven- preender o mesmo posicionamento em relação às na-
ção, e somente esta, faz de Israel a luz do mundo. ções. Há mais de 175 referências à universalidade da
... A evangelização do mundo, antes de mais nada mensagem divina, e muitas delas trazem esperança de
e acima de tudo, não é questão de palavras ou de salvação para as nações. Há vários Salmos que são men-
atividade, mas de presença: a presença do povo de sagens e apelos missionários (Sl 2; 33; 66; 72; 98; 117;
Deus no meio da humanidade, a presença de Deus 145). Além disso, na oração de dedicação do templo,
entre o Seu povo.11 feita por Salomão (1 Rs 8.23-53), a vinda das nações
ao templo é antecipada (1 Rs 8.41-43) e é expresso o
Israel é chamado e recebe a missão de ser servo e desígnio missionário do templo (1 Rs 8.60).13
povo de Deus, escolhido como mediador entre Deus O propósito missionário da salvação oferecida por
e os povos - uma nação santa e dedicada ao serviço do Deus aparece claramente na era profética. Sofonias
Senhor (Êx 19.4-6). A atitude de Israel para com os es- destaca a universalidade da promessa de Deus (2.11).

10. Ibid., p. 38-40. 12. PETERS, p. 111-114.


11. MARTIN-ACHARD, R. apud BLAUW, p. 42. (Grifo do autor) 13. Ibid., p. 114-118.

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Missão

Habacuque apresenta três princípios básicos: justifica- certos na medida em que compreendem que o livro
ção pela fé (2.4), o conhecimento universal da glória ocupa-se com algo que é muito mais do que o caráter
de Deus (2.14) e o culto universal ao Senhor (2.20). universal da salvação; e que, por outro lado, aqueles que
O profeta Joel anuncia que o julgamento divino virá rejeitam esta exegese missionária também estão certos,
sobre todas as nações (3.9,11) e que o seu Espírito será na medida em que entendem que não há pensamento
compartilhado por toda a carne (2.28).14 missionário no Antigo Testamento como ocorre no
O profeta Isaías mostra que todas as nações estão Novo, no sentido centrífugo, de “ida às nações”.17
sob o juízo de Deus, mas também sob a sua salvação. O livro de Jonas, por isso, é de grande importância
As nações são advertidas por Deus (10; 13-23) mas es- para uma base bíblica da missão, pois antecipa o man-
tão incluídas nas grandes promessas de bênçãos (2.1-5; dato divino da ida aos gentios, servindo assim como
11.10; 25.6-9). Os capítulos 40 a 55 do livro do pro- passo preparatório à ação da Igreja do Novo Testamen-
feta Isaías são um dos pináculos missionários do Anti- to. O livro apresenta o plano abrangente de Deus, que
go Testamento, onde Israel é apresentado como servo quer a salvação de toda a humanidade. Embora o Anti-
de Yahweh para ser sua testemunha e seu mensageiro go Testamento normalmente convide as outras nações
(43.10,12; 44.8; 42.19; 44.26). Em Isaías 55-60 são fei- a virem até Israel, Jonas, a exemplo dos discípulos do
tas promessas de ricas bênçãos para as nações, promes- Novo Testamento, recebe a ordem de ir! “O Deus de
sas que são garantidas em meio à glória de Israel (55.4- Jerusalém é também o Deus de Nínive. Diferentemen-
5; 56.3-7; 60.3,10-16; 61.5-11). Em Isaías 66.18-21 é te de Jonas, ele não tem ‘complexo gentílico’.”18
expressa a evangelização de toda a terra e afirmado que Assim, fica claro que o objetivo essencial do Antigo
as nações também participarão na responsabilidade de Testamento é missionário, pois a universalidade da sal-
ministrar perante o Senhor.15 vação pervade a todo ele. A missão constitui o propó-
Ao examinar o Antigo Testamento em busca de uma sito do chamado, da vida e do ministério de Israel. “O
teologia de missão, não se pode deixar de considerar o Antigo Testamento não contém missão; ele próprio é
livro do profeta Jonas, que é considerado por muitos ‘missão’ no mundo”.19
como um dos pináculos missionários do Antigo Testa- Deste modo, quando Jesus, na sinagoga de Nazaré,
mento. Outros, porém, acham que falta em Jonas uma abriu o livro do profeta Isaías e leu — “O Espírito do
justificativa real para a missão. Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evan-
Os exegetas, em sua maioria, são unânimes em sua gelizar aos pobres; enviou-me para proclamar liberta-
avaliação de Jonas. Aqui, na opinião destes, o ide- ção aos cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr
al missionário é proclamado sem ambigüidades, e em liberdade os oprimidos, e apregoar o ano aceitável
neste livro Israel é orientado para sua verdadeira do Senhor” (Lc 4.16-21; Is 61.1-3) — estava mostran-
vocação no mundo. O livro é preparado contra o do que o Antigo Testamento indicava em sua direção.
exclusivismo judeu, religioso ou nacionalista, sen- A missão de Israel era proclamar a salvação que viria
do, assim, clara justificativa da missão entre os com o Messias, a sua esperança de que Deus cumpriria
gentios. a promessa feita já a Adão e Eva (Gn 3.15). Os cânticos
do Servo do Senhor de Isaías apontam para este aspec-
Outros, porém,... negam que o livro esteja preocu- to, pois destacam o que Deus faria para trazer salvação
pado com a comissão de proclamar a todas as nações a ao povo do Senhor e, através dele — pelo seu testemu-
mensagem de salvação. A oposição a um exclusivismo nho — a todas as nações.
judeu só consiste, de acordo com esta opinião, em acen- Com Cristo, o dia do Senhor havia chegado. A salva-
tuar a misericórdia infinita e ampla de Javé.16 ção estava consumada e poderia ser proclamada a todas
Johannes Blauw apontou com propriedade os dois as nações. Isto Israel já estava fazendo, na expectativa da
lados da questão e comenta que estas duas tendências vinda do Messias. Mas a sua atuação, como diz o após-
de interpretação do livro de Jonas são possíveis, pois tolo Paulo, também era uma “sombra das coisas que ha-
os que defendem uma interpretação missionária estão
17. Ibid., p. 34.
18. VERKUYL, Johannes. Contemporary Missiology - An Introduc-
14. Ibid., p. 121. tion. Dale Cooper, trad. Grand Rapids: William B. Eerdmans,
15. Ibid., p. 123-128. 1978, p. 96-97,100.
16. BLAUW, p. 33. 19. PETERS, p. 129. (Grifo do autor)

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Missão

viam de vir” (Cl 2.17). A missão de Israel cumpre-se em seja pregada a todas as nações. E a vinda das nações é
Cristo, o Messias crido e do qual o povo de Israel deu o tempo do semear e do crescer. Deste modo, o “ain-
testemunho, pela fé (Hb 11, especialmente 12.1). Toda da não” do Antigo Testamento é substituído pelo “já
sua atividade como povo de Yahweh era missão — era agora” do Novo Testamento, embora este “ainda não”
envio ao mundo para proclamação da salvação. continue, em termos de plenitude.23

1.2. A Missão no Novo Testamento 1.2.1. Os Mandatos


Quando se compara o Antigo e o Novo Testamento Missionários de Jesus
com relação ao tema “missão”, vê-se que o Novo Testa- Todos os evangelhos culminam com o relato da res-
mento traz algo bem novo: a comissão de proclamar o surreição e, ligado a este, o chamado à missão. Em todas
evangelho às nações, a missão da Igreja no sentido cen- as narrativas, fica claro que a ressurreição é a primeira
trífugo. Assim, a continuidade entre o Antigo e o Novo e grande pressuposição e condição para a proclamação
Testamento não significa identidade, mas implica em do evangelho.
diferença também.20 A Grande Comissão em Mateus 28.18-20 procede
Deus, como criador do céu e da terra, concedeu vida da autoridade que Jesus recebeu do Pai. Ele permane-
e paz ao homem mesmo depois de sua desobediência, ceu fiel à missão recebida do Pai, venceu o tentador (Mt
e abriu o caminho para a restauração da comunhão en- 4.9) e consumou a salvação, atendendo à vontade do
tre Deus e o homem com a eleição de Abraão e, poste- Pai.24
riormente, de Israel. Com a vinda de Cristo, as nações O Senhor ressuscitado agora envia seu povo a todos
podem agora ver e experimentar o que Israel pôde na os lugares, quando diz: “Tendo ido, discipulai!” Ir às
aliança com Deus.21 nações é o caminho evidente e natural de agir para fazer
Com isto em mente, entende-se por que Jesus cons- discípulos de todas as nações.25 Os limites da pregação
cientemente confinou sua atividade a Israel (Mt 15.24) do evangelho (cf. Mt 10.5-6) são removidos, e todo o
e orientou seus discípulos a que limitassem sua ativida- mundo deve ouvir a boa nova da salvação.26
de “às ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mt 10.5-6). A Marcos 16.15-16 também liga o relato da ressur-
hora dos gentios viria após a cruz.22 A vinda dos gentios reição à comissão para os discípulos irem por todo o
era esperada para o tempo do fim, quando o reino de mundo e pregarem o euangelion a toda a humanidade,
Deus seria plenamente revelado a Israel. destacando a universalidade da graça divina.27
O tema e o conteúdo do evangelho são a proclama- Em sua oração sacerdotal, Jesus havia dito: “Assim
ção deste reino, como cumprimento das promessas do como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei
Antigo Testamento. A sua concretização começa na ao mundo” ( Jo 17.18). E em João 20.21-23 ele concre-
pregação de Jesus, que anuncia a vinda do reino e con- tiza isto. Assim, os discípulos tornaram-se efetivamente
vida o povo ao arrependimento e à fé. E embora o evan- apóstolos, os enviados do Senhor Jesus Cristo, que é o
gelho seja o cumprimento da expectativa de salvação, significado do termo apostello, enviar.28
é ainda um cumprimento em caráter experimental, em E aquele que envia capacita os que são enviados. O
relação às nações (Mc 1.15; Mt 4.17). dom do Espírito Santo é a capacitação dos discípulos a
A parábola do semeador, em Mateus 13, mostra que fim de que exerçam o direito, a autoridade e o poder de
o reino que veio em e com Cristo é agora a semente, e o perdoar e reter pecados, concedendo a paz que Cristo
Messias assume a figura do semeador. Na grande hora
escatológica do cumprimento é isto o que está aconte-
cendo: o semeador saiu a semear, e isto pressupõe tem- 23. BLAUW, p. 67-80.
po e espaço para o crescimento e amadurecimento para 24. TASKER, R. V. G. Mateus - Introdução e Comentário. Odair Oli-
vetti, trad. São Paulo:Vida Nova/Mundo Cristão, 1980, p. 217.
a colheita. Há um intervalo de tempo entre a revelação 25. LENSKI, R. C. H. The Interpretation of St. Matthew’s Gospel.
do reino e o juízo final, para que a boa nova do reino Columbus:Wartburg Press, 1943, p. 1172.
26. BLAUW, p. 85-86.
20. BLAUW, p. 66,71. 27. LENSKI, R. C. H. The Interpretation of St. Mark’s Gospel. Co-
21. Ibid., p. 81-83. lumbus:Wartburg Press, 1946, p. 28,765.
22. JEREMIAS, Joachim. Jesu Verheissung für die Völker. 2. ed. Stut- 28. BRUCE, F. F. João - Introdução e Comentário. Hans Udo Fuchs,
tgart:W. Kohlhammer, 1959, p. 32. trad. São Paulo:Vida Nova/Mundo Cristão, 1987, p. 334.

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conquistou com sua obra na cruz.29
Lucas 24.44-49 mostra que os dis-
cípulos, como testemunhas oculares,
proclamariam os eventos do sofri-
mento, morte e ressurreição de Jesus,
para arrependimento e remis¬são
dos pecados. Foram enviados como
arautos-testemunhas.30
A estas testemunhas seria enviado
o poder prometido pelo Pai. Aqui
está registrada a fonte de todo o ver-
dadeiro poder para a evangelização.31
E este poder os discípulos receberam
no Pentecostes.
Em Atos 1.8 Jesus afirma: “sereis
minhas testemunhas”, isto é, pessoas
que tiveram um encontro especial
com Cristo e estavam absolutamente convictas de que nária da Igreja. A primeira é a ressurreição de Cristo.
Jesus era seu Senhor e Salvador.32 “‘Minhas’ testemu- “A obra missionária da Igreja está ligada tanto à Páscoa
nhas = chamadas para testemunhar de mim, por mim, quanto ao Pentecostes.”36
sobre mim, sim, tudo sobre mim.”33 Pela ressurreição de Cristo e o dom do Espírito San-
E Jesus então mostra qual o plano de ação que os to é aberto o caminho ao mundo das nações. Israel não
discípulos seguiriam: “Jerusalém, Judéia e Samaria, e foi rejeitado, pois ainda tem precedência com respeito
até aos confins da terra”. Jerusalém é citada primeiro à proclamação do evangelho. Mas esta precedência é, a
porque os apóstolos iniciariam naquela cidade a sua princípio, interpretada por alguns como exclusividade
grande obra, fundando ali a congregação mãe de toda a (At 10; 11.2-3), e é apenas em Antioquia que a Igreja
cristandade, a partir da qual seriam estabelecidas todas Cristã perde seu caráter de congregação judaica refor-
as congregações irmãs em todos os lugares.34 mada (At 11.20-21,26). O ponto de partida para a obra
Nesta ordem de Jesus está o esboço da atividade dos da Igreja ainda é Jerusalém — não o templo, mas a con-
apóstolos e do próprio livro de Atos: os capítulos 1 a gregação de Jerusalém.37
7 descrevem a atividade em Jerusalém; o testemunho Nesta rápida análise dos mandatos missionários de
na Judéia e Samaria é descrito nos capítulos 8 e 9; e a Jesus, vê-se que todos os evangelhos culminam com
ida aos confins da terra, incluindo Cesaréia, Antioquia, esta Grande Comissão, destacando assim sua riqueza
Ásia Menor, Grécia e Roma, é descrita no restante do de conteúdo e sua unidade de propósito.
livro, capítulos 10 a 28.35 Sua riqueza teológica mostra a autoridade do Se-
A descida do Espírito Santo no Pentecostes é a se- nhor ressuscitado e exaltado, a universalidade do evan-
gunda pressuposição e condição para a tarefa missio- gelho e a instrumentalidade humana na sua procla-
29. LENSKI, R. C. H.The Interpretation of St. John’s Gospel. Colum-
mação, bem como a companhia constante do Senhor
bus: Lutheran Book Concern, 1942, p. 1371. através de seu Espírito Santo.38
30. _____.The Interpretation of St. Luke’s Gospel. Columbus:War-
tburg Press, 1946, p. 1205-1207.
31. MORRIS, Leon L. Lucas - Introdução e Comentário. Gordon
1.2.2. A Atividade dos Apóstolos
Chown, trad. São Paulo: Vida Nova/Mundo Cristão, 1986, p. Os apóstolos são os autorizados por Jesus para a rea-
322.
32. ROTTMANN, Johannes H. Atos dos Apóstolos no Contexto do lização da obra do reino de Deus. Sua importância para
Século XX. Porto Alegre: Concórdia, 1979, p. 23. a primeira comunidade cristã consistia no fato de se-
33. LENSKI, R. C. H.The Interpretation of the Acts of the Apostles. rem testemunhas oculares da ressurreição e terem sido
Columbus:Wartburg Press, 1944, p. 32.
34. Ibid., p. 32. 36. BLAUW, p. 89.
35. HOERBER, Robert G., ed. Concordia Self-Study Bible. St. Louis: 37. Ibid., p. 90-91.
Concordia, 1986, p. 1655. 38. PETERS, p. 176.

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Missão

revestidos pessoalmente por Jesus da autoridade de tes-


temunhas (Lc 24.44-49; At 1.8). Este grupo representa
Israel e forma o começo, o núcleo do povo escatológico
de Deus, em torno do Messias. Sua missão com relação
às nações, antes da consumação da obra de Cristo, é vis-
ta como futura (Mt 10.5-6). Após o sacrifício messiâni-
co, surge em plena atividade a comissão dada por Jesus,
e então os limites de Israel são ultrapassados para a pro-
clamação do reino de Deus em toda a terra.39 Inicia-se,
assim, a missão no sentido centrífugo, a ida a todas as
nações, o transpor dos limites geográficos e culturais.
O livro de Atos descreve os apóstolos em ativida-
de, primeiro como missionários ao seu próprio povo
e, depois, como embaixadores de Cristo às nações do
mundo. A grande linha divisória na vida destes após-
tolos foi o Pentecostes, onde a missão neotestamentá-
ria inicia seu curso progressivo de realização. O fato de
haverem testemunhado a ressurreição e a presença do
Espírito Santo modelou-os como homens de Deus e
apóstolos.40
Sua motivação missionária foi assim esboçada por
George W. Peters:
a) Os apóstolos estavam convictos que:
• Deus havia agido soberana, decisiva e redentiva-
mente (At 2.23; 4.28; 1 Pe 1.20; 1 Jo 4.9-10,14); d) Os apóstolos viviam e trabalhavam conscientes
• O ato decisivo e redentivo de Deus aconteceu em de que o Espírito Santo estava com eles, sendo a dinâ-
Cristo (At 3.13-15; 2 Co 5.19; 1 Jo 5.12; At 2.36; 4.12; mica de seu ministério (1 Jo 3.24; 4.13; At 2.4; 4.8,31;
10.36); 6.3,5,10; 7.55; 10.19; 1 Pe 1.12; 2 Pe 1. 21).41
• Este ato foi um evento histórico com conseqüen- A ação missionária dos apóstolos mostra a profunda
tes resultados históricos (At 2.22; 3.13); e abrangente visão missionária que possuíam. Sua te-
• Tudo que aconteceu estava em perfeita harmonia ologia missionária estava fundamentada no princípio
com as profecias do Antigo Testamento (At 2.16,25,34; que tornou o mandato do evangelismo mundial um
3.18,21,24); imperativo evangélico e espiritual, um transbordar de
• O ato redentivo de Deus em Cristo foi em bene- vida, antes que uma imposição. “A missão tornou-se a
fício de toda a humanidade (At 2.39; 10.34-35; 15.13- vida deles, seu interesse que tudo absorvia, sua paixão
20; 1 Jo 2.2; 4.14); que tudo consumia, à qual suas vidas foram alegremen-
• A pregação de lei e evangelho era o caminho para te dedicadas.”42
oferecer esta salvação aos povos (At 2.38; 3.19; 8.22;
10.36). 1.2.3. O Apóstolo Paulo
b) Os apóstolos foram impelidos em seu empreen-
dimento missionário pela entrega em obediência ao seu Paulo é o maior expoente, o principal representante
Senhor (At 5.32; 1 Pe 1.2,22; 1 Jo 2.3-4,29; 3.24; 5.2- teológico, o maior apologista evangélico e o mais ar-
5). dente advogado da fé cristã. É óbvio na sua vida, em
c) Os apóstolos eram motivados pela presença do seus ensinos e em suas atividades o reconhecimento
Cristo vivo (At 2.32; 3.15; 4.10,33; 5.29-32; 1 Jo 1.1- da universalidade do evangelho daquele Senhor que o
3). chamou e o comissionou, a quem o apóstolo viu e em

39. BLAUW, p. 77-78. 41. Ibid., p. 135-144.


40. PETERS, p. 134-135. 42. Ibid., p. 145-146.

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ção de Paulo elementos e características comuns à sua


pregação, como destaca Roland Allen: apelo ao passa-
do, tentando conquistar a simpatia dos ouvintes; decla-
ração simples de fatos familiares; resposta às objeções
da razão humana; apelo às necessidades espirituais do
ser humano; séria advertência, pois a rejeição da mensa-
gem divina envolve perigo. É característico na pregação
de Paulo a conciliação com a condição dos ouvintes, a
coragem no aberto reconhecimento das dificuldades, o
respeito e a confiança sem hesitação na verdade de sua
mensagem.44

1.3. O Plano Missionário de Deus


À luz desta rápida travessia pela Bíblia e pelos seus
enfoques missionários no Antigo e no Novo Testa-
mento, percebe-se que Deus revelou um plano pelo
qual o homem foi e é alvo da reconciliação, e que ele
pode voltar à comunhão divina rompida pelo pecado.
Como parte deste plano divino, Abraão e seus descen-
dentes foram escolhidos para que, através deles, todas
as nações da terra recebessem as bênçãos e a salvação de
Deus (Gn 12.1-3). Depois Israel foi chamado e escolhi-
do para ser este testemunho. Com o contínuo bairris-
mo do povo judaico e a sua rejeição final do Messias, os
quem creu “como por um nascido fora de tempo” (1 gentios foram chamados por Deus (Rm 11.11; Ef 3.6),
Co 15.8). Paulo evidencia esta universalidade quando, para a salvação do próprio Israel (Rm 11.25-29).45
em suas epístolas, deixa claro que toda a humanidade: E assim inicia a missão no sentido centrífugo, a ida
a) Assume posição igual perante Deus, como peca- às nações, levando a elas o evangelho da salvação, a boa
dora (Rm 1.18-3.20; Ef 2.1-3); notícia de Cristo Jesus. A partir da Grande Comissão
b) Está sob igual condenação e em necessidade de dada por Cristo, os apóstolos envolveram-se pessoal-
salvação da ira presente e eterna de Deus (Rm 1.18- mente nesta missão e devotaram suas vidas a levar este
3.20); evangelho da paz aos povos. Esta era a função da Igre-
c) É justificada em termos iguais, pela fé em Cristo ja primitiva: discipular as nações mediante batismo e
como provisão e propiciação divinas (Rm 3.21-5.21); ensino (Mt 28.19-20), pregar o evangelho (Mc 16.15),
d) Recebe posição igual na Igreja de Cristo como pregar arrependimento para remissão de pecados (Lc
membro de seu corpo (Ef 2.11-3.12); 24.47), reconhecendo-se enviada pelo Filho para ofere-
e) Experimenta igual relacionamento com Deus (Ef cer o que ele conquistou com sua obra na cruz - perdão
2.19; Rm 8.15; Gl 3.26); e paz ( Jo 20.21-23), ser testemunha pessoal do Senhor
f ) Participa de privilégios e riquezas iguais (Ef 3.6; ressuscitado e possuindo o poder do Espírito Santo (At
Rm 8.17).43 1.8).
Estas grandes verdades levaram Paulo a pregar o Para este fim, Deus confiou à sua Igreja “a palavra
evangelho a todas as nações e fazer-se “tudo para com da reconciliação” (2 Co 5.19), pois estabeleceu que a
todos, com o fim de, por todos os modos, salvar alguns” salvação dos homens aconteça pela pregação do evan-
(1 Co 9.22).
Perguntando pela natureza missionária da Igreja 44. ALLEN, Roland. Missionary Methods - St. Paul’s or ours? Grand
Cristã, observa-se na atividade missionária e na prega- Rapids:Wm. B. Eerdmans, 1966, p. 63-64.
45. HESSELGRAVE, David J. Plantar Igrejas - Um Guia para Mis-
sões Locais e Transculturais. Gordon Chown, trad. São Paulo:
43. Ibid., p. 147-151. Vida Nova, 1984, p. 14.

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gelho através dos próprios homens (Rm 10.14), e asse-


gura, com sua promessa, que este evangelho é poderoso
e eficaz, pois “é o poder de Deus para a salvação de todo
aquele que crê” (Rm 1.16; cf. Is 55.11).46

2. Lutero e a Missão da Igreja Cristã


Com o objetivo de ser reforçada a posição de que faz
parte da natureza da Igreja o seu aspecto missionário, o
presente capítulo realiza um rápido apanhado daquilo
que Lutero disse a respeito da missão da Igreja, sua ne-
cessidade e importância.
Procura também colocar-se contra a posição, sur-
gida no século XIX, de que o reformador não teve
compreensão das obrigações missionárias da Igreja, re-
afirmando, assim, o caráter missionário de nossa Igreja
Luterana.

2.1. O Ensino de Lutero sobre Missão


Pode-se perceber nos escritos de Lutero sua clara
compreensão da atividade missionária da Igreja. Assim,
por exemplo, falando sobre a promessa feita por Deus a
Abraão, afirmou: “Assim, esta promessa deverá ser dada
e distribuída para todos os povos e gerações da terra,
como as palavras claramente demonstram”,47 mostran- No comentário sobre o Salmo 19, Lutero afirma:
do que já no Antigo Testamento a promessa havia sido Também deverá ser pregado o evangelho em todos
dada a todas as nações, não apenas a Abraão e aos seus os países, nações e línguas, e não somente com e en-
descendentes. tre os judeus, não somente em Jerusalém, porém
Nos seus sermões e comentários sobre os Salmos são em todas as línguas... para que a graça de Deus
encontrados muitos ensinos missionários. Falando so- seja proclamada por toda parte.49
bre o Salmo 117, Lutero comenta: Lutero destaca aqui a necessidade de levar a palavra
Por isso, se todos os pagãos devem louvar a Deus, de Deus a todas as nações, fundamento de toda a obra
então primeiro deverá acontecer que ele se torne missionária, para que os pagãos passem a louvar a Deus
o seu Deus. Se ele deve ser o seu Deus, então eles e sejam membros de seu reino, louvando-o pela sua gra-
deverão conhecê-lo e nele crer, e abandonar toda ciosa salvação.
a idolatria. ... Se devem crer, então primeiro de- E, se todos os povos devem louvar ao Senhor, então
vem ouvir a sua palavra e por esse meio receber o pregadores devem ser enviados. Por isso, ao comentar o
Espírito Santo, o qual pela fé limpará e iluminará Salmo 68.11, ele ensina:
o seu coração. ... Se devem ouvir a sua palavra, en- Aqui Deus diz que dará evangelistas, assim como
tão pregadores devem ser enviados a eles, os quais Paulo também diz, em 2 Coríntios 3.6: “Nós somos
lhes anunciam a palavra de Deus... onde houver ministros do espírito e não da letra”, isto é, prega-
pagãos ou terras e cidades, lá deverá chegar o evan- dores da graça e não da lei. Isto aconteceu por meio
gelho e trazer alguns para a fé no reino de Cristo.48 dos apóstolos e de seus sucessores em todo o mundo.
46. FLOR, Paulo. Assim como eu vos amei - Manual de Evangeliza- Pois ele deu-lhes muito, enviando-os a todas as ter-
ção. Porto Alegre: Concórdia, s.d., p. 12-13. ras, como é conveniente no tempo da graça.50
47. LUTHERS, Martin. In: Sämmtliche Schriften. Joh. Georg Walch,
ed. St. Louis: Concordia, 1892, v. 1, col. 748. (Doravante desig-
nada por W). 49.W 5, 1334,1335.
48.W 5, 1139,1143. 50.W 5, 667.

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Deus providencia missionários e evangelistas. Esta é Nestes poucos exemplos de sermões e comentários
a afirmação missionária de Lutero, sua certeza de que a de Lutero evidencia-se com clareza seu pensamento
missão é obra do próprio Deus. Isto também é expres- missionário. Ele afirma a necessidade de levar a palavra
so por ele no segundo sermão para o dia da Ascensão, de Deus, a certeza de que a evangelização é obra contí-
quando fala sobre a Grande Comissão dada aos após- nua do próprio Deus levada a efeito pelos cristãos, que
tolos: proclamam a sua palavra, e que deve alcançar todas as
Sua pregação espalhou-se por todo o mundo, se pessoas em todo o mundo.
bem que ainda não tenha chegado em todo o mun- Nos seus escritos confessionais Lutero demonstra
do. Este ir e anunciar foi iniciado e distribuído, sua preocupação com a missão da Igreja Cristã. Nas
ainda que não tenha se realizado e cumprido, mas Confissões Luteranas não há uma teologia das missões,
ainda continuará a ser pregado até o dia do Juízo especificamente expressa, mas elas têm muito a dizer
Final. Quando esta pregação for pregada e ouvida, sobre a doutrina da Igreja, sobre a universalidade da
e proclamada em todo o mundo, então a mensa- redenção, sobre a pregação da palavra. E estas questões
gem estará cumprida e transmitida em toda parte, estão diretamente ligadas à missão em si.53
então também chegará o Juízo Final.51 Além disso, as explanações de Lutero sobre o Ter-
ceiro Artigo do Credo Apostólico e sobre a Segunda
Esta é, assim, a descrição da contínua obra da evan- Petição do Pai-Nosso demonstram sua confiança na
gelização, até que venha o último dia. Enquanto hou- obra divina e evidenciam a essência de seu pensamento
ver mundo, o evangelho será pregado e a obra da mis- missionário.54
são continuará. No Terceiro Artigo fala do Espírito Santo chaman-
No terceiro sermão para o dia da Ascensão, baseado do e reunindo a totalidade da Igreja Cristã e manten-
em Marcos 16, Lutero expôs o chamado do evangelho do-a na verdadeira fé em Cristo. No Catecismo Maior
a todos os homens: diz que a Igreja Cristã é “uma congregação peculiar no
Estas são palavras da majestade... que ordena a estes mundo, congregação esta que é a mãe que gera e carrega
pobres mendigos que saiam e anunciem esta nova a cada cristão mediante a palavra de Deus.”55
pregação, não em uma cidade ou nação, porém em Igualmente expressa sua compreensão missionária
todo o mundo, principado e reino; e abram a boca na Segunda Petição:
com confiança perante toda criatura, para que tudo Pedimos, por conseguinte, aqui, em primeiro lu-
que seja do gênero humano ouça esta pregação. gar, que isso tome efeito entre nós, e que destarte
Este mandato passa por sobre todos os reis, príncipes, seu nome seja exaltado pela santa palavra de Deus
nações e pessoas, grandes e pequenos, jovens e velhos, e por uma vida cristã, tanto para que nós, que a
eruditos, sábios, santos. Com esta única palavra fi- aceita¬mos, nisso permaneçamos e diariamente
cam sujeitos todo domínio e poder, bem como toda progridamos, como também a fim de que alcan-
sabedoria, santidade, alteza e regimento que exis- ce assentimento e adesões entre outros homens e
tam sobre a terra; tudo lhe deverá estar sujeito. marche poderosamente pelo mundo universo, a
Mas não é necessariamente um senhor mau, que fim de muitos deles, trazidos pelo Espírito Santo,
torna sujeito ao seu poder e envia missionários, não virem ao reino da graça e se tornarem partícipes
para um ou mais senhores ou reis, porém para to- da redenção, para que dessa maneira todos juntos
dos no vasto mundo; e tem sobre eles total poder e fiquemos eternamente em um só reino, agora prin-
domínio, como sobre seus súditos. cipiado.56
E lhes dá esta ordem, de modo que diante de nin-
guém tenham medo nem se espantem, seja grande Lutero expõe que, quando o cristão suplica “venha
ou poderoso; porém que vão livremente, sempre o teu reino”, está rogando que o reino venha a ele e que,
mais longe, tão grande seja o mundo, e preguem
de modo que sejam ouvidos e ninguém lhes possa 53. COATES, Thomas. “Were the Reformers Mission-Minded?”
Concordia Theological Monthly, St. Louis: n. 9, out. 1969, p. 609.
resistir.52 54. PETERS, Paul. Luther’s Practical Mission-Mindedness. Wiscon-
sin Lutheran Quarterly, Milwaukee: n. 2, abr. 1969, p. 112.
51.W 11, 951. 55. LIVRO DE CONCÓRDIA, CM II, iii, 42.
52.W 11, 963. 56. Ibid., CM III, ii, 52.

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através dele, alcance o mundo inteiro. Em outras pala- Esta visão de Warneck está baseada em seu concei-
vras, o cristão coloca-se à disposição de Deus como seu to de missão, como ele próprio afirma: “como a com-
instrumento para realizar a sua missão. preendemos hoje”.61 Isto significa, para ele, o envio
O próprio catecismo foi escrito com propósitos sistemático de missionários profissionais às nações não-
missionários, pois Lutero diz na Missa e Ordem do Cul- -cristãs através de sociedades missionárias organizadas,
to Alemão: patrocinadas pela Igreja oficial. Assim, fez de um mé-
Catecismo quer dizer a instrução pela qual os todo particular de missão uma necessidade teológica
pagãos que querem ficar cristãos são ensinados e e acusou Lutero de ter uma teologia imperfeita sobre
orientados a respeito do que devem crer, fazer, evi- missão, por não ter advogado este método.62
tar e saber no cristianismo.57 Para chegar-se a uma conclusão sobre a questão de
Lutero ter tido ou não visão missionária, não se pode
Em tudo isto, vê-se a compreensão de Lutero sobre comparar seu pensamento missionário com o que hoje
a obra que Deus vem realizando no mundo. A Grande se entende por missão e nem comparar a atividade mis-
Comissão, dada por Cristo aos seus discípulos, ainda sionária da Igreja de Lutero com a da Igreja Católica
é cumprida pelos seus discípulos de hoje, e Lutero viu Romana. Pois há três fatores importantes para o pro-
esta responsabilidade e necessidade com muita clareza, gresso e a eficácia do programa missionário católico-
mostrando que esta obra continuaria até o dia do Juí- -romano que não estavam presentes na Reforma e nas
zo Final, até que “o pecado, a morte e o inferno sejam Igrejas desta:
exterminados, a fim de vivermos eternamente em plena 1. O conceito de supremacia papal a embraçar o
justiça e bem-aventurança.”58 mundo inteiro;
2. As ordens monásticas, que eram um canal efetivo
2.2. A Controvérsia sobre a para a tarefa de evangelizar os pagãos;
Consciência Missionária de Lutero 3. As forças coloniais e seus governantes eram da
Igreja Romana, concedendo seu apoio e proteção às
Ao escrever a história das missões protestantes,
missões que estavam sendo estabelecidas em seus ter-
Gustav Warneck fez a acusação de que Lutero não teve
ritórios.63
compreensão das obrigações missionárias da Igreja de
Apesar de não ter havido uma explosão missionária
pregar o evangelho às nações ainda não-cristianizadas.59
na época de Lutero por parte das Igrejas protestantes
Reconheceu as circunstâncias peculiares da época que
alemãs, vê-se que isso não ocorreu por falta de uma cla-
tornavam a missão impossível, pois a Alemanha estava
ra e pura teologia de missão. Tanto Lutero como seus
isolada das recém-descobertas terras; que o movimento
colaboradores estavam conscientes da necessidade e
da Reforma precisava ser consolidado; e também que
urgência desta missão. Thomas Coates cita oito razões
as Igrejas protestantes estavam fazendo missão dentro
para a falta dessa atividade missionária no período da
da Alemanha, neste período. Mas, considerando o fato
Reforma e seu resultado na época da ortodoxia:
de que nenhum lamento surgiu a respeito da impossibi-
1. A luta para estabelecer e fixar os princípios da Re-
lidade de realizar a missão, chegou à conclusão de que
forma em seus próprios domínios;
esta falha era teológica, e não prática.60
2. As guerras religiosas, de modo especial a Guerra
57. LUTERO, Martinho. Pelo Evangelho de Cristo. Walter O. Schlu- dos Trinta Anos (1618-1648), que interromperam a
pp, trad. Porto Alegre/São Leopoldo: Concórdia/Sinodal, 1984,
p. 221. vida normal da Igreja;
58. LIVRO DE CONCÓRDIA, CM III, ii, 54. 3. A escatologia do período da Reforma;
59.WARNECK, p. 9: Não somente o feito missionário, mas mesmo 4. O princípio de cuius regio, eius religio;
o pensamento missionário, no sentido como o compreende-
mos hoje em dia, deixamos de sentir nos reformadores. E não 5. A ausência das ordens monásticas;
somente pelo fato de que quase todo o novo mundo pagão 6. O pouco contato dos países protestantes com
ultramarino descoberto estivesse fora do seu horizonte visual, pessoas e regiões não-cristãs no além-mar;
mas tão importante quanto isso deve ser considerado que
fundamentações teológicas principais os atrapalhavam para
7. O conceito do Landeskirche;
darem uma direção missionária ao seu campo de ação e mes-
mo aos seus pensamentos. 61.WARNECK, p. 9.
60. KOSCHADE, Alfred. Luther on Missionary Motivation. The Lu- 62. KOSCHADE, p. 224-225.
theran Quarterly, Gettysburg: n. 3, ago. 1965, p. 224. 63. COATES, p. 600-601.

