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LEX

ISSN 2237-2547

REVISTA JURÍDICA LEX

V. 77 — 2015
SETEMBRO/OUTUBRO

FUNDADA EM 1937
RUA DA CONSOLAÇÃO, 77 — CEP 01301-000
TEL. 11 2126.6000 — FAX 11 2126.6020

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e demais textos produzidos pela área editorial, está atualizada conforme o Acordo Ortográfico
aprovado em 1990 e promulgado pelo Decreto nº 6.583/2008, vigente desde 01/01/2009.
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SÃO PAULO
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As íntegras dos acórdãos aqui publicadas correspondem aos seus originais, obtidos junto ao
órgão competente do respectivo Tribunal.
Esta publicação conta com distribuição em todo o território nacional, para uma tiragem de
3.100 exemplares.

Revista Jurídica LEX


Continuação de: LEX – Revista do Direito Brasileiro
v. 1 (jan./fev. 2003)-.– São Paulo : LEX, 2003-

Bimestral
v. 77 (set./out. 2015)
ISSN 2237-2547

1. Direito – Periódico. 2. Direito Civil e Processual Civil – Periódico. 3. Direito Tributário


– Periódico. 4. Direito das Famílias e Sucessões – Periódico. 5. Direito Empresarial e do
Consumidor. 6. Direito Penal e Processual Penal. 7. Direito Ambiental e Urbanístico.

CDU 34(05)

Ficha catalográfica: Leandro Augusto dos S. Lima – CRB 10/1273


LEX
REVISTA JURÍDICA LEX

EDITORIAL

A Revista Jurídica Lex traz, no número 77 (set./out. 2015), matérias de reno-


mados juristas pátrios. São conteúdos selecionados das mais diversas áreas do Direito,
formando um conjunto de temas de viés diferenciado no mercado editorial brasileiro.
Na área do Direito Civil e Processual Civil, discute-se julgado do STJ na dou-
trina “Avaliação Judicial da ‘Representação Adequada’ das Entidades Legitimadas para
as Ações Coletivas no Brasil – Estudo do Caso Julgado pelo STJ no REsp 1.213.614/
RJ”, do juiz de direito Demócrito Reinaldo Filho. No artigo “Polêmicas Supressões
Encartadas pelo Novo CPC”, o professor e mestre Fernando Rubin apresenta os
principais dispositivos do CPC/73 suprimidos do Novo CPC/2015. O juiz de direito
e mestre Rafael Calmon Rangel, no ensaio “Contraditório Colaborativo e Postura
dos Sujeitos do Processo: uma Reflexão Necessária”, analisa crítica e brevemente o
instituto do contraditório, sob a perspectiva do novo Código de Processo Civil. No
artigo “Mediação de Conflitos no Direito das Famílias”, Hildeliza Lacerda Tinoco
Boechat Cabral, professora e mestre, Michelle Dutra Peres, bacharel em direito,
Carlos Henrique Medeiros de Souza, mestre e doutor, e Vívian Boechat Cabral
Carvalho, especialista, discutem a mediação como uma alternativa para a solução de
conflitos familiares. O especialista e mestre Clovis Brasil Pereira avalia o importante
instituto da petição inicial na doutrina “A Petição Inicial no Novo CPC”.
Na sequência, a professora e mestre Gisele Leite afirma que se não existisse a
ação rescisória triunfariam as injustiças acobertadas pelo manto da coisa julgada e pela
sua eficácia preclusiva no artigo “A Causa Petendi da Ação Rescisória”. Na doutrina
“Marco Inicial do Prazo da Inelegibilidade por Rejeição de Contas: Reconstrução do
Significado de ‘Decisão Irrecorrível’”, o advogado e especialista Helio Deivid Amorim
Maldonado aborda a questão dos direitos políticos, discutindo a legislação sobre o
tema, principalmente as modificações trazidas pela LC nº 135/2010 (Lei da Ficha Lim-
pa). No artigo “A Violência Sexual do Gênero É Causa de Indignidade”, da advogada
e especialista Alinne de Souza Marques, aborda-se a possibilidade de aplicação do
instituto da indignidade, constante no Código Civil brasileiro, aos casos de violência
sexual. Na doutrina “Útero Sub-Rogado nas Uniões Homoafetivas”, Brenda Bandoli
Vieira, bacharel em direito, Helber Campos de Oliveira, advogado e especialista,
Carlos Henrique Medeiros de Souza, mestre e doutor, e Margareth Vetis Zaganelli,
EDITORIAL

mestre e doutora, discorrem sobre a utilização das técnicas de reprodução assistida


heteróloga em uniões homoafetivas e a possibilidade da adoção dos procedimentos
de reprodução assistida pelos casais homoafetivos com ênfase na utilização do útero
sub-rogado, a fim de concretizar o desejo de ter filhos. No artigo “Cabimento de
Ações Coletivas para a Alteração de Nomes de Logradouros Públicos que Homena-
geiam Representantes da Ditadura Militar”, Acir de Matos Gomes e Fábio Cantizani
Gomes, professores e mestres, analisam os modernos princípios do processo coletivo
4 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

para concluir se é cabível ou não a alteração de nomes de logradouros públicos que


homenageiam membros da ditadura militar. O advogado Victor Hugo Marcão Crespo,
no artigo “Considerações sobre o Regime de Cobrança Administrativa Especial da
Portaria RFB nº 1.265/2015”, procura compreender o alcance das sanções previstas
na citada Portaria, notadamente para investigar se a normativa da Receita Federal
é um compilado da legislação vigente ou se, ao contrário, suas previsões revelam
restrições de direitos sem a necessária correspondência legal.
No temário sobre o Direito Penal e Processual Penal, na doutrina “A Dualidade
Havida (a Vida): Seria o Aborto Questão de Saúde Pública ou de Política Criminal?”, o
professor e advogado Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso procura esclarecer
se aborto deve ser tratado como questão de saúde pública ou permanecer na esfera
política criminal. O procurador de justiça e professor Rômulo de Andrade Moreira,
no artigo “A Vítima no Processo Penal Brasileiro”, faz sérias e contundentes críticas
à participação da vítima no processo penal. No artigo “Acordo de Leniência e seus
Reflexos Penais”, Flávio Augusto Maretti Sgrilli Siqueira, mestre e doutor, afirma
que não se pode conferir validade a um acordo elaborado sem a participação do órgão
que detém o poder-dever de deflagrar a ação penal e a chancela do Poder Judiciário.
Seguindo na seara penal, os especialistas e professores Paulo José Freire Teo-
tônio e Luís Augusto Freire Teotônio e os acadêmicos em direito Luan Guilherme
Dias e Luís Augusto Freire Teotônio Júnior apresentam o artigo “Limites e Pers-
pectivas para a Justiça Criminal”. Na sequência, Gustavo Filipe Barbosa Garcia,
doutor e pós-doutor, traz importante estudo na doutrina “Carteira de Trabalho e
Previdência Social – Ausência de Anotação e Competência Criminal”. No artigo
“Da Criminalização Regulamentar em Matéria de Efluentes Ambientais”, Magno
Federici Gomes, pós-doutor e doutor, e Fernando Marques Khaddour, advogado e
especialista, analisam a Resolução nº 430/2011 do Conama. No estudo “Reflexões e
Particularidades sobre a Preclusão, a Coisa Julgada e o Chamado ‘Trânsito em Julgado’
Penal”, Marcellus Polastri Lima, mestre e doutor, e Marciley Boldrini, mestran-
da e especialista, procuram analisar as diferenças e coincidências entre os termos
“preclusão”, “coisa julgada formal” e material e ainda sobre a expressão “trânsito
em julgado”, que às vezes pode ter mais de uma conotação dentro dos fenômenos
investigados. Na doutrina “Condução Coercitiva em CPI: a Legalidade da Condução
Coercitiva de Testemunha, Determinada por Comissão Parlamentar de Inquérito”,
o jurista Renato Marcão e o juiz de direito Rodrigo Tanamati buscam discutir se
as Comissões Parlamentares de Inquérito têm poderes para determinar a condução
forçada daquele que deixar de comparecer voluntariamente.
A Revista Jurídica Lex traz, ainda, seções especiais com Ementário de Acórdãos
e Íntegras de Acórdãos em todas as áreas do Direito. Legislação em Destaque, com
as modificações aprovadas para o período, pode ser acompanhada com o resumo
dos normativos selecionados para as publicações da LEX Editora. Todos os volu-
mes possibilitam, ainda, a pesquisa de matérias nas áreas cível e criminal em índice
alfabético-remissivo. A versão digital da publicação, dirigida com exclusividade aos
assinantes, compõe ainda um amplo conjunto de vantagens: pesquisas qualificadas
em todo o conteúdo, códigos e normas atualizados e anotados diariamente, íntegras
de todos os julgados publicados, notícias do Judiciário e do Legislativo, consolidação
e indexação alfabética e remissiva de todas as matérias e muito mais.
Boa leitura e até o próximo número!
Os Editores.
SUMÁRIO
EDITORIAL ............................................................................................................3

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL


Doutrinas
1. Avaliação Judicial da “Representação Adequada” das Entidades
Legitimadas para as Ações Coletivas no Brasil – Estudo do Caso Julgado
pelo STJ no REsp 1.213.614/RJ
Demócrito Reinaldo Filho...............................................................................11
2. Polêmicas Supressões Encartadas pelo Novo CPC
Fernando Rubin...............................................................................................25
3. Contraditório Colaborativo e Postura dos Sujeitos do Processo: uma
Reflexão Necessária
Rafael Calmon Rangel......................................................................................38
4. Mediação de Conflitos no Direito das Famílias
Hildeliza Lacerda Tinoco Boechat Cabral, Michelle Dutra Peres,
Carlos Henrique Medeiros de Souza e Vívian Boechat Cabral Carvalho......50
5. A Petição Inicial no Novo CPC
Clovis Brasil Pereira........................................................................................68
6. A Causa Petendi da Ação Rescisória
Gisele Leite......................................................................................................72
7. Marco Inicial do Prazo da Inelegibilidade por Rejeição de Contas:
Reconstrução do Significado de “Decisão Irrecorrível”
Helio Deivid Amorim Maldonado...................................................................76
8. A Violência Sexual do Gênero É Causa de Indignidade
Alinne de Souza Marques................................................................................98
9. Útero Sub-Rogado nas Uniões Homoafetivas
Brenda Bandoli Vieira, Helber Campos de Oliveira,
Carlos Henrique Medeiros de Souza e Margareth Vetis Zaganelli...............114
10. Cabimento de Ações Coletivas para a Alteração de Nomes de Logradouros
Públicos que Homenageiam Representantes da Ditadura Militar
Acir de Matos Gomes e Fábio Cantizani Gomes..........................................138
11. Considerações sobre o Regime de Cobrança Administrativa Especial da
Portaria RFB nº 1.265/2015
Victor Hugo Marcão Crespo..........................................................................158
Acórdãos
SUMÁRIO

1. STF – Taxa para Emissão de Anotação de Responsabilidade Técnica. Lei


nº 6.994/82. Princípio da Reserva Legal. Fixação de Valor Máximo
Rel. Min. Dias Toffoli........................................................................................167
2. STF – Dano Moral. Imunidade Parlamentar. Nexo de Causalidade entre a
Manifestação e o Exercício do Mandato. Inexistência. Indenização Devida
Rel. Min. Luís Roberto Barroso.........................................................................173
6 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

3. STJ – Desconsideração da Personalidade Jurídica. O Encerramento das


Atividades ou Dissolução da Sociedade, Ainda que Irregulares, Não São
Causas, por si Sós, para a Desconsideração
Rel. Min. João Otávio de Noronha.....................................................................177
4. STJ – Responsabilidade Civil. Acidente de Trânsito. Dano Moral
e Material. Morte. Pensão. Termo Final. Prescrição. Inocorrência.
Suspensão. Aplicação do Art. 200 do CCB
Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino...............................................................180
5. STJ – Ação de Cobrança. Serviços Advocatícios Prestados de
Forma Individualizada ao HSBC e ao Bamerindus. Solidariedade.
Impossibilidade. Não Ocorrência de Sucessão Universal. Necessidade de
Delimitação da Responsabilidade de cada uma das Partes Demandadas
Rel. Min. Luis Felipe Salomão..........................................................................189
6. STJ – Usucapião Rural. Função Social da Propriedade. Módulo Rural.
Área Mínima Necessária ao Aproveitamento Econômico do Imóvel.
Previsão de Área Máxima a Ser Usucapida. Inexistência de Previsão Legal
de Área Mínima
Rel. p/ o Ac. Min. Luis Felipe Salomão..............................................................196
7. CARFMF – Drawback Suspensão. Aspectos Formais. Adimplemento do
Compromisso de Exportar
Relª Consª Nanci Gama....................................................................................248
8. TRF 1ª R. – Execução Fiscal. Art. 620 do CPC. Princípio da Menor
Onerosidade para o Devedor. Art. 649, V, do CPC. Penhora sobre o
Faturamento da Empresa. Impossibilidade
Relª Desª Fed. Maria do Carmo Cardoso...........................................................253
9. TRF 2ª R. – Propriedade Industrial. Pedido de Adjudicação de Marca.
Prescrição Observada em Relação a um dos Pedidos. Excepcionalidade
da Adjudicação. Má-Fé Não Comprovada
Relª Desª Fed. Simone Schreiber.......................................................................256
10. TRF 3ª R. – Crédito-Prêmio. IPI. Correção Monetária. Índices e
Expurgos Inflacionários Utilizados. Orientação do STJ. Divergência.
Retratação
Rel. Des. Fed. Mairan Maia..............................................................................264
11. TRF 4ª R. – Cooperativa. Liquidação Extrajudicial. Suspensão da
Execução Fiscal. Descabimento
Rel. Des. Fed. Otávio Roberto Pamplona...........................................................269
12. TRF 5ª R. – Imposto sobre Produto Industrializado. Isenção. Veículo
Adquirido por Portador de Deficiência Física. Lei nº 8.989/95, Art. 1º, IV,
§ 1º. Possibilidade
Rel. Des. Fed. Conv. Rubens de Mendonça Canuto.............................................272
13. TJDF – Execução. Penhora. Veículo. Bem Essencial ao Exercício da
Atividade Profissional. Impenhorabilidade. Art. 649, V, do CPC
Rel. Des. José Divino........................................................................................276
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 7

14. TJRJ – Inventário. Requerimento de Assinatura pelo Patrono.


Admissibilidade. CPC, Art. 38
Rel. Des. Cezar Augusto Rodrigues Costa.........................................................279
15. TJRS – Embargos à Execução. Efeito Suspensivo. Existência Cumulativa
dos Requisitos Elencados no § 1º do Art. 739-A do CPC, Imperiosa a sua
Concessão
Relª Desª Ana Paula Dalbosco..........................................................................281
16. TJSC – Busca e Apreensão Convertida em Depósito. Localização do
Veículo. É Plenamente Possível o Cumprimento da Liminar se o Bem É
Localizado após a Conversão do Pedido de Busca e Apreensão em Ação
de Depósito
Relª Desª Hildemar Meneguzzi de Carvalho......................................................284
17. TJSP – Honorários de Advogado. Cumprimento de Sentença. Alienação,
pelo Executado, de Bens Imóveis aos Filhos após o Trânsito em Julgado
do Acórdão que Confirmou a Sentença Condenatória, Reduzindo-o à
Insolvência. Exegese do Art. 593, II, do CPC
Rel. Des. Gomes Varjão....................................................................................287
Ementário............................................................................................................293
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Doutrinas
1. A Dualidade Havida (a Vida): Seria o Aborto Questão de Saúde Pública
ou de Política Criminal?
Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso.................................................361
2. A Vítima no Processo Penal Brasileiro
Rômulo de Andrade Moreira.........................................................................368
3. Acordo de Leniência e seus Reflexos Penais
Flávio Augusto Maretti Sgrilli Siqueira........................................................408
4. Limites e Perspectivas para a Justiça Criminal
Paulo José Freire Teotônio, Luís Augusto Freire Teotônio,
Luan Guilherme Dias e Luís Augusto Freire Teotônio Júnior.....................416
5. Carteira de Trabalho e Previdência Social – Ausência de Anotação e
Competência Criminal
Gustavo Filipe Barbosa Garcia......................................................................428
6. Da Criminalização Regulamentar em Matéria de Efluentes Ambientais
Magno Federici Gomes e Fernando Marques Khaddour..............................434
7. Reflexões e Particularidades sobre a Preclusão, a Coisa Julgada e o
Chamado “Trânsito em Julgado” Penal
Marcellus Polastri Lima e Marciley Boldrini................................................446
SUMÁRIO

8. Condução Coercitiva em CPI: a Legalidade da Condução Coercitiva de


Testemunha, Determinada por Comissão Parlamentar de Inquérito
Renato Marcão e Rodrigo Tanamati..............................................................464
8 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Acórdãos
1. STF – Delito Societário. Crime de Autoria Coletiva. Denúncia Genérica.
Inépcia. Inocorrência. Observância do Art. 41 do CPP. Suficiente
Descrição do Fato Tido como Criminoso. Poder de Gestão na Pessoa Jurídica
Rel. Min. Edson Fachin....................................................................................469
2. STF – Tóxicos. Tráfico e Associação. Arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06.
Prisão Preventiva. Fundamentação Inidônea. Motivação Genérica e
Abstrata. Súmula nº 691/STF. Afastamento. Concessão da Ordem
Relª Minª Rosa Weber.......................................................................................485
3. STF – Permitir ou Entregar Direção de Veículo Automotor a Pessoa Não
Habilitada. Art. 310 do CTB. Crime de Perigo Abstrato. Prescindibilidade
do Resultado Naturalístico
Rel. Min. Dias Toffoli........................................................................................491
4. STF – Homicídio Qualificado. Art. 121, § 2º, do Código Penal. Prisão
Preventiva. Excesso de Prazo Prisional Configurado. Extensão da Ordem.
Art. 580 do Código de Processo Penal
Relª Minª Rosa Weber.......................................................................................496
5. STJ – Estupro de Vulnerável. Elementos do Tipo Penal. Ato Libidinoso.
Menor de 14 Anos. Desclassificação. Inadequação. Constrangimento Ilegal.
Crime Subsidiário. Adequação Típica
Rel. Min. Gurgel de Faria.................................................................................503
6. STJ – Pena. Roubo. Regime Inicial Fechado. Motivação Insuficiente.
Ordem Concedida de Ofício
Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz........................................................................507
7. STJ – Pena. Condenação Criminal com Trânsito em Julgado Há Mais de
Cinco Anos. Configuração de Maus Antecedentes. Possibilidade
Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca..............................................................511
8. STJ – Furto. Princípio da Insignificância. Inaplicabilidade. Concurso de
Agentes. Alto Grau de Reprovabilidade
Rel. Min. Gurgel de Faria.................................................................................516
9. STM – Furto. Princípio da Insignificância. Inaplicabilidade. Teoria da
Amotio ou Apprehensio. Crime Consumado. Reparação da Res Furtiva.
Desclassificação da Conduta. Incabível
Rel. Min. José Barroso Filho.............................................................................519
10. TRF 1ª R. – Liberdade Provisória. Fumus Commissi Delicti. Periculum
In Libertatis. Embasamento. Custódia Cautelar. Impossibilidade.
Característica Rebus Sic Stantibus da Custódia Provisória
Rel. Des. Fed. Hilton Queiroz............................................................................525
11. TRF 2ª R. – Rádio Comunitária. Ausência de Registros de Interferência
na Aeronavegabilidade da Região durante o Período de Operação.
Princípios da Insignificância e da Intervenção Mínima e da Subsidiariedade
Rel. Des. Antonio Ivan Athié.............................................................................531
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 9

12. TRF 3ª R. – Descaminho. Princípio da Insignificância. Aplicabilidade.


Não Encontra Óbice na Existência de Outros Processos Penais
Anteriormente Ajuizados, bem como Habitualidade Extraída de
Autuações Fiscais
Relª Juíza Conv. Denise Avelar..........................................................................539
13. TRF 4ª R. – Pena. Peculato. Inserção de Dados Falsos em Sistema de
Informações (Art. 313-A do CP). Semi-Imputabilidade. Art. 26, Parágrafo
Único, do CP. Circunstâncias Judiciais. Personalidade. Consequências do
Crime
Rel. Des. Fed. Leandro Paulsen.........................................................................546
14. TRF 5ª R. – Obter, Mediante Fraude, Financiamento em Instituição
Financeira. Recursos do Programa de Fortalecimento da Agricultura
Familiar – Pronaf. Configurou-se a Conduta Típica Prevista no Art. 19 da
Lei nº 7.492/86
Rel. Juiz Fed. Conv. Manuel Maia.....................................................................555
15. TJMG – Furto Qualificado. Rompimento de Obstáculo. Quebra de Vidro
de Janela para Acessar o Imóvel. Inclusão da Qualificadora com Base na
Prova Pericial
Rel. Des. Doorgal Andrada...............................................................................559
16. TJRJ – Roubo Qualificado. Emprego de Arma e em Concurso de Pessoas.
Divergência. Voto Vencido. Fração Relativa às Causas de Aumento da
Pena. Redução para o Menor Patamar (1/3). Resgate. Possibilidade.
Extensão de Efeitos aos Corréus
Rel. Des. Joaquim Domingos de Almeida Neto...................................................561
17. TJRS – Execução Penal. Regime Semiaberto. Benefícios Externos.
Inexigibilidade de Preenchimento do Requisito Objetivo de 1/4 de
Cumprimento da Pena Privativa de Liberdade
Rel. Des. Aymoré Roque Pottes de Mello............................................................566
18. TJSC – Pena. Remição. Declarando Remidos 51 Dias Referente aos
Meses de Maio e Junho de 2014. Alegação de que Desempenhava
Funções aos Domingos. Possibilidade
Relª Desª Marli Mosimann Vargas....................................................................571
19. TJSP – Falta Grave. Interrupção do Prazo Aquisitivo para Concessão de
Novos Benefícios. Livramento Condicional. Impossibilidade. Inteligência
da Súmula nº 441/STJ. Posicionamento Revisto
Rel. Des. Willian Campos.................................................................................577
Ementário............................................................................................................579
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL
Cédula de Crédito Rural – Aval Prestado por Pessoa Física – Nulidade –
SUMÁRIO

Possibilidade/Impossibilidade..............................................................................621
Violação de Direito Autoral – Exame Externo do Material Apreendido –
Possibilidade/Impossibilidade – Inaplicabilidade do Princípio da Adequação
Social....................................................................................................................622
10 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

JULGADOS DA OAB – CF/TED.........................................................................623

LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE..........................................................................627
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
Matéria Cível........................................................................................................643
Matéria Criminal..................................................................................................678
AVALIAÇÃO JUDICIAL DA “REPRESENTAÇÃO
ADEQUADA” DAS ENTIDADES LEGITIMADAS PARA AS
AÇÕES COLETIVAS NO BRASIL – ESTUDO DO CASO
JULGADO PELO STJ NO RESP 1.213.614/RJ

Demócrito Reinaldo Filho


Juiz de Direito, Titular da 32ª Vara Cível do Recife.

RESUMO
No presente trabalho procura-se demonstrar que o nosso sistema jurídico não
autoriza que o juiz, ao receber a petição inicial de uma ação coletiva, realize uma
avaliação do preparo técnico, da capacidade econômica ou de qualquer outra condi-
ção específica para o fim de conferir legitimidade para a propositura da demanda. A

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


regra continua sendo a de que, para se propiciar o seguimento do processo coletivo,
é preciso o preenchimento de requisitos objetivos (constituição da associação há pelo
menos um ano e finalidade institucional da defesa dos interesses coletivos). Observa-
se que, no caso julgado pelo STJ, a entidade proponente era despida de qualquer
caráter verdadeiramente associativo, motivo pelo qual o relator teve que recorrer à
regra do art. 125, III, do CPC, que diz que o juiz deve reprimir “ato atentatório à
dignidade da Justiça”, para no caso concreto negar legitimidade à associação autora.
É certo afirmar que o acórdão não cuidou de examinar as condições da autora para
a defesa dos interesses coletivos, mas de constatar que quem promoveu a ação não
era de fato uma associação, mas apenas um ente constituído sob a forma associativa.
Palavras-Chave: Ação Coletiva. Legitimidade. Entidade Legitimada. Requisitos
Objetivos.

TITLE: Judicial evaluation of the “adequate representation” of entities legitimized


for class actions in Brazil – study of a case tried by the Superior Court of Justice
in the Special Appeal 1,213,614/RJ.
ABSTRACT
This article aims at showing that our legal system does not authorize judges to
receive the complaint of a class action, perform evaluation of technical preparation, of
economic capacity or any other specific condition in order to ensure the legitimacy of the
filing of the action. The rule remains that, to provide the progression of class proceedings,
the meeting of objective requirements is necessary (association having been formed for at
least one year and institutional purpose of defending collective interests). It is possible to
see that in the case tried by the Superior Court of Justice, the filing entity had no truly
associative character whatsoever, a reason for which the rapporteur had to use the rule
of art. 125, item III, of the Code of Civil Procedure, which provides that a judge must
repress “acts that are threatening to the dignity of Justice,” so that in the recorded case
12 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

it can deny the legitimacy of the plaintiff’s association. It is correct to affirm that the
appellate decision did not examine the conditions of the plaintiff for defense of the class
interests, as the one filing the suit was not actually an association, but just an entity
formed in an associative way.
Keywords: Class Action. Legitimacy. Legitimized Entity. Objective Requirements.

SUMÁRIO
1 Introdução. 2 Sistema Jurídico Brasileiro Adota Legitimação Ope Legis para as
Ações Coletivas. 3 Necessidade de Preservação dos Interesses Coletivos Impede que
o Processo Seja Extinto por Aspectos Meramente Formais. 4 Pertinência Temática
entre os Interesses Defendidos na Demanda Coletiva e os Fins Institucionais Previstos
no Estatuto da Entidade Autora Não Pode Ser Exigida de Forma Rigorosa. 5 Não
se Pode Extinguir o Processo Coletivo sem Proporcionar que outros Legitimados
Assumam o Polo Ativo da Demanda. 6 Conclusões.

1. INTRODUÇÃO
No dia 8 de outubro deste ano foi divulgada notícia no site do STJ sob o título
“Juiz pode rejeitar ação civil pública proposta por ‘associação de gaveta’”. Na notícia
constava afirmação atribuída ao Ministro Luis Felipe Salomão de que ele lamenta
que a legitimação coletiva venha sendo utilizada de forma indevida ou abusiva por
algumas entidades, taxadas como “associações de gaveta”, que não têm origem na
sociedade civil. A notícia refere-se ao julgamento do REsp 1.213.614/RJ, de relatoria
do eminente Ministro.
Em alguns blogs e grupos de discussão sobre temas jurídicos, a notícia foi
recebida como um indicativo da introdução, por via pretoriana, do controle judi-
cial da “representação adequada” das entidades que promovem ações coletivas. O
acórdão referente ao recurso noticiado só seria publicado semanas depois (em 26
de outubro), talvez por isso tenha ajudado a difundir essa incorreta compreensão
do alcance do julgado.
No entanto, examinando-se com atenção o caso julgado, pode ser melhor
compreendida a lógica de decidir do Ministro-Relator, que apreciou um caso com
circunstâncias peculiares, não se podendo tomá-lo como precedente no sentido de
que o juiz pode e deve, em todo e qualquer caso, fazer um escrutínio das condições
econômicas, da capacidade técnica e da idoneidade da entidade autora da ação
coletiva.
No presente trabalho se procura demonstrar que o nosso sistema jurídico não
autoriza que o juiz, ao receber a petição inicial de uma ação coletiva, realize uma
avaliação do preparo técnico, da capacidade econômica ou de qualquer outra condi-
ção específica para o fim de conferir legitimidade para a propositura da demanda. A
regra continua sendo a de que, para se propiciar o seguimento do processo coletivo,
é preciso o preenchimento de requisitos objetivos (constituição da associação há pelo
menos um ano e finalidade institucional da defesa dos interesses coletivos).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 13

Observa-se que, no caso julgado pelo STJ, a entidade proponente era despida
de qualquer caráter verdadeiramente associativo, motivo pelo qual o relator teve
que recorrer à regra do art. 125, III, do CPC, que diz que o juiz deve reprimir “ato
atentatório à dignidade da Justiça”, para no caso concreto negar legitimidade à
associação autora.
É certo afirmar que o acórdão não cuidou de examinar as condições da auto-
ra para a defesa dos interesses coletivos, mas de constatar que quem promoveu a
ação não era de fato uma associação, mas apenas um ente constituído sob a forma
associativa.
Adiante, o caso é dissecado em maiores detalhes.

2. SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO ADOTA LEGITIMAÇÃO OPE LEGIS


PARA AS AÇÕES COLETIVAS
Efetivamente, o acórdão mencionado representa um caso em que o Tribunal
indicou a intenção de realizar o controle da “representação adequada” de entidades
autoras de ações coletivas. Não se sabe se o Ministro Luis Felipe Salomão (e os
ministros que o acompanharam) tenha se influenciado pela doutrina e pelas juris-
prudências norte-americanas, nas quais o exame da “legitimação adequada” para as
ações coletivas (as class actions) é feito pelo juiz.
Mas é preciso advertir que o nosso sistema processual é diferente do norte-
americano. Aqui são algumas entidades e associações (pessoas jurídicas), definidas
por lei, que podem promover com exclusividade a ação coletiva. Lá nos Estados

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Unidos inclusive pessoas físicas podem promover a ação e pedir para que ela seja
“certificada” como uma ação coletiva (class action). O juiz, numa fase preliminar,
faz então o exame da “representatividade adequada”, inclusive verificando se o
corpo de advogados tem a expertise necessária para conduzir o caso, tudo isso com
a preocupação de não prejudicar o conjunto ou a coletividade de consumidores (em
caso de insucesso na demanda). Somente quando o juiz se assegura de que a parte
autora representa adequadamente os interesses coletivos é que ele “certifica” a ação
como uma class action (ação coletiva); não sendo a hipótese, ela segue tramitando
como uma ação individual.
No sistema processual brasileiro, a legitimação para propor ação coletiva decorre
da lei (ope legis); é a lei que estabelece os legitimados e indica os requisitos para a
atuação judicial em processo coletivo. A lei já se encarregou de, previamente, ava-
liar a capacidade dos entes que legitimou para conduzir as ações coletivas. O nosso
sistema, portanto, é diferente do das class actions estadunidense, onde existe a pos-
sibilidade de aferição pelo magistrado acerca da adequação da representação do ente
legitimado, como forma de garantir um processo que efetivamente tutele os interesses
coletivos. Como requisito de desenvolvimento processual válido, é preciso que o
juiz se convença que o autor possa defender adequadamente os interesses coletivos
que estão em jogo no processo. A isso se dá o nome de representação adequada, cuja
principal consequência é tornar a legitimidade nas ações coletivas em ope iudicis.
Como explica Antonio Gidi, “de acordo com o direito americano, para que uma
14 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

ação coletiva seja aceita, o juiz precisa estar convencido, entre outras coisas, de que
o representante possa representar adequadamente os interesses do grupo em juízo.
Esse é, sem dúvida, o aspecto mais importante das class actions americanas, tanto
do ponto de vista teórico como prático”(1).
Todavia, o instituto da representação adequada não se aplica ao direito processual
coletivo brasileiro, já que a legitimidade é conferida a associações (e outras pessoas
jurídicas). Os requisitos da pré-constituição e da pertinência temática, previstos nos
arts. 82, IV, do CDC e 5º, V, da LACP, não revelam a importação pura da construção
doutrinária alienígena. A esse respeito, discorre Pedro da Silva Dinamarco: “Entre
nós não existe um verdadeiro requisito da representatividade adequada para que os
legitimados possam ajuizar uma ação civil pública, ao contrário do que sustentam
alguns doutrinadores. Dizem eles que as associações teriam de demonstrar essa
qualidade mediante tempo mínimo de constituição e autorização expressa em seus
estatutos ou por deliberação em assembleia. (...) Entretanto, esse requisito nada tem
que ver com a representatividade adequada, que exprime um conjunto de fatores
que demonstrariam concretamente ao juiz, durante todo o curso do processo, ser o
autor pessoa idônea, que irá despender eficazmente todos os esforços necessários
para a defesa dos interesses das pessoas ausentes do processo. Por outro lado, aquela
autorização interna da associação é apenas requisito abstrato para que esteja plena-
mente satisfeita a legitimidade extraordinária em cada caso, não significando que a
entidade irá realmente defender de forma adequada os interesses dos substituídos”(2).
O próprio Ministro Luis Felipe Salomão reconheceu (na ementa e no voto
do REsp 1.213.614/RJ) que, embora constasse do projeto que culminou na Lei nº
7.347/85, a verificação judicial da “representação adequada” foi eliminada do texto
durante a tramitação no Congresso, restando tão somente a verificação de requisitos
objetivos (constituição há pelo menos um ano e finalidade institucional da defesa dos
interesses coletivos) para se propiciar o seguimento do processo coletivo. Confira-se
o seguinte trecho:
“3. É digno de realce que, muito embora o anteprojeto da Lei nº 7.347/85,
com inspiração no direito norte-americano, previa a verificação da represen-
tatividade adequada das associações (adequacy of representation), propondo
que sua legitimação seria verificada no caso concreto pelo juiz, todavia, essa
proposta não prevaleceu, pois o legislador optou por indicar apenas quesitos
objetivos (estar constituída há pelo menos 1 [um] ano e incluir, entre suas
finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à
ordem econômica, à livre-concorrência ou ao patrimônio artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico). Com efeito, o legislador instituiu referidas
ações visando tutelar interesses metaindividuais, partindo da premissa de que
são, presumivelmente, propostas em prol de interesses sociais relevantes ou,

(1) GIDI, Antonio. A representação adequada nas ações coletivas brasileiras: uma proposta. Disponível em:
<www.abdpc.org.br>.
(2) DINAMARCO, Pedro da Silva. Ação civil pública. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 201-202.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 15

ao menos, de interesse coletivo, por legitimado ativo que se apresenta, ope


legis, como representante idôneo do interesse tutelado.” (MANCUSO, Rodol-
fo de Camargo. ACP em defesa do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos
consumidores – Lei 7.347/1985 e legislação complementar. 12. ed. São Paulo:
RT, 2011. p. 430)
Existem autores, entretanto, que, sob a justificativa de evitar que associações
sem qualquer seriedade e conhecimento técnico manejem processos coletivos e
terminem por prejudicar o interesse de todo um grupo de pessoas, defendem o
reconhecimento do instituto da legitimação adequada no ordenamento pátrio, como
é o caso da Profa. Ada Peligrini Grinover, que alerta: “Todavia, problemas práticos
têm surgido pelo manejo de ações coletivas por parte de associações que, embora
obedeçam aos requisitos legais, não apresentam a credibilidade, a seriedade, o co-
nhecimento técnico-científico, a capacidade econômica, a possibilidade de produzir
uma defesa processual válida, dados sensíveis esses que constituem as características
de uma ‘representatividade’ idônea e adequada. (...) Para casos como esse é que
seria de grande valia reconhecer ao juiz o controle sobre a legitimação, em cada
caso concreto, de modo a possibilitar a inadmissibilidade da ação coletiva, quando
a ‘representatividade’ do legitimado se demonstrasse inadequada”(3).
Essa preocupação, todavia, não leva em consideração uma nuance importante
que distingue o sistema de tutela judicial coletiva brasileira do das class actions: os
membros individuais de um grupo não são atingidos por eventual sentença desfa-
vorável em processo coletivo (art. 103 do CDC). Como adverte Vinicius Marques

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Rosa Emygdio, “há um detalhe, pois, de suma importância que não pode ser des-
considerado: enquanto no direito estrangeiro (...) a coisa julgada na ação coletiva
alcança toda a classe envolvida no litígio, independentemente do seu resultado, no
direito pátrio a extensão dos efeitos da decisão é mitigada, uma vez que, em regra, a
sentença desfavorável não prejudica a demanda individual. E em função disso não há
por que atribuir ao julgador a função de avaliar a legitimação do autor da demanda
(substituto), uma vez que, além de tal tarefa já ter sido realizada pelo legislador, as
consequências advindas da má condução processual não obstarão que os membros
da coletividade pleiteiem individualmente seus direitos”(4).
Como se observa, é injustificável a preocupação judicial relativamente a as-
pectos como “credibilidade”, “capacidade econômica” ou mesmo “conhecimento
técnico-científico” da associação que promove uma ação coletiva. O que importa
é que ela preencha os requisitos exigidos em lei para que seja considerada parte
legítima para propor a ação.

(3) GRINOVER, Ada Pellegrini. Ações coletivas ibero-americanas: novas questões sobre a legitimação e
a coisa julgada. Revista Forense, n. 301, p. 3-12.
(4) Breves considerações sobre a representatividade adequada e os limites subjetivos da coisa julgada nos pro-

cessos coletivos, artigo publicado no site Jurisway, em 14.04.2010. Disponível em: <http://www.jurisway.
org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3900>.
16 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Ainda existe outra característica do sistema processual brasileiro que justifica


afastar o controle judicial da legitimidade (adequada) para a propositura de uma ação
coletiva. É que no nosso sistema é conferida ao Ministério Público a função de fiscal
da lei no processo coletivo (art. 5º, § 1º, da Lei nº 7.347/85), sendo-lhe facultado,
inclusive, assumir a titularidade da demanda em caso de desistência ou abandono
da causa (art. 5º, § 3º). Além disso, a lei permite que o Poder Público e outras as-
sociações legitimadas possam ingressar no processo coletivo como litisconsortes da
parte (associação) autora, em defesa dos interesses da coletividade (art. 5º, § 2º).
Como se observa, a verificação judicial da representação adequada não se
coaduna com o ordenamento processual coletivo vigente no Brasil.

3. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DOS INTERESSES COLETIVOS


IMPEDE QUE O PROCESSO SEJA EXTINTO POR ASPECTOS
MERAMENTE FORMAIS
Como se explicou acima, no sistema processual brasileiro, a legitimação para
propor ação coletiva decorre da lei (ope legis); é a lei que estabelece os legitimados e
indica os requisitos para a atuação judicial em processo coletivo.
O caso julgado pelo Ministro Luis Felipe Salomão (Relator do REsp 1.213.614/
RJ) foi de uma excepcionalidade a toda vista, não significando que tenha introduzido,
por via pretoriana, instituto parecido com a “representação adequada” do direito
norte-americano, na qual o juiz faz uma avaliação prévia, casuisticamente, das condi-
ções da pessoa autora da ação coletiva. É certo que em trecho da ementa do acórdão
e do seu voto o Ministro destacou ser “plenamente possível que, excepcionalmente,
de modo devidamente fundamentado, o magistrado exerça, mesmo que de ofício, o
controle de idoneidade (adequação da representação) para aferir/afastar a legitimação
ad causam de associação”. Mas, estudando-se as peculiaridades do caso, vê-se que
o Ministro não pretendeu que, em cada caso, o juiz faça uma avaliação prévia das
condições da entidade autora de uma ação coletiva, sob os aspectos da capacidade
técnica ou econômica.
Com efeito, o Ministro foi buscar fundamento no art. 125, III, do CPC, que
diz que o juiz deve reprimir “ato atentatório à dignidade da Justiça”, para no caso
concreto negar legitimidade à associação autora. É que o caso envolvia circunstância
gravíssima, na qual a entidade autora não era propriamente uma “associação”, mas
apenas uma pessoa jurídica criada formalmente sob essa moldura, que na verdade
poderia servir como artifício de atuação para interesse de um único advogado, sem
qualquer atividade associativa aparente. O Ministro destacou dado revelador apura-
do na Corte de origem de que todos os associados da entidade proponente tinham
domicílio em um único local, circunstância que “já mostra indícios de algo que deve
ser apurado”.
Como se observa, fica fácil perceber que as peculiaridades do caso julgado
denotavam uma situação extrema, de uma associação apenas formal, chamada
“associação de gaveta”, sem qualquer atividade conhecida ou registrada, em que os
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 17

sócios apenas emprestaram seus nomes para sua constituição, tanto que têm um
único domicílio. O Ministro considerou, assim, que permitir que uma “associação”
com esse nível de aparência artificiosa possa movimentar a máquina judiciária, com
isenção de custas e outros benefícios, atenta contra a dignidade da justiça.
Mas isso não significa, como se disse, que se torne regra, em processos coletivos,
de o juiz fazer uma avaliação prévia das condições da entidade autora, quer seja do
ponto de vista técnico, operacional ou econômico. As condições exigidas pelo nosso
ordenamento jurídico são objetivas, bastando que a associação seja constituída há
pelo menos um ano e que tenha entre seus fins institucionais a defesa de interesses
dos consumidores ou das matérias previstas para o manejo da ação civil pública
(arts. 82, IV, do CDC e 5º, V, da Lei nº 7.347/85).
Por outro lado, a atribuição de poder ao magistrado de dizer, em todo e qual-
quer caso, quem é o legitimado para propor a ação coletiva poderia enfraquecer
o microssistema processual de defesa coletiva de interesses em juízo. Pequenas
associações ou com poucos anos de constituição, ou por qualquer outro motivo,
poderiam ser impedidas de litigar em juízo em defesa de interesses coletivos, o que
redundaria num enfraquecimento do sistema coletivo de defesa de direitos. E não
foi isso o que pretendeu o legislador brasileiro.
A tendência processual, inclusive representada com a aprovação no Congres-
so do novo CPC (Lei nº 13.105/2015), é da facilitação e da ampliação da utilização
das ações coletivas. O novo CPC influencia o minissistema de processo coletivos,
caracterizando-se por uma tendência à coletivização dos processos individuais. Por-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


tanto, uma concepção restritiva à legitimação das entidades autoras dos processos
coletivos representaria um retrocesso nessa tendência processual.
O próprio Ministro Luis Felipe Salomão teve a preocupação de evitar que seu
julgado seja utilizado com concepção restritiva, ao dizer que eventual controle excep-
cional da legitimação para a ação coletiva só pode ocorrer contanto que não seja exercido
de modo a ferir a necessária imparcialidade inerente à magistratura, e sem que decorra
de análise eminentemente subjetiva do juiz, ou mesmo de óbice meramente procedimental.
Realmente, não se deve impedir o trânsito de uma ação coletiva por concep-
ções formais que não decorram expressamente do texto da lei. Além disso, permitir
a apreciação das condições da pessoa autora de uma ação coletiva pelo juiz, como
condição de procedibilidade, geraria uma insegurança jurídica tremenda, dado o grau
de subjetivismo na análise individual feita por cada magistrado, em prejuízo, repita-
se, do sistema coletivo de defesa de direitos e em violação ao art. 170, V, da CF, que
coloca a “defesa do consumidor” como princípio da ordem econômica nacional.
A extinção do processo coletivo, sob o fundamento da ilegitimidade da parte
autora, só deve ser adotada em último caso, diante de circunstâncias excepcionais
que comprometam a própria defesa do direito que se pretende tutelar por meio
da ação, nunca por questões meramente formais. “As ações coletivas, em sintonia
com o disposto no art. 6º, VI, do CDC, ao propiciarem a facilitação da tutela dos
direitos individuais homogêneos dos consumidores, viabilizam otimização da pres-
18 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

tação jurisdicional, abrangendo toda uma coletividade atingida em seus direitos”(5).


Nesse sentido, o alto grau de importância e o valor social de que são dotadas as
ações coletivas fazem com que “o Poder Judiciário deva se esmerar em, sempre que
possível, ser condescendente na análise de aspectos relativos ao conhecimento das
ações, deixando de lado o apego ao formalismo”, como advertiu o Ministro Mauro
Campbell Marques(6).
A importância social das ações coletivas faz com que o juiz deva sempre
procurar uma prestação jurisdicional relacionada com o próprio direito material
em causa, ou seja, em sede de processo coletivo prevalece o princípio da primazia
do conhecimento do mérito, como lembrou o Ministro Mauro Campbell Marques no
julgamento do REsp 1.177.453/RS, ao enxergar na regra do § 4º do art. 5º da Lei
nº 7.347/85 indicativo da adoção desse princípio: normas específicas do microssis-
tema em comento e indicativas do que a doutrina contemporânea convencionou
chamar de princípio da primazia do conhecimento do mérito do processo coletivo
são o próprio art. 5º, § 4º, da Lei nº 7.347/85, que é a especialização do princípio
da instrumentalidade das formas (art. 154 do CPC).
Por ter o juiz que buscar quase sempre, no processo coletivo, conferir uma
jurisdição voltada à resolução do mérito, a criação de uma jurisprudência defensiva,
com a colocação de obstáculos ao exame do mérito do processo, traduz um empecilho
ao acesso efetivo ao Judiciário. A colocação de empecilhos formais de toda ordem ao
exame do mérito acaba por contrariar o direito fundamental de acesso à justiça (art.
5º, XXXV, da CF), aqui compreendido como garantia de acesso aos resultados que
o processo se dirige e, pois, garantia de obtenção de pronunciamentos de mérito e
de satisfação prática do direito substancial.
Nesse sentido, é inadmissível a extinção de um processo coletivo com funda-
mento exclusivamente na circunstância de o estatuto da associação proponente ser
“excessivamente genérico”, por exemplo. O princípio da primazia do conhecimento do
mérito, que na verdade é uma faceta ou decorre do princípio da instrumentalidade
das formas (art. 154 do CPC)(7), impede que na demanda coletiva se busque num
formalismo exagerado justificativa para extinguir o processo, afetando a conquista de
um direito difuso ou coletivo. Ainda que um requisito de admissibilidade para a causa
não esteja completamente implementado, deve-se buscar a superação de um formalismo
exagerado, tendo em vista os benefícios incomensuráveis que a ação coletiva pode trazer
para um conjunto de pessoas indeterminadas. Essa é a lição de Rhennan Faria Thamay,
quando discorre sobre o princípio da primazia do conhecimento do mérito no pro-
cesso coletivo: ‘Com esse princípio o que se pretende é de plano o conhecimento da
questão de fundo, ou seja, da matéria que se está a discutir, analisando-se o mérito do

(5) Min. Luis Felipe Salomão, no julgamento do REsp 1.213.614/RJ.


(6) No julgamento do REsp 1.177.453/RS, como relator na Segunda Turma, em 24.08.2010, DJe
30.09.2010.
(7) “Art. 154. Os atos e termos processuais não dependem de forma determinada senão quando a lei ex-

pressamente a exigir, reputando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade
essencial.”
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 19

debate por mais que haja a ausência de um dos requisitos necessários à admissibilidade
da demanda, sendo essa uma das formas de superar o formalismo que veda todo e
qualquer acesso ao Judiciário quando os referidos requisitos não estejam totalmente
implementados. (...). Com esse princípio o que se busca é, por toda a importância
das demandas coletivas, dar seguimento às ações coletivas propostas, visando conhecer
seu mérito e toda a discussão, e não simplesmente acabar com a demanda por ausência
de algum dos requisitos necessários à sua admissibilidade, desde que não causem
prejuízo, por lógico. Isso é relevante pela natureza das demandas coletivas, já que
podem ‘salvar’ milhares de consumidores e cidadãos de incorretas cobranças ou, ainda,
de procedimentos incorretos que se passem, ou até pior, de infrações ambientais de alta
gravidade, não devendo, e muito menos podendo, serem essas demandas afastadas por
mero formalismo que poderá ser superado, visto que o mérito da questão debatida é que
será nesse caso relevante, já que a repercussão é social e atingirá, em regra, um grande
grupo determinado de pessoas ou até um grupo indeterminado. Por tudo isso é que esse
princípio apregoa a superação das formalidades desprestigiadoras, para assim buscar
levar ao Poder Público o conhecimento das mais diversas lesões que todos os dias
se dão em um meio social fragilizado e por vezes esquecido”(8).
Fica evidente, assim, em face dos princípios que regem o processo coletivo e
da importância social que as demandas coletivas adquirem, que não se deve realizar
a extinção do processo com fundamentos de ordem estritamente formais. Não é
compatível com a natureza do processo coletivo, por exemplo, extinguir a demanda
diante de uma ligeira discrepância entre as finalidades estatutárias e a natureza do
direito que se procura preservar e, muito menos, invocar-se uma “excessiva gene-
ralidade” do estatuto da associação autora.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Mesmo nos países em que a legitimação para a propositura da ação coletiva é
apreciada ope judicis, a análise das condições dos titulares da demanda ou da “repre-
sentação adequada” não é feita inspirada em motivações ou argumentos formais ou
com o intuito de restringir o transcurso da ação como uma demanda coletiva, para
extingui-la, mas preponderantemente para garantir que os interesses relevantes que
estão em jogo sejam devidamente defendidos e preservados. Os próprios doutrinado-
res brasileiros citados pelo Ministro Luis Felipe Salomão em seu voto, e que defendem
a possibilidade excepcional do controle judicial da “legitimação adequada”, ressaltam
que esse controle deve ser feito de forma a verificar se a entidade que propõe a ação
tem capacidade para atuar em defesa do grupo: “Se, de um lado, deve o magistrado
abster-se de impor óbices meramente procedimentais aos representantes adequados
dos direitos coletivos, compete-lhe, de outra face, exercer o controle da representati-
vidade com o fito de impedir a iniciativa de entes desprovidos de capacidade para atuar
em defesa do grupo. Do mesmo modo que não seria justo cercear o acesso à justiça
de legitimados dotados de representatividade, também não se poderia permitir que os
direitos coletivos fossem defendidos por entes que desconhecessem os reais interesses da
coletividade ou que não estivessem aptos a tutelá-los de maneira satisfatória (DIDIER

(8) No artigo Princípios do Processo Coletivo, disponível em: <http://rennankrugerthamay.blogspot.com.


br/2012/05/os-principios-do-processo-coletivo.html>.
20 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Jr., Fredie; MOUTA, José Henrique; MAZZEI, Rodrigo [Coords.]. Tutela jurisdicional
coletiva. 2ª série. Salvador: Juspodivm, 2012. p. 173-174).
A preocupação, portanto, mesmo para aqueles que admitem em caráter excep-
cional a análise judicial da “representação adequada” da entidade autora da deman-
da coletiva, é com a “defesa satisfatória” dos interesses do grupo, para evitar que
associações sem condições técnicas e sem qualquer credibilidade possam terminar
prejudicando a defesa dos interesses coletivos. Não se deve colocar óbices mera-
mente formais à legitimação para atuação ativa em demanda coletiva, extinguindo
o processo e trazendo, com isso, consequências sociais indesejáveis. O que parte da
doutrina admite que pode ser feito, de forma excepcional, é uma análise da capaci-
dade jurídica e técnica da entidade proponente, para a defesa dos direitos tutelados.

4. PERTINÊNCIA TEMÁTICA ENTRE OS INTERESSES DEFENDIDOS NA


DEMANDA COLETIVA E OS FINS INSTITUCIONAIS PREVISTOS NO
ESTATUTO DA ENTIDADE AUTORA NÃO PODE SER EXIGIDA DE
FORMA RIGOROSA
O argumento de que o estatuto de uma associação é “excessivamente genérico”,
desatrelado de qualquer outro que aponte para uma efetiva fragilidade técnica ou
operacional da entidade, é de ordem exclusivamente formal, devendo prevalecer
a presunção legal da legitimidade do titular da ação coletiva. Esse argumento não
pode ser utilizado para o juiz se livrar de enfrentar o mérito da demanda. Não pode
o magistrado, só por um estatuto ser genérico, impedir que uma associação devida-
mente capacitada, idônea e com reconhecida visibilidade social em um determinado
setor ingresse em juízo com uma ação coletiva.
Basta um pequeno elo de ligação entre a atuação da entidade autora com a
matéria e a natureza dos direitos defendidos na ação para atribuir-lhe legitimidade
ativa (ad causam). Isso porque a pertinência temática que se exige não deve ser
extremamente rigorosa, sob pena de se formar uma concepção prejudicial à defesa
coletiva de interesses em juízo. É preciso tão somente que a pertinência seja razoável,
que a atuação processual revele alguma relação com a vida institucional da entidade
proponente da demanda coletiva, mas nunca o rigorismo exagerado de uma concep-
ção restritiva, porque isso terminaria redundado em prejuízo do sistema de defesa
coletiva de interesses, como advertiu o Ministro Luiz Fux, no julgamento do AgRg
no REsp 901.936/RJ, assim ementado:
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMATIO AD CAUSAM DO SINDICATO.
PERTINÊNCIA TEMÁTICA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. PREJUÍZO INDE-
MONSTRADO. NULIDADE INEXISTENTE. PRINCÍPIO DA INSTRUMEN-
TALIDADE DAS FORMAS. (...) 2. A pertinência temática é imprescindível
para configurar a legitimatio ad causam do sindicato, consoante cediço na
jurisprudência do e. STF: ADI 3.472/DF, Sepúlveda Pertence, DJ 24.06.05;
ADI-QO 1.282/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, DJ 29.11.02;
e do STJ: REsp 782.961/RJ, desta relatoria, DJ 23.11.06; e REsp 487.202/RJ,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 21

Rel. Min. Teori Zavascki, DJ 24.05.04. 3. A representatividade adequada sob


esse enfoque tem merecido destaque na doutrina; senão vejamos: ‘(...) A per-
tinência temática significa que as associações civis devem incluir entre seus
fins institucionais a defesa dos interesses objetivados na ação civil pública ou
coletiva por elas propostas, dispensada, embora, a autorização de assembleia. Em
outras palavras, a pertinência temática é a adequação entre o objeto da ação e
a finalidade institucional. As associações civis necessitam, portanto, ter finali-
dades institucionais compatíveis com a defesa do interesse transindividual que
pretendam tutelar em juízo. Entretanto, essa finalidade pode ser razoavelmente
genérica; não é preciso que uma associação civil seja constituída para defender
em juízo especificamente aquele exato interesse controvertido na hipótese concre-
ta. Em outras palavras, de forma correta, já se entendeu, por exemplo, que uma
associação civil que tenha por finalidade a defesa do consumidor pode propor ação
coletiva em favor de participantes que tenham desistido de consórcio de veículos,
não se exigindo que tenha sido instituída para a defesa específica de interesses
de consorciados de veículos, desistentes ou inadimplentes. Essa generalidade
não pode ser, entretanto, desarrazoada, sob pena de admitirmos a criação de
uma associação civil para a defesa de qualquer interesse, o que desnaturaria
a exigência de representatividade adequada do grupo lesado. (...). 11. Agravo
regimental desprovido, restando prejudicado o exame dos pedidos formulados
nas Petições 00103627 (fls. 2.042/2.050) e 00147907 (fls. 2.051/2.052), haja
vista que exaustivamente examinados no presente agravo regimental.” (AgRg
no REsp 901.936/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., j. 16.10.08, DJe 16.03.09)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


5. NÃO SE PODE EXTINGUIR O PROCESSO COLETIVO SEM
PROPORCIONAR QUE OUTROS LEGITIMADOS ASSUMAM O POLO
ATIVO DA DEMANDA
É importante chamar a atenção para o fato de que no julgamento do REsp
1.213.614/RJ o Ministro Luis Felipe Salomão somente adotou a solução pela extinção
do processo coletivo porque tinha outro motivo para fazê-lo. É que na instância de
origem o processo havia sido extinto por outro motivo, além da alegada ilegitimidade
ad causam da associação autora da ação coletiva. O magistrado sentenciante, no que
foi seguido pelo acórdão do TRF da 2ª Região, entendera que não havia utilidade
na demanda, daí ter extinto o processo também pela falta de interesse de agir. O
Ministro Luis Felipe destacou em seu voto (e na ementa do acórdão no STJ) que
decidira pela solução da extinção do processo coletivo também com esse segundo
fundamento, ou seja, de que, além da ilegitimidade da parte autora, faltava uma outra
condição da ação, o interesse processual, nesses termos: “8. Outrossim, em reforço
de argumento, além da ausência de legitimidade, fica patente a inexistência de outra
condição da ação – interesse de agir – a igualmente atrair a incidência do art. 267, VI,
do CPC (dispositivo tido por violado), pois, como relatado em petição incidental
formulada às fls. 392-395, a própria recorrente, na mesma linha da tese suscitada
em contrarrazões pela Caixa, reconhece que, em vista do precedente contido no
REsp 1.070.896/SC, a questão de fundo encontra-se ‘fulminada pela prescrição’,
22 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

não vislumbrando a possibilidade de vir a ser enfrentada no processo, visto que a


presente ação coletiva foi ajuizada após o prazo qüinqüenal”.
Tal constatação leva à conclusão de que, no caso julgado pelo STJ, provavelmen-
te o relator não tivesse acatado a extinção do processo coletivo se fosse apenas pela
ilegitimidade da parte autora. Como o relator vislumbrou que, de qualquer maneira,
o processo não poderia seguir ante a evidente falta de utilidade para a coletividade,
aí manteve a extinção decretada nas instâncias ordinárias.
As particularidades que o caso julgado pelo STJ apresenta reforça a ideia de
ser mínima a possibilidade de extinção sumária de um processo coletivo por fun-
damento exclusivo na “inadequada representação” da parte autora. Geralmente
as ações coletivas envolvem interesse social relevante, quer seja pela dimensão ou
característica do dano aos interesses de uma coletividade, quer pela relevância do
bem jurídico a ser protegido, situação que inclusive dispensa o requisito temporal da
constituição da associação autora (pelo prazo mínimo de um ano, art. 5º, § 4º, da Lei
nº 7.347/85). A relevância de um processo com tamanha projeção social e repercussão
em termos de benefícios que pode gerar a número grande de pessoa praticamente impede
a sua extinção com fundamento exclusivo em ilegitimidade da parte autora. Ainda que
o ente que promove a ação possa eventualmente não preencher os requisitos de
legitimação (dispostos nos arts. 82, IV, do CDC e 5º, V, da Lei nº 7.347/85), o ma-
gistrado processante do feito não pode simplesmente adotar solução pela extinção
do processo, pois tem que oportunizar a assunção da causa por outros legitimados,
conforme já decidiu o STJ no julgamento do REsp 1.177.453/RS, assim ementado:
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MICROSSISTEMA DE TUTELA DE DIREITOS
COLETIVOS (EM SENTIDO LATO). ILEGITIMIDADE ATIVA. APLICAÇÃO,
POR ANALOGIA, DOS ARTS. 9º DA LEI Nº 4.717/65 e 5º, § 3º, DA LEI Nº 7.347/85.
POSSIBILIDADE. ABERTURA PARA INGRESSO DE OUTROS LEGITIMADOS
PARA OCUPAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO
DE MÉRITO. MEDIDA DE ULTIMA RATIO. OBSERVAÇÃO COMPULSÓRIA
DAS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA ABSOLUTA. (...) 5.
De acordo com a leitura sistemática e teleológica das Leis de Ação Popular e
Ação Civil Pública, fica evidente que o reconhecimento da ilegitimidade ativa
para o feito jamais poderia conduzir à pura e simples extinção do processo sem
resolução de mérito. 6. Isto porque, segundo os arts. 9º da Lei nº 4.717/65 e 5º, §
3º, da Lei nº 7.347/85, compete ao magistrado condutor do feito, em caso de desis-
tência infundada, abrir oportunidade para que outros interessados assumam o polo
ativo da demanda. 7. Embora as referidas normas digam respeito aos casos em
que parte originalmente legítima opta por não continuar com o processo, sua
lógica é perfeitamente compatível com os casos em que faleça legitimidade a
priori ao autor. Dois são os motivos que levam a esta assertiva. 8. Em primeiro
lugar, colacione-se um motivo dogmático evidente, que diz respeito ao valor
essencialmente social que impregna demandas como a presente, a fazer com que o
Poder Judiciário deva se esmerar em, sempre que possível, ser condescendente na
análise de aspectos relativos ao conhecimento das ações, deixando de lado o apego
ao formalismo. 9. Normas específicas do microssistema em comento e indicativas
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 23

do que a doutrina contemporânea convencionou chamar de princípio da primazia


do conhecimento do mérito do processo coletivo são o próprio art. 5º, § 4º, da Lei
nº 7.347/85, que é a especialização do princípio da instrumentalidade das formas
(art. 154 do CPC). Excertos de doutrina especializada. (...) 15. Recurso espe-
cial não provido.” (REsp 1.177.453/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques,
Segunda Turma, j. 24.08.2010, DJe 30.09.2010)
Esse julgado retrata como nenhum outro o princípio da indisponibilidade da
demanda coletiva, que significa que, ante o interesse público de que se revestem as
demandadas coletivas, nem sequer a parte que a promove tem disponibilidade sobre
ela. Rennan Faria Thamay explica que essa nota da indisponibilidade diferencia o
processo coletivo do processo individual, ao dizer: “Contrariamente ao princípio
da disponibilidade da demanda na via do processo civil individual, o processo cole-
tivo perpassa naturalmente pelo princípio da indisponibilidade, já que a demanda
coletiva não depende da vontade das partes, mas, sim, da necessidade social de sua
propositura. Nesse ponto o que se tornará perceptível é que a demanda coletiva
independe da vontade das partes, visto que há aqui o interesse público que deve
prevalecer, sempre observando os critérios de conveniência e oportunidade. Não há
no processo coletivo a facultas agendi que existe no processo civil tradicional indi-
vidualista, pois há, sim, uma natural indisponibilidade do interesse público, o que
obriga os órgãos públicos a tomarem as devidas medidas. Nesse caso o Ministério
Público é que deve agir”(9).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


6. CONCLUSÕES
1ª) No sistema processual brasileiro, a legitimação para propor ação coletiva
decorre da lei (ope legis); é a lei que estabelece os legitimados e indica os requisitos
para a atuação judicial em processo coletivo. A lei já se encarregou de, previamente,
avaliar a capacidade dos entes que legitimou para conduzir as ações coletivas. Assim,
para ser atestada sua legitimidade ad causam, basta que a associação seja constituída
há pelo menos um ano e que tenha entre seus fins institucionais a defesa de interes-
ses dos consumidores ou das matérias previstas para o manejo da ação civil pública
(arts. 82, IV, do CDC e 5º, V, da Lei nº 7.347/85).
2ª) É injustificável a preocupação judicial relativamente a aspectos como “cre-
dibilidade”, “capacidade econômica” ou mesmo “conhecimento técnico-científico”
da associação que promove uma ação coletiva. O que importa é que ela preencha os
requisitos exigidos em lei para que seja considerada parte legítima para propor a ação.
3ª) O que ficou assentado no julgamento do REsp é que o juiz pode negar le-
gitimidade quando quem promove a ação não é de fato uma associação, mas apenas
um ente constituído sob a forma associativa, porque nesse caso se considera atenta-
tório à dignidade da justiça permitir que pessoa jurídica com esse nível de aparência

(9) Ob. cit.


24 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

artificiosa (verdadeira “associação de gaveta”) possa ser admitida para movimentar


a máquina judiciária, com isenção de custas e outros benefícios.
4ª) Não se deve colocar óbices meramente formais à legitimação para atuação
ativa em demanda coletiva, extinguindo o processo e trazendo, com isso, conse-
quências sociais indesejáveis. O princípio da primazia do conhecimento do mérito, que
na verdade é uma faceta ou decorre do princípio da instrumentalidade das formas
(art. 154 do CPC), impede que na demanda coletiva se busque num formalismo
exagerado justificativa para extinguir o processo, afetando o reconhecimento de
um direito difuso ou coletivo. Ainda que um requisito de admissibilidade para a
causa não esteja completamente implementado, deve-se buscar a superação de um
formalismo exagerado, tendo em vista os benefícios incomensuráveis que a ação
coletiva pode trazer para um conjunto de pessoas indeterminadas. A colocação
de empecilhos formais de toda ordem ao exame do mérito acaba por contrariar o
direito fundamental de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF) e enfraquece o sistema
coletivo de defesa de direitos, em violação ao art. 170, V, da CF, que coloca a “defesa
do consumidor” como princípio da ordem econômica nacional.
5ª) Em relação à pertinência temática, basta um pequeno elo entre a atuação
da entidade autora com a matéria e a natureza dos direitos defendidos na presente
ação para atribuir-lhe legitimidade ativa (ad causam). Isso porque a pertinência te-
mática que se exige (nos arts. 82, IV, do CDC e 5º, V, da Lei nº 7.347/85) não deve
ser extremamente rigorosa, sob pena de se formar uma concepção prejudicial à
defesa coletiva de interesses em juízo. É preciso tão somente que a pertinência seja
razoável, que a atuação processual revele alguma relação com a vida institucional
da entidade proponente da demanda coletiva, mas nunca o rigorismo exagerado
de uma concepção restritiva, porque isso terminaria redundado em prejuízo do
sistema de defesa coletiva de interesses. Não pode o magistrado, só por um estatuto
ser genérico, impedir que uma associação devidamente capacitada, idônea e com
reconhecida visibilidade social em um determinado setor ingresse em juízo com
uma ação coletiva.
6ª) Em face da relevância social e da repercussão em termos de benefícios que
pode gerar a número grande de pessoas, não se pode promover a extinção do pro-
cesso coletivo com fundamento exclusivo em ilegitimidade da parte autora sem antes
proporcionar a assunção do polo ativo por outros entes legitimados, em atenção ao
princípio da indisponibilidade da demanda coletiva (art. 5º, § 3º, da Lei nº 7.347/85).
POLÊMICAS SUPRESSÕES ENCARTADAS PELO NOVO CPC

Fernando Rubin
Advogado Sócio do Escritório de Direito Social, Especializado em Saúde do Trabalhador;
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com a
distinção da Láurea Acadêmica; Mestre em Processo Civil pela UFRGS; Professor da
Graduação e da Pós-Graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis – UniRitter,
Laureate International Universities; Professor Colaborador da Escola Superior de
Advocacia (ESA/RS); Professor Pesquisador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio
Grande do Sul (IMED-Cetra); Professor Convidado de Cursos de Pós-Graduação Lato
Sensu; Membro do Centro de Estudos Avançados em Processo Civil (CEAPRO) e do
Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP); Colunista e Articulista de Revistas
Jurídicas; Parecerista.

RESUMO
O presente trabalho se propõe a apresentar os principais dispositivos do CPC/73
suprimidos do Novo CPC/2015, propondo interpretação da necessidade de manu-
tenção de muitas das concepções banidas, diante da inexistência de convincente
ratio justificadora do desaparecimento de figuras relevantes ao regular andamento
do processo judicial.
Palavras-Chave: Supressões. CPC/73. Novo CPC/2015. Lei nº 13.105/2015.

TITLE: Controversial omissions presented by the new Code of Civil Procedure.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


ABSTRACT
This article aims at presenting the main provisions of the Code of Civil Procedure of
1973 omitted in the new Code of Civil Procedure (2015), by proposing the interpretation of
the need for maintenance of many of the deleted concepts, upon the non-existence of a convin-
cing and justifiable ratio for the disappearance of relevant points of the judicial procedures.
Keywords: Omissions. Code of Civil Procedure/73. New Code of Civil Procedu-
re/2015. Law no. 13,105/2015.

SUMÁRIO
I – Apresentação: do Rol de Supressões Encartadas pelo Novo CPC. II – Do
Efeito Translativo do Recurso de Apelação. III – Da Definição das Diferenciações
entre Prazo Peremptório e Prazo Dilatório. IV – Do Princípio da Identidade Física
do Juiz. V – Da Aplicação da Analogia, Costumes e Princípios Gerais do Direito.
VI – Referências Conclusivas. Doutrina Selecionada.

I – APRESENTAÇÃO: DO ROL DE SUPRESSÕES ENCARTADAS PELO


NOVO CPC
Já chegamos ao estágio de estruturarmos como adequada – e até mesmo
necessária – a formatação de um atualizado sistema processual, de acordo com as
26 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

disposições constitucionais pátrias(1), garantidoras – e balanceadoras – de efetividade


e segurança jurídica para uma suficiente tutela jurisdicional(2).
Agora, não podemos olvidar que foram encaminhadas supressões de determi-
nados dispositivos contidos no Código Buzaid que não encontram razoável justi-
ficativa, podendo até mesmo vir a causar eventual prejuízo à obtenção da aludida
suficiente tutela jurisdicional(3).
Dentro desse rol de supressões poderíamos apontar a do art. 132, caput, do
CPC/73, a tratar o princípio da identidade física do juiz; a do art. 126, parágrafo
único, a tratar da referência à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de
direito, como recursos utilizáveis pelo magistrado à falta de normas legais; a dos
arts. 181 e 182, a destacar as diferenças conceituais entre os prazos peremptórios e
dilatórios; a do art. 516 do Código Buzaid, a reger os efeitos translativos do recurso
de apelação; a do art. 188, a tratar da supressão do prazo em quádruplo para a con-
testação da Fazenda Pública e do Ministério Público; e a do art. 518 e seu parágrafo
único, a reger a exigência de juízo de admissibilidade pelo órgão de primeiro grau.
Com relação às duas últimas novidades, pensamos que podem sem compre-
endidas sem maiores digressões: a primeira pelo fato de, em geral, os prazos para a
Fazenda Pública e para o Ministério Público serem dobrados pelo Novo CPC, o que
estabelece certo ajuste no sistema de supressão de prazo em quádruplo exclusiva-
mente para contestar; e a segunda pelo fato de o juízo de admissibilidade ser matéria
de ordem pública, inclusive pelo sistema ainda em vigência, o que já determinava a
possibilidade de reexame oficioso do juízo de admissibilidade recursal pelo Tribunal
ad quem, operando-se, assim, pelo novel diploma, tão somente uma simplificação
de formas, evitando-se retrabalho.
No entanto, nos demais pontos acreditamos que as supressões entabuladas
devem ser desconsideradas pelo operador do direito, quando da aplicação do novo
sistema adjetivo, a entrar em vigor a partir de 18 de março de 2016.
Passemos, pois, à análise de cada um dos pontos tormentosos, em pormenor.

II – DO EFEITO TRANSLATIVO DO RECURSO DE APELAÇÃO


O ato judicial, mesmo não podendo fazer coisa julgada material, não fica sujeito
a ser, livremente, desfeito ou ignorado pelo seu prolator ou por outros juízes, não se
podendo decidir novamente questões já decididas relativas à mesma lide, conforme
comando contido no art. 471 do Código Buzaid.

(1) RUBIN, Fernando. A preclusão na dinâmica do processo civil, de acordo com o Projeto do Novo CPC. 2.
ed. São Paulo: Atlas, 2014.
(2) RUBIN, Fernando. Efetividade versus segurança jurídica: cenários de concretização dos dois macro-

princípios processuais no Novo CPC. Páginas de Direito, v. 1, 2015.


(3) A respeito do rol de supressões, Costa Machado trata de “40 figuras que desaparecem com o Novo

CPC”; entendemos que o estudo não teve a profundidade necessária, nem mesmo sendo examinados
com ampliação outros casos, mas mesmo assim é obra propedêutica interessante a ser consultada: Novo
CPC – sistematizado e resumido. São Paulo: Atlas, 2015.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 27

Diversamente da preclusão temporal, dirigida unicamente às partes, a preclu-


são consumativa pode vincular o magistrado, que nos termos do dispositivo infra-
constitucional supramencionado está impedido, por regra, e fora das vias recursais,
quando estritamente admitidas(4), de voltar ao reexame e ao rejulgamento das mesmas
questões já decididas, em novos pronunciamentos no processo.
Mas se a parte interpuser recurso, e a modalidade irresignatória não admitir a
reconsideração do prolator, teríamos preclusão da questão para este, mas não para
o Poder Judiciário, que reapreciará a discussão via juízo hierarquicamente superior.
Há, de fato, situações que configuram a regra, nas quais o recurso à superior instância
não permite que, concomitantemente, o juízo a quo se retrate; nesse caso, teríamos,
na hipótese de manejo do recurso, uma preclusão de instância (do primeiro grau),
mas não da matéria (para o segundo grau)(5).
Se, por expressa disposição de lei, a oposição de recurso à superior instância
normalmente veda a reconsideração pelo juízo a quo, também o resultado definitivo
apontado pelo Tribunal ad quem imporá que o tema não volte a ser enfrentado no
primeiro grau em ulteriores oportunidades do procedimento ainda sob seu comando,
já que aqui estar-se-ia configurada, conforme o art. 512 do CPC, uma preclusão em
razão da hierarquia judiciária (preclusão hierárquica)(6).
Por sua vez, situação que mais importa nessa passagem do presente ensaio, a
instância superior está obviamente impedida de modificar a decisão a quo de que não
cabe mais recursos, salvo se relacionado ao efeito translativo recursal. Caso típico de
preclusão de questões atingindo o juízo superior, que pode conhecer, em apelação,
da matéria de fato e de direito impugnada em face dos termos da sentença (efeito

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


devolutivo, art. 515 CPC), mas não pode conhecer das questões decididas pelo juízo
de primeiro grau, v.g., no despacho saneador, que acabaram restando inimpugnadas
pela parte interessada/prejudicada (art. 331, § 2º, c/c o art. 516, ambos do CPC)(7).
Moniz de Aragão(8), interpretando mais especificamente o teor do art. 516 do
CPC, refere que, fora as imperfeições do dispositivo, ressai do texto a regra geral de
ficarem subtraídas ao conhecimento do Tribunal as questões preclusas em decor-
rência de a parte não lhes ter dado competente combate através de recurso contra

(4) V.g., reconsideração de decisão pelo próprio prolator no agravo, na apelação de petição inepta e, a
partir da Lei nº 11.277/06, na apelação em face de sentença que julga de plano improcedente a demanda
estritamente de direito sem citação do réu.
(5) É o que ocorre com o juízo originário, diante de recurso de apelação interposto contra a sentença

por ele prolatada, na forma determinada pelo art. 463 do Código Processual.
(6) Caso típico em que há prolação de acórdão, em face de agravo de instrumento manejado contra deci-

são interlocutória gravosa, que passa a substituir o teor desta e impede o magistrado de posteriormente
reabrir o tema na instância inferior – mas, como não poderia deixar de ser, tal vedação se estabelece
nos estritos limites da matéria objeto de recurso, não se cogitando de alteração da situação fática e/ou
probatória (como no caso das liminares).
(7) MARINONI, Tereza Cristina. Sobre o pedido de reconsideração (sucedâneo de recurso?). Revista de

Processo, n. 62, 1991, 299/306.


(8) ARAGÃO, E. D. Moniz. Preclusão (processo civil). In: ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto (Co-

ord.). Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989. p. 177.
28 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

a decisão (interlocutória) que as solucionou: “nenhum juiz, pois, poderá revê-las,


nem mesmo o Tribunal”. De fato, conforme comentam Amir José F. Sarti(9) e Teresa
Arruda Alvim Wambier(10), o efeito translativo do recurso de apelação de que trata
o aludido dispositivo processual não envolve toda e qualquer matéria desenvolvida
antes da sentença, mas tão somente as (excepcionais) de ordem pública.
A ressalva quanto à possibilidade de reexame da decisão no que diz respeito às
matérias de ordem pública (como a prescrição, as nulidades e a matéria probatória),
seja pelo mesmo julgador (quando mantém jurisdição), seja pela instância superior
(em caso de recurso, com efeito devolutivo), reside na impossibilidade de, nesses
casos, se operar a preclusão, tendo-se em conta que as referidas matérias impera-
tivas, por serem notadamente de interesse suprapartes (para usarmos a concepção
consagrada por Galeno Lacerda(11)), podem ser reavaliadas ulteriormente. Mas mesmo
nessas situações excepcionais a melhor doutrina, encabeçada por Vittorio Denti(12)
em seu ensaio específico a respeito das questioni rilevabili d’ufficio e contradittorio,
indica a necessidade do estabelecimento de um contraditório prévio entre as partes,
sob pena de nulidade da decisão (tomada de ofício) – tudo a resguardar o direito
constitucional de defesa e a exigência, mais atual do processo, de colaboração(13)
(cuja orientação encontra-se expressa no Novo CPC, arts. 6º e 10).
Enfim, o efeito translativo, regulado no art. 516 do Código Buzaid, garante,
portanto, ao Tribunal ad quem examinar matérias de ordem pública, mesmo que
não invocadas ao longo da tramitação da lide, desde que evidentemente venham a
favorecer a parte recorrente(14), sob pena de infringência ao princípio da reformatio
in pejus(15).
Registra o comentado art. 516 que ficam também submetidas ao Tribunal as
questões anteriores à sentença, ainda não decididas. Ocorre que, ao tratar da temá-
tica, o Novo CPC registra tão só no art. 1.013, § 1º, que serão objeto de apreciação e

(9) SARTI, Amir José Finocchiaro. Apelação: efeito devolutivo e preclusão das questões processuais.
Ajuris, n. 70, 1997, 240/249.
(10) WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Omissão judicial e embargos de declaração. São Paulo: RT, 2005. p.

189.
(11) LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953.

(12) DENTI, Vittorio. Questioni rilevabili d’ufficio e contradittorio. Rivista de Diritto Processuale, n. 23,

1968, 217/231.
(13) MITIDIERO, Daniel. A colaboração no processo civil. São Paulo: RT, 2009.

(14) Em sentido contrário, Luis Eduardo Simardi Fernandes expõe que não se entende violada a proibição

da reformatio in pejus quando o Judiciário, ao apreciar o recurso, conhece de questão de ordem pública,
que pode ser examinada de ofício a qualquer tempo e grau de jurisdição: Embargos de declaração – efeitos
infringentes, prequestionamento e outros aspectos polêmicos. 4. ed. São Paulo: RT, 2015. p. 146.
(15) Esta solução, por nós defendida, parece ter sido muito bem captada por Vicente Greco Filho: se é

certo que há decisões irrecorríveis e que, portanto, não precluem no curso do processo, bem como de-
cisões que, por tratarem de ordem pública, podem ser sempre reexaminadas enquanto não transitar em
julgado a sentença que provoca a preclusão máxima, cabe ao recurso (da parte a ser beneficiada) manter
a decisão em condições de ser modificada: Direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1984. p.
261. v. 2.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 29

julgamento pelo Tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda


que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado(16).
O ponto polêmico circunscreve-se exatamente à parte final, já que, s.m.j.,
vincula o exame da matéria pelo Tribunal ad quem ao efeito devolutivo, relacionado
ao ponto impugnado da sentença. Não entendemos como adequada essa restrição, o
que pode criar no futuro certo embaraço à tradicional aplicação do efeito translativo
do recurso de apelação.
Persistimos entendendo que diante da importância do reconhecimento de tais
matérias, mesmo que não tenham sido objeto direto de recurso, cabe ao Tribunal
enfrentá-las, em preliminar recursal, determinando, se for o caso, o retorno dos autos
à origem para ajustes no procedimento – é o caso, por exemplo, de reconhecimento
oficioso pela instância superior da necessidade de complementação de prova ou
sanação de vício grave, a ser realizada na origem, com a desconstituição de plano
da sentença já proferida.
Mesmo que não tenha sido reeditado o art. 516 do CPC, cremos que há outros
dispositivos na Lei nº 13.105/2015 que garantem serem, determinadas matérias,
de ordem pública (com direito ao reconhecimento ex officio pelo julgador), o que
deverá colmatar a imprecisão legislativa no ponto.
Há de se reconhecer, por fim, que já há na doutrina entendimento no sentido de
que a redação do Novo CPC acaba, ao fim e ao cabo, por manter o efeito translativo
da apelação(17), o que nos conforta, mas sem que se torne inócua, ao menos por ora,
a crítica à redação do novel dispositivo e a supressão do antigo.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


III – DA DEFINIÇÃO DAS DIFERENCIAÇÕES ENTRE PRAZO PEREMPTÓRIO
E PRAZO DILATÓRIO
A mais usual das modalidades, a preclusão temporal, consiste na perda do
direito de praticar determinado ato processual pelo decurso do prazo fixado para o
seu exercício. Esse aludido “direito de praticar um ato processual” representa uma
faculdade conferida às partes de se manifestarem ao longo do processo, desde o in-
gresso com a petição inicial (com a sua causa petendi próxima e remota, e o pedido),
passando pela contestação (com a apresentação necessária de toda possível matéria
preliminar, prejudicial e de mérito), ingressando na ativa produção probatória, e,
inclusive, chegando à previsão do manejo de recursos, sempre na busca da defesa dos
seus interesses, sob pena dos ônus decorrentes da sua inércia, em todos esses casos(18).
A regra, esculpida no art. 183 do CPC/73, é de que decorrido o prazo, extingue-
se o direito de praticar o ato, independentemente de manifestação judicial; assim,

(16) ROQUE, André et al. (Org.). Novo CPC: anotado e comparado. São Paulo: Foco Jurídico, 2015. p.
180 e 264.
(17) DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Atlas, 2015. p. 770.

(18) Igualmente, na seara executória, até a sentença de extinção da execução, opera-se com robustez o

fenômeno, sendo inúmeros os prazos preclusivos que movem avante o feito para satisfação do crédito.
30 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

a natureza da decisão judicial que declarar a perda de uma faculdade processual


certamente não é constitutiva(19) – daí reconhecer-se que a preclusão normalmente
se opera ipso iure(20).
Além disso, é defeso às partes, nos termos do art. 182, ainda que todas estejam
de acordo, reduzir ou prorrogar os prazos peremptórios; tão só admitindo a lei,
de acordo com o art. 181, a alteração dos prazos dilatórios, e desde que ambos os
litigantes estejam de acordo – o que está em sintonia com a letra do art. 265, II, que
prevê a suspensão do processo em face da convenção de ambas as partes. Seriam
peremptórios, dentre outros, o prazo para resposta do réu (arts. 241 e 297), para
excepcionar (arts. 304 e 305), e para recorrer (art. 508); sendo dilatório o prazo,
v.g., para falar nos autos, mesmo fixando a lei prazo para a manifestação da parte
contrária, como nos arts. 398 e 327(21).
Tratando dos prazos peremptórios (art. 182 do CPC) sobre os quais realmente
não se deve discutir quanto à relativização da preclusão posta, Humberto Theodoro
Júnior apresenta sucinta e adequada concepção ao compará-los aos prazos dilatórios
(art. 181 do CPC), embora deixe claro a dificuldade prática de distingui-los – o que
ainda hoje é objeto de discussão e dúvidas, mesmo entre os juristas de escol(22):
“Não determinou o Código um critério especial para identificar, dentro dos prazos
legais, quais são os peremptórios e quais os dilatórios. Caberá, pois, à jurisprudência
a seleção casuística dos prazos de uma e outra espécie. Há alguns prazos, todavia,
que têm sua natureza já assentada dentro de um consenso mais ou menos uniforme
da doutrina processualística. Com efeito, os prazos para contestar, para oferecer
exceções e reconvenção, bem como o de recorrer, são tidos como peremptórios”(23).
Vê-se que os comandos contidos nos arts. 181 e 182 do CPC (cópias, respec-
tivamente, dos arts. 153 e 154 do CPC italiano), como expressamente consta, são
dirigidos estritamente às partes, não se dirigindo ao magistrado. Realmente, o juiz

(19) FERREIRA FILHO, Manoel Caetano. A preclusão no direito processual civil. Curitiba: Juruá, 1991. p. 81.

(20) Vale, ainda, para fins de reforço do entendimento, a transcrição da posição de Barrios de Angelis: “De

ahí que los impulsores del proceso sean las partes, el tribunal y la ley; que haya un impulso de parte, del
oficio y ex lege. Este último se efectúa mediante el decurso automático de los prazos, y la determinación
de las correspondientes preclusiones”: El proceso civil – Código General del Proceso. Montevidéo: IDEA,
1989. p. 224.
(21) ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: RT, 1997. v. 1. p. 454/457.

(22) É a posição compartilhada por Barbosa Moreira: “Apesar de propenso à formulação de definições,

houve por bem o Código, justamente aqui, silenciar quanto aos conceitos de ‘prazo dilatório’ e ‘prazo
peremptório’. Isso tem dificultado a sistematização da matéria e gerado perplexidades entre os intérpretes
e aplicadores da lei”: Sobre prazos peremptórios e dilatórios. In: Temas de direito processual. Segunda série.
2. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 49/60. Sobre o ponto ainda interessante a manifestação de Alcides
Mendonça de Lima, que exemplifica alguns dos mais importantes prazos peremptórios: “Como o Código
não classificou os prazos dilatórios e os peremptórios em dispositivos especiais, não podem os mesmos
ser agrupados arbitrariamente, pela influência que decorre da aplicação dos arts. 181 e 182, pela índole
do prazo de recurso, o mesmo é peremptório, como a da contestação, dos embargos do devedor, etc.”:
Introdução aos recursos cíveis. 2. ed. São Paulo: RT, 1976. p. 283.
(23) THEODORO Jr., Humberto. Curso de direito processual. 38. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. v.

1. p. 220.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 31

não incorre em preclusão temporal, por exceder os prazos que lhe sejam prefixados
– daí dizer-se que recaem sobre o diretor do processo os prazos impróprios (que
são normalmente tidos como “dilatórios” ou “não peremptórios” ou, ainda, “não
preclusivos”)(24).
Pelo Novo CPC, os arts. 181 e 182 não são reeditados na íntegra, havendo tão
só disposição contida no art. 222, § 1º, da Lei nº 13.105/2015, registrando que ao
juiz é vedado reduzir prazos peremptórios sem anuência das partes. Ora, tal “novi-
dade” é absolutamente despicienda, já que se sabe que será raro cenário de acordo
das partes para reduzir prazo peremptório(25).
Por outro lado, o art. 139, VI, do Novo CPC disciplina que o juiz, como
diretor do processo, poderá prorrogar os prazos, especialmente na situação de
requerimento pela parte interessada. Ora, evidente que nem todos os prazos serão
passíveis de prorrogação, mas tão somente os prazos dilatórios(26). Os consagrados
prazos peremptórios, como de apresentar defesa e recurso, devem, a seu turno,
seguir sendo impossíveis de prorrogação pelo juízo, sob pena de restarmos sem
organização nenhuma do procedimento, limite de formalismo necessário ao qual a
preclusão se presta(27).
Portanto, segue sendo necessário distinguirmos os efeitos dos prazos peremp-
tórios e dos prazos dilatórios, que aparecem em maior número no processo e podem
ser prorrogados pelo juiz, a requerimento da parte interessada, mesmo que com
oposição da parte litigante contrária.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


O fato de o Novo CPC não reiterar todos os dispositivos de diferenciação con-
ceitual dos prazos não determina que a distinção simplesmente tenha desaparecido,
sendo necessária a manutenção da distinção, inclusive para que possamos realmente
reconhecer que a maioria dos dispositivos do codex que estabelecem prazos sejam

(24) Realmente, quanto à nomenclatura utilizada, assevera Dinamarco que “peremptório, na linguagem
do Código (art. 182) significa preclusivo (prazo próprio), e dilatório (art. 181) está por não preclusivo
(prazo impróprio)”, e diz mais: “Voltemos agora aos arts. 153 e 154 do Código italiano e veremos que
o nosso contém, nos arts. 181 e 182, dispositivos substancialmente idênticos àqueles: são suscetíveis de
alteração entre nós os prazos (não preclusivos) a que a lei chama dilatórios (lá, ordinatori) e são insus-
cetíveis os peremptórios (na Itália, perentori)”: Fundamentos do processo civil moderno. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 2000. v. I. p. 196.
(25) Também André Vasconcelos Roque destaca a sua “perplexidade” com relação à referência ao prazo

peremptório, nos termos do art. 222, § 1º, do Novo CPC: Teoria geral do processo – Comentários ao CPC
de 2015. São Paulo: Método, 2015. p. 696.
(26) Em outro recente escrito já havíamos alertado que seria forçoso restringir a novidade destacada no

Projeto (art. 139, VI) à fase instrutória, em que vínhamos admitindo ser o espaço devido em que se po-
deria falar irrestritamente em prazos não sujeitos à imediata preclusão (prazos dilatórios). Sim, porque
se passamos a falar no conceito de prazo fatal (peremptório), inegável reconhecer que o juiz não poderia
dilatar tal prazo, como ocorre, por exemplo, com o prazo contestacional de 15 dias – inegável medida
integrante da fase postulatória e sujeita à rígida regra preclusiva, como historicamente reconhecido pela
jurisprudência: Grandes temas do Novo CPC. Livraria do Advogado: Porto Alegre, maio/2015, p. 85-106.
(27) ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva,

2003.
32 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

passíveis de prorrogação, salvo manifestas exceções em que o prazo deve ser com-
preendido como peremptório.

IV – DO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ


O Novo CPC, Lei nº 13.105/2015, causa ainda maior perplexidade ao suprimir
do sistema o art. 132, caput, do Código Buzaid, a explicitar o princípio da identi-
dade física do juiz, in verbis: “O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência
julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo,
promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor”.
Entendemos que se trata de verdadeiro princípio, a favor da oralidade, da
colaboração e da aproximação do julgador da realidade da causa concreta, razão
pela qual não pode simplesmente ser afastado, pelo operador do direito, em face de
inexistência de previsão legal.
Fica evidenciada, pela letra do Código de 1973, a existência de diversas ocasiões
em que o princípio da identidade física do juiz poderá e necessariamente virá a ser
excepcionado, mas, como bem observam Sérgio Porto e Guilherme Porto, tal situação
não retira a sua importância, já que, como regra, deve-se primar pela manutenção
do magistrado na causa, pois aquele que instruiu a demanda possui, sem dúvidas,
melhores condições fáticas para julgar o feito(28).
Repara-se, nesse mesmo diapasão, que a ratio do novo sistema se coloca, em
linhas gerais, justamente no sentido de nivelamento e aproximação do magistrado
para com as partes, sugerindo, inclusive, a realização de três audiências antes da
prolação de sentença: (a) audiência inicial – para acordo e contestação; (b) audiência
de saneamento – para prosseguimento da lide nos termos ajustados; e (c) audiência
de instrução e julgamento – para coleta, especialmente, da prova oral.
Mais adequado, assim, que o mesmo magistrado realize tais movimentos em
busca da cognição exauriente da causa, mantendo-se no controle do feito (ao me-
nos a partir do saneamento), com postura ativa, até a prolação da decisão final e
encerramento da sua jurisdição.
Se se trata realmente de princípio, como acreditamos(29), e não de uma mera
técnica processual, como pode ser simplesmente suprimido do sistema processual?
O instituto da identidade física é relevante para o regular fechamento da atividade
jurisdicional de primeiro grau e, por isso, deve ser confirmado como verdadeiro
princípio processual, ao passo que considerado não em si mesmo, mas no seu com-
plexo, organizado em sistema dentro da estrutura processual, decorrente de uma

(28) PORTO, Sérgio Gilberto; PORTO, Guilherme Athayde. Lições sobre teorias do processo. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2013. p. 62.
(29) Atrelado a outros princípios inerentes à prova, mantidos pelo Novo CPC, como os seguintes men-

cionados por Bento Duarte e Zulmar de Oliveira Junior – necessidade, ampla defesa e contraditório,
unidade, oralidade, igualdade, imediação, proibição da prova ilícita, lealdade, legalidade e distribuição
do ônus da prova: Princípios do processo civil, com remissões ao projeto do novo CPC. São Paulo: Método,
2012. p. 108/109.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 33

evolução (processual) histórica, com vista ao direito e ao precípuo funcionamento


desta estrutura, garantindo às partes uma solução razoavelmente rápida e coerente
da causa posta(30).
A surpresa com a exclusão do conhecido art. 132 do Código Buzaid vem sendo
anunciada pela doutrina, a qual indica, ao menos, que é possível extrair do art. 366
do novo Codex fundamento para a sua manutenção no ordenamento infraconstitu-
cional. Trata-se de comando que prevê que, encerrados os debates na audiência de
instrução, deve o juiz proferir sentença imediatamente ou em 30 dias(31).
Por derradeiro, interessante reparar que o art. 132, parágrafo único, também
não foi repisado pela Lei nº 13.105/2015, mesmo assim é evidente que o juiz poderá
repetir as provas que entender necessárias, conforme regula o aludido dispositivo
infraconstitucional do modelo de 1973 – diante do fato de a matéria ser de ordem
pública, de acordo com o que já colocamos neste ensaio, e de acordo com o art. 130,
ab initio, do Código Buzaid, repetido, aqui, sim, no art. 370 do Novo CPC.

V – DA APLICAÇÃO DA ANALOGIA, COSTUMES E PRINCÍPIOS GERAIS


DO DIREITO
Da mesma forma causa certa espécie a supressão pelo Novo CPC do art. 126
do Código Buzaid, in verbis: “O juiz não se exime de sentenciar ou despachar ale-
gando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as
normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios
gerais de direito”.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Trata-se de meio subsidiário de julgamento em razão do princípio do non liquet;
impõe evidentemente que haja suficiente motivação judicial e se relaciona, mais
proximamente ainda, com o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional
e o princípio dispositivo(32).
Em outros termos, o magistrado deve proferir sentença de acordo com o or-
denamento jurídico, mesmo que não encontre amparo específico no texto da lei,
fundamentando a sua decisão a contento, devolvendo aos jurisdicionados legítimo
decisum com o selo do Estado, de acordo com a realidade espaço-temporal da co-
munidade e de acordo também com o que foi pleiteado perante o agente político.
Também é consagrada, no ordenamento jurídico pátrio, a aplicação subsidiária
da analogia, costumes e princípios gerais ao menos desde a Lei de Introdução ao
Código Civil (LICC) de 1942, atualmente em vigência com a designação de Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro (art. 4º), razão pela qual não parece que
deva ser simplesmente afastada a partir da entrada em vigor do novo diploma adjetivo.

(30) Tesoriere, na Itália, bem trabalhou os conceitos de diferenciação entre ‘técnica’ e ‘princípio’ processual:

Contributo allo studio delle preclusioni nel processo civile. Padova: CEDAM, 1983. p. 14.
(31) MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo

civil. São Paulo: RT, 2015. Teoria do Processo Civil. v. 1. p. 538.


(32) AMENDOEIRA Jr., Sidnei. Manual de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 71 e ss.
34 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Veja-se, por outro lado, que o Novo CPC exige do magistrado ainda maior rigor
na ampla fundamentação de suas decisões, sendo reforçado o comando constitucional
contido no art. 93, IX, da CF/88, a partir especialmente da previsão do art. 489 da
Lei nº 13.105/2015 – parecendo, assim, ir na contramão deste modelo a supressão
de dispositivo processual que desenvolve formas alternativas, mas perfeitamente
aceitas, de julgamento.
Ademais, consagrada é no campo processual a aplicação do “costume” quan-
do da interpretação da prova judicial, ao tempo de prolação da sentença – juízo
de valoração probatória(33). Estamos aqui no campo das máximas de experiência,
previstas no art. 335 do CPC/73, repetido, aqui sim, no art. 375 do Novo CPC com
leve alteração(34).
Trata-se de regra de aplicação do bom senso, regra de experiência comum,
espécie de válvula de escape para o julgador considerar o conjunto probatório, ao
tempo de decidir, aplicando o que ordinariamente acontece. Regra, na parte geral
da teoria das provas, que estabelece um vínculo entre o julgador e a comunidade
em que se irá aplicar o direito.
Estabelece o art. 335 do CPC, ao regular o tópico, que em falta de normas ju-
rídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas
pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência
técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.
De fato, embora o dispositivo infraconstitucional, ao tratar das máximas de
experiência, não indique com clareza se o momento oportuno de sua utilização é ao
tempo de admissão ou ao tempo de valoração da prova, hodiernamente, de acordo
com a exposição contida no parágrafo supra, parece-nos que cabe a sua aplicação ao
tempo de o julgador proferir sua decisão em cognição exauriente(35).
Seja como for, por certo então a existência da previsão da matéria no Novo
CPC ao menos em parte desqualifica a exclusão do art. 126 do Código 1973 no
novel diploma.
Por fim, entendemos que pela desqualificação ampla, da exclusão noticiada,
em razão do art. 1º da Lei nº 13.105/2015, ao prever que o processo civil será or-
denado, disciplinado e interpretado não só de acordo com base na lei, mas também
em valores e normas fundamentais estabelecidas na CF/88, o que nos faz crer que
na prática será plenamente possível ao magistrado seguir aplicando a analogia, os

(33) RUBIN, Fernando. Teoria geral da prova: do conceito de prova aos modelos de constatação da verdade.

Revista Jurídica, Porto Alegre, 1953, v. 424, p. 45-74, 2013.


(34) Art. 375 do novo CPC: “O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela obser-

vação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a
estas, o exame pericial”.
(35) ROSITO, Francisco. Direito probatório: as máximas de experiência em juízo. Porto Alegre: Livraria

do Advogado, 2007. p. 134/148.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 35

costumes e principalmente os princípios gerais do direito, como aliás sempre fez,


com ou sem base em previsão de Código Processual(36).
E mesmo que assim não fosse, compactuamos com a posição de Marinoni e
Arenhart no sentido de que atualmente não se deve pretender limitar o poder do
juiz, mas, sim, controlá-lo; sendo que isso não pode ser feito mediante uma previsão
legal da conduta judicial, como se a lei pudesse dizer sempre o que o juiz deve fazer
para prestar a adequada tutela jurisdicional diante de todas as situações concretas:
como as situações de direito material são várias, deve-se procurar a justiça do caso
concreto, o que repele as teses de que a lei poderia controlar o poder do juiz(37).

VI – REFERÊNCIAS CONCLUSIVAS
Defendendo a entrada em vigor do novo diploma adjetivo (Lei nº 13.105/2015),
por certo não estamos de forma alguma pleiteando a sua não aplicação, ao passo em
que examinada criticamente algumas supressões realizadas.
Antes de qualquer outra coisa devemos procurar a ratio das exclusões reali-
zadas pelo novo CPC, vindo a enfrentá-las criticamente se não encontrarmos nada
convincente. Foi o que procuramos realizar, mesmo que de maneira incipiente.
Dessa forma, repetimos, não estamos pregando o inconformismo leviano e
superfialista, buscando aplicar no futuro e ad aeternum Código/73 que sabidamente
perderá a sua validade, ultrapassado o período de vacatio legis.
Estamos defendendo, isso sim, que algumas específicas disposições do Código

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Buzaid foram suprimidas sem que, s.m.j., melhores considerações fossem efetuadas,
o que pode desembocar, logo ali, em atividade jurisdicional deficiente na prática do
foro; situação que evidentemente deve ser evitada, sendo aplicadas as disposições
consagradas, as quais realmente se apresentam relevantes ao regular andamento
do processo judicial, como o amplo efeito translativo do recurso de apelação (nas
matérias de ordem pública), a distinção entre os prazos peremptórios (minoria
dos prazos processuais) e os prazos dilatórios (maioria dos prazos processuais), o
princípio da identidade física do juiz (condutor do iter até prolação de sentença), e
a aplicação da analogia, costumes (máximas de experiência, inclusive) e princípios
gerais do direito.

DOUTRINA SELECIONADA
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2003.

(36) O que estaria de acordo com a contemporânea linha de raciocínio processual que prevê a necessidade

de técnicas abertas e atípicas para a tutela adequada, efetiva e tempestiva de direitos, na órbita da juris-
dição do Estado Constitucional (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO,
Daniel. Novo curso de processo civil. São Paulo: RT, 2015. Teoria do processo civil. v. 1. p. 99 e ss.).
(37) MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 11. ed. São Paulo:

RT, 2013. p. 270.


36 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: RT, 1997. v. 1.
AMENDOEIRA Jr., Sidnei. Manual de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Sa-
raiva, 2012. v. 1.
ARAGÃO, E. D. Moniz. Preclusão (processo civil). In: ALVARO DE OLIVEIRA,
Carlos Alberto (Coord.). Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Sobre prazos peremptórios e dilatórios. In: Temas
de direito processual. Segunda série. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 49/60.
BARRIOS DE ANGELÍS, Dante. El proceso civil – Código General del Proceso.
Montevidéo: IDEA, 1989.
COSTA MACHADO, Antônio Cláudio da. Novo CPC – sistematizado e resumido.
São Paulo: Atlas, 2015.
DENTI, Vittorio. Questioni rilevabili d’ufficio e contradittorio. Rivista de Diritto
Processuale, n. 23, 1968, 217/231.
DINAMARCO, Cândido. Fundamentos do processo civil moderno. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 2000. v. I.
DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Atlas,
2015.
DUARTE, Bento; ZULMAR, Duarte. Princípios do processo civil, com remissões ao
Projeto do Novo CPC. São Paulo: Método, 2012.
FERREIRA FILHO, Manoel Caetano. A preclusão no direito processual civil. Curitiba:
Juruá, 1991.
GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1984.
v. 2.
LACERDA, Galeno. Do despacho saneador. Porto Alegre: La Salle, 1953.
LIMA, Alcides Mendonça de. Introdução aos recursos cíveis. 2. ed. São Paulo: RT, 1976.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento.
11. ed. São Paulo: RT, 2013.
______; ______; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil. São Paulo: RT,
2015. Teoria do processo civil. v. 1.
MARINONI, Tereza Cristina. Sobre o pedido de reconsideração (sucedâneo de re-
curso?). Revista de Processo, n. 62, 1991, 299/306.
MITIDIERO, Daniel. A colaboração no processo civil. São Paulo: RT, 2009.
PORTO, Sérgio Gilberto; PORTO, Guilherme Athayde. Lições sobre teorias do processo.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013.
ROQUE, André et al. Teoria geral do processo – comentários ao CPC de 2015. São
Paulo: Método, 2015.
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______. et al. (Org.). Novo CPC: anotado e comparado. São Paulo: Foco Jurídico,
2015.
ROSITO, Francisco. Direito probatório: as máximas de experiência em juízo. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
RUBIN, Fernando. A preclusão na dinâmica do processo civil, de acordo com o Projeto
do Novo CPC. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
______. Efetividade versus segurança jurídica: cenários de concretização dos dois
macro-princípios processuais no Novo CPC. Páginas de Direito, 2015. v. 1.
RUBIN, Fernando. Teoria geral da prova: do conceito de prova aos modelos de cons-
tatação da verdade. Revista Jurídica, Porto Alegre, 1953, v. 424, p. 45-74, 2013.
______; REICHELT, Luis Alberto (Org.). Grandes temas do Novo CPC. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2015.
SARTI, Amir José Finocchiaro. Apelação: efeito devolutivo e preclusão das questões
processuais. Ajuris, n. 70, 1997, 240/249.
SIMARDI FERNANDES, Luis Eduardo. Embargos de declaração – efeitos infringentes,
prequestionamento e outros aspectos polêmicos. 4. ed. São Paulo: RT, 2015.
TESORIERE, Giovanni. Contributo allo studio delle preclusioni nel processo civile.
Padova: Cedam, 1983.
THEODORO Jr., Humberto. Curso de direito processual. 38. ed. Rio de Janeiro: Fo-
rense, 2002. v. 1.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Omissão judicial e embargos de declaração. São
Paulo: RT, 2005.
CONTRADITÓRIO COLABORATIVO E POSTURA
DOS SUJEITOS DO PROCESSO: UMA REFLEXÃO
NECESSÁRIA

Rafael Calmon Rangel


Mestre em Direito Processual Civil pela UFES – Universidade Federal do Espírito
Santo; Membro do Ceapro – Centro de Estudos Avançados de Processo; Juiz de
Direito.

RESUMO
O ensaio analisa crítica e brevemente o instituto do contraditório, sob a pers-
pectiva do novo Código de Processo Civil. Partindo de uma superficial abordagem
dos ideais abraçados pela comissão encarregada da elaboração do projeto, o estudo
avança enfocando a evolução histórica do instituto e a visão atualmente destinada
a ele pela doutrina e pela jurisprudência nacionais, lançando provocações em torno
das atitudes e responsabilidades inerentes aos sujeitos do processo.
Palavras-Chave: Contraditório Colaborativo. Novo Código de Processo Civil.
Sujeitos do Processo. Deveres. Responsabilidades.

TITLE: Collaborative adversary proceeding and the posture of the parties to the
lawsuit: a necessary analysis.
ABSTRACT
This brief text critically analyzes the adversary proceeding from the perspective of
the new Code of Civil Procedure. Based on a superficial approach of the ideals adopted
by the Commission in charge of preparing the Bill, this study goes forward focusing on
the historical evolution of that provision, and the view that Brazilian jurists and courts
currently have about it, scrutinizing the inherent attitudes and responsibilities of the
parties to the lawsuit.
Keywords: Collaborative Adversary Proceeding. New Code of Civil Procedure.
Parties to the Lawsuit. Duties. Responsibilities.

SUMÁRIO
Introdução. 1 Da Evolução Histórica do Contraditório. 2 O Contraditório no
CPC/2015 e a Necessária Mudança de Mentalidade/Postura. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO
Um novo Código de Processo Civil se encontra prestes a entrar em vigor no
Brasil, consagrando ideias e possibilidades até então inéditas ao sistema.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 39

Os trabalhos da comissão encarregada da elaboração de seu projeto mantiveram


forte sintonia com os preceitos constitucionais no afã de proporcionar condições para
que o juiz decida a causa de forma mais consentânea com os fatos que lhe subjazem(1).
Como corolário seu texto se mostrou repleto de disposições atributivas de concreção
a princípios constitucionais (implícitos e explícitos) e de força normativa a valores
consagrados no ordenamento, inovando, em especial, ao impor expressamente o
dever de as partes colaborarem com o juiz para a identificação das questões fáticas
e jurídicas e o direito de participação ativa no processo.
Parece que o legislador pretendeu e efetivamente conseguiu elevar o contra-
ditório à máxima potência, autorizando as partes a exercerem verdadeira e efetiva
influência nas questões a serem enfrentadas e debatidas, nas provas a serem pro-
duzidas e na distribuição do encargo pertinente, nos rumos a serem tomados pelo
procedimento, enfim, em todo o conjunto de elementos que possa, de qualquer
forma, ser considerado pelo magistrado na estruturação de sua decisão.
Mostra disso pode ser obtida em diversos dispositivos, espalhados por prati-
camente todo o corpo do Código, de que são exemplos os arts. 5º a 9º, 372 e 503,
aqui citados apenas a título de amostragem.
A rigor, esse “direito à influência” não chega a ser uma novidade, porquanto
o direito de participação dos cidadãos em um Estado Democrático de Direito, asse-
gurado como princípio fundamental pela Constituição da República de 1988 (art.
1º, § 1º), não se restringe à escolha dos representantes políticos, mas se espraia por
todas as áreas que compõem a própria noção de Estado, como a saúde (art. 198,
III), a assistência social (art. 204, II), a educação (art. 205), a cultura (art. 216-A),

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


como forma mesmo de se efetivar direitos e garantias destinados a eles próprios,
cidadãos(2), não havendo por que ser diferente no ambiente do processo, que repre-
senta um dos mais importantes instrumentos de participação popular. No entanto,
não há como negar que o novo Código consagra uma radical mudança de foco na
visão tradicional do contraditório, proporcionando que o juiz abandone a “relação
de verticalidade” para com as partes, até hoje existente, para se posicionar como
que ao lado delas na condução do processo, no debate das questões relevantes para
formação de seu convencimento e na produção de provas, atuando em um arranjo
interativo destinado à elaboração conjunta do julgado que, como destinatários úl-
timos, estarão obrigadas a obedecer(3).
Justamente por atribuir tamanho valor ao diálogo crítico, o novo estatuto talvez
requeira uma mudança de mentalidade e postura de todos os sujeitos do processo,
numa conjugação de esforços voltada à asseguração do direito de participação na
elaboração do julgado, dentro dos limites do necessário, para que abusos de posições
processuais sejam evitados e/ou severamente reprimidos.
É para esse ponto que o presente ensaio pretende chamar a atenção.

(1) Disponível em: <http://direitoprocessual.org.br/fileManager/relatorioCPC.pdf>. Acesso em: 28 abr. 2013.


(2) De acordo com o que parcialmente defende MARINONI, Luiz Guilherme. In: Técnica processual e
tutela dos direitos. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 156.
(3) Por todos: MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil. 3. ed. São Paulo: RT, 2015. p. 72
40 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

1. DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONTRADITÓRIO


A noção de se permitir que uma parte influa no convencimento do julgador,
mediante a exposição de sua versão dos fatos antes do julgamento, parece ser tão
antiga quanto a própria ideia de humanidade, e os registros históricos comprovam
tal ilação, bastando ver que a própria Bíblia Sagrada contém passagens indicando
a adoção de tal proceder tanto no Antigo (Gênesis 3:9-13) quanto no Novo Tes-
tamento (Atos 26:1). Em tempos bem mais recentes, os tratados e as convenções
internacionais sobre direitos humanos, ratificados por quase todos os países do
globo, incluindo o Brasil, possuem disposições semelhantes, assegurando o direito
de a pessoa ser ouvida previamente em toda e qualquer decisão judicial que possa
influenciar em sua esfera jurídica(4).
Na literatura, existe farto material a respeito da origem histórica do instituto(5).
Todavia, pela maneira tão condensada quanto completa de análise, aqui merece
prestígio o ponto de vista manifestado por Carlos Alberto Alvaro de Oliveira(6). Re-
memorando a fase embrionária, o professor cita, inicialmente, o período do direito
romano em que o juiz se via absolutamente impedido de promover o julgamento
daquela parte que se recusasse a comparecer voluntariamente à sua presença, se a
força física do autor da demanda não fosse suficiente para demovê-lo desse intento.
Na sequência, aponta que a superação dessa concepção ocorreu apenas sob a égide
do procedimento contumacial do direito romano pós-clássico, quando se passou a
admitir o julgamento do réu sem sua presença. A partir daí, reconstrói todo o trajeto
perpassado pelo instituto, destacando os períodos em que ele foi “rebaixado a prin-
cípio externo e puramente lógico-formal”, nos quais bastava a mera oportunização
de que a parte fosse ouvida para se ter por atendida a “garantia à audiência bilateral”
(Grundsatz des beiderseitigen Gehörs), e posteriormente reconduzido à posição de
instituto dotado de relevância essencial ao processo, até chegar ao momento atual,
no qual o diálogo e a cooperação recíproca entre os sujeitos do processo conjugam-se
com o ativismo judicial, na estruturação de um processo democrático.
Veja a transformação: há pouco tempo, o contraditório se satisfazia com a
oportunização de que o requerido tomasse conhecimento da demanda e fosse
ouvido a respeito(7). Mais recentemente, essa ideia foi abandonada por completo,
devido à percepção de que não bastava proporcionarem-se oportunidades, mas,
sim, incentivar-se o exercício de efetiva influência (Einwirkungsmöglichkeit) sobre

(4) A título exemplificativo: Declaração Universal de Direitos Humanos, artigo 11.1; Carta Africana
dos Direitos dos Homens e dos Povos (Banjul), art. 7º, 1.c; Declaração Islâmica Universal dos Direitos
Humanos, item V, b; e Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José), artigo 8º, 1.
(5) Para considerações partidas de outro ângulo sobre a origem histórica do contraditório: SOUZA, Artur

César de. Contraditório e revelia. São Paulo: RT, 2003. p. 138-150; e WEDY, Gabriel de J. Tedesco. O
princípio do contraditório como garantia constitucional. Revista Jurídica, n. 350, 2006.
(6) A garantia do contraditório. Revista Ajuris, n. 74, 1998.

(7) GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2007.

v. 1. p. 30-33.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 41

o desenvolvimento do processo e sobre a formação de decisões racionais, com ine-


xistentes ou reduzidas possibilidades de surpresa(8).
Houve, por assim dizer, uma verdadeira transformação não só no modo de se
enxergar, mas, principalmente, de se operacionalizar o instituto.
Esse enfoque parece ser melhor compreendido quando se analisa o direito ale-
mão, no qual, provavelmente, deitam-se suas raízes. De acordo com Gilmar Ferreira
Mendes, por exemplo, a Corte constitucional daquele país julgou um caso paradig-
mático (BVerfGE, 70, 288-293), no qual foi apreciado o denominado Anspruch auf
rechtliches Gehör (pretensão à tutela jurídica). Na ocasião, firmou-se o entendimento
até hoje aplicável de que essa pretensão “envolve não só o direito de manifestação
e o direito de informação sobre o objeto do processo, mas também o direito de ver
os seus argumentos efetivamente contemplados pelo órgão incumbido de julgar”(9).
Não é de hoje que isso ocorre, porém. A bem da verdade, desde os idos
de 1940 a literatura jurídica tedesca já vinha trabalhando com a noção de que o
processo deveria representar algo semelhante a uma “comunidade de trabalho”
(Arbeitsgemeinschaft)(10), na qual as partes, os advogados e o juiz deveriam propor-
cionar o ambiente ideal para a implementação de um sistema harmônico, fundado
no debate e na inexistência de domínio de uns sobre os outros, que implicaria a
redução do tempo de duração do processo, a elaboração de decisões mais justas e a
consequente diminuição da interposição de recursos(11).
Embora tenha sido incorporada à mentalidade da doutrina nacional há menos
tempo, a ideia de se oportunizar uma maior participação das partes na formação do

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


convencimento do magistrado também angariou adeptos por aqui, que passaram a
sustentar a necessidade de o processo ser encarado, pensado e aplicado sob as luzes
emanadas do Estado Democrático de Direito. Embora o cenário jurídico da época
fosse completamente diferente daquele instaurado a partir de 1988, Cândido Rangel
Dinamarco(12), por exemplo, se posicionava desde os idos de 1982 pela adoção de
um contraditório que assegurasse a participação efetiva ao longo de todo o curso do
procedimento, a colaboração no exercício da jurisdição, o poder de influência das
partes sobre o convencimento do juiz e a informação. José Carlos Barbosa Moreira(13)
não destoava desse entendimento ainda naquela década. Mais recentemente, o tema
passou a representar a pauta de diversos expoentes da literatura, de que são exem-

(8) Precisamente nesse sentido: THEODORO Jr., Humberto. Processo justo e contraditório dinâmico.
Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, n. 33, p. 7.
(9) Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 499.

(10) De acordo com a expressão utilizada na obra Lehrbuch des Deutschen Zivilprozessrechts, de Leo Ro-

senberg. 5. ed. Munchen: Beck, 1951, traduzida para o espanhol em três volumes sob a denominação
Tratado de Derecho Procesal Civil. Buenos Aires: E.J.E.A., 1955.
(11) THEODORO Jr., Humberto. Ob. cit, p. 6.

(12) Fundamentos do processo civil moderno. São Paulo: Malheiros, 1986. p. 85-100.

(13) Sobre a “participação” do juiz no processo civil. In: GRINOVER, Ada Pellegrini (Coord). Participação

e processo. São Paulo: RT, 1988. p. 380-394.


42 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

plos Rui Portanova(14), Artur César de Souza(15), Carlos Alberto Alvaro de Oliveira(16),
Daniel Mitidiero(17) e Lúcio Grassi de Gouveia(18), criando-se o ambiente ideal para a
aceitação definitiva, se não da própria teoria antes mencionada, das premissas que
serviram de base à sua elaboração.
Não há dúvida de que a potencialização ao máximo do contraditório acaba in-
centivando os direitos de influência e de debate, reforçando, com isso, a credibilidade
no Judiciário, pelo fato de imbuir nos jurisdicionados a crença de que apenas e tão
somente os argumentos submetidos previamente à discussão no curso do processo,
do qual tenham participado ativa e criticamente, foram considerados pelo Estado-
juiz como razões de decidir(19).
Afere-se, por assim dizer, maior legitimidade aos julgados, na medida em que
todos os sujeitos do processo exercem uma verdadeira “atividade cocriadora” das
decisões emanadas do Poder Judiciário(20).
Mas se esse aumento de possibilidades pode ser visto como algo positivo em
um ambiente democrático, seu uso desmedido pode representar abuso, ato ilícito
portanto (CC, art. 185), daí advindo a necessidade de que os profissionais que atuam
no cotidiano forense se engajem no compromisso de exercitar suas mais diversas
situações jurídicas processuais dentro da legalidade estrita.

2. O CONTRADITÓRIO NO CPC/2015 E A NECESSÁRIA MUDANÇA DE


MENTALIDADE/POSTURA
As ideias de colaboração e participação ativa das partes em todas as etapas do
processo parecem ter se vinculado de forma indissociável à noção de devido pro-
cesso legal, encontrando campo fértil de aplicação nos Tribunais de Sobreposição,

(14) Princípios do processo civil. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 160-164.
(15) Contraditório e revelia. São Paulo: RT, 2003. p. 137.
(16) Do formalismo no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2010; A garantia do contraditório In: CRUZ E

TUCCI, José Rogério (Coord.). Garantias constitucionais do processo civil. São Paulo: RT, 1999; e também
In: O juiz e o princípio do contraditório. Revista de Processo, n. 71, p. 31-37.
(17) Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. São Paulo: RT, 2009. p. 137.

(18) GOUVEIA, Lúcio Grassi de. O projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro (NCPC) e o prin-

cípio da cooperação intersubjetiva. In: DIDIER Jr., Fredie (Coord.). Projeto do novo Código de Processo
Civil. 2ª série. Salvador: Juspodivm, p. 473.
(19) MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. São Paulo:

RT, 2009. p. 137.


(20) Na literatura, Jürgen Habermas pontua que, no Estado Democrático de Direito, “uma ordem jurídica

é legítima na medida em que assegura a autonomia privada e a autonomia cidadã de seus membros, pois
ambas são cooriginárias; ao mesmo tempo, porém, ela deve sua legitimidade a formas de comunicação
em que essa autonomia pode manifestar-se e comprovar-se” (Direito e democracia: entre facticidade e
validade. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. v. 2. p. 147). De acordo com esse enfoque, o
filósofo defende que o diálogo livre, desprovido de distorções ou contenções ideológicas, aberto, per-
missivo e igualitário representaria o fio condutor para a estruturação do modelo de interação social por
ele denominado de “ação comunicativa”, cuja formatação remete à ideia de complementaridade pelos
cidadãos na elaboração das normas que eles mesmos serão obrigados a cumprir (Era das transições. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. p. 162).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 43

mesmo antes da entrada em vigor do novo CPC. Mostra disso pode ser extraída do
seguinte julgado:
“1. Mandado de segurança.
2. Cancelamento de pensão especial pelo Tribunal de Contas da União.
Ausência de comprovação da doação por instrumento jurídico adequado.
Pensão concedida há vinte anos.
3. Direito de defesa ampliado com a Constituição de 1988. Âmbito de
proteção que contempla todos os processos, judiciais ou administrativos, e não
se resume a um simples direito de manifestação do processo.
4. Direito constitucional comparado. Pretensão à tutela jurídica que en-
volve não só o direito de manifestação e de informação, mas também o direito
de ver seus argumentos contemplados pelo órgão julgador.
(...)
6. O exercício pleno do contraditório não se limita à garantia de alegação
oportuna e eficaz a respeito de fatos, mas implica a possibilidade de ser ouvido
também em matéria jurídica. Aplicação do princípio da segurança jurídica,
enquanto subprincípio do Estado de Direito.
(...)
10. Mandado de segurança deferido para determinar observância dos
princípios do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, LV).” (STF, MS
24.268/MG, Relª Minª Ellen Gracie Nothfleet, DJU 17.09.04)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Ao menos em aparência, o novo Código incorporou a concepção moderna
de processo civil, pois revestiu o Capítulo I de sua Parte Geral de dispositivos
impregnados de alto teor cooperativista. Observe, para tanto, que logo em seu art.
6º o legislador enuncia que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre
si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. Na
sequência, assegura paridade de tratamento às partes no exercício das situações
jurídicas processuais e na aplicação de sanções processuais, incumbindo ao juiz o
dever de zelar pelo efetivo contraditório (art. 7º). Ressalvadas pouquíssimas exce-
ções, impede que qualquer decisão seja proferida contra a parte que não tenha sido
previamente ouvida e/ou com base em fundamento a respeito do qual não se tenha
dado a ela oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria passível de
conhecimento oficioso (arts. 9º e 10).
A mesma métrica é seguida por todo o Código, dando a entender que a opção
do legislador foi mesmo incorporar aquela tão propalada “comunidade de trabalho”
defendida pelo direito alemão (Arbeitsgemeinschaft)(21) ao ordenamento jurídico
nacional.

(21) De
acordo com a expressão utilizada na obra Lehrbuch des Deutschen Zivilprozessrechts, de Leo Ro-
senberg. 5. ed. Munchen: Beck, 1951, traduzida para o espanhol em três volumes sob a denominação
Tratado de Derecho Procesal Civil. Buenos Aires: E.J.E.A., 1955.
44 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Nesse cenário poderia ser questionado se a ideia de cooperação entre os parti-


cipantes do processo, levada a extremos, não poderia conduzir a situações um tanto
delicadas, haja vista as características inerentes ao próprio ambiente sobre o qual o
processo se desenvolve serem marcadas pela falta de base comum de entendimen-
to e pela acirrada disputa entre partes, na ininterrupta tentativa de dominação de
argumentos contrapostos.
É justamente por isso que se alertou no início deste trabalho para a necessidade
de mudança de mentalidade e de postura dos profissionais do direito, pois a imensi-
dão de poderes conferidos às partes pela nova Lei parece não ter sido acompanhada
do mesmo nível de responsabilidades.
Para se aferir a veracidade dessa assertiva, basta ver que o sistema de responsa-
bilidades pelos atos ímprobos inaugurado pelo novo Código (arts. 77 e ss.) nada ou
muito pouco alterou o panorama deficitário e pouco utilizado do Código revogado
(arts. 14 e ss).
Não se pode negar que a noção de cooperação (ou colaboração) dentro de uma
“comunidade de trabalho” traga consigo a necessidade de uma verdadeira reeducação
comportamental de todos os participantes do processo, com reflexos imediatos em
suas postulações, decisões e insurgências. Por isso talvez tenha chegado o momento
de se repensar atitudes e ideias em prol desse “processo cooperativo”(22), e até mesmo
de se redimensionar as possibilidades abertas ao juiz, para que se valha mais dos
poderes saneadores, no caso de isso se mostrar necessário.
Não haveria, por óbvio, a menor possibilidade de se analisarem todas as hipó-
teses de atos “anti-cooperativos” neste ensaio. Por opção metodológica, portanto,
as atenções se voltarão à singela situação hipotética abaixo retratada.
Em uma demanda tramitando sob o rito comum, é chegado o momento de o
juiz sanear e organizar o processo, tal qual determinado pelo art. 357 do Código.
De forma muito mais analítica do que o sistema revogado, o Código enuncia
que, por meio dessa decisão, o juiz pode, com o auxílio das partes, delimitar “as
questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios
de prova admitidos” e “as questões de direito relevantes para a decisão do mérito”
(art. 357, II e IV).
Logo, com seu auxílio e sob sua supervisão, poderiam ser fixadas, no mínimo,
as bases comuns sobre as principais questões a serem enfrentadas para a prolação
da decisão, facilitando-se sobremaneira o trabalho de todos os sujeitos envolvidos
naquela demanda específica. O Código autoriza, inclusive, a designação de audiência
específica para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes, ocasião em

(22) Sobreo processo cooperativo, conferir: DIDIER Jr., Fredie. Os três modelos de direito processual:
inquisitivo, dispositivo e cooperativo. Disponível em: <http://www.academia.edu/1771108/Os_tres_mo-
delos_de_direito_processual>. Acesso em: 15, nov. 2015.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 45

que, conforme o caso, elas poderiam ser convidadas pelo órgão decisor para integrar
ou esclarecer suas respectivas alegações (art. 357, § 3º)(23).
A aceleração e a simplificação acarretadas ao procedimento parecem mesmo
incentivar a designação desse ato.
O que chama especial atenção é o fato de que, nesse ponto do procedimento,
o magistrado atua em posição relativamente simétrica às partes, pois sua atuação
se volta muito mais à orientação e à oportunização de debate e esclarecimento dos
pontos porventura duvidosos ou controversos(24).
É dizer: sua relação, nesse instante, apresentaria maior “horizontalização”
para com as partes, sem prejuízo de vir a advertir seriamente ou impor penalidades
àqueles que eventualmente se inclinem pela adoção de comportamento incoerente
com o processo colaborativo.
Longe de representar algo utópico, a criação de um ambiente harmônico pelo
órgão julgador e, sobretudo, a adoção de um comportamento leal pelas partes e seus
respectivos advogados não significariam nada mais do que a contribuição de todos
para a construção do processo colaborativo, pois, mesmo imbuídas do desejo de
fazer valer seus argumentos, estas poderiam perfeitamente compreender que uma
verdadeira comunidade de trabalho depende do posicionamento e especialmente da
reeducação comportamental de todos os seus integrantes, os quais devem assumir
posturas destinadas à obtenção do pronunciamento judicial (preferencialmente de
mérito), para que possam usufruir do fim último do Estado Democrático de Direito,
que é a ideia de os endereçados da norma poderem se considerar também como

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


seus autores(25).
Isso não importa dizer que as partes abandonariam seu intento de se sagrarem
vencedoras na demanda. Absolutamente, não. Elas e os profissionais encarregados
de sua representação se comprometeriam apenas a formar as bases comuns para que
o procedimento pudesse se desenrolar sem percalços e as provas a respeito de suas
respectivas alegações pudessem encontrar ambiente saudável para serem produzidas.
Por outro lado, a liberdade assegurada pelo novo Código pode levar a abusos
que devem ser contidos, sob pena de se romper por completo o “panorama comu-
nitário” indispensável para o prosseguimento do feito sob as bases já alcançadas.
Estabelecidas as bases mínimas comuns sobre as principais questões a serem
enfrentadas para a prolação da decisão, a necessidade e até o interesse na interposição
de recursos seriam seriamente questionáveis. Pelo mesmo motivo, os requerimentos
de esclarecimentos deveriam se limitar apenas ao indispensável. Novos requerimentos

(23) O Enunciado nº 298 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, inclusive, é no sentido de que
“a audiência de saneamento e organização do processo em cooperação com as partes poderá ocorrer
independentemente de a causa ser complexa”.
(24) Em sentido próximo: MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos

e éticos. São Paulo: RT, 2009. p. 68.


(25) De certa forma, esta parece ser a ideia defendida, em outras palavras, por: LUCHI, José Pedro (Coord.).

Linguagem e socialidade. Vitória: Edufes, 2005. p. 136.


46 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

muito provavelmente seriam desnecessários a partir de então, exceto naquilo que


fosse absolutamente necessário para a efetiva realização das provas. Como resultado,
em ocorrendo qualquer intempérie que extrapole o exercício regular do direito de
postular em juízo, o juiz deve abandonar a posição de “horizontalidade” para ocupar
o posto de vértice nessa relação, advertindo o litigante ímprobo e sancionando-o na
eventualidade de ele se manter firme nesse propósito (arts. 77, III, e 80, IV e VII).
O posicionamento ora defendido, por óbvio, não é isolado. Na literatura,
Maria Carolina Beraldo é uma das que defende a necessidade de que “os julgadores
se deem conta de quão necessária é a aplicação dos mecanismos que reprimem a
conduta irregular das partes e façam valer as regras”, pois “não se pode admitir que
as técnicas e os recursos processuais se prestem a proporcionar a vitória à parte
que esteja assistida pelo advogado ‘malicioso’ em detrimento da parte que litigue
de forma justa. Ao contrário, a concepção finalística do processo busca garantir o
êxito daquele que efetivamente esteja com a razão”(26).
Superada essa etapa inicial e cientes das bases sobre as quais o procedimento
se desenvolveria dali por diante, teria início a fase probatória, inclusive com a de-
signação de audiência de instrução e julgamento, caso necessário (art. 358).
Nessa etapa, possivelmente a posição do magistrado sofreria alguma alteração
no que concerne à angulação de sua relação com as partes, para que os trabalhos
pudessem ser conduzidos de forma paritária e contidos eventuais abusos. Dito de
outro modo, a relação começaria a se “verticalizar”, embora ainda persistissem al-
guns deveres inerentes à fase em que a “horizontalidade” era a regra, dando origem
a uma relação mista. Logo, o julgador poderia, por exemplo, “limitar o número de
testemunhas levando em conta a complexidade da causa e dos fatos individualmente
considerados” (art. 357, § 7º); “dispensar a produção das provas requeridas pela
parte cujo advogado ou defensor público não tenha comparecido à audiência” (art.
362, § 2º); indeferir, “em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramen-
te protelatórias” (art. 370, paragráfo único); devendo, ainda, manter a ordem e o
decoro em eventual audiência, inclusive determinando que se retirassem da sala de
audiências aqueles que se comportassem inadequadamente (art. 360), sem nunca
perder de vista que tudo isso deveria ocorrer para que se atendessem aos fins sociais
e às exigências do bem comum, mediante o resguardo e a promoção da dignidade da
pessoa humana e a observação da proporcionalidade, da razoabilidade, da legalidade,
da publicidade e da eficiência (art. 8º).
As atividades, portanto, deveriam transcorrer sob o mais amplo diálogo e par-
ticipação, mas sempre sob a ciência de que o bom andamento do processo depende
muito mais da consciência e da postura dos profissionais que nele atuam do que
em reformas legislativas. E, mais uma vez, cabe a advertência de que cooperação
não se confunde com rendição, mostrando-se perfeitamente possível que as partes

(26) BERALDO, Maria Carolina Silveira. O comportamento dos sujeitos do processo como obstáculo à razoável

duração do processo. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 82-83.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 47

colaborem com o juízo e vice-versa, sem que suas respectivas pretensões sejam
abandonadas ou sofram qualquer espécie de concessão.
Esse novo olhar sobre a disputa, com o foco voltado para a resolução da con-
trovérsia e não necessariamente para o acolhimento de uma tese específica, parece
exigir mesmo uma “revolução cultural” preconizada, no particular, por Hermes
Zaneti Júnior(27), para quem,
“para obter-se a decisão judicial mais qualificada, será preciso uma re-
volução cultural, ao mesmo tempo abandonando-se a onisciência dos juízes
(e do legislador), admitindo-se, no mesmo passo, a insuficiência da norma a
priori para fornecer a ‘verdade’ dos fatos isoladamente para levarem à certeza
jurídica. Nestas águas, é de rigor que se discuta direito e fato, buscando-se
uma verdade provável, com alto grau de correção, dependente, justamente, do
elevado contraditório processual e do comprometimento com a decisão justa
e aderente aos problemas discutidos, demonstrando-se a racionalidade desta
‘certeza’ judicial pelo racconto do procedimento utilizado na sua construção.”
Claro que todo “aquele que de qualquer forma participa do processo deve
comportar-se de acordo com a boa-fé” (art. 5º). Portanto, a atividade probatória,
assim como toda e qualquer fase do procedimento, deverá ser desenvolvida sob a
ciência de que qualquer conduta que porventura desalinhe do dever de cooperação
será sancionada na forma da lei.
Encerrados os debates e inexistindo qualquer questão ou dúvida pendente, tal-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


vez surja o momento por excelência em que o juiz assume efetivamente a posição de
vértice, mais equidistante possível das partes, pois os autos lhe serão encaminhados
à conclusão para prolação de sentença (art. 366). Nesse ponto, parece ser possível
afirmar que a “verticalidade” será a regra, haja vista a imposição constitucional e
legal de proferir sentença em estrita observância ao dever de fundamentação ana-
lítica (art. 489).
Mas não é por isso que o juiz não terá que continuar exercendo atividades coo-
perativas. Embora a responsabilidade pela elaboração do ato sentencial seja exclusiva
e integralmente sua, a ele cabe seguir as prescrições normativas correspondentes,
para que seu pronunciamento atenda aos padrões de higidez e legalidade exigidos
pelo novo Código, mediante a apreciação de todos os argumentos levantados no
processo, inclusive daqueles extraídos a partir de uma interpretação sistemática de
todo o conjunto da postulação (art. 322), para que possa solucionar não só a questão
tornada litigiosa, mas também o conflito que reside por detrás do litígio.
Talvez assim se consiga reduzir a altíssima taxa de congestionamento de pro-
cessos e o surreal índice de reingresso de demandas no sistema de justiça brasileiro.

(27) In: O problema da verdade no processo civil: modelos de prova e de procedimento probatório. Revista
de Processo, n. 116, p. 347.
48 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

À guisa de conclusão deste brevíssimo ensaio, as palavras de José Pedro Lu-


chi(28) servem de alerta. Para ele, um sistema de direitos não é suficiente para garantir
uma convivência social legítima, pautada em uma cultura política de liberdade e
de respeito universal às leis da liberdade, pois, “para que as instituições jurídicas
funcionem, é preciso uma formação progressiva da população. Do contrário, ou o
sistema jurídico se desintegrará, ou haverá uma crescente cisão entre lei e prática
social efetiva”.

CONCLUSÃO
Sem qualquer outra pretensão que não a de suscitar a reflexão, procurou-se
demonstrar que a visão (e correspectiva aplicação) do instituto do contraditório so-
freu substancial alteração no processo civil brasileiro, abandonando-se a ideia inicial
de mera necessidade de ciência e de possibilidade de manifestação, para a assunção
de um papel essencial à estruturação do processo, pautado, sobretudo, na efetiva
participação em todas as fases do procedimento, no diálogo e na possibilidade de in-
fluência na decisão, guardando maior sintonia com o Estado Democrático de Direito.
Mas, para que se contenham abusos, talvez tenha chegado a hora de superar
velhos paradigmas e implantar novas mentalidade e postura condizentes com as
diretrizes emanadas da Constituição, com o objetivo de que o debate crítico seja a
principal ferramenta de influência do julgador, sem deixar de lado a responsabilidade
individual de cada participante do processo, em prol da construção de um ambiente
efetivamente colaborativo e democrático.

REFERÊNCIAS
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n. 74, 1998.
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In: GRINOVER, Ada Pellegrini (Coord). Participação e processo. São Paulo:
RT, 1988.
BERALDO, Maria Carolina Silveira. O comportamento dos sujeitos do processo como
obstáculo à razoável duração do processo. São Paulo: Saraiva, 2013.
DIDIER Jr., Fredie. Os três modelos de direito processual: inquisitivo, dispositivo e
cooperativo. Disponível em: <http://www.academia.edu/1771108/Os_tres_mo-
delos_de_direito_processual>. Acesso em: 10 nov. 2013.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. São Paulo:
Malheiros, 1986.

(28) LUCHI, José Pedro (Coord.). Linguagem e socialidade. Vitória: Edufes, 2005. p. 179.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 49

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(NCPC) e o princípio da cooperação intersubjetiva. In: DIDIER Jr., Fredie
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DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


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WEDY, Gabriel de J. Tedesco. O princípio do contraditório como garantia constitu-
cional. Revista Jurídica, n. 350.
ZANETI Jr., Hermes. O problema da verdade no processo civil: modelos de prova e
de procedimento probatório. Revista de Processo, n. 116.
MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NO DIREITO DAS FAMÍLIAS

Hildeliza Lacerda Tinoco Boechat Cabral


Doutoranda em Ciências Jurídicas; Mestre em Cognição e Linguagem pela UENF;
Professora de Direito Civil do Curso Jurídico e de Medicina da Universidade
Iguaçu/Itaperuna; Coordenadora da obra “Ortotanásia: Bioética, Biodireito,
Medicina e Direitos de Personalidade” (Del Rey, 2015).

Michelle Dutra Peres


Bacharel em Direito; Cursando Qualificação para Juiz Arbitral.

Carlos Henrique Medeiros de Souza


Doutor em Comunicação pela UERJ; Mestre em Educação; Professor e
Coordenador do Laboratório de Cognição e Linguagem da UENF.

Vívian Boechat Cabral Carvalho


Titular da Serventia de Registro Civil com atribuição Notarial de Reduto, Comarca de
Manhuaçu/MG; Especialista em Carreiras de Magistratura pela Escola de Magistratura do
Estado do Rio de Janeiro; Especialista em Direito Civil pela Rede LFG.

RESUMO
Os conflitos são inerentes às relações interpessoais, principalmente no que tange
às relações de família. Algumas famílias, quando se deparam com conflitos, conse-
guem solucioná-los de forma amigável entre si, porém, quando não se conseguem,
resta procurar as vias judiciais e, nesses casos, surgem verdadeiras batalhas que, além
de se arrastarem por longos períodos, desgastam e produzem traumas muitas vezes
irreparáveis à família. O que se vê atualmente são Varas de Família sobrecarregadas
e despreparadas para solucionar os conflitos, que são, na sua maioria, amenizados,
mas não solucionados. Nesse contexto, surge a mediação como uma alternativa para
a solução de conflitos familiares. Na primeira parte, apresenta-se o conceito que em
síntese define a mediação como um método de pacificação de conflitos, mediante o qual
um terceiro imparcial auxilia as partes através do diálogo para encontrar uma solução
que seja boa para ambas. Também é feita a distinção entre conciliação, arbitragem e
mediação. Na segunda parte, destaca-se a vantagem da aplicação da mediação nos
conflitos familiares, que crescem a cada dia junto com as novas entidades familiares
reconhecidas. Por fim, explica-se a evolução e a legislação específica da mediação,
sua situação atual, além de sua inserção no atual Código de Processo Civil, no qual
obteve maior destaque ao ser inserida como alternativa juntamente com a concilia-
ção. Conclui-se com o entendimento de que a mediação tem ganhado maior espaço
e uma nova roupagem onde se tem obtido um resultado satisfatório, porém, ainda há
um grande campo a ser alcançado, preconceitos a serem quebrados e a necessidade
de seu reconhecimento principalmente pelos operadores do Direito, que devem estar
comprometidos não só com a atuação jurídica como com a atuação social.
Palavras-Chave: Mediação. Família. Solução de Conflito.
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TITLE: Mediation of disputes in Family Law.


ABSTRACT
Disputes are inherent to interpersonal relations, especially regarding family rela-
tions. Some families in dispute manage to settle it in a friendly manner, but when this fails,
the only solution is to seek the judicial system, and in these cases the disputes become
real battles that last for long periods, and result in traumas that are often irreparable to
the family. What is seen nowadays is overloaded family courts that are unprepared to
settle disputes, which are mostly mitigated, but not solved. In this context, mediation is
an alternative for settling family disputes. The first part of this text introduces the concept
that defines mediation as a method of dispute settlement, by which an impartial third
party assists the parties through dialog to find a solution that is good for both parties. A
distinction between agreement, arbitration and mediation is also made, and in the second
part the advantage of using mediation in family disputes is presented, as such disputes
grow every day with new recognized family entities. Finally, this text explains the evo-
lution and specific legislation of Mediation, its current situation and its inclusion in the
current Code of Civil Procedure, in which it got greater emphasis, as it was mentioned as
an alternative along with agreement. This text ends with the understanding that media-
tion has gained more space, but that there is still much to be achieved, prejudices to be
eradicated and the need for its recognition by law professionals, who must be committed
not only with their legal actions but also with their social actions.
Keywords: Mediation. Family. Dispute Settlement.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


SUMÁRIO
1 Introdução. 2 Aspectos Gerais da Mediação; 2.1 Conceito e Princípios da
Mediação; 2.2 Objetivo da Mediação; 2.3 A Pessoa do Mediador; 2.4 Mediação, Con-
ciliação e Arbitragem. 3 Mediação no Direito das Famílias; 3.1 Conflitos Presentes
na Estrutura Familiar; 3.2 Vantagens da Mediação no Âmbito Familiar. 4 Mediação e
sua Aplicabilidade; 4.1 Evolução, Aplicação e Legislação Específica; 4.1.1 Aplicação e
Mediação; 4.2 Mediação no Novo Código de Processo Civil. 5 Conclusão. Referências.

1. INTRODUÇÃO
A família sempre foi amparada pelo Estado, com uma estrutura sempre muito
bem definida, sendo formada a partir do matrimônio. Aquela formada fora do pa-
râmetro do casamento ficava à margem da sociedade e também da proteção estatal.
A sociedade mudou, mas a estrutura do Direito das Famílias nem tanto, pois em
muitos aspectos continua rígida e conservadora e, assim, muito aquém das transfor-
mações sociais. No entanto, com o surgimento de novas entidades familiares e com
o seu reconhecimento pelo Judiciário, a flexibilização dessa estrutura é inevitável,
pois a família é dinâmica e o Direito tem se desdobrado para acompanhar sua evo-
lução. A família é sempre permeada por muitos conflitos, que se diversificam com
a evolução da estrutura familiar. A lei procura atender às necessidades humanas,
52 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

mas ocorre que as mudanças são diárias e as leis não conseguem atender a todas as
necessidades solicitadas.
A sociedade continua evoluindo e exigindo do legislador uma atenção especial
aos atuais dilemas familiares, pois os conflitos são frequentes e exigem das famílias
equilíbrio e capacidade de enfrentá-los, mas ocorre que muitas famílias não conse-
guem criar soluções para seus conflitos, e esse desajuste vai parar no Judiciário. O
processo judicial passa ser o meio utilizado para disputas, rancores e ressentimentos,
essas desavenças superlotam as Varas de Família, isso estende-se por longos períodos
e os prejuízos são para a vida toda.
Se o processo judicial colocasse fim ao litígio tudo seria mais fácil, porém, o
conflito continua, pois o processo judicial não consegue resolver o verdadeiro anseio
da família envolvida. Desta forma, percebe-se a necessidade de uma intervenção de
grupo multidisciplinar, pois ainda existe uma incapacidade por parte dos operado-
res do Direito, que, na maioria das vezes, não têm um olhar sensível para as partes
envolvidas no conflito.
No Direito das Famílias é preciso compreender emoções e buscar uma solução
de fato apaziguadora do conflito. Nesse contexto surge a mediação, meio alterna-
tivo que busca soluções satisfatórias para ambas as partes, auxiliando as pessoas a
desenvolverem uma capacidade própria de resolução de conflitos, criando, assim,
uma nova forma de se relacionarem, propiciando um ambiente favorável ao desen-
volvimento afetivo, emocional e físico dos componentes da família.
A metodologia é qualitativa, baseada em obras de autores como Adolfo Braga
Neto, Cristiano Chaves de Farias, Rozane Cachapuz, dentre outros.

2. ASPECTOS GERAIS DA MEDIAÇÃO


2.1. Conceito e Princípios da Mediação
Conflitos são inerentes às relações humanas, principalmente no ambiente
familiar, que é o local onde a pessoa se forma e se desenvolve. Atualmente, um de-
sajuste emocional está instalado no meio familiar, e no momento de um divórcio,
de uma separação, de uma partilha ou de qualquer tipo de conflito, as diferenças
se evidenciam, sendo que pais e filhos têm sido destruídos pelos desgastes de um
processo judicial, sem dizer de traumas que refletem em toda sociedade. Nesse
contexto surge a necessidade da composição desses conflitos.
Ao indivíduo sempre foi garantido o direito de ação pela CF (art. 5º, XXXV),
porém, com a complexidade e o aumento dos conflitos nas relações sociais, o Poder
Judiciário não consegue cumprir no tempo esperado tudo que está sendo posto
à sua apreciação através dos processos judiciais, ademais, o Judiciário decide os
conflitos e não os elimina, interrompe uma situação conflitiva, mas não impede o
desenvolvimento de outras, por conta dos vínculos e relações sociais que não se
encerram na sentença.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 53

É notório que as relações interpessoais sempre foram marcadas por conflitos,


porém, com o Judiciário cada dia mais sobrecarregado, esses conflitos tendem a se
estender no tempo e consequentemente causar desgastes irreversíveis, principalmente
no âmbito familiar. Nesse contexto surge a mediação, que é um meio consensual e
voluntário de resolução de conflitos de interesses, realizado entre pessoas físicas e/
ou jurídicas, uma ferramenta de apoio aos longos e desgastantes processos que se
estendem no Judiciário, e dentre seus vários conceitos, de uma forma abrangente
conceitua Tânia Almeida (2001, p. 46): “A mediação é um processo orientado a con-
ferir às pessoas nele envolvidas a autoria de suas próprias decisões, convidando-as
à reflexão e ampliando alternativas. É um processo não adversarial dirigido à des-
construção dos impasses que imobilizam a negociação, transformando um contexto
de confronto em contexto colaborativo. É um processo confidencial e voluntário em
que um terceiro imparcial facilita a negociação entre duas ou mais partes onde um
acordo mutuamente aceitável pode ser um dos desfechos possíveis”.
Por meio da mediação, a comunicação dos indivíduos envolvidos no conflito
seria facilitada e norteada, o conflito seria compreendido, se encontrariam seus
fundamentos sem imposições, seria pelas partes ajustado e se buscaria meios para
saná-los.
Para Adolfo Braga Neto, a mediação se define da seguinte forma (1999, p. 93):
“Mediação é uma técnica não adversarial de resolução de conflitos, por intermédio
da qual duas ou mais pessoas (físicas, jurídicas, públicas, etc.) recorrem a um es-
pecialista neutro, capacitado, que realiza reuniões conjuntas e/ou separadas, com o

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


intuito de estimulá-las a obter uma solução consensual e satisfatória, salvaguardando
o bom relacionamento entre elas”.
Muitos princípios norteiam a mediação e contribuem para a formação de seu
conceito. A Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015, que dispõe sobre mediação, no
art. 2º elenca os princípios que norteiam a mediação, quais sejam: imparcialidade
do mediador (I), isonomia entre as partes (II), oralidade (III), informalidade (IV),
autonomia da vontade das partes (V), busca do consenso (VI), confidencialidade
(VII) e boa-fé (VII).
Princípio, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello (1991, p. 230), é, “por
definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposi-
ção fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito
e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por
definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica
e lhe dá sentido harmônico”.
A partir do conceito percebe-se que, se a mediação não for realizada em con-
formidade com seus princípios, todo procedimento será prejudicado, além disso,
poderá ser declarado nulo, daí a importância de entender tais princípios e aplicá-
los corretamente de modo que não se retorne ao ponto inicial da controvérsia. No
entendimento de Carlos Roberto Gonçalves, dentre os princípios básicos do Código
Civil tem-se o princípio da eticidade, que “funda-se no valor da pessoa humana
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como fonte de todos os demais valores. Prioriza a equidade, a boa-fé, a justa causa
e demais critérios éticos” (2006, p. 25).
Todo procedimento da mediação se baseia em critérios éticos, e tais critérios
oferecem suporte para se alcançar um bom resultado. O mediador, por sua vez,
possui um código de ética que o orienta, preceitua e regula suas práticas profissio-
nais e funcionais, embora, atualmente, cada instituição ou casa constituída com a
finalidade de promover a mediação adote um código de ética próprio para zelar pela
reta conduta de seus mediadores, pois não existe um órgão máximo da mediação
que seja competente para impor a adoção de um código de ética ou mesmo para
elaborar um código único a ser observado por todos.
O código de ética tem por função compatibilizar os procedimentos e exercícios
de mediação com a moral, com a prudência, com os bons costumes e com a finalidade
social. Além disso, cabe ressaltar que o código de ética também é responsável por
permitir ao mediador fazer uma reflexão sobre suas ações e conhecer seus direitos,
deveres e a sua relação com outros profissionais e com a entidade credenciada à
realização da mediação.
A mediação se aplica a quase todo aspecto da vida humana; em tese, qualquer
conflito pode ser mediado, inclusive na esfera da Administração Pública. Sem dúvi-
da, existem situações incompatíveis com a mediação, como os casos que tratem de
filiação, adoção, poder familiar, invalidade de matrimônio, interdição, recuperação
judicial, falência, além de casos como o de uma violência física em que a vítima
está tão fragilizada que não seja mais possível qualquer contato. Em casos como
este, dentre outros, o consenso está completamente prejudicado, o que deve ser
identificado pelo mediador no caso concreto.

2.2. Objetivo da Mediação


A mediação tem como objetivo aliviar o sobrecarregado sistema judiciário na
busca informal da solução de conflitos, isto é, tem o condão de auxiliar e agilizar
processos que são postergados através dos anos, dependendo da morosidade da
justiça, mas, muito mais que isso, ela tem como principal objetivo proporcionar às
pessoas soluções adequadas, efetivas e tempestivas. Ainda mais: soluções em que as
próprias partes tenham opinado e realizado mútuas concessões.
A mediação se aplica na solução de conflitos, todavia, seu foco principal não
está na celebração de um acordo que ponha termo ao conflito, mas, sim, em pro-
mover uma reflexão pelas partes sobre o teor do conflito e sobre a necessidade do
restabelecimento da comunicação destruída pela pretensão. Isso não significa que
as partes deverão transigir, mas com o mínimo de diálogo obterão êxito no desfecho
do problema. Assim declara Stella Galbinsk Bretmann (2006, p. 55): “muito mais
do que um acordo, a mediação preconiza o potencial de transformação das pessoas,
pois representa e expressão de uma visão relacional, amparada na consideração e
no respeito às diferenças”.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 55

A administração do conflito proporciona às partes garantir uma relação futura.


No âmbito familiar, esse fator é de grande importância, principalmente quando se
trata de filhos. No processo de separação, vê-se, por exemplo, a questão de visita-
ção, guarda, alimentos, enfim, diversos detalhes que vão demandar no decorrer da
vida intervenção dos pais, e a boa relação certamente facilitará essa convivência. A
mediação ameniza consequências negativas, tornando o ambiente familiar mais equi-
librado após uma ruptura que é, por si só, um processo extremamente desgastante.
A mediação, sem dúvida, trará agilidade ao processo, bem como inúmeros
benefícios para as partes envolvidas, como redução de desgastes emocionais e custos
financeiros, além da garantia de privacidade e sigilo. A mediação familiar utilizada
nas Varas de Família será uma alternativa para retomar a comunicação das partes
e formar um bom relacionamento posterior ao conflito entre elas. A mediação terá
como escopo solucionar os conflitos jurídicos de família, impedindo a morosida-
de, diminuindo os elevados custos dos litígios e do processo, ajudando na relação
familiar, ou melhor, na cooperação familiar, esclarecendo os membros que devem
enfrentar de forma menos traumática possível os resultados como sofrimentos
emocionais que serão decorrentes desse conflito.
Mais do que trazer soluções para o conflito, a mediação auxilia as pessoas a
desenvolverem capacidades próprias de resolverem seus problemas, não necessaria-
mente de se relacionarem, mas alcançarem amadurecimento no convívio e satisfação
dos interesses e das necessidades dos envolvidos, sejam eles de que natureza for,
buscando o acordo e a resolução do conflito na pessoa do mediador.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


2.3. A Pessoa do Mediador
O mediador deve ter como uma de suas principais características o conhe-
cimento de diversas áreas que envolvem o conflito, principalmente os conflitos
familiares, que são estruturados nos mais diversos aspectos, tais como religiosos,
culturais, políticos e psicológicos. Ele deve harmonizar as opiniões, buscando o en-
tendimento das partes e uma convivência respeitadora. “A mediação é um processo
informal de resolução de conflitos em que um terceiro, imparcial e neutro, sem o
poder de decisão, assiste às partes, para que a comunicação seja estabelecida e os
interesses preservados, visando ao estabelecimento de um acordo. Na verdade, na
mediação, as partes são guiadas por um terceiro (mediador) que não influenciará no
resultado final. O mediador, sem decidir ou influenciar na decisão das partes, ajuda
nas questões essenciais que devem ser resolvidas durante o processo” (RODRIGUES
Jr., 2007, p. 50).
O mediador é um terceiro, neutro, que não se envolve no conflito, apenas
busca, juntamente com as partes, o caminho mais fácil para sua solução. Ele é um
catalizador que, após receber as informações e detectar o cerne do problema, tenta
levar as partes a reconhecê-lo e buscar meios de dirimi-lo, pois o olhar de um terceiro
facilita a visão das partes. Ele é um tradutor do problema, que em muitos momentos
é imperceptível para aqueles que começam a pensar apenas em si, quando o conflito
passa a se tornar uma espécie de vingança pessoal.
56 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Sobre o mediador, explica Adolfo Braga Neto: “O mediador, em sua intervenção,


coordena um processo de positivação do conflito, que nada mais é do que fruto da
estrutura relacional existente entre eles no passado e no presente, com a conscien-
tização de que o futuro está em suas próprias mãos. O mediador pratica o diálogo
e busca primeiramente as questões do conflito” (2008, p. 78).
O mesmo autor conclui:
“A atuação do mediador, portanto, é na vertente do auxílio na adminis-
tração do conflito, a fim de promover como resultado a responsabilidade, não
somente gerada na inter-relação existente ou que existia, mas, sobretudo, no
que poderá ser construído no futuro a partir dele.” (BRAGA NETO, 2008, p. 79)
O mediador é aquele que neutraliza as emoções para que a razão encontre o
caminho do bem-estar na situação de conflito. O Código de Ética de Mediadores
Judiciais é estabelecido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Composto por
princípios fundamentais que formam a consciência dos profissionais e impõem
uma conduta a ser tomada para garantir o desenvolvimento da política pública de
tratamento adequado dos conflitos e a qualidade dos serviços de mediação, esta-
belece ainda responsabilidade e sanções ao mediador, além disso, conforme o art.
3º, estabelece que apenas poderão exercer suas funções perante o Poder Judiciá-
rio mediadores devidamente capacitados e cadastrados pelos tribunais, aos quais
competirá regulamentar o processo de inclusão e exclusão no respectivo cadastro.
Segundo o art. 4º, o mediador deve exercer sua função com lisura, respeitando os
princípios e regras deste código, assinado, para tanto, no início do exercício, termo
de compromisso e submetendo-se às orientações do juiz coordenador da unidade
a que é vinculado.
Já no art. 5º aplicam-se aos mediadores os mesmos motivos de impedimentos e
suspeição dos juízes, devendo, quando constatados, ser informados aos envolvidos,
com a interrupção da sessão e sua substituição. Já o art. 6º salienta que, no caso de
impossibilidade temporária do exercício da função, o mediador deverá informar
com antecedência ao responsável para que seja providenciada sua substituição na
condução das sessões. Uma questão importante é posta no art. 7º, no qual o mediador
fica absolutamente impedido de prestar serviços profissionais, de qualquer natureza,
pelo prazo de dois anos, aos envolvidos em processo de mediação sob sua conduta.
Quanto ao descumprimento dos princípios e regras estabelecidos no Código do
CNJ, o art. 8º informa que resultará na exclusão do mediador do respectivo cadastro
e no impedimento para atuar nesta função em qualquer outro órgão do Poder Judi-
ciário nacional. Por fim, o parágrafo único cita que “qualquer pessoa que venha a ter
conhecimento de conduta inadequada por parte do mediador poderá representar o
Juiz Coordenador a fim de que sejam adotadas as providencias cabíveis”. A resolução
é incisiva ao exigir dos mediadores capacitação por meio de cursos específicos com
conteúdo programático detalhadamente por ela estabelecido no art. 12, sujeitando-
os, tal como os demais facilitadores do entendimento entre as partes, ao Código de
Ética estabelecido pelo Conselho.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 57

Os procedimentos de mediação, na prática, normalmente têm sido feitos pelas


Câmaras de Mediação, que possuem seus regimentos e normas. O mediador pode
também atuar sozinho, independentemente de estar vinculado a uma entidade.
Ressalta-se que o mediador não possui papel decisório e jamais poderá influenciar
decisões ou exercer seu papel de forma parcial. Ele não faz papel de advogado nem
de terapeuta, ele apenas favorece a realização do acordo. Ao mediador é necessário
conhecer os diferentes tipos de conflitos, identificar sua essência, manejar a situação
e, em conjunto com as partes, obter a melhor escolha do caminho a ser seguido.
Em síntese, uma vez solicitado, o mediador começa as entrevistas, ouvindo as
partes para uma coleta de dados sobre a natureza do problema, o que pode ser rea-
lizado em várias sessões. Por meio desse trabalho, o mediador entenderá a razão do
conflito e levará as partes a reconhecerem o fato gerador da discórdia e as possíveis
opções de resolução sem discussões e apontamentos de culpados, por intermédio
de mútuas concessões, nas quais cada parte abre mão de certas exigências para que,
além de solucionar o objeto da lide, as pessoas não se tornem inimigas, rompendo
laços. Ao contrário, elas se aproximam movidas pelo interesse que lhes é comum.

2.4. Mediação, Conciliação e Arbitragem


A mediação, a conciliação e a arbitragem são formas alternativas de resolução
de conflitos. Os termos, apesar de aparentemente possuírem significados semelhan-
tes, se distinguem não só conceitualmente como também na prática. Suas principais
diferenças residem no que diz respeito à abordagem.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


A mediação, como já dito anteriormente, é um meio alternativo e voluntário
de resolução de conflitos, no qual o terceiro imparcial, a pessoa do mediador, assiste
às partes na solução do problema conflitante, contudo, sem poder de decisões ou
imposições. Na mediação, as partes se mantêm autoras de suas próprias soluções.
Com o auxílio do mediador, com conhecimento interdisciplinar, tenta-se solucionar
o conflito, pensando não só na solução do conflito momentâneo, mas buscando o
incentivo das partes na busca de uma convivência futura que proporcionará um
ambiente mais amistoso e pacífico, principalmente no âmbito familiar.
A conciliação é considerada uma negociação, uma alternativa de solução ex-
trajudicial de conflitos. Na conciliação, um terceiro imparcial interveniente buscará,
em conjunto com as partes, chegar voluntariamente a um acordo, interagindo,
sugestionando junto às mesmas. O conciliador pode sugerir soluções para o litígio.
Atualmente, a conciliação é definida como “o processo pelo qual o conciliador
tenta fazer que as partes evitem ou desistam da jurisdição” (FIUZA, 1995, p. 56).
No âmbito processual civil, a conciliação é destaque por estar prevista entre
os arts. 447 a 449 do CPC. O parágrafo único do referido art. 447 dispõe que em
causas relativas à família terá lugar igualmente a conciliação, nos casos e para os fins
em que a lei consente a transação. O art. 448 aduz que, antes de iniciar a instrução,
o juiz tentará conciliar as partes. Chegando a acordo, o juiz mandará tomá-lo por
58 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

termo. Por fim, o art. 449 dispõe que o termo de conciliação, assinado pelas partes
e homologado pelo juiz, terá valor de sentença.
Por semelhante modo, o art. 125 do mesmo diploma processual civil estabelece
que, dentre outros, ao juiz compete velar pela rápida solução do litígio e tentar a
qualquer tempo conciliar as partes, inclusive em audiência preliminar (arts. 125, II
e IV, e 331 do CPC). Lília Maia de Morais Sales (2004, p. 38) elucida com exatidão
a diferença entre esses dois institutos: “A diferença fundamental entre a mediação
e a conciliação reside no conteúdo de cada instituto. Na conciliação, o objetivo é
o acordo, ou seja, as partes, mesmo adversárias, devem chegar a um acordo para
evitar um processo judicial. Na mediação, as partes não devem ser entendidas como
adversárias e o acordo é consequência da real comunicação entre as partes. Na
conciliação, o mediador (conciliador) sugere, interfere, aconselha. Na medição, o
mediador facilita a comunicação, sem induzir as partes ao acordo”.
A arbitragem, por sua vez, é uma forma de solução de conflitos, prevista pela
Lei nº 9.307/96, conhecida como “Lei Marco Maciel”, na qual um terceiro igualmente
neutro, especialista na matéria discutida, eleito pelas partes, com poder de emitir
decisões quanto às controvérsias, decide a controvérsia. Sua decisão tem a força
de uma sentença judicial e não admite recurso. Verifica-se, portanto, que o árbitro
emite decisões, não se tratando apenas de conduzir as partes a um acordo. O árbitro
atua com poder decisório relativamente ao mérito da demanda. Carmona (1998, p.
43) conceitua a arbitragem como “o meio alternativo de solução de controvérsias
através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma
convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a de-
cisão destinada a assumir a mesma eficácia de sentença judicial”.
Mediação e arbitragem não se confundem, pois naquela há a figura do media-
dor, que não tem poder decisório, e nesta há a figura do árbitro, que possui poder
decisório.
Enquanto outras alternativas buscam um meio-termo entre os anseios das
partes, a mediação estimula os envolvidos a buscarem uma solução em que os dois
lados saiam ganhando. Mediação não é meio-termo, mas identifica o que está por
trás das intenções e negocia com base nos interesses.

3. MEDIAÇÃO NO DIREITO DAS FAMÍLIAS


Sabe-se que se vive um momento inovador na estrutura familiar em razão das
novas entidades familiares reconhecidas. No âmbito jurídico, muito se discute sobre
a composição da família, quem é a família e qual o seu papel na sociedade. Enquanto
se discute sobre a estrutura familiar e melhores meios de solucionar seus conflitos,
uma verdadeira avalanche de desajustes se instaura, desencadeando processos que se
arrastam no Judiciário. Há uma grande divergência nos tribunais sobre a composição
familiar, e ao mesmo tempo, com o surgimento de uma grande diversidade de famí-
lias, crescem os conflitos que sobrecarregam o Judiciário, causando um verdadeiro
caos. É nesse contexto que os meios alternativos de resolução de conflitos se tornam
cada vez mais necessários e solicitados nos litígios familiares.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 59

3.1. Conflitos Presentes na Estrutura Familiar


A família sempre foi amparada pelo Estado, se estruturando a partir do matri-
mônio. Com a evolução da sociedade, inúmeras alterações foram alcançadas, como
a isonomia entre os cônjuges conquistada na Constituição de 1988, ainda, a equi-
paração do casamento e união estável, a igualdade entre os filhos dentro e fora do
casamento, as diversas formas de família, dentre outras. É a partir daí que se passa
a uma nova compreensão da família, na qual ela ocupa o centro do ordenamento,
solidificando a dignidade humana, como atributo essencial, o que veio desencadear
uma revisão e uma adequação do Direito das Famílias.
Segundo Maria Berenice Dias e Giselle Groeninga (2002), “há uma constante
interação entre o sistema familiar e o social, havendo um processo de retroalimenta-
ção, de influências recíprocas que obedece a leis que se modificam com o correr da
história. Todas as estruturas que evoluem no tempo sofrem modificações quanto ao
seu funcionamento. Via de consequência, as relações precisam ser constantemente
reajustadas, repensadas. Não é a imposição legal de normas de conduta que conso-
lida ou estrutura o vínculo conjugal. Além de seus aspectos inconscientes, é sim-
plesmente a sinceridade de sentimentos e a consciência dos papéis desempenhados
pelos seus membros que garantem a sobrevivência do relacionamento, como sede
de desenvolvimento e realização pessoal”.
A família atual é dinâmica, e é essa dinâmica dos movimentos sociais que
acarreta a necessidade de mudança e renovação dos modelos familiares existentes.
De acordo com Cristiano Chaves de Farias (2002, p. 3), “os casamentos, divórcios,
recasamentos, adoções, inseminações artificiais, fertilizações in vitro, clonagem,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


etc., impõem especulações sobre o surgimento de novos status familiares, novos
papéis, novas relações sociais, jurídicas e afetivas”. A família tenta se encontrar, a
lei busca alcançar essa evolução, contudo, os problemas continuam fazendo parte
de sua constituição, pois, sendo família, a relação é sempre complexa e, devido à
singularidade do indivíduo, essas diferenças no contexto relacional são o cerne
do conflito. É justamente nos conflitos familiares que transparecem sentimentos
como hostilidade, vingança, depressão, ansiedade, arrependimento, ódio, mágoa,
medo, etc., quase sempre, durante uma crise, as partes não conseguem conversar
de forma ordenada e pacífica para resolver suas controvérsias. Numa separação,
por exemplo, o estresse e o sofrimento são inevitáveis, pois podemos ver famílias
travando verdadeiras guerras, os filhos muitas vezes são usados como instrumentos
de agressão, desta forma, parece improvável que essas questões sejam eliminadas nos
tribunais de família. Há um desajuste nas famílias, visto que elas estão impregnadas
de discórdias e indiferenças, os casais dirigem suas desavenças para os filhos e a luta
continua indefinitivamente. Cláudio da Silva Ribeiro e Leandro Gadelha Dourado
Nogueira (2006, p. 8) definem conflito: “O conflito surge quando existe oposição de
interesses. Estes decorrem da simples razão de que os bens são limitados, ao passo
que as necessidades humanas podem ser ilimitadas. O interesse, no raciocínio car-
neluttiano, não se confunde com o juízo do homem em relação a determinado bem
da vida, mas com sua posição objetiva, isto é, a relação entre o homem – que sofre
necessidades – e os bens aptos a atendê-las. Assim, haveria um interesse mesmo que
60 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

não houvesse vontade manifestada. Outrossim, o juízo é apenas uma revelação do


real interesse, não este uma consequência do juízo”.
Nesse contexto, observam-se os maiores desafios e dificuldades enfrentados
pelas partes quando se instaura um processo judicial. Talvez o maior deles seja que,
de acordo com a complexidade do caso, o processo pode durar meses ou até mesmo
anos, e a incerteza na espera certamente corrobora para o aumento das tensões e
intensidade dos conflitos.
Os conflitos são inevitáveis e a mediação contribui de uma maneira eficaz, pois
desenvolve nas partes conflitantes uma nova forma de lidar com a situação, enten-
dendo que os desgastes causados nos litígios somatizam enfermidades que acarretam
sofrimentos para todos os envolvidos. A sociedade atual vem sendo acometida por
doenças da alma, desenvolvidas a partir de desajustes nas relações interpessoais, como
a depressão, que causa marcas desastrosas no emocional, desencadeando distúrbios
emocionais e relacionais, pacientes superlotam os consultórios em busca de solução
para um problema causado por desgastes que talvez poderiam ter sido evitados com
um meio alternativo de solução de conflito, como a mediação, pois, segundo esclarece
Rozane da Rosa Cachapuz (2003, p. 152), “a mediação traz o propósito de romper essas
barreiras conjunturais, de amparar na letra fria da lei a base emocional do ser humano,
visando levá-lo ao seu próprio interior, para encontrar as causas que desajustaram o
relacionamento e uma nova forma de vivência. Ela se responsabiliza pela integridade do
ser humano, por isso a sua grande responsabilidade de formar profissionais adequados”.
Assim, percebe-se uma grande necessidade de um trabalho interdisciplinar,
envolvendo profissionais de diversas áreas, como advogados, psicólogos, assistentes
sociais, entre outros, para tratar de conflitos familiares com o objetivo de proporcionar
uma prestação de serviço mais adequada e eficaz às famílias que estão em conflito.
O Direito das Famílias já utiliza pareceres de psicólogos e assistentes sociais, pois a
complexidade de alguns casos necessita de um olhar mais criterioso de suas emoções;
contudo, algumas Varas ainda não contam com o auxílio destes profissionais, ficando
o juiz limitado ao seu conhecimento jurídico. Os advogados certamente estão mais
preparados no que tange aos conhecimentos jurídicos, e isso facilita seu trabalho,
pois podem trazer às partes as normas adequadas a serem aplicadas ao caso, todavia,
na mediação requer-se um pouco mais do mediador. O mediador não só encontrará
soluções jurídicas para o caso como também lidará com as questões emocionais das
partes. Lígia Dornelles (2006, p. 10) afirma que “aplicar a lei é fácil, entender de gente
é um pouco mais complicado. Assim, o milênio que se inicia precisa de profissionais
capazes de entender gente, de preocupar-se com o ser do conflito e não somente
com o ser do direito. Sabemos que as duas grandes moedas do terceiro milênio são a
cooperação e a qualificação e somente as teremos se tivermos gente trabalhando com
gente, vivendo com gente, comunicando-se com gente e interagindo com gente”.
O advogado é indispensável à administração da justiça e deve, a partir dessas
novas mudanças, agregar conhecimento jurídico a um maior entendimento inter-
pessoal, que o possibilitará alcançar acordos mais satisfatórios, não só os advogados
como todos operadores da lei. Todos precisam aprender o aspecto emocional do ser
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 61

humano e se adequar aos novos moldes da justiça, pois com isso obteremos melhores
resultados nos acordos, agilidade na resolução de conflitos, além do profissional se
apresentar cada vez mais qualificado para as demandas do mercado atual.

3.2. Vantagens da Mediação no Âmbito Familiar


Os conflitos familiares são, na maioria das vezes, mais desgastantes e exigem
um olhar mais específico para o caso concreto, o que requer do Judiciário maior
sensibilidade para se obter um resultado mais eficaz e que não cause tantas conse-
quências na vida familiar já abalada pelo conflito existente.
A mediação no âmbito familiar propõe a desconstrução do conflito, ou pelo
menos dirimi-lo, incentivando a comunicação entre as partes, ficando assim os me-
diados responsabilizados por uma relação mutuamente satisfatória, cooperando para
a reorganização da família. Nota-se que a mediação familiar facilita a manutenção das
relações continuadas, propondo uma verdadeira mudança de paradigma. Este pro-
cesso incentiva as partes a observarem positivamente os conflitos, amenizando-os e
entendendo-os como fatos naturais. A partir destas transformações, os parentes passam
a conviver melhor, evitando novas contendas. São inúmeros os benefícios da mediação
familiar, dentre os quais se destaca a agilidade, uma vez que um processo que pode
levar anos pode ser resolvido num lapso temporal bem mais curto, evitando desgastes
e a morosidade da justiça atual. “A grande vantagem da mediação está em a própria
pessoa querer buscá-la. É na soberania de vontade que se encontra maior vantagem
da mediação, pois, estando as partes dispostas a buscarem um consenso, já se pode
vislumbrar, ao nível emocional, a resolução do conflito” (CACHAPUZ, 2003, p. 137).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


A mediação, na verdade, é um instituto bastante antigo e já utilizado em di-
versos países. Na Europa e na América do Norte a mediação é empregada há mais
de 50 anos com resultados eficazes e um elevado número de acordos. No Brasil,
somente agora a lei foi sancionada, após a comprovação, demonstrada através de
inúmeros processos solucionados com a mediação e reconhecimento dos operadores
do Direito (CACHAPUZ, 2006, p. 24).
A CF, em seu preâmbulo, prevê a solução pacífica de controvérsias, e no art.
226, § 8º, pode-se observar que o Estado mantém um compromisso de criar me-
canismos para coibir a violência no âmbito das relações familiares. A mediação,
sendo bem utilizada e conhecida pela sociedade, facilitará a resolução de conflitos,
transformando o litígio em algo positivo e direcionando as partes a desenvolverem
um relacionamento maduro o suficiente para evitar desgastes e prejuízos emocio-
nais. O sucesso da mediação não resultará apenas do acordo firmado, mas também
da forma que se age no emocional do indivíduo na busca de algo justo, e não em
atitudes motivadas por vinganças e ressentimentos. A mediação, sendo conhecida
pela sociedade, se tornará parte da cultura, pois as pessoas, até mesmo os operado-
res do Direito, precisam abandonar o vício do contencioso, precisam ser treinadas
para mediar antes de litigar. A partir daí as pessoas buscarão, na mediação, uma
opção, ou ao menos uma tentativa de resolução do conflito, podendo alcançar um
fim efetivo com solução favorável sem se sentirem lesados, detectando a razão que
62 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

as levou ao desentendimento. A mediação não é uma terapia a ser desenvolvida


pelo mediador, tampouco uma competição, ela apenas sinaliza um novo contexto
em meio à divergência, na qual as partes podem expandir seu entendimento para
alcançar harmonia emocional e uma possível convivência.

4. MEDIAÇÃO E SUA APLICABILIDADE


4.1. Evolução, Aplicação e Legislação Específica
No Brasil, a partir dos anos 90 do século passado, começou a haver um inte-
resse pelo instituto da mediação, sobretudo por influência da legislação argentina
editada em 1995. Por aqui, a primeira iniciativa legislativa ganhou forma com o PL
nº 4.827/98, oriundo da proposta da Deputada Zulaiê Cobra, tendo o texto inicial
levado à Câmara uma regulamentação concisa, estabelecendo a definição de media-
ção e elencando algumas disposições a respeito. Na Câmara dos Deputados, já em
2002, o projeto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e enviado ao
Senado Federal, onde recebeu o número PLC nº 94, de 2002.
O Governo Federal, no entanto, como parte do Pacote Republicano, que se
seguiu à EC nº 45/04 (conhecida como “Reforma do Judiciário”), apresentou diversos
projetos de lei modificando o CPC, o que levou a um novo relatório do PL nº 94. Foi
aprovado o substitutivo (Emenda nº 1/CCJ), ficando prejudicado o projeto inicial,
tendo sido o substitutivo enviado à Câmara dos Deputados no dia 11 de julho. Em
1º de agosto, o projeto foi encaminhado à CCJC, que o recebeu em 7 de agosto.
Desde então, dele não se teve mais notícia até meados de 2013, quando voltou a
tramitar, provavelmente por inspiração dos projetos que já tramitavam no Senado.
Em 2010, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 125 – um
importante passo para estimular a mediação e a conciliação – ao instituir a Política
Judiciária Nacional de tratamento aos conflitos de interesses, incumbindo aos ór-
gãos judiciários oferecer mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os
chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, bem como prestar
atendimento e orientação ao cidadão.
A Resolução nº 125 determinou aos tribunais a criação de Núcleos Perma-
nentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, e para atender aos juízos,
juizados ou varas com competência nas áreas cível, fazendária, previdenciária, de
família ou dos juizados especiais cíveis, criminais e fazendários, foi determinada a
criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania, conhecidos
como os CEJUSCs, incumbidos de realizarem as sessões de conciliação e mediação
pré-processuais, cujas audiências são realizadas por conciliadores e mediadores
credenciados junto ao tribunal.
A partir de então, um grande esforço para treinamento de conciliadores e
mediadores passou a ser desenvolvido, com a multiplicação de cursos de capacita-
ção, supervisionados pelo próprio CNJ e tribunais, para o fim de treinamento dos
interessados, para a nova atividade então estimulada. Inicia-se, por assim dizer,
uma nova era na mediação e conciliação, numa ação que está vencendo muitas re-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 63

sistências entre os operadores do Direito em geral, a começar pelos advogados, que


olham com desconfiança e temor pela perda de mercado de trabalho, e pelo próprio
Poder Judiciário, no qual muitos de seus integrantes não se mostram adeptos da
nova técnica de solução pacífica dos conflitos.
Justamente na mesma época que o CNJ deu novas diretrizes à conciliação e à
mediação no Brasil, deu entrada no Senado o PL nº 166/2010, tratando do NCPC,
que mais tarde foi transformado no Projeto Substitutivo nº 8.046/2010, na Câmara
dos Deputados, e que em 17 de dezembro de 2014, após retornar ao Senado, foi
finalmente aprovado pelo Poder Legislativo.
Após diversas tentativas de inserção da mediação como meio alternativo de
composição de conflitos, foi aprovada em março a Lei nº 13.140, de 26 de junho de
2015, que dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre par-
ticulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da Administração Pública;
é a mais atual, sancionada pelo atual Governo, e traz uma visão mais abrangente da
mediação que já foi acolhida pelo NCPC. Essa Lei certamente acarretará a redução
de processos tramitando no Poder Judiciário, pois poderá ser objeto da mediação o
conflito que verse sobre direitos disponível e indisponível que admitam transações,
por esse motivo, espera-se que ela seja um passo decisivo para os conflitos que se
estabelecem no âmbito do Direito das Famílias.
A lei determina ainda a criação de Centros Judiciários de Solução Consensual
de Conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação
e mediação, pré-processuais e processuais, e pelo desenvolvimento de programas
destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição. A norma estabelece

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


que poderão ser solucionados por meio da mediação os conflitos que versem sobre
direitos indisponíveis e disponíveis que admitam transação. Há também, conforme
a lei, a possibilidade de que contratos privados tenham cláusula de mediação como
opção prévia à abertura do processo. A lei também regulamenta a formação e atuação
dos mediadores, que terão critérios e princípios estabelecidos para a realização da
sua função, bem como todas as diretrizes a serem seguidas para o melhor desenvol-
vimento do trabalho do mediador.

4.1.1. Aplicação e Mediação


A mediação pode ser aplicada nas mais diversas áreas. Na área civil, em
qualquer conflito que verse sobre direitos disponível e indisponível que admitam
transação, salvo disposição em contrário. A mediação também é muito utilizada na
área comercial devido a sua rapidez e eficácia nos conflitos contratuais, que, em
sua maioria, dispensam o Judiciário. Também vem crescendo na área trabalhista,
na resolução de conflitos individuais e coletivos e até mesmo em conflitos gerados
por acidente e doença do trabalho. Até nas questões ambientais a mediação pode
ser usada, detectando os motivos geradores de conflitos, na tentativa de buscar uma
solução em que as partes saiam satisfeitas. As escolas têm sido um lugar onde a me-
diação tem ganhado grande espaço, na busca de equilíbrio e harmonia entre alunos,
professores e diretores, com a busca da facilitação do diálogo e uma proposta de
64 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

convivência pacífica. No Direito Internacional, sua aplicação é indispensável, pois os


mediadores promovem entre as partes recomposição na busca do termo do conflito.
E na família não poderia ser diferente, sua aplicação é fundamental na tentativa de
evitar a ruptura da estrutura familiar e uma maior reflexão das relações, talvez seja
na área familiar que a mediação mais atua e apresenta maiores vantagens, pois é um
método abrangente com resultados comprovadamente positivos.

4.2. Mediação no Novo Código de Processo Civil


O Senado Federal considerou oportuna a inclusão da mediação no NCPC,
atrelada à conciliação, sendo a última com maior destaque e maior campo de atu-
ação na lei atual.
O atual CPC, é bem verdade, tem no seu bojo a utilização da conciliação, nas
ações de procedimento sumário (art. 275, I e II), como procedimento preliminar à
apresentação da defesa pelo réu, em audiência, e nas ações de procedimento ordinário,
após o decurso do prazo para a defesa, por designação do juiz, conforme o art. 331, §
1º. Igual previsão está contida na Lei nº 9.099/95, que trata dos juizados especiais cíveis.
Ocorre que, na prática, essa audiência é pouco ou mal utilizada pelos magistra-
dos, uma vez que as ações de procedimento sumário, via de regra, são convertidas ao
procedimento ordinário; e as audiências preliminares de conciliação, muitas vezes,
não se realizam por desinteresse das partes, ou pelo pouco empenho dos juízes, que
no geral se limitam a perguntarem às partes se tem proposta ou não de composição,
sem nenhum empenho para a solução consensual do litígio, o que acaba por pro-
longar por anos a fio um processo que poderia ter solução mais rápida e eficiente
para as partes em um menor período de tempo. O texto do NCPC aprovado pelo
Poder Legislativo dá um destaque especial à conciliação e à mediação, prevendo e
disciplinando sua aplicação em várias oportunidades, a saber.
A mediação, juntamente com a conciliação, está prevista no art. 334 do NCPC.
Nele o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos,
através da conciliação e da mediação, que deverão ser estimuladas por juízes, advogados,
defensores públicos e membros do MP, inclusive no curso do processo judicial. O juiz
dirigirá o processo conforme as disposições do Código, incumbindo-lhe promover, a
qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e
mediadores judiciais, que serão auxiliares da justiça. Os tribunais criarão Centros Ju-
diciários de Solução Consensual de Conflitos, responsáveis pela realização de sessões e
audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados
a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição na pessoa do conciliador ou mediador,
que atuarão preferencialmente nos casos em que não tiver havido vínculo anterior entre
as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer
tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.
Como dito anteriormente, o mediador auxiliará os interessados a compre-
enderem as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo
restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais
que gerem benefícios mútuos. A confidencialidade estende-se a todas as informações
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 65

produzidas no curso do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim
diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes, em razão do dever de
sigilo, inerente às suas funções. O conciliador e o mediador, assim como os mem-
bros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos
oriundos da conciliação ou da mediação.
Admite-se a aplicação de técnicas negociais com o objetivo de proporcionar
ambiente favorável à autocomposição, e a mediação e a conciliação serão regidas
conforme a livre-autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à de-
finição das regras procedimentais. Os conciliadores, os mediadores e as Câmaras
Privadas de Conciliação e Mediação serão inscritos em Cadastro Nacional e em
Cadastro de Tribunal de Justiça ou de Tribunal Regional Federal, que manterá re-
gistro de profissionais habilitados, com indicação de sua área profissional, uma vez
que preencherem o requisito da capacitação mínima, por meio de curso realizado
por entidade credenciada, conforme parâmetro curricular definido pelo Conselho
Nacional de Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça.
Os conciliadores e mediadores judiciais cadastrados, se advogados, estarão im-
pedidos de exercer a advocacia nos juízos em que exerçam suas funções. O tribunal
poderá optar pela criação de quadro próprio de conciliadores e mediadores, a ser
preenchido por concurso público de provas e títulos, e as partes podem escolher, de
comum acordo, o conciliador, o mediador ou a câmara privada de conciliação e de
mediação, inclusive este poderá não ser cadastrado junto ao tribunal. Inexistindo
acordo na escolha do mediador ou conciliador, haverá distribuição entre aqueles
cadastrados no registro do tribunal, observada a respectiva formação, e sempre que

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


recomendável haverá a designação de mais de um mediador ou conciliador.
A mediação e a conciliação podem ser realizadas como trabalho voluntário,
observadas a legislação pertinente e a regulamentação do tribunal. No caso de impe-
dimento, o conciliador ou mediador o comunicará imediatamente, de preferência por
meio eletrônico, e devolverá os autos ao juiz da causa, ou ao coordenador do Centro
Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, devendo este realizar nova distribui-
ção. Se a causa de impedimento for apurada quando já iniciado o procedimento, a
atividade será interrompida, lavrando-se ata com relatório do ocorrido e solicitação de
distribuição para novo conciliador ou mediador, neste caso o conciliador e o mediador
ficam impedidos, pelo prazo de um ano, contado do término da última audiência em
que atuaram, de assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes.
Os conciliadores e mediadores que agirem com dolo ou culpa na condução da
conciliação ou da mediação sob sua responsabilidade, atuarem em procedimento
de mediação ou conciliação, apesar de impedidos ou suspeitos, serão excluídos do
quadro. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios criarão Câmaras
de Mediação e Conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de
conflitos no âmbito administrativo, tais como dirimir conflitos envolvendo órgãos
e entidades da Administração Pública, avaliar a admissibilidade dos pedidos de re-
solução de conflitos, por meio de conciliação, no âmbito da Administração Pública,
e promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta.
66 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência


de conciliação ou de mediação, designada pelos juízes nas ações de procedimento
ordinário, podendo haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação,
não excedentes a dois meses da primeira, desde que necessárias à composição das
partes. A autocomposição obtida pelo conciliador ou mediador será reduzida a termo
e homologada por sentença.

5. CONCLUSÃO
O princípio da dignidade humana consagra a importância e o valor do homem
na sociedade. O ser humano deve buscar viver em paz e em equilíbrio, porém, ao
relacionar-se, encontra conflitos quando deveria encontrar harmonia, mas nem
sempre é assim, e são nesses momentos de conflitos que o indivíduo trava suas
maiores batalhas, e essas batalhas muitas vezes são vivenciadas no meio familiar.
No primeiro atrito logo se pensa no litígio, e não se busca no diálogo uma opção
para a solução do conflito. É a partir daí que estruturas familiares são destruídas,
corações machucados, o amor dá lugar ao rancor e a união dá lugar ao individualismo,
os membros da família passam a viver em um ambiente desfavorável e inapropriado
para um bem viver.
A mediação busca, na raiz do conflito, solução para resgatar um ambiente
harmônico, onde a família possa desfrutar de paz e maturidade suficientes para re-
solverem suas questões rotineiras, onde a criança possa, se não desfrutar da presença
constante e afável dos pais, ao menos não viver em meio a brigas, ofensas, e até mesmo
agressões que lhes trazem profundas marcas que refletirão em toda a sua existência.
Se não se consegue viver em amor como antes, deve-se buscar apenas conviver.
Muitos países já abraçaram a mediação, e ela deve ser implantada nas univer-
sidades, pois antes de se aprender litigar deve se aprender a mediar. A mediação
possui um olhar menos técnico e mais humano, ela não será apenas um meio de alívio
para o Judiciário, mas um meio de resgate do ser humano e de famílias dilaceradas
e divididas. Talvez a mediação não seja a solução para os conflitos das famílias que
buscam o Judiciário, mas ela é uma opção, e ter uma opção é como encontrar uma
sombra em um dia quente de sol.

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A PETIÇÃO INICIAL NO NOVO CPC

Clovis Brasil Pereira


Advogado; Mestre em Direito; Especialista em Processo Civil; Coordenador Pedagógico da Comissão
de Cultura e Eventos da OAB/Guarulhos; Diretor da ESA, Unidade Guarulhos; Professor Universitário;
Coordenador Pedagógico da Pós-Graduação em Direito Processual Civil da FIG – Unimesp; Palestrante
Convidado do Departamento Cultural da OAB/SP; Editor Responsável do site jurídico www.prolegis.
com.br; Autor de diversos artigos jurídicos e do livro “O Cotidiano e o Direito”.

RESUMO
Pela Lei nº 13.105/2015, o processo de conhecimento, disciplinado no Novo
CPC a partir do art. 318, manda aplicar a todas as causas o procedimento comum,
salvo as disposições contrárias do Código, aplicando-se este procedimento subsi-
diariamente aos procedimentos especiais e ao processo de execução. Comparando
com o atual CPC, haverá uma simplificação no processo de conhecimento, uma vez
que teremos apenas o procedimento comum e os procedimentos especiais, sendo
que o procedimento sumário não tem previsão no Novo CPC.
Palavras-Chave: Petição Inicial. Novo Código de Processo Civil. Audiência de
Conciliação ou Mediação.

TITLE: The initial pleading in the new Code of Civil Procedure.


ABSTRACT
As per Law no. 13,105/2015, the cognizance procedure, established in the new
Code of Civil Procedure by article 318, enforces the application to all cases of common
proceeding, except otherwise stated in the Code, with subsidiary application of such pro-
cedure to special proceedings and the execution process. In comparison with the current
Code of Civil Procedure, there is some simplification in the cognizance procedure, since
that there are only the common proceeding and the special proceedings, and the summary
proceeding is not provided by the new Code of Civil Procedure.
Keywords: Initial Pleading. New Code of Civil Procedure. Pretrial Conference or
Mediation.

SUMÁRIO
Introdução. Requisitos e Peculiaridades no Procedimento Comum. Possibi-
lidade da Emenda da Petição Inicial. Peculiaridades do Pedido Inicial. Dispensa
da Audiência de Conciliação ou Mediação. Hipóteses do Indeferimento da Petição
Inicial. Recurso Cabível contra o Indeferimento do Pedido Inicial. Improcedência
Liminar do Pedido. Conclusão.

INTRODUÇÃO
Pela Lei nº 13.105/2015, o processo de conhecimento, disciplinado no Novo
CPC a partir do art. 318, manda aplicar a todas as causas o procedimento comum,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 69

salvo as disposições contrárias do Código, aplicando-se este procedimento subsi-


diariamente aos procedimentos especiais e ao processo de execução.
Comparando com o atual CPC, haverá uma simplificação no processo de conhe-
cimento, uma vez que teremos apenas o procedimento comum e os procedimentos
especiais, sendo que o procedimento sumário não tem previsão no Novo CPC.

REQUISITOS E PECULIARIDADES NO PROCEDIMENTO COMUM


Uma petição inicial no Novo CPC mantém praticamente os mesmos requisitos
do atual art. 282, conforme a previsão do art. 319, a saber:
“Art. 319. A petição inicial indicará:
I – o juízo a que é dirigida;
II – os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união está-
vel, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no
Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a
residência do autor e do réu;
III – o fato e os fundamentos jurídicos do pedido;
IV – o pedido com as suas especificações;
V – o valor da causa;
VI – as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos
alegados;
VII – a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


ou de mediação.”
Temos, assim, apenas duas alterações introduzidas no pedido inicial, com dois
acréscimos, conforme segue:
Inciso II – qualificação (união estável) e endereço eletrônico; e
Inciso VII – a opção do autor pela realização ou não da audiência de conci-
liação ou mediação.

POSSIBILIDADE DA EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL


Se o pedido inicial não preencher os requisitos dos arts. 319 e 320, com a
juntada dos documentos indispensáveis à propositura da ação, ou se forem consta-
tados defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento do mérito, o juiz
intimará o autor para que, no prazo de 15 dias, emende a inicial ou a complete, sob
pena de indeferimento, conforme o art. 321.

PECULIARIDADES DO PEDIDO INICIAL


Destacamos algumas inovações trazidas no Novo CPC, relacionadas ao pedido
inicial do autor, a saber:
– Segundo o art. 322, § 1º, no pedido principal, estão compreendidos os juros
legais, a correção monetária, as verbas de sucumbência e, inclusive, os honorários
advocatícios.
70 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

– Se o pedido inicial tratar de cumprimento de obrigações em prestações suces-


sivas, independentemente de declaração expressa do autor, serão automaticamente
incluídas na sentença, se o devedor não pagá-las no curso do processo ou consigná-
las, conforme a previsão do art. 323.
– Sendo acolhido o pedido inicial, o juiz determinará a citação do réu para
audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 dias, de-
vendo o réu ser citado pelo menos com 20 dias de antecedência da audiência, nos
termos do art. 334.
– A audiência preliminar será presidida por conciliador ou mediador, onde hou-
ver (§ 1º do art. 334), tendo a possibilidade de mais de uma sessão de conciliação
ou mediação, não excedente a 60 dias à primeira (§ 2º do art. 334).

DISPENSA DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO OU MEDIAÇÃO


O Novo CPC prevê para as ações que versem sobre direitos disponíveis a
realização da audiência de conciliação e mediação, podendo, no entanto, ocorrer a
dispensa de tal audiência se ambas as partes manifestarem expressamente desinte-
resse na composição consensual (§ 4º do art. 334).

HIPÓTESES DO INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL


Segundo o Novo CPC, o indeferimento da petição inicial poderá ocorrer na
forma do art. 330, que prevê:
“Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:
I – for inepta;
II – a parte for manifestamente ilegítima;
III – o autor carecer de interesse processual;
IV – não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321.”
O § 1º do art. 330 relaciona os casos em que será considerada inepta a petição inicial:
“Art. 330 (...)
§ 1º Considera-se inepta a petição inicial quando:
I – lhe faltar pedido ou causa de pedir;
II – o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que
se permite o pedido genérico;
III – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
IV – contiver pedidos incompatíveis entre si.”

RECURSO CABÍVEL CONTRA O INDEFERIMENTO DO PEDIDO INICIAL


Ocorrendo o indeferimento do pedido inicial, o autor poderá recorrer, conforme
o art. 331, através do recurso adequado, de apelação, com as seguintes possibilidades:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 71

– O juiz poderá retratar-se no prazo de cinco dias (no atual CPC o prazo é de
48h).
– Se o juiz não se retratar, mandará citar o réu para responder o recurso –
contrarrazões – art. 331, § 1º.

IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO


Segundo o art. 332, nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, in-
dependentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido
que contrariar:
– I – enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tri-
bunal de Justiça;
– II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tri-
bunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
– III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas
ou de assunção de competência; e
– IV – enunciado de súmula de Tribunal de Justiça sobre direito local.
O juiz pode julgar liminarmente ainda improcedente o pedido, se verificar a
decadência ou a prescrição.
Extinto o processo por decisão de improcedência liminar, o autor poderá tam-
bém interpor recurso de apelação, podendo, neste caso, ocorrer as seguintes hipóteses:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


– o juiz poderá retratar-se em cinco dias;
– se houver retratação, o juiz determinará o prosseguimento do processo, com
a citação do réu; e
– se não houver retratação, determinará a citação do réu para apresentar con-
trarrazões, no prazo de 15 dias.

CONCLUSÃO
O pedido inicial no procedimento comum no Novo CPC traz alterações que
buscam maior celeridade da justiça, com o aumento de possibilidades de o juiz
indeferir a petição inicial.
São as hipóteses que tratam de demandas que contrariem a jurisprudência domi-
nante nos Tribunais, conforme as hipóteses do art. 332, e com a previsão da audiência
de conciliação e mediação, para todas as ações que versarem sobre direitos disponíveis.
Obviamente que essa maior celeridade dependerá da postura dos conciliadores
e mediadores, que deverão ser submetidos a treinamento sobre técnicas e posturas
que deverão ser adotadas, sob pena de todo o esforço do legislador, privilegiando o
trabalho de tais auxiliares da justiça, restar inoperante.
A CAUSA PETENDI DA AÇÃO RESCISÓRIA

Gisele Leite
Professora Universitária; Mestre em Direito pela UFRJ; Mestre em Filosofia pela UFF;
Doutora em Direito pela USP; Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas
Jurídicas; Professora de diversas instituições de ensino privadas; Consultora do
Instituto de Pesquisas e Administração Escolar – IPAE; Colunista e Articulista de
diversos sites e revistas jurídicas; possui o total de 18 obras jurídicas publicadas.

RESUMO
Se não existisse a ação rescisória, triunfariam as injustiças acobertadas pelo
manto da coisa julgada e pela sua eficácia preclusiva, restando imunes para o todo
sempre. Assim, reafirma-se que a rescisória corresponde a um instrumento da justiça
para que a celeridade processual harmonize-se com os valores que contribuam para
o aprimoramento das decisões judiciais.
Palavras-Chave: Ação Rescisória. Desconstituição de Sentença. Acórdão Tran-
sitado em Julgado.

TITLE: The cause of action of the relief from judgment.


ABSTRACT
If there were no relief from judgment, injustices covered up by causes of action and
their preclusive efficacy would prevail and remain immune forever. Thus, it is reiterated
that the vacation is a justice tool for procedural speed to harmonize with the values that
contribute to the improvement of judicial decisions.
Keywords: Relief from Judgment. Vacation of Judgment. Unappealable Judgment.

Nos sistemas processuais contemporâneos, a sentença de mérito, mesmo


depois de adquirir a autoridade de coisa julgada material, pode ainda ser revogada
em hipóteses excepcionais.
Costuma-se justificar esta técnica pela necessidade de prevalência de um
interesse que transcende aquele das partes à realização de justiça, uma vez que a
decisão definitiva poderá apresentar vício tão nocivo à ordem pública que propícia
sua revogação inclusive após ter-se operado a preclusão dos prazos para a interpo-
sição de quaisquer recursos.
Os mecanismos processuais instituídos para esse fim são tradicionalmente de
duas espécies: ação autônoma ou recurso, ambos considerados de natureza especial
em razão de seu escopo, que se destaca das vias ordinárias de impugnação e supera
o da generalidade das ações.
É, aliás, o que se verifica nos ordenamentos processuais da Itália e da Alemanha,
que consagram no ricorso per cassazione e na Nichtikeisklage uma espécie de ação
de revogação da sentença, e da França, da Espanha e de Portugal, que disciplinam
um recurso de revisão da sentença também já transitada em julgado.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 73

No Brasil, tal remedium iuris, tendo como antecedente histórico mais próximo
o recurso de revista do velho direito lusitano, é a denominada ação rescisória, que
constitui o meio pelo qual se pede a desconstituição da sentença ou acórdão transi-
tado em julgado, com a possibilidade de rejulgamento, ato contínuo, da matéria já
apreciada, isto é, do meritum causae.
Ostenta, assim, a natureza de ação constitutiva, destinada ao pronunciamento
da anulação de ato decisório de mérito.
Em relação à causa petendi da ação rescisória e à distinção entre a quaestio iuris
e a quaestio facti, para Micheli, aquela se refere à cognição do fato normativo, e esta
se refere ao conhecimento do fato histórico. E, por isso, enquanto algumas questões
de direito podem ser apreciadas de ofício pelo órgão jurisdicional, a questão de fato
deve sempre ser alegada pelo interessado.
Os arts. 485 do CPC/73 ou 966 do CPC/2015 elencam as hipóteses que ensejam
a pretensão à rescisão. Cada uma delas corresponde a uma possível causa petendi de
ação rescisória, e, portanto, subordinam-se, em sua totalidade, ao regime reservado
às questões de fato.
Essa asserção inclui, à evidência, a violação de literal disposição de lei ou de
norma jurídica deduzida como fundamento do pedido de rescisão.
Como observa Barbosa Moreira, para averiguar se o fundamento existe e, por-
tanto, se a sentença deve ser rescindida, o órgão julgado tem de partir da análise da
lei que o autor aponta como violada e apreciar questões que, em si mesmas, à luz
do respectivo objeto, seriam classificáveis como questões de direito.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Ele o fará, porém, com a exclusiva finalidade de saber se há de aplicar ou não
o próprio art. 485, V, do CPC/73 rescindindo ou não a sentença.
Em caso afirmativo, a violação da lei, dada como existente, será o fato em que se
fundará a rescisão. No processo da rescisória, portanto, funcionam como questões de
fato, e assim se devem tratar, quaisquer questões que se necessita apreciar para apurar
se foi ou não violada a lei que se refere o autor. E essa mesma ordem de ideias, ainda
segundo o renomado doutrinador, vale para todas as demais hipóteses do art. 485.
Conclui-se, assim, que também na esfera da ação rescisória vigora a regra iura
novit curia, dispensando-se a indicação do inciso em que lastreado o pedido de res-
cisão, sendo absolutamente indiferente se o autor, na inicial, deixou de mencioná-lo
ou se, por engano, colacionou permissivo diverso.
Impõe-se ao demandante a precisa indicação, ainda que na hipótese do inciso
V do art. 485 (vide o art. 966, inciso V), que, em seu entender, foi transgredido pelo
julgado rescindendo como elemento integrante da causa de pedir.
Caso a petição inicial omita essa indicação, deve o relator do processo deter-
minar, de logo, seja esta completada no prazo de 10 dias e, uma vez não atendida
tal ordenação, indeferir a inicial.
O órgão julgador, por seu turno, não pode em caso algum apreciar o pedido de
rescisão à luz de outra norma que o autor se haja abatido de dizer violada. Por mais
74 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

evidente que seja a dita violação, se o órgão julgador rescindir a sentença com base
nela, infringirá o art. 128 do CPC/73 (art. 141 do CPC/2015), ou seja, o fundamento
da decisão estará fora dos limites da lide.
Assevera Moacyr Lobo da Costa que a ação rescisória poderá produzir duplo
julgamento como decorrência da instauração de dois juízos, o rescindente, que
constitui o escopo princípio da demanda, e o rescisório, que são conexos, não
obstante distintos.
Aquele tem por objetivo rescindir a sentença transitada em julgado, arguido de
vício capitulado na lei como motivo de sua insubsistência. O juízo subsequente, a
seu turno, visa promover novo julgamento da causa, uma vez rescindida a decisão.
Infelizmente, nem sempre tem lugar a duplicidade de julgamento. É o caso
de rescisória contra decisão que violou a coisa julgada: o juízo rescisório não teria
cabimento. Do mesmo modo seria na hipótese de incompetência ratione materiae
do órgão prolator da decisão rescindenda.
Em tais situações, como se conclui, delineia-se impertinente o juízo rescisório,
uma vez que o fim colimado com a ação rescisória é atingido no juízo rescindente. Se o
órgão judicial não tinha competência para julgar a causa, não a tem para julgá-la de novo.
Desta forma, é imprescindível que o advogado, ao preparar a inicial da resci-
sória, tenha presente o requisito previsto no inciso I do art. 488 do CPC/73 deter-
minativo da ampliação objetiva da demanda (art. 968 do CPC/2015).
Com efeito, se for o caso, o aludido dispositivo aponta que deverá ser cumulado
ao pedido de rescisão e de novo julgamento da causa. Porém, em algumas ocasiões,
o tribunal tem competência originária para julgar a ação rescisória, contudo, não
está autorizado a reexaminar o mérito da demanda primitiva.
A análise das hipóteses legais, discriminadas no art. 485 do CPC/73, evidencia
que pelo menos em cinco delas a finalidade da ação rescisória já é atingida com o
julgamento de procedência do pedido, ou seja, com a rescisão da sentença.
É o que ocorre nos casos de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz,
impedimento ou incompetência absoluta do juiz, dolo do vencedor em prejuízo do
demandado ou conluio dos litigantes visando fraudar a lei, ofensa à coisa julgada
e descoberta de documento novo em que não há lugar para o juízo rescisório por
manifesta falta de interesse ou impossibilidade lógica, ainda que o respectivo pedido
tenha sido erroneamente cumulado ao rescindente.
Em todas essas situações, a rescisória aflora amparada em única causa petendi,
que servirá para fundamentar apenas e tão somente a pretensão do autor ao juízo
rescindente.
Por outro lado, os permissivos legais, três destes elencados no art. 485, VI,
VIII e IX (vide art. 966, VI, VII e VIII), abrem a via para o desfazimento da sentença,
possibilitando o pedido cumulado não apenas de rescisão, mas também de novo
julgamento da causa pelo mesmo órgão perante o qual a demanda foi ajuizada.
Toda vez que a rescisória se amparar em falsa prova – invalidade da confissão,
renúncia ao direito ou transação, erro de fato –, a respectiva causa de pedir emergirá
necessariamente complexa.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 75

Causa petendi complexa é a que encerra pluralidade de fatos jurídicos, indi-


viduando mais de uma pretensão: narra o autor, em uma ação rescisória, lastreada
em prova falsa, a situação fática precedente à insubsistência do meio probante reco-
nhecidamente falso (causa de pedir do juízo rescindente), bem como fundamenta
aquela mesma situação no contexto jurídico dos demais elementos de convicção
para o fim de obter o rejulgamento da demanda (causa de pedir do juízo rescisório).
Nesse caso, não há qualquer impedimento para que o tribunal, reconhecendo a
procedência do primeiro pedido, rescinda o acórdão tido como viciado e, na mesma
oportunidade, profira novo julgamento da causa.
Já referente à violação a literal dispositivo de lei, a causa de pedir da ação rescisó-
ria poderá ser simples ou complexa, dependendo da natureza da norma inobservada.
Sendo vício de atividade o error in procedendo (por exemplo: a falta de intimação
do procurador da parte para o julgamento da apelação), que, sem dúvida, constitui
motivo de nulidade do acórdão por afronta à literalidade do art. 236, § 1º, do CPC/73
(art. 271, § 2º, do CPC/2015), a fundamentação da rescisória restringir-se-á a essa
causa petendi, uma vez que o tribunal, convencendo-se da procedência do pedido,
determinará o rejulgamento da causa, agora com estrita observância da regra legal
efetivamente violada, pelo mesmo órgão que proferirá o acórdão rescindido.
Some-se, por fim, que a mencionada cumulação de pedidos se subordina às
regras de competência previstas na legislação processual em vigor. Daí porque, em
razão do motivo de rescindibilidade invocado contra a decisão rescindenda, é im-
perioso que se verifique se o tribunal é competente para julgar, novamente, o objeto
litigioso da sentença rescindida. Sendo incompetente, o julgamento da rescisória se

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


exaure no juízo rescindente.
Não importa, para ensejar a ação rescisória, que a sentença se revele injusta, ou
não tenha enfrentado os aspectos éticos ou de juridicidade, posto que não se deve
fugir da relação de hipóteses elencadas no art. 966 do CPC/2015.
Se não existisse a ação rescisória, triunfariam as injustiças acobertadas pelo
manto da coisa julgada e pela sua eficácia preclusiva, restando imunes para o todo
sempre. Assim, reafirma-se que a rescisória corresponde a um instrumento da justiça
para que a celeridade processual harmonize-se com os valores que contribuam para
o aprimoramento das decisões judiciais.

REFERÊNCIAS
DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 16. ed. São Paulo:
Atlas, 2012.
MELO, Nehemias D. de (Coord.). Novo CPC: comentado – anotado – comparado.
São Paulo: Rumo Legal, 2015.
RIZZARDO, Arnaldo. Limitações do trânsito em julgado e desconstituição da sentença.
Rio de Janeiro: Forense, 2009.
MARCO INICIAL DO PRAZO DA INELEGIBILIDADE
POR REJEIÇÃO DE CONTAS: RECONSTRUÇÃO DO
SIGNIFICADO DE “DECISÃO IRRECORRÍVEL”

Helio Deivid Amorim Maldonado


Advogado; Especialista em Direito Público; Especialista em Fazenda Pública em
Juízo; Mestrando em Direitos e Garantias Fundamentais.

RESUMO
Os direitos políticos afiguram-se, na estrutura dogmática da Constituição, como
princípios de organização do poder soberano do povo. Entrementes, embutido pela
defesa subjacente dos princípios da probidade e da moralidade administrativa, bem
como da normalidade e legitimidade do pleito, foi que a própria Constituição outorgou
cláusula de reserva legal para restrição da capacidade eleitoral passiva, pela criação pelo
legislador infraconstitucional de hipóteses de inelegibilidade. Foi assim que sobreveio
a LC nº 64/90, sofrendo suas disposições ulteriores modificações pela LC nº 135/2010
(denominada Lei da Ficha Limpa), estando lá elencada a inelegibilidade por rejeição
de contas, decorrente de decisão irrecorrível por órgão competente. A toda evidência,
a inelegibilidade por rejeição de contas decorre do fato jurídico prévio da rejeição de
contas por órgão competente, podendo este ser o Poder Legislativo no caso do exame
das contas do Chefe do Executivo ou mesmo o próprio Tribunal de Contas.
Palavras-Chave: Inelegibilidade por Rejeição de Contas. Tribunal de Contas.
Decisão Irrecorrível.

TITLE: Beginning of term of ineligibility for account rejection: reconstruction of


the meaning of “unappealable decision”.
ABSTRACT
The political rights are, in the dogmatic structure of the Constitution, organizational
principles of the sovereignty of people. Nevertheless, inserted by the underlying defense
of the principles of probity and administrative morality, as well as by the normality and
legitimacy of the election, the Constitution granted the principle of legality clause for the
restriction of the passive electoral capacity, as per the creation of cases of ineligibility by
nonconstitutional law makers. That was how the Supplementary Law no. 64/90 arose,
having their subsequent provisions been amended by Supplementary Law no. 135/2010
(known as “the Clean Slate Law”), listing the ineligibility by account rejection, arising
from an unappealable decision of the competent body. In any case, the ineligibility by
account rejection stems from a prior legal fact of account rejection by the appropriate
authorities, and such body may be the Legislative Power in the case of examination of
the accounts of the Head of the Executive or even the Accounting Court itself.
Keywords: Ineligibility by Account Rejection. Accounting Court. Unappealable
Decision.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 77

SUMÁRIO
1 Da Introdução no Ordenamento Jurídico da Inelegibilidade por Rejeição de
Contas. 2 Do Contorno Jurídico Geral em Torno da Inelegibilidade por Rejeição de
Contas. 3 Da Jurisdição Constitucional do Tribunal de Contas. 4 Da Reconstrução
do Significado de “Decisão Irrecorrível”. 5 Conclusão. Referências.

1. DA INTRODUÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO DA


INELEGIBILIDADE POR REJEIÇÃO DE CONTAS
Tomando como ponto de partida o conceito de Lincoln, democracia é o “go-
verno do povo, pelo povo e para o povo”.
E assim seguiu nossa CF/88, ao explicitar em seu art. 1º, parágrafo único, que
“todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos desta Constituição”.
Dessa disposição alhures mencionada, percebe-se que a Lei Maior adotou o
princípio democrático como norma constitucionalmente positivada, enraizando em
seu conteúdo duas dimensões, quais sejam os postulados da democracia represen-
tativa (por meio de representantes) e participativa (ou diretamente). E mais, ao se
ressalvar que o exercício da soberania popular realiza-se nos termos da Constitui-
ção, a norma fundamental acabou por estabelecer o princípio democrático como
princípio de organização.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Isto é, nas palavras de Canotilho (2003, p. 287), “o poder político é consti-
tuído, legitimado e controlado por cidadãos (povo), igualmente legitimados para
participarem no processo de organização da forma de Estado e de governo”.
Tal processo, ligado ao conceito de democracia procedimentalista, pressupos-
to esse fundamental à realização do princípio democrático, tem por condão criar
um “conjunto de regras (primárias ou fundamentais) que estabelecem quem está
autorizado a tomar as decisões coletivas e com quais procedimentos” (BOBBIO,
2002, p. 18)(1).
Tal procedimento, para o exercício da democracia no nosso sistema jurídico,
encontra-se capitulado no art. 14 da Constituição, nos seguintes termos:
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo
voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
I – plebiscito;
II – referendo;
III – iniciativa popular.”

(1) Nesse mesmo sentido, Hans Kelsen (2000, p. 150).


78 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Logo, transladando a teoria democrática para a prática constitucional, o princí-


pio democrático é realizado pelo povo(2) através do sufrágio, entendido este último,
na lição de Paulo Bonavides (2000, p. 16), como “poder que se reconhece a certo
número de pessoas (o corpo de cidadãos) de participar direta ou indiretamente na
soberania”.
Nesse caminhar, o direito público subjetivo ao sufrágio erige-se como pilar do
princípio democrático, mas a conformação do exercício de direitos políticos não se
basta somente com o direito de voto(3). Muito pelo contrário, o próprio art. 14 da
Constituição traz, em seu § 3º, as condições de elegibilidade, a saber:
“§ 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei:
I – a nacionalidade brasileira;
II – o pleno exercício dos direitos políticos;
III – o alistamento eleitoral;
IV – o domicílio eleitoral na circunscrição;
V – a filiação partidária;
VI – a idade mínima de:
a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e
Senador;
b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Dis-
trito Federal;
c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital,
Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz;
d) dezoito anos para Vereador.”
Nesse diapasão, os direitos políticos, que são direitos fundamentais(4), base
do regime democrático, abrangem o direito ao sufrágio e o direito de ser votado(5).
Cumpre destacar, por oportuno, que esses âmbitos de conformação dos di-
reitos políticos têm ligação direta com a liberdade (direito também fundamental,
conforme expressão do art. 5º da CF), estreitamente correlacionada à dignidade da
pessoa humana (fundamento do nosso Estado de Direito, segundo indicação do
art. 1º, III, da CF).
Visão essa compartilhada por Adriano Sant’Ana Pedra (2012, p. 119-120, 134),
verbis: “A liberdade individual prepondera como valor supremo, garantida tão só

(2) Deve ser visto que na doutrina de Friedrich Muller (2003, p. 55-79) a palavra “povo” tem acepções
diversas, sendo que no texto emprega-se o conceito de povo ativo como atribuição de participação política
no Estado.
(3) Apesar de ser esse seu núcleo fundamental.

(4) Na acepção de Robert Alexy (1999, p. 67), os “direitos fundamentais são essencialmente direitos do

homem transformados em direito positivo”.


(5) Tomando em conta essa mesma posição é a orientação de Gilmar Ferreira Mendes (2012, p. 753).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 79

pela ausência de intervenção do Estado nas relações sociais, o que a faz também
ser denominada de liberdade negativa. Os direitos de primeira geração têm como
destinatário o indivíduo individualmente considerado. (...) Os direitos de primeira
geração também se preocupam com a participação na vida pública e, nesse senti-
do, também alcançam os direitos políticos. (...) Embora os direitos e garantias de
liberdade apareçam com uma conotação negativa, visando impedir que os Poderes
Públicos interfiram na vontade individual, o conceito de liberdade, próprio do
constitucionalismo, ainda possui uma dimensão positiva, com a liberdade compre-
endendo também a participação na adoção das decisões da comunidade política”.
Entrementes, o conteúdo da liberdade não somente tem natureza individual.
Como a liberdade decorre do poder de autodeterminação, a mesma se estende sob
um aspecto coletivo (ou positivo) como o direito de o indivíduo tomar parte das de-
cisões coletivas que invariavelmente irão influir na sua própria autodeterminação. É
dessa circunstância que emergem os direitos políticos.
Todavia, é indene de dúvidas que não existem direitos absolutos (nem mesmo
os fundamentais!).
Sobre a restrição de direitos fundamentais, é de se colacionar a lição de Dimitri
Dimoulis e Leonardo Martins (2007, p. 145): “(...) pode-se definir a intervenção na
área de proteção de um direito fundamental como ação ou omissão do Estado que:
a) impossibilite, em parte ou totalmente, um comportamento correspondente a um
direito fundamental (comportamento abrangido pela área de proteção do referido
direito); e b) ligue ao seu exercício uma consequência jurídica negativa mediante
uma proibição acompanhada de sanção”.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Destarte, a intervenção sobre os direitos fundamentais decorre da própria jus-
tificação constitucional, tomando-se em conta a complexa relação entre as normas
constitucionais que outorgam direitos fundamentais, podendo, a toda evidência, a
restrição decorrer da própria Constituição (restrição imediata) ou, por reserva legal
(restrição mediata), ser disciplinada pela legislação infraconstitucional.
Nesse último, caso diz muito bem a professora portuguesa Cristina Queiroz
(2002, p. 204) que “a Constituição autoriza a lei a restringir ela própria o âmbito
de proteção do direito”.
E mais, no magistério de Gilmar Mendes (2012, p. 232), quanto à sistema-
tização, essas restrições, também chamadas restrições constitucionais indiretas,
classificam-se, fundamentalmente, como restrição legal simples ou como restrição
legal qualificada. No primeiro caso, limita-se o constituinte a autorizar a intervenção
legislativa sem fazer qualquer exigência quanto ao conteúdo ou à finalidade da lei;
na segunda hipótese, eventual restrição deve-se fazer tendo em vista a persecução
de determinado objetivo ou o atendimento de determinado requisito expressamente
definido na Constituição. Outrossim, a restrição aos direitos fundamentais deve
encontrar limite dos limites na proteção do núcleo essencial do direito mitigado.
No caso dos direitos políticos, cujas dimensões normativas reconhecidas decorrem
do direito de votar e do direito de ser votado, por justamente serem direitos fun-
damentais (como alhures já visto), os mesmos recebem o influxo da condição de
80 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

cláusulas pétreas, previstas no art. 60, § 4º, IV, da CF, insuscetíveis então de abolição
(mas não de restrição), quer seja pela ação do poder constituinte derivado, quer seja
pela atuação do legislador ordinário.
Decorre, por via de consequência, da própria CF a restrição ao sufrágio,
conforme se deflui do art. 14, § 1º, II, letra c(6), e § 2º, como também mitigação à
elegibilidade(7), pelo estabelecimento de hipóteses de inelegibilidade(8) diretamente
na norma fundamental nos §§ 4º usque 8º do art. 14, e ainda pela delegação dessa
restrição à legislação infraconstitucional (a teor do § 9º do art. 14), sendo, por fim,
restringidas ambas as dimensões dos direitos políticos pela própria suspensão destes
nas hipóteses do art. 15.
Nessa toada, a CF/88 estabelece, no seu art. 14, § 9º, que a “lei complementar
estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de
proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato con-
siderada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições
contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo
ou emprego na administração direta ou indireta”; previu, também, a Carta Magna
reserva legal qualificada de restrição ao direito político fundamental do cidadão ser
votado, pelo estabelecimento de hipóteses de inelegibilidade.
Sendo a norma em questão de eficácia limitada(9), cumpriu à LC nº 64/90 a
conformação da restrição normativa da segunda parte do art. 14, § 9º, da CF, sendo
a primeira parte da norma constitucional preenchida pela alteração introduzida pela
LC nº 135/2010, para se estabelecer, de todo modo, a inelegibilidade por rejeição de
contas no seu art. 1º, I, letra g.

2. DO CONTORNO JURÍDICO GERAL EM TORNO DA INELEGIBILIDADE


POR REJEIÇÃO DE CONTAS
Hodiernamente, então, o art. 1º, I, letra g, da LC nº 64/90, com redação alterada
pela Lei Complementar nº 135/2010, dispõe o seguinte:
“g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções
públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de
improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente,
salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as

(6) A contrario sensu.


(7) Na expressão de Pinto Ferreira (1983, p. 364), a “elegibilidade é a capacidade de ser eleito, a quali-
dade de uma pessoa que é elegível nas condições permitidas pela legislação. A elegibilidade é, na restrita
precisão legal, o direito do cidadão de ser escolhido mediante votação direta ou indireta para represen-
tante do povo ou da comunidade, segundo as condições estabelecidas pela Constituição e pela legislação
eleitoral”.
(8) Na expressão de Pinto Ferreira (1983, p. 348), a “inelegibilidade é um impedimento ao direito do

cidadão de ser eleito para um cargo político. É assim impedimento de ordem pública, que visa sobretudo
à moralização e ao interesse social, amparando consequentemente a dita ordem pública. Daí a importância
que as Constituições ou as legislações eleitorais lhe atribuem por toda a parte e em diversas épocas”.
(9) Conforme restou reconhecido pelo STF quando do julgamento da ADPC 144/08.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 81

eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da


data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição
Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que
houverem agido nessa condição;”
Como bem anotam Adriano e Anderson Sant’Ana Pedra (2010, p. 12), a ine-
legibilidade é “a ausência de capacidade eleitoral passiva, ou seja, a inexistência do
direito de ser votado, constituindo, assim, uma restrição ao status de cidadania ativa”.
A restrição da dimensão do direito político de ser votado, especificamente em
relação à inelegibilidade por rejeição de contas, tem como finalidade subjacente,
consoante discriminação própria do § 9º do art. 14 da Constituição, atender aos
princípios da probidade/moralidade administrativa, eis que atinge exatamente aque-
les “que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas
rejeitadas”.
Sem embargo da sua discussão de superação da teoria clássica das inelegibilida-
des(10), ao que aqui podemos tomar de empréstimo da teoria das inelegibilidades(11),
de Adriano Soares da Costa (2013, p. 175), registra o doutrinador alagoano que a
“inelegibilidade como tal é sempre efeito jurídico, consequência atribuída a algum
fato ou complexo de fatos descritos no suporte fático da norma eleitoral”(12).
Por via de consequência, pode-se dizer que a inelegibilidade será caracterizada
como uma preposição prescritiva cujo imperativo hipotético(13) será o consequente
normativo decorrente de um antecedente normativo prévio. Exatamente por essa

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


razão é que para sua compreensão necessário é se retroceder ao fato jurídico de que
é efeito a inelegibilidade.
Entretanto, deve ser observada a lição de Adriano Soares da Costa (2013, p.
34), que adverte verbo ad verbum que, conquanto haja ampla liberdade do legislador
quanto à prescrição dos efeitos jurídicos, o mesmo não ocorre quanto à descrição do
fato ou complexo de fatos relevantes, os quais serão juridicizados. Deveras, os fatos
descritos no suporte fático da norma são fatos de possível ocorrência no mundo,
cuja importância para o regramento da vida social faz-nos ser adjetivos de jurídicos.

(10) Representada, por exemplo, na doutrina de Antônio Carlos Mendes (1994, p. 109-119), na qual se
faz o recorte metodológico entre elegibilidade e inelegibilidade.
(11) Em que busca o autor fazer a fusão metodológica entre a elegibilidade e a inelegibilidade, para dizer

que esta é o estado jurídico de ausência ou perda daquela (tese de que discordamos, pois na elegibilidade
a própria Constituição estabeleceu apenas condicionantes para o exercício da capacidade eleitoral pas-
siva, ficando também a cargo da legislação infraconstitucional estabelecer em conformidade normativa
os requisitos de registrabilidade, enquanto que na inelegibilidade a Constituição e a sua reserva de lei
qualificada estabeleceram hipóteses de restrição direta dos direitos fundamentais políticos, visando
proteger de todo modo interesses coletivos preponderantes).
(12) E mais, na inteligência de Soares da Costa (2013, p. 179), a inelegibilidade subdivide-se em inata

e cominada, sendo que, “quando o fato jurídico é lícito, estamos diante de uma inelegibilidade inata;
quando se trata de fato jurídico ilícito, de uma inelegibilidade cominada”.
(13) Estrutura da norma jurídica, segundo Norberto Bobbio (2005, p. 169-102).
82 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

No caso da inelegibilidade do art. 1º, I, alínea g, da LC nº 64/90, existe um


plexo de fatos jurídicos que a enseja, a saber: a) rejeição de contas por órgão com-
petente; b) decisão irrecorrível; c) irregularidade insanável passível de caracterizar
ato doloso de improbidade administrativa.
Ocorre que esse conjunto de palavras veiculadas no enunciado normativo em
questão (itens a, b e c elencados acima) é apenas e tão somente a forma linguística
e gramatical de expressão da inelegibilidade por rejeição de contas. Ocorre que não
há correspondência biunívoca entre enunciado e norma, pois a lei afigura-se como
fonte primária do direito e a norma como extração do significado do enunciado
linguístico a partir da reformulação feita pelo intérprete.
Nesse caminhar é o pensamento de Humberto Ávilla (2007, p. 30), o qual diz
que normas não são textos nem o conjunto deles, mas os sentidos construídos a
partir da interpretação sistemática de textos normativos. Daí afirmar-se que os dis-
positivos se constituem no objeto da interpretação; e as normas, no seu. Destarte,
interpretar é decidir o significado de um texto legislativo produzindo a norma, ou
seja, a norma jurídica é produto da atividade interpretativa do intérprete.
Então, para desvelarmos o campo de incidência temporal da inelegibilidade
por rejeição de contas, para fins de atenção deste trabalho, doravante iremos buscar
fazer a reconstrução de significado das expressões (a) rejeição de contas por órgão
competente e (b) decisão irrecorrível.
Todavia, a atividade interpretativa não se pode realizar aleatoriamente (ou
melhor, arbitrariamente).
Deve haver o controle da profusão de sentidos que emerge do subjetivismo
do intérprete.
Para tanto, aqui na reconstrução de significado das expressões (a) rejeição de
contas por órgão competente e (b) decisão irrecorrível, serão tomados como ponto
de partida, no primeiro caso, a contextualização da jurisdição constitucional do
Tribunal de Contas e, no segundo caso, o preenchimento do conteúdo semântico do
conceito jurídico indeterminado de decisão irrecorrível, a par do olhar sistemático
do ordenamento que sistematiza a jurisdição constitucional do Tribunal de Contas,
elegendo-se, dentre aquelas interpretações possíveis, a que mais se compatibiliza
com a finalidade subjacente da causa de inelegibilidade.

3. DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL DO TRIBUNAL DE CONTAS


De partida, cumpre destacar que o art. 2º da CF/88 estabeleceu o princípio da
separação de funções do Estado ao dizer que “são Poderes da União, independentes
e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.
Essa concepção montesquiana de divisão das funções estatais, pelo desenvol-
vimento de um sistema de freios e contrapesos na própria Constituição, acabou
por viabilizar a existência de mecanismos recíprocos de controle entre os poderes
constituídos, tanto político com “base na necessidade de equilíbrio entre os Poderes
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 83

estruturais da República”(14) como administrativo, entendido este último como o


“poder de fiscalização e revisão da atividade administrativa” (CARVALHO FILHO,
2010, p. 1.019-120).
Entrementes, no caso do controle administrativo, pode ser este interno (realiza-
do no âmbito do próprio órgão estatal) ou externo (realizado por órgão fiscalizador
diverso do fiscalizado).
De toda forma, o controle externo da atividade financeira de todos os órgãos
estatais foi prestigiado pela nossa Constituição Cidadã como princípio estruturante
de funcionamento do Estado(15) ao indicar diretamente, em seu art. 70, tal controle
do âmbito da União, no seu art. 31 a fiscalização no âmbito dos Municípios e ao
relegar ao seu art. 25 o poder de auto-organização dos Estados em suas respectivas
Constituições internas, com respeito aos princípios constitucionais sensíveis(16), nos
quais se incluiu o controle externo da atividade administrativa.
E, para essas ocorrências, o controle externo dos órgãos estatais é feito pelo
Legislativo com o auxílio do Tribunal de Contas, quer seja no âmbito da União,
conforme previsão direta no art. 71 da Constituição, quer seja no âmbito dos Estados
ou Municípios, pela verticalização de aplicação do art. 75 da norma fundamental.
Malgrado a Constituição tenha dito que o Tribunal de Contas presta função auxiliar
ao Legislativo no controle externo da atividade administrativa dos demais órgãos
estatais (no exercício de atividade tipicamente de jurisdição administrativa(17)), sob
esse prisma a expressão da Constituição deve ser interpretada com temperamento
para se concluir que essa função auxiliar é dotada de autonomia.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Nessa trilha é o magistério de Pedro Roberto Decomain (2006, p. 43), para
quem o TCU, embora atue em auxílio do Congresso Nacional, não lhe está de modo
algum subordinado. O Tribunal é órgão autônomo de estatura constitucional, com
incumbências próprias, no exercício das quais não está jungido à vontade de qual-
quer outro órgão. O próprio art. 71 da CF, que traz o rol de competências do TCU
(cujas diretrizes de atuação devem se repetir nos Tribunais de Contas dos Estados
e Municípios(18), pela verticalização constitucional(19)), somente nos seus incisos
I, IV e VII, é que elenca hipóteses em que se mostra correto, do ponto de vista
estritamente funcional, caracterizar o Tribunal de Contas como auxiliar do Poder
Legislativo. Em outros casos, como nas hipóteses dos incisos II, V, VI e VIII do art.

(14) Como, por exemplo, nos arts. 52, incisos I e II, e 103, inciso I, letra c, da Constituição.
(15) Nesse sentido também Pedro Roberto Decomain (2006, p. 37).
(16) Na lição de José Afonso da Silva (1990, p. 515), os princípios constitucionais sensíveis são aqueles

“que dizem respeito basicamente à organização dos poderes governamentais do Estado”, incluindo o
autor precisamente o controle administrativo externo dentre os princípios orgânicos estruturantes do
Estado.
(17) Não legislativa. Não jurisdicional. Mas, sim, tipicamente administrativa, voltada à atividade de con-

trole, no registro de Pedro Roberto Decomain (2006, p. 153-168).


(18) E dos Municípios quando existentes.

(19) Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Direta de Inconstitucio-

nalidade 3.307.
84 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

71 da Constituição, o Tribunal de Contas, no exercício de sua autonomia, fiscaliza


e julga diretamente as contas de todos aqueles responsáveis pela gestão de dinheiro
público, aplicando-lhes, em caso de rejeição de contas, as sanções previstas em lei,
sendo que tal decisão é título executivo extrajudicial, a teor do § 3º do art. 71 da CF.
É exatamente em torno desse prisma da jurisdição constitucional (adminis-
trativa) do Tribunal de Contas que deve ser compreendida a expressão rejeição de
contas por órgão competente contida no art. 1º, I, letra g, da LC nº 64/90. Isso porque,
propositalmente, a norma em questão, em sua parte final, indicou que aplica-se
“o disposto no inciso II do art. 71 da CF, a todos os ordenadores de despesa, sem
exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”.
Logo, na identificação do órgão competente para exercício do controle ad-
ministrativo externo dos demais órgãos-funções do Estado, necessário é se fazer o
discrime entre o alcance da jurisdição constitucional contida nos incisos I e II do
art. 71 da Constituição, desbocando neste último todas as funções de fiscalização,
e julgamento e autorização de imposição de penalidade(20).
No caso do inciso I, ficará a cargo do Tribunal de Contas “apreciar as contas
prestadas anualmente pelo Presidente da República”, sendo o órgão competente
para seu julgamento o Poder Legislativo (no caso, o Congresso Nacional), a teor do
art. 49, IX, da norma fundamental, sistemática essa que se repete obrigatoriamente
nos âmbitos dos Estados (regulado simetricamente em suas Constituições internas
pelo art. 25 da Constituição) e dos Municípios (segundo a previsão no art. 31, § 1º,
da Constituição).
Nesse caso, o Tribunal de Contas oferece apoio técnico-jurídico ao exercício
da função atípica do Legislativo de julgar as contas do Executivo.
Seguindo a mesma linha de entendimento, preconiza Marino Pazzaglini Filho
(2014, p. 36) que o órgão competente para julgar as contas prestadas pelos Chefes
do Poder Executivo (Presidente da República, Governadores, Prefeitos Municipais)
é o Poder Legislativo, a quem incumbe exercer, com o auxílio meramente técnico-
jurídico do Tribunal de Contas, o controle externo pertinente à fiscalização contábil,
financeira, orçamentária, operacional e patrimonial das pessoas estatais e entidades
administrativas. O Tribunal de Contas limita-se a exarar parecer, não emitindo jul-
gamento. A problemática de cotejamento das competências do Tribunal de Contas
contidas nos incisos I e II do art. 71 da Constituição decorre da expressão contida
na parte final do art. 1º, I, alínea g, da LC nº 64/90, que predetermina que afigurará
o Tribunal de Contas como órgão competente para rejeição de contas do mandatário
que tiver agido como ordenador de despesa(21).

(20) Competências previstas nos incisos V, VI e VIII do art. 71 da Constituição, ao cabo que tanto no
caso de realização de auditoria/inspeção como no de fiscalização de transferências voluntárias mediante
a pactuação de ajustes administrativos em geral a imposição de penalidade, diante da constatação de
irregularidade administrativa, dar-se-á na forma da jurisdição do inciso II da norma em questão.
(21) Em nossa Lei Eleitoral Comentada (2012, p. 125) fizemos a diferenciação entre contas de gestão e

contas de governo.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 85

Calha dizer que mandatário será, na expressão de Paulo Bonavides (2000, p.


311), todo aquele que exercer mandato representativo outorgado através de sufrágio
na forma do art. 14 da Constituição. Transportando essa compreensão para o Po-
der Executivo, ex vi dos arts. 28, 29, I, e 76, todos da CF, serão mandatários para a
exegese do art. 71, I, da Lei Fundamental o Presidente da República, o Governador
e o Prefeito Municipal. A todos esses mandatários subsiste o dever de prestação de
contas anual, conforme disciplinamento do art. 82 da Lei nº 4.320/64(22). Se não
leiamos seu conteúdo:
“Art. 82. O Poder Executivo, anualmente, prestará contas ao Poder Le-
gislativo, no prazo estabelecido nas Constituições ou nas Leis Orgânicas dos
Municípios.
§ 1º As contas do Poder Executivo serão submetidas ao Poder Legislativo,
com Parecer prévio do Tribunal de Contas ou órgão equivalente.
§ 2º Quando, no Município não houver Tribunal de Contas ou órgão
equivalente, a Câmara de Vereadores poderá designar peritos contadores para
verificarem as contas do prefeito e sôbre elas emitirem parecer.”
Os critérios de apreciação das contas anuais do Chefe do Executivo pelo Tri-
bunal de Contas, pelos ditames do art. 70 da Constituição, melhor explicitados no
art. 81 da Lei nº 4.320/64, serão voltados, precipuamente, ao controle da receita e
despesa pública. Nos comentários de Pedro Roberto Decomain (2006, p. 75), “não
se cuida, pois, de verificar apenas o cumprimento da lei orçamentária. Cabe ao Le-
gislativo também verificar se o gasto público obedeceu à legalidade, ou seja, se foi

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


realizado dentro dos parâmetros ditados pelas normas que lhe sejam pertinentes”.
Por via de consequência, a competência do Tribunal de Contas alcunhada no
inciso I do art. 71 da Carta Magna, para emissão de parecer prévio, relaciona-se à
apreciação das contas do Chefe do Executivo revestido na condição de executor do
orçamento(23).
Por isso é que a inelegibilidade por rejeição de contas, com a alteração de sua
redação ditada pela LC nº 135/2010, expressou em sua parte final que ingressará
no âmbito da competência do inciso II do art. 71 da CF o Chefe do Executivo que
atuar na condição de ordenador de despesa.
A partir dessa nova extensão do art. 1º, I, letra g, da Lei de Inelegibilidades,
foi que vozes da doutrina eleitoral, como a de José Jairo Gomes (2010, p. 171), pas-
saram a defender que, especificamente, como ordinariamente o Prefeito Municipal
no exercício da gestão do Município atua concomitantemente como executor do
orçamento e ordenador de despesa, nessa última função, está submetido à jurisdi-

(22) InstituiNormas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços
da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.
(23) Na lição de Lafayete Josué Petter (2011, p. 44), orçamento é o “instrumento de que dispõe o Poder

Público (em qualquer de suas esferas de poder) para expressar, em determinado período de tempo, o seu
programa de atuação, discriminando a origem e o montante dos recursos a serem obtidos, bem como os
dispêndios a serem efetuados”.
86 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

ção constitucional do art. 71, II, da CF, ainda que quando da apresentação de suas
contas de gestão anual, para emissão prévia pela Corte de Contas na forma do art.
71, I, da Lei Fundamental. Na síntese de Adriano Soares da Costa (2013, p. 211),
“o Prefeito Municipal se submete a duplo julgamento. Um político, perante o Parla-
mento, precedido de parecer prévio e outro técnico, a cargo do Tribunal de Contas”.
Todavia, a tese não emplacou no âmbito da jurisprudência do TSE(24).
Ao nosso sentir, com razão a Corte Eleitoral, pois a jurisdição constitucional do
Tribunal de Contas disposta no art. 71, I, da Constituição, malgrado afeta ao controle
externo administrativo da conformidade (leia-se, constitucionalidade/legalidade) dos
atos de gestão do Chefe do Executivo, o parecer prévio emitido quando da análise
das contas anuais somente é de caráter auxiliar ao Legislativo(25), órgão dentro da
estrutura constitucional responsável pelo julgamento das contas do Poder Executivo.
Tanto é que seu julgamento pelo Legislativo não é vinculativo(26)-(27), sendo a
decisão do Legislativo sobre as contas anuais do Chefe do Executivo de natureza
jurídica político-administrativa (inteligência de José Nilo de Castro, 2009, p. 33),
garantindo-se, de todo modo, o exercício do contraditório e amplitude de defesa
pelo interessado (princípios finalísticos do inciso LV do art. 5º da CF)(28). Ademais,
sobre a assertiva, deve ser visto que a desconcentração de poder, pela repartição de
competências administrativas internas no âmbito dos órgãos públicos, decorre do
poder hierárquico conferido ao Chefe do Poder Executivo, estabelecendo entre esse
e a autoridade delegada relação de coordenação e subordinação, com a finalidade
subjacente de otimização da prestação do serviço público(29).
No âmbito da União, pela parte orgânica da Constituição, é certo que o Pre-
sidente da República atua administrativamente auxiliado por Ministros de Estado
(art. 84, I), sendo que as competências destes, pela autorização do art. 88, são
regramentadas pela Lei nº 7.739/89, que em seu art. 9º outorga a responsabilidade
por ordenação de despesa a esses últimos.
Segue, em linha de simetria constitucional do art. 25 da norma fundamental,
pela atenção dos princípios constitucionais sensíveis, o disciplinamento dessa mesma
desconcentração de poder no âmbito dos Estados, sendo delegados aos Secretários
de Estado a incumbência da responsabilidade por ordenação de despesa.

(24) Como quando do julgamento do Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral 15.085, Acórdão
de 21.02.2013, Rel. Min. José Antônio Dias Toffoli, Publicação: DJe data 01.04.2013.
(25) De natureza jurídica de ato administrativo, conforme indicamos em artigo: <http://jus.com.br/

artigos/33210/da-possibilidade-juridica-de-revisao-de-acordao-condenatorio-de-tribunal-de-contas>.
(26) STF, ADI 614 MC, Rel. Min. Ilmar Galvão, TP, j. em 14.10.92, DJ 18.05.2001 PP-00062 Ement Vol-

02030-01 PP-00056.
(27) Submetido a quorum qualificado para sua rejeição nos Municípios, a teor do art. 31, § 2º, da Consti-

tuição.
(28) STF, AC 2.085 MC, Rel. Min. Menezes Direito, Primeira Turma, j. 21.10.08, DJe-241 Divulg 18.12.08

Public 19.12.08 Ement VOL-02346-01 PP-00032 RT v. 98, n. 882, 2009, p. 106-108.


(29) Inteligência de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, 2011, p. 420.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 87

Da mesma forma, pela permissão do art. 29 da Constituição, devendo a Lei


Orgânica Municipal seguir os mesmos princípios da Constituição Federal e da Cons-
tituição do respectivo Estado em que o Município pertença, possibilidade jurídica
existe da delegação de poder de ordenação de despesas aos Secretários Municipais,
que atuam em auxílio ao Prefeito. Ocorre que a práxis indica, mormente pela dimi-
nuta estrutura administrativa da maioria esmagadora dos Municípios brasileiros, que
ordinariamente as leis orgânicas não atribuem a função de ordenador de despesa a
Secretários Municipais, se centralizando a função nas mãos do Prefeito Municipal(30).
Em todos os casos, ordenador de despesa será, na forma do art. 64 da Lei nº
4.320/64, a autoridade administrativa que, no arcabouço das regras de competência
interna da atuação do órgão público, seja responsável pela determinação do paga-
mento da despesa pública.
Em relação aos Ministros de Estado, Secretários de Governo ou Secretários
Municipais, não existe obrigação constitucional ou infraconstitucional que os deter-
mine a apresentação de contas anual. Muito pelo contrário, a compreensão do art.
71, I, da Constituição, melhor qualificada no art. 82 da Lei nº 4.320/64, somente se
entende aos Chefes do Executivo.
Por tal razão é desproporcional a pretensão de atribuir tratamento desigual ao
Prefeito Municipal quando de sua prestação de contas anual, submetendo o mesmo à
dupla jurisdição, quer seja do Tribunal de Contas, quer seja da Câmara Municipal(31).
Então, se na prestação de contas anual do Chefe do Executivo (de todos os entes

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


políticos) será competente para sua rejeição o Poder Legislativo, somente a partir
do julgamento por este (a partir do procedimento indicado em sua Constituição ou
lei orgânica e regimento interno(32)) é que incidirá a inelegibilidade tratada, pouco
importando a data de emissão de parecer prévio por rejeição (ou não) de contas
pelo Tribunal de Contas(33).
De mais a mais, atuando o Prefeito (ou mesmo o Presidente ou Governador
de Estado) como ordenador de despesa orçamentária, poderá este estar submetido
à jurisdição constitucional do Tribunal de Contas disposta no inciso IV do art. 71
da Constituição, regulamentada pela Lei nº 8.443/92 (em seu art. 38, inciso I), caso
em que o controle administrativo externo será realizado por meio de inspeção ou
auditoria sobre ato (ou atos) administrativo específico(34).

(30) Observação essa também feita por Adriano Soares da Costa (2013, p. 211).
(31) Entendimento esse passível de fraude pela singela alteração na Lei Orgânica, sob a provocação do
próprio Prefeito interessado.
(32) Doutrina de José Nilo de Castro (2000, p. 26-37).

(33) Assim se pronuncia de maneira torrencial o TSE: Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral

19.051, Acórdão de 14.02.2013, Rel. Min. José Antonio Dias Toffoli, Publicação: DJe data 25.03.2013.
(34) Identificada irregularidade que resulte prejuízo ao erário, na forma do art. 47 da Lei Orgânica do

Tribunal de Contas, é instaurada Tomada de Contas Especial.


88 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

E mais, quando do recebimento de transferência voluntária(35) através do ajuste(36)


administrativo pactuado por convênio(37) ou consórcio(38) entre entes públicos, o Pre-
feito (ou mesmo o Governador do Estado(39)) também estará submetido à jurisdição
constitucional direta do Tribunal de Contas, a teor do art. 71, VI, da Constituição.
No mais, na esteira do art. 71, II, da Lei das leis, competirá ao Tribunal de
Contas:
“II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por
dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas
as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e
as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade
de que resulte prejuízo ao erário público;”
Ao compasso de que em todos estes últimos casos a competência de rejeição
de contas diretamente pelo Tribunal de Contas atenderá ao procedimento regulado
pela Lei nº 8.443/92(40), que indica em seu art. 8º a Tomada de Contas Especial como
instrumento próprio para esse desiderato (apuração, julgamento e eventual aplicação
de penalidade), tudo sob o influxo das garantias do contraditório e da amplitude de
meios ao exercício da ampla defesa (esculpidos no art. 5º, LV, da CF)(41).
Justamente quando a rejeição de contas decorre diretamente da jurisdição consti-
tucional do Tribunal de Contas(42) é que emerge dificuldade na compreensão do marco
inaugural do cômputo da inelegibilidade, vez que a Lei Orgânica do Tribunal de Contas,
afora disciplinar nos incisos do seu art. 32 mecanismos processuais de prolongamento
da relação jurídica processual administrativa pela possibilidade de interposição suces-
siva de recursos(43), não estabelece contorno normativo preciso em torno do conceito

(35) Autorizada pelo olhar sistemático do art. 23 da Constituição, que prevê o compartilhamento entre
os entes políticos do Estado Federal das competências executivas relacionadas à promoção do interesse
público primário, escriturados como receita pública decorrente de transferência corrente na forma do
art. 6º, § 1º, da Lei nº 4.320/64.
(36) Nas palavras de Diógenes Gasparini (2008, p. 787), “os convênios e os consórcios não integram a

Administração Pública indireta por serem ajustes, e neles a Administração tem interesse na medida em
que por eles são prestados serviços de interesse público”.
(37) Previsto sua figura nos arts. 71, inciso VI, e 199, § 1º, da Constituição, e ainda art. 116 da Lei nº 8.666/93.

(38) Autorizada sua pactuação pelo art. 241 da Constituição, norma essa regulamentada pela Lei nº

11.107/05.
(39) Assim também registra Pedro Roberto Decomain (2006, p. 215).

(40) Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União.

(41) STF, MS 30.586, Relª Minª Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 04.11.2014, Processo Eletrônico

DJe-224 Divulg 13.11.2014 Public 14.11.2014.


(42) Cuja natureza jurídica da decisão da Corte de Contas é de ato administrativo, na locução de Adriano

Soares da Costa (2013, p. 211).


(43) Cumpre dizer que, na conjugação dos arts. 23, inciso III, e 24 da Lei nº 8.443/92, deflui-se que a

decisão do Tribunal de Contas que no julgamento das contas imputa multa e/ou débito é formalizada
por meio de acórdão, sendo legítima a prescrição de sistema recursal no curso da jurisdição do Tribunal
de Contas, pois, nas palavras de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes (2009, p. 443), “as Cortes de Contas
devem encontrar no próprio desenvolvimento de atividades um modo de expurgar do julgamento o erro,
criando a possibilidade de reapreciação dos fatos, apontando os desacertos da decisão”.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 89

de decisão irrecorrível, acabando por colocar em zona cinzenta sua compreensão para
fins de eleição do marco inicial da inelegibilidade por rejeição de contas.

4. DA RECONSTRUÇÃO DO SIGNIFICADO DE “DECISÃO IRRECORRÍVEL”


Retomando-se a exegese do art. 1º, I, letra g, da LC nº 64/90, vimos que na
compreensão do conceito de rejeição de contas por órgão competente, no caso da pres-
tação de contas anual pelos Chefes dos Poderes Executivos (Presidente, Governador e
Prefeito), o órgão competente para o exercício do controle administrativo externo é o
Poder Legislativo (Congresso Nacional, Assembleia Legislativa e Câmara Municipal).
Nesse caso, como dito alhures, nada obstante o Legislativo atue atipicamente
na função de julgador, a natureza jurídica de sua atividade é tipicamente político-
administrativa, formalizada através da publicação de decreto legislativo(44) que verse
sobre a rejeição de contas. Destarte, publicado o decreto legislativo de rejeição das
contas do Executivo pelo Legislativo, passa a correr o prazo da inelegibilidade,
lastreada na função auxiliar do Órgão de Contas prevista no art. 71, I, da CF(45).
Por ser o decreto legislativo decisão colegiada tomada pelo corpo de integrantes
do Poder Legislativo, inexiste no procedimento de seu julgamento (disciplinado
pelos respectivos regimentos internos dos Poderes Legislativos de todas as esferas
de poder), segundo a exigência do princípio da taxatividade recursal(46), a hipótese
de revisão (ou reanálise) da decisão de rejeição de contas pelo próprio Legislativo a
partir da provocação do Chefe do Executivo através de recurso próprio(47).
De outra forma, a celeuma se instaura a partir da competência outorgada ao
TCU pelo art. 71, II, da CF, justamente pela previsão de sistemática recursal no

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


âmbito de realização de sua jurisdição constitucional e, mormente, pela falta de
explicitação normativa do conceito de decisão irrecorrível contida na inelegibilidade
do art. 1º, I, letra g, da LC nº 64/90.
Para então reconstrução de seu significado, necessário é relembrar que a ine-
legibilidade por rejeição de contas, como espécie de inelegibilidade cominada(48),

(44) Não como instrumento normativo do art. 59, inciso VI, da Constituição, mas como forma de exte-
riorização do ato político-administrativo emanado pelo Legislativo. Em doutrina, Diógenes Gasparini
(2008, p. 90) registra que “pelo decreto são instrumentalizados atos concretos”.
(45) Assim já decidiu o Tribunal Regional Eleitoral de Goiás: TREGO, Recurso de Diplomação 36.440,

Acórdão 14.239, de 31.03.2014, Rel. Marcelo Arantes de Melo Borges, Publicação: DJ – Diário de justiça,
Tomo 060, Data 03.04.2014, p. 4/5.
(46) Princípio segundo o qual a existência dos recursos se subordina à expressa previsão legal (ASSIS,

2007, p. 78).
(47) Malgrado ser possível, em atenção aos princípios constitucionais do art. 37 da Lei Fundamental,

no controle da legalidade de seus próprios atos, o exercício do poder de autotutela (bem delineado na
Súmula nº 473 do STF), para modificação da decisão de rejeição de contas pelo Poder Legislativo, ainda
que de ofício. Nessa esteira se pronunciou o TRE do Estado de Pernambuco: Recurso Eleitoral 3.218,
Acórdão de 23.08.2012, Rel. Virgínio Marques Carneiro Leão, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão,
Data 23.08.2012.
(48) Na lição de Adriano Soares da Costa (2013, p. 183), “a inelegibilidade cominada é sempre efeito

de um fato jurídico ilícito, decretada por decisão judicial de eficácia preponderantemente constitutiva
negativa”.
90 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

decorre do fato jurídico prévio da rejeição de contas por órgão competente em


decisão irrecorrível.
Assim é a observação de Adriano e Anderson Sant’Ana Pedra (2010, p. 15) para
os quais, de partida, pode-se afirmar que a inelegibilidade prevista no dispositivo
transladado é efeito anexado à decisão irrecorrível de natureza não judicial, cujo
conteúdo rejeita contas prestadas por quem exerceu função pública, contaminadas
que estavam por irregularidade insanável.
Se então a inelegibilidade constitui-se como efeito anexo(49) à decisão de rejeição
de contas(50) (aqui, no objeto de investigação, pelo Tribunal de Contas), prolatada
esta por meio de procedimento próprio(51) para expedição final de acórdão (ex vi do
art. 23 da Lei nº 8.443/92), poderia se cogitar que é partir desse fato jurídico que
incide o efeito da inelegibilidade.
Outrossim, para certeza dessa afirmação, adequado é se perpassar pela própria
sistemática recursal interna do Tribunal de Contas.
Colhe-se, por via de consequência, a redação dos arts. 32 a 35 da Lei nº 8.443/92:
“Art. 32. De decisão proferida em processo de tomada ou prestação de
contas cabem recursos de:
I – reconsideração;
II – embargos de declaração;
III – revisão.
Parágrafo único. Não se conhecerá de recurso interposto fora do prazo,
salvo em razão da superveniência de fatos novos na forma prevista no Regi-
mento Interno.
Art. 33. O recurso de reconsideração, que terá efeito suspensivo, será
apreciado por quem houver proferido a decisão recorrida, na forma estabele-
cida no Regimento Interno, e poderá ser formulado por escrito uma só vez,
pelo responsável ou interessado, ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal,
dentro do prazo de quinze dias, contados na forma prevista no art. 30 desta Lei.
Art. 34. Cabem embargos de declaração para corrigir obscuridade, omissão
ou contradição da decisão recorrida.
§ 1º Os embargos de declaração podem ser opostos por escrito pelo res-
ponsável ou interessado, ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro
do prazo de dez dias, contados na forma prevista no art. 30 desta Lei.

(49) Sobreos efeitos anexos da sentença, que na necessidade de completude do ordenamento jurídico
pode se estender para aqui na jurisdição constitucional do Tribunal de Contas, Rafael Calmon Rangel
(2014, p. 148) indica que são “consequências previstas unicamente em lei, que decorrem da prolatação
de sentença como verdadeiros reflexos automáticos, simplesmente por existir como ato estatal, dos quais
ela opera como elemento de suporte fático”.
(50) Exatamente este é o pensamento de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes (2009, p. 490).

(51) Da Tomada de Contas Especial.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 91

§ 2º Os embargos de declaração suspendem os prazos para cumprimento


da decisão embargada e para interposição dos recursos previstos nos incisos
I e III do art. 32 desta Lei.
Art. 35. De decisão definitiva caberá recurso de revisão ao Plenário, sem
efeito suspensivo, interposto por escrito, uma só vez, pelo responsável, seus
sucessores, ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de
cinco anos, contados na forma prevista no inciso III do art. 30 desta Lei, e
fundar-se-á:
I – em erro de cálculo nas contas;
II – em falsidade ou insuficiência de documentos em que se tenha fun-
damentado a decisão recorrida;
III – na superveniência de documentos novos com eficácia sobre a prova
produzida.
Parágrafo único. A decisão que der provimento a recurso de revisão en-
sejará a correção de todo e qualquer erro ou engano apurado.”
Pela leitura dos dispositivos supramencionados, percebe-se que no âmbito da
jurisdição do Tribunal de Contas o recurso de reconsideração possui efeito suspensivo,
enquanto que o recurso de revisão não o possui.
Calha dizer que, em conformidade com o magistério de Flávio Cheim Jorge
(2006, p. 290), “não é o recurso que cria o estado de ineficácia da decisão. Este

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já advém da própria lei, mesmo antes da interposição do recurso apontado como
correto. Prolonga-se, assim, uma situação que já existia”.
Logo, o efeito suspensivo impede a produção dos efeitos próprios do provi-
mento.
Nessa trilha, é válido citar o magistério de Araken de Assis (2007, p. 234), o
qual diz que, segundo certa opinião, a suspensão respeita à recorribilidade do pro-
vimento, jamais decorrendo da interposição, em si, do recurso porventura cabível.
Não é a partir da interposição que os efeitos ficam inibidos, como se produzissem até
esse momento. Na verdade, a simples previsão legal do recurso dotado desse efeito
já inibe a eficácia do ato decisório, antes mesmo da efetiva interposição, que tão só
prolonga semelhante ineficácia, que cessaria se não interpusesse o recurso. Também
se afirma que não há efeito suspensivo, mas ineficácia originária do provimento.
A par dessas premissas, não se pode dizer que é a partir da decisão que rejeita
as contas que incide o efeito anexo da inelegibilidade, porque tal decisão, frente à
possibilidade de interposição de recurso de reconsideração, não é dotada de eficácia
imediata.
Destarte, a melhor exegese que se faz da norma (art. 1º, inciso I, letra g, da Lei
de Inelegibilidades) é para reconhecer que decisão irrecorrível é aquela que possa
92 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

produzir efeitos jurídicos imediatos(52), sendo a atribuição de efeito suspensivo a


recurso que lhe possa desafiar a tônica central para tal auferimento(53)-(54).
Nesse mesmo sentido salienta Jorge Ulisses Jacoby Fernandes (2009, p. 493),
que diz que um dos atributos da decisão irrecorrível é a sua efetividade, possibilidade
de operar efeitos concretos no mundo jurídico.
Em relação aos embargos de declaração, na avaliação dessa compreensão, deve
ser dito que mesmo que o § 2º do art. 34 da Lei Orgânica do Tribunal de Contas
indique a existência de efeito suspensivo quando a sua oposição, a análise dos efeitos
do dito recurso deve ser melhor feita à luz da redação da norma e do ordenamento
jurídico, servindo-se, para tanto, da técnica de interpretação teleológica e sistemática.
Por conseguinte, mesmo que o § 2º do art. 34 da Lei nº 8.443/92 diga que o
recurso é recebido no efeito suspensivo, a aferição da tal característica não deve ser
feita em relação aos embargos, mas, sim, quanto ao recurso previsto em lei próprio
para atacar a decisão embargada.
Tanto é que o próprio § 2º do art. 34 da Lei nº 8.443/92 apregoa que há sus-
pensão do prazo para o recurso de revisão e reconsideração, dando a entender que
o mesmo é oponível tanto contra o acórdão que julga a prestação de contas como
contra o acórdão que julga o recurso de revisão e o recurso de reconsideração.
Acompanhando, então, a sistemática legal, somente são dotados de efeito
suspensivo (no sentido de impedir a eficácia imediata da decisão embargada) os
embargos de declaração opostos contra o acórdão que julga as contas, pois o recurso
próprio a desafiar o decisum é o recurso de reconsideração, dotado, invariavelmente,
de efeito suspensivo(55).
Por fim, pela necessidade de sua remissão, para fechar o tempo de duração da
inelegibilidade por rejeição de contas, no que tange ao seu termo final, o art. 1º, I,
letra g, da LC nº 64/90 diz em sua parte final que a inelegibilidade se estende “para
as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data
da decisão”.

(52) De mais a mais, por argumentação, o conceito de coisa julgada administrativa elencado por Diógenis
Gasparini (2008, p. 540) como “quando inexiste, no âmbito administrativo, possibilidade de reforma
da decisão”, deve, na observação de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes (2009, p. 466-467), ser visto com
reservas, já que pelo poder de autotutela, em atenção ao princípio da legalidade esculpido no art. 37
da Constituição, bem como pela possibilidade de revisão da decisão do Tribunal de Contas pelo Poder
Judiciário ante a cláusula de inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição), pos-
sível é a modificação da decisão do Tribunal de Contas, ainda que exauridos os recursos cabíveis no seu
trâmite administrativo.
(53) Seguindo em linha simétrica essa posição a jurisprudência do colendo Tribunal Superior Eleitoral:

Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral 10.402, Acórdão de 08.11.2012, Relª Minª Fátima
Nancy Andrighi, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 08.11.2012.
(54) Em sentido oposto, José Jairo Gomes (2010, p. 170) defende que decisão irrecorrível é a “decisão

final, irretratável, da qual não caiba mais recurso visando sua modificação”.
(55) É exatamente essa a orientação estratificada e torrencial do TSE: Recurso Especial Eleitoral 1.108.395,

Acórdão de 20.10.2011, Rel. Min. Arnaldo Versiani Leite Soares, Publicação: DJE – Tomo 209, Data
04.11.2011, p. 21.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 93

Sendo o início do cômputo da inelegibilidade feito a partir da decisão dotada


de aptidão para produzir efeitos jurídicos imediatos, a partir da mesma é que se
começa a fluir o prazo da inelegibilidade de oito anos, contado na forma do art.
132 do Código Civil(56).

5. CONCLUSÃO
Os direitos políticos afiguram-se, na estrutura dogmática da Constituição,
como princípios de organização do poder soberano do povo, sendo o âmbito de
conformação normativa de seu conteúdo realizado pelo direito de votar (capacidade
eleitoral ativa) e de ser votado (capacidade eleitoral passiva), previstos no art. 14
da Lei Maior.
Entrementes, embutido pela defesa subjacente dos princípios da probidade e
moralidade administrativa, bem como da normalidade e legitimidade do pleito, foi
que a própria Constituição, em seu art. 14, § 9º, outorgou cláusula de reserva legal
para restrição da capacidade eleitoral passiva, pela criação pelo legislador infracons-
titucional de hipóteses de inelegibilidade.
Foi assim que sobreveio a LC nº 64/90, sofrendo suas disposições ulteriores
modificações pela LC nº 135/2010 (denominada Lei da Ficha Limpa), estando lá
elencada a inelegibilidade por rejeição de contas, decorrente de decisão irrecorrível
por órgão competente. Na trilha da inevitável trajetória entre o direito como fonte
e a norma como produto da atividade interpretativa, foi que para a reconstrução
do significado de decisão irrecorrível foi percorrida a jurisdição constitucional do

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Tribunal de Contas estabelecida na Constituição, como também a Lei Orgânica que
o regulamenta.
A toda evidência, a inelegibilidade por rejeição de contas, capitulada no art.
1º, I, letra g, da LC nº 64/90, decorre do fato jurídico prévio da rejeição de contas
por órgão competente, podendo este ser o Poder Legislativo no caso do exame das
contas do Chefe do Executivo (a par da sistemática de função de auxílio do órgão
de Contas no art. 71, I, da CF), ou mesmo o próprio Tribunal de Contas, no caso
da realização da jurisdição constitucional do art. 71, II, da norma fundamental.
Exatamente nesta última hipótese é que se estabeleceu a celeuma em torno
do preenchimento do conteúdo semântico da expressão decisão irrecorrível. Isso
porque a Lei nº 8.443/92 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas), que define seu pro-
cedimento, é silente a respeito, de modo que para exatidão da identificação do seu
conceito foram feitos a filtragem constitucional sobre seu dispositivo e um olhar
sistemático em torno de seu arcabouço recursal, para concluir que decisão irrecorrível
é aquela que tem aptidão para produzir efeitos imediatos, independentemente do
exaurimento (ou não) da via recursal interna no âmbito do Tribunal de Contas. De
toda a forma, a inelegibilidade tratada é efeito anexo à decisão de rejeição de contas

(56) Assim
deliberou o TSE: Recurso Especial Eleitoral 5.163, Acórdão de 21.03.2013, Rel. Min. Marco
Aurélio Mendes de Farias Mello, Publicação: DJE – Tomo 099, Data 28.05.2013, p. 37.
94 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

por órgão competente. Isso quer dizer que não é a Justiça Eleitoral, nesse caso, o
órgão competente para a constituição da inelegibilidade.
Por isso é que compete à Justiça Eleitoral, na fase do processo eleitoral em
sentido amplo(57), quando do registro de candidaturas, consoante discriminação
do art. 10 da Lei nº 9.504/97, fazer essa aferição, sendo o conteúdo de sua decisão
eminentemente declaratório(58).
De mais a mais, a mera rejeição de contas não constitui, por si só, a hipótese
de inelegibilidade contida no art. 1º, I, letra g, da LC nº 64/90, cumprindo à Justiça
Eleitoral, quando do registro de candidatura, identificar todos seus requisitos cumu-
lativos(59) a partir da própria decisão de rejeição de contas, definindo, de todo modo,
também o espaço de tempo da não realização da capacidade eleitoral passiva, sendo
a fixação da restrição do direito fundamental (direitos políticos), de modo temporá-
rio, o ponto de harmonização proporcional do limite do limite para sua mitigação.

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(57) Sobre as fases do processo eleitoral em sentido latu, indicamos (2013, p. 42-43) que a mesmas se
iniciam com o alistamento eleitoral, finalizando-se com a diplomação dos eleitos, perpassando, ao pró-
ximo início de tudo, ao registro de candidatos.
(58) Nesse sentido é a doutrina de Adriano Soares da Costa (2013, p. 212) e de José Jairo Gomes (2010,

p. 246).
(59) Na lição de Marino Pazzaglini Filho (2014, p. 37), são requisitos cumulativos da inelegibilidade por

rejeição de contas: “1. Rejeição de contas por irregularidade que constitua vício insanável; 2. Vício insa-
nável que configura ato doloso de improbidade administrativa; 3. Irrecorribilidade da decisão proferida
pelo órgão competente; e 4. Inexistência de provimento que anule ou suspenda a inelegibilidade”.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 95

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DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


A VIOLÊNCIA SEXUAL DO GÊNERO É CAUSA DE
INDIGNIDADE

Alinne de Souza Marques


Advogada e Consultora Jurídica na AM Advocacia & Consultoria Jurídica na
Seccional do DF; Especialista em Direito de Família e Violência de Gênero;
Membro da Comissão da Mulher Advogada, da Comissão de Direito de Família,
da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB/DF e do
Instituto de Direito de Família IBDFAM/DF; Graduada em Direito pela Laureate
International Universities; Pós-graduada em Ciências Penais pela Anhanguera
Uniderp – Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes; Idealizadora e Proprietária do Blog
da Mulher Advogada.

“Estupro é um dos crimes mais terríveis da Terra. O problema


dos grupos que lidam com o estupro é que eles tentam ensinar
às mulheres como se defender, enquanto que o que precisa ser
feito é ensinar aos homens a não estuprar.” Kurt D. Cobain

RESUMO
Este artigo busca um breve estudo sobre a possibilidade de aplicação do ins-
tituto da indignidade, constante no Código Civil brasileiro, aos casos de violência
sexual. Isso porque hoje nossa sociedade se encontra carente de preceitos morais
e éticos, o que enseja a prática de atos indignos. Assim, buscam-se meios para que
seja aplicado o instituto da indignidade por analogia a casos que não estão descri-
tos no art. 1.814 do CC, mas que também são indignos. É sabido que o que causa
indignidade é a prática de atos gravíssimos contra o autor da herança ou contra
pessoa próxima a ele pelo fato de que a indignidade está fundada em valores morais
e éticos relevantes, supondo uma relação de afeto, solidariedade e consideração
entre o autor da herança e o sucessor. Há de se reconhecer, entretanto, que não
teve o legislador como prever até aonde iria a imaginação – ou a crueldade – do
ser humano, prevendo todas as hipóteses possíveis, de modo que não se pode fazer
uma leitura seca da lei, sob pena de cometer injustiças. A violência física ou sexual
contra as mulheres é alarmante. Trata-se de um problema mundial em que não há
distinção de classes sociais, etnias, religiões. Perdem-se mais anos de vida saudável
com incapacidade gerada do que com doenças graves como câncer de mama ou do
colo de útero. Pacientes que sobrevivem aos traumas físicos ou psicológicos gerados
por tais violências não merecem ser chamadas de vítimas, e sim de sobreviventes. A
lei, ao permitir o afastamento do indigno, faz um juízo de reprovação, em função da
gravidade dos atos praticados. É moral e lógico que quem pratica atos de desdoura
contra quem vai lhe transmitir uma herança torna-se indigno de recebê-la. Vale
lembrar aqui dos princípios gerais do direito, da analogia e dos costumes, conforme
preceitua o art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, e de que
na aplicação da lei o juiz deve atender aos fins sociais a que a norma se destina para
que esta cumpra sua verdadeira função social e atenda às exigências do bem comum,
coibindo práticas ilícitas. Neste caso, então, vale salientar a validade da aplicação
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 99

analógica do referido dispositivo legal, que trata dos casos de indignidade de modo
a ampliar sua aplicabilidade para que a justiça prevaleça.
Palavras-Chave: Violência Sexual. Indignidade. Violência de Gênero. Analogia.
Código Civil Brasileiro.

TITLE: Gender violence is a cause for indignity.


ABSTRACT
This article aims at analyzing the possibility of application of the indignity concept,
provided by the Brazilian Civil Code, to cases of sexual violence. The reason for that is
because nowadays our society lacks ethical and moral precepts, and this gives rise to
undignified acts. Thus, this article seeks means for the indignity concept to be applied –
by analogy – to cases that are not provided by art. 1,814 of the Civil Code, but that are
still undignified. It is known that what causes indignity is the practice of utterly serious
acts against a decedent or against a person close to it, due to the fact that indignity is
grounded on relevant moral and ethical values, assuming that there is a relationship based
on affection, solidarity and respect between the decedent and the successor. However, it is
necessary to acknowledge that it was not possible for the lawmakers to predict how far
would human imagination – or cruelty – go. Thus, making insensitive interpretations of
the law is not advisable, for there is risk of injustices to be committed. Sexual or physical
violence against women is alarming. It is a global problem, and there is no distinction
of social classes, ethnic groups or religions. The consequent incapacity results in more
years of healthy lives being lost, and such loss is greater than that resulting from serious

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


diseases like breast cancer or cervical cancer. Patients who survive physical or psycholo-
gical traumas generated by such violence should not be called “victims”, but “survivors”
instead. The law, by allowing the removal of an undignified party, makes a disapproving
judgment in reason of the seriousness of the acts performed. It is moral and logical that
individuals carrying out dishonorable acts against those who will devolve some estate
are not worthy of receiving it. It is worth recalling here the general principles of law,
analogy and customs as provided in art. 4th of the Law of Introduction to the Rules of
Brazilian Law, and that in the application of law a judge must meet the social purposes
for which the rule is meant to be, so that it meets its true social purpose and meets the
demands of common good, restraining malpractices. In such case, it is worth mentioning
the validity of analogical application of the aforementioned legal provision, which deals
with indignity cases, so that its applicability can be expanded and justice prevails.
Keywords: Sexual Violence. Indignity. Gender Violence. Analogy. Brazilian Civil
Code.

SUMÁRIO
1 Introdução. 2 Um Breve Histórico sobre Violência de Gênero. 3 A Violência
Sexual na Legislação Penal. 4 A Indignidade no Código Civil Brasileiro; 4.1 Princí-
pios que Permeiam o Instituto da Indignidade; 4.2 O Instituto da Indignidade; 4.3
100 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

A Aplicabilidade do Instituto da Indignidade por Analogia. 5 As Consequências da


Violência Sexual para a Vítima. 6 Considerações Finais. 7 Referências Bibliográficas.

1. INTRODUÇÃO
A violência física ou sexual contra as mulheres é alarmante. Trata-se de um
problema mundial em que não há distinção de classes sociais, etnias e religiões.
Perdem-se mais anos de vida saudável com incapacidade gerada do que com doenças
graves como câncer de mama ou de colo do útero. Dentre as diversas causas estão:
o reconhecimento social do poder do homem sobre a mulher(1); o condicionamen-
to da mulher a atos de mando, agressões e violências(2); e sua relação aos atos de
prostituição, uso abusivo de drogas lícitas e ilícitas, gravidez indesejada, aborto,
suicídio, etc. Pacientes que sobrevivem aos traumas físicos ou psicológicos gerados
por tais violências não merecem ser chamadas de vítimas, e sim de sobreviventes,
segundo o médico Jefferson Drezett, um dos maiores estudiosos brasileiros nesta
área (apud RENNÓ Jr., 2010).
Em 2011, o Ministério da Saúde reconheceu a violência sexual como questão
de saúde pública e ainda apontou que uma em cada quatro mulheres no mundo é
vítima de violência de gênero com perda de um ano de vida potencialmente sau-
dável a cada cinco anos(3). No Brasil, 70% dos crimes contra a mulher acontecem
no ambiente doméstico e são praticados, na sua maioria, pelos parceiros íntimos(4).
É necessário enfrentar essa problemática nos âmbitos públicos da segurança,
do direito e da saúde, pois a violência sexual provoca uma gama variada de conse-
quências nas suas vítimas(5). A violência contra a mulher é o retrato da desigualdade
de gênero existente no país, que determina papéis, posições e deveres diferentes do
feminino e do masculino(6).

(1) OLIVEIRA, Celin Camilo de; FONSECA, Rosa Maria Godoy Serpa da. Práticas dos profissionais das
equipes de saúde da família voltadas para as mulheres em situação de violência sexual. Revista da Escola
de Enfermagem da USP, v. 41, n. 4, p. 605-612, 2007.
(2) REIS, J. N. dos et al. Mulheres vítimas de violência sexual: meios coercitivos e produção de lesões

não-genitais. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 465-473, 2004.


(3) SOUZA, Flavia Bello Costa de; DREZZET, Jefferson; MEIRELLES, Alcina de Cássia; RAMOS, Denise

Gimenez. Aspectos psicológicos de mulheres que sofrem violência sexual. Pontifícia Universidade Cató-
lica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo/SP, Brasil, 2013. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1016/j.
recli.2013.03.002>. Acesso em: 8 out. 2015.
(4) MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas

Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência
sexual contra mulheres e adolescentes: norma técnica. 3. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2011.
(5) VILLELA, W.; LAGO, T. Conquistas e desafios no atendimento das mulheres que sofreram violência

sexual. Caderno de Saúde Pública, v. 23, 2007, p. 471-475. Disponível em: <doi.org/10.1590/S0102-
311X2007000200025>.
(6) DINIZ, D. Fórum violência sexual e saúde. Posfácio Caderno de Saúde Pública, v. 23, 2007, p. 477-478.

Disponível em: <doi.org/10.1590/S0102-311X2007000200026>.


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2. UM BREVE HISTÓRICO SOBRE VIOLÊNCIA DE GÊNERO


O estupro é um ato tão antigo quanto o homem. Existem registros de uma tra-
jetória da história da violência sexual durante todo o período na França dos séculos
XVI ao XX. No Antigo Regime, período anterior à Revolução, era muito pouco pe-
nalizado pela justiça, ainda que fortemente condenado pelos textos legais (PEREIRA
apud MARQUES; SANTOS). Os olhos da população desviavam dessa violência e
a carência de legislação específica crescia. O vocábulo “estupro” inexistia naquele
momento. O ataque sexual é punido eventualmente e quase sempre quando desferido
contra crianças, porque feria um bem secreto: a inocência. Os processos de estupro
em que a vítima é uma mulher adulta eram geralmente recusados, principalmente
quando não há nem assassinato, nem ferimento físico grave. O relaxamento é tal
que, em caso de guerra, é perfeitamente admitido pelos jurisconsultos como o mero
ato sistemático representando simbolicamente a posse de um território (PEREIRA
apud MARQUES; SANTOS).
Essa mentalidade refere-se ao fato de que o estupro era primeiramente uma
transgressão moral, associado ao comportamento pecaminoso, e não ao criminoso;
ele pertence ao universo do impudor, antes de pertencer ao da violência; é gozo ilí-
cito antes de ser ferimento ilícito (PEREIRA apud MARQUES; SANTOS). A vítima
é, então, envolvida, confundida com a indignidade do ato.
Logo após a Revolução, pode-se observar mudanças significativas. Talvez a
principal delas seja o reconhecimento de uma autonomia da mulher em relação a
quem passa a analisar os crimes de agressão sexual, desviando o olhar tradicional
do regime anterior. Agora, a vítima é um sujeito mais independente de seus tutores

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


e do erro moral que estava mantida. Não obstante, a suspeita sobre o consentimento
da mulher ainda permeia os processos. Aqui, a legislação é totalmente ampliada
para comportar uma categorização dos crimes, que, inclusive, faz distinção entre
os comportamentos sexuais privados “luxuriosos”, tais como a “fornicação ilícita”
e a sodomia, e os comportamentos sexuais criminosos que utilizam violência(7).
Outra mudança notável é a presença constante da opinião pública, que acom-
panha de perto os processos e as mutações da lei. Finalmente, é na metade do século
XX que a psicologia desvia completamente o olhar do Estado sobre o estupro, quando
elege o trauma como o elemento central do processo: não mais o peso moral ou
social do drama, não mais a injúria ou o aviltamento, mas a desestabilização de uma
consciência, um sofrimento psicológico cuja intensidade é medida por sua duração,
ou até por sua irreversibilidade (PEREIRA apud MARQUES; SANTOS).
Atualmente, a violência sexual contra a mulher é uma das expressões da vio-
lência baseada no gênero, que tem como origem o desequilíbrio de poder existente
entre homens e mulheres, com maior ou menor intensidade, em todos os países
do mundo. Essa violência então sempre existiu, mas nunca foi muito discutida. A
aceitação social no interior da família e fora dela faz com que a mulher acabe não

(7)
VIGARELLO, Georges. História do estupro: violência sexual nos séculos XVI-XX. Trad. Lucy Magalhães.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. p. 103.
102 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

denunciando, levando a um desconhecimento da real ocorrência. Portanto, isso nos


mostra que a figura feminina foi muito reprimida através dos séculos, como dito
anteriormente, ao ponto de não procurar por seus próprios direitos, já que, uma
vez que revelasse o ocorrido, poderia ser rejeitada pela sociedade por mais que fosse
apenas uma vítima.
Embora a violência de gênero(8) seja um fenômeno antigo, no Brasil, só ganhou
visibilidade nas três últimas décadas, em função da grande mobilização feminista
em torno da questão, que resultou em algumas conquistas, como a criação dos
Conselhos da Condição Feminina e das Delegacias de Defesa da Mulher, e em mu-
danças na legislação relacionadas às medidas de proteção das vítimas e punição do
agressor(9). O reconhecimento público do problema tem levado a propor soluções
que têm recebido apoio internacional, particularmente nas Conferências do Cairo
(1994) e Beijing (1995).
A ONU define violência de gênero como “qualquer ato de violência baseado
no gênero que resulte ou possa resultar em dano ou sofrimento físico, sexual ou
psicológico a uma mulher; incluindo ameaça de tais atos, coerção, privação arbitrária
da liberdade, seja no âmbito público ou privado” (Conselho Social e Econômico,
Nações Unidas, 1992)(10). Apesar de a violência baseada no gênero poder afetar
também os homens, na imensa maioria dos casos a vítima é uma mulher e o agres-
sor é um homem. A mulher tem direito a uma vida sexual livre de violência sem
se preocupar com riscos de gravidez ou adquirir doenças graves, é um dos direitos
sexuais e reprodutivos mais básicos de uma mulher.
Apesar de altas frequências e tantos comentários enfatizando a saúde em
risco das vítimas, a violência sexual permanece sendo ignorada e não faz parte dos
programas de saúde sexual e reprodutiva até mesmo nas faculdades de medicina
no Brasil. Infelizmente, não há a atenção necessária para prevenir as graves conse-
quências. Médicos especializados, como ginecologistas, precisam estar preparados
e informados sobre o tema.
A luta continua crescendo a cada dia. As mulheres finalmente estão indo
atrás de seus direitos através de manifestações e indo contra a “cultura do estupro”,
que continua sendo pregada na sociedade. O abuso contra as mulheres foi um dos

(8) O conceito de violência conjugal é frequentemente usado como fenômeno de violência doméstica ou
violência contra a mulher, por esse tipo de violência ocorrer predominantemente no espaço doméstico e
ser praticado pelo homem (AZEVEDO, 1985; GREGORI, 1993; SAFFIOTI, 2002). Segundo estatísticas,
em 95% dos casos o homem é o agressor e a mulher, a vítima. Neste trabalho, vamos adotar o conceito de
violência de gênero utilizado por Saffioti e Almeida (1995), como uma categoria mais ampla para entender
a dinâmica da violência, que ocorre no âmbito da conjugalidade, entendida aqui como relações afetivas
sexuais-estáveis. Sabemos que a violência de gênero é um fenômeno multicausal, no qual se articulam
as categorias de gênero, classe, raça/etnia, mas, para o propósito deste texto, vamos operar um recorte de
análise priorizando duas categorias centrais – dominação masculina e ordem patriarcal – como fatores
preponderantes na compreensão da violência de gênero.
(9) FÉRES-CARNEIRO, Terezinha. Família & casal: arranjos e demandas contemporâneas. Rio de Janeiro:

PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2003. p. 188.


(10) WORLD HEALTH ORGANIZATION. World report on violence and health. Geneva, 2002.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 103

problemas que levantou a questão do feminismo em busca da igualdade entre os


gêneros. A voz das multidões incentivam várias mulheres no silêncio em expor seus
casos de violência sexual, o que ajuda a termos dados mais concretos e realizar a
justiça contra estes tipos de criminosos.

3. A VIOLÊNCIA SEXUAL NA LEGISLAÇÃO PENAL


No nosso ordenamento jurídico, embora o reconhecendo desde sempre, o cri-
me de estupro sempre foi um tabu. No início existia a figura da mulher “honesta”,
legando às prostitutas um prejuízo moral histórico, enquanto que no estupro da
mulher honesta esta levava consigo a mancha indelével com a que poluiu o estu-
prador (se for virgem o dano assume proporções irreparáveis), implicando em duas
violações: contra a liberdade sexual e contra a honra – na mulher meretriz apenas
o primeiro bem é ferido.
Doutrinadores mais antigos, como Nelson Hungria e Edgar Magalhães Noro-
nha, entendiam não haver o crime de estupro, ainda que o marido constrangesse
a mulher à prática de relações sexuais mediante o emprego de violência ou grave
ameaça. Para esses doutrinadores, inexistia a cópula ilícita (fora do casamento). A
cópula decorrente do matrimônio era considerada dever recíproco dos cônjuges,
constituindo verdadeiro exercício regular de direito; somente podia a mulher escusar-
se se o marido, por exemplo, estivesse acometido por moléstia venérea.
“ESTUPRO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. O restabelecimento da so-
ciedade conjugal preexistente entre ofendida e o agente do delito constituiu-se

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


a partir da interpretação analógica in bonan partem do art. 107, VII, do Código
Penal, causa extintiva da punibilidade. Decretaram extinta a punibilidade.
Unânime.” (Apelação Crime 70009464470, Quinta Câmara Criminal, TJRS,
Rel. Luís Gonzaga da Silva Moura, j. 06.10.04)(11)
Com base no mesmo diploma legal, a jurisprudência reconhecia como causa
de extinção de punibilidade o estuprador que casasse com a sua vítima:
“ESTUPRO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. É admitido o perdão da
vítima em ação penal pública condicionada à representação, por força do
disposto nos arts. 105, 107, V, e 225, §§ 1º e 2º, todos do CP. O casamento da
ofendida com terceiro, em não tendo o crime sido cometido com violência
real ou grave ameaça e não havendo pedido de prosseguimento da ação penal,
constitui causa extintiva da punibilidade. Inaplicável as disposições da Lei nº
11.106/05, que revogou o art. 107, VIII, do CP, já que vigente lei mais benéfica
ao tempo do fato. Decretaram extinta a punibilidade. Unânime.” (Apelação
Crime 70013371620, Quinta Câmara Criminal, TJRS, Rel. Luís Gonzaga da
Silva Moura, j. 19.07.06)(12)

(11) <http://www.tjrs.jus.br/site_php/jprud2/ementa.php>.

(12) <http://www.tjrs.jus.br/site_php/jprud3/ementa.php>.
104 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Daí o fato de que até 1995 o estuprador que casasse com a sua vítima teria a
sua punibilidade extinta. Observa-se claramente a aplicação no que se refere aos
costumes, pois naquele tempo (quando da lei em vigor) a preocupação era com a
desonra da mulher, era com o fato de ter sido aflorada e não “conseguir arranjar
marido”, o que não faz sentido algum para a nossa atual sociedade(13).
Com o advento da Lei nº 12.015, de 2009, que promoveu diversas modifica-
ções no instituto, dentre elas o disposto no título, modificando de “crimes contra
a honra para crimes contra a dignidade sexual”, podemos observar que o nome
do título trazia a ideia de bons costumes, mais ligado à ofensa da honra, e não de
dignidade, como foi introduzido pela Lei nº 12.015/09. Dessa forma, com o novo
diploma legal, houve uma maior preocupação do legislador pela dignidade sexual;
houve uma maior repulsa pelo delito cometido, ao passo que nos crimes contra os
costumes ficava a critério da vítima ou do meio social ao qual pertencia classificá-
los contra os costumes.
Vale ressaltar que no antigo art. 213 do CPB(14), alterado pela Lei nº 12.015, de
2009 , o núcleo do tipo se consubstanciava no verbo constranger mulher a con-
(15)

junção carnal, mediante violência ou grave ameaça(16). Constranger significa forçar,


compelir, coagir a mulher a manter com o agente conjunção carnal(17).

4. A INDIGNIDADE NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO


4.1. Princípios que Permeiam o Instituto da Indignidade
A indignidade é uma pena civil cominada ao herdeiro ou ao legatário que
cometer atos criminosos, ofensivos ou reprováveis, contra a vida, a honra e a liber-
dade do de cujus ou de seus familiares, privando-os do direito à herança(18). Trata-se
de um instituto previsto no ordenamento civil que objetiva excluir da sucessão os
herdeiros ou legatários considerados indignos.
É uma forma de exclusão de herdeiros legítimos e testamentários e abrange,
portanto, a sucessão legítima e a testamentária; embora tendo a capacidade para su-

(13) OLIVEIRA, Guizela de Jesus. Estupro antes e depois da Lei 12.015, de 2009. 2009. Disponível em:
<http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3296>. Acesso em: 7 out. 2015.
(14) “Art. 213. (...) Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça:

Parágrafo único. (...) (Incluído pela Lei nº 8.069, de 1990)


(...)
Pena: reclusão, de seis a dez anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, 25.07.1990)”
(15) “Art. 213. (...) Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou

a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: (Redação dada pela Lei nº 12.015,
de 2009)
Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.”
(16) OLIVEIRA, Guizela de Jesus. Estupro antes e depois da Lei 12.015, de 2009. 2009. Disponível em:

<http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3296>. Acesso em: 7 out. 2015.


(17) BITENCOURT, César Roberto. Tratado de direito Penal. São Paulo: Saraiva. v. III. p. 05.

(18) DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v. 6. p. 50.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 105

ceder, o excluído perde-a, como pena civil, pela prática de certos atos determinados
pela lei, como danosos à vida, à honra ou à liberdade de testar do autor da herança(19).
Pelo prestígio à dignidade da pessoa humana, princípio maior da Constituição
Federal, elementar razão de ordem ética, quem desrespeita a dignidade do outro
merece ser punido. Quando a afronta se dá entre pessoas que têm vínculo familiar
e afetivo tão estreito, a ponto de ser um herdeiro do outro, a forma encontrada pela
lei para inibir tais ações é de natureza patrimonial. Merece ser alijado da sucessão
o herdeiro que age contra a vida ou a honra do autor da herança ou comete atos
ofensivos contra os membros de sua família. Também se sujeita à mesma penalidade
se obstaculiza a manifestação de vontade do testador(20).
A legislação, ao permitir o afastamento do herdeiro indigno, nada mais faz do
que um juízo de ponderação desaprovando a conduta praticada, levando em consi-
deração sua negativa intensidade(21). Nos moldes hodiernos da sociedade brasileira,
é possível perceber a emergência de fatos individuais e coletivos que revelam uma
dialética em diversos setores sociais, inclusive exigindo a regência normativa im-
prescindível do Direito para legitimar e manter a paz social(22).
Sob esse enfoque, conflui um conjunto de valores morais e princípios jurídi-
cos referentes à pessoa humana que são de observância obrigatória no momento de
subsunção desses fatos às normas jurídicas legais, de tal maneira que formam um
alicerce fundamental para a aplicação do direito, tendo em vista a conservação e o
respeito aos bens jurídicos e humanos(23).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


4.2. O Instituto da Indignidade
A indignidade é a privação do direito, cominada por lei, a quem cometeu certos
atos ofensivos à pessoa ou ao interesse do hereditando, ou seja, o legislador cria uma
pena, consistente na perda da herança, aplicável ao sucessor legítimo ou testamentário
que houver praticado certos atos de ingratidão contra o de cujus(24). Trata-se de uma
pena civil que priva do direito à herança não só o herdeiro, mas também o legatário

(19) CATEB, Salomão de Araújo. Direito das sucessões. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 57.
(20) DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. São Paulo: RT, 2008. p. 288.
(21) MARCELINO, Maíra Marques. O instituto da indignidade no ordenamento jurídico brasileiro e as alte-

rações previstas em projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional. Monografia apresentada ao Curso
de Graduação de Direito. Universidade Católica de Brasília, 2012. Disponível em: <http://repositorio.
ucb.br/jspui/bitstream/10869/1985/1/Ma%C3%ADra%20Marques%20Marcelino.pdf>. Acesso em: 11 out.
2015.
(22) SOUSA, Robson Soares. Um enfoque sócio-jurídico sobre o princípio da indignidade. Âmbito Jurídico,

Rio Grande, XVI, n. 113, jun. 2013. Disponível em: <http://ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_ar-


tigos_leitura&artigo_id=13316&revista_caderno=7>. Acesso em: out. 2015.
(23) Idem.

(24) LEITE, Gisele. Esclarecimentos sobre exclusão do direito sucessório por indignidade. 2009. Disponível

em: <http://www.prolegis.com.br/esclarecimentos-sobre-exclus%C3%A3o-do-direito-sucess%C3%B3rio-
por-indignidade-e-deserda%C3%A7%C3%A3o/>. Acesso em: 9 out. 2015.
106 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

que cometeu atos criminosos, ofensivos ou reprováveis, taxativamente enumerados


em lei, contra a vida, a honra e a liberdade do de cujus.
A lei, ao permitir o afastamento do indigno, faz um juízo de reprovação, em
função da gravidade dos atos praticados. É moral e lógico que quem pratica atos de
desdouro contra quem vai lhe transmitir uma herança torna-se indigno de recebê-la.
Daí porque a lei traz descritos os casos de indignidade, isto é, fatos típicos que, se
praticados, excluem o herdeiro da sucessão hereditária(25).
A indignidade não se opera automaticamente, havendo a necessidade da propo-
situra de uma ação de rito ordinário, movida por quem tenha interesse na sucessão e
na exclusão do indigno, sendo que os casos descritos no rol do art. 1.814 do Código
Civil devem ser provados no curso da ação. Supõe capacidade para suceder e se
funda em motivos pessoais do indigno. O indigno adquire a herança e a conserva
até que passe em julgado a sentença que o exclui da sucessão.
As hipóteses do art. 1.814 do Código Civil são comuns à indignidade e à
deserdação. Para a deserdação, abrem-se outras possibilidades nos casos descritos
nos arts. 1.962 e 1.963 do Código Civil pátrio. Porém, o fundamento de ambos os
institutos é idêntico, necessitando-se de uma ação e de uma sentença para afastar o
sucessor indigno ou deserdado.
“Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I – que houverem sido autores, co-autores ou partícipes do homicídio
doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa cuja sucessão se tratar, seu cônjuge,
companheiro, ascendente ou descendente;
II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança
ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o
autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.”
Enquanto a deserdação só alcança os herdeiros necessários, a indignidade pode
alcançar herdeiros legítimos, necessários, facultativos, testamentários ou legatários.
Vemos que causa indignidade a prática de atos gravíssimos contra o autor da
herança ou contra pessoa próxima a ele pelo fato de que a indignidade está fundada
em valores morais e éticos relevantes, supondo uma relação de afeto, solidariedade
e consideração entre o autor da herança e o sucessor(26).
Além do mais, a indignidade está pautada também nesses valores, pois é mo-
ralmente condenável em nossa sociedade um cônjuge que pratica violência sexual
com a mulher e recebe a herança. Este tipo de conduta, se permitida, sempre abre

(25) VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2009. v. 7.
p. 52-53.
(26) MORAES, Fernanda Cristina Rodrigues de. Aplicabilidade da indignidade por analogia. Portal Jurídico

Investidura, Florianópolis/SC, 21 jun. 2010. Disponível em: <investidura.com.br/biblioteca-juridica/


artigos/direito-civil/164139>. Acesso em: 12 out. 2015.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 107

precedentes para a perpetuação desses casos nos arranjos familiares. Isto ocorre
devido ao atual estágio em que se encontra nossa sociedade, pobre e escassa em
preceitos morais, éticos e valores como a solidariedade, fraternidade, respeito ao
próximo, dentre vários outros valores que poderiam aqui ser enumerados.

4.3. A Aplicabilidade do Instituto da Indignidade por Analogia


É sabido que o que causa a indignidade é a prática de atos gravíssimos contra
o autor da herança ou contra pessoa próxima a ele pelo fato de que a indignidade
está fundada em valores morais e éticos relevantes, supondo uma relação de afeto,
solidariedade e consideração entre o autor da herança e o sucessor(27).
Há de se reconhecer, entretanto, que não teve o legislador como prever até
aonde iria a imaginação – ou a crueldade – do ser humano, prevendo todas as hi-
póteses possíveis, de modo que não se pode fazer uma leitura seca da lei, sob pena
de cometer injustiças.
Por essa linha de raciocínio, já identificamos julgados que aplicam por analogia
o instituto da indignidade. Existe precedente do TJRS que teve como voto divergente
vencedor o da então Desembargadora Dra. Maria Berenice Dias, em um caso de um
genro que assassinou o sogro, no qual a esposa, com quem era casado em regime
de comunhão universal de bens, ajuizou ação declaratória de indignidade, para que
seu marido não tivesse direito aos bens deixados pelo pai da mesma, contra quem
seu cônjuge havia cometido homicídio. O TJRS aplicou o instituto da indignidade
a esse caso:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


“Assim, se há omissão de norma legal, deve sempre prevalecer o princípio
consagrado pelo legislador, que, indiscutivelmente, é o de não permitir a quem
atenta contra a vida de outrem possa dele receber alguma coisa, seja como
sucessor, seja como cônjuge ou companheiro do sucessor. Essa é a intenção
do legislador, e a função da Justiça é exatamente fazer incidir a orientação
ditada pela lei.” (TJRS, Apelação Cível 70005798004, Sétima Câmara Cível,
j. 09.04.03)
Em outro caso, o TJMG aplicou, por analogia, o instituto da indignidade ao
contrato de seguro. Assim, o beneficiário do seguro, que assassinou o contratante
do seguro em seu favor, após ser declarado indigno, perdeu o direito à percepção
do seguro(28).
“Declaratória. Caso concreto. Previsão legal. Ausência. Analogia. Cos-
tumes. Princípios gerais do direito. Possibilidade. Seguro de vida. Segurada.
Homicídio. Beneficiário. Indignidade. Declaração. Indenização. Herdeiros.

(27) PORDEUS, Jussara. Indignidade por analogia. 2014. Disponível em: <http://jussarapordeus.blogspot.
com.br/2014/08/indignidade-por-analogia.html>. Acesso em: 8 out. 2015.
(28) MORAES, Fernanda Cristina Rodrigues de. Aplicabilidade da indignidade por analogia. Portal Jurídico

Investidura, Florianópolis/SC, 21 jun. 2010. Disponível em: <investidura.com.br/biblioteca-juridica/


artigos/direito-civil/164139>. Acesso em: 12 out. 2015.
108 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Não havendo previsão legal quanto à determinada situação apresentada à


apreciação do julgador, deve utilizar-se da analogia dos costumes e princípios
gerais do direito. Inteligência do art. 4º da LICC. Vindo à pessoa que indicou
como beneficiário do seguro de vida o seu algoz, se por ele assassinada, deve
ser reconhecida a indignidade deste, sob pena de malferir os mais comezinhos
princípios do direito. Declarada a indignidade do beneficiário do seguro de
vida, deve este ser pago aos herdeiros do segurado.” (TJMG, 1.0518.02.016087-
6/001 (1), Rel. José Amâncio, DJ 07.04.06)

5. AS CONSEQUÊNCIAS DA VIOLÊNCIA SEXUAL PARA A VÍTIMA


No Brasil, o Ministério da Saúde (2011)(29) delineia os impactos que a violência
sexual acarreta para as vítimas. Entre as principais consequências estão lesões físicas,
gravidez indesejada, doenças sexualmente transmissíveis e impacto psicológico, na
maioria das vezes, irreversível. Também são citados os danos à saúde mental, como
ansiedade, depressão e suicídio(30).
Outros aspectos, como sentimentos de medo da morte, sensação de solidão,
vergonha e culpa(31), são acrescentados. Podem ocorrer, ainda, transtornos da se-
xualidade, incluindo vaginismo, dispareunia, diminuição da lubrificação vaginal e
perda do orgasmo, que podem evoluir para a completa aversão ao sexo(32).
A violência sexual pode gerar outras consequências, como problemas familiares
e sociais, abandono dos estudos, perda do emprego, separação conjugal, abandono
da casa e prostituição, como parte dos problemas psicossociais relacionados a essa
dinâmica(33). Pode levar, ainda, à delimitação confusa das próprias barreiras e dos
próprios limites, estigmatização, vergonha, traição, dissociação e repetição (34). A
invisibilidade é o desejo de muitas vítimas de violência sexual.
Há certo tom de fatalidade em relação ao futuro de uma pessoa que sofre vio-
lência sexual, especialmente se foi crônica ou se ocorreu na infância. É como se a

(29) MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas


Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência
sexual contra mulheres e adolescentes: norma técnica. 3. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2011.
(30) SOUZA, Flavia Bello Costa de; DREZZET, Jefferson; MEIRELLES, Alcina de Cássia; RAMOS, Denise

Gimenez. Aspectos psicológicos de mulheres que sofrem violência sexual. Pontifícia Universidade Cató-
lica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo/SP, Brasil, 2013. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1016/j.
recli.2013.03.002>. Acesso em: 8 out. 2015.
(31) MATTAR, R. et al. Assistência multiprofissional à vítima de violência sexual: a experiência da Uni-

versidade Federal de São Paulo. Caderno de Saúde Pública, v. 23, 2007, p. 459-464. Disponível em: <doi.
org/10.1590/S0102-311X2007000200023>.
(32) DREZETT, Jefferson. Aspectos biopsicossociais da violência sexual. Jornal da Rede Feminista de Saúde,

n. 22, 2000, p. 9-12.


(33) MATTAR, R. et al. Assistência multiprofissional à vítima de violência sexual: a experiência da Uni-

versidade Federal de São Paulo. Caderno de Saúde Pública, v. 23, 2007, p. 459-464. Disponível em: <doi.
org/10.1590/S0102-311X2007000200023>.
(34) EARLY, E. The raven’s return: the influence of psychological trauma on individuals and culture. Wil-

mette: Chiron Publications, 1993.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 109

sobrevivente do trauma estivesse inclinada a ocupar a posição de vítima de novas


traumatizações, impossibilitada de obter conscientemente o controle da própria
vida(35).
A violência sexual pode trazer diversas consequências por meio de transtornos,
mas também nas relações cotidianas. Quando os sintomas se tornam frequentes e
permanentes, passam a se expressar de forma patológica, como transtorno de stress
pós-traumático (TEPT), transtornos alimentares, depressão, tentativa de suicídio,
dificuldade nas relações afetivas e sexuais(36).
Uma investigação realizada para verificar a relação entre violência sexual,
saúde e comportamentos de risco indicou que mulheres que sofreram violência
sexual tiveram maior incidência de saúde mental debilitada, baixa satisfação com a
vida, limitação de atividades, tabagismo e consumo esporádico de bebida alcoólica.
A associação entre saúdes mental e física debilitadas e violência sexual foi mais
prevalente em mulheres, com consequências que persistem ao longo do tempo(37).
Entre 1980 e 2008 foi realizada meta-análise com 37 estudos sobre associação
entre abuso sexual e transtornos psiquiátricos. Os resultados indicaram relação entre
o antecedente de abuso sexual, o diagnóstico e a duração do transtorno de ansiedade,
depressão, transtornos alimentares, TEPT, distúrbios do sono e tentativa de suicídio.
A relação entre abuso sexual e transtornos psiquiátricos mostrou-se persistente,
independentemente do sexo da vítima e da idade em que o abuso ocorreu. Além
disso, observaram associação entre abuso sexual e desordens somáticas, incluindo-se
alteração funcional gastrointestinal, dor pélvica crônica, convulsões psicogênicas e
dor crônica não específica(38).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Estudo realizado de caráter comparativo entre mulheres que sofreram episódio
de estupro consumado e vítimas de tentativa de estupro avaliou 13 aspectos: saúde,
autoestima, autopercepção de atratividade, autopercepção do valor do parceiro, re-
lações familiares, trabalho, vida social, reputação, reputação sexual, desejo de fazer
sexo, frequência do sexo, prazer de fazer sexo e relação estável e duradora. Mulheres
que sofreram estupro consumado apresentaram índices significativamente mais
negativos em 11 aspectos. Os mais afetados foram autoestima, reputação sexual,
frequência do sexo, desejo de fazer sexo e autopercepção do valor do parceiro. No
entanto, mulheres que sofreram tentativa de estupro também reportaram vivências
negativas em vários aspectos(39).

(35) EARLY,E. The raven’s return: the influence of psychological trauma on individuals and culture. ����
Wil-
mette: Chiron Publications, 1993.
(36) LEVINE, P. A. O despertar do tigre: curando o trauma. 4. ed. São Paulo: Summus, 1999.

(37) CHOUDARY, E.; COBEN, J. H.; BOSSARTE, R. M. Gender and time differences in the associations between

sexual violence victimization, health outcomes, and risk behaviors. Am J Mens Health, 2, 2008, p. 254-259.
(38) CHEN, L. P. et al. Sexual abuse and lifetime diagnosis of psychiatric disorders: systematic review

and meta-analysis. Mayo Clinic Proceedings, 85 (2010), p. 618-629. Disponível em: <doi.org/10.4065/
mcp.2009.0583>.
(39) PERILLOUX, C.; DUNTLEY, J. D.; BUSS, D. M. The costs of rape. Arch Sex Behav, 41, 2012. p. 1.099-

1.106.
110 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após este breve estudo sobre a aplicação por analogia do instituto da indignida-
de, bem como sobre as graves consequências de uma violência sexual, como um grave
problema social, foi possível observar que, mesmo com todo o processo evolutivo
sofrido pela legislação, principalmente na seara penal, há que se designar atenção
especial às questões desse instituto que muito deixa a desejar. Não contemplam de
forma efetiva os princípios do direito pátrio e o interesse social, cujos objetivos são
inerentes à própria função do direito.
De tal modo, hoje o instituto da indignidade pode e deve ser aplicado em casos
de violência sexual, pois não seria moral e ético no direito o estímulo a esse ato de
violência para o recebimento de benefícios contratuais simplesmente pelo fato de
que os casos de indignidade não poderiam ser aplicados, por analogia, em relação
ao que está definido no art. 1.814 do Código Civil.
Vale lembrar aqui dos princípios gerais do direito, da analogia e dos costumes,
conforme preceitua o art. 4º da LICC(40), e de que na aplicação da lei o juiz deve
atender aos fins sociais a que a norma se destina para que esta cumpra sua verda-
deira função social e atenda às exigências do bem comum, coibindo práticas ilícitas
repudiadas moral e eticamente.
Nada obsta a aplicabilidade do instituto da indignidade por analogia, pois esta,
apesar de ser uma penalidade, não possuiu natureza jurídica penal, não tendo que
se falar no ramo de direito civil do respeito à tipicidade, que é inerente e própria do
ramo de direito penal, que decorre do princípio da reserva legal absoluta (art. 5º,
XXXIX, da CF/88). Entretanto, é sabido que há posicionamento diverso que entende
que não pode ser aplicado o instituto da indignidade por analogia(41).
Neste caso, então, vale salientar a validade da aplicação analógica do referido
dispositivo legal, que trata dos casos de indignidade de modo a ampliar sua apli-
cabilidade para que a justiça prevaleça. A indignidade é um instituto previsto no
ordenamento jurídico brasileiro e sua função é disciplinar as questões que envolvem
a ética e a moral na sucessão, uma vez que, ao se punir os herdeiros ou legatários
que cometeram os atos ofensivos previstos em lei contra o autor da herança ou de
seus familiares com a exclusão da sucessão, faz-se valer a lógica jurídica no que tange
ao respeito às relações de parentesco que, por si só, pressupõem o vínculo afetivo e
solidário entre o autor da herança e o herdeiro(42).

(40) Lei
nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
“Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os
princípios gerais de direito.”
(41) MORAES, Fernanda Cristina Rodrigues de. Aplicabilidade da indignidade por analogia. Portal Jurídico

Investidura, Florianópolis/SC, 21 jun. 2010. Disponível em: <investidura.com.br/biblioteca-juridica/


artigos/direito-civil/164139>. Acesso em: 12 out. 2015.
(42) MARCELINO, Maíra Marques. O instituto da indignidade no ordenamento jurídico brasileiro e as alte-

rações previstas em projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional. Monografia apresentada ao Curso
de Graduação de Direito. Universidade Católica de Brasília, 2012. Disponível em: <http://repositorio.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 111

A sociedade demanda ações que coíbam práticas ilícitas e imorais que na maio-
ria das vezes já estão positivados em nosso ordenamento jurídico, faltando apenas
que os instrumentos já existentes sejam postos em prática, como o da aplicação
analógica da lei, dentre outros instrumentos que buscam a realização e promoção
da justiça social(43). Por fim, é necessário analisarmos a possibilidade de aplicação
deste dispositivo legal por analogia para que se possa ter a finalidade social como
escopo a prevalecer a justiça.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ÚTERO SUB-ROGADO NAS UNIÕES HOMOAFETIVAS

Brenda Bandoli Vieira


Bacharel em Direito pela Universidade Iguaçu/Itaperuna.

Helber Campos de Oliveira


Advogado; Especialista em Direito Público.

Carlos Henrique Medeiros de Souza


Doutor em Comunicação pela UERJ; Mestre em Educação; Professor e
Coordenador do Laboratório de Cognição e Linguagem da UENF.

Margareth Vetis Zaganelli


Doutora em Direito-UFMG; Mestre em Educação – UFES; Estágios Pós-Doutorais
em Bioética na Università degli Studi di Milano-Bicocca – UNIMIB e na Alma
Mater Studiorum Università di Bologna – Unibo; Visiting Professor da Università
degli Studi di Milano-Bicocca – UNIMIB; Professora Titular de Direito Penal e
Teoria do Direito da Universidade Federal do Espírito Santo – UFES.

RESUMO
O objetivo deste artigo foi discorrer sobre a utilização das técnicas de repro-
dução assistida heteróloga em uniões homoafetivas e a possibilidade da adoção dos
procedimentos de reprodução assistida pelos casais homoafetivos com ênfase na
utilização do útero sub-rogado, a fim de concretizar o desejo de ter filhos. Abordou-
se, ainda, os critérios utilizados para a autorização de realização do procedimento
e suas respectivas implicações. A união homoafetiva, caracterizada como entidade
familiar, faz jus à tutela jurídica, devendo, assim, ter seu direito à filiação também
resguardado. A ausência de regulamentação do tema pelo ordenamento jurídico
brasileiro gera inúmeras controvérsias, pois encontra-se regulamentado atualmente
somente pelo Conselho Federal de Medicina por meio da Resolução nº 2.116/2015.
Concluiu-se que, ao julgar um caso concreto, o magistrado deve observar os prin-
cípios constitucionais que garantem a dignidade da pessoa humana e o direito à
liberdade e à igualdade visando à justa composição da lide. Inclusive, ressalta-se a
importância de garantir também aos casais homoafetivos a facilitação do registro civil
da criança advinda de um procedimento de reprodução assistida que na atualidade
encontra diversos entraves práticos.
Palavras-Chave: Reprodução Humana Assistida. Uniões Homoafetivas. Útero
Sub-Rogado e Dignidade da Pessoa Humana.

TITLE: Subrogated uterus in homoaffectionate unions.


ABSTRACT
This article aims at discussing the use of techniques of heterologous assisted human
reproduction in homoaffectionate unions and the possibility of adoption of assisted repro-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 115

duction procedures by homoaffectionate couples with emphasis on the use of a subrogated


uterus to fulfill the desire of having children. This text also addresses the criteria used
for the authorization of such procedure and its respective implications. Homoaffectio-
nate unions, as family entities, are entitled to legal protection, as is its right to filiation.
The lack of regulation of this subject by the Brazilian legal system creates countless
controversies, as it is currently regulated solely by the Resolution no. 2,116/2015 of the
Federal Council of Medicine. The conclusion is that when deciding on a case, a judge
must comply with the constitutional principles that ensure human dignity and the right
to freedom and equality. It is also worth mentioning the importance of granting homoa-
ffectionate couples the facilitation of civil registration of children born from an assisted
reproduction procedure, which nowadays have several practical obstacles.
Keywords: Assisted Human Reproduction. Homoaffectionate Unions. Subrogated
Uterus and Human Dignity.

SUMÁRIO
1 Considerações Iniciais. 2 Reprodução Humana Assistida; 2.1 Reprodução
Assistida Homóloga; 2.2 Reprodução Assistida Heteróloga; 2.3 Fertilização In Vitro.
3 União Homoafetiva; 3.1 Conceito; 3.2 Reconhecimento da União Homoafetiva
como Entidade Familiar; 3.3 Princípios Constitucionais. 4 Reprodução Humana
Assistida Heteróloga em Uniões Homoafetivas; 4.1 Sobre a Gestação de Substituição;
4.2 Sub-Rogação do Útero em Uniões Homoafetivas. 5 Registro Civil da Criança –
Homoparentalidade; 5.1 Registro Civil. 6 Considerações Finais. Referências.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Hodiernamente, o conceito de família tem se tornado cada vez mais amplo
diante de tantas mudanças que a sociedade contemporânea apresenta. O afeto passou
a ser elemento identificador dos vínculos familiares, um valor jurídico de relevante
prestígio para o direito das famílias. Os laços biológicos cederam lugar à afetividade.
Decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal em 2011 reconheceu as uniões
homoafetivas como entidades familiares, e estas passaram a merecer proteção cons-
titucional. Desta forma, o sonho da paternidade e da maternidade já não mais pode
ser negado aos homossexuais.
Existem várias técnicas de reprodução assistida e esta pesquisa enfatizará a
inseminação artificial heteróloga, visando analisar a possibilidade de utilização, pelos
casais homoafetivos, do mencionado meio de reprodução e da sub-rogação do útero,
cuja aplicação envolve aspectos éticos, morais e também efeitos jurídicos ainda não
regulamentados pelo ordenamento jurídico. Esta abordagem se justifica por apre-
sentar grande relevância tanto para a sociedade como para a comunidade científica,
abordando a utilização do meio de reprodução assistida nas uniões homoafetivas de
modo a garantir também a essa entidade familiar o tão sonhado desejo de ter filhos.
No segundo capítulo deste trabalho, tem-se uma exposição das técnicas de re-
produção assistida existentes na atualidade e a justificativa de sua adoção por casais
116 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

que, por diversos motivos, não conseguem de modo natural procriar. Ressalta-se a
ausência de normatização referente a esses procedimentos e faz-se uma análise da
portaria do Conselho Federal de Medicina que atualmente regulamenta o assunto.
A seguir, conceitua-se a união homoafetiva discorrendo sobre seu reconhecimento
como entidade familiar e os princípios constitucionais que lhe garantem a tutela
constitucional. No quarto capítulo, discute-se a utilização das técnicas de reprodução
humana assistida por casais homoafetivos e suas implicações jurídicas revelando que
o tão sonhado desejo de procriar é possível também para esses casais. Neste capítulo
aborda-se com maior ênfase a adoção da técnica de reprodução assistida heteróloga
por casais homoafetivos masculinos, analisando a possibilidade da utilização do
útero de substituição de modo a concretizar o tão desejado sonho de ter filhos. No
último capítulo, trata-se do registro civil da criança advinda da utilização de técni-
cas de reprodução assistida e da homoparentalidade, assunto de grande destaque
atualmente no Judiciário.
A reprodução humana assistida em uniões homoafetivas é uma temática
envolta em controvérsias na sociedade contemporânea, motivo pelo qual o Poder
Judiciário frequentemente é acionado no intuito de dirimir os conflitos existentes, o
que confere ao tema grande relevância. Além do mais, o fato de não haver legislação
que regulamente a temática causa ainda mais discussões não somente no cenário
jurídico, mas também no meio social.
A utilização do útero de sub-rogação como meio de possibilitar aos casais ho-
moafetivos masculinos a concretização do desejo de ter filhos se torna um assunto
ainda mais controverso, inclusive no tocante à realização do registro civil da criança
advinda das técnicas de reprodução humana assistida.
Este trabalho foi desenvolvido com um estudo qualitativo de cunho biblio-
gráfico, que tornou possível compreender de que forma se dão procedimentos de
reprodução assistida em uniões homoafetivas, vislumbrando a possibilidade do uso
de um útero de substituição. Para que o referencial teórico transcorresse de forma
positiva e que o desafio proposto se transformasse em aprendizado, houve a neces-
sidade ampla de leitura de livros, revistas e artigos, não obstante a incansável análise
de jurisprudência. O contato com a doutrina existente no que tange ao objeto ora
em estudo foi de grande importância para o conhecimento e o aprendizado sobre o
tema. Foram utilizados autores como Maria Berenice Dias (2013), Silvia da Cunha
Fernandes (2003), Paulo Lôbo (2010), Sílvio de Salvo Venosa (2014), Arnaldo
Rizzardo (2009), entre outros.

2. REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA


O surgimento das técnicas de reprodução assistida ocasionou no campo da ge-
nética uma das maiores revoluções que o mundo teve a oportunidade de presenciar,
possibilitando a realização de sonhos que antes pareciam impossíveis aos casais que
não podiam, por diversos motivos, procriar (DIAS; REINHEIMER, 2012, p. 30). Em
consequência de tal avanço no campo da genética, na atualidade, quando os casais
por meios naturais não conseguem ter filhos, podem valer-se dos procedimentos da
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 117

reprodução assistida, uma intervenção médica no processo natural de fecundação,


para satisfazer o desejo de ter filhos.
Existem dois tipos de reprodução assistida atualmente, a saber: a inseminação
artificial, que pode ser homóloga ou heteróloga, e a fertilização artificial in vitro. Tais
procedimentos serão abordados em detalhes mais adiante. Vale ressaltar também que
a gestação de um novo ser pode ocorrer tanto no útero da paciente que se submete
ao processo artificial como também no de outra mulher, configurando-se a hipótese
conhecida popularmente como “barriga de aluguel”. Insta mencionar que os meios
de reprodução assistida são meios paliativos e não curam a esterilidade, revelando-
se como um modo legítimo de proporcionar ao casal estéril o benefício de ter filhos
(CABRAL; CAMARDA, 2012, p. 16).
Até o presente momento ainda não existe no ordenamento jurídico brasileiro
uma legislação específica que regulamente a utilização dos procedimentos de re-
produção humana assistida. Apesar de diversos projetos terem tramitado pelo Con-
gresso Nacional visando regulamentar tal temática, muitos já até foram arquivados,
permanecendo o tema sem normatização.
Em 1992, o Conselho Federal de Medicina (doravante CFM) regulamentou
oficialmente o tema, por meio da Resolução nº 1.358/92, reformulada posteriormente
pela Resolução nº 1.957/2010. Em 2013, a Resolução nº 1.957/2010 sofreu novas
alterações, dando origem à Resolução nº 2.013/2013, revogada pela Resolução nº
2.121/2015, publicada em 24.09.2015, que na atualidade regulamenta os procedi-
mentos de reprodução humana assistida no Brasil (COXIR et al., 2014). Vale destacar

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


que a mencionada Resolução, publicada em 2015, considera o julgamento de 5 de
maio de 2011 do STF, que reconheceu e qualificou como entidade familiar a união
estável homoafetiva (BRASIL, CFM, 24.09.2015).
A Resolução nº 2.121/2015 adota as normas éticas para a utilização das técnicas
de reprodução assistida visando facilitar o processo de procriação. Para que se possa
utilizar dos procedimentos de reprodução assistida, deve haver efetiva probabilidade
de sucesso, não podendo incorrer em risco grave à saúde da paciente ou do possí-
vel descendente. Além do mais, as mulheres submetidas ao procedimento devem
ter idade máxima de 50 anos, conforme estabelece a referida Resolução do CFM.
Ainda prevê a obrigatoriedade do consentimento informado para todos os pacientes
submetidos às técnicas de reprodução assistida. Deverão ser expostos, de maneira
detalhada, os aspectos médicos que envolvem as circunstâncias da utilização da
técnica de reprodução assistida, assim como os resultados obtidos com a aplicação
da técnica proposta. Tais informações devem abarcar dados de caráter biológico,
jurídico, ético e econômico.
Veda-se expressamente a utilização dos métodos de reprodução assistida com
o intuito de selecionar o sexo ou qualquer outra característica biológica do futuro
filho, excetuando-se apenas no que se refere à prevenção de doenças ligadas ao sexo
do filho que venha a nascer. Os procedimentos de reprodução assistida devem sempre
ser feitos em clínicas autorizadas pelos respectivos conselhos regionais de medicina.
118 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Inclusive, foi publicada pelo CFM, em 4 de fevereiro de 2015, a Resoluçã nº


2.116/2015, reconhecendo a reprodução assistida como área de atuação vinculada
à especialidade de ginecologia e obstetrícia. A referida Resolução prevê, ainda, que
a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) “poderá credenciar programas
de formação em reprodução assistida e serão criadas regras para capacitação dos
médicos que já atuam ou pretendam atuar na área” (BRASIL, CFM, 04.02.2015).

2.1. Reprodução Assistida Homóloga


A inseminação artificial homóloga ocorre quando se utiliza os gametas das
pessoas diretamente envolvidas na concepção (DIAS, 2009, p. 334). Nesse caso,
presume-se que “a mulher seja casada ou mantenha união estável, pois o sêmen
provém do marido ou companheiro, portanto, o casal não é infértil, simplesmente
não ocorre a fecundação” (VENOSA, 2008, p. 226) por meio natural através do ato
sexual. A fecundação homóloga consiste em uma
“(...) técnica voltada para obtenção de uma concepção humana a partir
dos gametas dos dois esposos unidos em matrimônio, que pode ser realizada de
duas formas: primeiro a fecundação in vitro homóloga com embryotransfer, na
qual o encontro dos gametas se dá in vitro; em segundo a inseminação artificial
homóloga com o depósito nas vias genitais femininas do esperma do marido,
anteriormente recolhido.” (SGRECCIA, 1999, p. 499-501)
Neste caso, na utilização de reprodução assistida homóloga, os pais que as-
sumirão a criança são os mesmos que doaram o material genético, não havendo
mudança na hereditariedade biológica da criança, nem problemas quanto à filiação.

2.2. Reprodução Assistida Heteróloga


Nesta modalidade de reprodução assistida, o esperma utilizado pertence a um
doador fértil, estranho ao casal. O gameta utilizado para inseminação, no caso da
reprodução assistida heteróloga, é de uma terceira pessoa que não o casal envolvi-
do, podendo ocorrer, inclusive, a utilização de material genético de duas pessoas
estranhas aos futuros pais (KRELL, 2006, p. 158).
A fecundação heteróloga consiste em uma “técnica voltada para a obtenção de
uma concepção a partir dos gametas provenientes de ao menos um doador diferente
dos esposos unidos em matrimônio. Pode ser realizada na forma intracorpórea ou
na forma extracorpórea” (SGRECCIA, 1999, p. 499-501). É utilizada especialmente
nos casos de “esterilidade, incompatibilidade do fator Rh, moléstias graves transmis-
síveis pelo marido”, entre outros motivos. Assim, o sêmen utilizado não pertence ao
marido: e os casais, nesta situação, recorrem frequentemente aos chamados bancos
de esperma, sendo obrigatório o sigilo do doador e do receptor (VENOSA, 2008, p.
226). Na utilização do método de reprodução assistida heteróloga é possível procriar
sem a contribuição genética de um dos cônjuges ou companheiros.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 119

2.3. Fertilização In Vitro


A fecundação artificial in vitro ocorre fora do corpo da futura mãe. O processo
de fecundação se dá pela união de gametas masculinos e femininos em laboratório.
Tais gametas podem pertencer ao casal, bem como a terceiros. Após a fertilização, o
ovo será transferido para a cavidade uterina, já sob a forma de embrião (FROZZA;
OLIVEIRA, 2013). Na mesma linha de pensamento relata Leite (1995, p. 41) que a
fertilização in vitro é “uma técnica capaz de produzir artificialmente o ambiente da
trompa de Falópio, onde a fertilização ocorre naturalmente e a clivagem prossegue
até o estágio em que o embrião é transferido para o útero”. Após ser colocado no
útero da genitora, o óvulo já fecundado irá se desenvolver da mesma maneira como
se houvesse sido concebido por meios naturais.