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8. O dogmatismo da época da ortodoxia.64 significa uma parte ou duas, mas tudo e todos, o que for
Foi apenas com o advento do pietismo, por volta de e onde houver pessoas.”68
1670, que o luteranismo recebeu seu primeiro ímpe- Lutero compara a pregação do evangelho a uma pe-
to missionário real. Mas para a Igreja de hoje é impor- dra lançada à água, produzindo ondulações em círculos
tante que, apesar de não ter havido nenhuma tentati- concêntricos, as ondas se sucedendo e estendendo uma
va missionária de âmbito internacional no período da após a outra, até atingirem a margem. Esta é a tarefa
Reforma, já estavam implícitos na teologia da Reforma missionária centrífuga da Igreja, pois cada época recebe
os princípios que guiaram e motivaram as missões pro- de Deus este imperativo missionário que está claramen-
testantes posteriores. E esta é a grande contribuição de te expresso na Grande Comissão.
Lutero e da Reforma para o empreendimento missio- É assim que acontece com esta mensagem da pre-
nário atual.65 gação, como se a gente atirasse uma pedra na água,
a qual faz ondas e circunferências ou estrias ao seu
2.3. A Visão Missionária da Igreja redor, e as ondas empurram-se sempre e sempre,
em Lutero uma impele a outra, até que cheguem à margem.
Ainda que no meio fique calmo, as ondas não des-
Em face do exposto, evidencia-se que a teologia de cansam, mas movimentam-se por si. Assim tam-
Lutero estabeleceu os princípios básicos, orientações bém acontece com a pregação: ela foi iniciada pelos
e motivação para o empreendimento missionário da apóstolos e sempre continua, e é levada adiante
Igreja Luterana, que no decorrer do tempo realizou-se pelos pregadores, de cá para lá tocada no mundo e
efetivamente e que são encontrados principalmente na perseguida, mas é sempre tornada conhecida àque-
sua doutrina sobre a Igreja. les que anteriormente não a ouviram, é manifesta-
A Igreja, para Lutero, não é uma instituição estáti- da, mesmo que no meio do caminho seja apagada e
ca, mas uma comunhão de dimensões universais. Na e como heresia seja condenada.69
através da Igreja os homens são trazidos a Cristo, e esta
missão redentora continuará até o fim dos tempos.66 Em seu comentário sobre o livro do profeta Isaías
Onde houver cristãos, ali estarão a Igreja e o evange- mostra que esta contínua pregação do evangelho ao
lho, e este evangelho alcançará o mundo ao seu redor, mundo todo é a função da Igreja, pois ela existe e vive
buscando e salvando os perdidos. A Igreja tem uma só enquanto estiver perpetuamente ocupada em chamar
missão, independente de como ou por quem ou em as pessoas ao arrependimento e trazê-las à fé. Diz Lute-
que lugar ou por que meios essa missão é realizada. Ao ro: “Pois a Igreja permanece com isto: converter outros
chamar a Igreja de volta ao evangelho, Lutero a estava à fé e chamar ao arrependimento.”70 E a dinâmica para
chamando de volta à missão. Por isso, para andar nos esta tarefa e natureza missionárias da Igreja é o próprio
passos de Lutero, o pensamento missionário atual da evangelho, sem o qual não há Igreja.
Igreja deve ser retornar das missões para “a missão”, a Por isso, a continuidade desta obra missionária é in-
grande obra de levar o evangelho de Cristo a todas as cumbência de cada congregação. Lutero mostra que faz
nações. Esta é a obra própria da Igreja Cristã.67 parte da essência da comunhão cristã que a Igreja pro-
O caráter universal do evangelho foi muito bem curará estender-se e trazer outros ao seu meio. Fica evi-
compreendido por Lutero. Repetidas vezes mostrou dente, deste modo, que o imperativo missionário está
que Deus havia dado seu Filho ao mundo, não para um relacionado ao conceito do sacerdócio real de todos os
povo ou para uma classe de pessoas, mas para a huma- crentes. Cada cristão, em virtude de seu relacionamen-
nidade inteira. Isto é expresso enfaticamente por ele no to com Deus, tem a vocação e a responsabilidade de ser
seu sermão de Ascensão baseado em Marcos 16.14-20, uma testemunha de Cristo.71
onde diz: “Visto que ele afirma: ‘Ide por todo o mundo Sua compreensão do caráter universal do evange-
e pregai a toda criatura’, assim ele não quer que ninguém lho, sua reafirmação da natureza missionária da Igreja
seja excluído”; e mais adiante: “Pois ‘todo mundo’ não e a redescoberta do sacerdócio real dos cristãos mos-
64. Ibid., p. 609-610. 68.W 11, 966,970.
65. Ibid., p. 610. 69.W 11, 951.
66. Ibid., p. 610. 70.W 6, 782.
67. KOSCHADE, p. 238. 71. KOSCHADE, p. 232.

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tram como Lutero estava consciente da missão da Igreja sim estabelece uma conexão com os homens aos quais
e como seus ensinos e princípios teológicos servem de quer salvar. Em conseqüência, do ponto de vista de
fundamento para a obra missionária que a Igreja reali- Deus, o envio sempre tem um objetivo concreto a ser
zou durante estes cinco séculos e, igualmente, nos dias atingido — a salvação dos homens. Assim, a missão é
de hoje. obra do amor de Deus pela humanidade.75
A partir do texto de Mateus 24.14, Peter Beyerhaus,
3. Missão e Igreja falando sobre o conteúdo e objetivo da missão, diz que
ela acontece por nada menos que “a nomeação do Cru-
cificado e Ressuscitado no domínio do mundo.”76
3.1. O que é Missão? Também no Congresso Internacional de Evange-
A palavra “missão” designa a atividade divina que lização Mundial, realizado em Lausanne, a missão foi
emerge da própria natureza de Deus, pois o Deus vivo definida como proclamação: “evangelizar é divulgar
da Bíblia é um Deus que “envia”. Ele enviou os profetas, as boas novas de que Jesus Cristo morreu pelos nos-
seu Filho, os apóstolos, o Espírito Santo, a Igreja. As- sos pecados e ressuscitou dentre os mortos, segundo as
sim, a primeira missão é a missão de Deus, cujo centro
evidencia-se no envio de seu Filho ao mundo.72 E a mis-
75. Ibid., p. 40-41.
são da Igreja resulta desta missão do Filho ( Jo 20.21). 76. BEYERHAUS, Peter. Allen Völkern zum Zeugnis - Biblisch-the-
A Bíblia, em sua totalidade, atribui uma só intenção ologische Besinnung zum Wesen der Mission. Wuppertal: Rolf
para a ação de Deus: salvar a humanidade. Assim, tam- Brockhaus, 1972, p. 47.
bém o seu Filho foi enviado ao mundo apenas com este
objetivo: salvar a humanidade. Por isso, missão é Deus
em atividade, é obra de Deus.
O derradeiro mistério da missão, do qual ela ema-
na e do qual vive é: Deus envia seu Filho, Pai e
Filho enviam o Espírito. ... Esse processo do envio
intradivino é de eminente importância para a
missão e o serviço da Igreja. Sua missão está pre-
figurada na missão divina, seu serviço está prees-
tabelecido pelo serviço divino, o sentido e conteúdo
do trabalho estão determinados a partir da missio
Dei.73

Portanto, toda revelação de Deus em sua missio


acontece sempre em benefício da humanidade. A mis-
são da Igreja não é nada mais do que a continuação da
atividade salvífica de Deus através do anúncio daquilo
que ele fez pela humanidade. Esta atividade salvífica de
Deus, como é oferecida na missio Dei, seu relaciona-
mento com o mundo, seu agir com os homens, é des-
crita na Escritura pela palavra “enviar”. Deus envia a fim
de salvar os homens.74
Através deste envio Deus constrói uma ponte e as-

72. STOTT, John R.W. Gesandt wie Christus - Grundfragen christli-


cher Mission und Evangelisation. Gerd Rumler, trad.Wuppertal:
R. Brockhaus, 1976, p. 18.
73. VICEDOM, Georg F. A missão como Obra de Deus: Introdução
a uma teologia da missão. Ilson Kayser, trad. São Leopoldo:
Sinodal, 1996, p. 17.
74. Ibid., p. 18.

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Missão

Escrituras”.77 A missão objetiva salvar, trazendo à fé pelo teste-


Esta proclamação acontece pelo batismo e ensi- munho da palavra, pela qual o Espírito Santo age. A
no (Mt 28.18-20), pela pregação do evangelho (Mc palavra é o único meio da missão. A proclamação é de-
16.15), pela pregação de arrependimento para remis- finida por Paulo como a “palavra da reconciliação” (2
são de pecados (Lc 24.47), pela absolvição dos pecados Co 5.18-19), o testemunho “do evangelho da graça de
( Jo 20.23), pelo ser testemunha de Cristo em todo o Deus” (At 20.24).79
mundo (Lc 24.48; At 1.8), pelo anunciar do evangelho Por isso, o Espírito Santo é o impulso para a mis-
(1 Co 15.1-11; 2 Co 5.18-6.2). são e é aquele que age para que a missão seja levada a
A forma da missão é com certeza a pregação... O efeito. Os apóstolos iniciaram sua obra após receberem
caráter da missão é testemunho, martírio. Não é o Espírito Santo, no dia de Pentecostes, e assim foram
ação. Também não é revolução, mas testemunho. levados à pregação, ao estabelecimento da primeira
Isto significa que o caráter da missão é dirigir-se congregação e à missão. Aonde iam eram guiados pelo
com o destemido testemunho da verdade à consci- Espírito, e quando apresentavam sua mensagem, o Es-
ência dos homens.78 pírito Santo estava com eles.80
A missão é obra de Deus. É o Deus Triúno — Pai,
77. GRAHAM, Billy et al. O Congresso de Lausanne - A Missão da Filho e Espírito Santo — que está em ação na missão.
Igreja no Mundo de Hoje. José Gabriel Said, trad. São Paulo/ “Missão é a realidade de Deus neste mundo.”81
Belo Horizonte: ABU/Visão Mundial, 1982, p. 241. (Doravante
citado como LAUSANNE). E esta ação e realidade de Deus acontecem entre a
78. BEYERHAUS, p. 47,51. ascensão e a segunda vinda de Jesus. “Missio é agora a
atividade do Senhor exaltado entre sua ascensão e seu
volta”.82 Esse é o significado da missão “e será pregado
este evangelho do reino por todo mundo, para teste-
munho a todas as nações. Então virá o fim” (Mt 24.14).
“O significado da missão mundial como pregação é a
preparação da chegada do Senhor”.83
Aqui está o sentido escatológico da missão. Missão
não é apenas proclamação para encher Igrejas, para au-
mentar estatísticas denominacionais, para satisfazer o
ego de algum missionário bem-sucedido. Missão é pre-
parar o mundo para a volta de Cristo. É semear a boa
semente do evangelho do reino para que muitos, cren-
do, sejam salvos naquele dia. Se este aspecto escatoló-
gico é retirado, a missão perde seu objetivo, seu propó-
sito, seu alvo — a salvação. Foi para esse fim que Deus
enviou seu Filho, que o Filho enviou o seu Espírito e
os discípulos e a Igreja. Pois Deus “deseja que todos os
homens sejam salvos... Porquanto há um só Mediador
entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem. O qual a
si mesmo se deu em resgate por todos: testemunho que
se deve prestar em tempos oportunos. (1 Tm 2.4-6).
Deus é um Deus de missão. Ele quer a missão. Ele
ordena a missão. Ele exige a missão. Ele tornou a
missão possível através de seu Filho. Ele tornou a
79.VICEDOM, p. 83.
80. Ibid., p. 45-46.
81. FREYTAG, Walter. Reden und Aufsätze. München: Chr. Kaiser,
1961, v. 2, p. 219.
82.VICEDOM, p. 38.
83. BEYERHAUS, p. 49.

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Missão

missão real enviando o Espírito Santo. O argu- clusiva de Deus” com um objetivo definido — “a fim de
mento supremo para a missão... é o próprio Cristo proclamar as virtudes daquele que a chamou das trevas
e o que Ele revela e significa.84 para a sua maravilhosa luz” (1Pe 2.9). “A missão surge
da constituição, caráter, chamado e desígnios próprios
É na própria essência de Deus que a base mais pro- da Igreja”.90
funda do empreendimento missionário pode ser “Não existe nenhuma outra Igreja senão a Igreja en-
achada. Não podemos pensar em Deus a não ser viada ao mundo e não há outra missão a não ser a da
em termos que tornam necessária a idéia missio- Igreja de Cristo”.91 Por isso, o trabalho da missão não
nária.85 pode ser separado da obra da Igreja. “Todo serviço da
Igreja só tem sentido se levar à missão e nisso encontrar
seu objetivo último.”92
3.2. A Igreja Missionária A missão, e com ela a Igreja, são obra do próprio
A própria Igreja é resultado da missio Dei. O envio Deus. Ambas são tão-somente instrumentos de
que Deus realizou em Jesus Cristo e que continua sua Deus, através dos quais Deus promove sua mis-
atividade da época dos apóstolos até o dia de hoje levou são. Somente se a Igreja cumpre, em obediência,
à formação da Igreja. Se Deus não tivesse enviado seu a intenção missionária dele, ela pode também fa-
Filho, não haveria Igreja nem missão. Assim, a própria lar de sua missão, porque esta então está
Igreja é a maior prova de que o evangelho deve ser pro- acolhida na missio Dei. ... Portanto,
clamado aos pagãos. A Igreja realiza a obra da missão não cabe à Igreja decidir se ela
não porque tem o evangelho, mas tem o evangelho quer fazer missão, mas ela só
para que ele seja anunciado aos pagãos. “Somos Igre- pode decidir se quer ser Igre-
ja porque Deus quis a missão gentílica.”86 ja.93
Deus compadeceu-se dos homens. Ele quer salvá-
-los da condenação eterna. Por isso ele enviou o seu A obra missionária é, assim,
Filho, que trouxe a salvação. Pela fé a congregação não somente uma das atividades
toma parte neste envio. Ela é colocada no mundo da Igreja, mas o critério de todas as
para propiciar a salvação da humanidade e estar a suas atividades, pois reflete de modo
serviço do mundo.87 singular a própria essência da Igreja e do ministério da
reconciliação que lhe foi confiado. A Igreja foi chama-
A atitude da Igreja com relação ao mundo é deter- da e enviada por Deus ao mundo para chamar e enviar
minada pelo envio. Ela é a portadora da mensagem e é outras pessoas. “É exatamente pelo sair de si mesma
colocada no mundo e enviada ao mundo para procla- que a Igreja é ela mesma e volta a si mesma”.94
mar a palavra de Deus a este mundo perdido e assim Os sinais visíveis pelos quais se pode reconhecer a
reunir aqueles que ouvem a palavra e a aceitam em uma Igreja, a palavra e os sacramentos do batismo e da san-
congregação, a comunhão dos santos, o povo de Deus ta ceia, dados por Deus para a salvação dos homens,
na terra.88 são ao mesmo tempo o conteúdo do testemunho dos
A obra missionária é como um par de sandálias salvos. Por isso, palavra e sacramentos são de grande
dado à Igreja para que esta se ponha a caminho e importância na obra missionária.
continue avançando para tornar conhecido o mis- Faz parte do mandato missionário de Cristo que os
tério do Evangelho (Ef 6.19).89 discípulos, tendo ido, fizessem discípulos batizando e
ensinando. Pelo batismo a Igreja anuncia o perdão dos
A Igreja é, como diz o apóstolo Pedro, “raça eleita, pecados e proclama o Salvador ao mundo. Também
sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade ex- oferece, pelo batismo, a nova vida que é fruto da fé no
84. PETERS, George W., p. 346-347. Salvador. E, para nutrir e fortalecer esta nova vida cria-
85. SPEER, R. E. apud PETERS, George W., p. 347-348.
86.VICEDOM, p. 62. 90. PETERS, George W., p. 200.
87. _____. Die Missionarische Dimension der Gemeinde. Berlin: 91. BLAUW, p. 122. (Grifo do autor).
Lutherisches Verlaghaus, 1963, p. 14. 92.VICEDOM, A Missão como Obra de Deus, p. 15.
88. _____, A Missão como Obra de Deus, p. 75. 93. Ibid., p. 16. (Grifos do autor).
89. BLAUW, p. 126. (Grifo do autor). 94. BLAUW, p. 123.

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da pelo batismo, Cristo deixou à sua Igreja a santa ceia. em trevas, sem Deus e sem misericórdia, há de durar a
Pela santa ceia a Igreja sempre de novo torna-se uma tarefa missionária da Igreja Cristã.”99
Igreja que confessa seu Salvador perante o mundo.95 Em resumo, são as seguintes as pressuposições teo-
Estes meios missionários e dons de Deus — palavra lógicas da missão, elaboradas pela Comissão de Teolo-
e sacramentos — diferenciam a Igreja no ambiente em gia e Relações Eclesiais da Igreja Luterana - Sínodo de
que ela vive. Georg Vicedom comenta, a respeito disto: Missouri:
É um mistério o fato de, através deles, a Igreja in- 1. A missão da Igreja é fazer discípulos de todas as
fluenciar de modo mais incisivo seu ambiente jus- nações.
tamente quando ela mesma nada mais quer ser do 2. A missão da Igreja pressupõe que a Bíblia é a ins-
que uma comunidade do Senhor surgida através pirada e inerrante palavra de Deus.
dos meios da missão. Quanto mais deseja ser isso 3. A missão da Igreja pressupõe a total corrupção da
e somente isso, tanto maior sua influência sobre o totalidade da raça humana.
mundo. Através de seu testemunho, os povos vão 4. A missão da Igreja pressupõe o eterno plano de
sendo cristianizados aos poucos.96 salvação de Deus pela fé em Cristo.
5. A missão da Igreja pressupõe que a Igreja tenha
O Senhor Deus reuniu os cristãos em sua Igreja e sido instituída por Deus.
os mantém em seu serviço pela palavra e pelos sacra- 6. A missão da Igreja pressupõe que conversão é ex-
mentos. Assim, a Igreja se torna portadora da revelação clusivamente obra do Espírito Santo.
divina no mundo. Ela possui algo que outros não têm. 7. A missão da Igreja pressupõe a necessidade e cen-
Ela conhece a vontade de seu Senhor, que é a salvação tralidade dos meios da graça (palavra e sacramentos).
da humanidade. Esta Igreja recebeu pelo batismo a au- 8. A missão da Igreja pressupõe a distinção entre o
torização e o privilégio de testemunhar dos feitos ma- sacerdócio dos crentes e o ofício pastoral.
ravilhosos de Deus em Cristo, para que o mundo creia 9. A missão da Igreja pressupõe que Deus dá aos
e seja salvo. E Deus inclusive lhe dá os dons para o de- cristãos a graça de servi-lo em suas variadas vocações.
sempenho desta tarefa.97 10. A missão da Igreja pressupõe que Deus motiva
E a única motivação da Igreja para o desempenho seu povo a realizá-la, não pela pressão e com ameaças da
de sua natureza missionária é o próprio amor de Cristo, lei, mas pelas promessas do evangelho.100
que “amou a Igreja, e a si mesmo se entregou por ela,
para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da 3.3. Desafios atuais à Igreja Missionária
lavagem de água pela palavra, para a apresentar a si mes-
mo Igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa Há uma série de desafios que confrontam a Igreja
semelhante, porém santa e sem defeito” (Ef 5.25-27). missionária nos dias atuais. Um destes desafios é dei-
Esta Igreja amada pelo seu Senhor e Salvador tem um xar de ser uma Igreja nos moldes vétero-testamentários,
relacionamento tridirecional: para cima, com Deus, esperando sempre que as pessoas venham até à Igreja,
em adoração e louvor; para dentro, consigo mesma, em em vez de, motivada pelo amor de Deus em Cristo, ir
edificação, purificação, educação e disciplina; e para ao seu encontro, levando-lhes o evangelho da salvação,
fora, ao mundo, em evangelização e serviço.98 onde estiverem. Sobre isto, há a famosa frase de S. Vila:
O Senhor da missão também deixou sua Igreja cons- “Satanás soube traduzir a palavra ‘Ide’ por ‘Ficai aqui e
ciente de que o mundo iria contestar seu direito de exis- discuti’.”101
tir e de fazer missão, chegando a ponto de persegui-la e Mas aquilo de que nos ressentimos é o fato de sem-
tentar destruí-la. A Igreja seria “peregrina e forasteira” pre pensarmos somente em construir, em conser-
neste mundo (1 Pe 2.11), mas teria a presença constan- var, em mostrar tudo aquilo que possuímos. Sem-
te de seu Salvador, conforme sua promessa, “todos os pre viemos apenas “de onde” e nunca vamos “para
dias, até a consumação do século” (Mt 28.20). 99. BLAUW, p. 136.
Por isso, “enquanto houver neste mundo homens 100. EVANGELISM AND CHURCH GROWTH. A Report of the
Commission on Theology and Church Relations of the Luthe-
95.VICEDOM, A Missão como Obra de Deus, p. 88-91. ran Church - Missouri Synod, set. 1987, p. 8-24.
96. Ibid., p. 91. 101. VILA, S. apud LEHENBAUER, Oscar. Um Chamado à Reno-
97. Ibid., p. 93. vação no Luteranismo. Mensageiro Luterano, Porto Alegre: n. 6,
98. PETERS, George W., p. 209. jun. 1988, p. 16.

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onde”. E este “para onde” chama-se plano de Deus Esta é também a opinião de Georg F. Vicedom,
e é para todos.102 quando fala sobre a dimensão missionária da congre-
gação cristã, pois assim como ela foi escolhida para tes-
É preciso que a Igreja viva descentralizadamente, temunhar e servir, também recebeu os dons necessários
procurando o seu centro não em torno de si mesma, para este testemunho e serviço — a presença do Espí-
mas fora, voltando-se para o mundo e sendo uma Igreja rito Santo.106
para os outros. Como comenta John R. W. Stott: “So- Neste aspecto, a Igreja Evangélica Luterana do Brasil
mos com freqüência a ‘Igreja da espera’, onde simples- mostrou sua compreensão desse desafio e durante anos
mente se aguarda a vinda das pessoas. Devemos subs- tem oferecido lado a lado o evangelho da salvação e o
tituir nossas ‘estruturas-de-vir’ por ‘estruturas-de-ir’.”103 auxílio às necessidades do homem. Assim, foram cria-
Deste modo, a Igreja estará efetivamente realizado a dos os Centros Integrados de Missão, o Centro Edu-
missão centrífuga, a ida às nações. cacional para Deficientes Auditivos, o Instituto Santís-
Outro desafio à Igreja atual é a mudança do concei- sima Trindade de Moreira e o Lar Ebenézer em Porto
to de missão, que é vista hoje como um instrumento Alegre, bem como diversos empreendimentos em nível
de ação social e libertação, na busca de mudanças nas congregacional, para citar apenas alguns exemplos.
estruturas sociais.104 Dessa forma, no Brasil, missão é Além disso, as Áreas de Missão e de Ação Social
libertação da opressão, reconstrução de um novo mun- têm trabalhado de forma integrada, deixando claro que
do; a conversão é vista como mudança de interesses; a faz parte da ação missionária da Igreja o atendimento
salvação como melhoria das condições do mundo; a às necessidades físicas e materiais do ser humano, que
liberação como criação de um novo homem; a Igreja missão e diaconia devem andar lado a lado.
como instrumento para criar este novo mundo. Esta Logicamente, há aqueles que chegam ao extremo,
nova conceituação esquece de reafirmar os ensinamen- achando que missão é somente assistência social, aten-
tos sobre o pecado pessoal, reconciliação com Deus, ção à situação do ser humano e auxílio aos problemas
revelação, vida eterna e fé em Jesus Cristo. que ele enfrenta na sociedade moderna. Assim age
Outra dimensão da missão da Igreja é evidencia- muitas vezes a teologia da libertação, que converte a
da em seu caráter diacônico. Sem dúvida, faz parte da missão em mero atendimento às necessidades terre-
missão da Igreja o seu caráter diacônico, de serviço à nas do homem e numa luta contra as assim cha-
humanidade. A salvação oferecida por Cristo sempre madas “estruturas do poder”. Por isso, é sempre
é total, abrangendo corpo e alma, e a missão da Igreja atual e importante o alerta de Hugh Thomson
deve acontecer sempre visando a totalidade do homem. Kerr:
Também a diaconia pode ser expressão da mis- Não somos enviados para pregar sociologia mas sal-
são, no sentido verdadeiro, quando ela apresenta vação; não economia mas evangelismo; não refor-
o amor de Deus, como ele veio a nós através de ma mas redenção; não cultura mas conversão; não
Cristo. Isto significa que, se ela indica que aquilo progresso mas perdão; não uma nova ordem social
que faz é feito de acordo com a vontade de Cristo, mas um novo nascimento; não revolução mas re-
motivado por ele, com o objetivo de tornar real sua generação; não renovação mas reavivamento; não
vontade salvífica.105 ressuscitamento mas ressurreição; não uma nova
organização mas uma nova criação; não democra-
102. FREYTAG, p. 221.
103. STOTT, John R. W. A Base Bíblica da Evangelização. In: LAU- cia mas o evangelho; não civilização mas Cristo;
SANNE, p. 38. somos embaixadores e não diplomatas.107
104. COMBLIN, José. Medellín: Vinte Anos Depois. Revista Eclesi-
ástica Brasileira, Petrópolis: n. 192, dez. 1988, p. 807. SCHE- Este é um grande desafio à Igreja missionária. Man-
RER, James A. ...that the Gospel may be sincerely preached
throughout the world. LWF Report, Stuttgart: n. 11/12, nov. ter a tensão necessária entre a proclamação do evange-
1982, p. 93. GUTIÉRREZ, Gustavo. The Hope of Liberation. lho e o auxílio às necessidades físicas das pessoas é de
ANDERSON, Gerald H. e STRANSKI, Thomas R. Third World vital importância na obra missionária. Mas a Igreja não
Theologies. In: Mission Trends. New York/Grand Rapids: Paulist
Press/Wm. B. Eerdmans, 1978, v. 3, p. 65-69. BOFF, Leonardo.
Evangelizar a partir das culturas oprimidas. Revista Eclesiásti- 106. VICEDOM, Die Missionarische Dimension der Gemeinde, p.
ca Brasileira, Petrópolis: n. 196, dez. 1989, p. 833. 32.
105. BEYERHAUS, p. 48. 107. KERR, Hugh Thomson apud PETERS, George W., p. 209.

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pode deixar de atender da forma mais proveitosa, a Igreja Cristã, a exemplo do


a essas necessidades, próprio Deus que assumiu a natureza humana para sal-
pois fazem parte var o ser humano, insere-se na cultura e sociedade das
do serviço que ela pessoas, para lhes levar a palavra de maneira relevante e,
presta a Cristo, moti- vivendo no contexto destas pessoas, auxiliá-las em suas
vada pelo seu amor (Mt necessidades espirituais, oferecendo perdão dos peca-
25.31-46). dos, vida e salvação, pelos meios da graça.
A Igreja precisa estar sempre A Igreja Evangélica Luterana do Brasil tem uma
atenta à situação em que vive o povo a grande missão neste país. Ela possui as marcas visíveis
quem está levando a palavra de Deus. Ne- que a caracterizam como Igreja de Cristo: a proclama-
cessita entender o contexto em que vivem as ção pura e fiel da palavra de Deus e a correta administra-
pessoas, e não impor sua situação de vida. É por ção dos sacramentos. Contextualizando sua mensagem
isso que a presente dissertação procura proporcionar e atuação, a IELB crescerá, não somente em números,
auxílio àqueles que querem ir ao encontro das pessoas mas principalmente no ir ao encontro das necessidades
onde elas estão, levando em consideração o contexto de seus membros.
cultural, social, físico e religioso em que vivem. É Através da ação missionária contextualizada da
necessário que a Igreja realize sua missão não IELB o Espírito Santo quer continuar a chamar e con-
assumindo uma posição de superioridade gregar seu povo neste país. “Cristo para todos”, lema da
em relação aos que estão sendo evangeliza- IELB, é manifestação desta vontade que a Igreja tem de
dos. A tarefa da Igreja é levar o evangelho às servir com fidelidade ao Senhor, relevante e contextu-
nações, estejam onde estiverem, seja qual for o alizadamente.
contexto em que vivam, agindo de acordo com os A partir de uma análise constante do contexto em
princípios da Escritura Sagrada. que vive e de sua atuação e visão missionárias, a IELB
Missão é não é mais tanto missão “de cima para saberá se inserir neste contexto e continuar contextua-
baixo”, no sentido de os portadores da mensagem lizando sua ação, sendo um instrumento útil nas mãos
serem cultural ou pelo menos civilizatoriamente do Senhor para a realização da missão de “ir por todo
superiores aos destinatários. Com isto, chega ao o mundo e pregar o evangelho a toda criatura” (Mc
fim um longo período da história da missão. 16.15).
Desde a época de Constantino a expansão do Esta é a missão de Deus à qual somos chamados a
cristianismo sempre teve, com raras exceções, esta tomar parte. Ser Igreja missionária é privilégio. Con-
queda de cima para baixo. Se quisermos nos re- textualizar a mensagem e ação missionária também é
encontrar com uma compreensão da missão e com privilégio, antes que responsabilidade. Que o amor de
uma fundamentação que permaneçam mesmo Deus, manifesto em seu Filho Jesus Cristo, motive e ca-
diante de uma situação diferente, então precisa- pacite a Igreja Cristã e, de forma especial a IELB, nesta
mos voltar para bem antes de Constantino, preci- importante e proveitosa tarefa da contextualização.
samos voltar às fontes.108 A Igreja não é mundo e não é do mundo. Mas ela
precisa estar no mundo, precisa falar ao mundo, precisa
escrever, com letras fortes e compreensíveis, no contex-
Conclusão to do mundo, a boa nova do perdão e da salvação, para
que o mundo creia naquele que “foi morto e com o seu
A Igreja Cristã é e deve continuar sendo missionária sangue comprou para Deus os que procedem de toda
em sua natureza, essência e atuação. Recebeu do Se- tribo, língua, povo e nação” (Ap 5.9), pois Cristo é para
nhor Deus a comissão de tornar efetiva a missio Dei, todos.
que consiste na proclamação da sua palavra salvífica,
sua lei e evangelho, para arrependimento, perdão dos Rev. Rony Ricardo Marquardt, pastor da Igreja Evangélica Luterana do Brasil
pecados e fé. Extraído da obra: A contextualização na ação missionária da Igreja Cristã. Canoas/
Por isso, com o objetivo de levar a efeito esta missão Porto Alegre, ULBRA/Concórdia, 2005.
Produzida como dissertação para obtenção do grau de Mestre em Teologia no
Seminário Concórdia de São Leopoldo, RS, em 1991.
108. FREYTAG, p. 212.

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Missão e Mídia Rev. Dieter Joel Jagnow

Parte 1 - Levantamento histórico geral


O uso dos meios de comunica-
ção está previsto no Estatuto
e no Regimento da Igreja Evangéli-
Visão geral do uso
dos veículos de
pria Igreja, que aconteceu em junho de
1904.
No ano de 1917 começou a ser edi-
ca Luterana do Brasil (Ielb). No ca- comunicação tado o primeiro periódico em língua
portuguesa — o Mensageiro Christão
pítulo II do Estatuto, Artigo 5º, e),
Com invento dos tipos móveis (que no ano seguinte mudou de nome
é dito que a Igreja, para cumprir sua
por Gutenberg, em 1447, novas e para Mensageiro Luterano). Esta revis-
finalidade, “utilizará os meios de co- ta ainda é editada, constituindo-se no
grandes oportunidades surgiram
municação”. No Regimento, onde se principal órgão impresso da IELB, com
para uma rápida multiplicação da
fala sobre a Área de Comunicação, tiragem mensal de cerca de 9 mil exem-
palavra escrita. Desde logo, o lutera-
lê-se que a Igreja tem como objeti- plares.
nismo soube utilizar-se deste meio
vo de exercer um ministério cristão Na década de 1950, a IELB possuía,
para comunicar o evangelho. além do Kirchenblatt, as seguintes pu-
formador e evangelizador e que este
Lutero foi o grande expoente blicações periódicas: Mensageiro Lute-
acontecerá “através dos diferentes
dos primórdios da imprensa massi- rano, Igreja Luterana, Lar Cristão, O
veículos de comunicação” (Capítu-
va. Compreendendo a importância Jovem Luterano, O Pequeno Luterano e
lo V, Artigo 69). Neste mesmo arti-
desde meio, julgava que a imprensa Luther-Kalender. Destas, existem hoje
go, é dito que a Igreja deverá:
—“Divulgar os programas e a men- era o último milagre de Deus para apenas as três primeiras, sendo que
propagação ainda mais rápida do não foram criados periódicos novos
sagem da IELB pelos meios de comuni-
Evangelho. A Reforma liderada para atender a esta segmentação. Uma
cação social” (IV);
por Lutero aconteceu não tanto do publicação infantil é mensalmente en-
—“Alertar a opinião pública quan-
púlpito e da cátedra, mas através da cartada no Mensageiro Luterano, com o
to a conteúdos dos meios de comunica-
nome de Mensageiro das Crianças.2
ção que não condizem com a verdade” imprensa.
O rádio surgiu no fim do século 19
(V); Tradicionalmente, a imprensa e chegou a Brasil em 1922. Em 25 de
—“Praticar um jornalismo dinâmi- tem sido o meio de comunicação maio de 1929, na Rádio Clube do Bra-
co, ético, cristão, luterano, através de de massa mais utilizado pela IELB, sil, Rio de Janeiro, o pastor Rodolpho
todos os meios de comunicação dispo- em forma de livros, revistas, jornais, F. Hasse utilizou o veículo para trans-
níveis (VI);
folhetos e vários outros formatos. mitir um culto — o que aconteceu ain-
“Estimular e apoiar o uso dos meios
de comunicação nas congregações e en- Mesmo com a chegada do rádio ao da outras vezes a partir de então. Em 14
Brasil, foi a mídia mais usada, mas de março de 1937, foi irradiado, pela
tidades.” (X)1
Como se nota, o uso dos meios não tanto para o evangelismo, e sim 2 Para detalhes sobre uso da imprensa
de comunicação é previsão estatutá- para a informação e formação dos pela IELB ao longo da sua história, ver
ria e regimental na IELB. Mas como próprios fiéis. REHFELDT, Mário L. Um grão de
No caso da IELB, um indicativo mostarda — A história da Igreja
será a realidade? É o que se preten- Evangélica Luterana do Brasil.
claro desta preocupação está no fato de
de responder neste estudo (e no da Traduzido por Dieter Joel Jagnow. Porto
que a sua primeira publicação regular, Alegre: Concórdia, 2004. v. 1; BUSS,
próxima edição esta revista). o Evangelish-Lutherisches Kirchenblatt Paulo. Um grão de mostarda —
1 IGREJA EVANGÉLICA LUTERANA fuer Suedamerica [ Jornal da Igreja A história da Igreja Evangélica
DO BRASIL. Estatuto, Regimento, Evangélica Luterana para a América Luterana do Brasil. Porto Alegre:
Código de Ética Pastoral, Regras Concórdia, 2006. v. 2; WARTH, Carlos
do Sul] iniciou em dezembro de 1903
Plenárias, Administração. Porto H.Crônicas da Igreja. Porto Alegre:
Alegre, edição atualizada de 2006. — portanto antes da fundação da pró- Concórdia, 1979.