3. UNIÃO HOMOAFETIVA
A união homoafetiva, por tratar-se de opção sexual que diverge da tradicional, é
marcada pelo preconceito e considerada por muitos como anormal, fora dos padrões
morais. Apesar de estarem sempre presentes na história da humanidade, as men-
cionadas uniões nunca foram reconhecidas pelo direito (CARVALHO, 2011, p. 7).
É indiscutível a existência da união homoafetiva na sociedade contemporâ-
nea, sendo o assunto discutido abertamente, o que gera reflexos consideráveis no
ordenamento jurídico brasileiro. O direito, que é o instrumento capaz de disciplinar
a convivência comum, deve acompanhar as transformações na família de modo a
alcançar seu objetivo, regrando a vida em sociedade.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


3.1. Conceito
A união homoafetiva caracteriza-se pela união entre “duas pessoas do mesmo
sexo, ligadas por um vínculo afetivo a manter uma relação duradoura, pública e con-
tínua, como se casadas fossem”, formando, assim, “um núcleo familiar à semelhança
do casamento, independentemente do sexo a que pertencem” (DIAS, 2013, p. 207).
Diferencia-se a união estável homoafetiva da união estável entre um homem
e uma mulher pela simples ausência da possibilidade de gerar filhos. Contudo, a
possibilidade de procriação ou sua ausência não pode ser levada em consideração
para a concessão de tutela constitucional. Sendo assim, “a identidade sexual não
serve de justificativa para que seja buscado qualquer outro ramo do direito que não
o do direito das famílias” (DIAS, 2013, p. 209). Na atualidade, a celebração do ca-
samento ou a diferença de sexo do par não mais identifica a família, passando esta a
ser definida pelos laços de afetividade e os projetos de vida em comum (DIAS, 2010,
p. 42). Desta forma, caracterizados os laços de afetividade, o animus de constituir
família, a estabilidade e a comunhão plena de vida, bem como a publicidade da
entidade, resta configurada e reconhecida a entidade familiar.

3.2. Reconhecimento da União Homoafetiva como Entidade Familiar


Foi no âmbito do Judiciário que as relações homoafetivas começaram a ter
reconhecimento. A Constituição Federal deixou de prestar proteção somente às
120 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

famílias matrimonializadas, reconhecendo também as relações afetivas fora do


casamento, trazendo o conceito de entidade familiar. A união estável entre um ho-
mem e uma mulher e as famílias monoparentais ganharam proteção constitucional.
O vínculo afetivo passou a ter destaque no cenário das famílias. Salienta a autora
que a “constitucionalização da família implica assegurar proteção ao indivíduo em
suas estruturas de convívio, independentemente de sua orientação sexual” (DIAS,
2013, p. 206-207).
Em 5 de maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar duas ações
declaratórias de inconstitucionalidade, reconheceu as uniões homoafetivas como
entidades familiares com os mesmos direitos e deveres das uniões estáveis. À men-
cionada decisão do STF foram conferidos eficácia erga omnes e efeito vinculante,
podendo sua desobediência acarretar uma reclamação diretamente ao STF. A partir
desse marco a jurisprudência começou a admitir a conversão da união homoafetiva
em casamento (DIAS, 2013, p. 212-213).
Como meio de ilustração, colaciona-se o entendimento jurisprudencial edi-
ficado:
“1. Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). Perda
parcial de objeto. Recebimento, na parte remanescente, como ação direta de
inconstitucionalidade. União homoafetiva e seu reconhecimento como instituto
jurídico. Convergência de objetos entre ações de natureza abstrata. Julgamento
conjunto. Encampação dos fundamentos da ADPF 132/RJ pela ADI 4.277/DF,
com a finalidade de conferir ‘interpretação conforme a Constituição’ ao art.
1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação. 2. Proibição de
discriminação das pessoas em razão do sexo, seja no plano da dicotomia homem/
mulher (gênero), seja no plano da orientação sexual de cada qual deles. Proibição
do preconceito como capítulo do constitucionalismo fraternal. Homenagem ao
pluralismo como valor sociopolítico-cultural. Liberdade para dispor da própria
sexualidade, inserida na categoria dos direitos fundamentais do indivíduo, ex-
pressão que é da autonomia de vontade. Direito à intimidade e à vida privada.
Cláusula pétrea. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou
implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica.
Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal,
por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de ‘promover o bem
de todos’. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do
sexo dos indivíduos como saque da kelseniana ‘norma geral negativa’, segundo
a qual ‘o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridica-
mente permitido’. Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta
emanação do princípio da ‘dignidade da pessoa humana’: direito à autoestima no
mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade.
Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à
liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade
das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e
da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula
pétrea. 3. Tratamento constitucional da instituição da família. Reconhecimento
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 121

de que a Constituição Federal não empresta ao substantivo ‘família’ nenhum


significado ortodoxo ou da própria técnica jurídica. A família como catego-
ria sociocultural e princípio espiritual. Direito subjetivo de constituir família.
Interpretação não reducionista. O caput do art. 226 confere à família, base da
sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da
família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico,
pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por
casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-
se da expressão ‘família’, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem à
formalidade cartorária, à celebração civil ou à liturgia religiosa. Família como
instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas,
mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica.
Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos
fundamentais que a própria Constituição designa por ‘intimidade e vida privada’
(inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que
somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à for-
mação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente,
de que tudo o mais é conteúdo. (...) A Constituição não interdita a formação de
família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe
nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo
interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub
judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não equipa-
ração jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do § 2º do art.
5º da Constituição Federal a evidenciar que outros direitos e garantias, não

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


expressamente listados na Constituição, emergem ‘do regime e dos princípios
por ela adotados’, verbis: ‘Os direitos e garantias expressos nesta Constituição
não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou
dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte’.
5. Divergências laterais quanto à fundamentação do acórdão. Anotação de que
os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar Peluso convergiram
no particular entendimento da impossibilidade de ortodoxo enquadramento
da união homoafetiva nas espécies de família constitucionalmente estabele-
cidas. Sem embargo, reconheceram a união entre parceiros do mesmo sexo como
uma nova forma de entidade familiar. Matéria aberta à conformação legislativa,
sem prejuízo do reconhecimento da imediata autoaplicabilidade da Consti-
tuição. 6. Interpretação do art. 1.723 do Código Civil em conformidade com
a Constituição Federal (técnica da ‘interpretação conforme’). Reconhecimento
da união homoafetiva como família. Procedência das ações. Ante a possibilidade
de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723
do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utiliza-
ção da técnica de ‘interpretação conforme a Constituição’. Isso para excluir
do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento
da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como
família. Reconhecimento que há de ser feito segundo as mesmas regras e com
as mesmas consequências da união estável heteroafetiva.” (grifos inexistentes
122 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

no original) (ADI 4.277, Rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, j. 05.05.2011,
DJe-198 Divulg 13.10.2011 Public 14.10.2011 Ement Vol-02607-03 PP-00341
RTJ Vol-00219- PP-00212) (BRASIL, STF, 2011)
Inclusive, insta relatar que a Lei Maria da Penha, Lei nº 11.340/06, em seu art.
2º, ampliou o conceito de família, abarcando neste as uniões homoafetivas. Conforme
menciona Leonardo Barreto Moreira Alves, “a entidade familiar ultrapassa os limites
da previsão jurídica para abarcar todo e qualquer agrupamento de pessoas em que
permeie o elemento afeto” (apud DIAS, 2013, p. 216). Alves ensina ainda que, “no
momento em que as uniões de pessoas do mesmo sexo estão tuteladas na lei de
combate à violência doméstica, isso significa que são reconhecidas como uma famí-
lia, encontrando-se sob a égide do direito das famílias” (apud DIAS, 2013, p. 216).
A ausência de lei que regulamente as uniões homoafetivas não é impedimento
para sua existência, até por que a Constituição em momento algum veda o relacio-
namento entre pessoas do mesmo sexo. Desta forma, preenchidos os requisitos de
afetividade, estabilidade e ostensibilidade e tiverem a finalidade de constituição de
família, as uniões homoafetivas devem ser reconhecidas como entidades familiares
constitucionalmente protegidas (LÔBO, 2010, p. 84). A união entre duas pessoas
do mesmo sexo é, sim, merecedora de proteção pelo direito das famílias, sendo con-
siderada entidade familiar. Segundo o princípio da igualdade formal, vale lembrar
que os casais homoafetivos são iguais aos heteroafetivos perante a lei, devendo ter
resguardados os seus direitos (CARVALHO, 2011, p. 07).

3.3. Princípios Constitucionais


As relações homoafetivas são uma realidade na sociedade contemporânea, de
modo que não pode o legislador manter-se indiferente a elas, sob pena de afronta aos
princípios da dignidade humana, da liberdade e da igualdade. Tendo em vista todas
as garantias constitucionais deste Estado Democrático de Direito, se faz absoluta-
mente necessária a inclusão de todos os cidadãos sob o manto da tutela jurídica, não
permitindo, assim, a exclusão da homossexualidade do mundo do direito (ABREU
et al., 2014). Conforme menciona Dias em sua obra:
“O compromisso do Estado para com o cidadão sustenta-se no primado
da igualdade e da liberdade, estampado já no seu preâmbulo. Ao conceder
proteção a todos, veda discriminação e preconceitos por motivo de origem,
raça, sexo ou idade e assegura o exercício dos direitos sociais e individuais,
a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos.” (2013, p. 207)
As relações homossexuais sujeitam-se à deficiência da normatização jurídica
e são alvos de discriminação, devendo ser incluídas no rol dos direitos humanos
fundamentais “como expressão de um direito subjetivo que se insere em todas as
suas categorias, pois ao mesmo tempo é direito individual, social e difuso” (DIAS,
2013, p. 175). Na mesma linha de raciocínio assevera Girardi (2005, p. 50),
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 123

“(...) com base no princípio da dignidade da pessoa humana, que as ne-


cessidades humanas no plano da realização da personalidade e, em decorrência
disso, da sexualidade não são isonômicas, e que as uniões homossexuais vão
além do simples fato de se constituírem por pares de mesmo sexo, pois são
uniões que têm sua gênese no afeto, na mútua assistência e solidariedade entre
os pares e, dessa forma, não seria mais possível se deixar de reconhecer efeitos
jurídicos para esse tipo de união.”
Preconiza Venosa (2014, p. 462) que “o princípio da defesa da dignidade
humana é essencial a todo Estado Democrático contemporâneo”. Para assegurar
aos casais homoafetivos observância a seus direitos, o operador do direito necessita
muitas vezes socorrer-se dos princípios constitucionais que impõem o respeito à
dignidade e asseguram o direito à liberdade e à igualdade, pois, apesar da omissão
legislativa já mencionada, não pode o Judiciário abster de manifestar quando pro-
vocado (DIAS, 2013, p. 207).
Complementa a autora afirmando que
“a nenhuma espécie de vínculo que tenha por base o afeto se pode deixar
de conferir status de família, merecedora da proteção do Estado, pois a Consti-
tuição Federal (art. 1º, III) consagra, em norma pétrea, o respeito à dignidade
da pessoa humana.” (DIAS apud TEIXEIRA; RIBEIRO, 2010, p. 133)
Insta mencionar que quando for necessária a utilização dos costumes como
fonte para solucionar a lide e preencher as lacunas legais deverá o operador do
direito observar os costumes atuais, que veem prestando cada vez mais visibilidade

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


aos relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo (DIAS, 2013, p. 207). É assegu-
rado pelo ordenamento jurídico brasileiro o direito à entidade familiar com efetiva
proteção do Estado. Senão observe-se os ensinamentos de Dias:
“(...) ao serem reconhecidas como entidade familiar merecedora da tutela
jurídica as uniões estáveis, que se constituem sem o selo do casamento, tal
significa que o afeto, que une e enlaça duas pessoas, adquiriu reconhecimento
e inserção no sistema jurídico. Houve a constitucionalização de um modelo de
família eudemonista e igualitário, com maior espaço para o afeto e a realização
individual.” (2009, p. 30)
Além do mais, é de notório saber que todos têm direito à liberdade de expressar
seus sentimentos, inclusive na escolha da pessoa com quem deseja constituir uma
família, sendo o princípio da afetividade de grande relevância para o direito das
famílias. Também compete à dignidade da pessoa humana poder dizer que a liber-
dade para dispor da própria sexualidade está amparada nos direitos fundamentais
do indivíduo. Nesse sentido afirma Olga Jubert Gouveia Krell que
“o primeiro dos valores considerados como fundamento para a utilização
dessas técnicas é a liberdade pessoal, que não pode ser interpretada restritiva-
mente; ao contrário, sua extensão é tão ampla, por definição, que seria possí-
vel reconhecer nela a faculdade que toda pessoa possui de autodeterminar-se
fisicamente, o que incluiria a sua própria reprodução.” (2001, p. 103)
124 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Isto posto, é inquestionável concluir que as uniões entre pessoas do mesmo


sexo, ainda que não previstas expressamente na Constituição Federal e na legislação
infraconstitucional, fazem jus à tutela jurídica.

4. REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA HETERÓLOGA EM UNIÕES


HOMOAFETIVAS
Maria Helena Diniz ensina que “o planejamento familiar está vinculado à li-
berdade de decisão de cada casal, que passa a ser responsável não só pelo número de
filhos como também por seu desenvolvimento físico, moral, educacional, de saúde
e de proteção” (2002, p. 133). Dias afirma que, “como qualquer família, as uniões
homoafetivas também têm o direito de consolidar seus vínculos de afeto por meio
de filhos. O direito ao planejamento familiar e à filiação é direito de todos” (DIAS;
REINHEIMER, 2012, p. 31). Para que o mencionado sonho de ter um filho seja
concretizado, o que independe de um necessário contato sexual entre um homem e
uma mulher, duas são as opções disponíveis àqueles que não possuem capacidade pro-
criativa, quais sejam a filiação biológica advinda da reprodução assistida e a adoção.
Ao analisar a Resolução nº 2.121/2015 do Conselho Federal de Medicina,
observa-se que esta assegura a todas as pessoas capazes o direito de ser receptoras
das técnicas de reprodução assistida. O mencionado direito é independente da orien-
tação sexual ou identidade de gênero do casal, devendo os cônjuges ou os parceiros
firmarem o termo de consentimento informado. Surgiu, então, através dos métodos
avançados de reprodução humana assistida, para “aqueles que não podiam procriar
ou assumir seu destino biológico de perpetuação ou mesmo constituir uma família,
que lhe estivesse geneticamente vinculada, a possibilidade de realizar-se através do
papel social de ser pai ou mãe” (SOUZA et al., 2012, p. 419-426).
A reprodução heteróloga proporciona, para os casais homoafetivos que são
naturalmente inférteis, a chance de constituírem sua própria família, quando não há
possibilidade de ambos serem pais biológicos da mesma criança (DIAS; REINHEI-
MER, 2012, p. 32). De acordo com Dias, “a inseminação artificial, como técnica de
reprodução humana assistida, importa na substituição da relação sexual, na qual
ocorreria fecundação, pela união do sêmen ao óvulo, mediante processo auxiliar
reprodutivo” (DIAS; REINHEIMER, 2012, p. 32). Vislumbrada como uma tangível
opção nos casos de esterilidade ou inviabilidade de procriação por vias naturais, a
reprodução humana assistida independente da configuração familiar, devendo ser
ponderada e bem planejada (SAPKO, 2011, p. 80).
Depreende-se da leitura da Resolução do Conselho Federal de Medicina já
mencionada que todas as pessoas capazes, que tenham solicitado o procedimento
e cuja indicação não se afaste dos limites desta resolução, podem ser receptoras
das técnicas de reprodução assistida, desde que os participantes estejam de inteiro
acordo e devidamente esclarecidos, conforme legislação vigente. É permitido o uso
das técnicas de reprodução assistida para relacionamentos homoafetivos e pessoas
solteiras, respeitado o direito à objeção de consciência por parte do médico, sendo
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 125

também permitida a gestação compartilhada em união homoafetiva feminina em


que não exista infertilidade (BRASIL, CFM, 24.09.2015).
Conforme preconiza Dias, “a inseminação recebe o nome de heteróloga sem-
pre que o material genético é doado por uma terceira pessoa, geralmente anônima.
Trata-se da constituição de uma parentalidade socioafetiva” (DIAS; REINHEIMER,
2012, p. 32). A realização da reprodução assistida homóloga se dá por casais hete-
rossexuais com o sêmen proveniente do próprio marido ou companheiro. Já no que
se refere à reprodução assistida heteróloga, na qual o material genético envolvido é
de terceiro, tem-se mais controvérsia (FERRAZ, 2011, p. 42).
No caso de casais femininos, a decisão consiste na “escolha de qual delas le-
vará a gestação a termo”. Assim, submete-se “uma das companheiras à inseminação
artificial”, sendo possível “a utilização do próprio óvulo ou do material genético
da companheira” (DIAS; REINHEIMER, 2012, p. 32). No que se refere aos casais
masculinos, utiliza-se “a técnica de gravidez por substituição”, popularmente co-
nhecida como “barriga de aluguel”. Neste caso, “eles escolhem qual será o doador
de sêmen e quem irá gerar a criança. Podem optar em utilizar o material genético
de ambos, com o intuito de não saberem quem é o pai biológico do filho” (DIAS;
REINHEIMER, 2012, p. 32).
No tocante à reprodução assistida heteróloga em uniões homoafetivas,
“o Judiciário tem se posicionado em relação à matéria, ainda que ex-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


cepcionalmente, por meio de sentenças pontuais e decisões judiciais como
as relatadas a seguir. A primeira decisão judicial dessa natureza no Brasil foi
proferida pelo juiz da 1ª Vara de Família e Registro Civil de Pernambuco, Dr.
Clicério Bezerra e Silva, em 2012, com ampla repercussão midiática. A sentença
autorizou o registro civil de um filho proveniente de inseminação artificial com
dupla paternidade e transformou-se em um caso jurisprudencial emblemático,
referência para decisões judiciais subsequentes. O casal homoafetivo em ques-
tão acionou o Judiciário com o objetivo de abrir o processo de assentamento
de nascimento de uma menor, concebida por meio de reprodução assistida
heteróloga na condição de filha dos requerentes, ambos do sexo masculino. De
acordo com o que consta na sentença, o magistrado do Tribunal de Justiça do
Estado de Pernambuco fundamentou sua decisão em alguns princípios cons-
titucionais, sendo possível também evocar a tutela estatal à nova formatação
de entidades familiares e o direito à homoparentalidade.” (SILVA, 2014, p. 57)
Desta forma, conforme exposto anteriormente, no caso dos casais homoafetivos
masculinos deverá o casal valer-se da reprodução assistida heteróloga como forma de
realização do desejo de ter filhos, tendo em vista sua natural infertilidade. Para que
isso se concretize, deverão utilizar-se do útero de sub-rogação, também conhecido
como útero de substituição, para possibilitar a gestação da criança.
126 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

4.1. Sobre a Gestação de Substituição


A utilização do “procedimento do útero de substituição consiste em um acordo,
no qual a mãe de substituição gera a criança e quando esta nasce é entregue à mulher
solicitante” (ARAÚJO; CABRAL, 2013, p. 50). A gestação com útero de substituição
deve observar algumas regras e restrições, sendo permitida nas hipóteses em que
exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação da doadora
genética ou em caso de união homoafetiva. Há também uma limitação de idade da
candidata à gestação em 50 anos, sendo obrigatória a produção do termo de con-
sentimento informado em todos os casos (BRASIL, CFM, Resolução nº 2.116, de
2015). É vedada a utilização do útero de sub-rogação simplesmente para evitar os
desconfortos e inconvenientes normais de uma gravidez. Insta ressaltar que “a doa-
ção temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial” (QUEIROZ;
MENDES, 2013), o que consequentemente gera insegurança ao casal solicitante no
tocante à entrega da criança. Inclusive, afirma Silvia da Cunha Fernandes (2003,
p. 100) que, “atualmente, o contrato de substituição do útero não é aceito, é con-
siderado nulo, tendo em vista que a substância humana é um bem incomerciável”.
Além da vedação à exploração comercial do útero de substituição, insta destacar
que tal procedimento deve observar outras regras, como, por exemplo, a determina-
ção do grau de parentesco entre a mãe de substituição e o casal solicitante que deve
ser de até quarto grau. Os demais casos estão sujeitos à autorização do Conselho
Federal de Medicina. Menciona Silvia da Cunha Fernandes (2003, p. 100) que a
limitação referente ao parentesco se dá para evitar que ocorra a gestação onerosa do
útero, ou seja, uma exploração comercial, estando as partes, nas situações de paren-
tesco permitida pela Resolução, ligadas por laços familiares. O parentesco existente
entre a mãe solicitante e a mulher que gestará a criança também tem o condão de
diminuir os casos de arrependimento da gestante.
Vejam-se as limitações estabelecidas na mencionada Resolução:
“VII – SOBRE A GESTAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO (DOAÇÃO TEMPO-
RÁRIA DO ÚTERO)
As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técni-
cas de RA para criarem a situação identificada como gestação de substituição,
desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação
na doadora genética ou em caso de união homoafetiva.
1 – As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família de um
dos parceiros num parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau
– mãe; segundo grau – irmã/avó; terceiro grau – tia; quarto grau – prima), em
todos os casos respeitada a idade limite de até 50 anos.
2 – A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou
comercial.
3 – Nas clínicas de reprodução os seguintes documentos e observações
deverão constar no prontuário do paciente:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 127

3.1 – Termo de consentimento livre e esclarecido informado assinado


pelos pacientes e pela doadora temporária do útero, contemplando aspectos
biopsicossociais e riscos envolvidos no ciclo gravídico-puerperal, bem como
aspectos legais da filiação;
3.2 – Relatório médico com o perfil psicológico, atestando adequação
clínica e emocional de todos os envolvidos;
3.3 – Termo de Compromisso entre os pacientes e a doadora temporária
do útero (que receberá o embrião em seu útero), estabelecendo claramente a
questão da filiação da criança;
3.4 – Garantia, por parte dos pacientes contratantes de serviços de RA, de
tratamento e acompanhamento médico, inclusive por equipes multidisciplina-
res, se necessário, à mãe que doará temporariamente o útero, até o puerpério;
3.5 – Garantia do registro civil da criança pelos pacientes (pais genéticos),
devendo esta documentação ser providenciada durante a gravidez;
3.6 – Aprovação do cônjuge ou companheiro, apresentada por escrito, se
a doadora temporária do útero for casada ou viver em união estável.”
O processo para a utilização do útero sub-rogado geralmente se dá com a cele-
bração de um acordo, intermediado por um advogado. É celebrado um contrato que
obrigatoriamente deve ser especificado, mencionando a guarda do filho ou filhos e
as relações parentais, as garantias médicas, as avaliações físicas e psicológicas dos
pais e da mãe de substituição, entre outras informações. O advogado nessa situação
deverá explicar, detalhadamente, os possíveis riscos legais e as incertezas decorrentes

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


da matéria objeto do contrato, salientando as consequências possíveis resultantes
de uma violação material do acordo feito pelas partes (QUEIROZ; MENDES, 2013).
Existem três possibilidades mais comuns de maternidade de substituição, a
saber:
“a) A ‘maternidade de substituição’, que envolve o embrião resultante de
óvulo e de espermatozoide do casal, com sua implantação no corpo de outra
mulher que não aquela que deseja a maternidade e forneceu seu óvulo;
b) A ‘maternidade de substituição’ que se relaciona ao óvulo e à gravidez
da mulher que não quer ser mãe da criança, mas empresta seu corpo gratui-
tamente para gestar o embrião, e se compromete a entregar a criança ao casal
solicitante, sendo que o sêmen utilizado na procriação foi o do marido que
resolveu, juntamente com sua esposa, efetivar o projeto parental;
c) A ‘maternidade de substituição’ que consiste no embrião formado a
partir da união de óvulo da própria mulher que engravida e de espermatozoide
de doador, com o compromisso da mulher de entregar a criança ao casal que
não contribuiu, por sua vez, com material fecundante.” (GAMA, 2008, p. 374)
No caso da utilização da “maternidade de substituição” descrita no item a, o
casal solicitante, que desejou a gravidez, é biologicamente genitor da criança, estando
amparado pela verdade genética e pela verdade afetiva. Na “maternidade de substi-
128 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

tuição” descrita no item b “não existe relação biológica entre a mulher que deseja
o filho e a criança”, somente parentesco biológico da criança com o pai solicitante.
Já no terceiro caso, descrito no item c, a relação entre o casal solicitante e a criança
seria apenas afetiva, tendo em vista não haver entre eles qualquer relação biológica
(ARAÚJO; CABRAL, 2013, p. 48-49).
A autora Josiane Jung Martins descreve a técnica nas seguintes palavras:
“Nesta técnica requer-se a presença de uma terceira pessoa na relação
para assegurar a gestação quando o útero materno não desenvolve normal-
mente o óvulo fecundado ou quando a gravidez pode apresentar risco para
a mãe genética. Para a realização da gravidez por substituição, é necessária a
utilização de inseminação artificial e fecundação in vitro, que fecundam o óvulo
da mãe biológica (ou até mesma da mãe substituta) com o espermatozoide do
pai biológico (que também pode ser doador anônimo), eliminando, assim, a
necessidade do ato sexual. As possíveis causas necessárias para adotar a técnica
da mãe de substituição são: infertilidade vinculada a uma ausência (congênita
ou adquirida) de útero, uma patologia uterina de qualquer tratamento cirúrgico
ou contraindicações médicas a uma eventual gravidez. Não importa a causa,
uma anomalia de nascença ou a consequência de um problema grave descoberto
na idade adulta que provocou o ‘problema’ no útero, a sanção para a mulher é
severa: absoluta impossibilidade de levar a termo uma gestação.” (2008, p. 14)
Vale recordar que o útero de substituição deve ser utilizado “como recurso
derradeiro, quando todos os demais tratamentos disponíveis tenham se tornado
inócuos para a solução daquele caso de esterilidade” (FERNANDES, 2003, p. 100).

4.2. Sub-Rogação do Útero em Uniões Homoafetivas


Ao analisar a Resolução do Conselho Federal de Medicina verifica-se que esta
já permite “a utilização da técnica de reprodução assistida para pessoas solteiras e
casais homoafetivos, por força das decisões do Supremo Tribunal Federal na ADI
4.277 e na ADPF 132”, que conferiram à união estável homoafetiva qualificação de
entidade familiar (QUEIROZ; MENDES, 2013).
Até por que a própria Constituição Federal de 1988, em seu art. 226, § 7º, ga-
rante o direito ao planejamento familiar e a observância dos princípios da dignidade
da pessoa humana, da paternidade responsável e do melhor interessa da criança.
O diploma legal supramencionado também estabelece igualdade entre os filhos e
reconhece a existência de novos grupos de família, conferindo grande importância
ao princípio da afetividade. Conforme leciona Gama:
“No segmento da filiação (e, obviamente, da paternidade e da materni-
dade) é de fundamental importância identificar o projeto parental que o casal
(heterossexual ou homossexual) decidiu concretizar. O Estado não pode in-
terferir na decisão do casal quanto à titularidade e ao exercício do direito ao
planejamento familiar. As técnicas de reprodução assistida cumprem o papel
de auxiliar na solução de dificuldades ou impossibilidade de reprodução hu-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 129

mana, facilitando o processo reprodutivo quando outras técnicas terapêuticas


se revelaram ineficazes ou inapropriadas.” (2013, p. 03)
O útero de substituição é uma das soluções através da qual a mãe ou o ca-
sal impossibilitado de ter filhos realize o desejo da maternidade/paternidade. É
um procedimento em que há cooperação de um terceiro, denominado de mãe de
substituição, para a consumação da gestação, tendo em vista a existência de uma
impossibilidade absoluta de o casal engravidar. Na reprodução assistida heteróloga
em casais homoafetivos masculinos, dois homens conviventes e companheiros
recorrem a uma mulher, que deverá observar as regras previstas na resolução que
regulamenta o assunto, e esta se dispõe a gerar em seu útero um filho cujo gameta
contém o sêmen de um deles e um óvulo doado para que quando do nascimento da
criança esta mulher a entregue ao casal solicitante (dois pais).
Desta forma, é de fácil percepção que o cenário para os homens homoafetivos
é bem mais complicado, tendo em vista que dependem dos óvulos de uma doadora
desconhecida e da gestação do útero de uma parente próxima até o quarto grau
(primeiro grau – mãe; segundo grau – irmã/avó; terceiro grau – tia; quarto grau –
prima), que nem sempre aceita gerar a criança. Segundo Krell,
“em suma, pode-se afirmar que o desejo compreensível de gerar seus
próprios filhos com o fito de constituir uma família com prole, aliado ao pla-
nejamento familiar adequado às necessidades do casal, é fator elementar que
justifica o pretenso direito fundamental à reprodução assistida.” (2001, p. 109)
Resta evidente a complexidade dessa técnica de reprodução assistida heteróloga,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


que pode gerar discussões quanto à filiação, tendo em vista que o filho concebi-
do poderá não ter qualquer relação biológica com os pais solicitantes. Quaisquer
questões que possam vir a ser suscitadas referentes à maternidade de substituição
deverão estar resguardadas necessariamente tanto na dignidade humana da gestante
quanto na do casal solicitante que idealizou o projeto parental, e principalmente na
dignidade humana da criança fruto da reprodução assistida com gestação em útero
de substituição. De acordo com Dias,
“não conceder aos pares homoafetivos acesso às técnicas de reprodução
assistida, além de representar grave retrocesso de ordem jurídica e social, afronta
o princípio da dignidade da pessoa humana. Os homossexuais, como quaisquer
outras pessoas, têm o direito de se tornarem pais e mães, de realizar o sonho
de ter filhos, de exercer, com autonomia e liberdade, o direito de deliberarem
sobre o seu corpo e sobre o seu projeto parental, pois a dignidade da pessoa
humana é a de pessoa, em qualquer dos gêneros.” (2011, p. 175)
A Resolução nº 2.121/2015, que regulamenta o assunto, “por ter caráter de-
ontológico, não ter força de lei, não implicar em nenhuma sanção (sem coerção),
revela-se ainda uma norma precária no intuito de suprir a ausência de disposições
legais” (PEDROSO, 2013, p. 08). A ausência de normatização provoca no meio
jurídico diversas discussões, ocasionando uma insegurança àqueles que visualizam
esta técnica como a única possibilidade de realizar o sonho de ter um filho. Assim,
130 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

é absolutamente necessário que os legisladores regulamentem as técnicas de repro-


dução assistida e a utilização do útero sub-rogado.
Com a possibilidade da doação temporária do útero para proporcionar aos
casais homoafetivos a realização do sonho de ter filhos, os avanços científicos e a
difusão dos métodos de reprodução assistida, consagrou-se um novo sistema de
filiação, que tem como base a verdade socioafetiva, ocorrendo, então, o fenômeno
da “desbiologização” das relações paterno-filiais.

5. REGISTRO CIVIL DA CRIANÇA – HOMOPARENTALIDADE


Tendo em vista todos os meios de reprodução contemplados na atualidade,
não cabe mais continuar buscando a definição da paternidade na identificação da
verdade genética. O Judiciário, ao ser provocado a se manifestar, sobre o assunto,
deve atender aos cânones constitucionais e aos ditames do Estatuto da Criança e
do Adolescente. Esclarece Dias que a paternidade passou a ser reconhecida pela
identificação da posse do estado de filho e que
“a facilidade de descobrir a verdade genética, com significativo grau de
certeza, desencadeou uma verdadeira corrida na busca da verdade real, atro-
pelando a verdade jurídica, definida muitas vezes por meras presunções legais.
À justiça coube a tarefa de definir o vínculo paterno-filial quando a estrutura
familiar não reflete o vínculo de consanguinidade. No confronto entre a ver-
dade biológica e a realidade vivencial, a jurisprudência passou a atentar ao
melhor interesse de quem era disputado por mais de uma pessoa. Prestigiando
o comando constitucional, que assegura com absoluta prioridade o interesse
de crianças e adolescentes, regra exaustiva e atentamente regulamentada pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente, passaram os juízes a investigar quem a
criança considera pai e quem a ama como filho. O prestígio à afetividade fez
surgir uma nova figura jurídica, a filiação socioafetiva, que acabou se sobre-
pondo à realidade biológica.” (artigo sem paginação)
É imprescindível destacar que “o afeto que se estabelece entre o casal solici-
tante e a criança que está sendo gestada em útero de outra mulher é o elemento
caracterizador do vínculo de filiação, pois o afeto é apto a estabelecer o parentesco”,
devendo ser levado em consideração para solução de possíveis conflitos que venham
a surgir (ARAÚJO; CABRAL, 2013, p. 52).
Após o nascimento da criança advinda das técnicas de reprodução assistida
heteróloga com a utilização do útero sub-rogado é que surgem os maiores proble-
mas legais, pois tem-se a mãe substituta que foi quem gestou a criança e os pais
que concederam o material genético. Os questionamentos referentes à maternidade
surgem, pois “para muitos a verdadeira mãe é aquela que concebeu o bebê, e não
quem forneceu o material genético”. Tal problemática também “acontece com o
pai, pois se a lei diz que presume-se pai o esposo da mulher que gerou e concebeu
a criança, logo, o pai será o marido daquela que carregou durante nove meses o
feto” (PEREIRA, 2012).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 131

É importante tratar do registro de nascimento da criança. Assevera Dias (2013,


p. 384) que, “utilizadas as modernas técnicas de reprodução assistida, como a de-
cisão de ter filhos é do casal, é necessário assegurar, quer aos gays, quer às lésbicas,
o direito de proceder ao registro dos filhos no nome do casal”.
Os casais homossexuais não deveriam encontrar qualquer empecilho no
momento do registro, pois é notório o direito de a criança gerada ser reconhecida
por ambos os pais, ainda que sejam pessoas do mesmo sexo, devendo constar na
certidão de nascimento o nome de ambos os pais solicitantes (DIAS; REINHEIMER,
2012, p. 31).
Ensina Dias que, “presentes todos os requisitos para o reconhecimento de
uma filiação socioafetiva, negar sua presença é deixar a realidade ser encoberta pelo
véu do preconceito” (apud PEREIRA, 2004, p. 395). Portanto, deve ser garantida
à família homoafetiva a proteção constitucional de tal modo a possibilitar o seu
planejamento familiar, assim como qualquer outro tipo de família, assegurando seu
direito à filiação. A parentalidade socioafetiva também deve ser respeitada.

5.1. Registro Civil


Atualmente, a questão registral da criança gerada através da utilização das
técnicas de reprodução assistida encontra diversos entraves práticos, sendo neces-
sário que haja uma facilitação no registro, que muitas vezes, devido à ausência de
normatização, necessita de intervenção judicial para resolução (ARAÚJO; CABRAL,
2013, p. 61).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


A dificuldade enfrentada na hora da realização do registro civil de nascimento
da criança reside na medida em que na declaração de “nascido vivo” exigida pelo
RCPN e emitida pelo hospital consta obrigatoriamente o nome da gestante como
mãe, de acordo com disposição prevista no art. 10, inciso IV, da Lei nº 8.069/90
(Estatuto da Criança e do Adolescente), e não o da mãe solicitante, causando óbices
na lavratura da certidão de nascimento com os nomes dos pais solicitantes.
Com a ausência de regulamentação sobre o tema, resta ao magistrado a resolu-
ção dos conflitos referentes à prática da gestação de substituição, devendo observar
ao julgar um caso concreto, visando à justa composição da lide, os princípios do
direito, a ética e a moral, considerando também o melhor interesse da criança.
Insta destacar que, “como o projeto parental teve origem na vontade de am-
bos, aos dois cabem as responsabilidades parentais, com toda a gama de direitos
e deveres para com seus filhos” (DIAS; REINHEIMER, 2012, p. 32). Desta forma,
não reconhecer a dupla maternidade ou paternidade permitindo que um só pai ou
uma só das mães possua vínculo jurídico com o filho é um preconceito que vai de
encontro a tudo aquilo que a justiça vai construindo e também às estruturas fami-
liares contemporâneas.
No Brasil, ressalta Rodrigo da Cunha Pereira que, em decorrência do segredo
de justiça em que tramitam, “é muito difícil ter acesso aos processos para registro
132 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

do nome pelos pais beneficiários do útero de substituição, o pouco que se conhece


é divulgado pela imprensa” (2012).
Atualmente, vem sendo permitido o registro do nascimento em nome dos pais
que forneceram o material genético, ou seja, os pais biológicos, fato comprovado
facilmente através da realização de um exame de DNA e que se dá no caso da repro-
dução assistida homóloga. Nesse caso, “entende-se que os pais devem ser aqueles que
forneceram o material genético para o útero de substituição, pois estes sim possuem
o animus, a vontade de gerar a vida e a produção de um filho” (PEREIRA, 2012). As
maiores dificuldades são encontradas quando se trata de pais beneficiários do útero
de substituição que utilizaram os procedimentos da reprodução assistida heteróloga
e que não estão amparados pela verdade biológica.
Aos casais homoafetivos também vem sendo permitido o registro de filhos
havidos da reprodução assistida, “com precedente na 1ª Vara de Direito De família
e Registro Civil da Comarca de Recife, com sentença que concebeu o direito a dois
homens”, que viviam em união estável por cerca de 15 anos e que posteriormente
fora convertida em casamento civil, “para que registrassem em seus nomes a filha
advinda de gestação de substituição, utilizando o material genético de um deles”
(PEREIRA, 2012).
Faz-se necessário que o operador do direito compreenda que, ao aplicar a lei
ao caso concreto, “não somente nos casos heterossexuais são possíveis o registro do
menor e o reconhecimento da filiação, os casais homossexuais também são protegidos
e lhes é assegurado tal direito” (PEREIRA, 2012).
Há localidades em que o assunto já fora regulamentado através de portaria,
como, por exemplo, em Santos/SP, que na primeira semana de outubro deste ano
de 2015 editou uma portaria que beneficia os casais homoafetivos, proporcionando
a facilitação do registro dos bebês advindos da reprodução assistida. Desta forma,
esses casais não precisarão mais ir à justiça para registrar seus nomes nas certidões
dos filhos. Na mencionada portaria, já em vigor, “o juiz corregedor dos Cartórios de
Registro Civil da Comarca de Santos, Frederico dos Santos Messias, considera que
o registro de nascimento homoparental decorrente de reprodução assistida atende
ao princípio da dignidade da pessoa humana” (QUEIRÓZ, 2015). O assento de
nascimento homoparental, como prevê a portaria, independe do nome da genitora
constante da Declaração de Nascido Vivo.
É nítida a necessidade de regulamentação da utilização do útero de substituição
para evitar, assim, os conflitos oriundos de sua adoção, principalmente no que diz
respeito ao registro de nascimento da criança advinda dos métodos de reprodução
assistida. Além do mais, a evolução e a mudança científica devem ser acompanhadas
pela mudança legislativa. A regulamentação da temática, além de proporcionar maior
segurança aos beneficiários desse método de reprodução assistida, colaboraria para
coibir abusos e garantir a dignidade das partes envolvidas, cuja garantia dos direitos
deve ser tutelada pelo Estado.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 133

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo analisou a utilização do útero sub-rogado pelos casais ho-
moafetivos, que se valem das técnicas de reprodução humana assistida como forma
de realizar o desejo de ter filhos, abordando, inclusive, a necessidade da facilitação
do registro civil da criança advinda dessas técnicas de reprodução assistida. Este
estudo foi de grande relevância jurídica, pois constatou-se que o direito à filiação
também deve ser garantido aos casais homoafetivos que, como entidades familiares,
também fazem jus à tutela jurídica, não devendo ser afastados do mundo do direito.
A inseminação artificial homóloga ocorre quando se utiliza gametas de pessoas
diretamente envolvidas na concepção, ou seja, o material genético utilizado para
o procedimento pertence ao casal solicitante. Já a inseminação artificial heteróloga
ocorre quando o gameta utilizado para inseminação é de uma terceira pessoa que
não o casal solicitante, podendo, inclusive, ser utilizado material genético de duas
pessoas estranhas aos futuros pais.
A utilização do útero sub-rogado consiste em um acordo, no qual a mãe de
substituição gera a criança e quando esta nasce é entregue ao casal solicitante. No
que se refere a sua utilização pelos casais homoafetivos masculinos, esta se apresenta
como uma solução à infertilidade natural existente. Vale ressaltar que tal proce-
dimento, atualmente, deve observar algumas restrições previstas na resolução do
CFM que regulamenta o assunto. É vedada a exploração comercial do útero e deve
o operador do direito, sempre que se deparar com um caso concreto, observar os
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e os direitos à liberdade

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


e à igualdade.
Constata-se que a ausência de normatização sobre o assunto, tanto no que se
refere aos procedimentos de reprodução assistida como na utilização do útero de
substituição, tem sido um problema recorrente que acaba por ser solucionado, na
maioria das vezes, somente no Judiciário. Ainda, muito embora não haja regula-
mentação no ordenamento jurídico brasileiro, o magistrado, ao ser provocado, não
poderá manter-se inerte.
Por fim, chega-se à compreensão de que não deve ser negado aos casais ho-
moafetivos o direito à filiação, pois, apesar de não haver normas jurídicas que regu-
lamentem o assunto, deve-se observar os princípios constitucionais que garantem,
também a essa entidade familiar, proteção jurídica.

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DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


CABIMENTO DE AÇÕES COLETIVAS PARA A
ALTERAÇÃO DE NOMES DE LOGRADOUROS
PÚBLICOS QUE HOMENAGEIAM REPRESENTANTES DA
DITADURA MILITAR

Acir de Matos Gomes


Mestre em Linguística pela Universidade de Franca; Doutorando em Língua
Portuguesa com ênfase em Argumentação e Retórica na PUC-SP;
Especialista em Psicanálise; Professor de Processo Civil e Medicina
Legal na Universidade de Franca.

Fábio Cantizani Gomes


Mestre em Direito pela UNESP-Franca; Professor de Direito Constitucional da
Faculdade de Direito de Franca e da Universidade de Franca.

RESUMO
Pretende-se neste trabalho, partindo dos conceitos de justiça de transição,
direito à verdade e à memória, analisar os modernos princípios do processo coletivo
para concluir se é cabível ou não a alteração de nomes de logradouros públicos que
homenageiam membros da ditadura militar acusados de atos contrários aos direitos
humanos através de ações coletivas.
Palavras-Chave: Ação Coletiva. Logradouros Públicos. Alteração de Nome.
Ditadura Militar.

TITLE: Admissibility of class actions for the change of names of public highways
that pay tribute to representatives of the military dictatorship.
ABSTRACT
Based on the concepts of transitional justice and the right to truth and memory,
this article aims at analyzing modern principles of class procedure to find whether the
change of names of public highways that pay tribute to members of the military dicta-
torship who have been accused of acts contrary to the human rights by means of class
actions is admissible.
Keywords: Class Action. Public Highways. Name Change. Military Dictatorship.

SUMÁRIO
Introdução. 1 Justiça de Transição e o Direito à Memória e à Verdade; 1.1
Justiça de Transição e a Busca da Verdade; 1.2 Direito à Memória e à Verdade. 2
Nomes de Logradouros Públicos; 2.1 Simbologia Presente na Definição de Nomes
de Logradouros Públicos; 2.2 Programa Nacional de Direitos Humanos e Comis-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 139

são Nacional da Verdade; 2.3 Argumentos Contrários à Alteração dos Nomes de


Logradouros; 2.4 Logradouros Públicos e Homenagem à Ditadura; 2.5 Iniciativas
para Alteração dos Nomes de Logradouros que Homenageiam a Ditadura. 3 Ações
Coletivas para Alteração de Nomes de Logradouros Públicos. Considerações Finais.
Referências Bibliográficas.

INTRODUÇÃO
Os principais objetivos de qualquer justiça de transição são a busca pela verdade
e o esclarecimento dos atos atentatórios aos direitos humanos cometidos durante
um período de exceção. Esta busca, além de possibilitar a responsabilização dos
agentes, possui o caráter pedagógico de educar as gerações posteriores numa cultura
democrática e de respeito aos direitos humanos.
As políticas de memória utilizam, dentre outros elementos, o estabelecimento de
espaços que simbolizam e evocam a luta de resistência contra os regimes autoritários.
Uma das práticas mais frequentes destes espaços de memória é a alteração de nomes
de logradouros públicos que homenageiam figuras ligadas aos regimes ditatoriais.
Embora não haja consenso sobre a utilização deste recurso, há recomendação
expressa para sua utilização em nosso país no 3º Programa Nacional de Direitos
Humanos do Governo Federal, de 2009, tendo constado também como recomen-
dação da Comissão Nacional da Verdade, cujo relatório final foi publicado em 2014,
como medida simbólica de rompimento com o passado autoritário e estabelecimento

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


de uma nova sociedade fundamentada nos valores democráticos e de respeito aos
direitos humanos.
Dados apresentados neste trabalho revelam que centenas de logradouros pú-
blicos em nosso país homenageiam membros integrantes do período de ditadura
militar. Vários deles acusados de conivência com a prática de atos violadores dos
direitos humanos em nosso país, tais como a tortura, o assassinato, o desaparecimento
forçado, o estupro, dentre outros atos que vitimaram aqueles que contestavam o
regime de exceção.
Algumas medidas vêm sendo adotadas para a modificação dos nomes destes
logradouros, destacando-se as tentativas de alteração do nome da conhecida ponte
Rio-Niterói, denominada pela Lei nº 5.595/70 de Ponte Presidente Costa e Silva.
O Ministério Público Federal ingressou com ação civil pública para declarar a in-
constitucionalidade da referida Lei que nomeou a ponte, tendo o juiz julgado a ação
extinta sem julgamento de mérito, por considerar o pedido juridicamente impossível.
Pretende-se neste trabalho, partindo dos conceitos de justiça de transição,
direito à verdade e à memória, analisar os modernos princípios do processo coletivo
para concluir se é cabível ou não a alteração de nomes de logradouros públicos que
homenageiam membros da ditadura militar acusados de atos contrários aos direitos
humanos através de ações coletivas.
140 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

1. JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO E O DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE


1.1. Justiça de Transição e a Busca da Verdade
Desde o final da Segunda Guerra Mundial, com o conhecimento das barbáries
praticadas pelo regime nazifascista, surgem as primeiras ideias de criação de meca-
nismos de responsabilização e punição de agentes perpetradores destas atrocidades,
juntamente com a previsão de alguma forma de compensação para as vítimas ou
seus familiares.
A partir da década de 1980 surgem as ideias de se estabelecer uma justiça
de transição para implementar estes objetivos em sociedades pós-conflito em que
tenham ocorrido graves violações aos direitos humanos.
O professor da Universidade de Direito de Nova Iorque e vice-presidente do
Centro Internacional de Justiça de Transição, Paul Van Zyl, conceitua justiça de
transição como os esforços implementados “para a construção da paz sustentável
após um período de conflito, violência em massa ou violação sistemática dos direitos
humanos” (2009, p. 32).
Este mesmo autor, citando um consenso estabelecido pela Corte Interameri-
cana de Direitos Humanos, aponta que são objetivos reconhecidos do Estado, após
um período de graves violações aos direitos humanos, “processar os perpetradores,
revelar a verdade sobre crimes passados, conceder reparações às vítimas, reformar
as instituições perpetradoras de abuso e promover a reconciliação” (2009, p. 34).
Logicamente que as mais graves violações aos direitos humanos, como atos de
tortura, assassinato, violência sexual, perseguições políticas, dentre outros, pratica-
dos por regimes de exceção, costumam ficar mantidas em segredo durante e após o
encerramento dos períodos autoritários. Desse modo, a busca pela verdade dos fatos
que ocorreram nestes períodos constitui peça fundamental para concretizar todos
os demais objetivos de qualquer justiça transicional, como a punição de agentes e
a indenização das vítimas ou seus familiares, além de possuir uma dimensão peda-
gógica, como será tratado no próximo item.

1.2. Direito à Memória e à Verdade


Filósofos, sociólogos e historiadores tentam explicar o fenômeno do cres-
cimento de ideias conservadoras e reacionárias, principalmente em setores mais
jovens da sociedade. As causas apontadas são o crescimento de acesso à internet e
o surgimento das redes sociais, ambiente propício para divulgação de ideias, muitas
vezes, sem fundamento ou com fundamento equivocado, além daquelas carregadas
de preconceito, ódio e desinformação.
Mas a principal causa apontada costuma ser a falta de acesso à informação do
que verdadeiramente ocorreu durante o período de ditadura militar que controlou
nosso país de 1964 a 1985. Em março de 2015, em um seminário realizado no
Instituto de Estudos Avançados da USP, a historiadora Heloísa Starling, professora
da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG e assessora da Comissão
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 141

Nacional da Verdade, fez uma exposição sobre a importância do testemunho como


dispositivo reconstituidor da ditadura militar. A historiadora defendeu a necessidade
do conhecimento e da divulgação dos fatos ocorridos durante o período ditatorial
e alertou para os riscos dos mecanismos de esquecimento utilizados pela sociedade
em um período pós-conflito: “Na avaliação de Starling, esses mecanismos de esque-
cimento ajudam a explicar os pedidos de intervenção militar no Brasil que figuraram
na pauta de reinvindicações das manifestações de junho de 2014 e que voltaram
a aparecer nos protestos subsequentes. Para ela, os indivíduos que levantam essa
bandeira constroem um imaginário do regime militar com base naquilo que lhes falta
e, por isso, experimentam uma nostalgia do que nunca viveram. As pessoas dizem
que querem a ditadura, mas não têm a menor ideia do que querem dizer com isso.
Extravasam com esse pedido um sentimento de impotência e desencanto. Trata-se
de um olhar moralista: ‘não tenho memória sobre o que aconteceu’, observou, desta-
cando a importância de a verdade ser colocada na cena pública” (DOURADO, 2015).
No mesmo sentido o historiador Enrique Serra Padrós, da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, reconhece que a luta pela verdade e pela justiça em socie-
dades que passam por momentos transicionais possui quatro dimensões: histórica,
pedagógica, ética e social (2012, p. 68-71).
Sua dimensão pedagógica seria responsável para promover o encontro de ge-
rações, sendo que “o esclarecimento dos acontecimentos torna-se necessidade vital
e funciona como ação a contrapelo diante de um dos objetivos estratégicos mais
desejados pelos responsáveis e apoiadores das ditaduras de segurança nacional: a
desconexão entre as gerações que viveram sob o cotidiano dos regimes autoritários

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


e as que vieram depois. Tal desconexão se expressa, muitas vezes, no desconheci-
mento geral que essas novas gerações possuem sobre o passado recente, ou através
de um precário e perturbador senso comum. Pode-se dizer que tal constatação é o
resultado, mais do que a ausência de ‘políticas de memória’, da aplicação delibera-
da de ‘políticas de esquecimento’, ou seja, a proposição de ações de ‘esquecimento
induzido’: sonegação de informação, difusão de informações ambíguas, imprecisão
conceitual, relativização da violência irradiada contra a população, apagamento das
responsabilidades pelos crimes estatais e a reafirmação de justificativas como a teoria
dos dois demônios, ou da tese da ditabranda” (PADRÓS, 2012, p. 69-70).
O historiador conclui que esta reconstituição do elo generacional evita que
os jovens do presente sejam reféns da ignorância a respeito dos escabrosos acon-
tecimentos pretéritos e das lutas implementadas contra o regime de exceção, além
de possibilitarem o desenvolvimento de mecanismos de prevenção de eventuais
reversões autoritárias (PADRÓS, 2012, p. 78). Dentro deste contexto, ressalta que
“o desconhecimento e a desvalorização deste passado contribuem para que as no-
vas gerações tenham tido uma formação insuficiente, em termos políticos, tanto
em relação a uma consciência cidadã e ética quanto na exigência intransigente dos
direitos humanos. Desconhecer a importância destes efeitos nos impede de perceber
o significado da desconexão entre gerações. Há uma história dos pais e dos avós que
foi cortada dos filhos e dos netos. O futuro pode reservar momentos de tensão e é
142 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

claro que, caso isso ocorra, a ausência da apropriação dessa experiência social poderá
ser fatal para aqueles que deverão enfrentar esses desafios” (PADRÓS, 2012, p. 80).
A necessidade de amplo conhecimento dos fatos passados, principalmente
aqueles que ocorreram durante períodos autoritários, é unanimidade entre os re-
presentantes das ciências humanas e sociais para que as atuais gerações passem a
conferir maior valor para as instituições democráticas e criem maior consciência
sobre a importância do respeito aos direitos humanos.
Esta busca pela verdade costuma ser desenvolvida através de “políticas de me-
mória”, cujo conceito é abordado por Alexandra Barahona de Brito: “Pode-se definir a
política de memória de duas maneiras. De forma restrita, consiste de políticas para a
verdade e para a justiça (memória oficial ou pública); vista mais amplamente, é sobre
como a sociedade interpreta e apropria o passado, em uma tentativa de moldar o seu
futuro (memória social). Memória social é a criação de ‘comunidades imaginadas’
e a construção de uma ordem moral. As ‘políticas de memória’ sociais e culturais
são parte integral do processo de construção de várias identidades coletivas sociais
e políticas, que definem o modo como diferentes grupos sociais veem a política e
os objetivos que desejam alcançar no futuro. A memória é uma luta sobre o poder
e sobre quem decide o futuro, já que aquilo que as sociedades lembram e esquecem
determina suas opções futuras” (2009, p. 72).
Detalhando melhor o conceito de políticas de memória e relacionando-o com
atitudes práticas voltadas para familiares de desaparecidos políticos e demais vítimas
de regimes ditatoriais, que ainda sentem os efeitos das graves violações de direitos
humanos, Rogério Gesta Leal entende que “a memória aqui opera como condição
de possibilidade à superação destes problemas, compreendendo contextualmente
o ocorrido, já que as feridas se dão em determinado marco histórico. A par disto,
estratégias e políticas de memória usam de recursos locais e mecanismos de enfren-
tamento destas questões, associados a programas com estratégias de reconstrução
identitária e democrática dos vínculos societais. Dentre as ações possíveis, pode-se
destacar: 1) reconstrução do âmbito social e cultural, com a utilização de ativida-
des artesanais, artísticas, educativas, promoção de grupos de autoajuda, grupos de
apoio, etc.; 2) apoio individual e familiar centrado no trabalho em grupo, terapia
individual e familiar, abrindo espaços para que as pessoas possam compartilhar
suas experiências, o que pode ser útil para romper o silêncio; 3) treinamento de
pessoas locais em capacidades de apoio psicossocial para encarar e tratar o impacto
traumático, com apoio e seguimento institucional; 4) grupos de autoajuda, forma-
dos por sobreviventes de conflitos violentos e por familiares dos que morreram ou
desapareceram, gerando espaços seguros e amistosos em que pode haver o compar-
tilhamento de experiências; e 5) importância das formas simbólicas de expressão
do reconhecimento do ocorrido, como cerimônias e rituais, evidenciando ícones
sociais que mantenham vivas as lições dolorosas do passado (memoriais, parques,
placas nas ruas, celebração de aniversários, etc.)” (2012, p. 59).
Historiadores destacam na construção destas políticas de memória a simbologia
presente nos espaços de memória, como no trecho a seguir de Enrique Padrós: “Os
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 143

‘espaços de memória’ abrangem dois grandes conjuntos de modalidades. O primeiro


é associado, de forma geral, aos espaços físicos. Estes, quase sempre, estão marcados
por terem sido lugares de luta e resistência, ou de aplicação das práticas repressivas
do terror de Estado (centros de detenção, de tortura, etc.). (...) A segunda categoria
de ‘espaços de memória’ se relaciona com a ideia de estabelecer ‘marcas’ de eventos ou
de pessoas. Monumentos, nomes de ruas, praças e prédios, museus e até memoriais
compõem este conjunto de registros. Neste caso, os lugares escolhidos podem ter rela-
ção direta com o que se quer registrar ou podem ser alusões figuradas” (2012, p. 75).
Neste sentido, do até aqui exposto, depreende-se que um dos principais ob-
jetivos de qualquer justiça de transição é a busca pela verdade dos fatos ocorridos
durante um determinado período ditatorial, principalmente no tocante às graves
violações aos direitos humanos. Esta busca, além de possibilitar a responsabilização
dos agentes repressores, possui uma dimensão pedagógica de esclarecer as atuais
gerações sobre a verdade dos fatos ocorridos e de promover uma valorização da
cultura democrática e de respeito aos direitos humanos.
Esta busca pela verdade pode ser implementada através de políticas de memória
que possuem, entre outras finalidades, a de confortar as vítimas e seus familiares,
promovendo, assim, um outro objetivo da justiça de transição, que é a reconciliação
da sociedade. Entre estas políticas, destacam-se a construção de espaços de memória,
tais como monumentos e museus, e a definição de marcas simbólicas, como placas
e nomes de logradouros públicos.

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2. NOMES DE LOGRADOUROS PÚBLICOS
2.1. Simbologia Presente na Definição de Nomes de Logradouros Públicos
É incontestável o fato de que a definição de um nome para um logradouro
público, tal como uma rua, avenida, praça, ponte, rodovia, escola, dentre outros,
constitui-se em homenagem ou reconhecimento pelas contribuições prestadas à
comunidade, no caso de pessoa, ou pode representar a necessidade de se promover
determinados valores caros a esta comunidade (p. ex., “Rua da Justiça”, “Palácio da
Liberdade”), ou promover a lembrança de datas históricas importantes (“Avenida
Sete de Setembro”, “Rua Treze de Maio”).
O historiador Reginaldo Benedito Dias, da Universidade Estadual de Maringá,
ensina sobre a nominação de logradouros públicos: “Trata-se de recorrente meca-
nismo de construção da memória histórica, visto que se elege um personagem ou
um fato para ser perenizado na lembrança coletiva (DIAS, 2000). Dependendo da
abrangência do nome que será estampado na placa, investe-se na composição da
memória municipal ou nacional: ‘é na disputa pela definição de datas, símbolos e
cerimônias comemorativas que começa a se delinear o caráter culturalmente arbi-
trário, histórico, social e politicamente construído da nação’ (CATELA, 2001, p.
206). (...) batizar um espaço público é uma das possibilidades de que o objeto da
homenagem não venha a ser completamente esquecido fora dos círculos especiali-
zados. Uma vez formalizada, ela tem o potencial de incorporar fatos e personagens
144 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

históricos em dados da vida cotidiana: ‘os elementos da paisagem urbana e sua


visualidade permitem que os transeuntes interpretem, no campo simbólico ou cog-
nitivo, imagens, memórias e histórias da cidade ou do país’ (PELEGRINI, 2008, p.
218)” (DIAS, 2012, p. 161-162).
Reginaldo Dias ainda destaca que constitui prática comum a alteração de no-
mes dos logradouros públicos após períodos revolucionários ou de grande ruptura
política, simbolizando as transformações ocorridas em determinada comunidade e
a adoção de novos valores: “Rupturas históricas são pródigas na promoção de no-
vos símbolos. A incidência do ato de batizar logradouros públicos é uma extensão
da composição de um imaginário social coerente com o horizonte das mudanças.
Em revoluções e grandes reviravoltas históricas, é comum constatar até a mudança
de nomes de cidades. Ao contrário do que concebe o senso comum, o passado se
modifica. Não, evidentemente, o ocorrido, mas o que se sabe e como se interpreta o
que aconteceu. Isso leva a disputa pela memória a se reproduzir em todos os meios,
incluindo os nomes de ruas. Essa revisão de sentidos e de referências faz parte, não
há dúvida, da luta social pelo presente e de sua relação com um passado vivo. A
memória é, afinal, o suporte da identidade” (DIAS, 2012, p. 162).

2.2. Programa Nacional de Direitos Humanos e Comissão Nacional da Verdade


Esta prática simbólica de mudança de nomes de logradouros públicos que ho-
menageiam representantes da ditadura militar já estava prevista para que ocorresse
desde o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos do Governo Federal, de 2009,
tendo constado também como recomendação da Comissão Nacional da Verdade,
cujo relatório final foi publicado em 2014.
Em 2008 foi elaborado o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-
3), fruto de várias reuniões em todos os estados brasileiros, entre representantes do
governo e da sociedade civil, envolvidos na defesa dos direitos humanos. Foram, ao
todo, 137 encontros com a participação de mais de 14 mil pessoas que culminaram
com a 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos e a divulgação do PNDH-3,
que ingressou em nosso ordenamento jurídico através do Decreto nº 7.037, de 21
de dezembro de 2009 (PROGRAMA, 2010).
O PNDH-3 está estruturado em seis eixos orientadores, subdivididos em 25
diretrizes, 82 objetivos estratégicos que incorporam ou refletem os sete eixos, as 36 di-
retrizes e as 700 resoluções da 11ª CNDH. Entre estas diretrizes consta a de número 25:
“Diretriz 25: Modernização da legislação relacionada com a promoção do
direito à memória e à verdade, fortalecendo a democracia.Objetivo Estratégico I:
Suprimir do ordenamento jurídico brasileiro eventuais normas remanescentes
de períodos de exceção que afrontem os compromissos internacionais e os
preceitos constitucionais sobre Direitos Humanos.
Ações Programáticas:
a) Criar Grupo de Trabalho para acompanhar, discutir e articular, com o
Congresso Nacional, iniciativas de legislação propondo:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 145

– revogação de leis remanescentes do período 1964-1985 que sejam


contrárias à garantia dos Direitos Humanos ou tenham dado sustentação a
graves violações;
– revisão de propostas legislativas envolvendo retrocessos na garantia dos
Direitos Humanos em geral e no direito à memória e à verdade.
(...)
b) Propor e articular o reconhecimento do status constitucional de ins-
trumentos internacionais de Direitos Humanos novos ou já existentes ainda
não ratificados.
(...)
c) Fomentar debates e divulgar informações no sentido de que logradouros,
atos e próprios nacionais ou prédios públicos não recebam nomes de pessoas iden-
tificadas reconhecidamente como torturadores. (Redação dada pelo Decreto nº
7.177, de 12.05.2010).” (grifo nosso) (PROGRAMA, 2010)
Um dos principais aspectos inerentes a uma justiça de transição, em 2011, a
Lei nº 12.528 criou no Brasil a Comissão Nacional da Verdade, com a finalidade de
examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no perío-
do de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição (<http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm – adctart8>), a fim
de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação
nacional (CONHEÇA, 2014).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


Ao longo de dois anos e sete meses de trabalho, 1.121 depoimentos, mais de
80 audiências públicas em 20 estados brasileiros, os membros da CNV elaboraram
um relatório final, composto de três volumes, com mais de três mil páginas. Apurou
graves violações aos direitos humanos praticados durante o período da ditadura
militar por integrantes do regime, tais como a prática de tortura, violência sexual,
execuções, ocultações de cadáveres e desaparecimentos forçados (CONHEÇA, 2014).
O primeiro volume do relatório enumera as atividades realizadas pela CNV
na busca pela verdade, descreve os fatos examinados e apresenta as conclusões e
recomendações dos membros da CNV para que os fatos ali descritos não voltem a se
repetir. Dentre estas recomendações, consta a de número 28, nos seguintes termos:
“[28] Preservação da memória das graves violações de direitos humanos
48. Devem ser adotadas medidas para preservação da memória das graves
violações de direitos humanos ocorridas no período investigado pela CNV
e, principalmente, da memória de todas as pessoas que foram vítimas dessas
violações. Essas medidas devem ter por objetivo, entre outros:
a) preservar, restaurar e promover o tombamento ou a criação de marcas
de memória em imóveis urbanos ou rurais onde ocorreram graves violações
de direitos humanos;
b) instituir e instalar, em Brasília, um Museu da Memória.
146 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

49. Com a mesma finalidade de preservação da memória, a CNV propõe


a revogação de medidas que, durante o período da ditadura militar, objetivaram
homenagear autores das graves violações de direitos humanos. Entre outras, devem
ser adotadas medidas visando:
a) cassar as honrarias que tenham sido concedidas a agentes públicos ou
particulares associados a esse quadro de graves violações, como ocorreu com
muitos dos agraciados com a Medalha do Pacificador;
b) promover a alteração da denominação de logradouros, vias de transporte,
edifícios e instituições públicas de qualquer natureza, sejam federais, estaduais ou
municipais, que se refiram a agentes públicos ou a particulares que notoriamente
tenham tido comprometimento com a prática de graves violações.” (grifo nosso)
(CONHEÇA, 2014)

2.3. Argumentos Contrários à Alteração dos Nomes de Logradouros


Conforme já destacado, é de grande importância simbólica a alteração dos
nomes de logradouros e prédios públicos que homenageiam membros do período
ditatorial, como marco da mudança de valores de nossa sociedade. Alteração esta
recomenda no PNDH-3 e no relatório final da CNV. Entretanto, a necessidade desta
prática está longe de atingir unanimidade na sociedade e na própria comunidade
acadêmica.
Dentre os argumentos contrários predominam aqueles que acusam a mudança
dos nomes de constituir política de mera vingança ou justiça de vencedores, além
do fato de poder trazer ainda mais desinformação para as futuras gerações.
“(...) cabe mencionar que a retirada de placas que mencionam nomes de
funcionários vinculados à estrutura do Estado repressivo e antidemocrático
está longe do consenso imaginado, mesmo entre organizações sensíveis à luta
pelos direitos humanos e recuperação da história e da memória. Efetivamente,
trata-se de um tema polêmico: o que se faz com uma marca concreta da re-
pressão? De forma geral, há duas grandes vertentes que defendem argumentos
importantes, mas contrapostos. De um lado, estão os que defendem a retirada
sem contemplações; do outro, os que consideram que não se deve mexer em
algo que já é patrimônio da cidade. Seja como for, ou se muda, ou então se
deve iniciar uma ação educativa que esclareça e qualifique o protagonismo da
mencionada figura (no caso, um articulador do Golpe de 1964 e posterior di-
tador). É necessário ser responsável com essa questão, para evitar que a maior
parte da população, que provavelmente não tem acesso a uma informação mais
refinada, não seja vítima de um emaranhado de palavras imprecisas ou vazias
de significado.” (PADRÓS, 2012, p. 77)
Padrós ainda explica que a manutenção de nomes de ditadores em logradouros
públicos faria a comunidade refletir sobre quais os motivos que teriam levado parte
da sociedade a homenageá-los, concluindo que outro aspecto negativo da mudança
seria o de que os responsáveis pela homenagem a um ditador seriam esquecidos:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 147

“A retirada de um símbolo associado a um período repressivo pode ser solução sim-


plista. A tentativa reparatória de impedir que persista esse tipo de reconhecimento
público a cidadãos associados a práticas antidemocráticas pode gerar um dano muito
maior, o de impedir que se faça a devida reflexão, não sobre o prócer escolhido, mas
sobre aqueles que, em dado momento histórico, decidiram homenageá-lo, ou seja,
dentro dessa perspectiva poderia ser encarado como forma de desresponsabilização
de um setor da sociedade, que pelos motivos que forem agraciou alguém associado
à ditadura” (PADRÓS, 2012, p. 78).
Somam-se a estes argumentos outros de natureza mais prática e individual,
como os inconvenientes e transtornos apontados pela população atingida pela
alteração de endereço para o recebimento de correspondência e necessidade de
modificação de escritura de imóvel no cartório de registro de imóveis.

2.4. Logradouros Públicos e Homenagem à Ditadura


Reportagem do jornal O Dia revelou que existem no Brasil 205 logradouros
públicos (ruas, avenidas e praças) com nomes que homenageiam membros inte-
grantes dos governos da época da ditadura militar. O próprio jornal fez um levan-
tamento junto ao Diretório Nacional de Endereços dos Correios, buscando 377
nomes apontados no relatório final da CNV como colaboradores, civis ou militares
do regime de exceção, além dos cinco presidentes militares. Ficaram de fora da
pesquisa logradouros como pontes, viadutos, rodovias e escolas (VIEGAS, 2014).
São Paulo é o Estado com o maior número de ocorrências, 58 (28%), logo

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


seguido pelo Rio de Janeiro, com 26 referências. Entre os nomes de ditadores mais
homenageados constam os do Marechal Castello Branco, com 54 ocorrências, seguido
de Eduardo Gomes, com 48, Costa e Silva, com 40, e Médice, com nove ocorrências
(VIEGAS, 2014).
O site UOL destacou que existem no Brasil 717 escolas, entre públicas e par-
ticulares, com nomes dos generais da ditadura militar. Os maiores homenageados
são Castello Branco, com 347 referências, Costa e Silva, com 209, Médice, com
120, seguidos de Geisel e Figueiredo, com 23 e 18 referências respectivamente; 697
delas são públicas e 20 são particulares e a região do país com o maior número de
ocorrências é o nordeste, com 385 unidades (GENERAIS, 2014).
Segundo o jornal O Estado de São Paulo, existem, somente na cidade de São
Paulo, 29 ruas com referência a integrantes do regime militar ou à ditadura (HUPSEL
FILHO; ARRUDA, 2015). O jornal Zero Hora destacou que o Estado do Rio Grande
do Sul homenageia os presidentes do período de exceção em 78 ruas e escolas do
Estado. São 45 escolas no total e 33 logradouros entre ruas, avenidas, praças e bair-
ros. Lá também os ditadores mais homenageados são, por ordem de ocorrências,
Castello Branco, Costa e Silva e Médice (KANNENBERG, 2015).
Os sites e jornais que veicularam estes dados alertam para o fato de que podem
estar subdimensionados, não existindo números oficiais sobre a existência destes
logradouros. Ainda assim, pode-se concluir que existe um número muito expressivo
148 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

de logradouros e prédios públicos que homenageiam ditadores e responsáveis por


atos de violação aos direitos humanos espalhados por todo o país, fato incompatível
com os valores democráticos e civilizatórios que fundamentam nossa sociedade após
o processo de redemocratização.

2.5. Iniciativas para Alteração dos Nomes de Logradouros que Homenageiam


a Ditadura
Várias foram as iniciativas em diversos estados e cidades brasileiras para al-
teração dos nomes de logradouros públicos que homenageiam representantes da
ditadura militar, apontados no item anterior deste trabalho.
Um dos casos mais conhecidos e emblemáticos ocorreu em 2014 em Salvador,
onde o nome do antigo Colégio Estadual Presidente Emílio Garrastazu Médice foi
alterado para Carlos Mariguella. Como se sabe, Mariguella foi um dos principais
contestadores do regime militar, militante do Partido Comunista Brasileiro, e chegou
a ser considerado como inimigo número um do governo. Integrante da luta armada
contra a ditadura, foi baleado, preso algumas vezes até ser morto em emboscada.
Carlos Mariguella era baiano (MACHADO, 2014).
A proposta de mudança do nome da escola foi amplamente debatida entre
professores, alunos e pais de alunos que receberam informações sobre a biografia
de Médice, Mariguella e outro candidato a ser homenageado com o nome da escola,
o também baiano e geógrafo Milton Santos. A escolha do nome ocorreu por eleição
entre os alunos da escola. O pedido foi encaminhado à Secretaria Estadual de Edu-
cação e atendido pelo Governo do Estado (MACHADO, 2014).
Alteração semelhante ocorreu mais recentemente no Maranhão. O governador
Flávio Dino, do PCdoB, eleito em 2014, assinou um decreto, logo em seu primeiro
dia de mandato, proibindo a homenagem em logradouros públicos no Estado com
os nomes publicados no relatório da Comissão Nacional da Verdade responsáveis
por atos violadores dos direitos humanos (GOVERNO, 2015).
Simbolicamente, em 1º de abril de 2015, o governador alterou o nome de 10
escolas públicas que homenageavam os ex-presidentes militares. Escolas que antes
ostentavam os nomes de Castello Branco, Costa e Silva e Médice passaram a home-
nagear figuras como Paulo Freire, Vinicius de Moraes e outras pessoas de destaque
estadual na área da educação (GOVERNO, 2015).
Mas o caso de maior repercussão nacional até o presente momento é o da
ponte Rio-Niterói, nomeada pela Lei nº 5.595/70, editada pelo então presidente
General Emílio Garrastazu Médice, como Ponte Presidente Costa e Silva. Segundo
informações colhidas pelo MPF junto à empresa concessionária responsável pela
sua manutenção, a ponte Rio-Niterói é uma das maiores do mundo, sendo a maior
ponte do hemisfério sul do nosso planeta, detendo ainda o recorde de maior vão em
viga reta contínua do mundo, em seu vão central de 300 metros de comprimento
e 72 metros de altura. Portanto, evidente sua simbologia como obra de enorme
importância artística, arquitetônica, estética e turística (RIO DE JANEIRO, 2015).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 149

Duas frentes se organizam para tentar a alteração do nome da ponte: uma


através de projeto de lei no Congresso Nacional e outra através de ação judicial.
Nenhuma das duas obteve êxito até o presente momento.
Tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei (PL nº 3.388/2012)
proposto pelo Deputado Chico Alencar, do PSOL-RJ, para alterar o nome da ponte
Rio-Niterói para Ponte Herbert de Souza – Betinho, sociólogo exilado durante o
período da ditadura. Em novembro de 2014 o PL foi aprovado na comissão de cul-
tura da Câmara, desde então encontra-se pendente de análise em outras comissões.
Ao mesmo tempo, o MPF/RJ ingressou com uma ação civil pública para declarar
a inconstitucionalidade da Lei nº 5.595/70, que nomeou a ponte com o nome do
ex-presidente Costa e Silva. Alegou, para tanto, que a manutenção do nome de um
representante do regime que cometeu tantas atrocidades constitui-se em lesão ao
direito à memória e ao patrimônio histórico-cultural do povo brasileiro, protegidos
constitucionalmente.
A ação foi extinta sem julgamento de mérito pelo juiz de primeiro grau, por con-
siderar o pedido juridicamente impossível: “De acordo com o eminente magistrado
a quo, a postulação do MPF veicula uma ‘decisão política que deve ser tomada pela
sociedade coletivamente, através de sua participação direta e de seus representantes
no Legislativo, sob pena de ofensa ao art. 2º da Constituição Federal de 1988’. Para
o juízo de primeiro grau, ‘é à sociedade que cabe julgar, em última análise –, ela
que é construtora e beneficiária da memória nacional – se o ex-presidente Costa e
Silva prestou, ou não, relevante serviço à nação’” (RIO DE JANEIRO, 2015, p. 3).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


A Procuradoria Regional da República do Rio de Janeiro está recorrendo da
decisão, e no próximo capítulo será analisada a possibilidade da utilização de ações
coletivas para esta finalidade, à luz dos modernos princípios processuais.

3. AÇÕES COLETIVAS PARA ALTERAÇÃO DE NOMES DE


LOGRADOUROS PÚBLICOS
A CFB, considerada como norma jurídica vinculante, é dotada de relevância
jurisdicional, portanto, de um processo constitucional que determina aos juristas
um “olhar de efetividade” e um “agir eficacial”(1), ou seja, um espaço apropriado
para o exercício do dever-ser. As ações coletivas/constitucionais são instrumentos
jurídicos adequados para manter o controle de constitucionalidade, principalmente
para proteger os direitos e os interesses coletivos. Os princípios que norteiam as
ações coletivas, dentre elas a ação civil pública, são relevantes fontes primárias para
o exercício do direito de ação (também conhecido como acesso à justiça e inafastabi-
lidade do controle jurisdicional) e consequente obtenção da prestação jurisdicional
(art. 5º, XXXV, da CF), bem como para fundamentar as decisões judiciais (art. 93,
IX, da CF).

(1)
STRECK, Lenio Luiz. À guisa de apresentação. O processo constitucional no novo paradigma do
Estado Democrático de Direito. In: Processo constitucional, 2014, p. 12.
150 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Desta forma, da intrínseca relação entre a CF e as ações coletivas surge uma


tutela constitucional do processo, na qual se deve privilegiar os princípios, os valores
e as normas contidas na Lex Maior como forma de decidir e de orientar os demais
ramos do direito e as condutas sociais. Nos processos coletivos, novos relevos ganham
os princípios do devido processo legal, do acesso à justiça, da universalidade da
jurisdição, da primazia do conhecimento de mérito do processo coletivo, da indis-
ponibilidade da demanda, etc. Os princípios gozam não só de valores enunciativos,
mas também de normativos, logo, devem ser considerados como “preceitos cons-
titucionais que englobam e sistematizam os principais e mais elementares direitos
fundamentais a serem observados na realização e no desenrolar de todo e qualquer
processo judicial ou administrativo” (NERY Jr., 2009, p. 35).
Desta forma, a sentença prolatada nos autos da ação civil pública – Processo
0002039-10.2014.4.02.5101 –, que tramitou perante a 10ª Vara Federal da Subseção
Judiciária do Rio de Janeiro, mostra-se equivocada, notadamente por ter julgado
extinto o processo sem julgamento de mérito (art. 295, III, do CPC), sob o funda-
mento de ser o pedido juridicamente impossível por se tratar de “decisão política,
que deve ser tomada pela sociedade coletivamente, através de sua participação direta
e de seus representantes no Legislativo, sob pena de ofensa ao art. 2º da Constituição
Federal de 1988. Não faz sentido a alegação de que o Judiciário pode devolver o
debate à sociedade, como se esta não pudesse, desde já, fazê-lo por conta própria
e necessitasse de alguma espécie de tutor – o MP e/ou o juiz. Trata-se de o povo –
fonte primária de todo o Poder Público –, chamar para si, diretamente ou por meio
de seus representantes, a oportunidade e a conveniência no debate e de qual a decisão
sobre este tema (art. 1º, parágrafo único, da CF/88). É à sociedade que cabe julgar,
em última análise – e já que ela é a construtora e beneficiária da memória nacional –,
se o ex-presidente Costa e Silva prestou, ou não, relevante serviço à nação (art. 2º
da Lei nº 6.682/79)”.
Acreditamos que o recurso interposto pelo MP será provido e a r. sentença de
primeiro grau modificada pela inobservância dos princípios constitucionais do pro-
cesso coletivo e pelos demais fatos e fundamentos que o seguem. O pedido formulado
pelo MPF é juridicamente possível. Todas as condições da ação estão presentes e as
partes estão bem representadas. O MPF(2) tem legitimidade para propor a ação civil
pública em face dos réus (União e Concessionária CCR Ponte), os quais também
são partes legítimas para figurarem no polo passivo em litisconsórcio necessário. O
meio utilizado (ação civil pública com pedido de obrigação de fazer constante em
suprimir a referência ao nome do ex-presidente Artur da Costa e Silva dos registros e
sinalizações da Ponte Rio-Niterói) é adequado para obter o bem da vida pretendido,
uma vez que a ação civil pública, por força da Lei nº 7.347/85, tem como finalidade
proteger o meio ambiente, o consumidor, os bens e os direitos de valor artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico, interesses difusos e coletivos, infração

(2) Art. 5º, I, da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 151

da ordem econômica, ordem urbanística, a honra e a dignidade de grupos raciais,


étnicos ou religiosos e o patrimônio público e social(3).
O interesse de agir do MP também está presente tanto na modalidade adequa-
ção, como acima mencionado, quanto na necessidade, pois os réus, ao deixarem
de propor alteração do nome da ponte (ditador Artur da Costa e Silva), perpetuam
a sua memória e engrandecem os atos ditatoriais praticados no passado e que são
incompatíveis com o atual Estado Democrático de Direito. Em todas as placas e
registros deste monumento histórico há expressa menção do nome do ditador, do
violador dos direitos e das garantias fundamentais.
Ademais, pretende-se também com a ação, no âmbito do controle jurisdicional
dos atos administrativos, a declaração de ilegalidade da norma que atribuiu o nome
do ditador à ponte por desvio de finalidade do ato ante a grandiosidade e relevân-
cia da obra (extensão, beleza, finalidade) que se mostra dissociada das “obras” e
“condutas” maléficas praticadas pelo ditador, principalmente em face dos cidadãos
brasileiros que foram “objetos de tortura” (violação de direitos humanos). Além desse
fato jurídico, há também a não recepção, pela Constituição de 1988, da Lei Federal
nº 5.595/70, que denomina, supletivamente, a ponte Rio-Niterói de “Presidente
Costa e Silva”, ante a total incompatibilidade do ato com os valores democráticos,
com a dignidade humana e a cidadania, bem como o direito fundamental coletivo
à memória e à verdade.
A extinção do processo sem julgamento de mérito sob o fundamento de ser
uma “decisão política que deve ser tomada pela sociedade coletivamente, através de

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


sua participação direta e de seus representantes no Legislativo, sob pena de ofensa
ao art. 2º da CF/88”, embora sedutora, não pode prosperar. Como bem sustentado
pelo MP nas razões recursais, a supressão do nome do ditador não é um ato político,
pois um ato administrativo, para ser considerado estritamente político e insuscetível
de controle jurisdicional, “há de conter medida de fins unicamente políticos (finali-
dade) e, ao mesmo tempo, há de circunscrever-se ao âmbito interno do mecanismo
estatal, e, se o exceder, não deve alcançar direitos explicitamente reconhecidos. O
procedimento deixa de ser unicamente político quando, não obstante ter no ato
político a sua origem, é seguido de medidas que afetam direitos expressamente am-
parados pela ordem jurídica. E então desaparece a impossibilidade do controle. O
Judiciário é levado, embora indiretamente, ao exame do ato político” (FAGUNDES,
2006, p. 198-202).
Mostra-se equivocada também a r. sentença ao deixar de considerar os princí-
pios gerais do direito vigentes, principalmente os constitucionais, que são fiadores
dos direitos fundamentais. Soma-se a isso a existência dos arts. 6º e 7º da Lei nº
7.347/85, segundo os quais qualquer pessoa poderá, e os servidores públicos e os
juízes deverão, remeter peças e informações ao MP para as providências cabíveis,
ou seja, ante a violação de qualquer dos direitos tutelados pela ação civil pública,

(3) Art. 1º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985.


152 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

surge uma faculdade para o cidadão e um dever de agir para os servidores públicos
e magistrados.
Para Reale(4), os princípios são verdades fundantes de um sistema de conheci-
mentos evidentes ou comprovados. Para Bonavides(5), possuem uma função indutiva.
O texto legal é uma elaboração linguística da norma, mas a definição, o alcance, a
aplicação e o significado/sentido são definidos pelo julgador. Nesse sentido, tam-
bém se mostra equivocada a r. sentença ao deixar de considerar a revalorização do
direito constitucional e a normatização dos princípios que deixaram de ser apenas
subsídios de julgamento.
Para demonstrarmos o equívoco na r. decisão que extinguiu o processo sem
julgamento de mérito, adotamos os princípios constitucionais do processo coletivo
e os seus conceitos apresentados por Alvim, Thamay e Granado: “devido processo
legal coletivo, acesso à justiça, universalidade da jurisdição, participação da ação,
impulso oficial, economia, instrumentalidade das formas, primazia do conhecimen-
to do mérito, indisponibilidade da demanda coletiva, do microssistema, reparação
integral do dano, não taxatividade e do ativismo judicial” (ALVIM; THAMAY; GRA-
NADO, 2014, p. 357-379).
O princípio do devido processo legal constitucional deve ser entendido como
“devido processo social”, desburocratizante, que mitiga o formalismo desvalorativo e
garante a efetividade do processo. Pelo princípio do acesso à justiça e da universaliza-
ção da jurisdição permite-se que todo cidadão e demais pessoas legitimadas possam
ter acesso à justiça, que as teses jurídicas possam ser analisadas pelo Judiciário para
obtenção da pacificação social, já que nos processos coletivos as soluções atingem o
direito da coletividade. Por força do princípio de participação, o exercício da ação se
dá pelos legitimados que representam os sujeitos do direito, e os resultados positivos
alcançados nas ações coletivas se estendem à coletividade/cidadãos. O princípio da
ação permite que qualquer legitimado ingresse com uma ação e que esta também se
desenvolva pelo princípio do impulso oficial. O princípio da economia tem como
finalidade evitar o desgaste de tempo e de recurso para o deslinde das ações, com
permissão para reunião de processos nos casos de conexão e continência ou encer-
ramento em caso de litispendência e coisa julgada.
Inegável a finalidade do princípio da instrumentalidade das formas, pois, de
acordo com ele, privilegia-se a finalidade do ato em detrimento da sua forma, ou
seja, busca-se a utilização e o aproveitamento dos atos ainda que realizados de for-
ma distinta, mas que podem ser aproveitados ante a ausência de prejuízo, já que se
busca a solução da lide. Dele decorre o princípio da primazia do conhecimento do
mérito do processo coletivo, no qual se busca o julgamento da questão de fundo,
a matéria discutida, mesmo que ausente algum requisito de admissibilidade da
demanda. A questão discutida nas ações coletivas tem repercussão social, portanto,
deve-se privilegiar o julgamento de mérito. Esses princípios se interligam com o

(4) REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 305.
(5) BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 271 e ss.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 153

princípio da indisponibilidade da demanda coletiva, já que essa surge da necessidade


social e independentemente da vontade da parte. Prevalece o interesse público e há
obrigatoriedade da atuação do MP.
Na busca de um processo justo, com qualidade e justiça, existe o princípio do
microssistema, que determina a aplicação integrada das leis para a tutela coletiva.
Por esse princípio, o intérprete deve recorrer ao CPC de forma residual; antes deve
recorrer à legislação e ao microssistema das demandas coletivas. Pelo princípio
da reparação integral todo e qualquer dano à coletividade deve ser integralmente
reparado. O causador do dano deve sentir a consequência do ato danoso praticado.
Por este princípio também se estabelece a possibilidade de condutas que impeçam
a prática de ato lesivo à coletividade. Para que os direitos coletivos sejam realmente
assegurados, existe o princípio da não taxatividade, ou seja, os direitos coletivos
devem ser protegidos com primazia do conhecimento do conteúdo, e não da forma.
Tem relação com o princípio da instrumentalidade das formas.
O Judiciário, nos processos coletivos, deve assumir uma posição de protago-
nista e condutor da lide coletiva conforme princípio do ativismo judicial. É fato
que o juiz não pode iniciar a lide, mas ele pode e deve incentivar os legitimados
a agirem. Por meio desse princípio o Judiciário, além de cumprir a sua função de
julgar, passa a também corrigir as omissões do Legislativo nos casos de violação
dos direitos coletivos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


O Brasil foi um dos últimos países da América do Sul que, tendo passado por um
longo período de ditadura militar, implementou esforços no sentido de concretizar
uma justiça de transição. Um dos aspectos mais importantes de todo processo tran-
sicional é a busca pela verdade a respeito das graves violações de direitos humanos
ocorridas durante o regime de exceção. Em nosso país, esta busca ocorreu bastante
tardiamente. A Comissão Nacional da Verdade, criada com esta finalidade, só foi
instalada quase 30 anos após o final do período ditatorial.
Esta política do esquecimento é uma das principais responsáveis pelo alto nível
de desinformação, principalmente da parcela mais jovem da sociedade brasileira, a
respeito das atrocidades cometidas durante a ditadura militar. Esta desinformação
contribui para o aumento apurado em pesquisas e tem se manifestado recentemente
nas ruas de várias cidades brasileiras e nas redes sociais, com o apoio a uma nova
intervenção militar e até mesmo à prática da tortura no país.
Para corrigir estas distorções existem as chamadas políticas de memória, que
possuem uma dimensão pedagógica de reaproximar as atuais gerações dos valores
democráticos e de respeito aos direitos humanos. Uma das formas de se concretizar
os ideais destas políticas é através da construção de espaços de memória, tais como
museus e memoriais, além da fixação de placas comemorativas e homenagens em
nomes de logradouros públicos.
154 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Revela-se bastante simbólica esta fixação de nomes em logradouros e prédios


públicos, até mesmo como manifestação de poder – muito utilizada pelos próprios
militares que fixaram os nomes dos generais ex-presidentes em mais de 900 luga-
res entre logradouros e prédios públicos, como revelam algumas coletas de dados
citados neste trabalho.
Apesar de não existir consenso na sociedade e na comunidade acadêmica sobre
a prática da alteração destes nomes, esta medida foi estabelecida em diretriz no 3º
Programa de Direitos Humanos do Governo Federal, em 2009, além de constituir re-
comendação no relatório final da Comissão Nacional da Verdade, divulgado em 2014.
Neste sentido, algumas alterações de nomes de logradouros que homenagea-
vam pessoas acusadas da prática de atos contrários aos direitos humanos durante
o período da ditadura militar já foram realizadas. Outras estão em fase de estudo,
encontrando alguma resistência por parte de membros do Poder Legislativo nos três
níveis da federação, e de parcela da própria comunidade, mais preocupada com os
transtornos práticos que esta espécie de alteração pode causar.
Recomenda-se, portanto, que estas alterações sejam precedidas de amplo de-
bate e explicação para a comunidade da necessidade da alteração para reforçar os
valores democráticos e de respeito aos direitos humanos por parte desta sociedade.
É flagrante a incompatibilidade com os nossos compromissos assumidos peran-
te a comunidade internacional e os princípios consagrados em nossa Constituição,
como o do respeito à dignidade da pessoa humana, ao objetivo de construir uma
sociedade livre, justa e solidária, além da prevalência dos direitos humanos, manter
a homenagem em prédios e logradouros públicos a pessoas que participaram de
regime baseado no desrespeito destes mesmos princípios.
É possível concluir e afirmar, com a conceituação dos princípios constitu-
cionais coletivos citados neste trabalho, que as ações coletivas, principalmente a
ação civil pública, são cabíveis para a alteração de nome de logradouros públicos
que homenageiam membros da ditadura militar que praticaram atos violadores dos
direitos humanos.
Desse modo, o recurso impetrado pelo MP contra a decisão que indeferiu a
ação civil pública que visava declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 5.595/70, que
nomeou a ponte Rio-Niterói com o nome do ex-presidente Costa e Silva, deve ser
provido para ter seu mérito analisado, sob pena de violar o princípio da primazia do
conhecimento do mérito do processo coletivo. O juiz, ao julgar extinto o processo
sem julgamento de mérito, além de violar esse princípio, também deixou de observar
o princípio do microssistema, segundo o qual deve-se aplicar o CPC residualmente.
Deve-se privilegiar a aplicação integrada das leis que formam e tratam as tutelas
coletivas como integrantes de um microssistema.
A sentença também pode ser modificada por violar o princípio da instrumentali-
dade das formas e da não taxatividade. Uma vez que o princípio da indisponibilidade
da demanda coletiva impõe um dever de agir ao legitimado, cabe ao juiz sempre
buscar o julgamento de mérito, ainda que algum dos requisitos da demanda esteja
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 155

ausente. Nota-se que para não julgar o mérito da lide o magistrado fundamentou
se tratar de matéria “política” e de legitimidade do Poder Legislativo; contudo,
deixou de observar que toda sentença é política por trazer em si a possibilidade de
pacificação social e que hodiernamente, ante a existência do princípio do ativismo
judicial, o mérito da ação deveria ser julgado mesmo que se estivesse diante de
uma omissão legislativa. Ao deixar de sentenciar o mérito, o juiz agiu, conforme
Dinamarco (2004, p. 233-234), como “Pilatos”, deixou as coisas acontecerem sem
nada fazer e foi um juiz não ativo.

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CONSIDERAÇÕES SOBRE O REGIME DE COBRANÇA
ADMINISTRATIVA ESPECIAL DA PORTARIA
RFB Nº 1.265/2015

Victor Hugo Marcão Crespo


Advogado do BMA.

RESUMO
O objetivo do presente artigo é compreender o alcance das sanções previstas na
Portaria RFB nº 1.265/2015, notadamente para investigar se a normativa da Receita
Federal é um compilado da legislação vigente ou se, ao contrário, suas previsões
revelam restrições de direitos sem a necessária correspondência legal. Em nosso
entendimento, as disposições previstas na Portaria estão eivadas de graves incons-
titucionalidades e ilegalidades, na medida em que estabelecem um conjunto de
restrições à livre-iniciativa empresarial, cuja constitucionalidade já seria discutível
se introduzidas pela via legal, quanto mais por meio de portaria.
Palavras-Chave: Portaria RFB nº 1.265/2015. Programas de Parcelamento.
Cobrança Administrativa. Exclusão do Simples Nacional.

TITLE: Considerations about the regime of special administrative collection of


the Administrative Rule of the Federal Revenue Office no. 1,265/2015.
ABSTRACT
This article aims at analyzing the reach of the sanctions provided by the Adminis-
trative Rule of the Federal Revenue Office no. 1,265/2015, especially to investigate if this
norm is a compilation of the legislation in force or if its provisions include restrictions of
rights without the necessary legal matching. According to our interpretation, the provi-
sions of this Administrative Rule contain many unconstitutional and illegal aspects, as
they establish a set of restrictions to corporate free enterprise, whose constitutionality
would be debatable even if it had been introduced by law.
Keywords: Administrative Rule of the Federal Revenue Office no. 1,265/2015.
Installment Plans. Administrative Collection. Exclusion from the Integrated System for
Payment of Taxes and Contributions.

SUMÁRIO
1 Introdução. 2 A Portaria RFB nº 1.265/2015; A) Exclusão de Programas de
Parcelamento (Incisos II, III e IV); B) Exclusão do Simples Nacional (Inciso V); C)
Encaminhamento ao Ministério Público de Representação Fiscal para Fins Penais
por Crime de Sonegação Fiscal (Incisos VI e VII); D) Arrolamento de Bens (Inciso
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 159

IX); E) Exclusão de Benefícios e Incentivos Fiscais Federais Concedidos ao Sujeito


Passivo (Inciso XIV). 3 Conclusão.

1. INTRODUÇÃO
É sabido que o Brasil atravessa um cenário político-econômico desfavorável.
As estimativas oficiais apontam um diagnóstico econômico preocupante de esta-
gflação, desemprego, perda de confiança do investidor e do consumidor e déficits
nas contas públicas.
Nesse contexto, o Governo Federal vem promovendo um conjunto de reformas
destinadas a reequilibrar as contas públicas, tanto por meio da redução de despesas
como pelas iniciativas que geram novas fontes de receitas. Exemplos não faltam.
Dentre as iniciativas tendentes a aumentar as receitas federais destacam-se a
majoração da CSLL para instituições financeiras (MP nº 675/2015), o restabelecimen-
to do PIS/Cofins sobre receitas financeiras (Decreto nº 8.426/2015), o aumento da
tributação de IR sobre os juros sobre capital próprio (MP nº 694/2015), o aumento
do IR sobre ganho de capital auferido por pessoa física na alienação de bens e direitos
(MP nº 692/2015) e a volta da CPMF (PEC nº 140/2015).
Por sua vez, as políticas anunciadas pelo Governo para contenção de despesas
envolvem corte de ministérios e cargos comissionados, redução de investimentos
em saúde e educação, suspensão de concursos públicos, adiamento de reajuste aos
servidores públicos e mitigação de direitos trabalhistas (como o seguro-desemprego

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


e o abono salarial – Lei nº 13.134/2015).
Há, ainda, um terceiro conjunto de iniciativas que só recentemente se tornou
de primordial relevância na atuação do Poder Público. Trata-se das medidas de
fomento à eficiência na fiscalização e na arrecadação de tributos.
É justamente sob a justificativa de aprimorar a eficiência na arrecadação tribu-
tária(1) que a Receita Federal promulgou, no último dia 4 de setembro, a Portaria
RFB nº 1.265/2015 (“Portaria”), também conhecida como o Regime de Cobrança
Administrativa Especial no âmbito da Receita Federal do Brasil. Em breve síntese,
trata-se de um conjunto de sanções a serem aplicadas àqueles contribuintes com
débitos tributários federais exigíveis no valor igual ou superior a 10 milhões de reais
que, intimados, não regularizarem suas pendências fiscais.
No entendimento da autoridade fiscal, a normativa em comento nada mais fez
do que explicitar a legislação já existente, ou, em outras palavras, a Portaria RFB nº
1.265/2015 apenas consolidou a legislação esparsa sobre as sanções aplicáveis aos
devedores de débitos tributários.

(1) Conforme o seu art. 1º, o objetivo do sistema é “aprimorar os procedimentos de recuperação de
créditos tributários (CT) e, consequentemente, promover o aumento e a sustentação da arrecadação dos
tributos federais”.
160 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Não parece ser esta, porém, a interpretação unânime da comunidade jurídica(2).


Nesse contexto, o objetivo do presente artigo é compreender o alcance das san-
ções previstas na Portaria RFB nº 1.265/2015, notadamente para investigar se a nor-
mativa da Receita Federal é um compilado da legislação vigente ou se, ao contrário,
suas previsões revelam restrições de direitos sem a necessária correspondência legal.
Em nosso entendimento, as disposições previstas na Portaria estão eivadas
de graves inconstitucionalidades e ilegalidades, na medida em que estabelecem um
conjunto de restrições à livre-iniciativa empresarial, cuja constitucionalidade já seria
discutível se introduzidas pela via legal, quanto mais por meio de portaria.

2. A PORTARIA RFB Nº 1.265/2015


A leitura do art. 1º da Portaria já revela que as disposições desta não se limitam
a consolidar a legislação vigente.
Diz o art. 1º, § 1º, que “a Cobrança Administrativa Especial abrange, obrigato-
riamente, os CT que estejam na condição de exigíveis, cujo somatório, por sujeito
passivo, seja igual ou maior que R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais)”.
O objetivo é determinar o âmbito de aplicação das medidas ali previstas, apon-
tando que seu alcance é o contribuinte que possui débitos tributários federais com
exigibilidade ativa e montante superior a 10 milhões de reais (art. 1º, § 1º). É dizer,
portanto, que suas disposições não podem ser invocadas pela Fazenda Pública de
outros entes federativos para cobrança de créditos tributários, tampouco estão aptas
a amparar débitos tributários com exigibilidade suspensa (art. 151 do CTN) ou em
valor inferior a 10 milhões. Daí já surge a primeira questão: se todas as medidas
sancionadoras previstas na Portaria já se encontravam previstas em lei e à disposição
das autoridades fiscais, por que a limitação de valor mínimo?
O mesmo há de se questionar em relação ao art. 1º, § 2º, in verbis: “A unidade
da RFB poderá incluir na Cobrança Administrativa Especial outros CT que não se
enquadrem nos critérios definidos no § 1º”.
Como se pode ver, esse dispositivo outorga a possibilidade de as unidades da
Receita Federal estabelecerem a seu exclusivo critério outras hipóteses de enquadra-
mento no regime de cobrança administrativa especial, cuja consequência é a aplicação
do conjunto de sanções ali previsto. Não há qualquer parâmetro a ser seguido pela
autoridade fiscal: a inclusão de créditos tributários no regime é discricionária e pode
ser modificada a qualquer tempo.
Aqui surge a segunda indagação: se a autoridade fiscal já tinha à sua disposição
todas as medidas previstas no art. 2º da Portaria para cobrança de créditos tributários,
então qual a razão de se outorgar à Receita Federal a possibilidade de estabelecer
outros critérios de subsunção ao regime de cobrança especial?

(2)
Para alguns, a Portaria introduz no ordenamento jurídico graves restrições à livre-iniciativa das
empresas à margem da lei, razão pela qual seu teor está eivado de inconstitucionalidade.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 161

A propósito, em nossa opinião, semelhante delegação genérica de competência


mostra-se eivada de inconstitucionalidade. Primeiro porque introduz a possibilidade
de sistemas não isonômicos de cobrança fiscal, o que não se coaduna com o art. 5º
da Carta Constitucional. Segundo porque a inclusão no regime de cobrança especial
administrativa traz um conjunto de graves restrições à livre-iniciativa (arts. 1º, IV,
5º, XIII, e 170, parágrafo único, da CF), cuja constitucionalidade já seria discutível
se introduzidas pela via legal, quanto mais através de atos normativos exclusivos da
Receita Federal e totalmente discricionários.
Idêntica ressalva cabe ao disposto no art. 2º, § 1º, que prevê: “Além das me-
didas de que trata o caput, a Unidade da RFB poderá adotar outros procedimentos,
inclusive a inserção do sujeito passivo e, no caso de pessoa jurídica, dos respectivos
sócios e responsáveis em programa especial de fiscalização”.
Feitas essas considerações iniciais, vejamos o teor das medidas previstas no
art. 2º da Portaria.
Prevê o art. 2º que o sujeito passivo será intimado para regularizar os créditos
tributários abrangidos pela cobrança administrativa especial. Não regularizando
suas pendências junto à Receita Federal, a Portaria determina que sejam aplicadas
as sanções ali previstas.
Da leitura do referido dispositivo já se pode perceber que a não regularização
dos créditos tributários sujeitos ao regime de cobrança especial pode provocar con-
sequências devastadoras para o exercício da atividade das empresas.
De todo modo, há de se reconhecer que algumas das medidas previstas de

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


fato encontram idêntico amparo em legislação esparsa, limitando-se a Portaria a
reproduzir os seus termos. É o caso: (i) do inciso I – inscrição do sujeito passivo no
Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Setor Público Federal (Cadin),
o que de fato inviabiliza a realização de operações com instituições públicas e a con-
cessão de incentivos fiscais (cf. art. 6º da Lei nº 10.522/02); (ii) do inciso XII – não
liberação de recursos/empréstimos por parte de bancos públicos (cf. art. 6º, I, da Lei
nº 10.522/02); (iii) do inciso XIX – lançamento de ofício de multa de 50% sobre o
valor do pagamento mensal do tributo determinado sobre base de cálculo estimada
que deixou de ser efetuado (cf. art. 44, II, b, da Lei nº 9.430/96); (iv) do inciso XXV
– encaminhamento do débito para inscrição em dívida ativa com o acréscimo de
20% e o ajuizamento do executivo fiscal (cf. arts. 1º e seguintes da Lei nº 6.830/90
c/c o art. 1º do Decreto nº 1.025/69); e (v) do inciso XVIII – representação para
interposição de medida cautelar fiscal, caso o sujeito passivo se enquadre em uma
das hipóteses previstas no art. 2º da Lei nº 8.397/92(3).
Entretanto, em outras hipóteses, entendemos que a Portaria introduz novas
sanções que não encontram respaldo legal, razão pela qual são plenamente incons-
titucionais. Dada a limitação espacial, apresentaremos considerações individuais

(3) Há, ainda, aquela prevista no inciso XXIV, aplicável somente para as entidades desportivas profissionais
de futebol (cf. arts. 4º e 18 da Lei nº 13.155/2015).
162 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

acerca de cinco medidas, as quais consideramos as mais gravosas para a generalidade


das empresas(4). Senão, vejamos.

A) Exclusão de Programas de Parcelamento (Incisos II, III e IV)


A hipótese prevista no art. 2º, incisos II, III e IV, trata da exclusão do sujeito
passivo de programas de parcelamento fiscal (Refis, Paes e Paex), prevendo a exigi-
bilidade imediata da totalidade do débito confessado e não pago, bem como a devida
inclusão dos acréscimos legais em relação à parte ainda não quitada.
É dizer, portanto, que a simples condição de o sujeito passivo ter débitos exi-
gíveis acima de 10 milhões de reais (ou em quaisquer outras hipóteses que a Receita
Federal decidir, a teor do art. 1º, § 2º, da Portaria) já autoriza a sua exclusão dos
referidos programas de parcelamento – ainda que tenham sido cumpridas todas as
formalidades de adesão e as parcelas estejam sendo regularmente adimplidas. E pior:
sem possibilitar qualquer exercício do direito de defesa por parte do contribuinte
excluído.
Ocorre que nenhuma das legislações dos parcelamentos em questão autoriza
a rescisão de programa de parcelamento pela mera existência de débitos exigíveis
perante a Receita Federal. Nem poderia, pois revelaria verdadeira sanção política
destinada a coagir ao pagamento de tributo, prática reiteradamente censurada pela
jurisprudência pátria(5).
Evidente, portanto, que a Portaria inova na ordem jurídica ao instituir novas
causas de exclusão dos programas de parcelamento.

B) Exclusão do Simples Nacional (Inciso V)


Prevê o art. 2º, V, da Portaria como sanção ao contribuinte com débitos sujeitos
ao regime de cobrança especial administrativa a sua exclusão do regime do Simples
Nacional, supostamente autorizada pelo art. 17, V, da LC nº 123/06.
O art. 17 da LC nº 116/03 inaugura a seção “Das Vedações ao Ingresso no
Simples Nacional”, prevendo a impossibilidade de sujeição ao Simples Nacional
daquelas pessoas jurídicas que possuam débitos exigíveis junto ao INSS ou com as
Fazendas Públicas federal, estadual ou municipal.
Ocorre, no entanto, que tal disposição trata das vedações ao ingresso no Simples
Nacional, não de exclusão do regime.

(4) Sem prejuízo de outras igualmente relevantes para setores específicos, como é o caso dos incisos
XXII, XIII e XXIV.
(5) Há, inclusive, diversos entendimentos sumulados do Tribunal Supremo sobre o tema: Súmula nº 70:

“É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo”; Súmula
nº 323: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos”
e Súmula nº 547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas,
despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais”.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 163

É sabido que a Lei Complementar nº 123/06 estabelece os requisitos para en-


quadramento da pessoa jurídica no regime tributário simplificado(6); prevê, também,
as hipóteses de exclusão do Simples Nacional. É o caso da pessoa jurídica que se
enquadre em qualquer das vedações constantes no art. 3º, § 4º, da LC nº 123/06
(art. 3º, § 6º), que ultrapasse o limite máximo de faturamento anual (art. 3º, § 10)
e nas hipóteses previstas no art. 29 da LC nº 123/06(7).
Entretanto, nenhum dispositivo legal autoriza a exclusão do Simples Nacional
tão somente pela existência de débitos em aberto, tal como feito pelo art. 2º, V, da
Portaria. Não é esse o conteúdo do art. 17 da LC nº 123/06, que, repita-se, trata das
vedações ao ingresso no regime simplificado.
Nesses termos, evidente que a Portaria inova na ordem jurídica, instituindo
nova causa de exclusão do Simples sem amparo legal.

C) Encaminhamento ao Ministério Público de Representação Fiscal para


Fins Penais por Crime de Sonegação Fiscal (Incisos VI e VII)
Prevê o art. 2º, inciso VII, da Portaria como sanção a propositura de represen-
tação fiscal para fins penais junto ao Ministério Público pela prática do crime de
sonegação fiscal, com fundamento no art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90. Esse dispositivo
afirma ser crime contra a ordem tributária “deixar de recolher, no prazo legal, valor
de tributo ou contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito
passivo da obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”.
Em outras palavras, a Portaria afirma que a existência de débitos tributários

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


exigíveis é suficiente para a tipificação do crime de sonegação fiscal previsto na Lei
nº 8.137/90. Equipara, assim, a inadimplência tributária à prática de sonegação fiscal.
Entretanto, não há como se admitir que tais conceitos sejam sinônimos. A
inadimplência é a simples falta de pagamento de tributo. O que a diferencia da
sonegação fiscal é a intenção (dolo) de omitir, fraudar o Fisco, a má-fé de ocultar
a existência de operação tributável para reduzir o pagamento de tributos. É nesse
sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça(8).
Ao equiparar tais conceitos, a Receita Federal presume que toda inadimplência
é dolosa e fraudulenta, a merecer a sanção penal.

(6) Além do limite de faturamento anual, não se admite o benefício, por exemplo, àquelas pessoas jurídicas
de cujo capital participe outra pessoa jurídica, que tenham filial fora do país ou que sejam constituídas
sob a forma de sociedade anônima (art. 3º, § 4º).
(7) Prática de infrações como falta de comunicação de exclusão obrigatória, embaraço à fiscalização,

interposição de pessoas, inaptidão, comércio de mercadoria contrabandeada, falta de escrituração fiscal,


omissão reiterada da folha de pagamento da empresa.
(8) “10. A conduta de deixar de pagar tributo, por si só, não constitui crime. Assim, se o contribuinte

declara todos os fatos geradores à repartição fazendária, de acordo com a periodicidade exigida em lei,
mas não paga o tributo, não comete crime, mas mero inadimplemento. O crime contra a ordem tributária
pressupõe, além do inadimplemento, alguma forma de fraude, que, na espécie, consubstanciou-se em
omissão de receitas na declaração de renda firmada pelo agravante.” (AgRg no REsp 1.158.834/ES, Relª
Minª Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, j. 19.02.2013, DJe 01.03.2013)
164 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Ocorre, no entanto, que a legislação penal estabelece como regra geral que a
prática de “crime” depende da comprovação de dolo do autor (art. 15, parágrafo
único, do Decreto-Lei nº 2.848/1940)(9), e dolo jamais se presume: a sua ocorrência
deve ser objeto de prova inequívoca por parte da autoridade fiscal.
Nesse contexto, não basta que o autor pratique o fato jurídico descrito no tipo
penal: para que a conduta seja objeto da sanção penal, é de rigor a verificação da
culpabilidade (dolo, má-fé) do agente. Tão somente se restar demonstrada a inten-
ção fraudulenta do agente é que se poderá imputar o crime de sonegação fiscal. É
justamente no elemento subjetivo da conduta que se diferencia o inadimplemento
da sonegação.
A prevalecer a letra da Portaria, está-se a presumir o dolo do contribuinte!
Exatamente o oposto da garantia constitucional prevista no art. 5º, LVII.
Nesse contexto, resta claro que a Portaria inova na ordem jurídica, presumindo
a má-fé do contribuinte em débito com a Receita Federal ao equiparar o inadimple-
mento à sonegação fiscal.

D) Arrolamento de Bens (Inciso IX)


Prevê a Portaria a aplicação das medidas de arrolamento de bens e direitos
para acompanhamento do patrimônio do sujeito passivo (inciso IX), citando como
fundamento os arts. 64 e 64-A da Lei nº 9.532/97. Pela letra da Portaria pode-se
concluir que o arrolamento de bens será aplicado sempre que o sujeito passivo se
enquadrar no referido regime.
Ocorre, no entanto, que a Lei nº 9.532/97 não autoriza o procedimento de
arrolamento de bens e direitos tão somente pela existência de débitos exigíveis em
qualquer hipótese. A rigor, o arrolamento somente poderá se dar se o valor dos cré-
ditos tributários do sujeito passivo for superior a 30% de seu patrimônio conhecido
(cf. art. 64, caput, da Lei nº 9.532/97).
O parâmetro legislativo é o patrimônio conhecido do contribuinte, não o valor
do crédito tributário. Cabe ao Fisco, portanto, comprovar que as dívidas fiscais su-
peram 30% do patrimônio conhecido do contribuinte, dando causa ao procedimento
específico de acompanhamento patrimonial do sujeito passivo.
Ao fazer referência apenas ao arrolamento de bens como sanção aplicável
àqueles sujeitos passivos com débitos sujeitos à cobrança administrativa especial e
independente do patrimônio conhecido do contribuinte, temos que a Portaria está
inovando na ordem jurídica e estabelecendo nova hipótese de arrolamento de bens.

(9)
“Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão
quando o pratica dolosamente”.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 165

E) Exclusão de Benefícios e Incentivos Fiscais Federais Concedidos ao


Sujeito Passivo (Inciso XIV)
O art. 2º, XIV, prevê a exclusão de benefícios e incentivos fiscais federais
concedidos ao sujeito passivo como consequência da ausência de regularidade fis-
cal, com base no disposto no art. 60 da Lei nº 9.069/95. Por sua vez, diz o art. 60
da Lei nº 9.069/95 que a concessão ou reconhecimento de qualquer incentivo ou
benefício fiscal federal está condicionada à comprovação pelo contribuinte de sua
regularidade fiscal.
Como se pode ver, a legislação condiciona a concessão ou o reconhecimento
de incentivos fiscais à comprovação de regularidade fiscal. Nada diz em relação ao
momento posterior, qual seja o do aproveitamento/fruição de tal crédito.
Na linha da jurisprudência do STJ, se foi exigida a CND no momento da con-
cessão do incentivo fiscal, eventual ausência de regularidade fiscal posterior não tem
o condão de excluí-lo(10). É tão somente esse o alcance do art. 60 da Lei nº 9.069/95.
Nesse contexto, logo se vê que a Portaria não se ateve ao enunciado do art. 60
da Lei nº 9.069/95 e acabou inovando na ordem jurídica.

3. CONCLUSÃO
A Portaria RFB nº 1.265/2015 trouxe um conjunto de sanções destinadas a
“aprimorar os procedimentos de recuperação de créditos tributários” federais.
Não obstante algumas das medidas propostas de fato encontrarem correspon-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — DOUTRINAS


dência com a legislação vigente, não há como sustentar que a Portaria tão somente
consolida a legislação tributária aplicável ao mau pagador de tributos. As iniciativas
tratadas no capítulo anterior exemplificam algumas das situações em que o Poder
Executivo inovou na ordem jurídica para restringir direitos dos contribuintes, em
nítido viés de instituir sanções políticas para coagir os entes privados ao pagamento
de tributo – não obstante a firme jurisprudência pátria afastando a constitucionali-
dade das sanções políticas em matéria tributária, inclusive com precedente do STF
em controle concentrado de constitucionalidade(11).
Com efeito, as sanções previstas na Portaria violam ou restringem diversos
princípios constitucionais que sequer poderiam ser modificados por emenda
constitucional (art. 60, § 4º, IV, da CF), quanto menos por portaria. É o caso: (i)
do direito de petição (art. 5º, XXXIV, a, da CF); (ii) da livre-iniciativa (art. 170,
parágrafo único, da CF); (iii) da razoabilidade e da proporcionalidade (art. 5º, LIV,
da CF); (iv) da legalidade (art. 5º, II, da CF); (v) da inafastabilidade do controle
jurisdicional (art. 5º, XXXV, da CF); (vi) do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da
CF); e (vii) da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, da CF). Ademais, suas

(10) REsp 1.041.237/SP, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª S., j. 28.10.09, DJe 19.11.09; REsp 839.116/BA, Rel. Min.
Luiz Fux, 1ª T., j. 21.08.08, DJe 01.10.08; e REsp 859.119/SP, Relª Minª Eliana Calmon, 2ª T., j. 06.05.08,
DJe 20.05.08.
(11) ADI 173, Rel. Min. Joaquim Barbosa, TP, j. 25.09.08, publ. 20.03.09.
166 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

disposições presumem a má-fé do contribuinte em fraudar a legislação tributária,


desconsiderando a complexidade e a subjetividade inerente às múltiplas interpreta-
ções do ordenamento tributário; escancaram a visão fazendária de que inadimplência
e sonegação são sinônimos.
Em um momento de crise econômica e imperiosa necessidade de reequilíbrio
das contas públicas, seria de se esperar formas de aproximação entre Fisco e con-
tribuintes, de forma a reconhecer as dificuldades e partilhar os esforços. Por sua
vez, medidas como a Portaria RFB nº 1.265/2015 vão justamente de encontro a essa
aproximação: instituem um regime de terror ao contribuinte, com sanções que in-
viabilizam por completo qualquer atividade empresarial, colocando os contribuintes
como vilões da situação atual, sendo que na verdade estes são as “galinhas de ouro”
do sistema, aproveitando a analogia do Professor Quiroga(12). E o final dessa história
já sabemos: diz a fábula, tão antiga e ao mesmo tempo tão atual, que, por excesso
de ambição e ganância, o fazendeiro acabou matando a galinha dos ovos de ouro...

(12) Disponível
em: <http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2015/09/1678754-os-ovos-de-ouro-e-os-
impostos.shtml>.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM REPERCUSSÃO GERAL Nº 838.284-SC


Tribunal Pleno (DJE 08/10/2015)

Relator: Ministro Dias Toffoli


Data do julgamento: 09/06/2015

77/1 — EMENTA: TAXA PARA EMISSÃO DE ANOTAÇÃO DE RESPON-


SABILIDADE TÉCNICA. LEI Nº 6.994/82. PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL.
FIXAÇÃO DE VALOR MÁXIMO.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


Possui repercussão geral a matéria alusiva à validade da exigência da taxa
para expedição da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), baseada na
Lei nº 6.994/82, a qual estabeleceu limites máximos para a ART, até o valor de
5 MVR, considerada a exigência do art. 150, I, da Constituição.

Decisão: o Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O


Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão
constitucional suscitada.
Ministro Dias Toffoli – Relator

MANIFESTAÇÃO
Trata-se de recurso extraordinário fundado nas letras a e c do permissivo consti-
tucional interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o qual
aplicou precedente de seu Órgão Especial (Incidente 5001195-22.2011.404.7203/
SC) em que este reconhecia a constitucionalidade do parágrafo único do art. 2º
da Lei nº 6.994/82, ao argumento de que, em se tratando de taxa, o princípio da
legalidade tributária deve ser flexibilizado, ‘sendo suficiente para seu atendimento
que a lei formal indique o seu valor máximo, como feito pelas Leis ns. 6.994, de
1982 (art. 2º, parágrafo único), e 12.514, de 2011 (art. 11), com o que se propicia
seja ele mais adequadamente quantificado pelo órgão regulamentar competente,
baseado em estudos técnicos, atendendo-se melhor aos princípios constitucionais
da proporcionalidade e da capacidade contributiva.
O acórdão restou assim ementado:
“TRIBUTÁRIO. TAXA PARA EMISSÃO DE ANOTAÇÃO DE RESPON-
SABILIDADE TÉCNICA. LEI Nº 6.994/82. CONSTITUCIONALIDADE.
É válida a exigência da taxa para expedição da Anotação de Responsabi-
lidade Técnica, a partir da Lei nº 6.994/82, até o valor de 5 MVR.”
168 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

O recorrente alega afronta ao art. 150, I, da Constituição e divergência com a


jurisprudência da Corte. Sustenta que o Tribunal Regional, ao reconhecer a consti-
tucionalidade do art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 6.994/82, entendendo, por decor-
rência, pela validade da exigência da taxa de ART desde 1982, desde que limitadas a
5 MRV até 31.12.2011, data da edição da Lei nº 12.514, quando o limite passou a ser
de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), acabou por ferir o princípio da legalidade,
pois referida Lei teria delegado aos conselhos a competência para fixar os valores
da taxa, mantendo, dessa forma, os mesmos vícios da Lei nº 6.496/77, já declarada
inconstitucional por este Supremo Tribunal Federal nos autos do RE 748.445/SC,
com repercussão geral reconhecida, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski.
Em preliminar, aduz que, notoriamente, a matéria possui repercussão geral,
uma vez que cria precedente que atinge toda uma coletividade de profissionais e em-
presas da área de engenharia interessadas na forma de tributação das chamadas taxas
de anotação de responsabilidade (ART), ao mesmo tempo que reflete na segurança
jurídica tanto do cidadão-litigante quanto do Estado-Juiz. Passo a me manifestar.
No RE 748.445/SC, o Plenário Virtual ratificou a jurisprudência da Corte de
que a anotação de responsabilidade técnica, instituída pela Lei nº 6.496/77, tem
natureza de taxa – submetendo-se, assim, ao princípio da legalidade –, mas não
apreciou a legislação posterior, qual seja a Lei nº 6.994/82.
Reconheço a existência de alguns precedentes da Corte, os quais, com base
no citado RE 748.445/SC, concluíram que a Lei nº 6.994/82 teria mantido os mes-
mos vícios de sua antecessora (RE 826.299/RS-AgR, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe
07.05.2015; ARE 804.854/RS-AgR-ED, Primeira Turma, Rel. Min. Roberto Barroso,
DJe 16.12.2014).
Todavia, é inegável que a Lei nº 6.994/82, aplicável a todos os conselhos profis-
sionais, foi uma primeira tentativa de uniformização da matéria relativa à cobrança
de anuidades e da taxa objeto do presente recurso extraordinário, uma vez que essa
Lei estabeleceu limites máximos para as anuidades e para as ARTs.
Se, por um lado, o princípio da legalidade não pode ser ignorado – pelo contrá-
rio, é ele indispensável –, de outro é de se colocar a discussão sobre o tipo e o grau
de legalidade que satisfazem a exigência do art. 150, I, da Constituição, como fez o
Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Ou seja, é de se analisar
se o princípio da legalidade é absoluto, ou se o legislador tributário poderia se va-
ler, em determinadas hipóteses, de cláusulas gerais e de conceitos indeterminados.
De outro giro, nos autos do RE 704.292, de minha relatoria, com repercussão
geral reconhecida, e da ADI 3.408, também de minha relatoria, o tema da cobrança
de anuidades pelos conselhos de categorias profissionais, à luz do princípio da
legalidade, será amplamente debatido, o que torna prudente a inclusão do presen-
te recurso extraordinário no Plenário Virtual, para o reconhecimento ou não da
repercussão geral do tema constitucional e seu eventual julgamento conjunto no
Plenário físico da Corte, considerando-se, inclusive, a decisão do Órgão Especial
do Tribunal regional.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 169

Diante do exposto, manifesto-me pela existência de matéria constitucional e


pela repercussão geral do tema, submetendo o caso à apreciação dos demais minis-
tros da Corte.
Brasília, 9 de junho de 2015.
Ministro Dias Toffoli – Relator

PRONUNCIAMENTO
“TAXA DE ANOTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE TÉCNICA. LEI Nº
6.994/82. LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DECLARADA NA ORIGEM.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA.”
1. O Gabinete prestou as seguintes informações:
“Eis a síntese do que discutido no Recurso Extraordinário 838.284, da
relatoria do Ministro Dias Toffoli, inserido no sistema eletrônico da repercussão
geral em 12 de junho de 2015.
A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou
provimento à apelação cível interposta por empresa de engenharia, mantendo
a decisão mediante a qual se acolheu parcialmente os pedidos formulados na
inicial, para condenar o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia –
CREA/SC a restituir os valores indevidamente cobrados, a partir de 24 de maio
de 2008, a título de Taxa de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), a
ser apurado em liquidação de sentença. Assentou mostrar-se legítima a cobran-
ça do tributo, após a edição da Lei nº 6.994/82, limitada ao valor de 5 MVRs,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


tendo a autora o direito à repetição do que exceder as balizas legais, corrigido
pela Taxa Selic. Fez ver que a Corte Especial daquele Tribunal, apesar de haver
declarado a inconstitucionalidade do § 2º do art. 2º da Lei nº 6.496/77 – por
vislumbrar contrariedade ao princípio da legalidade tributária –, consignou,
em julgamento posterior, a constitucionalidade do parágrafo único do art. 2º
da Lei nº 6.994/82 e do art. 11 da Lei nº 12.514/2011. Salientou que o tributo
tem natureza jurídica de taxa. Afirmou a possibilidade de a lei indicar apenas
um valor máximo para a exação, de modo a permitir que o órgão fiscalizador
da atividade profissional, mediante estudos técnicos, realize a quantificação
adequada do montante devido, consoante os princípios constitucionais da
proporcionalidade e da capacidade contributiva.
Não foram formalizados embargos declaratórios.
No extraordinário, protocolado com alegada base nas alíneas a e c do
permissivo constitucional, a empresa de engenharia argui desrespeito aos arts.
5º, inciso II, e 150, incisos I e III, alínea a, da Carta da República. Salienta que
tanto no § 2º do art. 2º da Lei nº 6.496/77 quanto no parágrafo único do art.
2º da Lei nº 6.994/82 repassou-se ao Conselho Federal de Engenharia e Agro-
nomia – Confea a definição do contribuinte, do fato gerador, da alíquota e da
base de cálculo da Taxa de Anotação de Responsabilidade Técnica, devendo ser
reconhecida a inconstitucionalidade de ambos os preceitos, por contrariarem
170 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

o princípio da legalidade tributária e o disposto no art. 97, incisos III e IV, do


Código Tributário Nacional – CTN. Aduz violar o princípio da irretroativida-
de tributária o entendimento segundo o qual a edição da Lei nº 12.514/2011
teria garantido a legalidade da tributação e a constitucionalidade do art. 2º,
parágrafo único, da Lei nº 6.994/82. Pleiteia a repetição do indébito referente
aos valores pagos indevidamente – e ainda não prescritos – até a entrada em
vigor da Lei nº 12.514/2011.
Sob o ângulo da repercussão geral, assinala que a matéria versada no re-
curso ultrapassa os limites subjetivos da lide, mostrando-se relevante. Sublinha
ser o tema de interesse de profissionais e empresas de engenharia. Enfatiza que
o Supremo, no Recurso Extraordinário com Agravo 748.455/SC, da relatoria
do Ministro Ricardo Lewandowski, admitiu a repercussão geral relativamen-
te à taxa estabelecida na Lei nº 6.496/77, também cobrada pelos Conselhos
Regionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia e alusiva à Anotação de
Responsabilidade Técnica.
O CREA/SC, apesar de intimado, não apresentou contrarrazões.
Ao receber o extraordinário, o Vice-Presidente do Tribunal Regional Fe-
deral da 4ª Região determinou a remessa do recurso à Turma de origem, para
novo exame, nos termos do art. 543-B, § 3º, do Código de Processo Civil, ante
o julgamento do mérito do Recurso Extraordinário com Agravo 748.455/SC,
no qual reconhecida a repercussão geral e a suposta divergência, considerado
o decidido pelo Supremo e o constante do acórdão recorrido. O relator man-
teve o pronunciamento respaldado na constitucionalidade do art. 2º da Lei nº
6.994/82. Assentou que o paradigma versou a Lei nº 6.496/77, cujas regras
seriam distintas da Lei nº 6.994/82. Seguiu-se, então, a admissão do recurso.
Eis o pronunciamento do Ministro Dias Toffoli:
‘RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TRIBUTÁRIO.
TAXA PARA EMISSÃO DE ANOTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE TÉCNICA.
LEI Nº 6.994/82. PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL. FIXAÇÃO DE VALOR
MÁXIMO.
Possui repercussão geral a matéria alusiva à validade da exigência da taxa
para expedição da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART), baseada na
Lei nº 6.994/82, a qual estabeleceu limites máximos para a ART, até o valor de
5 MVR, considerada a exigência do art. 150, I, da Constituição.
MANIFESTAÇÃO
Trata-se de recurso extraordinário fundado nas letras a e c do permis-
sivo constitucional interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal
da 4ª Região, o qual aplicou precedente de seu Órgão Especial (Incidente
5001195-22.2011.404.7203/SC) em que este reconhecia a constitucionalidade
do parágrafo único do art. 2º da Lei nº 6.994/82, ao argumento de que, em se
tratando de taxa, o princípio da legalidade tributária deve ser flexibilizado,
‘sendo suficiente para seu atendimento que a lei formal indique o seu valor
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 171

máximo, como feito pelas Leis ns. 6.994, de 1982 (art. 2º, parágrafo único), e
12.514, de 2011 (art. 11), com o que se propicia seja ele mais adequadamente
quantificado pelo órgão regulamentar competente, baseado em estudos técni-
cos, atendendo-se melhor aos princípios constitucionais da proporcionalidade
e da capacidade contributiva.
O acórdão restou assim ementado:
‘TRIBUTÁRIO. TAXA PARA EMISSÃO DE ANOTAÇÃO DE RESPONSA-
BILIDADE TÉCNICA. LEI Nº 6.994/82. CONSTITUCIONALIDADE.
É válida a exigência da taxa para expedição da Anotação de Responsabi-
lidade Técnica, a partir da Lei nº 6.994/82, até o valor de 5 MVR.’
O recorrente alega afronta ao art. 150, I, da Constituição e divergência
com a jurisprudência da Corte. Sustenta que o Tribunal Regional, ao reco-
nhecer a constitucionalidade do art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 6.994/82,
entendendo, por decorrência, pela validade da exigência da taxa de ART desde
1982, desde que limitadas a 5 MRV até 31.12.2011, data da edição da Lei nº
12.514, quando o limite passou a ser de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais),
acabou por ferir o princípio da legalidade, pois referida lei teria delegado aos
conselhos a competência para fixar os valores da taxa, mantendo, dessa forma,
os mesmos vícios da Lei nº 6.496/77, já declarada inconstitucional por este
Supremo Tribunal Federal nos autos do RE 748.445/SC, com repercussão geral
reconhecida, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


Em preliminar, aduz que, notoriamente, a matéria possui repercussão
geral, uma vez que cria precedente que atinge toda uma coletividade de profis-
sionais e empresas da área de engenharia interessadas na forma de tributação das
chamadas taxas de anotação de responsabilidade (ART), ao mesmo tempo que
reflete na segurança jurídica tanto do cidadão-litigante quanto do Estado-Juiz.
Passo a me manifestar.
No RE 748.445/SC, o Plenário Virtual ratificou a jurisprudência da Corte
de que a anotação de responsabilidade técnica, instituída pela Lei nº 6.496/77,
tem natureza de taxa – submetendo-se, assim, ao princípio da legalidade –, mas
não apreciou a legislação posterior, qual seja a Lei nº 6.994/82.
Reconheço a existência de alguns precedentes da Corte, os quais, com
base no citado RE 748.445/SC, concluíram que a Lei nº 6.994/82 teria mantido
os mesmos vícios de sua antecessora (RE 826.299/RS-AgR, Rel. Min. Teori
Zavascki, DJe 07.05.2015; ARE 804.854/RS-AgR-ED, Primeira Turma, Rel.
Min. Roberto Barroso, DJe 16.12.2014).
Todavia, é inegável que a Lei nº 6.994/82, aplicável a todos os conselhos
profissionais, foi uma primeira tentativa de uniformização da matéria relativa à
cobrança de anuidades e da taxa objeto do presente recurso extraordinário, uma
vez que essa lei estabeleceu limites máximos para as anuidades e para as ARTs.
172 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Se, por um lado, o princípio da legalidade não pode ser ignorado – pelo
contrário, é ele indispensável –, de outro é de se colocar a discussão sobre o tipo
e o grau de legalidade que satisfazem a exigência do art. 150, ����������������
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da Constitui-
ção, como fez o órgão especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Ou
seja, é de se analisar se o princípio da legalidade é absoluto, ou se o legislador
tributário poderia se valer, em determinadas hipóteses, de cláusulas gerais e
de conceitos indeterminados.
De outro giro, nos autos do RE 704.292, de minha relatoria, com reper-
cussão geral reconhecida, e da ADI 3.408, também de minha relatoria, o tema
da cobrança de anuidades pelos conselhos de categorias profissionais, à luz
do princípio da legalidade, será amplamente debatido, o que torna prudente a
inclusão do presente recurso extraordinário no Plenário Virtual, para o reco-
nhecimento ou não da repercussão geral do tema constitucional e seu eventual
julgamento conjunto no Plenário físico da Corte, considerando-se, inclusive,
a decisão do órgão especial do Tribunal regional.
Diante do exposto, manifesto-me pela existência de matéria constitucional
e pela repercussão geral do tema, submetendo o caso à apreciação dos demais
Ministros da Corte.
Brasília, 9 de junho de 2015.
Ministro Dias Toffoli – Relator’”
2. A controvérsia, a envolver preceitos constitucionais alusivos aos tributos, é
passível de repetir-se em inúmeras situações jurídicas. O fato reclama a manifestação
do Supremo, guarda maior da Constituição Federal.
3. Pronuncio-me no sentido de encontrar-se configurada a repercussão geral.
4. A assessoria, para acompanhar a tramitação do incidente, inclusive quanto a
processos que, versando a mesma matéria, estejam aguardando exame no gabinete.
5. Publiquem.
Brasília – residência –, 28 de junho de 2015, às 18h15min.
Ministro Marco Aurélio
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 639.136-SP


Primeira Turma (DJE 15/09/2015)

Relator: Ministro Luís Roberto Barroso


Data do julgamento: 04/08/2015

77/2 — EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. IMUNIDADE


PARLAMENTAR. NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A MANIFESTAÇÃO E O
EXERCÍCIO DO MANDATO. INEXISTÊNCIA. SÚMULA Nº 279/STF.
1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 600.063-RG, Rel.
Min. Marco Aurélio, no qual fiquei como Redator do acórdão, firmou enten-
dimento no sentido de que os parlamentares são invioláveis pelas opiniões,
palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município,
desde que haja relação de pertinência entre a declaração e as atividades do
parlamentar.
2. No caso, correta a decisão proferida pelo Tribunal de origem, que

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


assentou o dever de indenizar, tendo em vista que não há correlação entre a
declaração do parlamentar e as atividades vinculadas ao seu cargo político.
Precedente.
3. Ademais, a parte recorrente limita-se a postular uma nova apreciação
dos fatos e do material probatório constante dos autos (Súmula nº 279/STF),
procedimento inviável em recurso extraordinário.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Ministra Rosa Weber, na
conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 4 de agosto de 2015.
Ministro Luís Roberto Barroso – Relator

RELATÓRIO
O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Relator):
174 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

1. Trata-se de agravo regimental cujo objeto é decisão que negou seguimento


ao recurso extraordinário sob os seguintes fundamentos: (i) está correta a decisão
proferida pelo Tribunal de origem que assentou o dever de indenizar, tendo em vista
que não há correlação entre a declaração do parlamentar e as atividades vinculadas
ao seu cargo político; (ii) a parte recorrente limita-se a postular uma nova aprecia-
ção dos fatos e do material probatório constante dos autos (Súmula nº 279/STF),
procedimento inviável em recurso extraordinário.
2. A parte recorrente alega que: (i) “a atuação dos agravantes foi na condição de
vereadores do Município de Colina, inclusive em programa radiofônico de responsa-
bilidade do Poder Público Municipal”; (ii) “não há que se falar em revolvimento do
quadro fático probatório, já que a análise do recurso extraordinário está circunscrita
apenas à moldura fática desenhada pelo v. acórdão recorrido”; (iii) é “preferível al-
gum excesso por parte dos vereadores, com a apuração em sede própria, que tolher
a relevante atribuição de fiscalizar os atos praticados por todos aqueles no exercício
de uma função pública municipal, como na espécie”.
3. É o relatório.

VOTO
O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Relator):
1. O recurso não deve ser provido, tendo em vista que a parte recorrente não
trouxe novos argumentos suficientes para modificar a decisão ora agravada. Nessas
condições, deve-se manter pelos seus próprios fundamentos a decisão recorrida,
assim transcrita:
“(...)
Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão da Sexta
Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
assim ementado:
‘Dano moral. Lei de Imprensa. Deserção. Inocorrência. Falta de depósito
integral da condenação. Art. 57, § 6º, da Lei nº 5.250/67 não recepcionado
pela CF de 1988.
Legitimidade passiva ad causam. Solidariedade entre o entrevistado e a
empresa que veiculou a reportagem considerada ofensiva. Súmula nº 221/STJ.
Imunidade parlamentar. Inviolabilidade relativa. Não se reconhece a imu-
nidade material dos vereadores quando as manifestações não estão inseridas
no âmbito específico e restrito ao exercício da vereança. Inexistência de nexo
etiológico entre o fato e o exercício do mandato político.
Condenação em salário mínimo. Não se reconhece afronta ao art. 7º,
IV, da CF ante a condenação em salário mínimo, porque este foi estabelecido
apenas como critério de cálculo e não como fator de atualização.
Litigância de má-fé. Preclusão. Inocorrência. O dano processual é medida
de ordem pública, não possui natureza reparatória civil.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 175

Sucumbência à condenação em valor inferior ao pretendido não acarreta


sucumbência recíproca. O pedido inicial se dá em caráter estimativo, na medida
em que o montante da indenização é arbitrado por equidade pelo julgador.
Recursos não providos.’
O recurso busca fundamento no art. 102, III, a, da Constituição Federal.
A parte recorrente alega violação ao art. 29, VIII, da Constituição. Alega que é
incontroverso que os recorrentes, quando externavam as alegadas ofensas, estavam
no exercício do mandato parlamentar.
O Supremo Tribunal Federal em recente julgamento do RE 600.063-RG,
Rel. Min. Marco Aurélio, no qual fiquei como relator do acórdão, firmou en-
tendimento no sentido de que os parlamentares são invioláveis pelas opiniões,
palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município,
desde que haja relação de pertinência entre a declaração e as atividades do
parlamentar. Confiram-se, a propósito, trechos do voto do Ministro Marco
Aurélio, do qual divergi tão somente quanto às premissas fáticas constantes
dos autos do referido paradigma:
‘(...)
As imunidades, como se sabe, são prerrogativas outorgadas aos parla-
mentares com o objetivo de assegurar ampla independência e liberdade de
ação para o exercício do mandato representativo. Não constituem espécie
de benefício pessoal conferido a senadores, deputados e vereadores para a
satisfação de interesses privados, mas prerrogativas decorrentes do interesse

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


público no bom desempenho do ofício parlamentar. Esta garantia funcional,
de caráter irrenunciável, protege os membros do Legislativo contra eventuais
abusos e impede que fiquem vulneráveis à pressão dos demais poderes. Trata-
se, portanto, de um instituto muito caro num Estado Democrático de Direito,
por viabilizar a atuação espontânea, equidistante dos detentores de mandatos
políticos.
(...)
A inviolabilidade, como já destacado, visa garantir a independência dos
membros do parlamento para permitir o bom exercício da função e proteger a
integridade do processo legislativo. Se, por um lado, esta prerrogativa deve ser
assegurada para possibilitar a ampla liberdade de expressão do parlamentar, por
outro, não pode transformar-se em anteparo para práticas abusivas, excessos
ou ofensas contra a honra alheia. A subordinação ao exercício do mandato
impõe o acatamento ao caráter teleológico da inviolabilidade, o qual deve estar
sempre presente no espírito do intérprete ou do aplicador das imunidades aos
casos concretos (HORTA, Raul Machado. Direito constitucional. 5. ed. Belo Ho-
rizonte: Del Rey. p. 564). Como já tive a oportunidade de consignar, a cláusula
não confere aos legisladores um bill de indenidade. Em cada situação, devem
ser sopesadas as circunstâncias fáticas, tendo-se sempre presente o elo entre o
mandato e o ato praticado pelo parlamentar. Aí surge a pertinência temática.
176 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

(...)’
No caso de que se trata, está correta a decisão proferida pelo Tribunal de
origem ao assentar o dever de indenizar, tendo em vista que não há correlação
entre a declaração do parlamentar e as atividades vinculadas ao seu cargo
político.’ Vejam-se trechos do voto condutor do acórdão recorrido:
‘(...)
O programa radiofônico A Voz do Povo veiculou entrevista dos vereadores
Gilsenson e Salomão, onde são tecidas duras críticas à conduta profissional
do autor, tendo-o como açougueiro, na medida em que tratava seus pacientes
como animais, dentre outras imputações.
(...)
Nesse passo, cumpre frisar que a imunidade parlamentar dos vereadores
não representa uma inviolabilidade absoluta e, portanto, não afasta o direito
do cidadão comum de acioná-los pelas ofensas que lhe causaram prejuízo,
mormente considerando-se que os vereadores a inexistência de nexo etiológico
entre o fato e o exercício do mandato político.
(...)’
Nessa linha, veja-se a ementa do RE 606.451 AgR-segundo, Rel. Min.
Luiz Fux:
‘(...)
1. A imunidade parlamentar material, que confere inviolabilidade, nas
esferas civil e penal, a opiniões, palavras e votos manifestados pelo congressista
(CF, art. 53, caput), incide de forma absoluta quanto às declarações proferidas
no recinto do Parlamento.
2. Os atos praticados em local distinto escapam à proteção absoluta da
imunidade, que abarca apenas manifestações que guardem pertinência, por um
nexo de causalidade, com o desempenho das funções do mandato parlamentar.
(...)’
Ademais, a parte recorrente limita-se a postular uma nova apreciação
dos fatos e do material probatório constante dos autos (Súmula nº 279/STF),
procedimento inviável em recurso extraordinário.
Diante do exposto, com base nos arts. 557, caput, do CPC e 21, § 1º, do
RI/STF, nego seguimento ao recurso.
(...).”
2. Diante do exposto, nego provimento ao agravo regimental.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 718.652-DF


Terceira Turma (DJE 09/10/2015)

Relator: Ministro João Otávio de Noronha


Data do julgamento: 06/10/2015

77/3 — EMENTA: DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍ-


DICA. SÚMULA Nº 83/STJ.
1. O encerramento das atividades ou dissolução da sociedade, ainda que
irregulares, não são causas, por si sós, para a desconsideração da personalidade
jurídica, nos termos do Código Civil (EREsp 1.306.553/SC).
2. Agravo regimental desprovido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indica-
das, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na
conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os
Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente),
Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com o Sr. Ministro-Relator.
Brasília (DF), 6 de outubro de 2015 (Data do Julgamento).
Ministro João Otávio de Noronha – Relator

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha (Relator):
Trata-se de agravo regimental interposto por Laboratório Sabin de Analise
Clínicas S.A. contra decisão que conheceu do agravo e deu-lhe provimento, a fim
de afastar a desconsideração da personalidade jurídica da parte agravada.
Em suas razões, a parte agravante alega que a decisão agravada violou o disposto
nas Súmulas ns. 7 e 435 do STJ ao rever a posição do Tribunal de origem acerca da
desconsideração da personalidade jurídica da empresa agravada.
Pleiteia a reforma da decisão.
A impugnação ao agravo regimental foi ofertada por Finance Business e Serviços
Ltda. e outros às fls. 245-247 (e-STJ).
É o relatório.
178 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

VOTO
O Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha (Relator):
O recurso não merece prosperar.
A decisão agravada não violou as Súmulas ns. 7 e 435 do STJ, visto que levou
em consideração exclusivamente os fundamentos do acórdão recorrido.
Observa-se que o Tribunal de origem desconsiderou a personalidade jurídica
da empresa agravada, tomando por base a presunção de dissolução irregular, já que
esta deixara de funcionar no domicílio fiscal e não possuía bens suficientes para
saldar o débito exequendo. Confira-se trecho do acórdão:
“O agravante-exequente, por sua vez, requereu a realização de pesquisas
por meio do Bacen Jud, do Rena Jud, do ERIDF (Sistema de Registro de Imóveis
Eletrônico) e do Info Jud (fl. 85), que resultaram no bloqueio de R$ 920,25
(fl. 74 e verso), quantia insuficiente para a quitação do débito exequendo.
Nesse contexto, apesar de a sociedade empresarial ter personalidade
jurídica distinta da dos seus sócios, esses devem responder pelas obrigações
sociais, quando a empresa for dissolvida irregularmente, não deixando endereço
nem bens para saldar os débitos, o que caracteriza o abuso da personalidade
jurídica.” (e-STJ, fl. 137)
Ademais, o acórdão recorrido, ao citar a sentença de primeiro grau, registra que
houve mera alteração do endereço da empresa executada e que não foram demons-
trados indícios suficientes de fraude ou má-fé dos sócios, que foram presumidos
ante a errônea aplicação da Súmula nº 435/STJ.
Portanto, a decisão agravada está em consonância com a jurisprudência do STJ
de que a mera dissolução irregular ou insolvência da pessoa jurídica, sem maiores
considerações acerca da peculiaridade do caso, não são motivos suficientes, por si
sós, a ensejar a sua desconsideração, diante da excepcionalidade do art. 50 do CC.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. ART. 50 DO CC/02.
ABUSO DA PERSONALIDADE. DESVIO DE FINALIDADE OU CONFUSÃO
PATRIMONIAL. REQUISITOS. ENCERRAMENTO IRREGULAR DA SOCIE-
DADE. INSUFICIÊNCIA.
1. A desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional e
está subordinada à comprovação do abuso da personalidade jurídica, caracte-
rizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.
2. ‘O encerramento das atividades ou dissolução, ainda que irregulares, da
sociedade não são causas, por si sós, para a desconsideração da personalidade
jurídica, nos termos do Código Civil’ (EREsp 1.306.553/SC, Relª Minª Maria
Isabel Gallotti, Segunda Seção, j. 10.12.2014, DJe 12.12.2014).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 179

3. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp 584.195/RJ, Rel.


Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe 04.08.2015)
“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL.
EXECUÇÃO. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. DESCONSIDERA-
ÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. DESCABIMENTO. ART. 50 DO CCB.
1. A desconsideração da personalidade jurídica de sociedade empresária
com base no art. 50 do Código Civil exige, na esteira da jurisprudência desta
Corte Superior, o reconhecimento de abuso da personalidade jurídica.
2. O encerramento irregular da atividade não é suficiente, por si só, para
o redirecionamento da execução contra os sócios.
3. Limitação da Súmula nº 435/STJ ao âmbito da execução fiscal.
4. Precedentes específicos do STJ.
5. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no REsp 1.386.576/SC, Rel. Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 25.05.2015)
Caso, pois, de aplicação da Súmula nº 83/STJ.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL Nº 1.524.765-PE


Terceira Turma (DJE 07/10/2015)

Relator: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino


Data do julgamento: 01/10/2015

77/4 — EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂN-


SITO. DANO MORAL E MATERIAL POR MORTE. PENSÃO. TERMO FINAL.
PRESCRIÇÃO.
1. Prescrição. Inocorrência. Suspensão. Aplicação do art. 200 do CCB.
2. Acidente de trânsito. Responsabilidade por fato de terceiro. Emprega-
do da ré condenado criminalmente por homicídio culposo. Responsabilidade
objetiva da empregadora. Arts. 932 e 933 do CCB.
3. Pretensão de rediscussão dos pressupostos da responsabilidade civil.
Inviabilidade. Ausência de comprovação de fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito do autor. Atração do Enunciado nº 7/STJ.
4. Pensionamento. Alegada falta de comprovação de rendimentos da
vítima e da parcela destinada ao sustento da viúva. Descabimento. Súmulas
ns. 282/STF e 7/STJ.
5. Alteração do dies ad quem do pensionamento para a expectativa de
vida do falecido. Art. 948, II, do CCB.
6. Agravo regimental desprovido.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
egrégia Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar
provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs.
Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente), Marco Aurélio Bellizze e Moura
Ribeiro votaram com o Sr. Ministro-Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.
Brasília, 1º de outubro de 2015 (Data de Julgamento).
Ministro Paulo de Tarso Sanseverino – Relator
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 181

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino (Relator):
Trata-se de agravo regimental interposto por Companhia Geral de Melhora-
mentos em Pernambuco contra a decisão deste Relator, que deu parcial provimento
ao seu recurso especial, cuja ementa está assim redigida:
“RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE
TRÂNSITO. DANO MORAL E MATERIAL POR MORTE. PENSÃO. TERMO
FINAL. PRESCRIÇÃO.
1. Prescrição. Inocorrência. Suspensão. Aplicação do art. 200 do CCB.
2. Acidente de trânsito. Responsabilidade por fato de terceiro. Emprega-
do da ré condenado criminalmente por homicídio culposo. Responsabilidade
objetiva da empregadora. Arts. 932 e 933 do CCB.
3. Pretensão de rediscussão dos pressupostos da responsabilidade civil.
Inviabilidade. Ausência de comprovação de fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito do autor. Atração do Enunciado nº 7/STJ.
4. Pensionamento. Alegada falta de comprovação de rendimentos da
vítima e da parcela destinada ao sustento da viúva. Descabimento. Súmulas
ns. 282/STF e 7/STJ.
5. Alteração do dies ad quem do pensionamento para a expectativa de
vida do falecido. Art. 948, II, do CCB.
6. Recurso especial a que se dá parcial provimento.”
Em suas razões recursais, sustentou, uma vez mais: (a) prescrição da pretensão,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


tendo em vista a não suspensão da contagem pela apuração criminal dos fatos; (b)
ilegitimidade ativa da recorrida, por ausência de comprovação de vínculo marital,
relação de companheirismo com a vítima do acidente; (c) culpa exclusiva do condutor
do veículo em que estava a vítima; (d) descabimento do pensionamento mensal à
recorrida, diante da ausência de comprovação dos rendimentos da vítima à época
do acidente e do quantum que seria revertido à recorrida; e (e) ausência de prova
do dano moral e revisão da indenização, fixada em R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Postulou o provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino (Relator):
Eminentes Colegas, as razões vertidas agora em sede de regimental não alte-
ram a convicção deste relator acerca dos temas objeto de impugnação, razão por
que submeto a este colendo Colegiado os fundamentos que me levaram ao parcial
provimento do recurso especial do agravante:
“Relembro que a recorrida, esposa de José Antônio Carlos de Souza, fale-
cido em acidente de trânsito ocorrido em 2004, ajuizou ação indenizatória por
danos materiais e morais contra a recorrente, imputando-lhe a responsabilidade
pelo evento fatídico em questão, pois causado por um de seus funcionários, que
182 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

conduzia, sem habilitação, a carregadeira que dera azo ao acidente, indivíduo


este que fugiu sem prestar socorro à vítima, razão por que fora definitivamente
condenado em âmbito penal nos idos de agosto de 2008.
Passo a exame de cada um dos tópicos do recurso especial, iniciando
pela prescrição.
a) Prescrição e o art. 200 do CCB:
Não há espaço para o reconhecimento do implemento do prazo prescri-
cional, tendo a Corte de origem, com apoio na prova dos autos, concluído pela
incidência do art. 200 do CCB.
A propósito:
‘No tocante ao prazo, observa-se que a ação penal que apurou a culpa do
motorista da máquina agrícola e funcionário da Usina Laranjeiras transitou
em julgado em agosto de 2008 (fl. 25) e assim o art. 200 do Código Civil é
claro ao afirmar que em ações que dependem de fato a ser apurado em juízo
criminal, a prescrição ocorrerá com o trânsito em julgado desta sentença. Fato
é que, ao impetrar a ação em 7 de agosto de 2009, a autora observou o prazo
prescricional de 3 (três) anos para intentar a ação que dependeu de fato a ser
apurado em juízo criminal, e o prazo prescricional só ocorreria com o trânsito
em julgado desta sentença, não cabendo alegação de prescrição.’ (fl. 303)
A regra do art. 200 do Código Civil obsta o transcurso do prazo prescri-
cional da pretensão cível no curso da ação penal em que se apura o mesmo
fato, gênese do ilícito penal e civil.
A finalidade dessa norma é evitar a possibilidade de soluções contra-
ditórias entre os juízos cível e criminal, especialmente quando a solução do
processo penal seja determinante do resultado do processo cível.
Perceba-se que a indenização com base na responsabilidade de terceiro,
ou seja, a responsabilidade objetiva do empregador pelos danos causados pelo
empregado, prevista no art. 932, III, do CCB, depende do reconhecimento da
responsabilidade do empregado, o causador do dano.
Configurando o fato, além de ilícito civil, um ilícito penal, pois o acidente
resultou no homicídio culposo do esposo da recorrida, permite-se ao autor da
ação civil aguardar a solução da ação penal para, apenas depois, desencadear
a demanda indenizatória.
É fundamental que exista processo penal em curso ou, pelo menos, a
tramitação de inquérito policial.
Na jurisprudência deste egrégio Tribunal acerca da aplicação do art. 200
do Código Civil, merecem referência os seguintes precedentes:
‘RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE
TRÂNSITO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. SUSPENSÃO
PREVISTA NO ART. 200 DO CÓDIGO CIVIL. NECESSIDADE DE INSTAURA-
ÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL OU DE AÇÃO PENAL. INAPLICABILIDADE
DA REGRA AO CASO.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 183

1. Ação de reparação de danos derivados de acidente de trânsito ocorrido


em 26 de agosto de 2002 proposta apenas em 7 de fevereiro de 2006, ense-
jando o reconhecimento pela sentença da ocorrência da prescrição trienal do
art. 206 do CC.
2. Reforma da sentença pelo acórdão recorrido, aplicando a regra do art.
200 do CC de 2002.
3. Inaplicabilidade da regra do art. 200 do CC/02 ao caso, em face da
inocorrência de relação de prejudicialidade entre as esferas cível e criminal,
pois não instaurado inquérito policial ou iniciada ação penal.
4. Interpretação sistemática e teleológica do art. 200 do CC/02, com base
na doutrina e na jurisprudência cível e criminal desta Corte.
5. Recurso especial provido.’ (REsp 1.180.237/MT, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, Terceira Turma, j. 19.06.2012, DJe 22.06.2012)
‘CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO. SE O
ATO DO QUAL PODE EXSURGIR A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTA-
DO ESTÁ SENDO OBJETO DE PROCESSO CRIMINAL, O TERMO INICIAL
DA PRESCRIÇÃO DA AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS INICIA, EXCEP-
CIONALMENTE, NA DATA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA
PENAL. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.’ (REsp 137.942/
RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, Segunda Turma, j. 05.02.98, DJ 02.03.98, p. 64)
‘PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊN-
CIA. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRISÃO

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


ILEGAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL.
1. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem,
embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a ques-
tão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a
um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados
tenham sido suficientes para embasar a decisão.
2. É assente na Corte que a coisa julgada na instância penal constitui o
termo inicial da contagem do prazo de prescrição da ação de indenização em
face do Estado. Precedentes: AEREsp 302.165/MS, Primeira Seção, Rel. Min.
Peçanha Martins, DJ 10.06.02; AGA 441.273/RJ, 2ª T., Rel. Min. João Otávio
de Noronha, DJ 19.04.04; REsp 254.167/PI, 2ª T., Relª Minª Eliana Calmon,
DJ 01.02.02; REsp 442.285/RS, 2ª T., Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 04.08.03;
AgREsp 347.918/MA, 1ª T., Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 21.10.02.
3. Funda-se a jurisprudência no fato de que nesses casos o termo a quo é o
trânsito em julgado da sentença condenatória penal, porquanto a reparação do
dano ex delicto é consequente, por isso que, enquanto pende a incerteza quanto à
condenação, não se pode aduzir à prescrição, posto instituto vinculado à inação.
4. Isto porque ‘se o ato ou fato danoso está sendo apurado na esfera cri-
minal, com ilícito, em nome da segurança jurídica aconselha-se a finalização,
184 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

para só então ter partido o prazo prescricional, pelo princípio da actio nata’
(REsp 254.167/PI).
5. In casu, versa hipótese de arquivamento de inquérito policial, por isso
que o autor alegou ter sido preso ilegalmente, indiciado, mas não chegou a ser
ajuizada a competente ação penal.
6. Nesta hipótese, o termo a quo da prescrição da pretensão indenizatória
moral conta-se da data do arquivamento do inquérito policial, inaplicando-se,
como evidente, o Código Civil com eficácia retroativa a fatos ocorridos antes
de sua entrada em vigor.
7. Ademais, é diversa a hipótese da ação de indenização calcada em repa-
ração de dano ex delito e ação de dano moral pela veiculação de representação
penal arquivada.
8. Recurso especial a que se nega provimento.’ (REsp 618.934/SC, Rel.
Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 24.11.04, DJ 13.12.04, p. 239)
‘PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ATO ILÍCITO PRATI-
CADO POR AGENTES DO ESTADO. AÇÃO PENAL. RECONHECIMENTO
DA AUTORIA E DO FATO NO JUÍZO CRIMINAL. PRESCRIÇÃO. TERMO
INICIAL. PRECEDENTES.
1. As jurisdições cível e criminal intercomunicam-se. A segunda repercute
de modo absoluto na primeira quando reconhece o fato ou a autoria. Nesse
caso, a sentença condenatória criminal ou a decisão concessiva de habeas corpus
constituem títulos executórios no cível.
2. O art. 1.525 do Código Civil de 1916 impede que se debata no juízo
cível, para efeito de responsabilidade civil, a ocorrência do fato e a sua autoria
quando tais questões tiverem sido decididas no juízo criminal.
3. O próprio CPC confere executoriedade à sentença penal condenatória
transitada em julgado (art. 548, II). Assim, não se poderia, coerentemente,
obrigar a vítima a aforar a ação civil dentro dos cinco anos do fato criminoso.
Remanesce o ilícito civil.
4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é uníssona no sen-
tido de que o termo inicial para a propositura da ação indenizatória, em face
de ilícito penal que está sendo objeto de processo criminal, é do trânsito em
julgado da sentença condenatória, ou, no caso, se, reconhecidos a autoria e
o fato no juízo criminal, da suspensão do processo (trânsito em julgado da
decisão concessiva de habeas corpus).
5. Precedentes das Primeira, Segunda e Quarta Turmas desta Corte Su-
perior.
6. Recurso provido, nos termos conclusivos do voto.’ (REsp 622.117/
PR, Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, j. 06.05.04, DJ 31.05.04, p. 246)
Com efeito, ajuizada ação penal para apuração do fato e decorrendo dela
a condenação do réu, empregado da ora recorrente, é patente a relação de pre-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 185

judicialidade, concretizando-se a hipótese prevista no art. 200 do CC, ou seja,


a existência ‘de fato que deva ser apurado no juízo criminal’.
Em tendo sido a ação reparatória ajuizada em 2009, escorreita a conclu-
são do acórdão recorrido no sentido da inexistência de implemento do prazo
prescricional.
Afasto, pois, a alegação de prescrição.
b) Ilegitimidade ativa:
Melhor sorte não assiste à recorrente.
A alegação pauta-se na ausência de demonstração do vínculo conjugal
entre a parte autora e a vítima falecida.
Contudo, as conclusões do Tribunal de origem atestam o contrário.
Confira-se:
‘Fato é que a autora acostou certidão de casamento e certidão de óbito,
fls. 15/16, comprovando o alegado, sendo a apelada parte legítima para intentar
a ação.’ (fl. 304)
Elidir as conclusões do aresto impugnado quanto ao ponto demandaria
o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, providência vedada
nesta sede especial a teor da Súmula nº 7/STJ.
c) Responsabilidade por fato de terceiro:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


A recorrente sustenta a culpa exclusiva do condutor do automóvel em
que estava a vítima e ressalta que a ausência de habilitação do seu empregado
não implicaria presunção de culpa.
Inicialmente, exsurge da sentença, confirmada pelo acórdão recorrido,
que o motorista da carregadeira, seu empregado, fora condenado criminalmente
pela prática do crime tipificado no art. 302, parágrafo único, do Código de
Trânsito Brasileiro (redação anterior à Lei nº 12.971/2014):
‘Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:
Penas – detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se
obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo
automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:
I – não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação;
II – praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada;
III – deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal,
à vítima do acidente;
IV – no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo
de transporte de passageiros.’
186 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

A Corte local, corroborando a responsabilidade do empregado da ré,


destacou:
‘Na verdade, foi comprovada a culpa do condutor da carregadeira da
ré, que trafegava com a máquina na PE-74, com parte do veículo na estrada,
inobstante ser a banqueta o local para transitar, além de não possuir carteira
de habilitação e fugir do local sem prestar socorro às vítimas.
O acidente é incontroverso, bem ainda o desfecho fatal. Divergem as
partes, todavia, quanto à dinâmica dos fatos e à extensão dos danos.
Em que pese as testemunhas divirjam, em parte, quanto a alguns dos
fatos que antecederam ao evento danoso, tais dissonâncias não interferem no
desate da lide.
Por outro lado, no que diz respeito ao alegado comportamento indevido
do motorista do automóvel, no qual estava a vítima, supostamente trafegar em
alta velocidade, não há prova alguma nos autos de que tenha agido de maneira
a contribuir para a ocorrência do infortúnio, que vitimou o de cujus, ônus que
recaía sobre a demandada, nos termos do art. 333, I, do CPC.
(...)
No caso concreto, diversamente do que sustenta o apelante, não há falar
em ausência de agir culposo da sua parte, nem mesmo de culpa concorrente
da vítima para o evento, eis que, segundo prova produzida, o motorista da
carregadeira, funcionário da empresa ora ré, não possui carteira de habilitação,
evadiu-se do local do crime sem prestar socorro e transitava em parte em pista
própria para automóveis, no período noturno, sem as devidas cautelas.
Por outro lado, o réu não produziu prova suficiente a demonstrar, como
refere, que seu preposto não foi o causador do atropelamento.’
Não fosse o fato de a autoria do fato não poder ser agora discutida, pois,
na forma do art. 935 do CCB, definitivamente reconhecida em sede penal,
cumpriria à parte recorrente evidenciar excludente da responsabilidade obje-
tiva prevista nos arts. 932 e 933 do CCB, o que, de fato, não lograra realizar,
consoante concluíra o acórdão recorrido.
Tornou-se certa, assim, a responsabilidade do seu empregado pelo evento
que vitimou o esposo da recorrida, isso já em seara penal, fazendo a recorrente,
sua empregadora, que lhe disponibilizou carregadeira para, imprudentemente,
sem a devida habilitação, trafegar em via pública, corresponsável pelos danos
cujas indenizações são, agora, postuladas, especialmente porque não logrou
afastar a responsabilidade que sobre ela pendia.
Não houve a comprovação de fato que corroborasse a ausência de res-
ponsabilidade da ré, o que, de toda sorte, em sede de recurso especial, porque
exigiria o reexame de provas, não poderia ser agora identificado, em conso-
nância com o óbice da Súmula nº 7/STJ.
e) Pensionamento:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 187

O acórdão recorrido, acerca do pensionamento, concluiu (fl. 325):


É patente que a mencionada verba é notadamente indispensável à sub-
sistência eficaz da autora/viúva.
Quanto ao termo final do pensionamento, entendo que agiu com acerto
a togada de piso, ao determinar que a citada pensão seja paga até a data em
que a autora complete 70 (setenta) anos de vida.
Do mesmo modo, compreendo que o valor arbitrado pela magistrada
sentenciante a título de pensão mensal, qual seja 1 (um) salário mínimo, está
em conformidade com as particularidades do caso concreto.
A recorrente, no especial, sustenta a ausência de comprovação dos rendi-
mentos da vítima à época do acidente, a ausência de comprovação do quanto o
falecido contribuía no sustento da autora e, ainda, que a expectativa de vida do
vitimado seria de 65 anos, e não 70, como fora firmado no acórdão recorrido.
Ora, não fosse o fato de que a prova da remuneração poderia ser ple-
namente acostada pela recorrente, já que incontroversamente empregadora
do vitimado, a questão acaba por, novamente, deitar-se sob leito meramente
fático-probatório, atraindo-se o Enunciado nº 7/STJ.
Por outro lado, não se extrai do acórdão recorrido discussão acerca da
presente questão, não se fazendo, pois, prequestionada (Súmula nº 282/STF).
Exigir-se, por outro lado, como sugere o recorrente, a prova do quanto
o marido contribuía para a o sustento de sua esposa desafia, até mesmo, a

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


razoabilidade.
Os pensionistas (as vítimas por ricochete) são, segundo o art. 948, as
pessoas a quem o morto devia alimentos, de acordo com as regras do Direito
de Família. Incluem-se o cônjuge (companheiro/companheira), os pais, os
filhos menores, etc.
Em que pese a dependência econômica seja relevante, o cônjuge, a com-
panheira, os filhos menores têm em seu favor uma presunção de necessidade,
não havendo falar em prova do sustento.
De outro lado, acerca do limite etário para o pensionamento, a sentença
e a Corte de origem fixaram-no à data em que a autora completasse 70 anos.
Eis o único tópico em que o recurso merece provimento.
No caso concreto, a fixação do termo final do pensionamento, com base
na idade da autora, refletiria na extensão por cerca de 6 anos do período de
pensionamento legalmente devido, pois o vitimado, nascido em 15.01.59 (fl.
13), contava com 45 anos à data do fato, e a autora com 39 anos, pois nascida
em 03.06.65 (fl. 14).
O art. 948, II, do CCB é claro – não permitindo interpretações diversas
– ao fixar, como termo ad quem do pensionamento pelo dano morte a expecta-
188 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

tiva de vida do falecido, e não dos seus familiares, postulantes da indenização,


como reconhecera a origem.
O termo inicial é, evidentemente, a data do óbito. Para a fixação do
termo final, o Código Civil menciona textualmente ‘a duração provável de
vida da vítima’.
Essa expressão ‘duração provável’ tem sido interpretada como sendo as
estimativas estatísticas feitas pelo IBGE, quando o estabelecimento da expec-
tativa de vida concreta da pessoa falecida não se mostre possível.
É inviável a esta Corte Superior alterar a idade limite fixada pela origem
de 70 anos, porque diretamente vinculada a elementos meramente fático-
probatórios, não se mostrando, todavia, irrazoável adotá-la, pois as tábuas de
mortalidade têm paulatinamente extendido a expectativa média de vida da
população, que, em alguns casos, supera e muito os 70 anos de idade.
Assim, o recurso merece parcial provimento, alterando-se o termo final
do pensionamento para a data em que o de cujus completasse o septuagésimo
ano de idade.
Por fim, quanto ao pedido de revisão do valor arbitrado a título de danos
morais (fl. 309), no caso em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), não assiste mínima
razão à recorrente.
O controle levado a efeito por esta Corte Superior no que tange ao valor
de indenizações por danos morais, consoante a sua jurisprudência pacífica,
restringe-se a arbitramentos que se revelem mínimos ou exacerbados, pois
afrontados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, casos em que
seria possível ultrapassar o óbice do Enunciado nº 7/STJ.
A hipótese em que se fixa a indenização pelo sofrimento decorrente do
dano morte em R$ 30.000,00 de modo algum revela-se desviada da propor-
cionalidade ou razoabilidade, encontrando-se, sim, muito aquém dos valores
arbitrados em inúmeros precedentes desta Corte Superior, que, em média, tem
fixado indenizações entre 300 e 500 salários mínimos.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso especial, alterando,
apenas, o termo final do pensionamento para a data em que o falecido com-
pletaria setenta (70) anos de idade.”
As questões agora impugnadas foram, todas, devidamente enfrentadas na
monocrática, não havendo em nada alterar-se o que anteriormente restou consig-
nado em relação à ausência de prescrição, à legitimidade ativa, aos danos morais, à
indenização e ao pensionamento.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É o voto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.513-PR


Quarta Turma (DJE 06/10/2015)

Relator: Ministro Luis Felipe Salomão


Data do julgamento: 22/09/2015

77/5 — EMENTA: VIOLAÇÃO AOS ARTS. 458 E 535 DO CPC NÃO


VERIFICADA. AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS PRES-
TADOS DE FORMA INDIVIDUALIZADA AO HSBC E AO BAMERINDUS.
SOLIDARIEDADE. IMPOSSIBILIDADE. NÃO OCORRÊNCIA DE SUCESSÃO
UNIVERSAL. NECESSIDADE DE DELIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE
DE CADA UMA DAS PARTES DEMANDADAS.
1. Inexiste afronta aos arts. 458 e 535 do CPC quando o acórdão recorrido
analisa todas as questões pertinentes para a solução da lide, pronunciando-se,
de forma clara e suficiente, sobre a controvérsia estabelecida nos autos.
2. À luz do disposto no art. 265 do Código Civil de 2002, esta Corte Su-
perior tem decidido pela impossibilidade de se presumir a solidariedade entre

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


as partes envolvidas sem qualquer amparo legal ou contratual.
3. As Turmas de Direito Privado deste Tribunal Superior têm entendimen-
to uníssono pela não ocorrência de sucessão a título universal entre os bancos
HSBC Bank Brasil S/A e Bamerindus do Brasil S/A – em liquidação extrajudicial,
afastada, por conseguinte, a aplicação da teoria da aparência.
4. À míngua de qualquer disposição legal ou contratual que indique a res-
ponsabilidade solidária, cada uma das instituições demandadas deverá arcar, de
forma individualizada, pelos serviços advocatícios prestados pelo demandante
e pelo ressarcimento das despesas realizadas a serviço, competindo ao juízo da
execução delimitar a quota-parte de responsabilidade de cada um dos bancos
réus em relação ao total fixado na condenação e à sucumbência.
5. Recurso especial provido.