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Missão e Mídia

Rádio Farroupilha, em Porto Alegre, iniciativas se deveu à Igreja como gada pelos cristãos na difusão de to-
RS, o primeiro “sermão radiofônico”. um todo, mas a determinados seg- das as gentes.” Finalmente, a nota faz
Todavia, a Igreja começou a atuar mentos dela. um prenúncio indireto para o uso da
organizadamente no rádio apenas em A década de 1990 marcou um televisão pela IELB: “Em anos não re-
1947, através da Hora Luterana, a Voz motos... poderá se tornar também em
período de declínio acentuado. To-
da Cruz.3 A organização surgiu com o nosso país... na anunciação da Palavra
davia, no final dela iniciou-se um
objetivo de produzir programas para de Deus”.4
serem reproduzidos em emissoras bra- processo de renovação de interesse, De acordo com Paulo Buss, os pri-
sileiras. especialmente pelo tema comunica- meiros registros do interesse da Igreja
A ruptura entre as organizações re- ção, cujo auge se deu em 2006. em usar os veículos aparecem em 1960.5
ligiosas e os meios de comunicação de Neste ano, a Convenção Nacional da
massa vem diminuindo, como ficou Décadas de IELB determinou que o Departamen-
evidenciado no Capítulo 2. Nos últi- 1940 a 1960
mos anos, não só a televisão, mas tam- 4 A HORA LUTERANA e a televisão.
bém a internet se tornou um meio de Ao que tudo indica, a primeira re- Mensageiro Luterano, Rio de
expressão da religiosidade das pessoas. ferência de eventual uso da televisão Janeiro, n. 6, ano 31, p. 43, 44, jun.
Rapidamente, elas vêm construindo 1948. O que se percebe através da
pela IELB é de junho de 1948. Uma publicação da nota é que mesmo antes
sites, portais e emissoras virtuais de nota da revista Mensageiro Luterano, do início das transmissões de televisão
televisão e rádio, além de chats, blogs, órgão oficial da Igreja, dava conta de no Brasil, a IELB já estava interessada
fóruns, etc. A IELB colocou a primeira que, em 1 de janeiro daquele ano, a no assunto, tendo como ponto de
versão do seu site na internet em feve- organização Hora Luterana (da Igreja referência a Igreja Luterana — Sínodo
reiro de 1997. Dezenas de organizações de Missouri, dos Estados Unidos. (A
Luterana — Sínodo de Missouri), dos mesma revista publicou outra nota do
e congregações da Igreja mantém sites. Estados Unidos, havia transmitido seu uso da televisão por luteranos nos EUA
Todavia, o investimento neste veículo primeiro programa pela televisão. Pa- em maio de 1949, p. 39.)
ainda pode ser considerado tímido. ralelamente a esta transmissão, foi rea- 5 Deve se entender a expressão de Buss
lizado em uma congregação “um culto como sendo referência ao primeiro
registro de uma ação concreta para uso
Visão histórica geral no por televisão”, considerado o “primeiro da televisão, haja vista a nota anterior.
uso da televisão culto desta espécie realizado na
América.” Quase ao final
A televisão chegou ao Brasil em da nota, é dito que
1950. Somente cerca de 25 anos de- “esta maravilho-
sa invenção
pois a IELB começou a utilizar este
deve ser
veículo de forma regular. empre-
A década de 1980 marcou o
apogeu e a decadência da Igreja uso
da TV como veículo de evangeliza-
ção. Neste período, a IELB chegou
a ter oito programas de veiculação
regular. Hoje, possui um. Dado
significativo é que nenhuma destas

3 Posteriormente, o nome mudou para


Cristo Para Todas as Nações, e, por fim,
novamente Hora Luterana.

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Missão e Mídia

to de Educação Paroquial tivesse como “Pela TV o Evangelho entra em lares vestir em televisão é revelada através
uma das suas atribuições o estudo da nunca imaginados”; “A televisão... é de uma série de indicativos situados
possibilidade de produzir programas um instrumento valioso para a missão”. no ano de 1976, especialmente.
religiosos para a TV. Outro registro, de Hilmar também diz que num país onde Para fins históricos, este ano pode
1962, indica que a Igreja esperava ini- os evangélicos são absoluta minoria, ra-
ser apontado como o início de uma
ciar, em breve, programas religiosos de dio e televisão são praticamente os úni-
nova era na Igreja no que se refere à
televisão em algumas capitais de esta- cos meios de comunicação com o povo.
dos brasileiros. Todavia, conclui Buss, Ele cita o exemplo do Japão: 30% dos comunicação e à televisão.
“o acesso à televisão continuava um so- membros de igrejas luteranas do país O primeiro indicativo é a pre-
nho não realizado no final da década.”6 tiveram seu primeiro contato com o sença do assunto “meios de comuni-
Em 1969, a Igreja fez publicar uma cristianismo através do rádio e da TV. cação de massa” na 45ª Convenção
matéria onde novamente o assunto é Em razão disto, diz, é de se estranhar Nacional, realizada nos dias 21 a 26
tratado. Com o título Vamos à T.V. [sic], a ausência marcante de programas de janeiro, em São Leopoldo, RS.
o artigo inicia dizendo que há muito a das igrejas no Brasil, particularmente Durante o evento foram realizadas
IELB vem sonhando com um progra- as igrejas protestantes. Por fim, o au- dez oficinas sobre diferentes
ma de TV, mas que até o momento tor sugere um caminho a ser trilhado: temas. Uma delas teve
nada havia sido conseguido. Novamen- “reunião de todas as forças disponíveis
como tema Os
te é citado o exemplo dos luteranos dos para ao patrocínio, a compra de espaço
meios de comu-
Estados Unidos, que mantinham diver- na TV, censura e dublagem dos filmes.
sos programas. Em seguida, o texto traz O evangelho nos deve ser tão caro que nicação social
uma informação que ainda não havia nada nos seja caro demais para a sua e a Igreja.
aparecido em registro anterior: de que transmissão aos homens.”8 O segun-
há anos a IELB tinha o interesse em do momento
se localiza
transmitir no Brasil um dos programas Década de 1970 em setembro
de maior audiência nos EUA, o Esta é
a Vida. É dito que um pastor da Igreja deste ano,
A década de 1970 marca o início
havia assumido a direção da Hora Lu- quando foi
de um processo regular no uso da te- publicada uma
terana Internacional e que ele estava levisão pela IELB. Historicamente,
“convicto de que em muito breve tere- extensa reporta-
é possível dizer que o ponto de par- gem sobre a Hora
mos este programa na TV brasileira.”7
tida foi uma reorganização adminis- Luterana Inter-
Após estas notas introdutórias, o
texto apresenta um artigo do pastor trativa da Igreja. Ela iniciou em ja- nacional,
Hilmar Kannenber, da Igreja Evangéli- neiro de 1972, em uma Convenção dos Esta-
ca de Confissão Luterana no Brasil (IE- Nacional. Todos os departamentos dos Unidos,
CLB). A transcrição do artigo no Men- e comissões até então existentes responsável
sageiro Luterano tem um claro cunho deram lugar a quatro departamen- pelo então
de incentivo e desafio para a IELB: a tos, cada qual dirigido por um se- maior pro-
importância e a necessidade de usar a grama de rá-
cretário executivo. Inicialmente, os
TV como veículo de evangelização no dio de uma
departamentos eram estes: Missão, organização
Brasil. O artigo faz afirmações como Educação Paroquial, Educação Mé-
estas: ”Ninguém deixa de ver TV, nem não governamental.9 A matéria enfoca
dia e Superior, e Finanças. Na Con- os investimentos feitos pela organiza-
mesmo os seus maiores críticos”; “A
venção Extraordinária de 1976 foi ção no rádio e na televisão.
TV atinge todas as camadas sociais”;
criado mais um departamento: Co- A comunicação pelo rádio e pela te-
6 BUSS, op.cit., p. 87. municação. Foi a partir da criação levisão também teve novamente amplo
7 VAMOS à T.V. Mensageiro
deste Departamento que o investi- destaque no Mensageiro Luterano em
Luterano, Porto Alegre, n. 11, ano 52,
p. 16, nov. 1969. Esta série estreou nos mento em comunicação na Igreja dezembro. Nesta edição foi publicada
EUA em 1952 e ficou no ar até o final — também em televisão — ganhou na revista uma extensa entrevista com
da década de 1980. Originalmente
um significativo impulso, tendo seu Oswald Hoffmann, orador em língua
era produzida pela Igreja Luterana inglesa da Hora Luterana Internacio-
— Sínodo de Missouri e distribuída auge em meados da década de 1980.
International Lutheran Laymen’s Esta tendência na IELB de in- 9 Na época, o programa era transmitido
League (Liga Internacional de Leigos por 1.800 emissoras de 125 países e
Luteranos). 8 Idem. em 50 línguas diferentes.

24 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Missão e Mídia

nal, além de conferencista em cruza- ordem missionária para os seus segui- Outra marca da segunda metade
das evangélicas ao redor do mundo. dores (cf. Capítulo 1), ele “certamente da década foi o empenho do primei-
Em março, Hoffmann havia estado no também quis referir-se ao uso dos mo- ro secretário executivo eleito para
Brasil e realizado cruzadas em várias dernos meios de comunicação, qual seja o Departamento de Comunicação,
cidades brasileiras. Entre uma série de a Imprensa, o Rádio e a Televisão.”11
pastor Leopoldo Heimann, no sen-
outros assuntos, ele comenta sobre a No anuário também foi é publica-
tido de desenvolver uma série de
diferença entre a comunicação pelo rá- da o que parece ser a primeira reflexão
dio e a pela televisão. Diz que o rádio crítica impressa na IELB sobre o que é ações em comunicação. Uma delas
é um meio de som e, por isso, a produ- denominado “mass-média”, ou seja, os foi o início de uma série de Con-
ção precisa ser “praticamente perfeita”; grandes meios de comunicação. São ci- gressos Luteranos de Comunicação.
caso contrário, as pessoas desligam. De tados: jornal, revista, livro, rádio, filme O primeiro Congresso aconteceu
outro lado, a televisão é um forte meio e televisão. O texto fala sobre a pres- nos dias 23 a 25 de maio de 1978, em
audiovisual. Daí a importância de se são que estes veículos exercem sobre a São Leopoldo, com mais de 200 parti-
utilizar imagens para acompanhar a “massa”. Por si só, os veículos são neu- cipantes. Uma justificativa para a reali-
fala. Hoffmann também diz que, en- tros, mas que podem ser utilizados para zação do evento apareceu em matéria
quanto os programas de o bem ou para o mal.. do Mensageiro Luterano da edição de
rádio custam ficar no Em seguida, o artigo avalia como abril daquele ano. É dito que a Igre-
ar por muito tempo, o cristão deve se posicionar diante dos ja deve conhecer e procurar investir
os de TV se esgotam “mass-média”. Duas atitudes básicas são nas novas formas de comunicação que
rapidamente.10 citadas. Em primeiro lugar, é necessário estão à disposição para o anúncio do
Neste mesmo escolher e controlar bem o que é lido Evangelho. Assim, o encontro tinha
ano saiu uma pu- e visto. Em segundo lugar, o cristão e como objetivo refletir sobre a “impor-
blicação (lançada a Igreja devem fazer uso correto “dos tância e necessidade de se utilizar cada
no final de 1975) maravilhosos meios de comunicação.” vez mais e melhor dos diversos veículos
que dava indícios É preciso usar o rádio e a TV para de comunicação social.”14
concretos do interes- transmitir bons programas, ou seja, que Na edição do Mensageiro Lutera-
se da Igreja em investir veiculem a Palavra de Deus. Assim, “os no em que foi publicada a reportagem
em comunicação. Trata-se meios de comunicação podem ser uma sobre o Congresso, Heimann justifi-
do anuário Lar Cristão grande bênção para a humanidade.”12 ca a realização do evento por vários
1976, que tinha como Além destas abordagens no Men- motivos. Um deles era analisar “este
título de capa Ide, sageiro Luterano e no Lar Cristão, um complexo mundo das comunicações:
comunicai... O outro indicativo é que neste ano iniciou os veículos, as mensagens, o estranho
anuário tra- o primeiro programa regular da IELB comportamento de nossa sociedade
zia cerca de na televisão: o A Hora, de Erechim, RS. massificada...” Um outro motivo era
20 textos Durante quatro ano ele permaneceu provocar o despertamento da IELB so-
abor- como o único programa da Igreja na bre a necessidade de “utilizar, cada vez
dando a TV.13 mais e melhor, estes novos púlpitos que
c o mun i c a ç ã o a ciência e a técnica colocaram à nossa
da Igreja em di- 11 WARTH, R. Pelo microfone. IN: Lar
Cristão 1976. Porto Alegre: Concórdia.
ferentes contextos (no lar, na escola, Ano XXVII, p. 59. religioso na TV —, somente algumas
na cátedra, no púlpito, etc.). Não há 12 KUCHENBECKER, H. O uso dos linhas realmente tratam do assunto em
uma referência direta ao uso da televi- meios de comunicação. IN: Lar termos de informação. É dito que “Deus
são. Todavia, onde o rádio é abordado, Cristão 1976. Porto Alegre: Concórdia. nos abriu uma grande porta e está nos
é dito que, quando Jesus Cristo deu a Ano XXVII, p. 76-78. dando uma possibilidade extraordinária
13 Este e outros programas regulares para levar a mensagem da salvação a
10 DINAMISMO e progresso na da IELB serão vistos na parte 2 deste lares, através de um programa semanal
Igreja. Mensageiro Luterano. Porto estudo (vide próxima edição da Revista na TV...” e que se tratava do primeiro
Alegre, n. 2/3, ano 59, p. 16, fev./mar. Teologia & Prática) 4. Ao que tudo na Igreja. TILP, Edgar. Erechim tem
1976; HEIMANN, Leopoldo. O maior indica, a primeira informação oficial de programa religioso na TV.
programa religioso do mundo! que havia surgido o primeiro programa Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 5,
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 9, religioso da IELB na televisão aconteceu ano 60, p. 20, maio 1977.
ano 59, p. 13-15, set. 1976; HEIMANN, somente em maio de 1977. Embora a 14 KUCHENBECKER, Horst. 46º
Leopoldo. Cristo é o Senhor. reportagem de dois terços de página Convenção Nacional da IELB.
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 12, do Mensageiro Luterano aponte para Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 4.
ano 59, p. 5-9, dez.. 1976. o fato — Erechim tem programa ano 61p. 9, abr. 1978.

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 25


Missão e Mídia

disposição...”15 diferentes veículos, como o rádio e o


Este Congresso teve como tema A jornal, mas não há informação de que
Igreja busca novos púlpitos. Foram reali- a televisão tenha sido contemplada.
zadas várias palestras por profissionais Apenas há indicação de que os congres-
de diferentes veículos, além de teóricos sistas visitaram a TV Guaíba, de Porto
da comunicação. Em uma elas, o pastor Alegre, e que “foi de proveito esse en-
Ilmar Kannenberg disse que a Igre- contro com a moderna técnica e apare-
ja deve semear o Evangelho também lhagem da comunicação eletrônica.”18
através da televisão. Para tanto, precisa Durante esta década, a Hora Lute-
usar a imaginação, criando programas rana também procurou investir em
que realmente prendam a atenção das televisão. Em dezembro de 1972,
pessoas. Para ele, o rádio e a televisão trinta emissoras da Rede Globo vei-
podem ser transformados em “verda- cularam o filme O Natal é..., produ-
deiros púlpitos”. Todavia, advertiu, “o zido nos Estados Unidos e dublado
objetivo da Igreja no uso desses meios pela Hora Luterana. No ano seguinte,
é levar o indivíduo à comunhão na o mesmo filme foi ao ar em algumas
comunidade cristã, e não formar uma emissoras da Rede Tupi.19
espécie de comunidade aérea, de uma Em meados de 1974 aparece um re-
‘igreja do ar’”.16 gistro de que a Igreja desejava transmi-
Em outra palestra, o teólogo cató- tir o Evangelho pela televisão de uma
lico Urbano Zilles enfatizou a neces- forma regular e que fazia esforço nesse
sidade da Igreja integrar os meios de sentido. Contudo, as perspectivas eram
comunicação social em sua reflexão pouco animadoras. Nesse sentido, é
teológica, pois não bastava formar téc- emblemática a afirmação de diretores
nicos. “Não se resolve o problema com da Hora Luterana: “Infelizmente na
gente diplomada nas universidades, podemos acusar grandes progressos na
tavam sendo
mas deve-se levar em conta os aspec- missão pela televisão, apesar de não ter-
feitos para fazer
tos teológicos da comunicação”, disse. mos poupado esforços neste sentido.”20
as dublagens.21
Neste sentido, Zilles criticou a Igreja Na segunda metade da década, a
Novas informações so-
Católica, considerando que ela não ha- questão da dublagem do seriado Esta
bre a série Esta é a vida aparecem
via se preparado adequadamente para o é a Vida continuava na pauta da Hora
em abril de 1978. É informado que a
uso da TV e do rádio: “A Igreja nunca Luterana. O Mensageiro Luterano de
dublagem ainda não havia sido feita
preparou homens para tal serviço; ela outubro de 1977 registra o momento
— mas que o seria “muito em breve”
se preocupou e instalar emissoras de em que um luterano norte-americano,
— e que parte do dinheiro já estava
rádio e TV, além de gráficas e editoras, representando um distrito de leigos
disponível. Depois de superada a etapa
e pôs apenas técnicos lá dentro.” Zilles dos EUA, entrega ao então presidente
da dublagem haveria um novo desafio a
também afirmou que se a comunica- da IELB, Johannes Gedrat, um cheque
ser superado: a distribuição. Também é
ção massiva não fosse acompanhada de de 5.000 dólares para a dublagem. A
dito que “se esta série de filmes tiver boa
comunicação interpessoal, tendia a ser nota também informa que uma rede
aceitação pelo público brasileiro, sem
vaga e incompleta.17 de televisão brasileira havia prometi-
dúvida alguma as atividades resultantes
O segundo Congresso aconteceu do transmitir 26 episódios da série ao
deste empreendimento serão inúmeras
no ano seguinte, nos dias 29 a 31 de longo de um ano, tão logo eles estives-
e em muito a IELB será beneficiada.”22
maio, também em São Leopoldo. Este sem prontos. O custo do projeto estava
Na edição de maio de 1978 do
teve como tema A Igreja cresce escreven- orçado em 30 mil dólares. Esforços es-
do. O evento destacou a redação para 18 GRASEL, Gerhard. A Igreja cresce 21 JUNG, Paulo Kerte. No Brasil —
escrevendo. Mensageiro Luterano, Esta é a Vida. Mensageiro Luterano,
15 HEIMANN,Leopoldo.Apresentando. Porto Alegre, n. 8, ano 62, p. 4-8, set. Porto Alegre, n. 10, ano 60, p. 18, out.
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 7, 1979. 1977.
ano 61, p. 2, jul. 1978. 19 BUSS, op. cit., p. 177. 22 WARTH, Rodolpho. Há trinta
16 GRASEL, Gerhard e PETER, Silvo R. 20 GEDRAT, Johannes eWARTH, Rodolpho. anos a Hora Luterana está
A igreja busca novos púlpitos. Hora Luterana: Trazendo transmitindo a Palavra de Deus
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 7, Cristo às nações. Mensageiro ao povo brasileiro. Mensageiro
ano 61, p. 5-12, jul. 1978. Luterano, Porto Alegre, n. 7, ano 57, p. Luterano. Porto Alegre, n. 4, ano 61, p.
17 Idem. 17, jul.1974. 27, abril 1978.

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Missão e Mídia

cinema, do livro, dos jornais, das revis- tivesse bem, o da televisão estava tendo
tas, dos cartazes.” Em seguida, o autor problemas crescentes, pois estava au-
diz que “os meios eletrônicos de massa mentando cada vez mais a dificuldade
devem estar a serviço da propagação de transmitir programas religiosos por
do evangelho” e que a Igreja precisa este veículo.
usar “todos aqueles instrumentos de Conforme visto no Capítulo 2, as
comunicação que vão mais alto e mais décadas de 1970 e 1980 foram marca-
longe.”24 das pela forte presença de tele-evange-
O crescente interesse da IELB pela listas na televisão Brasileira. O assunto
televisão também pode ser notado no foi pautado pela revista Mensageiro
aumento do número de artigos publi- Luterano de janeiro/fevereiro de 1981.
cados na revista oficial da Igreja a partir A matéria é uma crítica, especialmen-
de meados da década. Havia uma certa te, ao norte-americano Rex Humbard.
preocupação sobre o conteúdo da TV e Suas pregações são consideradas espe-
o seu efeito sobre as crianças. Por exem- táculos teatrais e de autopromoção.
plo, em outubro de 1977 foi publicada Além disso, ele é acusado de usar da
uma matéria Televisão, a nova moléstia boa fé dos evangélicos brasileiros. Por
da infância. Em abril de 1979 o assunto isso, após escrever que Humbard fizesse
foi As crianças da geração televisão. seus programas onde e como quisesse, o
autor faz um apelo: “mas que faça tudo
Mensagei-
ro Luterano
Década de 1980 isto à sua própria custa e não use e abuse
de nossa gente e dos nossos recursos.”26
é publicada De outro lado, o autor também
A década de 1980 marca o apogeu
uma entrevista critica os crentes evangélicos, que se
da presença da IELB nos meios de co-
com o recém eleito deixam levar pela “genuína danças das
municação, particularmente na TV.
Presidente da IELB, Jo- cores para impressionar os olhos, di-
Um dos primeiros registros desta fase
hannes Gedrat. Em uma das vertir e deleitar o povo, seguido sempre
foi um evento que aconteceu nos dias
perguntas foi colocada a reali- do maior milagre, real milagre e único,
2 e 3 de setembro de 1980, quando a
zação do 1º Congresso de Co- o de coletar fundos financeiros como
Hora Luterana realizou um encontro
municação que aconteceria em nunca se fez entre os evangélicos do
de colaboradores, na cidade de São
breve e a “convicção de que igre- Brasil...” Por esta razão, os crentes são
Paulo. Há registro de que os programas
ja precisa anunciar a mensagem de instados a saírem do “esclerosamento
regulares de TV da IELB que existiam
Cristo através dos veículos de massa”. espiritual” e “usar a cabeça”.27
na época (A Hora, A Voz da Cruz e
Perguntado sobre sua opinião acerca Nos últimos anos da década de
Expectativa) foram alvos de considera-
do assunto, Gedrat respondeu: “A igre- 1970 e no começo da década de 1980
ções durante o evento.25
ja deve utilizar-se de todos os veículos surgiram quatro programas de televi-
O encontro da Hora Luterana tam-
para levar aos homens a mensagem da são na IELB. Em abril de 1981, a revis-
bém revela uma dupla face da realidade
salvação em Cristo.”23 ta Mensageiro Luterano publicou uma
do uso religioso da TV por luteranos
Em dezembro deste mesmo ano, extensa reportagem sobre eles.
dos Estados Unidos e do Brasil. Este-
um editorial da revista Mensageiro Lu-
ve presente no encontro um represen- 26 EGG, Carlos René. A dança das
terano insistia na necessidade da Igreja
tante da Igreja Luterana — Sínodo de cores — Rex Humbard no Brasil.
sair de si mesma e divulgar ao grande Mensageiro Luterano, Porto Alegre,
Missouri, dos EUA. Ele falou sobre o
público a mensagem de Cristo. O texto n. 1, ano 64, jan./fev. 1981, p. 16,17.
trabalho desta Igreja no rádio e na te-
dizia que, caso Cristo desafiasse a sua Este artigo havia sido originalmente
levisão. Embora o trabalho no rádio es- publicado dois anos antes no jornal
Igreja hoje para a evangelização, diria
algo como: “proclamai-o através de O Estandarte, da Igreja Presbiteriana
24 HEIMANN, Leopoldo. Proclamar Independente do Brasil.
todos os veículos de comunicação so- dos telhados. Mensageiro Luterano, 27 Idem. O assunto voltou às páginas do
cial... através do rádio, da televisão, do Porto Alegre, n. 12, ano 60, p. 3, dez. Mensageiro em novembro de 1985
1977. (p. 32), onde é citada uma matéria
23 HEIMANN, Leopoldo. “Aceito 25 SEIBERT, Erni W. A Hora Luterana publicada no jornal Folha de São Paulo
minha eleição como um continua levando Cristo para as (24/02/1985) sobre o fenômeno
chamado especial de Deus”. nações. Mensageiro Luterano, Porto da Igreja Eletrônica e as cifras
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 5, Alegre, n. 11, ano 63, p. 11,12, nov. astronômicas envolvidas e o esquema
ano 61, p. 7, maio 1978. 1980. de marketing utilizado.

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Missão e Mídia

Na abertura da matéria são mos- programa de televisão, pois a seara está O pastor Nikolai Neumann fa-
trados rapidamente os investimentos madura e não há tempo a perder.” 29 lou sobre a manutenção de progra-
feitos pela Igreja nos meios de comu- Ainda em 1981, foi publicada no mas religiosos, particularmente no
nicação, como a imprensa e o rádio. Mensageiro Luterano uma reportagem rádio e na televisão. Para ele, este
Também são citados eventos abordan- sobre o 3º Congresso Luterano de Co- era o “calcanhar de Aquiles”. Suge-
do a Igreja e os meios de comunicação. municação, realizado em São Leopol- riu que cada congregação da Igreja
Referindo-se ao uso da TV, é dito que do, com a participação de 198 inscri-
“mesmo conhecendo, há tempo, a im- criasse uma equipe de pessoas inte-
tos. O tema geral foi É tempo de falar.
portância e a penetração da TV e a ne- ressadas nos meios de comunicação
Esse congresso, como os anteriores, foi
cessidade de utilizar este maravilhoso uma promoção do Departamento de
e que previsse em seu orçamento in-
instrumento de comunicação, faz pou- Comunicação da Igreja.30 vestimentos nestes meios.
cos anos que a igreja mantêm progra- Neste encontro, o uso da televisão O jornalista Roberto Thomé pales-
mas regulares.”28 como veículo de evangelização recebeu trou sobre os equipamentos utilizados
A reportagem também explica que destaque sob diferentes ângulos. O jor- para se fazer TV. Em sua avaliação, por
as principais dificuldades para mul- nalista Carlos Henrique Weber pales- causa dos altos custos destes equipa-
tiplicar o número de programas são o trou sobre as características de um pro- mentos, a solução mais adequada era
alto custo de veiculação, poucos profis- grama religioso na TV. Ele afirmou que usar os que as emissoras locais possuí-
sionais qualificados e carência de equi- a TV é um grande desafio missionário am.
pamento. Em seguida, são apresenta- que requer uma equipe capaz de O convidado especial do evento for
dos os quatro programas regulares atuar o jornalista Ruy Carlos Ostermann.
que existiam na época: A Hora Ele falou sobre a sua experiência da te-
(Erechim, RS), A Voz da Cruz levisão sob vários aspectos e
(Cruz Alta. RS), Expectati- repassou orientações
va (Vitória, ES) e Expec- sobre o seu uso
tativa (Cascavel, PR). adequado.
Além de historiar Ta m b é m
os programas com houve um painel
informações de pes- para que os pro-
soas ligadas a eles, gramas de TV
a matéria também então existentes
traz opiniões de- pudessem rela-
las sobre o uso da tar suas experi-
TV. Em uma delas ências.
é dito que a Igreja É significa-
está atrasada “no tivo notar que
tempo e no espaço. durante o Con-
Se Deus deu sabe- gresso foi utili-
doria ao homem para zado considerável
aperfeiçoar a técnica, por tempo para discutir
que não colocar Cristo como a criação de uma “central de
estandarte vivo na frente desta técni- produção e informação” da IELB. Um
ca? A TV não pode ser esquecida.” levantamento feito indicava que, em
Em seguida, é afirmado que, embora média, os programas exigiam doze ho-
a TV seja um investimento caro, mais ras semanais de produção. A idéia era
caro é o Evangelho de Jesus Cristo e a criar um núcleo que alimentasse os
salvação das pessoas. Por esta razão, é programas regionais com material re-
dito que “se o apóstolo Paulo estives- nas mais diferentes áreas, desde a pro- colhido entre as pessoas que atuavam
se aqui hoje, por certo estaria voando dução até a execução. na área. Com isso, se evitaria desperdí-
em supersônico, falando pelo rádio, cio de talentos, de tempo, de energia e
29 Ibidem, p. 11. de dinheiro.31
28 HEIMANN, Leopoldo. Proclamando 30 GRASEL, Gerhard e JUNG, Paulo Kerte.
Cristo do alto dos telhados. É tempo de falar. Mensageiro
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 4, Luterano, n. 10, ano 64, p 4-8, out. 31 Na reportagem citada é dito que “a
ano 64, p 6, abr. 1981. 1981. idéia da central está germinando”.

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Missão e Mídia

Uma iniciativa da Redação do Men- Na época, o presidente da LLLB, estavam “em fase de preparação para
sageiro demonstra a importância que Alcion Sponholz, apresentou o projeto dublagem” e que os filmes “possivel-
a atuação da IELB no rádio e na TV através da revista Mensageiro Lutera- mente ainda neste ano serão apresenta-
estava tendo no início da década. Na no. Segundo ele, os programas tinham dos no Brasil.”38
edição de janeiro de 1982 estreou uma o propósito de despertar no telespecta- Nos dias 25 a 32 de maio de 1983,
nova coluna, como o nome de Rádio e dor o interesse para que se aprofundas- a IELB realizou o primeiro Concílio
TV. Na justificativa da Redação consta se no tema e buscasse a igreja.35 Nacional de Obreiros, em Florianópo-
que o espaço estava sendo aberto para Foram produzidos dez progra- lis, SC. Um dos estudos tratou sobre O
que programas regionais, mantidos por mas com a duração de dois minutos, obreiro e sua Igreja, onde foi destacado
indivíduos, congregações e distritos, apresentados pelo pastor Nilo Figur. a atenção especial que deve ser dada ao
pudessem divulgar suas atividades mis- Os temas eram variados e tratavam de conteúdo das pregações, tanto no púl-
sionárias pelo rádio ou TV. A coluna questões como o sentido da vida, a es- pito tradicional ou em “outros púlpi-
iniciou com uma matéria de página in- perança, medo da morte, ansiedade, fé tos”, como a televisão.39
teira sobre o programa Expectativa, de e ciência.36 O primeiro programa foi Ainda em 1983 foi publicada uma
Vitória.32 oficialmente apresentado — e avaliado nota no Mensageiro Luterano concla-
Como havia acontecido com a edi- — durante o VI Congresso Nacional mando os leitores a colaborarem na re-
ção de 1976 do anuário Lar Cristão, a da LLLB, realizado nos dias 18 a 21 de posição do acervo da TVE — Funda-
edição de 1982 enfocou a comunicação agosto de 1983, em Caiobá, PR.37 ção Televisão Educativa do Rio Grande
da Palavra de Deus de diversas formas. Em junho de 1983, uma matéria do Sul — que havia sido destruído por
Também foram apresentados os quatro publicada no Mensageiro Luterano um incêndio. Os leitores foram convi-
programas de TV que existiam então: dava conta que o projeto de veicular a dados a enviar para a emissora “tudo o
A Hora, A Voz da Cruz, Expectativa série Esta é a vida ainda estava em an- que for útil à preservação da memória
(Vitória, ES) e Expectativa (Cascavel, damento. É dito que 100 filmes “ad- do RS, como fitas, cassete, livros, revis-
PR).33 quiridos pela rede de Televisão SBT” tas, áudios, discos, etc.”40
Nesta década surgiu uma outra ini- uma aconteceu no Distrito Paraná- O ano de 1984 marcou o apogeu da
ciativa que procurou usar a televisão Leste, tendo como base a cidade de IELB no uso da televisão como veículo
como instrumento de evangelismo: o Curitiba, PR. Espaços foram comprados evangelizador. Igreja tinha programas
Projeto Um Momento. A Liga de Lei- em uma emissora de TV. Durante em oito canais de TV, nos estados do
gos Luteranos do Brasil (LLLB) resol- vários dias, programas Um Momento Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Pa-
foram veiculados em diferentes
veu, em um congresso nacional extraor- horários. Ao final de cada programa, raná e Espírito Santo, além do alcance
dinário, realizado em janeiro de 1982, era fornecido um número telefônico, das áreas vizinhas a estes estados. Estes
que destinaria 80% das ofertas recebi- através do qual era possível obter mais programas tinham uma duração total
das para investimento evangelísticos informações sobre o assunto, além de 93 minutos, utilizados semanalmen-
no rádio e na televisão. Segundo Paulo de outros materiais evangelísticos. Foi te. Na avaliação de Hugo Assmann, os
montada uma equipe de atendimento
Buss, a Liga, auxiliada pelo Departa- na Comunidade São Paulo, do bairro luteranos da IELB faziam “um esforço
mento de Comunicação da IELB e Portão. de programação evangélica de nível
pela Hora Luterana, criou a Comissão 35 SPONHOLZ, Alcion. Projeto Rádio técnico e conteúdo responsável.”41
Rádio e TV. A Comissão liderou a pro- e TV. Mensageiro Luterano, n. 8, ano Neste sentido, é emblemática uma
dução do programa Um Momento, cujo 66, p. 20, ago. 1984. edição da revista Mensageiro Luterano
36 Idem.
objetivo era auxiliar as congregações da 37 KUCHENBECKER, Horst. O desafio 38 JUNG, Paulo K. Hora Luterana.
Igreja em campanhas evangelísticas.34 dos leigos: missão pela TV. Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 6,
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, ano 66, p. 26, jun. 1983.
O assunto voltaria à pauta de um n. 6, ano 66, p. 8-10, out. 1983. O 39 SEIBERT, Erni Walter. O Concílio
Congresso de Comunicação em 1984. projeto ainda estava em andamento Nacional de Obreiros. Mensageiro
32 UM ANO de Expectativa. Mensageiro em 1985. Em matéria no Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 6, ano 66, p. 4,
Luterano, Porto Alegre, n. 1, ano 65, Luterano, o então presidente da LLLB, ago. 1983.
p. 37, jan. 1982. Alcion Sponholz, escreve sobre o 40 TVE começa de novo. Mensageiro
33 O programa Expectativa de Projeto Participação. Uma das ações Luterano. Porto Alegre, n. 9, ano 66,
Cascavel estava fora do ar quando do Projeto era a arrecadação de p. 32, set. 1983.
do fechamento desta edição do Lar fundos e o investimento no programa 41 ASSMANN, Hugo. A Igreja
Cristão. Veja na próxima edição desta Um Momento. SPONHOLZ, Alcion. O Eletrônica e seu impacto na
revista. presidente da LLLB fala sobre o América Latina. Petrópolis: Vozes,
34 Não foi localizado registro oficial de Projeto Participação. Mensageiro 1986, p. 123. Assmann informa que a
campanhas evangelísticas com base Luterano, Porto Alegre, n. 3, ano 68, p. duração total dos programas da IELB
nos programas. Todavia, ao menos 10,11, mar. 1983. era de “cerca de 100 minutos”.