DECISÃO
1. Cuida-se de recurso especial interposto por HSBC Bank Brasil S/A – Banco
Múltiplo, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição da República, contra
acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, assim ementado:
“AÇÃO DE COBRANÇA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELA-
ÇÃO CÍVEL. SOLIDARIEDADE PASSIVA DO HSBC COM RELAÇÃO AOS DÉ-
190 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

BITOS DO BANCO SUCEDIDO BAMERINDUS. PRECEDENTES. RECURSO


ADESIVO. VERBA SUCUMBENCIAL. MANUTENÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL
NÃO PROVIDA. RECURSO ADESIVO NÃO PROVIDO.”
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.
Em suas razões recursais, aponta a parte recorrente, além de dissídio juris-
prudencial, ofensa ao disposto nos arts. 3º, 267, VI, 458, II, e 535, II, do Código de
Processo Civil, 896 do Código Civil de 1916 e 265 do Código Civil de 2002.
Sustenta, em síntese: (a) nulidade do acórdão recorrido, pois, não obstante a
oposição de embargos de declaração, os vícios apontados não foram sanados; (b) a
ausência de solidariedade entre o HSBC Bank Brasil S/A e o Banco Bamerindus do
Brasil S/A – em liquidação extrajudicial em relação aos serviços advocatícios objeto
da presente ação de cobrança de honorários advocatícios.
Contrarrazões ao recurso especial às fls. 789-792 em que se aduz que a questão
sucessória entre as instituições financeiras é matéria fática, atraindo a incidência da
Súmula nº 7/STJ, bem como a ausência de similitude fática com o acórdão apontado
como paradigma.
Crivo positivo de admissibilidade na origem (fls. 794-795).
É o relatório.
Decido.
2. Inicialmente, observa-se que não se viabiliza o recurso especial pela indicada
violação do art. 535 do Código de Processo Civil. Isso porque, embora rejeitados
os embargos de declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo
Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que
em sentido contrário à pretensão da recorrente.
Não se verifica, também, no caso, a alegada vulneração do art. 458, II, do Código
de Processo Civil, porquanto a Corte local apreciou a lide, discutindo e dirimindo as
questões fáticas e jurídicas que lhe foram submetidas. O teor do acórdão recorrido
resulta de exercício lógico, ficando mantida a pertinência entre os fundamentos e
a conclusão.
3. Melhor sorte socorre o recorrente no tocante ao não cabimento da solida-
riedade.
Dessume-se dos autos que o ora recorrido ajuizou ação de cobrança de hono-
rários advocatícios, decorrente de alegada prestação de serviços advocatícios que
teria prestado para o Banco Bamerindus do Brasil S/A – em liquidação extrajudicial
e para o HSBC Bank Brasil S/A.
Com base nas provas carreadas aos autos, o juízo monocrático, ao final, jul-
gou parcialmente procedente o pedido e condenou solidariamente as instituições
financeiras ao pagamento do valor de R$ 52.500,00, corrigido monetariamente a
partir da data do laudo pericial – 20.05.08 – e juros de mora, e ao ressarcimento das
despesas realizadas a serviço pelo demandante.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 191

Em relação à solidariedade, o juízo singular consignou:


“(...)
No que concerne a este tema, os Tribunais pátrios já sedimentaram o
entendimento de que o primeiro requerido sucedeu o segundo requerido,
assumindo todas as obrigações e as responsabilidades relativas às negociações
efetivadas por este, independentemente do fato de o segundo requerido ainda
possuir personalidade jurídica distinta do primeiro requerido.
(...)” (fl. 586)
O Tribunal de origem, de modo similar, concluiu:
“(...)
Conforme mencionado pelo próprio recorrente, restou pacificado o
entendimento de que na seara dos processos que tratam do direito bancário
propriamente dito, o banco HSBC é solidariamente responsável pelos débitos
do banco sucedido Bamerindus.
Porém, tal constatação não impede que outras demandas na esfera civil
e empresarial sejam igualmente propostas contra o HSBC.
(...)” (fl. 658)
Observa-se que a solidariedade entre as duas instituições financeiras foi as-
sentada pelas instâncias ordinárias sem qualquer referência ao acervo documental
ou probatório.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


À luz do disposto no art. 265 do Código Civil de 2002, esta Corte Superior
tem decidido pela impossibilidade de se presumir a solidariedade entre as partes
envolvidas sem qualquer amparo legal ou contratual.
Ilustrativamente:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE
BANCO COOPERATIVO E COOPERATIVA DE CRÉDITO. INEXISTÊNCIA.
AÇÃO MONITÓRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA.
1. Não há solidariedade passiva entre banco cooperativo e cooperativa de
crédito quanto às operações bancárias por esta realizadas com seus cooperados,
uma vez que o sistema de crédito cooperativo funciona de molde a preservar
a autonomia e a independência – e consequente responsabilidade – de cada
uma das entidades que o compõem.
2. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.
3. É parte ilegítima para figurar no polo passivo do procedimento moni-
tório a instituição financeira (banco cooperativo) que não contrata diretamente
com o cooperado, cabendo à cooperativa de crédito responder pelos prejuízos
a que der causa.
4. Recurso especial provido.” (REsp 1.173.287/SP, Rel. Min. João Otávio
de Noronha, Quarta Turma, j. 01.03.2011, DJe 11.03.2011)
192 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO


ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ISS. EXECUÇÃO FISCAL. PESSOAS JURÍDICAS
QUE PERTENCEM AO MESMO GRUPO ECONÔMICO. CIRCUNSTÂNCIA
QUE, POR SI SÓ, NÃO ENSEJA SOLIDARIEDADE PASSIVA.
1. O entendimento prevalente no âmbito das Turmas que integram a
Primeira Seção desta Corte é no sentido de que o fato de haver pessoas ju-
rídicas que pertençam ao mesmo grupo econômico, por si só, não enseja a
responsabilidade solidária, na forma prevista no art. 124 do CTN. Ressalte-se
que a solidariedade não se presume (art. 265 do CC/02), sobretudo em sede
de direito tributário.
2. Embargos de divergência não providos.” (EREsp 834.044/RS, Rel. Min.
Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, j. 08.09.2010, DJe 29.09.2010)
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITA-
ÇÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO AGENTE FINANCEIRO POR
DEFEITOS NA OBRA. ILEGITIMIDADE RECONHECIDA. PRECEDENTE.
1. A responsabilidade advém de uma obrigação preexistente, sendo aquela
um dever jurídico sucessivo desta que, por sua vez, é dever jurídico originário.
2. A solidariedade decorre de lei ou contrato, não se presume (art. 265
do CC/02).
3. Se não há lei, nem expressa disposição contratual atribuindo à Caixa
Econômica Federal o dever jurídico de responder pela segurança e solidez da
construção financiada, não há como presumir uma solidariedade.
4. A fiscalização exercida pelo agente financeiro se restringe à verificação
do andamento da obra para fins de liberação de parcela do crédito financiado à
construtora, conforme evolução das etapas de cumprimento da construção. Os
aspectos estruturais da edificação são de responsabilidade de quem os executa,
no caso, a construtora. O agente financeiro não possui ingerência na escolha de
materiais ou avaliação do terreno no qual que se pretende erguer a edificação.
5. A Caixa Econômica Federal é parte ilegítima para figurar no polo pas-
sivo de ação indenizatória que visa o ressarcimento por vícios na construção de
imóvel financiado com recursos do SFH, porque nesse sistema não há obrigação
específica do agente financeiro em fiscalizar, tecnicamente, a solidez da obra.
6. Recurso especial que se conhece, mas nega-se provimento.” (REsp
1.043.052/MG, Rel. Min. Honildo Amaral de Mello Castro [Des. Conv. TJAP],
Quarta Turma, j. 08.06.2010, DJe 09.09.2010)
Mais especificamente em relação à apontada sucessão havida entre a casa ban-
cária recorrente e o Banco Bamerindus do Brasil S/A – em liquidação extrajudicial, as
Turmas de Direito Privado deste Tribunal Superior têm entendimento uníssono pela
não ocorrência de sucessão a título universal entre essas instituições financeiras,
afastada, por conseguinte, a aplicação da teoria da aparência.
Nesse sentido, confiram-se:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 193

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CUMPRIMENTO DE


SENTENÇA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. HSBC. BAMERINDUS. SUCESSÃO
UNIVERSAL. NÃO OCORRÊNCIA. TITULARIDADE DOS PASSIVOS. VERI-
FICAÇÃO EM CADA CASO CONCRETO. TEORIA DA APARÊNCIA. INAPLI-
CABILIDADE. PERSONALIDADES JURÍDICAS DISTINTAS. CONSERVAÇÃO.
ÔNUS DA PROVA. INCUMBÊNCIA DE QUEM ALEGA.
1. Cinge-se a controvérsia a definir se o HSBC é parte legítima para in-
tegrar o polo passivo do cumprimento de sentença exarada nos autos de ação
revisional proposta contra o Banco Bamerindus.
2. A jurisprudência desta Corte firmou posicionamento no sentido de não
reconhecer a ocorrência de sucessão universal entre o HSBC e o Bamerindus,
de modo que a verificação da titularidade dos passivos deve ser efetivada em
cada caso concreto.
3. A ausência de sucessão universal sobressai da leitura do Instrumento
Particular de Contrato de Compra e Venda de Ativos, Assunção de Direitos e Obri-
gações e Outras Avenças firmado entre o Banco HSBC S/A e o Banco Bamerin-
dus do Brasil S/A – sob intervenção –, da qual se conclui que a transferência
de determinados ativos e passivos ligados mormente à atividade empresarial
bancária não gerou a transmissão de todo o patrimônio ou da totalidade das
obrigações de uma instituição financeira para a outra.
4. Nos termos do decidido pela Quarta Turma, no REsp 1.338.793/MS,
Relator Ministro Marco Buzzi, a incidência da teoria da aparência tem lugar nos
casos em que, havendo sucessão parcial de uma instituição financeira por outra,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


o consumidor (mutuário/correntista) se vê eventualmente impossibilitado de
definir a qual banco está vinculado ou qual deles hospeda sua escrita contábil.
5. O caso dos autos é substancialmente diverso, pois o contrato em
comento foi celebrado em 19.09.95 com o Bamerindus, tendo toda a ação de
conhecimento sido processada contra esse requerido, ao passo que o HSBC
somente foi incluído no polo passivo da demanda na fase de cumprimento de
sentença, por meio de decisão exarada em 23.05.07.
6. O Bamerindus, que foi submetido ao regime especial de liquidação
extrajudicial por força de ato do Banco Central do Brasil, conservou sua per-
sonalidade jurídica e capacidade de atuação em juízo e fora dele. Precedentes:
REsps 1.431.693/SP e 1.429.173/PA.
7. No caso em apreço, não há nos autos nenhum elemento que indique
que o passivo objeto do cumprimento de sentença que deu origem ao presente
recurso especial tenha sido assumido pelo HSBC.
8. Incumbe ao exequente fazer prova do fato que alega, sendo impróprio
adotar a premissa de que caberia ao ora recorrente comprovar que não era
devedor.
9. Recurso especial provido.” (REsp 1.505.282/GO, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 25.08.2015, DJe 04.09.2015)
194 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO


DE SENTENÇA. SUCESSÃO EMPRESARIAL. VALORES SUPOSTAMENTE
DEVIDOS POR INSTITUIÇÃO FINANCEIRA (HSBC BANK BRASIL S/A)
NA QUALIDADE DE SUCESSORA DE BANCO EM LIQUIDAÇÃO EXTRA-
JUDICIAL (BANCO BAMERINDUS S/A). APLICAÇÃO PELO TRIBUNAL DE
ORIGEM DA TEORIA DA APARÊNCIA. INAPLICABILIDADE NO CASO.
PRECEDENTE ESPECÍFICO DO STJ. RECURSO ESPECIAL PROVIDO POR
MAIORIA.” (REsp 1.429.173/PA, Rel. Min. Sidnei Beneti, Rel. p/ Ac. Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 03.06.2014, DJe 08.09.2014)
“RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DE VALORES
REFERENTES A HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ARBITRADOS NO BOJO
DO PROCESSO 002.98.050031-0/002 EM 20% (VINTE POR CENTO) SOBRE
O VALOR DA EXECUÇÃO, SUPOSTAMENTE DEVIDOS PELA INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA HSBC BANK BRASIL S/A, NA QUALIDADE DE SUCESSORA
DO BANCO BAMERINDUS S/A. EM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. TRI-
BUNAL DE ORIGEM QUE APLICOU A TEORIA DA APARÊNCIA A FIM DE
REPUTAR O BANCO HSBC COMO SUCESSOR DO BANCO BAMERINDUS.
INSURGÊNCIA DA CASA BANCÁRIA HSBC.
1. Inaplicabilidade da teoria da aparência utilizada para hipóteses nas
quais, em razão da incidência do CDC, reputa-se o HSBC e o Banco Bame-
rindus, solidariamente responsáveis pelos serviços bancários e seus defeitos,
ante a impossibilidade de definição escorreita a qual banco está o mutuário/
correntista vinculado e qual deles hospeda sua escrita contábil após a sucessão
parcial do Banco Bamerindus pelo HSBC, no tocante à assunção de montante
determinado de passivos, representados por conta de depósitos, cadernetas de
poupança e aplicações financeiras de pessoas físicas e jurídicas.
2. Hipótese que não versa sobre relação de correntista considerado hipos-
suficiente e a instituição financeira, mas, sim, de créditos sucumbenciais do
patrono que logrou êxito em embargos de devedor e fulminou execução lastrada
em ‘título’ extrajudicial, considerado ilíquido na relação processual anterior.
3. No caso ora em foco, há indícios objetivos de que não houve sucessão
universal entre o HSBC e o Banco Bamerindus, bem como que o crédito en-
sejador da presente contenda remanesceu sob a titularidade do Bamerindus.
Instâncias ordinárias que se pautaram unicamente na teoria da aparência, sem
uma análise aprofundada do contrato de compra e venda de ativos, assunção
de direitos e obrigações e outras avenças, além dos termos anexos que respal-
daram a negociação.
4. Recurso especial provido para afastar a aplicação da teoria da aparência,
com a anulação do acórdão recorrido, e determinação do retorno dos autos
ao Tribunal de origem para novo julgamento, desta feita, mediante o exame
minudente do acervo fático-probatório existente nos autos.” (REsp 1.338.793/
MS, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 20.06.2013, DJe 17.09.2013)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 195

Dessa sorte, à míngua de qualquer disposição legal ou contratual que indique


a responsabilidade solidária, cada uma das instituições demandadas deverá arcar,
de forma individualizada, pelos serviços advocatícios prestados pelo demandante e
pelo ressarcimento das despesas realizadas a serviço.
Assim, competirá ao juízo da execução delimitar a quota-parte de responsa-
bilidade de cada um dos bancos réus em relação ao total fixado na condenação e à
verba de sucumbência.
4. Ante o exposto, com base no art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Ci-
vil, dou provimento ao recurso especial, a fim de afastar a solidariedade entre as
instituições financeiras demandadas, competindo ao juízo da execução delimitar a
quota-parte de responsabilidade de cada um dos bancos réus em relação ao total
fixado na condenação e à verba de sucumbência.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 22 de setembro de 2015.
Ministro Luis Felipe Salomão – Relator

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.040.296-ES


Quarta Turma (DJE 14/08/2015)

Relator p/ o Acórdão: Ministro Luis Felipe Salomão


Data do julgamento: 02/06/2015

77/6 — EMENTA: USUCAPIÃO RURAL CONSTITUCIONAL. FUN-


ÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE RURAL. MÓDULO RURAL. ÁREA MÍ-
NIMA NECESSÁRIA AO APROVEITAMENTO ECONÔMICO DO IMÓVEL.
INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DA NORMA. CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
PREVISÃO DE ÁREA MÁXIMA A SER USUCAPIDA. INEXISTÊNCIA DE
PREVISÃO LEGAL DE ÁREA MÍNIMA. IMPORTÂNCIA MAIOR AO CUM-
PRIMENTO DOS FINS A QUE SE DESTINA A NORMA.
1. A propriedade privada e a função social da propriedade estão previstas
na Constituição Federal de 1988 dentre os direitos e garantias individuais
(art. 5º, XXIII), sendo pressupostos indispensáveis à promoção da política de
desenvolvimento urbano (art. 182, § 2º) e rural (art. 186, I a IV).
2. No caso da propriedade rural, sua função social é cumprida, nos termos
do art. 186 da CF/88, quando seu aproveitamento for racional e apropriado;
quando a utilização dos recursos naturais disponíveis for adequada e o meio
ambiente preservado, assim como quando as disposições que regulam as rela-
ções de trabalho forem observadas.
3. A usucapião prevista no art. 191 da Constituição (e art. 1.239 do Có-
digo Civil), regulamentada pela Lei nº 6.969/81, é caracterizada pelo elemento
posse-trabalho. Serve a essa espécie tão somente a posse marcada pela explora-
ção econômica e racional da terra, que é pressuposto à aquisição do domínio
do imóvel rural, tendo em vista a intenção clara do legislador em prestigiar o
possuidor que confere função social ao imóvel rural.
4. O módulo rural previsto no Estatuto da Terra foi pensado a partir da
delimitação da área mínima necessária ao aproveitamento econômico do imóvel
rural para o sustento familiar, na perspectiva de implementação do princípio
constitucional da função social da propriedade, importando sempre, e princi-
palmente, que o imóvel sobre o qual se exerce a posse trabalhada possua área
capaz de gerar subsistência e progresso social e econômico do agricultor e sua
família, mediante exploração direta e pessoal – com a absorção de toda a força
de trabalho, eventualmente com a ajuda de terceiros.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 197

5. Com efeito, a regulamentação da usucapião, por toda legislação que


cuida da matéria, sempre delimitou apenas a área máxima passível de ser
usucapida, não a área mínima, donde concluem os estudiosos do tema, que
mais relevante que a área do imóvel é o requisito que precede a ele, ou seja, o
trabalho realizado pelo possuidor e sua família, que torna a terra produtiva e
lhe confere função social.
6. Assim, a partir de uma interpretação teleológica da norma, que assegure
a tutela do interesse para a qual foi criada, conclui-se que, assentando o legisla-
dor, no ordenamento jurídico, o instituto da usucapião rural, prescrevendo um
limite máximo de área a ser usucapida, sem ressalva de um tamanho mínimo,
estando presentes todos os requisitos exigidos pela legislação de regência, parece
evidenciado não haver impedimento à aquisição usucapicional de imóvel que
guarde medida inferior ao módulo previsto para a região em que se localize.
7. A premissa aqui assentada vai ao encontro do que foi decidido pelo
Plenário do Supremo Tribunal Federal, em conclusão de julgamento realiza-
do em 29.04.2015, que proveu recurso extraordinário em que se discutia a
possibilidade de usucapião de imóvel urbano em município que estabelece
lote mínimo para parcelamento do solo, para reconhecer aos recorrentes o
domínio sobre o imóvel, dada a implementação da usucapião urbana prevista
no art. 183 da CF.
8. Na oportunidade do julgamento acima referido, a Suprema Corte fixou
a seguinte tese: “Preenchidos os requisitos do art. 183 da CF, o reconhecimento

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


do direito à usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação
infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área onde
situado o imóvel (dimensão do lote)” (RE 422.349/RS, Rel. Min. Dias Toffoli,
29.04.2015).
9. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do
Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taqui-
gráficas, após o voto-vista do Ministro Antonio Carlos Ferreira dando provimento
ao recurso especial, no sentido da divergência, por maioria, dar provimento ao re-
curso especial, nos termos do voto divergente instaurado pelo Ministro Luis Felipe
Salomão, que lavrará o acórdão.
Vencidos o Ministro Marco Buzzi (Relator) e Ministra Maria Isabel Gallotti,
que conheciam parcialmente do recurso e lhe negavam provimento. Votaram com
o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão os Srs. Ministros Raul Araújo (Presidente) e
Antonio Carlos Ferreira.
Brasília (DF), 2 de junho de 2015 (Data do Julgamento).
Ministro Luis Felipe Salomão – Relator p/ o Acórdão
198 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Marco Buzzi (Relator):
Cuida-se, na origem, de procedimento especial – consistente em usucapião
especial rural –, proposto por Waldevino Fehlber e Maria Antônia de Aráujo, a fim
de ser declarada a propriedade de imóvel rural, situada na localidade denominada
Barro Preto, na zona rural do Munícipio de Itaguaçu/ES.
Na petição inicial, afirmaram ter exercido, por mais de cinco anos, posse mansa,
pacífica e ininterrupta, com animus domini, do imóvel já mencionado, onde edificaram
uma casa de alvenaria, “além de uma pequena fábrica de caixas para embalagem de
verduras e hortaliças, composta de um barracão com a dimensão de 240 m2 (12x20),
contendo vários maquinários destinados à serragem e ao beneficiamento de madeira
e ainda vêm cultivando a terra com plantio de verduras e hortaliças, criação de aves e
suínos para consumo, com o que mantém sua sobrevivência (...)” (fls. 4 e 6, e-STJ).
O imóvel em questão, aduziram, está inserido em outro de maiores dimensões,
matriculado no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Itaguaçu/ES, sob o
número 5-2609, pertencente a Anízio João Zanotti e sua esposa.
O magistrado singular, ao entender ser juridicamente impossível o pedido
veiculado na demanda, tendo em vista que “a área usucapienda é muito inferior
ao mínimo legal permitido para desmembramento ou divisão de gleba rural, e, na
espécie, não se extrai dos autos qualquer de exceção” (fl. 45, e-STJ), extinguiu o
feito, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do Código de
Processo Civil.
Inconformados, os autores interpuseram recurso de apelação, ao qual se negou
provimento, monocraticamente (fls. 67-70, e-STJ). Interposto agravo regimental, a
Corte de origem manteve a decisão unipessoal do desembargador-relator, negando
provimento ao recurso, nos termos da seguinte ementa:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO
CÍVEL. USUCAPIÃO PRO LABORE. ÁREA INFERIOR AO MÓDULO RURAL.
IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1. Por força do art. 65 da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), é vedada
a divisão do imóvel rural em áreas inferiores ao módulo da propriedade rural,
ou seja, 30.000 m2 (trinta mil metros quadrados).
2. Logo, a usucapião não pode ocorrer em área inferior ao módulo de
propriedade rural. Nos termos do precedente do STJ, ‘caso se admitisse o usu-
capião de tal área, estar-se-ia viabilizando, de forma direta, o registro de área
inferior àquela permitida pela lei daquele Munícipio. Há, portanto, vício na
própria relação jurídica que se pretende modificar com a aquisição definitiva
do imóvel’ (REsp 402.792/SP, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 06.12.04, p. 316).
Recurso desprovido.” (fl. 94, e-STJ)
Irresignados, os autores interpuseram recurso especial (fls. 105-107, e-STJ),
com fulcro no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição Federal, bem como
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 199

recurso extraordinário (fls. 112-115, e-STJ), este fundamentado no art. 102, inciso
III, alínea a, da Constituição Federal.
Nas razões do apelo extremo (fls. 105-107, e-STJ), apontam os insurgentes a
existência de violação ao art. 1.239 do Código Civil, uma vez que o mencionado
dispositivo, nos termos da norma constitucional que lhe serve de fundamento – art.
191 da Constituição Federal –, não faz qualquer referência à área mínima; assim,
sustentam ser possível usucapir área inferior ao módulo rural.
Houve manifestação do Ministério Público estadual, às fls. 127-128, e-STJ, no
sentido de admissão parcial do recurso especial.
Em juízo provisório de admissibilidade (fls. 130-131, e-STJ), o Tribunal de
Justiça do Estado do Espírito Santo admitiu o processamento do recurso especial,
determinando a remessa dos autos a esta Corte.
Com vista dos autos, o Ministério Público federal, por intermédio do Subpro-
curador-Geral da República, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso
especial (fls. 141-142, e-STJ).
É o relatório.

VOTO VENCIDO
O Exmo. Sr. Ministro Marco Buzzi (Relator):
O presente recurso merece ser conhecido pela alínea a do permissivo consti-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


tucional e, nessa extensão, não provido, nos termos a seguir expostos.
1. Preliminarmente, no que concerne ao dissídio pretoriano, infere-se não ser
cognoscível o presente apelo extremo, porquanto os recorrentes limitaram-se, em
suas razões, a indicar o fundamento (alínea c), sem tecer quaisquer considerações
ou explicitação do tema, não tendo sido realizado, tampouco, o necessário cotejo
analítico.
Com efeito, manifesta a deficiência na fundamentação do recurso no que con-
cerne ao dissídio pretoriano, de modo a ensejar a aplicação, neste ponto, do óbice
inserto no enunciado da Súmula nº 284/STF – “é inadmissível o recurso extraordi-
nário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão
da controvérsia” –, cuja incidência se estende, por analogia, aos recursos especiais.
Quanto ao fundamento estabelecido na alínea a do permissivo constitucional,
observam-se presentes os requisitos autorizadores ao conhecimento do presente
recurso, cuja tese passa a ser analisada.
2. A controvérsia instaurada neste recurso especial refere-se, pontualmente,
à possibilidade de aquisição, por meio de usucapião especial rural – igualmente
denominada de “usucapião rural pro labore” –, da propriedade de imóvel rural cuja
área é inferior ao módulo rural estabelecido para a região, neste caso, consoante
afirmado pelas instâncias ordinárias, de três hectares (3 ha – 30.000 m2).
200 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Os recorrentes pautam sua pretensão pela disciplina concedida ao instituto


no âmbito do Código Civil de 2002, que, em verdade, teve como fonte precípua a
disciplina constitucional. Argumentam, nesse sentido, que o art. 1.239 do mencio-
nado diploma legal, ao prever especificamente a possibilidade de usucapião especial,
com prazo diminuto, não fez referência à dimensão mínima do imóvel, dispondo
unicamente que “aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano,
possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona
rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou
de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade”.
A temática, por sua relevância, reclama maior aprofundamento, sendo neces-
sário expor, de início, a evolução histórica, bem como as finalidades do instituto da
usucapião especial rural, a fim de melhor elucidar/examinar o objeto do presente
reclamo. Em um segundo momento, analisar-se-ão as implicações entre o instituto
e as unidades agrárias, notadamente o módulo rural, para, ao final, delinear a con-
clusão atinente ao caso concreto.

2.1. Evolução Legislativa e Finalidades da Usucapião Especial Rural


Inicialmente, cumpre destacar que toda temática relacionada às questões agrá-
rias é bastante sensível à realidade brasileira, cujos problemas fundiários remontam
ao início da tentativa de colonização do território pela metrópole portuguesa, isto
é, com a criação das capitanias hereditárias e o sistema de sesmarias.
Nesse contexto, insta ressaltar que apenas em 1850, com a edição da Lei de
Terras (Lei nº 601), procedeu-se a uma tentativa de ordenação do espaço territorial
brasileiro. De acordo com suas disposições, eram quatro as modalidades para o
reconhecimento da propriedade: i) revalidação das cartas de sesmaria; ii) legitima-
ção das posses; iii) compra das terras devolutas; e iv) doação (este último instituto
aplicável só na faixa de fronteira).
Nesse sentido, assevera Luiz Rodrigues Wambier:
“Em 18 de setembro de 1850, o Imperador D. Pedro II sancionou a Lei
nº 601, que representou uma tentativa de organização e regularização do pano-
rama fundiário vigente à época no país, com a definição daquilo que se entendia
por terra devoluta e, ainda mais, com a proposta de legitimação das situações de
fato existentes, tanto no que se referia às sesmarias concedidas e não regularizadas
quanto no que dizia respeito às áreas havidas por mera ocupação, em que a
posse não deriva de qualquer título.” (Regime da Lei de Terras: aspectos atuais.
Revista Semina, Londrina/PR, v. 9, n. 1, p. 10, 1988; grifou-se)
A par das críticas que podem ser tecidas em relação à Lei em comento, inte-
ressante ressaltar que, em seu art. 5º, houve a positivação da legitimação da posse
– instituto por meio do qual os posseiros poderiam adquirir o domínio das glebas
devolutas que ocupassem, desde que comprovassem cultura efetiva, bem como
morada habitual, in verbis: “Serão legitimadas as posses mansas e pacificas, adqui-
ridas por occupação primaria, ou havidas do primeiro occupante, que se acharem
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 201

cultivadas, ou com principio de cultura, e morada, habitual do respectivo posseiro,


ou de quem o represente, guardadas as regras seguintes: (...)”.
A esta disposição é possível atribuir a ideia remota do instituto da usucapião
especial rural, que surgiu, efetivamente, no ordenamento jurídico brasileiro, com a
promulgação da Constituição de 1934. No âmbito desta Carta Constitucional, ca-
racterizada por uma maior preocupação social e com o escopo de tutelar o pequeno
produtor rural, previu-se:
“Art. 125 – Todo brasileiro que, não sendo proprietário rural ou urbano,
ocupar, por dez anos contínuos, sem oposição nem reconhecimento de domínio
alheio, um trecho de terra de até dez hectares, tornando-o produtivo por seu
trabalho e tendo nele a sua morada, adquirirá o domínio do solo, mediante
sentença declaratória, devidamente transcrita.”
Interessante atentar para o objetivo do constituinte, que, consoante assevera
José Carlos Tosetti Barruffini, já imbuído pela ideia da função social da propriedade,
criou a usucapião para amenizar os problemas do homem do campo, combatendo
uma estrutura fundiária arcaica e que sempre estimulou o latifúndio improdutivo
(Usucapião constitucional urbano e rural: função social da propriedade. São Paulo:
Atlas, 1998. p. 115).
O preceito foi integralmente repetido pelo art. 148 da Constituição de 1937,
ao passo que a Carta Constitucional promulgada em 1946, em seu art. 156, embora
tenha mantido o instituto, trouxe duas alterações, essas consistentes na eliminação
do vocábulo “estrangeiro”, constante das redações anteriores, bem como na elevação
da dimensão limite para 25 (vinte e cinco) hectares.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


A partir da edição da Emenda Constitucional nº 10, de 9 de novembro de 1964,
houve o alargamento desse limite para área não excedente a cem hectares, a qual, em
qualquer caso, deveria ser reputada como suficiente para assegurar ao lavrador e à
sua família condições de subsistência e progresso social e econômico, nas dimensões
fixadas pela lei, segundo os sistemas agrícolas regionais.
Editado o Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64), a modalidade de usucapião
em tela recebeu disciplina infraconstitucional, precisamente no art. 98 do citado
diploma legal, que, por mais quase quinze anos, foi a sua fonte normativa, tendo
em vista que a Emenda Constitucional nº 01, de 17 de outubro de 1969, a exemplo
da Constituição de 1967, manteve-se silente quanto ao tema.
Nesse contexto, interessante transcrever o texto normativo constante do art.
98 da Lei nº 4.504/64, a saber:
“Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano, ocupar por
dez anos ininterruptos, sem oposição nem reconhecimento de domínio alheio,
tornando-o produtivo por seu trabalho, e tendo nele sua morada, trecho de terra
com área caracterizada como suficiente para, por seu cultivo direto pelo lavrador
e sua família, garantir-lhes a subsistência, o progresso social e econômico, nas
dimensões fixadas por esta Lei, para o módulo de propriedade, adquirir-lhe-á o
domínio, mediante sentença declaratória devidamente transcrita.”
202 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Frise-se, por oportuno, a expressa determinação de área mínima, consistente


no módulo rural, que, segundo o legislador, representa o “imóvel rural que, direta
e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de
trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área
máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho com
ajuda de terceiros”, nos termos do art. 4º, II, do citado diploma.
Com a edição da Lei nº 6.969/81 a conceder disciplina específica ao instituto,
houve a redução do prazo concernente à posse aquisitiva, além de permissão à
usucapião de terras devolutas, dispondo:
“Art. 1º Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano,
possuir como sua, por 5 (cinco) anos ininterruptos, sem oposição, área rural
contínua, não excedente de 25 (vinte e cinco) hectares, e a houver tornado
produtiva com seu trabalho e nela tiver sua morada, adquirir-lhe-á o domí-
nio, independentemente de justo título e boa-fé, podendo requerer ao juiz
que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para transcrição no
Registro de Imóveis.
Parágrafo único. Prevalecerá a área do módulo rural aplicável à espécie, na
forma da legislação específica, se aquele for superior a 25 (vinte e cinco) hectares.”
(grifou-se)
Observe-se que, conquanto a redação acima transcrita não preceitue qualquer
área mínima ao imóvel usucapiendo, é possível inferir a preocupação com o des-
membramento de áreas inferiores ao módulo rural, notadamente pelo disposto no
parágrafo único, ao permitir a usucapião de imóvel com dimensões superiores a
25 (vinte e cinco) hectares quando o módulo rural fosse superior a esta dimensão.
A seu turno, a Carta Constitucional de 1988, em seu art. 191, disciplinou a
usucapião especial rural, nos seguintes termos: “Aquele que, não sendo proprietário
de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem
oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinquenta hectares, tornando-a
produtiva por seu trabalho e de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á
a propriedade”.
Por fim, o Código Civil de 2002, em seu art. 1.239, “(...) reproduz integralmente
o disposto no art. 191 da Constituição Federal. Na verdade, a Constituição Federal
reproduziu o texto do então projeto do Código Civil, elaborado na década de 1970”
(PELUSO, Cezar [Coord]. Código Civil comentado. Doutrina e jurisprudência. 5. ed.
rev. e atual. Barueri: Manole, 2011. p. 1.239).
No que toca à finalidade do instituto, destaca Arnaldo Rizzardo a consagra-
ção do princípio agrarista, segundo o qual deve ser o proprietário da terra aquele
que a tiver frutificado/laborado, bem como feito dela seu lar e de sua família. Nas
palavras do autor:
“Mais do que qualquer outra forma de aquisição da propriedade, constitui
o usucapião rural a consagração do princípio agrarista de que deve ser o dono da
terra rural quem a tiver frutificado com o seu suor, quem nela se estabeleceu com
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 203

a família, morando habitualmente, ali construindo seu lar.” (Direito das coisas.
Lei nº 10.406, de 10.01.02. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense. p. 279; grifou-se)
Sob essa mesma perspectiva, isto é, ressaltando o objetivo de fixação do
homem ao campo, ao conferir a propriedade àquele que tornou a terra produtiva,
nela fixando residência, consolidando, enfim, a sua função social, transcreve-se o
seguinte excerto doutrinário:
“A usucapião especial rural, conhecida também como pro labore, está
inserida no capítulo da política agrícola e fundiária da Constituição Federal e
tem nítido escopo de fixar o homem ao campo, conferindo a possibilidade de, em
curto espaço de tempo, atribuir propriedade ao possuidor que pessoalmente deu
função social à gleba rural, tornando-a produtiva e nela fixando moradia. De um
lado, o prazo é exíguo, com fim de estimular essa modalidade de usucapião. De
outro lado, limita-se à categoria destinatária do benefício, mediante a criação
de uma série de requisitos objetivos e subjetivos.” (PELUSO, Cezar [Coord].
Código Civil comentado. Doutrina e jurisprudência. 5. ed. rev. e atual. Barueri:
Manole, 2011. p. 1.240; grifou-se)
Neste particular, também se destacam as razões que deram origem à Lei nº
6.969/81, as quais, segundo assevera José Carlos Moraes Salles, estão consubstan-
ciadas na Mensagem do Executivo que acompanhou o projeto de lei então elaborado.
Nos excertos abaixo transcritos, evidencia-se o caráter social do instituto, destinado
à tutela dos possuidores de imóveis rurais e à denominada “posse-trabalho”, bem
como a preocupação acima já comentada com o módulo rural, consolidada no pa-
rágrafo único do art. 1º da lei em questão:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


“Excelentíssimos Senhores membros do Congresso Nacional: nos ter-
mos do § 2º do art. 51 da Constituição, tenho a honra de submeter à elevada
deliberação de Vossas Excelências o anexo Projeto de Lei, que dispõe sobre
aquisição, por usucapião especial, de imóveis rurais, e dá outras providências.
2. O estudo deste Projeto de Lei, versando matéria de direito civil, foi deter-
minado pelo Presidente João Figueiredo, a quem o problema fundiário, tanto pelas
tensões sociais que provoca quanto por sua causa visível, ligadas aos defeitos secu-
lares do nosso sistema de distribuição de terra, vinha causando preocupação recente.
3. Aqueles defeitos, segundo entendo, remontam ao período das capitanias
hereditárias, e hoje demandam correção, em nome de uma ordem constitucional
que impõe ao Poder Público a valorização do trabalho e a garantia de que a
propriedade desempenhe função social (CF, art. 160, II e III).
4. O constituinte de 1946 voltara já sua atenção para aquelas pessoas que,
não tendo propriedade alguma, urbana ou rural, ocupam sem contestação, durante
anos seguidos, certa área de terra, e, com seu trabalho, a redimem da improdutivi-
dade e do abandono em que a encontram. Essa forma peculiar de usucapião seria
versada em novembro de 1964 pela Emenda Constitucional nº 10, que remeteu
à lei ordinária a fixação das dimensões da área rural usucapienda, preservan-
do, todavia, a exigência de ocupação pelo prazo de dez anos ininterruptos.
204 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

No Congresso Nacional, por mais uma vez o tema da prescrição aquisitiva,


permeado de preocupações sociais, deu ensejo à apresentação de projetos de
lei, ora tendentes a reduzir os prazos de usucapião do Código Civil em vigor,
ora concebidos para estender às terras particulares a perspectiva da usucapião
decenária que o Estatuto da Terra (Lei nº 4.504, de 30.11.64, art. 98) disciplina
no tocante às áreas do domínio da União.
5. O propósito de amparar os pequenos possuidores é patente no projeto do
Código Civil preparado por ilustrada comissão de juristas, e apresentado no Con-
gresso em 1975. O art. 1.279 daquele Projeto mantém o prazo de dez anos para
que se consume a prescrição aquisitiva, sem prova de justo título e boa-fé, visando
à proteção de um valor social que, na exposição de motivos, do professor Miguel
Reale, foi denominado ‘posse-trabalho’. A determinação da área usucapienda
deveria obedecer aos critérios da lei ordinária, tomando-se em conta a região, o
tipo de atividade econômica e o intento de assegurar a subsistência do posseiro e
de sua família.
(...)
7. Com o intuito de evitar compreensíveis delongas quanto à determinação
do módulo rural, que seria aplicável em cada caso, o projeto estabelece como regra
geral a área máxima usucapível de vinte hectares, ficando, porém, ressalvado para
o possuidor o direito de adquirir trecho de terra correspondente ao módulo rural,
se este exceder àquele limite.
Brasília, 20 de outubro de 1981 – Aureliano Chaves.” (SALLES, José
Carlos de Moraes. Usucapião de bens imóveis e móveis. 6. ed. São Paulo: RT,
2005. p. 369-370; grifou-se)
Partindo-se dessas premissas, infere-se que a usucapião especial rural tem por
escopo tutelar situações nas quais se visualiza o aproveitamento da propriedade
rural – tornada assim produtiva –, que sirva também de moradia ao agricultor/
produtor e à sua família.
O instituto em comento, portanto, transforma uma situação factual em direi-
to, concedendo estabilidade e segurança àquela propriedade que cumpra/observe sua
utilidade social, capaz de garantir ao possuidor a subsistência, bem como a promoção
do progresso econômico da propriedade, o que será melhor explicitado na seção sub-
sequente.
Estabelecidos, assim, os fundamentos que ensejaram a concepção do instituto
da usucapião especial rural, bem como sua evolução histórica, no direito brasileiro,
procede-se ao exame da tese sobre a qual versa a controvérsia instaurada no âmbito
do recurso especial.

2.2. Usucapião Especial Rural e o Módulo Rural


Neste ponto, cumpre destacar, de início, que a figura descrita nos arts. 191 da
Constituição Federal de 1988 e, no âmbito infraconstitucional, 1.239 do Código
Civil de 2002, demanda, à sua configuração, a observância de requisitos de ordem
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 205

subjetiva e objetiva, concernentes aos aspectos pessoais do prescribente, à coisa


hábil, à posse e ao decurso do tempo.
No que concerne especificamente ao objeto passível de aquisição por meio
de usucapião especial rural, alguns pontos se apresentam relevantes e, sobretudo,
aquele ao qual se refere a controvérsia veiculada neste apelo, isto é: as dimensões do
imóvel rural usucapiendo.
O art. 191 da Constituição Federal bem como o art. 1.239 do Código Civil
alterarou o art. 1º da Lei nº 6.969/81, ao dispor que “(...) área de terra, em zona rural,
não superior a cinqüenta hectares”. Ressalta-se, neste particular, que os artigos em
comento, seja na redação concedida pela Lei nº 6.969/81, seja por aquela constante
do novo Código Civil (art. 1.239) e da Constituição Federal (art. 131), não estabe-
leceram um limite mínimo para a dimensão da propriedade.
Nesse contexto, situa-se a questão pertinente à possibilidade de o usucapião
especial rural, nos moldes atualmente delineados, ter por objeto área inferior ao
módulo rural ou à fração mínima de parcelamento, tendo em vista a disposição do
art. 65 da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), qual seja: “O imóvel rural não é divi-
sível em áreas de dimensão inferior à constitutiva do módulo de propriedade rural”.
O enunciado da norma acima transcrita complementa-se com o disposto no
art. 8º da Lei nº 5.868/72, a qual instituiu o Sistema Nacional de Cadastro Rural,
criando uma nova unidade de medida agrária, a saber:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


“Para fins de transmissão, a qualquer título, na forma do Art. 65 da Lei nº
4.504, de 30 de novembro de 1964, nenhum imóvel rural poderá ser desmembrado
ou dividido em área de tamanho inferior à do módulo calculado para o imóvel ou
da fração mínima de parcelamento fixado no § 1º deste artigo, prevalecendo a de
menor área.
§ 1º A fração mínima de parcelamento será:
a) o módulo correspondente à exploração hortigranjeira das respectivas
zonas típicas, para os Municípios das capitais dos Estados;
b) o módulo correspondente às culturas permanentes para os demais
Municípios situados nas zonas típicas A, B e C;
c) o módulo correspondente à pecuária para os demais Municípios situ-
ados na zona típica D.” (grifou-se)
Diante do quadro legislativo acima delineado, mister esclarecer em que consis-
tem as duas unidades mencionadas e que servem de parâmetro para divisibilidade
do imóvel rural, quais sejam (i) o módulo rural e (ii) a fração mínima de parcela-
mento – FMP. Frise-se que, nos termos do art. 8º da Lei nº 5.868/72, o imóvel não
é divisível em área inferior ao módulo rural ou à fração mínima de parcelamento, a
prevalecer a de menor área.
206 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

O conceito de módulo rural, de acordo com o Estatuto da Terra (art. 4º), está
intrinsecamente relacionado à ideia de propriedade familiar, concebida como o
imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e por sua família,
absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social
e econômico.
Nesse sentido é a definição apresentada por Paulo Torminn Borges,
“O conceito de módulo está ínsito no de propriedade familiar, definida
como o imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua
família, lhes absorve toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência
e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e
tipo de exploração, e eventualmente contando com a ajuda de terceiros (Esta-
tuto da Terra, art. 4º, II; Decreto nº 55.891, de 31.03.65, arts. 6º, I, e 11 a 23).
O módulo rural é esta área da propriedade familiar, suporte necessário para o
progresso social e econômico do grupo familiar.” (Divisibilidade e indivisibilidade
do imóvel rural. Módulo e fração mínima de parcelamento. Revista da Facul-
dade de Direito da Universidade de Uberlândia, v. 1, n. 2, 1972, p. 57; grifou-se)
Enquanto unidade de medida agrária, consoante as disposições do Decreto
nº 55.891/65, o referido módulo “(...) tem como finalidade primordial estabelecer
uma unidade de medida que exprima a interdependência entre a dimensão, a situ-
ação geográfica dos imóveis rurais e a forma e as condições do seu aproveitamento
econômico”.
Nos termos do art. 11 do Decreto em comento, os elementos a serem conside-
rados para o cálculo do módulo rural são: i) a localização e os meios de acesso do
imóvel em relação aos grandes mercados, ii) as características ecológicas das áreas
em que se situam e iii) os tipos de exploração predominantes na respectiva zona.
Sobre a finalidade do instituto, bem assim das razões que ensejaram sua cria-
ção, destaca Fernando Pereira Sodero o combate à distorção fundiária existente no
Brasil – representada pelo latifúndio e pelo minifúndio –, ao fornecer bases efetivas
para coibir a sua multiplicação. Nas exatas palavras do autor:
“O módulo rural foi criado pelo legislador para fornecer subsídios à po-
lítica agrária do país – entre outras finalidades. Era necessário (...) não apenas
estabelecer diretrizes seguras para um combate frontal à distorção fundiária
representada pelo minifúndio e pelo latifúndio, como, ainda, não permitir
mais sua multiplicação e fixar bases efetivas para o desenvolvimento normal
do setor primário.
O módulo foi uma das medidas encontradas. Conjugado com outras,
possibilitou o Poder Executivo meios para disciplinar de maneira homogênea
a política agrária a ser seguida, dentro de um espírito novo de renovação de
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 207

ideias, de progresso e elevação econômica do rurícola.” (SODERO, Fernando


Pereira. O módulo rural e suas implicações jurídicas. São Paulo: LTr, 1975. p. 63)
Portanto, a instituição do módulo rural teve por escopo o fornecimento de
subsídios ao desenvolvimento da política agrária no Brasil, traduzido na preocupação
com o estabelecimento de áreas de terras ideais para a perfeita e eficaz exploração
agropecuária pela família, visando coibir o fracionamento dos imóveis em áreas
inferiores àquela necessária para o desenvolvimento produtivo, evitando-se, assim,
a proliferação do minifúndio.
Com efeito, a unidade de medida em questão representa a área mínima em
condições possíveis para torná-la produtiva, possibilitando ao agricultor e à sua
família uma subsistência digna e, ao mesmo tempo, um progresso socioeconômico.
Almeja, dessa forma, a harmonização do princípio da dignidade da pessoa humana
e da função social da propriedade, conciliando a subsistência familiar e o progresso
econômico.
No entanto, a disciplina concernente ao módulo rural e à possibilidade de
divisão do imóvel rural sofreu algumas alterações com a edição da Lei nº 5.868/72,
que criou o Sistema Nacional de Cadastro Rural. No âmbito da mencionada Lei,
além do módulo rural, foi estabelecida nova unidade de medida agrária, isto é, a
fração mínima de parcelamento (FMP), definida como a menor dimensão que um
imóvel rural poderá conter – cujos índices são fixados pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária – INCRA, para cada município.
Consoante assevera Fernando Pereira Sodero, este diploma legal foi redigido

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


após o estudo dos dados colhidos no recenseamento de 1970, o qual “ofereceu ao
Poder Público elementos que permitiram o conhecimento da área dos imóveis rurais,
regime de exploração, terras próprias, arrendadas, exploradas em parceria, ocupadas,
ou outro qualquer tipo, atividade econômica predominante, cooperativismo rural e
uso atual do solo (O módulo rural e suas implicações jurídicas. São Paulo: LTr, 1975.
p. 153).
A fração mínima de parcelamento define-se como a área mínima passível de ser
desmembrada de um imóvel rural para a constituição de uma nova unidade agrícola
(cf. art. 8º da Lei nº 5.868/72). Esta unidade, constante do Certificado de Cadastro
do Imóvel Rural – CCIR, corresponde ao módulo da exploração hortigranjeira da
zona típica de módulo (ZTM) – regiões delimitadas pelo INCRA, com características
ecológicas e econômicas homogêneas, baseada na divisão microrregional do IBGE –
do município de localização do imóvel rural. Assim, o imóvel, ao ser parcelado para
fins de transmissão a qualquer título, não poderá permanecer com área remanescente
inferior à fração mínima de parcelamento – FMP.
Sobre as modificações no conceito de módulo rural, procedidas pela adoção de
novas unidades de medida agrárias, quais sejam o módulo fiscal e a fração mínima
de parcelamento, salienta-se o seguinte excerto doutrinário, em que o autor Paulo
Guilherme de Almeida pontua as distinções e as alterações operadas no conceito
de módulo rural:
208 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“(...) o conceito de módulo rural, na forma inicialmente concebida e


instituída pelo Estatuto da Terra (art. 4º, III), correspondia ao de propriedade
familiar, servindo de critério para a adoção de medidas normativas sobre impor-
tantes seguimentos do Direito Agrário. No entanto, o instituto do módulo rural,
como originariamente formulado, foi quase totalmente substituído por dois outros,
o da fração mínima de parcelamento (medida prefixada para cada município) e
o do módulo fiscal. (...) 1 Com a implantação na sua forma original, mediante a
primeira emissão do ITR, referente ao exercício de 1966, o módulo rural, como
parâmetro limitativo do desmembramento, consistia na media correspondente
às atividades eventualmente exercidas pelo contribuinte dentre as hortifrutigran-
jeira, de lavoura temporária, de lavoura permanente, de pecuária e de exploração
florestal. O Sistema de Cadastro Rural (Lei nº 5.868/72) manteve o critério, mas
introduziu a alternativa da fração mínima de parcelamento, conforme dispõe o art.
8º acima reproduzido. A mesma orientação foi adotada pelas Instruções Especiais
INCRA ns. 5/73 e 14/78. Foi definitivamente a fração mínima de parcelamento,
aplicável a cada município, independentemente da particularidade de cada imóvel,
abolindo-se, assim, a sistemática da média ponderada individual para o cálculo
do módulo rural. Desta forma, desnaturou-se, com a adoção da fração mínima de
parcelamento (FMP), a ideia correta de vincular a regra proibitiva do desmem-
bramento a um padrão (módulo), cujo conceito sabiamente o Estatuto da Terra
equiparou ao da propriedade familiar e que, evidentemente, deve sofrer variações
consistentes nos tipos de exploração agropecuária somadas às características re-
gionais.” (ALMEIDA, Paulo Guilherme de. Aspectos jurídicos da reforma agrária
no Brasil. 1. ed. São Paulo: LTr, 1990; grifou-se)
Acerca do tema, leciona, outrossim, Benedito Ferreira Marques:
“Além do ‘módulo rural’, criado no ventre do Estatuto da Terra, o legisla-
dor brasileiro introduziu, depois, outras duas figuras jurídicas que, igualmente,
têm muito a ver com a dimensão do imóvel rural. Tais foram: (a) a fração mí-
nima do parcelamento e (b) o módulo fiscal. Essas inovações surgiram através
das Leis ns. 5.868, de 12.12.72, e 6.746, de 10.12.79.
Os analistas consideram que esses novos institutos vieram, de certa ma-
neira, reduzir a importância do ‘módulo rural’, no contexto geral da legislação
agrária, a ponto de Paulo Guilherme de Almeida afirmar que tal instituto foi
substituído por essas novas figuras, resumindo-se a sua aplicação prática no
enquadramento sindical, quando é utilizado como fator de delimitação entre
as categorias econômicas e profissional da agricultura (...).
Para a compreensão dessas colocações, vale transcrever os seguintes
trechos:
(...)
Aprimorando o sistema de composição do módulo rural, com novos
elementos e alíquotas, o módulo fiscal, em cotejo com a fração mínima de
parcelamento, é o que mais atende aos requisitos para a elaboração de um pa-
drão mais adequado e consentâneo com a realidade. Basta examinar o art. 50,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 209

§ 2º, do Estatuto da Terra, com a nova redação dada pela Lei nº 6.746/79. Por
força deste dispositivo, o módulo fiscal sofre várias influências, tais como: a da
individualidade de cada município do tipo de exploração predominante; a da
renda obtida nesta exploração; a de outras explorações expressivas em função da
renda e da área utilizada; e, por último, a do conceito de propriedade familiar.
(...)
Assim, com as alterações até hoje introduzidas, temos o seguinte quadro:
1. Módulo rural, transformado no instituto da fração mínima de parcelamen-
to (FMP). Justamente para permitir a aplicação do princípio da função social, o
legislador instituiu o módulo rural. Paralelamente estabeleceu a regra que proíbe
o desmembramento do imóvel rural em áreas de dimensão inferior à constitutiva
do módulo da propriedade, visando, com isto, evitar a proliferação de áreas tidas
como antieconômicas para efeito de exploração agropecuária, o que acarreta pro-
blemas e distorção fundiária.
(...)
3. Módulo fiscal como elemento constitutivo de fixação do Imposto
Territorial Rural (ITR), representando aqui a sua função precípua (art. 50 do
Estatuto da Terra, com a nova redação dada pela Lei nº 6.746/79), bem assim,
como elemento constitutivo de fixação da contribuição parafiscal de que trata
o art. 5º do Decreto nº 1.146, de 31 de dezembro de 1970, com a nova redação
do art. 21 do Decreto nº 84.685/80.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


4. Módulo fiscal, como critério de classificação do imóvel rural: minifún-
dio, propriedade familiar, empresa rural, latifúndio por dimensão e latifúndio
por exploração, consoante art. 22, incisos I, II e III, do Decreto nº 84.685/80.”
(MARQUES, Benedito Ferreira. Direito agrário brasileiro. 9. ed. São Paulo:
Atlas, 2011, p. 50-52; grifou-se)
Acrescente-se, ainda, que a fração mínima de parcelamento, nos termos da
Lei nº 5.868/72 (art. 8º, § 1º), consiste no módulo correspondente: i) à exploração
hortigranjeira das respectivas zonas típicas, para os municípios das capitais dos
Estados; ii) às culturas permanentes para os demais municípios situados nas zonas
típicas A, B, C; e iii) à pecuária para os demais municípios situados na zona típica D.
Ainda, de acordo com a Tabela III da Instrução Especial do INCRA nº 5-A, de 1973,
com as alterações procedidas pela Instrução Especial nº 50, de 1997, esta unidade
de medida varia, no território brasileiro, entre 2 (dois) a 110 (cento e dez) hectares.
Assim, a par das distinções existentes entre as unidades de medida agrárias
supramencionadas, considerando a controvérsia ora em análise, forçoso ater-se
para a finalidade perseguida por meio de sua instituição, nos moldes originalmente
propostos para o módulo rural, ainda que flexibilizado pela fração mínima de par-
celamento, isto é, a de evitar o fracionamento de imóveis agrários em áreas diminutas,
incapazes de proporcionar a subsistência do agricultor e de sua família, bem assim o
progresso econômico da propriedade rural.
210 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Ademais, no caso em tela, nos moldes delineados pelas instâncias ordinárias,


não houve a especificação da dimensão ali considerada, pois, apesar de ter sido
utilizada a nomenclatura “módulo rural mínimo”, ao que tudo indica, a referência
é à fração mínima de parcelamento, esta, sim, fixada para a região/munícipio, dife-
rentemente do módulo rural da propriedade, fixado individualmente.
Esclarecido esse ponto, retoma-se à temática pertinente à política de combate
ao minifúndio, do que são instrumentos os módulos fixados pelo INCRA, notada-
mente o módulo rural e a fração mínima de parcelamento.
Sobre o tema, convém destacar o acórdão proferido no julgamento do Recurso
Extraordinário 78.048/SP, de Relatoria do Ministro Aliomar Baleeiro, julgado em
17.05.74, oportunidade em que se analisou a possibilidade de divisão de imóvel
rural, em áreas inferiores ao módulo rural, para fazer cessar o condomínio sobre
ele existente.
Argumentava-se, na ocasião, que a pretensão almejada, consistente na divisão
do imóvel para fazer cessar o condomínio, não se tratava de hipótese de “transmis-
são” do imóvel, e, por isso, não se submetia às limitações dos módulos. No entanto,
referida pretensão foi rechaçada pela Corte Suprema, salientando o dever de com-
bate à proliferação dos minifúndios ínsito à política agrária, o que se evidencia nos
excertos ora transcritos:
“Razoável, por igual, a interpretação do venerado acórdão recorrido, que
abandona a literalidade e busca a luz no fim da lei. Entre duas interpretações
razoáveis, uma necessariamente é a melhor e impõe-se se confrontadas ambas.
Nesse caso, desaparece a tolerância da súmula que, considerando uma inteli-
gência isolada, a admite ainda que não seja a melhor, se razoável.
É incontestável que o Estatuto da Terra tem como finalidade precípua
uma reforma agrária e uma política rural que evite os dois males germinados,
da estrutura agrícola brasileira: a convivência do latifúndio com o minifúndio.
Nesse padrão, dois casais, eram os únicos proprietários duma gleba e um
deles pediu a divisão impugnada pelo outro, porque cada metade não atingiria
o módulo local.
Não conheço do recurso, em obediência aos arts. 305, 308, IV, e 22, § 1º,
do Regimento Interno.
Mas, se os eminentes juizes dele conheceram, nego-lhe provimento. É
certo que o dispositivo diz: ‘Para fins de transmissão a qualquer título, nenhum
imóvel poderá ser desmembrado ou dividido, etc.’. Poder-se-á, razoavelmente,
interpretar como fez o padrão, que, a contrario sensu, é divisível a gleba se o
co-proprietário não visa à transmissão. Em Santa Catarina, por exemplo, os
lotes iniciais eram de 25 ha da colonização alemã de há um século, como a do
Dr. Blumenau, e geraram, por efeito das partilhas C.C., parvifúndios que não
bastam a ocupar a atividade duma família, nem alimentá-la. A extrema divisão
engendrou a lavoura de mera subsistência de tipo caboclo das áreas empobre-
cidas do nordeste. O Estatuto da Terra pretende impedir essa pulverização do
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 211

fundo agrário, estabelecendo aqueles módulos indivisíveis. No caso dos autos, cada
coproprietário viria a receber menos de 7 ha e menos de 400 laranjeiras, quinhão
tão exíguo que não se conciliaria com a atividade econômica racional. Isso, aliás, já
reconhecia um marxista, como Karl Kautsky, quando analisou a reforma agrária ao
apagar das luzes do século IXI. Dividida a gleba pelos 8 comunheiros, nenhum
dos quais se poderia manter nela, nada impediria a transmissão dos quinhões.
O Estatuto da Terra quer impedir esse fracionamento e, a meu ver, tanto para
a transmissão imediata quanto para a posterior em 2 etapas. O que a lei quer
evitar diretamente, também o quer por via oblíqua.” (grifou-se)
O aresto em comento apresenta a seguinte ementa:
“ESTATUTO DA TERRA – ART. 65 – DIVISÃO DA GLEBA.
1) Ex vi dos art. 65 da Lei nº 4.504/64 e 11, do Decreto-Lei nº 57/66, é
inadmissível a divisão da gleba em quinhões menores do que os módulos, ainda
que para fazer cessar o condomínio entre os coproprietários.
2) O fim da lei, no caso, é o de evitar a proliferação de minifúndios anti-
econômicos, e deve preponderar sobre a literalidade do dispositivo.”
Partindo-se das premissas acima delineadas, procede-se à análise pontual da
controvérsia veiculada neste apelo extremo, qual seja a possibilidade de usucapir
imóvel rural com dimensões inferiores ao módulo rural, ou, consoante já ponderado,
à fração mínima de parcelamento.
Não obstante a existência de desenvolvimentos doutrinários favoráveis à

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


usucapião de imóveis com área inferior às unidades de medida em comento – mó-
dulo rural ou fração mínima de parcelamento –, fundamentados no fato de que a
observância às limitações estabelecidas pela legislação agrária impediria o instituto
constitucional de atingir seu desiderato, conclui-se em sentido diverso.
Neste ponto, repisa-se que a finalidade da usucapião especial rural, nos moldes
estabelecidos pela Mensagem 458/81 – transcrita na primeira seção deste voto – foi
a de solucionar o problema daqueles que, não sendo proprietário de outro imóvel,
rural ou urbano, ocupassem, por determinado tempo, sem contestação, uma área
rural e a afastassem do quadro de improdutividade e abandono. Salientou-se, ou-
trossim, o anseio de alcançar-se, o quanto possível, o progresso social e econômico
do trabalhador que, sozinho ou com sua família, torne viável/produtiva a extensão
de terra que possui.
Neste particular, destaca-se que a porção de terra inferior ao módulo rural
traduz-se em minifúndio, vale dizer, imóvel rural de tamanho e possibilidades infe-
riores àquelas da propriedade familiar (art. 4º, inciso IV, da Lei nº 4.504/64), sendo,
portanto, antieconômico, de modo a ensejar a redução do minifundiário a estado
deficitário. Desse modo, permitir a usucapião desses imóveis representaria afronta
às finalidades perseguidas pelos princípios do direito agrário, notadamente àquele
que preceitua a promoção do rurícola e o combate ao minifúndio.
212 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Esse é a posição defendida por José Carlos Moraes Sales, ao afirmar a possi-
bilidade de instituição de limitações ao direito de propriedade, dentre as quais se
encontra a sua indivisibilidade.
“Diante de tudo quanto foi exposto, em edições anteriores desta obra,
perfilhamos o entendimento acolhido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo
nos arestos supramencionados, não só pelas razões constantes dos acórdãos
aludidos como por nos parecer que a impossibilidade de se usucapir área inferior
ao módulo rural não constituía obstáculo a que o instituto constitucional da usu-
capião especial rural atingisse seu desiderato.
Acrescentamos, então, que, apesar de o direito de propriedade ser assegu-
rado plenamente pela Constituição Federal (art. 5º, ����������������������������
XXII), poderia
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a lei estabe-
lecer limitações a esse direito, como, por exemplo, as limitações administrativas,
as quais são, no dizer de Hely Lopes Meirelles, ‘uma das formas pelas quais o
Estado, no uso de sua soberania interna, intervém na propriedade e nas ativi-
dades particulares. Pelas mesmas razões, não víamos obstáculo em que o Estatuto
da Terra estabelecesse a impossibilidade de divisão de áreas em outras de dimensão
inferior à do módulo de propriedade rural (art. 65), nem víamos impedimento em
que se considerasse que tal indivisibilidade alcançasse, também, as situações de
usucapião pro labore. De fato, se o proprietário atingido pela usucapião já estava
sujeito àquela restrição, por força do disposto no art. 65 do Estatuto da Terra, não
haveria razão para se entender que o art. 191 da Constituição estaria a conceder
ao usucapiente situação mais vantajosa, permitindo-lhe usucapir área inferior à
do módulo rural, com imenso prejuízo aos objetivos visados pelo Estatuto da Terra,
que, no caso, são os de impedir a proliferação de minifúndios.” (Usucapião de bens
imóveis e móveis. 6. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 361-362)
Outrossim, destacando a incompatibilidade entre a possibilidade de usucapião
de imóvel com dimensões inferiores ao módulo rural e o princípio da função social
da propriedade, salienta-se:
“Questão controvertida diz respeito à possibilidade de usucapião cons-
titucional agrário sobre área inferior ao módulo rural.
Para o ilustre constitucionalista Celso Ribeiro Bastos, a inadmissibilidade
de usucapião de área inferior ao módulo rural impediria que o instituto cons-
titucional atingisse seu propósito.
No entanto, outro entendimento tem conquistado espaço nos tribunais
e, especialmente, dentre os agraristas.
O caput do art. 65 do Estatuto da Terra prescreve que o ‘imóvel rural não é
divisível em áreas de dimensão inferior à constitutiva do módulo de propriedade
rural’. Módulo rural, nos termos do inciso III do art. 4º, é ‘a área fixada nos
termos do inciso anterior’, que diz ser propriedade familiar ‘o imóvel rural que,
direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e por sua família, lhes absorva
toda a força de trabalho, garantindo-lhe a subsistência e o progresso social e
econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 213

eventualmente trabalho com a ajuda de terceiros’. Se o fundamento do instituto


está na exigência de cumprimento da função social da propriedade, e sendo esta
em relação ao imóvel rural o já comentado anteriormente, perderia seu objetivo
admitir a aquisição por usucapião de área insuficiente para propiciar a produção
pelo trabalho de sua família. O usucapião é, acima de qualquer outra coisa,
um dos institutos jurídicos que mais refletem a proteção dada pelo Direito à
propriedade. Não a propriedade improdutiva, inutilizada, que só acarreta no
aumento dos problemas sociais do Brasil e contribui para uma desigualdade
social ainda maior, mas a propriedade que realmente cumpre sua função so-
cial.” (BARBOSA, Alessandra de Abreu Minadakis. Usucapião constitucional
agrário. In: BARROSO, Lucas Abreu; MIRANDA; Alcir Gursen de; SOARES;
Mário Lúcio Quintão. O direito agrário na Constituição. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006. p. 268; grifou-se)
De fato, a limitação à divisão do imóvel rural não se afasta da ideia de cum-
primento de sua função social, muito pelo contrário. Saliente-se, por oportuno,
que esta, nos termos preceituados pelo art. 186 da Constituição Federal, “(...) é
cumprida quando a propriedade rural atende simultaneamente, segundo critérios e
graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I – aproveitamento
racional e adequado; II – utilização adequada (...); III – observância das disposições
que regulam as relações de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem-estar dos
proprietários e dos trabalhadores”.
Com efeito, a função social da propriedade, prevista, em nossa Constituição
Federal, nos arts. 5º, inciso XXIII (direitos e garantias fundamentais), e 170, inciso

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


III (princípio da ordem econômica), tem acepção social e econômica.
Nesse sentido, ressalta-se a lição de José Afonso da Silva, ao comentar os di-
tames preceituados pela função social da propriedade:
“O regime jurídico da terra ‘fundamenta-se na doutrina da função social
da propriedade, pela qual toda riqueza produtiva tem uma finalidade social e
econômica, e quem a detêm deve fazê-la frutificar, em benefício próprio e da
comunidade em que vive’. Essa doutrina, como observa Sodero, trouxe um
novo conceito de direito de propriedade rural que informa que ela é um bem
de produção e não simplesmente um bem patrimonial; por isso, quem detém a
posse ou a propriedade de um imóvel rural tem a obrigação de fazê-lo produzir, de
acordo com o tipo de terra, com a sua localização e com os meios e as condições
propiciados pelo Poder Público, que também tem responsabilidade no cumprimento
da função social da propriedade agrícola.
Essa doutrina foi acolhida pela Constituição, que declara que toda pro-
priedade atenderá à sua função social (art. 5º, XXIII), que é um princípio da
ordem econômica (art. 170, III).
(...)
A produtividade é um elemento da função social da propriedade rural. Não
basta, porém, ser produtiva para que ela seja tida como cumpridora do princípio.
214 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Se ela produz, mas de modo irracional, inadequado, descumprindo a legislação


trabalhista em relação a seus trabalhadores, evidentemente está longe de atender
à sua função social.” (Curso de direito constitucional positivo. 32. ed. rev. e atual.
São Paulo: Malheiros, 2009. p. 819-820, e-STJ; grifou-se)
Portanto, a instituição de módulos mínimos para os imóveis rurais se coa-
duna com o princípio da função social da propriedade rural – que impõe, além de
outras determinações, a observância de critérios relativos à produtividade racional
e adequada –, pois estas unidades de medida agrária têm por escopo justamente
garantir ao agricultor e à sua família uma exploração de terra que lhes possibilite a
subsistência, bem como a promoção do progresso econômico da propriedade, o que
estaria inviabilizado em glebas de dimensões ínfimas.
Desse modo, embora os arts. 191 da Constituição Federal e 1.239 do Código
Civil não determinem área mínima para o imóvel rural passível de usucapião espe-
cial, forçoso reconhecer a necessidade de observância ao módulo rural ou à fração
mínima de parcelamento, preconizados pelo Estatuto da Terra e pela Lei nº 5.868/72.
Referidos diplomas legais encerram, em si, indubitavelmente, premissas de
políticas (públicas) institucionais fixadas legítima e adequadamente pelos demais
poderes da república, destinadas a combater as distorções fundiárias ocorrentes no
território nacional, não competindo ao Judiciário revê-las, exceto para declará-las
estabelecidas com erro formal ou contrariando cláusula constitucional.
Assim, a adoção de entendimento contrário implicaria a subversão dos critérios
técnicos e pressupostos ideológicos que cumprem ser fixados pelos poderes consti-
tucionalmente incumbidos para tanto, os quais, legítima e eficazmente os estabele-
ceram, atentos à função social do uso da terra e à viabilidade concreta da obtenção
de meios para subsistência digna da unidade familiar, ante a real possibilidade de a
exploração rural do imóvel garantir meios efetivos de subsistência.
Ademais, cumpre destacar que mesmo os autores que defendem a possibilidade
de se usucapir imóveis com dimensões inferiores ao módulo rural ou à fração mínima
de parcelamento, apresentam preocupação no que toca à possibilidade de fraude à
lei, por meio do instituto em questão. A título ilustrativo, confira-se:
“Pode ocorrer de a gleba ser inferior ao módulo rural. Há divergência
doutrinária e jurisprudencial sobre o tema, mas, se a finalidade de tornar a
gleba produtiva for preenchida pelo possuidor, o melhor entendimento é admi-
tir a usucapião, em razão da natureza originária de aquisição (...). Ressalva-se
a ocorrência de fraude à lei, em especial nos casos em que há negócio jurídico de
alienação da gleba, pretendendo o adquirente contornar a vedação cogente com o
instituto da usucapião, o que se mostra inadmissível.” (PELUSO, Cezar [Coord].
Código Civil comentado. Doutrina e jurisprudência. 5. ed. rev. e atual. Barueri:
Manole, 2011. p. 1.239-1.240; grifou-se)
Neste ponto específico, acrescenta-se, ainda, que esta Quarta Turma, no julga-
mento do Recurso Especial 402.792/SP, de Relatoria do Ministro Jorge Scartezzini,
julgado em 26 de outubro de 2004, decidiu pela impossibilidade de usucapião, em
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 215

demanda que versava acerca da viabilidade de usucapir imóvel urbano, cuja área era
inferior à fração de parcelamento prevista pela legislação municipal.
No caso subjacente ao precedente em comento, entendeu-se pela impossibilida-
de se declarar a propriedade de imóvel urbano, por meio da usucapião extraordinária,
ratificando-se os argumentos deduzidos pelo Corte estadual, nos seguintes termos:
“Em última análise, não há como sobrepor o reconhecimento da possibilidade
de usucapião em área cujo registro sem as dimensões mínimas é vedado por lei.
Destarte, precisas as considerações expendidas pela douta Subprocura-
doria-Geral da República, em seu parecer, à fl. 202, da lavra da i. Dra Armanda
Soares Figueiredo, do qual destaco o seguinte trecho, in verbis: ‘A Lei nº 6.766,
de 19 de dezembro de 1979, Lei do Parcelamento do Solo Urbano, prevê em seu
art. 1º, parágrafo único, que: ‘Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
poderão estabelecer normas complementares relativas ao parcelamento do solo
municipal para adequar o previsto nesta Lei às peculiaridades regionais e locais’.
De acordo com o Plano Diretor do Município de Socorro/SP, o módulo
mínimo para parcelamento do solo urbano em imóvel situado no local do
imóvel objeto da ação é de 250 m², de acordo com a resposta do ofício 922/99
G.P. (fl. 135).
Logo, como o imóvel pretendido tem apenas 126 m2, a pretensão do
requerente não pode ser atendida, pois, se tal fosse, haveria burla à Lei do Parce-
lamento do Solo Urbano e à lei municipal que regula o assunto em cada município.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


Assim, incensurável o v. acórdão recorrido (fl. 169) quando afirmou que
‘o entendimento do pedido implicaria em ofensa à norma municipal relativa ao
parcelamento do solo urbano, pela via reflexa do usucapião. Seria, com isso,
legalizado o que a lei não permite. Anotou, a propósito, o dd. Promotor de Justiça
que na Comarca de Socorro isso vem ocorrendo ‘como meio de buscar a legitimação
do parcelamento de imóveis realizados irregularmente e clandestinamente’.”
Conquanto se trate de hipótese diversa, pois nestes autos se discute a usucapião
especial rural, ao passo que o caso subjacente ao precedente mencionado concernia
à usucapião extraordinária de imóvel urbano com dimensões inferiores à fração
mínima de parcelamento prescrita pela legislação municipal, ainda assim, a mesma
solução deve ser adotada.
Isso porque o fundamento utilizado naquele julgamento, isto é, a impossibilida-
de de utilização do instituto da usucapião para legalizar o que a lei não permite, vale
dizer, o desmembramento de imóveis em porções inferiores aos módulos mínimos,
estende-se ao caso destes autos.
Assim, considerando as razões apresentadas ao longo deste voto, conclui-se
pela impossibilidade de reconhecimento, por meio da usucapião especial rural ou
pro labore, da propriedade de imóvel rural com área inferior ao módulo rural ou à
fração mínima de parcelamento.
216 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

2.3. Conclusão em Relação ao Caso Concreto


Considerando as conclusões acima firmadas, no sentido de que o instituto da
usucapião especial rural pressupõe a utilização adequada e racional da propriedade
rural, apta a promover o progresso social e econômico, e, por isso, não há como ad-
mitir que recaia sobre imóveis de dimensões inferiores ao módulo rural ou à fração
mínima de parcelamento, impondo-se o afastamento da pretensão recursal veiculada
neste apelo extremo.
O desfecho ora concedido encontra justificativa, ainda, nas peculiaridades
do presente caso, pois, consoante narrado na sentença proferida pelo magistrado
singular, a área usucapienda, com dimensões de 2.435 m2 (dois mil quatrocentos e
trinta e cinco metros quadrados), é muito inferior ao módulo rural/fração mínima de
parcelamento, fixado, para o Município, em 3 (três) hectares, isto é, 30.000 m2 (trinta
mil metros quadrados).
Confira-se, a propósito, o seguinte excerto da sentença:
“Conforme testifica a informação do Oficial do Registro de Imóveis, o
módulo rural mínimo fixado pelo órgão competente para a região é de 3 (três)
hectares, o que equivale a cerca de 30.000 m2 (trinta mil metros quadrados),
enquanto que a área que os autores pretendem adquirir mede somente 2.435
m2 (dois mil quatrocentos e trinta e cinco metros quadrados).
Logo, a área usucapienda é muito inferior ao mínimo legal permitido
para desmembramento ou divisão de gleba rural, e, na espécie, não se extrai
dos autos qualquer hipótese de exceção.” (fl. 45, e-STJ)
Não se trata, portanto, de hipótese em que o imóvel usucapiendo possui dimen-
sões aproximadas daquelas fixadas pelo órgão agrário, o que, a depender das demais
circunstâncias, poderia ensejar a adoção de solução diversa, flexibilizando-se o enten-
dimento acima firmado. No caso ora em exame, frise-se, a extensão do imóvel sequer
atinge um hectare (dez mil metros quadrados), revelando-se insuficiente, portanto,
ao atendimento da função social da propriedade rural, que preceitua a harmonização
entre a subsistência do agricultor e de sua família e o progresso econômico.
Saliente-se, neste particular, consoante já destacado às fls. 16/17 deste voto,
que o menor índice para a fração mínima de parcelamento fixada pelo órgão agrá-
rio – INCRA –, considerando todo o território nacional (e não o município), é de
dois hectares, ou seja, 20.000 m2 (vinte mil metros quadrados), da qual se distancia
consideravelmente a área do imóvel usucapiendo (de acordo com a Tabela III da
Instrução Especial do INCRA nº 5-A, de 1973, com as alterações procedidas pela
Instrução Especial nº 50, de 1997).
Com efeito, impõe-se a rejeição da pretensão recursal deduzida no presente
apelo extremo, mantendo-se a improcedência do pedido declaratório veiculado na
demanda proposta pelos ora recorrentes.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 217

3. Do exposto, voto no sentido de conhecer, em parte, do recurso especial e,


na extensão, negar-lhe provimento.
É como voto.

VOTO-VISTA
O Exmo. Sr. Ministro Luis Felipe Salomão:
1. Cuida-se de recurso especial interposto por Waldevino Fehlberg e outro, com
fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal de 1988, contra acórdão
proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, assim ementado:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO
CÍVEL. USUCAPIÃO PRO LABORE. ÁREA INFERIOR AO MÓDULO RURAL.
IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1. Por força do art. 65 da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), é vedada
a divisão do imóvel rural em áreas inferiores ao módulo de propriedade rural,
ou seja, 30.000 m2 (trinta mil metros quadrados).
2. Logo, a usucapião não pode ocorrer em área inferior ao módulo de
propriedade rural. Nos termos dos precedentes do STJ, ‘caso se admitisse o
usucapião de tal área, estar-se-ia viabilizando, de forma direta, o registro de
área inferior àquela permitida pela lei daquele município. Há, portanto, vício
na própria relação jurídica que se pretende modificar com a aquisição definitiva
do imóvel’ (REsp 402.792/SP, Rel. Min. Jorge Scartezzi, DJ 06.12.04, p. 316).

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


3. Recurso desprovido.”
Na origem, Waldevino Fehlberg e sua companheira, Maria Antônia de Araújo,
ajuizaram ação de usucapião especial sob o argumento de que desde o mês de janeiro
de 1996 mantêm a posse mansa, pacífica e ininterrupta, com animus domini do imó-
vel rural onde residem, com área aproximada de 2.435 m² (dois mil quatrocentos e
trinta e cinco metros quadrados), conforme descrito na planta que instruiu o pedido.
Ressaltaram, na ocasião, que construíram no imóvel uma casa de alvenaria para sua
moradia e uma pequena fábrica de caixas para embalagem de verduras e hortaliças;
ainda, que cultivavam a terra com plantio de verduras e hortaliças, além de criarem
aves e suínos para consumo, com que mantinham sua sobrevivência.
O Juiz de piso reconheceu a impossibilidade jurídica do pedido e extinguiu o
processo sem exame de mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC. A decisão
teve por fundamento o fato de ser a área usucapienda muito inferior ao mínimo
legal permitido para desmembramento ou divisão de gleba rural. Acrescentou que,
“conquanto o legislador constitucional tenha fixado apenas um limite máximo de
área rural usucapível, e não mínimo, o que, em princípio, autorizaria a entender pela
não recepção da discriminação, certo é que a exploração de áreas rurais inferiores
ao módulo mínimo permitido ensejaria a formação de verdadeiros minifúndios
improdutivos e, assim, ofenderia o postulado constitucional fundamental que é o
de garantir a função social e econômica da propriedade”.
218 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Os autores interpuseram recurso de apelação em face da sentença e, após, agravo


interno contra a decisão monocrática que negou provimento ao apelo. Julgado o
agravo, negou-se provimento ao recurso, em síntese, pelos seguintes fundamentos:
“Pois bem, o art. 65 da Lei nº 4.504/64 veda claramente a divisão do
imóvel rural em áreas inferiores ao módulo de propriedade rural. O Decreto
nº 62.504/68 ressalta que o art. 65 da Lei nº 4.504/64 ‘tem o objetivo precípuo
de evitar a proliferação de novos minifúndios, proibindo os desmembramentos
de imóveis rurais quando esses resultem na criação de novas propriedades
minifundiárias’.
Ademais, o MM. Juiz na r. sentença de fls. 32-33, assevera com precisão
que:
‘(...) a proibição infraconstitucional de divisão de imóvel rural em área
inferior ao módulo mínimo não extrapola o disposto na Lei Maior. Ao contrário,
lhe confere eficácia total.’ (fl. 33).”
Nas razões do recurso especial, os recorrentes, além de dissídio jurisprudencial,
alegam ofensa ao disposto no art. 1.239 do Código Civil.
Argumentam que “não há dúvida de que o Código Civil de 2002 apenas ab-
sorveu a norma constitucional insculpida no art. 191 da CF, o que vale dizer que o
art. 65 da Lei nº 4.504/64 foi derrogado”. Defendem que a Lei nº 4.504/64 “aplica-se
exclusivamente para os casos de áreas destinadas à colonização” e que, “considerando
que o Código Civil é posterior à Lei nº 4.504/64, não resta dúvida de que prevalecem
as disposições da lei mais recente”.
Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal opinou pelo conheci-
mento e não provimento do recurso especial. Salientou que a usucapião especial
não pode ocorrer sobre imóvel cuja área seja inferior ao módulo de propriedade
rural, exatamente o caso dos autos. Afirmou que o art. 1.239 do novo Código Civil
não afasta a necessidade de a área ser maior do que o módulo rural previsto para a
região (e-fls. 141-142).
O eminente Relator, Ministro Marco Buzzi, conheceu em parte do recurso es-
pecial e, na extensão, negou-lhe provimento, mantendo a improcedência do pedido
declaratório, reconhecendo, desta maneira, a impossibilidade de usucapião de imó-
veis rurais de dimensão inferior ao módulo rural ou à fração mínima de parcelamento.
Na assentada do dia 19.11.2013, pedi vista dos autos para melhor exame da
questão.
É o relatório, em acréscimo àquele produzido pelo cuidadoso Relator.
2. Em primeiro lugar, impõe-se o não conhecimento do recurso fundado na
alínea c do permissivo constitucional, tendo em vista o não cumprimento da indis-
pensável demonstração analítica da divergência que se alega.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 219

No caso sob análise, na verdade, apesar de os recorrentes mencionarem no


intróito das razões recursais a interposição do apelo fundamentada na alínea c, não
se preocuparam, no decorrer da peça, em demonstrar o dissídio jurisprudencial.
De fato, nem sequer foram transcritas ementas de julgados paradigmas, muito
menos se realizou o confronto entre acórdão recorrido e decisões apontadas como
divergentes, com menção às circunstâncias que identificassem ou assemelhassem os
casos confrontados, a ensejar a deficiência de fundamentação no recurso especial,
inviabilizando a abertura da instância excepcional. Incidência da Súmula nº 284/STF.
3. Já no que respeita à interposição com base na alínea a do art. 105 da Cons-
tituição Federal, o recurso merece conhecimento.
O debate que se inaugura com este recurso é, conforme bem delimitado pelo
eminente Relator, a possibilidade de aquisição, por meio da usucapião especial
rural, de propriedade de imóvel cuja área é inferior ao módulo rural estabelecido
para a região.
Importante, num primeiro momento, e de forma breve, uma vez que o eminente
voto do relator cuidou com louvor desse mister, identificar as espécies normativas
que albergam ou albergaram o instituto ao longo dos tempos.
Assim procedendo, será possível a identificação de requisitos e características
da usucapião de imóvel rural, estudo essencial à resposta da questão recursal.
A usucapião especial de imóvel rural é instituto hoje previsto na Constituição
Federal de 1988 em seu art. 191, nos seguintes termos:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


“Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano,
possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em
zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu
trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usuca-
pião.”
De forma idêntica, o Código Civil de 2002 previu essa modalidade de aquisição
da propriedade:
“Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou ur-
bano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de
terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva
por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a
propriedade.”
Ao longo dos tempos, essa modalidade de usucapião ora recebeu tratamento
constitucional, ora infraconstitucional.
As primeiras constituições brasileiras – a Constituição do Império, outorgada
em 1824, e a primeira Constituição Republicana, promulgada em 1891 – nada dis-
puseram acerca da possibilidade de usucapir imóvel rural.
220 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

A Constituição Federal promulgada em 1934 foi a primeira a tratar da matéria,


em seu art. 125. Confira-se
“Todo brasileiro que, não sendo proprietário rural ou urbano, ocupar, por
dez anos contínuos, sem oposição nem reconhecimento de domínio alheio,
um trecho de terra até dez hectares, tornando-o produtivo por seu trabalho
e tendo nele a sua morada, adquirirá o domínio do solo, mediante sentença
declaratória devidamente transcrita.”
Decorrente do rompimento da ordem jurídica ocasionado pela Revolução de
1930, a Constituição de 1934 é destacada pela doutrina como a primeira a preocupar-
se com os direitos fundamentais sociais, apresentados, a maioria deles, por normas
constitucionais programáticas. Apesar de sua vida curta, a Constituição de 1934
ampliou sobremaneira a relação de matérias por ela tratadas, constitucionalizando,
termo utilizado por José Afonso da Silva, temas antes disciplinados apenas por
normas infraconstitucionais.
As cartas que sucederam à de 1934 (1937 e 1946) fizeram alterações sutis
no texto do artigo que previa a usucapião de imóvel rural, acima referido. As va-
riações que se verificaram diziam respeito ao tamanho máximo da área passível de
ser usucapida. A Constituição de 1937 reproduziu exatamente o texto do art. 125
da Constituição de 1934 e a única alteração que se observou no texto da Carta de
1946 dizia respeito ao tamanho da área usucapível por meio desta modalidade: os
10 hectares previstos na Carta de 1934 foram alargados para 25 hectares.
A Constituição de 1946 foi ainda modificada pela Emenda Constitucional nº 10,
de 9 de novembro de 1964, que por sua vez alterou o disposto no § 3º de seu art. 156:
“Art 156. A lei facilitará a fixação do homem no campo, estabelecendo
planos de colonização e de aproveitamento das terras pública. Para esse fim,
serão preferidos os nacionais e, dentre eles, os habitantes das zonas empobre-
cidas e os desempregados.
(...)
§ 3º Todo aquêle que, não sendo proprietário rural nem urbano, ocupar,
por dez anos ininterruptos, sem oposição nem reconhecimento de domínio
alheio, trecho de terra que haja tornado produtivo por seu trabalho, e de sua
família, adquirir-lhe-á a propriedade mediante sentença declaratória devida-
mente transcrita. A área, nunca excedente de cem hectares, deverá ser carac-
terizada como suficiente para assegurar ao lavrador e sua família, condições
de subsistência e progresso social e econômico, nas dimensões fixadas pela
lei, segundo os sistemas agrícolas regionais.”
A inovação trazida pela emenda consistiu na determinação da área nunca exce-
dente de cem hectares, originalmente não superior a vinte e cinco hectares.
Sob a égide da Constituição de 1946 foi promulgado, em 30 de novembro de
1964, o Estatuto da Terra, Lei nº 4.504, que regulou o assunto em seu art. 98:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 221

“Art. 98. Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano,
ocupar por dez anos ininterruptos, sem oposição nem reconhecimento de
domínio alheio, tornando-o produtivo por seu trabalho, e tendo nele sua
morada, trecho de terra com área caracterizada como suficiente para, por seu
cultivo direto pelo lavrador e sua família, garantir-lhes a subsistência, o pro-
gresso social e econômico, nas dimensões fixadas por esta Lei, para o módulo
de propriedade, adquirir-lhe-á o domínio, mediante sentença declaratória
devidamente transcrita.”
Benedito Silvério Ribeiro explica que
“a Constituição de 1967, e mesmo com a modificação advinda com a
Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, não mais reproduziu
o direito à usucapião de terras públicas, relegada, assim, à lei ordinária disci-
plinar a matéria.
Essa modalidade usucapicional, já denominada pro labore, constitucional,
especial, rústica, rural, agrária e pro deserto, deixou de figurar no bojo da Cons-
tituição Federal, sofrendo o processo que se pode chamar desconstitucionali-
zação do instituto.” (RIBEIRO, Benedito Silvério. Tratado de usucapião. 8. ed.
rev. e atual com a usucapião familiar. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 2. p. 1.128)
Mais tarde, a matéria voltou a ser objeto de lei ordinária, Lei nº 6.969/81, que
dispôs sobre a aquisição, por usucapião especial, de imóveis rurais e previu em seu
art. 1º:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


“Art. 1º Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano,
possuir como sua, por 5 (cinco) anos ininterruptos, sem oposição, área rural
contínua, não excedente de 25 (vinte e cinco) hectares, e a houver tornado
produtiva com seu trabalho e nela tiver sua morada, adquirir-lhe-á o domí-
nio, independentemente de justo título e boa-fé, podendo requerer ao juiz
que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para transcrição no
Registro de Imóveis.
Parágrafo único. Prevalecerá a área do módulo rural aplicável à espécie,
na forma da legislação específica, se aquele for superior a 25 (vinte e cinco)
hectares.”
Com a promulgação da Carta de 5 de outubro de 1988, a usucapião de imóvel
rural volta a receber previsão constitucional e, mais tarde, vem compor o rol de
artigos do Código Civil de 2002.
Na vigente Constituição, o instituto tomou assento em seu Título VII, Da Or-
dem Econômica e Financeira, mais especificamente em seu Capítulo III, Da Política
Agrícola e Fundiária e Da Reforma Agrária.
Os incisos do art. 170 da CF/88 enumeram os princípios básicos da ordem
econômica, tomando por referência a livre-iniciativa e a valorização do trabalho hu-
mano, fundamentos da ordem econômica, explicitados no caput do artigo.
222 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho


humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I – soberania nacional;
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;
IV – livre concorrência;
V – defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente;
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado
conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos
de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42,
de 19.12.2003)
VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII – busca do pleno emprego;
IX – ���������������������������������������������������������������
tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte consti-
tuídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995)”
O caráter compromissário da Constituição está estampado no artigo reproduzi-
do acima. A intenção da Carta é clara: integração e harmonia entre a livre-iniciativa,
que deve ser assegurada, sem se descuidar da valorização do trabalho humano, fator
de produção que ocupa papel primordial na concretização da justiça social.
O tratamento conferido pelo constituinte à propriedade privada como princípio
da ordem econômica revela o Brasil como Estado Capitalista em que a apropriação
privada dos meios de produção é permitida. No entanto, ao lado da propriedade
privada, também apontada como princípio da ordem econômica, está a função social
da propriedade, que necessariamente deverá ser atendida.
A propriedade privada e a função social da propriedade vêm, ainda, arroladas
na Constituição Federal de 1988 dentre os direitos e garantias individuais (art. 5º,
XXIII), �����������������������������������������������������������������������
sendo pressupostos indispensáveis à promoção da política de desenvolvi-
mento urbano (art. 182, § 2º) e rural (art. 186, I a IV).
Nos termos do art. 186 da CF/88, a função social é cumprida quando a pro-
priedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência
estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
“I – aproveitamento racional e adequado;
II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação
do meio ambiente;
III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 223

IV – ������������������������������������������������������������������
exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos traba-
lhadores.”
Na mesma linha, prescreve o Estatuto da Terra, Lei nº 4.504/64:
“Art. 2º É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da
terra, condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei.
§ 1º A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social
quando, simultaneamente:
a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela
labutam, assim como de suas famílias;
b) mantém níveis satisfatórios de produtividade;
c) assegura a conservação dos recursos naturais;
d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho
entre os que a possuem e a cultivem.”
A usucapião especial rural é instrumento de aperfeiçoamento da política
agrícola do Estado, cujo fundamento é a função social, ou seja, o legislador cons-
tituinte elegeu a usucapião como instituto promotor/incentivador da função social
da propriedade rural, utilizando-o, ao mesmo tempo, como forma de recompensa
ao possuidor que dá à terra sobre a qual exerce a posse a almejada função social.
A finalidade buscada pelas normas constitucionais, assim como as de direito
agrário, é o incentivo à produtividade da terra, que termina alcançando a função

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


social de proteção aos agricultores.
Institutos como a usucapião especial de imóvel rural e a desapropriação para
a reforma agrária surgiram, assim, quando da necessidade de regulamentação pelo
Estado do uso e gozo da propriedade territorial rural, conforme os ditames da Carta
Magna.
Oswaldo Opitz e Silvia Opitz, ao tratarem da usucapião especial constitucional
e da função social como fundamento e ao mesmo tempo objetivo do instituto, fazem
as seguintes considerações:
“Nota-se que o fim social se destaca, remontando aos velhos princípios
do direito romano, quando ofereciam as terras deixadas incultas a quem as
quisesse cultivar.
O fato de pertencer a alguém uma propriedade rural igual ao módulo
não lhe confere o direito de deixá-la inculta, daí a limitação imposta pela
Constituição, quando permite a desapropriação por interesse social e agora a
usucapião pro labore.
Não é por ser inculta a terra particular que a usucapião especial vai recair;
necessário se torna que essa propriedade rural tenha incorporado a si o trabalho
do agricultor, que este a tenha tornado produtiva e que nela tenha sua morada
com sua família, célula mater, por excelência, da sociedade.” (OPTIZ, Silvia C.
224 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

B.; OPTIZ, Oswaldo. Curso completo de direito agrário. 7. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2013. p. 100-101)
De fato, a usucapião prevista nos arts. 191 da Constituição e 1.239 do Código
Civil, regulamentada Lei nº 6.969/81, é caracterizada pelo elemento posse-trabalho.
Serve a essa espécie tão somente a posse marcada pelo trabalho. Para a concretização
do direito ao domínio do imóvel rural, a exploração econômica e racional da terra é
pressuposto impossível de ser afastado, deixando clara a intenção do legislador em
prestigiar o possuidor que confere função social ao imóvel rural.
4. Retomo, pois, o raciocínio para o caso concreto.
Os recorrentes defendem a possibilidade de usucapir imóvel rural, cuja área é
inferior ao módulo rural da região. Argumentam que o art. 65 da Lei nº 4.504/64, que
prevê a impossibilidade de divisão do imóvel rural em áreas inferiores ao módulo,
teria sido derrogado, tendo em vista a previsão do art. 1.239 do Código Civil de 2002
referir-se apenas à extensão máxima do imóvel passível de usucapião.
A conclusão, a meu ver, rogando vênia ao eminente relator e com todo respeito
ao entendimento por ele defendido em precioso voto, não deve ser outra, senão a
viabilidade de aquisição do domínio de área inferior ao módulo rural, por meio da
usucapião pró-labore.
E assim o é porque a Constituição no caput de seu art. 191, cujo texto se faz
idêntico no art. 1.239 do Código Civil, preceitua:
“Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou ur-
bano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de
terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva
por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a
propriedade.”
Percebe-se a existência de demarcação de área máxima passível de ser usucapida,
não de área mínima. Mais relevante que a área do imóvel é o requisito que precede
a esse, ou seja, o trabalho realizado pelo possuidor e por sua família, que torne a
terra produtiva, dando a ela função social.
Da mesma forma, a regulamentação feita pela Lei nº 6.969/81, anterior à
Constituição, diga-se de passagem, também não previa área mínima em imóvel
rural como condição para a aquisição do direito à propriedade. Nela, inclusive, a
limitação da área máxima era menor, 25 hectares, tendo sido superada pela previsão
constitucional que a sucedeu.
Benedito Silvério Ribeiro, em sua obra Tratado de Usucapião, comenta a questão:
“Erigindo o legislador um instituto no ordenamento jurídico, dando um limite
máximo de área a ser usucapida, presentes todos os requisitos necessários, sem
ressalva de um tamanho mínimo, parece evidenciado que não emerge empecilho
à aquisição usucapicional de imóvel que guarde medida inferior que o módulo
previsto para a região em que se localize.
(...)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 225

Assentou-se na IV Jornada de Direito Civil o Enunciado nº 312: ‘Art. 1.239.


Observado o teto constitucional, a fixação da área máxima para fins de usucapião
especial rural levará em consideração o módulo rural e a atividade rural regio-
nalizada’.
Assim, o tamanho da área rural não encontraria limite mínimo algum, ha-
vendo ressalvar que tenha sido produtiva, morando nela o pretenso adquirente.
Não podendo o morador usucapir gleba inferior ao módulo local, que lhe
possibilite a regularização registrária, para fins de cadastro bancário e garantia
de financiamentos agrícolas, pecuários, etc., ficará totalmente desprotegido e
fora do alcance legal, cujo fundamento foi justamente ajudar o rurícola que
desenvolva a riqueza, contribuindo para a produção de bens de consumo e
circulação. (...)
A vigente Constituição voltou a regular a modalidade usucapicional pro
labore ou rural, que pode ser de novo chamada constitucional, convindo acres-
cer que o diploma máximo passou também a albergar a prescrição aquisitiva
denominada urbana.
O art. 191 da Constituição Federal fala em ‘área de terra, em zona rural,
não superior a cinqüenta hectares’.
É óbvio, como antes lembrado, que não incide usucapião sobre terras
públicas, consoante os termos da vedação inserta no parágrafo único do citado
dispositivo.
Como se vê, abandonou o legislador constitucional a ideia de fixação da

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


área pelo módulo rural, relegando ao novo Código Civil referência a imóvel
que a lei considera suficiente para assegurar a subsistência do possuidor e da
sua família, restando, no entanto, idêntico o dispositivo do art. 1.239 àquele
estatuído na Constituição Federal.” (RIBEIRO, Benedito Silvério. Tratado de
usucapião. 8. ed. rev. e atual com a usucapião familiar. São Paulo: Saraiva, 2012.
v. 2. p. 1.156-1.160)
Da mesma forma conclui Celso Ribeiro Bastos em Comentários à Constituição
do Brasil:
“Outro problema suscitável é o de a área usucapienda ter menos de cin-
quenta hectares. A conclusão mais correta é a de considerar usucapível mesmo
as áreas inferiores, até porque a Constituição fala em área de terra não superior a
cinquenta hectares. Não é de aplicar-se aqui a legislação referente a módulos.
Estes têm em mira o desdobramento comum de propriedade, mas no nosso
entender não podem funcionar como obstáculo para que um instituto consti-
tucional atinja o seu desiderato. São, portanto, usucapíveis mesmo as áreas de
proporções inferiores às do módulo rural da região.” (BASTOS, Celso Ribeiro.
Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 2.
ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 339. v. 7)
Com efeito, considerando que não há na Constituição Federal, e mesmo na legis-
lação ordinária, regra que determine área mínima sobre a qual deve o possuidor exercer
226 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

sua posse para que seja possível a usucapião pró-labore, a conclusão natural será pela
impossibilidade de o intérprete discriminar onde o legislador não discriminou.
O Estatuto da Terra, mais especificamente seu art. 4º, III, que prevê a regra do
módulo rural, assim como o art. 65, que trata da indivisibilidade do imóvel rural
em área inferior àquele módulo, ainda que anterior à Constituição Federal de 1988,
buscou inspiração, sem dúvida alguma, no princípio da função social da propriedade.
Não discordam doutrinadores e juristas que o módulo rural previsto no Es-
tatuto da Terra foi pensado a partir da delimitação da área mínima necessária ao
aproveitamento econômico do imóvel rural para o sustento familiar, na perspectiva
de implementação do princípio constitucional da função social da propriedade.
Assim, se o imóvel sobre o qual se exerce a posse trabalhada possui área capaz
de gerar subsistência e progresso social e econômico do agricultor e sua família,
mediante exploração direta e pessoal – com a absorção de toda a força de trabalho,
eventualmente com a ajuda de terceiros –, parece menos relevante o fato de aquela
área não coincidir com o módulo rural da região ou até mesmo ser-lhe inferior.
Essa a interpretação teleológica da norma, capaz de assegurar a tutela do in-
teresse para o qual foi criada.
Com maestria pondera Carlos Maximiliano na obra Hermenêutica e Aplicação do
Direito, valendo a reprodução, ainda que um tanto quanto extensa, de cada palavra
estrategicamente utilizada na formação do texto, que exprime com perfeição o que
se pretende afirmar neste voto:
“Toda prescrição legal tem provavelmente um escopo, e presume-se que
a este pretenderam corresponder os autores da mesma, isto é, quiseram tornar
eficiente, converter em realidade o objetivo ideado. A regra positiva deve ser
entendida de modo que satisfaça aquele propósito; quando assim não se pro-
cedia, construíam a obra do hermeneuta sobre a areia movediça do processo
gramatical.
(...)
162 – Não se deve ficar aquém, nem passar além do escopo referido; o
espírito da norma há de ser entendido de modo que o preceito atinja comple-
tamente o objetivo para o qual a mesma foi feita, porém dentro da letra dos
dispositivos. Respeita-se esta, e concilia-se com o fim (1). Isolado, o elemento
verbal talvez imobilizasse o Direito Positivo, por lhe tirar todo o elastério.
Enquadra, de fato, o último em uma fórmula abstrata, que encerra o escopo
social; porém, este, como elemento móvel, conduzirá o jurista às aplicações
diversas e sucessivas de que a fórmula é suscetível. Deste modo a lei adquire
o máximo de dutibilidade (2).
(...)
163 – Deve o intérprete sentir como o próprio autor do trabalho que estu-
da; imbuir-se das ideias inspiradoras da obra concebida e realizada por outrem.
(...)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 227

Entretanto, o trabalho ficaria em meio, se apenas se limitassem a perquirir


acerca do fator subjetivo, da intenção dos prolatores. O objetivo da norma,
positiva ou consuetudinária, é servir à vida, regular a vida; destina-se a lei a
estabelecer a ordem jurídica, a segurança do Direito. Se novos interesses des-
pontam e se enquadram na letra expressa, cumpre adaptar o sentido do texto
antigo ao fim atual (2).” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação
do direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 124-128)
Complementando o raciocínio, em passagem mais à frente da mesma obra,
Maximiliano trata da interpretação de normas do Direito Constitucional, ponderações
que ainda com mais razão merecem ser apresentadas. Confira-se:
“A técnica da interpretação muda, desde que se passe das disposições
ordinárias para as constitucionais, de alcance mais amplo, por sua própria
natureza e em virtude do objetivo colimado redigidas, de modo sintético, em
termos (...)
É força não seja a lei fundamental casuística, não desça a minúcias,
catalogando poderes especiais, esmerilhando providências. Seja entendida
inteligentemente: se teve em mira os fins, forneceu meios para os atingir. Va-
riam estes com o tempo e as circunstâncias: descobri-los e aplicá-los é a tarefa
complexa dos que administram.
(...)
375 – XII. Quando o estatuto fundamental define as circunstâncias em que
um direito pode ser exercido, ou uma pena aplicada, esta especificação importa

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


proibir implicitamente qualquer interferência legislativa para sujeitar o exercí-
cio do direito a condições novas ou estender a outros casos a penalidade (1).
(...)
377 – XIV. Interpretam-se estritamente os dispositivos que instituem
exceções às regras gerais firmadas pela Constituição. Assim se entendem os
que favorecem algumas profissões, classes, ou indivíduos, excluem outros,
estabelecem incompatibilidades, asseguram prerrogativas, ou cerceiam, embo-
ra temporariamente, a liberdade, ou as garantias da propriedade. Na dúvida,
siga-se a regra geral (1).
Entretanto, em Direito Público esse preceito não pode ser aplicado à risca:
o fim para que foi inserto o artigo na lei sobreleva a tudo (2). Não se admite
interpretação estrita que entrave a realização plena do escopo visado pelo
texto. Dentro da letra rigorosa dele procure-se o objetivo da norma suprema;
seja este atingido, e será perfeita a exegese. (...)
Quando as palavras forem suscetíveis de duas interpretações, uma estrita,
outra ampla, adotar-se-á aquela que for mais consentânea com o fim transpa-
rente da norma positiva (4).
378 – XV. Aplica-se à exegese constitucional o processo sistemático de
hermenêutica, e também o teleológico, assegurada ao último a preponderância.”
228 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

(MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 20. ed. Rio de


Janeiro: Forense, 2011. p. 247-255)
O Supremo Tribunal Federal outrora posicionou-se sobre a questão da forma
como aqui me posiciono. Optou a Corte Suprema por conferir interpretação finalís-
tica ao art. 65 da Lei nº 4.504/64 e prover o direito ao desmembramento de imóvel
rural com área inferior ao módulo rural da região.
Naquela oportunidade, o Supremo Tribunal Federal deparou-se com situação
diversa do caso que ora se analisa. O RE 66.409/RS não se referia à usucapião de
imóvel rural, mas de ação de divisão e demarcação de imóvel daquela natureza.
No entanto, para resolver a pendenga, a Corte Suprema invocou a finalidade
da norma em foco, disciplinadora da proibição que lá se pretendia afastar, qual seja
a impossibilidade de divisão do imóvel, tendo em vista o disposto no art. 65 do
Estatuto da Terra, em torno do qual também gravita nosso estudo.
O eminente Relator, Ministro Adaucto Cardoso, delimitou a controvérsia:
“O tema focado nos autos é de excepcional importância. Trata-se de
interpretação das leis que regem o domínio e o uso de imóveis rurais ‘para os
fins da reforma agrária e promoção da política agrícola’, como reza o art. 1º do
Estatuto da Terra. Mais especificamente, cogita-se da compreensão dos arts. 65
do referido Estatuto e 11 do Decreto-Lei nº 57, de 18.11.66.”
Após, em seu voto, preconizou:
“Nega-se ao proprietário da terra, que a possui em condomínio, a facul-
dade de exigir a todo tempo a divisão da coisa comum (...).
Procede a argumentação do recorrente, acolhida pelo despacho trans-
crito e pelo brilhante parecer do Procurador da República, no sentido de que
a proibição contida no art. 65 da Lei nº 4.504, de 1964 (Estatuto da Terra),
complementada pelo art. 11 do Decreto-Lei nº 57, de 1966, só se aplica aos
casos de transmissão da propriedade. O sentido desse dispositivo é, aliás, de
clara interpretação da lei anterior, introduzido nela, em expressão preambular, a
limitação a que me refiro: ‘Para fins de transmissão a qualquer título, na forma
do art. 65 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1934, nenhum imóvel rural
poderá ser desmembrado ou dividido em área de tamanho inferior ao quociente
da área total pelo número de módulos constantes do certificado de cadastro’.
Visa a lei extinguir o minifúndio, não, porém, ao esbulho de quem, antes dela,
adquiriu a terra, a possui, a lavra, como no caso do recorrente.
Não há, como se salientou, lugar para a transmissão da propriedade,
em ação divisória e demarcatória. Apenas se estrema e se separa o que a cada
condômino toca na coisa antes indivisa. E o direito do condômino de exigir a
divisão tem a expressão mais enérgica no Código, pois subsiste ‘a todo tempo’.
Assim, dou provimento ao recurso para que se prossiga no processo da
divisão e demarcação.” (grifei) (RE 66.409/RS, Rel. Min. Adaucto Cardoso,
Tribunal Pleno, j. 12.11.69, DJ 27.02.70)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 229

O julgado recebeu a seguinte ementa:


“ESTATUTO DA TERRA. MÓDULO. ÁREA MÍNIMA. AÇÃO DIVISÓRIA
E DEMARCATÓRIA. A proibição de desmembramento de imóvel em áreas de
tamanho inferior ao quociente da área total pelo número de módulos constantes
do certificado de cadastro só se aplica aos casos de transferência da propriedade
por ato entre vivos ou por direito hereditário, excluída a divisão do condomínio.
Aplicação dos arts. 65 da Lei nº 4.504, de 1964, e 11 do DL n° 57 de 1966.”
Por seu lado, e elaborando raciocínio a contrario sensu, a existência de imóvel
produtivo, mesmo que com área não correspondente ao módulo rural, tendo, na
verdade, área inferior a ele, justifica o afastamento da proibição de seu fracionamento.
Na mesma linha segue Francisco Eduardo Loureiro:
“No que se refere ao objeto, a gleba usucapiente deve situar-se em zona
rural, fora, portanto, do perímetro urbano, não bastando sua destinação rústica.
O limite máximo usucapível é de 50 ha. Não cabe ao usucapiente decotar posse
sobre gleba maior para obter a usucapião especial, pois tal conduta colheria de
surpresa o proprietário registrário. Durante todo o quinquênio deve a posse
estar limitada ao teto previsto pelo legislador.
Pode ocorrer de a gleba ser inferior ao módulo rural. Há divergência doutriná-
ria e jurisprudencial sobre o tema, mas, se a finalidade de tornar a gleba produtiva
for preenchida pelo possuidor, o melhor entendimento é admitir a usucapião, em
razão da natureza originária de aquisição (a favor: RJTJSP 209/266 e 247/75;
RT 681/602 e 693/133; contra: RT 652/65 e RJTJSP 133/148).” (grifei) (LOU-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


REIRO, Francisco Eduardo; PELUSO, Cezar [Coord.]. Código Civil comentado:
doutrina e jurisprudência. 7. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2013. p. 1.219)
De fato, importa à Lei nº 4.504/64 e principalmente à Constituição Federal e
ao Código Civil, que reproduz nos exatos termos o dispositivo constitucional que
disciplina a matéria, que o usucapiente demonstre que deu ao imóvel utilidade social,
que comprove que lavrou a terra, semeou-a, colheu o que ela produziu, que proveu
seu sustento com o produto da venda de seu trabalho na terra.
Não há dúvidas de que o legislador se inspirou no propósito de incentivar a
ocupação e a exploração de terras abandonadas, premiando o ocupante que as valo-
rizava por meio de seu trabalho, assim como na ideia de dar assistência ao homem
do campo, propiciando-lhe o domínio da terra que valorizou com seu esforço e suor.
Vale, ainda, para corroborar o entendimento exposto neste voto, a transcrição
de trecho da Exposição de Motivos do Projeto de Lei nº 26, de 1981, de autoria de
Aureliano Chaves, que deu origem à Lei nº 6.969/81.
“2. O estudo deste Projeto de Lei, versando matéria de Direito Civil, foi
determinado pelo Presidente João Figueiredo, a quem o problema fundiário,
tanto pelas tensões sociais que provoca quanto por sua causa visível, ligada aos
defeitos seculares do nosso sistema de distribuição de terra, vinha causando
preocupação crescente.
230 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

3. Aqueles defeitos, segundo entendo, remontam ao período das capitanias


hereditárias, e hoje demandam correção, em nome de uma ordem constitucional
que impõe ao Poder Público a valorização do trabalho e a garantia de que a
propriedade desempenhe função social (CF, art. 160, II e III).
(...)
7. Com o intuito de evitar compreensíveis delongas quanto à determinação do
módulo rural, que seria aplicável em cada caso, o projeto estabelece, como regra
geral, a área máxima usucapível de vinte hectares, ficando, porém, ressalvado para
o possuidor o direito de adquirir trecho de terra correspondente ao módulo rural, se
este exceder àquele limite.” (Mensagem 97, de 1981 – CN – nº 458/81, na origem)
5. A legislação mais moderna abraça o entendimento defendido até aqui.
De fato, recentes alterações realizadas nas Leis ns. 4.504/64, Estatuto da Ter-
ra, e 5.868/72, que cria o Sistema Nacional de Cadastro Rural, nos apontam que o
legislador ordinário pretende se ajustar aos objetivos almejados pela Constituição
Federal, no que se refere à política agrícola do país.
A alteração ocorreu em seu art. 65, que recebeu os §§ 5º e 6º, que excetuaram
a proibição constante do caput, referente aos parcelamentos de imóveis rurais em
dimensão inferior à do módulo.
“Art. 65. O imóvel rural não é divisível em áreas de dimensão inferior à
constitutiva do módulo de propriedade rural. (Regulamento)
(...)
§ 5º Não se aplica o disposto no caput deste artigo aos parcelamentos de
imóveis rurais em dimensão inferior à do módulo, fixada pelo órgão fundiário
federal, quando promovidos pelo Poder Público, em programas oficiais de apoio à
atividade agrícola familiar, cujos beneficiários sejam agricultores que não possuam
outro imóvel rural ou urbano. (Incluído pela Lei nº 11.446, de 2007)
§ 6º Nenhum imóvel rural adquirido na forma do § 5º deste artigo poderá
ser desmembrado ou dividido. (Incluído pela Lei nº 11.446, de 2007)”
No caso da Lei nº 5.868/72, a inovação ocorreu em seu art. 8º. Confira-se o
artigo primeiro:
“Art. 1º É instituído o Sistema Nacional de Cadastro Rural, que com-
preenderá:
I – Cadastro de Imóveis Rurais;
II – Cadastro de Proprietários e Detentores de Imóveis Rurais;
III – Cadastro de Arrendatários e Parceiros Rurais;
IV – Cadastro de Terras Públicas.
V – Cadastro Nacional de Florestas Públicas. (Incluído pela Lei nº 11.284,
de 2006)”
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 231

Mais adiante, em seu art. 8º, a Lei nº 5.868/72 regula o desmembramento e a


divisão do imóvel rural, para fins de transmissão:
“Art. 8º Para fins de transmissão, a qualquer título, na forma do art. 65
da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, nenhum imóvel rural poderá ser
desmembrado ou dividido em área de tamanho inferior à do módulo calculado
para o imóvel ou da fração mínima de parcelamento fixado no § 1º deste artigo,
prevalecendo a de menor área.”
É no § 4º do art. 8º que está a alteração realizada pela Lei nº 13.001, de 2014.
Confira-se:
“§ 4º O disposto neste artigo não se aplica: (Redação dada pela Lei nº
13.001, de 2014)
I – aos casos em que a alienação da área destine-se comprovadamente a
sua anexação ao prédio rústico, confrontante, desde que o imóvel do qual se
desmembre permaneça com área igual ou superior à fração mínima do parce-
lamento; (Incluído pela Lei nº 13.001, de 2014)
II – à emissão de concessão de direito real de uso ou título de domínio
em programas de regularização fundiária de interesse social em áreas rurais,
incluindo-se as situadas na Amazônia Legal; (Incluído pela Lei nº 13.001, de
2014)
III – aos imóveis rurais cujos proprietários sejam enquadrados como agri-
cultor familiar nos termos da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006; ou (Incluído
pela Lei nº 13.001, de 2014)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


IV – ���������������������������������������������������������������
ao imóvel rural que tenha sido incorporado à zona urbana do Mu-
nicípio. (Incluído pela Lei nº 13.001, de 2014)”
Interessa-nos, em especial, o inciso III: “imóveis rurais cujos proprietários
sejam enquadrados como agricultor familiar nos termos da Lei nº 11.326, de 24 de
julho de 2006”.
“A Lei nº 11.326/06 estabelece as diretrizes para a formulação da Política
Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais e a
definição apresentada por ela do que seja agricultor familiar descreve, ao que
parece, exatamente a situação que nos apresenta este recurso:
‘Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empre-
endedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo,
simultaneamente, aos seguintes requisitos:
I – não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos
fiscais;
II – utilize
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predominantemente mão-de-obra da própria família nas ati-
vidades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;
III – tenha renda familiar predominantemente originada de atividades
econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento;
232 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

III – tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades


econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida
pelo Poder Executivo; (Redação dada pela Lei nº 12.512, de 2011)
IV – dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.’”
Destarte, não há como negar que as recentes alterações legislativas apresenta-
das acima corroboram a intenção do legislador ordinário em se ajustar, de maneira
explícita, aos ditames da Constituição Federal, à necessidade de realização da função
social da propriedade rural, viabilizando o efetivo funcionamento dos institutos
criados para esse fim.
No mesmo ano em que editada a Lei nº 11.326/06, o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE, em cooperação com o Ministério do Desenvolvimento
Agrário, realizou o Censo Agropecuário de 2006, cujo objetivo era a reunião de infor-
mações oficiais capazes de apontar as potencialidades e as limitações da agricultura
familiar, para tornar as políticas públicas de desenvolvimento rural mais eficazes. A
pesquisa que se desenvolveu intencionou revelar o perfil da atividade agropecuária
brasileira e estabelecer os fundamentos da referida Lei nº 11.326/06.
O censo de 2006, cujos dados ainda não foram superados por novo levan-
tamento, revelaram a importância da atividade agrária familiar, responsável pelo
emprego do maior número de indivíduos no trabalho rural. Constatou-se que 74,4%
do pessoal ocupado desenvolvem suas atividades em propriedades rurais familiares.
Com base nos fundamentos apresentados, acredito que a questão sob análise
merece interpretação atualizada, permitindo-se, assim, afirmar a possibilidade de
usucapião de imóvel rural, nos moldes previstos na Constituição e no Código Civil,
de imóvel cuja área seja inferior ao módulo rural para a região.
É irrefutável que o principal objetivo da usucapião constitucional rural é viabi-
lizar, por meio da propriedade familiar, a sobrevivência do trabalhador rural baseada
na exploração da terra. O maior desafio do instituto e que faz dele seu objetivo é a
harmonização de valores igualmente relevantes: a função social da propriedade, a
subsistência familiar e o progresso econômico.
Por isso, penso que possibilitar a divisão do módulo rural em casos como o
que ora se apresenta vai ao encontro do espírito constitucional, contribuindo so-
bremaneira para a melhoria da qualidade de vida no campo, dando dignidade aos
trabalhadores. Permitir a usucapião de imóvel cuja área seja inferior ao módulo rural
da região é otimizar a distribuição de terras destinadas aos programas governamentais
para o apoio à atividade agrícola familiar.
A pequena propriedade rural é inseparável de sua função social, cujo objetivo
é garantir o sustento da família que naquele imóvel labuta, contribuindo para o
progresso e o bem-estar social.
6. Diante do exposto, novamente rogando a vênia devida para divergir do
eminente relator, dou provimento ao recurso especial para afirmar a inexistência de
impedimento para que imóvel rural, cuja área seja inferior ao módulo rural da região,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 233

possa ser objeto da usucapião prevista no art. 191 da CF/88, assim como no art. 1.239
do CC/02, cassando o acórdão e a sentença, permitindo regular instrução do feito.
É como voto.

VOTO-VISTA
Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo:
A discussão posta no presente recurso especial, analisado sob o prisma do
art. 1.239 do Código Civil de 2002, é bastante oportuna, pois não se têm muitos
precedentes nesta eg. Corte acerca do tema, que trata de aquisição originária de
propriedade, mediante a usucapião especial rural, prevista na Lei nº 6.969, de 10 de
dezembro de 1981, de imóvel com dimensões inferiores ao módulo rural.
O debate apresenta-se ainda mais valoroso e consistente, na medida em que
tal possibilidade aparenta estar em confronto com outras normas de lei federal que
impedem a divisão de imóvel rural em dimensões que possam inviabilizar a con-
cretização da função social da propriedade e aparentando conflito com institutos
jurídicos que concretizam a política agrária nacional de combate ao minifúndio.
O apelo nobre enfrenta v. acórdão estadual, confirmando sentença que enten-
deu pela impossibilidade jurídica do pedido posto na ação de usucapião especial,
uma vez que a área que se pretende usucapir é inferior àquela fixada como módulo
rural. Eis a ementa do julgado:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO
CÍVEL. USUCAPIÃO PRO LABORE. ÁREA INFERIOR AO MÓDULO RURAL.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1. Por força do art. 65 da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), é vedada
a divisão do imóvel rural em áreas inferiores ao módulo de propriedade rural,
ou seja, 30.000 m² (trinta, mil metros quadrados).
2. Logo, a usucapião não pode ocorrer em área inferior ao módulo de
propriedade rural. Nos termos dos precedentes do STJ, ‘caso se admitisse a
usucapião de tal área, estar-se-ia viabilizando, de forma direta, o registro de
área inferior àquela permitida pela lei daquele município. Há, portanto, vício
na própria relação jurídica que se pretende modificar com a aquisição definitiva
do imóvel’ (REsp 402.792/SP, Rel. Min. Jorge Scartezzi, DJ 06.12.04, p. 316).
3. Recurso desprovido.” (fl. 94)
O apelo nobre tem como relator o eminente Ministro Marco Buzzi, que, na
assentada de 19.11.2013, apresentou brilhante voto, no qual traz explanação sobre
a evolução legislativa e acerca da finalidade da usucapião especial, concluindo pelo
desprovimento do recurso, conforme motivação que pode ser assim sintetizada: a) as
normas insertas nos arts. 4º e 65 da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), 8º da Lei nº
5.868/72 e 1º, parágrafo único, da Lei nº 6.969/81 visam impedir a divisão de imóvel
rural com área inferior àquela considerada viável economicamente, ou seja, o mínimo
definido como “módulo rural” ou “fração mínima de parcelamento” (FMP); b) o
234 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

objetivo do módulo rural é estabelecer áreas de terras ideais para a perfeita e eficaz
exploração agropecuária pela família, visando coibir o fracionamento dos imóveis
em áreas inferiores àquela necessária para o desenvolvimento produtivo, evitando-
se, assim, a proliferação do minifúndio; c) embora os arts. 191 da Carta Magna e
1.239 do CC/02 não definam área mínima para que o imóvel rural seja passível de
usucapião, não se pode entender viável usucapir área inferior àquela definida como
“módulo rural” ou FMP, pois seria uma afronta aos já mencionados dispositivos
legais, à política agrária e à finalidade perseguida pelos princípios do direito agrário,
em especial o que preceitua a promoção do rurícola e o combate ao minifúndio; d)
possibilitar-se a usucapião no caso em comento, com área muito inferior à definida
como módulo rural, “(...) implicaria a subversão dos critérios técnicos e pressupostos
ideológicos que cumprem ser fixados pelos poderes constitucionalmente incumbidos
para tanto, os quais, legitima e eficazmente os estabeleceram, atentos à função social
do uso da terra e à viabilidade concreta da obtenção de meios para subsistência digna
da unidade familiar, ante a real possibilidade de exploração rural do imóvel garantir
meios efetivos de subsistência”; e e) a usucapião poderia ser utilizada para legalizar
o que a lei não permite, qual seja a divisão do imóvel em unidades inferiores ao
módulo rural ou FMP.
Em meio aos debates, pediu vista dos autos o nobre Ministro Luis Felipe Sa-
lomão. Na continuidade ao julgamento, na sessão de 21.10.2014, veio o voto-vista
inaugurando a divergência, dando provimento ao recurso especial. Após irretorquível
apanhado da evolução legislativa, o entendimento apresentado pode ser assim resu-
mido: a) a usucapião especial rural é instrumento que aperfeiçoa a política agrícola
estatal, cujo fundamento é a função social, recompensando o possuidor que dá à
gleba almejada função social; b) a usucapião especial rural “(...) é caracterizada pelo
elemento posse-trabalho. Serve a essa espécie tão somente a posse marcada pelo
trabalho. Para a concretização do direito ao domínio do imóvel rural, a exploração
econômica e racional da terra é pressuposto impossível de ser afastado, deixando
clara a intenção do legislador em prestigiar o possuidor que confere função social ao
imóvel rural”; c) os arts. 191 da Constituição Federal, 1.239 do Código Civil e a Lei
nº 6.969/81 estabelecem limites máximos da área passível da usucapião, o que leva
à conclusão de que, inexistindo “(...) regra que determine área mínima sobre a qual
deve o possuidor exercer sua posse para que seja possível a usucapião pro labore,
a conclusão natural será pela impossibilidade de o intérprete discriminar onde o
legislador não discriminou” (fl. 10); d) a interpretação teleológica dos arts. 4º, III,
e 65 do Estatuto da Terra leva à conclusão de que, “(...) se o imóvel sobre o qual se
exerce a posse trabalhada possui área capaz de gerar subsistência e progresso social
e econômico do agricultor e de sua família, mediante exploração direta e pessoal –
com a absorção de toda a força de trabalho, eventualmente com a ajuda de terceiros
–, parece menos relevante o fato de aquela área não coincidir com o módulo rural
da região ou ser até mesmo inferior”; e) “(...) possibilitar a divisão do módulo rural
em casos como o que ora se apresenta vai ao encontro do espírito constitucional,
contribuindo sobremaneira para a melhoria da qualidade de vida no campo, dando
dignidade aos trabalhadores. Permitir a usucapião de imóvel cuja área seja inferior ao
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 235

módulo rural da região é otimizar a distribuição de terras destinadas aos programas


governamentais para o apoio à atividade agrícola familiar”.
Na conclusão de seu voto, o em. Ministro Salomão posicionou-se pelo provi-
mento do recurso para, afirmando a inexistência de impedimento para que imóvel
com dimensão inferior ao módulo rural possa ser objeto de usucapião, cassar o v.
acórdão e a sentença, determinando o regular trâmite da ação de usucapião especial.
Naquela ocasião, pedi vista dos autos para um exame mais próximo da con-
trovérsia.
Visando facilitar o exame do caso, transcrevem-se adiante os principais dispo-
sitivos normativos regentes da matéria:
a) Constituição Federal:
“Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano,
possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra,
em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu
trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usuca-
pião.”
b) Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra):
“Art. 1º Esta Lei regula os direitos e obrigações concernentes aos bens imó-
veis rurais, para os fins de execução da Reforma Agrária e promoção da Política
Agrícola.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


§ 1º Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a
promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de
sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento
de produtividade.
§ 2º Entende-se por Política Agrícola o conjunto de providências de
amparo à propriedade da terra, que se destinem a orientar, no interesse da
economia rural, as atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o
pleno emprego, seja no de harmonizá-las com o processo de industrialização
do país.”
“Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se:
I – ‘Imóvel Rural’, o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja
a sua localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou
agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através
de iniciativa privada;
II – ‘Propriedade Familiar’, o imóvel rural que, direta e pessoalmente
explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho,
garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área
máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho
com a ajuda de terceiros;
236 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

III – ‘Módulo Rural’, a área fixada nos termos do inciso anterior;


IV – ‘Minifúndio’, o imóvel rural de área e possibilidades inferiores às da
propriedade familiar;
V – ‘Latifúndio’, o imóvel rural que:
a) exceda a dimensão máxima fixada na forma do art. 46, § 1º, alínea b,
desta Lei, tendo-se em vista as condições ecológicas, sistemas agrícolas regio-
nais e o fim a que se destine;
b) não excedendo o limite referido na alínea anterior, e tendo área igual
ou superior à dimensão do módulo de propriedade rural, seja mantido inex-
plorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais do meio,
com fins especulativos, ou seja deficiente ou inadequadamente explorado, de
modo a vedar-lhe a inclusão no conceito de empresa rural;
VI – ‘Empresa Rural’ é o empreendimento de pessoa física ou jurídica,
pública ou privada, que explore econômica e racionalmente imóvel rural, dentro
de condição de rendimento econômico ...Vetado... da região em que se situe
e que explore área mínima agricultável do imóvel segundo padrões fixados,
pública e previamente, pelo Poder Executivo. Para esse fim, equiparam-se às
áreas cultivadas, as pastagens, as matas naturais e artificiais e as áreas ocupadas
com benfeitorias;
VII – ‘Parceleiro’, aquele que venha a adquirir lotes ou parcelas em área
destinada à Reforma Agrária ou à colonização pública ou privada;
VIII – ‘Cooperativa Integral de Reforma Agrária (C.I.RA.)’, toda sociedade
cooperativa mista, de natureza civil,...Vetado... criada nas áreas prioritárias de
Reforma Agrária, contando temporariamente com a contribuição financeira e
técnica do Poder Público, através do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária,
com a finalidade de industrializar, beneficiar, preparar e padronizar a produção
agropecuária, bem como realizar os demais objetivos previstos na legislação
vigente;
IX – ‘Colonização’, toda a atividade oficial ou particular, que se destine a
promover o aproveitamento econômico da terra, pela sua divisão em propriedade
familiar ou através de Cooperativas ...Vetado...
Parágrafo único. Não se considera latifúndio:
a) o imóvel rural, qualquer que seja a sua dimensão, cujas características
recomendem, sob o ponto de vista técnico e econômico, a exploração florestal
racionalmente realizada, mediante planejamento adequado;
b) o imóvel rural, ainda que de domínio particular, cujo objeto de preser-
vação florestal ou de outros recursos naturais haja sido reconhecido para fins
de tombamento, pelo órgão competente da administração pública.”
“��������������������������������������������������������������������
Art. 5º A dimensão da área dos módulos de propriedade rural será fi-
xada para cada zona de características econômicas e ecológicas homogêneas,
distintamente, por tipos de exploração rural que nela possam ocorrer.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 237

Parágrafo único. No caso de exploração mista, o módulo será fixado


pela média ponderada das partes do imóvel destinadas a cada um dos tipos de
exploração considerados.”
“Art. 13. O Poder Público promoverá a gradativa extinção das formas de
ocupação e de exploração da terra que contrariem sua função social.”
“Art. 65. O imóvel rural não é divisível em áreas de dimensão inferior à
constitutiva do módulo de propriedade rural. (Regulamento)
§ 1º Em caso de sucessão causa mortis e nas partilhas judiciais ou amigáveis,
não se poderão dividir imóveis em áreas inferiores às da dimensão do módulo de
propriedade rural.
§ 2º Os herdeiros ou os legatários, que adquirirem por sucessão o domínio
de imóveis rurais, não poderão dividi-los em outros de dimensão inferior ao
módulo de propriedade rural.
§ 3º No caso de um ou mais herdeiros ou legatários desejar explorar as
terras assim havidas, o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária poderá prover
no sentido de o requerente ou requerentes obterem financiamentos que lhes
facultem o numerário para indenizar os demais condóminos.
§ 4º O financiamento referido no parágrafo anterior só poderá ser con-
cedido mediante prova de que o requerente não possui recursos para adquirir
o respectivo lote.
§ 5º Não se aplica o disposto no caput deste artigo aos parcelamentos de
imóveis rurais em dimensão inferior à do módulo, fixada pelo órgão fundiário

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


federal, quando promovidos pelo Poder Público, em programas oficiais de apoio à
atividade agrícola familiar, cujos beneficiários sejam agricultores que não possuam
outro imóvel rural ou urbano. (Incluído pela Lei nº 11.446, de 2007).
§ 6º Nenhum imóvel rural adquirido na forma do § 5º deste artigo poderá
ser desmembrado ou dividido. (Incluído pela Lei nº 11.446, de 2007).”
“Art. 98. Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano, ocu-
par por dez anos ininterruptos, sem oposição nem reconhecimento de domínio
alheio, tornando-o produtivo por seu trabalho, e tendo nele sua morada, trecho
de terra com área caracterizada como suficiente para, por seu cultivo direto
pelo lavrador e sua família, garantir-lhes a subsistência, o progresso social e
econômico, nas dimensões fixadas por esta Lei, para o módulo de propriedade,
adquirir-lhe-á o domínio, mediante sentença declaratória devidamente transcrita.”
c) Lei nº 5.868/72:
“Art. 8º Para fins de transmissão, a qualquer título, na forma do Art. 65
da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, nenhum imóvel rural poderá ser
desmembrado ou dividido em área de tamanho inferior à do módulo calculado
para o imóvel ou da fração mínima de parcelamento fixado no § 1º deste artigo,
prevalecendo a de menor área.
§ 1º A fração mínima de parcelamento será:
238 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

a) o módulo correspondente à exploração hortigranjeira das respectivas


zonas típicas, para os Municípios das capitais dos Estados;
b) o módulo correspondente às culturas permanentes para os demais
Municípios situados nas zonas típicas A, B e C;
c) o módulo correspondente à pecuária para os demais Municípios situ-
ados na zona típica D.
§ 2º Em Instrução Especial aprovada pelo Ministro da Agricultura, o
INCRA poderá estender a outros Municípios, no todo ou em parte, cujas
condições demográficas e sócio-econômicas o aconselhem, a fração mínima
de parcelamento prevista para as capitais dos Estados.
§ 3º São considerados nulos e de nenhum efeito quaisquer atos que
infrinjam o disposto no presente artigo, não podendo os Cartórios de Notas
lavrar escrituras dessas áreas nem serem tais atos transcritos nos Cartórios de
Registro de Imóveis, sob pena de responsabilidade de seus respectivos titulares.
§ 3º São considerados nulos e de nenhum efeito quaisquer atos que
infrinjam o disposto neste artigo não podendo os serviços notariais lavrar
escrituras dessas áreas, nem ser tais atos registrados nos Registros de Imóveis,
sob pena de responsabilidade administrativa, civil e criminal de seus titulares
ou prepostos. (Redação dada pela Lei nº 10.267, de 28.8.2001)
§ 4º O disposto neste artigo não se aplica aos casos em que a alienação da
área se destine comprovadamente a sua anexação ao prédio rústico, confron-
tante, desde que o imóvel do qual se desmembre permaneça com área igual
ou superior à fração mínima do parcelamento.
§ 4º O disposto neste artigo não se aplica: (Redação dada pela Lei nº
13.001, de 2014)
I – aos casos em que a alienação da área destine-se comprovadamente a
sua anexação ao prédio rústico, confrontante, desde que o imóvel do qual se
desmembre permaneça com área igual ou superior à fração mínima do parce-
lamento; (Incluído pela Lei nº 13.001, de 2014)
II – à emissão de concessão de direito real de uso ou título de domínio
em programas de regularização fundiária de interesse social em áreas rurais,
incluindo-se as situadas na Amazônia Legal; (Incluído pela Lei nº 13.001, de
2014)
III – aos imóveis rurais cujos proprietários sejam enquadrados como
agricultor familiar nos termos da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006; ou
(incluído pela Lei nº 13.001, de 2014)
IV – ���������������������������������������������������������������
ao imóvel rural que tenha sido incorporado à zona urbana do Mu-
nicípio. (Incluído pela Lei nº 13.001, de 2014)
§ 5º O disposto neste artigo aplica-se também às transações celebradas
até esta data e ainda não registradas em Cartório, desde que se enquadrem nas
condições e requisitos ora estabelecidos.”
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 239

d) Lei nº 6.969/81:
“Art. 1º Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano, possuir
como sua, por 5 (cinco) anos ininterruptos, sem oposição, área rural contínua,
não excedente de 25 (vinte e cinco) hectares, e a houver tornado produtiva com
seu trabalho e nela tiver sua morada, adquirir-lhe-á o domínio, independente-
mente de justo título e boa-fé, podendo requerer ao juiz que assim o declare
por sentença, a qual servirá de título para transcrição no Registro de Imóveis.
Parágrafo único. Prevalecerá a área do módulo rural aplicável à espécie, na
forma da legislação específica, se aquele for superior a 25 (vinte e cinco) hectares.”
e) Código Civil/02:
“Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou
urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área
de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva
por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a
propriedade.”
Como se verifica na legislação transcrita, inexiste vedação à usucapião de
imóvel rural de área inferior ao módulo rural. A regra do art. 65 do Estatuto da Ter-
ra, apontada como impeditiva, está situada na Seção II do Capítulo II daquela Lei,
tratando da colonização (colonização oficial, colonização particular e organização da
colonização). Do mesmo modo, o art. 8º da Lei nº 5.868/72 refere-se à transmissão
para fins de colonização. Então, para fins de colonização, definida na Lei nº 4.504
como “toda a atividade oficial ou particular, que se destine a promover o aproveita-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


mento econômico da terra, pela sua divisão em propriedade familiar ou através de
Cooperativas”, é que se estabelece a proibição de divisão do imóvel rural em área
de dimensão inferior à do módulo rural, mas não para fins de usucapião pro labore.
Quanto ao usucapião pro labore, convivem as regras dos arts. 98 do Estatuto da
Terra, 1º da Lei nº 6.969/81, 191 da Constituição Federal e 1.239 do Código Civil
de 2002, sendo que apenas a norma do Estatuto refere-se à área mínima; os demais
dispositivos nenhuma exigência de dimensão mínima impõem para a usucapião, ao
invés, referem-se apenas à área máxima do imóvel.
Convém lembrar que a ação de usucapião não promove a vedada divisão de
terras, mas, sim, a regularização da situação fática de um imóvel já preexistente, para
efeito de reconhecimento de aquisição de propriedade e de formalização de registro
imobiliário. Tem esse instituto notória função social, contribuindo para prestigiar a
segurança jurídica, dando respaldo jurídico a uma situação fática existente.
Com efeito, no caso dos autos, os ora recorrentes alegam que na área que pre-
tendem usucapir construíram sua moradia (casa de alvenaria), plantam verduras e
hortaliças e, ainda, possuem um barracão para produção de caixas de madeira para
transporte de verduras e hortaliças, o que leva a crer que a função social relativa ao
imóvel esteja sendo alcançada, cabendo, pois, à instância ordinária o exame dessa
temática. No entanto, no caso em apreço, nem sequer se examinou tal questão, uma
vez que foi reconhecida a impossibilidade jurídica do pedido.
240 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Nesse contexto, com a devida vênia, o fato de a área ser inferior àquela definida
como módulo rural, por si só, não pode levar ao reconhecimento da impossibilidade
jurídica do pedido, como o fez o v. acórdão estadual, com supedâneo no art. 65 da
Lei nº 4.504/64, sob pena de infringir-se as demais normas invocadas, que, repita-se,
não estabelecem área mínima.
Com essas considerações, rogando vênia ao ilustrado Relator, acompanho a
divergência inaugurada no voto-vista do nobre Ministro Luis Felipe Salomão.
É como voto.

VOTO
Ministra Maria Isabel Gallotti: Senhor Presidente, peço vênia à divergência
iniciada pelo Ministro Luis Felipe Salomão, à qual aderiu V. Exa., mas entendo que
o voto do Relator apreciou com acuidade a interpretação dos diversos dispositivos
de lei ordinária e da Constituição, e que, em se tratando de uma usucapião especial
no prazo de cinco anos, cujo objetivo é a função social da propriedade, presume-se
que essa função social deverá ser realizada no módulo mínimo rural.
A usucapião é instituto que tem em mira não a manutenção da posse simples-
mente, mas é um modo de aquisição originário de propriedade e, assim sendo, como
modo de aquisição de propriedade, não pode prescindir da característica inerente ao
instituto da propriedade, que é o registro imobiliário da área. E, no caso, o Relator
enfatizou que a área é muito menor do que o módulo rural, não é apenas uma pe-
quena diferença, mas uma área bastante inferior ao módulo rural. Se admitirmos a
usucapião de áreas tão pequenas, com impossibilidade de formalização da aquisição
da propriedade por meio do registro imobiliário, que é o instrumento necessário
para que haja domínio, atingir-se-á uma consequência que é exatamente aquela que
o sistema legal procura inibir: o fracionamento da terra em áreas que são incompa-
tíveis com a função social da propriedade, ou seja, tentando alcançar um benefício
para alguns indivíduos se chega a um resultado socialmente nocivo de praticamente
acabar com o módulo rural, com a fração mínima de divisão da propriedade que o
sistema legal concebeu para cada região.
Portanto, peço vênia à divergência e acompanho o voto do Relator.