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 29


Missão e Mídia

consciente de uso da TV como meio então.


de proclamar o evangelho através de 7 Estiveram reunidas cerca de 80
programas semanais...”43 pessoas — pastores e leigos — que de
Na abertura da reportagem princi- alguma forma estavam envolvidas ou
pal são apresentados números sobre o interessadas no tema comunicação. O
uso do rádio e da TV pela IELB.44 É objetivo era refletir como a Igreja es-
dito, também, que a matéria especial tava usando os meios de comunicação,
tinha por objetivo “dar uma panorâ- se estava alcançando seus alvos, e o que
mica do uso que a IELB está fazendo poderia ser aperfeiçoado.47
dos meios eletrônicos para a pregação Na abertura, foram apresentados
do Evangelho.” O texto também indi- todos os programas regulares da IELB
ca que a reportagem fornece subsídios existentes na época: A Hora (Erechim,
para uma reflexão em torno do tema e RS), A Voz da Cruz (Cruz Alta, RS),
chama a atenção para um evento que Expectativa (de Vitória, ES, também
ocorreria em outubro: o próximo Con- transmitido em Cascavel, PR, e Lon-
gresso Luterano de Comunicação. Nes- drina, PR), Fé e Esperança (Porto Ale-
te encontro, diz a matéria, “deverá ser gre, RS) e Encontro (Florianópolis,
estabelecida uma estratégia global de SC). Além disso, foi apresentado o pro-
princípios de uso destes meios eletrôni- jeto Um Momento, da Liga de Leigos
cos para o evangelismo.”45 Luteranos do Brasil.48
deste ano com matéria de capa intitula- Artigos desta mesma edição do Uma das palestras tratou do tema
da Rádio e TV como meios de evangelis- Mensageiro Luterano refletem sobre a A comunicação na TV. Ela foi proferida
mo. Na Palavra do Leitor, o jornalista postura do cristão diante da TV. Die- pelo jornalista Gontijo Teodoro, inte-
Astomiro Romais escreveu que a Igreja ter Joel Jagnow escreveu que o “cristão grante do Departamento de Telejor-
não podia dispensar as possibilidades pode e deve usar bem a TV”, e Carlos nalismo da extinta TV Tupi e que du-
da tecnologia moderna para falar da Henrique Weber afirmou que a Igreja rante muitos anos foi apresentador do
vinda do Reino, “sob pena de nos alie- tem o desafio de usar o rádio e a televi- Repórter Esso. Gontigo, além de falar
narmos e negarmos a ordem de evange- são com um “padrão de qualidade cria- sobre a televisão em termos gerais, fez
lizar os povos.”42 tivo e comunicador”.46 uma avaliação dos programas de TV da
No editorial desta edição nota-se Também foi em 1984, durante os IELB. Uma das suas críticas foi em rela-
uma clara preocupação em usar a tele- dias 15 a 17 de outubro, aconteceu o ção à ausência de testemunhos nos pro-
visão como instrumento missionário. É IV Congresso Luterano de Comuni- gramas, já que os julgava importantes
dito que “este veículo de comunicação cação, em Florianópolis, SC. Foi uma para reforçar a mensagem, promover a
com os seus prós e contras não pode promoção do Departamento de Co- imitação, persuadir melhor.49
ser ignorado e omitido na estratégia municação da IELB com o apoio de O pastor e professor Leopoldo
de Cristo de leve o evangelho a cada Luteranos Unidos em Comunicação Heimann foi outro palestrante do en-
criatura.” Também são reconhecidas (LUC). A temática do encontro foi contro que focou bastante a televisão.
dificuldades financeiras e humanas, Rádio e TV como meios de evangelismo. Ele abordou a questão teológica em
mas com um tom otimista: “Os custos Todavia, o destaque ficou por conta da palestra denominada O texto divino
são altos e os recursos humanos não são televisão, devido ao significativo núme- para o contexto humano: a Teologia da
muitos, mas estes custos nunca serão ro de programas que a IELB mantinha evangelização nos textos de rádio e TV.
maiores do que o valor da palavra sal- Heimann disse que a Igreja Cristã não
vadora de Deus...” Por isso, é afirmado 43 FIGUR, Nilo Lutero. A missão da podia ser substituída pela igreja eletrô-
que “não podemos ignorar o rádio e a IELB no rádio e na TV. Mensageiro nica, mas que os meios de comunicação
Luterano, n. 8, ano 86, p. 3, ago. 1984.
TV como meios de chegarmos aos 120 deveriam ser auxiliares na proclamação
44 Sobre a TV, os números já foram
milhões de brasileiros...” Além disso, citados acima. do Evangelho. Salientou que a Igreja
nota-se uma satisfação em relação ao 45 A IELB no rádio e na TV. Mensageiro deveria estar ciente de que estes progra-
uso da televisão pela IELB na década de Luterano, n. 8, ano 86, p. 8, ago. 1984.
80 e prevê avanços: “... e na década de 46 JAGNOW, Dieter Joel. O videota 47 FLOR, Jonas. 4 ºCongresso
— o cristão diante da TV; Luterano de Comunicação.
80 está amadurecendo uma estratégia
WEBER, Carlos Henrique. A Igreja Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n.
42 ROMAIS, Astomiro. Palavra ao e os meios de comunicação. 12, ano 67, p. 22-25, dez. 1984.
Leitor. Mensageiro Luterano, n. 8, ano Mensageiro Luterano, n. 8, ano 86, p. 48 Sobre este projeto, veja detalhes acima.
86, p.1, ago. 1984. 21, 33, ago. 1984. 49 FLOR, op. cit., p. 26.

30 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Missão e Mídia

mas não eram, em primeiro lugar, para


os seus próprios membros, mas para o
público externo. Heimann também su-
geriu que os programas tivessem o que
chamou de “carimbo confessional”, ou
seja, que tivessem o mesmo formato
para identificar a Igreja. Outra ênfase
esteve na necessidade da Igreja apri-
morar seus talentos nesta área e racio-
nalizar seus esforços nesta área através
de uma central de produção de progra-
mas.50
Uma das atividades práticas do en-
contro foi a discussão de princípios e
estratégias para o uso do radio e da TV
como meios de evangelismo. Dentre as
dução de Rádio e TV. Esta Central visando racionar esforços e custos
inúmeras conclusões também relativas
servirá para a racionalização de custos financeiros.”53
à televisão, estão estas: e desenvolvimento de uma unidade de O assunto foi também foi alvo de
— As iniciativas até agora desen-
mensagens e imagem pública e televisa decisão na 50ª Convenção Nacional,
volvidas ainda são deficientes no que se
da IELB, além de envolver nesta missão realizada de 21 a 26 de janeiro de 1986.
refere ao embasamento teórico, técnico
as congregações e os distritos da Igreja. Uma das moções propunha a oficializa-
e organizacional. De outro lado, preparará recursos hu- ção da Central de Produções da IELB.
— É urgente a necessidade de for-
manos através de cursos profissionais A moção foi aprovada.54
mação de recursos humanos através de
e técnicos, literatura, releases, progra- Apesar da chancela oficial, pelo que
cursos, treinamentos, etc. mas-piloto, etc. Além disso, adquirirá foi possível levantar durante a pesquisa,
— Embora o nível atual dos pro-o material e equipamento necessário a Central de Produções nunca chegou
gramas de TV possa ser considerado para o seu bom funcionamento, bus- a ser concretizada nos moldes planeja-
satisfatório, em visto dos poucos recur-
cando “recursos financeiros de órgãos dos.
sos materiais disponíveis, é urgente o
que se dedicam a esse ministério no De todos os Congressos de Comu-
investimento nesta área. país e exterior, ou de ofertas e doações nicação realizados até então, este foi o
— No que se refere aos recursos fi-
de indivíduos e firmas que se propo- que modo mais direto e prático focou o
nanceiros, propõe-se formar comissões
nham a isso.”52 uso da TV como veículo de evangeliza-
congregacionais e distritais, formadas Como havia acontecido no 3º Con- ção. A proposta estava dentro do espí-
por leigos e pastores, para planejarem a
gresso, realizado em 1981, a questão de rito do momento, já que a Igreja estava
consecução do apoio necessário para o
uma central de produção ocupou parte investindo neste veículo como nunca o
seu programa. do tempo dos congressistas. O assunto fizera antes.55
— É imprescindível a montagem de
ainda continuou latente durante algum Em fevereiro de 1985, o então Se-
estratégias adequadas para o desenvol-
tempo na Igreja. Em março de 1985,
vimento de um trabalho evangelístico 53 LÜDKE, Reinaldo Martim. Projeto
a Liga de Leigos Luteranos do Brasil Participação — o que é?
junto ao público-alvo. “Como numa (LLLB) publicou artigo no Mensagei- Mensageiro Luterano, n. 3, ano 68, p.
caça, a TV e o rádio são como cachor-
ro Luterano falando sobre suas metas e 6-9, mar. 1985. Na matéria também
ros que vão à frente e levam a caça.”51
seu plano de ação. Fica claro que havia aparece um demonstrativo das ofertas
— É necessário um maior intercâm-
se estabelecido uma parceria entre a da LLLB e sua aplicação, havendo
bio de programas entre os diversos pro- indicação de provisão para a Missão
LLLB, o Departamento de Comunica- Rádio e TV.
dutores, a fim de administrar melhor o
ção e a Hora Luterana para concretizar 54 AS PRINCIPAIS decisões. Mensageiro
tempo e os recursos. o projeto. É dito que o objetivo da par- Luterano. Porto Alegre, n. 2/3, ano
— Impõe-se a implantação imedia-
ceria era criar a Central “para amparar 69, p. 45, jan./fev. 1986.
ta de uma Central Luterana de Pro- as congregações e distritos que se uti- 55 Não foi possível encontrar informações
sobre a realização de um 5º Congresso.
50 Idem, p. 24. lizam da televisão como apoio para o Ao que tudo indica, isso se deve ao
51 FLOR, Elmer. Rádio e TV como evangelismo, bem como coordenar a fato do gradativo fim do programas
meios de Evangelismo. produção e veiculação de programas, que aconteceram nos anos seguintes,
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. chegando a nenhum antes do final da
12, ano 67, p. 25-27, dez. 1984. 52 Idem. década.

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Missão e Mídia

cretário Executivo do Departamento missionário.


de Comunicação da IELB participou Apesar de todos os investimentos
de um encontro de Luteranos Unidos feitos nas diversas áreas durante o final
em Comunicação (LUC), em Lima, da década de 1970 e a primeira metade
Peru. No evento, ele palestrou sobre a da década de 1980, um a um os progra-
evangelização através da TV.56 mas de televisão da IELB começaram
Neste mesmo ano, de 22 a 25 de a deixar de ir ao ar, especialmente por
agosto, aconteceu o VII Congresso Na- causa de dificuldades na manutenção.
cional da LLLB, em Irai, RS. Durante o Buss diz que “já ao final da década, a
encontro foram desenvolvidas duas te- IELB deixara de utilizar a televisão
máticas: qual é a obra da igreja e como como veículo de sua mensagem.”59
realizar esta obra. Para respondeu a Além disso, um sintoma do estado
estas questões, foram discutidos três te- das coisas nesta segunda metade da
mas. Um deles foi: O desafio dos meios década pode ser verificado no fato de
de comunicação no trabalho da igreja, que a Igreja resolveu, em 1987, não
liderado pelo pastor Nilo Lutero Figur. mais ter um secretário executivo para
Durante o Congresso foi apresen- a área de comunicação. Como “despe-
tando um documentário sobre o Proje- dida”, o pastor Nilo Figur escreveu um
to Participação da Liga. O vídeo, com editorial do Mensageiro Luterano no
20 minutos de duração, havia sido pro- início de 1988. Apesar do declínio dos
duzido pela LLLB, em conjunto com investimentos da Igreja na área — ou
o Departamento de Comunicação da talvez por causa dele — ele diz que a
IELB e a Hora Luterana,57 ou seja, a comunicação havia assumido um lugar 13 a 17 de abril de 1988, a Igreja rea-
“central de produções”. importante, até decisivo em qualquer lizou sua 51º Convenção Nacional, em
Ainda neste ano, a edição de outu- empreendimento. Por isso, julgava que Brasília. Uma das conferências foi so-
bro do Mensageiro Luterano traz uma a IELB precisava “tratar a comunica- bre Igreja e Meios de Comunicação, diri-
carta de um pastor repercutindo a ma- ção, em todas as suas áreas de atuação, gida pelo jornalista Alexandre Garcia,
téria O videota, publicada em agosto. O como algo até decisivo na busca do seu da TV Globo.61
autor diz que criou “ao longo dos anos objetivo maior, que é o testemunho da Neste mesmo mês, foi publicada
uma verdadeira aversão pelos meios nova vida em Cristo.”60 no Mensageiro Luterano uma crítica
de comunicação, mormente pela TV” Criado em 1976, o Departamento ao conteúdo da televisão brasileira e à
e que a TV, embora tenha pontos po- surgiu no mesmo ano que foi criado o ausência do Cristianismo na programa-
sitivos, os negativos não compensam primeiro programa de TV da IELB, o ção. De autoria do pastor Vilson Re-
“gastar tanto dinheiro e tanto tempo A Hora. A extinção do cargo de Secre- gina, o texto não cita especificamente
com ela.” Ele também afirma que “a TV tário Executivo se deu exatamente no a IELB, mas, por extensão, a crítica já
é um dos mais sérios, um dos mais gra- período em que os programas regula- era válida nesta época, haja vista o acen-
ves, um dos mais terríveis problemas de res já tinham ou estavam em processo tuado declínio no uso da televisão que
nosso tempo e que precisa ser discutido de sair do ar. Todavia, o Departamento estava ocorrendo na segunda metade
e analisado.”58 A preocupação do leitor voltaria a ter um Secretário quatro anos desta década.
dirige seu foco à presença da TV na depois, como será visto mais adiante. Quando fala do conteúdo, Regina
vida das famílias e os danos que pode Embora não especificamente a tele- diz que a Igreja Cristã, embora possua
causar. Não há indício no texto de que visão, a questão dos meios de comuni- “o mais excelente conteúdo”, ela carece
exista uma crítica ao empenho da Igreja cação ainda ocupou espaço importante “de muito mais espaços nos melhores
em usar mais a televisão como veículo na IELB quase no final da década. De
61 JUNG, Paulo Kerte. Representativa,
56 EVANGELHO e comunicação massiva. 59 BUSS, op.cit., p. 254. Além disso, dinâmica, eficiente. Mensageiro
Mensageiro Luterano, Porto registra Buss, também houve redução Luterano, Porto Alegre, p. 28-31, maio
Alegre, n. 4, ano 68, p 31,32, abr. 1985. no acesso ao rádio. Não foi possível 1988. O pastor Nilo Figur, que recém
57 VII CONGRESSO Nacional da LLLB. encontrar registros sobre a data do havia deixado o cargo do também
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. término dos programas regulares que recém extinto Departamento de
12, ano 68, p 20,1, dez. 1985. existiam na IELB. Comunicação, foi o presidente da
58 PFLUCK, Ari. A TV em nosso 60 FIGUR, Nilo Lutero. Registros. comissão organizadora da Convenção.
tempo. Mensageiro Luterano, Porto Mensageiro Luterano, Porto Alegre, p. 4, Sua atuação foi decisiva para que a
Alegre, n. 10, ano 67, p. 33, out. 1984. fev./mar. 1988. comunicação fosse pautada no evento.

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O conteúdo da tele- cialmente sobre os efeitos produzi-


visão brasileira também dos pela televisão. Em 1984, apare-
foi alvo de uma decisão ceram vários textos na edição agosto
do Distrito Lago Itaipu analisando a postura do cristão da
da IELB (no estado do
Igreja diante da TV, e um outro em
Paraná) em sete de março
outubro, abordando os possíveis
de 1999: enviar uma cor-
respondência para o Pre- efeitos maléficos do veículo. Os
sidente das Organizações efeitos dos comerciais de TV foram
Globo, Roberto Marinho. abordados em março de 1985. Em
Para justificar a carta, são junho de 1986 apareceu o artigo A
citados a violência e a imo- televisão e o tempo. Em 1988, foram
ralidade, tanto nos filmes publicados dois artigos: Criança e
como nas novelas. Uma TV: cuidado com o abuso (fevereiro/
das decisões colocadas no março) e Televisão: um mal necessá-
texto enviado: “Deixar de rio? (agosto).
assistir a filmes e novelas O assunto também ocupou várias
que apresentam cenas de vezes a seção de cartas dos leitores. Ao
violência e imoralidades, menos um leitor escreveu à Redação da
desligando o aparelho, ou revista criticando o conteúdo das ma-
ao menos selecionando um térias publicadas, pois há tempo vinha
outro canal.”64 Também é observando “a radical condenação à
meios de comunicação”, inclusive a TV. dito que os membros de televisão”. Por fim, ele questiona: “será
Em seguida, ele faz uma comparação toda a Região Paranaense seriam incen- mesmo a televisão responsável pela
entre a doutrina da ressurreição (cristã) tivados a fazerem o mesmo. mudança dos hábitos dos cristãos? Um
e da reencarnação (espírita). Enquan- No final da década surgiu na IELB cristão autêntico trocaria o culto por
to que a primeira praticamente quase o Projeto Macedônia da IELB. No site um capítulo de novela?”66
não aparece nos diferentes veículos, a atual do Projeto, consta que a sua tare-
segunda tem ampla visibilidade. E isto fa é de “estimular e treinar pessoas de
comunidades cristãs para visitarem ou-
A década de 1990
que, no seu entender, a ressurreição de
Jesus Cristo é a “maior manchete da vintes e telespectadores de programas Na década de 90, o assunto “tele-
história”.62 de 30 segundos em rádio e televisão, visão” praticamente desapareceu da
A questão da propriedade do uso onde é oferecida literatura gratuita...”65 agenda da IELB. Neste período, os in-
da televisão pela IELB voltou a ser Não há notícia de que o Projeto tenha vestimentos na comunicação de uma
mencionada de passagem em artigo utilizado, até hoje, a televisão como fer- forma geral diminuíram sensivelmente.
do Mensageiro Luterano em agosto de ramenta evangelística. Inclusive, a estrutura administrativa da
1988. Sob o título Culpada ou inocen- A indicação da década de 1980 Igreja passou por um processo de mu-
te?, o jornalista Décio Dalke analisa a como sendo o auge da presença da dança, que acabou levando à extinção
programação da TV. Ele cita estupros, televisão como alvo da IELB tam- definitiva do Departamento de Comu-
assaltos, socos, vícios, perseguições e bém pode ser verificado através do nicação e, por extensão, da figura de
uma infinidade de cenas que diaria- número de artigos publicados sobre um Secretário Executivo. Este Depar-
mente aparecem nas telas. Em seguida,
o assunto no Mensageiro Luterano. tamento havia apoiado, de forma direta
comenta que esse estado de coisas não é
Assim como na década de 1970, a e indireta, o surgimento de programas
culpa da TV em si, mas de quem a utili-
za. Caso fosso o contrário, escreve, “en- preocupação continuou a ser espe- de televisão desde o final da década
de 1970 e, especialmente, na década
tão a própria Igreja Luterana não mais Porto Alegre, n. 8, ano 71, p 21, ago. de 1980, além de promover encontros
poderá fazer uso dela para transmitir 1988.
64 DE OLHO na televisão. Mensageiro
para discutir a comunicação e outras
suas mensagens.”63
Luterano. Porto Alegre, p. 27, jul. ações.
62 REGINA,Vilson. A maior manchete 1989. Uma crítica à atitude da Igreja em
da história. Mensageiro Luterano. 65 PROPÓSITOS. Disponível em:
Porto Alegre, abr. 1988, p. 13, 14. <http://www.macedonia.org.br/index. 66 SOBIESIAK, Regina. Televisão e
63 DALKE, Décio. Culpada ou php?pag=propositos.php>. Acessado Telenovela. Mensageiro Luterano,
Inocente? Mensageiro Luterano, em: 25 jan 2006. Porto Alegre, p. 2, jan. 1987.

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também diz que não adianta a Igreja uso da televisão. Figur estava voltando
ter uma assessoria de imprensa, se não à Secretaria Executiva de Comunicação
possui uma estrutura de comunicação. da IELB após um período de quatro
Para ele, apenas levar sugestões de anos em que a função deixou de exis-
pauta aos veículos da Capital [Por- tir.70
to Alegre] “equivale à comunicação Após afirmar que existe uma rela-
com tambor em aldeia, quando os ção importante entre a comunicação e
meios eletrônicos levam mensagens aos a Igreja, Figur diz que é “difícil enten-
confins do universo.”68 der” como uma Igreja que historica-
A crescente presença da Igreja Uni- mente tinha uma íntima relação com a
versal do Reino de Deus (leia-se Edir comunicação resolveu, em 1987, privar
Macedo) na mídia, especialmente na a Área de Comunicação de ter uma pes-
televisão, foi motivo de nota e comen- soa para coordená-la. Em seguida, ele
tário no Mensageiro Luterano de maio demonstra satisfação porque a função
relação à comunicação de uma forma de 1991. Na nota, é informado que foi restabelecida através de decisão da
geral foi publicada no editorial do milhares de fiéis estavam levando, aos Convenção Nacional.
Mensageiro Luterano de novembro de templos da Universal, envelopes com No restante do artigo, Figur tam-
1990. Assinado por Astomiro Romais, dinheiro como resposta à Operação bém não cita especificamente a tele-
a reflexão diz que, ao contrário do que Salmo 91. A Operação tinha o objetivo visão, mas argumenta que “este é um
tradicionalmente aconteceu durante a de arrecadar dinheiro para pagar dívi- tempo precioso e trepidante no qual
história do Cristianismo, hoje existe das trabalhistas que Macedo havia con- precisamos comunicar e comunicar
um afastamento entre teologia e comu- traído com a compra da Rede Record. bem os nossos valores, nossa ética,
nicação. Romais diz que é fácil explicar Além disso, a arrecadação também ser- nossa fé e esperança em Cristo” e que
a ausência nos meios de comunicação viria para retomar obras da Igreja, que “fazendo uso dos recursos da comuni-
argumentando falta de recursos. Mas a estavam paradas por causa da redução cação que Deus está oferecendo à Igreja
questão vai muito além, afirma. A Igre- do volume de contribuições, em fun- através da ciência e tecnologia...”71
ja precisa entender que “a educação e ção da crise econômica do Brasil. Durante esta década a IELB conti-
ocupação com a comunicação são fato- Após a nota, segue-se um comentá- nuou ativa como parceira de Luteranos
res fundamentais de quem quer procla- rio. É dito que o Macedo, já apresen- Unidos em Comunicação (LUC), um
mar o evangelho...” Por isso, ela precisa tado ao país pela televisão carregando fórum de comunicadores luteranos da
se preocupar como uma série de ques- sacos de dinheiro, após uma concen- América Latina. LUC realizou encon-
tões, como estas: a Igreja está se preo- tração evangelística da cidade do Rio tros periódicos. Um deles aconteceu
cupando com a nova sociedade, ori- de Janeiro, “especializa-se na ‘arte’ de em Viamão, RS, em abril de 1993: o
ginária dos meios de comunicação? A arrecadar dinheiro. É um ministro 2º Congresso Latino-americano de
Igreja está se preocupando com a nova não do evangelho, mas da economia. Comunicação e a VI Assembleia Geral
linguagem do mundo, a fim de poder Das economias dos pobres, entenda-se de LUC, que teve como tema central
se comunicar com ele? A Igreja está bem. Para o descrédito cada vez maior Comunicação para a vida. Um dos or-
consciente de que é preciso se aproxi- do nome ‘evangélico’ junto à opinião ganizadores do evento foi o pastor Nilo
mar, entender, estudar os novos meios, pública.”69 Figur, que na época ainda coordenava
além de preparar pessoas para utilizá- Ainda neste ano, a comunicação o Departamento de Comunicação da
-los adequadamente? A Igreja está foi novamente pautada em editorial do
ciente da necessidade de comunicar-se Mensageiro Luterano, assinado pelo 70 FIGUR, Nilo. Comunicar é
melhor e de maneira mais eficiente?67 então secretário da Área de Comuni- fundamental. Mensageiro Luterano,
O editorial foi repercutido na seção cação da IELB, o pastor Nilo Lutero Porto Alegre, p 4, set. 1991.A decisão do
fim da Secretaria Executiva havia sido
de cartas de dezembro do mesmo ano. Figur. O artigo é importante porque tomada pelo Conselho Diretor da IELB
O jornalista Décio Dalke escreveu que reflete uma reação a um estado de coi- em 1987. Ou seja, a Igreja permaneceu
a visão da IELB é de gabinete, enquan- sas criado na Igreja nos anos anteriores, sem Secretário Executivo por cerca de
to deveria de ser de mercado, a partir o que também contribuiu para o fim do quatro anos. Todavia, mesmo com o
de fundamentos de marketing. Dalke retorno do Secretário Executivo não
68 CARTAS. Mensageiro Luterano, mais seria possível retornar ao período
67 ROMAIS, Astomiro. Igreja e novos Porto Alegre, p. 2, dez. 1990. áureo da década anterior no uso da
desafios de comunicação. 69 ROMAIS, Astomiro. Para a tele televisão. Figur concorreu à eleição ao
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, p. 4, crente. Mensageiro Luterano. Porto cargo com mais dois candidatos.
nov. 1990. Alegre, p. 32, maio 1991. 71 Idem.

34 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Missão e Mídia

IELB. O encontro se tornou emblemá- ta Catarina (Blumenau, Rio do Sul e


tico por mostrar a disposição da Igreja Tubarão); dois em Paraná ( Juranda e
em manter de alguma forma o interesse Toledo); dois no Mato Grosso ( Juína
em comunicação, apesar de não mais e Cuiabá), um no Rio de Janeiro (capi-
usar a televisão como veículo de evan- tal) e um no Pará (Santarém).74
gelização. Neste encontro, o pastor No final da década também come-
Nilo Figur foi eleito como Coordena- çou a projeção nacional do padre Mar-
dor Geral de LUC.72 celo Rossi na televisão, com a sua “ae-
Após um período de cerca de cinco róbica do Senhor”. Editorial da revista
anos sem iniciativas importantes, mu- Mensageiro Luterano de janeiro de
danças começaram a acontecer no final 1999 abordou a “ibopização” de Rossi.
da década de 1990, quando surgiu um No final da matéria, os leitores foram
projeto conjunto para a televisão entre convidados a enviar sua opinião sobre
a IELB e a Igreja Evangélica de Confis- o assunto para a Redação, ou seja, se se- agosto de 1990 foi publicado um
são Luterana no Brasil (IECLB). Em ria bom se a IELB tivesse na televisão artigo avaliando o conteúdo da TV
outubro de 1998, aconteceu em Ro- pastores como era o padre.75 Nos meses brasileira. Em agosto de 1993 saiu
deio 12, SC, a 1ª Conferência Nacional subsequentes várias opiniões foram pu- um artigo analisando a televisão, a
Interluterana, organizada pela Comis- blicadas. Na edição de abril apareceram família e a educação. Na edição de
são Interluterana de Diálogo (CID). dez opiniões. Apesar de serem contra- janeiro/fevereiro de 1995, um títu-
Um dos desafios colocados pelo encon- ditórias, ficou claro que a Igreja tinha lo forte chama a atenção: Jogue sua
tro para as Igrejas foi a produção de três dificuldades nesta área, tanto no uso de
TV fora! Ou aprenda a usá-la! Em
VTs de 30 segundos cada para a divul- dons como da televisão. Um dos leito-
gação da mensagem cristã na televisão. res escreveu: “...não estamos aparecen- julho de 1999 saiu a matéria TV: de
O projeto, denominado Igreja do na telinha. Precisamos sair do nos- quem é o controle?
na TV, foi desenvolvido por comu- so casulo, fazer uso da televisão e nos
nicadores das duas Igrejas em 1999. apresentar como uma verdadeira igreja A década de 2000
Os vídeos tiveram seus conteúdos missionária.”76
Convém notar, ainda, que em 20 A comunicação — e de forma in-
direcionados para três temas: Re- direta o uso da televisão — começou a
forma Luterana, Liberdade e Novo de novembro de 1999 aconteceu o ser pautada novamente na IELB no fi-
Milênio. 1º Encontro de Comunicadores. O
nal da década de 1990 e, de forma mais
Os VTs foram oferecidos para as evento foi uma promoção de LUC- acentuada, na década de 2000. Em ou-
congregações de ambas as Igrejas. Uma -Brasil com o objetivo de reunir co- tubro deste ano aconteceu um novo
nota do Mensageiro Luterano dá conta municadores da IELB e da IECLB encontro de comunicadores da IELB
de “houve 15 encomendas por parte de para a discussão de temas afins e o e da IECLB. Uma das atividades de-
congregações, paróquias e distritos das compartilhamento de experiências senvolvida foi a análise da série de três
duas Igrejas, resultando em boa veicu- na área. Um novo encontro foi mar- VTs A Igreja na TV, que haviam sido
lação em diferentes regiões do Brasil.”73 cado para 2000, em São Leopoldo, produzidos em conjunto pelas Igrejas
Foram seis no Rio Grande do Sul (Es- RS. em 1999. Os comunicadores julgaram
trela, Pelotas, Três de Maio, Erechim, que a iniciativa era “muito positiva”. De
Embora o uso da televisão te-
Porto Alegre e Gramado); três em San- outro lado, foi questionado se não con-
nha cessado na década de 1980, o
72 SILVA, João Artur M. da. Luteranos assunto continuou sendo motivo fundia mais mostrar que há duas Igrejas
unidos em comunicação. Luteranas diferentes no Brasil. Além
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. de matérias na revista Mensageiro disso, concluiu-se que ainda era preci-
9, ano 76, p. 10,11, set. 1993. Também Luterano durante esta década. Em so acertar a linguagem e que faltavam
merece nota a participação de
representantes da IELB em encontros 74 CID — A igreja na TV. Mensageiro recursos para uma produção melhor.77
da World Association for Christian Luterano, Porto Alegre, n. 2/3, ano Ao longo do ano de 2003, a IELB
Communication (WACC), seção Brasil, 83, p.14, fev./mar. 2000. promoveu uma série de Concílios.78 A
tanto na década de 1980, como nas 75 JAGNOW, Dieter Joel. A aeróbica
de 1990 e 2000. do Senhor. Mensageiro Luterano, 77 LUTERANOS se reúnem para o
73 IGREJA na TV. Mensageiro Porto Alegre, n. 1, ano 82, p. 3, jan 1999. 2º Encontro de Comunicadores.
Luterano, encarte Pela IELB, Porto 76 SCHMIDT, Eric. Opção pela TV. Mensageiro Luterano, Porto
Alegre, n. 2/3, ano 83, p. 4, fev./mar. Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 1, Alegre, n. 12, ano 84, p. 14, dez. 2000.
2000. ano 82, p. 8, jan. 1999. 78 Na IELB, os Concílios são encontros

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 35


Missão e Mídia

temática destes en-


contros foi comunicação. Em
uma mensagem para a Igreja, o
então presidente da Igreja, Carlos
W. Winterle, disse que “os nossos
dias são privilegiados em termos de
comunicação com toda a tecnolo-
gia que está à nossa disposição.” Em
seguida, colocou os objetivos dos
Concílios ao abordar o tema:
a) avaliar como está a comu-
nicação pessoal; b) refletir so-
tes áreas.80 Foi resolvido que os Fóruns da da Igreja e que havia necessidade de
bre o que pode ser feito para melhorar
teriam uma periodicidade anual. investimentos (inclusive financeiros)
a comunicação; c) verificar como “usar
Um encontro de líderes da IELB e na área, a fim de levar o evangelho para
os meios, recursos e técnicas de hoje
representantes da Igreja Luterana — Sí- mais pessoas.81
em prol de uma melhor e maior divul-
nodo de Missouri, dos Estados Unidos, Este encontro ajudou a acelerar a
gação do Evangelho...”79
aconteceu entre os dias 12 e 15 de abril concretização de um anseio da Igreja,
Também em 2003 a IELB promo-
de 2004, no campus da Universidade já manifestado em outros momentos:
veu o 1º Fórum de Comunicadores. O
Luterana do Brasil (Ulbra), em Canoas, novamente investir em assessoria de co-
encontro aconteceu em São Leopoldo,
RS. O objetivo do encontro foi de dia- municação. Um estagiário em Jornalis-
RS. O evento marcou um novo início
logar sobre o que os diversos segmentos mo foi contratado em agosto de 2004.
da Igreja no sentido de repensar as
da Igreja poderiam fazer melhor em con- Após a formatura do assessor, ele ficou
ações de comunicação e capacitar os
junto do que separados para a obra mis- na função até fevereiro de 2007, quan-
comunicadores que atuam em diferen-
sionária. Uma das principais conclusões do aceitou outra atividade na Igreja.
de pastores para reciclagem e do encontro foi que a comunicação de- Em novembro de 2004 a IELB
aperfeiçoamento. Eventualmente veria ser um ponto prioritário da agen- voltou a ter um programa regular de
podem ser convidadas pessoas leigas. TV: Toque de Vida. Tratou-se de uma
Acontecem em várias regiões do Brasil 80 .FÓRUM reúne comunicadores da IELB. iniciativa da Universidade Luterana do
a cada dois anos. Mensageiro Luterano, Porto Alegre,
79 WINTERLE, Carlos W. Concílios n. 9, ano 86, p. 25, set. 2003. De certa 81 JAGNOW, Dieter Joel. Líderes
2003 — Comunicação. forma, estes Fóruns viriam a preencher a indicam prioridades da agenda
Mensageiro Luterano, Porto Alegre, n. 5, lacuna deixada pelo fim dos Congressos da IELB. Mensageiro Luterano, Porto
ano 86, p. 5, maio 2003. de Comunicação. Alegre, n. 6, ano 87, p. 22-24, jun. 2004.

36 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Missão e Mídia

Brasil. O programa ainda está no ar, na de teoria da comunicação em Marti- Em dezembro de 2006, CPTN
Ulbra TV. nho Lutero. O assunto também esteve veiculou cinco desenhos animados re-
Em 2005, a preocupação pelo tema presente em oficinas sobre comunica- ligiosos na Rede Canção Nova de Te-
ficou demonstrada através de uma de- ção escrita, comunicação a serviço da levisão.88
cisão do Conselho Diretor da Igreja, missão, comunicação visual no culto, Em 2007, o Departamento de Co-
realizado em novembro em Campo comunicação pelas mídias contempo- municação (hoje Área de Comunica-
Grande, MS: “Que o Seminário Con- râneas, comunicação e responsabilida- ção) continua existindo dentro da es-
córdia promova seminários na área de de social e comunicação pessoal e em trutura administrativa da IELB. A sua
comunicação, visando à preparação dos grupos.85 coordenação é da responsabilidade do
candidatos ao ministério na produ- Mas em termos concretos, no que Secretário da Igreja. O uso da televisão
ção de textos e de apresentações para se refere à televisão, durante esta déca- como veículo de evangelização não tem
jornal, rádio e televisão, com acompa- da praticamente nada aconteceu. Além sido prioridade da Área. O foco está na
nhamento de profissionais da área de do início do programa Toque de Vida, comunicação impressa, seguida da co-
comunicação.”82 as únicas iniciativas ficaram com Cristo municação via internet.
Pode-se dizer que o ápice desta Para Todas as Nações. Em 6 de julho de Além destas iniciativas ao longo das
nova tendência aconteceu durante a 2003, entrou no ar na rede Bandeirante décadas, convém ressaltar ações isola-
59ª Convenção Nacional da IELB, re- Vale do Paraíba, SP o programa "Tudo das de pastores no sentido de abrirem
alizada entre os dias 19 e 23 de abril para todos". O programa abria uma ja- espaços na mídia local e regional como
de 2006, em Guarapari, ES. Antes do nela de três minutos para o "Momento fontes. É o caso do pastor Vilson Regi-
evento, o então presidente da IELB, Espiritual", que trazia mensagens pre- na, enquanto trabalhou em Uruguaia-
Carlos W. Winterle enviou mensagem paradas por Cristo para Todas as Na- na, RS entre 1979 e 1983. Regina era
para a Igreja acerca da Convenção e ções. O programa alcançava 36 cidades regularmente entrevistado pela TV
do tema. Após comentar sobre o cres- do Vale do Paraíba, litorais Sul e Norte Uruguaiana (RBS) para opinar sobre
cimento da comunicação (imprensa, de São Paulo, Serra da Mantiqueira e temas com algum nível de apelo reli-
rádio, televisão e internet) nos últimos Campos do Jorão. O "Momento Es- gioso, como Páscoa, Natal, atentado
tempos, afirmou que “muitas vezes piritual" era apresentado pelo pastor sofrido pelo papa, autoflagelação pra-
ficamos parados no tempo, usando a Waldemar Garcia Jr86. ticada por uma determinada seita do
comunicação apenas verbal, no púlpito Em 2006, CPTN anunciou o livro nordeste brasileiro, o crescimento dos
ou, timidamente, através de literatura e A Verdade Sobre os Anjos em televisão cultos sectários e a estagnação das igre-
dos outros meios citados.”83 aberta, no programa Pra Você da rede jas históricas.89
O tema geral da Convenção foi A Gazeta, nos dias 11 e 12 de maio, no
comunicação a serviço do Evangelho — programa “Mulheres”, da mesma emis- Rev. Dieter Joel Jagnow é jornalista e pastor da
Aquecendo corações. A temática foi pau- sora, no dia 14 de maio. Os anúncios Igreja Evangélica Luterana do Brasil em Ribeirão
tada em palestras sobre planejamento foram do tipo “testemunhal”. Segundo Preto-SP, além de participar da equipe editorial da
Revista.Teologia.
de comunicação para a congregação, nota de CPTN, a organização acredi-
Teologia e Comunicação,84 e elementos tava que essa era uma grande oportu-
nidade de evangelismo, pois o assunto
82 SCHMIDT, Gustavo. IELB reúne “anjos” estava sendo muito explorado
Conselho Diretor em Campo e vinha despertando um interesse cada
Grande. Mensageiro Luterano, Porto
Alegre, n. 1/2, ano 90, p. 26, 27, jan./fev. vez maior nas pessoas.
87

2006,
83 WINTERLE, Carlos W. A mesmo sabem da existência da IELB”.
comunicação a serviço do SCHMIDT, Gustavo. IELB realiza TV. Disponível em <http://www.
Evangelho — Aquecendo Convenção Nacional e elege cptln.org/hora.luterana/lerdestaque.
corações com o amor de Cristo. nova Diretoria. Mensageiro Lutera- asp?xid=1352004131740>. Acessado
Mensageiro Luterano, n. 4, ano 89, p. 5, no, Porto Alegre, n. 6, ano 89, p. 22-24, em: 7 fev. 2007.
abr. 2006. jun. 2006, 88 DESENHOS de CPTN na TV Canção
84 Nesta palestra, foi dito que as congre- 85 Idem. Nova. Disponível em: <http://www.
gações da IELB deveriam investir recur- 86 LUTERANOS ampliam evangelismo cptln.org/hora.luterana/lerdestaque.
sos e esforços na divulgação e no uso em meios de comunicação. Disponível asp?xid=15122006111824>.
dos meios de comunicação de massa, em: <http://www.alc-noticias.org/arti- Acessado em: 7 fev. 2007.
especialmente a televisão. “A IELB culo.asp?artCode=1319&lanCode=3>. 89 REGINA, Vilson. Informações
precisa posicionar-se, ocupar espaço Acessado em: 7 fev 2007. O progra- [mensagem pessoal]. Mensagem
na mídia, mostrando-se para aqueles mete durou poucas edições. recebida por editor@editoraconcordia.
que buscam uma igreja cristã e nem 87 A VERDADE Sobre os Anjos na com.br em 26 jan. 2007.