VOTO-VISTA
O Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira: na origem, Waldevino Fehlberg
e sua companheira, Maria Antonia de Araújo, ajuizaram ação de usucapião especial
visando declarar a propriedade do bem imóvel descrito na petição inicial, situado em
área rural do Município de Itaguaçu/ES, afirmando o preenchimento dos requisitos
previstos no art. 1º da Lei nº 6.969/81 (e-STJ, fls. 4/7).
Antes mesmo da citação dos réus, o magistrado de primeiro grau, concluindo
pela impossibilidade jurídica do pedido deduzido pelos autores – porque a área
usucapienda, cuja extensão é inferior ao módulo rural, não poderia ser desmembrada,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 241

ex vi do preceito contido no art. 65 da Lei n º4.504/64 –, extinguiu o processo sem a


resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do CPC (e-STJ, fls. 45/46).
Inconformados, interpuseram os autores recurso de apelação (e-STJ, fls. 49/57),
defendendo a prevalência das disposições dos arts. 191 da CF/88 e 1.239 do Código
Civil de 2002, que preveem os requisitos para a aquisição de propriedade de bem
imóvel rural por meio da usucapião especial. Aduziram que, por se tratar de modo
originário de aquisição da propriedade, não se lhe aplica a restrição legal invocada
pelo magistrado singular.
No TJES o recurso foi julgado por decisão monocrática do relator, que, in-
vocando precedente deste Tribunal Superior (REsp 402.792/SP, Rel. Min. Jorge
Scartezzini, Quarta Turma, j. 26.10.04, DJ 06.12.04), negou-lhe provimento. Na
oportunidade, manifestou entendimento de que a hipótese não qualificaria carência
de ação, reformando a sentença em parte para avançar sobre o mérito da causa e
julgar improcedente o pedido desde logo, na forma prevista pelo art. 285-A do CPC
(e-STJ, fls. 67/70).
A decisão foi desafiada por agravo interno (e-STJ, fls. 81/86), igualmente impro-
vido. O correspondente acórdão veio aos autos assim ementado (e-STJ, fls. 94/101):
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO
CÍVEL. USUCAPIÃO PRO LABORE. ÁREA INFERIOR AO MÓDULO RURAL.
IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1. Por força do art. 65 da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), é vedada
a divisão do imóvel rural em áreas inferiores ao módulo de propriedade rural,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


ou seja, 30.000 m2 (trinta mil metros quadrados).
2. Logo, a usucapiação não pode ocorrer em área inferior ao módulo de
propriedade rural. Nos termos dos precedentes do STJ, ‘caso se admitisse o
usucapião de tal área, estar-se-ia viabilizando, de forma direta, o registro de
área inferior àquela permitida pela lei daquele município. Há, portanto, vício na
própria relação jurídica que se pretende modificar com a aquisição definitiva do
imóvel’ (REsp 402.792/SP, Rel. Ministro Jorge Scartezzini, DJ 06.12.04, p. 316).
3. Recurso desprovido.”
Contra o decisum, os recorrentes interpuseram recurso especial, na forma pre-
vista pelo art. 105, III, a e c, da CF/88, afirmando violação do art. 1.239 do CC/02
(e-STJ, fls. 105/107).
O apelo recebeu juízo positivo de admissibilidade na origem (e-STJ, fls.
130/131) e, neste Tribunal, foi distribuído para a relatoria do em. Ministro Marco
Buzzi. Eis um breve resumo do autuado. Reporto-me, quanto ao mais, aos relatórios
gravados pelos Ministros que me antecederam neste julgamento.
O em. Relator, em voto que apresentou na sessão de 19.11.2013, conheceu
parcialmente do recurso e, na parte conhecida, negou-lhe provimento. Ponderou s.
excelência que a vedação contida no Estatuto da Terra tem por finalidade “evitar o
fracionamento de imóveis agrários em áreas diminutas, incapazes de proporcionar
242 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

a subsistência do agricultor e da sua família, bem assim o progresso econômico da


propriedade rural”, ressaltando a preocupação de que o deferimento da usucapião na
hipótese tratada nestes autos pode viabilizar a prática de fraude à norma legal cogente.
O em. Ministro Luis Felipe Salomão, em voto-vista oferecido na sessão de
23.10.2014, divergiu do Relator. Entendeu juridicamente possível a usucapião es-
pecial na espécie, dando provimento ao recurso especial para “afirmar a inexistência
de impedimento para que imóvel rural, cuja área seja inferior ao módulo rural da
região, possa ser objeto da usucapião prevista no art. 191 da CF/88, assim como
no art. 1.239 do CC/02, cassando o acórdão e a sentença, permitindo a regular
instrução do feito”.
Seguiu-se voto-vista proferido pelo em. Ministro Raul Araújo, em sessão de
14/4 p., que aderiu à divergência. Na oportunidade, a em. Ministra Maria Isabel
Gallotti acompanhou o voto do Ministro-Relator.
Ante a riqueza dos debates e a profundidade dos votos dos eminentes pares,
pedi vista dos autos.
Passo ao exame do recurso.
De início, entendo que a indicação da alínea c do permissivo constitucional na
peça de interposição do recurso deriva de mero equívoco dos recorrentes, colhendo-
se das razões recursais que nem sequer aventaram suscitar dissídio jurisprudencial
para o exame de seu apelo. Não conheço do recurso no ponto.
No mais, entendo que a irresignação colhe frutos, aderindo à solução adotada
pelo em. Ministro Luis Felipe Salomão.
Deveras, não se revela impossível – como afirmou o magistrado de primeiro grau
–, tampouco de flagrante improcedência – segundo o julgamento do TJES –, o pedido
de usucapião ajuizada pelos recorrentes no intuito de ver declarada a aquisição da
propriedade do bem imóvel descrito na peça inicial.
Isso porque a vedação legal da divisão do imóvel em área inferior ao módulo
rural não é por si só apta a obstar o exercício de direito previsto em legislação que
não encampa a restrição, posterior ao Estatuto da Terra. Em tais circunstâncias, a
possível incompatibilidade da regra restritiva em face da legislação mais recente (e
especial, afirmo desde logo) deve ser resolvida em favor desta, a teor do que disci-
plina o art. 2º, § 1º, segunda parte, da LINDB.
A propósito dessa ilação, cabe ponderar que o Estatuto da Terra, em seu art.
98, disciplinava o instituto da usucapião especial com alusão expressa ao módulo de
propriedade, fixando-o como a dimensão do “trecho de terra com área caracterizada
como suficiente para, por seu cultivo direto pelo lavrador e sua família (...)”. A Lei nº
6.969/81, por sua vez, igualmente referiu-se ao módulo rural, permitindo ampliar o
limite máximo da área do imóvel usucapiendo na hipótese em que este fosse inferior
àquele. Nenhuma referência, todavia, consta da regra atual (art. 1.239 do CC/02),
revelando o intento do legislador em desprestigiá-la para fins de usucapião, ante o
comando irrefutável do art. 191 da Lei Fundamental. Confira-se:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 243

Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra):


“Art. 98. Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano,
ocupar por dez anos ininterruptos, sem oposição nem reconhecimento de
domínio alheio, tornando-o produtivo por seu trabalho, e tendo nele sua
morada, trecho de terra com área caracterizada como suficiente para, por
seu cultivo direto pelo lavrador e sua família, garantir-lhes a subsistência, o
progresso social e econômico, nas dimensões fixadas por esta Lei, para o mó-
dulo de propriedade, adquirir-lhe-á o domínio, mediante sentença declaratória
devidamente transcrita.”
Lei nº 6.969/81:
“Art. 1º Todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano,
possuir como sua, por 5 (cinco) anos ininterruptos, sem oposição, área rural
contínua, não excedente de 25 (vinte e cinco) hectares, e a houver tornado
produtiva com seu trabalho e nela tiver sua morada, adquirir-lhe-á o domí-
nio, independentemente de justo título e boa-fé, podendo requerer ao juiz
que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para transcrição no
Registro de Imóveis.
Parágrafo único. Prevalecerá a área do módulo rural aplicável à espécie, na
forma da legislação específica, se aquele for superior a 25 (vinte e cinco) hectares.”
Lei nº 10.406/02 (Código Civil):
“Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou ur-
bano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva
por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a
propriedade.”
Ressalto que a vedação prevista no art. 8º da Lei nº 5.868/72, a par de se re-
velar anterior ao Código Civil vigente, diz respeito exclusivamente às hipóteses de
“transmissão” do imóvel rural, ou seja, meio de aquisição derivada, com o qual não
se identifica a usucapião. Nesse sentido:
“DIREITO DAS COISAS. RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO. IMÓVEL
OBJETO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. INSTRUMENTO QUE
ATENDE AO REQUISITO DE JUSTO TÍTULO E INDUZ A BOA-FÉ DO AD-
QUIRENTE. EXECUÇÕES HIPOTECÁRIAS AJUIZADAS PELO CREDOR
EM FACE DO ANTIGO PROPRIETÁRIO. INEXISTÊNCIA DE RESISTÊNCIA
À POSSE DO AUTOR USUCAPIENTE. HIPOTECA CONSTITUÍDA PELO
VENDEDOR EM GARANTIA DO FINANCIAMENTO DA OBRA. NÃO PRE-
VALÊNCIA DIANTE DA AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DA PROPRIEDADE.
INCIDÊNCIA, ADEMAIS, DA SÚMULA Nº 308.
(...)
4. A declaração de usucapião é forma de aquisição originária da proprie-
dade ou de outros direitos reais, modo que se opõe à aquisição derivada, a qual
244 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

se opera mediante a sucessão da propriedade, seja de forma singular, seja de


forma universal. Vale dizer que, na usucapião, a propriedade não é adquirida
do anterior proprietário, mas, em boa verdade, contra ele. A propriedade é
absolutamente nova e não nasce da antiga. É adquirida a partir da objetiva
situação de fato consubstanciada na posse ad usucapionem pelo interregno
temporal exigido por lei. Aliás, é até mesmo desimportante que existisse antigo
proprietário.
5. Os direitos reais de garantia não subsistem se desaparecer o ‘direito
principal’ que lhe dá suporte, como no caso de perecimento da propriedade
por qualquer motivo. Com a usucapião, a propriedade anterior, gravada pela
hipoteca, extingue-se e dá lugar a uma outra, ab novo, que não decorre da
antiga, porquanto não há transferência de direitos, mas aquisição originária.
Se a própria propriedade anterior se extingue, dando lugar a uma nova, origi-
nária, tudo o que gravava a antiga propriedade – e lhe era acessório – também
se extinguira.
6. Assim, com a declaração de aquisição de domínio por usucapião, deve
desaparecer o gravame real hipotecário constituído pelo antigo proprietário,
antes ou depois do início da posse ad usucapionem, seja porque a sentença
apenas declara a usucapião com efeitos ex tunc, seja porque a usucapião é
forma originária de aquisição de propriedade, não decorrente da antiga e não
guardando com ela relação de continuidade.
7. Ademais, ‘a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro,
anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem
eficácia perante os adquirentes do imóvel’ (Súmula nº 308).
8. Recurso especial conhecido e provido.” (REsp 941.464/SC, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 24.04.2012, DJe 29.06.2012)
Se não bastasse, o entendimento gravado no acórdão recorrido resulta em
indevida limitação ao exercício de direito previsto na Constituição Federal, o que
é suficiente para afastá-lo, a meu ver, com a devida vênia dos que manifestaram
entendimento no mesmo sentido.
Com efeito, o constituinte não autorizou nenhuma espécie de contenção ao
comando do art. 191 da CF/88, que, ademais, dispensa regulamentação ulterior,
revelando preceito constitucional de eficácia plena, na esteira da lição sempre atual
de José Afonso da Silva, invocando doutrina de Ruy Barbosa:
“Na verdade, não nos parece possível estabelecer um critério único e
seguro para distinguir as normas constitucionais de eficácia plena das demais.
Mas poder-se-ão fixar regras gerais sobre o assunto, no que as conclusões da
clássica doutrina norte-americana sobre ele podem oferecer, ainda, contribui-
ção valiosa. Segundo essa doutrina, uma norma constitucional é autoaplicável
(corresponde, mutatis mutandis, às de eficácia plena) ‘quando, completa no que
determina, lhe é supérfluo o auxílio supletivo da lei, para exprimir tudo o que in-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 245

tenta e realizar tudo o que exprime’.” (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das
normas constitucionais. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 97)
Nesse sentido, o col. Supremo Tribunal Federal – STF, em recente julgamento
para o qual se reconheceu repercussão geral da matéria jurídica debatida, por demais
assemelhada à discussão presente (contudo versando sobre usucapião de imóvel
urbano), assentou o entendimento de que “preenchidos os requisitos do art. 183 da
Constituição Federal, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana não
pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos
na respectiva área em que situado o imóvel (dimensão do lote)”. Trata-se do RE
422.349/RS, relatado pelo em. Ministro Dias Tóffoli, julgado em 29/4 p. (resultado
de julgamento publicado no último dia 25/5).
Extraem-se do voto proferido pelo em. Relator (ainda pendente de publicação,
todavia divulgado no sítio da Corte Suprema na rede mundial de computadores
– Internet, com acesso em: <http://www.stf.jus. br/arquivo/cms/noticianoticiastf/
anexo/re_ 422349.pdf��������������������������������������������������������
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usucapiao.pdf.>) oportunas
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considerações acerca da im-
possibilidade de conferir limitação ao dispositivo constitucional que trata desse
meio de aquisição da propriedade. Citando doutrina abalizada, assim ponderou o
em. Ministro-Relator:
“(...) a eventual irregularidade do loteamento em que localizado o imóvel
objeto da usucapião ou a desconformidade de sua metragem com normas e
posturas municipais que disciplinam os módulos urbanos em sua respectiva
área territorial não podem obstar a implementação de direito constitucional-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


mente assegurado a quem preencher os requisitos para tanto exigidos pela
Carta da República; até porque – ressalte-se – trata-se de modo originário de
aquisição da propriedade. Há que se destacar, ainda, a existência de firmes
posicionamentos doutrinários a corroborar a conclusão a que aqui se chegou.
Representativo desse entendimento doutrinário, é o seguinte excerto da
magistral obra Tratado de Usucapião, v. I, Saraiva, 2008, de autoria do eminente
jurista Benedito Silvério Ribeiro: ‘cabe ressaltar que a função social da proprie-
dade pode levar a contornar requisitos urbanísticos e mesmo do plano diretor
da cidade, sem o rigor inerente ao parcelamento do solo’ (p. 942).
Discorrendo sobre a norma do referido artigo e posicionando-se contra
a fixação, por lei municipal, de limite mínimo para esse tipo de usucapião,
disserta o aludido autor, em ensinamento aplicável também para a hipótese
inversa, que é a retratada nestes autos, que ‘não se trata de atropelar preceito
sobre postura municipal, de vez que à norma constitucional deve-se atribuir
máxima eficácia, cediço também que é competente a União para legislar nesse
particular, conforme o inciso I do art. 22 da CF’ (op. cit., p. 945).”
Na parte final de seu voto, o douto julgador invoca os ensinamentos de Celso
Bastos – ainda mais específicos para o trato da questão sob o enfoque da legislação rural
– e conclui, repelindo a interpretação de que a lei infraconstitucional que prevê a
dimensão mínima do imóvel, seja ele urbano ou rural, possa inviabilizar a aquisição
246 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

da propriedade por intermédio da usucapião especial, prevista na Constituição da


República:
“Aponta o saudoso professor Celso Bastos, em sua obra Comentários à
Constituição do Brasil (Saraiva, 1990. v. 7. p. 347) – a despeito de ter tratado de
usucapião constitucional rural, pois a tese é plenamente aplicável à hipótese
dos autos –, que áreas inferiores ao tamanho fixado na norma constitucional
também podem ser objeto desse tipo de usucapião, refutando a aplicação ao
caso da legislação referente a módulos, na medida em que ‘es[s]es têm em mira
o desdobramento comum da propriedade, mas no nosso entender não podem
funcionar como obstáculo para que um instituto constitucional atinja o seu
desiderato. São, portanto, usucapíveis mesmo as áreas de proporções inferiores
ao módulo rural da região’.
Nessa conformidade, a decisão recorrida, por negar vigência ao comando
exarado na norma do art. 183 da Constituição Federal, não pode subsistir,
devendo ser reformada, de modo que se acolha o pedido formulado pelos
recorrentes. Por derradeiro, dada a relevância da questão do ponto de vista
social e jurídico, proponho o reconhecimento da repercussão geral do tema,
com a aprovação da seguinte tese: preenchidos os requisitos do art. 183 da
Constituição Federal, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana
não pode ser obstado por norma municipal que estabeleça módulos urbanos
na respectiva área, nem pela existência de irregularidades no loteamento em
que situado o imóvel.”
Finalmente, no escopo de reforçar a tese encampada neste voto, registro o en-
tendimento de que o mero fato da indivisibilidade do imóvel, na forma prevista pelo
art. 65 da Lei nº 4.504/64, não obsta a aquisição da propriedade da parcela ocupada
pelos recorrentes, que deve ser declarada, ainda que disso resulte a constituição de
um condomínio. No ponto, valho-me de precedentes desta Casa em que tal solução
foi albergada, direta ou indiretamente:
“DIREITO CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA DE ANULAÇÃO DE ESCRITURA
DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RURAL CUMULADA COM DEPÓSITO
DO PREÇO E ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. CC, ART. 1.139. DEPÓSITO
CONSIDERADO INSUFICIENTE, PORQUE NÃO CORRIGIDO. IMPROCE-
DÊNCIA DA PRETENSÃO ADJUDICATÓRIA. PRECEDENTES DA TURMA.
IMPOSSIBILIDADE DE ÊXITO DA PRETENSÃO ANULATÓRIA. INTERDE-
PENDÊNCIA ENTRE OS PEDIDOS. RECURSO PROVIDO.
(...)
III – A proibição de divisão e desmembramento dos terrenos rurais, de sorte a
resultar metragem inferior ao módulo mínimo, não importa na sua inalienabilidade,
uma vez que poderão ser eles havidos em condomínio, permanecendo indivisos.
(...).” (REsp 174.080/BA, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta
Turma, j. 26.10.99, DJ 13.12.99, p. 153)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 247

“CIVIL. DIVISÃO DE COISA COMUM. MÓDULO RURAL. Seja por


ato inter vivos, seja por ato causa mortis, o desmembramento do imóvel deve
respeitar o módulo rural. Hipótese, todavia, em que é possível extinguir, em
parte, o condomínio, que passa a subsistir apenas em relação aos proprietários
de áreas que, isoladamente, são menores do que o módulo rural. Precedente (REsp
16.851-0, MG).” (REsp 36.713/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, Terceira Turma, j.
23.08.99, DJ 27.09.99, p. 93)
“EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO. MÓDULO (ART. 65 DA LEI Nº 4.504,
DE 30.11.64). DIVISIBILIDADE. É DIVISÍVEL O IMÓVEL RURAL, SE, DE
UM LADO, O QUINHÃO PERTENCENTE AOS AUTORES É SUPERIOR AO
MÓDULO REGIONAL E SE, DE OUTRO, TAMBÉM O SÃO OS QUINHÕES
SOMADOS DOS RÉUS, PERMANECENDO ESTES EM COMUNHÃO. RECURSO
ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.” (REsp 16.851/MG, Rel. Min. Barros
Monteiro, Quarta Turma, j. 08.09.92, DJ 03.11.92, p. 19.768)
Veja-se, a propósito, que a lei admite essa possibilidade quando dispõe acerca
da transmissão hereditária do imóvel, vedando, nessa hipótese, a divisão do bem
pelos herdeiros em dimensão inferior ao módulo, referindo tratar-se de condomínio:
Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra):
“Art. 65. O imóvel rural não é divisível em áreas de dimensão inferior à
constitutiva do módulo de propriedade rural. (Regulamento)
§ 1º Em caso de sucessão causa mortis e nas partilhas judiciais ou ami-
gáveis, não se poderão dividir imóveis em áreas inferiores às da dimensão do

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


módulo de propriedade rural.
§ 2º Os herdeiros ou os legatários, que adquirirem por sucessão o domínio
de imóveis rurais, não poderão dividi-los em outros de dimensão inferior ao
módulo de propriedade rural.
§ 3º No caso de um ou mais herdeiros ou legatários desejar explorar as
terras assim havidas, o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária poderá prover
no sentido de o requerente ou requerentes obterem financiamentos que lhes
facultem o numerário para indenizar os demais condôminos.”
Assim, inadequado afirmar, como fizeram as instâncias ordinárias, a impossi-
bilidade jurídica do pedido, cabendo aqui o registro de que o julgamento proferido
pelo TJES, no ponto em que modifica o comando da decisão, julgando o mérito da
demanda, importa em reformatio in pejus, afigurando-se nula nesse particular.
Ante o exposto, rogando vênia ao em. Ministro-Relator, acompanho a di-
vergência e dou provimento ao recurso especial para cassar o acórdão e a sentença,
permitindo a regular instrução do feito.
É como voto.
CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS
DO MINISTÉRIO DA FAZENDA

RECURSO DE OFÍCIO Nº 13045.000654/2003-10


Terceira Seção (DOU 30/09/2015)

Relatora: Conselheira Nanci Gama


Data do julgamento: 29/09/2015

77/7 — EMENTA: DRAWBACK SUSPENSÃO. ASPECTOS FORMAIS.


ADIMPLEMENTO DO COMPROMISSO DE EXPORTAR.
Constatado que as divergências apuradas pela fiscalização aduaneira se
afiguram de natureza formal, resta adimplido do cumprimento do regime de
drawback, modalidade suspensão, na medida em que ocorreu a efetiva saída
das mercadorias discriminadas no ato que formalizou a concessão do respectivo
regime, inclusive no que diz respeito às transações acordadas para se realizarem
sem cobertura cambial.
Recurso voluntário negado.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.


Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, negar provi-
mento ao recurso de ofício.
Joel Miyazaki – Presidente ad hoc
Conselheira Nanci Gama – Relatora
José Luiz Feistauer de Oliveira – Redator ad hoc
Participaram do presente julgamento os Conselheiros Luis Marcelo Guerra
de Castro, Vanessa Albuquerque Valente, Celso Lopes Pereira Neto, Anelise Daudt
Prieto e Nanci Gama. Ausente o Conselheiro Heroldes Bahr Neto.

RELATÓRIO
Por bem relatar os fatos, transcreve-se o relatório constante da decisão a quo:
“Trata o presente processo da cobrança do Imposto de Importação (II) no
valor de R$ 299.464,78, acrescida de multa de ofício no valor de R$ 224.598,59,
e juros de mora no valor de R$ 277.777,15, em virtude de inadimplemento do
Regime Aduaneiro Especial de Drawback, na modalidade suspensão, operação
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 249

especial sem cobertura cambial, formalizada por meio do auto de infração de


fls. 01 a 10 e relatório de fiscalização de fls. 11 a 16.
Conforme se depreende dos autos, a interessada obteve o Ato Concessório
de Drawback 0018-97/000321-0, emitido em 07.11.97, com prazo de validade
até 06.05.98, autorizando a epigrafada a importar com suspensão de tributos o
insumo Iminoestibeno, para posterior exportação do produto Carbamazepina.
Posteriormente, por meio de aditivos ao ato concessório, foi prorrogado o prazo
de validade constante no item 29 para 30.04.99 (fls. 62 a 66).
Consta no relatório elaborado pela fiscalização que, relativamente ao as-
pecto quantitativo, tanto as importações como as exportações foram realizadas
com observância do estabelecido no ato concessório e legislação de regência.
No entanto, procedendo ao exame dos registros de exportação constantes
no Relatório de Comprovação de Drawback, evidenciou que:
– a beneficiária procedeu à exportação de mercadorias sem cobertura
cambial no valor de US$ 23.424.003,03, que adicionadas às exportações com
cobertura cambial realizadas no valor de US$ 9.000.160,29, chegou ao mon-
tante total de exportação de US$ 32.424.163,32;
– o montante de importação realizada sem cobertura cambial perfez a
quantia de US$ 29.860.054,15, de um total de importação apurado de US$
30.349.630,40, apontando um inadimplemento parcial em valor de US$
2.564.109,17 (US$ 32.424.163,32 [Exportação Total] – US$ 29.860.054,15
[Importação sem Cobertura Cambial]), caracterizando um ingresso de divisas

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


superior ao autorizado em ato concessório;
– representa um ganho cambial apurado de 8,45% (US$ 2.564.109,17/
US$ 30.349.630,40).
Prosseguindo, a fiscalização informa que da proporção de 1,285 exis-
tente entre exportações e importações originalmente previstas para o regime
(US$ 38.881.646,14 e US$ 30.262.866,74) e tendo em vista que a diferen-
ça entre exportações realizadas e previstas foi de US$ 6.457.482,82 (US$
38.881.646,14 – US$ 32.424.163,32), apurou-se um montante FOB no valor
de US$ 5.025.278,46, a título de importação não beneficiada pelo regime.
Com base nessas constatações, a fiscalização apropriou o respectivo
saldo de divisas com o valor aduaneiro das mercadorias ingressadas por meio
das Declarações de Importação 98/0998954-7, 98/0865455-0, 98/0865454-1
e 98/0812006-7, até zerá-lo; aplicando nessas importações a alíquota do II
vigente na data do fato gerador (5%), para apurar um crédito tributário total
de R$ 801.840,52, conforme antes discriminado.
Por fim, a fiscalização salienta que as notas fiscais de saída que ampa-
raram as exportações indicam o mesmo montante em dólares americanos
que os consignados nos Registros de Exportação respectivos, reafirmando o
inadimplemento parcial do regime aduaneiro especial de Drawback amparado
no Ato Concessório 0018-97/000321-0, haja vista o que preceitua a Consoli-
250 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

dação do Regime de Drawback (CND), aprovada pelo Comunicado Decex nº


21, de 11.07.97.
Cientificada da autuação em 08.08.03 (fl. 01), a impugnante apresentou
a defesa de fls. 140/141, acompanhada dos documentos de fls. 142 a 186,
argumentando que:
– as autoridades lançadoras, com relação aos REs sem cobertura cambial
de ns. 98/0101664-001, 98/0223630-001 e 98/0293304-001, deixaram de con-
siderar os valores de US$ 1.868.801,34, US$ 2.014.860,57 e US$ 2.573.820,91,
respectivamente, tendo em vista que por um equívoco da interessada o campo
9-L destes registros não foi preenchido;
– referido equívoco não deveria ter sido considerado, pois caso fosse
observado o campo 25 dos referidos REs, perceberia que consta expressamente
indicado que estes valores se referem ao Valor de Importação sem Cobertura
Cambial, referente ao AC 0018-97/000321-0;
– agregando estes três valores aos demais apurados pela fiscalização a
título de exportação efetuada com e sem cobertura cambial chegasse à cifra de
US$ 38.881.646,14, qual seja o montante idêntico ao apontado no relatório
fiscal a título de exportação prevista.
Ante o exposto, provada a improcedência da ação fiscal, requer seja
cancelado o débito tributário indevidamente reclamado.
É o relatório.”
A Delegacia da Receita Federal de Julgamento em Florianópolis julgou o lan-
çamento improcedente, conforme ementa abaixo transcrita:
“Assunto: regimes aduaneiros
Data do fato gerador: 18.08.98, 02.09.98, 07.10.98
DRAWBACK SUSPENSÃO. ASPECTOS FORMAIS. ADIMPLEMENTO
DO COMPROMISSO DE EXPORTAR.
Constatado que as divergências apuradas pela fiscalização aduaneira se
afiguram de natureza formais, resta adimplido do cumprimento do regime de
drawback, modalidade suspensão, na medida em que ocorreu a efetiva saída
das mercadorias discriminadas no ato que formalizou a concessão do respectivo
regime, inclusive no que diz respeito às transações acordadas para se realizarem
sem cobertura cambial.
Lançamento improcedente.”
Dessa decisão foi apresentado recurso de ofício ao Terceiro Conselho de Con-
tribuintes, conforme determina o art. 29 da Portaria MF nº 375, de 7 de dezembro
de 2001.
É o relatório.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 251

VOTO
Conselheiro Suplente José Luiz Feistauer de Oliveira – Redator ad hoc
Por intermédio de despacho, nos termos da disposição do art. 17, III, do
Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – RICARF,
incumbiu-me o Presidente da Câmara a formalizar o acórdão, cujo relator original,
Conselheira Nanci Gama, não integra mais nenhum dos colegiados do CARF.
Desta forma, a elaboração deste voto deve refletir a posição adotada pelo re-
lator original.
Como bem destacou a decisão recorrida, para descaracterizar o adimplemento
do drawback, toma-se necessário demonstrar que a exportação não ocorreu, ou que
os insumos não foram empregados nos produtos exportados, ou que as exportações
não obedeceram ao prazo previsto, etc.
Nesse sentido, não há reparo a fazer na decisão recorrida, que entendeu assistir
razão ao contribuinte por entender que o preenchimento incorreto dos Registros
de Exportação (descumprimento de obrigação acessória), em nenhuma hipótese,
pode ser motivo de exigência dos tributos suspensos, que constituem obrigação
tributária principal. Tratam-se de obrigações de natureza jurídica distinta, que não
se confundem, conforme se observa do CTN.
Assim, o fato de a beneficiária não haver indicado em campo próprio do Regis-
tro de Exportação (RE) a parcela do valor da mercadoria importada sem cobertura
cambial não autoriza a glosa da operação de exportação para efeito de comprovação
do adimplemento do regime.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


O adimplemento do Regime Aduaneiro Especial de Drawback suspensão consis-
te, em sua essência, na efetiva exportação dos produtos indicados no ato concessório,
dentro do prazo pactuado, conforme a fiscalização atesta que a beneficiária cumpriu.
Consta dos autos que foi efetuado o despacho de exportação das mercadorias
de nome comercial Carbamazepina e devidamente quantificadas no RE. Portanto,
presume-se que as mercadorias foram exportadas. Caberia ao Fisco o ônus de pro-
var que não ocorreu a efetiva exportação. Como bem disse o voto da decisão a quo,
“considerando que o ônus da prova das infrações atribuídas ao contribuinte incumbe
ao Fisco (art. 142 do CTN), a glosa das exportações alcançadas no procedimento
fiscal somente seria legítima na hipótese de descaracterização dos documentos que
instruem os despachos de exportação correspondentes, o que não ocorreu no caso
dos autos. (...) perquirindo os extratos dos Registros de Operações de Exportação,
juntados pela impugnante às fls. 146 a 172, podemos depreender que as informações
não prestadas nos campos próprios (09-L, 09-C ou 09-D), referentes ao esquema
de pagamento total/valor sem cobertura cambial e o valor relativo ao efetivo paga-
mento da exportação (valor total menos a parcela sem cobertura cambial) foram
efetivamente consignadas nos campos 24 Dados do Fabricante e 25 Observação/
Exportador, suprindo, ao meu sentir, sobremaneira a falha cometida pela benefici-
ária do regime, uma vez que informou o valor total da operação, o valor referente
à importação sem cobertura cambial, o valor líquido da exportação, ou seja, com
252 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

cobertura cambial, assim como a que ato concessório se refere a exportação em trato
(fls. 150/151, 159/160 e 168/169)”.
Em conclusão, não há como negar que os produtos especificados no RE fo-
ram efetivamente exportados. A simples falha na elaboração do RE, quando muito
prejudica o controle fiscal, e deveria ser punida com penalidade específica. Tal fato,
contudo, não constitui prova suficiente para afirmar que as exportações não teriam
ocorrido.
Ante ao exposto, nego provimento ao recurso de ofício.
E estas são as considerações possíveis para suprir a inexistência do voto.
José Luiz Feistauer de Oliveira – Redator ad hoc
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0053117-47.2014.4.01.0000-RO


Oitava Turma (DJF1 02/10/2015)

Relatora: Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso


Data do julgamento: 21/08/2015

77/8 — EMENTA: EXECUÇÃO FISCAL. ART. 620 DO CPC. PRINCÍPIO


DA MENOR ONEROSIDADE PARA O DEVEDOR. ART. 649, V, DO CPC.
PENHORA SOBRE O FATURAMENTO DA EMPRESA. IMPOSSIBILIDADE.
1. O princípio da execução menos onerosa para o devedor, consagrado no
art. 620 do CPC, deve ser observado pelo julgador, pois não se trata de mera
faculdade concedida ao juiz, mas de um preceito cogente.
2. A penhora sobre o faturamento da empresa só é admitida em circuns-
tâncias excepcionais e desde que, entre outros requisitos, não implique o
comprometimento da atividade da pessoa jurídica executada.
3. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


ACÓRDÃO
Decide a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimi-
dade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto da Relatora.
Brasília (DF), 21 de agosto de 2015.
Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso – Relatora

RELATÓRIO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso (Relatora):
Neste agravo de instrumento, interposto com pedido de efeito suspensivo
ativo, a Fazenda Nacional pretende a reforma da decisão proferida pelo Juízo da 2ª
Vara da Seção Judiciária de Rondônia, que, nos autos da Execução Fiscal 15865-
34.2011.4.01.4100, indeferiu o pedido de realização de penhora sobre o montante
de 10% do faturamento mensal, bem como dos bens que guarnecem o estoque da
empresa executada (fl. 11).
A agravante sustenta que “a penhora sobre 10% do faturamento da executada
mostra-se a medida mais adequada neste momento processual, pois a presunção é
de que a executada aufere lucros em decorrência de suas atividades, como se vê do
resultado parcialmente frutífero da última ordem de penhora online”(fl. 8).
254 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Alega que, “no caso dos autos, presentes todos os requisitos necessários para
o deferimento da penhora do faturamento. A uma porque a empresa executada não
possui outros bens passíveis de penhora (doc. j); a duas porque a exequente indi-
cou como administrador o representante legal da empresa; e, por fim, foi requerido
a penhora de apenas 10% do faturamento da executada, que não é suficiente para
inviabilizar o seu funcionamento” (fls. 9-10).
Requer, assim, a concessão do efeito suspensivo e, ao fim, o provimento do
agravo para que seja determinada a penhora de 10% do faturamento mensal da
executada e, subsidiariamente, dos bens que compõem seu estoque.
É o relatório.

VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso (Relatora):
Primeiramente, apesar de o art. 655-A, § 2º, do CPC dispor que compete ao
executado comprovar que as quantias são impenhoráveis, compete ao exequente
esgotar as diligências para localizar bens passíveis de penhora, especialmente porque
menos gravoso ao executado.
A ordem estabelecida nos arts. 11 da Lei nº 6.830/80 e 655 do Código de Pro-
cesso Civil, que conferem prioridade ao dinheiro para fins de penhora, tem caráter
relativo e deve ser interpretada em consonância com os demais valores albergados
pela legislação processual civil, entre os quais o princípio de que a execução deve
processar-se da maneira menos gravosa para o devedor, de acordo com o art. 620
do CPC.
O faturamento da empresa, que não é igual a dinheiro, configura expectativa de
receita ainda não realizada, somente passível de penhora em situação excepcional,
quando não encontrado outro bem penhorável.
O STJ definiu que a penhora sobre o faturamento da empresa só é admitida
em circunstâncias excepcionais, quando presentes os seguintes requisitos: “(a) não
localização de bens passíveis de penhora e suficientes à garantia da execução ou,
se localizados, de difícil alienação; (b) nomeação de administrador (arts. 677 e se-
guintes do CPC); e (c) não comprometimento da atividade empresarial” (STJ, REsp
903.658/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 13.10.08).
Verifica-se, no caso dos autos, que não foram preenchidos os requisitos neces-
sários para autorizar a penhora sobre do faturamento da pessoa jurídica executada.
In casu, não consta nos autos documentação que comprove uma ampla re-
alização de diligências para localização de bens móveis e imóveis penhoráveis da
executada.
Ademais, a exequente não preencheu os requisitos previstos nos arts. 677 e
678 do CPC. A indicação do representante legal da empresa executada para atuar
como administrador não atende às exigências legais, porquanto se mostra ineficaz
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 255

e inócua. Ora, a função do administrador é um múnus público que não pode ser
compulsoriamente imposto ao executado.
Incabível, portanto, a penhora sobre o faturamento da pessoa jurídica agravada,
uma vez que a supressão do seu capital de giro poderá impedir o regular desenvol-
vimento de suas atividades.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento.
É como voto.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0809820-26.2009.4.02.5101-RJ


Segunda Turma Especializada (DEJF 27/10/2015)

Relatora: Desembargadora Federal Simone Schreiber


Data do julgamento: 24/02/2015

77/9 — EMENTA: PROPRIEDADE INDUSTRIAL. PEDIDO DE ADJU-


DICAÇÃO DE MARCA. PRESCRIÇÃO OBSERVADA EM RELAÇÃO A UM
DOS PEDIDOS. EXCEPCIONALIDADE DA ADJUDICAÇÃO. MÁ-FÉ NÃO
COMPROVADA. PROVIMENTO NEGADO À APELAÇÃO.
I – Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que (i)
declarou extinto o processo, com resolução de mérito, na forma do art. 269,
IV, do CPC, pronunciando a prescrição da pretensão da apelante em adjudicar
o registro 818.792.892, referente à marca nominativa “Al Rifai”, e (ii) julgou
improcedente, nos termos do art. 269, I, do CPC, o pedido de adjudicação do
registro da marca 822.431.998, referente à marca nominativa “Al Rifai”.
II – Aplicável analogicamente o prazo prescricional previsto no art.
174 da LPI, de cinco anos contados da concessão da marca. Como o registro
818.792.892 foi concedido em 16.06.98 e a presente demanda adjudicatória foi
proposta em 13.08.09, faz-se necessário reconhecer a prescrição da pretensão
autoral em relação a tal registro.
III – A adjudicação é medida excepcional, cabível na limitada hipótese do
art. 6 septies (1) da CUP. Há posição mais ampliativa que entende a adjudicação
cabível também nos casos de irregistrabilidade do art. 124 da LPI. De qualquer
forma, as duas correntes exigem a efetiva usurpação, ou seja, registro de má-fé
com objetivo de adquirir titularidade do que já se sabe existente.
IV – Não comprovada a má-fé no caso. Em via de consequência, impro-
cedente a pretensão adjucatória em relação ao registro 822.431.998.
V – Provimento negado ao recurso de apelação.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Segunda Turma Especializada deste Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por
unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do relatório e
voto, constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 2015.
Desembargadora Federal Simone Schreiber – Relatora
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 257

RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto por Al Rifai Roastery, às fls. 316/328,
contra sentença de fls. 298/311, que (i) declarou extinto o processo, com resolução
de mérito, na forma do art. 269, IV, do CPC, pronunciando a prescrição da pretensão
da apelante em adjudicar o registro 818.792.892, referente à marca nominativa “Al
Rifai”, e (ii) julgou improcedente, nos termos do art. 269, I, do CPC, o pedido de ad-
judicação do registro da marca 822.431.998, referente à marca nominativa “Al Rifai”.
Em suas razões recursais, a apelante informa inicialmente ser empresa no-
toriamente reconhecida no ramo alimentício, em especial no segmento de grãos
exóticos, famosa por introduzir e popularizar a castanha-de-caju no Líbano e, a
partir daí, em diversos outros mercados, como Comunidade Europeia, regiões do
Golfo Pérsico, Egito e Canadá, sempre utilizando a marca “Al Rifai”. Posteriormente,
passou a oferecer seus produtos no mercado brasileiro e, anos mais tarde, quando
foi promover o registro de sua marca no Brasil, descobriu a existência dos registros
anulandos, também referentes à marca “Al Rifai”, de titularidades da 1ª apelada
(Maxifour Produtos Alimentícios Ltda.).
Argumenta que, como a 1ª apelada teria sido fundada por um libanês e também
seria dedicada a produtos libaneses, não poderia alegar desconhecimento quanto à
titularidade da marca “Al Rifai”, que também constituiria nome de família da apelante.
Cotejando os arts. 6 bis (1) e (3), 6 septies (1) e (2) e 8, todos da Convenção da
União de Paris (CUP), e 124, V, XV, XXIII, 126, 165 e 166, todos da Lei nº 9.279/96
(LPI), argumenta que a adjudicação de marca também seria cabível nos casos de

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


nulidade de marca. Aduz que, mesmo que não tenha sido formulado pedido de
nulidade dos registros, “há nos autos elementos suficientes para que a mesma seja
reconhecida de forma incidental” (fl. 324).
Colaciona excertos doutrinários que explicam que a regra de irregistrabilidade
contida no art. 124, XXIII, da LPI, que impede o registro da marca que evidente-
mente não se poderia desconhecer, seria aplicável às situações de fraude relativas a
“segmentos do mercado em que são razoáveis que o empresariado desconhecesse a
existência do signo distintivo”, com vistas a “criar mecanismos concretos e criteriosos
para conferir efetividade ao princípio da repressão à concorrência desleal” (fl. 325).
Finaliza com a transcrição de trechos de doutrina e jurisprudência que re-
forçariam a exceção ao princípio da territorialidade trazida pelo art. 6 bis da CUP.
Contrarrazões do INPI em fl. 335, reiterando sua manifestação de fls. 184/191
e pugnando pela manutenção da sentença no tocante à prescrição em relação ao
registro 818.792.892 e pela reforma da sentença, com a consequente adjudicação,
em relação ao registro 822.431.998.
Em fl. 339, o MPF opina pela manutenção da sentença.
Devolvido o prazo, a 1ª apelada ofereceu suas contrarrazões em fls. 357/361.
Em fls. 363/370, a apelante informa ter requerido o registro da marca “Al Rifai”
na Argélia, Índia e Venezuela. Em fls. 372/430, a apelante junta documentação que
258 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

comprovaria a notoriedade de sua marca no segmento alimentício e em especial uma


declaração da Câmera de Comércio, Indústria e Agricultura do Líbano, datada de 13
de janeiro de 2015, que comprovaria que a apelante importaria “NUTS do Brasil há
40 anos” e exportaria seus produtos para Brasil e América Latina desde 1990 (fl. 372).
É o relatório. Peço dia.
Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 2015.
Desembargadora Federal Simone Schreiber – Relatora

VOTO
Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença
que (i) declarou extinto o processo, com resolução de mérito, na forma do art. 269,
IV, do CPC, pronunciando a prescrição da pretensão da apelante em adjudicar o
registro 818.792.892, referente à marca nominativa “Al Rifai”, e (ii) julgou impro-
cedente, nos termos do art. 269, I, do CPC, o pedido de adjudicação do registro da
marca 822.431.998, referente à marca nominativa “Al Rifai”.
O registro 818.792.892 refere-se à classe 32 (massas alimentícias, farinhas
e fermentos em geral), subclasse 10 (massas alimentícias em geral). Já o registro
822.431.998 refere-se à classificação de Nice NCL(7) 30 (café, chá, cacau, açúcar,
arroz, tapioca, sagu, sucedâneos de café, farinhas e preparações feitas de cereais, pão,
pastelaria e confeitaria, sorvetes, mel, xarope de melaço, levedo, fermento em pó, sal,
mostarda, vinagre, molhos [condimentos], especiarias, gelo), com a especificação
“condimentos, especiarias e essências alimentícias (cereais)”. Ambos os registros
são de titularidade da primeira apelada.
A apelante, por sua vez, afirma ser notoriamente conhecida na comercialização
de grãos exóticos, tais como nozes e castanha-de-caju.
A r. sentença inicialmente verificou que a lide apenas comportava pedido de
adjudicação de marca, nada dispondo acerca de eventual pedido de nulidade. Em
relação ao registro 818.792.892, entendeu que a imprescritibilidade para o cance-
lamento ou para a proibição de uso de marca registrada de má-fé, prevista no art.
6 bis (3) da CUP, apenas seria aplicável às marcas notoriamente conhecidas. Tendo
em vista a ausência de provas em relação à má-fé ou à notoriedade da marca da
apelante, malgrado não haver previsão expressa de prazo prescricional para a de-
manda adjudicatória, na hipótese em tela, entendeu que seria aplicável o prazo de 5
anos para a ação de nulidade marcária, previsto no art. 174 da LPI. Como o registro
818.792.892 fora concedido em 16.08.98 e a presente demanda fora proposta em
13.08.09, o juiz a quo reconheceu a prescrição nesse ponto.
Já em relação ao registro 822.431.998, a r. sentença consignou que o art. 166
da LPI permite a adjudicação do registro de marca se a mesma ocorrer nos termos
previstos no art. 6 septies (1) da CUP, que condiciona aquela à hipótese em que “o
agente ou representante do titular de uma marca num dos países da União pedir, sem
autorização deste titular, o registro dessa marca em seu próprio nome”. Nesse sentido,
a ação adjudicatória apenas seria cabível quando houvesse registro feito de má-fé,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 259

não sendo possível manejá-la em caso de criação autônoma, ainda que infringente
das hipóteses de irregistrabilidade do art. 124 da LPI. Como no caso dos autos, a
ora apelante não teria logrado demonstrar a má-fé da 1ª apelada, o magistrado a quo
julgou improcedente o pedido de adjudicação em relação ao registro 822.431.998.
Analisando a prova dos autos, entendo que a sentença deve ser mantida por
seus próprios fundamentos.
Inicialmente, verifico que não há pedido de nulidade marcária na petição inicial
de fls. 02/13, mas apenas de adjudicação dos registros 818.792.892 e 822.431.998. A
importância dessa observação reside no fato de que, como será visto posteriormente,
partilho do entendimento de que a nulidade marcária não pode ser reconhecida de
ofício e de “forma incidental”, como pretende a apelante.
No tocante ao registro 818.792.892, observo que o mesmo foi concedido em
16.06.98, ao passo que a presente demanda foi proposta em 13.08.09, de modo
que faz-se necessário avaliar se já ocorreu a prescrição da pretensão adjudicatória.
A LPI é omissa em relação ao prazo prescricional para demanda adjudicatória,
apenas dispondo acerca do prazo da ação de nulidade de registro de marca. À míngua
de previsão legal, duas possíveis soluções surgem: o entendimento de que não há
prazo prescricional, aplicável analogicamente em razão do disposto no art. 6 bis (3)
da CUP, ou a aplicação analógica do prazo prescricional para demandas de nulidade
marcárias, contido no art. 174 da LPI.
Dispõe o art. 6 bis da CUP (grifos adicionados):
“1) Os países da União comprometem-se a recusar ou invalidar o registro,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


quer administrativamente, se a lei do país o permitir, quer a pedido do interessado
e a proibir o uso de marca de fábrica ou de comércio que constitua reprodução,
imitação ou tradução, suscetíveis de estabelecer confusão, de uma marca que a
autoridade competente do país do registro ou do uso considere que nele é noto-
riamente conhecida como sendo já marca de uma pessoa amparada pela presente
Convenção, e utilizada para produtos idênticos ou similares. O mesmo sucederá
quando a parte essencial da marca constitui reprodução de marca notoriamente
conhecida ou imitação suscetível de estabelecer confusão com esta.
2) Deverá ser concedido um prazo mínimo de cinco anos a contar da data
do registro, para requerer cancelamento de tal marca. Os países da União têm a
faculdade de prever um prazo dentro do qual deverá ser requerida a proibição de uso.
3) Não será fixado prazo para requerer o cancelamento ou a proibição de
uso de marcas registradas ou utilizadas de má-fé.”
Pela leitura da alínea (3), verifica-se que, nas hipóteses de registro ou uso de
má-fé, não há prazo prescricional para demanda pleiteando o cancelamento ou a
abstenção de uso de registro de marca. Contudo, é necessário ter em mente que tal
disposição está inserida no contexto estabelecido pela alínea (1), de proteção às
marcas notoriamente conhecidas, não sendo extensível às demais marcas. Em outros
termos, apenas será possível aplicar o regime de imprescritibilidade se a hipótese for
de (i) registro ou uso de má-fé de (ii) marcas notoriamente conhecidas.
260 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Nesse ponto, apesar de a ora apelante ter invocado, em sua petição inicial
(fls. 02/13), a proteção à marca notoriamente conhecida, não há nos autos provas
suficientes para caracterizar o notório conhecimento de sua marca no segmento
idêntico ou similar ao que busca proteção, havendo tão somente fôlder publicitário
apresentando os produtos oferecidos (fls. 21/32) e certificados de registro da marca
em outros países.
Com o feito concluso para julgamento, em fls. 363/370 e 372/430, a apelante,
informando fato novo, trouxe documentação teoricamente apta a demonstrar a
notoriedade da marca “Al Rifai” no comércio de grãos.
Entretanto, entendo que tais documentos são irrelevantes para o deslinde da
causa. Isso porque os documentos efetivamente novos apenas poderiam comprovar
a notoriedade superveniente da marca “Al Rifai” em relação ao registro adjudican-
do. Ademais, a apelante promoveu a juntada de documentos após a interposição
de seu recurso de apelação e a apresentação das contrarrazões pela parte adversa
sem justificar porque não foram trazidos aos autos na fase instrutória, perante o 1º
grau de jurisdição.
O art. 397 do CPC somente autoriza a juntada extemporânea de documentos
quando “destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados, ou para
contrapô-los aos que foram produzidos nos autos”. Nenhuma dessas situações ocorre
no caso em tela, motivo pelo qual tais documentos não devem ser considerados no
julgamento da apelação.
Dessa forma, entendo que a apelante não logrou comprovar que a marca da
qual é titular é notoriamente conhecida, razão pela qual deixo de aplicar a impres-
critibilidade prevista no art. 6 bis (3) da CUP, na medida em que seus requisitos são
cumulativos.
Destarte, aplica-se analogicamente ao caso o prazo prescricional previsto no
art. 174 da LPI, abaixo transcrito:
“Art. 174. Prescreve em 5 (cinco) anos a ação para declarar a nulidade
do registro, contados da data da sua concessão.”
Como o registro 818.792.892 foi concedido em 16.06.98 e a presente demanda
adjudicatória foi proposta em 13.08.09, forçoso reconhecer a prescrição da pretensão
autoral em relação a tal registro.
O mesmo não ocorre em relação ao registro 822.431.998, na medida em que
o mesmo foi concedido em 25.02.09, ao passo que a presente demanda foi proposta
em 13.08.09, não tendo ocorrido a prescrição da pretensão autoral.
Passo à análise do mérito da demanda.
No sistema de proteção marcário vigente, a adjudicação é medida excepcional.
A LPI é lacônica e, em seu art. 166, apenas permite a adjudicação na estrita hipótese
do art. 6 septies (1) da CUP, ou seja, quando o agente ou representante do titular de
uma marca fizer, sem autorização deste titular, o registro da marca em seu próprio
nome. Vejamos as referidas normas, com grifos adicionados:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 261

“Art. 166. O titular de uma marca registrada em país signatário da Convenção


da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial poderá, alternativa-
mente, reivindicar, através de ação judicial, a adjudicação do registro, nos termos
previstos no art. 6 septies (1) daquela Convenção.” (LPI)
“1) Se o agente ou representante do titular de uma marca num dos países da
União pedir, sem autorização deste titular, o registro dessa marca em seu próprio
nome, num ou em vários desses países, o titular terá o direito de se opor ao registro
pedido ou de requerer o cancelamento ou, se a lei do país o permitir, a transferência
a ser favor do referido registro, a menos que este agente ou representante justifique
o seu procedimento.” (CUP: art. 6 septies)
Nos termos do art. 6 septies (1), são necessárias duas condições cumulativas
para a adjudicação do registro: (i) que agente ou representante do titular de uma
marca faça o registro desta marca em algum país da União e (ii) que tal registro seja
feito de má-fé.
Saliente-se que há posição mais ampliativa, defendida por Denis Barbosa, que
entende que a demanda adjudicatória é cabível “não só na hipótese de aplicação
do art. 6 septies da CUP, mas todas as vezes em que o direito formativo gerador
foi objeto de usurpação” (BARBOSA, Denis Borges. Nota sobre a adjudicatória em
marcas. Disponível em: <http://denisbarbosa.addr.com/arquivos/200/propriedade/
nota_adjudicatoria_marcas.pdf>. Acesso em: 6 out. 2014)
Em outras palavras, caberá demanda adjudicatória se houver usurpação, ou
seja, registro de má-fé com objetivo de adquirir titularidade do que já se sabe exis-
tente, não apenas nas hipótese previstas no art. 6 septies da CUP, mas também nas

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


hipóteses de irregistrabilidade do art. 124 da LPI.
Em relação à má-fé, a ora apelante informa em sua petição inicial que “os re-
gistros de marca efetuados pela empresa ré foram depositados sem o conhecimento da
autora, com quem a ré manteve relação comercial no passado” (fl. 4, grifos originais).
Em seguida afirma que “os sócios da ré são de origem libanesa e possuem es-
tabelecimentos especializados na venda dos produtos daquele país, tendo portanto
perfeito conhecimento da existência da autora e dos seus direitos sobre a marca “Al
Rifai” (fl. 4). Esse último argumento foi repetido, ainda que por outras palavras,
em fl. 320 de sua apelação.
Contudo, não entendo razoável supor que os sócios da 1ª apelada teriam agido
de má-fé no registro da marca “Al Rifai”, apenas por serem de origem libanesa e por
possuírem estabelecimentos especializados na venda de produtos libaneses. E apesar
de afirmar ter mantido relações comerciais no passado com a 1ª apelada, a apelante
não juntou quaisquer provas que confirmem tal argumento.
Em verdade, a oitiva do Sr. Farid Mekhael Kheir, representante legal da 1ª
apelada, realizada em fls. 291/292, infirma ainda mais os argumentos da apelante.
Na oportunidade, o Sr. Farid informou que a 1ª apelada existe desde 1990 e co-
mercializa mais de 500 produtos de todo o Oriente Médio, fazendo eventualmente
homenagens ao Líbano e ao Oriente Médio. Afirmou que o nome “Al Rifai” é comum
262 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

em tais regiões, equivalendo ao “José da Silva” no Brasil e que nunca tinha ouvido
falar em outras empresas usando a marca “Al Rifai”. Demais disso, afirmou também
nunca ter tido contato com o Sr. Moussa Al Rifai, fundador da apelante, e que nunca
manteve contato comercial com a apelante ou importou nenhum produto da mesma.
Fortalecendo esse entendimento, confira-se trechos do parecer de fls. 170/182,
elaborado pelo Dr. Newton Oliveira e juntado aos autos pela 1ª apelada, que indi-
cam que a expressão “Al Rifai” não é tão exclusiva como pretende fazer a apelante:
“Al Rifai é, antes de mais nada, o nome da mais conhecida e uma das
maiores mesquitas do Cairo, destino de turistas do mundo inteiro, venerada
por todos os cidadãos nascidos ou originários daquela parte do mundo. A
mesquita de Al Rifai foi construída em duas fases durante o período entre 1869
e 1912, quando foi finalmente concluída. Aliás, o nome da mesquita, Al Rifai,
remete a Ahamad Rifai (1182), nascido no Iraque, um reconhecido ‘santo’ da
religião islâmica, fundador da Ordem Al Rifai, um dos poucos, de acordo com
a religião islâmica, tornados professores, pela graça de Allah, para disseminar
seus ensinamentos. Musab Nabil Al Rifai é o nome do mais conhecido jogador
de futebol do mundo árabe. Conhecidíssimo, já atuou nos times Ramtha SC,
Shabab Al Ordon e Al Jazeera, onde se encontra desde 2008. Tariq Al Rifai
é como se chama o Diretor do Islamic Market Index Group, de Dubai, cujas
ações são cotadas no índice Dow Jones.
Hani Al Rifai, ou o Sheikh Hani Al Rifai, é um dos mais proeminentes
religiosos do mundo islâmico, sendo seus ensinamentos recitados pelas mes-
quitas de todo o Islã, e mostrados na internet e disseminados juntamente com
a cultura árabe. O Hino Nacional da Jordânia, As-Salam Al-Malak Al-Urdoni,
ou Viva o Rei da Jordânia, adotado desde 1946, foi escrito por Abdul Monem
Al-Rifai. Fora tudo isso, a presença islâmica existe também muito forte no
Brasil, onde atua a Orde Rifai, originada de Hadrad Shaykh Sayyid Ahmad Al
Rifai, o mesmo em homenagem ao qual foi dado o nome da conhecidíssima
mesquita Al Rifai, antes mencionada Al Rifai é, também, o nome de outro ponto
importante, o da tumba do Grande Sheikh Sayyid Ahmad Al Rifai, que viveu
de 1119 a 1182 e está situada no Iraque. Al Rifai é nome de muitas famílias
naquela parte do mundo, não apenas sobrenome do sócio da autora, mas uma
espécie de ‘Silva’ por aquelas plagas, inclusive que moram em outros países e
até no Brasil. Al Rifai é denominação de um bairro no Cairo, conhecido pelos
seus quitutes, comidas que são servidas na rua. Al Rifai é nome comercial de
empresas em diversas partes do mundo. Al Rifai faz parte da antiga história do
Kuwait e da história do próprio islamismo.” (fls. 176-177)
Dessa forma, entendo que a apelante não se desincumbiu do ônus de comprovar
a má-fé da 1ª apelada, inviabilizando sua pretensão adjudicatória, na medida em que
a má-fé constitui requisito essencial para a caracterização da usurpação da marca.
Note-se que, como consignado inicialmente, o pleito autoral é apenas de adju-
dicação de marca, não dispondo nada acerca de declaração de nulidade dos registros
da 1ª apelada, nem mesmo a título subsidiário.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 263

Nesse contexto, inaceitável a pretensão da apelante de que, mesmo ausente


pedido de nulidade dos registros de marca da 1ª apelada, a mesma “seja declarada
de forma incidental” (fl. 324). É ônus do autor delimitar a matéria e os pedidos sub-
metidos ao Poder Judiciário, sendo defeso ao magistrado decidir fora de tais limites,
sob pena de violação do princípio da congruência (art. 460 do CPC) e proferimento
de sentença extra petita.
Dessa forma, entendo que se encontra prescrita a pretensão da apelante em
adjudicar o registro 818.792.892 e julgo improcedente o pedido de adjudicação do
registro 822.431.998.
Pelo exposto, nego provimento ao recurso de apelação.
É como voto.
Desembargadora Federal Simone Schreiber – Relatora

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0637189-36.1984.4.03.6100-SP


Sexta Turma (DE 08/09/2015)

Relator: Desembargador Federal Mairan Maia


Data do julgamento: 27/08/2015

77/10 — EMENTA: CRÉDITO-PRÊMIO. IPI. CORREÇÃO MO-


NETÁRIA. ÍNDICES E EXPURGOS INFLACIONÁRIOS UTILIZADOS.
ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DIVERGÊNCIA.
RETRATAÇÃO.
1. O STJ, ao apreciar o REsp 1.112.524/DF, na sistemática do art. 543-C
do CPC, pacificou a questão relativa aos índices e aos expurgos inflacionários
que devem ser aplicados na atualização monetária em ações de compensação/
repetição de indébito, quais sejam: (i) ORTN, de 1964 a janeiro de 1986; (ii)
expurgo inflacionário em substituição à ORTN do mês de fevereiro de 1986;
(iii) OTN, de março de 1986 a dezembro de 1988, substituído por expurgo
inflacionário no mês de junho de 1987; (iv) IPC/IBGE em janeiro de 1989
(expurgo inflacionário em substituição à OTN do mês); (v) IPC/IBGE em
fevereiro de 1989 (expurgo inflacionário em substituição à BTN do mês); (vi)
BTN, de março de 1989 a fevereiro de 1990; (vii) IPC/IBGE, de março de 1990
a fevereiro de 1991 (expurgo inflacionário em substituição ao BTN, de março
de 1990 a janeiro de 1991, e ao INPC, de fevereiro de 1991); (viii) INPC, de
março de 1991 a novembro de 1991; (ix) IPCA série especial, em dezembro
de 1991; (x) UFIR, de janeiro de 1992 a dezembro de 1995; e (xi) Selic (índice
não acumulável com qualquer outro a título de correção monetária ou de juros
moratórios), a partir de janeiro de 1996.
2. Reexaminando a matéria, por força do disposto no art. 543-C, § 7º, II,
do CPC, verifico ter na hipótese o acórdão recorrido divergido da orientação
do Superior Tribunal de Justiça, no que atine aos índices de correção monetária
aplicável nas ações de compensação/repetição de indébito.
3. De rigor exercer o juízo de retratação para adotar o entendimento
sufragado pelo STJ no REsp 1.112.524/DF.
4. Parcial provimento à apelação do contribuinte. Manutenção dos demais
termos do acórdão.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 265

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade,
não conhecer da apelação da União Federal e dar parcial provimento à apelação do
contribuinte e à remessa oficial, nos termos do relatório e do voto, que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 27 de agosto de 2015.
Desembargador Federal Mairan Maia – Relator

RELATÓRIO
Cuida-se de ação de conhecimento, processada sob o rito comum ordinário,
ajuizada com o objetivo de ser condenada a União Federal a ressarcir valores oriun-
dos de incentivos fiscais decorrentes do aproveitamento de crédito-prêmio de IPI,
incidentes sobre operações de exportação de produtos manufaturados.
Por acórdão de minha relatoria, integrado pelos embargos de declaração, não
foi conhecida a apelação da União Federal, foi negado provimento à apelação do
contribuinte e dado parcial provimento à remessa oficial. Prescrição quinquenal, de
acordo com a regra prevista no Decreto nº 20.910/1932. Não incidência, na espécie, da
prescrição sobre o crédito de IPI materializado nas exportações realizadas no período
compreendido entre 11.01.79 (5 anos precedentes ao ajuizamento da medida cautelar

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


de protesto) e 01.12.79. Correção monetária na forma preconizada pelo Decreto-
Lei nº 491, de 5 de março de 1969, ou seja, com a conversão da moeda estrangeira
em nacional, com base na taxa cambial oficial referente à data da exportação dos
produtos. A partir daí, apurado o valor do crédito em moeda nacional, para fins de
escrituração nos livros fiscais, foi determinada a incidência de correção monetária
pelos mesmos índices oficiais utilizados pela Fazenda até 31 de dezembro de 1995,
com aplicação da Taxa Selic a partir de 1º de janeiro de 1996, afastada a aplicação
de qualquer outro índice.
Contra este acórdão, interpôs a autora recurso especial, pugnando a concessão
de expurgos inflacionárias e a majoração dos honorários advocatícios.
Com contrarrazões ao recurso especial da União Federal.
Por decisão monocrática proferida pelo i. Vice-Presidente desta Corte Regio-
nal, Desembargador Federal André Nabarrete, com fundamento no art. 543-C, § 7º,
II, do Código de Processo Civil, foi determinado o retorno dos autos a esta Turma
julgadora para reexame da matéria referente aos expurgos inflacionários.
É o relatório.
Desembargador Federal Mairan Maia – Relator
266 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

VOTO
A questão relativa à correção monetária se encontra pacificada pelo Superior
Tribunal de Justiça por meio do regime dos recursos repetitivos, previsto no art.
543-C do CPC. Confira-se:
“RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART.
543-C DO CPC. PROCESSUAL CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA. INEXIS-
TÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO DO AUTOR DA DEMANDA. MATÉRIA
DE ORDEM PÚBLICA. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL DE OFÍCIO. POS-
SIBILIDADE. JULGAMENTO EXTRA OU ULTRA PETITA. INOCORRÊNCIA.
EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. APLICAÇÃO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA.
TRIBUTÁRIO. ART. 3º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 118/05. PRESCRIÇÃO.
TERMO INICIAL. PAGAMENTO INDEVIDO. ART. 4º DA LC Nº 118/05.
DETERMINAÇÃO DE APLICAÇÃO RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE DIFUSO. CORTE ESPECIAL.
RESERVA DE PLENÁRIO. JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL RE-
PRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (RESP 1.002.932/SP). 1. A correção
monetária é matéria de ordem pública, integrando o pedido de forma implícita,
razão pela qual sua inclusão ex officio, pelo juiz ou tribunal, não caracteriza
julgamento extra ou ultra petita, hipótese em que prescindível o princípio da
congruência entre o pedido e a decisão judicial (Precedentes do STJ: AgRg no
REsp 895.102/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em
15.10.09, DJe 23.10.09; REsp 1.023.763/CE, Relª Minª Eliana Calmon, Segunda
Turma, julgado em 09.06.09, DJe 23.06.09; AgRg no REsp 841.942/RJ, Rel.
Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 13.05.08, DJe 16.06.08; AgRg no
Ag 958.978/RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, Quarta Turma, julgado em
06.05.08, DJe 16.06.08; EDcl no REsp 1.004.556/SC, Rel. Min. Castro Meira,
Segunda Turma, julgado em 05.05.09, DJe 15.05.09; AgRg no Ag 1.089.985/
BA, Relª Minª Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 19.03.09, DJe 13.04.09;
AgRg na MC 14.046/RJ, Relª Minª Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado
em 24.06.08, DJe 05.08.08; REsp 724.602/RS, Relª Minª Eliana Calmon, Se-
gunda Turma, julgado em 21.08.07, DJ 31.08.07; REsp 726.903/CE, Rel. Min.
João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em 10.04.07, DJ 25.04.07; e
AgRg no REsp 729.068/RS, Rel. Min. Castro Filho, Terceira Turma, julgado em
02.08.05, DJ 05.09.05). 2. É que ‘a regra da congruência (ou correlação) entre
pedido e sentença (CPC, arts. 128 e 460) é decorrência do princípio dispositi-
vo. Quando o juiz tiver de decidir independentemente de pedido da parte ou
interessado, o que ocorre, por exemplo, com as matérias de ordem pública, não
incide a regra da congruência. Isso quer significar que não haverá julgamento
extra, infra ou ultra petita quando o juiz ou o tribunal pronunciar-se de ofício
sobre referidas matérias de ordem pública. Alguns exemplos de matérias de
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 267

ordem pública: a) substanciais: cláusulas contratuais abusivas (CDC, arts. 1º


e 51); cláusulas gerais (CC, art. 2.035, parágrafo único) da função social do
contrato (CC, art. 421), da função social da propriedade (CF, arts. 5º, XXIII,
e 170, III, e CC, art. 1.228, § 1º), da função social da empresa (CF, art. 170;
CC, arts. 421 e 981) e da boa-fé objetiva (CC, art. 422); simulação de ato
ou negócio jurídico (CC, arts. 166, VII, e 167); b) processuais: condições da
ação e pressupostos processuais (CPC, arts. 3º, 267, IV, e V, 267, § 3º, 301, X,
30, § 4º); incompetência absoluta (CPC, art. 113, § 2º); impedimento do juiz
(CPC, arts. 134 e 136); preliminares alegáveis na contestação (CPC, art. 301
e § 4º); pedido implícito de juros legais (CPC, art. 293), juros de mora (CPC,
art. 219) e de correção monetária (Lei nº 6.899/81; TRF da 4ª R., 53); juízo
de admissibilidade dos recursos (CPC, art. 518, § 1º (...)’ (NERY Jr., Nelson;
NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação
extravagante. 10. ed. São Paulo: RT, 2007. p. 669). 3. A correção monetária
plena é mecanismo mediante o qual se empreende a recomposição da efetiva
desvalorização da moeda, com o escopo de se preservar o poder aquisitivo
original, sendo certo que independe de pedido expresso da parte interessada,
não constituindo um plus que se acrescenta ao crédito, mas um minus que se
evita. 4. A tabela única aprovada pela Primeira Seção desta Corte (que agrega
o Manual de Cálculos da Justiça Federal e a jurisprudência do STJ) enumera
os índices oficiais e os expurgos inflacionários a serem aplicados em ações de
compensação/repetição de indébito, quais sejam: (i) ORTN, de 1964 a janeiro
de 1986; (ii) expurgo inflacionário em substituição à ORTN do mês de fevereiro
de 1986; (iii) OTN, de março de 1986 a dezembro de 1988, substituído por

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


expurgo inflacionário no mês de junho de 1987; (iv) IPC/IBGE em janeiro de
1989 (expurgo inflacionário em substituição à OTN do mês); (v) IPC/IBGE em
fevereiro de 1989 (expurgo inflacionário em substituição à BTN do mês); (vi)
BTN, de março de 1989 a fevereiro de 1990; (vii) IPC/IBGE, de março de 1990
a fevereiro de 1991 (expurgo inflacionário em substituição ao BTN, de março
de 1990 a janeiro de 1991, e ao INPC, de fevereiro de 1991); (viii) INPC, de
março de 1991 a novembro de 1991; (ix) IPCA série especial, em dezembro
de 1991; (x) UFIR, de janeiro de 1992 a dezembro de 1995; e (xi) Selic (índi-
ce não acumulável com qualquer outro a título de correção monetária ou de
juros moratórios), a partir de janeiro de 1996 (Precedentes da Primeira Seção:
REsp 1.012.903/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, julgado
em 08.10.08, DJe 13.10.08; e EDcl no AgRg nos EREsp 517.209/PB, Rel. Min.
Luiz Fux, julgado em 26.11.08, DJe 15.12.08). 5. Deveras, ‘os índices que
representam a verdadeira inflação de período aplicam-se independentemente
do querer da Fazenda Nacional, que, por liberalidade, diz não incluir em seus
créditos’ (REsp 66.733/DF, Rel. Min. Garcia Vieira, Primeira Turma, julgado em
02.08.95, DJ 04.09.95). 6. O prazo prescricional para o contribuinte pleitear
a restituição do indébito, em se tratando de pagamentos indevidos efetuados
antes da entrada em vigor da Lei Complementar nº 118/05 (09.06.05), nos casos
dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, continua observando a
cognominada tese dos cinco mais cinco, desde que, na data da vigência da novel
268 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Lei Complementar, sobejem, no máximo, cinco anos da contagem do lapso


temporal (regra que se coaduna com o disposto no art. 2.028 do Código Civil
de 2002, segundo o qual ‘serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos
por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido
mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada’) (Precedente da Pri-
meira Seção submetido ao rito do art. 543-C do CPC: REsp 1.002.932/SP, Rel.
Min. Luiz Fux, julgado em 25.11.09). 7. Outrossim, o art. 535 do CPC resta
incólume quando o tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de
forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado
não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde
que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
8. Recurso especial fazendário desprovido. Acórdão submetido ao regime do
art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08.”
Assim, da leitura do acórdão supra, conclui-se estar superada a questão relativa
à incidência de correção monetária do crédito-prêmio de IPI pelos mesmos índices
utilizados pela Fazenda para atualização dos seus créditos.
Cabendo-me o novo exame da matéria, por força do disposto no art. 543-C, §
7º, II, do CPC, verifico ter na hipótese o acórdão recorrido divergido da orientação
da Corte Especial.
Destarte, de rigor exercer o juízo de retratação para adotar o entendimento
sufragado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.112.524/DF.
Ante o exposto, voto por não conhecer da apelação da União Federal, dar parcial
provimento à apelação do contribuinte e à remessa oficial, para fixar os critérios de
correção monetária na forma acima. Mantidos os demais termos do acórdão.
É como voto.
Desembargador Federal Mairan Maia – Relator
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO


Nº 0003791-03.2015.4.04.0000-RS
Segunda Turma (DEJF 16/10/2015)

Relator: Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona


Data do julgamento: 06/10/2015

77/11 — EMENTA: COOPERATIVA. LIQUIDAÇÃO. SUSPENSÃO DA


EXECUÇÃO FISCAL. DESCABIMENTO.
1. A liquidação extrajudicial de cooperativa não suspende a execução
fiscal, não incidindo, na espécie, o invocado art. 76 da Lei nº 5.764/71 (Lei
das Sociedades Cooperativas), mas, sim, os arts. 187 do CTN e 29 da Lei das
Execuções Fiscais.
2. Agravo legal desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade,
negar provimento ao agravo legal, nos termos do relatório, dos votos e das notas
taquigráficas, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 6 de outubro de 2015.
Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona – Relator
RELATÓRIO
Trata-se de agravo legal interposto em face de decisão monocrática que negou
seguimento ao agravo de instrumento, com base no art. 557, caput, do CPC.
A agravante defende que a matéria e o contexto probatório em apreço dos autos
não autorizam o julgamento monocrático. Aduz que as ações judiciais que tramitam
contra a cooperativa em fase de liquidação extrajudicial devem ser suspensas, ao teor
do art. 76 da Lei nº 5.764/71. Refere que, caso se entenda pela não suspensão dos
processos executivos, a sociedade cooperativa continuará à mercê de eventuais atos
expropriatórios. Requer a suspensão do executivo fiscal, de modo que não venha
a ser prejudicada a cooperativa agravante com a expropriação de bens que estejam
constritos judicialmente, enquanto perdurar a fase de liquidação voluntária.
É o relatório, no essencial.
Trago em mesa.
270 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

VOTO
A decisão que negou seguimento ao agravo de instrumento foi proferida nos
seguintes termos (fls. 200/201):
“Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Cotrijui – Cooperativa
Agropecuária & Industrial –, em liquidação, em face da decisão que indeferiu
o pedido de suspensão dos atos expropriatórios da execução fiscal. Eis o teor
da decisão recorrida (fl. 190):
‘Indeferido o pedido das fls. 123/137 formulado pela parte executada, uma
vez que a suspensão pleiteada não incide na regra do art. 76 da Lei nº 5.764/71.
Nesse sentido, colaciono jurisprudência:
‘AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. ICMS. EXE-
CUÇÃO FISCAL. PROCESSUAL CIVIL. COOPERATIVA. LIQUIDAÇÃO.
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL. DESCABIMENTO.
A liquidação extrajudicial de cooperativa não suspende a execução fiscal,
não incidindo, na espécie, o invocado art. 76 da Lei nº 5.764/71 (Lei das Socie-
dades Cooperativas), mas, sim, os arts. 187 do CTN e 29 da Lei das Execuções
Fiscais. Precedentes do STJ e desta Corte. Agravo de instrumento provido
de plano. Aplicação do art. 557, § 1º-A, do CPC.’ (Agravo de Instrumento
70062879358, Segunda Câmara Cível, TJRS, Rel. Ricardo Torres Hermann,
Julgado em 04.12.2014)
Intime-se.’
Alega a agravante, em suma, que não há outro caminho senão a suspen-
são do processo executivo fiscal, de modo que não venha a ser prejudicada a
cooperativa com a expropriação de bens que estejam constritos judicialmente,
enquanto perdurar a fase de liquidação voluntária.
É o relatório. Decido.
De fato, a execução fiscal não se suspende pela superveniência de liqui-
dação extrajudicial de cooperativa. Em que pese o art. 76 da Lei nº 5.764/71
estabelecer que a publicação da ata da assembleia geral da sociedade, que
deliberou sua liquidação, implicará a sustação de qualquer ação judicial
contra a cooperativa, pelo prazo de 1 (um) ano, é certo que a Lei nº 6.830/80
disciplina inteiramente o processo de execução fiscal, devendo prevalecer a
norma segundo a qual ‘a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública
não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata,
liquidação, inventário ou arrolamento’ (art. 29 da LEF).
Portanto, seja em virtude da aplicação do critério cronológico, seja em
atenção ao disposto no art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas de Direito
Brasileiro, o advento da Lei nº 6.830/80 produziu a revogação tácita do aludido
dispositivo da Lei nº 5.764/71 no concernente às execuções fiscais.
Cito precedentes do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema:
‘EXECUÇÃO FISCAL. FAZENDA PÚBLICA. LIQUIDAÇÃO DO EXE-
CUTADO. SUSPENSÃO. IMPOSSIBILIDADE. LEI Nº 6.830/80.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 271

1. A decretação de liquidação do executado não suspende a execução fiscal


em curso, pois o art. 29 da Lei nº 6.830/80 determina que a cobrança judicial
da dívida ativa da Fazenda Pública não está sujeita à liquidação.
2. A Lei de Execuções Fiscais, pelo princípio da especificidade, prevalece
sobre outras que tratam da suspensão da execução.
Precedentes.
3. Recurso especial a que se nega provimento.’ (REsp 738.455/BA, Rel. Min.
Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 09.08.05, DJ 22.08.05, p. 150)
‘TRIBUTÁRIA. RECURSO ESPECIAL. COOPERATIVA. LIQUIDAÇÃO
EXTRA JUDICIAL. SÚMULA Nº 83/STJ.
1. A execução fiscal não se suspende pela liquidação extrajudicial da
cooperativa.
2. ‘Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orien-
tação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’ (Súmula
nº 83/STJ).
3. Recurso especial não conhecido.’ (REsp 151.259/SP, Rel. Min. Castro
Meira, Segunda Turma, julgado em 26.04.05, DJ 01.07.05, p. 456)
‘PROCESSUAL. COOPERATIVA EM LIQUIDAÇÃO. EXECUTIVO
FISCAL. SUSPENSÃO DO PROCESSO (LEI Nº 5.764/71, ART. 76). IMPOS-
SIBILIDADE.
I – A Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80) disciplina, por inteiro,
o procedimento da cobrança judicial dos créditos estatais.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


O sistema por ela consagrado só admite suspensão do processo executivo,
na hipótese prevista em seu art. 40.
II – O art. 76 da Lei nº 5.671/71 não se aplica ao processo de execução
fiscal.’ (REsp 79.683/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma,
julgado em 18.03.96, DJ 13.05.96, p. 15.532)
Assim, merece ser mantida a decisão, determinando-se o regular prosse-
guimento do feito executivo.
Ante o exposto, nego seguimento ao agravo de instrumento, com fulcro no
art. 557 do CPC, nos termos da fundamentação.
Publique-se.
Intimem-se.”
Com efeito, a decisão agravada não merece reparos, uma vez que proferida nos
exatos termos do caput do art. 557 do CPC, que assim dispõe: “O relator negará
seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou
em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal,
do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior”.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo legal.
Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona – Relator
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012361-53.2010.4.05.8300-PE


Primeira Turma (DEJF 08/09/2015)

Relator: Desembargador Federal Convocado Rubens de Mendonça Canuto


Data do julgamento: 27/08/2015

77/12 — EMENTA: IMPOSTO SOBRE PRODUTO INDUSTRIALIZADO


– IPI. ISENÇÃO. VEÍCULO ADQUIRIDO POR PORTADOR DE DEFICIÊNCIA
FÍSICA. LEI Nº 8.989/95, ART. 1º, INCISO IV, § 1º. POSSIBILIDADE.
Preliminar de falta de interesse de agir, em virtude da ausência de pe-
dido administrativo, rechaçada. Legítima a propositura da presente demanda
diante do laudo de avaliação de deficiência física, emitido pelo Detran/PE, em
18.05.2010, asseverando não ter a autora necessidade de adaptação veicular.
Ademais, a Fazenda Nacional em nenhuma etapa do processo acostou-se à tese
autoral, restando, assim, caracterizada a pretensão resistida.
O art. 1º, IV, § 1º, da Lei nº 8.989/95 traz disposição expressa quanto
à isenção do Imposto sobre Produtos Industrializado – IPI, na aquisição de
automóveis por pessoas portadoras de deficiência física.
Comprovação da existência de deficiência física por parte da autora ates-
tada em laudo médico pericial, onde restou asseverado que a mesma não está
apta a dirigir um veículo convencional de câmbio manual, sem prejuízo algum
à sua saúde e às suas limitações físicas, em virtude de apresentar linfedema de
membro superior direito e redução da força no mesmo, necessitando de uma
adaptação no câmbio de marcha para que não realize esforço físico.
Apelação e remessa desprovidas.

ACÓRDÃO
Vistos, etc.
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por una-
nimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório,
voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Recife, 27 de agosto de 2015 (Data do Julgamento).
Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto – Relator Convocado
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 273

RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto (Convocado):
Trata-se de apelação e remessa oficial de sentença que julgou procedente pedido
formulado por Édila de Araújo Lira Soares, em ação declaratória de isenção tribu-
tária c/c indenização por danos morais, visando ver reconhecido direito à isenção
tributária de IPI e ICMS, na compra de veículo novo adaptado, nos termos do art.
1º, § 1º, da Lei nº 8.989/95 e do Convênio ICMS nº 03/07, bem como a condenação
do Detran/PE em danos morais.
O douto sentenciante extinguiu a presente demanda quanto ao Detran/PE e ao
Estado de Pernambuco, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, inciso IV,
do CPC, em face da incompetência absoluta. Julgou procedente o pedido autoral,
isentando a autora do recolhimento do IPI, na compra de um veículo novo adaptado.
Honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais), nos termos do
art. 20, § 4º, do CPC.
Apelação da Fazenda Nacional alegando, em preliminar, falta de interesse de
agir, em virtude de ausência de pedido administrativo à Delegacia da Receita Fede-
ral do Brasil a atestar a ausência de pretensão resistida. No mérito, assevera que o
laudo médico mais recente do Detran concluiu que a autora não era portadora de
deficiência física, não tendo sido feita prova contrária deste fato.
Apesar de devidamente intimada, a apelada não apresentou contrarrazões.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


É o relatório.

VOTO
O Sr. Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto (Convocado):
O ponto nodal da presente querela cinge-se ao reconhecimento do direito à
isenção tributária de IPI na compra de veículo novo.
Preambularmente, rechaço a preliminar de falta de interesse de agir, em virtude
da ausência de pedido administrativo à Delegacia da Receita Federal do Brasil. Legí-
tima a propositura da presente demanda diante do laudo de avaliação de deficiência
física, emitido pelo Detran/PE, em 18.05.2010, asseverando não ter a autora neces-
sidade de adaptação veicular. Ademais, a Fazenda Nacional em nenhuma etapa do
processo acostou-se à tese autoral, restando, assim, caracterizada a pretensão resistida.
Alega a autora apresentar problemas de saúde relativos à debilidade funcional
permanente por lesão nervosa após cirurgias realizadas em decorrência de tratamento
de câncer de mama. Em virtude do seu estado de saúde, chegou a ter reconhecido
o direito à aquisição de um veículo automotor adaptado, um HondaFT LX, com a
isenção de IPI e ICMS, nos moldes da legislação de regência. Todavia, por ocasião
274 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

da troca daquele veículo, foi emitido laudo pericial do Detran/PE, asseverando que
não havia necessidade de adaptação veicular para a autora.
Foram carreados aos autos cópias de laudos médicos periciais, todos emitidos
pelo Detran/PE, com conclusões contraditórias. Vejamos trechos dos referidos docu-
mentos: 1) emitido em 29.07.03: “Parecer: Deverá dirigir veículo automático com dire-
ção hidráulica, vidros elétricos e ar condicionado (...)” (fl. 35); 2) emitido em 09.05.05:
“Parecer: Apta dirigir veículo automático” (fl. 40); 3) emitido em 03.04.06: “Parecer:
Apta a dirigir veículo automático. Impossibilidade de dirigir veículo convencional” (fl.
39); e 4) emitido em 18.05.2010: “Não há necessidade de adaptação veicular” (fl. 38).
Ante tais elementos contraditórios, foi deferida pelo Juízo de origem a reali-
zação de prova pericial, para que fossem dirimidas possíveis dúvidas e contradições
existentes quanto ao estado de saúde da requerente.
O laudo acostado aos autos às fls. 166/171, em resposta aos quesitos produzidos
pelas partes, é de compreensão cristalina, asseverando que a autora tem limitações
funcionais. Ademais, ao responder a questionamento se a mesma estaria apta a dirigir
um veículo convencional de câmbio manual sem prejuízo algum à sua saúde e às
suas limitações físicas, foi peremptório ao afirmar que não. Respondendo a outros
quesitos, a perita asseverou, ainda, que a autora apresenta linfedema de membro
superior direito e redução da força no mesmo, necessitando de uma adaptação no
câmbio de marcha para que não realize esforço físico.
Destarte, resta inconteste a necessidade da autora em adquirir um veículo
adaptado, para seu maior conforto e segurança, dado os problemas de saúde que
detém. Vejamos o que preconiza a Lei nº 8.989/95, que dispõe sobre a isenção do
Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, na aquisição de automóveis por
pessoas portadoras de deficiência física.
“Art. 1º Ficam isentos do Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI
os automóveis de passageiros de fabricação nacional, equipados com motor de
cilindrada não superior a dois mil centímetros cúbicos, de no mínimo quatro
portas inclusive a de acesso ao bagageiro, movidos a combustíveis de origem
renovável ou sistema reversível de combustão, quando adquiridos por: (Re-
dação dada pela Lei nº 10.690, de 16.6.2003) (Vide art 5º da Lei nº 10.690,
de 16.6.2003)
(...)
IV – pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou
profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante
legal; (Redação dada pela Lei nº 10.690, de 16.6.2003)
§ 1º Para a concessão do benefício previsto no art. 1º é considerada
também pessoa portadora de deficiência física aquela que apresenta alteração
completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando
o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraple-
gia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia,
triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, pa-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 275

ralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as


deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho
de funções. (Incluído pela Lei nº 10.690, de 16.6.2003)”
De acordo com os dispositivos legais acima transcritos os compradores de
veículos portadores de deficiência física ficam isentos do IPI, desde que comprovem
suas debilidades. In casu, restou devidamente comprovado que a autora necessita
de um veículo com câmbio automático, devendo haver a aplicação da benesse fiscal
com relação ao não recolhimento do IPI.
Assim sendo, mantenho a sentença por todos os fundamentos, negando pro-
vimento à apelação e à remessa oficial.
É como voto.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2015.00.2.017998-3


Sexta Turma Cível (DJDFTE 07/10/2015)

Relator: Desembargador José Divino


Data do julgamento: 23/09/2015

77/13 — EMENTA: EXECUÇÃO. PENHORA. BEM ESSENCIAL AO


EXERCÍCIO DA ATIVIDADE PROFISSIONAL. IMPENHORABILIDADE.
ART. 649, V, DO CPC.
I – Nos termos do art. 649, V, do CPC, são absolutamente impenhoráveis
os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros
bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão.
II – Assim, é absolutamente impenhorável o veículo comprovadamente
indispensável ao exercício da profissão do executado.
III – Deu-se provimento ao recurso.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores da Sexta Turma Cível do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal e Territórios, José Divino – Relator, Vera Andrighi – 1º
Vogal, Hector Valverde – 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador
Hector Valverde, em proferir a seguinte decisão: conhecido. Provido. Unânime, de
acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 23 de setembro de 2015.
Desembargador José Divino – Relator
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento da decisão de fl. 297 que, nos autos da ação
de execução movida por D.M.L.N., deferiu o pedido de penhora do veículo Ford
7000, placa XXX-XXX, ano 1979, de propriedade de G.B.S.
Em suas razões recursais, o agravante sustenta, em síntese, a impenhorabilidade
do bem, porquanto necessário ao exercício da sua atividade profissional, nos termos
do art. 649, inciso V, do CPC. Pede a atribuição de efeito suspensivo e a reforma da
decisão impugnada.
O recurso foi recebido no efeito suspensivo.
As informações foram dispensadas.
O recurso não foi contrariado.
É o relatório.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 277

VOTOS
O Senhor Desembargador José Divino (Relator):
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Trata-se de agravo de instrumento da decisão que, nos autos da ação de exe-
cução movida por D.M.L.N., deferiu o pedido de penhora do veículo Ford 7000,
placa XXX-XXXX, ano 1979, de propriedade de G.B.S.
O art. 649, V, do CPC prevê a impenhorabilidade absoluta dos livros, máquinas,
ferramentas, utensílios, instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis
ao exercício de qualquer profissão.
No caso, há indícios de que o bem constrito, um caminhão antigo, da marca
Ford, modelo 7000, é essencial ao desempenho da atividade laboral exercida pelo
agravante.
Com efeito, há informações nos autos de que o agravante é motorista (fl. 130v),
ao passo que o bem penhorado é um caminhão, catalogado como sendo “veículo de
aluguel” (fl. 288), cuja definição legal, nos termos do art. 135 do CTB, é de bem des-
tinado ao transporte de passageiros ou empregados em qualquer serviço remunerado.
Essas características, portanto, permitem deduzir que o agravante realmente
o utiliza como instrumento do seu trabalho, a autorizar a invocação da norma
mencionada.
Nesse sentido:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. HONO-
RÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. AUMENTO. CABIMENTO. BENS MÓVEIS
NECESSÁRIOS OU ÚTEIS AO EXERCÍCIO DE QUALQUER PROFISSÃO.
PENHORABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. ART. 649, V, DO CPC. SENTENÇA
PARCIALMENTE REFORMADA.
1. Conforme disposto no art. 649, V, do CPC, são absolutamente impe-
nhoráveis os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos
ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão.
2. É impenhorável o veículo que se mostra útil ao exercício da profissão,
art. 649, V, do CPC.
(...)
4. Apelação do embargante conhecida e provida. Apelação do embargado
conhecida e desprovida.”(1)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PENHORA. BENS ÚTEIS
OU NECESSÁRIOS AO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE EMPRESARIAL. IMPOS-
SIBILIDADE. ART. 649, V, DO CPC.

(1)
Acórdão 814.472, 20130110504816APC, Rel. Sebastião Coelho, Rev. Sandoval Oliveira, 5ª Turma
Cível, j. 20.08.2014, DJE 29.08.2014, p. 132.
278 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

O art. 649, V, do Código de Processo Civil estabelece a impenhorabilidade


absoluta dos livros, máquinas, ferramentas, utensílios, instrumentos ou outros
bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão.
Agravo conhecido e provido.”(2)
Ante o exposto, dou provimento ao recurso, para, reformando a respeitável de-
cisão, afastar a constrição sobre o veículo Ford 7000, placa XXX-XXXX, ano 1979.
É como voto.
A Senhora Desembargadora Vera Andrighi – Vogal
Com o Relator.
O Senhor Desembargador Hector Valverde – Vogal
Com o Relator.

DECISÃO
Conhecido. Provido. Unânime.

(2)
Acórdão 724.707, 20130020170753AGI, Relª Ana Maria Duarte Amarante Brito, 6ª Turma Cível, j.
16.10.2013, DJE 22.10.2013, p. 130.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0013914-10.2015.8.19.0000


Oitava Câmara Cível (DORJ 18/09/2015)

Relator: Desembargador Cezar Augusto Rodrigues Costa


Data do julgamento: 15/09/2015

77/14 — EMENTA: AÇÃO DE INVENTÁRIO. TERMO DE INVENTA-


RIANÇA. REQUERIMENTO DE ASSINATURA PELO PATRONO. DECISÃO
QUE INDEFERIU O PEDIDO POR ENTENDER O JUÍZO QUE A REPRESEN-
TAÇÃO DO ESPÓLIO DEVE SER FEITA PELA PESSOA DO INVENTARIANTE.
Requer o inventariante que o juízo de origem permita que o termo de
inventariança seja assinado por seu patrono, uma vez que não possui condições
de se deslocar até o juízo, costuma viajar a trabalho e dificilmente se encontra no
Município do Rio de Janeiro durante os dias úteis, tendo, inclusive, outorgado
procuração a seu advogado com poderes especiais e específicos para este fim.
Estabelece o art. 38 do Código de Processo Civil que “a procuração geral
para o foro, conferida por instrumento público, ou particular assinado pela parte,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para receber citação
inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar
ao direito sobre que se funda a ação, receber, dar quitação e firmar compromisso”.
Assim, temos que o citado artigo excepciona expressamente os atos que
não estão incluídos nos poderes para o foro em geral, entre eles o de firmar
compromisso, o que engloba o ato de assinar o termo de inventariança.
Como há na procuração conferida ao patrono do agravante poder especí-
fico para este fim, temos que não há motivo para que o pedido seja indeferido.
Sendo assim, merece reforma a decisão agravada.
Recurso conhecido e provido para autorizar que o advogado do agravante
assine o termo de inventariança.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento 0013914-


10.2015.8.19.0000 em que é agravante Marcelo Generoso Martins da Costa.
Acordam os Desembargadores da Oitava Câmara Cível, por unanimidade, em
conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Excelentíssimo
Senhor Desembargador-Relator.
Rio de Janeiro, 15 de setembro de 2015.
Desembargador Cezar Augusto Rodrigues Costa – Relator
280 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão, item 00002 do
anexo, que segue in verbis:
“Fl. 53 – J. Indefiro, eis que a representação do espólio é feita pela pessoa
do inventariante. Daí o porquê faz-se necessário que o termo seja subscrito pelo
próprio inventariante. Cumpra-se o despacho de fl. 52. Intime-se.”
Alega o recorrente, em síntese, que na forma do disposto no art. 38 do Código
de Processo Civil a procuração geral basta para que o patrono possa firmar o termo
de inventariança em nome de seu outorgante, e esta procuração consta dos autos à
fl. 05, inclusive com poderes específicos e especiais; que se faz necessário fazer prova
da presente inventariança junto ao MM. Juízo da 11ª Vara de Órfãos e Sucessões
da Comarca da Capital; processo de inventário de Jose Martins da Costa, 0117225-
87.2012.8.19.0001, o qual se encontra em fase final, eis que já possui a concordância
dos doutos representantes do Ministério Público e da Fazenda Estadual.
Decisão do Relator no item 00012. Petições do agravante, itens 00016 e 00023.
Informações pelo juízo, item 00026, mantendo a decisão agravada e informando que
foi assinado o termo de inventariança. Despacho do Relator, item 00036, para que o
agravante informe se persiste o interesse recursal. Petição pelo agravante no sentido de
que o presente agravo não se encontra prejudicado, pois será necessária a expedição
de novo termo de inventariança com a colheita de nova assinatura do termo. Parecer
pela Procuradoria de Justiça, item 00040, pelo conhecimento e provimento do recurso.
VOTO
O recurso interposto é tempestivo e ostenta os demais requisitos de admissi-
bilidade, razão por que o conheço.
Requer o inventariante que o juízo de origem permita que o termo de inventa-
riança seja assinado por seu patrono, uma vez que não possui condições de se deslocar
até o juízo e que costuma viajar a trabalho e dificilmente se encontra no Município
do Rio de Janeiro durante os dias úteis, tendo, inclusive, outorgado procuração a
seu advogado com termos especiais e específicos para este fim.
Estabelece o art. 38 do Código de Processo Civil que “a procuração geral
para o foro, conferida por instrumento público, ou particular assinado pela parte,
habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para receber citação
inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar
ao direito sobre que se funda a ação, receber, dar quitação e firmar compromisso”.
Assim, temos que o citado artigo excepciona expressamente os atos que não
estão incluídos nos poderes para o foro em geral, entre eles o de firmar compromisso,
o que engloba o ato de assinar o termo de inventariança. Como há na procuração
conferida ao patrono do agravante, item 00001 do anexo, poder específico para
este fim, temos que não há motivo para que o pedido seja indeferido. Sendo assim,
merece reforma a decisão agravada.
Diante do exposto, voto pelo conhecimento e provimento do recurso para autorizar
que o advogado do agravante assine o termo de inventariança.
Rio de Janeiro, 15 de setembro de 2015.
Desembargador Cezar Augusto Rodrigues Costa – Relator
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0344747-30.2015.8.21.7000


Vigésima Terceira Câmara Cível (DJERS 08/10/2015)

Relatora: Desembargadora Ana Paula Dalbosco


Data do julgamento: 05/10/2015

77/15 — EMENTA: NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMBARGOS


À EXECUÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO.
1. A outorga de efeito suspensivo aos embargos à execução está condicio-
nada à existência cumulativa dos requisitos elencados no § 1º do art. 739-A do
Código de Processo Civil, quais sejam a relevância da fundamentação, o risco
de dano grave ou de difícil reparação e a garantia do juízo.
2. Constatado o preenchimento de todos os requisitos legais para a atri-
buição do efeito suspensivo postulado, imperiosa a sua concessão.
Agravo de instrumento provido.
DECISÃO MONOCRÁTICA

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


Vistos.
Pescador Comércio e Transporte de Gás Ltda. e Luis Roberto Pescador de Lucena
interpõem agravo de instrumento contra decisão que indeferiu o efeito suspensivo aos
embargos à execução opostos em face de Itaú Unibanco S/A.
Em suas razões, aduzem os agravantes estarem preenchidos os requisitos ne-
cessários à concessão do efeito suspensivo postulado. Discorreram sobre a relevância
dos argumentos invocados, bem como o risco de dano grave com o prosseguimento
do feito executivo. Requereram o provimento do recurso, com a reforma da decisão.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
Decido.
É de ser conhecido o agravo de instrumento interposto, pois atendidos os
pressupostos de admissibilidade, o recurso é próprio e há interesse e legitimidade
para tanto. Ademais, foi apresentado tempestivamente e devidamente preparado.
Compulsando os autos, outrossim, verifica-se ser hipótese de conhecimento e
julgamento imediato do agravo de instrumento, em conformidade com o que dispõe
o art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, consoante entendimento consoli-
dado deste Colegiado e de outros órgãos fracionários desta Corte sobre o assunto.
Com efeito, o § 1º do art. 739-A, com a nova redação dada pela Lei nº 11.382,
de 06.12.06, em vigor desde 21.01.07, estabelece que
282 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“o juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo


aos embargos quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento
da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil
ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora,
depósito ou caução suficientes.”
Discorrendo sobre esse preceito, elucidam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio
Cruz Arenhart que:
“A segurança do juízo – que pode ocorrer por penhora, depósito ou caução
suficientes – não é mais condição para a apresentação de embargos à execução.
Tomou-se apenas pressuposto para a outorga de efeito suspensivo a estes em-
bargos (art. 739-A, § 1º, do CPC), ou seja, no regime atual o devedor pode opor
embargos do executado independentemente da penhora de seus bens. Porém,
só poderá pleitear a atribuição de efeito suspensivo aos embargos – de modo a
paralisar a execução enquanto discute o direito demandado – quando o juízo
estiver garantido por penhora, depósito ou caução suficientes.” (In: Curso de
processo civil: execução. São Paulo: RT, 2007. v. 3, parte IX, cap. 4, nº 4.2, p. 449)
No mesmo sentido, leciona Humberto Theodoro Júnior:
“Em caráter excepcional, o juiz é autorizado a conferir efeito suspensivo
aos embargos do executado (art. 739-A, § 1º). Não se trata, porém, de um
poder discricionário. Para deferimento de semelhante eficácia, deverão ser
conjugados os seguintes requisitos, todos de presença necessária e cumulativa:
a) os fundamentos dos embargos deverão ser relevantes, ou seja, a defesa
oposta à execução deve se apoiar em fatos verossímeis e em tese de direito
plausível; em outros termos, a possibilidade de êxito dos embargos deve
insinuar-se como razoável; é algo equiparável ao fumus boni iuris exigível para
as medidas cautelares; b) o prosseguimento da execução deverá representar,
manifestamente, risco de dano grave para o executado, de difícil ou incerta
reparação (...); c) deve, ainda, estar seguro o juízo antes de ser a eficácia sus-
pensiva deferida; (...)” (In: Processo de execução e cumprimento de sentença. 26.
ed. São Paulo: Leud, 2009. p. 428)
Assim, a outorga de efeito suspensivo aos embargos está condicionada à exis-
tência cumulativa dos requisitos mencionados no § 1º do art. 739-A do Código de
Processo Civil, quais sejam a relevância da fundamentação, o risco de dano grave
ou de difícil reparação e a garantia do juízo.
Acerca do tema, já se pronunciou este órgão fracionário:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS.
PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE
CRÉDITO BANCÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AÇÃO REVISIONAL.
EFEITO SUSPENSIVO. AUSÊNCIA DE REQUISITOS EXIGIDOS JUNTO AO
ART. 739-A DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Inexistindo a garantia do juí-
zo, nos termos do art. 739-A do Código de Processo Civil, inviável a concessão
de efeito suspensivo aos embargos à execução. Trata-se de requisito objetivo
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 283

para afastar a regra geral de inexistência de efeito suspensivo aos embargos.


O simples ajuizamento de ação revisional não gera, por si só, a suspensão do
processo executivo. No caso, não houve perfectibilização de penhora para
garantia do juízo. Agravo de instrumento provido.” (TJRS, Agravo de Instru-
mento 70060798907, 23ª C.Cív., Rel. Alberto Delgado Neto, j. 29.10.2014)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS.
EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONCESSÃO DE
EFEITO SUSPENSIVO. NÃO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DO
ART. 739-A, § 1º, DO CPC. A concessão de efeito suspensivo aos embargos à
execução de título extrajudicial está condicionada ao cumprimento cumula-
tivo dos requisitos contidos no § 1º do art. 739-A do CPC. Caso concreto em
que, todavia, além de não serem relevantes os fundamentos expendidos, não
foi comprovada a existência de penhora de bens suficientes para garantir a
execução, e tampouco demonstrado que o seu prosseguimento causará grave
dano de difícil ou incerta reparação. Precedentes deste Tribunal. Agravo de
instrumento desprovido.” (TJRS, Agravo de Instrumento 70060608312, 23ª
C.Cív., Rel. Carlos Eduardo Richinitti, j. 30.09.2014)
“AGRAVO INTERNO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMBARGOS
À EXECUÇÃO. NOTA DE CRÉDITO COMERCIAL. INDEFERIMENTO DE PEDI-
DO DE EFEITO SUSPENSIVO À EXECUÇÃO. DECISÃO MANTIDA. Uma vez não
estando garantida a execução e ausentes fundamentos relevantes demonstrativos
de risco de dano irreparável ou de difícil reparação em caso de prossseguimento
dos atos executórios (art. 739-A, § 1º, do CPC), é de rigor a confirmação do ato

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


judicial agravado. Possível a aplicação do art. 557, caput, do CPC quando a decisão
agravada está em consonância com o entendimento da Câmara, como no caso.
Precedentes. Agravo interno desprovido. Unânime.” (TJRS, Agravo 70061290888,
23ª C.Cív., Rel. Clademir José Ceolin Missaggia, j. 28.10.2014)
No caso específico dos autos, constatado o atendimento de todos os requisitos
legais para a atribuição do efeito suspensivo postulado, estando garantido o juízo
e havendo relevância nos fundamentos invocados pela parte (os quais envolvem,
entre outros, a própria inexistência do débito), além do risco de dano grave ou de
difícil reparação com o prosseguimento do feito expropriatório (veja-se que os bens
oferecidos em garantia ao juízo constituem o próprio negócio da parte embargante),
imperiosa a reforma da decisão agravada.
Diante de todo o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, nos termos
do art. 557, § 1º-A, do CPC, a fim de conceder o efeito suspensivo aos embargos
opostos.
Intimem-se.
Comunique-se o juízo de origem.
Dil. legais.
Porto Alegre, 5 de outubro de 2015.
Desembargadora Ana Paula Dalbosco – Relatora
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2012.086690-0


Câmara Especial Regional de Chapecó (DJSC 09/10/2015)

Relatora: Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho


Data do julgamento: 28/09/2015

77/16 — EMENTA: AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA


EM DEPÓSITO. LOCALIZAÇÃO DO VEÍCULO. DECISÃO QUE INDEFERIU
O PEDIDO DE EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO EM
RAZÃO DA CONVERSÃO DO PROCEDIMENTO. POSSIBILIDADE. INTE-
LIGÊNCIA DO ART. 905 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RESGUARDO
DO PRINCIPAL INTERESSE DA PARTE AO INGRESSAR COM A DEMANDA.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
É plenamente possível o cumprimento da liminar se o bem é localizado
após a conversão do pedido de busca e apreensão em ação de depósito.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento


2012.086690-0, da Comarca de Chapecó (4ª Vara Cível), em que é agravante CNF
Administradora de Consórcios Nacional Ltda., e agravado Volmar Maciel de Oliveira:
A Câmara Especial Regional de Chapecó decidiu, por unanimidade, conhecer
do recurso e dar-lhe provimento.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo excelentíssimo Senhor
Desembargador Raulino Jacó Brüning, com voto, e dele participou o excelentíssimo
Senhor Desembargador Luiz Felipe Siegert Schuch.
Chapecó, 28 de setembro de 2015.
Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho – Relatora

RELATÓRIO
CNF Administradora de Consórcios Nacional Ltda. interpôs agravo de ins-
trumento contra a decisão interlocutória proferida na ação de busca e apreensão
convertida em depósito nº 018.10.001576-7, a qual indeferiu o pedido de expedição
de mandado de busca e apreensão (fl. 191).
Sustenta o agravante a possibilidade de cumprimento da liminar anteriormente
concedida, independentemente da conversão da busca e apreensão em depósito.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 285

Pleiteia, dessa feita, a reforma da decisão agravada, a fim de que seja determi-
nada a expedição do mandado para a formalização da apreensão do veículo objeto
da lide (fls. 2-10).
Ausente pedido liminar admitiu-se o processamento do agravo na forma de
instrumento (fl. 198).
Ausente a triangularização processual, o agravado deixou de ser intimado.
Vieram conclusos os autos para julgamento.
Este é o relatório.

VOTO
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Sustenta o agravante ser possível o cumprimento do mandado de busca e
apreensão do veículo alienado fiduciariamente, mesmo após a conversão da ação
em depósito.
Antecipo que razão lhe assiste.
O Decreto-Lei nº 911/69, faculta ao credor, quando frustrada a liminar de busca
e apreensão, a conversão do feito em ação de depósito ou de execução (arts. 4º e 5º).
Essas duas possibilidades visam remediar a ausência do bem para a satisfação
do crédito inadimplido, possibilitando ao credor a execução direta, com a penhora
e alienação de bens, ou a sentença de depósito, com a ordem de entrega do objeto

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


ou devolução do equivalente em dinheiro.
Com efeito, os procedimentos previstos nos arts. 4º e 5º da referida norma
são subsidiários ao pleito principal da ação de busca e apreensão, que objetiva a
retomada do bem, possibilitando posteriormente a sua alienação para a satisfação
do crédito inadimplido.
Desta feita, não há, no caso sub judice, a modificação da causa de pedir, por-
quanto o pleito principal não se extingue com a conversão do procedimento.
A propósito, leciona Theotônio Negrão:
“Se o bem é localizado após a conversão do pedido de busca e apreensão
em ação de depósito, admite-se a sua busca e apreensão (RT 799/285).” (NE-
GRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. São
Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.095)
No mesmo sentido é a jurisprudência desta Corte de Justiça:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO
CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CITAÇÃO DO DEVEDOR E POSTERIOR
LOCALIZAÇÃO DO VEÍCULO. INTERLOCUTÓRIA INDEFERINDO O
DESENTRANHAMENTO DO MANDADO DE RETOMADA DO BEM, EM
FACE DA TRANSMUDAÇÃO DA LIDE. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA. ACOLHIMENTO. POSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO DA
286 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

LIMINAR DEFERIDA NOS AUTOS DA AÇÃO ORIGINÁRIA DO DL Nº 911/69,


MESMO QUANDO OPERADA SUA CONVERSÃO NOS MOLDES DO ART. 4º
DO ALUDIDO DIPLOMA. RESGUARDO AO INTERESSE FUNDAMENTAL
DA AUTORA AO MOVER A DEMANDA, QUE CONSISTE PRECISAMENTE
NA APREENSÃO E VENDA DO VEÍCULO PARA SATISFAÇÃO DO CRÉDITO
INADIMPLIDO. APLICAÇÃO, ADEMAIS, DO PRINCÍPIO DA ECONOMIA
PROCESSUAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. ‘Se o bem é localizado
após a conversão do pedido de busca e apreensão em ação de depósito, admite-
se a sua busca e apreensão (RT 799/285)’ (NEGRÃO, Theotônio. Código de
Processo Civil e legislação processual em vigor. São Paulo: Saraiva, 2003. p.
1.095).” (TJSC, AI 2007.017612-8, Chapecó, Rel. Des. Marco Aurélio Gastaldi
Buzzi, j. 08.11.07)
Ademais, o art. 905 do Código de Processo Civil, mutatis mutandis, prevê que,
sem prejuízo do depósito (...), é lícito ao autor promover a busca e apreensão da coisa.
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe provimento.
Este é o voto.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2180550-34.2015.8.26.0000


34ª Câmara de Direito Privado (DJESP 09/10/2015)

Relator: Desembargador Gomes Varjão


Data do julgamento: 30/09/2015

77/17 — EMENTA: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS.


AÇÃO INDENIZATÓRIA EM FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.
FRAUDE À EXECUÇÃO CARACTERIZADA. ALIENAÇÃO, PELO EXECU-
TADO, DE BENS IMÓVEIS AOS FILHOS APÓS O TRÂNSITO EM JULGA-
DO DO ACÓRDÃO QUE CONFIRMOU A SENTENÇA CONDENATÓRIA,
REDUZINDO-O À INSOLVÊNCIA. EXEGESE DO ART. 593, II, DO CÓDIGO
DE PROCESSO CIVIL.
Irrelevância do fato de o negócio ter sido praticado antes do início da fase
executória, pois naquele momento não pairavam mais dúvidas a respeito da
obrigação do agravante de pagar ao agravado a quantia estabelecida no título
judicial passado em julgado. Conluio do alienante e adquirentes para frustrar

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


a execução evidenciado. Imposição de multa por ato atentatório à dignidade
da justiça que atende ao preceito expresso e objetivo do art. 600, I, da Lei
Processual. Penalidade mantida em 20% do valor atualizado do débito, dada
a gravidade da conduta do executado.
Recurso improvido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento 2180550-
34.2015.8.26.0000, da Comarca de Novo Horizonte, em que é agravante Nabih
Nehmetallah Najm, é agravado Aparecido Donizete Ruiz.
Acordam, em 34ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São
Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos exmos. Desembargadores Gomes Varjão
(Presidente), Nestor Duarte e Cristina Zucchi.
São Paulo, 30 de setembro de 2015.
Desembargador Gomes Varjão – Relator
288 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Trata-se de agravo de instrumento tirado contra decisão que, em ação indeni-


zatória em fase de cumprimento de sentença, reconheceu a ocorrência de fraude à
execução, tornou ineficaz a venda do imóvel objeto da Matrícula nº 5.011 do CRI
de Novo Horizonte, determinando sua penhora, e aplicou ao executado multa por
ato atentatório à dignidade da justiça, correspondente a 20% do valor atualizado
do débito (fls. 56/57).
Alega o agravante, em suma, que, nos termos da Súmula nº 375 do STJ, o reco-
nhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado
ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. Sustenta que deve ser verificado não
apenas se a alienação ou oneração praticada após o ajuizamento da ação era capaz de
levar o devedor à insolvência, mas também se esta não agride ato jurídico perfeito,
para dar segurança aos terceiros de boa-fé. Afirma que é impossível ao terceiro tomar
conhecimento de ações contra o alienante sem o registro destas, pelo exequente, na
matrícula do imóvel, em conformidade com o art. 615-A do CPC. Ressalta que, no
caso vertente, a alienação ocorreu em 29.04.2013, antes da intimação para cumpri-
mento do art. 475-J do CPC, em 22.11.2013, de modo que, à época, não era formal-
mente devedor e nada impedia o negócio. Aduz que, nos termos do art. 54 da Lei
nº 13.097/2015, não podem ser opostas ao adquirente de boa-fé situações jurídicas
não constantes da matrícula no Registro de Imóveis. Defende que a venda do bem
aos seus filhos foi negócio legítimo, sendo que eles utilizam parte do imóvel para
o desempenho de suas atividades profissionais e o restante para residência de sua
ex-esposa, de quem se encontra separado de fato há muito tempo. Assinala que não
se pode admitir a presunção de má-fé apenas pelo fato de que a transmissão ocorreu
entre genitor e filhos. Destaca que ofereceu à penhora os rendimentos locatícios
que recebe, razão pela qual não havia necessidade de declaração de fraude, diante
da possibilidade de satisfação do crédito sem prejuízo ao devedor, pessoa idosa, em
atendimento ao comando do art. 620 do CPC. Alega que nunca teve a intenção de
fraudar a execução e, levantada a constrição, pela inocorrência de fraude, não subsiste
fundamento para a manutenção da multa aplicada pelo Juízo a quo, até por que a
alienação ocorreu antes de iniciada a fase de cumprimento de sentença. Argumenta
que, eventualmente mantida a multa, deve ser reduzida, pois fixada em porcentual
excessivo. Sob tais fundamentos, requer a reforma da r. decisão agravada.
Recebido o recurso no efeito suspensivo (fl. 74) e contrariado (fls. 82/98), a
lide está em termos para julgamento.
É o relatório.
Em que pesem os argumentos declinados nas razões recursais, a r. decisão
agravada deve ser confirmada, com exceção do porcentual da multa, que de fato
revela-se excessivo.
Ainda que a alienação do imóvel objeto da matrícula nº 5.011 do CRI de Novo
Horizonte tenha ocorrido antes da intimação do agravante para cumprimento vo-
luntário da condenação, nos termos do art. 475-J do CPC, isso não é óbice para o
reconhecimento da fraude à execução.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 289

Dispõe o art. 593, II, do Código de Processo Civil: “Considera-se em fraude de


execução a alienação ou oneração de bens: (...) II – quando, ao tempo da alienação
ou oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência”.
Oportuno observar que, conforme já se decidiu no âmbito do e. Superior Tri-
bunal de Justiça, o termo “demanda” a que alude o art. 593, II, do CPC não remete
necessariamente ao processo autônomo de execução ou à fase executória já iniciada,
mas também ao processo de conhecimento(1), de modo que a fraude à execução pode
ser reconhecida mesmo quando a alienação de bens do devedor antecede o início
da fase de cumprimento de sentença.
No caso vertente, o recorrente vendeu o imóvel em questão aos seus filhos
Patrick e Miled por escritura pública lavrada em 29.04.2013, registrada na respectiva
matrícula em 03.05.2013 (fls. 40/41). À época, já havia sido proferido e publicado
o v. acórdão que negou provimento ao apelo do ora agravante e, por consequência,
manteve a sentença que, em primeiro grau, o havia condenado ao pagamento da
quantia de R$ 20.279,07, além dos ônus da sucumbência (fls. 153/162). O aresto,
aliás, transitou em julgado quase um mês antes da alienação, em 03.04.2013 (fl. 163).
Desta forma, mesmo antes do início da fase de cumprimento de sentença, não
pairavam mais dúvidas a respeito da obrigação do agravante de pagar ao agravado a
quantia estabelecida no título judicial passado em julgado. Ainda assim o executado
alienou o imóvel aos filhos e deixou de possuir, em seu nome, patrimônio suficiente
para a satisfação do crédito do agravado, tanto que, intimado a indicar bens passíveis
de penhora, declarou não tê-los (fls. 54/55), o que torna evidente que a demanda

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS


não apenas era capaz de reduzi-lo à insolvência, como de fato foi isso que aconteceu.
Não se descuida que a Súmula nº 375 do STJ estabelece que “o reconhecimento
da fraude de execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova
de má-fé do terceiro adquirente”.
Claro que a primeira hipótese não se aplica ao caso, posto que não havia deter-
minação de penhora quando da alienação. A má-fé do alienante e dos adquirentes,
por seu turno, é de fácil percepção, dada a relação de parentesco entre eles, que torna
evidente o conhecimento de todos acerca da demanda movida contra o agravante
e da condenação a ele imposta. Ademais, ainda que os envolvidos não fossem pai
e filhos, a informação sobre a existência de processos contra o alienante pode ser
facilmente obtida por qualquer pessoa, no cartório distribuidor local, e é o mínimo
que se espera do adquirente para que se possa afastar a hipótese de consilium fraudis.
No ponto o e. STJ já assentou que “só se pode considerar, objetivamente, de boa-fé,
o comprador que toma mínimas cautelas para a segurança jurídica da sua aquisição”
(3ª T., REsp 618.625/SC, Relª Minª Nancy Andrighi, j. 19.02.08).
Confira-se, a propósito, o que decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça em
caso análogo:

(1) STJ, 4ª T., REsp 97.646/SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 15.10.96, DJ 18.11.96, p. 44.901.
290 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMÓVEL PENHORADO. DOAÇÃO


DOS EXECUTADOS A SEUS FILHOS MENORES DE IDADE. AUSÊNCIA
DE REGISTRO DA PENHORA. IRRELEVÂNCIA. FRAUDE À EXECUÇÃO
CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA Nº 375/STJ.
1. No caso em que o imóvel penhorado, ainda que sem o registro do gra-
vame, foi doado aos filhos menores dos executados, reduzindo os devedores a
estado de insolvência, não cabe a aplicação do verbete contido na Súmula nº
375 do STJ. É que, nessa hipótese, não há como perquirir-se sobre a ocorrência
de má-fé dos adquirentes ou se estes tinham ciência da penhora.
2. Nesse passo, reconhece-se objetivamente a fraude à execução, porquan-
to a má-fé do doador, que se desfez de forma graciosa de imóvel, em detrimento
de credores, é o bastante para configurar o ardil previsto no art. 593, II, do CPC.
3. É o próprio sistema de direito civil que revela sua intolerância com o
enriquecimento de terceiros, beneficiados por atos gratuitos do devedor, em
detrimento de credores, e isso independentemente de suposições acerca da má-
fé dos donatários (v.g., arts. 1.997, 1.813, 158 e 552 do Código Civil de 2002).
4. Recurso especial não provido.” (4ª T., REsp 1.163.114/MG, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, DJe 01.08.2011)
Embora a hipótese dos autos seja de alienação supostamente onerosa e não
doação, isso não é suficiente para descaracterizar a fraude à execução, pois o execu-
tado, intimado para pagamento voluntário da condenação, não se dispôs a depositar
nos autos o produto da venda, que é de R$ 70.000,00, conforme consta da matrícula
(fl. 41), nem foram encontrados valores equivalentes em suas contas bancárias por
ocasião da tentativa de penhora online (fl. 172).
Assim, tem-se que, se houve algum pagamento, esse dinheiro está fora do
alcance do credor, o que reforça a convicção de que o negócio foi realizado com
o intuito de frustrar a satisfação do crédito do agravado. Aliás, o fato de pouco
tempo depois, em 24.07.2013, o recorrente ter vendido outro imóvel seu para o
filho Patrick, também pelo valor de R$ 70.000,00 (fls. 190/191), só contribui para
o convencimento de que, diante do trânsito em julgado da decisão condenatória,
buscou em curto espaço de tempo dissipar qualquer patrimônio que pudesse ser
alcançado pela fase executória que se seguiria.
A providência determinada na origem não ofende o preceito do art. 620 do
CPC, mesmo diante da proposta do agravante de que o débito seja quitado de for-
ma parcelada, apenas por meio dos alugueis de R$ 1.000,00 que recebe do imóvel
de que é usufrutuário. O exequente não é obrigado a aceitar qualquer espécie de
parcelamento, sobretudo porque a declaração de ineficácia do negócio sub judice
permitirá, com a alienação do imóvel em hasta pública, a quitação integral do débito,
em uma única parcela.
Também não comporta acolhimento a insurgência do agravante contra a apli-
cação de multa por ato atentatório à dignidade da justiça, pois está claro que agiu de
forma premeditada, livrando-se dos bens em seu nome, para fraudar a execução. O
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 291

art. 600, I, do Código de Processo Civil prevê objetivamente a hipótese: “Considera-se


atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado que: (...) I – frauda a execução”.
Sobre o tema, Antônio Cláudio da Costa Machado pondera: “Frauda a exe-
cução (ou comete fraude de execução) o devedor que aliena ou onera os bens que
compõem o seu patrimônio nas circunstâncias previstas pelos incisos I, II e III do
art. 593, provocando, assim, a não realizabilidade do provimento satisfativo, escopo
último do processo de execução ou da fase de execução. Dada a objetividade desse
ato atentatório à dignidade da justiça (v. notas ao art. 593), a previsão sob exame é
indubitavelmente a que mais desencadeia atos repressivos concretos da parte dos
magistrados contra devedores na execução”(2) (g.n.).
Por derradeiro, não considero excessiva a multa aplicada na origem, fixada
dentro do limite previsto no art. 601, caput, do CPC. O porcentual máximo, por seu
turno, se justifica pela gravidade da conduta do executado, que deliberadamente
alienou seus bens com o claro propósito de frustrar a execução.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
É meu voto.
Desembargador Gomes Varjão – Relator

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — ACÓRDÃOS

(2) Código de Processo Civil interpretado, 6. ed. p. 778-779.


EMENTÁRIO
• As íntegras destes acórdãos estão disponíveis na versão on-line (www.lex.com.br)
para os assinantes desta revista.

77/18 — AÇÃO AMBIENTAL. GUARUJÁ. SERRA DO GUARARU. LOTEA-


MENTO TAGUAÍBA. CANCELAMENTO DA AUTORIZAÇÃO PARA DESMATE
E CONSTRUÇÃO. AÇÃO VISANDO À ANULAÇÃO DO CANCELAMENTO E
À AFIRMAÇÃO DA VALIDADE DA LICENÇA ADMINISTRATIVA. 1. AGRAVO
RETIDO. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. LE Nº 10.177/98. A Administração
decai no prazo de dez anos, contados de sua produção, do direito de anular seus
atos inválidos (art. 10, inciso I, da LE nº 10.177/98). A LF nº 9.784/99 disciplina o
processo administrativo federal e não se aplica ao Estado. Agravo retido desprovido.
2. CERCEAMENTO DE DEFESA. Os documentos trazidos pelos autores não podem
ser aceitos como documentos novos, pois existentes ao tempo da propositura da
ação, e deveriam ter instruído a inicial. De qualquer modo, trata-se de documentos

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


referentes a processos administrativos instaurados para averiguar as licenças con-
cedidas a lotes diversos, os quais possuem especificidades não extensíveis ao lote
do autor. Os documentos não aproveitam aos autores. Preliminar rejeitada. 3. ATO
ADMINISTRATIVO. NULIDADE. AUTOTUTELA. O Parecer Técnico Florestal nº
61/03 e a Autorização nº 35/04 não foram anulados porque expedidos pelo Engenhei-
ro Florestal Domingos Ricardo de Oliveira Barbosa, mas por incompatibilidade entre
a realidade constatada in loco pelos agentes do DEPRN e as informações oferecidas
pelos autores ao solicitar a licença. Os agentes constataram intervenções em área de
preservação permanente (proximidade a curso d’água e declividade acentuada), bem
como canalização de córrego sem autorização do DAEE. Ausente a prova pericial,
único meio para desconstituir os motivos que levaram à anulação dos atos adminis-
trativos, não há como afastar a decisão administrativa. Sentença de improcedência.
Recurso dos autores desprovido. (TJSP; APL 0012552-77.2011.8.26.0562; Ac. 8705514;
1ª C.R.M.Amb.; Rel. Des. Torres de Carvalho; DJESP 22/09/2015)
77/19 — AÇÃO ANULATÓRIA. DEPOSIÇÃO IRREGULAR DE RESÍDUOS.
A área atingida foi devidamente delimitada e o cálculo da multa obedeceu aos cri-
térios legais. Não configurado o cerceamento de defesa ou a ilegitimidade passiva.
O recorrente era, à época dos fatos, o único proprietário do imóvel. Aplicação do
art. 1.245, § 1º, do Código Civil. Mantida a sentença de improcedência da ação.
Rejeitadas as preliminares. (TJSP; APL 0042687-81.2010.8.26.0053; Ac. 8807160; 1ª
C.R.M.Amb.; Rel. Des. Ruy Alberto Leme Cavalheiro; DJESP 24/09/2015)
77/20 — AÇÃO ANULATÓRIA. ISS. CONTRATO DE ARRENDAMENTO
MERCANTIL. LOCAL DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. AUSÊNCIA DE PROVA
INEQUÍVOCA. ELEMENTOS RECURSAIS INCAPAZES DE DESCONSTITUIR A
PRESUNÇÃO DE REGULARIDADE DA COBRANÇA. RECURSO NÃO PROVIDO.
De acordo com as normas processuais, a antecipação dos efeitos da tutela se justifica
quando comprovados: o risco de dano grave ou de difícil reparação, a verossimilhança
das alegações e a prova inequívoca. Desautorizada a sua concessão quando ausentes
294 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

um desses requisitos. A verossimilhança das alegações, intimamente ligada à prova


inequívoca, só se alcançará quando os elementos apresentados, fáticos e de direito,
se traduzirem em determinado grau de convicção do magistrado, que lhe permita
observar a probabilidade das alegações naquele pleito. Celebrando a jurisprudência
do STJ, é devido o ISS, proveniente de contratos de arrendamento mercantil, na loca-
lidade em que “o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada,
assim entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional
da instituição financeira com poderes decisórios suficientes à concessão e à apro-
vação do financiamento – núcleo da operação de leasing financeiro e fato gerador
do tributo” (REsp 1.060.210/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira
Seção, j. 28.11.2012, DJe 05.03.2013). Ausência de elementos convincentes sobre o
alegado aperfeiçoamento do contrato em município diverso ao daquele onde se dá
a cobrança do tributo. Não confluência dos requisitos do art. 273 do CPC. Recurso
não provido. (TJMG; AGIN 1.0702.14.091356-8/001; 1ª C.Cív.; Rel. Des. Armando
Freire; DJEMG 16/10/2015)
77/21 — AÇÃO ANULATÓRIA. ISS. INSURGÊNCIA CONTRA A INCI-
DÊNCIA DO ISS SOBRE SERVIÇO DE TAPEÇARIA. ITEM 14.11 DA LISTA DE
SERVIÇOS. Alegação de que a atividade consiste em comercialização de acessórios
de couro para automóveis. Provas documentais que autorizam a tributação do ISS.
Ausência de comprovação das alegações da apelante. Inteligência do art. 333, I, do
CPC. Sentença mantida. Recurso improvido. (TJSP; APL 1006026-17.2014.8.26.0451;
Ac. 8872373; 15ª C.D.Púb.; Rel. Des. Eutálio Porto; DJESP 16/10/2015)
77/22 — AÇÃO ANULATÓRIA DE ACORDO. PARTILHA DE BENS. CO-
AÇÃO MORAL EVIDENCIADA. DOAÇÃO UNIVERSAL DE TODOS OS BENS
PERTENCENTES SOMENTE À CÔNJUGE VIRAGO EM FAVOR DA SUA FILHA.
ATO DISPOSIÇÃO ISOLADO. LESÃO EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DE GARAN-
TIA DO MÍNIMO PATRIMONIAL NECESSÁRIO A ASSEGURAR O PRIMADO DA
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. OFENSA AOS ARTS. 548 DO CÓDIGO CIVIL
E 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO
RECONHECIDA. APELO PROVIDO. 1. Diferentemente da coação absoluta ou física
(vis absoluta), a coação moral (vis compulsiva) apta a invalidar o negócio jurídico
não exige da comprovação do ato coator explícito, bastando que a parte coagida
demonstre a existência de situações fáticas que sejam suficientes para abalar o seu
equilíbrio emocional e o discernimento, levando-se em consideração, para apreciar
a coação, “o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas
as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela” (CC, art. 152). 2.
Havendo elementos nos autos que permite concluir que o requerido agia com certo
grau de superioridade, apresentando, inclusive, comportamentos despóticos para
com autora, os quais retiravam dela a sua própria individualidade, somado ao fato
de ser ele 23 (vinte e três) anos mais experiente, mantenedor da residência do casal
à época, e também ter porte e posse de arma de fogo, autoriza deduzir que a parte
restou moralmente coagida a assinar o acordo da forma em que entabulado, pois
certamente se sentia amedrontada pelo opressor. Soma-se a isso a possível ameaça
deste de tornar público um suposto caso extraconjugal da autora, que, inclusive,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 295

nem sequer restou demonstrado nos autos. 3. Ainda que não fosse evidenciada a
coação moral sofrida (CC, art. 151), verifica-se o instituto da lesão, também apto a
justificar a anulação do negócio jurídico, nos termos do art. 171, II, do CC, por conta
da doação universal dos bens sem qualquer reserva, e ocorreu apenas em relação aos
bens do cônjuge virago em favor da sua filha, numa interpretação conjunta com o art.
548 do CC c/c o art. 1º, III, da CF, também autoriza a sua invalidação, eis que não
restou reservado uma parte ou renda suficiente para garantir a subsistência da parte
doadora e não ser possível, destarte, assegurar o mínimo patrimonial necessário a
concretizar a dignidade da pessoa humana. 4. Apelação provida. (TJES; APL 0013819-
49.2012.8.08.0013; 4ª C.Cív.; Rel. Des. Subst. Marcelo Pimentel; DJES 02/10/2015)
77/23 — AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO. SUCESSIVOS EMPRÉSTI-
MOS TOMADOS JUNTO AOS RÉUS PELA EMPRESA AUTORA. TRANSFERÊNCIA
DA PROPRIEDADE DE BENS MÓVEIS E IMÓVEL NO DECORRER DOS ANOS.
Alegação, deduzida em sede de alegações finais, de que a transferência patrimonial
consubstanciaria pacto comissório. Art. 765 do Código Civil de 1916, com consen-
tâneo no art. 1.428 do Código Civil de 2002. Substrato probatório absolutamente
exíguo e inconclusivo a respeito. Coação tampouco indemonstrada. Incerteza quanto
à entrega voluntária dos bens pela própria devedora, em pagamento das dívidas
repetidamente contraídas. A documentação acostada pelos réus, à exceção do bem
imóvel, sugere a regularidade das obrigações contraídas, com a transferência a eles
dos bens questionados, até porque, como se consignou na sentença, não “é impos-
sível que se descarte que não foram dados em pagamento parcial da dívida, que por
tantos anos (e anos de, notoriamente, altíssima inflação) foi sendo renegociada”.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


Alegada quitação do débito indemonstrada. Divergência entre os valores informa-
dos pelas partes. Recurso de agravo interposto pelos réus na modalidade retida.
Utilidade comprometida pelo resultado do recurso de apelação cível, que, despro-
vido, implica a manutenção da sentença de improcedência dos pedidos vertidos na
exordial. Recurso de apelação conhecido e desprovido, julgando-se prejudicado o
agravo retido. (TJSC; AC 2010.022893-9; 1ª C.D.Civ.; Rel. Des. Artur Jenichen Filho;
DJSC 07/10/2015; p. 160)
77/24 — AÇÃO CAUTELAR. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE REGULA-
RIDADE FISCAL. OFERECIMENTO DE CAUÇÃO IDÔNEA. POSSIBILIDADE.
EXEGESE DO ART. 206 DO CTN. Desnecessidade de se atentar à ordem do art.
11 da LEF. Recurso conhecido e desprovido. O judiciário possibilita o manejo da
cautelar de caução a fim de viabilizar a certidão negativa ao devedor que demonstre
vontade em quitar o débito e, para tanto, garante a dívida fiscal com bens aptos a
serem penhorados. É o caso dos autos. Lá na frente é que se definirá o que realmente
será constritado. Nesse momento, ao contrário, sendo viabilizada a caução, as duas
partes sairão ganhando: o Estado de Santa Catarina com a garantia do pagamento
da dívida e a contribuinte com a certidão negativa de débito, que lhe possibilitará
participar de licitações, adquirir empréstimos, etc., situação que gerará maior ati-
vidade da empresa e, consequentemente, mais pagamento de tributo. (TJSC; AC
2014.002010-8; 3ª C.D.Púb.; Rel. Des. Subst. Júlio César Knoll; DJSC 15/10/2015; p. 313)
296 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

77/25 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BEM PÚBLICO. DOAÇÃO. ENCARGO.


PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. CONTAGEM. NÃO OCORRÊNCIA. JULGA-
MENTO ANTECIPADO. TEORIA DA CAUSA MADURA. INAPLICABILIDADE.
Na doação com encargo em que não há prazo estipulado para o seu cumprimento,
o termo inicial para a contagem do prazo prescricional surge com a lesão ao direito
do doador. Na hipótese dos autos, é incabível a aplicação da teoria da causa madura,
considerando que houve indeferimento da petição inicial, portanto, antes da citação
dos réus. Assim, o julgamento imediato do processo acarretaria indevida supressão
de instância. (TJAC; Apl-RN 0000388-76.2012.8.01.0001; Ac. 2.196; 2ª C.Cív.; Rel.
Des. Samoel Evangelista; DJAC 02/09/2015; p. 11)
77/26 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. REPARAÇÃO DO
DANO. CUMULAÇÃO COM INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE NO CASO
CONCRETO. 1. Sendo incontroversos os danos causados ao meio ambiente em face
da construção de açude na propriedade do réu, correta a sentença que determinou a
elaboração de projeto de recuperação da área. 2. Entretanto, não sendo irrecuperáveis
os danos, não há que se falar no pagamento de indenização. Incumbia ao Ministério
Público produzir prova de suas alegações, ônus do qual não se desincumbiu, deixan-
do de quantificar o prejuízo efetivamente verificado. De outra banda, o réu acostou
parecer técnico demonstrando a possibilidade de recuperação da área degradada.
Apelo desprovido. (TJRS; AC 0294481-39.2015.8.21.7000; 2ª C.Cív.; Rel. Des. Ricardo
Torres Hermann; DJERS 28/09/2015)
77/27 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. JOGOS DE AZAR. BINGOS, CAÇA-NÍQUEIS
E AFINS. SÚMULA VINCULANTE Nº 2/STF. VEDAÇÃO PELA LEI Nº 9.981/00.
INEXISTÊNCIA, POR ORA, DE LEGISLAÇÃO QUE AUTORIZE A ATIVIDADE.
INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO. CABIMENTO. 1. Na origem, o
Ministério Público Federal e a União promoveram ação civil pública contra casas de
bingos, caça-níqueis e demais jogos de azar, pleiteando a condenação em obrigações
de fazer e não fazer atinentes à interdição da atividade, além de indenização por
dano moral coletivo a ser revertida para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. 2.
A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido relativo às interdições, bem
como apontou os efeitos dos jogos ilegais não só para o consumidor como também
para a família, a coletividade, a economia e a saúde pública, também condenou as
rés à indenização por dano moral coletivo, a ser apurada na fase de liquidação, sob
o parâmetro de 20% da média arrecadada a partir da expiração das autorizações a
elas concedidas até a efetiva interdição das atividades. O Tribunal de origem, em
agravo regimental, reformou a sentença de primeiro grau para afastar a condenação
das rés ao pagamento de dano moral coletivo. 3. É competência privativa da União
legislar sobre sistemas de consórcios e sorteios. Nesse sentido, a Súmula Vinculante
nº 2 considera “inconstitucional a lei ou ato normativo estadual ou distrital que
disponha sobre sistemas de consórcios e sorteios, inclusive bingos e loterias” (STF,
DJe 31, de 06.06.07). 4. A exploração de casas de bingo chegou a ser permitida pela
Lei nº 9.615/98 (arts. 59 a 81), mas tais dispositivos legais foram revogados pela
Lei nº 9.981/00, a partir de 31.12.01, “respeitando-se as autorizações que estiverem
em vigor até a data da sua expiração” (art. 2º). A União detém a exploração direta
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 297

de loterias federais (“jogos autorizados”), e o Decreto nº 50.954/61 incumbe a ad-


ministração das loterias federais à Caixa Econômica Federal. Portanto, enquanto
não sobrevier legislação que a autorize, a exploração comercial de jogos de bingo
e de demais jogos de azar não encontra amparo no ordenamento jurídico pátrio
vigente. 5. Quando os interesses e direitos individuais coletivamente considerados
trazem repercussão social apta a transpor as pretensões particulares, autoriza-se
sua tutela pela via coletiva (arts. 81 e 82 do CDC). 6. O art. 6º do CDC traz como
direitos básicos do consumidor: “(...) VI – a efetiva prevenção e reparação de danos
patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII – o acesso aos órgãos
judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patri-
moniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção jurídica,
administrativa e técnica aos necessitados”. 7. A responsabilidade civil é objetiva,
respondendo os réus, “independentemente da existência de culpa, pela reparação
dos danos causados aos consumidores” (art. 12, caput, do CDC). 8. O dano moral
coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, pois
tal comprovação, embora possível na esfera individual, torna-se inaplicável quando
se cuida de interesses difusos e coletivos. Nesse sentido: REsp 1.410.698/MG, Rel.
Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 30.06.2015; REsp 1.057.274/RS, Relª
Minª Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 26.02.2010. Recurso especial interposto
pelo Parquet foi conhecido e provido para restabelecer a condenação das rés ao
pagamento de indenização por dano moral coletivo, na forma fixada pela sentença
de primeiro grau. (STJ; REsp 1.509.923; Proc. 2015/0000777-0; SP; 2ª T.; Rel. Min.
Humberto Martins; DJE 22/10/2015)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


77/28 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. BEM NÃO TOMBADO.
PROVA DO VALOR HISTÓRICO. DEVER DE CONSERVAÇÃO PELO PROPRIE-
TÁRIO. Nos termos do art. 216, § 1º, da Constituição Federal, o Poder Público, em
colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro,
por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de
outras formas de acautelamento e preservação. Quando o Poder Público não toma
as medidas necessárias para o tombamento de um bem que possui grande valor
histórico e cultural, pode o Ministério Público, mediante ação civil pública, recor-
rer ao Judiciário para determinar a pretendida proteção. No caso, está devidamente
comprovado que o Moinho Backhaus é relevante para o patrimônio histórico da
comunidade de Rolante, devendo os proprietários adotar as medidas de conservação
requeridas na ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público. Recurso provido.
Unânime. (TJRS; AI 0233270-02.2015.8.21.7000; 2ª C.Cív.; Rel. Des. João Barcelos de
Souza Junior; DJERS 15/09/2015)
77/29 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRAS DE INFRAESTRUTURA EM LOTE-
AMENTO. LIMINAR QUE DETERMINA A ADOÇÃO DE MEDIDAS PARA CESSAR
O RISCO DE DESABAMENTO EM ÁREA DE RISCO. RECURSO QUE TENTA
AFASTAR A RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO DE MANAUS. ART. 30, VIII,
DA CF/88. IMPOSSIBILIDADE. HIPÓTESE DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
DOS ENTES PÚBLICOS MUNICIPAL E ESTADUAL. LIMINAR QUE DEVE SER
MANTIDA. MULTA DIÁRIA AO ENTE MUNICIPAL POR DESCUMPRIMENTO
298 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DA DECISÃO. POSSIBILIDADE. CARÁTER INTIMIDATÓRIO. RECURSO NÃO


PROVIDO. Nos termos do art. 30, VIII, da Constituição Federal de 1988, compete
aos Municípios promover, no que couber, adequado ordenamento e controle do
uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano. No caso concreto, embora
o loteamento e o projeto das moradias tenham sido realizados pelo ente público
estadual, não se pode afastar a responsabilidade do Município de Manaus, dado o
seu dever de controle e fiscalização, com fulcro no texto constitucional e na Lei
Orgânica Municipal (art. 217), o que caracteriza verdadeira hipótese de responsa-
bilidade solidária. Não merece reparos, portanto, a decisão que determina a ambos
os entes federados a adoção de medidas cabíveis para cessar o risco de desabamento
na área de risco em questão. De igual modo, não merece reforma a parte da decisão
que comina multa diária em decorrência de eventual descumprimento da determi-
nação em sede de liminar, uma vez que o valor arbitrado não se mostra excessivo
considerado seu caráter intimidatório. Agravo conhecido e não provido. (TJAM;
AI 4003339-23.2014.8.04.0000; 1ª C.Cív.; Rel. Des. Yêdo Simões de Oliveira; DJAM
23/09/2015; p. 19)
77/30 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECI-
MENTO DE ÁGUA POTÁVEL. CONVÊNIO ENTRE FUNASA E MUNICÍPIO.
DESCUMPRIMENTO DO PRAZO. SERVIÇO ESSENCIAL. VIOLAÇÃO AOS PRIN-
CÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA EFICIÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 1. A água, como elemento natural, é
bem essencial à vida e à saúde. O Poder Público responsável pelo abastecimento
desse serviço deve prestar de forma a garantir seu acesso universal, igualitário, e de
forma ininterrupta, ante o comando constitucional (art. 175, I, II e IV, da CF/88).
2. Não basta que o ente público preste o serviço essencial para o cumprimento do
escopo constitucional; deve a prestação ser igualmente eficiente. 3. O injustificável
descumprimento, pelo convenente, das obrigações firmadas no Convênio nº 938/04
entre o Município e a Funasa, no tocante à execução do sistema de abastecimento
de água potável no Loteamento Açaí (Macapá), fere o princípio da eficiência da
Administração Pública (art. 37 da CF/88). 4. A política nacional de saneamento
básico deve se amoldar às garantias constitucionais, por isso não se identifica que o
julgamento de procedência da ação civil pública, com o fim de garantir o abasteci-
mento de água potável à população, contrarie a Lei Federal nº 11.445/07 (art. 2º, I,
II e XII, e caput do art. 19). 5. Sentença confirmada. 6. Remessa ex officio desprovida.
Recurso voluntário prejudicado. (TJAP; REO 0015194-96.2011.8.03.0001; C.Ún.; Rel.
Juiz Conv. João Lages; DJEAP 08/09/2015; p. 20)
77/31 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PARCELAMENTO DO SOLO URBANO.
REGULARIZAÇÃO DE LOTEAMENTO PRIVADO. RESPONSABILIDADE SUBSI-
DIÁRIA DO MUNICÍPIO. ART. 40 DA LEI Nº 6.766/79. PROCEDIMENTO FACUL-
TATIVO. 1. É facultativo o procedimento previsto no art. 40 da Lei nº 6.766/79, o
qual possibilita ao município o ressarcimento dos custos financeiros pela realização
de obras de infraestrutura em loteamento privado irregular, quando o loteador não
as realiza. Precedentes: AgRg no REsp 1.310.642/RS, Rel. Min. Humberto Martins,
Segunda Turma, DJe 09.03.2015; REsp 859.905/RS, Rel. Min. Mauro Campbell
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 299

Marques, Rel. p/ o Ac. Min. César Asfor Rocha, Segunda Turma, DJe 16.03.2012.
2. É subsidiária a responsabilidade do ente municipal pelas obras de infraestrutura
necessárias à regularização de loteamento privado, quando ainda é possível cobrar
do loteador o cumprimento de suas obrigações. 3. Recurso especial não provido.
(STJ; REsp 1.394.701; Proc. 2013/0236369-6; AC; 1ª T.; Rel. Min. Benedito Gonçalves;
DJE 28/09/2015)
77/32 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PARQUE DA CIDADE. IRREGULARIDADE
NA EXPLORAÇÃO DE ESPAÇOS PÚBLICOS. 1. O Ministério Público tem a função
institucional de proteção do patrimônio público (CF, art. 129, III), o que lhe autoriza
apurar irregularidades na exploração de área pública. 2. A omissão do Distrito Fe-
deral quanto à exploração de área pública por particular justifica a sua condenação
em obrigação de fazer para a adoção de medidas necessárias à regularização do uso.
(TJDF; APO 2011.01.1.032991-7; Ac. 886.829; 4ª T.Cív.; Rel. Des. Fernando Habibe;
DJDFTE 09/09/2015; p. 192)
77/33 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PATRIMÔNIO HISTÓRICO NACIONAL.
TOMBAMENTO. LEI Nº 11.483/07. BEM DA EXTINTA RFFSA. ESTAÇÃO FER-
ROVIÁRIA. CONTROLE JUDICIAL SOBRE DECISÕES ADMINISTRATIVAS. 1. O
patrimônio cultural brasileiro, constituído por bens de natureza material e imate-
rial, é tutelado pela Constituição Federal, conforme preceitua seu art. 216, sendo
de competência comum a todos os entes da federação a proteção aos bens de valor
artístico, histórico e cultural (art. 23, I, III e IV). 2. O tombamento, previsto no
art. 216, § 1º, da Constituição Federal e regulado pelo Decreto-Lei nº 25/1937, é
espécie de intervenção do Estado na propriedade, limitativa do exercício de direi-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


tos de utilização e de disposição, destinada à preservação e ao acautelamento do
patrimônio cultural. 3. A competência do IPHAN para o tombamento dos bens da
extinta RFFSA, prevista no art. 9º, caput, §§ 1º e 2º, da Lei nº 11.483/07, é condi-
cionada à avaliação prévia sobre a existência ou não de valor artístico, histórico e
cultural a ser protegido, mediante ato discricionário autorizado por lei, visando ao
atendimento do interesse público. 4. Em princípio, é cabível o controle judicial das
decisões administrativas no que diz respeito à forma (pressupostos de validade) e
ao conteúdo (aspectos jurídicos e fáticos), inclusive quanto à discricionariedade.
No que tange à discricionariedade, o controle judicial incidirá apenas se princípios
fundamentais como os da igualdade, da legalidade, da proporcionalidade e da
confiança legítima forem atingidos. 5. Ausência de demonstração de efetiva violação
ao art. 3º, III e IV, da CF – que prevê como objetivos da República a erradicação das
desigualdades sociais e regionais, bem como a promoção do bem-estar de todos sem
qualquer discriminação –, pelo fato de a localização do imóvel em área rural, na
análise do caso concreto e em juízo de discricionariedade, ter sido considerada
como um dos fatores para a recusa ao tombamento, em razão da inviabilidade de
sua utilização para fins culturais. 6. A atuação do IPHAN destina-se a bens de re-
levância nacional, sem prejuízo da atuação dos municípios e Estados nos assuntos
de interesse local e estadual. Tal entendimento amolda-se ao disposto nos arts. 216
e 23, III, da Constituição Federal, que preveem a competência comum entre entes
federativos para a tutela do patrimônio cultural brasileiro. 7. O reconhecimento
300 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

do valor artístico, histórico e cultural para o tombamento de determinado bem na


esfera estadual não conduz, necessariamente, a idêntico posicionamento no âmbito
federal. 8. Inexistindo tombamento pelo IPHAN, é inviável a condenação da União
Federal e dos demais apelados à elaboração e à execução de projeto de recuperação
do imóvel, a ser submetido à aprovação da referida autarquia. 9. Remessa necessária
e apelação não providas. (TRF 2ª R.; AC 0001114-25.2012.4.02.5120; 5ª T.Esp.; Rel.
Des. Fed. Ricardo Perlingeiro; DEJF 29/09/2015; p. 413)
77/34 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE
DEFESA. REJEIÇÃO. MATADOURO PÚBLICO. CONDIÇÕES PRECÁRIAS. RISCO
DE DANO AMBIENTAL À SAÚDE E À VIDA DA POPULAÇÃO CIRCUNVIZINHA.
REALIZAÇÃO DE OBRAS NECESSÁRIAS. MULTA DIÁRIA. DESPROPORCIONA-
LIDADE NO VALOR FIXADO DE R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS), LIMITADO
AO VALOR DE R$ 200.000,00 (DUZENTOS MIL REAIS). REDUZO DE OFÍCIO A
MULTA DIÁRIA AO VALOR DE R$ 1.000,00 (MIL REAIS), LIMITADO AO VALOR
DE R$ 30.000,00, EIS QUE OS VALORES APRESENTAM-SE ELEVADOS. RESPON-
SABILIZAÇÃO PESSOAL DO AGENTE PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. REFORMA
DA SENTENÇA DE OFÍCIO PARA EXCLUIR A RESPONSABILIZAÇÃO PESSOAL
DO ADMINISTRADOR PÚBLICO E REDUZIR O LIMITE DA MULTA APLICADA.
APELAÇÃO CONHECIDA E IMPROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFOR-
MADA DE OFÍCIO. UNANIMIDADE. I – Constatando-se nos autos o funcionamen-
to do matadouro público do Município de Campo do Brito/SE sem as condições
sanitárias e legais apropriadas, expondo o meio ambiente e a saúde da população a
graves riscos, a reforma das suas instalações é medida que se impõe, adotando pro-
vidências que solucionem tais problemas, tanto no que se refere às suas instalações
quanto no que atine ao tratamento das carnes e dos resíduos. II – A multa pecuni-
ária ou astreinte foi concedida como forma de coagir o recorrido ao cumprimento
da obrigação específica de fazer, não podendo proporcionar o enriquecimento sem
causa da parte que requereu sua aplicação, sendo possível o seu afastamento, a sua
redução ou a sua majoração, inclusive ex officio pelo juiz, com espeque no art. 461,
§ 6º, do CPC. III – Atentando para as peculiaridades do presente caso, percebe-se
que foi desproporcional a fixação de multa diária no valor de R$ 10.000,00, portan-
to, reduzo-a ao valor de R$ 1.000,00. O limite fixado também está elevado, razão
pela qual reduzo-o ao valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). IV – Ainda que o
art. 11 da Lei nº 7.347/85 autorize o direcionamento da multa fixada em sede de
ação civil pública pessoalmente às autoridades responsáveis pelo cumprimento das
determinações judiciais, tal regra não pode ser aplicada sem a observância do devido
processo legal, contraditório e ampla defesa, conforme ocorreu nos presentes autos,
razão pela qual deve ser afastada, de ofício, a responsabilização pessoal do chefe do
executivo municipal. (TJSE; AC 201500718429; Ac. 17383/2015; 1ª C.Cív.; Rel. Des.
Ruy Pinheiro da Silva; DJSE 09/10/2015)
77/35 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. QUEIMA DA PALHA DA CANA-DE-AÇÚ-
CAR. 1. Pretendida condenação das corrés à obrigação de não fazer consistente na
abstenção da prática de queima da palha da cana-de-açúcar. Impossibilidade. Prática
que não é ilícita quando autorizada pelos órgãos ambientais competentes. 2. Preten-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 301

dida condenação ao pagamento de indenização pelos danos ambientais decorrentes


da queima. Impossibilidade. Ausência de demonstração do efetivo dano, apto a dar
ensejo à indenização. Necessidade de comprovação e quantificação do dano. Impos-
sibilidade de estimativa com critério que não guarde relação com o dano. Sentença
mantida. Recurso improvido. (TJSP; APL 0034029-33.2011.8.26.0506; Ac. 8721246;
2ª C.R.M.Amb.; Rel. Des. Eutálio Porto; DJESP 15/09/2015)
77/36 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TOMBAMENTO DO CONJUNTO ARQUI-
TETÔNICO E PAISAGÍSTICO NO MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ CABRÁLIA/BA.
CONSTRUÇÃO IRREGULAR. PAVIMENTO SUPERIOR. DESCARACTERIZAÇÃO
APÓS O TOMBAMENTO. CONFIGURAÇÃO. LAUDOS TÉCNICOS. PODER PÚ-
BLICO. SENTENÇA MANTIDA. 1. O conjunto arquitetônico do Município de Santa
Cruz Cabrália/BA compõe o patrimônio histórico e artístico nacional, não sendo
possível dar destinação diversa à coisa tombada sem que haja prévia autorização do
IPHAN, órgão federal responsável pela sua fiscalização e proteção. 2. “O § 1º do art.
216 da CF/88 estabelece que ‘o Poder Público, com a colaboração da comunidade,
promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários,
registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautela-
mento e preservação’. Ora, se o Poder Público, diante das circunstâncias concretas da
lide, não pudesse adotar as medidas consignadas na sentença recorrida, tal omissão
esvaziaria a eficácia do mencionado dispositivo constitucional e deixaria um flanco
aberto para toda sorte de vulneração ao postulado fundamental de preservação do
patrimônio histórico e cultural do país”. Precedente: 0042709-97.2001.4.01.3800,
AC 2001.38.00.042815-2/MG, Rel. Juiz Fed. Márcio Barbosa Maia, 4ª Turma Su-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


plementar, e-DJF1 21.09.2011, p. 565, data da decisão: 30.08.2011). 3. Apelação a
que se nega provimento. (TRF 1ª R.; AC 0000580-77.2010.4.01.3310; BA; 6ª T.; Rel.
Des. Fed. Kassio Marques; DJF1 02/10/2015)
77/37 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. USO EXCESSIVO E IMOTIVADO DE FOR-
ÇA POLICIAL. COMUNIDADES QUILOMBOLAS E SEGMENTOS DA SOCIEDADE
CIVIL. DANO MORAL COLETIVO. CABIMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL
OBJETIVA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. I –
A responsabilidade civil imputada ao Estado por ato danoso de seus prepostos é
objetiva (art. 37, § 6º, da CF), impondo-se o dever de indenizar quando houver
dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do
preposto. II – A orientação jurisprudencial já sedimentada no âmbito de nossos
tribunais firmou-se no sentido de que “a possibilidade de indenização por dano
moral está prevista no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, não havendo res-
trição da violação à esfera individual. A evolução da sociedade e da legislação tem
levado a doutrina e a jurisprudência a entenderem que, quando são atingidos valores
e interesses fundamentais de um grupo, não há como negar a essa coletividade a
defesa do seu patrimônio imaterial” e de que “o dano moral coletivo é a lesão na
esfera moral de uma comunidade, isto é, a violação de direito transindividual de
ordem coletiva, valores de uma sociedade atingidos do ponto de vista jurídico, de
forma a envolver não apenas a dor psíquica, mas qualquer abalo negativo à moral
da coletividade, pois o dano é, na verdade, apenas a consequência da lesão à esfera
302 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

extrapatrimonial de uma pessoa” (REsp 1.397.870/MG, Rel. Min. Mauro Campbell


Marques, Segunda Turma, j. 02.12.2014, DJe 10.12.2014). III – Na hipótese dos
autos, comprovados o nexo de causalidade e o evento danoso, resultante do uso
injustificado de força policial excessiva, por parte de agentes públicos do Estado de
Minas Gerais, mediante a realização de prisão ilegal, o uso indevido de algemas e
a exposição de membros de comunidades quilombolas à execração pública, com o
intuito de intimidar e de inibir, à margem da lei, a sua atuação, na defesa do exer-
cício do seu direito à posse de terras, resta caracterizado o dano moral coletivo, do
que resulta o dever de indenizar, nos termos do referido dispositivo constitucional.
IV – Relativamente à fixação do valor da indenização por danos morais coletivos,
cumpre verificar que inexiste parâmetro legal definido para o seu arbitramento,
devendo ser quantificado segundo os critérios de proporcionalidade, moderação
e razoabilidade, submetidos ao prudente arbítrio judicial, com observância das
peculiaridades inerentes aos fatos e circunstâncias que envolvem o caso concreto,
bem assim em consonância com a função sancionatória e pedagógica da reparação.
Dessa forma, reputa-se razoável, na espécie, a fixação do valor da indenização por
danos morais no montante de R$ 4.500.000,00 (quatro milhões e quinhentos mil
reais), em favor das comunidades quilombolas descritas nos autos. V – Provimento
das apelações interpostas pelo Ministério Público Federal e pela Fundação Cultural
Palmares. Sentença reformada. (TRF 1ª R.; AC 0008595-96.2010.4.01.3807; 5ª T.; Rel.
Des. Fed. Souza Prudente; DJF1 29/09/2015)
77/38 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VAZAMENTO DE ÓLEO DE EMBARCA-
ÇÃO. AGENTE MARÍTIMO. LEGITIMIDADE AD CAUSAM PASSIVA. TUTELA
ANTECIPATÓRIA. CUMPRIMENTO. PERDA INTERCORRENTE DE INTERESSE
PROCESSUAL. INOCORRÊNCIA. DEMORA NA CONTENÇÃO. RESPONSABILI-
DADE OBJETIVA. PROCEDÊNCIA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. ARBITRA-
MENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA EM FACE DE AGENTE MARÍTIMO
A BUSCAR A CONDENAÇÃO DE A RÉ ADOTAR AS MEDIDAS CABÍVEIS PARA A
CONTENÇÃO DE VAZAMENTO DE ÓLEO DE NAVIO, BEM COMO DE ARCAR
COM A COMPLETA RECOMPOSIÇÃO DOS RECURSOS AMBIENTAIS ATINGI-
DOS. LAUDO QUE APONTA QUE O VAZAMENTO PERDUROU POR DIAS, O QUE
AGRAVOU OS DANOS AMBIENTAIS DELE DECORRENTES. AGRAVO RETIDO
INTERPOSTO DA DECISÃO QUE REJEITOU PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE
PASSIVA AD CAUSAM. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. 1. A legi-
timidade ad causam, como qualquer outra condição do direito de ação, é aferida in
abstracto; se o autor afirma que a ré, representante do armador do navio no qual
houve o vazamento, é responsável pelos danos ambientais decorrentes desse fato,
tal asserção indica sua pertinência subjetiva com a res in iudicium deducta. 2. A rea-
lização de medidas de contenção, por si só, não demonstra o cumprimento integral
da obrigação determinada na liminar, certo que a eficácia de tais medidas deve ser
apurada na fase de liquidação, o que afasta a tese de falta de interesse processual;
persistiu a necessidade da provocação jurisprudencial e se manteve a utilidade da
ação. 3. Demonstrado o agravamento de dano ambiental decorrente da demora na
contenção do óleo derramado, o agente marítimo se subsume no conceito de po-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 303

luidor e deve reparar os danos causados (arts. 3º, IV, e 14, caput, e § 1º, da Lei nº
6.938/81). 4. Nesse diapasão, é irrelevante a demonstração do status quo ante dos
recursos ambientais, o que há de ser apurado em liquidação. 5. Natureza e comple-
xidade da demanda que autorizam a cominação e honorários de sucumbência em
R$ 10.000,00. 6. Agravo retido e apelo aos quais se nega provimento. (TJRJ; APL
0064056-64.2005.8.19.0001; 3ª C.Cív.; Rel. Des. Fernando Foch de Lemos Arigony da
Silva; DORJ 11/09/2015)
77/39 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA COIBIR A PRÁTICA RECORRENTE
DE POLUIÇÃO SONORA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE RECONHE-
CIDA. DANO MORAL COLETIVO. POLUIÇÃO SONORA. OCORRÊNCIA. PRE-
CEDENTES. REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Recurso especial decorrente de ação civil
pública em que se discute danos morais coletivos decorrentes de poluição sonora e
de irregularidade urbanística provocadas por funcionamento dos condensadores e
geradores colocados no fundo do estabelecimento das condenadas. 2. Tratando-se
de poluição sonora, e não de simples incômodo restrito aos lindeiros de parede,
a atuação do Ministério Público não se dirige à tutela de direitos individuais de
vizinhança na acepção civilística tradicional, e sim à defesa do meio ambiente, da
saúde e da tranquilidade pública, bens de natureza difusa. O Ministério Público
possui legitimidade para propor ação civil pública com o fito de prevenir ou cessar
qualquer tipo de poluição, inclusive sonora, bem como buscar a reparação pelos
danos dela decorrentes. Nesse sentido: REsp 1.051.306/MG, Rel. Min. Castro Meira,
Rel. p/o Ac. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 16.10.08, DJe 10.09.2010. 3.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


“Tratando-se de poluição sonora, e não de simples incômodo restrito aos lindeiros de
parede, a atuação do Ministério Público não se dirige à tutela de direitos individuais
de vizinhança na acepção civilística tradicional, e sim à defesa do meio ambiente, da
saúde e da tranquilidade pública, bens de natureza difusa” (REsp 1.051.306/MG, Rel.
Min. Castro Meira, Rel. p/o Ac. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 16.10.08,
DJe 10.09.2010.). 4. “O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual
e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela
presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese
das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação
jurídica-base. (...) O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação
de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera
do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos”. Nesse sentido:
REsp 1.410.698/MG, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j. 23.06.2015,
DJe 30.06.2015; REsp 1.057.274/RS, Relª Minª Eliana Calmon, Segunda Turma, j.
01.12.09, DJe 26.02.2010. 5. A Corte local, ao fixar o valor indenizatório em R$
50.000,00 (cinquenta mil reais), o fez com base na análise aprofundada da prova
constante dos autos. A pretensão da ora agravante não se limita à revaloração da
prova apreciada do aresto estadual, mas, sim, ao seu revolvimento por este Tribunal
Superior, o que é inviável. Incidência da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça.
Nesse sentido: AgRg no AREsp 430.850/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda
304 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Turma, DJe 07.03.2014. Agravo regimental improvido. (STJ; AgRg-AREsp 737.887;


Proc. 2015/0161381-8; SE; 2ª T.; Rel. Min. Humberto Martins; DJE 14/09/2015)
77/40 — AÇÃO CIVIL PÚBLICA QUE OBJETIVA A PROTEÇÃO DE FAIXA
MARGINAL DE CURSO D’ÁGUA, NA QUALIDADE DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE DEFERIU PARCIALMENTE
AS MEDIDAS DE URGÊNCIA POSTULADAS PELO PARQUET. AGRAVO POR
INSTRUMENTO. ALEGAÇÃO DA EMPRESA PROPRIETÁRIA NO SENTIDO DE
QUE SE TRATA DE CURSO D’ÁGUA EFÊMERO E, POR CONSEGUINTE, NÃO
PROTEGIDO PELA ATUAL LEGISLAÇÃO AMBIENTAL. AUSÊNCIA DE SUPORTE
TÉCNICO A LASTREAR ESSA CONCLUSÃO. TALVEGUE QUE SE APRESENTOU
SEM FLUXO DE ÁGUA NA ESTAÇÃO DE ESTIAGEM. CARACTERÍSTICA PRÓ-
PRIA DOS CURSOS D’ÁGUA INTERMITENTES, CUJAS MARGENS SÃO ÁREAS DE
PRESERVAÇÃO PERMANENTE. ART. 4º, I, DA LEI Nº 12.651/2012. AUSÊNCIA,
ADEMAIS, DE LICENÇAS AMBIENTAIS. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA
PREVENÇÃO E DA PRECAUÇÃO. PREVALÊNCIA DA PROTEÇÃO AMBIENTAL
NO CASO DE INCERTEZA TÉCNICA. Ante a divergência técnica que paira acerca
da categoria em que se insere o corpo hídrico em debate, ao menos nesta fase pro-
cessual, há que se privilegiar a cautela e, portanto, a preservação do provável bem
ambiental, à luz dos princípios da prevenção e da precaução, a fim de evitar even-
tuais intervenções e dano irreversível a patrimônio da coletividade. Mesmo porque
cabe à empreendedora o ônus da prova de que sua atividade observa os padrões
ambientais permitidos (REsp 1.237.893/SP, Relª Minª Eliana Calmon, Segunda Turma,
j. 24.09.2013). Não se pode simplesmente desprezar, sem maiores esclarecimentos,
a informação de que existe curso d’água a interferir na área em debate, ainda que
tenha se modificado por ações pretéritas. Dessa sorte, a intervenção no local estaria
sujeita ao licenciamento ambiental, observados os limites impostos nos arts. 225,
§ 1º, III, da Constituição Federal e 7º e 8º da Lei nº 12.651/2012, além das hipóte-
ses de utilidade pública, interesse social e baixo impacto ambiental exaustivamente
enumeradas no art. 3º, incisos VIII, IX e X, do mesmo diploma. PROVIMENTOS
LIMINARES POSTULADOS. OBSERVÂNCIA AO PRIMADO DA PROPORCIONA-
LIDADE. PARALISAÇÃO DAS OBRAS. MEDIDA NECESSÁRIA À CONSERVAÇÃO
DO AVENTADO CURSO D’ÁGUA E SUA RESPECTIVA ÁREA DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE. “Quanto à medida a ser adotada com base na precaução, ela deverá
ser proporcional (se em casos de risco muito elevado poderá ser decidida a interdição
da atividade, já em casos de risco reduzido a informação do público poderá ser sufi-
ciente), coerente (a medida deve ser de âmbito e natureza comparáveis às medidas
já tomadas em domínios equivalentes) e precária (as medidas precaucionais devem
ser revistas periodicamente à luz do progresso científico e, sempre que necessário,
alteradas)” (CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito constitucional ambiental
português e da União Europeia. In: CANOTILHO, Joaquim José Gomes; LEITE, José
Rubens Morato [Org.]. Direito constitucional ambiental. 5. ed. São Paulo: Saraiva,
2012. p. 72). Diante das circunstâncias presentes nos autos, afigura-se escorreita a
providência acautelatória postulada no sentido de ordenar a paralisação das obras
e intervenções em geral na área em foco. PUBLICIDADE À DEMANDA POR MEIO
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 305

DE AVERBAÇÃO NA MATRÍCULA DO IMÓVEL E COLOCAÇÃO DE PLACA


INDICATIVA NO LOCAL. SUFICIÊNCIA DA AVERBAÇÃO. Tratando-se de bem
possivelmente protegido pela legislação ambiental e, nesse caso, de patrimônio da
coletividade, merece ser conferida publicidade à discussão. Para tanto, satisfatória a
averbação da existência da presente ação civil pública e da indisponibilidade do bem
na matrícula do registro de imóveis, assim como da ordem judicial de paralisação
das obras e intervenções em geral na área, sendo despicienda a afixação de placas
informativas quanto ao ajuizamento da demanda. Com efeito, a colocação de placas
atingiria o mesmo objetivo que a averbação, podendo ser prejudicial à imagem do
empreendimento perante a sociedade. Assim, pelo primado da proporcionalidade,
dentre duas medidas igualmente adequadas para a consecução de um fim, deve-se
priorizar a menos gravosa. Recurso parcialmente provido. (TJSC; AI 2014.092524-8;
1ª C.D.Púb.; Rel. Des. Carlos Adilson Silva; DJSC 29/09/2015; p. 216)
77/41 — AÇÃO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS. MANUTENÇÃO DOS AVÓS
PATERNOS NO POLO PASSIVO DA DEMANDA. MANUTENÇÃO DO VALOR AR-
BITRADO PELA MAGISTRADA DE ORIGEM. VALOR QUE REFLETE AS NECES-
SIDADES DECORRENTES DA GRAVIDEZ E A POSSIBILIDADE DOS GENITORES.
RECURSO DESPROVIDO. 1. Em que pese a obrigação avoenga de prestar alimentos
seja subsidiária em relação à obrigação do genitor, somente incidindo quando os que
devem prestar alimentos em primeiro lugar não tenham condições de suportar tal
encargo, na hipótese em apreço, diante das peculiaridades do caso concreto, correta
a decisão que deferiu a inclusão dos avós paternos no polo passivo da demanda. 2. O
suposto pai da criança se licenciou do cargo de auditor fiscal estadual que ocupava,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


sem percepção de vencimentos, passando a residir nos Estados Unidos, onde conta
com a ajuda financeira de seus pais, que também residem no exterior. Ademais, o
suposto pai não possui patrimônio no Brasil, de modo que os bens pertencentes aos
avós paternos representam o único lastro patrimonial existente no país. 3. O valor
arbitrado a título de alimentos gravídicos se mostra adequado para custear as despe-
sas decorrentes da gravidez, já que reflete os gastos referentes a aluguel, remédios e
demais despesas do período gestacional, conforme se verifica do documento de fl. 58
da ação originária. 4. Embora a agravada exerça atividade remunerada, atuando como
bancária, os alimentos gravídicos devem ser suportados não só por um genitor, mas,
sim, por ambos, na proporção de seus recursos. 5. A decisão recorrida foi proferida
em juízo de cognição sumária, de modo que, havendo elementos para tanto, pode ser
revista a qualquer momento pela magistrada. Ademais, o ato atacado não apresenta
flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia que justifiquem sua reforma.
6. Recurso conhecido, mas não provido. (TJES; AI 0013226-46.2015.8.08.0035; 1ª
C.Cív.; Relª Desª Janete Vargas Simões; DJES 28/09/2015)
77/42 — AÇÃO DE ANULAÇÃO DE CASAMENTO. RECUSA EM MANTER
RELAÇÕES SEXUAIS COM O CÔNJUGE. SENTENÇA QUE HOMOLOGOU O
ACORDO CELEBRADO ENTRE AS PARTES E DECRETOU A ANULAÇÃO DO
CASAMENTO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE JU-
RÍDICA DO PEDIDO. INOCORRÊNCIA. DIREITO INDISPONÍVEL QUE NÃO
ADMITE TRANSAÇÃO. NULIDADE DO PROCESSO A PARTIR DO PROTOCOLO
306 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DO ACORDO. MEDIDA QUE SE IMPÕE PARA GARANTIR AO RÉU A APRESEN-