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Homilética: Sermão Rev. Heldo Bredow

Mateus 2.1-121 guiará o meu povo de Israel.”


7
Então Herodes chamou os visitantes do Oriente para uma
1
Jesus nasceu na cidade de Belém, na região da Judeia, quando reunião secreta e perguntou qual o tempo exato em que a estrela
Herodes era rei da terra de Israel. Nesse tempo alguns homens que havia aparecido; e eles disseram. 8Depois os mandou a Belém com a
estudavam as estrelas vieram do Oriente e chegaram a Jerusalém. seguinte ordem: — Vão e procurem informações bem certas sobre
2
Eles perguntaram: — Onde está o menino que nasceu para ser o o menino. E, quando o encontrarem, me avisem, para eu também
rei dos judeus? Nós vimos a estrela dele no Oriente e viemos adorá- ir adorá-lo.
9
-lo. Depois de receberem a ordem do rei, os visitantes foram em-
3
Quando o rei Herodes soube disso, ficou muito preocupado, e bora. No caminho viram a estrela, a mesma que tinham visto no
todo o povo de Jerusalém também ficou. 4Então Herodes reuniu os Oriente. Ela foi adiante deles e parou acima do lugar onde o me-
chefes dos sacerdotes e os mestres da Lei e perguntou onde devia nino estava. 10Quando viram a estrela, eles ficaram muito alegres
nascer o Messias. 5Eles responderam: — Na cidade de Belém, na re- e felizes. 11Entraram na casa e encontraram o menino com Maria,
gião da Judeia, pois o profeta escreveu o seguinte: a sua mãe. Então se ajoelharam diante dele e o adoraram. Depois
6
“Você, Belém, da terra de Judá, de modo nenhum é a menor abriram os seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso
entre as principais cidades de Judá, pois de você sairá o líder que e mirra.
12
E num sonho Deus os avisou que não voltassem para falar com
1 Texto da Nova Tradução na Linguagem de Hoje, da Socie- Herodes. Por isso voltaram para a sua terra por outro caminho.
dade Bíblica do Brasil (www.sbb.org.br).

Faz uns 4000 anos mais ou menos que Deus cha-


mou um homem, como, não sabemos, de
sua terra, onde hoje fica o Iraque, para ir a uma terra
nascimento do Rei dos judeus? O fato é que por esta
época se sabia que deveria nascer o Messias Salvador do
mundo. Não só entre os judeus isto era conhecido, mas
totalmente desconhecida para ele. Ele hoje nos é mui- também em muitos outros países. É que os judeus na
to conhecido por meio da história bíblica. Ele é........ época eram grandes comerciantes e viajantes, e muitos
ABRAÃO. Pois este Abraão é, para nós, o símbolo da moravam em grandes cidades da época. Também na
evangelização no AT. Por todos os lugares onde Abraão longínqua Babilônia, onde hoje fica o Iraque, isto era
ia e vivia, ele levantava um altar ao Deus verdadeiro, em sabido. Lá o AT com suas promessas era conhecido en-
meio a um mundo de total idolatria e paganismo. tre os sábios. Lá viveram os profetas Daniel e Ezequiel.
Infelizmente os filhos de Abraão, os israelitas, não Por isso não devemos ficar surpresos se, logo após
entenderam e não cumpriram a sua tarefa de ser um estes sábios terem avistado uma estrela diferente, que
povo especial de Deus com o objetivo de pregar e tes- eles logo entenderam que isto era o sinal de Deus. Logo
temunhar o nome de Senhor Deus ao mundo pagão da encilharam os seus camelos e rumaram para a terra dos
época. judeus, atrás da orientação da referida estrela. Deus lhes
Ontem, dia 6/01, foi o dia assim conhecido pela tinha dado a ver uma estrela especial. Eles obedeceram
tradição litúrgica de Epifania. Ele também é conhe- e logo seguiram o sinal da natureza. Deus acendeu uma
cido pelo nome de “Natal dos gentios”, Natal dos não luz para que os sábios entendessem a mensagem.
judeus, para nós brasileiros conhecido como Dia dos Para nós hoje, a própria natureza é uma “estrela” de
Santos Reis. Deus que nos deve guiar ao encontro de Deus. Toda a
Conforme conclusão dos estudiosos, foi neste dia, natureza criada por Deus brilha sobre nós, ela é como
12 dias após o nascimento de Jesus, que os 3 sábios do milhões de dedos a indicarem para a existência. Lemos
oriente chegaram a Belém e lá encontraram José, Maria no salmo 19.1: “Os céus proclamam a glória de Deus
e Jesus, de acordo com o que lemos em nosso texto. e o firmamento anuncia as obras de suas mãos”. Não
Como é que estas sábios sabiam que a estrela di- há desculpa para os descrentes que não sabem da exis-
ferente que lhes brilhou no Oriente era um sinal do tência do Deus verdadeiro, do Criador de tudo, visto o

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Homilética: Sermão

nosso próprio corpo ser uma verdadeira maravilha divi- “estrela” por meio da qual o Senhor nos quer guiar a ele.
na, criada por um Deus sábio e poderoso. A segunda estrela, com a qual Deus nos quer cha-
Muitas vezes, no entanto, Deus faz brilhar em nos- mar ao seu encontro, é a sua Palavra. Lemos: “Quando
sas vidas estrelas especiais da própria natureza para nos o rei Herodes...... (ler de 3 a 6). A estrela que os sábios
conduzir a ele. Os sinais da natureza: calamidades, do- tinham visto no oriente não continuou a lhes brilhar ao
enças e morte são dedos que apontam para Deus, prin- chegarem a Jerusalém. Lá ela sumiu, se apagou. Eles ti-
cipalmente quando andamos por caminhos errantes. É nham certeza de que era a estrela do Messias. Sua certe-
então que Deus usa os seus “dedos” para conduzir as za os levou a Jerusalém, mas, em chegando lá, ninguém
pessoas a si mesmo, mesmo que isto seja feito por meio sabia lhes dizer nada sobre o Messias. Que decepção
de sofrimentos. Ele então nos corrige e procura levar para eles! Deve ter sido um grande choque para eles.
ao arrependimento, para que não sejamos condenados Vieram de tão longe para adorarem o Messias, e o pró-
junto com os nossos pecados. prio povo, em cujo meio o Salvador nasceu, nada sabia
Por outro lado, quando Deus nos concede alegrias do seu nascimento.
na vida, quando ele nos liberta de perigos e da morte, Quando os sábios já estavam quase ao ponto de de-
que sinais são estes, a não ser “estrelas” pelas quais nos sistirem de tudo e darem meia volta para casa, eis que a
quer achegar a ele? A natureza, portanto, é a primeira segunda estrela começa a brilhar. Deus lhes acendeu a
luz de sua Palavra. A bíblia, diga-se aqui AT, lhes mos-

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 39


Homilética: Sermão

trou que eles não estavam enganados. É que eles espera- prios pensamentos e idéias. Por isso, a religião natural
vam encontrar o novo rei em berço de ouro, no palácio nunca salvou e nunca salvará ninguém! Quem segue as
real. Só que a bíblia os levou a Belém, uma pequena vila suas idéias próprias em questões espirituais é como um
alguns quilômetros distante da capital. A bíblia lhes navegador em alto mar sem bússola. Ele não chegará ao
mostrou o caminho certo, o endereço onde poderiam destino.
encontrar Jesus. E Deus nos deu este guia, esta bússola, esta estrela.
A Palavra de Deus, a bíblia, escrita por homens ins- Mas precisamos usá-la, como um navegador usa a sua
pirados pelo Espírito Santo, é a mais brilhante estrela bússola. Precisamos ouvir a sua Palavra e nela procu-
que conduz peregrinos pecadores deste mundo a Deus. rar Deus e a vida eterna. A Palavra de Deus é a única
A natureza, a 1ª estrela, conforme dissemos, nos diz lâmpada, não interessa se o mundo pagão e até pesso-
que existe um Deus, mas ela não nos diz QUEM é este as dentro da igreja cristã ou mesmo dentro de famílias
Deus. A luz da natureza nos conduz aos nossos pró- cristãs a consideram ultrapassada. Sem a sua luz, as pes-

40 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Homilética: Sermão

soas acabam na desilusão, como desiludidos estiveram tinha acabado de nascer há poucos dias. O único que
os sábios do oriente antes de procurarem nas promessas se preocupou foi o traiçoeiro Herodes. Despertado em
do AT o caminho certo. seu ciúme e em sua inveja, ele procurou logo matar a
Quanto você leu e pesquisou e ouviu a sua bíblia criança de Belém, porque achava que era uma amea-
no ano de 2006? Se você comparar o tempo que gas- ça ao seu reinado. Mas toda a apatia e o desinteresse
tou diante da telinha, vendo “abobrinhas”, com o tem- dos judeus para com Jesus não desanimou os sábios do
po que a sua bíblia pousou em suas mãos, você pode oriente. Eles o adoraram, se ajoelhando diante dele, tão
dizer “Graças a Deus”, que você teve e usou o tempo logo o encontraram, entregando a José e Maria os seus
para crescer no conhecimento da vontade Deus, para tesouros trazidos de longe, se alegrando com “grande
assim você poder dar um melhor testemunho de sua fé e intenso júbilo”. Tinham estudado e visto muitas es-
no Messias Salvador? Ou você foi um desses a quem trelas, mas nenhuma se podia comparar com a Estrela
certo autor num livro chama de “cristãos que envelhe- de Belém. E aí foram de volta para a sua terra, para as
cem mas nunca crescem..... porque suas casas, na certeza de terem encontrado o seu Salva-
decidem não crescer”? Andam ain- dor. Desta forma, através dos sábios do oriente Deus
da, depois de adultos, em sapatinhos levou a notícia da vinda do Salvador ao mundo gentio,
de crochê e quando precisam dar um ao mundo não judeu. E assim este Salvador hoje é co-
testemunho de sua fé, engasgam por- nhecido por nós gentios também.
que não lêem a bíblia. A verdadeira Estrela de Belém é Jesus Cristo. É
A Palavra de Deus traz perdão ele que traz a graça e a felicidade de nos sentirmos ama-
em Cristo, e é só a Palavra de Deus dos por Deus. Como é estimulante e confortador ou-
que trata e que fala do perdão. A Pa- virmos sempre de novo, entra ano, sai ano, que o Deus
lavra de Deus responde perguntas que se revelou em Cristo é o Senhor dos senhores, que
de ordem espiritual. E as que ela não se compadece de nossas fraquezas.
responde, por serem mistérios da fé, Todas as estrelas especiais que Deus possa fa-
estas perguntas Deus nos responderá zer brilhar em nossas vidas: Os dedos da natureza que
na eternidade, pessoalmente. A Pa- apontam para ele, as alegrias e tristezas que ele venha
lavra de Deus nos fortalece a prosse- a nos proporcionar, não levarão a anda, enquanto não
guirmos adiante, não interessa se so- formos levados a imitar os sábios do oriente, enquan-
fremos decepções na vida ou não. A to não dobrarmos os nossos joelhos e nos rendermos
Palavra de Deus nos anima, estimula a ele em fé verdadeira. Não terá sentido conhecermos,
e conforta nas dúvidas e turbulências como falamos acima, a Palavra de Deus pelo uso diário
da vida presente. Esta é a 2ª estrela de e constante da mesma por meio da leitura aplicada, en-
Deus para nós. E esta brilha e ilumi- quanto não acompanharmos em humildade e confian-
na a todo aquele que se aproximar ça os sábios do oriente e nos dobrarmos diante daquele
de sua luz. Ela não falha para quem que é o Caminho, a Verdade e a Vida. “Não existe sal-
nela buscar a luz real e verdadeira em vação em nenhum outro, porque abaixo do céu não foi
Cristo. dado, entre os homens, nenhum outro nome, por meio
Mas existe uma 3ª estrela, a Es- do qual podemos ser salvos”, At 4.12.
trela com letra maiúscula, a grande EPIFANIA, dia da manifestação oficial da gra-
Estrela-Guia, que é o próprio Jesus ça de Deus também aos gentios, é uma festa quase es-
Cristo, o Filho de Deus, verdadeiro quecida dentro da própria igreja luterana.
Deus e verdadeiro homem. Olhemos para a natureza: Nela estão registra-
“Então Herodes chamou...... (ler das as marcas de Deus e de sua existência. Mas em Cris-
de 7 a 12). Nenhuma pessoa, ne- to ele revela o seu amor, pelo qual ele nos salva para a
nhum judeu, nenhum sacerdote foi vida eterna. Amém.
com os sábios quando estes saíram Curitiba-PR, 7/jan/2007
de Jerusalém. Ninguém em Jerusa-
lém se preocupou com Cristo, que Rev. Heldo Bredow, pastor da Igreja Evangélica Luterana do Brasil em Curitiba-PR

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 41


Artigo Rev. David Karnopp

A Epifania e suas

Oportun
O dia 6 de Janeiro é o dia Epi-
fania, onde é lembrada a vi-
sita dos magos, por isso também
nomes deles são: Gaspar, Melquior
e Baltazar. Mas da veracidade disso
também não há certeza.
da primeira manifestação de Cristo
a um povo que não era de entre os
judeus e da primeira demonstração
chamado de “Natal dos gentios”, ou Diz o Evangelista Mateus (Mt de que Cristo é para todos. É o Fi-
seja, Natal dos não judeus (Mt 2.1- 2.1) que eles vieram do Oriente, lho de Deus dando-se a conhecer
12). Pois as primeiras manifestações mas não diz o lugar exato. É possível ao mundo. É um dia para celebrar
se deram por judeus para judeus. que tenha sido da antiga Babilônia, a alegria por Deus nos ter condu-
O termo Epifania vem do grego: onde hoje fica o Irã e o Iraque. Eles zido ao conhecimento do Salvador.
Ἐπιφάνεια: “manifestação, aparição”. viram uma estrela diferente e a se- E, enquanto aguardamos a manifes-
guiram. Sabiam que ela indicava o tação da sua glória, no juízo final,
O dia da Epifania lugar do nascimento de um grande importa continuar adorando e tes-
rei e de ser ele o Messias prometido. temunhando.
O dia da Epifania marca a visita Mas como sabiam disso? Acontece Um agravante é que o dia da Epi-
dos magos ao menino Jesus. Mas que, 500 anos antes, o povo de Isra- fania, 6 de Janeiro, cai num domin-
quem eram eles? De onde e quando el viveu 70 anos no cativeiro babi- go somente a cada sete anos. E como
vieram? Para que vieram? Nos pro- lônico. Ali construíram sinagogas este dia não é feriado nacional, a
gramas de natal apresentam-se os e cultivaram sua religião. Entre eles tendência é que ele passe desperce-
magos como se eles tivessem vindo estava o profeta Daniel e outros pro- bido e a mensagem dele cause pou-
logo após o nascimento de Jesus. fetas. Daniel era um homem extre- co impacto. Tende a ficar apenas a
Mas certamente vieram alguns me- mamente sábio. Ele até foi nome- lembrança do costume, de neste dia,
ses depois. Pois Maria e José já não ado chefe dos sábios da Babilônia. desmontar o pinheirinho de Natal.
estavam mais numa estrebaria, mas Foi conselheiro de sete reis na Babi-
já moravam numa casa. É também lônia. Foi testemunha fiel do Deus A Época da Epifania
provável que eles não eram reis, verdadeiro no palácio destes reis
como diz a tradição, pois a Bíblia que dominaram o mundo na épo- Além do dia próprio, comemo-
não diz isso. Sabemos que eram ma- ca. É possível que ele tenha falado ra-se também a Época de Epifania.
gos. E magos eram homens sábios de uma estrela que indicaria o nas- É o período que liga o nascimento e
que estudavam as estrelas e eram cimento de um novo Rei. Ou seja, a Paixão de Jesus Cristo. O ponto de
pesquisadores de outras ciências. A os sábios da Babilônia conheciam as partida é a visita dos magos ao me-
tradição também diz que eles eram profecias de Daniel não só a respei- nino Jesus.
em número de três, porque foram to do futuro dos reis e da história do Dentro do espírito de manifes-
entregues três presentes. Mas não se universo, mas também do fato de o tação, no domingo seguinte ao dia
tem certeza, podem ter sido mais. Messias ser o Salvador da humani- da Epifania é lembrado o Batismo
Em se tratando de estudiosos, a co- dade. A estrela especial lhes deu a de Jesus. Ele é considerado tão im-
mitiva não dever ter sida pequena. É convicção de que o tempo tinha se portante que os quatro evangelhos
possível que tenham tido um escolta cumprido. Mateus, Marcos, Lucas e João dão
de segurança. Tradicionalmente os O dia da Epifania é a lembrança destaque para ele. E, para acentu-

42 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Artigo

nidades
ar esta importância, os evangelhos
mostram que o céu se abriu e o Es-
pírito de Deus desceu em forma de
o ministério dos apóstolos. A Epi-
fania culmina com a Transfiguração
de Jesus, dia que nos dá uma visão
Deus ao mundo.
No Brasil esta é uma época de
férias escolares e trabalhistas. Mui-
pomba e se ouviu a voz do Pai falan- antecipada da glória no céu. Assim, tos fazem passeios com a família,
do do céu. Jesus sendo batizado, o a ênfase desta época é a manifesta- o que gera um certo esvaziamento
Espírito Santo descendo em forma ção de Jesus Cristo como verdadeiro dos cultos. É também a época onde
de pomba e o Pai falando. É a San-
ta Trindade unida no batismo. Este
grande destaque, dado ao batismo
de Jesus, nos convida a refletirmos
sobre o valor do batismo para nossa
vida. É uma brilhante oportunidade
para falar da importância do batis-
mo.
Na Epifania também é lembrado
o início do ministério de Jesus. As
leituras do evangelho para a época
falam do seu ministério. Uvm desta-
que é o milagre da agua para o vinho
no casamento de Caná. Com este
milagre “ele revelou a sua natureza
divina, e os seus discípulos creram
nele” ( Jo.2.11). Este relato não tem
a intenção de falar do casamento em
si, mas mostrar que obra salvadora
de Jesus estava iniciando.
Na Epifania também é destacado
o trabalho de João batista, o precur-
sor, que apontou para Jesus como
“Cordeiro de Deus que tira o peca-
do do Mundo”( Jo 1.29). As leituras
do Antigo testamento para a época
enfatizam o chamado dos profetas.
Também neles se vê um destaque
na promessa da vinda do Filho de
Deus ao mundo. A epístola e os
evangelhos enfatizam o chamado e

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 43


Artigo

a maioria dos pastores tira férias. E Quais as de homens. É uma grande oportu-
como muitas congregações não têm nidade para enfatizar a vocação ao
um programa de culto para a ausên-
oportunidades que a pastorado e para falar do chamado
cia do seu pastor, acaba-se perdendo Epifania nos fornece? e ministério pastoral.
a rica ênfase da Epifania. As ativida- 2. Tendo ênfase na manifestação,
Ou perguntando de outra forma,
des nas congregações costumam ser a Epifania é uma boa oportunida-
como aproveitar melhor a riqueza
retomadas de forma mais intensa na de para destacar a missão de Deus
da Epifania? E mais, que papel a
Quaresma. E nela tende a ser enfa- no mundo. O espírito missionário
igreja tem na epifania do Senhor?
tizada a piedade pessoal e nem sem- está muito forte nos relatos das di-
O contexto das leituras bíblicas do
pre a obra do Cordeiro de Deus. As- ferentes pessoas que Jesus se deu a
Lecionário Trienal para a Epifania é
sim, geralmente saltamos do Natal conhecer a começar pelos magos
extremamente rico. São estas leitu-
para a Quaresma sem apreciar com do oriente. Entre as muitas abor-
ras a melhor resposta e nos dão vá-
profundidade a riqueza da Epifania. dagens pode-se dizer que a mani-
rias orientações.
A Epifania deveria iluminar o cami- festação de Cristo é a única possi-
1. As leituras do Antigo Testa-
nho da Quaresma para que a peni- bilidade de o ser humano ter acesso
mento e da epístola destacam o cha-
tência da igreja tivesse como base o a Deus e a vida eterna. E a salvação
mado e o ministério dos profetas e
sofrimento de Cristo e seu amor por do pecador só acontece por causa
apóstolos. As leituras dos evange-
nós. da Epifania do Senhor. Epifania é
lhos mostram Jesus chamando seus
a manifestação do amor de Deus
discípulos para serem pescadores
em Cristo Jesus. Cristo continua se
manifestando através da sua Palavra

a s e u s d iscípulos
ham s.
- Jesus c pescadores de homen ito
u
para serem o missionário está m
it s
- O espír latods das diferente
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forte nos Jesus se deu a co-
e o
pessoas qu eçar pelos magos d
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oriente. ntinua se manifesta
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- Cristo sua Palavra.
e
por meio d

44 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Homilética: Sermão

e sacramentos. E, firmados na ação


de Deus em Cristo Jesus, todos os
cristãos são chamados a manifestar
o evangelho em palavras e ações. A
longa viagem em lombo de camelos,
mostra que os magos não mediram
esforços para adorar o menino. Eles
sairam do silêncio, contrariando tal-
vez todos que os desaconselhavam.
Eles tinham um grande propósito
em mente: “Nós vimos a estrela dele
no Oriente e viemos adorá-lo”(Mt
2.2). A Epifania nos conclama a sair
do silêncio da fé e a manifestar ao
mundo que Jesus é o Cordeiro de
Deus que tira o pecado do mundo.
3. Os cultos da Epifania deve- próprio para falar do fundamento seus presentes, o dia da Epifania
riam ter a linguagem da manifesta- bíblico da adoração. Há uma bri- pode ser oportunidade para falar
ção do Senhor e do espírito missio- lhante culminância deste tema no da oferta cristã que nasce do amor
nário. Há vários hinos onde a ênfase dia da Transfiguração, que encerra de Deus. Aquele que crê em Cristo
da epifania é muito rica. Na oração a epifania. Lá o assunto pode ser como seu Salvador, não há de ficar
geral da igreja de cada culto da epi- retomado com o propósito do Pai passivo diante do amor de Deus
fania, pode se orar pelos missioná- falando de seu Filho: “A ele ouvi” e há de se prostrar e adorar ao seu
rios espalhados pelos mundo e pelo (Lc 9.28-36). É a oportunidade Criador e lhe ofertar o melhor da
despertar de novas vocações. para mostrar que o enfoque princi- sua vida.
4. Epifania é o tempo para reafir- pal do culto não está no dar, mas no Em todas as suas manifestações,
mar o “Cristo para todos”, lema da receber de Cristo. E ele se manifes- Jesus mostrou ao povo que é o Filho
Igreja Evangélica Luterana do Bra- ta no culto através da proclamação de Deus, o Cordeiro Deus que veio
sil. Dos nossos púlpitos isso devia da Palavra e da administração dos ao mundo trazer salvação a todos.
ser dito com coragem e ouvido com sacramentos Batismo e Santa Ceia. Que o amor de Deus, manifestado
clareza. O “Rei dos judeus”, veio É época para enfatizar nossa parti- em Cristo Jesus, nos encha de ale-
para salvar o mundo todo, não ape- cipação na Santa Ceia, na qual Jesus gria para adorar, ofertar e testemu-
nas os judeus. se manifesta dando-nos seu corpo e nhar.
5. Lembrando a presença dos sangue. Rev. David Karnopp, pastor da Igreja Evangélica Lute-
6. No gesto de abrirem seus te- rana do Brasil em Vacaria-RS e membro da Comissão
magos que vieram adorar o menino, de Culto da IELB
o dia da Epífania é um momento souros e ofertarem generosamente

Bibliografia
GARLIPP, Luiz Carlos. Sabiam, vieram, adoraram. In Mensageiro Luterano Jan 1990 p.9 Porto Alegre Concórdia Editora LTDA
GEDRAT, Clovis Vitor. A Epifania, a festa da alegria. In Mensageiro Luterano Jan 1989 p.7 Porto Alegre Concórdia Editora LTDA
HOFFMANN, Martinho Lutero. O resgate da Epifania. Mensageiro Luterano Jan 1992 p.5 Porto Alegre Concórdia Editora
LTDA
KARNOPP, David. A Dinâmica do Culto Cristão. Origem prática e simbologia. Porto Alegre Concórdia Editôra, 2003
LINDEN, Gerson. Missão de Deus revela a sua glória em humildade. Preciso Falar 2001 Vol. 1. P 40-41 Porto Alegre: Concórdia
Editora.
WEIRICH, Paulo P. A missão de Deus desfaia a igreja a revelar o Cristo em Alegria. Preciso Falar 2002 p.30-31. Porto Alegre:
Concórdia Editora.
WINTERLE, Carlos Walter. Epifania: Uma declaração de que Cristo é para todos. Mensageiro Luterano Jan 1992 p. 23 Porto
Alegre Concórdia Editora LTDA
WINTERLE, Carlos Walter. Cristo é para todos — na Manifestação gloriosa como Filho de Deus. Mensageiro Luterano Fev
1992 p. 23 Porto Alegre Concórdia Editora LTDA

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 45


Artigo Rev. Horst Kuchenbecker

O Verbo se fez carne, e habitou entr


A encarnação do Verbo, receberam. 12Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder
de serem feitos filhos de Deus; a saber: aos que crêem no seu nome;
João 1.1-141 13
os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem
1
da vontade do homem, mas de Deus.
No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo 14
E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, cheio de graça e
era Deus. 2Ele estava no princípio com Deus. 3Todas as cousas foram de verdade, e vimos a sua glória, glória como do unigênito do Pai.
feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez. 4A
vida estava nele, e a vida era a luz dos homens. 5A luz resplandece
nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra ela. O testemunho de João Batista,
7
6
Houve um homem enviado por Deus, cujo nome era João. 1.15-18
Este veio como testemunha para que testificasse a respeito da luz,
a fim de todos virem a crer por intermédio dele. 8Ele não era a luz, 15
João testemunha a respeito dele e exclama: Este é o de quem
mas veio para que testificasse da luz, 9a saber: a verdadeira luz que, eu disse: O que vem depois de mim tem, contudo, a primazia, por-
vinda ao mundo, ilumina a todo homem. quanto já existia antes de mim.
10
Estava no mundo, o mundo foi feito por intermédio dele, mas 16
Porque todos nós temos recebido da sua plenitude, e graça so-
o mundo não o conheceu. 11Veio para o que era seu, e os seus não o bre graça. 17Porque a lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça
1 Texto da Bíblia Almeida Revista e Atualizada, da Sociedade e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo. 18Ninguém jamais viu
Bíblica do Brasil (www.sbb.org.br) a Deus: o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o revelou.

Natal é uma das principais festas na cristan-


dade. A única festa que tem três cele-
brações num período de vinte e quatro horas: vésperas,
Principais Leituras Bíblicas
As principais leituras bíblicas para o dia festivo de
culto matinal de Natal e o culto de Natal propriamente Natal são: Vésperas: Sl 96.1-10; Is 9.2-7; Tt 2.11-14;
dito; além das celebrações devocionais nos lares. Em Lc 2.1-20; culto matinal: Sl 98.1-7 (Sl 2); Ez 37.24-
nosso meio, os dois eventos mais conhecidos e celebra- 28 (Is 52.7-10); Tt 3.4-8 (Hb 1.1-9); Jo 1.1-14; cul-
dos são: a noite de Natal, com o programa das crianças, to de Natal: Sl 98.1-7; Mq 5.2-4 (Is 62.10-12); Hb
e o culto de Natal. 1.1-5 (Tt 3.4-7) Lc 2.1-20. Vale a pena ler e meditar
sobre esses textos para inteirar-se do espírito de Na-
Encarnação tal. Além disto, é importante relembrar as principais
passagens que falam diretamente sobre a encarnação
O grande destaque nas celebrações, nas quais fes- de Cristo: “Vindo, porém, a plenitude do tempo,
tejamos o nascimento de Jesus Cristo em Belém da Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido
Judéia, é a doutrina da encarnação de Jesus. O Filho sob a lei, para resgatar os que estavam sob a lei, a
de Deus, Jesus Cristo, assumiu, da virgem Maria, fim de que recebêssemos a adoção de filhos”(Gl 4.4).
nossa natureza humana e tornou-se nosso irmão na “Aquele que foi manifestado na carne, foi justificado
carne a fim de salvar a humanidade do pecado, da em espírito, contemplado por anjos, pregado entre
morte e da eterna condenação. Essa verdade é ensina- os gentios, crido no mundo, recebido na glória”(1
da em toda a Escritura e foi proclamada aos pastores Tm 3.16). “Porquanto o que fora impossível à lei, no
pelo anjo: “Eis aqui vos trago boa nova de grande que estava enferma pela carne, isso fez Deus envian-
alegria, que o será para todo o povo: é que hoje vos do o seu próprio Filho em semelhança de carne pe-
nasceu na cidade de Davi, o Salvador, que é Cristo, o caminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, con-
Senhor”(Lc 2.10,11). denou Deus, na carne, o pecado em sua carne”(Rm

46 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Artigo

re nós, cheio de graça e de verdade.


8.3). A palavra “encarnação” significa “tornar-se car- (Jo 1.14)
ne,” isto é, vir a ser pessoa humana, sem degradar ou Texto dos Evangelhos
perder algo de sua natureza divina. O apóstolo Pau-
lo acentua aos filipenses: “Tende em vós o mesmo Os textos dos evangelhos merecem atenção especial.
sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois Três evangelhos contam a história do nascimento de Je-
ele, subsistindo em forma de Deus não julgou como sus: Mateus, Lucas e João. Marcos apresenta Jesus com
usurpação o ser igual a Deus, ...” (Fp 2.5-11). Todos a idade de 30 anos, ao iniciar o seu ministério público.
os atributos essenciais de Deus são atribuídos, na Bí- Ao lermos os evangelhos, precisamos ter em mente que
blia, também a Jesus Cristo como homem. Confira o autor dos mesmos é Deus Espírito Santo. O Espírito
ainda: Gl 4.1-7; Cl 1.13-17; 2.9; Hb 2.14-18; 2 Pe Santo, ao usar os evangelistas para relatarem sobre a
1.2. vida de Jesus, teve um propósito definido: dizer o que

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 47


Artigo

precisamos saber para nossa sal-


vação. Por isso, se um evangelista
relata um fato e o outro não, ou
um relata um fato de um ângulo e
outro evangelista de outro ângulo,
tudo isso serve para nos tornar sá-
bios para a salvação. Não nos cabe
especular sobre o porquê de um
fato e o não de outro, ou tentar
preencher lacunas. O evangelista
Mateus traz a genealogia de José
(Mt 1.1-17). Ele escreve para os ju-
deus e acentua o cumprimento das
profecias. O evangelista Lucas traz
a genealogia de Maria (Lc 3.23-
38) (Obs.: Comparando as duas
genealogias nos deparamos com
diferenças. Qual a explicação? A
explicação mais provável é de que
Lucas traz a genealogia de Maria.
E que a frase: “Como se cuidava,
filho de José”(Lc 3.23), tem o sig-
nificado: “Como o povo supunha
ser filho de José”, e não quer dizer O Verbo (v.1)
especificamente que esta genealogia é a de José.) Mateus
e Lucas destacam a pessoa humana de Jesus. O evange- Nos primeiros cinco versículos, o evangelista João
lista João acentua a divindade de Jesus. O prólogo de fala sobre Jesus, a quem chama de Logos, uma palavra
seu evangelho é o trecho mais belo sobre a encarnação grega que, traduzida, significa: Palavra ou Verbo. Mas
de Jesus Cristo, resumido, claro e maravilhoso. a palavra grega significa mais do que diz a simples tra-
dução em português. Uma palavra é uma idéia expressa
Prólogo, João 1.1-14 pela combinação de sons e letras. Sem a idéia ou o con-
ceito sobre a palavra, as simples letras são vazias e inex-
As palavras introdutórias do evangelho de João, pressivas. Tomemos, por exemplo, a sigla: IELB. Um
chamadas de prólogo, são fundamentais para a com- estranho pode tentar reproduzir os sons destas letras,
preensão de todo o evangelho. Nessas palavras, o mas isso nada significará para ele, se ele não for infor-
evangelista João chama atenção sobre a pessoa de mado sobre o significado dessas letras, a saber: Igreja
Cristo e o profundo mistério de sua encarnação, o Evangélica Luterana do Brasil. Assim também uma
Deus homem. Nossa razão não pode compreender palavra estrangeira. Ela pode ser pronunciada por al-
esse mistério divino. Por isso nos aproximamos desse guém, mas se ele não for informado a respeito da idéia
texto divino com a humilde súplica de que Deus Espí- e do conceito que a palavra encerra, ela nada significará
rito Santo nos ilumine e nos firme na fé. para ele. Isto acontece também com a palavra “Logos”.
O prólogo destaca oito pontos: a) A divindade do Logos é um termo técnico da filosofia grega, e significa:
Verbo (v.1); b) O Verbo, o Criador (v.3); c) A vida a razão controladora do universo, a mente que controla
que está no Verbo (v.4); d) O Verbo, a luz do mundo e dá sentido ao universo. “Logos” na filosofia grega era
(v.5); e) O Verbo que veio para o que era seu (v.11- o conceito mais puro e último da inteligência, a razão
13); f ) O Verbo que se tornou carne (v.14); g) O Ver- ou vontade que era chamado deus, mas um deus im-
bo que revela a Deus (v.18); h) O testemunho de João pessoal.
a respeito do Verbo (v.15). Ao traduzirmos a palavra “Logos” do prólogo de

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Artigo

João, não podemos colocar que — se assim o podemos dizer — o Verbo já existia.
nela simplesmente o conte- O Verbo é o Deus que fala no princípio: “Disse Deus”
údo da filosofia grega, mas é (Gn 1.3). “Façamos (plural) o homem (Gn 1.26). “Pela
preciso ver o significado que fé entendemos que o universo foi formado pela palavra
o evangelista João dá a esta de Deus”(Hb 11.3). “Os céus por sua palavra se fize-
palavra no seu evangelho. A ram ... Pois ele falou, e tudo se fez”(Sl 33.6,9). Jesus,
palavra “Logos” deve ser com- o Verbo, estava com o Pai e o Espírito Santo quando a
preendida na luz da pessoa de boa notícia da salvação foi anunciada a Adão e Eva (Gn
Cristo. Com Jesus de Naza- 3.15). O apóstolo Paulo escreveu: “Ele é antes de todas
ré começou uma nova vida, as cousas”(Cl 1.17). Em Hebreus lemos: “Ele, que é o
uma nova razão e esperança resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser”(Hb
de vida, que o mundo pagão 1.3).
não conhecia. Aqui cabe uma “O Verbo estava com Deus.” Jesus Cristo não é um
observação: Muitos gostam princípio impessoal, não é um atributo de Deus. A pala-
de falar numa nova filosofia vra “com” relaciona duas pessoas. Jesus é uma persona-
de vida. De certa forma pode- lidade viva, inteligente, ativa, que se relaciona, que fala.
mos falar em filosofia de vida. No grego, a palavra Deus neste versículo é usada aqui
Mas como a filosofia é algo a primeira vez sem artigo, isso enfatiza a qualidade do
que o homem desenvolve, não ser Deus; e na segunda vez com artigo, para enfatizar o
gostamos de usar a palavra fi- indivíduo: Jesus, como pessoa divina. Jesus, o agente na
losofia. Realmente Cristo não criação, como pessoa própria, estava com Deus.
nos trouxe uma nova filosofia “O Verbo era Deus.” João dá mais um passo. Ele
de vida, mas vida nova. afirma: “Jesus, o Verbo era Deus.” Não era algo dife-
A grande pergunta, ainda rente ou inferior a Deus, mas ele próprio era Deus. E
hoje muito atual, com a qual o evangelista João se de- ele é Deus não somente para os homens, mas para toda
fronta, é: Quem é Jesus Cristo? É ele o melhor dos ho- a criação. Ele não é simplesmente o começo, ele está
mens, um espírito evoluído (espiritismo), que deve ser no começo. Ele não estava somente com Deus, ele era
admirado e seu exemplo seguido ou é ele o verdadeiro Deus. Por isso confessamos na explicação do Segundo
Deus que deve ser adorado? É ele o maior de todos os Artigo do Credo Apostólico: “Jesus Cristo é verda-
profetas (Islã e Testemunhas de Jeová) ou o Salvador deiro Deus, gerado do Pai desde a eternidade (Sl 2.7;
da humanidade? É nossa atitude para com ele, nosso At 13.33; Hb 1.5; 5.5) e também verdadeiro homem,
caráter ou nossa fé em Cristo que determinará o nosso nascido da virgem Maria, é meu Senhor.” Alguns que-
destino eterno? rem relacionar o salmo 2.7 ao versículo 6, dizendo que
Estas perguntas João responde no evangelho como “gerar” é sinônimo de empossar como rei. Tal exegese é
um todo e no prólogo de forma sucinta, clara e objeti- impossível. Nenhuma artimanha exegética pode tirar a
va ( Jo 1.1-18). Vamos, pois, analisar esta maravilhosa força e a clareza dessas palavras.
exposição, dentro do contexto do evangelho e de toda Que maravilha! Jesus Cristo, nosso Salvador, é ver-
a Escritura. dadeiro Deus. A ele seja toda a honra e todo o louvor,
agora e sempre. Amém.
A) A divindade do Verbo (v.1)
A primeira afirmação a respeito do Verbo é que ele B) O Verbo, o Criador (v.3)
é Deus eterno. João diz: “No princípio era o Verbo.” “Tudo foi feito por intermédio dele, e sem ele nada
Isso lembra o que está escrito no início da Bíblia: “No do que foi feito se fez”(v.3). Jesus é o criador do mundo,
princípio.” A pergunta que João enfoca não é: O que do universo. O apóstolo Paulo reafirma isso ao escre-
era no princípio, mas: Desde quando existe o Logos, o ver: “O mistério que estivera oculto dos séculos e das
Verbo? E a resposta é: No princípio, quando o tempo gerações; agora, todavia, se manifestou aos seus santos;
começou, quando o relógio começou a fazer tique-ta- aos quais Deus quis dar a conhecer qual seja a riqueza

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 49


Artigo

da glória deste mistério entre os gentios, isto é, Cristo C) A vida que está no Verbo (v.4)
em vós, a esperança da glória; o qual nós anunciamos,
advertindo a todo homem e ensinando a todo homem “A vida estava nele e a vida era a luz dos homens.”
em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo O que é vida? Pensamos nos seres animados, na vida
homem perfeito em Cristo; para isso é que eu também vegetal e animal, mas a palavra “vida”, usada pelo evan-
me afadigo, esforçando-me o mais possível, segundo gelista João 54 vezes no seu evangelho, refere-se à ver-
a sua eficácia que opera eficientemente em mim.”(Cl dadeira vida no seu sentido pleno. É a vida que Adão e
1.26-29). “E pôs todas as cousas debaixo dos seus pés Eva possuíram antes da queda em pecado. Eles foram
e, para ser o cabeça de todas as cousas, o deu à igre- criados com a Imagem Divina, que consistiu “no bem-
ja” (Ef 1.22). O salmista declara: “Ele falou, e tudo se -aventurado conhecimento de Deus, perfeita justiça e
fez.”(Sl 33.9). A palavra “tudo” está relacionada ao uni- santidade.” Isto era vida. Verdadeira vida é vida em co-
verso, e inclui todos os elementos e sistemas de leis, a munhão com Deus. E a verdadeira vida estava no Ver-
ordem que rege o universo. As palavras “foram feitas”, bo. O imperfeito da forma verbal não caracteriza um
podemos traduzir também por “vieram a ser,” que é fato histórico passado, mas que Jesus é a fonte eterna da
uma tradução mais exata. O verbo grego (aoristo) ex- verdadeira vida. Verdadeira vida só existe em Deus, em
pressa uma ocorrência, um evento, não um processo. O Jesus Cristo. Fora da comunhão com
evangelista João não está interessado em falar sobre o Deus, não há verdadeira vida.
método usado na criação, mas sobre o fato da criação. “E a vida era a luz dos homens.” Esta
O verbo “era”, no imperfeito, mostra a duração em con- luz não é uma capacidade racional,
traste com o verbo existir. O Verbo, o Criador é eterno; mas “a que ilumina a todo o homem.”
a matéria, o universo é temporal. Em que sentido? O termo “trevas” no
A obra da criação é obra da Trindade. Lemos na car- versículo 5 aponta para o conflito en-
ta aos hebreus: “Havendo Deus, outrora, falado muitas tre a luz e as trevas. Trevas lembram o
vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, mundo caído em pecado. Deus criou
nestes últimos dias nos falou pelo Filho a quem consti- tudo perfeito. Mas um grupo de anjos
tuiu herdeiro de todas as cousas, pelo qual também fez se rebelou contra Deus e Deus os con-
o universo. Ele, que é o resplendor da glória e a expres- denou ao inferno. A Escritura afirma:
são exata do seu Ser, sustentando todas as cousas pela “Aos anjos, os que não guardaram o
palavra do seu poder.”(Hb 1.1-3). seu estado original, mas abandona-
Verbo não criou somente o universo, ele também ram o seu próprio domicílio, ele tem
o sustenta. Em sua grande passagem cristológica, o guardado sob trevas, em algemas eter-
apóstolo Paulo afirma: “Pois nele foram criadas todas nas, para o juízo do grande dia”( Jd 6).
as cousas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisí- Esses anjos aproveitaram sua liberdade
veis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, condicional e tentaram os primeiros
quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para homens. E Adão e Eva, de livre e es-
ele”(Cl 1.16). pontânea vontade, deixaram-se sedu-
Muitos estudiosos da Bíblia vêem na afirmação do zir e desobedeceram a Deus. Caíram
rei Salomão, que “personifica a sabedoria,” uma refe- em pecado e nas trevas. O homem,
rência à pessoa de Cristo: “O Senhor me possuía no despido da imagem divina, está des-
início de sua obra, antes de suas obras mais antigas. qualificado para viver em comunhão
Desde a eternidade fui estabelecida, desde o princípio, com Deus. Após a queda em pecado,
antes do começo da terra ...” (Pv 8.22-31). Aqui é des- os homens foram expulsos da presen-
crita uma pessoa, a sabedoria, que está com Deus desde ça de Deus, do paraíso. Desde lá nas-
o começo e participa com Deus Pai na criação. Lutero e cemos com o pecado original. “O pe-
outros acreditam que esta pessoa, a sabedoria, é Cristo. cado original é a completa corrupção
Que maravilha! Jesus Cristo, nosso Salvador, é o de toda a natureza humana, privada
criador e mantenedor do universo. A ele seja toda a da justiça original, inclinada para todo
honra e todo o louvor, agora e sempre. Amém. o mal, sujeita à condenação.” Somos

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incapazes de nos regenerarmos por esforço próprio. nhor são a causa de não sermos consumidos, porque as
Mesmo que alguém se esforce e adquira honrosa justiça suas misericórdias não têm fim” (Lm 3.22). Deus amou
diante dos homens, a ponto de ser considerado homem o mundo e enviou o seu Filho unigênito para remover
bom e reto, diante dos olhos de Deus o homem per- as trevas. A vida do Verbo trouxe luz e esperança. Esta
manece pecador, “morto em seus delitos e pecados”(Ef vida é a luz dos homens. Não luz natural, mas a graça
2.1,5). Precisamos de um salvador, de uma força sobre- de Cristo, o perdão dos pecados que reestabeleceu a
natural para sermos salvos da ruína eterna. O relato verdadeira vida em comunhão com Deus e a esperança
de Gênesis 1.1-3, mostra que as trevas cósmicas foram da vida eterna a todo o que crê. Maravilhado, João es-
substituídas por ordem divina pela luz, ao Deus dizer: creve: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que
“Haja luz!” Isto é o pano de fundo para a encarnação do deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê
Verbo. João mostra que este mundo precisava do Verbo não pereça, mas tenha a vida eterna. Porquanto Deus
para remover as trevas do pecado. O mundo é incapaz enviou o seu Filho ao mundo, não para que julgasse
de salvar-se a si próprio. Em seu grande amor para com o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele.
a humanidade, Deus veio a Adão e Eva e lhes prometeu Quem nele crê não é julgado; o que não crê já está jul-
salvação. O profeta afirma: “As misericórdias do Se- gado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho
de Deus.”( Jo 3.16-18).
A palavra “verdade” refere-se à verdade em contraste
ao erro. A mesma palavra “verdade” é usada a respeito
de Deus em Jo 17.3: “E a vida eterna é esta: que te co-
nheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo,
a quem enviaste”. Por isso a oração de Jesus: “Santifica-
-os na verdade; a tua palavra é a verdade”( Jo 17.17).Te-
mos a capacidade de ler a Bíblia e até considerá-la como
uma verdade. Mas aceitar como a verdade e confiar nela
plenamente, só pela iluminação do Espírito Santo, que
atua pela palavra. Daí a oração: “Santifica-nos na verda-
de.” A ênfase está no caráter último do ser Deus, que é
a verdade. Do Verbo provém a verdadeira iluminação
espiritual, o verdadeiro conhecimento de Deus, de sua
graça e do seu amor. A verdadeira sabedoria é conhe-
cer a Cristo e confiar nele. Este tem a verdadeira vida, a
vida eterna. O apóstolo Paulo afirma: “Cristo Jesus, o
qual se nos tornou da parte de Deus sabedoria, e justi-
ça, e santificação, e redenção”(1 Co 1.30).
Que maravilha! Jesus Cristo, verdadeiro Deus e
verdadeiro homem, nosso Salvador, trouxe de volta a
verdadeira vida, o perdão dos pecados, pelo qual temos
paz com Deus e a esperança da vida eterna. A ele seja
toda a honra e o todo o louvor, agora e sempre. Amém.

D) O Verbo, a luz do mundo (v. 5)


Nos versículos 6 a 9, o evangelista João descreve a
vinda de Cristo, o Verbo, ao mundo e sua humanação.
Contemplamos o Verbo como o eterno, agora João fala
da encarnação do Verbo no tempo. O apóstolo Pau-
lo escreveu a respeito: “Vindo, porém, a plenitude do
tempo, Deus enviou o seu Filho, nascido de mulher,

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nascido sob a lei, para resgatar os que estavam sob a lei, para os judeus, loucura para os gen-
a fim de que recebêssemos a adoção de filhos. E, por- tios”(1 Co 1.23).E conclui: “Mas,
que vós sois filhos, enviou Deus aos nossos corações o a todos quantos o receberam,
Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai.”(Gl 4.4,5). deu-lhes o poder de serem fei-
João relaciona a missão de João Batista com a vinda do tos filhos de Deus; a saber: aos
Verbo. João Batista foi enviado para preparar o cami- que crêem no seu nome (v.12).”
nho para Cristo, a perfeita “luz do mundo.” A palavra Isto é um ato da misericórdia de
mundo é usada 72 vezes no evangelho de João. Aqui o Deus. Crer na graça de Cristo
termo mundo é aplicado ao envolvimento espiritual e é a chave para ser recebido
material, no qual vive a humanidade. O Verbo entrou pelo Verbo que veio ao mun-
na estrutura da vida do mundo e tomou parte dela. do.
Cristo veio ao mundo durante o reinado de Cesar Que maravilha! Todo aquele
Augusto. Jesus viveu 30 anos com seus pais, nos deve- que nele crê tem perdão dos peca-
res domésticos. Aos trinta anos começou o seu minis- dos. E onde há perdão dos pecados,
tério profético e sacerdotal propriamente dito. Atuou há também vida e eterna salvação. A ele
três anos na Palestina, locomovendo-se entre Jerusalém seja toda a honra e todo o louvor, agora e
e a Galiléia, ensinando, curando e revelando-se como sempre. Amém.
o Messias prometido, o Filho de Deus. Mas o mun-
do, tanto judaico como gentílico, conforme relatam F) O Verbo que se tornou
os evangelhos, só tomou conhecimento superficial de carne (v.14)
Cristo. Mesmo seus discípulos custaram a compreen-
der a pessoa e obra de Cristo. Só a compreenderam a Nos versículos 14 a 18, o evangelista
partir de Pentecostes (At l.7). João fala especificamente da encarnação
Que maravilha! Jesus Cristo, verdadeiro Deus e ho- do Verbo. O versículo 14, mesmo curto,
mem, trouxe luz para o meio das trevas. “Agora temos é rico em conteúdo e contém assunto sufi-
salvação de graça e por bondade.” A ele seja toda a hon- ciente para um livro. O eterno Filho de Deus,
ra e todo o louvor, agora e sempre. Amém. nosso Salvador, aceitou a natureza humana
para salvar os pecadores. Isso não foi uma meta-
E) O Verbo veio para o que morfose, como de uma lagarta que se transforma
em borboleta. O divino uniu-se à natureza humana,
era seu (v.11-13) o infinito ao finito. Esse é o grande mistério da huma-
Os versículos 11 a 13, ampliam ainda mais o termo nação de Cristo.
“mundo,” como sinônimo da humanidade, e ao mesmo O versículo 14 é chave do prólogo. A palavra Verbo,
tempo o individualiza. “Veio para o que era seu, e os neste versículo, é conectada com a palavra Verbo dos
seus não o receberam”(v.11). Os indivíduos que com- versículos 1 e 2. O primeiro versículo fala da natureza
põem o mundo, que são suas criaturas necessitadas, às eterna do Verbo e de seu relacionamento com Deus; o
quais Jesus veio salvar, não lhe deram as boas vindas. v.14 fala do relacionamento do Verbo com o mundo
Sendo Jesus o Criador do mundo, quando ele nasceu, dos homens. Jesus, o eterno e majestoso Filho de Deus,
veio para o que lhe pertencia (Cf.: Jo 16.32; 19.27). Ele assume a natureza humana visível, audível e tangível.
“veio para o seu próprio lar.” Mas mesmo seu próprio Lemos em Hebreus: “Visto, pois, que os filhos tem
povo, os judeus, povo formado e escolhido por Deus, participação comum de carne e sangue, destes também
não o recebeu. A idéia de “vir ao que era seu” é a ex- ele, igualmente participou, para que, por sua morte,
pressão que Jesus usou nas parábolas do administrador destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o
infiel (Mt 21.33-46; Mc 12.1-12; Lc 20.9-16). Cristo diabo, e livrasse a todos que, pelo pavor da morte, esta-
foi aceito pelos samaritanos ( Jo 4), foi procurado pelos vam sujeitos à escravidão por toda a vida”(Hb 2.14,15).
gentios gregos ( Jo 12.20), mas foi rejeitado pelos repre- Jesus tornou-se homem como nós em todas as cousas,
sentantes oficiais do seu povo. Bem atesta o apóstolo exceto o pecado. Como nós, ele nasceu de mulher, da
Paulo: “Nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo virgem, conforme o anjo anunciara a Maria: “Descerá

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sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te Cristo. “A humilhação de Cristo, que iniciou com sua
envolverá com a sua sombra; por isso também concepção e foi até o seu sepultamento, consistiu em
o ente santo que há de nascer, será chamado Jesus não ter usado sempre e inteiramente a majestade
Filho de Deus.”(Lc 1.35; Is 7.14). O Es- divina, comunicada à sua natureza humana.” A Escri-
pírito Santo, “que com sua sombra tura afirma: “Tende em vós o mesmo sentimento que
envolve Maria”, não gera o Filho, houve também em Jesus Cristo, pois ele, subsistindo
não é o Pai de Jesus, mas o espí- em forma de Deus não julgou como usurpação o ser
rito criador que atua em Maria. Lucas relata que, tal igual a Deus; antes a si mesmo se esvaziou assumindo
como nós, ele cresceu corporalmente “em estatura e a forma de servo”(Fp 2.5-8). “E a exaltação de Cristo,
sabedoria” (Lc 2.52). Tal como nós, ele passou fome, que iniciou com sua descida ao inferno, para proclamar
sede, comeu, bebeu, dormiu, estava cansado, sentiu sua vitória, e consiste em ele usar sempre e inteiramen-
dor, alegria, maravilhava-se e tinha compaixão. Ele te a majestade divina comunicada à sua natureza hu-
brincou, leu a Escritura, sofreu, foi tentado, der- mana.” A Escritura afirma: “Pelo que também Deus o
ramou seu sangue, morreu e foi sepultado, ressuscitou exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima
e subiu ao céu. de todo o nome, para que ao nome de Jesus se dobre
“O Verbo habitou entre nós.” A palavra “habi- todo o joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e
tar”, no original, lembra o “tabernáculo,” no qual toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para a
Deus habitou no meio do seu povo Israel, glória de Deus Pai”(Fp 2.9-11). (Definições do Cate-
no Antigo Testamento. O evangelista cismo Menor). Esta união das duas pessoas, a divina e a
João, no seu livro de Apocalipse, aponta humana numa só pessoa, e a comunicação de suas qua-
para Jesus e o chama de “o tabernáculo lidades uma à outra é um dos grandes mistérios da reli-
de Deus entre os homens”(Ap 21.3). Ta- gião cristã. Esse mistério não pode ser desvendado pela
bernáculo é uma tenda. A palavra taber- razão humana, nem serve para especulações, só pode
náculo é usada somente 5 ser aceito por fé.
vezes no Novo Essa habitação de Cristo no mundo entre os ho-
Testamen- mens foi reconhecida pelos discípulos. João escreve:
to: Jo 1.14 “E vimos a sua glória, glória como do unigênito do
(habitação); Pai”(v.14). “Vimos,” quer dizer observamos. Isso é mais
Ap 2.13; 12.12; do que um simples golpe de vista. A vida de Jesus foi
13.6; 21.3; duas vezes observada e examinada nas mais diferentes situações.
se refere a Deus. Assim como Todas as observações possíveis foram dadas por Cristo
no Antigo Testamento, Deus estava a seus contemporâneos.
presente entre o seu povo, no tabernácu- E João dá o seu testemunho bem pessoal: “Porque
lo, de dia na nuvem e de noite na coluna de fogo todos nós temos recebido da sua plenitude, e graça so-
(Nm 14.14), para o guiar. Jesus veio ao mundo para es- bre graça.” ( Jo 1.16). E Pedro confessou: “Tu és o Cris-
tar no meio da humanidade, como nosso irmão na car- to, o Filho do Deus vivo”(Mt 16.16). Em sua carta João
ne, para a salvar e guiar ao lar celestial. testemunha: “O que era desde o princípio, o que temos
O Verbo se tornou carne. Essa união é definitiva para ouvido, o que temos visto com os nossos próprios olhos,
toda a eternidade. A partir da concepção, em nenhum o que contemplamos e as nossas mãos apalparam, com
momento estas duas naturezas, a divina e a humana respeito ao Verbo da vida e a vida se manifestou, e nós
unidas na pessoa de Cristo, se separaram. Jesus sempre a temos visto, e dela damos testemunho e vo-la anun-
foi, em todos os momentos, mesmo nos momentos da ciamos, a vida eterna, a qual estava com o Pai e nos foi
mais profunda humilhação, como na sua concepção manifestada, o que temos visto e ouvido anunciamos
ou crucificação, verdadeiro Deus. Como também o é também a vós outros, para que vós igualmente man-
agora, no seu estado de exaltação, sempre verdadeiro tenhais comunhão conosco. Ora, a nossa comunhão é
homem. Para compreendermos isto — até onde nos é com o Pai e com seu Filho Jesus Cristo”(1 Jo 1.1-3).
possível captar esse mistério com a razão — precisamos Aqui precisamos levantar mais uma pergunta: Por
lembrar em que consistiu a humilhação e a exaltação de que o nosso Salvador tinha que ser verdadeiro Deus e

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Artigo

verdadeiro homem? Nosso Catecismo responde à base


da Escritura: “Nosso Redentor tinha quer ser verdadei-
ro homem, para que, como substituto de todos os ho-
mens, pudesse cumprir a lei, padecer e morrer.” A Escri-
tura afirma: “Visto, pois, que os filhos têm participação
comum de carne e sangue, destes também ele, igual-
mente, participou, para que, por sua morte, destruísse
aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo”(Hb
2.14). Por que nosso Salvador tinha que ser verdadeiro
Deus? “Nosso Redentor tinha que ser verdadeiro Deus,
para que pudesse expiar a ira de Deus e vencer o peca-
do, a morte e o diabo.” A Escritura afirma: “Ao irmão,
verdadeiramente, ninguém o pode remir, nem pagar
por ele a Deus o seu resgate, pois a redenção da alma
deles é caríssima, e cessará a tentativa para sempre”(Sl
49.7,8).
Para salvar a humanidade, nosso Salvador tinha
que ser verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Por isso
o Verbo se tornou carne e habitou entre nós, cheio de
graça e de verdade.”
Que maravilha! Jesus desceu do céu e tornou-se nos-
so irmão na carne. E como nosso substituto cumpriu a
lei, pagou a nossa dívida e nos libertou de nossos inimi-
gos: pecado, morte e Satanás. A ele seja toda a honra e
todo o louvor, agora e sempre. Amém.

G) O Verbo, que revela a Deus (v.18) Por isso o apóstolo afirma: “Certamente a palavra da
O clímax do prólogo está no versículo 18. “Nin- cruz é loucura para os que se perdem, mas para nós, que
guém jamais viu a Deus: o Deus unigênito, que está somos salvos, poder de Deus. Pois está escrito: “Des-
no seio do Pai, é quem o revelou.” Deus é invisível. A truirei a sabedoria dos sábios e aniquilarei a inteligên-
essência da divindade nunca poderá ser vista por um cia dos entendidos.” Onde está o sábio? onde o escriba?
ser humano. Como Deus havia dito a Moisés: “Não me onde o inquiridor deste século? Porventura não tor-
poderás ver a face, porquanto homem nenhum verá a nou Deus louca a sabedoria do mundo? Visto como,
minha face, e viverá” (Êx 33.20). Mas o caráter de Deus na sabedoria de Deus, o mundo não o conheceu por
pode ser visto no Filho, é a plena expressão da vida e sua própria sabedoria, aprouve a Deus salvar aos que
do amor do Pai. A expressão “no seio do Pai,” revela a crêem, pela loucura da pregação. Porque tanto os ju-
união e o amor entre o Pai e o Filho. A natureza invi- deus pedem sinais, como os gregos buscam sabedoria;
sível e misteriosa de Deus é revelada é trazida à luz por mas nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para
um que é qualificado para fazê-lo, o Filho de Deus. os judeus, loucura para os gentios; mas para os que fo-
Ao Deus revelar-se em seu unigênito Filho, Jesus ram chamados, tanto judeus como gregos, pregamos a
Cristo, ele o fez “ao contrário”, isto é, de uma forma não Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus. Porque a
esperada. Ele veio pobre, fraco, e morreu numa cruz. loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a

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Artigo

Verbo: 1) O Verbo na eternidade; 2) o Verbo que nas-


ceu em Belém e recebe o nome de Jesus; e 3) o início do
ministério do Verbo aos 30 anos. João Batista recebe
não menos do que seis versículos no Prólogo, descre-
vendo o seu relacionamento com o Verbo.
O aparecimento de Jesus de Nazaré na Palestina não
foi um evento repentino. Ele foi anunciado por muitos
profetas durante um período de 4 mil anos, conforme
relata o Antigo Testamento. Vale a pena conferir as
principais profecias a respeito da pessoa e obra de Jesus
Cristo. (Gn 3.l5; 12.1-3; 49.10; Nm 24.17; Dt 18.15;
2 Sm 7.12; Sl 2; 110.1; Is 7.14; 11.1,2; 9.6; 28.16; 42.1;
52.13; 53; 60.1,2; Jr 23.5,6; Ez 34.23; Zc 9.9; Ml 4.2)
O último profeta foi Malaquias. Então seguiram-se
400 anos de silêncio. Após o que surgiu João Batista
que levantou sua voz nas proximidades do rio Jordão e
clamou: “Está próximo o reino de Deus.”(Mt 3.2). João
Batista recusou ser identificado como Cristo, a luz do
mundo. João testemunhou: “Este é o de quem eu disse:
O que vem depois de mim tem, contudo, a primazia,
porquanto já existia antes de mim”(v.15). E outro dia,
vendo a Jesus, apontou para ele e exclamou: “Eis o Cor-
deiro de Deus que tira o pecado do mundo”(v.29).
João Batista tinha discípulos os quais ele dirigiu
para Jesus. João e André estavam entre eles. Em cone-
xão com o seu testemunho a respeito do Verbo, afirma:
fraqueza de Deus é mais forte do que os homens”(1 Co “Pois eu de fato vi, e tenho testificado que ele é o Filho
1.18-25). Hoje ele vem a nós por sua palavra, quando de Deus” (v.34). Este é um dos muitos testemunhos
retamente ensinada, e por seus sacramentos, quando que João dá em seu evangelho. Diante disso a cristan-
administrados conforme instituídos. dade confessa no Credo Ecumênico, chamado Atana-
Estas duas verdades: que o verdadeiro Deus é um só siano (ano 451 AD):
Deus em três pessoas e que Jesus Cristo, a segunda pes- “Aquele que quiser ser salvo, antes de tudo deverá
soa da Trindade, é também verdadeiro homem, nasci- ter a verdadeira fé cristã.
do da virgem Maria, nosso único e suficiente Salvador, Aquele que não a conservar em sua totalidade e
distinguem a religião cristã de todas as outras religiões. pureza, sem dúvida perecerá eternamente. E a verda-
Que maravilha! Jesus nos revela o profundo amor deira fé cristã é esta, que honremos um único Deus na
do Pai, para que todo o que nele crê não pereça, mas Trindade e a Trindade na Unidade, não confundindo
tenha a vida eterna. A ele seja toda a honra e todo o as pessoas nem dividindo a substância divina. Pois uma
louvor, agora e para sempre. Amém. é a pessoa do Pai, outra a do Filho e outra a do Espíri-
O testemunho de João a respeito do Verbo (1.15- to Santo; mas o Pai, o Filho e o Espírito Santo são um
18) único Deus, iguais em glória e majestade eterna. Qual
O prólogo fala de três tempos relacionados com o o Pai, tal o Filho e tal o Espírito Santo. O Pai é incria-

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Artigo

do, o Filho é incriado, o Espírito Santo é incriado. O ceu pela nossa salvação, desceu ao inferno, no terceiro
Pai é incomensurável, o Filho é incomensurável, o Es- dia ressuscitou dos mortos. Subiu ao céu, está sentado
pírito Santo é incomensurável. O pai é eterno, o Filho à direita de Deus Pai todo poderoso, donde há de vir a
é eterno, o Espírito Santo é eterno. Contudo não são julgar os vivos e os mortos. E quando vier, todos os ho-
três Eternos, mas um único Eterno. Do mesmo modo mens hão de ressuscitar com os seus corpos e dar
não são três Incriados, nem três Incomensuráveis, mas contas de seus próprios atos, e aqueles que fize-
um único Incriado e um único Incomensurável. Da ram o bem irão para a vida eterna, mas aqueles
mesma maneira, o Pai é todo-poderoso, o Filho é to- que fizeram o mal, para o fogo eterno. Esta é a
do-poderoso, o Espírito Santo é todo-poderoso; con- verdadeira fé cristã. Aquele que não crer com
tudo, não são três Todo Poderosos, mas um único firmeza e fidelidade, não poderá ser salvo.”
Todo-Poderoso. Assim, o Pai é Deus, o Filho é Deus, Este é o poderoso testemunho do evange-
o Espírito Santo é Deus; todavia, não são três Deuses, lista João no prólogo do seu evangelho. Jesus
mas um único Deus. Deste modo o Pai é Senhor, o Cristo é o verda-
Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor; entretanto, deiro Filho de
não são três Senhores, mas um único Senhor. Visto Deus, igual
que, segundo a verdade cristã, nos importa confessar ao Pai
cada pessoa por sua vez como sendo Deus e Senhor, e ao Es-
é-nos proibido pela fé cristã dizer que há três Deuses e pírito
três Senhores. O Pai por ninguém foi feito, nem cria- Santo
do, nem gerado. O Filho provém apenas do Pai, não em poder e
foi feito, nem criado, mas gerado. O Espírito Santo não majestade, que
foi feito, nem criado, nem gerado pelo Pai e pelo Filho, veio ao mundo e se
mas deles procede. encarnou na virgem Maria. Desde a concepção é,
Logo, é um único Pai, não são três Pais; um único agora, verdadeiro Deus e verdadeiro homem uma
Filho, não três Filhos; um único Espírito Santo, não só pessoa. E hoje, glorificado, enche como homem
três Espíritos Santos. E nesta Trindade nenhuma pes- céus e terra. O Pai deu-lhe todo o poder sobre céu
soa é anterior ou posterior, nenhuma maior ou menor; e terra. Ele virá um dia em glória para julgar vivos
mas todas as três pessoas são coeternas e iguais entre e mortos. “Bem-aventurados aqueles que lavam as
si; de modo que, como foi dito, em tudo seja honra- suas vestiduras no sangue do Cordeiro, para que
da a Trindade na Unidade e a Unidade na Trindade. lhes assista o direito à árvore da vida, e entrem na
Portanto, quem quiser ser salvo, deverá pensar assim cidade pelas portas”(Ap 22.14).
da Trindade. Entretanto, é necessário para a salvação Por isso, escreve João no evangelho: “E a vida
eterna crer também fielmente na humanação de nosso eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus
Senhor Jesus Cristo. Esta é, portanto, a fé verdadeira: verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste”( Jo
crermos e confessarmos que nosso Senhor Jesus Cristo, 17.3). E Jesus diz: “Bem-aventurado é aquele que
o Filho de Deus, é Deus e Homem. É Deus da substân- não achar em mim motivo de tropeço”(Mt 11.6).
cia do Pai, gerado antes dos tempos, e Homem da subs- E: “Bem-aventurado são os que ouvem a palavra
tância de sua mãe, nascido no tempo; Deus perfeito e de Deus e a guarda!”(Lc 11.28).”
Homem perfeito, subsistindo em alma racional e car- Que maravilha! Que Deus em sua graça nos
ne humana. Igual ao Pai segundo a divindade e menor fortaleça a fé no Salvador Jesus. A ele seja toda a
do que o Pai segundo a sua humanidade. Ainda que é honra e todo o louvor, agora e sempre. Amém.
Deus e Homem, nem por isso são dois, mas um único
Cristo, um só, não pela transformação da divindade em Conclusão
humanidade, mas mediante a recepção da humanidade
na divindade. É, de fato, um só, não pela fusão das duas Você crê isso? Talvez você dirá: Quem me
substâncias, mas por unidade de pessoa. Pois, assim dera, pudesse? Mas isso tudo vai contra minha
como corpo e alma racional constituem um único ho- razão. É verdade. Por isso, o apóstolo João afir-
mem, Deus e Homem é um único Cristo, o qual pade- ma: “Veio para o que era seu, e os seus não o re-

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Artigo

ceberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o nhecer a Jesus, o Filho de Deus, como nosso único e
poder de serem feitos filhos de Deus; a saber: aos que suficiente Salvador e confiar nele plenamente. E ele
crêem no seu nome; os quais não nasceram do sangue, opera esta fé nos que não lhe resistem obstinadamen-
nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, te. Esta fé se apega à palavra escrita, quer o compre-
mas de Deus”( Jo 1.11,12). Confessamos na exposi- endamos ou não, quer o sintamos ou não. O Espírito
ção do terceiro Artigo do Credo Apostólico: “Creio Santo nos mostra que a palavra é confiável. Haverá
que por minha própria razão ou força não posso crer tentações, lutas, dúvidas, mas o Espírito Santo nos
em Jesus Cristo, meu Senhor, nem vir a ele. Mas o ampara, para voltarmos sempre à palavra e deposi-
Espírito Santo me chamou pelo evangelho, ilumi- tar nela nossa confiança. Com ela podemos apagar
nou com seus dons, santificou e conservou na verda- as setas inflamadas do maligno (Ef 6.16). Quando
deira fé.” Por sermos espiritualmente cegos, mortos alguém chega a esta convicção, ele sabe, “não foi por
e inimigos de Deus, não minha inteligência que cheguei a este conhecimento
aceitamos essa palavra e convicção, mas foi a graça de Deus Espírito Santo
de Deus nem con- que me regenerou.” E quando alguém se perde pre-
fiamos nela. É cisará confessar: Eu não quis. Confessamos no Cre-
preciso que do Apostólico: “Nesta cristandade perdoa a mim e
Deus Espí- a todos os crentes diária e abundantemente todos os
rito Santo pecados, e no dia derradeiro me ressuscitará a mim e
nos ilumine, a todos os mortos, e me dará a mim e a todos os cren-
nos convença de tes em Cristo a vida eterna. Isto é certamente verdade.
nossa pecaminosi- Amém.
dade e nos faça reco-
Rev. Horst Reinhold Kuchenbecker, Igreja Evangélica Luterana do Brasil

Oração — Te Deum Laudamus


A ti, ó Deus, louvamos, e por Senhor nosso confessamos. Tu, quando venceste o aguilhão da morte, abriste a todos
A ti, ó eterno Pai, adora toda a terra. os fiéis o reino celeste.
A ti clamam todos os anjos, os céus e todas as suas Tu, à mão direita de Deus, estás sentado na glória do Pai.
potestades; Cremos que virás ser nosso Juiz.
A ti os querubins e os serafins continuamente bradam: Portanto te suplicamos socorras a teus servos,
santo, santo, santo, Senhor Deus dos Exércitos; aos quais com teu precioso sangue redimiste.
os céus e a terra estão cheios da majestade da tua glória. Faze com que o número de teus santos sejam contados na
A ti louva o glorioso coro dos apóstolos. glória sempiterna.
A ti louva a santa congregação dos profetas. Ó Senhor, salva teu povo e abençoa a tua herança.
A ti louva o nobre exército dos mártires. Governa-o e exalta-o perpetuamente.
A ti reconhece, por toda a terra, a santa igreja: Dia após dia a ti magnificamos;
como o Pai de infinita majestade; E glorificamos teu nome pelos séculos dos séculos.
como adorável, verdadeiro e único Filho; Digna-te, ó Senhor, conservar-nos hoje sem pecado.
e como o Espírito Santo, o Consolador. Ó Senhor, tem misericórdia de nós, tem misericórdia de
Tu és o Rei da glória, ó Cristo. nós.
Tu és do Pai, o sempiterno Filho. Ó Senhor, seja sobre nós tua misericórdia, pois em ti está
Tu, quando tomaste sobre ti livrar o homem, te humi- toda a nossa confiança.
lhaste a nascer duma virgem. Em ti, ó Senhor, tenho confiado, não me deixes jamais ser
confundido. Amém.
Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 57
Artigo Rev. Maximiliano W. Silva

biblicamente falando
Não tenho a pretensão de
esgotar o assunto pro-
posto pelo título. Reparto contigo
ensina isto.
A Concordância Bíblica edita-
da pela Sociedade Bíblica do Brasil
rael, Moisés, foi “tirado das águas”
(Êxodo 2.10). No Salmo 23, um
dos textos bíblicos mais popu-
alguns pensamentos, na esperança apresenta 662 referências à palavra lares do mundo, pedimos que
que sejam sementes. Eis o que quero “água” na Tradução Revista e Atua- nosso Bom Pastor nos leve às
partilhar: lizada de João Ferreira de Almeida. “águas de descanso” (Salmo
Inimigas declaradas na percep- Isto não é pouca coisa. Do Gênesis 23.2). Apocalipse, último li-
ção de muitos teólogos e cientistas, ao Apocalipse ela está presente. Na vro da Bíblia, diz, próximo à
a Teoria Evolucionista e a Proposta verdade, já estava aqui antes de nós. sua conclusão: “Aquele que
Criacionista se tocam em alguns Os dois primeiros versículos da Bí- tem sede venha, e quem quiser
pontos. Um deles refere-se ao lo- blia nos dizem: “No princípio criou receba de graça a água da vida”
cal onde a vida animal começou: a Deus os céus e a terra... e o Espírito (Apocalipse 22.17b).
água. Portanto, existe, desde o iní- de Deus pairava sobre as águas”. A Obviamente, a Bíblia não atribui
cio, um marcante elo entre a água e água também foi usada como juízo nenhum poder mágico à água. Ela,
a vida. De certa maneira a mente do de Deus quando “vieram sobre a em si, é parte da criação de Deus,
homem carrega esta marca: água é terra as águas do dilúvio” (Gênesis sendo, portanto, um meio para os
vida. 7.10). Um juízo que renovou a ter- seus propósitos. No entanto, a água
Infelizmente, nem todas as mar- ra dominada pela maldade humana. é frequentemente usada em cone-
cas na mente do homem o impelem O grande libertador do povo de Is-
a fazer a coisa certa. Até porque es-
tas marcas são diversas, e o homem
parece ter uma tendência a escolher
aquilo que lhe provoca o mal. Deve
ser a tal pulsão de morte da qual nos
falava Freud. Mas bem, voltemos
àquilo sobre o que eu quero falar:
água é vida, e também a Bíblia nos