TAÇÃO DE DEFESA. NECESSIDADE DE APURAÇÃO DOS FATOS NARRADOS NA
EXORDIAL. RECURSO PROVIDO. I – O pedido é juridicamente possível quando o
ordenamento não o proíbe expressamente, não se podendo confundir tal instituto
com o caso de improcedência do pedido. II – Versando a causa acerca de direito
considerado indisponível, não se pode admitir a transação entre as partes. (TJSC;
AC 2014.076535-0; C.Esp.Reg.Chap.; Rel. Des. Subst. Luiz Antônio Zanini Fornerolli;
DJSC 07/10/2015; p. 384)
77/43 — AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.
BUSCA E APREENSÃO DEFERIDA LIMINARMENTE. PURGAÇÃO DA MORA.
INOCORRÊNCIA. MORA CONTRATUAL CONFIGURADA. DEVOLUÇÃO DAS
PARCELAS PAGAS. INADMISSIBILIDADE. Devedor tem direito somente ao crédito
remanescente da venda do bem pelo credor. Sentença reformada nesta parte. Recurso
provido. (TJSP; APL 9000002-57.2007.8.26.0457; Ac. 8837872; 27ª C.D.Priv.; Relª Desª
Ana Catarina Strauch; DJESP 09/10/2015)
77/44 — AÇÃO DE COBRANÇA. ECAD. DIREITOS AUTORAIS. INDENI-
ZAÇÃO PELA REALIZAÇÃO DE EVENTOS MUSICAIS. COMPROVAÇÃO PELO
AUTOR. FATOS IMPEDITIVOS. ÔNUS DA PROVA DO RÉU. LITIGÂNCIA DE
MÁ-FÉ. AUSÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUTENÇÃO. 1. Incum-
be ao magistrado, como destinatário final, sopesar as provas carreadas aos autos,
atentando-se para o contexto do processo e baseado no princípio do livre-convenci-
mento motivado, para, então sim, enfrentar a lide. 2. Tendo em vista que o réu não
se desincumbiu do seu ônus probatório, com o escopo de demonstrar o excesso na
cobrança dos direitos autorais devidos a título de execução de obras musicais em
seu estabelecimento comercial, deve ser mantida a sentença recorrida. 3. Merece ser
rejeitado o pedido formulado pelo réu para que seja aplicada a pena do art. 940 do
Código Civil, em razão da parcial procedência dos pedidos, porquanto não restou
caracterizada a má-fé, o dolo ou a malícia empregada pelo autor. 4. Mantém-se a
verba honorária fixada se condizente com os ditames do § 3º do art. 20 do Código de
Processo Civil. 5. Negou-se provimento ao apelo. (TJDF; APC 2013.01.1.118691-8;
Ac. 901.304; 3ª T.Cív.; Rel. Des. Flavio Rostirola; DJDFTE 27/10/2015; p. 335)
77/45 — AÇÃO DE COBRANÇA. LEI DE REGISTROS PÚBLICOS. INCOR-
PORAÇÃO IMOBILIÁRIA. AVERBAÇÃO RELATIVA A NEGÓCIO JURÍDICO
QUE ENVOLVE O EMPREENDIMENTO. CUSTAS E EMOLUMENTOS. ATO DE
REGISTRO ÚNICO. APLICAÇÃO DO ART. 237-A, § 1º, DA LRP. SENTENÇA RE-
FORMADA. 1. O art. 237-A, § 1º, da Lei de Registros Públicos estabelece que, após
o registro da incorporação imobiliária até a expedição da carta de habite-se, todos os
subsequentes registros e averbações relativos à pessoa do incorporador ou referentes
a direitos reais de garantias, cessões ou demais negócios jurídicos que envolvam o
empreendimento serão realizados na matrícula de origem do imóvel e em cada uma
das matrículas das unidades autônomas eventualmente abertas, sendo que, para efeito
de cobrança de custas e emolumentos, as averbações e registros serão considerados
como “ato de registro único”. 2. É contraditória a pretensão do demandante em tentar
afastar o comando do § 1º do art. 237-A da LRP, para efeito de cobrança de custas e
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 307

emolumentos, quando, embora não tenha declarado expressamente, utilizou, para


a prática dos atos notariais, o comando inserto no caput do mencionado dispositivo,
ao averbar o cancelamento de penhora, originariamente afeta à matrícula de origem
do bem imóvel, nas matrículas de cada uma das unidades imobiliárias oriundas da
incorporação. 3. Ademais, e apenas para a específica finalidade de cobrança de cus-
tas e emolumentos, considera-se que o ato notarial de averbação de cancelamento
de penhora efetuada na matrícula originária, bem como em todas as matrículas das
unidades imobiliárias daí oriundas, relaciona-se com o referido empreendimento. 4.
Apelação provida. (TJDF; APC 2013.01.1.063944-6; Ac. 893.340; 4ª T.Cív.; Rel. Des.
Cruz Macedo; DJDFTE 28/09/2015; p. 155)
77/46 — AÇÃO DE COBRANÇA. PROMOVIDA PELO HOSPITAL EM FACE
DOS CONSUMIDORES, EM RAZÃO DE MATERIAL USADO EM PROCEDIMENTO
QUE NÃO FOI REEMBOLSADO PELO PLANO DE SAÚDE. INADIMPLÊNCIA
CONFESSADA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. CONSUMIDORES QUE DENUN-
CIARAM A LIDE AO PLANO DE SAÚDE. COMPROVAÇÃO DA AUSÊNCIA DE
AUTORIZAÇÃO PARA PROCEDIMENTO COM MATERIAL CIRÚRGICO RECO-
MENDADO PELO MÉDICO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. APLICAÇÃO
DA SÚMULA Nº 211 DO TJRJ. RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE
CIVIL CONFIGURADA. A denunciação da lide deve, até pela aplicação do princípio
da celeridade, impor ao réu denunciado o dever de efetuar o pagamento diretamente
aos réus da ação principal, como solidário. Sentença que merece mínima reforma.
(TJRJ; APL 0046663-48.2013.8.19.0001; 24ª C.Cív.; Relª Desª Lucia Mothe Glioche;
DORJ 21/09/2015)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


77/47 — AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA. COBERTURA PARA
MORTE POR ACIDENTE. Segurado que faleceu por queda do avião que pilotava.
Contrato de adesão. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor que não im-
pede a aplicação de cláusulas limitativas de direito. Dever de serem redigidas de
forma expressa e clara. Prévia cientificação do consumidor comprovada. Atendidas
as exigências da norma consumerista no caso em tela. Sentença mantida e recurso
de apelação desprovido. (TJPR; ApCiv 1345803-0; 9ª C.Cív.; Rel. Des. José Augusto
Gomes Aniceto; DJPR 08/10/2015; p. 181)
77/48 — AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO, INEXIGIBILIDADE
DE DÉBITO E INDENIZATÓRIA, REUNIDA A MEDIDA CAUTELAR INCIDENTAL.
Mútuo imobiliário. Hipótese que, em princípio, era desnecessária a propositura
da cautelar para consignar prestações vencidas no curso da lide principal a fim de
afastar a mora. Admissão, entretanto, da cautelar incidental como mera “extensão
da principal”, tendo em vista que tal solução não viola, no caso concreto, o direito
das partes, porquanto observados os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Possibilidade de consignar judicialmente as prestações vencidas. Devedora legitimada
a lançar mão da ação consignatória até o momento em que o inadimplemento da
obrigação não tenha ainda materializado situação irreversível. Hipótese, ademais,
em que demonstrada a recusa injustificada pelo credor. Valores consignados pela
devedora superiores aos constantes no demonstrativo de evolução do financiamen-
to exibido nos autos pelo próprio banco, conferindo verossimilhança à alegação
308 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

no sentido de que, ao valor devido, houve o acréscimo de correção monetária e


encargos moratórios. Circunstância, outrossim, em que não impugnou o réu es-
pecificamente as quantias depositadas em juízo. Pedido consignatório procedente
com a liberação da devedora das prestações do financiamento depositadas nos autos.
Descabimento, entretanto, da pretensão de condenação do réu à sanção prevista no
art. 940 do Código Civil, ante a inexistência da cobrança judicial de dívida paga
e da não caracterização de má-fé do credor. Sentença reformada em parte. Pedido
principal julgado parcialmente procedente, procedente o cautelar. Sucumbência
mínima da autora. Condenação do réu ao pagamento das custas e despesas pro-
cessuais despendidas na ação principal e na cautelar, e de honorários advocatícios
arbitrados somente na ação de conhecimento. Recursos, em parte, providos. (TJSP;
APL 4010641-62.2013.8.26.0506; Ac. 8871582; 19ª C.D.Priv.; Rel. Des. João Camillo
de Almeida Prado Costa; DJESP 09/10/2015)
77/49 — AÇÃO DE DESOBSTRUÇÃO DE LOGRADOURO PÚBLICO. ART.
435 DO CPC. COMPARECIMENTO DO PERITO EM AUDIÊNCIA. PRESCINDIBI-
LIDADE NO CASO. NULIDADE DE SENTENÇA. NÃO OCORRÊNCIA. QUESITOS
RESPONDIDOS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. 1. O sistema das nulidades processuais
é informado pela máxima pas de nullité sans grief, segundo a qual não se decreta
nulidade sem prejuízo. 2. O art. 435 do CPC estabelece ser dever da parte, quando da
apresentação ao juízo de requerimento da intimação para comparecimento do perito
em audiência, que formule, desde logo, as perguntas que entender necessárias sob a
forma de quesitos. 3. Conforme a jurisprudência desta Corte, nas hipóteses em que
não há mais dúvidas a esclarecer, a ausência do perito em audiência não configura
nulidade. Precedente. 4. No caso, tendo sido devidamente respondidos pelo perito
os quesitos apresentados pela parte, na mesma oportunidade em que este comunicou
ao juízo a impossibilidade de seu comparecimento na data aprazada para realização
da audiência de instrução, sua ausência no referido ato judicial não é capaz de por
si só nulificá-lo. 5. Agravo regimental não provido. (STJ; AgRg-REsp 1.320.105; Proc.
2012/0082651-3; PB; 3ª T.; Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva; DJE 08/10/2015)
77/50 — AÇÃO DE DESPEJO. DENÚNCIA VAZIA. CONTRATO DE LO-
CAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. PRAZO INDETERMINADO. CASO CONCRETO.
MATÉRIA DE FATO. PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS PARA A CONCES-
SÃO DO PEDIDO LIMINAR. Incidência do inciso VIII do § 1º do art. 59 da Lei do
Inquilinato, acrescido pela Lei nº 12.112/09. Agravo de instrumento provido. (TJRS;
AI 0348549-36.2015.8.21.7000; 15ª C.Cív.; Rel. Des. Vicente Barroco de Vasconcellos;
DJERS 08/10/2015)
77/51 — AÇÃO DE DIVÓRCIO COM PEDIDO DE ALIMENTOS. DECISÃO
LIMINAR QUE INDEFERIU A FIXAÇÃO DE ALIMENTOS PROVISÓRIOS. PEDIDO
DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA FORMULADO EM IMPUGNAÇÃO
À CONTESTAÇÃO. REQUERIMENTO DE DIVISÃO ANTECIPADA DOS LUCROS
MENSAIS. NÃO CONFIGURADA A ALTERAÇÃO DE PEDIDO. PEDIDO LIMINAR
QUE SOMENTE VISA ANTECIPAR A PARTILHA PERQUIRIDA EM PETIÇÃO INI-
CIAL. DIVISÃO DE LUCROS MENSAIS ALBERGADA PELO INSTITUTO DOS ALI-
MENTOS COMPENSATÓRIOS. DISTINÇÃO ENTRE ALIMENTOS DECORRENTES
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 309

DA RELAÇÃO FAMILIAR. Agravado que ficou na administração e gerência dos bens


comuns. Cônjuges profissionais liberais que constituíram empresa familiar. Lucros
da empresa que se confundem com os lucros dos sócios. Agravante que mudou de
cidade e teve que se readaptar a uma nova realidade. Dever de solidariedade fruto do
dever de mútua assistência que se inicia a partir da separação de fato. Impossibilidade
de divisão de lucros da maneira pretendida pela agravante. Necessidade de fixação
de verba compensatória pela impossibilidade de utilização pela agravante dos bens
comuns, os quais eram essenciais ao exercício da profissão de odontóloga. Alimentos
compensatórios fixados em R$ 4.000,00 (quatro mil reais). Recurso conhecido e
parcialmente provido. (TJPR; AgInstr 1273698-8; 12ª C.Cív.; Relª Juíza Conv. Ângela
Maria Machado Costa; DJPR 13/10/2015; p. 298)
77/52 — AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DA PRESUNÇÃO DE PATERNIDADE
JULGADA EXTINTA, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, ANTE A COISA JULGA-
DA FORMADA EM ANTERIOR AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE
FILIAÇÃO JULGADA IGUALMENTE IMPROCEDENTE. RELATIVIZAÇÃO DA
COISA JULGADA. INAPLICABILIDADE NO CASO CONCRETO. PREVALÊNCIA
DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. PRECEDENTES. Não há cogitar
relativização dos efeitos da coisa julgada quando se trata de pretensão que contraria
sentença de improcedência proferida em anterior ação declaratória de inexistência
de filiação, a qual foi julgada improcedente ao argumento de que o vínculo familiar
estabelecido é irreversível, independentemente do liame biológico. Irrevogabilidade
do reconhecimento. Caso concreto em que indeferida a prova pericial na primeira
demanda, manteve-se inerte o demandante, anuindo com a negativa. Nova preten-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


são deduzida em juízo que afronta o princípio da segurança no tráfego das relações
jurídicas, merecendo rechaço. Sentença confirmada. Apelo desprovido. (TJRS; AC
0237425-48.2015.8.21.7000; 7ª C.Cív.; Relª Desª Sandra Brisolara Medeiros; DJERS
08/10/2015)
77/53 — AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
ACIDENTE DE TRÂNSITO. MOTOCICLETA DO PAI E ESPOSO DAS AUTORAS
QUE COLIDIU NA TRASEIRA DO VEÍCULO DE TRAÇÃO ANIMAL (CARROÇA)
DO REQUERIDO, QUE TRAFEGAVA SOBRE A RODOVIA ESTADUAL SC-477.
FALECIMENTO DO CONDUTOR DA MOTOCICLETA. SENTENÇA DE IMPRO-
CEDÊNCIA. RECURSO DAS AUTORAS. PEDIDO DE REFORMA DA SENTENÇA
AO ARGUMENTO DE QUE O SINISTRO OCORREU POR CULPA EXCLUSIVA DO
REQUERIDO. SUBSISTÊNCIA EM PARTE. Elementos probatórios presentes nos
autos que evidenciam a culpa concorrente dos envolvidos no sinistro. Conjunto pro-
batório que demonstra terem as partes envolvidas no sinistro desrespeitado normas de
trânsito, cuja inobservância foi determinante para ocorrência do acidente. Declaração
do condutor da carroça corroborada por prova testemunhal que torna inconteste o
tráfego sobre a rodovia e não no acostamento. Ponto de colisão a demonstrar que o
sinistro ocorreu sobre a pista de rolamento. Flagrante desobediência ao art. 52 do
Código de Trânsito Brasileiro. Portanto, evidente contribuição do requerido para
o evento danoso. Outrossim, vítima que trafegava de motocicleta na retaguarda do
requerido. Inobservância da previsão legal de manutenção de distância segura entre
310 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

veículos com vista ao controle absoluto da motocicleta. Sinistro ocorrido ao ama-


nhecer, em pista reta, com visibilidade regular, a impor ao condutor da motocicleta
o dever de sobrecautela. Inteligência do art. 28 do Código de Trânsito Brasileiro.
Previsibilidade da ocorrência em razão da movimentação de veículos agrícolas no
local. Culpa concorrente dos envolvidos evidenciada. Dano moral suportado pelas
autoras presumido em decorrência da perda do pai e esposo (in re ipsa). Quantum
indenizatório fixado em R$ 30.000,00 (trinta mil reais). Observância das condições
financeiras das partes, bem como do caráter pedagógico e inibidor da reprimenda,
visando ao fortalecimento da cidadania e prestigiamento da dignidade humana
(art. 1º, II e III, da CF). Danos materiais decorrentes das despesas do funeral da
vítima. Dever de indenizar caracterizado. Exegese dos arts. 948 e 949 do Código
Civil. Pedido de ressarcimento das despesas decorrentes do conserto da motocicle-
ta. Possibilidade. Comprovação documental satisfatória. Ausência de produção de
prova capaz de afastar a idoneidade dos documentos apresentados pelas autoras.
Ônus que competia ao requerido. Exegese do art. 333, II, do Código de Processo
Civil. Pedido de fixação de pensão mensal. Dependência econômica da filha menor
e da esposa presumida. Pensão mensal devida no montante equivalente a 2/3 (dois
terços) do salário mínimo. Valor da pensão fixado com base no salário mínimo, por
não restar comprovado o valor da remuneração mensal da vítima. Constituição de
capital. Imprescindibilidade da medida, a qual visa assegurar o fiel pagamento do
valor mensal da pensão. Art. 475-Q do Código de Processo Civil. Limite temporal
da pensão devida à filha menor com dependência econômica presumida até a data
em que completar 25 (vinte e cinco) anos de idade. Outrossim, termo final da obri-
gação devida à esposa da vítima na data em que o de cujus completaria 70 (setenta)
anos de idade, resguardado o direito de acrescer dos beneficiários remanescentes.
Sentença reformada. Sucumbência recíproca, custas pro rata. Suspensa a exigibilidade
dos ônus sucumbenciais por serem ambas as partes beneficiárias da justiça gratuita.
Verbas indenizatórias reduzidas pela metade ante o reconhecimento da concorrência
de culpas. Recurso conhecido e provido. (TJSC; AC 2013.029869-8; 6ª C.D.Civ.; Relª
Desª Denise Volpato; DJSC 09/10/2015; p. 241)
77/54 — AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILI-
DADE CIVIL. SERVIÇO DE INTERNET. BLOQUEIO INDEVIDO. DANOS MORAIS.
OCORRÊNCIA. I – No caso concreto, o serviço de internet contratado pela autora
foi indevidamente bloqueado, por quase um mês e meio, sem qualquer aviso prévio
ou motivo justificável. Tal serviço, atualmente, é considerado essencial e a suspensão
indevida causa transtornos, dissabores e aborrecimentos ao usuário, passíveis de
reparação. II – Caracterizados os danos morais pela falha na prestação do serviço,
cabível a indenização pretendida, acrescida de correção monetária pelo IGP-m, a
partir desta decisão, na forma da Súmula nº 362 do STJ, e dos juros moratórios de
1% ao mês, contados da citação, por se tratar de relação contratual. III – A questão
da multa pelo suposto descumprimento de ordem judicial deverá ser comprovada e
solvida no Juízo de origem, não podendo ser suprimido um grau de jurisdição. IV –
Redimensionamento da sucumbência, observado o integral decaimento da ré em suas
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 311

pretensões. Apelação parcialmente provida. (TJRS; AC 0531383-75.2013.8.21.7000;


5ª C.Cív.; Rel. Des. Jorge André Pereira Gailhard; DJERS 08/10/2015)
77/55 — AÇÃO DE INTERDIÇÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA SEN-
TENÇA EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO À AUDIÊNCIA
DE INTERROGATÓRIO. PROMOTOR DE JUSTIÇA PREVIAMENTE NOTIFICA-
DO DA AUDIÊNCIA. AUSÊNCIA DE NULIDADE. MÉRITO. PERÍCIA MÉDICA
CONCLUINDO QUE A INTERDITANDA PODE GERIR SEUS ATOS. AUSÊNCIA
DE PROVA TESTEMUNHAL PELA INCAPACIDADE. IMPROCEDÊNCIA DOS
PEDIDOS INICIAIS. SENTENÇA REFORMADA. 1. Se o Promotor de Justiça,
mesmo tendo sido efetivamente intimado, se mantém inerte e não toma a iniciativa
de intervir no processo ou comparecer aos atos que fora notificado, não poderá
se falar que houve nulidade processual. 2. Compulsando o arcabouço probatório
desta demanda, denoto que não há provas suficientes para atestar a incapacidade da
interditanda em praticar os atos da vida civil. 3. É que, além do laudo pericial (fls.
36/38) declarar que a interditanda é capaz de reger sua própria vida, administrar
seus bens e até de trabalhar, apesar de portar doença mental temporária, mas não
incapacitante, não houve produção de prova testemunhal nesse sentido, existindo
apenas o seu interrogatório. 4. O fato de a interditanda encontrar-se nervosa e mis-
turando as palavras em sede de interrogatório não faz presumir que seja incapaz,
até porque é normal que pessoas leigas, diante de um magistrado, fiquem nervosas,
em razão de um certo temor de audiência judicial. 5. Não havendo prova suficiente
para se concluir pela incapacidade da interditanda, deve o pedido inicial ser julgado
improcedente, reformando-se a sentença de primeiro grau. 6. Recurso conhecido e

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


provido. (TJAL; APL 0000432-49.2009.8.02.0203; 3ª C.Cív.; Rel. Des. James Magalhães
de Medeiros; DJAL 10/09/2015; p. 382)
77/56 — AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. JULGAMENTO
MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. OB-
SERVÂNCIA. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA E BIOLÓGICA. ANÁLISE DOS
CONTORNOS DO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS NOVOS.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. 1. A decisão monocrática do relator,
proferida nos termos do art. 557 do CPC, não afronta os princípios do contraditório,
ampla defesa, duplo grau de jurisdição ou mesmo do devido processo legal, eis que,
além de ser passível de reexame por meio de agravo, viabiliza o acesso às instâncias
extraordinárias, preservando, em última análise, o princípio do duplo grau de juris-
dição, e todos os demais ínsitos ao ordenamento jurídico vigente. 2. A tese segundo a
qual a paternidade socioafetiva sempre prevalece sobre a biológica deve ser analisada
com bastante ponderação e depende sempre do exame do caso concreto. Afinal,
afastar a possibilidade de o filho maior pleitear o reconhecimento de paternidade
biológica em seu assento de nascimento, no caso de “adoção à brasileira”, significa
impor-lhe que se conforme com essa situação, criada à sua revelia e à margem da lei.
3. Quando a parte agravante não traz nenhuma argumentação suficiente para ensejar
a modificação da linha de raciocínio adotada na decisão monocrática, impõe-se o
desprovimento do regimental, porquanto interposto à míngua de elemento capaz
de desconstituir a decisão que negou seguimento à recurso de apelação anterior. 4.
312 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Agravo regimental conhecido e desprovido. (TJGO; AC 0107781-25.2012.8.09.0167;


5ª C.Cív.; Rel. Des. Geraldo Gonçalves da Costa; DJGO 09/10/2015; p. 153)
77/57 — AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM
PEDIDO DE ALIMENTOS E ANULAÇÃO DO REGISTRO DE NASCIMENTO.
ALIMENTOS PROVISÓRIOS. ADEQUAÇÃO AO TRINÔMIO NECESSIDADE,
POSSIBILIDADE, RAZOABILIDADE. MAJORAÇÃO DEVIDA. I – Os alimentos
provisórios visam atender às necessidades básicas do alimentando até o final do feito,
em parâmetros razoáveis, pois somente através do aprofundamento da cognição é
que se terá o conhecimento da real situação de necessidade e possibilidade das par-
tes, nos termos do art. 1.694, § 1º, do Código Civil. II – Comprovada a privilegiada
situação financeira do prestador, bem como a necessidade presumida da criança e
a ausência de estrutura econômica da mãe, merecem ser majorados os alimentos
estabelecidos na decisão proferida pelo julgador singular, evidenciado que aquele
valor é insuficiente à manutenção das despesas mensais ordinárias da menor. Agra-
vo parcialmente provido. (TJGO; AI 0188859-52.2015.8.09.0000; 6ª C.Cív.; Rel. Des.
Wilson Safatle Faiad; DJGO 29/09/2015; p. 147)
77/58 — AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, AJUIZADA NA COMARCA
DE ARAÇATUBA, CONTRA AUTARQUIA ESTADUAL. EXCEÇÃO DE INCOM-
PETÊNCIA NÃO ACOLHIDA. ART. 100, IV, D, DO CPC. POSSIBILIDADE DE A
AÇÃO SER AJUIZADA EM COMARCA DO INTERIOR. I – In casu, o Tribunal de
origem deu provimento ao agravo de instrumento, interposto contra decisão do
Juízo da Vara de Fazenda Pública da Comarca de Araçatuba/SP, que havia acolhido
a exceção de incompetência e determinado a remessa dos autos a uma das Varas de
Fazenda Pública da Comarca da Capital/SP. II – Ao assim decidir, a Corte de origem
não dissentiu do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que
os Estados e suas autarquias não têm prerrogativa de foro, uma vez que as regras
do art. 100, IV, alíneas b e d, do CPC são especiais em relação à alínea a do mesmo
dispositivo, mormente no caso concreto, em que, conforme ressaltado pelo Tribunal
a quo, a autarquia ré possui estabelecimento e estrutura na Comarca de Araçatuba,
onde haveria o cumprimento da obrigação. III – Segundo a jurisprudência do STJ, “o
Estado-membro não tem prerrogativa de foro. De acordo com as normas de direito
processual civil, as regras do art. 100, IV, b e d, do CPC são especiais em relação à
alínea a do citado artigo. Os Estados federados também podem ser demandados nas
Comarcas onde ocorreram os fatos. Inteligência do art. 100, IV, do CPC. Precedentes:
RESps 50.295/SC, 67.186/SP, 80.482/MG e 13.649/SP (EREsp 49.457/PR, Rel. Min.
Adhemar Maciel, DJU 16.05.97)” (STJ, REsp 186.576/RS, Rel. Min. Franciulli Net-
to, Segunda Turma, DJ 21.08.00). No mesmo sentido: “Reconhece-se às autarquias
estaduais, como aos respectivos Estados-membros, juízo privativo (Vara especiali-
zada). Entretanto, não têm eles foro privilegiado, vale dizer, podem ser demandados
nas Comarcas do interior. Precedentes da Corte” (STJ, REsp 173.301/SP, Rel. Min.
Fernando Gonçalves, Sexta Turma, DJU 28.09.98). IV – Agravo regimental impro-
vido. (STJ; AgRg-AREsp 381.609; Proc. 2013/0260021-9; SP; 2ª T.; Relª Minª Assusete
Magalhães; DJE 02/10/2015)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 313

77/59 — AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE SOCIEDA-


DE DE FATO POST MORTEM. UNIÃO ESTÁVEL EVIDENCIADA. REGIME DE
BENS APLICÁVEL. COMUNHÃO PARCIAL. JULGAMENTO MONOCRÁTICO.
POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE FATO NOVO. PREQUESTIONAMENTO. 1. A
jurisprudência deste Tribunal é forte em afirmar que é absolutamente possível a
aplicação do art. 557 do Código de Processo Civil, desde que sejam observados
os requisitos a ele referentes, como ocorrido in casu, em que a matéria tratada na
decisão monocrática já encontra jurisprudência dominante nesta Corte de Justiça.
2. É notório que a valoração das provas pelo juiz deve atender ao princípio do livre-
convencimento motivado, observada a compatibilidade com a realidade dos autos,
na busca da verdade real. In casu, restou evidenciado pelo conjunto probatório a
existência da união estável havida entre os genitores da apelante/agravante, deven-
do ser mantida a sentença que concluiu pela procedência dos pedidos iniciais. 3.
Reconhecida a união estável, deve ser observado o regime de comunhão parcial de
bens, nos termos do art. 1.725 do Código Civil. 4. Se a parte agravante não traz
argumento suficiente para acarretar a modificação da linha de raciocínio adotada na
decisão monocrática, impõe-se o desprovimento do agravo regimental, porquanto
interposto sem elementos novos capazes de desconstituir o decisum recorrido. 5.
Quanto ao prequestionamento, esclarece-se que dentre as funções do Judiciário não
se encontra a de órgão consultivo. Agravo regimental conhecido, mas improvido.
(TJGO; AC 0271759-23.2013.8.09.0175; 1ª C.Cív.; Rel. Des. Carlos Roberto Favaro;
DJGO 08/10/2015; p. 112)
77/60 — AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁ-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


VEL. DELIMITAÇÃO DOS MARCOS ESTABELECIDOS NA SENTENÇA. MANU-
TENÇÃO. PARTILHA DE IMÓVEL FINANCIADO. VALORIZAÇÃO POSTERIOR.
MEAÇÃO QUE DEVE RECAIR SOBRE O QUANTUM OBTIDO DA SUBTRAÇÃO
ENTRE O SALDO DEVEDOR JUNTO À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E O VA-
LOR DE MERCADO DO BEM. RECURSOS CONHECIDOS. APELO DA AUTORA
PROVIDO E O RECURSO INTERPOSTO PELO REQUERIDO IMPROVIDO À
UNANIMIDADE. DO APELO INTERPOSTO PELA AUTORA. Para a justa compo-
sição de quinhões e equânime distribuição patrimonial, é imperioso que a autora
seja ressarcida não pelo valor em si das parcelas pagas em razão do financiamento
do bem no curso da união estável, mas pela projeção do que significa tal montante
em percentual a incidir sobre o valor de mercado do imóvel, o qual foi apurado me-
diante avaliação judicial. No caso concreto, o bem guerreado fora adquirido no ano
de 2007 por R$ 112.185,05 (cento e doze mil, cento e oitenta e cinco reais e cinco
centavos) e, atualmente, conforme laudo de avaliação, o mesmo vale R$ 230.000,00
(duzentos e trinta mil reais). Portanto, a sentença neste tópico deve ser reformada,
para que considere o valor de mercado atualizado do bem, incidindo a meação sobre
a diferença obtida entre o valor de mercado do imóvel e a quantia devida à instituição
financeira, a título de financiamento, excluindo as parcelas pagas após a dissolução
da união estável. Apelo provido. Do apelo interposto pelo requerido. Divergência
acerca do lapso da união estável. Sentença que deve ser mantida, eis que restou
comprovado nos autos que as partes conviveram no período compreendido entre
314 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

meados de 2004 até o final de 2011, com uma breve interrupção em 2007; devendo
haver a meação do patrimônio adquirido durante esse período. Apelo improvido
à unanimidade. (TJSE; AC 201300217984; Ac. 15768/2015; 1ª C.Cív.; Rel. Des. Ruy
Pinheiro da Silva; DJSE 21/09/2015)
77/61 — AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ESPAÇO PÚBLICO. BAR
QUE SERVE ESCOLA ESTADUAL. TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE USO. Em se
tratando de imóvel como bem público, decorra a titularidade de direito real ou pes-
soal, e não estando os bens públicos sujeitos à usucapião, deve o espaço utilizado
como bar de escola estadual ser desocupado, para fins de que seja licitada a explo-
ração da área. (TJRS; AC 0180600-84.2015.8.21.7000; 20ª C.Cív.; Rel. Des. Carlos Cini
Marchionatti; DJERS 17/09/2015)
77/62 — AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. CASAMENTO
E DIVÓRCIO REALIZADOS NO EXTERIOR. ASSENTOS REGISTRADOS NO
BRASIL APÓS TRASLADO DA SENTENÇA ESTRANGEIRA, QUE DECRETOU
O DIVÓRCIO, DEVIDAMENTE HOMOLOGADA PELO E. STJ. PRETENSÃO DE
SUPRESSÃO DO PATRONÍMICO DO EX-MARIDO. POSSIBILIDADE. EXEGESE
DO ART. 32, § 1º, DA LEI Nº 6.015/73. TRASLADO DO ASSENTO DE DIVÓRCIO
NO 1º OFÍCIO DE DOMICÍLIO DO REGISTRADO QUE CONFERIU EFICÁCIA
AO DIVÓRCIO NO TERRITÓRIO PÁTRIO. CONSEQUENTE SURGIMENTO DO
DIREITO DE RENÚNCIA AO USO DO SOBRENOME DO EX-MARIDO (ART.
1.578, § 1º, DO CC). PRETENSÃO QUE NÃO BUSCA ALTERAÇÃO DO QUE
FOI REGISTRADO NO EXTERIOR OU DA TRANSCRIÇÃO DESSE REGISTRO
NO CARTÓRIO COMPETENTE, MAS A PRÁTICA DE NOVO ATO REGISTRAL,
DESVINCULADO DO ANTERIOR. APELO PROVIDO. 1. Nos termos do art. 32, §
1º, da Lei nº 6.015/72 (Lei de Registros Públicos), uma vez concretizado o registro
do divórcio da ora apelante, está apto a produzir os seus mais variados efeitos no
direito pátrio. Dentre estes, destaca-se o estampado pela regra do art. 1.578, § 1º, do
Código Civil, que autoriza ao cônjuge, a qualquer momento, renunciar ao direito de
usar o sobrenome do outro. 2. Pretensão aduzida que não busca a alteração do que
foi registrado no exterior ou da transcrição desse registro no cartório competente,
mas a prática de um novo ato registral, desvinculado do anterior, decorrente dos
próprios efeitos do divórcio registrado. 3. Não subsunção da temática em discus-
são – direito de supressão do nome de casada – às leis estrangeiras, ainda que o
casamento e o divórcio tenham se realizado fora do território pátrio. Regra do art.
7º, caput, do Decreto-Lei nº 4.657/1941 (Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro) no sentido de que a lei do país em que domiciliada a pessoa determina as
regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos
de família. (TJPR; ApCiv 1343319-5; 12ª C.Cív.; Relª Desª Denise Kruger Pereira; DJPR
01/10/2015; p. 277)
77/63 — AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA PARA ACRESCER AO SOBRENOME DA AUTORA O PATRONÍMI-
CO DO MARIDO. AUSÊNCIA DE PRECLUSÃO TEMPORAL PARA O DESIDERATO.
JUSTIFICATIVA IDÔNEA. IDENTIFICAÇÃO PERSONALÍSSIMA DA ENTIDADE
FAMILIAR. INTERPRETAÇÃO CONJUNTA DA REGRA DOS ARTS. 109 DA LEI
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 315

DE REGISTROS PÚBLICOS (LEI Nº 6.015/73) E 1.056 DO CÓDIGO CIVIL. 1. Não


obstante seja de estilo a adoção do patronímico do cônjuge por ocasião da celebração
do casamento, a lei não impede taxativamente que não possa ocorrer em momen-
to posterior, justamente porque não há limitação às hipóteses de modificação do
nome, cujo pedido será levado sob justificativa à apreciação judicial. 2. Em sendo
manifesto o interesse na adoção do patronímico do marido, inclusive como forma
de identificação da família no meio social, não há por que privarem-se as pessoas
desse direito personalíssimo. 3. Recurso de apelação cível do Ministério Público
conhecido e não provido. (TJPR; ApCiv 1328983-9; 12ª C.Cív.; Relª Desª Ivanise Maria
Tratz Martins; DJPR 01/10/2015; p. 275)
77/64 — AÇÃO DE REVISÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO PARA
FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. INCIDÊNCIA DO CDC. Revisão que é possível
em face da onerosidade excessiva. Arts. 6º, IV e V, e 51, IV, ambos do CDC. “Registro
de contrato”. Cobrança desta despesa que nunca foi vedada. Ausência de interesse
recursal. “Serviços de terceiros”. Encargo que, apesar de pactuado, não está devi-
damente especificado, desconhecendo-se quais os serviços prestados ao mutuário.
Ilegalidade da cobrança. Nova orientação da Câmara. Repetição do indébito. Direito
assegurado, na forma simples, para o fim de evitar o enriquecimento ilícito e que
independe da prova do erro no pagamento. Possibilidade da compensação dos ho-
norários advocatícios. Súmula nº 306/STJ e REsp 963.528/PR, submetido ao rito do
art. 543-C do CPC. Recurso conhecido em parte e, na extensão, desprovido. (TJSC;
AC 2015.061130-4; 5ª C.D.Com.; Rel. Des. Jânio Machado; DJSC 09/10/2015; p. 265)
77/65 — AÇÃO DECLARATÓRIA. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


DE NEGATIVA. CAUÇÃO. ORDEM DE PREFERÊNCIA. INTELIGÊNCIA DO
ART. 11 DA LEI Nº 6.830/80. NÃO CONFIGURA HIPÓTESE DE SUSPENSÃO DA
EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO. RECURSO IMPROVIDO. Apesar de ser possível o
oferecimento de caução, antecipando-se os efeitos da penhora em execução fiscal,
ainda não ajuizada, com a finalidade de obter certidão positiva com efeitos de nega-
tiva, nos termos do art. 206 do CTN, esse procedimento não configura hipótese de
suspensão do crédito. A caução deve seguir as mesmas exigências legais aplicáveis
à execução fiscal, ou seja, deve ser observada a ordem legal, prevista nos arts. 655
do CPC e 11 da Lei nº 6.830/80. (TJMT; AI 69520/2015; 3ª C.Cív.; Rel. Des. Márcio
Vidal; DJMT 16/10/2015; p. 33)
77/66 — AÇÃO DECLARATÓRIA. PRETENSÃO À DECLARAÇÃO DE NÃO
INCIDÊNCIA DE ICMS SOBRE A ATIVIDADE DE MANIPULAÇÃO DE MEDI-
CAMENTOS (FÓRMULAS). Procedência da ação corretamente pronunciada em
primeiro grau. Atividade sujeita ao ISSQN, e não ao ICMS. Tipificação no item 4.07
da lista anexa da Lei Complementar nº 116/03. Precedentes deste c. TJSP. Sentença
mantida. Reexame necessário desacolhido e recurso voluntário improvido. (TJSP;
APL 4002926-24.2013.8.26.0132; Ac. 8879173; 8ª C.D.Púb.; Rel. Des. Rubens Rihl;
DJESP 15/10/2015)
77/67 — AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE FILIAÇÃO E
ANULATÓRIA DE REGISTRO PÚBLICO. DUPLO REGISTRO DE PATERNIDADE.
316 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

MULTIPARENTALIDADE. PAI SOCIOAFETIVO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO


NOS AUTOS. DEMONSTRAÇÃO DE INTERESSE EM FIGURAR NA CERTIDÃO DE
NASCIMENTO DO MENOR. INOCORRÊNCIA. DISPOSIÇÃO FUTURA DE BENS.
POSSIBILIDADE. DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. ANÁLISE. COMPETÊNCIA
DO STF. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL NÃO PREQUESTIONADA.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 211/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO
DEMONSTRADA NOS MOLDES LEGAIS. 1. Cinge-se a controvérsia a verificar a
possibilidade de registro de dupla paternidade, requerido unicamente pelo Ministério
Público Estadual, na certidão de nascimento do menor para assegurar direito futuro
de escolha do infante. 2. Esta Corte tem entendimento no sentido de ser possível o
duplo registro na certidão de nascimento do filho nos casos de adoção por homoa-
fetivos. Precedente. 3. Infere-se dos autos que o pai socioafetivo não tem interesse
em figurar também na certidão de nascimento da criança. Ele poderá, a qualquer
tempo, dispor do seu patrimônio, na forma da lei, por testamento ou doação em
favor do menor. 4. Não se justifica o pedido do Parquet para registro de dupla pa-
ternidade quando não demonstrado prejuízo evidente ao interesse do menor. 5. É
direito personalíssimo e indisponível do filho buscar, no futuro, o reconhecimento
do vínculo socioafetivo. Precedentes. 6. Recurso especial parcialmente conhecido
e, nesta parte, não provido. (STJ; REsp 1.333.086; Proc. 2012/0141938-1; RO; 3ª T.;
Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva; DJE 15/10/2015)
77/68 — AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍ-
DICA. CESSÃO DE CRÉDITO. Falta de notificação do devedor. Art. 290 do Código
Civil de 2002. Efeitos. Inscrição do nome do devedor, “cedido”, em cadastros de
proteção ao crédito. Ausência de impedimento. Precedentes. Súmula nº 83 do STJ.
Agravo improvido. (STJ; AREsp 782.850; Proc. 2015/0232525-0; RS; Rel. Min. Marco
Aurélio Bellizze; DJE 20/10/2015)
77/69 — AÇÃO DECLARATÓRIA NA QUAL SE PRETENDE VER RECO-
NHECIDAS A VALIDADE E A REGULARIDADE DA INSTALAÇÃO DE LETREIRO
LUMINOSO NA FACHADA DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL. Alegação
autoral de adequação às normas previstas na Lei Municipal nº 758/85, que trata da
instalação de anúncios indicativos em imóveis edificados. Notificação promovida
pelo ente municipal amparada nas disposições contidas no Decreto nº 35.507/2012,
que determinou à apelante as competentes providências no prazo estabelecido, a
retirada ou adequação do anúncio fixado na fachada de imóvel comercial. Impossi-
bilidade. Situação fática que revela a completa ilegalidade da exigência contida na
notificação de fl. 30, que sequer faz referência ao artigo violado, contrariando expres-
samente a Lei Municipal nº 758/85. Decisão que não apresenta caráter teratológico,
se encontrando em perfeita harmonia com a jurisprudência desta Corte estadual.
Improvimento do agravo interno. (TJRJ; AGInt-AC 0366861-67.2012.8.19.0001; 10ª
C.Cív.; Rel. Des. Celso Peres; DORJ 21/09/2015)
77/70 — AÇÃO INDENIZATÓRIA. APELAÇÃO RECEBIDA EM SEU DUPLO
EFEITO. IMPOSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA. ART. 521 DO CPC.
NECESSIDADE DE EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO EXECUTÓRIO E LIBE-
RAÇÃO DOS VALORES BLOQUEADOS. 1. Analisando o Sistema de Automação
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 317

do Judiciário – SAJ/PG5, após o conhecimento da liminar proferida neste agravo


de instrumento, o Juízo a quo recebeu o recurso da apelação nos efeitos devolu-
tivo e suspensivo, o que impede o prosseguimento da execução, seja nas formas
definitiva ou provisória, nos termos da dicção do art. 521 do CPC. 2. Em razão do
efeito suspensivo atribuído ao apelo, nenhum ato de constrição pode ser efetuado
antes do julgamento, de forma que deve haver a suspensão do procedimento de
execução provisória. Recurso conhecido e provido. Decisão unânime. (TJAL; AI
0801779-04.2015.8.02.0000; 1ª C.Cív.; Rel. Des. Fernando Tourinho de Omena Souza;
DJAL 08/10/2015; p. 54)
77/71 — AÇÃO MONITÓRIA. DUPLICATA PRESCRITA. PRAZO PRES-
CRICIONAL DE CINCO ANOS. ART. 206, § 5º, I, DO CÓDIGO CIVIL. 1. A ação
monitória fundada em duplicata mercantil prescrita está subordinada ao prazo
prescricional de 5 (cinco) anos de que trata o art. 206, § 5º, I, do Código Civil,
contados do vencimento da obrigação. 2. Recurso especial conhecido e provido.
(STJ; REsp 1.402.309; Proc. 2013/0296088-0; PR; Rel. Min. João Otávio de Noronha;
DJE 23/10/2015)
77/72 — AÇÃO MONITÓRIA. JUNTADA DE DOCUMENTO COM A APE-
LAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 397 DO CPC. 1. É possível a juntada a posteriori
de documentos com a apelação, desde que tais documentos sejam acerca de fatos já
alegados ou para contrapor-se a outros fatos que foram produzidos nos autos, nos
termos do art. 397 do CPC. E isso não implica reexame do conjunto fático-probatório
dos autos, o que afasta a incidência da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ; AgRg-AREsp 407.426; Proc.
2013/0339149-5; SC; 4ª T.; Relª Minª Isabel Gallotti; DJE 01/10/2015)
77/73 — AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. EXAME DE DNA. RECUSA
DA MÃE QUE INCLUSIVE APONTA O NOME DO PAI BIOLÓGICO. PATERNI-
DADE SOCIOAFETIVA. AUSÊNCIA. CONFISSÃO DA MÃE. PREVALÊNCIA.
ERRO NO RECONHECIMENTO DA FILIAÇÃO. INTERESSE DO MENOR. 1. A
ação negatória de paternidade atende não apenas ao interesse do pai, mas também
da menor, interessada que é na verdadeira paternidade, fato que a irá marcar para
o resto da vida, com reflexos inclusive na personalidade. 2. Provada a ausência de
vínculo afetivo entre o autor e a menor e pela confissão da mãe, que declara ser a
filha de outrem, procede o pedido de negatória de paternidade. 3. Além disso, o
reconhecimento da paternidade pode ser desconstituído quando demonstrado que
foi falsamente atribuído a alguém, caso em que houve erro no ato de registro por
engano provocado pela genitora da menor. 4. A menor tem o direito de saber quem
é seu verdadeiro pai. Assim, não se mostra possível que se saiba que o autor não é
o pai biológico da menor e ainda assim não se determine a correção dos assenta-
mentos. Não se pode perder de vista que o direito tem que seguir, sempre, regras
éticas, morais e primar pelo princípio da dignidade da pessoa humana. 5. Recurso
conhecido, mas improvido. (TJDF; APC 2013.03.1.036530-7; Ac. 893.219; 2ª T.Cív.;
Relª Desª Gislene Pinheiro de Oliveira; DJDFTE 16/09/2015; p. 144)
318 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

77/74 — AÇÃO POPULAR. CONDIÇÕES DA AÇÃO. AJUIZAMENTO PARA


COMBATER ATO LESIVO À MORALIDADE ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE.
ACÓRDÃO QUE MANTEVE SENTENÇA QUE JULGOU EXTINTO O PROCESSO,
SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, POR ENTENDER QUE É CONDIÇÃO DA AÇÃO
POPULAR A DEMONSTRAÇÃO DE CONCOMITANTE LESÃO AO PATRIMÔNIO
PÚBLICO MATERIAL. DESNECESSIDADE. CONTEÚDO DO ART. 5º, LXXIII, DA
CF. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHE-
CIDA. 1. O entendimento sufragado no acórdão recorrido de que para o cabimento
de ação popular é exigível a menção na exordial e a prova de prejuízo material aos
cofres públicos diverge do entendimento sufragado pelo STF. 2. A decisão objurgada
ofende o art. 5º, LXXIII, da CF, que tem como objetos a serem defendidos pelo ci-
dadão, separadamente, quaisquer atos lesivos ao patrimônio material público ou de
entidade de que o Estado participe, ao patrimônio moral, ao patrimônio cultural e
ao patrimônio histórico. 3. Agravo e recurso extraordinário providos. 4. Repercussão
geral reconhecida com reafirmação da jurisprudência. (STF; ARE-RG 824.781; MT;
Rel. Min. Dias Toffoli; DJE 09/10/2015; p. 20)
77/75 — AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO DE FALÊNCIA AJUIZADA SOB A VI-
GÊNCIA DO DL Nº 4.661/1945. Sentença que decretou a falência com base na nova
Lei de Falências e recuperação judicial. Lei nº 11.101/05. Desobediência ao art. 192 da
Lei nº 11.101/05. Violação a literal disposição de Lei. Art. 485, V, do CPC. Ausência
de documentos necessários à propositura da ação falimentar, ex vi do art. 15 da Lei
nº 5.474/68 e da Súmula nº 361 do STJ. Interpretação e incidência dos princípios do
devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa – CF, art. 5º, LIV e LV – e
da regra insculpida no art. 284 do CPC. Determinação ao Juízo de primeiro grau
para que intime o autor, concedendo-lhe o prazo de 10 (dez) dias, a fim de trazer
aos autos os documentos essenciais – CPC, art. 283 – e proceder à emenda da inicial
– CPC, art. 282 –, sob pena de extinção do processo, sem resolução do mérito art.
267, inciso I, do CPC. Rescisória julgada procedente, em parte. Devolução do valor
do depósito previsto no art. 488, II, do CPC. (TJAL; AR 0003227-21.2010.8.02.0000;
S.Esp.Cív.; Rel. Des. Fábio José Bittencourt Araújo; DJAL 29/09/2015; p. 117)
77/76 — AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE CRÉDITO. COOPERATIVA
DE CRÉDITO. APLICAÇÃO DO CDC. TARIFA DE ADIANTAMENTO DE DEPO-
SITANTE. REPETIÇÃO E/OU COMPENSAÇÃO DE INDÉBITO. MAJORAÇÃO DE
HONORÁRIOS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. COOPERATIVA DE
CRÉDITO. APLICABILIDADE. Nas relações de creditícias realizadas com coope-
rativas de crédito, incide o Código de Defesa Consumidor. Em razão da natureza
de instituição financeira, fiscalizada pelo Bacen, e da conformação da cooperativa,
inexistindo vinculação pessoal entre os associados, o negócio jurídico concretizado
possui características típicas de contrato bancário. Na concessão de crédito, a parte
atua como qualquer instituição bancária, inclusive pela forma de contratação dos
produtos. Tarifa de adiantamento. Tarifa de adiantamento à depositante e de serviço.
Previsão regulamentar para cobrança segundo as normas administrativas. Todavia, a
cobrança é condicionada à expressa contratação e a uma cobrança a cada trinta dias.
No caso, não há demonstração de contratação explícita entre as partes, o que afasta a
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 319

cobrança da tarifa. Compensação. Repetição. Devem ser devolvidos ou compensados,


de forma simples, os valores eventualmente pagos pelo consumidor, dispensada prova
de erro. Ausência de demonstração de cobrança com malícia ou má-fé. Precedentes do
STJ. Sucumbência. Pedido de majoração dos honorários advocatícios. Considerando
os pedidos formulados pela parte autora, houve maior sucumbência da ré, de forma
que devem ser redimensionados os ônus da sucumbência, inclusive com majoração
da verba honorária, porque insuficiente aquela fixada na sentença (R$ 268,99). Pre-
questionamento. Apelação do réu parcialmente provida, à unanimidade. Apelação
do autor provida em parte, por maioria. (TJRS; AC 0577362-94.2012.8.21.7000; 23ª
C.Cív.; Rel. Des. Alberto Delgado Neto; DJERS 08/10/2015)
77/77 — AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO.
COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. TARIFA DE
SERVIÇO DE TERCEIROS. TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO. 1. É possível
a cobrança de comissão de permanência, desde que limitada à soma dos encargos
remuneratórios e moratórios previstos no contrato, não podendo sua cobrança ser
cumulada com correção monetária, juros remuneratórios e moratórios e multa
contratual. 2. As tarifas de avaliação de bem, de serviços de terceiros e de registro
de contrato figuram-se abusivas, por se tratarem de serviços de exclusivo interes-
se da instituição financeira. 3. Sentença parcialmente reformada. (TJMG; APCV
1.0707.11.012428-6/002; 9ª C.Cív.; Rel. Des. José Arthur Filho; DJEMG 09/10/2015)
77/78 — ACIDENTE DE TRÂNSITO. TAXISTA QUE DEIXOU DE LABORAR
ENQUANTO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO-HOSPITALAR. LUCROS
CESSANTES DEVIDOS. DISCUSSÃO RELATIVA À BASE ESTIMATIVA DA REMU-

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


NERAÇÃO DIÁRIA DEVIDA E AO TERMO FINAL DOS LUCROS CESSANTES. É
possível a utilização de declaração de entidade representativa de classe para cômputo
dos lucros cessantes. Precedentes jurisprudenciais. Termo final modificado, ante a
data da última consulta médica realizada. Inexistência de prova em sentido adverso,
comprovando a aptidão para o exercício da profissão em momento anterior. Apli-
cação do art. 333, inciso II, do CPC. Verbas de sucumbência mantidas, nos termos
do art. 21, parágrafo único, do CPC. Sentença parcialmente reformada. (TJSP; APL
0014475-88.2009.8.26.0278; Ac. 8836375; 27ª C.D.Priv.; Relª Desª Ana Catarina
Strauch; DJESP 09/10/2015)
77/79 — ACORDO DE ALIMENTOS. CÔNJUGES SOB O MESMO TETO.
ALIMENTOS PARA EX-CÔNJUGES. REQUISITOS. NÃO PREENCHIMENTO. 1. O
dever de prestar alimentos, alicerçado nos princípios constitucionais da dignidade
da pessoa humana (art. 1º, inciso III) e da solidariedade social e familiar (art. 3º),
somente é cabível quando um dos familiares não possui condições de satisfazer suas
necessidades vitais por si só. 2. O encargo alimentar deve ser fixado com amparo
no binômio necessidade-utilidade. 3. Cônjuges que permanecem com o vínculo
marital e convivem de forma harmoniosa sob o mesmo teto, com regular presta-
ção do dever de assistência e sustento, não fazem jus à percepção de alimentos. 4.
Quanto a ex-cônjuges que residem sob o mesmo teto, admite-se excepcionalmente
a prestação alimentícia, desde que preenchidos os seguintes requisitos: a) a exis-
tência de vínculo marital ou decorrente de união estável entre os requerentes; b) a
320 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

necessidade alimentar daquele que postula o recebimento da prestação alimentícia;


c) a incapacidade do alimentando de sustentar a si próprio; e d) a possibilidade fi-
nanceira do alimentante de arcar com o encargo. 5. Na ausência de algum requisito
legal, incabível a imposição do dever de prestar alimentos. 6. Apelação não provida.
(TJDF; APC 2015.03.1.013733-2; Ac. 898.555; 3ª T.Cív.; Rel. Des. Flavio Rostirola;
DJDFTE 13/10/2015; p. 198)
77/80 — AGRAVO REGIMENTAL EM SEDE DE DECISÃO MONOCRÁTICA
PROFERIDA NA AÇÃO RESCISÓRIA QUE MANTEVE INTACTA A SENTENÇA
DE PLANÍCIE, JULGANDO, POIS, DESPROVIDO O RESCINDENDO. SENTENÇA
MERAMENTE HOMOLOGATÓRIA. DIVERGÊNCIA DOUTRINÁRIA. EXISTÊNCIA
DE DUAS CORRENTES, SENDO QUE A PRIMEIRA AFIRMA QUE PARA FINS
DE INCIDÊNCIA DO ART. 486 DO CPC HÁ QUE SE FAZER UMA DISTINÇÃO
ENTRE SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA PROPRIAMENTE DITA E SENTENÇA
MERAMENTE HOMOLOGATÓRIA. INTERPRETAÇÃO LÓGICO-GRAMATICAL
DO DISPOSITIVO DE LEI (ART. 486 DO CPC). A SEGUNDA CORRENTE DIZ QUE
A LEI PROCESSUAL CIVIL NÃO IMPÔS A DIFERENCIAÇÃO MENCIONADA NA
PRIMEIRA CORRENTE, DEVENDO, PORTANTO, O JULGADOR, DEBRUÇANDO-
SE SOBRE A PECULIARIDADE DE CADA CASO, FAZER UMA CONCILIAÇÃO
ENTRE AS NORMAS EXISTENTES NOS ARTS. 485, VIII, E 486 DO CPC. ADOÇÃO
DO PRIMEIRO POSICIONAMENTO. PRECEDENTES DE OUTROS TRIBUNAIS
DE JUSTIÇA PÁTRIOS. 1. A insurgência apontada desafia o decisum monocrático de
fls. 148/156, que julgou improcedente a ação rescisória, que por sua vez tinha como
alvo sentença homologatória de acordo em ação executória de alimentos. 2. No que
diz respeito à propositura de rescindendo cujo objeto seja sentença homologatória,
a doutrina denota-se divergente, pois que para C.S.B. a sentença homologatória
divide-se em dois planos, aquelas que resolvem de certa forma o mérito da questão e
aquelas que apenas ratificam a vontade das partes, sendo que nesta última não seria
possível a propositura de ação rescisória, mas, sim, de ação anulatória, conforme
se pode depreender da interpretação lógico-gramatical do art. 486 do CPC. Já para
a doutrina de J.C.B.M., não há diferenciação alguma no que concerne à temática
sentença homologatória, porquanto o texto legiferante (art. 486 do CPC) não faz
nenhuma distinção, sendo correto, então, o julgador utilizar-se de uma conciliação
entre as normas dispostas nos arts. 485, VIII, e 486 do CPC. 3. O Superior Tribunal
de Justiça, bem como os Tribunais de Justiça pátrios têm adotado o entendimento
esposado por C.S.B., ou seja, o de que nas sentenças meramente homologatórias,
como é o caso dos autos, não se admite a propositura de rescindendo, mas, sim, de
ação anulatória – interpretação lógico-gramatical do art. 486 do CPC. Neste sen-
tido: STJ, REsp 1.246.515/RS, Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j.
10.05.2011; STJ, REsp 962.350/RS, Minª Eliana Calmon, Segunda Turma, j. 04.09.08;
TJGO, AC 0273556-50.2004.8.09.0110, Aruana, Primeira Câmara Cível, Rel. Des.
Roberto Horácio de Rezende, DJGO 07.08.2014, p. 201; TJMT, AR 20758/2013, Barra
do Garças, Sexta Câmara Cível, Rel. Des. Adilson Polegato de Freitas, j. 05.06.2014,
DJMT 11.06.2014, p. 43; TJRJ, AR 2006.006.00226, Décima Sétima Câmara Cível,
Rel. Des. Lindolpho Morais Marinho, j. 28.02.07; TJSP, AR: 20070627220148260000
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 321

SP, Rel. Des. Morais Pucci, j. 15.05.2014, 27ª Câmara de Direito Privado, public.
16.05.2014. 4. Filio-me ao primeiro entendimento, de que não cabe rescindendo
na sentença meramente homologatória, isto porque este posicionamento já tem o
sustentáculo de precedentes jurisprudenciais, e mais: a adoção da segunda corrente
torna diminuta a utilidade da ação anulatória, pois que naturalmente será pequeno
o espaço de tempo entre a prática de atos como a renúncia à prescrição, ou reco-
nhecimento do pedido, ou a transação, e o trânsito em julgado da sentença que os
homologue, sendo, desta forma, descabidos os fundamentos expostos pelo agravante,
pois que, em verdade, este e. Tribunal sequer poderia analisar a matéria, inclusive
quanto à prescrição, porquanto impossível, ante a necessidade, como já dito, do
aforamento de ação anulatória (art. 486 do CPC). 5. Em ressunta, a sentença que se
pretende rescindir é meramente homologatória do acordo celebrado entre as partes,
sem análise do mérito de direito material controvertido. Cabível a anulação do ato
realizado entre as partes (art. 486 do CPC), não a propositura de ação rescisória (art.
485 e seus incisos), se o vício alegado se refere ao acordo, não à sentença. (TJCE;
AgRg 0031996-23.2013.8.06.0000/50001; C.Cív.Reun.; Rel. Des. Antônio Pádua Silva;
DJCE 08/10/2015; p. 12)
77/81 — AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM
AGRAVO. Retenção de recurso extraordinário com base no art. 542, § 3º, do CPC.
Descabimento. Precedentes. Agravo regimental ao qual se nega provimento. (STF;
ARE-AgR 899560; AL; 2ª T.; Relª Minª Cármen Lúcia; DJE 06/10/2015; p. 32)
77/82 — ALIMENTOS AVOENGOS COMPLEMENTARES. FIXAÇÃO. CABI-
MENTO. QUANTUM REDUZIDO. MARCO FINAL DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


DESCABIMENTO. REVOGAÇÃO DA GRATUIDADE JUDICIÁRIA. APELAÇÃO DA
AVÓ/ALIMENTANTE. A OBRIGAÇÃO ALIMENTAR AVOENGA É “SUBSIDIÁRIA”
OU “COMPLEMENTAR”. Logo, os avós podem ser compelidos a contribuir para
com as necessidades dos netos não somente na impossibilidade absoluta do pais
(subsidiariamente), mas também quando demonstrado que os obrigados principais
não têm condições de satisfazer totalmente as necessidades dos filhos (art. 1.698
do Código Civil). Caso em que os avós podem ser chamados a “complementar” os
alimentos dos netos. Doutrina e precedentes jurisprudenciais. Hipótese em que vai
mantida a obrigação da avó prestar alimentos à neta. O valor dos alimentos, contudo,
vai reduzido à metade do fixado na sentença, em razão do avanço da idade, despesas
com saúde e conforto da progenitora. APELAÇÃO. AUTORA/ALIMENTANDA.
Tratando-se de alimentando maior de idade e recém formado, não se justifica a ma-
nutenção da obrigação alimentar, sem qualquer termo final, como requerido pela
alimentanda. Na peculiaridade, adequado que os alimentos permaneçam vigentes
durante um prazo minimamente razoável para que a alimentanda, recém formada,
possa se estabelecer no mercado de trabalho, não sendo adequada a exoneração da
obrigação no exato momento da formatura em curso superior. Caso em que, em
um juízo de proporcionalidade, adequado adiar em um ano o termo final da obri-
gação alimentar fixado na sentença. Gratuidade judiciária revogada em favor da avó
materna, pois ela recebe renda superior a 10 salários mínimos. Precedentes. Deram
322 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

parcial provimento às apelações. (TJRS; AC 0030665-67.2015.8.21.7000; 8ª C.Cív.;


Rel. Des. José Pedro de Oliveira Eckert; DJERS 10/09/2015)
77/83 — ALIMENTOS FIXADOS EM FAVOR DA FILHA MENOR. PLEITO
DE REDUÇÃO DO PERCENTUAL FIXADO. ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. OBSERVÂNCIA DO BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE.
VERBA FIXADA EM VALOR SUPERIOR ÀS POSSIBILIDADES ECONÔMICAS. I
– O valor fixado para os alimentos deve ser baseado no binômio necessidade/possi-
bilidade, consoante dispõe o § 1º do art. 1.694 do Código Civil, lembrando que, ao
mesmo tempo em que deve atender às necessidades do alimentando, deve respeitar
as condições econômicas do alimentante, sob pena de se tornar gravame insupor-
tável para o mesmo. II – A redução dos alimentos se impõe quando demonstrada a
impossibilidade do alimentante em arcar com o quantum fixado, mormente quando
o valor se mostrar superior ao quantum necessário para fazer frente às despesas da
menor, ressaltando-se que a obrigação de sustento da prole é imposta a ambos os
genitores, nos termos do art. 1.703 do CC. III – In casu, analisada a prova documental
apresentada nos autos, sobretudo, os contracheques do apelante, suas despesas e as
da menor, tenho que restou demonstrada a impossibilidade de arcar com o valor dos
alimentos no percentual estipulado pelo sentenciante (30%), impondo-se a redução
dos alimentos para o equivalente a 20% (vinte por cento) de seus rendimentos, o
que considero mais condizente com a sua possibilidade e com as despesas regulares
da menor demonstradas nos autos. IV – Recurso conhecido e parcialmente provido.
(TJSE; AC 201500821652; Ac. 17448/2015; 2ª C.Cív.; Relª Desª Iolanda Santos Gui-
marães; DJSE 09/10/2015)
77/84 — ANULAÇÃO DE REGISTRO CIVIL CUMULADA COM INVESTI-
GAÇÃO DE PATERNIDADE. VÍNCULO BIOLÓGICO E LIAME SOCIOAFETIVO.
1. Se o pai biológico propôs a ação buscando a desconstituição do registro civil e
a declaração do liame parental com a filha, bem como se o pai registral deixou de
contestar a ação, não se opondo ao pedido e se a filha também deixou de contestar,
ficando cabalmente comprovado o vínculo de consanguinidade com o autor, então
não merece qualquer reparo a sentença que julgou a ação procedente e, acolhendo
o pedido, desconstituiu o liame registral, para nele constar o nome do pai biológico.
2. É manifestamente descabida a pretensão dos réus no sentido de que permaneça
hígido o registro anterior, apenas incluindo o nome do pai biológico, isto é, mantendo
também o nome do pai registral, pois desapareceu o vínculo jurídico deste com a ré.
3. Embora tenha sido desconstituído o vínculo jurídico de filiação, nada impede que
eles mantenham o mesmo vinculo afetivo e também as mesmas relações estreitas que
sempre mantiveram. Recurso desprovido. (TJRS; AC 0317919-94.2015.8.21.7000; 7ª
C.Cív.; Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves; DJERS 08/10/2015)
77/85 — ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. ISENÇÃO TRIBUTÁRIA. CO-
BRANÇA INDEVIDA DE ICMS SOBRE PRODUTOS ISENTOS. COMPROVAÇÃO.
NECESSIDADE DE RESTRINGIR APENAS AOS PRODUTOS HORTIFRUTIGRAN-
JEIROS ELENCADOS NO ANEXO VII DO DECRETO Nº 3.803/04. SENTENÇA
PARCIALMENTE MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PRO-
VIDO. A isenção da cobrança de ICMS sobre produtos isentos deve ser restringida
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 323

àqueles elencados no Anexo VII do Decreto nº 3.803/04. (TJMT; RCIN 250/2015;


T.R.Un.; Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida; DJMT 16/09/2015; p. 75)
77/86 — APLICAÇÃO DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL PELO
TRIBUNAL DE ORIGEM (ART. 543-B DO CPC). INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO
PREVISTO NO ART. 544 DO CPC. NÃO CABIMENTO. PRINCÍPIO DA FUNGI-
BILIDADE RECURSAL. DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM
PARA JULGAMENTO DO RECURSO COMO AGRAVO INTERNO. CABIMENTO
SOMENTE PARA OS RECURSOS INTERPOSTOS ANTES DE 19.11.09. CONFI-
GURAÇÃO DE ERRO GROSSEIRO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. I – A jurisprudência do STF firmou-se no sentido do não cabi-
mento do agravo previsto no art. 544 do CPC para atacar decisão a quo que aplica
a sistemática da repercussão geral (AI 760.358-QO/SE, Rel. Min. Gilmar Mendes).
II – Inaplicável o princípio da fungibilidade recursal para se determinar a conversão
do presente recurso em agravo regimental a ser apreciado pela origem, porquanto
esta Corte fixou o entendimento de que após 19.11.09, data em que julgado o AI
760.358-QO/SE, a interposição do agravo previsto no art. 544 do CPC configura
erro grosseiro. III – Agravo regimental a que se nega provimento. (STF; ARE-AgR
888.138; RO; T.P.; Rel. Min. Ricardo Lewandowski; DJE 05/10/2015; p. 65)
77/87 — ARRENDAMENTO MERCANTIL. REVISÃO CONTRATUAL C/C
RESTITUIÇÃO DE VALORES. 1. Tanto na conclusão quanto na execução dos
contratos, as partes devem observar os princípios da probidade e da boa-fé. 2. No
contrato em que as prestações foram calculadas e estabelecidas em valores mensais
fixos, com ciência e concordância de ambas as partes, incide a regra do pacta sunt

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


servanda e os princípios da probidade e da boa-fé. Inteligência dos arts. 113 e 422 do
Código Civil. 3. Perfeitamente cabível a cobrança da tarifa de cadastro, pois em total
consonância com as disposições emanadas pelo Banco Central e pelo CMN, conforme
entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo.
4. Não pode a arrendadora requerer o pagamento de valores sem informar a consu-
midora, de forma detalhada e clara, a que se referem. 5. Se o seguro de proteção era
facultativo, e a arrendatária aceitou sua contratação, não há que se falar em cobrança
indevida. Recurso parcialmente provido. (TJSP; APL 1036649-84.2013.8.26.0100; Ac.
8838016; 26ª C.D.Priv.; Rel. Des. Felipe Ferreira; DJESP 09/10/2015)
77/88 — ARROLAMENTO DE BEM. UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM.
DECISÃO QUE DETERMINOU A INCLUSÃO DA AGRAVADA COMO HER-
DEIRA PARA LHE ATRIBUIR O EQUIVALENTE A 2/3 DA HERANÇA, CASO
COMPROVADA A CONDIÇÃO DE IRMÃ DO DE CUJUS. INSURGÊNCIA DA
AGRAVANTE, COMPANHEIRA DO DE CUJUS. PRETENSÃO À DECLARAÇÃO
DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 1.790 DO CÓDIGO CIVIL. IMPOSSI-
BILIDADE. CONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO ÓRGÃO ESPECIAL.
A constitucionalidade do art. 1.790 do CC já foi reconhecida pelo Órgão Especial
do Tribunal de São Paulo e deve prevalecer. Em razão da cláusula constitucional
de reserva e da Súmula Vinculante nesse sentido, somente o Tribunal Pleno pode
declarar a inconstitucionalidade do dispositivo legal em referência, de modo que, já
decidido em sentido contrário pelo Órgão Especial do Tribunal de São Paulo, não se
324 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

admite solução diferente, cumprindo ao órgão de jurisdição fracionário de segundo


grau aplicar a norma declarada constitucional. Portanto, tendo o de cujus deixado
uma irmã, cabe à agravante apenas 1/3 da herança, além do direito à meação sobre
o imóvel, como corretamente decidiu a decisão agravada. Decisão mantida. Recurso
não provido. (TJSP; AI 2119753-92.2015.8.26.0000; Ac. 8855437; 10ª C.D.Priv.; Rel.
Des. Carlos Alberto Garbi; DJESP 09/10/2015)
77/89 — AUTOS DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO LAVRADOS POR SOCIE-
DADE DE ECONOMIA MISTA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. DECLARAÇÃO
DE NULIDADE DOS AIIMS. RECURSO DA RÉ. DESPROVIMENTO DE RIGOR.
O Município tem competência para legislar sobre assuntos de interesse local e para
suplementar a legislação federal e estadual (art. 30, I e II, da CF), o que autoriza a
celebração de convênios ou credenciamentos com órgãos e entidades em matéria
de trânsito. Delegação de função pelo Poder Público com o objetivo de controlar
e sancionar o infrator de trânsito. Legalidade da lavratura dos autos de infração
pela Transerp, desde que expedidos por policial militar ou equipamento eletrônico
(radar). Precedentes. Questão controversa. Reconhecimento de repercussão geral
no ARE 662.186/MG pelo e. STF. Presunção de legalidade e legitimidade do ato
administrativo que deve prevalecer. No entanto, no caso dos autos, as autuações
foram promovidas por agente civil de trânsito, padecendo, desse modo, de nulidade.
R. sentença mantida. Recurso desprovido. (TJSP; APL 1037579-14.2014.8.26.0506;
Ac. 8874135; 6ª C.D.Púb.; Rel. Des. Sidney Romano; DJESP 09/10/2015)
77/90 — AUTUAÇÃO PELO PROCON. LOJISTAS. DESCONTO PARA PA-
GAMENTO EM DINHEIRO OU CHEQUE EM DETRIMENTO DO PAGAMENTO
EM CARTÃO DE CRÉDITO. PRÁTICA ABUSIVA. CARTÃO DE CRÉDITO. MO-
DALIDADE DE PAGAMENTO À VISTA. PRO SOLUTO. DESCABIDA QUALQUER
DIFERENCIAÇÃO. DIVERGÊNCIA INCOGNOSCÍVEL. 1. O recurso especial
insurge-se contra acórdão estadual que negou provimento a pedido da Câmara de
Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte no sentido de que o Procon/MG se abstenha
de autuar ou aplicar qualquer penalidade aos lojistas pelo fato de não estenderem
aos consumidores que pagam em cartão de crédito os descontos eventualmente ofe-
recidos em operações comerciais de bens ou serviços pagos em dinheiro ou cheque.
2. Não há confusão entre as distintas relações jurídicas havidas entre (i) a instituição
financeira (emissora) e o titular do cartão de crédito (consumidor); (ii) o titular do
cartão de crédito (consumidor) e o estabelecimento comercial credenciado (forne-
cedor); e (iii) a instituição financeira (emissora e, eventualmente, administradora
do cartão de crédito) e o estabelecimento comercial credenciado (fornecedor). 3. O
estabelecimento comercial credenciado tem a garantia do pagamento efetuado pelo
consumidor por meio de cartão de crédito, pois a administradora assume inteiramente
a responsabilidade pelos riscos creditícios, incluindo possíveis fraudes. 4. O paga-
mento em cartão de crédito, uma vez autorizada a transação, libera o consumidor de
qualquer obrigação perante o fornecedor, pois este dará ao consumidor total quitação.
Assim, o pagamento por cartão de crédito é modalidade de pagamento à vista, pro
soluto, implicando, automaticamente, extinção da obrigação do consumidor perante
o fornecedor. 5. A diferenciação entre o pagamento em dinheiro, cheque ou cartão
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 325

de crédito caracteriza prática abusiva no mercado de consumo, nociva ao equilíbrio


contratual. Exegese do art. 39, V e X, do CDC: “Art. 39. É vedado ao fornecedor de
produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (...) V – exigir do consumi-
dor vantagem manifestamente excessiva; (...) X – elevar sem justa causa o preço de
produtos ou serviços”. 6. O art. 51 do CDC traz um rol meramente exemplificativo
de cláusulas abusivas, num “conceito aberto” que permite o enquadramento de
outras abusividades que atentem contra o equilíbrio entre as partes no contrato de
consumo, de modo a preservar a boa-fé e a proteção do consumidor. 7. A Lei nº
12.529/2011, que reformula o sistema brasileiro de defesa da concorrência, considera
infração à ordem econômica, a despeito da existência de culpa ou de ocorrência de
efeitos nocivos, a discriminação de adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços
mediante imposição diferenciada de preços, bem como a recusa à venda de bens ou à
prestação de serviços em condições de pagamento corriqueiras na prática comercial
(art. 36, X e XI). Recurso especial da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte
conhecido e improvido. (STJ; REsp 1.479.039; Proc. 2014/0223163-4; MG; 2ª T.; Rel.
Min. Humberto Martins; DJE 16/10/2015)
77/91 — AVAL PRESTADO POR UM DOS CÔNJUGES SEM A OUTORGA
UXÓRIA. ATO ANULÁVEL. EXECUÇÃO EXTINTA. Preceitua o Código Civil, em
seu art. 1.647, inciso III, que, “ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos
cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta,
prestar fiança ou aval”. (TJMG; APCV 1.0702.07.414234-1/001; 15ª C.Cív.; Rel. Des.
Maurílio Gabriel; DJEMG 07/10/2015)
77/92 — CADASTRO NEGATIVO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. VIOLAÇÃO

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


AO ART. 535 DO CPC. SÚMULA Nº 284/STF. OFENSA AO ART. 474 DO CPC.
EXISTÊNCIA DE MÚLTIPLAS INSCRIÇÕES. AUTONOMIA DAS ANOTAÇÕES.
PRAZO MÁXIMO DE MANUTENÇÃO. POSSIBILIDADE DE POSTULAR O CAN-
CELAMENTO INDIVIDUAL. EXISTÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. RECURSO
PROVIDO. 1. Não se conhece da alegada violação ao art. 535 do CPC quando ine-
xiste indicação dos pontos considerados omissos, contraditórios e/ou obscuros. 2.
Incide, por analogia, o Enunciado da Súmula nº 284/STF quando a parte recorrente
não apresenta os argumentos jurídicos a embasar suas alegações, caracterizando
deficiência de fundamentação. 3. No âmbito do cadastro negativo de proteção ao
crédito, é possível a existência de múltiplas anotações autônonas, uma vez que
cada inscrição possui origem em diferentes obrigações vencidas e não pagas. 4. Há
interesse de agir na ação em que o consumidor postula o cancelamento de diversas
inscrições de seu nome em cadastro de inadimplente, mas somente uma ou algumas
delas ultrapassaram os prazos de manutenção dos registros previstos no art. 43, §§
1º e 5º, do Código de Defesa do Consumidor. 5. Segundo a jurisprudência desta
Corte Superior, os prazos de manutenção do nome em cadastro de inadimplente
obedecem às seguintes regras: (a) o prazo máximo de manutenção da inscrição no
cadastro de inadimplente é de 5 (cinco) anos, contados a partir da efetiva anotação
(§ 1º do art. 43 do CDC); (b) pode também ser limitado ao prazo prescricional da
ação de cobrança, se menor o lapso quinquenal (§ 5º do art. 43 do CDC); (c) neste
último caso, não se aplica o prazo previsto para o ajuizamento da ação cambial. 6.
326 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Recurso especial provido. (STJ; REsp 1.196.699; Proc. 2010/0100418-9; RS; 4ª T.; Rel.
Min. Luis Felipe Salomão; DJE 20/10/2015)
77/93 — COMPETÊNCIA. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL PARA DIS-
POR SOBRE A TAXA DE JUROS BANCÁRIOS. NÃO REVOGAÇÃO. 1. O Supremo
Tribunal Federal já decidiu pela validade da Lei nº 4.595/64, na parte que outorga
poderes ao Conselho Monetário Nacional para dispor sobre as taxas de juros ban-
cários. Precedente. 2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a
que se nega provimento. (STF; RE-ED 582.437; RS; 1ª T.; Rel. Min. Roberto Barroso;
DJE 15/09/2015; p. 49)
77/94 — COMPRA E VENDA. RESCISÃO CONTRATUAL. Relação de con-
sumo. Partes que preenchem os requisitos estabelecidos pelos arts. 2º e 3º do CDC.
Legitimidade passiva quanto à comissão de corretagem. Cabimento. Aplicação do
art. 7º, parágrafo único, do CDC. Ausência de interesse recursal quanto à iniciativa
pela resolução contratual. Aplicação do art. 499 do CPC. MÉRITO. Intermediação.
Stand de vendas montado pela vendedora, com atendimento por corretores por ela
disponibilizados, para a comercialização das unidades. Obrigação de pagamento da
comissão de quem contratou o corretor. Contrato de adesão. Imputar o pagamento
da corretagem e a contratação da taxa Sati ao consumidor, como condição à aqui-
sição do bem é prática abusiva. Venda casada. Devolução das quantias adimplidas.
Percentual de retenção majorado para 20% sobre os valores pagos. Percentual que
se mostra mais adequado à hipótese. Precedente majoritário deste e. Tribunal. Afas-
tamento do enriquecimento sem causa. Inteligência das Súmulas ns. 01 e 02 desta
Corte. Afastamento de ofício de juros de mora sobre o valor do contrato. Consectário
legal que pressupõe mora da ré. Juros moratórios sobre a restituição da comissão de
corretagem e Taxa SATI. Termo a quo. Data da citação. Inteligência do art. 405 do
Código Civil. Recurso não conhecido em parte e, na parte conhecida, parcialmente
provido. (TJSP; APL 4033620-88.2013.8.26.0224; Ac. 8879131; 5ª C.D.Priv.; Rel. Des.
Fábio Podestá; DJESP 09/10/2015)
77/95 — CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. INDENIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS E MATERIAIS DECORRENTES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.
LEI Nº 11.340/06. JUIZADO ESPECIALIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FA-
MILIAR CONTRA A MULHER. PRETENSÃO DE NATUREZA EXCLUSIVAMENTE
CÍVEL. 1. A competência cível atribuída pela Lei nº 11.340/06, Lei Maria da Penha,
aos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher se limita à apreciação
das medidas protetivas de urgência de natureza cível e de família. 2. A pretensão de
condenação ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, ainda que
decorrentes de ato tipificado na Lei Maria da Penha, tem natureza exclusivamente
cível e não atrai a competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra
a Mulher, posto que não se destina à promoção de quaisquer medidas de proteção
especificadas na Lei. 3. Conflito conhecido e julgado procedente para declarar com-
petente para processar e julgar o pedido de indenização por danos morais e materiais
o Juízo da Vara Cível. (TJDF; CCP 2015.00.2.019272-4; Ac. 897.724; 2ª C.Cív.; Rel.
Des. Carlos Rodrigues; DJDFTE 08/10/2015; p. 99)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 327

77/96 — CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. PROCESSO DE RECU-


PERAÇÃO JUDICIAL (LEI Nº 11.101/05). AÇÃO DE DESPEJO C/C COBRANÇA
DE ALUGUÉIS. DEMANDA ILÍQUIDA. EXECUÇÃO. MONTANTE APURADO.
HABILITAÇÃO DO CRÉDITO NO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. 1. Não
há óbice ao prosseguimento da ação de despejo promovida em desfavor de empresa
em recuperação judicial por constituir demanda ilíquida não sujeita à competência
do juízo universal. 2. Por mais que se pretenda privilegiar o princípio da preservação
da empresa, não se pode afastar a garantia ao direito de propriedade em toda a sua
plenitude daquele que, durante a vigência do contrato de locação, respeitou todas
as condições e os termos pactuados, obtendo, ao final, decisão judicial – transitada
em julgado – que determinou, por falta de pagamento, o despejo do bem objeto
da demanda. 3. O crédito referente à cobrança de aluguéis deve ser habilitado nos
autos do processo de recuperação judicial. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ;
AgRg-CC 133.612; Proc. 2014/0100116-5; AL; 2ª S.; Rel. Min. João Otávio de Noronha;
DJE 19/10/2015)
77/97 — CÔNJUGE. REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS.
HERDEIRO NECESSÁRIO. CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTES. POSSI-
BILIDADE. ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES. SÚMULA Nº 83
DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Admite-se
ao cônjuge casado sob o regime de separação convencional de bens a condição de
herdeiro necessário, possibilitando a concorrência com os descendentes do falecido.
Precedentes. Incidência da Súmula nº 83 do STJ. 2. Agravo regimental a que se nega
provimento. (STJ; AgRg-REsp 1.334.340; Proc. 2012/0146989-4; MG; 3ª T.; Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze; DJE 08/10/2015)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


77/98 — CONSELHEIRO TUTELAR. REMUNERAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO
EFETIVO LICENCIADO DO CARGO DE ASSISTENTE SOCIAL PARA EXERCÍCIO
DE MANDATO ELETIVO. MANUTENÇÃO DOS DIREITOS DECORRENTES DO
CARGO. PERCEPÇÃO DE FÉRIAS E RESPECTIVO TERÇO CONSTITUCIO-
NAL. TAMBÉM PREVISTA NA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL (LEIS NS. 1.033/91 E
2.147/02). DIREITO CONFIGURADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA.
RECURSO DESPROVIDO. “Havendo lei municipal estipulando pagamento de van-
tagens aos conselheiros tutelares, não pode o município eximir-se de tal obrigação
suspendendo-o indevidamente” (STJ, AGREsp 21.619/GO, Rel. ����������������
Min. Herman Ben-
jamin, j. 14.09.2011). (TJSC; AC 2013.020082-0; 4ª C.D.Púb.; Rel. Des. Subst. Paulo
Ricardo Bruschi; DJSC 09/10/2015; p. 299)
77/99 — CONTRATO. TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE
MERCADORIAS. Cobrança de despesas de sobre-estadia, ante a devolução de contêi-
neres com atraso. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Hipótese em
que a sobre-estadia dos cofres de carga tem natureza jurídica de verba indenizatória,
e não de cláusula penal, o que afasta a pretensão da consignatária de limitar o valor
da cobrança pela devolução tardia dos contêineres. Prescindibilidade de prestação
de caução, nos termos do art. 835 do Código de Processo Civil, porque a empresa
transportadora estrangeira está representada por sociedade limitada sediada no Brasil.
Apuração de que foi efetuado o abatimento dos valores adiantados pela consignatária.
328 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Constatação de que ao retirar, sem ressalvas, os cofres de carga, anuiu a consignatária


ao teor dos conhecimentos de transporte. Responsabilidade civil contratual. Cômputo
dos juros de mora a partir da data da citação, e não do vencimento da obrigação.
Pedido inicial julgado parcialmente procedente. Sentença reformada, em parte. Re-
curso parcialmente provido. (TJSP; APL 4001423-36.2013.8.26.0562; Ac. 8871787;
19ª C.D.Priv.; Rel. Des. João Camillo de Almeida Prado Costa; DJESP 09/10/2015)
77/100 — CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP. PERÍODO DE APURAÇÃO.
04.07.99 A 30.06.00. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. GÁS LIQUEFEITO DE PE-
TRÓLEO. RESSARCIMENTO. PROVA. O ressarcimento da contribuição para o
PIS paga sob o regime de substituição tributária, na aquisição de gás liquefeito de
petróleo, está condicionado à comprovação de que a contribuição fora efetivamente
apurada, retida e recolhida pelo substituto. (CARF; RecVol 13890.000627/2001-14;
Ac. 2802-000.064; Rel. Cons. Hélcio Lafetá Reis; DOU 30/09/2015)
77/101 — CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO EXECUTADO
NA PESSOA DE SEU ADVOGADO. NECESSIDADE. MULTA DO ART. 475-J DO
CPC. De acordo com recurso repetitivo julgado pelo c. STJ, o devedor haverá de ser
intimado na pessoa do seu advogado, por publicação na imprensa oficial, para efetuar
o pagamento no prazo de quinze dias, somente a partir de quando, caso não o efetue,
passará a incidir sobre o montante da condenação, a multa de 10% (dez por cento)
prevista no art. 475-J, caput, do Código de Processo Civil. Descabida a imposição
de multa automaticamente, apenas com a prolação de despacho para cumprimento
do acórdão. Recurso improvido. (TJSP; AI 2151098-76.2015.8.26.0000; Ac. 8865507;
30ª C.D.Priv.; Relª Desª Maria Lúcia Pizzotti; DJESP 08/10/2015)
77/102 — DANO MORAL. BANCO. TRAVAMENTO DA PORTA GIRATÓRIA.
AGENTE PENITENCIÁRIO COM ARMA DE FOGO. IDENTIFICAÇÃO FUN-
CIONAL E PORTE DE ARMA. ACESSO AO INTERIOR DA AGÊNCIA NEGADO.
ATO ILÍCITO. VEXAME E HUMILHAÇÃO NÃO COMPROVADOS. EXERCÍCIO
REGULAR DE DIREITO VISANDO GARANTIR A SEGURANÇA DO ESTABELECI-
MENTO E DOS CLIENTES. INEXISTENTE COMPROVAÇÃO DE EXCESSO. MERO
ABORRECIMENTO. AUSENTES OS PRESSUPOSTOS CARACTERIZADORES DO
INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL. DEVER DE INDENIZAR AFASTADO.
ATO ILÍCITO NÃO DEMONSTRADO. ÔNUS DO AUTOR. ART. 333, INCISO I,
DO CPC. 1. Para que se configure o dever de indenizar, em virtude do travamento
de porta giratória em instituição bancária e negativa de acesso ao interior de suas
dependências, é imperioso restar, inequivocamente, comprovado o abuso de direito
por parte dos prepostos daquela, de modo a configurar o ato ilícito, bem como o
vexame e a humilhação sofridos. 2. A conduta da instituição bancária consistente
na instalação de porta giratória com detector de metais e a proibição de entrada
de pessoas armadas constitui em exercício regular de direito (art. 188, inciso I, do
CC), podendo, portanto, revistar os pertences e evitar a entrada de armas e outros
objetos capazes de gerar risco à incolumidade de seus clientes, a fim de garantir e
preservar a segurança de todos aqueles que se encontram no interior da agência. 3.
Inocorrência de particularidades aptas a evidenciar excesso por parte dos prepostos
do banco. Ato ilícito não demonstrado. Ônus do autor. Inteligência do art. 333, I,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 329

do CPC. 4. Recurso conhecido e provido. (TJAC; APL 0006940-91.2011.8.01.0001;


Ac. 2.279; 2ª C.Cív.; Rel. Des. Júnior Alberto; DJAC 18/09/2015; p. 14)
77/103 — DANO MORAL. NATUREZA IN RE IPSA. DESNECESSIDADE DE
PROVA DO PREJUÍZO OU DANO. BASTA MERA COMPROVAÇÃO DO ATO OU
CONDUTA ILÍCITA. PRECEDENTES. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO
DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. ABALO À IMAGEM E AO CRÉDITO FRENTE AO
COMÉRCIO EM GERAL. IMPOSIÇÃO CREDITÍCIA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Na esteira da doutrina e da jurisprudência, o dano moral é in re ipsa, daí porque
se mostra desnecessária a comprovação do prejuízo ou do dano, mas apenas da
conduta ou ato ilícito capaz de atingir os atributos da personalidade ou causar abalo
expressivo no estado anímico da pessoa. Precedentes. 2. Na esteira do entendimento
desta Turma, a simples inscrição indevida do nome em cadastro de proteção ao cré-
dito caracteriza o dano moral, porque é indiscutível o abalo à imagem e ao crédito
no comércio e no mercado financeiro, além de causar uma restrição à capacidade
de obtenção de crédito. 3. Não merece reproche a sentença que fixa indenização
com razoabilidade e proporcionalidade ao prejuízo (R$ 5.000,00), sem descurar do
propósito preventivo, repressivo e compensador da reparação. 4. Recurso conhecido
e desprovido. 5. Em razão da sucumbência, condeno o recorrente ao pagamento das
custas processuais, se houver, e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por
cento) sobre o valor da condenação. 6. Decisão proferida nos termos do art. 46 da
Lei nº 9.099/95, servindo a ementa de acórdão. (TJDF; ACJ 2015.03.1.010563-8; Ac.
899.873; 1ª T.R.J.Esp.; Rel. Juiz Luis Gustavo B. de Oliveira; DJDFTE 20/10/2015; p. 412)
77/104 — DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


DEMANDA PROPOSTA CONTRA MÉDICO E ENTIDADE HOSPITALAR PRIVA-
DA. RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE PELO FATO DO SERVIÇO.
ART. 14 DO CDC. RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL. A responsabilidade civil
dos hospitais pelos danos causados ao paciente por ato de seus prepostos é objetiva,
prescindindo da demonstração da culpa do estabelecimento. Entretanto, cumpre
averiguar se houve falha no serviço prestado pelo médico integrante de seu corpo
clínico, somente se responsabilizando o nosocômio quando comprovado ato doloso
ou culposo imputável ao facultativo. Intelecção do art. 14 do CDC. Já a responsabi-
lidade civil do médico é subjetiva, a teor do que preceitua o § 4º do art. 14 do CDC,
porquanto, de regra, sua obrigação é de meio, e não de resultado. Menor internado
com infecção respiratória. Pediatra de sobreaviso. Acompanhamento presencial
realizado uma vez ao dia. Prescrição medicamentosa adequada. Estado de saúde
que não exigia atendimento diverso. Tratamento adequado. Remoção do menino
para hospital de outra cidade, durante a madrugada, após desentendimento dos
familiares com o facultativo. Iniciativa exclusiva dos pais. Encaminhamento corre-
tamente realizado pelo médico. Desídia ou negligência profissional. Inocorrência.
Sentença de improcedência. Fundamentação embasada no conjunto probatório. A
prova pericial e testemunhal infirma as assertivas da inicial e indica que não houve
conduta negligente, imprudente ou imperita dos profissionais integrantes do corpo
clínico do hospital codemandado. Desídia ou negligência médica incomprovada. A
singela e genérica assertiva de que há corporativismo dos profissionais da medici-
330 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

na não basta para desacreditar a conclusão pericial, quando o laudo se harmoniza


com todo o conjunto probatório. Apelo desprovido. Unânime. (TJRS; AC 0347013-
24.2014.8.21.7000; 9ª C.Cív.; Rel. Des. Miguel Ângelo da Silva; DJERS 08/10/2015)
77/105 — DANOS MORAIS. OFENSAS PRATICADAS EM CAMPANHA ELEI-
TORAL. CRÍTICAS ACIRRADAS CONTRA ADVERSÁRIOS POLÍTICOS QUE NÃO
EXTRAPOLAM OS LIMITES DA TOLERÂNCIA. DEVER DE INDENIZAR REFUTA-
DO. SENTENÇA REFORMADA. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. 1. Dano moral
é todo prejuízo que o sujeito de direito vem a sofrer por meio de violação a bem
jurídico específico. É toda ofensa aos valores da pessoa humana, capaz de atingir os
componentes da personalidade e do prestígio social. 2. No caso, as palavras usadas
pelo apelante ocorreram durante as campanhas eleitorais. Os fatos e acontecimentos
descritos nos autos não são capazes de abalar o equilíbrio psicológico do apelado,
tratando-se de dissabores decorrentes do acaloramento do pleito eleitoral. 3. Desse
modo, não vislumbro a ocorrência de ato ilícito e, consequentemente, de danos
morais a justificar compensação pecuniária, sendo deveras desarrazoado admitir a
condenação do apelante, diante da narrativa dos fatos declinados na peça inicial. 4.
Recurso de apelação conhecido e provido. (TJCE; APL 0003443-17.2012.8.06.0059;
3ª C.Cív.; Rel. Des. Francisco Gladyson Pontes; DJCE 03/09/2015; p. 15)
77/106 — DANOS MORAIS C/C MATERIAIS NÃO CARACTERIZADOS. FA-
LHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DA AGÊNCIA DE TURISMO. NÃO CONFIGU-
RADO. 1. Trata-se de relação de consumo, devendo ser aplicado o CDC. 2. A apelada
assessorou para agilizar o visto canadense (trabalho e estudo), porém a modalidade
que será concedida é de responsabilidade exclusiva da autoridade consular do país,
assim isento de culpa, não há como responsabilizar por danos materiais e morais.
3. É de responsabilidade exclusiva da Autoridade Consular a concessão ou não do
visto solicitado. O serviço ora contratado constitui-se na assessoria à obtenção do
visto, sendo considerado efetivamente prestado independente do resultado final. 4.
Obrigação de meio é aquela que impõe de quem a exerce ou executa o emprego de
determinados meios propícios e adaptados para o fim visado. 5. Recurso conhecido
e improvido. (TJES; APL 0032765-02.2013.8.08.0024; 4ª C.Cív.; Rel. Des. Walace
Pandolpho Kiffer; DJES 08/10/2015)
77/107 — DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. PARTO. USO DE
FÓRCEPS. CESARIANA. INDICAÇÃO. NÃO OBSERVÂNCIA. LESÃO NO MEM-
BRO SUPERIOR ESQUERDO. MÉDICO CONTRATADO. CULPA CONFIGURADA.
HOSPITAL. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. AÇÃO DE REGRESSO. PROCE-
DÊNCIA. DANOS MORAIS. VALOR. RAZOABILIDADE. 1. A jurisprudência desta
Corte encontra-se consolidada no sentido de que a responsabilidade dos hospitais,
no que tange à atuação dos médicos contratados que neles trabalham, é subjetiva,
dependendo da demonstração da culpa do preposto. 2. A responsabilidade objetiva
para o prestador do serviço prevista no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor,
no caso o hospital, limita-se aos serviços relacionados ao estabelecimento empre-
sarial, tais como a estadia do paciente (internação e alimentação), as instalações,
os equipamentos e os serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia). Prece-
dentes. 3. No caso em apreço, ambas as instâncias de cognição plena, com base na
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 331

prova dos autos, concluíram que houve falha médica, seja porque o peso do feto
(4.100 gramas) indicava a necessidade de realização de parto por cesariana, seja
porque a utilização da técnica de fórceps não se encontra justificada em prontuário
médico. 4. A comprovação da culpa do médico atrai a responsabilidade do hospital
embasada no art. 932, inciso III, do Código Civil (“são também responsáveis pela
reparação civil: (...) III – o empregador ou comitente, por seus empregados, servi-
çais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;”),
mas permite ação de regresso contra o causador do dano. 5. O Superior Tribunal de
Justiça, afastando a incidência da Súmula nº 7/STJ, tem reexaminado o montante
fixado pelas instâncias ordinárias apenas quando irrisório ou abusivo, circunstâncias
inexistentes no presente caso, em que arbitrada indenização no valor de R$ 80.000,00
(oitenta mil reais). 6. Recurso especial parcialmente provido. (STJ; REsp 1.526.467;
Proc. 2014/0143277-8; RJ; 3ª T.; Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva; DJE 23/10/2015)
77/108 — DESAVENÇA ENTRE VIZINHAS. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO
COM NOME IGUAL AO DA VIZINHA. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR
INDENIZATÓRIO REDUZIDO PARA R$ 300,00. 1. Trata-se de recurso inominado
em face da sentença de procedência do pedido indenizatório formulado por Joana
Lino da Piedade ao argumento de que Helane Cavalcante da Silva Ribeiro atribuiu
ao seu animal de estimação (porca) o nome de Joana. 2. Em suas razões, p. 25/28,
a recorrente diz que possui a porca há 9 (nove) meses e que a ela deu no nome de
Fiona, e não Joana. Pugna pela reforma da referida sentença para ser julgado impro-
cedente o dano moral. 3. Verificados os pressupostos de admissibilidade, conheço
do recurso. 4. Em que pese a existência de desavenças anteriores entre as partes,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


analisados os autos, especialmente a oitiva das litigantes e de suas testemunhas,
convenço-me da verossimilhança dos fatos narrados na inicial e vejo configurado
o dano moral, ante a ofensa aos direitos da personalidade da autora, nos termos do
art. 186 do Código Civil. 5. Assim, nestas circunstâncias, considerando a repro-
vabilidade da conduta, a gravidade do dano, as condições das partes, bem como o
caráter punitivo/compensatório da indenização, tenho que o valor fixado na sen-
tença monocrática de R$ 800,00 (oitocentos reais) comporta redução para melhor
atender aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, pelo que reduzo para
o importe de R$ 300,00 (trezentos reais). 6. Recurso conhecido e parcialmente pro-
vido para reformar a sentença e reduzir o valor indenizatório fixado em R$ 800,00
(oitocentos reais) para R$ 300,00 (trezentos reais). 7. Sem condenação em custas
finais e em honorários advocatícios, ante o resultado do julgamento. (TJAC; APL
0011749-09.2014.8.01.0070; Ac. 11.215; 2ª T.R.; Rel. Juiz Francisco das Chagas Vilela
Júnior; DJAC 02/09/2015; p. 57)
77/109 — DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. SÚMULA
Nº 83. REQUISITOS DO ART. 50 DO CC. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. O encerramento
das atividades ou dissolução da sociedade, ainda que irregulares, não são causas,
por si sós, para a desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do Código
Civil. 2. Não cabe rever o entendimento da Corte de origem acerca da inexistência
dos requisitos do art. 50 do CC por demandar o necessário revolvimento da maté-
332 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

ria fático-probatória. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ; AgRg-AREsp 711.452;


Proc. 2015/0112739-6; SP; 3ª T.; Rel. Min. João Otávio de Noronha; DJE 09/10/2015)
77/110 — DESPEJO. RETOMADA DO IMÓVEL. EMPRESA EM RECUPERA-
ÇÃO JUDICIAL. SUSPENSÃO DO CURSO DA AÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. A recu-
peração judicial é destinada àquelas empresas que se encontram em situação de crise
econômico-financeira, mas com possibilidade concreta de superação. 2. A retomada
da posse direta do imóvel locado à sociedade empresária em recuperação judicial tem
aptidão de impactar na continuidade de suas atividades, não se coadunando com os
fins teleológicos almejados por esse instituto. 3. Ao locador cabe exigir os aluguéis
vencidos mediante a execução das correspondentes garantias locatícias, ou reclamar
ao juízo da recuperação judicial que resolva a questão da desocupação, assinalando
prazo razoável para a retomada, isso se o locador não assentir com novas condições
e garantias que se ajustarem para a continuidade da locação. 4. Agravo conhecido e
desprovido. (TJDF; AGI 2015.00.2.017247-4; Ac. 897.732; 6ª T.Cív.; Rel. Des. Carlos
Rodrigues; DJDFTE 07/10/2015; p. 309)
77/111 — DIREITO À SAÚDE. ASTREINTES. FIXAÇÃO CONTRA O ES-
TADO. POSSIBILIDADE. INDISPONIBILIDADE DO DIREITO À SAÚDE. VALOR
PROPORCIONAL QUE NÃO GERA ENRIQUECIMENTO INDEVIDO. AGRAVO
DESPROVIDO. I – A imposição de astreinte é medida que visa impedir que a parte
obrigada por determinada decisão judicial se quede inerte e deixe de cumpri-la,
desprestigiando a eficacidade do provimento jurisdicional. II – No caso dos autos,
a imposição da astreinte ganha maior relevância, tendo em vista que o bem da vida
tutelado é de natureza indisponível (a saúde), e não pode sucumbir diante de alegadas
limitações materiais. Inteligência do art. 461 do CPC. III – Agravo de instrumento
desprovido. (TJAM; AI 4003149-26.2015.8.04.0000; 3ª C.Cív.; Rel. Des. João de Jesus
Abdala Simões; DJAM 06/10/2015; p. 28)
77/112 — DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE. REGIME DE SEPARAÇÃO
CONVENCIONAL DE BENS. HERDEIRO NECESSÁRIO. CONCORRÊNCIA COM
DESCENDENTES. POSSIBILIDADE. ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. PRECE-
DENTES. SÚMULA Nº 83 DO STJ. 1. Admite-se ao cônjuge casado sob o regime de
separação convencional de bens a condição de herdeiro necessário, possibilitando a
concorrência com os descendentes do falecido. Precedentes. Incidência da Súmula nº
83 do STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ; AgRg-REsp 1.334.340;
Proc. 2012/0146989-4; MG; 3ª T.; Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze; DJE 08/10/2015)
77/113 — DIVÓRCIO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 4º, II, DO CC E 8º, 9º, I, E 13
DO CPC. ALEGAÇÃO DE INCAPACIDADE DA AGRAVADA RECHAÇADA PELO
TRIBUNAL DE ORIGEM. INVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA
Nº 7/STJ. RECURSO IMPROVIDO. 1. Tendo a Corte a quo, com base nas provas dos
autos, concluído pela capacidade da agravada, infirmar o entendimento alcançado,
a fim de se acatar a cogitada violação dos arts. 4º, II, do Código Civil e 8º, 9º, I, e 13
do CPC, encontra óbice no Enunciado nº 7 da Súmula do STJ. 2. Agravo regimental
a que se nega provimento. (STJ; AgRg-AREsp 753.260; Proc. 2015/0184812-9; SP; 3ª
T.; Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze; DJE 09/10/2015)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 333

77/114 — DOAÇÃO. PEDIDO DE NULIDADE. VÍCIO DE CONSENTIMEN-


TO E INOFICIOSIDADE. ILEGITIMIDADE ATIVA. 1. Se o autor foi adotado em
tenra idade e se somente houve o reconhecimento da maternidade após o óbito, em
sentença que determinou o registro do vínculo jurídico de filiação, desconstituin-
do a maternidade adotiva, então ele não tem legitimidade para reclamar qualquer
participação na herança, pois ele não ostentava a condição de filho no momento da
abertura da sucessão. 2. Como estava vigente o vínculo de adoção, outra era a mãe
do autor, somente havendo ruptura dessa relação jurídica com a prolação da sen-
tença que determinou a alteração dos registros, constituindo novo vínculo parental.
3. Embora a ação investigatória de paternidade ou de maternidade tenha conteúdo
declaratório, reconhecendo a filiação desde o nascimento, no caso sub judice a si-
tuação é diversa, pois a sentença teve conteúdo declaratório e também constitutivo
da relação de filiação, já que era válida a adoção, cujo vínculo foi desfeito com o
julgamento da ação investigatória. Recurso do autor desprovido e provido o recurso
da ré. (TJRS; AC 0242327-44.2015.8.21.7000; 7ª C.Cív.; Rel. Des. Sérgio Fernando de
Vasconcellos Chaves; DJERS 28/09/2015)
77/115 — EMBARGOS À EXECUÇÃO. ISSQN. SERVIÇOS BANCÁRIOS. LEI
COMPLEMENTAR Nº 116/03. TAXATIVIDADE DOS ITENS DA LISTA ANEXA.
POSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. MULTA DE 60% EM RAZÃO
DE DOLO, FRAUDE OU SIMULAÇÃO NÃO APLICADA E NÃO EXIGIDA NA
EXECUÇÃO. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. PARCELA RECURSAL NÃO CO-
NHECIDA. NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO
OCORRÊNCIA. POSSIBILIDADE DE O TRIBUNAL DECIDIR QUESTÕES NÃO

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


INTEGRALMENTE DECIDIDAS. EXEGESE DO ART. 515, § 1º, DO CPC. RECURSO
REPETITIVO. RECONHECIMENTO DE REPERCUSSÃO GERAL PELO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. Homologação da desistência dos recursos representativos da
controvérsia. Sobrestamento não aplicável. Serviços impugnados: tarifa interbancária.
Inexistência de prestação de serviço contratual. ISSQN que não deve incidir sobre
tal cobrança. Receitas que não derivam de cobranças feitas dos clientes, mas dos
demais bancos integrantes do sistema de compensação. Contratação de operações
ativas. Exação relativa às taxa cobradas pela realização de pesquisa em serviços de
proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados
e informações necessárias ao início de relacionamento decorrente da abertura de
conta de depósitos à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito
ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente. ISSQN
devido pela adequação ao item 15.08 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/03.
Adiantamento a depositantes. Exigência do ISSQN relativo à tarifa cobrada pelo le-
vantamento de informações e avaliação de viabilidade e de riscos para a concessão de
crédito em caráter emergencial para cobertura de saldo devedor em conta de depósitos
à vista e de excesso sobre o limite previamente pactuado de cheque especial, cobrada
no máximo uma vez nos últimos trinta dias. Imposto exigível com fundamento no
item 15.08 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/03. Multa de 40%. Art. 26 da
Lei Complementar Municipal de Curitiba nº 40/01. Falta de pagamento do tributo
apurado em procedimento administrativo fiscal. Multa corretamente aplicada. Efeito
334 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

confiscatório. Vedação relacionada aos tributos, e não às penalidades pecuniárias.


Readequação dos ônus sucumbenciais. Sentença reformada em parte. Recurso de
apelação conhecido em parte, por unanimidade, e na parte conhecida, negado pro-
vimento, por maioria. (TJPR; ApCiv 1366256-1; 2ª C.Cív.; Rel. Des. Stewalt Camargo
Filho; DJPR 07/10/2015; p. 292)
77/116 — EMBARGOS À EXECUÇÃO. RELAÇÃO LOCATÍCIA. CONTRATO
DE FIANÇA. PRELIMINAR DE NULIDADE DE REPRESENTAÇÃO AFASTADA.
PREJUDICIAL DE MÉRITO NÃO CONFIGURADO. INTERRUPÇÃO DA PRES-
CRIÇÃO DO DEVEDOR PRINCIPAL PREJUDICA O FIADOR. INTELIGÊNCIA
DO ART. 204, § 3º, DO CÓDIGO CIVIL. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE
DÉBITO. ENTREGA DAS CHAVES PELO FIADOR. NÃO RESPONSABILIDADE
PELOS FATOS POSTERIORES OCORRIDOS. PRESERVAÇÃO DA BOA-FÉ. 1. Fica
liberado o fiador das obrigações posteriores a entrega das chaves do imóvel, salvo
inequívoca ciência da prorrogação contratual. 2. Recurso conhecido e parcialmente
provido. (TJSE; AC 201500719471; Ac. 17277/2015; 1ª C.Cív.; Relª Desª Elvira Maria
de Almeida Silva; DJSE 09/10/2015)
77/117 — EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CON-
TRATO DE LOCAÇÃO. FIANÇA. FALSIDADE DA ASSINATURA ATRIBUÍDA À
CÔNJUGE VIRAGO. VALIDADE DA GARANTIA PRESTADA PELO VARÃO. DE-
CISÃO PROFERIDA EM AÇÃO DECLARATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO.
INVIABILIDADE DE REDISCUSSÃO DO FATO. NULIDADE POR INEXISTÊNCIA
DE OUTORGA UXÓRIA. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO. INVIABILIDADE. A boa-fé
objetiva, entendida como princípio ético de comportamento, cuja observância na
interpretação dos negócios jurídicos tem matriz no art. 113 do Código Civil, impõe
conduta leal aos contratantes, tanto na fase da contratação quanto na execução e no
pós-contrato. Questionada a validade da prestação de fiança atribuída aos cônjuges
em contrato de locação e firmada, por meio de decisão de mérito proferida em ação
declaratória de nulidade do ato jurídico, a higidez da garantia efetivada pelo varão,
revela-se inviável novo enfrentamento e conclusão diversa em torno do fato no âmbito
dos embargos à execução. A nulidade da fiança, com fundamento na inexistência
de outorga uxória, não pode ser declarada ex officio, à falta de base legal, por não se
tratar de nulidade absoluta, à qual a lei comine tal sanção, independentemente da
provocação do cônjuge ou dos herdeiros (Código Civil, art. 1.650). (TJMG; APCV
1.0702.10.053714-2/001; 18ª C.Cív.; Rel. Des. Roberto Vasconcellos; DJEMG 09/10/2015)
77/118 — EMBARGOS À PENHORA. IMÓVEL RURAL. BEM DE FAMÍLIA.
LEI Nº 8.009, DE 23.03.90. Impenhorabilidade reconhecida na sentença, com ex-
ceção da área sem construções, benfeitorias e plantações. Imóvel que possui área
correspondente à pequena propriedade rural, conforme a conceituação que é dada
pela Lei nº 8.629, de 25.02.93. Módulo fiscal estabelecido pela Instrução Especial/
INCRA nº 20, de 28.05.80. Desmembramento que se mostra inviável, pois resultaria
em área inferior ao módulo fiscal do município. Impenhorabilidade que deve abranger
a área total do imóvel. Pedido inicial acolhido. Ônus da sucumbência que é imposto
ao litigante vencido. Recurso provido. (TJSC; AC 2015.060405-5; 5ª C.D.Com.; Rel.
Des. Jânio Machado; DJSC 09/10/2015; p. 265)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 335

77/119 — EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONTRA DECISÃO INTER-


LOCUTÓRIA NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
CABIMENTO. OMISSÃO. MEDIDA PROTETIVA. AFASTAMENTO DO LAR.
DISCUSSÃO DE PROPRIEDADE DO IMÓVEL. VIA INADEQUADA. DECISÃO
INTERLOCUTÓRIA QUE MANTEVE O CÔNJUGE VIRAGO NA RESIDÊNCIA DO
CASAL. DÚVIDA ACERCA DA UNIÃO ESTÁVEL. MATÉRIA DE COMPETÊNCIA
DO JUÍZO CÍVEL. CAPACIDADE ECONÔMICA DO CÔNJUGE VARÃO BEM
SUPERIOR À DO CÔNJUGE VIRAGO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
1. “É pacífico no âmbito do STJ o entendimento de que os embargos de declaração
podem ser opostos contra qualquer decisão judicial, interrompendo o prazo para
interposição de outros recursos, salvo se não conhecidos em virtude de intempes-
tividade. Precedentes” (STJ, AgRg no AREsp 14.395/SP, Rel. Min. Marco Buzzi,
Quarta Turma, j. 02.08.2012, DJe 09.08.2012). 2. A decisão embargada encampa
ampla e robusta apreciação dos elementos trazidos ao longo do caderno processual,
eis que analisou de forma lógica e satisfatória a questão fático-probatória posta em
exame. 3. Há verdadeira dúvida nos presentes autos – a ser dissipada pelas partes
na esfera cível – quanto à existência ou não de união estável por ocasião da compra
do imóvel do qual o embargante teve que se retirar por motivo de medida prote-
tiva alicerçada na Lei nº 11.340/06, a fim de assegurar a integridade física de sua
ex-mulher. Soma-se a isso que a capacidade econômica do cônjuge varão, servidor
público do Tribunal de Contas da União, ainda que considerados os descontos de
sua remuneração, é bem superior ao do cônjuge virago, professora aposentada da
rede de ensino do Estado do Espírito Santo, o que lhe facilita a manutenção de outra
residência. 4. O documento que descreve certidão de ônus do imóvel financiado

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


pela Caixa Econômica Federal não exclui automaticamente a eventual propriedade
de sua ex-mulher em razão de apenas o cônjuge varão adimplir com o pagamento
do respectivo bem imóvel. É que vigora no direito civil moderno a presunção do
esforço comum do casal em união estável na obtenção dos respectivos bens, o que
significa dizer que a mulher pode contribuir de outras maneiras para a aquisição
do imóvel que não seja por meio da contribuição financeira. Segundo o Superior
Tribunal de Justiça: “Essa comunhão de esforços não se restringe à mera contribui-
ção financeira, porque, na divisão de tarefas do cotidiano familiar, outras atividades
existem, de igual importância e necessidade para a harmonia do convívio de todos
os integrantes e a construção do almejado patrimônio. A tese de que até o advento
da Lei nº 9.278/96 se exige a comprovação do esforço comum, para que tenha o
companheiro direito à metade dos bens onerosamente adquiridos na constância
da união estável, é construção jurisprudencial que não se coaduna com a natureza
própria de entidade familiar, conferida, muito antes, pela Constituição Federal, sob
cujos influxos axiológicos deve ser interpretado todo o direito infraconstitucional”
(REsp 1.337.821/MG, Relª Minª Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 21.11.2013,
DJe 29.11.2013). 6. A motivação do julgador, desde que respeitado o princípio da
persuasão racional ou do livre-convencimento motivado, não necessita adentrar cada
filigrana processual ou material aduzida nos autos, em verdadeiro exercício hercúleo
ou mesmo como órgão consultivo sobre as inúmeras, e muitas vezes semelhantes/
idênticas, teses levantadas pelas partes, a teor do entendimento pacificado perante
336 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

o colendo Superior Tribunal de Justiça. 7. Recurso conhecido e improvido. (TJES;


EDcl-AgR-AI 0017775-02.2015.8.08.0035; 2ª C.Crim.; Rel. Des. Sérgio Luiz Teixeira
Gama; DJES 08/10/2015)
77/120 — EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA EM AÇÃO DE MODIFICAÇÃO
DE GUARDA ACOLHIDA. PEDIDO DE DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA
PARA O DOMICÍLIO DO TRABALHO DOS GENITORES. IMPOSSIBILIDADE.
COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR A AÇÃO DEVE SER A DO DOMICÍLIO DOS
PAIS OU RESPONSÁVEIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 147, I, DO ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. O MENOR, REPRESENTADO POR SUA GUAR-
DIÃ LEGAL, PODE OPTAR ENTRE O FORO COMUM E O ESPECIAL, PORÉM TAL
CIRCUNSTÂNCIA NÃO PODE SER IMPOSTA ÀQUELE. AGRAVO CONHECIDO
E DESPROVIDO. 1. Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra decisão
interlocutória, no bojo da exceção de incompetência em ação de modificação de
guarda, em que a magistrada a quo declinou de sua competência para processar o
feito. 2. Não é possível acolher o pleito do agravante, o qual desejava ver o feito
processado no seu domicílio de trabalho, que também é o domicílio profissional da
genitora do menor, ambos servidores públicos. 3. A competência para processar a
ação deve ser a do domicílio dos pais ou responsáveis, conforme prevê o art. 147, I,
do Estatuto da Criança e do Adolescente. 4. O menor, representado por sua guardiã
legal, pode optar entre o foro comum e o especial, porém tal circunstância não pode
ser imposta àquele. 5. Agravo conhecido e desprovido. (TJDF; AGI 2015.00.2.020665-
4; Ac. 897.923; 5ª T.Cív.; Rel. Des. Silva Lemos; DJDFTE 08/10/2015; p. 164)
77/121 — EXECUÇÃO. INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONFISSÃO E
COMPOSIÇÃO DE DÍVIDA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE CONFIGURADA.
Processo que ficou paralisado por mais de 10 (dez) anos por desídia do exequente.
Ação de execução ajuizada na vigência do Código Civil de 1916. Prescrição vintenária
que, a partir da entrada em vigor do Código Civil de 2002, passou a ser de 5 (cinco)
anos. Aplicação dos arts. 206, § 5º, inciso I, e 2.028, ambos do novo diploma legal.
Manutenção da decisão que extinguiu a ação de execução. Recurso desprovido. (TJSC;
AC 2015.063393-9; 5ª C.D.Com.; Rel. Des. Jânio Machado; DJSC 09/10/2015; p. 263)
77/122 — EXECUÇÃO. REALIZAÇÃO DE ACORDO PARA PAGAMENTO
DA DÍVIDA. AUSÊNCIA DE ANIMUS NOVANDI. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO.
OFENSA AO ART. 792 DO CPC. SUSPENSÃO APLICÁVEL. REFORMA DA
SENTENÇA. I – No presente caso, as partes celebraram acordo, fazendo constar
pedido expresso de suspensão do processo de execução, dispondo também que o
ajuste não implicava novação. II – A jurisprudência do STJ é uniforme no sentido
de que, não existindo animus novandi, a execução deve ser suspensa, e não extinta,
pois, inadimplido o pacto, a dívida é executada pelo valor originário. III – Recurso
conhecido e provido. (TJSE; AC 201500822285; Ac. 17170/2015; 2ª C.Cív.; Relª Desª
Iolanda Santos Guimarães; DJSE 09/10/2015)
77/123 — EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PENHORA DE VALORES DEPO-
SITADOS NA CONTA DA EMPRESA. APLICAÇÃO DA DISREGARD DOCTRINE.
PAGAMENTOS IN NATURA. COMPENSAÇÃO. DESCABIMENTO. 1. Somente
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 337

se justifica na execução de alimentos a aplicação da disregard doctrine, isto é, da


desconsideração da personalidade jurídica, quando o devedor não vem cumprindo
com a sua obrigação alimentar e, mesmo possuindo empresa sólida e apresentando
sinais exteriores de riqueza, não possui bens em seu nome capazes de garantir o
adimplemento forçado da obrigação. 2. Quando inexistem bens passíveis de penhora
em tais condições, fica evidenciada a situação de abuso de direito, onde o devedor
procura escudar-se no manto protetor da pessoa jurídica para fugir da execução
forçada. 3. Se o devedor possui bens passíveis de garantir a execução, descabe a
aplicação do disposto no art. 50 do Código Civil, não se cogitando de confusão pa-
trimonial ou desvio de finalidade. 4. São admitidos pagamentos in natura, quando
previstos na obrigação ou, excepcionalmente, quando referente a item que deve ser
atendido necessariamente pela pensão alimentícia. 5. A modificação do que ficou
estabelecido judicialmente não prescinde de novo ajuste submetido ao crivo judicial
e, enquanto não for alterado, não pode o alimentante, unilateralmente, modificar a
forma de prestação dos alimentos. 6. Pela sua natureza, as prestações de alimentos
não podem ser compensadas com o pagamento de verbas de outra natureza, que
assumem a feição de liberalidade. Recurso parcialmente provido. (TJRS; AI 0238377-
27.2015.8.21.7000; 7ª C.Cív.; Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves; DJERS
01/09/2015)
77/124 — EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. SÚMULA Nº 309/
STJ. OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. PAGAMENTO PARCIAL. IRRELEVÂNCIA.
REVOGAÇÃO LIMINAR. RESTABELECIMENTO DO MANDADO DE PRISÃO.
ORDEM DENEGADA. 1. A teor da Súmula nº 309 do STJ, o débito alimentar que

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações an-
teriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.
Precedentes. 2. O adimplemento parcial da dívida não é capaz de elidir a prisão
civil do devedor de alimentos. 3. Liminar revogada. Ordem denegada. (TJAC; HC
1001334-29.2015.8.01.0000; Ac. 2.346; 2ª C.Cív.; Relª Desª Waldirene Cordeiro; DJAC
07/10/2015; p. 7)
77/125 — EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. Decisão interlocutória
que indeferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica. Presença de
pressupostos para deferimento da medida. Aplicabilidade do art. 50 do Código Civil
brasileiro. Indícios de práticas irregulares nas atividades empresariais. Abuso de
personalidade evidenciado. Decisão reformada. Recurso conhecido e provido. (TJPR;
AgInstr 1413138-3; 14ª C.Cív.; Relª Desª Ana Lúcia Lourenço; DJPR 09/10/2015; p. 381)
77/126 — EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL FORMADO EM MANDADO
DE SEGURANÇA COLETIVO. ASSOCIAÇÃO. REPRESENTAÇÃO. NECESSIDADE
DE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DOS ASSOCIADOS. 1. O Supremo Tribunal Federal,
no julgamento do mérito do RE 573.232/RG, firmou entendimento no sentido de que
a exigência de autorização expressa prevista no art. 5º, XXI, da Constituição Federal
não se satisfaz com a simples previsão genérica do estatuto da associação a revelar a
defesa dos interesses dos associados. 2. Acórdão proferido pelo Tribunal de origem
que se ajusta ao entendimento firmado por esta Corte. 3. Agravo regimental a que
338 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

se nega provimento. (STF; ARE-AgR 787.123; DF; 1ª T.; Rel. Min. Roberto Barroso;
DJE 22/09/2015; p. 44)
77/127 — EXECUÇÃO FISCAL. ADESÃO A PROGRAMA DE PARCELA-
MENTO. PENHORA DE BENS PELO CONVÊNIO BACEN JUD. DESBLOQUEIO.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. 1. A adesão do executado a
programa de parcelamento gera a suspensão da exigibilidade do crédito tributário,
de modo que não mais se justifica a manutenção de bloqueio de valores por meio
do convênio Bacen Jud. Precedentes do TRF da 1ª Região. 2. Agravo regimental não
provido. (TRF 1ª R.; AgRg-AI 0051055-68.2013.4.01.0000; MG; 8ª T.; Rel. Des. Fed.
Marcos Augusto de Sousa; DJF1 02/10/2015)
77/128 — EXECUÇÃO FISCAL. DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS DA FILIAL. RES-
PONSABILIDADE DA MATRIZ. POSSIBILIDADE. PESSOA JURÍDICA ÚNICA. 1.
A filial, na condição de espécie de estabelecimento, é um bem, um instrumento,
uma universalidade de fato que integra o patrimônio da sociedade empresária, e
não uma pessoa distinta desta. Destarte, a discriminação do patrimônio da empresa,
mediante a criação de filiais, não afasta a unidade patrimonial da pessoa jurídica,
que, na condição de devedora, deve responder com todo o ativo do patrimônio
social por suas dívidas, à luz de regra de direito processual prevista no art. 591 do
Código de Processo Civil, segundo a qual “o devedor responde, para o cumprimento
de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições
estabelecidas em lei” (REsp 1.355.812/RS, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Cam-
pbell Marques, submetido ao regime do art. 543-C do CPC). 2. Agravo regimental
não provido. (STJ; AgRg-REsp 1.544.571; Proc. 2015/0177535-7; SC; 2ª T.; Rel. Min.
Mauro Campbell Marques; DJE 16/10/2015)
77/129 — EXECUÇÃO FISCAL. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À RECEITA FEDE-
RAL. DECLARAÇÃO DE OPERAÇÕES IMOBILIÁRIAS (DOI). APRESENTAÇÃO
DAS TRÊS ÚLTIMAS DECLARAÇÕES DE IMPOSTO DE RENDA (DIR). POSSIBI-
LIDADE. Uma vez esgotadas as diligências na busca de bens passíveis de penhora
e não tendo o exequente logrado êxito, cabível a interferência do judiciário para
determinar a expedição de ofício à Receita Federal, fins de obtenção das declarações
de imposto de renda e operações imobiliárias. Precedentes desta Corte. Ademais, cabe
lembrar que, nos termos do disposto no art. 5º, LXXVIII, da CF, o Poder Judiciário
deve garantir a celeridade no trâmite dos processos judiciais. Recurso provido, por
decisão monocrática. (TJRS; AI 0373770-21.2015.8.21.7000; 2ª C.Cív.; Rel. Des. João
Barcelos de Souza Júnior; DJERS 15/10/2015)
77/130 — EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA ONLINE. CONTA-CORRENTE
CONJUNTA. PENHORA DA TOTALIDADE. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. 1.
Discute-se nos autos a possibilidade de a penhora online recair sobre a totalidade
dos valores contidos em conta conjunta quando um dos titulares não é responsável
pela dívida. 2. A Segunda Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.229.329/SP, de
minha relatoria, em caso semelhante ao dos autos, posicionou-se no sentido de
que, no caso de conta conjunta, cada um dos correntistas é credor de todo o saldo
depositado, de forma solidária. O valor depositado pode ser penhorado em garantia
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 339

da execução, ainda que somente um dos correntistas seja responsável tributário pelo
pagamento do tributo. Agravo regimental improvido. (STJ; AgRg-REsp 1.550.717;
Proc. 2015/0200041-0; RS; 2ª T.; Rel. Min. Humberto Martins; DJE 16/10/2015)
77/131 — EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. FATURAMENTO DE EMPRE-
SA. ART. 655, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REQUISITOS
AUTORIZADORES. PRESENÇA. PERCENTUAL DA PENHORA. REDUÇÃO. 15%
(QUINZE POR CENTO) PARA 5% (CINCO POR CENTO). CASO CONCRETO.
POSSIBILIDADE. RESTRIÇÃO. FILIAL. GERADORA DO TRIBUTO. IMPOSSIBI-
LIDADE. UNIDADE PATRIMONIAL DA PESSOA JURÍDICA. RESP 1.355.812/RS
(ART. 543-C DO CPC). AFIRMAÇÃO. NOMEAÇÃO DE DEPOSITÁRIO. ART. 655-A,
§ 3º, DO CPC. NECESSIDADE. SÓCIO ADMINISTRADOR. RECOMENDAÇÃO.
RECEBÍVEIS. ADMINISTRADORAS DE CARTÕES DE CRÉDITO E DÉBITO. FA-
TURAMENTO. CARACTERIZAÇÃO. PENHORA. POSSIBILIDADE. 1. A incidência
da penhora sobre o faturamento da empresa devedora é possível, conforme expressa
disposição de Lei, constante do art. 655, inciso VII, do Código de Processo Civil. 2.
Recomendando as circunstâncias do caso concreto, haja vista inexistir percentual
fixado pela lei para essa modalidade de penhora, cuidando-se de atribuição afeta ao
julgador caso a caso, é possível reduzir o percentual do faturamento a ser penhorado
de 15% (quinze por cento) para 5% (cinco por cento), encontrando-se este último
em linha com vários precedentes, de vários tribunais pátrios, notadamente deste
TJDFT. 3. O faturamento da empresa, instituto próprio da contabilidade, deve ser
considerado, conforme lição de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero (Código
de Processo Civil comentado artigo por artigo. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


p. 667), como sendo. 3. Percentual do faturamento de empresa executada. Possível
(arts. 655, VII, e 655-A, § 3º, do CPC). O faturamento corresponde a tudo que foi
faturado, vale dizer, tudo quanto ingressou pecuniariamente na empresa. A penhora
sobre o faturamento não pode inviabilizar a atividade comercial da empresa. Proíbe-se
o excesso na fixação de percentual penhorável (STJ, 2ª Turma, REsp 594.927/RS, Rel.
Min. Franciulli Netto, j. 04.03.04, DJ 30.06.04, p. 320). 4. Conforme entendimento
firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial submetido
ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ nº 8/08, não é possível limitar
a satisfação do crédito na execução, notadamente do crédito tributário, a somente o
patrimônio do estabelecimento que participou da situação caracterizada como fato
gerador, no caso, a filial no DF, pois a discriminação do patrimônio da empresa, me-
diante a criação de filiais, não afasta a unidade patrimonial da pessoa jurídica, que, na
condição de devedora, mantém-se responsável pelo pagamento das suas obrigações,
conforme, aliás, disposto no art. 591 do Código de Processo Civil (REsp 1.355.812/
RS, submetido ao regime do art. 543-C do CPC). 5. Tratando-se a penhora de fatura-
mento de empresa de situação excepcional, embora expressamente autorizada pelo
legislador, recomenda-se a estrita observância ao seu regramento, notadamente na
previsão contida no § 3º do art. 655-A do Código de Processo Civil, inclusive com
a nomeação de depositário, sempre que possível na pessoa de algum dos sócios, em
vista de recolher os valores e repassá-los à parte credora, nos limites admitidos nos
autos, prestando as contas devidas. 6. Na hipótese, a própria agravante-executada,
340 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

espontaneamente, ofereceu, inicialmente, à penhora, o percentual de 5% (cinco


por cento) sobre o seu faturamento, após a frustração em relação a outros bens.
Contudo, após ouvida a fazenda credora, o juiz deferiu a penhora no percentual de
15% (quinze por cento), admitindo que a restrição alcance os créditos da empresa
junto às administradoras de cartões de crédito e débito (recebíveis). Contra essa
decisão, agrava a empresa, em vista de reduzir o percentual a 5%, restringindo a
penhora às filiais no DF, afastando a possibilidade de alcançarem-se os recebíveis e,
por fim, requerendo a observância ao § 3º do art. 655-A do CPC, com a nomeação
de depositário. 7. Agravo de instrumento conhecido e parcialmente provido. Decisão
parcialmente reformada. (TJDF; AGI 2015.00.2.010898-2; Ac. 896.726; 3ª T.Cív.; Rel.
Des. Alfeu Machado; DJDFTE 06/10/2015; p. 200)
77/132 — EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. SÓCIO QUE DE-
TINHA PODERES DE GESTÃO À ÉPOCA DA DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA
SOCIEDADE. IRRELEVÂNCIA DA DATA DA OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR
OU DO VENCIMENTO DA OBRIGAÇÃO. 1. Não obstante o entendimento que pre-
valecia no âmbito das Turmas que integram a Primeira Seção/STJ, a Segunda Turma/
STJ alterou o seu entendimento, passando a afirmar que é suficiente que o sócio-
gerente exerça a administração da sociedade quando de sua dissolução irregular, de
modo que é irrelevante a data da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.
2. Agravo regimental não provido. (STJ; AgRg-REsp 1.532.394; Proc. 2015/0024022-0;
RS; 2ª T.; Rel. Min. Mauro Campbell Marques; DJE 16/10/2015)
77/133 — FALECIMENTO DO TITULAR DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO.
CANCELAMENTO DO PLANO COM MENOS DE UM MÊS DA DATA DO ÓBITO.
DEPENDENTE QUE, IDOSA, NECESSITOU CONTRATAR NOVO PLANO NO VA-
LOR DE R$ 1.900,00 MENSAIS. CLÁUSULAS CONTRATUAIS QUE PREVEEM A
MANUTENÇÃO DO DEPENDENTE POR CINCO ANOS SEM PAGAMENTO DAS
MENSALIDADES EM CASO DE ÓBITO E PAGAMENTO DE SEGURO DE MORTE
POR ACIDENTE QUE NÃO FORAM CUMPRIDAS PELA PARTE RÉ. PEDIDO DE
REATIVAÇÃO DO PLANO COM O PRAZO DE CARÊNCIA DE CINCO ANOS E
DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES GASTOS, ALÉM DO PAGAMENTO
DO SEGURO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. SENTENÇA DE PROCE-
DÊNCIA. Apelação da parte ré que afirma que a questão não foi solucionada admi-
nistrativamente em razão do não envio da documentação necessária, impugnando
especificamente apenas a existência e quantificação da indenização por dano moral,
que foi fixada em R$ 8.000,00. Sentença que foi corretamente proferida, observando
os termos do contrato e da Lei nº 9.656/98. Valor arbitrado a título de dano moral
que se mostra razoável, considerando o valor da mensalidade de R$ 1.900,00 que
foi imposto à autora após o falecimento de seu esposo. Desprovimento da apelação.
(TJRJ; APL 0419909-67.2014.8.19.0001; 26ª C.Cív.; Rel. Des. Ricardo Alberto Pereira;
DORJ 07/10/2015)
77/134 — FALÊNCIA. AVOCAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROCESSO EM
TRÂMITE. JUSTIÇA TRABALHISTA. REDIRECIONAMENTO. SÓCIOS. NEGATIVA
DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÃO GENÉRICA.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 284/STF. 1. O recurso especial que indica violação
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do art. 535 do Código de Processo Civil, mas traz somente alegação genérica de
negativa de prestação jurisdicional, é deficiente em sua fundamentação, o que atrai
o óbice da Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal. 2. A jurisprudência desta
Corte firmou posicionamento no sentido de que não se justifica a remessa dos autos
ao juízo falimentar se a execução promovida contra pessoa jurídica foi direcionada
para atingir os sócios, pois o patrimônio da falida permanece livre de constrição. 3.
Agravo regimental não provido. (STJ; AgRg-AREsp 709.729; Proc. 2015/0108125-6;
RS; 3ª T.; Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva; DJE 08/10/2015)
77/135 — FGTS. CONTRIBUIÇÃO DE CARÁTER NÃO TRIBUTÁRIO. BASE
DE CÁLCULO. NATUREZA DAS PARCELAS PAGAS AO EMPREGADO. INDENI-
ZATÓRIA/REMUNERATÓRIA. IRRELEVÂNCIA PARA FINS DE INCIDÊNCIA DA
CONTRIBUIÇÃO DO FGTS. PRECEDENTES. I – “O FGTS trata-se de um direito
autônomo dos trabalhadores urbanos e rurais de índole social e trabalhista, não pos-
suindo caráter de imposto e nem de contribuição previdenciária. Assim, não é possível
a sua equiparação com a sistemática utilizada para fins de incidência de contribuição
previdenciária e imposto de renda, de modo que é irrelevante a natureza da verba
trabalhista (remuneratória ou indenizatória/compensatória) para fins de incidência
da contribuição ao FGTS” (REsp 1.436.897, Rel. Min. Mauro Campbell Marques,
Segunda Turma, DJe 19.12.2014). II – À luz da orientação firmada pela e. Corte,
mostra-se irrelevante o debate acerca da natureza da parcela recebida pelo empregado,
se indenizatória ou remuneratória, para fins de incidência da contribuição do FGTS,
uma vez que este não possui caráter tributário, não podendo ser interpretada sua
aplicação/incidência em analogia com a contribuição previdenciária. III – Merece

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reparos a r. sentença, que concedeu parcialmente a segurança – declarando a inexi-
gibilidade da contribuição devida ao FGTS sobre as verbas pagas pelas impetrantes
a seus empregados a título de salário pago nos primeiros 15 dias de afastamento
por doença/acidente e aviso prévio indenizado –, para reconhecer a exigibilidade da
contribuição ao FGTS sobre essas verbas, além daquelas denegadas. IV – Reexame
necessário e apelação da União a que dá provimento. Apelação das impetrantes a
que se nega provimento. (TRF 1ª R.; APELRE 0007883-25.2013.4.01.3800; MG; 6ª
T.; Relª Juíza Fed. Conv. Hind Ghassan Kayath; DJF1 08/10/2015)
77/136 — HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. DEVEDOR DE ALIMENTOS.
CHOQUE DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. LIBERDADE X DIREITO A ALI-
MENTOS. APARENTE ANTINOMIA. SOLUÇÃO À LUZ DA PONDERAÇÃO DE
INTERESSES E DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PRISÃO COMO ME-
DIDA ADEQUADA E NECESSÁRIA, MAS, NO ENTANTO, DESPROPORCIONAL.
MALEFÍCIOS SUPERAM BENEFÍCIOS. POSSIBILIDADE DE CAUSAR PERDA DO
EMPREGO DO PACIENTE. LIBERDADE COMO INSTRUMENTO GARANTIDOR
DO DIREITO DE ALIMENTOS DOS FILHOS DO IMPETRANTE. ORDEM CON-
CEDIDA. LIMINAR CONFIRMADA. I – O habeas corpus é a ação constitucional
cabível para combater eventual constrangimento ilegal na liberdade de locomoção,
destacando-se pela sumariedade do seu trâmite e pela celeridade do seu rito, fatores
estes que exigem pré-constituição probatória capaz de revelar, de plano, a coação
hostilizada. II – É patente, no caso dos autos, a existência de conflito entre duas
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normas constitucionais, quais sejam o direito de liberdade do impetrante, de um


lado, e o direito aos alimentos de seu filho e credor, de outro, ambos indispensáveis
para assegurar uma existência digna do ser humano. Solução que perpassa pelo
postulado da ponderação de interesses, à luz do princípio da proporcionalidade.
III – Inobstante a necessidade e a adequação da medida (prisão), esta não se revela
razoável, na medida em que existe a possibilidade concreta de o impetrante perder
seu emprego por conta da prisão, a aumentar ainda mais sua gravosa situação. De
igual forma, eventual dispensa do emprego por conta de sua prisão prolongada
pode terminar por prejudicar seus filhos e credores de alimentos, os quais sequer
passarão a receber os valores atuais dos alimentos. Portanto, os malefícios da prisão
são maiores que os benefícios que porventura possa trazer. Assim, a medida estatal,
no caso concreto, falha no teste da proporcionalidade estrita ou razoabilidade, o
que revela sua incompatibilidade com o ordenamento constitucional. IV – Ordem
concedida. Liminar confirmada. (TJAM; HC 4003175-24.2015.8.04.0000; 3ª C.Cív.;
Rel. Des. João de Jesus Abdala Simões; DJAM 30/09/2015; p. 22)
77/137 — HABEAS DATA. ART. 5º, LXXII, DA CRFB/88. LEI Nº 9.507/97.
ACESSO ÀS INFORMAÇÕES CONSTANTES DE SISTEMAS INFORMATIZADOS
DE CONTROLE DE PAGAMENTOS DE TRIBUTOS. SISTEMA DE CONTA-COR-
RENTE DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL – SINCOR. DIREITO
SUBJETIVO DO CONTRIBUINTE. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1. O
habeas data, posto instrumento de tutela de direitos fundamentais, encerra amplo
espectro, rejeitando-se visão reducionista da garantia constitucional inaugurada
pela carta pós-positivista de 1988. 2. A tese fixada na presente repercussão geral é
a seguinte: “O habeas data é garantia constitucional adequada para a obtenção dos
dados concernentes ao pagamento de tributos do próprio contribuinte constantes
dos sistemas informatizados de apoio à arrecadação dos órgãos da administração
fazendária dos entes estatais”. 3. O Sistema de Conta-Corrente da Secretaria da Re-
ceita Federal do Brasil, conhecido também como Sincor, registra os dados de apoio
à arrecadação federal ao armazenar os débitos e créditos tributários existentes acerca
dos contribuintes. 4. O caráter público de todo registro ou banco de dados contendo
informações que sejam ou que possam ser transmitidas a terceiros ou que não sejam
de uso privativo do órgão ou entidade produtora ou depositária das informações é
inequívoco (art. 1º da Lei nº 9.507/97). 5. “O registro de dados deve ser entendido
em seu sentido mais amplo, abrangendo tudo que diga respeito ao interessado, seja
de modo direto ou indireto, causando-lhe dano ao seu direito de privacidade (...)”
(CANOTILHO, José Joaquim Gomes et al. Comentários à Constituição. 1. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013. p. 487). 6. A legitimatio ad causam para interpretação de habeas
data estende-se às pessoas físicas e jurídicas, nacionais e estrangeiras, porquanto
garantia constitucional aos direitos individuais ou coletivas. 7. Aos contribuintes
foi assegurado constitucionalmente o direito de conhecer as informações que lhes
digam respeito em bancos de dados públicos ou de caráter público, em razão da
necessidade de preservar o status de seu nome, planejamento empresarial, estratégia
de investimento e, em especial, a recuperação de tributos pagos indevidamente, ver-
bis: “Art. 5º (...) LXXII – Conceder-se-á habeas data para assegurar o conhecimento
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de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos


de dados de entidades governamentais ou de caráter público, considerado como
um writ, uma garantia, um remédio constitucional à disposição dos cidadãos para
que possam implementar direitos subjetivos que estão sendo obstaculados”. 8. As
informações fiscais conexas ao próprio contribuinte, se forem sigilosas, não importa
em que grau, devem ser protegidas da sociedade em geral, segundo os termos da lei
ou da Constituição, mas não de quem a elas se referem, por força da consagração do
direito à informação do art. 5º, inciso XXXIII, da Carta Magna, que traz como única
ressalva o sigilo imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, o que não se
aplica no caso sub examine, verbis: “Art. 5º (...) XXXIII – todos têm direito a receber
dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo
ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressal-
vadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”.
9. In casu, o recorrente requereu à Secretaria da Receita Federal do Brasil os extratos
atinentes às anotações constantes do Sistema de Conta-Corrente de Pessoa Jurídica
– Sincor, o Sistema Conta-Corrente de Pessoa Jurídica – CONTACORPJ, como de
quaisquer dos sistemas informatizados de apoio à arrecadação federal, no que tange
aos pagamentos de tributos federais, informações que não estão acobertadas pelo
sigilo legal ou constitucional, posto que requerida pelo próprio contribuinte, sobre
dados próprios. 10. Ex positis, dou provimento ao recurso extraordinário. (STF; RE
673.707; MG; T.P.; Rel. Min. Luiz Fux; DJE 30/09/2015; p. 30)
77/138 — HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA.
MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. 1. O STJ homologou sentença arbitral es-

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trangeira valendo-se da aplicação da legislação pertinente ao caso, qual seja a Lei
nº 9.307/96 (Lei de Arbitragem) e o Código de Processo Civil, não havendo que se
cogitar de questões constitucionais. 2. As impugnações suscitadas pela agravante
implicariam revisão dos fatos e provas colhidos nos autos, o que é inviável em face
da Súmula nº 279/STF. 3. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão
agravada. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF; RE-AgR 715.400;
SP; 1ª T.; Rel. Min. Roberto Barroso; DJE 07/10/2015; p. 39)
77/139 — ICMS. ADESÃO AO SIMPLES NACIONAL QUE NÃO AFASTA
A EXIGÊNCIA RELATIVA À OPERAÇÃO INTERESTADUAL. ART. 13, § 1º, XIII,
G, DA LC Nº 123/06. OFENSA À ANTERIORIDADE ANUAL. INOCORRÊNCIA.
AGRAVO REGIMENTAL DE MALYSKA DISTRIBUIÇÃO, INDÚSTRIA, COMÉRCIO
E REPRESENTAÇÃO LTDA. DESPROVIDO. 1. Nos termos do art. 13, § 1º, XIII, g,
da LC nº 123/06, norma compatível com a Constituição Federal de 1988, o enqua-
dramento no regime Simples Nacional não afasta a incidência do ICMS devido nas
operações com mercadorias oriundas de outros estados, sujeitas à antecipação do
recolhimento do imposto. 2. Precedentes: AgRg no AREsp 287.473/PE, Rel. Min.
Arnaldo Esteves Lima, DJe 18.06.2014; RMS 29.568/AM, Rel. Min. Castro Meira, DJe
30.08.2013; REsp 1.193.911/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 02.02.2011. 3.
Devem respeito à regra da anterioridade anual a instituição e a majoração de tributos,
situações que não ocorreram no caso dos autos. De todo modo, só pela obediência
ao art. 150, III, b, da CF/88 não se impediria a aplicação, no ano de 2007, da LC nº
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123/06, publicada no ano anterior, como logo se percebe. 4. Agravo regimental de


Malyska Distribuição, Indústria, Comércio e Representação Ltda. desprovido. (STJ;
AgRg-RMS 29.259; Proc. 2009/0064137-6; AM; 1ª T.; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia
Filho; DJE 15/10/2015)
77/140 — IMISSÃO NA POSSE. ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL ADQUIRIDO
DURANTE A CONSTÂNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL. OUTORGA UXÓRIA. NECES-
SIDADE. COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. PRESUNÇÃO ABSOLUTA. ART. 1.725
DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. DIREITOS PATRIMONIAIS DA COMPANHEIRA.
ART. 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. TERCEIRO DE BOA-FÉ.
DIREITO À INDENIZAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO
POR MAIORIA. 1. A interpretação segundo a qual não cabe outorga uxória na
união estável agride frontalmente os direitos da companheira e subverte a melhor
interpretação do art. 226 da CF/88, no sentido da equiparação de direitos e deveres
entre casamento e união estável. 2. Se foi a própria lei que atribuiu à união estável
o regime de comunhão parcial de bens (art. 1.725 do CC/02), estabelecendo uma
presunção legal absoluta de que os bens havidos durante a união pertencem a ambos
e dispensam prova de esforço comum, seria absurdo supor que a lei, contraditoria-
mente, também autorizaria a disposição dos bens por vontade unilateral de um dos
companheiros. 3. Deve-se suspender a imissão na posse determinada pelo juízo a
quo em face da ausência de autorização expressa da agravante para a alienação do
bem objeto da lide, resguardando-se ao terceiro de boa-fé o direito que lhe assiste
de pleitear eventual indenização por danos que tenha sofrido. Recurso conhecido
e, no mérito, provido. Decisão por maioria. (TJAL; AI 0804327-36.2014.8.02.0000;
1ª C.Cív.; Rel. Des. Fábio José Bittencourt Araújo; DJAL 08/10/2015; p. 56)
77/141 — IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS
– ICMS. Repasse constitucional aos municípios. Retenção pelo Estado. Impossibili-
dade. Precedentes. Agravo regimental ao qual se nega provimento. (STF; ARE-AgR
904.572; GO; 2ª T.; Relª Minª Cármen Lúcia; DJE 13/10/2015; p. 61)
77/142 — IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – IPI. DATA
DO FATO GERADOR: 31.07.02, 31.10.03. MULTA REGULAMENTAR. DIF-PAPEL
IMUNE. A falta e/ou o atraso na apresentação da Declaração Especial de Informações
Relativas ao Controle de Papel Imune a tributo – DIF-Papel Imune, pela pessoa jurí-
dica obrigada, sujeita o infrator à multa regulamentar prevista na Lei nº 11.945/09.
O órgão ad quem deve examinar a questão posta nos limites do pedido recursal e
não pode piorar a situação do recorrente, sob pena de ferir de morte o princípio da
proibição do reformatio in pejus. Recurso especial do procurador negado. (CARF;
REsp 13558.000246/2005-40; Ac. 9303-001.466; Rel. Cons. Gilson Macedo Rosenburg
Filho; DOU 30/09/2015)
77/143 — IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – IPI. PE-
RÍODO DE APURAÇÃO: 01.07.02 A 30.09.02. CRÉDITO PRESUMIDO DO IPI.
OCORRÊNCIA DA EXPORTAÇÃO. Conforme o disposto no parágrafo único do art.
3º da Lei nº 9.363/96, tem-se que o auferimento da receita de exportação, para todos
os fins, a cuja aplicação subsidiária a Lei se refere, ocorre no momento da emissão
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 345

do Conhecimento de Cargas, nos termos do art. 47 da IN SRF nº 28/94. CRÉDITO


PRESUMIDO DE IPI. AQUISIÇÃO DE INSUMOS JUNTO A PESSOAS FÍSICAS E
COOPERATIVAS. A aquisição de insumos atrelados ao processo produtivo junto a
pessoas físicas e cooperativas deve ser considerada no cálculo do crédito presumido
do IPI. Precedentes do CARF e REsp 993.164, julgado pela sistemática de recursos
repetitivos pelo STJ. CRÉDITO PRESUMIDO DE IPI. CUSTOS COM ENERGIA
ELÉTRICA. MULTAS E JUROS DECORRENTES DE PAGAMENTO EM ATRASO E
CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DO SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA.
INAPLICABILIDADE. Não devem ser considerados, para os fins de cálculo do cré-
dito presumido do IPI, despesas diversas pagas conjuntamente à fatura de energia
elétrica, quais sejam penalidades contratuais (multas e juros por pagamento em
atraso) ou Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública. CRÉDITO
PRESUMIDO DE IPI. PEÇAS DE REPOSIÇÃO. MÁQUINAS. NÃO CABIMENTO.
Independentemente da utilização no processo produtivo ou não, fato é que o con-
tribuinte não deve considerar as peças de reposição como insumos, mas, sim, ativo
imobilizado. A partir daí, seguindo a legislação de regência, o crédito seria aprovei-
tado à razão de 1/12 mensais, ao invés de integralmente em um mês de apuração.
Recurso voluntário provido em parte. (CARF; RecVol 13971.002754/2002-39; Ac.
3802-004.018; Rel. Cons. Bruno Mauricio Macedo Curi; DOU 30/09/2015)
77/144 — INCIDENTE DE FALSIDADE DOCUMENTAL PROCESSADO
EM AUTOS APARTADOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO PARA
DECLARAR A FALSIDADE DO DOCUMENTO. ART. 395 DO CPC. ADMISSÃO
DO AGRAVO DE INSTRUMENTO PELA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUN-

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GIBILIDADE. AUSÊNCIA DO DOCUMENTO ORIGINAL NÃO IMPEDE O RE-
GULAR PROCESSAMENTO DO INCIDENTE DE FALSIDADE. DEPOIMENTO
ELUCIDATIVO DO OFICIAL DE REGISTRO QUE EVIDENCIA A FALSIDADE DO
DOCUMENTO. CONFRONTAÇÃO DOS SEUS DADOS COM O LIVRO DE RE-
GISTRO CARTORÁRIO. 1. Em que pese o STJ possuir o entendimento de que cabe
apelação contra a sentença que julga o incidente em autos apartados, ainda existe
dúvida objetiva na doutrina e na jurisprudência sobre o recurso adequado contra
o ato que julga o incidente de falsidade, o que faz presumir a boa-fé do agravante
e a admissão do presente agravo de instrumento, pela aplicação do princípio da
fungibilidade, nada obstante o ato atacado ser uma sentença que julgou procedente
o incidente de falsidade processado em autos apartados, nos moldes do art. 395 do
CPC. 2. Assim sendo, tal como retroconsignado, diante da expressiva quantidade
de julgados averbados no presente voto, os quais acolhem na hipótese vertente o
cabimento do recurso de agravo de instrumento, e reputados os demais requisitos
recursais, torna-se admissível a aplicação do princípio da fungibilidade, mesmo
diante do entendimento pessoal do Relator sobre o recurso cabível (apelação). 3.
A ausência do documento original, não apresentado por aquele que trouxe a cópia
inquinada de falsa, não impede o regular processamento do incidente de falsidade. 4.
O depoimento elucidativo do Oficial de Registro evidencia a falsidade do documento,
mormente diante da confrontação dos seus dados com o livro de registro cartorário.
5. O incidente em questão não se presta à discussão relativa à comprovação de que
346 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Idalina Ribeiro é a mesma Idalina Alves de Souza, herdeira de Orozimbo Pinto Ribeiro,
proprietário do denominado Sítio Cambury. Cuida-se de matéria afeta aos autos do
processo principal, limitando-se o presente incidente/recurso à análise da certidão
de casamento (cópia) juntada aos autos. 6. As alegações de eventual impedimento
ou suspeição do julgador de origem devem ser tratadas por via própria. 7. Recurso
conhecido e desprovido. (TJES; AI 0041799-64.2014.8.08.0024; 2ª C.Cív.; Rel. Des.
Subst. Fábio Brasil Nery; DJES 23/09/2015)
77/145 — INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO COM MOTOCICLE-
TA DECORRENTE DE DEFEITOS EM VIA MUNICIPAL. AUSÊNCIA DE SINALI-
ZAÇÃO. ÓBITO DO COMPANHEIRO E PAI DOS AUTORES. RESPONSABILIDADE
CARACTERIZADA. ABALO MORAL. PENSÃO MENSAL. DEVER DE INDENIZAR.
Preliminar de nulidade da sentença por julgamento ultra petita inacolhida. Mérito.
Afastamento da responsabilidade. Rejeição. Excludentes inocorrentes. Evidenciado
o nexo causal entre a conduta omissiva e o evento morte. Dano moral in re ipsa.
Quantum indenizatório. Montante proporcional, razoável e adequado ao sofrimento
experimentado. Pensão mensal devida à companheira e aos filhos menores. Depen-
dência econômica. Juros de mora. Aplicabilidade da Súmula nº 54 do STJ mantida.
Sentença confirmada. (TJSC; AC 2013.017234-9; 4ª C.D.Púb.; Rel. Des. Edemar Gruber;
DJSC 09/10/2015; p. 298)
77/146 — INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE POST MORTEM. PARTE
AUTORA BENEFICIÁRIA DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA. INVERSÃO DO ÔNUS
DA PROVA. TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS DA PROVA. CA-
BIMENTO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. DECISÃO MANTIDA. 1.
Segundo a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, que vem sendo admitida
pela jurisprudência do colendo STJ e desta Corte de Justiça, atribui-se a respon-
sabilidade pela produção da prova a quem tem melhores condições de produzi-la,
conforme o caso concreto, retirando-se, assim, o peso da carga probatória daquele
que se encontra em evidente debilidade de suportá-lo, repassando-o para quem se
encontra em melhores condições de produzir a prova essencial ao deslinde do litígio.
2. Diante da notória dificuldade da autora/agravada, beneficiária da gratuidade de
justiça, em promover a realização do exame de DNA, a se efetivar por carta rogatória
na França, mediante a colheita de material genético de parentes do falecido e dos
réus/agravantes ou por meio da exumação do cadáver também naquele país, e tendo
em conta o alcance financeiro limitado da Portaria nº 53/2011 desta Corte de Justiça
e o interesse indubitável dos agravantes na produção da referida prova, o que foi
expresso até mesmo nas razões da apelação cível por eles interposta e que ensejou
a cassação da sentença primeva, proferida sem realização do respectivo exame de
DNA, vislumbra-se escorreita a decisão agravada, em que, com base na teoria da
distribuição dinâmica do ônus da prova, promoveu-se a inversão do ônus da prova
para determinar aos réus/agravantes que arquem com os custos de sua realização,
incluindo as despesas de tradução da carta rogatória e demais despesas a serem
incorridas quando do seu cumprimento na França, sob pena de se inviabilizar a
solução da lide, cujo trâmite, aliás, já se arrasta por mais de uma década. Agravo de
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instrumento desprovido. (TJDF; AGI 2014.00.2.030125-6; Ac. 894.242; 5ª T.Cív.; Rel.