58 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Artigo

xão com as promessas e bênçãos de do que é palpável e visível podemos mente, angustiante. Jesus apresen-
Deus. Isto acontece nas figuras de entender melhor aquilo que é espi- ta-se como a “água viva” ( João 4).
linguagem ou no uso da água en- ritual e invisível. Sua escolha fala de Bebemos dele, e através dele temos
quanto elemento sacramental visí- suas qualidades e características. vida. Não uma vida qualquer, mas
vel. O poder não está na água, mas Pensar em água nos remete ao uma vida plena. Se dele bebermos,
na Palavra à qual ela está ligada. De limpar, lavar, purificar. Perceba que jamais teremos sede novamente.
uma maneira ou de outra, o impor- poluir água é destruir parte de seu Imagine o poder desta analogia
tante é notarmos que a água é es- propósito que, em última análise, é numa região árida, rodeada por de-
colhida. Isto ocorre porque através o propósito de Deus. Esta água, usa- sertos. Mais valorizamos aquilo que
da por judeus em suas cerimônias menos temos.
de purificação, torna-se o elemen- A água que limpa e hidrata tor-
to externo do Santo Batismo na-se parte atuante do maior pro-
Cristão. Sua imagem nos pósito de Deus: promover a vida.
fala sobre aquilo que Deus Através da água ele nos mantém fi-
faz no sacramento: lim- sicamente, também através dela ele
pa, lava, purifica, perdoa nos ensina sobre as bênçãos espiri-
pecados. Perdão é vida, tuais que quer nos conceder. Nada
nova vida em Cristo. mais justo do que honrarmos aquele
Dependemos de água que nos presenteia honrando o pre-
para viver. Sem ela não sente que nos concede ( João 3.5,
duramos mais que poucos João 7.38, 1 Pe 3.20,21, Apocalipse
dias. 7.17).
Estar sem ela é, extrema- Rev. Maximiliano Wolfgramm Silva é pastor da Igreja
Evangélica Luterana do Brasil e capelão da Universi-
dade Luterana do Brasil em Santarém

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 59


Artigo Rev. Waldyr Hoffmann

Deus continua manifestando


glória através da

Já estamos próximos ao quin-


gentésimo aniversário da
Igreja Luterana (1517–2017).
Mas a nossa história não é a
única. Há mais de 2000 anos, des-
de quando os pastores e os magos
Epifania para nós nos leva a re-
fletir sobre a nossa prática missio-
nária. Sair do anonimato passa a ser
Grandes movimentos e festas se- visitaram a Jesus, esta boa nova da um desafio constante para todos os
rão realizados neste período nas salvação é divulgada. Os magos, cristãos. Hoje não temos os magos
comunidades luteranas do mundo por exemplo, vieram de longe para para levarem a boa notícia do reino.
inteiro. Somos gratos a Deus pelas adorar o menino Jesus. Após vi- Esta tarefa é de todos nós. Os ma-
muitas bênçãos derramadas sobre rem esta manifestação da glória de gos nos inspiram à evangelização.
a Igreja Luterana e, por isso, come- Deus, divulgaram por onde iam No entanto, quando fazemos uma
morar estes 500 anos é, sem dúvida, a boa nova do rei nascido. Nesta análise mais séria sobre o nosso
um motivo para darmos glórias a época do ano, epifania, segundo o comportamento missionário, ob-
Deus. Afinal, o Evangelho de Cris- calendário eclesiástico (começa do servamos uma lacuna muito grande
to para todos alcançou milhares por no dia de reis, 06 de janeiro e vai até entre a nossa comissão/tarefa e a
este mundo afora. Aqui no Brasil, a 4a. feira de cinzas) nos unimos aos nossa prática, ou seja, somos bons
por exemplo, de um pequeno grupo magos para adorar o rei recém nas- adoradores, temos cultos em nossas
no Rio Grande do Sul, que estabe- cido, trazendo os nossos presentes, igrejas a cada final de semana, temos
leceu a IELB em 1904, somos hoje a nossa vida e saindo do anonima- contato com os valores do reino, a
mais de 230 mil em todo o país, sem to, com alegria por termos conhe- palavra, a Santa Ceia, somos rea-
contar com os milhares que foram cido a salvação em Cristo. bastecidos e, quando se espera algo
transferidos para a glória. E tudo Epifania, portanto, significa a a mais, afirmamos que não estamos
isto, portanto, nos leva a acreditar manifestação de Cristo ao mundo prontos. Os magos também não es-
que o Senhor Deus continua mani- que começou com os magos e con- tavam prontos. Apesar disso, ime-
festando a sua glória na igreja. tinua com ele próprio, após o seu diatamente, após virem a Salvação,
batismo no rio Jordão quando Jesus anunciaram a boa nova ao mundo.
manifestou-se ao povo iniciando o Precisamos aprender com eles e dei-
seu ministério.

60 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Artigo

a sua

xar o nosso comodismo de lado.


Epifania também é manifestação
do Senhor através da igreja cristã e,
particularmente, também através da
IELB. Não dá para contar quantos
foram beneficiados com a mensa-
gem de Jesus, suas curas e milagres.
Assim também não dá para contar
quantas pessoas foram atingidas
pelo ensino transmitido pela palavra
dado pela IELB ate hoje. Crianças,
jovens, adultos e idosos receberam
a mensagem de Cristo para todos e
confiaram no Senhor. A manifes-
tação do amor de Deus em Cristo
continua sendo tão atual e benéfica
tal qual foi no tempo de Jesus.
Por isso estamos agradecidos.
Deus continua manifestando o seu
poder, amor e misericórdia para to-
dos. Eis, portanto, o nosso desafio:
somos os agentes que promovem
este bem estar na igreja, sendo pro-
pagadores desta verdade perante to-
dos. Pastores e líderes precisam sen-
tir o chamado e se engajar cada vez
mais neste desafio de levar Cristo
para todos. Com certeza, Deus nos
acompanhará em cada passo.

Rev. Waldyr Hoffimann é pastor da Igreja Evangélica


Luterana do Brasil em Joenvile-SC

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 61


Lutero - Luteranismo Rev. Élvio Nei Figur

e-mail de Lutero — A Reform

Uma das atividades mais exercidas por Martinho Lutero foi escrever correspondências. Por meio delas, Lutero
procurava esclarecer as diversas dúvidas levantadas por cristãos de diversas partes da Europa. Abaixo um pequeno
exercício que simula uma suposta correspondência eletrônica de Lutero enviada às igrejas.
Em 2008, quando a elaborei, dividi em duas partes para dois cultos sempre esclarecendo os pontos com in-
formações adicionais. Julgo importante esclarecer a congregação de que pessoas falecidas não podem escrever ou
se comunicar com os vivos. Portanto, esta é apenas uma maneira de ilustrar e fazer referência ao pensamento do
Reformador Martinho Lutero.

From: lutero@docéu.com
To: Igrejas Luteranas em todo o Brasil
Subject: A Reforma da Igreja Cristã
Date: 31 de outubro de 2010

“Graça e paz da Parte de Deus e de Jesus Cristo


seu Filho e do Espírito Santo a todos vocês, meus
amigos e cidadãos das Igrejas Luteranas em todo o
Brasil, especialmente da Congregação Trindade de
São Luís-MA. Em mais alguns dias vocês irão lembrar
de um momento muito importante para a vida e sal-
vação de todos vocês. Por isso achei que seria im-
portante enviar, por este meio moderno e eficiente,
esta simples e humilde correspondência onde gosta-
ria de relatar e esclarecer alguns pontos importan-
tes sobre minha vida enquanto estive aí na terra,
e sobre o movimento da Reforma da Igreja Cristã.
Em primeiro lugar não me vanglorio por ser con-
siderado o ‘Iniciador’ desse movimento, nem gosta-
ria que vocês me considerassem o ‘mais importante’,
‘santo’ ou qualquer outra coisa parecida por esse
motivo. Não estou acima nem ao lado de Cristo, mas
muito abaixo dele. O que fiz foi apenas zelar pela
única verdade que salva: a verdadeira fé em Cristo
Jesus, nosso SENHOR. Fui apenas um servo a serviço
de Deus. Também sempre dou graças a Deus por ele
ter sido meu protetor e a quem sempre recorri como
meu único Deus e Pai.
Minha família sempre foi uma família humilde,
mas muito trabalhadora. Me criaram com muito rigor
e me instruíram no conhecimento e temor do Senhor.

62 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Lutero - Luteranismo

ma da

‘Eles sempre quiseram meu bem estar; suas intenções a meu respeito foram
sempre boas; vinham do fundo de seus corações’. Cursei boas escolas, apesar
de a disciplina nelas ser muito rígida e agressiva, como daquela na qual fui
espancado, me lembro muito bem, quinze vezes numa mesma manhã... Não gosto
nem de lembrar...
Mas isso me fez recordar a disciplina e a exigência feita pela Igreja
Romana, a qual eu e meus pais freqüentávamos por ser a única existente. Os
Padres e o Papa ensinavam que precisávamos nos bater muito e sofrer castigos
por causa de nossos pecados para que Deus nos perdoasse. Sempre achei isso
um absurdo e um abuso.
‘Terrível. Implacável. Assim eu via o Senhor.
Ele nos punia em vida e nos enviava ao purgatório
após a morte ou nos enviava para as chamas do in-
ferno antes do descanso eterno. Mas estava errado.
Quem vê um Deus enfurecido... não o vê com clare-
za... mas o vê através de um véu... como se uma
tempestade escura escondesse a Sua face...’.
Meu pai sempre quis que eu estudasse direito e
fosse um grande homem público. Foi o que fiz, estu-
dei artes e me tornei mestre na área e comecei a
dar aulas de Filosofia. Podia, assim, iniciar meus
estudos em Direito. Nessa época, quando tinha vinte
anos de idade, vi, pela primeira vez, uma Bíblia,
só que estava em Latim e poucos a podiam ler.
Em todos estes anos de estudo, uma coisa me in-
quietava sempre: O que devo fazer para que eu seja
salvo?
Eu não conseguia encontrar paz para minha alma.
Constantemente ficava com medo quando me lembrava
da ira de Deus e dos exemplos de castigo divino.
Esses temores se tornaram mais fortes quando, de
tão doente, caí por cima do suporte onde coloca-
va os livros para lecionar em sala de aula. Depois
perdi um colega de estudos, vítima de acidente. O
Medo da morte me assombrava, pois nunca sabia se
tinha feito o suficiente e se estava preparado para
ser salvo. E em 2 de julho de 1505, quando eu vol-
tava da casa de meus pais, uma tremenda tempestade
sobreveio e um raio caiu numa árvore bem perto de

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 63


Lutero - Luteranismo

onde eu estava. Pensei que morreria naquele dia, por isso fiz uma promessa
para Santa Ana de que, ‘se eu saísse com vida dali, eu ingressaria num con-
vento dos monges agostinianos’ na cidade de Erfurt.
Quinze dias depois cumpri minha promessa. Eu esperava sinceramente en-
contrar ali a resposta pra a minha questão sobre o que devo fazer para ser
salvo? E esperava também ali, finalmente encontrar ‘um Deus misericordioso’,
pois eu estava ‘enfeitiçado’ pela idéia de que fazendo boas obras e me cas-
tigando eu ganharia o perdão de Deus. Por isso, dia e noite eu me afligia
com jejuns, orações e vigílias. Esperava que assim conquistaria o céu ‘à
força’. Bem mais tarde percebi que estava errado. ‘Se alguma vez um monge
ganhou o céu através da vida mo-
nástica, então eu também entraria
nele...’.
Depois de muito estudar e buscar
na Escritura a resposta para as
minhas angústias, finalmente encon-
trei a verdade e o consolo, que
tanto procurara. Quando lia o Novo
Testamento, me deparei com um tre-
cho da carta do apóstolo Paulo aos
Romanos (3.28) onde diz: ‘o ho-
mem é justificado pela fé, indepen-
dentemente das obras da lei’, ou
seja, a pessoas é aceita por Deus
pela fé, e não pelo fato de fazer
o que a lei manda.
A partir desse dia mergulhei
com tudo na Bíblia, e pude perce-
ber que o que estava sendo ensina-
do e praticado pela Igreja Romana
não estava de acordo com o que a
Palavra de Deus diz. E o irôni-
co é que, justamente os Romanos
para quem Paulo escreveu esta car-
ta, não estavam levando a sério o
que Deus disse a eles por meio do
Apóstolo Paulo.

Percebi que a minha pergunta
sobre o que fazer para ser sal-

64 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Lutero - Luteranismo

vo estava sendo respondida aos poucos. Percebi também que na época de Jesus
Cristo o povo também fazia a mesma pergunta e acredito que entre vocês aí em
São Luís, no Brasil, e em todo o mundo, muitos fazem essa mesma pergunta.
Alguns acham que precisam fazer penitências, ou fazer e pagar promessas
como eu fazia no tempo em que era frade virtuoso. Eu estava tão empregado em
preces, jejuns, vigílias, frio, auto-flagelação e trabalho que, se tivesse
continuado por muito tempo, provavelmente morreria.
Outras pessoas achavam e ainda acham que, para serem salvas, precisam
cumprir toda a lei. Mas não sabem que isso é impossível ao ser humano, pois
o apóstolo Paulo escreve com muita clareza em Gálatas (5.4): ‘Os que querem
que Deus os aceite porque obedecem à Lei estão separados de Cristo e não tem
a graça de Deus’.
Outros ainda, acham que devem pertencer a uma determinada Igreja para se-
rem salvos e existem outros que pensam que não podem vestir algum tipo de
roupa, ou que devem deixar de comer algum tipo de alimento para se salvarem.
Mas tudo isso de nada contribui para a salvação.
Enquanto eu me aprofundava nos ensinos da Bíblia, percebi que, na verda-
de a pergunta não deveria ser: O que devo fazer para ser salvo? Mas deve-
ria ser: QUEM é a salvação? Ou: QUEM poderá me salvar? Pois a Bíblia é cla-
ra neste ponto onde afirma que, a salvação acontece somente pela fé em JESUS
CRISTO.
Aos poucos pude compreender o que meu grande amigo e conselheiro João
Staupitz me dizia: ‘Habitue-se ao fato de que Cristo é o Salvador verdadei-
ro e você, pecador real. Deus não brincou ao entregar seu Filho por nós’. Ou
seja, meu amigo já me dizia a grande verdade do Evangelho de que o ser huma-
no, como eu e como vocês, é pecador e precisa da salvação que vem de Cristo,
pois, como diz Paulo (Gl 2.21); “... se é por meio da lei que as pessoas são
aceitas por Deus, então a morte de Cristo não adiantou nada!”, e nós ainda
estaríamos perdidos para sempre.
Encontrei muitas outras passagens que me ajudaram a confirmar essa minha
constatação: Rm 1.17; ‘O justo viverá por fé’. Rm 4.28; ‘Assim vemos que a
pessoa é aceita por Deus pela fé e não por fazer o que a Lei manda’. O mes-
mo apóstolo Paulo citando Davi: Rm.4.6b-8 (Sl.32) diz: ‘...bem-aventurado o
homem a quem Deus atribui justiça, independentemente de obras: Bem aventu-
rados aqueles cujas iniqüidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos.
Bem-aventurado o homem a quem o Senhor jamais imputará pecado’...
Como assim? Eu havia aprendido que Cristo era um juiz rigoroso e só apre-
ciava as boas obras?
Graças a Deus, pude ver, pela Bíblia, que a justiça de Deus e a salvação

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 65


Lutero - Luteranismo

dos homens se faz SOMENTE PELA FÉ no Cristo Salvador. Que grande amor de
Deus para conosco, miseráveis seres humanos!! (Sola fide)
Finalmente compreendi e desejo que todos vocês também compreendam a ver-
dade do EVANGELHO e as suas conseqüências para a vida do cristão. Jesus diz
em João 8. 32: ‘e conhecereis a verdade e a verdade vos libertará’. Eu co-
nheci esta verdade e por isso não desisti de levar adiante essa verdade
para que vocês e tantas pessoas que ainda virão depois de vocês, conheçam a
verdade que Liberta.
Em 1511, recebi a ordem de ir para Roma. Este era m antigo sonho meu. Só
que ali me decepcionei completamente. Chamavam Roma de ‘Cidade Eterna’...
‘Se existe inferno, Roma foi construída sobre ele’ pois lá vi tanta rouba-
lheira pois a Igreja Romana vendia indulgências. Estas eram cartas trocadas
por dinheiro para que a pessoa que comprasse tal ‘passe’, tivesse lugar ga-
rantido no céu. Sempre achei que isso não era correto.
Também em Roma, vi prostitutas que faziam ‘promoções’ para os padres.
A igreja já não era mais Igreja, havia se transformado em um go-
verno de homens sem interesse com o Evangelho. Ela estava cada vez
mais se afastando da verdade escriturística de que Jesus é o sal-
vador de todo homem que nele crer. E tudo isso debaixo do nariz
do Papa, e ele não fazia nada.
Com a intenção de debater sobre o valor das Indulgências e o
distanciamento cada vez maior da verdade de Deus, escrevi 95 te-
ses ou pontos do ensino da Igreja Romana que estavam sendo dis-
torcidos da palavra Bíblica e, no dia 31 de outubro de 1517, as
prendi na porta da Igreja de Wittemberg. Elas logo foram tra-
duzidas para várias línguas e logo chegaram aos ouvidos do papa
Leão X.
Eu, Martinho Lutero, não sabia que aquelas afirmações teriam essa
repercussão. Eu havia escrito apenas para que os professores e alunos
da Universidade de Wittemberg lessem e pensassem nelas. Mas, eu tinha a
certeza que tudo que escrevi estava correto, pois escrevi baseado na Es-
critura Sagrada. Também sabia que Deus está sempre do lado da verdade e que
Deus estava agindo ali naquele momento através daquelas palavras. Deus que-
ria e quer mostrar a verdade a todas as pessoas de todas as épocas, a mim e
a vocês, pois ‘a verdade nos libertará’.
Jesus também diz: ‘se vocês permanecerem na minha palavra, vocês serão
verdadeiramente meus discípulos’ (Jo. 8. 31) Mas, se a verdadeira Palavra
de Deus não estava sendo proclamada e ensinada, como as pessoas iriam co-
nhecer a verdade?

66 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Lutero - Luteranismo

Para que existam verdadeiros cristãos e discípulos de Jesus, é preciso


que haja a PALAVRA sendo ensinada de maneira clara! E SOMENTE A ESCRITURA
SAGRADA É A PALAVRA DE DEUS DADA AOS HOMENS! Nada mais!
Nem a tradição da igreja, nem a palavra de homens, nem mesmo a pala-
vra do Papa podem ter prioridade sobre a Palavra de Deus. Lembrem-se sempre
das palavras do Cristo “Se vocês permanecerem na MINHA PALAVRA, vocês serão
verdadeiramente meus discípulos”... (Sola Scriptura).
Somente permanecendo na PALAVRA DE DEUS (Jo. 8.32) ‘vocês conhecerão a
Verdade e essa verdade vos Libertará’.
A Verdade é Cristo! Somente Cristo. O Verbo que se fez carne. Jesus
não só é o anúncio do da Verdade do Evangelho Salvador, mas Ele mesmo É o
EVANGELHO em pessoa, ele é a própria Verdade; ‘eu sou o caminho, e a verda-
de, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim’ (Jo 14.6).
Jesus veio ao mundo para libertar os seres humanos. E pagou um preço alto
por isso, ‘não com ouro ou prata, mas com seu santo e precioso sangue e sua
inocente paixão e morte’. E, SOMENTE PELA GRAÇA conquistada por Jesus por
meio de sua morte em nosso favor, passamos da condição de escravos (do pe-
cado) para a condição de libertos e Filhos de Deus. (Sola Gratia).
Desta forma somos agora verdadeiramente livres. Isso não quer dizer
que temos agora o direito de fazer com nossas vidas o que bem en-
tendemos. A nossa liberdade está totalmente compromissada com
aquele que nos libertou — Cristo!
Jesus nos libertou da escravidão do pecado e da morte para
sermos instrumentos úteis em seu Reino. Foi com este espí-
rito e com esse objetivo que eu, Martinho Lutero, levei
em frente o movimento da Reforma, para que outros pu-
dessem ter acesso a esse mesmo Evangelho. Pois so-
mente esse Evangelho da Justificação pela Fé, que é a
verdade, pode trazer a liberdade para a vida de vocês
e a vida da Igreja.
Deus nos mostrou a Liberdade em Cristo. E o movimento
da Reforma nos libertou da opressão de um regime de lei e nos
mostrou o único caminho por meio da ESCRITURA, para a salva-
ção das almas atribuladas; Pela GRAÇA, mediante a FÉ em Cristo.
Estamos livres da lei, pois Jesus, o Filho de Deus nos libertou e
somos verdadeiramente Livres como Filhos amados do querido Pai.
Um Grande abraço. Dr. Martinho Lutero”.
Élvio Nei Figur é pastor da Igreja Evangélica Luterana do Brasil em São Luís-MA

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 67


Estudo: Antigo Testamento Rev. Mário Rafael Yudi Fukue

A Onipotência de Deus e a

Um Estudo sobre Historicidade Profética


Pretende-se comparar as abordagens que estudiosos de diferentes inexplicáveis, muitos estudiosos con-
vertentes isagógicas fazem do livro profético de Jonas. Ao analisar os temporâneos estão mais inclinados a
argumentos de teólogos contemporâneos, nota-se que não há razões tratar Jonas como uma narrativa fic-
para negar a historicidade do profeta Jonas. Além disso, conclui-se cional, parabólica ou alegórica.
que a historicidade de Jonas e sua missão dinamizam importantes Lasor escreve que “o valor didático
aspectos pastorais e missionários deste importante livro bíblico, tais e profético de uma narrativa não de-
como a onipotência de Deus e a universalidade da graça. Nesse senti- pende necessariamente de sua histo-
do, no livro de Jonas não temos mera estória sobre o poder e o amor ricidade. [...] a história de Jonas pode
de Deus pelo mundo, mas uma história que revela a onipotência de ter sido contada apenas para ilustrar
Deus em atos milagrosos e a graça de Deus por ‘todos os povos da uma lição (LASOR, ibid, p. 416)”.
terra’. Assim, o sinal de Jonas na paixão de Cristo revela a compaixão Concordamos com isso.
‘encarnada’ de Deus pelo profeta desobediente, pelos povos gentios e No entanto, julgamos ser neces-
pelo mundo todo. sário analisar a historicidade do livro
Palavras-chave: de Jonas, não para tomar partido na
Jonas. Historicidade. Onipotência. Universalidade da graça. guerra inútil entre ‘conservadores’ e
“Ah! Senhor! Não foi isso o que eu disse, estando ainda na minha ‘liberais’, mas por que a onipotência
terra? Por isso, me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus de Deus e a universalidade da graça
clementes, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em benignida- recebem realce dinâmico-profético
de, e que te arrependes do mal.” Profeta Jonas (4.2) especial em uma visão historicizante
da vida do profeta Jonas. Em outras
Introdução palavras, na perspectiva historicista
do livro de Jonas, o poder de Deus e sua graça universal

O livro de Jonas é um incomum membro dos


“Doze”. Enquanto a maior parte dos livros pro-
féticos são oráculos (tipo “A”), Jonas é do tipo “B”, isto
ganham contornos mais vivos e palpáveis. Dessa forma,
a mensagem sobre um Jonas histórico amplia as pers-
pectivas pastorais e missionárias acerca do poder e gra-
é, apresenta narrativa sobre Jonas (HUMMEL, 1979, ça de Deus.
p. 322). Assim, podemos concluir que a ‘história das Em nosso trabalho, realizamos a análise da histo-
experiências e reações de Jonas é a mensagem’ do livro ricidade (ou ficcionalidade) do livro de Jonas a partir
(LASOR, 1999, p. 413). do estudo comparado de referências bibliográficas que
O adjetivo ‘gadol’ (grande) aparece catorze vezes tratam do assunto. Dividimos nosso estudo em três
no livro e indica o caráter hiberpólico do livro. Há o seções. Na primeira, explanamos criticamente os argu-
‘grande’ peixe, a ‘grande’ Nínive e outros elementos mentos literários e científicos de estudiosos contempo-
fantásticos. Diante de tantos eventos maravilhosos e râneos que colocam em xeque a historicidade de Jonas.
68 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011
Estudo: Antigo Testamento

Universalidade da Graça no

Na segunda, apresentamos os argumentos que parecem


afirmar a historicidade do livro de Jonas. Na terceira
seção delimitamos algumas perspectivas pastorais e
missionárias pautadas pela mensagem sobre um Jonas
histórico.

1. Jonas: personagem
ou profeta?

1.1. A história de Jonas


Jonas bem Amitai foi um profeta que predisse a
expansão do reino do norte no reinado de Jeroboão II
(780 a. C.), conforme 2 Reis 14.25. O livro de Jonas
nada fala sobre o ministério nacional do profeta, mas
relata a ordem de Javé para Jonas profetizar em Nínine. israelita nacionalista, o profeta desejava a destruição da
Entretanto, Jonas embarca para direção oposta, para cidade. Então Jonas abriga-se fora da cidade, sentando-
longe da presença do Senhor (v.3). O profeta vai para -se ali por quarenta dias. Deus faz uma planta crescer a
Társis, o destino mais ocidental que se podia imaginar fim de proteger Jonas do sol. No dia seguinte, entretan-
na época. to, Deus envia um verme para exterminar a planta e faz
Durante a viagem, Yahweh provoca grande tem- soprar um vento quente que faz Jonas desejar a morte.
pestade. Todos os navegadores oram a seus deuses. O Yahweh, então, mostra ao profeta a inconsistência de
capitão desperta Jonas e pede que ore a seu Deus. Jo- sua revolta ao contrastar o lamento egoísta do profeta
nas confessa sua fuga de Deus e pede para ser jogado pela planta com a misericórdia divina pelos filhos de
ao mar. Após tentarem retornar à terra, os marinheiros Nínive, “mais de cento e vinte mil que não sabem dis-
concordam em jogar o profeta ao mar. A tempestade cernir entre a mão direita e a mão esquerda...” (v.11).
cessa e a tripulação oferece sacrifícios ao Deus de Jo- O livro do profeta Jonas é atípico. Ele possui um en-
nas. Yahweh envia um grande peixe para tragar Jonas e. redo com início, meio e fim. Nesta belíssima história
Após três dias e três noites de orações e louvor, o profe- ocorreram milagres espetaculares como a sobrevivência
ta é vomitado na praia. de Jonas no ventre do grande peixe e a conversão de
Dessa vez, Jonas atende o chamado de Yahweh e Nínive. São tanto milagres que o livro parece uma no-
anuncia o juízo de Deus aos ninivitas. Inesperadamen- vela. Para muitos estudiosos contemporâneos, o livro
te, os ninivitas creram em Deus (v.5) e foram perdoa- de Jonas deve ser lido como uma alegoria ou parábola.
dos graciosamente. Deus, então, muda de idéia e não Durante este capítulo, serão explanados e analisados os
destrói a cidade. argumentos que parecem comprovar essa posição.
Jonas revolta-se com a bondade de Deus. Como um De forma sintética, todos os argumentos que impe-
Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 69
Mesmo assim, discussão acerca de
tamanho de baleias ou tubarões e a
possibilidade de engolir um homem
cabem ao campo científico. Se existe
ou existiu tal animal, isso não altera
o fato de Deus poder agir milagrosa-
mente. Milagres são, por definição,
impossíveis, ou pelo menos, imprová-
veis no que se refere à ciência.
Quanto ao tempo de três dias e
três noites, é improvável que tenha
sido formulada com sentido figurado.
Além do fato de que a historicidade
de Jonas exclui essa possibilidade, de-
vemos lembrar que não há exemplos
no Antigo Testamento do uso do nú-
mero três em uma representação figu-
rada (WATTS, 1975, p. 30).
dem a aceitação da historicidade de Jonas se resumem
em um preceito: Há muitos acontecimentos supranatu-
(2) Conversão de Nínive:
rais no livro que não poderiam ter acontecido realmente. Existem dúvidas quanto à conversão de Nínive.
Vejamos quais são esses argumentos: Estudiosos dizem não existir nenhum registro ou do-
cumento que relate uma possível conversão de Nínive.
(1) O grande peixe O nome de Yahweh nunca é mencionado em registros
e a sobrevivência de Jonas: ninivitas (LAETSCH, 1956, p. 216). Spaude lembra-
-nos de que muitos teólogos defendem a idéia de que
É biologicamente impossível a sobrevivência de Jonas só pregou condenação, por isso, o arrependimen-
uma pessoa no ventre de um “grande peixe” por três to dos Ninivitas teria sido forjado (SPAUDE, 1987).
dias. São várias as dificuldades para tal sobrevivência: Na percepção de uma pregação integralmente legalista
a. No sistema digestivo não existe oxigênio. de Jonas, o arrependimento de Nínive era fingido. Não
b. O suco gástrico corroeria a pele e outros tecidos. havia verdadeira contrição e pesar de pecados. Em vista
c. Não há água potável. da impossibilidade de conversão em massa, deduz-se
que o conteúdo do livro de Jonas não passa de mera
Alguns estudiosos classificam o episódio do grande
alegoria ou parábola.
peixe como uma lenda ou elemento que teve origem em
O evangelho de Mateus (12.41) escreve: “Ninivitas
fábulas de outros povos (YOUNG, 1964, p. 274). Isso
se levantarão, no juízo, com esta geração e a condenarão”.
confirmaria, segundo eles, que o autor do livro usou
Neste versículo, Jesus considera a conversão dos nini-
fontes mitológicas de povos da antigüidade na compo-
vitas como histórica e verdadeira, sem lugar para um
sição da parábola (WATTS, 1975, p. 82).
arrependimento forjado (Lc 11:29-30).
Entretanto, não parece haver motivos para negar ou
Podemos também ressaltar que nenhum traço de
duvidar do poder de Deus agindo no episódio do gran-
arrependimento mostrado em Jonas aparente ser mera-
de peixe. Além do mais, Spaude aponta:
mente fictício ou figurativo. Ao contrário, os ninivitas
They point out that the sperm whale is big enough
se arrependem de seus erros e não buscam seus antigos
to swallow a man or even a horse. The largest in
deuses. Eles buscam a Yahweh. A confiança dos ninivi-
the shark family is the whale shark, ranging up to
tas é mostrada na atitude do rei em produzir um decreto
fifty feet in length and fifteen tons. In weight; it
exortando o povo a fazer jejum. Além disso, é surpreen-
could easily swallow a man (SPAUDE, 1987, p.
dente o fato de ver os animais convocados para o jejum!
53).

70 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Estudo: Antigo Testamento

(3) Inexatidão histórica: linguagem” do tipo hipérbole (exagero) ou pode se re-


lacionar com o complexo de vilas que se amontoavam
Nínive como cidade importante e de ao redor de Nínive (Assur, Kalah e Dur-Sharruken)
três dias para percorrê-la (Jn 3.3). (YOUNG, 1964, p. 274). Essa última hipótese é com-
Conforme alguns teólogos, Nínive nunca foi gran- patível com o termo “grande Nínive” que aparece em
de o suficiente para ser mencionada como cidade de 1.2, 3.2 e 4.11. Escreve Baker: “De fato, a expressão
três dias de percurso. Nínive parece ser tomada como pode ser entendida em sentido semi-técnico com o sig-
cidade fantástica no livro de Jonas. E, isso ressaltaria nificado de “Grande Nínive” (BAKER, 2001, p. 67)”.
um provável caráter alegórico do livro.
Há autores que apontam para mais longe e afirmam (4) Expressão “rei de Nínive”
que a descrição do tamanho de Nínive tal como está em seria falsa (Jn 3.6).
Jonas remete a data de composição do livro para um pe-
Seria historicamente incorreta uma referência a um
ríodo posterior à destruição da cidade em 612 a.C. Se-
suposto “rei de Nínive”. O correto seria citar “Rei da
gundo Baker, o autor de Jonas utilizou descrições len-
Assíria”, visto que Nínive era a capital da Assíria.
dárias da “antiga Nínive” que figuravam no imaginário
Entretanto, o termo “Rei de Nínive” se referia ao
popular após 612 a.C. Portanto, a descrição de Nínive
governante de toda a Assíria que residia em Nínive.
como cidade de “três dias” para percorrê-la é fruto da
Esta expressão encontra paralelos tais como “rei da Sa-
tradição popular e não um fato histórico. Se calcular-
maria” ao referir-se ao rei de Israel (1Rs 21.1); “Rei de
mos a caminhada de um dia como 30 km, Nínive teria,
Damasco” ao se referir ao rei da Síria (2Cr 24.29). Por-
conforme Jonas, um diâmetro ou circunferência de 90
tanto, “rei de Nínive” equivale a Rei da Assíria.2
km!1 Um documento da época afirma que Senaqueri-
Conforme explanado por Lemansky, o ministério
be alargou a cidade para 21815 côvados (cerca de 12
de Jonas em Nínive aconteceu durante o reinado de
km). Esse fato é confirmado pelas escavações (BAKER,
Jeroboão II (786-746 a.C.). Nessa época, Nínive não
2001, p. 64).
era a capital do Império assírio. Por isso, a nomenclatu-
A expressão “caminho de três dias” pode se referir à
ra “rei de Nínive” é exata e refere-se ao governador ou
circunferência da cidade; pode ser uma “expressão de
chefe da cidade e não ao rei da Assíria (LEMANSKY,
1 Baker lembra que em documentos antigos não há indicação 1992, p.40).
alguma sobre o costume de medir uma cidade pela extensão
de seus muros.Ver BAKER, 2001. P.65. 2 Ideia compartilhada pela maioria dos autores conservadores
como Young.