Des. Angelo Canducci Passareli; DJDFTE 29/09/2015; p. 249)
77/147 — LIVRE-CONVENCIMENTO MOTIVADO (ART. 131 DO CPC).
PROVA DOCUMENTAL SUFICIENTE PARA O JULGAMENTO DA LIDE. DES-
NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. AUSÊNCIA DE
CERCEAMENTO DE DEFESA. A) Não há falar-se em nulidade do processo por
cerceamento de defesa quando o julgador entender, no caso concreto, que é desneces-
sária a produção de outras provas além daquelas já existentes nos autos para formar
o seu convencimento. B) No sistema processual brasileiro, adotou-se o princípio da
persuasão racional, segundo o qual cabe ao julgador apreciar a questão controvertida
de acordo com o que entender atinente à lide, de modo fundamentado, cabendo-lhe
indeferir o pleito de nova produção de prova quando considerar que a prova produ-
zida é suficiente para o seu convencimento (art. 420, parágrafo único, incisos I e II,
do Código de Processo Civil), até por razões de economia e celeridade processuais.
C) Nessas condições, não é caso de nulidade do processo, por cerceamento de defesa,
porquanto o julgamento foi fundamentado e embasado em prova suficiente para a
solução do processo. DIREITO ADMINISTRATIVO. DOAÇÃO COM ENCARGO.
IMÓVEL PÚBLICO. FINALIDADE DA DOAÇÃO ALCANÇADA. COMPROVAÇÃO
DE ATIVIDADES RELIGIOSAS. CUMPRIMENTO DO ENCARGO. A) Nota-se dos
autos que a Lei Municipal nº 132/03 autorizou a doação com encargo de imóvel
público para construção de um templo religioso. B) A condição imposta era que a
donatária deveria iniciar a edificação do templo religioso em 6 (seis) meses e em 24
(vinte e quatro) meses findá-la e colocar em funcionamento a atividade religiosa,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


sob pena de revogação da doação. C) No caso, não houve descumprimento dos en-
cargos impostos por lei, porque foi construído o templo religioso no imóvel doado,
observando-se o prazo determinado em lei, com exercício de atividade religiosa.
D) Por fim, vale ressaltar que não foi imposta como condição a utilização integral
do terreno doado, mas apenas a construção do templo religioso no prazo legal e o
exercício da atividade religiosa, motivo pelo qual não há motivo para a revogação
da doação. Apelo a que se nega provimento. (TJPR; ApCvReex 1406496-9; 5ª C.Cív.;
Rel. Des. Leonel Cunha; DJPR 09/10/2015; p. 230)
77/148 — MANDADO DE SEGURANÇA. APREENSÃO. DE VEÍCULO CI-
CLOMOTOR. REGISTRO E LICENCIAMENTO. COMPETÊNCIA MUNICIPAL.
AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO DA MATÉRIA. CONDUÇÃO SEM HABI-
LITAÇÃO OU AUTORIZAÇÃO. DIÁRIAS DE DEPÓSITO LIMITADAS A 30 DIAS.
Ausente legislação do Município de Novo Hamburgo regulando o registro e licen-
ciamento de veículos ciclomotores, inviável se mostra a imposição da penalidade
relativa à infração descrita no art. 230, V, do CTB. Para a circulação de ciclomotores
no território nacional é obrigatório o porte da autorização ou da Carteira Nacional
de Habilitação categoria “A”, segundo o art. 10 da Resolução nº 50/98 do Contran.
Apreendido veículo ciclomotor em razão de condução sem habilitação, em confor-
midade com o disposto no art. 162, I, do CTB, cabível a exigência de pagamento
de despesas de remoção e diárias de depósito, estas limitadas em 30 dias. Negaram
provimento aos recursos de apelação, mantendo a sentença, em reexame necessário.
348 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Unânime. (TJRS; APL-RN 0429985-51.2014.8.21.7000; 4ª C.Cív.; Rel. Des. Alexandre


Mussoi Moreira; DJERS 08/10/2015)
77/149 — MANDADO DE SEGURANÇA. MENOR DE DEZOITO ANOS.
REQUERIMENTO DE MATRÍCULA EM CURSO SUPLETIVO. REALIZAÇÃO DO
EXAME FINAL DE ENSINO MÉDIO. CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DE CURSO
PARA MATRÍCULA EM INSTITUIÇÃO DE NÍVEL SUPERIOR. POSSIBILIDADE. LEI
Nº 9.394/96. ART. 208, V, DA CF/88. 1. Diante do espírito meritocrático que norteia
a Lei nº 9.394/96, à luz da garantia insculpida no art. 208, inciso V, da Constituição
Federal, ao assegurar aos estudantes o acesso aos níveis mais elevados do ensino
segundo a capacidade de cada um, bem como em razão do periculum in mora con-
substanciado na possibilidade de perda do semestre letivo, impõe-se o deferimento de
liminar na ação mandamental para determinar à autoridade impetrada que efetive a
matrícula e proceda à imediata realização das provas de conclusão do curso supletivo
pela impetrante e, em caso de aprovação, lhe seja emitido o certificado de conclusão
do ensino médio. 2. Recurso provido. (TJDF; AGI 2015.00.2.019859-7; Ac. 897.241;
4ª T.Cív.; Rel. Des. Cruz Macedo; DJDFTE 08/10/2015; p. 151)
77/150 — MENOR SOB GUARDA. PENSÃO POR MORTE. GARANTIA
DO PRINCÍPIO INTEGRAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DIGNIDADE
DA PESSOA HUMANA. 1. A Carta Magna de 1988 assegura expressamente que a
proteção integral à criança abrange, dentre outros, os direitos previdenciários. Este
comando normativo não tratou de restringir em qual situação esse direito deve ser
observado, mas tratou da criança e do adolescente em seu status quo originário. 2.
Os direitos constitucionais, ratificados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente,
asseguram, com efeito, os direitos previdenciários à criança sob guarda, em que
pese o regramento da Medida Provisória nº 1.523/96, posteriormente convertida na
Lei nº 9.528/97. Vislumbrando-se, portanto, que a garantia do princípio integral da
criança e do adolescente se afigura como corolário da dignidade da pessoa humana.
3. Recurso desprovido. (TJAC; AGInst 1000925-53.2015.8.01.0000; Ac. 2.246; 2ª
C.Cív.; Rel. Des. Roberto Barros; DJAC 15/09/2015; p. 19)
77/151 — MONITÓRIA. ENTREGA DE MERCADORIA. AUSÊNCIA DE
LIQUIDEZ. IMPROCEDÊNCIA. NOTA FISCAL SEM ASSINATURA DO ADQUI-
RENTE. DOCUMENTO UNILATERAL. INADMISSIBILIDADE. 1. É improcedente
a ação monitória quando não instruída com documento que demonstre a liquidez
da obrigação, porquanto a nota fiscal, sem assinatura do adquirente da mercado-
ria, é ato unilateral do credor (emitente) que não constitui título hábil a ensejar
o recebimento do seu valor pela via monitória. 2. Recurso conhecido e provido.
(TJAP; APL 0047657-23.2013.8.03.0001; C.Un.; Rel. Des. Agostino Silvério; DJEAP
08/10/2015; p. 31)
77/152 — PLANO DE SAÚDE. COBERTURA EM HOSPITAL NÃO ABRAN-
GIDO PELA MODALIDADE CONTRATADA. IMPOSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO
DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DA AVENÇA. Se os hospitais indi-
cados pela apelante são conhecidos nacionalmente pela sua excelência, possuindo
tratamento e acomodações diferenciadas, não é razoável que a apelante adesiva
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 349

decida, unilateralmente e fora do seu plano, se submeter à cirurgia em nosocômio


não conveniado, sob pena de inviabilizar o equilíbrio econômico-financeiro do con-
trato e causar enriquecimento sem causa. VV. A negação indevida da cobertura de
atendimento por parte da operadora de plano de saúde enseja reparação a título de
dano moral, por intensificar a situação de sofrimento psicológico e de angústia no
espírito da beneficiária, mormente em se tratando de paciente idosa, diagnosticada
com câncer. (TJMG; APCV 1.0525.12.017790-8/001; 18ª C.Cív.; Rel. Des. Roberto
Vasconcellos; DJEMG 09/10/2015)
77/153 — PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO. USO DOMICILIAR. MEDI-
CAMENTO. NEGATIVA DE COBERTURA. CLÁUSULA ABUSIVA. MULTA DIÁRIA.
INCIDÊNCIA E VALOR. PROPORCIONALIDADE. 1. É abusiva a cláusula con-
tratual que exclua da cobertura do plano de saúde qualquer tipo de procedimento
ou medicamento necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas pelo
referido plano, mormente quando presentes a prescrição médica e a urgência no
tratamento. 2. Igualmente desmerece guarida a tese recursal de existir resolução da
ANS (Resolução Normativa nº 167, de 9 de janeiro de 2007), permitindo exclusão
assistencial para o fornecimento de medicamento para tratamento domiciliar por
implicar na mesma limitação de tratamento/medicamento indicado por médico
especialista, correspondendo à cláusula abusiva por parte da operadora do plano
de saúde. 3. O valor fixado para a multa diária é proporcional por ser suficiente
e compatível com a obrigação específica, servindo ao propósito de coibir o seu
descumprimento sem ensejar enriquecimento ilícito da parte contrária. 4. Recurso
conhecido e desprovido. (TJDF; AGI 2015.00.2.022197-2; Ac. 897.926; 5ª T.Cív.; Rel.
Des. Silva Lemos; DJDFTE 08/10/2015; p. 165)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


77/154 — PLANO DE SAÚDE COLETIVO. CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. LEI Nº 9.656/98. APLICABILIDADE. RESCISÃO UNILATERAL.
INADIMPLEMENTO SUPERIOR A 60 DIAS. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. POSSIBI-
LIDADE. 1. Aplica-se aos contratos de plano de saúde o Código de Defesa do Con-
sumidor (Súmula nº 469 do STJ). 2. Em decorrência do princípio da hierarquia das
normas, a Resolução nº 195 da ANS não se sobrepõe ao disposto na Lei nº 9.656/98.
Dessa forma, os planos de saúde coletivos devem ser regidos pelo mencionado di-
ploma normativo. 3. É possível a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde
quando houver o não pagamento das mensalidades por mais de 60 dias, consecutivos
ou não, e cumulativamente, e houver a prévia notificação do consumidor. 4. Recurso
conhecido e não provido. (TJDF; APC 2015.03.1.011259-0; Ac. 901.531; 6ª T.Cív.; Relª
Desª Ana Maria Duarte Amarante Brito; DJDFTE 28/10/2015; p. 359)
77/155 — PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. CONTRATO VERBAL. PRELIMINAR
DE INCOMPETÊNCIA. JUSTIÇA DO TRABALHO. AUSÊNCIA DE VÍNCULO
EMPREGATÍCIO OU DE SUBORDINAÇÃO NO CASO VERSADO. PRELIMINAR
REJEITADA. AUSÊNCIA DE PROVA IMPEDITIVA/MODIFICATIVA DO DIREITO
DA RECLAMADA. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMEN-
TOS, NOS TERMOS DO ART. 46 DA LEI FEDERAL Nº 9.099/95. 1. O recorrente
afirma em sede de recurso inominado que prestou serviço de construção civil para a
recorrida e empregou na obra toda a quantia que recebera, em forma de remuneração
350 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

do trabalho e materiais empregados. A sentença julgou parcialmente procedente o


pedido e condenou o recorrente a pagar à autora o valor de R$ 3.394,08 pelos danos
materiais causados, devidamente corrigidos e atualizados. 2. Inicialmente, quanto à
preliminar de incompetência do juízo suscitada em sede recursal, esta não merece
guarida. Trata-se no caso de contrato informal de prestação de serviços de empreita-
da, inexistindo vínculo empregatício ou de subordinação. Preliminar rejeitada. 3. O
recorrente não apresentou prova impeditiva ou modificativa do direito alegado pela
reclamante, ora recorrida, nos termos do art. 333, II, do Código de Processo Civil,
mantenho a sentença de primeiro grau por seus próprios fundamentos, servindo
esta Súmula de julgamento como acórdão, nos termos do art. 46 da Lei Federal nº
9.099/95. 4. Custas de lei, suspensa a exigibilidade posto que beneficiário da justiça
gratuita. (TJAC; APL 0013417-49.2013.8.01.0070; Ac. 11.325; 2ª T.R.; Relª Juíza Shirlei
de Oliveira Hage Menezes; DJAC 24/09/2015; p. 64)
77/156 — PROPRIEDADE INDUSTRIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA.
INEXISTÊNCIA. NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO CABIMENTO. NULIDADE
DA PATENTE MODELO DE UTILIDADE. CABIMENTO. NÃO PREENCHIMENTO
DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA ESTA MODALIDADE. 1. Impossibilidade
de nulidade de sentença por cerceamento de defesa. Inexistência de cerceamento
de defesa, pois o apelante indicou expressamente em seu requerimento de fls.
1.002/1.006 a produção de prova pericial no Libro de Instrucciones para a identi-
ficação da autoria e se o mesmo não sofreu manipulações e alterações editoriais,
bem como o depoimento da testemunha arrolada. 2. Recurso no qual se discute se
a patente modelo de utilidade MU 7802799-3 já se encontrava no estado da técnica
quando do seu pedido de depósito, na medida em que, segundo o apelado, existiam
anterioridades impeditivas. 3. Existência de documentos suficientes de que a patente
MU 7802799-3 do apelante não preencheu os requisitos legais. 4. Apresentação de
nota fiscal de venda de uma desnatadeira modelo 29 AE, que conjuntamente com
o catálogo Libro de Instrucciones comprovava a sua existência anteriormente ao de-
pósito do pedido de patente MU 7802799-3. 5. Apelação conhecida e não provida.
(TRF 2ª R.; AC 0805042-76.2010.4.02.5101; RJ; 1ª T.Esp.; Rel. Des. Fed. Abel Gomes;
DEJF 29/10/2015; p. 238)
77/157 — PROPRIEDADE INDUSTRIAL. INDEFERIMENTO DE REGISTRO
DE MARCA MISTA. ALEGAÇÃO DE COLIDÊNCIA. EXAME DO SIGNO MAR-
CÁRIO COMO UM TODO. DISTINTIVIDADE CONFERIDA PELO CONJUNTO
DOS ELEMENTOS NOMINATIVOS E FIGURATIVOS. APELAÇÃO DESPROVIDA
E REMESSA NÃO CONHECIDA. I – Tratando-se de marcas mistas, cujos registros
foram concedidos para o conjunto dos seus elementos nominativos e figurativos,
o exame de eventual colidência deve ser realizado com maior cautela e levando-
se em consideração o signo marcário como um todo. Precedentes deste Tribunal.
II – Cotejando-se os signos das marcas envolvidas, verifica-se que seus elementos
figurativos não guardam qualquer semelhança entre si, inclusive quanto ao estilo
empregado em suas letras. Já no tocante aos elementos nominativos, conquanto
ambas as marcas contenham o termo “formato” em suas composições, há na mar-
ca da autora outro elemento envolvido que se destaca – a expressão “clínico”, ou
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 351

seja, há características próprias que conferem suficiente distintividade às referidas


marcas, aptas a afastar a aplicação da regra impeditiva do inciso XIX do art. 124 da
LPI. III – Arredada a possibilidade de haver concorrência parasitária, indução do
público consumidor a erro, dúvida ou confusão, na hipótese, pois, ainda que haja
leve afinidade em relação ao ramo de negócio – clínicas atuantes na área da saúde
–, ambas as empresas têm porte modesto e são prestadoras de serviço conhecidas
apenas regionalmente, além de estarem localizadas em diferentes estados da fede-
ração, há mais de dois mil quilômetros de distância uma da outra. IV – Apelação
desprovida. Remessa necessária que não se conhece, por incabível na espécie. (TRF
2ª R.; AC-REEXNEC 0012625-77.2012.4.02.5101; RJ; 1ª T.Esp.; Rel. Des. Fed. Antonio
Ivan Athié; DEJF 29/10/2015; p. 274)
77/158 — PROPRIEDADE INDUSTRIAL. PRELIMINAR DE NÃO CONHECI-
MENTO DO RECURSO. REJEIÇÃO. NULIDADE DA PATENTE DE INVENÇÃO.
CABIMENTO. NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO DA ATIVIDADE INVEN-
TIVA. 1. Remessa necessária e apelação cível interposta pelo Instituto Nacional da
Propriedade Industrial contra a sentença proferia pelo MM. Juízo da 39ª Vara Federal/
RJ, nos autos da Ação 2004.51.01.534946-1, ajuizada pela empresa Texima S/A Indús-
tria de Máquinas em face do apelante e da empresa Master Sas Di Ronchi Franceso
SC, objetivando a nulidade da patente de invenção PI 9203658-9. A autora apontou
como anterioridade impeditiva as seguintes patentes: US 2.582.241, US 2.682.116, US
2.640.277, US 3.048.383, EP 88202976.2, US 2.896.335, US 3.319.353, US 2.591.621
e US 3.371.430. 2. Não há que se falar em não conhecimento do recurso do INPI.
No presente caso, na primeira folha do recurso (fl. 1.162) consta argumentação,

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


embora simples, mas suficiente para impugnar a sentença guerreada. Ademais, o
apelante reiterou os termos de suas razões finais, de fls. 1.263/1.266 (acrescida do
parecer técnico da diretoria de patentes – de fls. 1.267/1.269), contendo as referidas
peças alegações aptas para contrapor os fundamentos da sentença. 3. Restou claro
no laudo pericial que a patente de invenção PI 9203658-9 não atende ao requisito
da atividade inventiva. Releve-se que o parecer técnico juntado pela empresa Master
Sas di Ronchi Franceso SC., assim como o parecer técnico do INPI, não conseguiu
afastar a credibilidade do laudo pericial que elucidou de forma clara e específica as
questões postas nos autos pelas partes. 4. Ademais, além da inexistência de falhas no
laudo pericial, deve ser ressaltado que o perito judicial é dotado de imparcialidade, o
que reforça a credibilidade do laudo pericial, devendo este ser acolhido sem ressalvas,
na medida em que traduziu a melhor forma de avaliação da patente PI 9203658-9. 5.
Remessa oficial e recurso de apelação desprovidos. (TRF 2ª R.; AC-REOAC 0534946-
30.2004.4.02.5101; RJ; 1ª T.Esp.; Rel. Des. Fed. Abel Gomes; DEJF 29/10/2015; p. 94)
77/159 — PROPRIEDADE INDUSTRIAL. REJEIÇÃO DA PRELIMINAR. RE-
GISTRO DE MARCA. IMPOSSIBILIDADE. IDENTIDADE. SEGMENTOS MERCA-
DOLÓGICOS AFINS E MESMA CLIENTELA. POSSIBILIDADE DE CONFUSÃO.
OCORRÊNCIA. ART. 124, XIX, DA LPI. 1. Rejeição da preliminar de nulidade da
sentença sob a alegação de não ter o magistrado a quo enfrentado todos os fundamen-
tos trazidos aos autos. Entendimento de que o juízo a quo avaliou, adequadamente,
o conjunto probatório dos autos, que se mostrou suficiente à formação de sua con-
352 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

vicção, inexistindo omissões capazes de comprometer a integridade do julgado. 2.


De plano, verifica-se a impossibilidade de coexistência das marcas em cotejo, ante
todo um conjunto probatório que demonstra claramente que as marcas destinam-se
a distinguir produtos ou serviços idênticos, semelhantes e afins, suscetíveis de causar
confusão ao público consumidor, alcançando o mesmo segmento mercadológico e
a mesma clientela. 3. Verifica-se que os termos “Schin/Skin” não são evocativos de
cerveja, refrigerante ou bebidas em geral, não sendo de uso comum no ramo, po-
dendo ser considerados como um termo forte, distintivo, que identifica os produtos
daquela determinada empresa, sendo, desta maneira, expressões merecedoras de um
escopo maior de proteção. 4. A empresa apelante, ao registrar sua marca (Skan) com
um termo muito próximo ao utilizado pela empresa apelada, pode levar o público
consumidor a acreditar que a marca da apelante seja uma nova linha de produto
inserida no rol da família de marcas da apelada. 5. Remessa necessária e recurso
conhecidos e não providos. (TRF 2ª R.; AC-REEXNEC 0801952-60.2010.4.02.5101;
RJ; 1ª T.Esp.; Rel. Des. Abel Gomes; DEJF 29/10/2015; p. 255)
77/160 — REGISTRO CIVIL. PEDIDO DE RETIFICAÇÃO PARA CONSTAR
O NOME DO MARIDO DA MÃE. DESCABIMENTO. 1. É juridicamente impossí-
vel o pedido da parte para que conste no seu registro civil de nascimento os dados
relativos ao marido da sua mãe, com acréscimo do patronímico dele e exclusão dos
dados referentes ao seu pai biológico e registral. 2. O registro civil deve espelhar a
verdade, sendo que o sistema registral está submetido ao princípio da legalidade,
e a liberdade individual encontra limite nas disposições de ordem pública. 3. Se o
pai registral é o pai biológico, então inexiste possibilidade jurídica de sua exclusão.
4. Se a parte não tivesse pai registral, ainda assim a pretensão seria descabida, pois
inclusão do nome de outra pessoa como pai no registro civil somente poderia de-
correr de reconhecimento da paternidade espontânea ou forçada, esta decorrente de
investigação de paternidade, ou, ainda, por adoção. 5. A possibilidade de alteração
de nome constitui exceção dentro da regra geral de imutabilidade e, sendo exceção,
deve ser interpretada sempre de forma restritiva e apenas nas hipóteses previstas na
lei. Recurso desprovido. (TJRS; AC 0259793-51.2015.8.21.7000; 7ª C.Cív.; Rel. Des.
Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves; DJERS 03/09/2015)
77/161 — REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. SUSPEITA DE AGRESSÃO
SEXUAL DA MADRASTA. PROCESSO CRIMINAL. ABSOLVIÇÃO POR FALTA
DE PROVAS. ESTUDO PSICOSSOCIAL. INDÍCIOS. MELHOR INTERESSE DA
CRIANÇA. MONITORAMENTO DAS VISITAS. DESNECESSIDADE. DESENVOL-
VIMENTO DO MENOR. MAIOR DISCERNIMENTO. PERDA DA CONVIVÊNCIA
PATERNA. RECONSTRUÇÃO DO CONVÍVIO. ALIENAÇÃO PARENTAL. NÃO
OCORRÊNCIA. 1. A absolvição da madrasta do infante da prática de crime sexual
durante visita paterna, por ausência de prova da existência do fato e por não existir
prova suficiente para a condenação (art. 386, incisos II e VII, do CPP), não conduz
à assertiva de que o fato não ocorreu, mormente quando o laudo técnico produzido
nos autos não afasta a sua ocorrência. 2. Evidenciado que o infante, atualmente,
possui maior discernimento (8 anos) do que à época em que teria supostamente
sido vítima de abuso sexual (3 anos), além de não apresentar rejeição ou medo da
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 353

madrasta, suposta agressora, não mais subsistem motivos para que as visitas do
genitor sejam monitoradas durante a visitação, sob pena de restar prejudicada a
reconstrução dos laços com o pai. 3. Durante o período de visitação deve o genitor
zelar pela integridade do filho, adotando a postura de se comprometer a estar atento
aos momentos em que a criança estiver na companhia da madrasta, não delegando
tarefas referentes aos cuidados do infante a terceiro, além de não deixá-lo sozinho
com a suposta agressora. 4. Diante de um quadro de suposto abuso sexual por parte
da companheira do genitor e de ruptura da convivência paterna, as visitas prolon-
gadas demandam um período razoável de adaptação do menor, com a finalidade de
fortalecimento dos laços com o pai, reconstrução do convívio com a família paterna
e, também, para gerar segurança à mãe quanto às visitas por longo período. 5. Não
há que se falar em acolhimento do incidente de alienação parental se o conjunto
probatório não revela nenhum pressuposto de sua eventual prática. 6. Apelação da
autora conhecida e parcialmente provida. Apelação do MPDFT e recurso adesivo
do réu conhecidos e não providos. (TJDF; APC 2015.01.1.013114-4; Ac. 896.461; 1ª
T.Cív.; Relª Desª Simone Lucindo; DJDFTE 07/10/2015; p. 196)
77/162 — RESOLUÇÃO DE CONTRATO PARTICULAR COM PEDIDO DE
REINTEGRAÇÃO POSSESSÓRIA. COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA DE
IMÓVEL. REGULARIDADE DO ATO CITATÓRIO PRATICADO. CITAÇÃO POR
HORA CERTA. O simples fato de a epístola descrita no art. 229 do CPC ter sido
recebida por terceira pessoa não autoriza a conclusão de nulidade do ato citatório,
pois, consoante remansoso entendimento, a expedição da carta traduz mera forma-
lidade complementar. Descabimento da exceção de usucapião invocada. Em razão

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


do inadimplemento do preço, tem-se que a posse exercida pelo compromissário
comprador é meramente precária. Ausência de animus domini. Ocupação do imóvel
sem a devida contraprestação, desde outubro de 1996. Perdimento, excepcional, de
todos os valores pagos como compensação pelo uso do bem. Ausência de violação
ao preceito do art. 53 da Lei nº 8.078/90. Conferir ao requerido o direito de receber
qualquer valor estar-se-ia contemplando o seu enriquecimento sem causa, que é
coibido pelo ordenamento jurídico pátrio. Débitos relativos ao imposto predial.
Responsabilidade do compromissário comprador de quitá-los durante o período
de ocupação da coisa. Construções realizadas no bem. Acessões. Necessidade de
justa indenização. Direito de retenção da coisa até o efetivo adimplemento. Recurso
interposto pela incorporadora imobiliária a que se dá parcial provimento e recurso
interposto pelo compromissário comprador a que se nega provimento. (TJSP; APL
4011293-52.2013.8.26.0224; Ac. 8845451; 9ª C.D.Priv.; Rel. Des. Conti Machado;
DJESP 09/10/2015)
77/163 — RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. INEXIS-
TÊNCIA DE DÉBITO. DESCONTO INDEVIDO EM CONTA-CORRENTE. AUSÊN-
CIA DE CONTRATAÇÃO COM A EDITORA. INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO
DO DESCONTO EM CONTA-CORRENTE. ATO ILÍCITO. DEVER DE INDENIZAR.
DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
1. Irresignação apreciada na forma do art. 557 do CPC. 2. O caso diz com pedido
de cancelamento de desconto em conta corrente, restituição em dobro de valores,
354 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

cumulado com pedido de indenização por danos morais, decorrentes do desconto


indevido em conta corrente. 3. Irresignação recursal limitada ao reconhecimento de
danos morais. Danos morais configurados. Natureza in re ipsa. Desconto indevido em
conta corrente do demandante por vários meses, mesmo após insurgência do autor
aos demandados, referente a débito que não contraiu. Danos morais caracterizado. 4.
Indenização fixada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pois tal importância se mostra
adequada ao caso concreto e aos parâmetros adotados por este colegiado. Tal quantia
vai acrescida de correção monetária pela variação mensal do IGP-m, a contar desta
data, nos termos da Súmula nº 362/STJ, e juros de mora de 1% ao mês, desde a data
de ocorrência do evento danoso, no caso desde o primeiro desconto indevido, nos
termos da Súmula nº 54 também do STJ. 5. Sentença parcialmente reformada. Apelo
provido. Decisão monocrática. (TJRS; AC 0344751-67.2015.8.21.7000; 9ª C.Cív.; Relª
Desª Iris Helena Medeiros Nogueira; DJERS 08/10/2015)
77/164 — RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO
MORAL POR DISCRIMINAÇÃO RACIAL. ALEGAÇÃO DE OFENSAS PROFERI-
DAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO SUFICIENTE PARA A DEMONSTRAÇÃO
DOS PRESSUPOSTOS ENSEJADORES DE DANOS MORAIS, ÔNUS QUE LHE
INCUMBIA DIANTE DO ART. 333, INCISO I, DO CPC. AJG DEFERIDA. 1. A
parte autora não comprova de forma satisfatória que houve de fato as ofensas no
estabelecimento de trabalho que visa ser indenizado, em razão de suposto uso de
palavras ofensivas e agressivas. 2. Nesse sentido, a reparação por danos morais
resulta da presença dos pressupostos de indenizar elencados nos arts. 186 e 927
do Código Civil, a saber: conduta ilícita, o dano e o nexo de causalidade. 3. Assim,
não demonstrada a existência dos pressupostos, tais como conduta ilícita, o dano e
o nexo de causalidade, tenho por afastado o dever de indenizar da parte ré, ou seja,
pela improcedência da demanda. 4. Quanto ao pedido de indeferimento referente
à AJG do apelante não há provas cabais para afastá-la. Apelação do réu provida e
apelação do autor prejudicada. (TJRS; AC 0431928-06.2014.8.21.7000; 5ª C.Cív.; Rel.
Des. Léo Romi Pilau Júnior; DJERS 08/10/2015)
77/165 — RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE ÔNIBUS. PASSA-
GEIRO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS EXISTENTES. VALOR
ADEQUADO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. É obrigação da transportadora conduzir
o passageiro são e salvo a seu local de destino. 2. Em tendo sido atingida a incolu-
midade física do passageiro, deve a apelante indenizar-lhe os danos morais. 3. Valor
indenizatório adequado, ante a natureza do bem jurídico ofendido e a gravidade da
lesão. 4. Apelação a que se nega provimento. (TJRJ; APL 0018068-28.2012.8.19.0210;
15ª C.Cív.; Rel. Des. Horacio dos Santos Ribeiro Neto; DORJ 07/10/2015)
77/166 — RESPONSABILIDADE CIVIL. CIRURGIA DE LAQUEADURA TU-
BÁRIA. POSTERIOR GRAVIDEZ. RÉU QUE NÃO COMPROVA O CUMPRIMENTO
DO DEVER DE INFORMAR AO PACIENTE SOBRE O RISCO DO INSUCESSO DA
CIRURGIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CF.
DANO MORAL CONFIGURADO. COMPROMETIMENTO DO PLANEJAMENTO
FAMILIAR. PENSÃO MENSAL DEVIDA. JUROS DE MORA QUE DEVEM SER
CALCULADOS DE ACORDO COM A REGRA DO ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 355

COM A REDAÇÃO DA LEI Nº 11.960/09. Decisão do Supremo Tribunal Federal


que reconhece a inconstitucionalidade parcial do art. 5º da Lei nº 11.960/09 (ADI
4.357/DF). Correção monetária que deve ser calculada com base no IPCA-e, a partir
de 25.03.2015, diante do reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal da incons-
titucionalidade parcial do art. 5º da Lei nº 11.960/09 (ADIs 4.425/DF e 4.357/DF).
Recurso da primeira apelante a que se dá parcial provimento. Recurso do segundo
apelante a que se nega provimento. Juros e correção monetária retificados em sede
de reexame necessário. (TJRJ; APL 0049761-20.2009.8.19.0021; 21ª C.Cív.; Relª Desª
Lucia Helena do Passo; DORJ 07/10/2015)
77/167 — RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATO BANCÁRIO NÃO RE-
CONHECIDO. Não demonstrada contração por parte do autor. Inscrição imerecida
em órgãos de restrições creditórias. Dano moral configurado. Indenização arbitrada
em valor adequado. Manutenção integral do julgado. Não provimento do recurso.
(TJBA; Rec 0001065-93.2014.805.0076-1; 5ª T.R.; Rel. Des. Walter Americo Caldas;
DJBA 29/09/2015)
77/168 — RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. Utilização de docu-
mentos pessoais legítimos da autora, por terceira pessoa, sem o seu consentimento
e presença, com a finalidade da contratação de empréstimo para o financiamento
de veículo. Falta de prova da vinculação da autora ao contrato inadimplido e que
gerou restrição cadastral ao seu nome. Omissão da casa bancária na apresentação
do contrato celebrado e dos documentos pessoais utilizados no ato da celebração
do ajuste. Negligência da instituição financeira evidenciada. Responsabilidade civil
caracterizada. Danos morais indenizáveis, que prescindem de prova do prejuízo

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


material, configurados. Excludente da responsabilidade civil não configurada. Cul-
pa concorrente da autora evidenciada pelo fato de ter entregue seus documentos
pessoais a sua prima, ainda que com finalidade diversa, que não tem o condão de
afastar a responsabilidade do banco, conquanto sirva de critério delimitador do ar-
bitramento da cifra indenizatória. Indenização fixada em dez mil reais, nos limites
da postulação da autora. Sentença parcialmente reformada. Pedido inicial julgado
procedente. Recurso provido. (TJSP; APL 0001434-26.2013.8.26.0533; Ac. 8867801;
19ª C.D.Priv.; Rel. Des. João Camillo de Almeida Prado Costa; DJESP 08/10/2015)
77/169 — RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO EM CADASTROS DE
INADIMPLENTES. DANOS MORAIS. DOSAGEM DA INDENIZAÇÃO. 1. Nos casos
de inscrição indevida em cadastros de proteção ao crédito, o dano moral se configura
in re ipsa, derivado inexoravelmente do fato danoso. 2. Para a fixação do quantum
indenizatório, levam-se em conta determinados critérios baseados nas condições
econômicas e sociais das partes, bem como a intensidade do dano, atendidos os prin-
cípios da razoabilidade e proporcionalidade. Ação procedente. Negado provimento
ao recurso. (TJSP; APL 0042361-36.2012.8.26.0576; Ac. 8814069; 21ª C.D.Priv.; Rel.
Des. Itamar Gaino; DJESP 09/10/2015)
77/170 — RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE DE MULHER EM CADEIA
PÚBLICA DURANTE VISITA ÍNTIMA. Pretensão dos filhos ao percebimento de
pensão mensal. Descabimento. Cerceamento de defesa não caracterizado. Inexistência
356 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

de elementos que permitam concluir pela falha no serviço público. Vítima que fazia
visitas íntimas frequentes. Falta de provas de que vítima e autor dos fatos estives-
sem sofrendo extorsão por parte do crime organizado. Sentença mantida. Recurso
conhecido e desprovido. (TJSP; APL 1019833-37.2014.8.26.0053; Ac. 8854922; 2ª
C.D.Púb.; Relª Desª Vera Angrisani; DJESP 07/10/2015)
77/171 — RESPONSABILIDADE CIVIL. PRETENDIDA INDENIZAÇÃO EM
DECORRÊNCIA DE ACIDENTE ENVOLVENDO AMBULÂNCIA DE PROPRIEDA-
DE DE MUNICIPALIDADE REFERIDA. ESPOSA DO AUTOR QUE, TRANSPOR-
TADA EM CITADA AMBULÂNCIA, VEIO A FALECER. INDENIZAÇÃO DEVIDA
PELO DANO MORAL CARACTERIZADO. Presunção de culpa do motorista da
ambulância, que bateu na parte traseira de caminhão que seguia à frente, reconhecida.
Recurso parcialmente provido para julgar a ação procedente em parte. (TJSP; APL
0001453-61.2009.8.26.0019; Ac. 8852838; 4ª C.D.Púb.; Rel. Des. Ferreira Rodrigues;
DJESP 08/10/2015)
77/172 — RESPONSABILIDADE CIVIL EM RAZÃO DE O PRODUTO APRE-
SENTAR UM CORPO ESTRANHO. OBJETO DE METAL NÃO IDENTIFICADO NO
INTERIOR DO BISCOITO. PRODUTO IMPRÓPRIO PARA CONSUMO. Documentos
e provas que corroboraram o exposto na exordial, danos morais configurados, ainda
que o produto não tenha sido ingerido pelo consumidor. Situação irregular do pro-
duto impróprio para consumo caracteriza potencial risco à saúde do consumidor e
provoca sentimentos de insegurança, vulnerabilidade e repugnância, caracterizando
danos morais passíveis de indenização. Constituindo-se prática abusiva a entrega
dos produtos com defeito de fabricação. Frustrando a expectativa lícita criada ao
consumidor impossibilitado de usufruir bens de consumo não duráveis. Dano moral
configurado. Sentença que julgou procedente a queixa da autora. Indenização a título
de danos morais arbitrada no montante de R$ 7.000,00 (sete mil reais). Quantum
arbitrado em valor excessivo. Redução em consonância com o princípio da razoabi-
lidade. Comando sentencial parcialmente reformado para reduzir o valor arbitrado
a título de danos morais de R$ 7.000,00 (sete mil reais) para R$ 2.000,00 (dois mil
reais); e no mais, manter a r. sentença pelos seus próprios fundamentos. Recurso
conhecido e parcialmente provido. Sem custas e honorários advocatícios em razão
de recorrente vencedor. (TJBA; Rec 0000197-80.2014.805.0023-1; 3ª T.R.; Relª Desª
Josefa Cristina Tomaz Martins Kunrath; DJBA 10/09/2015)
77/173 — REVISÃO DE CONTRATO. CHEQUE ESPECIAL. APLICABILIDA-
DE CDC. JUROS. TAXA MÉDIA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. POSSIBILIDADE.
O Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos contratos bancários, conforme
pacificado na Súmula nº 297 do STJ, desde que haja relação de consumo, ainda que
por equiparação. Sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, adequar-se-á
o princípio pacta sunt servanda, tornando-o relativo, em face da à função social do
contrato e da boa-fé das partes, proporcionando a defesa do consumidor em caso
de pactos abusivos, sem que isso enseje insegurança jurídica. Embora não haja a
limitação dos juros para instituições financeiras, não pode sua taxa ser totalmente
liberada, sem nenhum controle efetivo, devendo ser declarada a abusividade de
cláusula que estipule juros excessivos. A capitalização de juros é lícita se contratada,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 357

conforme a MP nº 1.963-17/00. A divergência entre a taxa de juros anual e o duo-


décuplo da taxa de juros mensal indica a existência de previsão contratual acerca da
capitalização de juros. (TJMG; APCV 1.0525.12.008067-2/001; 10ª C.Cív.; Relª Desª
Mariângela Meyer; DJEMG 09/10/2015)
77/174 — REVISIONAL DE ALIMENTOS. MAIORIDADE DO ALIMENTAN-
DO. ISONOMIA NA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. ART. 227, § 6º, DA CONSTI-
TUIÇÃO FEDERAL. 1. A maioridade, por si só, não exime a obrigação alimentícia
paterna, que passa a existir em razão da relação de parentesco, nos termos do disposto
no art. 1.694 do Código Civil de 2002. Precedentes. 2. No caso concreto, embora
não se vislumbre o suposto empobrecimento e incapacidade financeira do apelante
em continuar pagando a obrigação alimentar no importe a um salário mínimo e
meio, a incontroversa nos autos corroborada por documentos, de que o alimentante
paga quantia equivalente a um salário mínimo para outro filho dele, também maior
de idade, e, em situação semelhante do apelado, autoriza a revisão dos alimentos
para adequar-se os valores pagos, para que não se venha a alegar ofensa ao primado
constitucional da isonomia dos alimentos aos filhos, conforme inteligência do art.
227, § 6º, da Constituição Federal. 3. Apelação parcialmente provida. (TJAP; APL
0001346-97.2015.8.03.0002; C.Un.; Rel. Des. Carlos Tork; DJEAP 08/10/2015; p. 27)
77/175 — SEGURO DE VIDA (PRESTAMISTA). FALECIMENTO DA CON-
SORCIADA. ILEGITIMIDADE ATIVA DOS HERDEIROS. EXTINÇÃO DO FEI-
TO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. Somente a estipulante (administradora do
consórcio) possui legitimidade para formular pedido de cobrança de indenização
securitária (de caráter prestamista) diretamente contra a seguradora. Não há que se

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


falar, na hipótese dos autos, em pagamento, aos autores, herdeiros da consorciada,
da indenização prevista. Não se trata de seguro de vida, mas de proteção financeira
(prestamista), que tem por objetivo garantir a quitação de uma dívida do segurado, no
caso de sua morte ou invalidez ou até mesmo desemprego involuntário. O primeiro
beneficiário deste tipo de seguro, até o limite da dívida, será sempre a estipulante,
ou seja, a administradora do consórcio. (TJMG; APCV 1.0699.11.001318-1/001; 9ª
C.Cív.; Rel. Des. Luiz Artur Hilário; DJEMG 09/10/2015)
77/176 — SEGURO DE VIDA EM GRUPO CONTRATADO PELA EMPRE-
GADORA MANDATÁRIA. SEGURO FACULTATIVO. PRESCRIÇÃO ÂNUA. PRE-
CEDENTES. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Na relação securitária decorrente de
contrato de seguro facultativo em grupo, a empregadora-estipulante qualifica-se
como mera mandatária dos segurados, e não como terceira. Precedentes. 2. A ação
de cobrança da seguradora contra a empregadora-estipulante relativa a prêmios
não pagos de seguro de vida em grupo sujeita-se ao prazo prescricional de 1 ano.
Precedentes. 3. Agravo regimental não provido. (STJ; AgRg-REsp 1.492.981; Proc.
2014/0277220-4; RJ; 3ª T.; Rel. Min. Moura Ribeiro; DJE 09/10/2015)
77/177 — SUCESSÃO. EXCLUSÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INDIG-
NIDADE. Demanda movida em face dos herdeiros de suposto autor de homicídio
contra o irmão da autora, que era seu pai adotivo. Extinção do feito sem resolução
do mérito. Inconformismo da autora. Descabimento. Notória falta de interesse
358 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

processual. Suposto indigno que também já faleceu. Impossibilidade de extensão


dos efeitos da dignidade aos sucessores deste. Exclusão pretendida que tem caráter
pessoal. Inteligência do art. 1.816 do CC (art. 1.599 do CC/1916). Sentença man-
tida. Recurso desprovido. (TJSP; APL 0009465-79.2013.8.26.0001; Ac. 8768948; 1ª
C.D.Priv.; Rel. Des. Rui Cascaldi; DJESP 09/09/2015)
77/178 — SUSCITAÇÃO DE DÚVIDAS. CRIANÇA. ASSENTO. INDICAÇÃO
DE PATERNIDADE. PROCURAÇÃO OUTORGADA PELO PAI. PRINCÍPIO DO
MAIOR INTERESSE DO MENOR. POSSIBILIDADE. DEFINIÇÃO DA CIRCUNSCRI-
ÇÃO E DO CARTÓRIO. ENDEREÇO DOS PAIS. 1. A conjugação da Lei de Registros
Públicos (Lei nº 6.015/73) e a Lei que regula a investigação de paternidade dos filhos
havidos fora do casamento e dá outras providências (Lei nº 8.560/92), bem como o
princípio do maior interesse da criança, qual seja o de ter nome, sobrenome, filiação
e nacionalidade brasileira, dentre outros, permite ao julgador, no caso concreto, não
tardar ao jurisdicionado uma prestação jurisdicional célere, sendo este o objetivo
precípuo do Poder Judiciário. 2. O instrumento procuratório possui concordância
de ambos os pais, instrumento este dotado de fé pública, acerca da filiação do me-
nor. Tem-se que nesta ocasião o pai reconheceu a paternidade do filho, podendo
em conjunto ser procedido o assento da criança com a indicação da paternidade,
com a devida averbação. Ademais, inexistente qualquer vício a obstar a pretensão
deduzida nos autos. 3. Recurso desprovido. (TJAC; APL 0501399-49.2013.8.01.0001;
Ac. 2.244; 2ª C.Cív.; Rel. Des. Roberto Barros; DJAC 15/09/2015; p. 19)
77/179 — TUTELA ANTECIPADA. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
– EJA. ALUNO CURSANDO O MÓDULO II DO ENSINO MÉDIO. APROVAÇÃO
EM VESTIBULAR. TUTELA ANTECIPADA INDEFERIDA. AUSÊNCIA DE FRE-
QUÊNCIA MÍNIMA. DECISÃO MANTIDA. 1. Não se reconhece o direito do aluno
em ser submetido à avaliação escolar que lhe permita avançar em nível educacional,
quando ele, matriculado no módulo II, equivalente ao segundo ano do ensino médio
da modalidade de ensino a distância, para a Educação de Jovens e Adultos – EJA,
não comprovar o prazo mínimo de frequência no ensino médio, essencial para a
pretensão vindicada. 2. Recurso não provido. (TJDF; AGI 2015.00.2.019727-2; Ac.
897.282; 4ª T.Cív.; Rel. Des. Cruz Macedo; DJDFTE 08/10/2015; p. 151)
77/180 — UNIÃO ESTÁVEL. DANO MORAL. SUPOSTA INFIDELIDADE.
DEVER DE INDENIZAR. RECURSO IMPROVIDO. 1. Não há dúvidas quanto à inci-
dência das regras de responsabilidade civil nas relações do âmbito familiar, devendo
o caso em comento ser analisado à luz do art. 186 do Código Civil. Assim, para
que seja caracterizado o dano moral, e gerado o dever de indenizar, é necessária a
comprovação de existência do dano, do nexo de causalidade entre o fato e o dano e
da culpa do agente. 2. Com relação ao apontado cúmplice do convivente infiel, não
há como se imputar o dever de indenizar, já que ele não possui, legal ou contratu-
almente, vínculo obrigacional com o convivente supostamente traído, não sendo
possível exigir sua responsabilização pelo descumprimento de deveres inerente ao
casamento. 3. Ainda que a união estável imponha o dever de fidelidade recíproca e
de lealdade, a violação pura e simples de um dever jurídico familiar não é suficiente
para caracterizar o direito de indenizar. A prática de adultério, isoladamente, não se
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 359

mostra suficiente a gerar um dano moral indenizável, sendo necessário que a postura
do cônjuge infiel seja ostentada de forma pública, comprometendo a reputação, a
imagem e a dignidade do companheiro. 4. Recurso improvido. (TJES; APL 0002963-
55.2010.8.08.0026; 1ª C.Cív.; Rel. Des. Júlio César Costa de Oliveira; DJES 14/10/2015)
77/181 — UNIÃO ESTÁVEL. NÃO CONFIGURAÇÃO. ALEGADO COMPA-
NHEIRO CASADO. IMPEDIMENTO LEGAL E INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA.
1. Embora o relacionamento afetivo do casal tenha perdurado ao longo de 35 anos,
com dois filhos, a autora sempre se manteve residindo na casa de seus pais, e lá
mantinha seus encontros com o agora de cujus. Jamais, portanto, mantiveram vida
em comum sob o mesmo teto. O varão a “ajudava” nas despesas e durante todo esse
tempo sempre preservou a vida em comum com a esposa, e, embora as promessas
que fazia à autora, jamais concretizou a separação – o que era do pleno conhecimento
da autora. Portanto, não há falar em união estável putativa, no caso. 2. Assim, afora
o impeditivo legal à caracterização da união estável – decorrente da constância do
casamento do varão –, a ausência do intuito de constituir família (pois a autora
permaneceu sempre residindo com os pais), não se vê como configurada entidade
familiar entre o casal. Por maioria, deram provimento, vencido o Desembargador
Relator. (TJRS; AC 0253333-48.2015.8.21.7000; 8ª C.Cív.; Rel. Des. José Pedro de
Oliveira Eckert; DJERS 10/09/2015)
77/182 — USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. OPOSIÇÃO DO MUNICÍPIO.
METRAGEM DO IMÓVEL INFERIOR À PREVISÃO DA LEI MUNICIPAL. IRRE-
LEVÂNCIA. INCIDÊNCIA DE TESE FIXADA EM AUTOS DE REPERCUSSÃO
GERAL. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA QUE NÃO PODE SER OBSTADA POR

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL — EMENTÁRIO


LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
ÔNUS DO APELANTE. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. SENTENÇA MANTI-
DA. 1. Aquele que por 5 (cinco) anos, sem interrupção ou oposição, possui como
seu imóvel no qual constituiu moradia habitual, adquire-lhe a propriedade, por
usucapião especial urbana. 2. A função social da propriedade supera a questão da
legislação infraconstitucional a respeito do zoneamento e parcelamento do solo. 3.
A condenação ao pagamento dos honorários advocatícios deve observar o princípio
da causalidade. (TJPR; ApCiv 1406788-2; 17ª C.Cív.; Relª Desª Rosana Amara Girardi
Fachin; DJPR 09/10/2015; p. 395)
77/183 — UTILIZAÇÃO DE ASSINATURA PESSOAL E ARTÍSTICA COMO
MARCA. DIREITO DE PERSONALIDADE LATENTE. AUTORIZAÇÃO EXPRESSA
E LIMITADA. CONTRATO DE CESSÃO DE MARCA MISTA. TRANSFERÊNCIA
DEFINITIVA DE PROPRIEDADE. RETOMADA DE MARCA OU PRÁTICA DE
ATO CONTRADITÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Recurso em que se discutem os
efeitos extraídos de contrato de autorização de uso de assinatura do pintor Cân-
dido Portinari na condição de marca mista e a cessão da referida marca registrada
perante o INPI, a fim de definir se o referido instrumento alcança também a marca
nominativa associada, bem como aos direitos remanescentes ao cedente em relação
à exploração da marca. 2. Conquanto o nome civil se consista em direito de perso-
nalidade – absoluto, obrigatório, indisponível, exclusivo, imprescritível, inalienável,
incessível, inexpropriável, irrenunciável e intransmissível –, a legislação nacional
360 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

admite o destaque de parcela desse direito para fins de transação e disposição, tal
qual se dá na sua registrabilidade enquanto marca, desde que autorizada de forma
expressa e delimitada. 3. A autorização de uso de nome civil ou assinatura mantém
latente, na esfera jurídica do titular do direito de personalidade, o direito de defesa
contra utilização que desborde os limites da autorização ou ofenda a imagem ou
a honra do indivíduo representado. 4. Autorizada a utilização apenas na forma de
assinatura – marca mista –, não pode o autorizatário utilizá-la por qualquer outra
forma – marca nominativa. 5. O registro da marca composta por nome civil ou
assinatura, cuja utilização fora autorizada, ganha autonomia em relação à pessoa a
que alude, passando a vincular-se ao bem ou ao serviço que denomina, com a dupla
finalidade de viabilizar a identificação de sua origem pelos consumidores e resguar-
dar a livre-concorrência. 6. Ademais, o desenvolvimento da marca no segmento de
sua exploração, apesar de ter em si agregado o valor da pessoa representada pelo
nome civil, vincula-se ao bem ou ao serviço, o qual também agrega valor à marca.
7. Diante dessa autonomia, muito embora não seja possível ao cessionário de marca
mista consubstanciada na assinatura do pintor sua utilização por qualquer outra
forma, tampouco será possível nova autorização para exploração por terceiros na
mesma classe. Do contrário, ter-se-ia configurada violação à proteção marcária re-
sultante na confusão dos consumidores quanto à origem do produto, bem como o
desenvolvimento de concorrência parasitária. 8. A cessão de marca é instrumento
apto a transferir os direitos de propriedade da marca transacionada, legitimando
o cessionário ao uso, fruição, disposição e reivindicação e, por consequência, a
opor-se, ainda que preventivamente, à pretensão de registro por terceiro, inclusive
o próprio cedente. 9. Recurso especial parcialmente provido. (STJ; REsp 1.532.206;
Proc. 2015/0105289-5; RJ; 3ª T.; Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze; DJE 13/10/2015)
A DUALIDADE HAVIDA (A VIDA): SERIA O ABORTO
QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA OU DE POLÍTICA
CRIMINAL?*

Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso


Advogado; Presidente da Comissão de Cultura da 18ª Subseção da Ordem dos
Advogados do Brasil – São Paulo (2013/2015); Professor no Departamento de
Ciências Jurídicas da Universidade de Taubaté; Membro do Instituto Brasileiro de
Direito Processual Penal (IBRASPP), do Instituto Brasileiro de Direitos Humanos
(IBDH), da Fundación Internacional de Ciencias Penales (FICP – Madrid);
Investigador no International Center of Economic Penal Studies (ICEPS – New
York) e de Projetos coordenados pela Secretaria-Geral para América Latina
(Montevidéu).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


RESUMO
O aborto deve ser tratado como questão de saúde pública ou permanecer na
esfera política criminal? Embora a interdisciplinaridade do tema (seja de ordem
religiosa, política ou jurídica) e esquadrinhada esta dualidade existente e as fortes
razões de cada linha de pensamento, resta a indagação dicotômica.
Palavras-Chave: Aborto. Política Criminal. Saúde Pública.

TITLE: The duality of life: is abortion a matter of public health or criminal policy?
ABSTRACT
Should abortion be treated as a matter of public health or stay in the sphere of
criminal policy? Notwithstanding the interdisciplinarity of the subject (whether it is
related to religion, politics or law), and after this duality and the strong reasons of each
current of thought being examined, the dichotomous question remains.
Keywords: Abortion. Criminal Policy. Public Health.

A interrupção do nascimento, por mais antiga que seja, traduz um tema que
até os dias atuais permanece latente na sociedade – precipuamente por trazer em
seu bojo questionamentos axiológicos e religiosos.
Tal fato, diga-se de passagem, é visualmente perceptível por diversos eventos
recentes que permearam os jornais e as revistas nos últimos anos.
Como exemplo, ilustramos: a) o programa nacional de direitos humanos, que
em maio de 2010 trazia em seu corpo redação alterando, dentre vários pontos, a via-
bilidade de abortamento; b) a revista TPM, de novembro de 2014, com a participação

(*) Tal artigo se trata de uma versão estendida, verticalizada, do artigo Aborto: Questão de Saúde Pública
ou de Política Criminal?, publicado pelo site Empório do Direito (<emporiododireito.com.br>) em 12 de
novembro de 2015.
362 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

de diversos atores globais se posicionando favoravelmente à prática de cessação da


gestação (Leandra Leal, Alessandra Negrini, Marília Gabriela e Gregório Duvivier);
c) a revista Marie Claire, de março de 2015, com a confissão da atriz Débora Bloch
acerca da concreção de um aborto há 31 anos; e, recentemente, d) a pichação da
Catedral da Sé, em São Paulo, em 1º de novembro deste ano, como forma de se ma-
nifestar contrariamente ao PL nº 5.069 – de autoria do Deputado Eduardo Cunha,
presidente da Câmara dos Deputados –, que propõe, entre outras medidas, pena
para quem induz, instiga ou auxilia a gestante a abortar e, por demais, para quem
vende ou entrega, ainda que de forma gratuita, substância ou objeto para provocar
o aborto – ressalvadas as exceções previstas em lei, que são as mesmas do art. 128
do Código Penal.
Nota-se, decerto, que a problemática acerca do aborto sempre se desenvolve
com lastro em duas linhas de pensamento: a viabilidade do abortamento, haja vista
se tratar de questão de saúde pública, ou, no outro cunho da moeda, a ideação de
que tal ato deve permanecer sendo tratado como questão de política criminal.
Passada essa verberação e antes de se adentrar no cerne do presente questio-
namento e de verticalizar as duas percepções deste fato, é imprescindível notar que
nenhum direito é absoluto, nem mesmo a vida, bem jurídico máximo de acordo com
a nossa Constituição – lei suprema do Estado brasileiro e fundamento de validade
de todas as demais normas jurídicas.
Não por outra razão, observa-se que a própria Carta Magna esboça uma exceção
explícita à tutela da vida, que é a pena de morte em caso de guerra declarada (art.
5º, XLVII, alínea a, da CRFB), além do que o bem jurídico vida pode, por vezes, se
defrontar com outros direitos fundamentais. De tal arte, para sanar este conflito, é
necessária a concreção de uma ponderação valorativa, indicando, no caso em con-
creto, qual direito deverá preponderar(1) – como muitas vezes se verifica na legítima
defesa, situação autorizada pelo direito.

(1) Ponderação de interesses, fruto do substantive due process (dimensão material do devido processo
constitucional), que se preocupa com uma solução equilibrada.
Para tanto, emergem alguns sub-princípios, muito bem explanados por Teori Albino Zavascki (apud
DIDIER Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento.
10. ed. Salvador: Juspodivm, 2008. v. I. p. 38-39).
Vejamos:
a) (sub)princípio da menor restrição possível, segundo o qual o tribunal deve observar que a mitigação,
que se faça a qualquer um dos bens jurídicos em conflito, seja a menor possível e ocorra dentro da
medida do necessário;
b) umbilicalmente relacionado ao axioma ut retro estudado está o cânone da salvaguarda do núcleo es-
sencial, que se consubstancia na impossibilidade de se debelar um dos bens jurídicos em conflito ou de
retirar de um deles sua substância elementar. Denominado, também, de princípio da escolha do meio
mais suave (das Prinzip der Wahl des mildesten Mittels ou, ainda, Gebot des mildesten Mittels), pela qual,
diante de medidas que servem para a obtenção de um mesmo fim, deve-se eleger aquela menos nociva
aos interesses do cidadão.
c) de mais a mais, há a exigibilidade do (sub)princípio da necessidade (Erforderlichkeit), que legitima a
ponderação sempre que for inviável a convivência concomitante das normas em desarmonia (Erfordern
– exigir lo que se estima necesario. In: QUINTANO, Johanna Heilpern de; RIPOLLES, Antonio Quin-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 363

Diga-se de passagem, é no âmago desse juízo avaliativo que se encontram, além


da outra possibilidade de se excepcionar a vida – já que, como visto, esta privação
não pode se dar arbitrariamente (artigo 4º da Convenção Americana de Direitos
Humanos) –, os argumentos sobre a descriminalização do aborto.
Vejamos!
Num primeiro pensar, tendencioso à descriminalização do aborto, se vislum-
bram direitos da gestante a uma vida digna – fundamento da Constituição (art. 1º,
III, da CF).
Daí, para prevalecer sobre o bem vida, valoram-se inúmeros direitos que devem
ser observados para a genitora, como:
a) o direito de autonomia reprodutiva e a sua liberdade de escolha, inviabili-
zando-se, nesse sentido, uma maternidade indesejada (ponto deveras cristalino no
curta, de 4 de novembro do presente ano, “Meu Corpo, Minhas Regras” – que conta
com a participação dos atores Julia Lemmertz, Alexandre Borges, Nanda Costa,
Bruna Linzmeyer e outros);
b) o direito à privacidade, competindo a análise sobre a plausibilidade do abor-
tamento à gestante, e não a ingerência estatal – até porque, ante o desespero (causa
precípua do aborto(2)) e a responsabilidade de gerar e criar uma criança indesejada,
nem o Estado nem ninguém, para ser franco, apresentam algo de consolador ou
alguma alternativa a tal prática; e, por fim,

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


c) o direito à igualdade, haja vista que as mulheres com melhores condições de
vida continuarão abortando de forma mais segura do que aquelas que não apresentam
a mesma possibilidade de subsistência. En passant, é por isso que muito raramente
morre, por essa causa, uma mulher rica(3).
Como consequência desse entender, para combater o flagelo do aborto clan-
destino e as famigeradas fazedoras de anjinhos, o aborto deveria ser visualizado, no
âmbito penal, como mera questão de saúde pública, haja vista que “no Brasil uma

tano. Diccionario de derecho comparado [alemán-españo]. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado,
1951. p. 132); e
d) derradeiramente, vislumbra-se o (sub)princípio da pertinência ou aptidão (Geeignetheit), donde se
averigua se a medida empregada é o meio adequado a se atingir o desate colimado.
(2) Conforme denota a pesquisa nacional de aborto, realizada pela Universidade de Brasília em 2010, “a

religião não é um fator importante para a diferenciação das mulheres no que diz respeito à realização do
aborto”. É que, ao se refletir a composição religiosa do país, “a maioria dos abortos foi feita por católicas,
seguidas de protestantes e evangélicas e, finalmente, por mulheres de outras religiões ou sem religião”.
Tal fato é indicativo, nesse passo, de que uma das maiores razões para a prática de tal ato se encontra no
desespero de a gestante ter a responsabilidade de criar uma criança indesejada (como acima pontuado),
agravado, muitas vezes, pelo desaparecimento repentino do pai do feto. De mais a mais, é digno de nota
que em outras situações este desespero é fruto dos costumes em que a gestante se faz inserida: como a
forma de sua criação, etc.
(3) GOMES, Luiz Flávio. Em defesa da vida, o aborto. Porto Alegre: Magister/RS. Publicado em: 22 out.

2010. Disponível em: <http://www.editoramagister.com/doutrina_ler.php?id=851>. Acesso em: 24 out.


2010.
364 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

mulher faz aborto a cada 33 segundos e a prática insegura mata uma delas a cada
dois dias” (O Globo, de 10.10.2010, p. 3)(4).
Id est, deste modo se tutelaria a gestante, fornecendo a ela todo suporte mé-
dico necessário para a concreção do aborto, obstando, nesse passo, vindouras e
plausíveis infecções que sobejariam em seus últimos estertores e lampejos vitais,
ou seja, haveria uma liberação condicionada à provocação por médicos habilitados
e em clínicas especializadas, diminuindo, consideravelmente, o risco à vida ou a
incolumidade da gestante.
Por demais, como questão de saúde pública, ainda haveria maior controle es-
tatístico de quantos abortos, de fato, são realizados em nosso solo e, principalmente,
em quais localidades há uma maior concentração de tais atos. Fato este que, por
si só, auxiliaria na prevenção e, quiçá, na diminuição do índice de abortamentos
concretizados.
Desmiúde, inclusive, a questão de política criminal, pautada na inocuidade
da pena para inibir a sua frequência, bem como no ultrapassado pensar de muitos
profitentes desta tese (oriundo do direito romano) em que “o pequeno ser nada
mais é senão um anexo ocasional do organismo materno, preso em suas entranhas,
de modo que, como parte da mulher ou de suas vísceras, dele a gestante poderia
livremente dispor (...)”(5).
Vale dizer! Para este primeiro elucubrar(6), em vez de rotular/estigmatizar
(labelling approach) a gestante que perpetra o aborto, tratando-a como criminosa,
seria muito mais profícuo o Estado dispensar a ela um maior cuidado (tutelando-a
desde a prática do ato – já que a questão seria de saúde pública) e atenção (uma vez
que as marcas de tal trágica decisão tendem a permanecer até o fim dos dias de sua
vida, sobejando, em algumas situações, a necessidade de tratamentos psicológicos
ulteriores).
Noutra palavra, ter-se-ia com isso medidas mais efetivas e de amparo à gestante
em vez da presença de um mero discurso punitivo estatal.

(4) Idem, ibidem.


Diga-se en passant, ainda de acordo com a pesquisa nacional de aborto, realizada pela Universidade de
Brasília em 2010, o aborto no Brasil é um ato deveras comum. Isso porque, consoante dados estatísticos,
ao completar 40 anos, mais de uma em cada cinco mulheres já abortou. Vale dizer, mais de 20% da popu-
lação feminina brasileira, em regra entre a faixa de 18 a 29 anos de idade (ápice do período reprodutivo
feminino), já perpetrou manobras abortivas.
(5) PEDROSO, Fernando de Almeida. Direito penal – parte especial. São Paulo: Método, 2008. p. 275.

Reverbere, tão somente, a crítica feita por García Pintos a esse vetusto pensar: “Só por um sofisma – pros-
segue – poderia dizer-se que um continente absorve os direitos do conteúdo” (idem, ibidem). Isso porque
o fato de estar o filho materialmente contido no corpo da mãe não implica que esta possa absorvê-lo
também juridicamente.
(6) Adotado por centenas de mulheres que participaram, no final de maio de 2015, da 5ª Marcha das

Vadias em São Paulo. Nesta manifestação, pleitearam a legalização do aborto e o fim do encarceramento
feminino.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 365

Mutatis mutandis, contrário à descriminalização do aborto, respeitam-se os


direitos do feto.
Para tanto, pontua-se que o nosso Código Civil, apesar de natalista (art. 2º
do Código Civil), reconhece direitos da personalidade ao nascituro, como o direito
à vida – que se inicia a partir da concepção(7). Nessa senda, hialino que de igual
modo que se perfaz com a gestante, pode-se asseverar que o nascituro é considerado
pessoa, daí, cabe a ele a proteção dada pelo axioma da dignidade da pessoa humana.
Vale exacerbar. Há garantia constitucional, infraconstitucional (até mesmo em
razão do fenômeno da filtragem constitucional/contaminação virótica da constitui-
ção) e supralegal (dada por convenções e tratados internacionais de direitos huma-
nos, aprovados sem o quórum de emenda constitucional) da tutela à vida do feto(8).
Sem olvidarmos, ainda, que a legalização aumentaria o número de abortos
realizados, inclusive com a existência de diversos métodos anticonceptivos – sendo
possível, outrossim, o abandono, por parte de alguns, dos instrumentos de prevenção
de doenças sexualmente transmissíveis, ampliando, quiçá, o número de infectados
por tais enfermidades.
Nesse mesmo cadinho, tratar o aborto como questão de saúde pública, em-
bora impressione, não chegaria a convencer, uma vez que o preço cobrado “para as
intervenções cirúrgicas e internações para este fito é exorbitante”(9).
De tal arte, “a camada mais pobre da população, que concentra a maior parte
do contingente abortador, continuaria, indubitavelmente, a procurar as famigeradas
parteiras e curiosas, em ambientes nada ascéticos”(10) – persistindo a clandestinidade.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Aliado a isso, para esta forma de pensar(11), já se viabiliza o aborto em casos
excepcionais, garantindo, de igual maneira, os direitos da gestante – como ocorre,
exempli gratia, no caso de anencefalia, no qual o feto não possui atividade cerebral
(ADPF 54(12)); na hipótese de aborto necessário (terapêutico ou profilático), que é

(7) É aparente a adoção, pelo codificador, da teoria natalista, dada sua praticidade. Entrementes, em
virtude da fragilidade dessa corrente, em diversos pontos de nosso codex se reconheceu forte influência
concepcionista, como ao se reconhecer direitos do nascituro (art. 2º, segunda parte, do Código Civil).
(8) Nessa vereda, verbi gratia, “artigo 3º da Declaração Universal de Direitos Humanos, da qual o Brasil

é signatário, segundo o qual ‘todo o ser humano tem direito à vida’, ou a Convenção sobre os Direitos da
Criança da ONU, que afirma que ‘a criança necessita de proteção e cuidados especiais, inclusive a devida
proteção legal, tanto antes quanto após seu nascimento’; o Pacto de São José, do qual o Brasil é também
signatário, cujo artigo 1º estabelece que ‘pessoa é todo o ser humano’, o artigo 3º que ‘tem o direito de
reconhecimento de sua personalidade jurídica’ e o artigo 4º que esse direito deve ser protegido pela lei
‘desde o momento de sua concepção’” (MARTINS, Ives Gandra da Silva. O aborto no direito brasileiro.
Porto Alegre: Magister/RS. Publicado em: 21 out. 2010. Disponível em: <http://www.editoramagister.
com/doutrina_ler.php?id=850>. Acesso em: 24 out. 2010).
(9) PEDROSO, Fernando de Almeida. Direito penal – parte especial, p. 276.

(10) Idem, ibidem.

(11) Empregado por inúmeras pessoas na 8ª Marcha Nacional da Cidadania pela Vida, no início de junho

de 2015.
(12) Nesse sentido, ler o artigo ADPF 54 e a Hipostasiação do Poder Judiciário (PEDROSO, Fernando Gentil

Gizzi de Almeida. ADPF 54 e anencefalia: hipostasiação do Judiciário. Revista Jus Navigandi, Teresina,
ano 17, n. 3.211, 16 abr. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21520>).
366 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

o único meio para salvaguardar a vida da gestante (art. 128, I, do CP); e, igualmen-
te, no caso de gravidez resultante de estupro (aborto humanitário, sentimental ou
ético – art. 128, II, do CP).
Daí a necessidade de permanecer tratando o aborto como forma de política
criminal, que tende a balancear os direitos do feto com os da gestante, ainda que,
em determinados momentos, traga em seu corpo um maior punitivismo – como ora
se perfaz com o PL nº 5.069.
Isso porque este elucubrar denotaria o respeito havido ao princípio democrá-
tico e, seu corolário, a tripartição das funções de poder, que assegura a existência
(13)

de “poderes” harmônicos e independentes (art. 2º da CRFB) – pelo qual se extrai a


soberania popular, na qual a ordem de domínio é legitimada pelo povo, sendo que,
ainda que sejamos um Estado laico (secular ou não confessional) desde a Cons-
tituição Republicana de 1891, é indiscutível a presença da religião no âmago dos
cidadãos(14), razão pela qual, ainda que presente a ideação de que direito é direito
e religião é religião, 71% da população se posicionou contrariamente à prática do
aborto (Folha de São Paulo, de 11.03.2010).
Enfim, exteriorizada a interdisciplinaridade de tal tema (seja de ordem religiosa,
política ou jurídica) e esquadrinhada esta dualidade existente e as fortes razões de
cada linha de pensamento, resta a indagação dicotômica: o aborto deve ser tratado
como questão de saúde pública ou permanecer na esfera política criminal?
A resposta? Deixo com vocês...

(13) Relembra-se, aqui, do constitucionalismo antigo dos gregos.


Isso porque, no Estado helênico, que exerceu larga influência no evolver da civilização clássica, eclode
um movimento de democracia constitucional, obstando a vontade do poder.
Para tanto, no perfazer do Século de Péricles (entre VI e IV a.C.), as Polis (Cidade-Estado) – em especial
o Estado ateniense – elaboraram um magnífico corpo de leis, que retratou, para muitos, a mais bela e
avançada forma de governo.
Exemplifica-se. O Estado tornou-se eletivo e subordinado à assembleia dos cidadãos, que, por meio de
assembleias gerais realizadas periodicamente nas praças públicas, possibilitava que o povo governasse
diretamente. Por demais, as magistraturas, existentes por meio da escolha do povo, tornaram-se tempo-
rárias, com mandato de um ano. E, enfim, os cidadãos, investidos em função pública, deveriam prestar
contas periódicas, sob pena de serem citados diante da assembleia popular.
Decerto, o poder encontrava limites na intervenção do povo – demos – nos negócios estatais e na dis-
tribuição da justiça.
Como lecionou o erudito Aristóteles, há três formas de governo: a monarquia (governo de uma só pes-
soa), a aristocracia (governo da minoria) e a democracia (governo da maioria). Nesse diapasão, embora
superado o luminar de que a democracia é uma forma de governo, é hialino que o Estado grego fora o
berço da democracia, haja vista a identidade entre governantes e governados.
(14) Porém, não mais de acordo com aquele pensamento de fundo religioso, no qual era predominante

para a punição da morte do feto a perdição do pequeno ser, morto sem haver ingressado pelo batismo
no seio da igreja (BRUNO, Aníbal. Crimes contra a pessoa. 3. ed. Rio de Janeiro: Rio, 1975. p. 157).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 367

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Edição histórica.
Rio de Janeiro: Rio, 1975.
BRUNO, Aníbal. Crimes contra a pessoa. 3. ed. Rio de Janeiro: Rio, 1975.
DIDIER Jr., Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo
de conhecimento. 10. ed. Salvador: Juspodivm, 2008. v. I.
GOMES, Luiz Flávio. Em defesa da vida, o aborto. Porto Alegre: Magister/RS. Pu-
blicado em: 22 out. 2010. Disponível em: <http://www.editoramagister.com/
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MARTINS, Ives Gandra da Silva. O aborto no direito brasileiro. Porto Alegre: Magister/
RS. Publicado em: 21 out. 2010. Disponível em: <http://www.editoramagister.
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PEDROSO, Fernando de Almeida. Direito penal – parte especial. São Paulo: Método,
2008.
PEDROSO, Fernando Gentil Gizzi de Almeida. ADPF 54 e anencefalia: hipostasiação
do Judiciário. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3211, 16 abr. 2012.
Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21520>.
QUINTANO, Johanna Heilpern de; RIPOLLES, Antonio Quintano. Diccionario de
derecho comparado (alemán-español). Madrid: Editorial Revista de Derecho
Privado, 1951.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


A VÍTIMA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

Rômulo de Andrade Moreira


Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia; Professor de
Direito Processual Penal da Universidade Salvador – UNIFACS, na Graduação e
na Pós-Graduação (Especialização em Direito Penal e Processual Penal e Direito
Público); Pós-Graduado, Lato Sensu, pela Universidad de Salamanca/Espanha
(Direito Processual Penal); Especialista em Processo pela Universidade Salvador
– UNIFACS (Curso então coordenado pelo Jurista J. J. Calmon de Passos);
Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira
de Professores de Ciências Penais, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e
Membro Fundador do Instituto Baiano de Direito Processual Penal (atualmente
exercendo a função de Secretário); Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais; Integrante, por quatro vezes, de bancas examinadoras de concurso
público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia; Autor
das obras “Curso Temático de Direito Processual Penal” e “Comentários à Lei
Maria da Penha” (esta em coautoria com Isaac Guimarães), ambas editadas pela
Editora Juruá, 2010 e 2014, respectivamente (Curitiba), “A Prisão Processual, a
Fiança, a Liberdade Provisória e as demais Medidas Cautelares” (2011), “Juizados
Especiais Criminais – o Procedimento Sumaríssimo” (2013), “Uma Crítica à
Teoria Geral do Processo”, “A Nova Lei de Organização Criminosa”, publicadas
pela Editora Lex Magister (Porto Alegre), “O Procedimento Comum: Ordinário,
Sumário e Sumaríssimo”, publicado pela Editora Empório do Direito (2015), além
de Coordenador do livro “Leituras Complementares de Direito Processual Penal”
(Editora Juspodivm, 2008); Participante em várias obras coletivas; Palestrante em
diversos eventos realizados no Brasil.

RESUMO
Nada obstante fazermos sérias e contundentes críticas à participação da vítima
no processo penal, dois aspectos, a meu ver, merecem destaques. Em primeiro lugar,
a composição civil dos danos prevista na Lei dos Juizados Especais Criminais (Lei
nº 9.099/95). Este acordo realizado na esfera penal tem efeito na esfera cível para se
evitar o enriquecimento ilícito. A composição civil dos danos nas infrações penais
de menor potencial ofensivo deverá sempre ser tentada, ainda que se trate de crime
cuja ação penal seja pública incondicionada, ressalvando-se apenas a hipótese da
inexistência de vítima determinada. Em que pese opiniões em contrário, o certo é
que a esta conclusão chegou, salvo engano, a maioria dos doutrinadores. O segundo
aspecto diz respeito à figura do assistente. Com efeito, o Estado, embora titular do
jus puniendi, por vezes concede ao ofendido a faculdade de intervir na relação pro-
cessual penal, seja na condição de titular da ação penal, como ocorre na ação penal
de iniciativa privada, seja como assistente do MP. Na primeira hipótese, o ofendido
figura na relação como parte necessária, atuando como substituto processual, titular
que é do jus accusationis; no outro caso, porém, a vítima não é parte necessária no
processo sendo considerada sujeito secundário da relação processual, parte acessória,
colateral, contingente ou adjunta. A falta do assistente, portanto, não inviabiliza o
início nem a continuidade da relação processual.
Palavras-Chave: Processo Penal. Vítima.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 369

TITLE: Victims in the Brazilian criminal procedure.


ABSTRACT
It is appropriate to express serious criticism about the participation of victims in
criminal procedure. Two aspects deserve to be highlighted. First, the civil composition
of damage under the Law of Small Criminal Claims Courts (Law no. 9,099/95). This
agreement made in the criminal sphere has effect in the civil sphere to prevent illicit
enrichment. The civil composition of damage in less serious criminal offenses should
always be attempted, even if it concerns a crime whose prosecution is public uncondi-
tioned, excepting only the hypothesis that there is no particular victim. Despite opposite
opinions, it is certain that most jurists reached this conclusion. The second aspect con-
cerns the assistant. Indeed, the State, although the holder of the jus puniendi, sometimes
gives the victim the right to intervene in the criminal procedural relationship, whether
as the holder of the criminal prosecution, as in the prosecution in the private sector, or
as assistant of the prosecution. In the first case, the victim is the nominal party of the
relation, acting as a procedural substitute, holder of the jus accusationis; in the other
case, however, the victim is not the nominal party to the proceedings, being considered
secondary subject of the procedural relationship, accessory, collateral, contingent or
associate party. The lack of an assistant therefore prevents neither the beginning nor the
continuation of the procedural relationship.
Keywords: Criminal Procedure. Victim.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Acabei de ler um alentado estudo em torno da vítima, estudo feito por Ana
Paula Alves Barros.
No seu texto, ela afirma, com acerto, que
“o estudo sobre a vítima, como parte do crime, é algo muito recente,
considerando a organização desse estudo após a Segunda Guerra Mundial
(1940-1945). A Escola Clássica de Beccaria e Fuerbach e a Escola Positiva de
Lombroso, Ferri e Garofalo concentravam seus esforços no trinômio delinquen-
te-pena-crime. No entanto, esse cenário começou a mudar com o término da
Segunda Guerra e seu terrível legado de ódio, intolerância e racismo.
Nos tempos primórdios o reparo do dano era feito a partir da vingança
privada contra o ofensor ou seu grupo social. A vítima detinha, em suas mãos,
o poder de escolher o tipo de pena que deveria ser aplicada ao agressor. São
exemplos de escolhas que o ofendido poderia fazer: punições físicas, a perda
dos bens e a até mesmo a morte do seu algoz. Em um segundo momento, a
pena passou a ser um pagamento em dinheiro, feito pelo ofensor à vítima. Nesse
caso, o Estado passa a intervir, fixando a pena e obrigando a vítima a receber.
Nota-se que a sociedade e o próprio Estado não viam a vítima como parte
do crime, mas fora dele. Essa concepção estende-se para as Escolas Clássica e
Positivista. Na Escola Clássica, por exemplo, havia uma grande preocupação
com o crime, já na Escola Positivista a atenção estava voltada para o criminoso.
370 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Esse abando em relação à vítima também pode ser visto em outras áreas do
conhecimento. (...)
Segundo Marlet (1995), os primeiros trabalhos sobre vítimas foram feitos
por Hans Gross em 1901. No entanto, consideramos que a sistematização dos
estudos em torno da vítima se deu após a Segunda Guerra Mundial. Benjamin
Mendelsohn e Von Henting foram dois grandes pesquisadores que contribuíram
para a organização dos estudos sobre a vítima. É muito certa a mudança que
pesquisadores como B. Mendelsohn provocaram nos estudos sobre a vítima.
Entender a vítima como parte do crime é uma transformação significativa. (...)
Sabe-se que os estudos sobre a vítima já tinham começado no primeiro
ano do século XX, mas é após a Segunda Guerra que esses estudos são siste-
matizados e a vítima passa a assumir um papel fundamental, inclusive para o
entendimento do crime. Observa-se a notável importância da Segunda Guerra
para os estudos sistemáticos da vítima por B. Mendelshon e Von Henting.
B. Mendelsohn (1900-1998), advogado nacionalizado israelense, passou
a se interessar pelo comportamento das vítimas dos campos de concentração.
Esses campos estavam espalhados pela Europa Ocidental e agregavam milhares
de pessoas presas por Hitler durante a Segunda Guerra. Judeus, homossexuais,
negros e ciganos foram perseguidos e presos nesses campos para servirem
como mão de obra. O comportamento dessas vítimas chamou a atenção do
pesquisador, que passou a buscar entender o motivo pelo qual os prisioneiros,
mesmo frente a sua iminente morte, trabalhavam nesses locais.
Essa relação do nascimento da vitimologia com o pós-Segunda Guerra
Mundial é apontada por Fatolico (2007):
‘A vitimologia nasceu após a Segunda Guerra Mundial, mais especifica-
mente em 1947, dois anos após o seu término, em decorrência do sofrimento
dos judeus pelo Nazismo de Hitler, que teve como resultado milhões de mortos,
feridos e desaparecidos.’
Embora estudos sobre a vítima viessem sendo feitos no início do século
XX, foi em 1947 que o termo ‘vitimologia’ foi cunhado por B. Mendelsohn em
um Congresso em Bucareste, em sua palestra Um Horizonte Novo na Ciência
Biopsicossocial: a Vitimologia. Segundo Piedade Junior (1993), B. Mendelsohn
passou a defender a vitimomologia como uma ciência autônoma. Para o pes-
quisador, tratava-se de uma ciência sobre as vítimas e a vitimização. Por outro
lado, alguns outros pesquisadores viam-na como um ramo da criminologia,
como é o caso de Henry Ellemberger ao afirmar que a vitimologia é ‘um ramo
da criminologia que se ocupa da vítima direta do crime e que compreende o
conjunto de conhecimentos biológicos, sociológicos e criminológicos concer-
nentes à vítima’.
Não é nosso objetivo discutir a cientificidade da Vitimologia nesse mo-
mento. O que queremos é nos ater ao momento em que se deu a sistematização
e organização dos estudos em torno da vítima. Entre muitas contribuições de
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 371

B. Mendelsohn e de diversos outros pesquisadores, como Hans von Henting,


está a conceituação de vítima e a sua classificação. É importante salientar que,
a nosso ver, o divisor de águas está não só na importância que a vítima adquiriu
posteriormente à Segunda Guerra, mas também como ela passou a ser vista.
A vítima passou a ser percebida e estudada como parte do crime, um su-
jeito. O comportamento da vítima passou a ser reconhecido como fundamental
para a consumação de um delito. É considerada, por exemplo, sua participação
voluntária ou não no ato criminoso. (...)
Para ilustrar essa ideia de vítima como sujeito passivo na eclosão do deli-
to, usaremos a própria classificação de B. Mendelsohn. O referido pesquisador
dividiu sua classificação de vítima em três grandes grupos. Vejamos: ‘vítima
inocente ou ideal, uma vez que não teve a menor participação na produção do
resultado; vítima provocadora, imprudente, voluntária e ignorante, caracteri-
zada pela evidente participação prestada aos fins queridos pelo agente; vítima
agressora, simuladora e imaginária, que, na verdade, deve ser considerada como
suposta vítima, uma vez que na realidade deve ser tipificada como coautora
do resultado querido pelo agente’. (...)
Portanto, nota-se uma grande diferença dos estudos sobre a vítima fei-
tos antes e depois da Segunda Grande Guerra. A vítima passa a ser entendida
como uma espécie de coadjuvante do crime. E mais, passa a ser uma peça
fundamental para se entender o crime. Com isso, não estamos olvidando todo
o conhecimento produzido sobre a vítima antes da guerra, mas salientando

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


que a situação de caos durante e no pós-guerra são chaves importantes para
entender o desenvolvimento científico dessas pesquisas nesse momento. Isso
porque acreditamos que o auge dessas pesquisas está diretamente relacionado
com o contexto gerado pela guerra, como veremos a seguir.
(...)
Para entendermos o aumento do interesse dos pesquisadores pela vítima
após a Segunda Guerra Mundial, se faz necessário mostrar um conjunto de
elementos que envolveram as vítimas dessa guerra, especialmente os judeus.
Assim, apresentaremos o nazifascismo com foco no antissemitismo. An-
tes disso, é importante lembrarmos que não vemos a Segunda Guerra como
contribuição, mas como elemento gerador de mudanças na área científica,
social, política, econômica, cultural, etc. Paulo Fagundes (2000) considera o
nazifascismo como um movimento que foi à resposta a situação que se formou
após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Os anos que se seguiram a esse
conflito contribuíram para a formação desse movimento. Segundo o mesmo
autor, o que catapultou o movimento nazifascista foi a Crise de 29 e a Grande
Depressão, já que gerou um ‘caldo de cultura’ propício para o desenvolvimento
desses movimentos.
Antes de falar sobre o movimento nazifascista, é importante fazermos
alguns apontamentos sobre o antissemitismo. Inicialmente, a questão de ódio
372 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

aos judeus se restringia a questões religiosas e ao imaginário popular. Durante a


Idade Média houve perseguição por parte do cristianismo aos judeus. Por isso,
nesse momento, podemos falar de antijudaísmo. Os cristãos (tanto os católicos
quanto os protestantes) relacionavam a culpa da morte de Cristo aos judeus. Além
do elemento religioso, é importante indicar que várias lendas surgiram em torno
dos judeus, de forma que os demonizavam. Ocorreu, por exemplo, a disseminação
da lenda de que os judeus teriam contaminado a água e os poços com a peste
bubônica para atingir os cristãos (LUZ, 2006). No entanto, essa situação começou
a mudar com a chegada do século XVIII, acompanhado dos discursos voltados à
razão trazidos pelo Iluminismo. A partir desse período, o elemento religioso dá
lugar ao quesito racial. Então, torna-se o antissemitismo, e não mais antijudaísmo.
Entre 1907 e 1913, Hitler passou a ter contato com a literatura antissemita
como as de Karl Lueger (1844-1910), as de Georg Ritter von Schönerer (1842-
1921) e de Adolf Lanz (1874-1954). No entanto, somente após a Primeira Guerra
Mundial as ideias antissemitas de Hitler assumiram a forma de um programa. (...)
Por outro lado, se faz necessário esclarecer que a política de extermínio
do nazifascismo não se restringia à perseguição antisemita. A política assumiu
um papel ambíguo, por um lado Hitler previa a eliminação do povo judeu, mas
também queria a expansão da raça ariana. Segundo o autor, tratava-se de uma
política eugenista, já que se incentivava o alemão a se relacionar com diversas
mulheres (desde que arianas). (...)
A solução final para os judeus parte do projeto eugenista de A. Hitler e
toma forma nos campos de concentração que foram construídos na Alemanha
e nos países dominados pelos alemães durante a guerra. O campo de Auschwitz
compôs esse cenário de horror e racismo. Nesse local, os judeus foram mortos
aos milhares nas câmaras de gás. Num relatório de Griksch, em uma visita ao
campo de Auschwitz, intitulado ‘A reinstalação dos judeus’, é explicitado as etapas
seguidas antes de irem para a câmara de gás. Em trens, os judeus chegavam e
eram examinados por médicos para avaliar sua aptidão para o trabalho. Aqueles
que estivessem saudáveis eram separados para serem incorporados ao trabalho;
os doentes curáveis eram submetidos a uma dieta que visava a sua recuperação
para também fazer parte do grupo de trabalhadores; já os que fossem considerados
impróprios ao trabalho eram enviados para as câmaras de gás.
Este último grupo era induzido a pensar que estavam sendo levados para
se banharem. O local era preparado para levá-los a acreditar nisso. Depois de
desmaiarem, seus dentes de ouro eram retirados e seus corpos incinerados.
Segundo o autor Oswaldo Henrique Duek Marques (2001), o sofrimento, a
perseguição e a discriminação das vítimas do Holocausto contribuíram para o
que autor denomina de ‘a grande redescoberta da vítima’. Ou seja, segundo o
autor, o racismo disseminado pelo movimento nazifascista contribuiu para que
os estudos sobre a vítima fossem tratados com mais seriedade. A comunidade
internacional, inclusive, voltou seus olhos para essas vítimas.
(...)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 373

A expressão usada por Marques (2001) ilustra muito bem, em poucas palavras,
a ideia que nós propomos discutir. ‘A grande redescoberta da vítima’ não ignora todo
o conhecimento e estudos anteriores à Segunda Guerra Mundial e mostra que se
trata de um novo momento na história do estudo da vítima. Como desenvolvemos
em nosso texto, havia um quadro muito propício para que os pesquisadores e a
própria comunidade internacional voltassem seus olhos para a vítima, especialmente
quanto ao genocídio provocado por Hitler nos campos de concentração.
Portanto, pensamos que o estudo em torno da vítima é modificado por
todo o contexto que a guerra gerou.
O cenário provocado pela dizimação em massa dos judeus criou um mo-
mento muito favorável para isso. Nota-se uma mudança no entendimento dos
pesquisadores em relação a vítima. Para se estudar e entender como se chegou
à eclosão de um crime, passa a ser considerado o comportamento da vítima. A
Segunda Guerra Mundial escancarou suas portas de terror pelas vítimas que
provocou e da forma que o fez.
Nada de positivo pode ser visto em meio a uma guerra, mas o ser humano
consegue memorá-la através de pesquisas importantes, se levantar em meio ao
caos e enxergar possibilidades de mudar o mundo e a leitura dele, sempre batendo
nas portas das nossas lembranças para que não esqueçamos as vítimas que o breve
século XX fez.” (Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/33290/a-segunda-
guerra-mundial?utm_source=boletim-diario&utm_medium=newsletter&utm_
content=titulo&utm_campaign=boletim-diario_2015-06-15>)

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Nada obstante fazermos sérias e contundentes críticas à participação da vítima
no processo penal, dois aspectos, a meu ver, merecem destaques.
Em primeiro lugar, a composição civil dos danos prevista na Lei dos Juizados
Especais Criminais (Lei nº 9.099/95). Este acordo realizado na esfera penal tem
efeito na esfera cível para se evitar o enriquecimento ilícito, tal como já se prevê
na Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98, art. 12)(1), no CP (art. 45, § 1º, in
fine)(2) e no CTB (Lei nº 9.503/97, art. 297, § 3º)(3).
A composição civil dos danos nas infrações penais de menor potencial ofensivo
deverá sempre ser tentada, ainda que se trate de crime cuja ação penal seja pública

(1) “Art. 12. A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou
privada com fim social, de importância, fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior
a trezentos e sessenta salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual reparação
civil a que for condenado o infrator.”
(2) “Art. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts.

46, 47 e 48. § 1º A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou
a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um)
salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido
do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários.”
(3) “Art. 297. A penalidade de multa reparatória consiste no pagamento, mediante depósito judicial em

favor da vítima, ou seus sucessores, de quantia calculada com base no disposto no § 1º do art. 49 do
Código Penal, sempre que houver prejuízo material resultante do crime. (...) § 3º Na indenização civil
do dano, o valor da multa reparatória será descontado.”
374 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

incondicionada, ressalvando-se apenas a hipótese da inexistência de vítima deter-


minada. Esta afirmação deflui da própria redação dos arts. 74, parágrafo único, e
76, ambos da Lei nº 9.099/95. Em que pesem opiniões em contrário, o certo é que
a esta conclusão chegou, salvo engano, a maioria dos doutrinadores. Assim, por
exemplo, afirma Ada Pellegrini Grinover:
“Frise-se, por oportuno, que tanto para a ação pública condicionada como
para a ação de iniciativa do ofendido a homologação do acordo civil acarreta a
renúncia tácita ao direito de representação ou queixa. (...) No caso de ação de
iniciativa pública (incondicionada), ao contrário, a homologação do acordo
civil nenhum efeito terá sobre a ação penal.”(4)
Por sua vez, Mirabete adverte que tal homologação, no caso de ação penal
pública incondicionada, acarreta dois efeitos penais, senão vejamos:
“Evidentemente, homologada a composição, não ocorre a extinção da pu-
nibilidade quando se tratar de infração penal que se apura mediante ação penal
pública incondicionada, prosseguindo-se na audiência preliminar com eventual
proposta de transação ou, não sendo esta apresentada, com o oferecimento da
denúncia pelo MP. Entretanto, se a composição dos danos ocorrer, deve ser ela
objeto de consideração do MP, quando da oportunidade de oferecer a transação,
e do juiz, como causa de diminuição de pena ou circunstância atenuante (arts.
16 e 65, III, b, última parte, do CP). Além disso, é evidente que a composição
impedirá uma ação ordinária de indenização fundada no art. 159 do CC, ou a
execução, no cível, da eventual sentença condenatória (art. 91, I, do CP).”(5)
Neste ponto discordamos: a composição civil dos danos não impedirá a ação
civil ex delicto, apenas obrigará a que se compense de uma posterior indenização
concedida no cível o que foi pago no acordo homologado no Juizado Especial Cri-
minal, à semelhança do que prescrevem, como dissemos acima, os arts. 45, § 1º, in
fine, do CP, 12 da Lei nº 9.605/98 (Meio Ambiente) e 297, § 3º, da Lei nº 9.503/97
(Código de Trânsito Brasileiro)(6).
Vê-se que impostergável será a tentativa de composição civil dos danos, ainda
que se trate de contravenção ou de crime de ação penal pública incondicionada(7).
Se assim não o fosse, ferido estaria o princípio constitucional da igualdade (art.

(4) GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Juizados especiais criminais. 2. ed. São Paulo: RT, 1997. p. 129.
(5) Juizados especiais criminais. São Paulo: Atlas, 1997. p. 78.
(6) Neste sentido é o pensamento de Ada et al.: “A composição dos danos civis pode ser parcial. Embora a

transação civil implique, via de regra, quitação recíproca, é possível que haja nela a repartição entre danos
materiais (imediatamente compostos) e danos morais (a serem apurados no juízo civil). A quitação poderá,
assim, ser parcial, ressalvada a controvérsia sobre os danos morais. Mas a composição, conquanto parcial, dos
danos civis importará, de qualquer modo, na renúncia ao direito de representação ou queixa, com a consequente
extinção da punibilidade.” (ob. cit., p. 133).
(7) Para Weber Martins Batista, “nos crimes de ação penal pública incondicionada, ela não impede a

aplicação de pena ao autor do fato, mas não deixa de influir na qualidade e quantidade da pena a ser
imposta, pois a indenização dos danos deve aconselhar um tratamento menos severo do autor do fato”
(Juizados especiais cíveis e criminais e suspensão condicional do processo penal. Rio de Janeiro: Forense,
1996, p. 314).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 375

5º, caput, da CF), pois a vítima de uma infração de menor potencial ofensivo, cuja
ação penal fosse pública incondicionada, seria tratada diferentemente daqueloutra
que sofrera também uma infração da mesma natureza, porém de ação penal pública
condicionada à representação. Assim, por exemplo, a vítima de uma ameaça teria
direito à composição civil dos danos, enquanto que o ofendido por um constrangi-
mento ilegal não o teria, o que seria um absurdo.
Ademais, note-se que um dos objetivos da lei que criou os Juizados Especiais
Criminais é exatamente a reparação dos danos sofridos pela vítima (art. 62). Como
observam Ada, Scarance, Luiz Flávio e Gomes Filho:
“É a primeira vez, no nosso ordenamento, que a legislação abre tão amplo
espaço à sua proteção jurisdicional, inserindo-se no generoso e atualíssimo
filão que advoga a revisão dos esquemas processuais de modo a dar resposta
concreta à maior preocupação com o ofendido.”(8)
Esta atenção com a vítima no processo penal é tema atual e tem sido motivo de
inúmeros trabalhos doutrinários, como observou o jurista argentino Alberto Bovino:
“Después de varios siglos de exclusión y olvido, la víctima reaparece,
en la actualidad, en el escenario de la justicia penal, como una preocupación
central de la política criminal. Prueba de este interés resultan la gran variedad
de trabajos publicados recientemente, tanto en Argentina como en el extranjero;
(...) mismo porque se señala que con frecuencia el interés real de la víctima
no consiste en la imposición de una pena sino, en cambio, en ‘una reparación

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


por las lesiones o los daños causados por el delito’.”(9)
Neste sentido, veja-se obra bastante elucidativa de Antonio Scarance Fernandes(10).
Dois juristas italianos, Michele Correra e Danilo Riponti, também anotaram:
“Il recupero della dimensione umana della vittima, molto spesso reificata,
vessata, dimenticata da giuristi e criminologi in quanto oscurata da quella cosí
clamorosa ed eclatante del criminale, soddisfa l’intento di rendere giustizia a
chi viene a trovarsi in una situazione umana tragica ed ingiusta, a chi ha subito
e subisce e danni del crimine e l’indifferenza della società.”(11)
Seria, portanto, até sob este ponto de vista, descabida qualquer exegese que
impedisse a composição civil dos danos nestas hipóteses. Assim, sempre que estiver-
mos à frente de um delito de menor potencial ofensivo cuja ação penal seja incon-
dicionada ou de uma contravenção penal (cuja ação penal é sempre, como em toda

(8) Ob. cit., p. 110.


(9) Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, RT, n. 21, p. 422.
(10) O papel da vítima no processo criminal. São Paulo: Malheiros, 1995. Indicamos também o trabalho

intitulado El Papel de la Víctima en el Proceso Penal Según el Proyecto de Código Procesal Penal de la Nación,
por Santiago Martínez (Fonte: www.eldial.com – 12.08.05).
(11) La vittima nel sistema italiano della giustizia penale: un approccio criminológico. Padova, 1990. p. 144.

Na doutrina estrangeira, também indicamos De los Delitos y de Las Víctimas, obra coletiva com trabalhos
de Claus Roxin, Julio Maier, Nils Christie, dentre outros.
376 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

contravenção – inclusive vias de fato, pública incondicionada), deve-se oportunizar


a composição dos danos civis, observando-se, porém, que a sua homologação não
acarreta os efeitos impeditivos da transação penal ou de posterior denúncia ou queixa.
Nestes casos, havendo e sendo homologada a composição civil, não estará o
MP impedido de transacionar ou oferecer denúncia. Adverte-se que a homologação
da composição civil em casos que tais não é causa, em absoluto, de arquivamento,
mas somente poderá acarretar aquelas consequências apontadas por Mirabete e
acima transcritas.
Assim, ainda que tenha ocorrido a referida composição, será de rigor a conti-
nuidade da audiência preliminar, vigorando, in casu, o princípio da obrigatoriedade
ou da legalidade da ação penal que, apesar de efetivamente mitigado pela lei em
estudo, não foi excluído de nossa sistemática processual penal, que abraçou o sis-
tema acusatório (ainda que com impurezas) e o da obrigatoriedade da ação penal,
reforçados pelo art. 129 da CF.
Observa-se que mesmo com o advento da lei especial sob comento, continua
em nosso processo penal o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública a
impedir, v.g., o arquivamento do termo circunstanciado em caso de composição
civil dos danos em infração de ação penal pública incondicionada, havendo justa
causa para a denúncia.
Socorremo-nos, a propósito e mais uma vez, em Mirabete:
“A Constituição atual, ao permitir a criação dos Juizados Especiais, para
a apuração de infrações penais de menor potencial ofensivo, permitindo a
transação, não instituiu o princípio da oportunidade nas ações penais públicas,
uma vez que tal instituto se refere somente à possibilidade de composição entre
as partes, nos termos da lei, após a propositura do processo.”(12)
No mesmo sentido, preleciona Maurício Antônio Ribeiro Lopes:
“O princípio da obrigatoriedade da ação penal, desse modo, não foi
afastado pela Lei nº 9.099/95. Ao receber o termo de ocorrência da autoridade
policial, o representante do MP obrigatoriamente deverá adotar uma das se-
guintes providências: verificar o cabimento de proposta da aplicação imediata
da pena não privativa de liberdade (art. 76, caput); oferecer denúncia oral (art.
77, caput); oferecer prova escrita (art. 77, § 2º); requerer arquivamento (CPP,
art. 28); requerer diligências imprescindíveis ao oferecimento da denúncia
(CPP, art. 16); ou propor a suspensão do processo.”(13)
Note-se que, ao se referir à possibilidade do arquivamento, o autor acima citado
coloca em parêntese o art. 28 do CPP como que para delimitar tal possibilidade.
Desta forma, tratando-se de ação penal pública incondicionada, o pedido de
arquivamento só será possível, à vista do princípio da obrigatoriedade, se o fato não

(12) Processo penal. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1996.


(13) Comentários à Lei dos Juizados Especiais Civis e Criminais. São Paulo: RT, 1995. p. 356.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 377

for infração penal, ou, em sendo, a autoria for desconhecida, ou se não houver justa
causa (lastro probatório mínimo), além da hipótese de extinção da punibilidade. Não
nos parece possível, portanto, pedido de arquivamento de um termo circunstanciado
em que se noticia uma infração penal de ação penal pública incondicionada pelo só
fato de ter havido a composição civil dos danos, quando a lei penal já prevê, como
efeito deste acerto, o arrependimento posterior e a circunstância atenuante.
A mitigação implantada pela lei ora comentada não pode ser interpretada a tal
ponto que infira não ser possível o oferecimento da transação penal quando haja a
composição civil no caso de ação penal pública incondicionada.
Como ensina Afrânio Silva Jardim, “todo o sistema do Código está voltado
para a propositura da ação penal pública. O exercício desta ação é a regra geral,
sendo o arquivamento a exceção, tanto que o legislador não tratou expressamente
das hipóteses de arquivamento, mas, sim, dos casos em que a ação não deve ser
exercitada (art. 43)(14).
É o mesmo autor quem adverte: “É preciso interpretar a Lei nº 9.099/95 dentro
dos postulados dos princípios que informam o nosso sistema processual acusatório,
e não como desejaríamos que o legislador tivesse dito”(15).
Por outro lado, pelo princípio da indisponibilidade da ação penal, que é corolá-
rio da regra da obrigatoriedade, veda-se qualquer manifestação de poder dispositivo
no que concerne à promoção e à movimentação do processo penal, refletindo isto o
interesse público na determinação do conteúdo da causa penal(16).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Com o advento da Lei nº 9.099/95, é evidente que também restou mitigado
este último princípio quando no seu art. 89 instituiu-se a suspensão condicional
do processo para as infrações de pequeno e de médio potencial ofensivo, pois o MP
passou, obedecidos determinados requisitos e pressupostos, a dispor da res deducta
in judicio, possibilidade antes expressamente vedada pelo art. 42 do CPP. Tal aspecto,
no entanto, não autoriza, a nosso ver, o arquivamento do termo circunstanciado nas
condições colocadas, mesmo porque a suspensão condicional do processo pressupõe
processo penal instaurado.
Em complemento à fundamentação acima exposta, veja-se mais uma vez o
ensinamento de Afrânio:

(14) Ação penal pública: princípio da obrigatoriedade. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense. p. 46.
(15) Boletimdo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim. n. 48.
(16) Não desconhecemos que parte da doutrina nega a existência do conceito de pretensão no direito pro-

cessual penal. Por todos, conferir Rogério Lauria Tucci, para quem “os conceitos de pretensão punitiva,
ou, ainda, de pretensão executória, não se adequam ao processo penal, sendo-lhe de todo estranhas”
(Teoria do direito processual penal. São Paulo: RT, 2003. p. 36). Na doutrina estrangeira, leia-se: SOARES,
Fernando Luso. O processo penal como jurisdição voluntária. Coimbra: Almedina, 1981 (citado nas refe-
rências bibliográficas da citada obra do Professor Tucci). Como se evidencia, este autor lusitano chega
ao extremo de denominar o processo penal como de jurisdição voluntária, concepção, nas palavras de
Tucci, de todo inaceitável (p. 46). Tampouco desconhece-se a reação à existência do conceito carneluttiano
de lide no processo penal. Sobre esta matéria, por todos, veja-se a obra indispensável de: COUTINHO,
Jacinto Nelson de Miranda. A lide e o conteúdo do processo penal. Curitiba: Juruá, 1998.
378 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“Na verdade, o legislador não deu ao MP a possibilidade de requerer o


arquivamento do termo circunstanciado e das peças de informação que o ins-
truírem, quando presentes todas as condições para o exercício da ação penal.
Vale dizer, o sistema do arquivamento continua sendo regido pelo CPP, desca-
bendo ao MP postular o arquivamento do termo circunstanciado por motivos
de política criminal. Aqui também não tem o Parquet discricionariedade que
lhe permita manifestar ou não em juízo a pretensão punitiva estatal.”(17)
Esta composição civil poderá ser conduzida por conciliadores leigos, sendo
que a homologação caberá sempre ao juiz de direito. Questão que suscita certa
controvérsia na disciplina dos Juizados Especiais Criminais diz respeito à obrigato-
riedade ou não da presença do membro do MP na audiência preliminar de tentativa
de composição civil dos danos.
Há autores, como, por exemplo, Marino Pazzaglini Filho e outros, que só
vislumbram a necessidade da participação do MP nesta fase caso o ofendido seja
incapaz, oportunidade em que o Promotor de Justiça atuaria especificamente para
proteger interesse seu (do incapaz) que estivesse sendo prejudicado(18).
Neste mesmo sentido foi editada a Súmula nº 07 da Procuradoria-Geral de
Justiça do Estado de São Paulo sobre a Lei dos Juizados Especiais Criminais (São
Paulo, 22 de novembro de 1995).
Nada obstante o posicionamento em contrário, temos para nós que o enten-
dimento mais acertado é exatamente o oposto, ou seja, aquele segundo o qual a
necessidade do representante do MP na referida audiência é, em qualquer hipótese,
impostergável. A fim de que possamos exarar a nossa opinião a respeito do assunto,
necessário se nos afigura a análise dos arts. 72, 73 e 74 da Lei nº 9.099/95 que dizem
respeito à matéria ventilada.
Com efeito, lê-se nos três dispositivos citados o seguinte (grifados por nós):
“Art. 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Pú-
blico, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por
seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e
da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.
Art. 73. A conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador sob sua
orientação.
Parágrafo único. Os conciliadores são auxiliares da Justiça, recrutados na
forma da lei local, preferentemente entre bacharéis em Direito, excluídos os que
exerçam funções na administração da Justiça Criminal.
Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada
pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no
juízo civil competente.

(17) Idem.

(18) Juizado Especial Criminal. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 45.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 379

Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de


ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta
a renúncia ao direito de queixa ou representação.”
Diante dos dispositivos legais acima transcritos, necessariamente são extraídas,
desde já, quatro conclusões:
1ª) A presença do representante do Ministério Público na audiência preliminar
é obrigatória;
2ª) É nesta audiência preliminar que se dará a (primeira) tentativa de com-
posição dos danos (poderá haver uma segunda oportunidade prevista no art. 79);
3ª) Esta tentativa de conciliação para composição dos danos pode ser conduzida
por um Conciliador, que agirá sob a orientação do juiz de direito;
4ª) A homologação do acordo acaso efetivado só poderá ser feita pelo juiz to-
gado, vedado ao conciliador esta ou qualquer outra tarefa de natureza jurisdicional.
A primeira de nossas assertivas provém mesmo da literalidade do texto trans-
crito (art. 72), que não dá margem à interpretação diversa. Neste sentido vejamos
a doutrina (todos os grifos são nossos):
“Mas a audiência preliminar, conduzida por quem estiver imbuído da ade-
quada mentalidade de mediador, deverá ser o mais informal possível, atendendo
aos critérios do art. 62. O juiz (ou conciliador) conversará abertamente com os

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


interessados, deixará que troquem ideias entre si e com ele, induzirá os advogados
e o promotor ao mesmo comportamento.”(19)
Nesta mesma obra, lê-se adiante:
“Os conciliadores funcionarão nos Juizados como multiplicadores da
capacidade de trabalho do juiz. Sentarão junto aos protagonistas principais
(MP, autuado, vítima, responsável civil e seus advogados) para conduzir o
entendimento destes com vistas à autocomposicão.” (p. 118)
Damásio de Jesus afirma que o “promotor de justiça participa da composição
civil, ainda que o ofendido não seja menor ou incapaz”(20).
Mas não é só. Para ilustrar, vejamos outros doutrinadores:
“A audiência de conciliação é o momento mais importante do procedi-
mento prévio. Presentes o órgão do MP, o autor do fato e a vítima e, se possível,
o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o juiz dará início à
audiência preliminar (...). Sua participação, bem como a do MP, deve ser a mais
informal possível, não apenas conduzindo, como está no art. 72, mas inter-

(19) GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Juizados Especiais Criminais. 2. ed. São Paulo: RT. p. 108.
(20) Lei dos Juizados Especiais Criminais anotada. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 70.
380 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

vindo nos momentos apropriados, quando a conciliação das partes depender


de uma palavra, de um conselho, de uma pequena mudança na proposta.”(21)
A seguir, esclarece este mesmo autor que como “estabelece o art. 73, a con-
ciliação será conduzida pelo juiz ou conciliador sob sua orientação”, que deverá
“esclarecer o autor do fato e a vítima sobre as vantagens que a conciliação traz para
ambos” (p. 314).
Mirabete assevera:
“Por essa razão, devem estar presentes, obrigatoriamente, para a tenta-
tiva de conciliação e transação, além do juiz, o representante do Ministério
Público, o autor do fato, seu advogado constituído por instrumento próprio
ou verbalmente na própria audiência.”(22)
Para este autor, os conciliadores “terão a condição de auxiliares da justiça
e tentarão, sob orientação do magistrado, promover o acordo entre a vítima, ou
eventualmente o responsável civil, e o autor do fato”, tendo “como função apenas
presidir, sob a orientação do juiz, a tentativa de conciliação entre as partes, como
auxiliares da justiça que são, nos limites exatos da lei” (p. 73-74).
Cézar Roberto Bittencourt afirma também que à audiência preliminar “devem
comparecer o MP, as partes – autor e vítima – e, se possível, o responsável civil, todos
acompanhados por seus advogados”, asseverando, ademais, que “a conciliação será
conduzida pelo juiz ou por conciliador”(23).
Neste mesmo sentido pensam Fátima Nancy Andrighi e Sidnei Beneti, além
de Liberato Póvoa e José Maria de Melo; estes dois últimos escreveram: “Como a
finalidade precípua da audiência preliminar é a conciliação do autuado com o Mi-
nistério Público (com vistas à transação penal) e com a vítima (levando à transação,
renúncia ou submissão), a lei determina a imprescindibilidade da presença das partes
e do Ministério Público”(24).
Vê-se, portanto, que a presença de um promotor de justiça (ou procurador
da república) na audiência preliminar é necessária e indeclinável até porque acaso
não obtido êxito na composição civil (e tendo havido representação ou tratando-se
de ação penal pública incondicionada) imediatamente deverá ser dada a palavra ao
representante do MP para que se pronuncie acerca da possibilidade de transação
penal ou do oferecimento de denúncia oral.
Ora, se ausente estiver (e sendo o caso de se oportunizar a transação penal),
como se passará à segunda fase desta primeira audiência se não se encontrava no
recinto o representante do MP?

(21) BATISTA, Weber Martins. Juizados Especiais Cíveis e Criminais e suspensão condicional do processo.
Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 313.
(22) Juizados Especiais Criminais. São Paulo: Atlas, 1997. p. 68.

(23) Juizados Especiais Criminais e alternativas à pena de prisão. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

1997. p. 76 e 78.
(24) Teoria e prática dos Juizados Especiais Criminais. Curitiba: Juruá, 1996. p. 44.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 381

Observa-se, a propósito, que a audiência preliminar não tem como fito apenas
a tentativa de composição civil dos danos, mas, como bem advertem Marino Pazza-
glini Filho e outros, “compõe-se de três fases: composição dos danos civis, transação
penal e oferecimento oral de denúncia”(25). Indaga-se: sem o promotor de justiça,
como haverá a transação penal ou o oferecimento de denúncia oral?
É sempre bom relembrar, por outro lado, que a participação do conciliador se
reduz à primeira fase da audiência preambular, visto que, à evidência, não detém
qualquer poder jurisdicional.
Como adverte Mirabete, “o conciliador tem como função apenas presidir,
sob a orientação do juiz, a tentativa de conciliação entre as partes (...), portanto,
função meramente administrativa (...)”, nada impedindo “que o juiz interfira nas
negociações, devendo fazê-lo obrigatoriamente no caso de apurar alguma irregula-
ridade no decorrer das negociações (...), sem obstar, ademais, que o juiz promova
várias audiências concomitantes, a cargo cada uma de um auxiliar, supervisionando
o andamento delas e interferindo apenas quando necessário ou aconselhável”(26).
Sobre esta importante função, assim se pronunciou a Confederação Nacional
do Ministério Público em documento oficial: “Conclusão 11 – A participação dos
conciliadores na audiência prevista pelo art. 72 da lei cessa com o encerramento
da fase de reparação civil dos danos entre ofensor e ofendido, qualquer que seja o
seu resultado”.
Aliás, na conclusão anterior a mesma Confederação deixou assentado: “É

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


indispensável a presença do Promotor de Justiça à audiência prevista pelo art. 72
da Lei nº 9.099/95”.
Ressalte-se que mesmo havendo a composição civil entre as partes, ainda
assim, termina a participação do conciliador, pois a homologação do respectivo
acordo (como ato tipicamente jurisdicional) só poderá ser feita pelo juiz togado(27).
É evidente que não há falar-se em submissão do promotor de justiça ao con-
ciliador. Absolutamente! Estar ao lado deste auxiliar da justiça não significa estar a
ele submetido, mesmo porque, como já se disse, não haverá nesta fase da conciliação
civil nenhum ato que se revista de caráter jurisdicional, fato que redundaria, se assim
não o fosse, em grosseira inconstitucionalidade, como advertiu Ribeiro Lopes, para
quem “é preciso que se afaste por completo qualquer possibilidade de se conferir
ao conciliador poderes superiores ao de mediar a composição dos danos civis”, não
sendo possível submeter-se o MP, na conciliação, “à disciplina do conciliador, mero
auxiliar da justiça (arts. 7º e 73, parágrafo único, desta Lei), subvertendo a hierarquia
constitucionalmente desenhada”(28).

(25) Ob. cit., p. 39.


(26) Ob. cit., p. 74.
(27) Neste sentido: JESUS, Damásio de. Ob. cit., p. 69; e LOPES, Maurício Antônio Ribeiro. Comentários

à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. São Paulo: RT, 1995. p. 335.
(28) Ob. cit., p. 336.
382 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Relembra-se, ademais, que a condução da composição civil pelo conciliador está


submetida à supervisão do juiz togado, inclusive no prosseguimento da audiência
seja homologando o acordo, colhendo a representação da vítima, ouvindo o MP para
a transação penal ou para o oferecimento da denúncia oral ou mesmo interferindo na
própria tentativa de conciliação civil. A atividade do conciliador, repita-se, restringe-
se à condução da conciliação entre o autor do fato e o ofendido, e só.
Diante deste quadro, é perfeitamente possível, como, aliás, acima foi mostrado
por Mirabete, a realização de mais de uma audiência simultaneamente, cada uma
com o seu conciliador, inclusive em horário noturno e em qualquer dia da semana
(art. 64).
Diante do exposto, entendemos necessária a presença do representante do MP
na audiência preliminar, inclusive na fase em que esta é conduzida pelo conciliador; a
audiência preliminar será presidida sempre por um juiz de direito, ficando a cargo do
auxiliar apenas o encaminhamento da composição civil dos danos; a participação do
Parquet servirá também para fiscalizar os esclarecimentos prestados pelo conciliador,
funcionando neste primeiro momento da audiência, tipicamente, como fiscal da lei,
pugnando ao juiz togado pela correção de possíveis irregularidades. Nada impede que
o acordo entre a vítima e o autor do fato seja realizado extrajudicialmente, contanto
que haja a homologação, a posteriori, no Juizado Especial Criminal.
A composição civil homologada em Juízo acarreta renúncia tácita ao direito de
queixa (o que é uma inovação em relação ao art. 104, parágrafo único, do CP) ou de
representação (inovando igualmente em relação ao nosso sistema, que só previa a
sua irretratabilidade(29)). Poderá, também, haver renúncia expressa à representação,
usando-se analogicamente o art. 50 do CPP.
Se não houver o acordo, à vítima será dada oportunidade para representar, se
se tratar de crime de ação penal pública condicionada (se já não o fez na Delegacia
de Polícia(30)). O prazo para a representação não mudou, tampouco o dies a quo,
continuando a valer o que está escrito no art. 38 do CPP. Atente-se que o prazo de
30 dias previsto no art. 91 (cujo início é o da data da notificação, e não da juntada
do respectivo mandado – Enunciado nº 710 da Súmula do STF) é uma norma feita
para resolver as questões atinentes aos processos em curso quando do surgimento
da referida Lei, e tão somente.
Em se tratando de crime de ação penal de iniciativa privada e havendo plu-
ralidade de autores (querelados) e de vítimas (querelantes), poderá haver uma
exceção à regra da indivisibilidade (art. 48 do CPP), pois o procedimento só terá

(29) O art. 16 da Lei nº 11.340/06 (que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar
contra a mulher) refere-se à retratação da representação, verbis: “Nas ações penais públicas condicionadas
à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante
o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e
ouvido o Ministério Público”. Observe-se que, diferentemente do art. 25 do CPP, a retratação pode ser
feita até o recebimento da denúncia (neste sentido conferir a nossa obra sobre a Lei Maria da Penha, em
coautoria com Isaac Sabbá Guimarães, Salvador: JusPodivm, 2008).
(30) Certamente já terá feito, autorizando a lavratura do termo circunstanciado (art. 5º, § 4º, do CPP).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 383

continuidade (com o oferecimento da queixa) em relação aos que não aceitaram


compor-se civilmente, ou seja, existirá ação penal de iniciativa privada em relação
a apenas um ou alguns querelados, mesmo tendo havido um terceiro ofensor (que
se compôs civilmente). Neste caso, a renúncia ao direito de oferecer queixa não se
estenderá aos demais ofensores, não sendo aplicáveis as regras dos arts. 48 e 49 do
CPP, ainda que a composição civil tenha sido total (admitir-se o contrário seria a
consagração do enriquecimento sem causa, pois o ofensor que não aceitou reparar
o dano seria beneficiado com o acordo feito pelo[s] outro[s], configurando-se uma
situação de evidente injustiça(31)).
Temos, outrossim, uma exceção à regra da irretratabilidade da representação
(art. 25 do CPP) quando se lê o art. 79 da Lei nº 9.099/95, pois, mesmo já tendo
sido ofertadas a representação e a denúncia na audiência preliminar, o acordo feito
posteriormente na audiência de instrução e julgamento impedirá o prosseguimento
do feito, ou seja, mesmo após o oferecimento da denúncia, a representação já não
terá o condão de legitimar o MP a continuar acusando.
O segundo aspecto diz respeito à figura do assistente. Com efeito, o Estado,
embora titular do jus puniendi, por vezes concede ao ofendido a faculdade de intervir
na relação processual penal, seja na condição de titular da ação penal, como ocorre
na ação penal de iniciativa privada, seja como assistente do MP. Na primeira hipótese,
o ofendido figura na relação como parte necessária, atuando como substituto pro-
cessual, titular que é do jus accusationis; no outro caso, porém, a vítima não é parte
necessária no processo, sendo considerada sujeito secundário da relação processual,

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


parte acessória, colateral, contingente ou adjunta. A falta do assistente, portanto,
não inviabiliza o início nem a continuidade da relação processual.
Como assistente da acusação, pode se habilitar a vítima ou seu representante
legal, ou, na falta, o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. O art. 530-H do
CPP dispõe que “as associações de titulares de direitos de autor e os que lhes são
conexos poderão, em seu próprio nome, funcionar como assistente da acusação nos
crimes previstos no art. 184 do Código Penal, quando praticado em detrimento de
qualquer de seus associados”(32).
Diverge a doutrina quanto à função do assistente. Assim, por exemplo, para
Borges da Rosa, o assistente seria mero auxiliar da acusação ou um acusador asses-
sor ou auxiliar(33), opinião comungada por Frederico Marques e Espínola Filho(34).
Outros, no entanto, entendem que “a razão de se permitir a ingerência do ofendido

(31) Ada, Scarance, Luiz Flávio e Gomes Filho entendem diferentemente, sendo, para eles, “possível, no
entanto, que, apesar de um só dos possíveis ofensores transacionar, a reparação dos danos sofridos pela
vítima seja integral. Nesse caso, haverá renúncia tácita e extinção da punibilidade com relação a todos”
(ob. cit., p. 137).
(32) Como exemplo, podemos citar o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD, que é uma

sociedade civil privada instituída pela Lei nº 5.988/73 e mantida nos moldes da atual Lei nº 9.610/98.
(33) ROSA, Inocêncio Borges da. Processo penal brasileiro. Porto Alegre: Globo, 1942. v. 2. p. 202.

(34) Apud TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. v. 2.

p. 498.
384 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

em todos os termos da ação penal pública, ao lado do MP, repousa na influência


decisiva que a sentença da sede penal exerce na sede civil”, como explica Tourinho
Filho embasado nas lições de Florêncio de Abreu e Canuto Mendes de Almeida(35).
Para nós, acertada é esta última posição, pois só entendemos legítima a atuação
do ofendido como assistente quando configurado estiver o seu interesse em uma
posterior indenização pelo dano sofrido. Logo, sempre que da infração penal advier
prejuízo de qualquer ordem para o ofendido, este estaria legitimado a se habilitar
como assistente para pleitear depois a ação civil ex delicto, executando a sentença
penal condenatória(36).
Nesta questão, é bom que se note ser a posição do STJ majoritária no sentido
de se permitir a intervenção do assistente ainda que não tenha interesse patrimonial,
pois ele “também é interessado na averiguação da verdade substancial. O interesse
não se restringe à aquisição de título executório para reparação de perdas e danos.
O direito de recorrer, não o fazendo o Ministério Público, se dá quando a sentença
absolveu o réu, ou postulando aumento da pena. A hipótese não se confunde com
a justiça privada. A vítima, como o réu, tem direito a decisão justa. A pena, por seu
turno, é a medida jurídica do dano social decorrente do crime” (REsp 13.375/RJ).
De toda forma, de há muito a intervenção do ofendido no processo penal vem
sendo questionada, muitos a contestando sob o argumento de que caberia ao Estado
exclusivamente exercer as funções persecutórias em matéria penal, pois se admitir
a intervenção do particular seria aceitar que “su papel en el proceso parece estar
teñido de una especie de sentimiento de venganza”(37).
Analisando o direito português, por exemplo, o mestre lusitano Germano
Marques da Silva esclarece que a “intervenção dos particulares no processo penal
é por muitos contestada por poder constituir um factor de perturbação, pois não é
de esperar deles a objectividade e a imparcialidade que devem dominar o processo
penal, mas é também por muitos outros considerada como uma excelente e demo-
crática instituição e assim o entendemos também”(38).
Aliás, para este autor português o assistente é um mero colaborador da acu-
sação pública, definindo-o nos seguintes termos: “Sujeito processual que intervém
no processo como colaborador do Ministério Público na promoção da aplicação da
lei ao caso e legitimado em virtude da sua qualidade de ofendido ou de especiais
relações com o ofendido pelo crime ou da natureza deste”(39).
É importante ressaltar que o corréu no mesmo processo não pode intervir
como assistente, pois estaríamos diante da possibilidade de alguém ser, na mesma
ação penal, acusado e acusador (em uma caso de lesões corporais recíprocas, por
exemplo). O impedimento está expresso no art. 270 do CPP.

(35) Ob. cit., p. 498.


(36) Conferir sobre a ação civil “ex delicto” o nosso Direito Processual Penal, Salvador: Juspodivm, 2008.
(37) MORENO CATENA, Victor. Derecho procesal penal. Madrid: Colex, 1999. p. 250.

(38) SILVA, Germano Marques da. Curso de processo penal. 3. ed. Lisboa: Verbo, 1996. v. 1. p. 308.

(39) Ob. cit., p. 311.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 385

Também não é possível a assistência na ação penal de iniciativa privada, pois,


nos termos do art. 268 do CPP, a intervenção do assistente dar-se-á “em todos os
termos da ação pública”. Parece-nos evidente esta impossibilidade, pois nas referidas
ações a posição do ofendido já é de titular do jus accusationis, parte principal da
relação processual. Nada obstante a clareza do texto legal acima referido, bem como
a obviedade do impedimento, o certo é que o próprio CPP previa no procedimento
para os crimes de falência a admissão como assistente do síndico ou do credor ha-
bilitado, mesmo em se tratando de ação penal de iniciativa privada subsidiária da
ação pública (arts. 503 e 506 do CPP); mas, como se sabe, estas disposições foram
expressamente revogadas pela Lei nº 11.101/05. Do mesmo modo, veja-se o acima
referido art. 530-H do CPP, a permitir a assistência, ainda quando se trate de crime
de ação penal de iniciativa privada, como é o caso do art. 184, caput, do CP.
Outra discussão travada na doutrina e na jurisprudência é quanto à possibi-
lidade de o Poder Público estar legitimado a ser assistente da acusação. Parte da
doutrina não admite que um órgão do Estado auxilie um outro (o MP) na tarefa
de acusar. Seria o Estado-administração auxiliando-se. Para eles não é razoável
juridicamente a possibilidade de o Poder Público auxiliar o próprio Poder Público
na persecutio criminis. Como sustenta Tourinho Filho, se o MP já atua em nome do
Poder Público, “seria uma superfetação a ingerência da Administração Pública na
ação penal pública”(40). Neste sentido há posições jurisprudenciais.
Uma outra corrente, admitindo a assistência do Poder Público, ressalta que
os interesses do MP não são necessariamente coincidentes com os de outros entes

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


públicos, até porque aquele, apesar de ser parte, também tem a obrigação de fun-
cionar no processo como custos legis (art. 257, II, do CPP), obrigação à qual não
se vincularia a Administração Pública em geral, quando ofendida diretamente por
um determinado delito. Exemplificando: em um crime de peculato, o ente público
atingido imediatamente pelo fato delituoso não teria necessariamente que admitir
a improcedência da acusação (muito pelo contrário), enquanto que o MP, tendo em
vista as suas feições de parte e de fiscal da lei, tem a obrigação legal e institucional
de pugnar pela absolvição do acusado, inclusive recorrendo em seu favor.
Ora, se não é sempre coincidente a atuação do Ministério Público com a do
outro órgão do Estado, afigura-se-nos possível a presença deste como assistente de
acusação.
Bem a propósito, veja-se este julgado do TJSP: “Tratando-se de ação penal
pública promovida pelo Ministério Público, sendo lesada a municipalidade local, é
admissível o ingresso desta como assistente. É que o interesse do bem público geral
do órgão ministerial não coincide com o interesse secundário da ofendida” (RT
688/295). Neste mesmo julgado, lê-se: “Inocorre, na espécie, a superfetação a que
alude Tourinho Filho, pois a municipalidade, enquanto assistente, age na defesa de
interesses próprios, estranhos ao interesse geral pelo qual atua o Parquet, segundo
destinação constitucional”.

(40) Ob. cit., p. 496.


386 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Note-se, a propósito, que no DL nº 201/67, que dispõe sobre a responsabilidade


dos prefeitos e vereadores (art. 2º, § 1º), prevê-se expressamente a possibilidade
da assistência ao MP dos órgãos federais, estaduais ou municipais interessados na
apuração da responsabilidade do prefeito; da mesma forma, a Lei nº 7.492/86, que
define os crimes contra o SFN (art. 26, parágrafo único), dispõe que são admitidos
a se habilitar como assistentes da acusação a Comissão de Valores Mobiliários –
CVM (autarquia federal) e o Banco Central do Brasil; por fim, na Lei nº 8.078/90,
que disciplina a proteção do consumidor (art. 80), há hipóteses em que se permite
a assistência acusatória por meio de órgãos e entidades da Administração Pública,
direta ou indireta, bem como de determinadas associações.
Ao assistente é permitido propor meios de prova(41) que serão produzidos por
decisão judicial, após a ouvida do MP, bem como requerer reperguntas às testemu-
nhas(42), aditar os articulados (não a denúncia(43)), participar do debate oral, arrazoar
os recursos interpostos pelo MP ou por ele próprio e contra-arrazoar os interpostos
pela defesa (considerando-se as contrarrazões como os referidos articulados), reque-
rer o desaforamento (art. 427 do CPP), além de pedir a prisão preventiva do acusado
(art. 311 do CPP). Em relação à possibilidade de o assistente da acusação requerer a
decretação da prisão preventiva, entendemos só ser possível por conveniência da ins-
trução criminal ou quando for cabível a substituição de medida cautelar anteriormente
decretada, especialmente aquelas indicadas no art. 319, IV e VIII.
O assistente poderá interpor os seguintes recursos:
a) Recurso em sentido estrito da sentença que decretar a extinção da puni-
bilidade (art. 271 do CPP) e da decisão que denegar ou julgar deserta a apelação
interposta por ele próprio (art. 581, XV, do CPP). É certo que o recurso em sentido
estrito previsto no art. 581, XV, não está elencado expressamente como passível de
impetração pelo assistente, mas esta possibilidade é lógica, pois não seria possível
se permitir a apelação (como o faz o art. 271) e não se aceitar o remédio recursal
para a sua possível denegação. Este mesmo raciocínio utiliza-se para se admitir a
carta testemunhável quando se denegar o recurso em sentido estrito nas hipóteses
indicadas pelo art. 271 e agravo de instrumento contra decisão denegatória dos re-
cursos constitucionais. Como diz Tourinho Filho, “de nada valeria conceder-se-lhe
o direito ao recurso se, porventura, lhe fossem negados os meios necessários para
preservar e fazer valer aquele direito”(44).

(41) Não é possível, porém, arrolar testemunhas, mesmo para completar o número legal, pois a peça
acusatória já foi formulada e precluso estará o direito da acusação de propor este meio de prova (art. 41
do Código de Processo Penal). Tampouco ao assistente cabe aditar a denúncia.
(42) E também ao acusado no interrogatório, tendo em vista o disposto no art. 188 do Código de Processo

Penal, alterado posteriormente pela Lei nº 10.792/03.


(43) Discutindo em sala de aula este assunto e defendendo a tese de que não cabia ao assistente aditar a

peça acusatória, o aluno Rodrigo Souza Britto, hoje colega, complementou, aduzindo que, acaso fosse
permitido também este aditamento, maculado estaria o disposto no art. 129, I, da Constituição Federal.
(44) Ob. cit., p. 514.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 387

Ressalve-se que há precedentes no STF e no STJ admitindo o recurso em


sentido estrito interposto pelo assistente também contra a decisão de pronúncia,
posicionamento com o qual não concordamos, principalmente em razão do que
dissemos acima a respeito da legitimidade da vítima para atuar como assistente do
MP. Vejamo-los:
“SENTENÇA DE PRONÚNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
DO ASSISTENTE DA ACUSAÇÃO. LEGITIMIDADE. ARTS. 271, 584, § 1º, E
598 DO CPP. Desclassificação de homicídio qualificado para simples. Ausên-
cia de recurso do MP. Recurso do assistente provido pelo Tribunal, a fim de
reintroduzir as qualificadoras imputadas na denúncia. Matéria controvertida
na doutrina e na jurisprudência. Escassos precedentes do STF: RE 64.327,
RECr 43.888. Tendência de tratamento liberal da Corte em matéria recursal.
Interesse do ofendido, que não está limitado à reparação civil do dano, mas
alcança a exata aplicação da justiça penal. Princípio processual da verdade real.
Amplitude democrática dos princípios que asseguram a ação penal privada
subsidiária e o contraditório, com os meios e recursos a ele inerentes, art. 5º,
LV e LIX, da CF. Pedido conhecido, mas indeferida a ordem de habeas corpus,
diante da legitimidade do assistente para interpor recurso em sentido estrito
da sentença de pronúncia, irrecorrida pelo MP, para obter o reconhecimento
da qualificação do homicídio.” (STF, HC 71.453/GO, Rel. Min. Paulo Brossard,
2ª T., j. 06.09.94, DJ 27.10.94, p. 29.163, Ement Vol 01764-01, p. 180)
“SENTENÇA DE PRONÚNCIA. LEGITIMIDADE DO ASSISTENTE DE

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


ACUSAÇÃO. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. SILÊNCIO DO MINISTÉ-
RIO PÚBLICO. O assistente de acusação tem legitimidade para, no silêncio
do Ministério Público, interpor recurso em sentido estrito contra sentença de
pronúncia, objetivando o reconhecimento de causa de qualificação do homi-
cídio. Precedente do STF (HC 71.453/GO, Rel. Min. Paulo Brossard). Recurso
conhecido e provido.” (STJ, REsp 299.730/PR, Rel. Min. Vicente Leal, 6ª T., j.
05.03.02, DJ 01.04.02, p. 00229, RSTJ vol. 156, p. 560)
b) Apelação da sentença absolutória própria e sumária e da impronúncia (art.
416 do CPP). Outrossim, a Quarta Câmara Criminal do TJSP decidiu, por unani-
midade, que o assistente de acusação tem legitimidade para apelar contra decisão
que homologou a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº 9.099/95),
pois estaria sendo inviabilizada a reparação de danos à vítima. Com a decisão foi
cancelado o acordo de suspensão do processo e determinado o prosseguimento da
ação penal. O caso envolvia 11 pessoas acusadas de estelionato, em continuidade
delitiva, e formação de quadrilha. No caso, em tese, uma decisão condenando os
réus pelos crimes apontados na denúncia permitiria ação de reparação na área cível.
Essa possibilidade foi afastada pela decisão patrocinada pelo Ministério Público e
aceita em primeira instância. A turma julgadora do Tribunal de Justiça paulista
entendeu que a função do assistente de acusação não é a de auxiliar o MP, mas a de
defender o interesse da parte prejudicada na indenização do dano, ou seja, o ofen-
dido participa da ação penal pública por causa do seu interesse civil. Os réus foram
processados por formação de quadrilha e estelionato. Os advogados do assistente
388 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

de acusação alegaram que o benefício da suspensão processual foi concedido sem o


preenchimento dos requisitos legais. Afirmam que três dos acusados não poderiam ser
beneficiados porque respondem a outras ações penais e que uma já tem condenação
anterior transitada em julgado. Em preliminar, o MP sustentou que a assistência de
acusação não tinha legitimidade para apelar e, no mérito, pediu que a decisão fosse
mantida. Argumentou que não havia impedimento legal de concessão do benefício
a delitos em concurso. O relator, Desembargador Marco Antônio Cogan, acolheu
a tese sustentada pelos advogados, apontando que o acordo contrariou súmula do
STJ (“o benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações
penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade deliti-
va, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da
majorante, ultrapassar o limite de um ano”). Ele apontou ainda outras ilegalidades
para a concessão do benefício. Segundo o relator, não foram fixadas as condições
para o ressarcimento do dano nem se fez prova para descobrir se algum dos acusa-
dos estava impossibilitado de arcar com sua parte na reparação. “Patente, portanto,
que aqui houve colisão entre os interesses legítimos do assistente da acusação e a
proposta ministerial de aplicação de suspensão processual, com evidente prejuízo à
empresa vítima, uma vez que poderia essa se valer, em caso de eventual prolação de
decreto aflitivo, do emprego desse como título executivo no juízo civil”, completou
o relator(45). Acertada, a nosso ver, esta decisão.
c) Carta testemunhável.
d) Embargos de declaração. Quanto aos embargos declaratórios (tanto os
previstos no art. 382 quanto os do art. 619 do CPP), a sua admissibilidade é evi-
dente, até porque não se pode admitir a perfeita validade de uma decisão judicial
que não seja clara e íntegra. Exatamente por isso, qualquer decisão judicial pode
ser atacada pelos embargos declaratórios, ainda que não haja previsão específica a
esse respeito. Como dizem Ada, Scarance e Magalhães, “é inconcebível que fiquem
sem remédio a obscuridade, a ambiguidade, a contradição ou a omissão existente no
pronunciamento, que podem chegar até a comprometer a possibilidade prática de
cumpri-lo. Para eles, então, ainda quando o texto legal, expressis verbis, qualifique
a decisão como irrecorrível, deve entender-se que o faz com a ressalva implícita aos
embargos de declaração”(46). Eis, portanto, porque incluímos também tal recurso
entre os oponíveis pelo assistente. É a lição, aliás, de José Carlos Barbosa Moreira(47).
e) Recursos extraordinário e especial (Súmula nº 210 do STF). Não o pode na
hipótese de decisão concessiva de habeas corpus (Súmula nº 208 do STF). A propó-
sito, por seis votos a dois, o Plenário do STF aplicou sua própria Súmula nº 210 para
admitir que o assistente de acusação em ação penal incondicionada possa interpor
recurso, no caso de omissão do MP, titular da ação. A decisão foi tomada pela Corte

(45) Revista
Consultor Jurídico, 8 de agosto de 2006.
(46) GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance.
Recursos no processo penal. São Paulo: RT, 1996. p. 229.
(47) Comentários ao Código de Processo Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. v. V. p. 536.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 389

ao negar provimento ao HC 102.085. Nele, a defesa do réu se insurgia contra decisão


do STJ que deu provimento parcial a recurso especial lá interposto pelo assistente
da acusação. No julgamento prevaleceu a tese defendida pela relatora do processo,
Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, de que, embora a CF preveja, em seu art.
129, I, que cabe ao MP, privativamente, promover a ação penal pública, a própria
CF, em seu art. 5º, LIX, admite que “será admitida ação privada nos crimes de ação
pública, se esta não for intentada no prazo legal”. A maioria dos Ministros presen-
tes à sessão de hoje do Plenário entendeu que essa regra do art. 5º da CF se aplica,
também, à interposição de recurso no caso presente, contra sentença absolutória
da ré. A Ministra Cármen Lúcia fundamentou-se tanto na doutrina quanto na juris-
prudência da Suprema Corte para negar o HC e admitir a legitimidade do assistente
de acusação de atuar no processo, como o fez. Entre os precedentes, citou os REs
331.990 e 160.222 e o HC 76.754. No mesmo sentido da Ministra Cármen Lúcia
votaram os Ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto, Ellen Gracie e
Celso de Mello. Em seu voto, a Ministra Ellen Gracie admitiu um certo desconforto
em admitir que uma empresa de factoring, “que vive da compra de cheques”, atue na
prossecução criminal. Entretanto, ela se disse compelida a votar no mesmo sentido
em que votara o Ministro Ayres Britto, de que o MP é um órgão público e, como tal,
precisa estar sujeito à constante vigilância do cidadão. “A hipótese não é boa, mas
a tese deve ser mantida”, observou a Ministra Ellen Gracie. Votos discordantes, o
presidente do STF, Ministro Cezar Peluso, e o Ministro Marco Aurélio sustentaram
a prerrogativa exclusiva do MP de agir na ação penal. Segundo o primeiro deles, a
CF é clara ao atribuir ao MP, em caráter privativo, a titularidade da ação penal, no

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


interesse do Estado de punir criminosos. Por isso, no seu entender, não há interesse
do Estado em defender o interesse patrimonial do ofendido, até mesmo porque, no
processo, seu papel deve ser de neutralidade. Exceção só é o caso de omissão do MP,
o que, no seu entendimento, não ocorreu no processo envolvendo Neusa Tomiello,
no qual ele se manifestou em alegações finais. Peluso lembrou que “agir”, na ação
processual, significa tecnicamente praticar todos os atos. Portanto, segundo ele,
“quando se fala em exercício de ação penal, quem pode recorrer é somente quem tem
o direito de agir, que é o próprio Estado”. Quanto ao assistente, “ele simplesmente
adere ao titular da ação, que é o MP”. Ainda segundo o Ministro Cezar Peluso, não
está em jogo a satisfação de interesses patronais, porque para isso há a via própria,
que é a ação cível, que já estaria em curso no presente caso. O advogado que atuou
na defesa pediu uma revisão da Súmula nº 210/STF, lembrando que ela data de 1963.
Ele apontou contradição entre os arts. 129, I, da CF e 5º, LIX, o primeiro dispondo
que a ação penal é função privativa do MP e o segundo admitindo a ação privada nos
crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal. Ainda segundo o
advogado, o art. 598 do CPP, ao admitir a interposição de recurso em ação penal por
cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, “carece de conformidade com a Consti-
tuição”. Segundo ele, o dispositivo abriu uma brecha de promoção de vingança, ao
permitir ao particular assumir o papel do Estado na promoção da ação. O advogado
lembrou que, em 1941, quando foi editado o CPP, o assistente de acusação exercia
mais a função de assistente litisconsorcial. Hoje, entretanto, segundo o advogado,
ele deveria ter a função de assistente simples. Em sentido semelhante ao da defesa
390 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

manifestou-se a Subprocuradora-Geral da República Deborah Duprat. Segundo ela,


admitir a atuação do assistente da acusação, no caso, geraria um desequilíbrio entre
acusação e defesa, com ofensa ao princípio da proporcionalidade e do direito do
contraditório. Segundo ela, a jurisprudência moderna vai no sentido da obediência
do princípio da paridade de armas para propor e produzir provas no processo. Ainda
conforme Duprat, o papel do assistente, hoje, é mais de participação, de proporcio-
nar o diálogo entre as partes na busca do ideal de justiça. No caso julgado, segundo
seu entendimento, o assistente “não está à procura do diálogo e da conciliação, que
são o ideal do processo, mas de seu próprio interesse, com visão individualista em
confronto com o Estado Democrático de Direito”.
f) Agravo de instrumento contra decisão denegatória dos recursos constitu-
cionais (art. 28 da Lei nº 8.038/90).
O prazo recursal para o assistente é o mesmo estabelecido para as partes prin-
cipais. Observa-se, porém, que quando o assistente recorre supletivamente o prazo
para o recurso começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do MP,
segundo a Súmula nº 448 do STF. Este preceito sumular somente se aplica quando o
assistente é intimado antes do MP ou quando corre o prazo para este (RTJ, 68/604).
Neste sentido, em decisão unânime, a Segunda Turma do STF confirmou decisão
judicial que, por falta de intimação do assistente de acusação, impediu o trânsito
em julgado de sentença que havia reconhecido a prescrição da pretensão punitiva
do Estado contra o réu. Segundo explicou o Ministro Gilmar Mendes, relator do
caso, o direito da vítima de exercer o papel de assistente de acusação foi processu-
almente negado por “exclusiva omissão” do Magistrado de 1ª instância da causa.
A matéria foi julgada na análise de RHC 106.710 interposto pelo réu no processo,
acusado pelo MP por denunciação caluniosa contra um Desembargador do TJAM.
O Ministro citou decisão do Supremo no sentido de que o prazo para o assistente
da acusação interpor recurso começa a correr a partir do encerramento do prazo do
MP. Ele afirmou ainda que jurisprudência consolidada da Corte determina que o
assistente de acusação tem legitimidade para recorrer da decisão que absolve o réu
nos casos em que o MP não interpõe recurso.
Neste sentido, o STJ decidiu que o prazo para o assistente de acusação já
habilitado nos autos apelar é de cinco dias, após a sua intimação da sentença e
terminado o prazo para o MP recorrer. Com esse entendimento, a Quinta Turma do
STJ concedeu HC para anular decisão do TJSP que reconheceu a tempestividade de
recurso de apelação interposto pela assistência da acusação em um caso de tentativa
de homicídio qualificado. “Em que pese toda a análise sistemática feita pelo juízo,
para aplicar igualmente o prazo de cinco dias às partes, é certo que o art. 598, pa-
rágrafo único, do CPP estipula o prazo de 15 dias para a interposição da apelação
pelo assistente da acusação, sem qualquer distinção entre estar habilitado ou não”,
assinalou o TJSP. Em sua decisão, a relatora, Ministra Laurita Vaz, destacou que, ao
contrário do que afirma o Tribunal estadual, a jurisprudência do STJ e do STF há
muito é pacífica no sentido de que o prazo de interposição do recurso de apelação
para o assistente de acusação habilitado nos autos é de cinco dias, a contar da sua
intimação. A Ministra ressaltou que o STF tem súmula sobre o tema (nº 488), a qual
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 391

diz que “o prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imedia-
tamente após o transcurso do prazo do MP” (BRASIL. Coordenadoria de Editoria e
Imprensa do STJ. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.
wsp?tmp.area=398&tmp.texto=107722>. Acesso em: 19 nov. 2012).
Uma observação urge: é sabido que o art. 598 e seu parágrafo único estabelecem
que “o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se
tenha habilitado como assistente”, tem legitimidade para apelar (além de interesse,
evidentemente) quando, “nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juiz
singular, da sentença não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo
legal”, deferindo, inclusive, um prazo bem maior para o recurso (15 dias a partir da
data em que terminar o prazo do Ministério Público).
Ora, a doutrina sempre justificou e admitiu este prazo em triplo concedido à
vítima não habilitada como assistente (e aos seus sucessores), exatamente em ra-
zão do ofendido (e aquelas demais pessoas) não terem sido intimados da sentença,
razão pela qual se justificava um prazo maior pela dificuldade de conhecimento da
decisão. Agora, no entanto, estabelecendo a Lei (art. 201, § 2º) que da sentença será
também intimada a vítima, parece-nos, à luz do princípio da igualdade, que o prazo
deve ser o mesmo de cinco dias previsto no caput do art. 593 do CPP, tornando-se
inaplicável o prazo previsto no parágrafo único do art. 598.
Ressalte-se, com Humberto Ávila, que a igualdade (que ele denomina de pos-
tulado) “estrutura a aplicação do direito quando há relação entre dois sujeitos em

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


função de elementos (critério de diferenciação e finalidade da distinção) e da relação
entre eles (congruência do critério em razão do fim)”. Para ele, a proporcionalidade
(que também seria um postulado) “aplica-se nos casos em que exista uma relação
de causalidade entre um meio e um fim concretamente perceptível. A exigência de
realização de vários fins, todos constitucionalmente legitimados, implica a adoção
de medidas adequadas, necessárias e proporcionais em sentido estrito”(48).
Tal princípio está previsto expressamente no art. 5º, caput, da CF e “significa
a proibição, para o legislador ordinário, de discriminações arbitrárias: impõe que a
situações iguais corresponda um tratamento igual, do mesmo modo que a situações
diferentes deve corresponder um tratamento diferenciado”. Segundo ainda Mari-
ângela Gama de Magalhães Gomes, a igualdade “ordena ao legislador que preveja
com as mesmas consequências jurídicas os fatos que em linha de princípio sejam
comparáveis, e lhe permite realizar diferenciações apenas para as hipóteses em que
exista uma causa objetiva – pois, caso não se verifiquem motivos desta espécie,
haverá diferenciações arbitrárias”(49).
Para Ignacio Ara Pinilla, “la preconizada igualdad de todos frente a la ley (...)
ha venido evolucionando en un sentido cada vez más contenutista, comprendiédo-

(48) Teoria dos princípios. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 131.
(49) O princípio da proporcionalidade no direito penal. São Paulo: RT, 2003. p. 67.
392 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

se paulatinamente como interdicción de discriminaciones, o, por lo menos, como


interdicción de discriminaciones injustificadas”(50).
Como ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, “há ofensa ao preceito cons-
titucional da isonomia quando a norma singulariza atual e definitivamente um
destinatário determinado, ao invés de abranger uma categoria de pessoas, ou uma
pessoa futura e indeterminada”(51).
Em qualquer fase processual (após o recebimento da peça acusatória) admite-
se a habilitação para a assistência, respeitando-se apenas o trânsito em julgado da
sentença. Aliás, no julgamento da Petição 3.898, por maioria, os Ministros do STF
não aceitaram que o advogado de um assistente da acusação fizesse sustentação oral
durante uma sessão em que se analisava o recebimento de uma denúncia oferecida
contra um Deputado Federal. No Plenário do Tribunal do Júri, a intervenção do
assistente deverá ser requerida com antecedência de pelo menos cinco dias (art.
430 do CPP).
Para a admissão do assistente é indispensável a ouvida do MP (art. 272). Por
força do art. 273 do CPP, não é cabível nenhum recurso da decisão que admitir ou
não o assistente. Nada obstante, é indiscutível a possibilidade da interposição de
mandado de segurança (que não é recurso), embargos declaratórios (pelos motivos
acima expostos), correição parcial (dada a sua natureza jurídica) e mesmo o habeas
corpus. A utilização deste último remédio jurídico estaria justificada pela possibili-
dade, em tese, de prejuízo para o réu, considerando-se que o assistente pode recorrer
de uma decisão absolutória.
Observa-se que é direito da vítima ter o seu pedido de habilitação analisado
pelo juiz de direito. Neste sentido, em decisão unânime, a Segunda Turma do STF
confirmou decisão judicial que, por falta de intimação do assistente de acusação,
impediu o trânsito em julgado de sentença que havia reconhecido a prescrição da
pretensão punitiva do Estado contra o réu. Segundo explicou o Ministro Gilmar Men-
des, relator do caso, o direito da vítima de exercer o papel de assistente de acusação
foi processualmente negado por “exclusiva omissão” do magistrado de 1ª instância
da causa. A matéria foi julgada na análise de RHC 106.710 interposto pelo réu no
processo, acusado pelo MP por denunciação caluniosa contra um Desembargador do
TJAM. A denúncia começou a tramitar na Justiça Federal, mas, posteriormente, foi
transferida para a Justiça Estadual, considerada competente para julgar o processo.
Quando isso ocorreu, todos os atos processuais da Justiça Federal foram anulados,
inclusive o pedido da vítima para ingressar na denúncia como assistente de acusação.
Na Justiça Estadual, o magistrado de 1ª instância deixou de admitir a vítima como
assistente de acusação. O réu foi condenado e somente a defesa apelou, argumentado
em favor da prescrição da pena, que acabou sendo reconhecida. Contudo, por meio

(50) “Reflexiones sobre el significado del principio constitucional de igualdad”, artigo que compõe a obra
coletiva denominada El Principio de Igualdad, coordenada por Luis García San Miguel, Madri: Dykinson,
2000. p. 206.
(51) Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. 6. tir. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 47.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 393

de uma reclamação apresentada ao TJAM, a vítima conseguiu reverter a decisão


que decretou a extinção da punibilidade do réu e obteve o direito de ser intimada
da decisão de 1ª instância, para apresentar seu recurso de apelação. No STF, o réu
afirmou que, uma vez declarada a prescrição da pretensão punitiva do Estado, a
mudança dessa decisão por meio de uma apelação criminal da defesa significaria
uma reforma em seu prejuízo (reformatio in pejus). Em outras palavras, ao reconhecer
a necessidade de intimação de assistente não formalmente habilitado no processo,
vítima no processo, o Tribunal estadual teria reformado a sentença de 1º grau pre-
judicando o réu, sem que houvesse sido interposto recurso ao MP, o titular da ação.
O Ministro Gilmar Mendes rebateu o argumento. Ele explicou que a transferência
da denúncia para a Justiça Estadual anulou todos os atos praticados pela Justiça
Federal, inclusive o pedido da vítima de figurar como assistente de acusação, mas
“não teve o condão de desconstituir o direito material da parte ofendida de figurar
no polo ativo da demanda”. Segundo o relator, o direito da vítima de exercer a figu-
ra de assistente de acusação foi processualmente negado por exclusiva omissão do
magistrado da 5ª Vara Criminal da Comarca de Manaus, que deixou de despachar
o pedido efetuado. “As nulidades absolutas podem ser arguidas a qualquer tempo,
porque os atos nulos não podem gerar efeitos processuais. O assistente de acusação
deve ser intimado de todas as decisões e, caso não tenha sido, tem-se a nulidade dos
atos praticados após a omissão”, disse. Assim, não há como alegar a ocorrência de
trânsito em julgado para a acusação diante da ausência de intimação do assistente.
“Dessa forma, a omissão consistente em desconhecer o pleito de habilitação da
vítima na qualidade de assistente, bem como de negar-lhe o direito de figuração no

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


polo ativo da demanda, representa, a meu ver, ofensa ao devido processo legal, que
nulifica os atos posteriores à omissão”, reiterou (Fonte: STF).
A propósito, defensores públicos têm legitimidade para atuar como assistentes
de acusação do MP. A decisão é da Câmara Criminal do TJAL. O colegiado tomou
o posicionamento ao rejeitar a alegação, em preliminar, dos advogados de defesa de
um empresário acusado de homicídio qualificado. Um defensor público atuou como
assistente do MPE no caso, representando a família da vítima. O Desembargador-
Relator João Luiz Azevedo Lessa destacou que a CF e a legislação específica sobre
as atribuições da Defensoria Pública permitem tal atuação, que efetiva o direito
fundamental de assistência jurídica integral para aqueles que não têm condições
financeiras de contratar um advogado. “Declarar a impossibilidade de tal atuação
seria restringir um direito da vítima e seus familiares, que, decerto, são atingidos
pelas disposições constitucionais, ao considerar a própria literalidade do caput do
art. 5º de nossa Carta Magna, o qual registra que todos são iguais perante a lei,
não existindo distinção legal em razão da condição econômico-social das partes de
processos judiciais”, afirmou o relator. O Desembargador reforçou ainda que, como
o instituto do assistente de acusação é plenamente admitido no sistema jurídico
brasileiro, este deve ser acessível a todos. “Se determinada parte possuir recursos
financeiros suficientes e puder contratar um advogado para figurar no polo acusa-
tório do processo penal, aquele que comprova insuficiência financeira também deve
possuir o mesmo direito, sendo que este é efetivado pela Instituição da Defensoria
394 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Pública”, analisou. O Desembargador José Carlos Malta Marques, presidente da Câ-


mara Criminal, destacou a importância do trabalho exercido pela Defensoria Pública
para a população e de se deliberar sobre esse assunto na sessão. “No tempo que
estou no Tribunal, nós não havíamos nos deparado com essa questão. A provocação
da defesa foi bastante providencial, porque ensejou o posicionamento da Câmara
sobre o assunto. Acredito que, a partir do conhecimento desse julgado, nós teremos
vários outros casos. Esta sessão vai inaugurar a possibilidade de a defensoria atuar
no polo acusador”, disse – com informações da Assessoria de Imprensa do TJAL,
Processo 0005214-21.2012.8.02.0001 (Disponível em: <http://www.conjur.com.
br/2015-mai-29/defensoria-atuar-assistente-acusacao-decide-tj-al>).
Questão controvertida consiste na (i)legitimidade da Defensoria Pública como
representante processual do assistente do MP. A propósito, concordamos inteiramente
com Lenio Luiz Streck:
“A notícia vinda de Vespasiano (MG) de que, em um júri, o promotor
requereu a absolvição dos acusados (o que, aliás, é de sua prerrogativa) e o
assistente da acusação, a condenação, faz-me retornar a um assunto sobre o qual
já há muito me debrucei. Qual é o papel das instituições em uma democracia?
Vamos complicar um pouco o exemplo, supondo que esse assistente de acusação
seja um defensor público. Pronto: temos o prato feito. No primeiro exemplo,
o Estado, que tem um agente político com a garantia da vitaliciedade e que
possui o monopólio da ação penal pública, ao mesmo tempo admite que possa
haver um ‘auxílio’ de ‘terceiro interessado’ para essa tarefa. Já no segundo caso,
o Estado paga – caro – duas vezes: para acusar e para ‘auxiliar’ a acusação. Se
no primeiro caso até poderíamos dizer que, afinal, quem paga é o particular,
no segundo caso temos uma esquizofrenia institucional: em um país carente
de recursos, o Estado-se-dá-ao-luxo-de-pagar-duas-acusações-públicas. Bingo!
Contei isso para um jurista alemão. E ele farfalhava de tanto rir. E brincou: –Por
isso perderam de 7 a 1 (não gostei da gozação, mas, o que fazer?). Enfim...
País rico é país sem pobreza, diriam os governos Lula e Dilma. Fechemos as
cortinas e façamos uma anamnese do problema.
O primeiro ponto é a constitucionalidade ou a adequação ao Estado de
Direito Democrático da própria figura do assistente de acusação. Não serei
peremptório. Apenas proponho a discussão. Já houve momento em que essa
questão teve repercussão no Judiciário, quando, pela primeira vez, sustentei a
não recepção da figura da assistência de acusação. Naquele momento, porque
o dispositivo era anterior à Constituição, sustentei a não recepção, mostrando
como a nova conformação do Ministério Público afastava a participação da
vítima, que ficaria reservada à busca de indenização civil (como verão, esta
também é a tese do Ministro Marco Aurélio e do ex-Ministro Cezar Peluso). A
assistência da acusação, na verdade, significa(ria) vingança privada. A questão
se agrava(va) nos casos em que o Ministério Público pedia a absolvição e o
assistente pedia a condenação do réu, o que suscitava discutir o interesse de
agir da vítima.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 395

Se o réu é acusado pela sociedade e essa não tem interesse, qual a razão
para a vítima intervir na ação? Obtive várias vitórias no TJRS, ao ponto de
a Quinta Câmara Criminal, por um determinado período, não mais aceitar
recursos advindos do assistente de acusação. Aliás – para minha satisfação,
essa também era a tese da Defensoria Pública do RS e da União, como se pode
ver no HC 102.085/RS.
Veio uma minirreforma no processo penal e o dispositivo prevendo o
assistente de acusação foi ‘novado’. Logo, já não seria o caso de não recepção
– questão que não demanda(va) incidente de inconstitucionalidade –, e sim
de inconstitucionalidade de uma ‘nova’ lei. Nesse sentido, não encontrei clima
para um incidente. Tentei e fui derrotado.
Passado um tempo, penso que devemos voltar a discutir o tema. Qual
é o sentido da assistência à acusação? A busca da indenização ou (um)a vin-
gança privada? Ou as duas coisas? Ora, só para começar, mesmo que o réu
seja absolvido, isso não impede a ação civil, porque nem todos os dispositivos
que tratam da sentença no Código de Processo Penal conduzem diretamente à
não possibilidade de ação civil (sim, sei que, se a absolvição é por negativa de
autoria ou da inexistência do fato, não cabe indenização; mas, convenhamos,
são as hipóteses radicais de absolvição, pois não?). Elementar isso.
(...)
A questão, agora, assume foros diferenciados, em face de um novo elemen-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


to. Mesmo que se admita que a assistência à acusação (em si) seja constitucional,
pode um defensor público ingressar como assistente? A Defensoria foi criada
para isso? E, uma vez aceita a tese, como ficam os casos em que o-titular-
exclusivo-da-ação-penal requer a absolvição do réu e defensor, ‘contratado’
para a assistência, vê-se na obrigação – porque, afinal, é assistente por parte
da vítima – de pleitear a condenação? Ou o defensor, com sua independência
funcional, poderia também pedir a condenação de seu cliente? Qual é a posição
que deve valer? A do promotor ou do defensor, atuando como assistente? E
como fica o réu, que tem contra si alguém que não é indicado pela Constituição
para acusá-lo? E como ficam os casos em que tanto promotor como defensor-
assistente requerem a condenação (caso recente em São Paulo)? Não se trata
de manifesto excesso de acusação?
Daí a pergunta: podemos transferir recursos do restante da população
para pagar um defensor que irá fazer a assistência da acusação em nome de
uma vítima em particular, sem que possamos estender esse direito para todas
as demais vítimas de terrae brasilis? Ou seja, se uma vítima tem direito a um
defensor fazendo a assistência de acusação, devemos ter presente que todas
as demais vítimas devem ter o mesmo direito. Elementar isso também. Logo,
haveria dois agentes do Estado acusando réus. Como coadunar isso, quando
a própria Defensoria diz que faltam defensores? Para que serve o Ministério
Público? É incompetente? O promotor é um néscio que não tem condições de
sustentar a visão da sociedade acerca de um processo criminal? Afinal: quem
396 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

representa a sociedade: O Ministério Público, dominus litis, ou a Defensoria,


que representa o hipossuficiente?
Veja-se que essa questão é antiga. No HC 102.085, estivemos juntos.
Eu sustentando, de há muito, no segundo grau, a inconstitucionalidade do
assistente de acusação (tese criada por mim e Marcellus Polastri há 20 anos
ou mais), e a Defensoria impetrando habeas corpus para impedir que o recurso
do assistente (advogado pago pela vítima) vingasse junto ao STJ, repetindo a
ação através de HC junto ao STF. Apenas quero que os juristas e os políticos
pensem sobre isso. Em uma sociedade carente de recursos, terrae brasilis é
jabuticaba (só tem por aqui isso). Nenhum país do mundo tem dois agentes –
bem pagos (e que bom que sejam bem pagos) – acusando um réu (na maioria
das vezes, superhipossuficiente). Só Pindorama tem. E, pior: pode ocorrer de
ter dois agentes públicos (promotor e defensor) acusando e... outro agente
público (também defensor público) defendendo. País rico é país sem pobreza!
E então, a esquizofrenia é total. A malta paga tudo isso com seus impostos.
Ah: como todos são iguais, sendo caso de duas vítimas, poderemos ter dois
defensores assistentes e mais dois defendendo os acusados. Logo, três acusan-
do e dois defendendo. Todos pagos pela viúva. Afinal, se o juiz concede um
defensor como assistente para um familiar, por que um segundo familiar (de
outra família) pode ter negado pedido semelhante, se forem várias as vítimas?
Tirante outras hipóteses, como o prazo em dobro que dispõe a Defensoria...
Além do fato de que o defensor, atuando como assistente, tem poderes que o
advogado privado não possui. Como fica a isonomia?
Sigo. Terrae brasilis é demais. A saúde é um bom exemplo disso. Os patu-
leus tomam soro em pé nas filas do SUS. Enquanto isso, numa sala de audiências
qualquer, digladiam-se um defensor público, um procurador do Estado, um
procurador do município, um promotor de justiça e um juiz de direito, todos
muito bem remunerados pela viúva, em torno da grande questão de saber
quem é que paga pelos remédios. Mas não há recursos públicos suficientes...
Não me entendam mal (nesse país onde até mesmo a ironia tem de ser
explicada, não cabe vacilar). É claro que vejo, no fortalecimento em si das De-
fensorias Públicas, um bem, e não um mal. É preciso garantir acesso à justiça,
e a contratação de advogados públicos é uma etapa importante para que isso
aconteça. Franz Klein, um dos corifeus do socialismo processual, lá pelo fim
do século XIX, já apontava para isso, ao defender que o juiz, enquanto não
houvesse advogados pagos pelo Estado, deveria assumir a defesa endoproces-
sual dos mais pobres (que o socialismo processual tenha ecos ainda hoje no
processo jurisdicional é um daqueles mistérios insondáveis da nossa existên-
cia). Também no célebre texto de Garth e Cappelletti sobre o acesso à justiça
aparecem apontamentos interessantes sobre essa temática. Se é verdade que
o Poder Judiciário passava a ter um papel importante na resolução de ‘novas’
questões, no enfrentamento de demandas políticas (ou com estas imbricadas),
era preciso que alguém as levasse até ele, pois não?
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 397

No contexto do constitucionalismo brasileiro, no qual se encontram,


de um lado, um generoso catálogo de direitos fundamentais e, de outro, uma
realidade bruta e (em alguns aspectos) pré-moderna, é mesmo indispensável
a figura de um advogado público. A judicialização das omissões concreta
e individualmente geradas pelo Estado lato sensu deve poder ser feita com
alguém competente. Então, loas às Defensorias. Que devem ser fortalecidas.
Devo ter sido o primeiro, ou um dos primeiros ao menos, a sustentar que a
não implementação de Defensorias, no âmbito dos Estados, implicava omissão
inconstitucional (judicializável, portanto). Também, de nada adiantaria trocar
as filas do SUS por ‘filas nas Defensorias’. Fichas para atendimento por médico
e por advogado. Troca-se de fila, segue-se sem o remédio, entendem?
Agora, que justificativas há para que se crie um ‘superadvogado público’,
com poderes e prerrogativas que não alcançam aos demais advogados? O que
justifica esta distinção? Por que alguém optaria por contratar um advogado
particular se poderá ser assistido, gratuitamente, por alguém que pode requi-
sitar documentos e providências de órgãos públicos, além de possuir prazo
dilatado para se manifestar nos processos? Vejam, aliás, como a questão da
hipossuficiência vem sendo relativizada... A questão não é mais saber quem é
hipossuficiente... A questão é: ‘Quem não é?’. O ‘conceito’ de hipossuficiente,
agora, é organizacional. Não é mais econômico. Confesso que não entendi a
‘sofisticação’ desse conceito... Mas, se o cidadão não é hipossuficiente econô-
mico, não pode ele contratar advogado? Para que serve o advogado, afinal?