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 71


Estudo: Antigo Testamento

rica de um relato. O que impossibilitaria um autor es-


tritamente simétrico e sistemático relatar um episódio
histórico?
Após essa análise dos argumentos de estudiosos que
negam a historicidade do livro de Jonas, convém res-
ponder a questão: O que seria, então, o livro de/sobre
Jonas?
Lasor delimita algumas possibilidades (LASOR,
1999, p 414-419):
a. Interpretação Mística: Segundo os defensores
desta vertente, o livro de Jonas é um mito que pro-
cura explicar verdades terrenas com história que
provocam ou representam tal verdade.
b. Alegoria: Na alegoria, a história é contada
para transmitir uma mensagem. Nela, a maior
parte dos detalhes possui um significado. No caso
Hipérbole é uma figura de linguagem caracterizada específico de Jonas, teólogos modernos apresentam
pelo exagero. Afinal, ninguém tem tanta fome que o seguinte esquema:
comeria um camelo. Jonas (pomba) representa Israel que se negou a pre-
gar aos povos gentios ( fuga para Társis). Por isso,
Javé envia o grande peixe para engolir Jonas (exílio
de Israel e Judá). O período de três dias e três noites
significaria um grande período de tempo (duração
(5) Hipérbole. do exílio).3 Depois, Jonas se arrepende e o grande
peixe o vomita no mar (volta do exílio).
Outro aspecto do livro de Jonas que parece indicar
O problema para esta interpretação é que ela en-
seu caráter não histórico é a hipérbole. O adjetivo ‘ga-
xerga o fator grande peixe como algo negativo. Na
dol’ (grande) ocorre 14 vezes no livro. Tudo em Jonas
verdade, o grande peixe salvou Jonas da morte no
é exagerado: o grande peixe, a grande Nínive, a popula-
mar! Além disso, o episódio é o único da vida de
ção de Nínive, a tempestade. Por esses fatores, conclui
um profeta que Jesus aplica a si mesmo.
que Jonas não é um registro sensato da realidade, mas,
c. Parábola: Na parábola, o conto representa a
sim uma alegoria. Entretanto, o caráter hiperbólico do
vida real e incorpora uma verdade espiritual. Não
texto pode também indicar eventos históricos magnífi-
possui significado para cada parte como na alego-
cos ou incomuns.
ria. Nesta visão, a história de Jonas mostraria que
o fato do povo de Israel ter sido eleito por Deus fora
(6) Estrutura Simétrica. interpretada de forma egoísta pelos hebreus. Eles se
Para alguns, o fato do livro de Jonas possuir uma
estrutura estritamente simétrica impossibilita o caráter
histórico do livro. Baker traz uma citação de Fretheim:
[...] as estruturas cuidadosamente elaboradas do
livro [...] fazem supor um objetivo não-histórico
por parte do autor. Tal interesse por estrutura e si-
metria não é tão característico de escritos históricos
objetivos, indicando mais um produto da imagi-
nação (LEMANSKY, 1992, p 85).

Não há razão alguma para sustentar a tese de que 3 WATTS, 1975, p. 82. O autor lembra também que há alguns
possuir estrutura simétrica mostra a inexatidão histó- mitos que reconheciam “três dias e três noites” como o perío-
do de tempo da fase escura da lua.

72 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Estudo: Antigo Testamento

esqueceram da promessa de Deus a Abraão de que


“em ti serão benditas todas as famílias da terra”
(Gn 13.3).
A semelhança entre a interpretação alegórica e pa-
rabólica é evidente. Entretanto, a segunda é prefe-
rível por não ser obrigada a encontrar um signifi-
cado para cada detalhe da história.

2. Jonas como livro histórico


O profeta do livro em estudo é o Jonas, filho de
Amitai, mencionado em 2 Reis 14.23-25. Presume-se,
assim, que o ministério de Jonas aconteceu por volta de
775-750 a.C. Estudiosos mais antigos apresentam al-
gumas provas cabais que comprovariam a historicidade
do livro de Jonas:

(1) Testemunho de Cristo.


Cristo cria e atesta a historicidade do milagre regis-
trado no livro de Jonas e na historicidade da missão do
profeta aos ninivitas. Como visto anteriormente, em (3) Testemunho das Escrituras.
Mateus 12.39-40, Jesus se refere ao sinal de Jonas como 2 Reis 14.25 menciona Jonas como personagem his-
algo real. tórico:
Em Mateus 12.41 lemos: “Ninivitas se levantarão, Restabeleceu ele os limites de Israel, desde a entra-
no juízo, com esta geração e a condenarão”. Neste ver- da de Hamate até ao mar da Planície, segundo a
sículo, Jesus considera a conversão dos ninivitas como palavra do Senhor, Deus de Israel, a qual falara
histórica e verdadeira, sem lugar para um arrependi- por intermédio do seu servo Jonas, filho de Amitai,
mento forjado (Lc 11.29-30). o profeta, o qual era de Gate-Hefer.

(2) Testemunho da O próprio livro de Jonas traz indicações que reve-


tradição judaico-cristã. lam sua natureza histórica:
a. cita Jonas, filho de Amitai (personagem histó-
Unger traz: “Ancient Jews regarded the account rico);
as historical ( Josephus Antiquities IX, 10,2). Jewish b. traz a introdução de um livro profético: E veio
and Christian traditions have followed the same view a Palavra do Senhor a Jonas [...]. Quanto a isso, o
(UNGER, 1951, p. 244).” Josefo justifica a inclusão de próprio teólogo liberal Shöekel escreve: “A primeira
Jonas em sua obra com o seguinte comentário: “Mas, frase é inconfundivelmente profética (SCHÖKEL,
uma vez que prometi dar um relato exato de nossa his- 1991, p.1045)”;
tória, achei necessário registrar o que encontrei escri- c. A presença do “vaw” consecutivo no início do li-
to nos livros hebraicos acerca desse profeta (BAKER, vro parece indicar que o conteúdo do livro possui
2001, p. 86).” ligação a algo anterior (não especificamente ao li-
Os Pais da Igreja tomam o relato do grande peixe vro de Obadias).
como verídico. “O sinal mais claro e patente entre os
sinais proféticos” (Gregório de Nissa, PG 46, 604). Te-
odósio da Mopsuéstia denomina o episódio de “tipo” (4) Prova histórica:
e estende o seu valor à ressurreição do Cristão como o
Keil aponta vários motivos históricos para provar a
mesmo corpo (SHÖKEL, 1991, p.1053).
historicidade do livro de Jonas (KEIL, 1986, p. 398):
Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 73
Estudo: Antigo Testamento

a. A missão de Jonas corresponde historicamente (LASOR, 1999, p. 419).” Por outro lado, o autor tam-
com a situação de Nínive na época; bém lembra que “um firme princípio no estudo bíblico
b. Corrupção moral da cidade pode ser vista em é que, mesmo numa passagem claramente histórica, a
Naum 3.1.; e mensagem teológica é mais importante que os detalhes
c. A descrição da grandeza de Nínive está em har- históricos (id. ibid, p.419).”
monia com os apontamentos feitos pelos escritores Entretanto, em nossa opinião, se tomássemos o li-
clássicos. vro do profeta Jonas como parábola, o máximo que
conseguiríamos extrair de sua mensagem seria a uni-
Concordamos que os eventos milagrosos relatos versalidade da graça de Deus revelada no ministério do
em Jonas são extraordinários. Tão extraordinários que personagem Jonas entre os gentios de Nínive.
Lutero chegou a dizer que “também não teria crido na A universalidade da graça de Deus é atestada no
veracidade da história, se não fosse parte das Escrituras trabalho de Jonas entre os ninivitas. Yahweh não é um
Sagradas (KUNSTMANN, 1983, p.83)”. Deus tribal que deseja somente a salvação de Israel.
Em 2Reis, Jonas é visto como personagem históri- Yahweh é Aquele que quer “abençoar todas as famí-
co. Caso o livro de Jonas fosse uma parábola, o autor lias da terra”. Ele trabalha para isso desde o princípio,
não intentaria fazê-la parecer real utilizando formas quando criou o mundo ex nihilo por meio do Verbo.
literárias profético-narrativas e usando a figura de um Ele prometeu enviar seu amor encarnado à Eva, mãe
profeta histórico como personagem da parábola. Usar- de todos os seres humanos (Gn 3.15). E consolida a
-se-ia profetas fictícios e formar literárias próprias ás promessa no envio de Cristo ao mundo. Tudo isso não
parábolas. Decididamente, o fator que pesa e autentica para ‘julgar o mundo, mas para salvá-lo’.
a historicidade de Jonas é o testemunho de Cristo acer- Não queremos desprezar a universalidade da graça,
ca do sinal de Jonas e do arrependimento dos ninivitas. mas a mensagem do livro de Jonas é maior. Há de se
Além disso, devemos acrescentar que Jesus se compara sublinhar a onipotência de Deus, a partir de uma inter-
diretamente a Jonas. Nenhum outro profeta recebe tal pretação histórica do livro.
tratamento. A onipotência de Deus em Jonas só se ‘encarna’
Em vista dos argumentos analisados, o livro de Jo- quando tomamos o livro como relato histórico. Assim,
nas parece retratar a história real do filho de Amitai en- numa interpretação histórica do livro, vemos Yahweh
viado por Deus para anunciar os desígnios de Deus aos agindo na história, provocando acontecimentos4 em
habitantes da cidade de Nínive, em alguma época do favor de Seu povo. Ele faz maravilhas e proezas inexpli-
VIII século antes de Cristo. cáveis a fim de levar sua mensagem aos ninivitas. Epi-
sódios como o grande peixe sublinham a onipotência
3. Perspectivas Pastorais e de Deus. E, isso é crucial para a pregação cristã. Anun-
Missionárias ciamos um Deus que age milagrosamente em favor de
todos. Dessa forma, há uma relação intrínseca entre o
Lasor escreve que “caso se decida pela interpretação poder de Deus e o anúncio de salvação e libertação a
parabólica ou simbólica porque o elemento miraculoso todos. Deus age na história. Deus salva a todos. Deus
é problemático, a decisão será baseada numa conclusão liberta os excluídos.
moderna preconcebida que, contrária à posição bíblica, De igual modo, nosso discurso não pode ficar so-
rejeita a intervenção sobrenatural de Deus na história mente no campo das palavras. Precisamos agir histo-
ricamente. Necessitamos encarnar o evangelho através
de nossa ação em amor a Deus e ao próximo. Nesse sen-
tido, o anúncio profético da Igreja será revestido pelo
poder e graça de Deus. Declaramos o ‘não’ de Deus,
denunciado os sistemas de exclusão que deixam à mar-

4 Abordamos aqui o termo ‘acontecimento’ numa perspectiva


foucaultiana. Assim sendo, um acontecimento caracteriza-se
por ‘mudanças’ na história, pela descontinuidade. Para maiores
detalhes, ver a obra “Arqueologia do saber”.

74 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


trasse amistoso a todos
os seres humanos. Em
nossa era, o Deus Tri-
úno sustenta e envia a
Igreja a divulgar o evan-
gelho. Intercala-se aqui
o conceito de missio
dei. Enviar Cristo parar
salvar o mundo, enviar
o Espírito Santo para
auxiliar a Igreja compõe
a missio dei. Entretan-
to, a tarefa de pregar
o evangelho a todas as
nações é o desafio da
Igreja. Nesse desafio, o
Espírito Santo alimenta
a Igreja e preserva sua
mensagem pura até os
nossos dias. São dois
mil anos permeados
de ‘milagres’ tais como
apóstolos, mártires,
pais da Igreja, os refor-
madores e cada cristão
individualmente. Esse é
o Deus apresentado em
Jonas: o Deus dos mila-
gres e maravilhas.
Nosso desafio, como
igreja, é dar continui-
gem milhões de pessoas oprimidas que, a exemplo do dade a esses ‘milagres’.
egoísmo de Jonas, se compadecem egoisticamente da Nossa ação profética de anúncio do evangelho e ações
morte ‘das plantas que trazem sombra’. Ao mesmo tem- libertárias e emancipadoras são ‘profecias dramatiza-
po, declaramos o ‘sim’ de Deus para a vida humana. O das’ no palco dos acontecimentos históricos. E, nesse
mesmo Deus que, no VIII século a.C., se compadeceu desafio, muitos ‘milagres’ acontecem. Quando nossa
dos cento e vinte mil ninivitas, se compadece dos ex- pregação/ação traz salvação, provocam mudanças e
plorados de nosso tempo. trazem libertação, por menor que sejam, vemos o po-
O aspecto mestre do livro de Jonas e sua historici- der de Deus se historicizar. Devemos trabalhar para
dade é a “profecia dramatizada” de Jonas. O profeta é ampliar a magnitude desses pequenos ‘milagres’ locais.
único a quem Cristo se compara pessoalmente. O sinal Nesse sentido, a proposta de uma práxis pautada pelo
de Jonas atrela o historicismo do profeta com a própria fazer/pensar teológico com a dimensão prática da ação
história do Salvador Jesus. Da mesma forma que Jonas diaconal procura ‘globalizar’ a ética cristã fundamen-
permaneceu no ventre do grande peixe e foi vomitado tada nos princípios de cooperação, responsabilidade e
na praia, Cristo permaneceu no coração da terra e res- reconhecimento (SCHAPER, 2009, p. 9).
suscitou da morte. Tal comparação faz de Jonas uma A onipotência de Deus se revela historicamente em
prefiguração ou “tipo” do Messias. Sua graça universal.
Yahweh enviou Cristo para que Seu poder se mos-
Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 75
Estudo: Antigo Testamento

Conclusão Conclui-se, com base naquilo que foi posto neste


artigo, que uma interpretação histórica de Jonas enal-
Chegamos ao final desse estudo na esperança de ter- tece a onipotência de Deus e torna a universalidade da
mos conseguido realizar uma análise da historicidade/ graça de Deus um ‘acontecimento histórico’ também
ficcionalidade de Jonas pautada pelo método científi- na Nínine do século VIII a.C.
co-teológico comparativo na apresentação dos argu- Rev. Mário Rafael Yudi Fukue, trabalho apresentado à Escola Superior de Teologia
— São Leopoldo, é pastor da Igreja Evangélica Luterana do Brasil em Passo
mentos isagógicos e hermenêuticos que fundamentam
Fundo-RS.
uma interpretação histórica do livro de Jonas.

Bibliografia
BAKER, D. W. ALEXANDER, T. D. STURZ, R. J. Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque e Sofonias. Série Cultural Bíblica.
São Paulo:Vida Nova, 2001.

HUMMEL, H.The Word becoming Flesh: an introduction to the Origin, Purpose and Meaning of the Old Testament. Saint Louis,
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KUNSTMANN, W. G. Os profetas Menores. Porto Alegre: Concórdia, 1983.

LAETSCH, T. The Minor Prophets. (Bible Commentary). Saint Lois: Concordia, 1956.

LASOR, W. S. HUBBARD, D.V. BUSH, F. W. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo:Vida Nova, 1999.

LEMANSKY, J. The Jonah’s Nineveh. Concordia Journal. v. 18 nº1 p. 40-48. Jan. 1992.

SCHAPER,V. G. A tolerância entre solidariedade e reconhecimento. São Leopoldo: EST-EAD, 2009.

SHÖKEL, L. A. DIAZ, J. L. Profetas II: Ezequiel, Profetas menores, Daniel, Baruque, Carta de Jeremias. (Grande Comentário
Bíblico). São Paulo: Paulinas, 1991.

SPAUDE, C. W. Obadiah, Jonah, Micah (The people’s bible). Milwaukee: North Wester, 1987.

UNGER, M. F. Introductory Guide to the Old Testament. Grand Rapids: Zondervan, 1951.

WALTON, J. Jonah (Bible study commentary). Grand Rapids: Zondervan, 1982.

WATTS, J. D.W.The books of Joel, Obadiah, Jonah, Nahum, Habakuk and Zechariah. London, New York, Melbourne: Cambridge,
1975

YOUNG, J. E. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo:Vida Nova, 1964.

Demais Referências
ALLEN, L. C. The books of Joel, Obadiah, Jonah and Micah. s.l. W. B. Eerdmans, 1976.

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LUTERO, Martinho. The Minor Prophets. Saint Louis: Concordia, s.d .

ROOS, Deomar. Apostila de Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: ICSP-EST, 2000.

ROOS, Deomar. Apostila de Isagoge do Antigo Testamento. São Paulo: ICSP-EST, s. d.

76 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Rev. Jarbas Hoffimann
Pesquisa e Adaptação

A Estrela
As Estrelas eram símbolos
bastante comuns na vida
dos antigos. Os astrólogos desenvol-
Estrelas — as reais no céu e suas
representações que nós podemos fa-
zer — são muito significativas para
anjo para anunciar essas coisas a vo-
cês nas igrejas. Eu sou o famoso des-
cendente do rei Davi. Sou a brilhan-
veram uma pseudociência, combi- os cristãos. Elas nos lembram do te estrela da manhã.” (Ap 22.16)
nada com crenças religiosas, a qual Criador e sua maravilhosa criação.
acreditava na influência das estrelas O Salmista chama lua
sobre os sentimentos humanos e e estrelas de trabalho
que sua posição no céu indicava algo das mãos de Deus.
sobre eventos na terra. Até hoje as Ainda mais, a es-
estrelas são usadas como símbolos. trela no período
Policiais as usam como escudos que de Epifania apon-
simbolizam sua autoridade. Pessoas ta para a salvação
de qualidades brilhantes para as ar- que nos trouxe nosso
tes cênicas ou esportes são chama- abençoado Salvador, que
das de estrelas (astros). por meio de João nos diz:
Estrelas aparecem evidenciadas “ Eu, Jesus, enviei o meu
em nossas igrejas e casas — Estre-
las de cinco pontas — durante o
período de Advento e Epifania. O
significado que nós encontramos
para isto vem da Bíblia. No Antigo
Testamento a vinda do Salvador é
mostrada sob a figura de uma estre-
la. Apontando, é claro, para a crian-
ça de Israel, Balaão a abençoou com
a seguinte profecia: “Olho para o
futuro e vejo o povo de Israel. Um
rei, como uma estrela brilhante, vai
aparecer naquela nação; como um
cometa ele virá de Israel. Ele derro-
tará os chefes dos moabitas e acaba-
rá com esse povo orgulhoso.” (Nm
24.17).
A Festa de Epifania marca o
Natal dos Gentios. No Novo Tes-
tamento está registrada a história
dos sábios que vieram adorer Jesus
Cristo e que a estrela apontava o lu-
gar onde o menino deveria nascer.
A estrela é parte importante desta
história, pois ela guiou os Magos até
Belém.

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 77


Música

Três Reis magos do Oriente a sós


L. e M. : John Henry Hopkins Jr, 1857
Trad.: Ruth See, 1938/Antônio de Campos Gonçalves, 1947
       
Arr. 2 vozes.: Jarbas Hoffimann, 2008
Soprano  

Baixo
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              
Violão
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Três reis magos 3
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Três reis magos 5

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Os Reis Magos
Os Magos são figuras que representam bem a Epifania.
Eles não foram personagens criados pela tradição. Estão muito bem testemunhados no Evangelho.
Eles seguiram uma estrela e chegaram até onde Jesus estava. Era o Filho de Deus, o Messias, dos judeus, que não
ficaria apenas para os judeus. Jesus foi enviado para todo o povo. Até mesmo os gentios, como os Reis Magos, são
objeto de Salvação, pois Deus quer salvar a todos.
Comissão de Culto da IELB Litúrgica: Culto de Natal

Sugestão Litúrgica para o Culto de Natal


Veja uma sugestão de liturgia para o culto de Na- 3. Canto congregacional responsivo
tal. Aqui aparece sem a formatação adequada para (HL 15)
uso prático no culto. Caso queira formatar à vonta- P.: Felicíssimo, contentíssimo,
de, este texto pode ser usado. Caso queira o material tempo santo de Natal!
finalizado, verifique no blog da Comissão de Culto C.: Amor profundo salvou o mundo.
Alegrai-vos, alegrai-vos, ó Cristãos.
da IELB (www.liturgialuterana.blogspot.com). P.: Felicíssimo, contentíssimo,
Lá você vai encontrar o material para imprimir, tempo santo de Natal!
bem como para ser projetado e as partituras das me- C.: O rei da glória trouxe a vitória!
lodias sugeridas nesta liturgia. Alegrai-vos, alegrai-vos, ó Cristãos.
C.: Felicíssimo, contentíssimo,
tempo santo de Natal!
Legenda: Coros divinos cantam seus hinos.
Alegrai-vos, alegrai-vos, ó Cristãos.
P Pastor de pé 4. Leitura Responsiva — Is 9.2-3, 6-7
P.: O povo que andava na escuridão viu uma forte
C Congregação sentados luz;
T Todos ajoelhados C.: A luz brilhou sobre os que viviam nas trevas.
P.: Tu, ó Deus, aumentaste esse povo e lhe deste
|: Repetir o canto. cantar muita felicidade.
C.: Eles se alegram pelo que tens feito, como se ale-
gram os que fazem as colheitas.
Oração Pessoal P.: Ou como os que repartem as riquezas tomadas
na guerra.
Natal é vida! C.: Pois já nasceu uma criança, Deus nos mandou
Jesus iniciou sua vida aqui entre nós... um menino que será o nosso rei.
P.: Ele será chamado de “Conselheiro Maravilho-
Para mais tarde entregar sua vida... so”, “Deus Poderoso”, “Pai Eterno”, “Príncipe da
E voltar novamente à vida três dias depois... Paz”.
Dando novo sentido às nossas vidas! C.: Ele será descendente do rei Davi;
Nos proporcionando esperança de vida — eterna! P.: O seu poder como rei crescerá, e haverá paz em
Natal é vida completa em Jesus! todo o seu reino.
C.: As bases do seu governo serão a justiça e o direi-
Que este seja um Natal vido em alegria e esperança to,
dentro de nossos corações, P.: Desde o começo e para sempre.
motivando-nos para mais um ano de nossas vidas T.: No seu grande amor, o senhor todo-poderoso
repleto de bênçãos do Doador da verdadeira vida. fará com que tudo isso aconteça.
Amém. 5. Confissão dos pecados e
Absolvição
P.: Querido Pai, reconheço que pequei e que me-
1. Prelúdio ou Hino Processional reço a tua condenação.
C.: Com muitos de meus erros, causo divisões e dis-
2. Saudação e Invocação córdias.
P.: Deus Pai nos envia Jesus, o Rei bendito P.: Com muitas de minhas atitudes, desobedeço
C.: que vem a nós como Salvador. tua santa vontade.
P.: Ele é Rei-menino, homem Deus, Redentor. C.: Em meu ser, tenho a inclinação para o erro,
C.: que com o Espírito Santo, é o Deus triúno que somente tua palavra pode perdoar.
P.: Criador, Salvador, Santificador. A quem rende- P.: Por isso, peço que me perdoes, restaures, que
mos culto, honra e glória me tires toda culpa e dor.
T.: Em nome do PAI, do FILHO e do ESPÍRITO C.: E ajuda-me, por teu Espírito Santo, a viver
SANTO. Amém. uma vida conforme o teu caminho.

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 83


Litúrgica: Culto de Natal

P.: Peço em nome e por amor de Jesus, aceitos por Deus e recebamos a vida eterna que
T.: Nosso único e suficiente Salvador, Amém. esperamos.
P.: O Deus de toda graça teve compaixão de nós, e
a todos os arrependidos que confiam nesta gra- Evangelho de Lucas 2.1-20
ça salvadora, ele perdoa, restaura a esperança e P.: Naquele tempo o imperador Augusto mandou
dá poder para se tornarem seus filhos. Vai em uma ordem para todos os povos do Império.
paz! Perdoados estão os teus pecados em nome Todas as pessoas deviam se registrar a fim de ser
do PAI e do FILHO e do ESPÍRITO SAN- feita uma contagem da população.
TO. Amém. Quando foi feito esse primeiro recenseamento,
Cirênio era governador da Síria.
6. Salmo Então todos foram se registrar, cada um na sua
própria cidade.
7. Glória Por isso José foi de Nazaré, na Galiléia, para a
T.: Glória ao Pai e ao Filho e ao Santo Espírito. região da Judéia, a uma cidade chamada Belém,
Como era no princípio, agora é e por todo o onde tinha nascido o rei Davi. José foi registrar-
sempre há de ser! Amém. -se lá porque era descendente de Davi.
Levou consigo Maria, com quem tinha casa-
8. Oração mento contratado. Ela estava grávida, e aconte-
P.: Pai Celestial, que nos deste o teu Filho, Rei ceu que, enquanto se achavam em Belém, che-
nascido em Belém, para que nos fosse sacrifício gou o tempo de a criança nascer. Então Maria
pelo pecado, bem como exemplo de vida san- deu à luz o seu primeiro filho. Enrolou o meni-
ta, dá-nos a tua graça para que recebamos com no em panos e o deitou numa manjedoura, pois
agradecimento este enorme benefício, e dá-nos não havia lugar para eles na pensão.
a capacidade de seguir os passos de sua vida Naquela região havia pastores que estavam pas-
santa. Pelo mesmo Jesus Cristo, nosso Senhor sando a noite nos campos, tomando conta dos
e Salvador, nascido em humildade em Belém. rebanhos de ovelhas.
Aleluia. Amém. Então um anjo do Senhor apareceu, e a luz glo-
riosa do Senhor brilhou por cima dos pastores.
9. Canto Congregacional (HL 549) Eles ficaram com muito medo, mas o anjo dis-
Ó tempo santo de Natal, se:
Tu tens mensagens lindas! MULHERES.: Não tenham medo! Estou aqui a
O mundo não tem luz nem paz, fim de trazer uma boa notícia para vocês, e ela
Mas isto meu Jesus me traz. será motivo de grande alegria também para
Ó tempo santo de Natal, todo o povo! Hoje mesmo, na cidade de Davi,
Tu tens mensagens lindas! nasceu o Salvador de vocês - o Messias, o Se-
nhor! Esta será a prova: vocês encontrarão uma
Ó tempo santo de Natal, criancinha enrolada em panos e deitada numa
Alegras toda a gente! manjedoura.
Jesus a cada coração P.: No mesmo instante apareceu junto com o anjo
Traz vida, paz, consolação. uma multidão de outros anjos, como se fosse
Ó tempo santo de Natal, um exército celestial. Eles cantavam hinos de
Alegras toda a gente! louvor a Deus, dizendo:
T.: Glória a Deus nas maiores alturas do céu! E
10. Leituras paz na terra para as pessoas a quem ele quer
bem!
Tito 3.4-7 P.: Quando os anjos voltaram para o céu, os pasto-
P.: Porém, quando Deus, o nosso Salvador, mos- res disseram uns aos outros:
trou a sua bondade e o seu amor por todos, ele HOMENS.: Vamos até Belém para ver o que
nos salvou porque teve compaixão de nós, e não aconteceu; vamos ver aquilo que o Senhor nos
porque nós tivéssemos feito alguma coisa boa. contou.
Ele nos salvou por meio do Espírito Santo, que P.: Eles foram depressa, e encontraram Maria e José, e
nos lavou, fazendo com que nascêssemos de viram o menino deitado na manjedoura. Então con-
novo e dando-nos uma nova vida. taram o que os anjos tinham dito a respeito dele.
Deus derramou com generosidade o seu Espíri- Todos os que ouviram o que os pastores disse-
to Santo sobre nós, por meio de Jesus Cristo, o ram ficaram muito admirados.
nosso Salvador. Maria guardava todas essas coisas no seu cora-
E fez isso para que, pela sua graça, nós sejamos ção e pensava muito nelas.

84 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Litúrgica: Culto de Natal

Então os pastores voltaram para os campos, 15. Oração Geral + Oração Natalina
cantando hinos de louvor a Deus pelo que ti- P.: (Concluindo) — Ó Senhor Deus, nosso Pai,
nham ouvido e visto. E tudo tinha acontecido nossos corações estão cheios de alegria porque
como o anjo havia falado. iluminaste a primeira noite de Natal com o res-
T.: Glória a Deus nas maiores alturas do céu! E plendor do teu Filho, o pequeno Jesus, a Luz
paz na terra para as pessoas a quem ele quer do mundo. Concede, ó Pai, que assim como
bem! esta luz nos conduziu aqui à tua casa, ela tam-
11. Confissão da fé bém ilumine e conduza os nossos corações sem-
pre no caminha da luz divina.
P.: Creio em Deus Pai todo poderoso, criador do Concede que a mensagem do Natal nasça, re-
céu e da terra. nasça e viva nos corações de todas as pessoas na
C.: Creio que este mundo não surgiu por acaso, face da terra.
ou por uma simples explosão, mas creio que foi Por Jesus, o menino de Belém, o nosso Salva-
Deus quem o criou. dor. Amém.
P.: Creio em Jesus Cristo, filho único de Deus,
nascido da virgem Maria pela ação do Espírito 16. Canto Congregacional (HL 555)
Santo. 1. Oh! Vinde, meninos, Não falte ninguém!
C.: Creio que Jesus morreu na cruz para perdoar Correi ao presépio da gruta em Belém,
todos os meus pecados, que ele ressuscitou no E vede o presente sublime que Deus
domingo de Páscoa e que 40 dias após, subiu Na noite feliz nos envia dos céus.
ao céus para preparar um lugar para todos os
que nele creem. Creio também que ele voltará, 2. Oh! Vede deitado do mundo áurea luz,
visivelmente e em glória, para julgar os vivos e Criança divina, que é Cristo Jesus;
os mortos. Em faixas envolto, eis o Filho de Deus,
P.: Creio no Espírito Santo, na santa Igreja Cristã Mais meigo e formoso que os anjos dos céus.
- a comunhão dos santos, na remissão dos peca-
dos, na ressurreição da carne e na vida eterna. 3. Maria e José enlevados estão,
C.: Eu creio que jamais poderia ser filho de Deus, Pastores humildes, em grata oração;
se não fosse o Espírito Santo. Ele entrou em E os anjos alegres entoam louvor
meu coração e me deu a fé. Creio também que Com voz jubilosa a Jesus Salvador.
existe vida após a morte. Creio em Ressurrei-
ção, e não em Reencarnação, porque a Bíblia 4. De joelhos, meninos, de joelhos orai,
diz: “Aos homens está ordenado morrer uma só As mãos para prece sincera elevai;
vez e depois disto, o juízo”. Amém. (Hb 9.27). Uni vossas vozes com santo fervor
12. Canto Congregacional (HL 549) Ao coro dos anjos, louvando ao Senhor!
Ó tempo santo de Natal, 17. Pai Nosso
Tu tens mensagens lindas! T.: Pai nosso, que estás nos céus. Santificado seja
O mundo não tem luz nem paz, o teu nome. Venha o teu reino. Seja feita a tua
Mas isto meu Jesus me traz. vontade, assim na terra como no céu. O pão
Ó tempo santo de Natal, nosso de cada dia nos dá hoje. E perdoa-nos as
Tu tens mensagens lindas! nossas dívidas, assim como nós também per-
doamos aos nossos devedores. E não nos deixes
Ó tempo santo de Natal, cair em tentação. Mas livra-nos do mal. Pois
Eternamente lindo! teu é o reino, o poder, e a glória, para sempre.
Reina alegria em terra e céu: Amém.
O amor do Pai, Jesus nos deu.
Ó tempo santo de Natal, 18. Palavras da Instituição
Eternamente lindo! P.: Nosso Senhor Jesus Cristo, na noite em que foi
13. Mensagem traído, tomou o pão
C.: e, tendo dado graças, o partiu e o deu a seus dis-
14. Ofertório e Recolhimento das cípulos dizendo:
P.: “Tomai, comei, isto é o meu corpo, que é dado
ofertas de gratidão por vós. Fazei isto, em memória minha”.
“Que cada um dê conforme resolveu no coração, C.: E, semelhantemente também, depois da ceia,
não com tristeza nem por obrigação, pois Deus ama tomou o cálice e, tendo dado graças, o entre-
quem dá com alegria”. (2Co 9.7). gou, dizendo:

Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011 | Teologia | 85


Litúrgica: Culto de Natal

P.: “Bebei todos deste. Este cálice é o Novo Testa- 23. Canto Final - HL 560
mento no meu sangue, que é derramado por vós 1. Noite Feliz! Noite Feliz!
para a remissão dos pecados. Fazei isto quantas Ó Senhor, Deus de amor,
vezes o beberdes, em memória minha”. Pobrezinho nasceu em Belém.
P.: A paz do Senhor seja convosco para sempre Eis na lapa Jesus, nosso Bem!
C.: Amém. Dorme em paz, ó Jesus!
19. Agnus Dei Dorme em paz, ó Jesus!
|: Cordeiro Divino, morto pelo pecador, 2. Noite Feliz! Noite Feliz!
sê compassivo! :| Eis que no ar vêm cantar.
Cordeiro Divino, morto pelo pecador, Aos pastores os anjos dos céus,
a paz concede! Amém! Anunciando a chegada de Deus,
20. Distribuição (Hinos Natalinos) De Jesus Salvador!
De Jesus Salvador!
21. Ação de Graças
3. Noite Feliz! Noite Feliz!
T.: Te agradecemos, o Pai, por este presente que Oh! Jesus, Deus da luz,
salva. Pedimos que esta Santa Ceia nos fortale- Quão afável é teu coração
ça a fé em ti e nos dê mais motivação para servir Que quiseste nascer nosso irmão
o nosso semelhante em amor. Mediante Jesus, Para a todos salvar!
nosso Salvador e Senhor. Amém. Para a todos salvar!
22. Bênção 24. Poslúdio e Recessional
e Avisos
Liturgia completa e em diversos formatos no blogue Liturgia Luterana. Inclusive as melodias para as partes
cantadas, sugeridas nesta liturgia. www.liturgialuterana.blogspot.com

Toque de Natal!
Se a nossa maior necessidade fosse educação, Deus teria
mandado um pedagogo; se fosse tecnologia, teria mandado
um cientista; se fosse dinheiro, um economista;
mas como nossa maior necessidade era perdão, amor e vida,
Deus nos mandou o Salvador — Jesus.

A mãe — ficou grávida sendo virgem.


O Pai — abraçou o compromisso.
O Rei — nasce em um estábulo.
A notícia — é anunciada por um anjo.
O sinal — uma estrela no céu.
Os divulgadores — simples pastores de ovelhas.
A história — ganhou o mundo.
Meio incrível, não? De fato. É por isso que o Natal é festa da FÉ!
Neste Natal, tudo bem que o Papai Noel entre pela chaminé ou pela porta. Mas o quarto — o lugar em seu
coração — reserve para o Menino Jesus!

Um feliz Natal e abençoado ano novo a todos.


Pastoral da ULBRA.

86 | Teologia | Dezembro, 2010 e Janeiro, 2011


Direto ao Ponto

O “wikileaks” de cada um
O assunto é Wikileaks — um site na inter-
net que publica documentos, fotos e in-
formações confidenciais, vazadas de governos
fechado, será anunciado abertamente” (Lucas
12.2-3).
O teólogo Dietrich Bonhoeffer, que morreu
ou empresas, sobre assuntos sensíveis. No último torturado nos campos nazistas, escreveu que
dia 28 de novembro, esta organização divulgou nos acostumamos a viver com um duplo enga-
mais de 250 mil documentos secretos enviados no que permite até viver despreocupadamente.
de embaixadas americanas ao redor do mun- Acreditamos que os nossos erros ficarão para
do a Washington. A maior parte dos sempre no abismo do esquecimento,
dados trata de assuntos diplo- e que o oculto nunca será revelado.
máticos — que provocou “Vivemos duas vidas, uma pública
reação negativa de e uma escondida”, disse o mártir
diversos países e alemão. No tempo dele não tinha
deixou o governo Internet, mas se referia ao enga-
dos Estados Unidos no humano diante do wikileaks
muito envergonha- divino.
do. Conta-se que uma viúva teve
O logotipo do problemas com o testamento, e foi
Wikileaks — o planeta Terra vazando — procurada por um advogado ami-
mostra bem que nestes tempos da Inter- go que se ofereceu para cuidar da
net, nada fica em segredo por muito questão. No entanto, a viúva demo-
tempo. Tudo vaza. Bom e ruim ao rou em buscar auxílio jurídico.
mesmo tempo. Bom porque a Percebendo a gravidade, foi ao
gente fica sabendo de coisas que encontro do advogado, mas
nunca deveriam ficar em segre- este a recebeu com as seguintes
do. Ruim porque, cedo ou tarde, palavras: — Sinto muito, mas
os nossos próprios segredos e agora fui escolhido para ser o
confidências estarão às vistas juiz desta questão.
de todos. Quem sabe Escreve a Bíblia:
um cumprimento “Se alguém pecar,
profético daqui- temos Jesus Cris-
lo que disse Jesus to...; ele nos defende
sobre a falsidade: diante do Pai” (1º João
“Tudo o que está coberto 2.1). É Advento, tempo para
vai ser descoberto, e o que está escondido será fugir dos nossos enganos e crer na reveladora
conhecido. Assim tudo o que vocês disserem na história do Natal.
escuridão será ouvido na luz do dia. E tudo o Rev. Marcos Schmidt é pastor da Igreja Evangélica Luterana do Brasil em Novo
Hamburgo-RS
que disserem em segredo, dentro de um quarto

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