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Parece que ‘hipossuficiente’ quer dizer: ‘basta alegar’.
Há, com efeito, uma esquizofrênica superposição de funções e poderes
entre a Defensoria Pública e o Ministério Público. É possível dizer que o Mi-
nistério Público não tem cumprido a contento sua missão constitucional (isso
é tema para outra coluna); mas dois erros não fazem um acerto. Principalmente
enquanto ainda estiverem sendo distribuídas fichas de atendimento individual
aos cidadãos que madrugam na esperança de obter, na coloração tupiniquim,
o seu day in court.
É nesse sentido que devemos discutir o que vem acontecendo, com a
atuação da Defensoria Pública como assistente de acusação em ações penais.
Como disse, não quero ser peremptório. Quero colocar o problema para a
comunidade jurídica discutir.
E para que isso não fique incompleto, trago a lume o HC 102.085, no qual
o STF enfrentou o assunto (neste caso, tratava-se de um assistente privado),
ainda que não estivessem presentes três ministros. Nesse writ, a Defensoria
Pública pleiteava a nulidade de decisão do STJ, que deu guarida a recurso
especial contra decisão do TJRS, que inadmitira recurso de apelação feito por
assistente de acusação privado. Por maioria de votos, o STF sustentou a vali-
dade da velha Súmula nº 210 (corretamente, a Defensoria da União sustentava
a sua não recepção!).
398 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Permissa venia, penso que o Supremo se equivocou. Os dois votos ven-


cidos, da lavra dos Ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso, foram precisos e
corretos. Para o Ministro Marco Aurélio,
‘o próprio constituinte abriu exceção única à regra da promoção privada
em substituição à ação penal pública do Estado acusador. Fê-lo, de forma
exauriente, mediante o preceito do inciso, já muito referido, LIX do art. 5º (será
admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada –
está em bom vernáculo, em bom português – no prazo legal) (...).
Será que, diante desses dois dispositivos, é possível ter-se a transmudação
da ação penal pública que existiu em ação penal privada? A resposta, para mim,
é desenganadamente negativa. Uma ação que nasce pública incondicionada
não pode, na fase recursal, transformar-se em uma ação penal privada. (...).’
Para encerrar, disse o Ministro: a ação penal pública não pode se trans-
formar em uma corrida de revezamento. Assistente só se justifica quando o
Ministério Público for inerte.
Já o Ministro Peluso asseverou que o texto constitucional derrogou a
velha concepção de justiça privada e, por isso, deferiu ao Ministério Público,
em caráter privativo e exclusivo, a titularidade da ação penal.
‘Para quê? Para a defesa de interesse estatal específico, que é o de punir
criminosos (...). De modo que nem sequer se pode cogitar de que haja, nisso,
algum interesse estatal em defender interesses patrimoniais do ofendido.
Em segundo lugar, porque costuma acontecer, como em qualquer ins-
tituição, que os agentes às vezes falhem, nos casos em que eventualmente o
Ministério Público se omita, dada a relevância do mesmo interesse estatal, a
Constituição atribuiu a titularidade da ação ao particular ofendido, mas em
caráter de exceção e apenas na hipótese de omissão. (...) Só pode agir em
termos de recurso quem tem direito de ação, direito de agir. Ora, quem tem
direito de agir? O MP, como regra, e o querelante, como exceção, não o assis-
tente. O assistente não exerce direito de ação, nem na concepção do processo
criminal, nem na concepção, muito mais generosa, da ação civil. O assistente
simplesmente adere ao titular da ação. (...) Ora, o assistente penal, não sendo
titular de ação nenhuma, senão assistente de quem o é, a meu ver não pode
recorrer (...).’
Sigo. Admitindo que a decisão do STF esteja correta, ainda assim teríamos
que ver se a decisão é extensível aos casos em que o assistente da acusação é um
defensor público. Neste caso, uma interpretação conforme (verfassungskonfor-
me Auslegung) ao dispositivo do CPP poderia resolver o assunto, ressalvando
que o Estado (no caso, via defensor-assistente) não pode incorrer em bis in
idem e excesso de acusação, tendo na mesma ação penal e do mesmo lado um
agente do Ministério Público e um agente da Defensoria. Neste caso, poder-
se-ia admitir que, em uma democracia, não se pode impedir que um cidadão
que tenha recursos contrate um advogado privado para buscar seus interesses
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 399

(claro, de novo, vem a questão: qual é a leitura que se faz da Constituição,


que, no seu art. 5º, LIX, coloca como exceção à titularidade exclusiva do MP
a hipótese de sua inércia, isto é, voltar-se-ia à discussão do cabimento stricto
sensu da figura do assistente: afinal, ela é ou não constitucional?).
Sei das posições que sustentam tanto a permanência da assistência para
a advocacia privada como para a Defensoria. No próprio HC 102.085 essas
posições estão desenhadas. Mas com elas não concordo. De todo modo, o que
não podemos fazer é colocar recursos públicos onde não se deve pô-los e onde
já existe alguém (bem) pago para fazer essa função.
Assim, ou é excesso de acusação, considerando-se inclusive o pressuposto
não apenas da competência do Ministério Público, mas também o princípio da
presunção de inocência, ou então, como no caso em que o promotor pede a
absolvição e o defensor-assistente persiste na acusação, ‘esquizofrenia’ estatal,
na qual deve prevalecer a posição do MP. Ou não? Como fica isso?
Enfim, como diz Marcellus Polastri, assistente de acusação é ‘intervenção
de terceiro’: se for para interesse de ressarcimento cível. Isso para os que acham
constitucional a figura do assistente, é claro.
(...)
Em um país carente de recursos, essa questão assume foros de dramatici-
dade. Admitamos, como disse – no limite –, que prevaleça a tese da adequação
constitucional do instituto da assistência da acusação. Mas, ainda que essa tese

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


se consolide, uma questão deve ser discutida, isto é: como colocar um defensor
público como assistente de acusação para a vítima, se essa atitude não pode ser
universalizada? Eis o busílis. E se fosse possível universalizar a concessão de um
defensor para cada vítima (e levando-se em consideração o elástico conceito de
hipossuficiência), qual seria o sentido da existência do titular da ação penal?
Tornar-se-ia inútil, porque poderia ser substituído pelo defensor-assistente,
poupando valiosos recursos públicos. Pronto: substitua-se o promotor pelo
defensor, que pode, assim, fazer as duas coisas. Simples. E mais barato. Ou,
quem sabe, que sejam unificadas as duas carreiras... Em outras palavras: temos
que, urgentemente, reexaminar as nossas ‘bondades’ e estudar as ‘fragilidades’
de tais bondades, para usar uma expressão de Nussbaum.
Enfim, parece que os recursos públicos em terrae brasilis dão em árvore.
Depois nos queixamos. Estamos indo com muita sede ao pote. E brincando
de ‘relações institucionais’. O Estado brasileiro parece ser um universo em
expansão. Incha dia a dia. E sobrará pouco espaço para ‘as coisas privadas’. Só
quero saber o que faremos com as mais de mil faculdades de Direito, se tudo
será bancado pelo Estado. É inexorável que venha a explodir (ou implodir).
E as instituições fazem uma disputa pelos pobres. O Estado é muito bondoso,
pois não? Terrae brasilis é realmente incrível. Incrível no sentido de que não
dá para acreditar. Vamos refletir sobre isso? Temos maturidade para tal? Tenho
convicção que sim. Sou um otimista do tipo als ob (como se), isto é, ‘é como
se tivéssemos’. Enfim, um pouco da filosofia do ‘como se’, de Hans Vahinger:
400 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

uma ficção necessariamente útil...” (Revista Consultor Jurídico, 24 jul. 2014.


Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-jul-24/senso-incomum-
promotor-requer-absolvicao-defensor-condenacao-jabuticaba>)
Por fim, ressalvamos a posição pacífica da jurisprudência em não admitir a
intervenção do assistente nos processos de habeas corpus. A propósito:
“I – O assistente de acusação não possui legitimidade para intervir no
processo de habeas corpus ajuizado pelo réu em crime de ação penal pública.
II – Precedentes da Corte. III – Agravo não provido.” (STF, HC 84.022 AgR/
CE, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª T., j. 03.08.04, DJ 20.08.04, p. 00053)
“Nos termos da orientação jurisprudencial dominante, não se admite
o ingresso do assistente de acusação em sede de habeas corpus. Agravo não
conhecido.” (STJ, AgRg no HC 72.726/SP, 2006/0276683-5, Relª Minª Maria
Thereza de Assis Moura)
Vejamos este trecho do voto da Ministra Maria Theresa de Assis Moura:
“(...) Segundo, como já muito bem explicado no recurso, é pacífico o
entendimento contrário à admissão do assistente de acusação no writ. Não
prospera o raciocínio calcado no paralelo entre os bens jurídicos vida e honra.
As características de cada uma das modalidades de ação penal, de iniciativas
pública e privada, garantem-lhes tratamentos distintos, justamente pela extra-
ordinária inserção do particular no polo ativo desta última categoria processual.
(...)
Neste diapasão, é a ‘jurisprudência desta Corte e do c. Pretório Excelso
que não admite a intervenção do assistente de acusação no habeas corpus. Nesse
sentido, os seguintes julgados: AEDRHC 505/SP, Rel. Min. Assis Toledo, DJU
17.09.90; REsp 17.039/GO, Rel. Min. Assis Toledo, DJU 16.11.92; e MS 7.073,
Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 06.02.01. E no colendo STF: RHC 65.781, Rel.
Min. Moreira Alves, RTJ 126/154; e HC 72.710/MG, Rel. Min. Sydney Sanches,
DJU 27.10.95. A questão é, inclusive, objeto do enunciado da Súmula nº 208
da augusta Corte’ (AgRg nos EDcl no HC 43.127/GO, Rel. Min. Felix Fischer,
DJ 28.11.05, p. 320).
Cumpre destacar ainda o seguinte aresto do STF:
‘A intervenção do assistente do Ministério Público na presente causa
não se justifica, eis que lhe falece legitimidade para atuar no processo penal
de habeas corpus.
Sabemos que, na ação de habeas corpus, os sujeitos da relação processual
penal, além do órgão judiciário competente para julgá-la, são, apenas, (1) o
impetrante/paciente, (2) a autoridade apontada como coatora e (3) o Minis-
tério Público.
Eles compõem o quadro dos elementos subjetivos essenciais da relação
jurídico-processual do habeas corpus. São, por isso mesmo, os sujeitos proces-
suais relevantes, principais e imprescindíveis da ação de habeas corpus, não
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 401

obstante Pontes de Miranda, em clássica monografia sobre o tema (História e


prática do habeas corpus. 7. ed. t. II. p. 23-24. § 105. Rio de Janeiro: Borsoi,
1972), ao versar essa mesma questão, tenha acrescentado ao rol a figura, por
ele reputada essencial, do detentor do paciente.
As vítimas de qualquer infração penal, ou aquelas pessoas mencionadas
no art. 268 do Código de Processo Penal, mesmo quando habilitadas como
assistentes da acusação – o que só ocorre nos crimes de ação penal pública –,
não possuem qualidade e nem dispõem de legitimação, por ausência absoluta
de previsão legal, para intervir no procedimento judicial de habeas corpus.
Na realidade, a atividade processual do assistente do Ministério Público
não se revela ampla e nem ilimitada, especialmente no que concerne à sua parti-
cipação no processo de habeas corpus, eis que são de direito estrito as faculdades
jurídicas a ele outorgadas pelo ordenamento positivo (CPP, art. 271, caput).
O assistente do Ministério Público, bem por isso, somente pode intervir ad
coadjuvandum no processo penal condenatório (CPP, art. 268), assistindo-lhe, no
plano estrito das ações penais de condenação – com as quais não se confunde a
ação de habeas corpus (MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual
penal. v. 4/380-382, item n. 1.178. São Paulo: Forense, 1965) –, a prerrogativa de
propor meios de prova, de requerer perguntas às testemunhas, de aditar o libelo e
os articulados, de participar do debate oral e de arrazoar os recursos interpostos
pelo Parquet ou por ele próprio, inclusive extraordinariamente, nos casos dos
arts. 584, § 1º, e 598 (CPP, art. 271, caput, e Súmula nº 210/STF).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Vê-se, portanto, que a atividade processual do assistente do Ministério
Público sofre explícitos condicionamentos impostos pela lei, a cuja disciplina
está ela juridicamente sujeita. É por isso que o assistente do Ministério Público,
mesmo nas estritas hipóteses legais que justificam a sua intervenção assistencial,
‘(...) não pode recorrer, extraordinariamente, de decisão concessiva de habeas
corpus’ (Súmula nº 208/STF); não pode recorrer em sentido estrito da sentença
de pronúncia (RTJ 49/344); não pode interpor recurso extraordinário para o
Supremo Tribunal Federal de decisão que absolve o condenado em revisão
criminal (RTJ 70/500); não pode, ainda, postular, nas causas de competência
do Júri, o desaforamento de seu julgamento (RTJ 56/381).
A jurisprudência do STF, por tal razão, não tem admitido a participação
do assistente do MP na relação processual penal instaurada com a impetração
do habeas corpus.
(...)
Também o egrégio Superior Tribunal de Justiça – apreciando essa mesma
questão – perfilhou igual orientação, rejeitando a possibilidade de intervenção
do assistente do Ministério Público no processo penal de habeas corpus:
‘Processo penal. Habeas corpus. Assistente de acusação. Inadmissibili-
dade. Não cabe intervenção do assistente da acusação no processo de habeas
corpus, visto como a função do assistente é restrita à parte acusatória (art. 271
402 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

do CPP), enquanto que, no habeas corpus, onde não existe sequer acusação,
o MP não desempenha o papel de acusador, e sim de fiscal da lei. Precedentes
jurisprudenciais.’ (RT 666/352, Rel. Min. Assis Toledo – grifei)
Em suma: o assistente de acusação não ostenta a situação jurídica de
parte nas ações de habeas corpus, cujos sujeitos processuais, como já ressal-
tado, são, unicamente, o impetrante, o paciente, a autoridade coatora, o MP
e o próprio juiz.
O assistente de acusação, portanto, é um extraneus na formação da rela-
ção processual penal instaurada com o ajuizamento da ação de habeas corpus.
Não ostentando a condição jurídico-formal de litigante nesse processo não
condenatório, não há como invocar a regra consubstanciada no art. 268 do
CPP, cuja incidência restringe-se ao plano das ações penais condenatórias. Não
custa enfatizar, portanto, que, no processo penal de habeas corpus, o assistente
de acusação não é parte e nem ostenta a condição de litigante. Parte adversa
ao impetrante/paciente é o próprio Estado, cuja atuação administrativa ou
jurisdicional enseja o ajuizamento do writ. Compõem, destarte, a relação pro-
cessual penal instaurada com a impetração do habeas corpus, como litigantes
– e, portanto, como destinatários da garantia do contraditório proclamada pelo
art. 5º, LV, da Constituição –, o impetrante/paciente, de um lado, e a autori-
dade coatora, de outro. Daí a observação de José Frederico Marques (op. cit.,
v. 4/406), no sentido de que o conteúdo do processo de habeas corpus ‘é uma
lide ou litígio entre o que sofre a coação ou ameaça ao direito de ir e vir, e o
Estado, representado pela autoridade coatora’.
O assistente de acusação, na realidade, é terceiro formalmente estranho à
discussão, que, sob a égide do contraditório, se estabelece no processo penal de
habeas corpus entre o paciente e o Estado. Não há como se lhe aplicar a garantia
inscrita no art. 5º, LV, da Constituição, pois, não sendo parte litigante nesse
procedimento penal não condenatório, não pode, o assistente do Ministério
Público, pretender o amparo da cláusula constitucional mencionada.
Cumpre assinalar, ainda, que pertence ao Estado, de modo absoluto, o
direito de punir.
Sendo assim, não há que se cogitar de qualquer direito material titulari-
zável pelo assistente do Ministério Público, cuja intangibilidade possa justificar
o seu chamamento ou a sua intervenção no processo de habeas corpus, em cujo
âmbito um dos sujeitos – o próprio Estado, titular do jus puniendi – já se faz
presente por intermédio da autoridade coatora.
A circunstância de o Ministério Público poder intervir no processo de
habeas corpus, nas condições referidas na legislação processual (CPP, art. 654,
caput, e DL nº 552/69), não traduz, só por si, situação jurídica invocável pelo
assistente da acusação, para legitimar o seu ingresso na relação processual
instaurada com a impetração do writ. Tais situações são absolutamente inas-
similáveis.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 403

O Ministério Público, na presente causa – que configura processo penal


de caráter não condenatório –, desempenha a típica função institucional de
custos legis. Ressalvada a hipótese legal de ser, ele próprio, o impetrante do
writ (situação inocorrente neste caso), o Ministério Público atua como órgão
interveniente, velando pela correta aplicação das leis.
Daí o já haver sido proclamado que o Ministério Público, na ação penal
de habeas corpus, exerce, ordinariamente, a função de custos legis. Em sendo
assim, e ‘(...) não havendo, no processo de habeas corpus, quem acuse, não se
pode falar em assistente do Ministério Público, pois tal assistência não diz com
todas as funções daquela Instituição, já que a interferência do particular na
ação penal pública é de conteúdo específico’ (RT 590/359-361, 360, TACRIM/
SP, Rel. Juiz Adauto Suannes).
Sendo assim, e tendo em consideração as razões invocadas, não conheço
dos pedidos formulados nesta sede processual de habeas corpus pelo assistente
do Ministério Público, a quem deverão ser devolvidas as petições protocoladas
sob ns. 014738/00-STF, 015098/00-STF e 016172/00-STF, acompanhadas de
cópia da presente decisão.’” (STF, HC 80.022-0, Rel. Min. Celso de Mello, j.
09.03.00, p. 29)
Deve-se transcrever também a recente decisão do eminente Ministro Hamilton
Carvalhido, nos autos do Habeas Corpus 55.631, datada de 13 de junho de 2006:
“Persisto no entendimento de ser incabível a pretendida intervenção na
ação de habeas corpus. É que, em tema de liberdade, a interpretação há de ser

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


sempre em seu obséquio e, portanto, restritiva, excluindo, por certo, qualquer
outra, assim como a aplicação analógica ou subsidiária de norma, devendo ser
afirmada, por isso, a inadmissibilidade da assistência da acusação, no processo
de habeas corpus.
Não é outra a compreensão desta Corte Superior de Justiça:
‘EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL PRI-
VADA. LITISCONSÓRCIO. INCABIMENTO. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA.
NULIDADE. INCARACTERIZAÇÃO.
1. Diversamente do que ocorre com o mandado de segurança, inexiste,
relativamente ao habeas corpus, no Código de Processo Penal, norma autoriza-
tiva de intervenção de terceiros, devendo ser afirmado, por isso, a sua inadmis-
sibilidade, porque, em tema de liberdade, a interpretação há de ser sempre em
seu obséquio e, portanto, restritiva, excluindo, por certo, pretendida aplicação
analógica ou subsidiária.
2. De qualquer modo, as questões em que se visava à assistência ao Juízo
impetrado como coator foram decididas pelo acórdão embargado, impondo-se
a rejeição dos embargos declaratórios.’
‘PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. AGRAVO REGIMENTAL.
ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. Em sede de habeas
corpus é inadmissível a intervenção do assistente de acusação, ainda que esteja
404 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

atuando na ação originária (Precedentes do Pretório Excelso e desta Corte).


Agravo regimental desprovido.’ (AgRg nos EDcl no HC 43.127/GO, Rel. Min.
Felix Fischer, 28.11.05)
‘HABEAS CORPUS. No habeas corpus não cabe a manifestação do assistente
da acusação. Decisão unânime. Pedido prejudicado. Maioria.’ (HC 11.649/GO,
Rel. Min. Fontes de Alencar, DJ 28.05.01)
‘PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ASSISTENTE DE ACUSA-
ÇÃO. INADMISSIBILIDADE. Não cabe intervenção do assistente da acusação
no processo de habeas corpus, visto como a função do assistente é restritiva
à parte acusatória (art. 271 do CPP), enquanto que, no habeas corpus, onde
não existe sequer acusação, o Ministério Público não desempenha o papel de
acusador, e sim de fiscal da lei.
Precedentes jurisprudenciais.
Despacho de Relator que negou seguimento a embargos de declaração
em recurso de habeas corpus, interpostos por quem se intitula assistente de
acusação.
Agravo regimental improvido, confirmando-se aquele despacho pelos
seus próprios fundamentos.’ (AgRg no EDcl no RHC 505/SP, Rel. Min. Assis
Toledo, DJ 17.09.90)
‘RHC. CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. VÍTIMA. LITISCON-
SÓRCIO. O habeas corpus, ação constitucionalizada, visa preservar o direito
de liberdade. Admissível ser concedido de ofício. Daí, a vítima, ou qualquer
interessado ser carecedor de ação para atuar como litisconsórcio, visando im-
pedir a concessão do writ.’ (RHC 8.063/CE, Rel. Min. Vicente Cernicchiaro,
DJ 22.02.99)
‘RECURSO ORDINÁRIO DE HABEAS CORPUS (ART. 105, II, A, DA
CONSTITUIÇÃO). Querelante. Falta de legitimidade. O recurso ordinário de
habeas corpus é privativo do impetrante, ‘quando denegatória a decisão’. Das
decisões deferitórias de habeas corpus cabe apenas, em tese, o recurso especial
(art. 105, III, a e c, da Constituição). Recurso não conhecido.’ (RHC 2.646/
PA, Rel. Min. Assis Toledo, DJ 03.05.93)
E também do Excelso Supremo Tribunal Federal, valendo invocar, a pro-
pósito e em remate, o voto do ilustre Ministro Celso de Mello, no HC 72.710/
MG (Questão de Ordem), verbis:
‘Os sujeitos da relação processual penal instaurada com a impetração
do remédio constitucional do habeas corpus são, além do órgão judiciário
competente para julgá-lo, apenas (1) o impetrante/paciente, (2) a autoridade
apontada como coatora e (3) o Ministério Público.
Compõem, eles, o quadro dos elementos subjetivos essenciais da relação
jurídico-processual do habeas corpus. São, por isso mesmo, os sujeitos pro-
cessuais relevantes, principais imprescindíveis da ação de habeas corpus, não
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 405

obstante Pontes de Miranda, em clássica monografia sobre o tema (História e


prática do habeas corpus. 7. ed. t. II. p. 23-24, § 105. Rio de Janeiro: Borsoi,
1972), ao versar essa mesma questão, tenha acrescentado ao rol a figura, por
ele reputada essencial, do detentor do paciente.
As vítimas de qualquer infração penal, mesmo quando habilitadas como
assistentes da acusação – o que só ocorre nos crimes de ação penal pública –,
não possuem qualidade e nem legitimação, por ausência absoluta de previsão
legal, para intervirem no procedimento judicial de habeas corpus. Na realida-
de, a vítima de qualquer infração delituosa perseguível mediante ação penal
pública pode intervir ad coadjuvandum na relação processual, como assistente
do Ministério Público (CPP, art. 268), desde que o faça estritamente no plano
das ações penais condenatórias – com as quais não se confunde o habeas corpus
–, sendo-lhe reconhecido o direito de exercer, no âmbito desse procedimento
judicial, determinadas prerrogativas taxativamente definidas pelo texto legal
(CPP, art. 271, caput, e Súmula nº 210/STF).
A atividade processual do ofendido, portanto, sofre limitações derivadas
dos condicionamentos impostos pela lei, a cuja disciplina está ela juridicamen-
te sujeita. Por isso, mesmo nas estritas hipóteses legais que justificam a sua
intervenção assistencial – crimes perseguíveis mediante ação penal pública –,
o assistente do Ministério Público ‘(...) não pode recorrer, extraordinariamen-
te, de decisão concessiva de habeas corpus’ (Súmula nº 208/STF); não pode
recorrer em sentido estrito da sentença de pronúncia (RTJ 49/344); não pode

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


interpor recurso extraordinário para o STF de decisão que absolve o conde-
nado em revisão criminal (RTJ 70/500); não pode, ainda, postular, nas causas
de competência do Júri, o desaforamento de seu julgamento (RTJ 56/381).
A jurisprudência desta Corte, tendo presente esse contexto emergente
de nosso sistema normativo, não tem admitido a participação do assistente
do MP na relação processual instaurada com a impetração do habeas corpus.
O remédio constitucional do habeas corpus nada mais é do que uma ação
penal tendente à obtenção de provimentos jurisdicionais não condenatórios.
Assume o perfil – tal seja a natureza da postulação nele veiculada ora de ação
penal declaratória, ora de ação penal constitutiva, ora de ação penal cautelar.
O magistério de José Frederico Marques (Elementos de direito processual penal.
v. 4/380-382, item 1178. Rio de Janeiro: Forense, 1965) é definitivo a esse
respeito, verbis:
‘A ação de habeas corpus terá a natureza da prestação jurisdicional invo-
cada. O direito de liberdade, lesado ou ameaçado, recebe a tutela jurisdicional
para o seu pronto restabelecimento, graças à ação de habeas corpus (...). As-
sim sendo, ao lado do direito de liberdade, há o ‘direito público subjetivo’ de
impetrar-se o habeas corpus, isto é, o direito de deduzir em juízo a pretensão
fundada no status libertatis, para que o Judiciário a aprecie e decida.
O pedido de habeas corpus, levado a juízo, pode ter por objeto imediato
ou um pronunciamento declaratório, ou uma providência cautelar, ou uma
406 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

decisão constitutiva, ou ato jurisdicional que imponha à autoridade coatora o


restabelecimento acautelatório da liberdade atingida e violada. Donde poder
a ação de habeas corpus ter a natureza de ação declaratória, ou constitutiva,
ou cautelar.
Esse jus actionis, por outro lado, terá a natureza de ação penal, desde
que o seu fundamento esteja no direito penal de liberdade, o que acontecerá
quando a lesão ou ameaça, que pese sobre o jus libertatis, derivar de atos da
persecutio criminis, tendo, assim, como autoridade coatora, algum dos órgãos
da Justiça Criminal, ou mesmo outro órgão estatal que arrogue para si, ainda
que indevidamente, a prática de ato persecutório-penal.’
O ofendido é, portanto, um extraneus na formação da relação processual
penal instaurada com o ajuizamento da ação de habeas corpus.
É preciso salientar, por isso mesmo, que, no processo penal de habeas
corpus, o ofendido não é parte e nem ostenta a condição de litigante. Parte
adversa ao impetrante/paciente é o próprio Estado, cuja atuação administrativa
ou jurisdicional – a que se atribuiu o vício da ilegalidade – tornou necessário o
ajuizamento do writ constitucional. Compõem, destarte, a relação processual
penal instaurada com a impetração do habeas corpus, como litigantes, apenas
o impetrante/paciente, de um lado, e a autoridade coatora, de outro. Daí a
observação de José Frederico Marques (op. cit., v. 4/406) no sentido de que
o conteúdo do processo de habeas corpus ‘é uma lide ou litígio entre o que
sofre a coação ou ameaça a direito de ir e vir e o Estado, representado pela
autoridade coatora’.
A circunstância de o Ministério Público poder intervir no processo de
habeas corpus não traduz, por si só, situação jurídica invocável pelo assistente
da acusação para legitimar o seu ingresso na relação processual instaurada
com a impetração do writ.
O Ministério Público – cuja atuação processual nas ações de habeas corpus
é necessária no segundo grau de jurisdição em face de expressa determinação
legal (Decreto-Lei nº 552/69) – desempenha, nesse processo penal de caráter
não condenatório, a típica função institucional de custos legis. Ressalvada a
hipótese legal de ser ele próprio o impetrante, o Ministério Público atua como
órgão interveniente, velando pela correta aplicação das leis.
Daí, o já haver sido proclamado que o Ministério Público, na ação penal
de habeas corpus, exerce, normalmente, a função de custos legis. Em sendo
assim, e ‘(...) não havendo, no processo de habeas corpus, quem acuse, não se
pode falar em assistente do Ministério Público, pois tal assistência não diz com
todas as funções daquela instituição, já que a interferência do particular na
ação penal pública é de conteúdo específico’ (RT 590/359-361, 360, TACRIM/
SP, Rel. Juiz Adauto Suannes).
A jurisprudência dos Tribunais, por isso mesmo, e considerando a estrita
disciplina jurídico-legal a que se acha submetida a atuação processual penal
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 407

do ofendido, tem proclamado a inadmissibilidade de sua intervenção no pro-


cesso de habeas corpus, ainda quando habilitado como assistente do Ministério
Público (RT 557/350 – RT 598/325 – RTJ 56/693-695).
Bem por isso, impende salientar que esta colenda Primeira Turma, ao
julgar o RHC 65.181-8/SP, de que foi relator o eminente Ministro Moreira Alves
(RTJ 126/154), reiterou o entendimento de que, tratando-se de processo de
habeas corpus, nele não cabe a intervenção assistencial do ofendido.
Assim sendo, e tendo presentes as razões expostas, não atribuo legitimi-
dade ao assistente do Ministério Público para intervir no processo de habeas
corpus e, em consequência, não lhe reconheço o direito de fazer sustentação
oral, como ora pretendido.
Pedido indeferido.”
Assim, tem-se claramente como inviável o ingresso do assistente de acusação
no writ. A despeito de não ser possível conhecer-se do agravo regimental em razão
dos jurídicos argumentos alinhavados acima, cumpre-me abrir um parêntese. Inde-
pendentemente das características desta ou daquela causa, esta relatora, no exercício
de suas funções, vem dispensando o tradicional, e isonômico, empenho que sempre
marcou a atuação dos Ministros desta Casa.
Não é possível a intervenção da parte acusadora em processo de HC, pois este
é um instrumento exclusivo da defesa. Com base nesse entendimento, a Ministra
Laurita Vaz, do STJ, rejeitou RE apresentado contra decisão da Quinta Turma que

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


concedeu HC. A relatora avaliou que, sendo um instrumento exclusivo da defesa,
“não cabe, na referida via, qualquer intervenção do acusador ou de assistente do
MP, sob pena de desvirtuamento da finalidade constitucional do writ”. Ela ainda
mencionou a Súmula nº 208/STF, segundo a qual o assistente do MP não pode
recorrer extraordinariamente de decisão que concede HC (Disponível em: <http://
www.conjur.com.br/2015-jun-07/assistente-acusacao-nao-recorrer-habeas-corpus>).
ACORDO DE LENIÊNCIA E SEUS REFLEXOS PENAIS

Flávio Augusto Maretti Sgrilli Siqueira


Doutor em Direito Penal e Política Criminal pela Universidad de Granada;
Mestre em Direito Penal Supraindividual pela Universidade Estadual de Maringá;
Especialista em Direito e Processo Penal pela Universidade Estadual de Londrina;
Defensor Público e Professor de Direito e Processo Penal nas Faculdades
Integradas Libertas.

RESUMO
A elaboração de acordo de leniência por parte do CADE não se afigura como
uma medida que é dotada de adequação constitucional por desrespeitar a titulari-
dade da ação penal que pertence ao Ministério Público. Não se cogita em violação
ao princípio do venire contra factum propium, uma vez que o acordo de leniência
é elaborado sem a observância de regras constitucionais sobre as atribuições insti-
tucionais do Ministério Público. Logo, não se pode conferir validade a um acordo
elaborado sem a participação do órgão que detém o poder-dever de deflagrar a ação
penal e a chancela do Poder Judiciário.
Palavras-Chave: Acordo de Leniência. Reflexos Penais.

TITLE: Leniency agreements and their criminal reflections.


ABSTRACT
The preparation of a leniency agreement by the Brazilian Antitrust Authority is
not a measure that complies with the Constitution due to not respecting the ownership
of the criminal case that belongs to the Prosecution Office. There is no violation of the
venire contra factum propium principle, since the leniency agreement is prepared without
compliance with the constitutional rules concerning institutional powers of the Prosecu-
tion Office. Therefore, it is not possible to consider valid an agreement prepared without
the participation of an entity that has the power-duty of filing the criminal prosecution
and the approval of the Judiciary.
Keywords: Leniency Agreement. Criminal Reflections.

SUMÁRIO
I – Introdução. II – Acordo de Leniência: umas Considerações Pontuais. III
– Os Reflexos Penais do Acordo de Leniência. IV – Conclusões. V – Bibliografia.

I – INTRODUÇÃO
Invariavelmente, os ilícitos praticados contra interesses difusos concitam prá-
ticas exercidas de modo elíptico, oculto, com restrita publicidade e alta lesividade,
o que promove a não descoberta dos mesmos pelo Estado.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 409

Emerge, assim, a necessidade da participação de envolvidos prestando infor-


mações privilegiadas sobre a atividade ilícita, permitindo o início ou o encerramento
das investigações, o que, de um lado, gera críticas, pelo atestado de ineficiência do
Estado na investigação pelo mesmo dos delitos cometidos, o que também é sua função
por força do contrato social, além da veracidade das informações pelo agente infor-
mante ter participado na atividade delitiva, e, noutros aplausos, pela possibilidade
de descoberta de fatos outrora encobertos pelo manto do sigilo.

II – ACORDO DE LENIÊNCIA: UMAS CONSIDERAÇÕES PONTUAIS


Nesse quadrante surge o acordo de leniência, que é “um acordo de colaboração
entre o Poder Público e o particular investigado por prática de ato lesivo ao erário
ou à infração à ordem econômica”(1).
Os antecedentes históricos desse acordo se encontravam na antiga legislação
antitruste brasileira (arts. 35-B e 35-C da Lei nº 8.884/94), os quais foram inseridos
originariamente pela MP nº 2.055/00, que gera inclusive questionamentos pela
(in)segurança jurídica advinda desses acordos pela exiguidade do tempo de vigência
da medida provisória nos termos da CRFB.
A Lei Antitruste (Lei nº 12.529/2011), nos arts. 86 a 87, disciplina a matéria
sob o título de Programa de Leniência.
Esse acordo é firmado pelo CADE por intermédio da Superintendência-Geral,
sendo exigidas para sua elaboração a identificação dos envolvidos e a obtenção de

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


informações/documentos que comprovem a infração ou que estejam sob investigação
da autarquia federal.
A Lei exige preferência (prioritariamente ser a primeira empresa ou pessoa
física a noticiar o fato), cessação de envolvimento na infração cometida, confissão
de participação ou cooperação voluntária e ausência de provas internas no CADE
quanto à caracterização da infração.
Os acordos de leniência admitem a modulação dos efeitos por intermédio da
fixação de condições necessárias e resultado útil buscando efetividade e boa-fé (art.
86, § 4º, II, da Lei nº 12.529/2011).
Os benefícios podem se referir à redução de um a dois terços da penalidade e
à extinção da ação punitiva por parte da Administração Pública pelo infrator se o
CADE não conhecesse da mesma.
Há a possibilidade de extensão dos efeitos aplicando-se às empresas do mesmo
grupo e aos dirigentes, administradores e empregados incluídos no acordo, desde
que firmem em comum o acordo.
Caso o fato revelado não seja considerado inédito por haver apuração em in-
quérito ou processo administrativo, poderá celebrar o acordo com relação a outro

(1) CUSTÓDIO FILHO, Ubirajara; SANTOS, José Anacleto Abduch; BERTONCINI, Mateus. Comentários
à Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção). São Paulo: RT, 2014. p. 233.
410 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

fato inédito, mas terá possibilidade de aplicação do benefício residual de redução


de um terço da pena sobre o fato não inédito.
As propostas de acordo de leniência e as investigações são uma medida prevista
em lei com o fim de preservação do programa a ser entabulado, mas esse sigilo não
é oponível aos advogados dos envolvidos, por força de súmula vinculante do STF.
O acordo de leniência proíbe que o mesmo agente firme outro acordo com
a autarquia federal pelo lastro de três anos, contados do julgamento pelo Tribunal
do CADE, que homologará o mesmo, o que lembra dispositivo do Juizado Especial
Criminal no que cuida da impossibilidade de aplicação das medidas despenalizadoras,
ressalvada a hipótese do prazo, que na Lei nº 9.099/95 é de cinco anos.
A proibição temporal de firmar outros acordos não se aplica se o mesmo referir-
se a fato diverso em que incide a Lei Anticorrupção pela inexistência de vinculação
entre os documentos legislativos.
Não há presunção sobre a ilicitude do fato, tampouco fala-se em confissão e a
proposta não será objeto de divulgação.

III – OS REFLEXOS PENAIS DO ACORDO DE LENIÊNCIA


O aspecto de maior levante doutrinário e polêmica cuida-se da possibilidade
de apresentação de reflexos penais(2) ao acordo tal qual como previsto expressamente
no art. 87 da Lei nº 12.529/2011.
Os reflexos penais não devem ser aplicados, por implicar em insanável vício
de inconstitucionalidade ou de eficácia, como veremos.
Inicialmente, o acordo de leniência com aspectos penais implica em violação
de atribuição típica do Ministério Público, posto que por força de imperativo cons-
titucional ele é o titular da ação penal (art. 129, I, da CRFB), e ao prever que uma
autarquia pode livremente dizer onde há ou não razão ou motivação político-criminal
idônea para repelir a aplicação de pena no direito penal, há a criação de perigoso
precedente à inflição de elementos políticos afetando diretamente a atuação do MP.
A hipótese evidencia violação à autonomia institucional do Ministério Público
igualmente assegurada por norma constitucional.
Ao analisarmos o histórico da legislação brasileira sobre o tema de colaboração
com a justiça, temos que os acordos devem ser submetidos à homologação pelo Poder
Judiciário, o que inexiste nestes acordos de leniência, promovendo-se em última

(2) Art. 87 da Lei nº 12.529/2011, que diz que “nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei
nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel,
tais como os tipificados na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e os tipificados no art. 288 do Decreto-
Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, a celebração de acordo de leniência, nos termos
desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia
com relação ao agente beneficiário da leniência. Parágrafo único. Cumprido o acordo de leniência pelo
agente, extingue-se automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo”.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 411

instância esvaziamento da função desse poder como aplicador das normas jurídicas,
violando-se o princípio da separação dos poderes (art. 2º da CRFB).
Verificamos que esses acordos não promovem nenhum efeito perante o Mi-
nistério Público, que passa imune a essa extinção da punibilidade pela titularidade,
uma vez que ela foi infensa ao controle do Poder Judiciário, que tem essa função
no art. 61 do CPP.
Lado outro, há a clara verificação de transbordamento dos limites em que esse
acordo poderia, ainda que inconstitucionalmente, ser realizado por beneficiar delitos
que se encontram fora do objeto das infrações administrativas do CADE, por trazer
como imputações passíveis de sofrerem com a extinção de punibilidade, como delitos
contra as licitações (Lei nº 8.666/93) e associação criminosa.
A salvação desses acordos residiria na participação do Ministério Público(3),
no entabulamento dos acordos ou na alusão da projeção penal do mesmo com a
participação do Ministério Público, notadamente, pelos reflexos que transcendem as
raias meramente administrativas, indo além para alcançar situações açambarcadas
por processos de improbidade administrativa ou ações penais(4).

(3) Plínio Antônio Britto Gentil, Charles Hamilton Santos Lima, Roberto Livianu, Márcio Soares Berclaz,
Tiago de Toledo Rodrigues e Gustavo Roberto Costa sustentam que, “antes de enfraquecer o acordo de
leniência ou despotencializá-lo, ao contrário, o interesse e a previsão da possibilidade de manifestação
do Ministério Público somente reforçam a importância e a utilidade do referido instrumento, permitindo

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


que haja fiscalização sobre os seus termos e condições, tal como ocorre com outro instituto de justiça
consensual ou negociada, no qual o Ministério Público já tem experiência e manejo. Melhor que o
acordo de leniência seja qualificado pela presença e participação do Ministério Público do que desquali-
ficado posteriormente de descriterioso e indevido, inclusive como risco de sua nulidade ser postulada
e reconhecida pelo Poder Judiciário” (Intervenção do Ministério Público nos acordos de leniência é
imprescindível. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-out-12/
mp-debate-intervencao-acordos-leniencia-imprescindiivel>. Acesso em: 13 out. 2015, p. 1). No mesmo
sentido: LIVIANU, Roberto. Corrupção. Incluindo a nova Lei Anticorrupção. 2. ed. São Paulo: Quartier
Latin, 2014. p. 187.
(4) Plínio Antônio Britto Gentil, Charles Hamilton Santos Lima, Roberto Livianu, Márcio Soares Ber-

claz, Tiago de Toledo Rodrigues e Gustavo Roberto Costa sustentam: “Definitivamente, não se pode dar
margem ao oportunismo, permitindo que empresários desonestos restem eventualmente impunes ao
ponto de estarem estimulados à primária violação inicial da lei para posterior e descriterioso acerto com
o governo, acordo este que pode abranger, por exemplo, pena de proibição de contratar com o Poder
Público. Não se pode permitir que uma estrutura de governo, eventualmente envolvida e pressionada
por suspeitas de corrupção, acerte-se livremente com uma empresa igualmente suspeita (que pode até
ter sido doadora na sua campanha), podendo buscar, inclusive, a partir disso, financiamentos com os
bancos públicos, sem que haja fiscalização e possibilidade de intervenção pela instituição constitucional-
mente encarregada do primário combate à corrupção e, inclusive, da defesa da ordem jurídica, no caso, o
Ministério Público. O Ministério Público é não só o principal legitimado pela Constituição da República
a defender com independência o patrimônio público (art. 129, III), mas também o titular exclusivo da
ação penal pública (art. 129, I). Não se olvide, também, o impacto e a pertinência que eventuais acordos
de leniência podem produzir no âmbito de ações penais e ações civis públicas de responsabilidade por
ato de improbidade administrativa. Somente a ciência, de modo a permitir, via de consequência, a pre-
sença, o acompanhamento e a intervenção do Ministério Público, permite que esse novo e importante
instrumento seja utilizado de modo responsável e legítimo, mais do que isso, com os controles e os
filtros próprios do Estado constitucional e democrático” (Intervenção do Ministério Público nos acordos
de leniência é imprescindível.., p. 1).
412 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

A questão poderia ser saneada por intermédio da forçosa intervenção do


Ministério Público Federal junto ao Conselho de Administração da Defesa Econô-
mica na forma do art. 20 da Lei nº 12.529/2011, que diz: “O Procurador-Geral da
República, ouvido o Conselho Superior, designará membro do Ministério Público
Federal para, nesta qualidade, emitir parecer, nos processos administrativos para
imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica, de ofício
ou a requerimento do Conselheiro-Relator”.
A questão ainda não restaria sanada, porquanto a intervenção do MPF é li-
mitada a aspectos administrativos da atuação do CADE, sendo que a lei silencia-se
quanto à participação do MP.
A competência para conhecimento dos delitos contra a ordem econômica,
via de regra, é da Justiça Estadual(5), ressalvado se o delito atingir bens da União
(art. 109, IV, da CRFB), venha a atingir mais de dois Estados-membros ou afetarem
interesses dos entes mencionados no art. 109, I, da CRFB.
Levanta-se outra bandeira a ser questionada, uma vez que a intervenção do
MPF chancelando um acordo de leniência em um fato que apresente reflexos em
delitos contra a ordem econômica não teria o condão de promover qualquer efeito
válido, uma vez que deve-se adotar solução que aproxime-se à competência firmada
na jurisprudência do STJ para fins de determinação do MP, que deve atuar nesse
tipo de acordo.
Eduardo Molan Gaban e Juliana Oliveira Domingues ressaltam que o critério
ideal é adotar a competência criminal para se verificar qual Ministério Público
deve atuar, posto que, “identificando-se o espectro da infração objeto do acordo de
leniência, é possível identificar-se se está mais próxima da competência da Justiça
Estadual ou da Justiça Federal, identificando-se, assim, qual dos Ministérios Públicos
devem figurar no acordo”(6).
Calha dizer que, em conformidade com o assinalado na doutrina, temos que,
“(...) uma vez assinado pelo órgão ministerial, este, quer por um de seus membros
quer por outro, não poderá mais exercer seu direito de propor ação penal contra
as pessoas que assinaram o acordo de leniência pelos fatos confessados no acordo
de leniência”(7).

(5) A jurisprudência do STJ pontua: “CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME DO ART. 4º DA LEI Nº


8.137/90. PRÁTICA DE DUMPING. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO PARA A UNIÃO. COMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA ESTADUAL. 1. Compete à Justiça Estadual processar e julgar ação penal relacionada a crime
contra a ordem econômica (Lei nº 8.137/90), salvo se praticados ‘em detrimento de bens, serviços ou
interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas’ e ‘nos casos determinados por
lei’ (CR, art. 109, IV e VI; STJ, CC 56.193/RS, Rel. Min. Og Fernandes; CC 42.957/PR, Relª Minª Laurita
Vaz; STF, RE 502.915, Rel. Min. Sepúlveda Pertence). 2. Conflito conhecido para declarar a competência
do Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Campo Mourão/PR, ora suscitante” (CC 119.350/
PR, Rel. Min. Newton Trisotto [Desembargador Convocado do TJSC], Terceira Seção, j. 26.11.2014, DJe
04.12.2014).
(6) MOLAN GABAN, Eduardo; OLIVEIRA DOMINGUES, Juliana. Direito antitruste. 3. ed. São Paulo:

Saraiva, 2012. p. 261.


(7) MOLAN GABAN, Eduardo; OLIVEIRA DOMINGUES, Juliana. Direito antitruste..., p. 260.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 413

A questão ainda vai levantar polêmica, em especial, pelo princípio da unidade


do Ministério Público, se o acordo firmado pelo MPF produzir efeitos junto ao MP
estadual, além da existência ou não da violação ao promotor natural(8).
Os defensores dos acordos de leniência sustentam que haveria uma venire fac-
tum propium, porquanto o Estado que firma um acordo prometendo a extinção da
punibilidade é o mesmo que posteriormente comparece ajuizando ação penal contra

(8) A jurisprudência do STF diz: “NULIDADE DO JULGAMENTO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DO


JÚRI E INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL. ACÓRDÃO PROFERIDO PELO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA, CONTENDO DUPLO FUNDAMENTO: LEGAL E CONSTITUCIONAL. NÃO
INTERPOSIÇÃO SIMULTÂNEA DE RECURSO ESPECIAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 283 DO STF.
AGRAVO REGIMENTAL. ALEGAÇÃO DE CABIMENTO SOMENTE DE RE POR ENTENDER QUE O
TRIBUNAL DE ORIGEM TERIA ADOTADO O TEMA RELACIONADO À OFENSA AO PRINCÍPIO
DO PROMOTOR NATURAL COMO FUNDAMENTO AUTÔNOMO E SUFICIENTE PARA DECIDIR
A CONTROVÉRSIA. ARGUMENTAÇÃO INSUBSISTENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. Tendo o tribunal de origem decidido a controvérsia com base em fundamento constitucional e legal,
impunha-se a interposição simultânea de recurso especial, sob pena de não o fazendo subsistir hígido o
tema afeto à interpretação da legislação ordinária. O conhecimento do extraordinário, assim, encontra
óbice na Súmula nº 283 do STF. 2. In casu, o acórdão recorrido assentou (fl. 642): ‘Júri. Duplo homicídio
duplamente qualificado. Atuação em plenário de julgamento de promotor de justiça estranho à comarca e
ao feito. Ferimento ao princípio do promotor natural. Nulidade reconhecida. Embora não previsto expres-
samente em lei, o princípio do promotor natural decorre de dispositivos constitucionais e é admitido na
doutrina e na jurisprudência, ainda que comportando alguma relativização. No caso, a atuação em plenário
de julgamento de um promotor de justiça estranho à comarca e ao feito, sem regular designação e estando
a titular da promotoria em pleno exercício de suas funções, constitui ferimento ao referido princípio e

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


acarreta a nulidade do julgamento. De outra banda, estando o réu preso há quase onze meses e pronun-
ciado há cerca de sete meses, está caracterizado o excesso de prazo na formação da culpa, impondo-se
a concessão de habeas corpus de ofício. Apelo provido, por maioria. Habeas corpus concedido de ofício,
por maioria’. 3. Agravo regimental no recurso extraordinário. Alegação de não cabimento de recurso
especial, porquanto o acórdão recorrido teria adotado a violação ao princípio do promotor natural como
fundamento autônomo e suficiente ao prover o recurso de apelação interposto contra a decisão proferida
pelo tribunal do júri. Argumentação insubsistente, dado que, tendo em vista a realidade processual e os
fatos jurídicos ocorridos na sessão do júri, o tribunal estadual assentou a violação a regras processuais e
o vício no ato de designação do promotor de justiça que fora designação para atuar tão somente na as-
sentada em que o recorrido seria submetido a julgamento, o que viria patentear a ocorrência de nulidade
após a pronúncia, razão pela qual o recurso de apelação foi conhecido com base no art. 593, III, a, do
CPP. 4. A reiterada jurisprudência do STF é no sentido de que ‘o princípio do promotor natural, tendo
presente a nova disciplina constitucional do Ministério Público, ganha especial significação no que se
refere ao objeto último decorrente de sua formulação doutrinária: trata-se de garantia de ordem jurídica
destinada tanto a proteger o membro da instituição, na medida em que lhe assegura o exercício pleno
e independente de seu ofício, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de
ver atuando, em quaisquer causas, apenas o promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios
abstratos e predeterminados, estabelecidos em lei’ (HC 67.759-2/RJ, Plenário, Rel. Min. Celso de Mello,
DJ 01.07.93). 5. Agravo regimental não provido” (STF. RE 638.757 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira
Turma, j. 09.04.2013, Acórdão Eletrônico DJe-078 Divulg 25.04.2013 Public 26.04.2013). O STJ apontou:
“JUIZ NATURAL. PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. DEPUTADO FEDERAL. JUÍZO SINGULAR. INCOM-
PETÊNCIA ABSOLUTA. INSTAURAÇÃO DE AÇÃO PENAL. RATIFICAÇÃO DE ATOS PROCESSUAIS.
IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA.
RECURSO PROVIDO. 1. A inobservância das regras processuais de competência em razão da prerroga-
tiva de função, de natureza absoluta, impõe a anulação de todo o processo-crime, inclusive da exordial
acusatória oferecida por órgão que não detinha a legitimidade ativa. 2. Recurso provido para anular o
Processo-Crime 2005.83.00.011539-1” (RHC 25.236/PE, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma,
j. 03.12.09, DJe 01.02.2010).
414 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

a pessoa que lavrou um acordo(9), carecendo nessa situação o MP dos requisitos do


art. 41 do CPP para oferecimento da denúncia.
A interação complementária entre Ministério Público e CADE deve ser necessá-
ria para fins de uma atuação conjunta para o combate a ilícitos administrativos, atos
de improbidade administrativa e ilícitos penais, em especial, porquanto um possui
legitimidade exclusiva para termo de cessação de conduta e o MP pode firmar os
termos de ajustamento de conduta, além da exclusiva titularidade da ação penal.

IV – CONCLUSÕES
À guisa de encerramento deste presente trabalho, temos que a elaboração de
acordo de leniência por parte do CADE não se afigura como uma medida que é
dotada de adequação constitucional por desrespeitar a titularidade da ação penal
que pertence ao MP (art. 129, I, da CRFB).
Não se cogita em violação ao princípio do venire contra factum propium, uma
vez que o acordo de leniência é elaborado sem a observância de regras constitucio-
nais sobre as atribuições institucionais do Ministério Público. Logo, não se pode
conferir validade a um acordo elaborado sem a participação do órgão que detém o
poder-dever de deflagrar a ação penal e a chancela do Poder Judiciário.
A insegurança jurídica trazida pelo acordo de leniência na lei de tutela da
concorrência é corrigida pela atuação dos profissionais em não elaborar o acordo
somente na presença do CADE, mas também com a atuação do Ministério Público
com atribuição para atuar no caso em homenagem ao princípio do promotor natural.
Desta feita, se evitaria a elaboração de acordos de leniência ineficazes perante
o titular da ação penal, expondo a pessoa que forneça as informações a uma situa-
ção de difícil resolução por ter prestado dados relevantes à descoberta de delitos e
posteriormente correr o risco de não ter suas informações gerando benefícios penais
em seu favor, a não ser apenas uma atenuante genérica da confissão.

(9) Anna Carolina Pereira Cesarino Faraco Leny explica: “Conforme a dicção do art. 395, II, do CPP,
a denúncia será rejeitada se for manifestamente inepta, caso careça de um pressuposto processual ou
condição da ação ou em não se observando a justa causa. Com efeito, havendo previsão de extinção da
punibilidade quando da celebração do acordo, consequentemente haverá falta de uma condição da ação,
de maneira que segundo os ditames da economia processual não é coerente a apresentação de denúncia.
Ademais, trazendo para o direito público a teoria do venire contra factum proprium, tradicionalmente
utilizada na teoria dos contratos, o Estado não é obrigado a legislar, mas quando o faz deve cumprir
suas determinações. Tal importação é plenamente possível, eis que o acordo de leniência possui natureza
contratual, de maneira que compromete ambos os lados que o assinam a cumprir sua parte com a devida
boa-fé. Também insta destacar que os entes que regulam o funcionamento do Estado em sua soberania
integram um todo indissolúvel, de modo que a alegação de que o Ministério Público tem a obrigação
de propor a denúncia talvez esconda um ranço de vaidade no sentido de afirmar poder e legitimidade
para o controle da força. Assim, a maneira como vem previsto o acordo de leniência no ordenamento
brasileiro, atrelado à insistência em propor ação penal contra o delator, acaba por ensejar grave quadro
de insegurança jurídica ao proponente, que se encontra em nítida posição de submissão ao arbítrio do
Estado” (LENY, Anna Carolina Pereira Cesarino Faraco. Acordo de leniência no Brasil traz insegurança
jurídica. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-ago-09/anna-carolina-lamy-acordo-leniencia-
brasil-traz-inseguranca-juridica>. Acesso em: 15 set. 2015).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 415

V – BIBLIOGRAFIA
BRITO GENTIL, Plínio Antônio; SANTOS LIMA, Charles Hamilton; LIVIANU,
Roberto; BERCLAZ, Márcio Soares; RODRIGUES, Tiago de Toledo; COSTA,
Gustavo Roberto. Intervenção do Ministério Público nos acordos de leniência é
imprescindível. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.
com.br/2015-out-12/mp-debate-intervencao-acordos-leniencia-imprescindiiv-
el>. Acesso em: 13 out. 2015.
CUSTÓDIO FILHO, Ubirajara; SANTOS, José Anacleto Abduch; BERTONCINI,
Mateus. Comentários à Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção). São Paulo: RT, 2014.
LENY, Anna Carolina Pereira Cesarino Faraco. Acordo de leniência no Brasil traz
insegurança jurídica. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-ago-09/
anna-carolina-lamy-acordo-leniencia-brasil-traz-inseguranca-juridica>. Acesso
em: 15 set. 2015.
LIVIANU, Roberto. Corrupção. Incluindo a nova Lei Anticorrupção. 2. ed. São Paulo:
Quartier Latin, 2014.
MOLAN GABAN, Eduardo; OLIVEIRA DOMINGUES, Juliana. Direito antitruste. 3.
ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


LIMITES E PERSPECTIVAS PARA A JUSTIÇA CRIMINAL

Paulo José Freire Teotônio


Graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP – Turma de
1990); Pós-Graduado (Especialização) pela Faculdade de Direito Municipal de
Franca; Mestre pela Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp/SP); ex-Coordenador
dos Cursos de Direito das Faculdades Unificadas de Barretos (Unifeb) e do
Instituto Municipal de Ensino de Bebedouro (IMESB-VC); Promotor de Justiça
do Ministério Público do Estado de São Paulo, na Comarca de Ribeirão Preto;
Professor no Curso de Direito das Faculdades Estácio-Uniseb e Unaerp.

Luís Augusto Freire Teotônio


Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdad de Derecho da Universidad
del Museo Social Argentino (UMSA) de Buenos Aires, Argentina; Especialista
em Direito Penal pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco da
Universidade de São Paulo; Juiz de Direito da 1ª Vara do Júri e das Execuções
Criminais de Ribeirão Preto, São Paulo; Coordenador do Deecrim; Professor da
Faculdade de Direito Laudo de Camargo da Universidade de Ribeirão Preto.

Luan Guilherme Dias


Acadêmico de Direito da Unaerp; Pesquisador e Estagiário do Ministério Público.

Luís Augusto Freire Teotônio Júnior


Acadêmico de Direito da PUC-SP e Pesquisador.

RESUMO
O presente estudo tem como objetivo analisar, de forma breve e sucinta,
as consequências da aplicação do direito penal na práxis cotidiana, revelando a
necessidade de o jurista guiar-se pelo princípio da dignidade da pessoa humana,
transformando-o em peça-chave da hermenêutica jurídica, a fim de buscar-se a ple-
na concretização dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, bem como a
humanização do aparato repressivo, pautando-o pelos princípios da razoabilidade e
da proporcionalidade. Não obstante, buscar-se-á apontar os limites e as perspectivas
da seara criminal brasileira, a fim de controlar-se o atual desenfreado poder punitivo
que, com a promessa não cumprida de segurança, aflige dor, agonia e sofrimento
para boa parte da população.
Palavras-Chave: Justiça Criminal. Poder Punitivo. Dignidade da Pessoa Hu-
mana.

TITLE: Limits and prospects for the criminal justice.


ABSTRACT
The present study is to analyze scope, so brief and succinct, the consequences of
the application of the Criminal Law in everyday praxis, revealing the need for a lawyer
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 417

be guided by the principle of the Dignity of the human person, by transforming it into
key part of legal hermeneutics, in order to seek the full realization of the foundations
of a Democratic State of Law, as well as the humanization of the repressive apparatus,
adhere to the principles of reasonableness and proportionality. Nevertheless, It will seek
to point out the limits and prospects for the Brazilian criminal realm, in order to check
out the current rampant punitive power that with the unfulfilled promise of security,
afflicting pain, agony and suffering a good deal of population.
Keywords: Criminal Justice. Punitive Power. Dignity of the Human Person.

SUMÁRIO
1 Dignidade da Pessoa Humana e Justiça. 2 A Justiça para Além do Positivismo
Reducionista. 3 Perspectivas para a Humanização da Justiça Criminal. 4 Hermenêu-
tica Jurídica e Justiça. 5 Considerações Finais. Bibliografia.

1. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E JUSTIÇA


O ponto central de qualquer discussão jurídica, máxime quando verte sobre a
liberdade do cidadão, é e sempre será o ser humano.
A civilização moderna, com efeito, optou por rechaçar a ditadura, os regimes
totalitários, o poder dos monarcas e dos tiranos, instituindo o conceito de Estado
Democrático de Direito, tendo como base o povo, sendo necessária a construção do

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


que se convencionou chamar de Estado (fruto da nossa maldade interior), antago-
nista da sociedade civil (derivada da nossa bondade interior), entendendo-se que a
existência de um governo seria necessária para a manutenção da ordem.
O homem é o começo e fim do ordenamento jurídico. É o centro do ordenamen-
to jurídico constitucional. Da existência e da razão humana derivam racionalmente
todas as regras e normas, inclusive as de direito criminal.
Desta forma, a resposta penal pela violação de um preceito tipificado concre-
tamente como ilícito pelo direito penal (preceito primário) deve ser a mais humana
entre as soluções possíveis, entre as hipóteses prováveis que se apresentam ao Estado-
juiz, mesmo porque, embora se pretenda atender também a fins de prevenção geral,
da segurança social, verifica-se que a intervenção, como ultima ratio, se realiza, cons-
tantemente, em casos particulares, individualizados, com fins de prevenção especial.
A infração penal, com efeito, ainda que possa ser enquadrada no mesmo preceito
ou espécie, do tipo furto, estupro, tráfico, lesões, dentre diversas outras prováveis,
no caso concreto submetido a exame perante os hermeneutas, terá sempre distinção,
com múltiplas variáveis e possibilidades, tais como as motivações, os antecedentes,
as circunstâncias e as consequências do crime, o modo de atuar do sujeito ativo,
o comportamento da vítima, que poderá ser relevante ou não para majoração ou
minoração da pena, e as reações da sociedade, que podem repercutir na necessidade
e/ou conveniência da decretação da custódia cautelar (prisão preventiva).
418 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

A assertiva mais apropriada para o que acima expusemos é a que reza que
“o homem não possui direitos, ele é o próprio direito”, posto que em nenhuma
hipótese se pode fracionar o conceito de dignidade humana, retirando-o do direito.
A dignidade da pessoa humana é conceito basilar, antecedente e fundamental, que
precede, inclusive, os princípios esculpidos no art. 5º da Magna Carta, sendo a
qualificação que deve permear todas as formas de atuação do Estado-administração,
além de servir como adjetivo indispensável a qualquer forma de pensar do direito
objetivo (normatividade).
Destarte, salutar as palavras de Carvalho (2008, p. 109-110):
“A estrutura do direito e do Estado não é justificada em si mesma, pois o
seu referencial é dirigido à dignidade da pessoa humana. A centralidade da pes-
soa e o respeito pelos direitos humanos determinam os critérios de justificação
externa do poder, delimitando os pressupostos normativos de tolerabilidade
do sistema. Se desde o seu interior direito e Estado são legitimados substan-
cialmente pelos direitos fundamentais, externamente são os direitos humanos
que propiciam os parâmetros avaliativos do seu nível de justiça, servindo de
norte ao próprio conteúdo do pacto social: a Constituição.”
De se consignar, assim, que os fatos sociais e as leis devem andar de braços
entrelaçados, de mãos coladas, caminhar juntos na distribuição equânime da justiça.
É fato, todavia, que a justiça não é um dado objetivo, algo concreto ou palpável
por si só. De tal forma, a busca pela justiça não deve ser reduzida à mera aplicação
das normas jurídicas estatais, vez que estas são apenas resultados de um fenômeno
histórico específico, nascidas em determinadas relações sociais, não necessariamente
ligadas à ideia de justiça.
O apego exagerado à norma e à ordem da maioria dos juristas, na maioria dos
casos, repele qualquer expressão da justiça que esteja além da legislação, esquecendo-
se da velha máxima que apregoa: nem tudo que é legal é justo.

2. A JUSTIÇA PARA ALÉM DO POSITIVISMO REDUCIONISTA


A justiça, enquanto função indispensável do Estado, deve ter um papel social
relevante de satisfação das aspirações da sociedade e pacificação social dos conflitos,
vez que a sociedade reclama dos magistrados, cada vez com maior ênfase, que este-
jam ao lado da lei, circundando-a em todos os aspectos da observação, mas sempre
diante dos fatos, da verdade, da necessária ponderação do que é justo e correto, o
que, por vezes, pode afastar a hipótese da incidência da lei ao caso concreto, fazendo
com que, na concreção da norma, seja necessária a prévia invocação dos fundamen-
tos do Estado Democrático de Direito e dos princípios constitucionais correlatos,
hipótese que poderá levar ao afastamento da aplicação da norma positiva diante do
caso concreto em análise.
Quando nossos olhos postam-se perante a justiça, no momento em que a
norma é aplicada em cada caso concreto em análise perante as Varas e os Tribunais,
devemos nos ater à ideia central e basilar de pacificação dos conflitos, no atendi-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 419

mento aos anseios da sociedade, cada vez mais sedenta e conclamando por justiça,
mas não por qualquer justiça, mas aquela acoimada e tão profundamente buscada,
justiça social, com distribuição de oportunidades, afastamento das iniquidades e
preconceitos seculares.
Para o positivismo jurídico, a questão da justiça está além do direito, tratando-se
de questão metajurídica. O direito hodiernamente identifica-se com a ordem nor-
mativa dominante, produzida e reconhecida pelo Estado, já que traduz segurança
e estabilidade.
Nesse diapasão, imperioso trazer à baila os ensinamentos de Alysson Mascaro
(2008, p. 99-100):
“A legalidade, assim sendo, resta instrumentalizada sempre de maneira
exponencialmente vertical, tendo em vista a fragilidade da resposta das classes
dominadas. (...) As relações internas da própria atividade capitalista nacional
também instrumentalizam a legalidade a benefício da dominação de classe,
seja por meio do controle das instituições e daí manejando as ferramentas da
legalidade de acordo com seus interesses, seja por meio de ações nos limites
da própria legalidade, ou seja por meio da sua recusa. Os privilégios de classe
recebem, assim, ou respaldo legal ou, na efetividade social, ignoram mesmo a
legalidade, no caso da universalidade desta.”
No período de pós-modernidade, com efeito, a liberdade do cidadão reside na
certeza de que cada um tem a sua segurança, de forma a não temer seu semelhante

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


e o próprio Estado, preconizada pelo brocardo que prega que “o seu direito vai até
onde confronta com o direito alheio e com os anseios sociais”. A falada segurança
somente reside onde efetivamente existir e prevalecer o princípio da legalidade,
lembrando que ninguém seja constrangido a fazer as coisas que a lei não obrigue e
a deixar de fazer aquelas que a lei permita.
Ao jurista, no positivismo, cabe exclusivamente aplicar a regra, ainda que
ilegítima, inadequada, ultrapassada e às vezes até arbitrária. Nada traduz melhor o
positivismo como a redução do direito à ordem estabelecida, intitulada como positi-
vismo legalista ou formalista, que se sustenta em um discurso lógico, perfeitamente
articulado, tido como científico e construído através da reivindicação de um direito
como objeto (apenas norma) e método (lógico-dedutivo) próprio, tornando o Estado
impessoal, abstrato e universal, já que pretende falar em nome de todos.
Com tais parâmetros, sustenta-se que o conceito de norma deve estar restrito
ao propalado dogma de norma legítima, que é aquela elaborada de acordo com a
sociedade, com as vontades legítimas da maioria do povo, a quem ela se dirige,
posto que as outras não são verdadeiras normas, são meras imposições arbitrárias.

3. PERSPECTIVAS PARA A HUMANIZAÇÃO DA JUSTIÇA CRIMINAL


Necessário, certamente, repensar o trabalho dos magistrados, com uma postura
crítica e autocrítica, para que se tenha maior preocupação com o resultado final,
com a justiça de suas decisões, para que se deixem contagiar necessariamente pelos
420 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

problemas sociais, com plena consciência de que, muitas vezes, o apego exagerado
à norma, através de seu frio texto, o transformaria em mero instrumento de interes-
ses arbitrários e mesquinhos, um mero robô, enfim, um corpo sem alma e cérebro.
Nesse contexto, devemos ponderar que as nossas leis são produzidas pela elite
política e econômica, quase sempre dissociadas da vontade da maioria do agrupa-
mento social, contagiadas pelo espírito do “levar vantagem”, das consignações de
caráter pessoal ou de grupo, dos enquadramentos preconceituosos e sem qualquer
base na comunidade em que vivemos e labutamos.
Assim, vivemos no Brasil um processo de técnica legislativa equivocada, com
evidente viés demagógico, sem qualquer base ou critério técnico, que não leva em
consideração fenômeno penal de suprema importância, qual seja a da consideração da
prevenção, em nome de uma pretensa segurança e de uma paz falaciosa, muito mais
discursiva do que propriamente efetiva, como bem ensina Ferrajoli (2004, p. 319):
“A segurança e a liberdade de cada um são, com efeito, ameaçadas não
apenas pelos delitos, mas também, e frequentemente, em medida ainda maior,
pelas penas despóticas e excessivas, pelas prisões e pelos processos sumários,
pelos controles arbitrários e invasivos da polícia, vale dizer, por aquele conjunto
de intervenções que se denomina ‘justiça penal’, e que talvez, na história da
humanidade, tenha custado mais dores e injustiças do que todos os delitos
cometidos.”
O caminho de humanização da justiça e do direito, como outrora havia in-
vocado os pensadores mais arejados, é árduo, sendo, contudo, hodiernamente,
inevitável e urgente.
É certo que nos defrontamos com resistências naturais, de índole conservadora.
Não é menos correto, de outro lado, que temos os questionamentos sociais tendentes
a reclamar modificações, principalmente ante o fato de que o direito não é estático,
estando constantemente reclamando alterações, através de uma nova postura, sem
que tal possa redundar em inflação legislativa e leis conflitantes e inócuas do ponto
de vista social.
Necessário ter a compreensão, então, que a função do aplicador do direito, o
Estado-juiz, desta forma, é ajustar a generalidade e abstração dos termos da lei às
peculiaridades dos casos concretos submetidos a exame, com as nuances acima refe-
ridas (circunstâncias, motivação, reação, repercussão, etc., diferentes em cada caso).
Há, por assim dizer, um alto grau de descricionariedade, sempre tendo como
parâmetro o perfil desenhado em lei, para aqueles que atuam perante a jurisdição
criminal, posto que, entre a descrição abstrata e provisória da lei e a aplicação defini-
tiva e concreta realizada pelos magistrados, sempre são encontradas diversas nuances
que dependerão da análise subjetiva do hermeneuta (processo de interpretação).
A norma penal, desta forma, apenas destaca um paradigma (sempre genérico,
abstrato) para servir de base ao início de apreciação pelo Poder Judiciário, o qual,
para chegar a conclusões definitivas, deve percorrer um longo caminho analítico,
desenvolvido de forma dialética, para o qual contribuem necessariamente acusação
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 421

e defesa, dentro do primado mater do devido processo legal, regra basilar do pro-
cedimento penal pátrio.
Conclui-se, sem qualquer esforço, que as condutas humanas submetidas a
julgamento por violação de um preceito abstrato contido na legislação penal estão
sempre sujeitas a critérios amplos e com infinita variedade de soluções.
Da conclusão acima exposta, consideradas a generalidade e a abstração da
norma penal, devemos extrair outra, ou seja, a necessidade de afastarmos mitos, pre-
conceitos, prejulgamentos, iniquidades arraigadas na tradição processual brasileira.
Na verdade, um ordenamento que visa regular a conduta humana de forma
externa, bilateral e coercitiva, nos dizeres de Karl Engish(1), se ocupa da vida.
Em pertinente observação, Maximiliano (1967, p. 73) afirma que
“a vida sociojurídica não é composta de casos gerais, senão de casos
concretos e os mais diversos, dos quais a simples justiça que se supõe existir
na lei nem sempre é suficiente para atender equilibradamente a essa infinita
casuística. Assim, é, por vezes, mister o suprimento do princípio da justiça
contido na lei por intermédio de um outro princípio, àquele semelhante, mas
sob outros aspectos mais extensos e mais altos, o princípio da equidade.”
A missão da justiça criminal, desta forma, mais do que “solucionar conflitos”
é a de proferir a decisão mais razoável possível, dentro do critério do bom senso, na
medida proporcional entre a infração, caso ocorrida, e a pena a ela cominada, dentre

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


tantas hipóteses previamente descritas nos diplomas penais.
Emerge daí a preocupação de erigir o homem ao topo das preocupações do
julgador, o que torna imperioso o afastamento do caráter tecnocrata, acrítico e de-
sumano desenhado na norma.

4. HERMENÊUTICA JURÍDICA E JUSTIÇA


O magistrado, que antes de técnico deve ser um humanista, deve ir muito
mais além da consideração meramente dogmática da norma, posto que ela deve
atender concretamente à finalidade de servir ao ser humano enquanto integrante
de determinada coletividade, o que obriga o julgador a dar primazia à análise social
dos fatos submetidos ao seu exame, com muito mais profundidade do que a abstrata
avaliação positivista.
A superação dos limites individuais da apreciação da responsabilização penal,
com sua inserção no ambiente ou sistema social, é imprescindível na ponderação
do justo, do razoável e do proporcional, posto que o homem não existe dissociado
da sociedade em que vive integrado, sendo, conforme anotamos anteriormente, a
razão, a essência e a finalidade da norma.

(1) ENGISH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 6. ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1983.
422 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

De se notar, por outro lado, que a finalidade basilar do processo penal é, antes
de tudo e fundamentalmente, a busca da verdade real, erigida como princípio do
sistema, inserido dentro do postulado do due process of law.
Desta forma, para obtenção da verdade, finalidade de qualquer procedimento
penal, devemos considerar as circunstâncias do caso concreto, em atendimento ao
bom senso e à humanidade, como a motivação peculiar, as reações da vítima, o perfil
social dos envolvidos, as consequências sociais da infração, a repercussão do crime
em face dos valores morais existentes, etc.
A jurisprudência justa, mais apropriada ao caso concreto em análise, assim,
é aquela que visa impedir novos delitos, não apenas punir certa e determinada
pessoa, sendo razoável considerar a missão do direito penal como a de possibilitar
a convivência social harmônica, não podendo ficar restritivamente preso na ideia
exclusiva de retribuição.
O discurso punitivista desenfreado, assim sendo, torna-se o grande responsável
por girar os nossos moinhos de gastar gente e verticalizar ainda mais o poder social,
como bem alerta Zaffaroni (2013, p. 32):
“Desde a inquisição até hoje os discursos foram se sucedendo com idêntica
estrutura: alega-se uma emergência como uma ameaça extraordinária que coloca
em risco a humanidade, quase toda a humanidade, a nação, o mundo ociden-
tal, etc., e o medo da emergência é usado para eliminar qualquer obstáculo ao
poder punitivo que se apresenta como a única solução para neutralizá-lo. Tudo
o que se quer opor ou objetar a esse poder é também um inimigo, um cúmplice
ou um idiota útil. Por conseguinte, vende-se como necessária não somente a
eliminação da ameaça, mas também a de todos os que objetam ou obstaculizam
o poder punitivo, em sua pretensa tarefa salvadora.” (grifos do autor)
O poder punitivo, não obstante, necessita ser limitado e usado com parcimô-
nia, sob pena de transformarmos determinados grupos em inimigos portadores de
uma doença mortal e acabarmos vitimados pelos próprios remédios adotados: penas
despóticas e excessivas, prisões e processos sumários e pelo controle autoritário da
polícia.
Nesse ínterim, Antônio Alberto Machado(2) é certeiro ao alertar sobre a ameaça
que a desenfreada repressão penal representa para a efetivação dos direitos humanos:
“A repressão penal, desencadeada preferencialmente contra as classes
populares, é uma repressão seletiva, discriminatória e, portanto, arbitrária.
Logo, atua com sérias restrições aos princípios constitucionais da isonomia,
do contraditório e da ampla defesa, os quais compõem o chamado ‘devido pro-
cesso legal’. A atuação seletiva e, portanto, discriminatória, do processo penal
é já uma forma de agressão aos direitos humanos e configura até mesmo uma
espécie de abuso de poder, isto é, abuso do poder que controla violentamente

(2)
MACHADO, Antônio Alberto. A miséria e as misérias do processo penal. Disponível em: <http://avessoedireito.
com/2011/02/26/a-miseria-e-as-miserias-do-processo-penal/>. Acesso em: 10 jul. 2014.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 423

as classes dominadas por meio do direito penal. É justamente por causa da


atuação seletiva e discriminatória desse poder que um conhecido autor norte-
americano, Loïc Waquant, percebeu que nas sociedades estratificadas o sistema
punitivo, no fundo, realiza uma espécie de ‘administração penal da miséria’.”
Se a resposta penal, por exemplo, não for necessária à finalidade de coibir a
prática de novos delitos, por evidente deve o magistrado, naquele caso concreto sub-
metido ao seu exame, reconhecer a injustiça de uma eventual condenação criminal,
absolvendo ou deixando de aplicar pena a determinado comportamento específico,
em atendimento da razoabilidade e da proporcionalidade.
No âmbito penal, desta forma, em atendimento à razoabilidade, deve prepon-
derar, acima do preceito positivado, os interesses dos envolvidos, ou seja, a vítima
(direta), a sociedade (vítima indireta) e o acusado (autor do fato criminoso), com
a adequação da sanção (adequação social da conduta ou comportamento humano),
se constatada necessária, em face da proporcionalidade, aos fatos peculiares con-
cretamente postos.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O direito penal, do modo como é hoje aplicado, de forma mecânica e desprovido
de maiores considerações de ordem sociológica, longe de solucionar conflitos, atu-
ando de modo meramente burocrático e positivista, acaba por agravar os problemas
sociais, uma vez que, por vezes, chega a uma resposta que não interessa a ninguém,

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


como, verbi gratia, foi o caso da custódia cautelar e posterior condenação de uma
mulher que subtraiu um pote de manteiga.
Indispensável, nesse passo, as ponderações do sociólogo francês Loïc Wacquant
(1999, p. 09), sobre o atual paradigma do sistema criminal brasileiro:
“A insegurança criminal no Brasil tem a particularidade de não ser ate-
nuada, mas nitidamente agravada pela intervenção das forças da ordem. O uso
rotineiro da violência letal pela polícia militar e o recurso habitual à tortura por
parte da polícia civil (através do uso da ‘pimentinha’ e do ‘pau-de-arara’ para
fazer os suspeitos ‘confessarem’), as execuções sumárias e os ‘desaparecimentos’
inexplicados geram um clima de terror entre as classes populares, que são seu
alvo, e banalizam a brutalidade no seio do Estado. Uma estatística: em 1992, a
polícia militar de São Paulo matou 1.470 civis – contra 24 mortos pela polícia
de Nova York e 25 pela de Los Angeles –, o que representa 1/4 das vítimas de
morte violenta da metrópole naquele ano. É de longe o recorde absoluto das
Américas. Essa violência policial inscreve-se em uma tradição nacional multis-
secular de controle dos miseráveis pela força, tradição oriunda da escravidão
e dos conflitos agrários, que se viu fortalecida por duas décadas de ditadura
militar, quando a luta contra a ‘subversão interna’ se disfarçou em repressão
aos delinquentes. Ela apóia-se numa concepção hierárquica e paternalista da
cidadania, fundada na oposição cultural entre feras e doutores, os ‘selvagens’
e os ‘cultos’, que tende a assimilar marginais, trabalhadores e criminosos, de
424 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

modo que a manutenção da ordem de classe e a manutenção da ordem pública


se confundem.” (grifos do autor)
Contrariamente, para atendimento dos paradigmas constitucionais, inclusive
o do fundamento basilar da dignidade da pessoa humana, antecedente adjetivo de
qualquer paradigma hermenêutico, deveria ter como referência o primado social, do
caráter humano do direito, devendo ser orientado não para retribuir, mas compor
os conflitos, de modo a ser socialmente útil, levando a um resultado socialmente
defensável e justo.
A lógica criminal, por tal razão, deve estar vinculada ao crescimento e ao
desenvolvimento sociais, para que possa ter respostas institucionais à altura das
infrações e dos seus prováveis autores, sejam ricos, pobres, governantes, desempre-
gados, empresários e, com maior enfoque, ao crime organizado, dentro ou fora da
máquina estatal.
Contudo, a intervenção penal não pode satisfazer-se com o mero castigo,
devendo ser razoável a consecução do objetivo de pacificar socialmente, servindo
a coibir novas infrações, caminhando ao largo do conceito de Justiça Distributiva,
sinônimo de Justiça Social.
Do mesmo modo, a retrógrada ideia de um direito penal meramente retribu-
tivista deve ser expelida. Nesse ínterim, imperiosas as palavras de Marta Machado
e Maíra Machado (2013, p. 345):
“Este tipo de argumentação associa a resposta do direito penal sempre
com a punição como um mal – já que apenas a violência estatal satisfaria os
desejos de vingança da vítima e da comunidade. Além disso, associa o não
estatal com o pré-moderno, isto é, sem o mal praticado pelo Estado, estaria
recolocado o risco de anomalia – caos, linchamentos, guerra de todos contra
todos. Esse argumento é frágil, pois ignora a existência de um amplo repertório
de mecanismo e estratégias de resolução de conflitos que se desenvolveram
em paralelo ao aparato estatal.”
Cada caso submetido a exame perante o Estado-juiz, por conclusão, deve ter
uma solução particularizada, adequada àquela específica situação, partindo-se sempre
do pressuposto de que o Estado é obrigado a garantir todas as condições sociais para
que as pessoas vivam dignamente, o que importa no binômio da máxima distribuição
de direitos sociais com o mínimo de intervenção do direito penal. A frustração das
garantias sociais, a toda evidência, não pode levar ao socorro da mera aplicação das
sanções penais, como costumeiramente é feito pelo legislador brasileiro, hipótese em
que, antes de mais nada, caberia intervenção do Estado-juiz, não para punição do
cidadão, mas para cobrança, exigência e responsabilização do Estado-Administração.
Sob pena de banalizar-se o mal e perder-se a capacidade de indignação (Arendt),
a violência, a sanção e o cárcere não podem ser as únicas respostas do Estado-juiz,
devendo o julgador pautar-se pela efetiva consagração dos preceitos constitucionais.
A interpretação, portanto, deve ser entendida como um complexo ato de cria-
ção, não como uma atividade de contemplação da norma positiva.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 425

A intervenção penal merece ser rechaçada, quando revelar ser inadequada, posto
que muito superior ao entendimento do mero castigo, que apenas tem o condão de
excluir e marginalizar pessoas, desumanizando o direito (razoabilidade).
A existência de princípios constitucionais garantidores de direitos fundamen-
tais, com efeito, gera para a população em geral, no âmbito da ética, expectativa
de respeito e cumprimento por parte dos agentes do Poder Público, impondo aos
aplicadores do direito o dever de observância e a busca dos meios necessários para
sua efetiva realização no plano da práxis.
Quando presente condição para a intervenção, por fim, em nome do senso
de justiça, a pena a ser imposta deve guardar correlação com as circunstâncias
concretamente consideradas, afastando-se o hermeneuta da falácia de considerar
apenas abstratamente o conteúdo da norma positivada, posto que, para prevenir, a
reprimenda deve ser proporcional ao fato peculiar, não à letra fria da lei, considerada
na sua generalidade (proporcionalidade).
Enfim, o que propomos e defendemos ao longo do presente trabalho é a hu-
manização da aplicação do direito penal, sempre levando em consideração o que
há de mais relevante para o direito pátrio, ou seja, a adjetivação da dignidade e a
análise prévia dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, inseridos em
um grande número de outros princípios, mesmo que de forma indireta.
O homem e sua racionalidade são, por essência, a razão e a finalidade do
direito, só sendo justificável a intervenção, acoimada de justa, do Estado-juiz para

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


aplicação e distribuição de Justiça Social, com a dignidade que lhe é peculiar, dentro
da medida do certo e do justo.

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DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL –
AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO E COMPETÊNCIA CRIMINAL

Gustavo Filipe Barbosa Garcia


Livre-Docente pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo; Doutor
em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo; Especialista
em Direito pela Universidad de Sevilla; Pós-Doutorado em Direito pela
Universidad de Sevilla; Professor Titular do UDF; Membro Pesquisador do IBDSCJ;
Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Titular da Cadeira 27;
Advogado e Consultor Jurídico; ex-Juiz do Trabalho das 2ª, 8ª e 24ª Regiões;
ex-Procurador do Trabalho do Ministério Público da União; ex-Auditor-Fiscal do
Trabalho.

RESUMO
Em tese, a ausência de anotação na CTPS da vigência do contrato de trabalho
é considerada crime de falsificação de documento público. Logo, deve-se analisar
a Justiça competente quanto ao referido delito. Prevalece o entendimento de que a
Justiça do Trabalho, mesmo depois da EC nº 45/04, não tem competência criminal.
Ainda assim defende-se o entendimento de que a matéria em estudo deveria ser
disciplinada e sancionada, de modo pleno e eficaz, nos âmbitos administrativo,
civil e trabalhista, mas não criminal, uma vez que nem todos os ilícitos devem ser
abrangidos pelo direito penal, ao qual se reserva a tutela dos valores essenciais à
vida em sociedade.
Palavras-Chave: Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS. Ausência
de Anotação. Competência Criminal.

TITLE: Labour and social security – annotation absence and criminal jurisdiction
ABSTRACT
In theory, the lack of annotation in the labour and social security the term of the
employment contract is considered a crime of public document falsification. Therefore,
one should analyze the competent Court as to that offense. Prevails the understanding that
the Labor Court, even after the EC no. 45/04, does not have criminal jurisdiction. Still it
defends the understanding that the matter under consideration should be disciplined and
sanctioned, fully and effectively, administrative, civil and labor fields, but not criminal,
since not all offenses should be covered by criminal law, which reserves the protection of
the essential values of life in society.
Keywords: Labour and Social Security – CTPS. Note Absence. Criminal Jurisdiction.

A CTPS tem a finalidade de documentar e comprovar o contrato de trabalho,


bem como o tempo de serviço do empregado, para fins trabalhistas e previdenciários.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 429

Trata-se de documento de grande importância por ter como objetivo a identi-


ficação profissional do trabalhador(1).
A CTPS é emitida pelas Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego ou,
mediante convênio, pelos órgãos federais, estaduais e municipais da Administração
direta ou indireta (art. 14 da CLT).
Não havendo convênio com os órgãos indicados, ou na inexistência destes,
pode ser admitido convênio com sindicatos para o mesmo fim.
Em conformidade com o art. 16 da CLT, a CTPS, além de número, série, data
de emissão e folhas destinadas às anotações pertinentes ao contrato de trabalho e
as de interesse da Previdência Social, deve conter: fotografia, de frente, modelo 3
x 4; nome; filiação; data de nascimento, naturalidade e assinatura; nome, idade e
estado civil dos dependentes; e número do documento de naturalização, ou data
da chegada ao Brasil e demais elementos constantes da identidade de estrangeiro,
quando for o caso.
A Portaria MTE nº 210, de 29 de abril de 2008, dispõe sobre a confecção de
“CTPS informatizada”, contendo o denominado “Cartão de Identificação do Traba-
lhador – CIT”. A CTPS deve ser obrigatoriamente apresentada, contra recibo, pelo
trabalhador ao empregador que o admitir, o qual tem o prazo de 48 horas para nela
anotar, especificamente, a data de admissão, a remuneração e as condições especiais,
se houver, sendo facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico,
conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho (art. 29 da CLT).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


As anotações concernentes à remuneração devem especificar o salário, qualquer
que seja sua forma de pagamento, seja em dinheiro ou em utilidades, bem como a
estimativa da gorjeta. As anotações na CTPS devem ser feitas na data-base; a qual-
quer tempo, por solicitação do trabalhador; no caso de rescisão contratual; e quando
houver necessidade de comprovação perante a Previdência Social.
A falta de cumprimento pelo empregador do disposto no art. 29 da CLT acar-
retará a lavratura do auto de infração, pelo auditor-fiscal do trabalho, que deve co-
municar, de ofício, a falta de anotação ao órgão competente, para o fim de instaurar
o processo de anotação, previsto nos arts. 36 a 39 da CLT.
É vedado ao empregador efetuar anotações desabonadoras à conduta do empre-
gado em sua CTPS, sob pena de multa administrativa e, conforme o caso, havendo
afronta a direito da personalidade, condenação em indenização por danos morais.
Os acidentes do trabalho devem ser obrigatoriamente anotados pelo Instituto
Nacional de Previdência Social na CTPS do acidentado (art. 30 da CLT).
Segundo o art. 40 da CLT, as CTPS que forem regularmente emitidas e anotadas
servem de prova nos atos em que sejam exigidas carteiras de identidade e especial-
mente nos casos de dissídio na Justiça do Trabalho entre a empresa e o empregado,

(1) Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de direito do trabalho. 8. ed. São Paulo: Método, 2015.
p. 158-161.
430 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

por motivo de salário, férias ou tempo de serviço; perante a Previdência Social, para
o efeito de declaração de dependentes; e para cálculo de indenização por acidente
do trabalho ou moléstia profissional.
Na verdade, a prova do contrato individual do trabalho deve ser feita pelas
anotações constantes da CTPS ou por instrumento escrito, mas pode ser suprida
por todos os meios permitidos em direito (art. 456 da CLT).
Sendo assim, de acordo com a Súmula nº 12 do TST, “as anotações apostas
pelo empregador na carteira profissional do empregado não geram presunção juris
et de jure, mas apenas juris tantum”.
No mesmo sentido, a Súmula nº 225 do STF confirma que “não é absoluto o
valor probatório das anotações da carteira profissional”.
Observados os aspectos acima, discute-se se a ausência de anotação do contra-
to de trabalho na CTPS do empregado configura delito, ou seja, ilícito de natureza
criminal.
O art. 49 da CLT dispõe que para os efeitos da emissão, da substituição ou de
anotação de CTPS, deve-se considerar como crime de falsidade, com as penalidades
previstas no art. 299 do CP: fazer, no todo ou em parte, qualquer documento falso
ou alterar o verdadeiro; afirmar falsamente a sua própria identidade, filiação, lugar
de nascimento, residência, profissão ou estado civil e beneficiários, ou atestar os
de outra pessoa; servir-se de documentos por qualquer forma falsificados; falsificar,
fabricando ou alterando, ou vender, usar ou possuir CTPS que assim tiver sido
alterada; anotar dolosamente em CTPS ou registro de empregado, ou confessar ou
declarar em juízo ou fora dele, data de admissão em emprego diversa da verdadeira.
O art. 299 do CP, ao tipificar o crime de falsidade ideológica, assim prevê:
“Art. 299. Omitir, em documento público ou particular, declaração que
dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa
da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou
alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público,
e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular.
Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime
prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento
de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.”
Comprovando-se falsidade, quer nas declarações para emissão de CTPS, quer
nas respectivas anotações, o fato deve ser levado ao conhecimento da autoridade
que houver emitido a carteira, para fins de direito (art. 50 da CLT).
De forma mais específica quanto ao tema em estudo, o CP, no art. 297, dispõe
sobre o crime de falsificação de documento público, com a seguinte redação:
“Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar
documento público verdadeiro:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 431

Pena – reclusão, de dois a seis anos, e multa.


§ 1º Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se
do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.
§ 2º Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado
de entidade paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as
ações de sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular.
§ 3º Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir: (incluído pela
Lei nº 9.983, de 2000)
I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja
destinado a fazer prova perante a previdência social, pessoa que não possua
a qualidade de segurado obrigatório; (incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em do-
cumento que deva produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa
ou diversa da que deveria ter sido escrita; (incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relaciona-
do com as obrigações da empresa perante a previdência social, declaração falsa
ou diversa da que deveria ter constado. (incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
§ 4º Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no
§ 3º, nome do segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


de trabalho ou de prestação de serviços (incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)”
O crime previsto no art. 297, § 3º, do CP é comissivo, no sentido de inserir
ou fazer inserir dados falsos. Diversamente, o crime previsto no art. 297, § 4º, do
CP é omissivo.
Nas duas hipóteses os crimes são formais, não havendo necessidade de se
concretizar o resultado ou eventual prejuízo.
Como se pode notar, em tese, a ausência de anotação na CTPS da vigência
do contrato de trabalho é considerada crime de falsificação de documento público.
Logo, deve-se analisar a Justiça competente quanto ao referido delito.
Prevalece o entendimento de que a Justiça do Trabalho, mesmo depois da EC
nº 45/04, não tem competência criminal(2).
Nesse sentido, o STF deferiu medida cautelar na ADI 3.684-0, com efeito ex
tunc, atribuindo interpretação conforme à Constituição aos incisos I, IV e IX do seu
art. 114, e decidiu que no âmbito da Justiça do Trabalho não está incluída compe-
tência para processar e julgar ações penais (STF, Pleno, ADIn 3.684-0/DF, Rel. Min.
Cezar Peluso, DJ 03.08.07).

(2)
Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito processual do trabalho. 4. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 149-151.
432 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Em consonância com o art. 109, IV, da CR, aos juízes federais compete proces-
sar e julgar “os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de
bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas
públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar
e da Justiça Eleitoral”.
Frise-se que a hipótese em estudo não está prevista nos “crimes contra a or-
ganização do trabalho”, conforme arts. 197 a 207 do CP, por se tratar, na verdade,
de “crime contra a fé pública”, mais especificamente de “falsidade documental”.
Anteriormente, a Súmula nº 62 do STJ assim previa: “Compete à Justiça Estadual
processar e julgar o crime de falsa anotação na Carteira de Trabalho e Previdência
Social, atribuído a empresa privada”.
Pode-se dizer, entretanto, que esse entendimento ficou superado, como se
observa no seguinte julgado:
“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ART. 297, §§ 3º, II, E 4º,
DO CP. OMISSÃO DE LANÇAMENTO DE REGISTRO OU DECLARAÇÕES
FALSAS NA CTPS. INTERESSE DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. COMPETÊNCIA
DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. O agente que omite dados ou faz declarações falsas
na CTPS atenta contra interesse da autarquia previdenciária e estará incurso nas
mesmas sanções do crime de falsificação de documento público, nos termos
dos §§ 3º, II, e 4º do art. 297 do CP. Competência da Justiça Federal. 2. O su-
jeito passivo principal do delito é o Estado, ficando o empregado na condição
de vítima secundária. 3. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo
Federal da 5ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Estado de São Paulo, ora
suscitado.” (STJ, 3ª Seção, CC 97.485/SP, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 17.10.08)
Não obstante, mais recentemente, o Ministro Marco Aurélio, do STF, em 21 de
setembro de 2015, proferiu a seguinte decisão:
“COMPETÊNCIA. CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. MINIS-
TÉRIO PÚBLICO ESTADUAL E FEDERAL. OMISSÃO DE ANOTAÇÃO DE
DADOS EM CARTEIRA DE TRABALHO. DEFINIÇÃO. 1. O assessor Dr.
Alexandre Freire prestou as seguintes informações: o conflito negativo de atri-
buição concerne a procedimento voltado a apurar a suposta prática de crime
de omissão de anotação de dados relativos a contrato de trabalho na – CTPS
(art. 297, § 4º, do CP). O Ministério Público Federal remeteu os autos ao
Ministério Público do Estado de São Paulo. Este suscitou o conflito negativo,
afirmando incumbir àquele a condução da investigação. A Procuradoria-Geral
da República manifesta-se pela admissão do conflito negativo de atribuição,
para reconhecê-la como sendo do MPF. 2. Preliminarmente, assento cumprir ao
Supremo a solução de conflitos de atribuições entre o MPF e o MP estadual –
Petição 3.528/BA, de minha relatoria, Diário da Justiça de 3 de março de 2006.
Define-se o conflito considerando a matéria objeto do procedimento de origem,
devendo ser levados em conta os fatos motivadores da atuação do Ministério
Público. Quando se trata de investigar prática de possível crime de omissão de
anotação de dados relativos a contrato de trabalho na – CTPS (art. 297, § 4º, do
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 433

CP), a atribuição, para qualquer ação, é do Ministério Público estadual, e não do


Federal, pois inexiste lesão a bem ou interesse da União bastante a potencializar
a atração da competência da Justiça Federal, o que direciona à competência da
Justiça Comum estadual para processar e julgar eventual ação penal, consoante,
inclusive, enuncia a Súmula nº 107 do STJ. 3. Ante o quadro, resolvo o conflito
no sentido de reconhecer a atribuição do Ministério Público estadual.” (STF,
Pet 5.084/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, DJe 28.09.2015)
Cabe esclarecer que a mencionada Súmula nº 107 do STJ dispõe que: “Com-
pete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime de estelionato praticado
mediante falsificação das guias de recolhimento das contribuições previdenciárias,
quando não ocorrente lesão à autarquia federal”.
A rigor, no caso do art. 297, § 4º, do CP, pode-se dizer que o tipo penal envolve
interesse da Previdência Social(3), mais especificamente da autarquia previdenciária,
integrante da Administração federal indireta, tanto que se trata de falsificação de
documento público.
Ainda assim, defende-se o entendimento de que a matéria em estudo deveria
ser disciplinada e sancionada, de modo pleno e eficaz, nos âmbitos administrativo,
civil e trabalhista, mas não criminal, uma vez que nem todos os ilícitos devem ser
abrangidos pelo Direito Penal, ao qual se reserva a tutela dos valores essenciais à
vida em sociedade.
De todo modo, quando a própria existência da relação de emprego é verda-
deiramente controvertida e duvidosa, não havendo a intenção do agente de omitir

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


em CTPS a anotação da vigência de contrato de trabalho, pode-se dizer que não se
observam os elementos do tipo penal em questão.
Cabe, portanto, acompanhar a evolução da jurisprudência, em especial do STF,
notadamente em composição colegiada, a respeito do controvertido tema.

(3)
Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito da seguridade social. Rio de Janeiro: Forense,
2015. p. 618-620.
DA CRIMINALIZAÇÃO REGULAMENTAR EM MATÉRIA
DE EFLUENTES AMBIENTAIS

Magno Federici Gomes


Pós-Doutor em Direito Público e Educação pela Universidade Nova de Lisboa
– Portugal; Pós-Doutor em Direito Civil e Processual Civil; Doutor em Direito
e Mestre em Direito Processual pela Universidad de Deusto – Espanha; Mestre
em Educação pela PUC Minas; Professor do Mestrado Acadêmico em Direito
Ambiental e Sustentabilidade na Escola Superior Dom Helder Câmara; Professor
Adjunto da PUC Minas e Professor Titular Licenciado da Faculdade de Direito
Arnaldo Janssen; Advogado Sócio do Escritório Raffaele & Federici Advocacia
Associada.

Fernando Marques Khaddour


Bacharel em Direito; Advogado Militante; Especialista em Direito Criminal;
Mestrando em Direito Ambiental e Sustentabilidade na Escola Superior Dom
Helder Câmara.

RESUMO
A presente pesquisa teve por finalidade abordar as competências legislativas em
matéria criminal, tendo em vista o exposto na Resolução nº 430/2011 do Conselho
Nacional do Meio Ambiente (Conama), na qual foi criada a criminalização (tipos
penais) pelas práticas previstas na mesma Resolução, utilizando, no entanto, a pu-
nição existente na Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais). Assim, analisam-se,
além da competência legislativa, os princípios penais, a Lei nº 9.605/98 e a própria
Resolução nº 430/2011, para se chegar ao problema, que é o fato de existir ou não
abuso de direito regulamentar na tipificação de condutas pelo Conama. Na realização
deste trabalho foram utilizados o método jurídico-teórico e o raciocínio dedutivo
com técnica de pesquisa bibliográfica, a fim de trazer uma resposta aos anseios dos
pesquisadores e de todos aqueles que se preocupam com a observância da Consti-
tuição brasileira de 1988 (CR/88) e do Estado Democrático de Direito. Concluiu-se
que entre as prerrogativas concedidas ao Conama não existe a possibilidade de tal
órgão legislar em matéria criminal ambiental por violar os princípios da reserva legal
e da taxatividade, por mais louvável que seja a sua intenção, fato que, sem dúvida,
compromete os comandos constitucionais e a segurança jurídica.
Palavras-Chave: Direito Penal. Legislação Ambiental. Competência. Regula-
mentação.

TITULO: La criminalización reglamentar en materia de efluentes ambientales.


RESUMEN
Esta investigación tuvo por finalidad estudiar las competencias legislativas en ma-
teria criminal, teniendo en cuenta el expuesto en la Resolución nº 430/2011 del Consejo
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 435

Nacional del Medio Ambiente brasileño (Conama), en que se creó la penalización (tipos
penales) por los hechos contenidos en la misma resolución, utilizando, sin embargo, la
punición existente en la Ley nº 9.605/98 (Ley de los Crimines Ambientales). Así, se ana-
lizó, además de la competencia legislativa, los principios penales, la Ley nº 9.605/98 y la
Resolución nº 430/2011, para llegar al dilema, que es el hecho de existir, o no, el abuso
de derecho reglamentar en la tipificación de conductas por el Conama. En la realización
del trabajo, ha sido utilizado el método jurídico-teórico y el raciocinio deductivo con
técnica de investigación bibliográfica, para presentar una respuesta a los deseos de los
investigadores y de todos que se preocupan con el cumplimiento de la Constitución de la
República de 1988 (CR/88) y con la observancia del Estado Democrático de Derecho. Se
ha concluido que entre las prerrogativas concedidas al Conama no existe la posibilidad de
ese órgano legislar en materia criminal ambiental por violar los principios de la reserva
legal y de la expresa previsión normativa, por más saludable que sea su intención, hecho
que, sin duda, pode en cheque los comandos constitucionales y la seguridad jurídica.
Palabras Clave: Derecho Penal. Legislación Ambiental. Competencia. Reglamen-
tación.

SUMÁRIO
1 Introdução. 2 Competência Legislativa em Matéria Penal. 3 Princípios Penais
Gerais. 4 A Lei nº 9.605/98 e sua Importância e Legalidade. 5 Resolução nº 430/2011
do Conama. 6 Abuso de Direito Regulamentar na Tipificação de Condutas. 7 Con-
siderações Finais. Referências.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


1. INTRODUÇÃO
Fator muito importante para a manutenção de um Estado Democrático de
Direito é a observância dos preceitos constitucionais, o que engloba o sistema de
governo, divisão de poderes e competências legislativas dentro das diversas esferas
da Administração Pública.
A inserção das previsões legais expostas na CR/88 se mostra como um verda-
deiro avanço na proteção jurídica ao meio ambiente para o Brasil, visto que nenhuma
das Constituições anteriores deu destaque ou importância substancial ao tema, como
a atual, existindo apenas normas infraconstitucionais esparsas que não ofereciam
uma sistematização adequada ou necessária para integrar as questões que envolvem
o meio ambiente nacional, como, por exemplo, as Leis ns. 4.771/65 (Lei das Flo-
restas), 6.453/77 (Lei das Atividades Nucleares), 6.766/79 (Lei do Parcelamento do
Solo Urbano) e o Decreto-Lei nº 25/1937 (Lei do Patrimônio Cultural).
Após a Declaração sobre Meio Ambiente Humano, que se deu no ano de 1972,
em Estocolmo, na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano – a
qual foi comparada com a Declaração Universal dos Direito Humanos de 1945, por
sua relevância para o Direito Internacional e para a diplomacia dos Estados (países)
–, a visão sobre o assunto tomou um rumo que culminou na inserção das previsões
na CR/88, conforme apontado anteriormente. Devido a tais fatos, o encontro de
436 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

países para discussão do futuro ambiental do planeta, realizado no Rio de Janeiro,


em 1992, passou a ser denominado Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento.
Conforme o entendimento atual, a proposta exposta na CR/88 de elevar o
direito ao meio ambiente sustentável a um direito fundamental, por meio de tutela
diferenciada, não terá êxito sem uma aplicabilidade adequada e uma forma de efeti-
vação na prática em um país de proporção continental, com vários Estados-membros,
Distrito Federal e centenas de Municípios.
Assim, a dificuldade de tal tutela já se inicia na própria previsão constitu-
cional (art. 1º da CR/88), pois o Brasil é pautado no pacto federativo (unidade na
diversidade), observando-se a autonomia local. Com isso, os entes federados gozam
de certa capacidade de auto-organização e normatização própria (autogoverno e
autoadministração).
Nesse raciocínio, a compreensão de descentralização do poder político no in-
terior do Brasil, ou no Brasil como um todo, passa pela noção de Estado Federado,
na qual cada ente, órgão ou agente do Poder Público tem a faculdade jurisdicional
para emitir decisões e exercer a sua função constitucionalmente assegurada.
Entra-se, assim, na discussão das competências que cada ente federado ou a
própria União têm para legislar e administrar as questões ambientais como um todo
no país. No caso desta pesquisa, vira-se a atenção para os efluentes jogados no meio
ambiente, através do olhar e da tutela dada pela CR/88.
Dentro deste diapasão, aponta-se o Conselho Nacional do Meio Ambiente
(Conama) como um órgão administrativo criado para fazer garantir um meio am-
biente equilibrado e que tem sua competência definida no art. 8º da Lei nº 6.938/81.
Ocorre que o Conama se pauta, ou deveria se pautar, em sua atuação nos
limites legais. Diante deste parêntese, é de suma importância saber se o Conama,
ao criar a Resolução nº 430/2011, que trata de efluentes, principalmente no que se
refere às cláusulas penais, por ser objeto da pesquisa, estaria ou não indo além de
sua competência e desrespeitando a legislação pátria.
Na realização da presente pesquisa, foram utilizados a metodologia teórico-
documental, jurídico-teórico e o raciocínio dedutivo com técnica de pesquisa bi-
bliográfica, tendo como marco teórico a obra de Machado (2015), com as seguintes
partes: primeiro analisou-se a competência legislativa determinada pela CR/88,
que é a orientadora de todo o Estado brasileiro; no próximo tópico apresentam-se
os princípios constitucionais de Direito Penal pertinentes ao estudo, abordando-se
em seguida a Lei nº 9.605/98, que trata de Direito Ambiental. Após essas investiga-
ções, pode-se passar ao estudo da Resolução nº 430/2011 do Conama, fazendo-se
um entrelaçamento dos temas, discutindo-se em um penúltimo tópico a atuação
do Conama, em matéria legislativa, para então delinear-se uma conclusão sobre o
tema abordado.
É certo que a presente pesquisa não teve por finalidade esgotar o assunto, prin-
cipalmente por sua complexidade. Todavia, o que se espera é chamar a atenção dos
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 437

que lerem essas humildes linhas para a possibilidade de um desrespeito ao Estado


Democrático de Direito e aos direitos fundamentais, que, como aponta Dworkin
(2014), devem ser pautados na Constituição com suas regras e princípios, para se
atingir um direito de integridade, conseguindo-se, assim, garantir a democracia.

2. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA EM MATÉRIA PENAL


Ao se observar a CR/88 detidamente no dispositivo que determina a compe-
tência legislativa da União, art. 22, precisamente no inciso I, tem-se que as questões
criminais são privativas do Estado Maior: “Art. 22. Compete privativamente à União
legislar sobre: I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marí-
timo, aeronáutico, espacial e do trabalho” (BRASIL, 1988, grifo próprio).
Para a realização do princípio democrático na federação, conforme aponta
Bastos (1997), é certo que
“a regra de ouro poderia ser a seguinte: nada será exercido por um poder
de nível superior, desde que possa ser cumprido pelo inferior. Isto significa
dizer que só serão atribuídas ao governo federal e ao estadual aquelas tarefas
que não possam ser exercidas senão a partir de um governo com esse nível de
amplitude e generalização. Em outras palavras, o Município prefere ao Estado
e à União. O Estado, por sua vez, prefere à União.” (p. 21)
Este princípio estruturante da federação está intimamente ligado ao princípio da
subsidiariedade(1), mecanismo adequado para solução dos conflitos administrativos

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


das diferentes esferas federativas.
Certo é que a Constituição, como lei fundamental e suprema de um Estado,
que contém normas referentes à estruturação deste mesmo Estado, como forma de
governo, poderes políticos, poder administrativo, direitos e garantias fundamen-
tais, entre outros, não poderia deixar de contemplar a distribuição de competência
legislativa, já que, segundo Baracho (2008, p. 11), “a tutela do processo efetiva-se
pelo reconhecimento do princípio da supremacia da Constituição sobre as normas
processuais. Ela efetua-se pelo império das previsões constitucionais, que têm como
suporte as garantias”.
E uma destas garantias fundamentais é a prevista no art. 5º da própria CR/88,
na qual é informado que “todos são iguais perante a lei” (BRASIL, 1988), o que é
importantíssimo quando se trata de Direito Penal.
Sem entrar em profundidade na questão da hierarquia(2) das leis, observando-se
que as leis que tutelam a criminalidade são leis ordinárias, válidas em todo o território
nacional, é de se observar que o Direito Penal é o mais violento dos ramos jurídicos.
Conforme é possível abstrair da obra de Queiroz (2008, p. 83), o sistema penal se
apresenta repleto de polêmicas em sua forma de aplicação, ou seja, quando se fala

(1) Um dos princípios que é aplicado para resolver os conflitos aparentes das normas (GUIMARÃES,
2004, p. 495).
(2) Art. 59 da CR/88.
438 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

de persecução penal e execução penal(3), há de se atentar para o fato da existência


de confronto aos direitos fundamentais na sua aplicabilidade.
Ao somar esses fatores, além das determinações dadas pela CR/88, e aqui se
tenta fugir do sectarismo, há de se chegar à conclusão de que as normas penais não
podem ser legisladas por regiões ou de forma isolada, o que causaria um abuso, um
autoritarismo e uma insegurança jurídica incomensurável.
Daí a necessidade da competência legislativa em matéria penal ter que ser
do ente maior, de somente um órgão, evitando-se divergências em todo o Estado
(nação), respeitando-se os direitos fundamentais que são de mesma hierarquia e
competência legislativa.
Assim, há de se falar em alguns princípios que não podem deixar de ser ob-
servados quando o assunto é Direito Penal, como, por exemplo, reserva legal ou
legalidade, taxatividade e anterioridade.

3. PRINCÍPIOS PENAIS GERAIS


Todo o ordenamento jurídico é pautado em princípios, os quais podem ser
definidos como padrões de conduta presentes de forma explícita ou implícita no
ordenamento jurídico, havendo quem considere como regras e/ou normas, já que a
distinção entre esses dois elementos é objeto de dissenso(4).
Salles Junior (2009, p. 8) vai informar que princípios gerais de Direito, Direito
Penal no caso, “(...) suprem as lacunas das normas não incriminadoras. Para uns,
são os princípios do Direito Natural; para outros, os princípios gerais do Direito
Positivo, ou, ainda, as premissas éticas que são extraídas do material legislativo. São
regras formuladas pelos princípios morais que informam à legislação onde ocorre
o caso omisso”.
Certo é que, para Guimarães (2004, p. 439), princípio é “preceito, regra, causa
primária, proposição, começo, origem” ou forma de o legislador se orientar na cria-
ção de leis, apesar de na prática não existir um legislador pensante ou ponderador
ao propor uma lei.
Ainda assim, para que haja um equilíbrio entre restrição ou punição e garan-
tias, como defesa do cidadão contra abusos do Estado, os princípios não podem
ser olvidados, principalmente quando se trata de Direito Penal, que é “aquela parte
do ordenamento jurídico que estabelece e define o fato-crime, dispõe sobre quem
deva por ele responder e, por fim, fixa as penas e as medidas de segurança a serem
aplicadas” (TOLEDO, 2008, p. 1).
Nesse diapasão, os princípios de maior importância para o assunto tratado são
o princípio da reserva legal ou legalidade, o princípio da anterioridade e o princípio
da taxatividade.

(3) Sistema penal como um todo, segundo denominação de Queiroz (2008).


(4) Vide Ronald Dworkin (2014) no que tange ao dissenso de princípios, regras e normas.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 439

Toledo (2008) vai definir o princípio da reserva legal da seguinte forma:


“O princípio da legalidade, segundo o qual nenhum fato pode ser consi-
derado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada, sem que antes desse
mesmo fato tenham sido instituídos por lei o tipo delitivo e a pena respectiva,
constitui uma real limitação ao poder estatal de interferir na esfera das liberda-
des individuais. Daí sua inclusão na Constituição, entre os direitos e garantias
fundamentais, no art. 5º, XXXIX e XL, in verbis: ‘não há crime sem lei anterior
que o defina, nem pena sem prévia cominação legal’; ‘a lei penal não retroagirá,
salvo para beneficiar o réu’. O princípio da legalidade costuma ser enunciado
por meio da expressão latina nullum crimen, nulla poena sine lege, esta última
construída por Feuerbach, no começo do século XIX. Significa, em outras pa-
lavras, que a elaboração das normas incriminadoras e das respectivas sanções
constitui matéria reservada ou função exclusiva da lei.” (p. 21, grifo próprio)
Assim, observa-se que a matéria é de exclusividade da lei, conforme determina
a CR/88, já que não admite ninguém, ou nenhum ente ou órgão, legislando sobre
o tema, a não ser a União, de forma privativa. Quanto a outro princípio igualmente
importante, Salles Junior (2009) aponta que, assim como o princípio da legalidade
ou reserva legal, o princípio da anterioridade se encontra no art. 1º do Código Penal,
sendo certo que este artigo foi exposto de maneira praticamente idêntica no inciso
XXXIX do art. 5º da CR/88. Assim expôs o autor (2009): “O mesmo dispositivo
contém outro princípio: o da anterioridade, já que crime e pena devem constar
de lei anterior à conduta praticada. Daí decorre que a lei penal é irretroativa, rege

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


apenas fatos futuros, de modo que a ação praticada antes da lei não é considerada
pelo Direito Penal” (SALLES Jr., 2009, p. 33).
Diante disso, tira-se a conclusão de que se um crime é praticado sem uma
norma incriminadora, sem uma conduta prevista, observando-se que a conduta se
define pela ação e pelo verbo, o ato não pode ser penalizado. Este princípio se une
ao próximo no que tange a uma determinação legal abstrata.
O presente princípio salienta fator importante quanto às normas penais, qual
seja que não basta a existência de lei anterior definindo condutas como crime ou que
seja confeccionada por ente competente, além disso, toda a norma incriminadora tem
que ser compreensível, clara, dando condições ao cidadão de ter a real consciência
acerca da conduta que pode ser punida pelo Estado.
Como exposto anteriormente, a tipificação não pode ser abstrata, ela não pode
ser aberta, não pode dar margem a interpretações diversas, não cabendo inclusive
analogia para definição de conduta criminosa. Certo é que o ����������������������
princípio da taxativi-
dade, ou da determinação, não está expresso em nenhuma norma legal. Trata-se de
uma construção doutrinária, fundamentada no princípio da legalidade e nas bases
do Estado Democrático de Direito (SALLES Jr., 2009).
Logo, estes princípios não podem ser olvidados, pois, caso contrário, a própria
democracia estaria em risco, assim como os direitos fundamentais prestigiados pela
CR/88.
440 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

4. A LEI Nº 9.605/98 E SUA IMPORTÂNCIA E LEGALIDADE


Após a apresentação dos princípios que regem as normas penais, é possível se
analisar a Lei nº 9.605/98, que trata de crimes ambientais.
O meio ambiente é um bem fundamental à existência humana, meio ambiente
este que carecia de uma definição legal até o advento da Lei de Política Nacional do
Meio Ambiente. Esse é o entendimento de Machado (2015, p. 51), ao afirmar que
“nota-se a ausência de definição legal e/ou regular de meio ambiente até o advento
da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente”. Assim, ainda conforme o mesmo
autor, “conceituou-se meio ambiente como o conjunto de condições, leis, influências
e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida
em todas as formas” (MACHADO, 2015, p. 51).
Certo é que este meio ambiente, importante para a manutenção da vida huma-
na, através de uma visão antropocêntrica, deve ser protegido para o uso de todos,
gerações passadas, através da sua memória, geração presente e gerações futuras.
Trata-se de um princípio expresso no texto esculpido no art. 225 da CR/88, ao
determinar que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (BRASIL, 1988),
como uma extensão ao direito à vida, apresentando-se neste aspecto a própria exis-
tência. Impõe-se ao Poder Público e à própria coletividade, ou seja, a todos sem
exceção, a responsabilidade pela proteção ambiental.
Assim, dentro de uma Política Nacional de Meio Ambiente, surge a Lei nº
9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), que aponta e determina as sanções penais e
administrativas em face das atividades e condutas lesionadoras do meio ambiente
e que possam atingir seus elementos, flora, fauna, recursos naturais e o patrimônio
cultural.
Tem-se que a Lei nº 9.605/98 é uma lei ordinária, criada através de um processo
legislativo legítimo, com tramitação no Congresso Nacional, através das observações
legais. Aponta Machado (2015, p. 835), o qual participou desse processo, o que se
segue:
“A Lei nº 9.605, de 12.02.98, nasceu de projeto enviado pelo Poder
Executivo federal. A Exposição de Motivos nº 42 é de 22.04.91, do Secretário
do Meio Ambiente. Inicialmente, o projeto tinha o objetivo de sistematizar as
penalidades administrativas e unificar os valores das multas. Após amplo de-
bate no Congresso Nacional, optou-se pela tentativa de consolidar a legislação
relativa ao meio ambiente no que diz respeito à matéria penal.”
Assim, a Lei nº 9.605/98 é legítima e as sanções apontadas em seu corpo são
relativas aos atos praticados e que tenham previsão na própria lei. Não existe nenhum
artigo na Lei nº 9.605/98 informando que outros atos praticados e previstos em outra
lei, decreto, regulamento ou portaria sejam puníveis com as sanções ali previstas.
Não pode outra lei ou regulamento determinar condutas com punições previstas
na Lei nº 9.605/98. Se a conduta coincidir com as previstas na Lei nº 9.605/98, será
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 441

punível não por estar previsto em lei distinta, mas, sim, e com base na própria Lei
nº 9.605/98, por seus próprios fundamentos, norma e previsão.
No caso, o agente não terá punição da Lei nº 9.605/98 por ter transgredido
outra norma, mas, sim, por ter transgredido a própria Lei nº 9.605/98. Nesse ponto,
através de uma medida extrema, se aplica a subsidiariedade das normas. Afirma-se
medida extrema por entender que não existe conflito algum, pois a Lei nº 9.605/98
trata de crimes ambientais e a Resolução nº 430/2011 do Conama cuida de formas
de conduta administrativa.

5. RESOLUÇÃO Nº 430/2011 DO CONAMA


Conforme é de fácil verificação, o Conama criou a Resolução nº 430/2011,
que trata sobre condições e padrões de lançamento de efluentes(5), colocando em tal
Resolução, precisamente no art. 30, uma norma penal, nos seguintes termos: “Art.
30. O não cumprimento do disposto nesta Resolução sujeitará os infratores, entre
outras, às sanções previstas na Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, e em seu
regulamento” (BRASIL, 2011).
Percebe-se que esta norma deixou de observar todos os princípios estudados
até aqui, já que não é taxativa, dando margem a interpretações. Ademais, não se
pode apontar a obediência à anterioridade ante a falta de definição expressa de
conduta (ação/verbo), e principalmente verifica-se a inobservância da legalidade
ou da reserva legal.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Além disso, observando a própria Resolução nº 430/2011, o seguinte texto se
reteria do corpo: “Dispõe sobre condições e padrões de lançamento de efluentes,
complementa e altera a Resolução nº 357, de 17 de março de 2005, do Conselho
Nacional do Meio Ambiente – CONAMA” (BRASIL, 2011).
Logo, é de fácil observação que a referida Resolução���������������������������
nº������������������������
430/2011 é um ato admi-
nistrativo, passível de sanções administrativas, dentro das competências do Conama.

6. ABUSO DE DIREITO REGULAMENTAR NA TIPIFICAÇÃO DE CONDUTAS


O Conama foi criado pela Lei nº 6.938/81 (Lei de Política Nacional de Meio
Ambiente – PNMA), e suas competências estão esculpidas no inciso VII do art. 8º
da citada Lei. Leia-se:
“Art. 8º Compete ao CONAMA:
(...)
VII – estabelecer normas, critérios e padrões relativos ao controle e à
manutenção da qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional dos
recursos ambientais, principalmente os hídricos.” (BRASIL, 1981)

(5) Efluentes são, na maioria das vezes, produtos produzidos por indústrias (líquidos ou gasosos), ou
resultado dos esgotos domésticos urbanos, tendo como depósito final o meio ambiente.
442 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Diante disso, fica claro que a competência do Conama é puramente admi-


nistrativa, podendo estabelecer normas (esclareça-se: normas de conduta e nunca
legislar, criando normas penais), com a finalidade de se ter um uso racional dos
recursos ambientais.
O disposto no art. 225 da CR/88, ao informar que “todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, (...) essencial à sadia qualidade de vida (...)”
(BRASIL, 1988), estabelece a proteção de todos, sem exceção, ficando claro o valor
que o meio ambiente tem para o homem e a importância deste bem jurídico criado
pela vida e tutelado pelo ordenamento jurídico, inclusive para o desenvolvimento.
O que se quer dizer é que a tutela do bem jurídico meio ambiente é de res-
ponsabilidade de todos, inclusive do Conama, devendo ele agir para garantir a
sua manutenção e o seu uso de forma adequada, sem prejuízo para o patrimônio
ambiental. Porém, essa luta não pode ser feita a qualquer custo, uma vez que os
meios não justificam os fins. O Estado Democrático de Direito deve ser observado
e democracia não é anarquia, mas, sim, a observância dos preceitos constitucionais
que regulam a sociedade.
Sábias são as palavras de Martins (2009), ao informar o que se segue:
“Montesquieu, ao declarar que a importância da tripartição dos poderes
reside na possibilidade de o poder controlar o poder, porque o homem, no
exercício do poder, não é confiável, apenas demonstrou que a lei, que garante a
independência e a harmonia dos três poderes, termina por ser, simultaneamente,
forte e controladora do poder, como forma de evitar os danos inerentes àquele
que, ao conquistá-lo, tende a com ele se identificar. Escrevi: ‘Montesquieu,
ao escrever o seu Do Espírito das Leis, fê-lo a partir de duas realidades que o
impressionaram vivamente, a saber: o sucesso político do modelo inglês e a
absoluta descrença na natureza humana’.” (p. 23)
Logo, repita-se, por mais louvável que seja a intenção do Conama, a CR/88 e
o Estado Democrático de Direito não podem ser olvidados, devendo a proteção do
meio ambiente ser praticada dentro de seus ditames e das competências conferidas
no texto da CR/88.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Direito Penal, como apontado inicialmente, é objeto de grande polêmica,
haja vista o reconhecimento dos direitos fundamentais do homem, que em várias
situações são desrespeitados, ou melhor, mitigados, na prática adotada pelo sistema
penal, que é violento. A violência não se restringe à prática da infração, isto é, à
quebra dos ditames da lei penal, mas também se verifica nas formas utilizadas para
se combater ou fazer cumprir uma determinação legal, daí a observância necessária
da CR/88 no momento de se criar leis coercitivas.
Tal argumento é utilizado neste trabalho como um dos motivos da reserva legal,
ou seja, da necessidade de ser a União, de forma privativa, a única a poder legislar
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 443

em matéria criminal, além de existir outros motivos incontestáveis, como a própria


e simples determinação da CR/88.
A inobservância dos parâmetros que norteiam o Estado Democrático de Direito
pode levar a regimes indesejáveis, por mais nobres que possam parecer as justifica-
tivas para fazê-lo. Para se chegar a esta conclusão, basta a observância da própria
história da humanidade, pois tanto Hitler como Fidel Castro – sendo que os casos
não se resumem a estes dois – tinham como discurso a libertação, a igualdade, dentre
outros argumentos que, a priori, são desejáveis. Contudo, não pode uma sociedade
olvidar da história e cair em promessas ou aparências idênticas, sob pena de se perder
a liberdade e a democracia.
Hoje muito se discute sobre direitos humanos, direitos fundamentais, igualdade
e proteção ambiental. Porém, pouco se sabe o que realmente são tais direitos, não
só pela inaplicabilidade de muitos já positivados na própria CR/88, mas também pela
falta de parâmetro definidor do que sejam esses direitos, como facilmente se observa
no mundo real. Não é necessária qualquer criatividade para se demonstrar isso, basta
ver a judicialização de políticas públicas, como no caso de demandas objetivando va-
gas em hospitais, entrega de medicamento para manter a vida de uma pessoa carente,
educação, dentre outras situações.
Para não se chegar às demandas é que se busca a elaboração de leis idôneas.
Nesse ínterim, o Brasil conta com a hierarquia legislativa, além de outros fundamen-
tos que se fazem um tanto óbvios, com prerrogativas de atuação, a fim de garantir e
fazer com que o sistema funcione com equilíbrio e fluidez, ao menos teoricamente,

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


já que, sem dúvida, não existe regime perfeito, somente “menos pior”.
Em outras palavras, bem diretas, a CR/88 tem que ser respeitada, mesmo não
sendo perfeita, para que se possa garantir a democracia, cumprindo a cada ente e
órgão ater-se à prerrogativa preestabelecida naquele mandamus.
Certo é que entre as prerrogativas concedidas ao Conama não existe a possi-
bilidade de tal órgão legislar em matéria criminal ambiental, por mais louvável que
seja a sua intenção de tentar garantir um meio ambiente equilibrado, uma vez que
tal fato compromete o próprio Estado Democrático de Direito.
Assim, ao criar uma norma incriminadora, que viola principalmente o prin-
cípio da taxatividade, pois sem prerrogativas para tal, criou uma anomalia jurídica,
tratando-se de regulamento inconstitucional e sem qualquer efeito jurídico. Isso
posto, criou-se total insegurança jurídica em matéria penal, fato que sem dúvida
pode levar a abusos, arbitrariedades e, o mais grave, expor a risco a democracia e
os direitos fundamentais tão necessários à vida plena e digna das pessoas, presentes
e futuras, mesmo que ainda o exercício de tais direitos careça de parâmetros ade-
quados para a efetivação.
Por sua vez, a única interpretação admissível e conforme a CR/88 exige que o
art. 30 da Resolução nº 430/2011 do Conama somente seja aplicável em matéria de
infrações administrativas, nos termos dos arts. 70 e seguintes da Lei nº 9.605/98,
ou mesmo quando versa o tipo do art. 33 da mencionada norma.
444 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Dessa maneira, faz-se fundamental o respeito à CR/88 e o respeito a todos da


sociedade que se encontram sob sua guarda, doa a quem doer.

REFERÊNCIAS
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19, p. 45-88, jan./jun. 2013. Disponível em: <http://www.domhelder.edu.br/
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______. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e
administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e
dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 13 fev. 1998, retificado
em 17 fev. 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/
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______. Ministério do Meio Ambiente. Conselho Nacional do Meio Ambiente.
Resolução Conama nº 430, de 13 maio de 2011. Dispõe sobre condições e
padrões de lançamento de efluentes, complementa e altera a Resolução nº 357,
de 17 de março de 2005, do Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama.
Diário Oficial da União nº 92, Brasília, 16 maio 2011, p. 89. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=646>. Acesso em:
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Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 445

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DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


REFLEXÕES E PARTICULARIDADES SOBRE A
PRECLUSÃO, A COISA JULGADA E O CHAMADO
“TRÂNSITO EM JULGADO” PENAL

Marcellus Polastri Lima


Doutor e Mestre em Direito pela UFMG; Professor da Graduação e do Mestrado
da UFES – Universidade Federal do Espírito Santo (Direito Processual Penal
e Recursos Excepcionais e Ações de Impugnação); Pesquisador Visitante em
Processo Penal Comparado no Instituto de Ciências Criminais do Departamento
de Direito Penal Estrangeiro e Internacional na Georg-August Universität de
Göttingen-Alemanha (até 2014); Membro do Instituto Brasileiro de Direito
Processual (IBDP); Procurador de Justiça no Rio de Janeiro.

Marciley Boldrini
Especialista em Direito Público e Mestranda do Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu (Mestrado) em Direito Processual da Universidade Federal do
Espírito Santo.

RESUMO
Os institutos da preclusão e coisa julgada formal nem sempre são diferenciados
(se é que existe diferença) pela doutrina da teria geral do processo, mormente no
que se refere ao processo civil. Também quanto à coisa julgada material existem
discrepâncias na sua natureza. O estudo procura estudar as diferenças e as coinci-
dências entre os termos “preclusão”, “coisa julgada formal” e material e ainda sobre
a expressão “trânsito em julgado”, que às vezes pode ter mais de uma conotação
dentro dos fenômenos investigados. Por fim, demonstra como, no Processo Penal,
os mesmos termos têm tratamento diversificado do processo civil e que a expressão
“trânsito em julgado” não serve para identificar a coisa julgada material.
Palavras-Chave: Processo Civil. Processo Penal. Preclusão. Coisa Julgada.
Trânsito em Julgado. Recurso. Ação de Revisão Criminal.

TITLE: Reflections and quirks on estoppel, the judged thing and the criminal res
judicata.
ABSTRACT
The estoppel institutes and formal res judicata, are not always differentiated (if
any difference) the doctrine would have overall process, especially with regard to civil
procedure. Also on the res judicata discrepancies exist in nature. The study aims to study
the differences and similarities between the terms “estoppel”, “formal res judicata” and
material still on the phrase res judicata, which can sometimes have more than one con-
notation within the investigated phenomena. Finally, as shown in the criminal procedure,
the same terms have diversified treatment of civil procedure and that the phrase “final
judgment” does not serve to identify the res judicata.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 447

Keywords: Civil Procedure. Criminal Proceedings. Estoppel. Res Judicata. Judged


in Transit. Resource. Criminal Action Review.

SUMÁRIO
1 Coisa Julgada, Coisa Julgada Formal e a Preclusão. Diferenciação. 2 Trânsito
em Julgado, Preclusão e Coisa Julgada. 3 A Coisa Julgada no Processo Penal. Rela-
tividade. 4 Um Problema Prático: o Trânsito em Julgado e a Prescrição da Pretensão
Executória. 5 Conclusão. Referências.

1. COISA JULGADA, COISA JULGADA FORMAL E A PRECLUSÃO.


DIFERENCIAÇÃO
Na verdade, na doutrina brasileira existe certa confusão terminológica e de
identificação entre os institutos da coisa julgada (material e formal) e o instituto
da preclusão.
O certo é que a ideia de coisa julgada surge a partir da concepção de estabilização
das demandas judiciais com o objetivo de garantir a segurança jurídica ao impedir
que as questões levadas ao Poder Judiciário sejam objeto de novas impugnações.
Trata-se de instituto jurídico protegido pela CF, expressamente previsto no
rol de direitos fundamentais materializado pelo art. 5º, XXXVI, o qual garante que
mesmo com o advento de inovação legislativa as demandas acobertadas pela coisa

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


julgada permanecem imutáveis e indiscutíveis, resguardando a paz social.
Apesar da especial atenção dada pela Carta Magna ao instituto, a CF não dá
um conceito inequívoco do mesmo, não fazendo distinção entre a coisa julgada
material e formal, deixando a cargo do legislador infraconstitucional e da doutrina a
tarefa de diferenciar e traçar seus limites dentre as diversas faces e áreas que o direito
pode apresentar. Tal tarefa não é das mais fáceis, tanto que a doutrina apresentou
ao menos três teorias dignas de nota, mas saliente-se que todas estão no âmbito da
chamada Teoria Geral do Processo e voltadas para o processo civil.
A concepção alemã, encabeçada por Konrad Hellwig (1967, apud MOREIRA,
1977, p. 82) e, no Brasil, adotada por Pontes de Miranda, define coisa julgada como
o efeito declaratório da decisão. A declaração de um direito proferida ganharia o
status de imutável, não podendo ser mais discutida. A coisa julgada consistiria na
força vinculante da declaração.
Em crítica a essa teoria, Liebman (1945, p. 5) afastava a ideia de que a coisa
julgada se resumiria em um dos diversos efeitos que uma decisão poderia possuir.
Para o jurista italiano, coisa julgada não é um efeito, mas, sim, uma qualidade dos
efeitos da decisão. Para o autor, que influenciou toda uma geração de juristas no
pós-guerra no Brasil, confundir a declaração inserta no ato jurisdicional com a coisa
julgada seria confundir o elemento com aquilo que o qualifica.
O autor italiano reforça sua compreensão ao afirmar que a decisão pode, in-
clusive, gerar efeitos antes da formação da coisa julgada, fato comum na experiência
448 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

jurídica. A incontestabilidade não seria condição necessária para a produção de


efeitos. Assim, define a coisa julgada como a qualidade do efeito da decisão.
Analisando efeito da coisa julgada entre partes e terceiros, diz Liebman que
“(...) entre partes e terceiros só há essa grande diferença: que para as partes, quando
a sentença passa em julgado, os seus efeitos se tornam imutáveis, ao passo que para
os terceiros isso não acontece (...)” (1945, p. 108).
Já a terceira corrente doutrinária, capitaneada por Barbosa Moreira (1984, p.
103), concebe a coisa julgada como uma situação jurídica do conteúdo da decisão.
Trata-se da imutabilidade do conteúdo da decisão, ou de seu dispositivo. Verdadeira
norma jurídica concreta criada pelo órgão jurisdicional, não podendo ser confundida
com os efeitos da decisão, estes sim passíveis de mudanças.
Em suas palavras:
“Toda sentença, meramente declaratória ou não, contém a norma jurídica
completa que deve disciplinar a situação submetida à cognição judicial. (...) Em
determinado instante, pois, a sentença experimenta notável modificação em sua
condição jurídica: de mutável que era, faz-se imutável – e por que imutável,
faz-se indiscutível, já que não teria sentido permitir-se nova discussão daquilo
que não se pode mudar (...). Ao nosso ver, porém, o que se coloca sob o pálio
da incontrastabilidade, ‘com referência à situação existente ao tempo em que a
sentença foi prolatada’, não são os efeitos, mas a própria sentença, ou, mais pre-
cisamente, a norma jurídica concreta nela contida.” (MOREIRA, 1977, p. 84-85)
Segundo outros autores civilistas, como Leonardo Greco, “podemos ver a coisa
julgada como a imutabilidade que adquirem os efeitos de direito material da sentença
não mais sujeita a qualquer recurso no processo em que foi proferida” (2010, p. 354).
Porém, o que se quer acentuar, em primeiro lugar, é que é necessário estabele-
cer os traços diferenciadores entre a verdadeira coisa julgada, que é a coisa julgada
material e uma simples “premissa” dessa coisa julgada material, que é a chamada
“coisa julgada formal” e ainda se indagar o que seria a chamada preclusão e qual sua
relação com a coisa julgada. Existiria realmente diferença da preclusão e da coisa
julgada formal, e qual seria?
Segundo esclarecem Marinoni e Arenhart sobre a preclusão:
“Para que o processo possa seguir sempre adiante, é preciso que se criem
mecanismos destinados a impedir a repetição da prática de atos processuais ou
retorno a fases ou atos já praticados, evitando-se, com isso, contradições entre-
atos já praticados e outros a serem praticados e círculos viciosos na tramitação
processual (...). Daí a importância do instituto da preclusão. É precisamente esse
instituto que permite ao processo desenvolver-se adequadamente, dirigindo-
se ao seu objetivo final, à sua conclusão. Toda marcha processual se ordena
sob o critério da preclusão, sendo esta, ainda, o pressuposto essencial para a
figura a ser adiante estudada, a coisa julgada. Esta é por muitos considerada a
preclusão por excelência, capaz de gerar efeitos mesmo para fora do processo
em que ocorre (...); a preclusão é pressuposto indispensável para a ocorrência
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 449

da coisa julgada, confundindo-se, aliás (...) com aquilo que a doutrina costuma
chamar de coisa julgada formal.” (2008, p. 538/541) (grifo nosso)
A preclusão, segundo a doutrina em geral, pode ser temporal, consumativa
ou lógica e, ainda, existe a preclusão que se aplica ao juiz, a chamada preclusão
projudicato.
A temporal se dá quando não obedecido o prazo previsto em lei para a prática
de determinado ato, como, por exemplo, cinco dias para apelar no processo penal,
não entrando a parte com o recurso nesse prazo, ocorre a preclusão.
A consumativa ocorre quando se dá a extinção da faculdade processual pela
prática do ato validamente. Oferecido o recurso, o próximo passo é o reexame por
outro grau, se for o caso, e, no caso do processo penal público, não pode mais o MP
desistir (indisponibilidade).
A lógica se dá quando a parte pratica ato incompatível, por exemplo, renuncia
ou desiste do recurso, o que no processo penal só se aplica à ação penal privada e
para a defesa aqui não pode seguir o recurso.
A projudicato, por sua vez, como dito, se aplica ao juiz, e é sempre consumativo e,
assim, oferecida pelo juiz a sentença, exaure sua jurisdição, não podendo mais alterar
ou rever a decisão, salvo em caso de embargos de declaração ou, no processo penal, em
reconsideração de recurso em sentido estrito se for uma mera decisão interlocutória.
Já a coisa julgada formal, segundo Marinoni e Arenhart,
“Opera-se em relação a qualquer sentença, a partir do momento em que

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


precluir o direito do interessado em impugná-la internamente à relação proces-
sual. Como preclusão que é, não deve ser confundida com a figura (e o regime)
da coisa julgada (material) (...). Naturalmente, a coisa julgada material tem
como pressuposto inafastável a coisa julgada formal. Todavia, a imutabilidade
que realmente tem relevância é aquela caracterizada externamente ao processo
(decorrente da coisa julgada material).” (2008, p. 643)
Humberto Theodoro Júnior afirma que “a diferença entre a coisa julgada
material e a formal é apenas de grau de um mesmo fenômeno. Ambas decorrem
da impossibilidade de interposição de recurso contra a sentença” (2010, p. 536).
E conclui:
“A coisa julgada formal decorre simplesmente de imutabilidade da
sentença dentro do processo em que foi proferida pela impossibilidade de
interposição de recurso, quer porque a lei não mais o admite, quer porque se
esgotou o prazo estipulado pela lei sem interposição pelo vencido, quer porque
o recorrente tenha desistido do recurso interposto ou ainda tenha renunciado
à sua interposição.” (2010, p. 536)
Ora, mas tal não se configura justamente o que se chama de “preclusão”? Não
são repetidas na conceituação do autor as formas do instituto da preclusão ao tratar
da coisa julgada formal, sabendo-se que, como visto, a preclusão pode ser temporal,
consumativa e lógica?
450 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Claro que sim, pois, na verdade, a coisa julgada formal é a própria preclusão e
antecede a verdadeira coisa julgada que é a material. A criação doutrinária da cha-
mada “coisa julgada formal” se torna até desnecessária, pois o que interessa mesmo,
em um primeiro momento, é a caracterização de preclusão, já que a coisa julgada
formal é o último efeito desta e com esta se confunde.
E, quanto à diferenciação entre coisa julgada formal e material, de acordo com
Marinoni e Arenhart,
“(...) a coisa julgada formal, como se nota, é endoprocessual, e se vincula
a impossibilidade de se rediscutir o tema decidido dentro da relação jurídi-
ca processual em que a sentença foi prolatada. Já a coisa julgada material é
extraprocessual, ou seja, seus efeitos repercutem fora do processo (...), não
se confunde com a verdadeira coisa julgada (ou seja, com a coisa julgada
material). É, isso sim, uma modalidade de preclusão, a última do processo de
conhecimento, que torna insubsistente a faculdade processual de rediscutir a
sentença nele proferida.” (2008, p. 242-643)
Alexandre Freitas Câmara, por sua vez, diz que “enquanto a imutabilidade do
provimento judicial se chama coisa julgada formal, a imutabilidade de seu conte-
údo (isto é, do ato judicial que resolve o mérito da causa) chama-se coisa julgada
material” (2007, p. 72).
Interessante a distinção proposta, mas a imutabilidade do provimento judicial
se dá justamente pela irrecorribilidade, ou seja, como melhor destaca Marinoni, a
coisa julgada formal nada mais é do que a preclusão.
Aliás, sobre outra visão, Leonardo Greco afirma que os aspectos de coisa jul-
gada formal e da material seriam duas faces de uma mesma moeda, “porque um não
existe sem o outro, de modo que, se a sentença tornou-se imutável no processo no
qual foi proferida, também se tronará imutável em qualquer outro. Por conseguinte,
não há coisa julgada formal sem coisa julgada material, e vice-versa” (2010, p. 367).
Assim, no momento em que se dá a coisa julgada formal (repita-se: que nada
mais é do que a preclusão), abre-se caminho para a coisa julgada material, pois a
imutabilidade no processo específico logo se torna exógena, ou seja, erga omnes.

2. TRÂNSITO EM JULGADO, PRECLUSÃO E COISA JULGADA


Após essas breves considerações sobre a conceituação doutrinária de coisa julga-
da e de preclusão perante a Teoria Geral do Processo e do Processo Civil, pergunta-se:
quando ocorre a coisa julgada e o que seria o que se chama de “trânsito em julgado”?
Para melhor compreender essa questão, necessário traçar aqui a diferença entre
as expressões “trânsito de julgado” e “coisa julgada”, propriamente dita. Embora
sejam, normalmente, tratadas como sinônimos, pode-se dizer que a primeira cuida
justamente do momento que marcará o início da existência da segunda.
Pode se entender por “trânsito em julgado” o marco a partir do qual não é mais
possível a interposição de qualquer recurso pelas partes.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 451

A consequência maior é que tal “trânsito” gera, justamente, a formação da coisa


julgada formal, ou seja, quando a decisão torna-se imutável dentro de determinado
processo, não sendo passível de recurso. Frise-se, o que transita em julgado é a de-
cisão, pois para se dar o efeito de uma verdadeira coisa julgada (que é coisa julgada
material) primeiro é necessário tornar imutável a decisão “dentro” do processo e
na relação processual, seja para a parte vencida ou para a vencedora ou ambas, não
mais se podendo falar em recurso, para posteriormente se dar o efeito para terceiros e
“para todos”, inclusive deitando influência sobre outros processos, diga-se, portanto,
efeito erga omnes: a verdadeira coisa julgada.
Portanto, o trânsito em julgado, a princípio, seria o marco processual temporal
que indica que a sentença foi alcançada pela preclusão que nada mais é do que a
coisa julgada formal, como visto.
Nas palavras de Carlos Henrique Soares (2010, p. 86):
“Ultrapassado o prazo para a interposição dos recursos sem que haja a im-
pugnação da sentença, ocorre o trânsito em julgado da sentença por ‘preclusão’.
Esgotados os recursos cabíveis, também ocorre o trânsito em julgado da sen-
tença. Por esses dois aspectos, verifica-se a existência de elementos meramente
‘procedimentais’ para a conceituação do termo sob análise. O CPCB vai mais
além, afirmando, em seu art. 474, que ‘passada em julgado a sentença de mérito,
reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte
poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido’.” (grifos nossos)

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


Mas o autor vai mais longe e conclui que “tal dispositivo confere ao trânsito
em julgado uma eficácia preclusiva consumativa, que impede que em novo processo,
possam ser rediscutidos fatos e fundamentos jurídicos que deveriam ser objeto de
alegação, mas que, por qualquer motivo, não foram” (SOARES, 2010, p. 86).
Pelo que já foi exposto no tópico anterior, já se vê uma impropriedade de
termos em que a doutrina geralmente incide, pois na verdade a eficácia preclusiva
se dá anteriormente à verdadeira coisa julgada que é a material, pois isso é o que
se chama de preclusão, que nada mais é do que uma coisa julgada formal. Na ver-
dade, a coisa julgada material é mais do que isso, pois só se dá quando a decisão é
imutável no processo em que se deu e em todos os possíveis outros que decorrem
ou tem relação com aquele.
Já o conceito de “trânsito em julgado” só possui estreita relação com o de pre-
clusão, e não de coisa julgada material e, por vezes, o que ocorre é que, comumente,
na doutrina e jurisprudência, o termo é confundido com a coisa julgada verdadeira
(a material).
A preclusão garante o andamento do progresso (procadere) e da relação pro-
cessual, impedindo o seu recuo para fases anteriores, e é definido pela perda de uma
faculdade ou de direito processual, seja porque já foi devidamente manejado, seja
porque se esgotou o prazo para sua prática sem o devido exercício ou mesmo se foi
praticado ato incompatível (lógica).
Conforme analogamente demonstram Arenhart e Marinoni:
452 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

“(...) a preclusão consiste – fazendo-se um paralelo com figuras do direito


material, como a prescrição e a decadência – na perda de direitos processuais.
A cada situação ativa de alguém corresponde uma situação passiva de outrem.
Diante de certa posição de vantagem de um sujeito, sua fruição abre espaço
para inúmeras situações jurídicas processuais. A preclusão, como se pode
concluir dessas observações, é instituto concebido para gerar efeitos dentro
do processo, vinculados a direitos, ônus, poderes e sujeições que conformam a
relação jurídica processual.” (2008, p. 639)
Assim, até se poderia falar em uma divisão de efeitos para uma e outra parte
no caso de preclusão (ou coisa julgada formal), diversamente do que ocorre com a
verdadeira coisa julgada, pois essa não seria divisível, já que é a própria decisão final
que se torna imutável e, para ambas as partes, traz um efeito de modo exógeno, ou
para fora do processo. No primeiro caso até se poderia ajustar o conceito de trânsito
em julgado no processo penal.
No entanto, a preclusão pode também se divorciar do trânsito em julgado (do
modo visto supra) justamente em razão das consequências dadas pela maior parte
da doutrina para este último termo. Enquanto na preclusão há apenas a perda do
direito de se praticar determinado ato (recorrer, por exemplo, ou mesmo o próprio
juiz modificar a decisão por ele prolatada), o “trânsito em julgado”, que também
deveria ter somente esse significado, é visto por vezes pela doutrina como algo mui-
to maior, ou seja, uma irrecorribilidade qualificada pela formação da própria coisa
julgada material e definitiva, com efeitos para as duas partes e para todos, mesmo
fora do processo. Evidente que essa última visão, mormente para o processo penal,
como veremos, seria imprópria ou equivocada.
Dependerá o significado do termo, assim, da área do processo e do contexto a
que se refere a doutrina (como no processo civil que por vezes é chamado de “passa-
do em julgado”), sendo certo que no processo penal comumente se fala sempre em
“trânsito em julgado” (e não passado em julgado), inclusive em face de sua inserção
no texto legislativo e pela designação comum doutrinária.
O que é certo é que nas diversas áreas do direito, às vezes, o termo é utilizado
no sentido de preclusão, e em outras no sentido de início (e até da própria) da coisa
julgada material, a verdadeira coisa julgada, e daí a confusão.
Mas, se considerado o chamado “trânsito em julgado” como uma coisa julgada
material, teria que estender seus limites e efeitos para todos os sujeitos do processo,
já que estes não poderão ter sua situação modificada, nem para melhor nem para
pior. E, como se verá, isso não seria adequado ao processo penal.
A percepção dessa conclusão fica mais clara, mesmo fora do processo penal,
quando tomamos, por exemplo, os casos do chamado reexame necessário, que
garante a revisão da decisão de primeiro grau pelo Tribunal no caso de decisões
específicas previamente definidas em lei. Nessas situações, ainda que nenhuma das
partes tenha recorrido, ocorrendo, portanto, a preclusão temporal do recurso, não
é possível falar em trânsito em julgado e suas consequências antes do reexame pelo
Tribunal Superior.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 453

Logo, nesse exemplo, enquanto o reexame da decisão não tiver sido efetuado
pelo Tribunal, ela não irá transitar em julgado, ainda que tenha havido a preclusão
temporal para uma das partes ou ambas, não restando, assim, dúvidas de que os
institutos não devem ser confundidos. Nota-se que o conceito de trânsito em julgado
adquire contornos próprios, não se restringindo apenas como um efeito da preclusão,
mas, sobretudo, como consequência da legitimidade das decisões jurisdicionais.
Aqui fica claro que a coisa julgada só poderia ser identificada com o “trânsito em
julgado” quando se desse o reexame necessário.
Desse modo, resta claro que a concepção de “trânsito em julgado”, de forma
mais correta, deveria se referir exclusivamente à irrecorribilidade das decisões, seja
para uma ou ambas as partes, sendo, assim, apenas pressuposto para uma futura
formação de uma verdadeira coisa julgada. Mas se confundem na lei, doutrina e
jurisprudência, com a verdadeira coisa julgada material.
O que é certo é que a chamada preclusão recursal ocorrida para uma das partes,
por si só, não é suficiente para a formulação da coisa julgada, já que mesmo que
apenas uma delas tenha recorrido, essa situação já é considerada como suficiente
para uma possível alteração da decisão que está sub judice e, nesse caso, não teríamos
a coisa julgada material. E aqui relembramos: a coisa julgada atinge a decisão, sendo
desimportante a consideração da parte beneficiada ou prejudicada. Assim, não há
dúvidas de que a estabilização da demanda para significar uma coisa julgada material
deve ocorrer simultaneamente para todos os sujeitos processuais.
Nesse sentido, Soares, (2010, p. 88) conclui afirmando que:

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


“Decisão jurisdicional transitada em julgado, no paradigma demo-
crático, significa a impossibilidade de retratação ou modificação, tendo em
vista o exaurimento dos poderes, faculdades e deveres das partes no processo
(preclusão), uma vez que tal decisão se formou mediante um procedimento
em contraditório (direito garantia-fundamental), que possibilitou às partes o
assentimento como autores e destinatários do conteúdo decisional. Não pode
transitar em julgado a sentença que não atendeu aos critérios de legitimidade e
nem operar os efeitos da preclusão. Qualquer decisão em que não se verifique
esses dois elementos é uma decisão que não ‘transita em julgado’, podendo, a
qualquer momento, ser modificada.”
Essas premissas, ainda que formuladas no âmbito da teoria geral do processo,
são essenciais para a compreensão do momento do trânsito em julgado em matéria
processual penal, como se verá a seguir.

3. A COISA JULGADA NO PROCESSO PENAL. RELATIVIDADE


Embora existam diversas concepções doutrinárias sobre o tema no processo
civil, a doutrina brasileira dedicada ao processo penal não tece maiores discussões
sobre o assunto, limitando-se a repetir os estudos referentes à teoria geral do proces-
so, normalmente direcionados ao estudo do processo civil. O mesmo pode-se dizer
sobre o CPP, que, ao contrário do CPC (art. 467, CPC/73, e art. 502, CPC/2015), não
454 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

trouxe qualquer definição da expressão “coisa julgada”, ainda que faça referência a
ela (mesmo que não diretamente) em algumas passagens.
Dessa forma, na ausência de previsão na legislação específica, somente para
fins de estudo, toma-se por base a definição apresentada pela Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro (DL nº 4.657/1942), a qual dispõe que:
“Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato
jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.
(...)
§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já
não caiba recurso.”
Nota-se um verdadeiro atrelamento do conceito de coisa julgada à imutabi-
lidade e à incontestabilidade da decisão. É a estabilização da demanda, quando o
conteúdo torna-se indiscutível, perpetuando a situação jurídica então resolvida. Mas,
no entanto, no âmbito do processo penal a coisa julgada e as suas características
ganham contornos próprios.
A característica de imutabilidade da coisa julgada não é a mesma no processo
penal, pois a “coisa julgada” na sentença penal é flexibilizada, uma vez que essa toma
contorno secundum eventus litis, já que possui maior consistência e imutabilidade
quando se trata de decisão pro reo do que nos casos em que ela é contra reo. Assim,
as sentenças absolutórias depois que “passam em julgado” sempre asseguram a
imutabilidade absoluta da coisa soberanamente julgada e, ao revés, as sentenças de
condenação se apresentam apenas com a imutabilidade de uma coisa julgada formal
(ou preclusão) e quando muito um especial “trânsito julgado material” especial,
considerado apenas como uma impossibilidade de “recorrer”, ou seja, de se aden-
trar com recurso ordinário ou excepcional, mas, em vista da especial característica
do processo penal, no que se refere ao réu, a qualquer tempo pode ser objeto de
contestação, desde que preenchidos os requisitos legais para tanto (cf. MARQUES,
2009, p. 61).
É que no processo penal a condenação pode ser desconstituída através de uma
ação de impugnação que é a revisão criminal, e talvez por isso o art. 621 do CPP
não fale em coisa julgada como condição para a revisão criminal (ao contrário do
CPC quando prevê a rescisória), mas só se utiliza do termo “processo findo”, ou
seja, para o réu só existe processo “findo”, já que mesmo não tendo possibilidade
de recorrer (ordinária ou extraordinariamente) poderá obter a mutabilidade ou a
desconstituição da condenação através da revisão, tudo em vista do especial caráter
do processo penal e sendo justificável sob o aspecto humanitário a não imposição
de limite temporal para seu manejo.
O simples fato de a lei processual penal se referir a “processo findo” e não à
“coisa julgada” como condição para se adentrar com a revisão criminal (de forma
diversa do CPC) parece já indicar que no processo penal o que teremos é mesmo
somente um processo que esteja findo (ou, em outras palavras, só coberta pela
preclusão para o Estado), pois, na verdade, não existirá a imutável coisa julgada,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 455

até porque a qualquer tempo poderá o réu ou os seus sucessores obter a revisão do
julgado com base em novas provas. Assim, não existe preclusão para se adentrar
com a ação de impugnação desconstitutiva que é a revisão criminal.
Como salienta Marcelo Cunha de Araújo:
“Mesmo fazendo uso dos meios legais de impugnação da decisão, há um
momento em que impossível se torna outro reexame: é quando se esgotam todas
as instâncias (...); a teor do art. 621 do CPP só é cabível a revisão criminal pro
reo, nunca pro societate. Além disso, por determinação legal (art. 622 do CPP),
‘a revisão criminal poderá ser requerida em qualquer tempo, antes da extinção
da pena ou após’. Verifica-se, portanto, diferentemente da ação rescisória, que a
revisão criminal não tem prazo preclusivo, podendo mesmo ser utilizada após a
extinção da puninbilidade.” (2007, p. 146/147) (grifo nosso)
É certo que, tal como a ação rescisória, poderia se alegar que não se tratando
a ação revisional de um recurso, mas de uma ação de impugnação, não seria um
obstáculo a se reconhecer a soberania e a autoridade da coisa julgada no julgado.
Ocorre que há uma diferença gritante: enquanto só se pode desconstituir a coisa
julgada no cível até o prazo de dois anos, no processo penal para o réu inexiste qual-
quer limite. Assim, não se dá uma coisa julgada material perfeita, ou de uma forma
total para o réu, e não se dando para o réu, não se dará para a própria decisão, pois
é esta que deveria se tornar imutável. Se pode existir uma mutabilidade a qualquer
tempo, mesmo que provocada e em benefício de apenas uma parte, isso também

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


trará efeitos para a outra. Isso é intuitivo.
Ora, assim, é forçoso reconhecer que, na verdade, somente poderia ocorrer
realmente uma coisa julgada material ou soberana se não mais houvesse possibilidade
de se adentrar com a revisão criminal, com vistas à observância da segurança jurídica,
podendo-se, aí sim, falar em coisa soberanamente julgada (OLIVEIRA, 2008, p. 506).
José Frederico Marques (2009, p. 58) parece já reconhecer isso ao afirmar que no
processo penal existe o trânsito em julgado “quando se encerra a fase de conhecimento
do processo penal condenatório, com a decisão da pretensão punitiva deduzida na
acusação, o jus puniende fica reconhecido ou negado ao Estado”.
Assim, parece evidente que para o Estado haveria um trânsito em julgado,
mas somente para o Estado. Para a parte ré ou acusada, ou mesmo seus sucessores,
o que existe é somente um “processo findo”, como a própria lei processual penal
reconhece, e nunca coisa julgada totalmente soberana e imutável, que para o réu
não se dá, ao menos até se ver o resultado de eventual revisão criminal.
Para autores presos aos dogmas do processo civil ontologicamente não haveria
diferença da coisa julgada material do cível para o processo penal, mas, na verdade,
existe uma diferença crucial, pois segundo Sérgio de Oliveira Médici, “assegurada
pela CF, a coisa julgada é plena no campo extrapenal, pois as revisões dos julgados
estão limitadas no tempo. Findo o prazo, opera-se a imutabilidade absoluta. No
âmbito penal, entretanto, o problema apresenta algumas peculiaridades, que exigem
456 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

uma adequação desses conceitos às regras específicas da revisão criminal (art. 5º,
XXXVI, da Carta Magna)” (2000, p. 2.007).
Assim, no processo penal, até por existir um mandamento constitucional (art.
5º, XXXVI), a coisa julgada material é sempre relativa e não absoluta, conforme ob-
servam autores mais atentos a uma teoria geral adequada ao processo penal, como
Rogério Lauria Tucci, que observa que diferentemente do que acontece no processo
civil de caráter contencioso, a exigência de irrevogabilidade do ato decisório de
mérito não se faz absoluta no processo penal, e acrescenta que “há sentenças penais
que transitam em julgado apenas formalmente, podendo ser revogadas em qualquer
tempo ou circunstâncias” (1984, p. 22)
Portanto, deve se indagar se realmente existe a coisa julgada material quando
findo o processo penal, já que esta pressupõe que a decisão seja imutável.
Pelo visto, a rigor, não! Simplesmente porque não se pode transportar do pro-
cesso civil para o penal as mesmas consequências, pois fica sempre aberta a possibi-
lidade de a defesa mudar a decisão e, mudando a decisão, altera-se a coisa julgada.
Consoante Miguel Fenech, “o adjetivo julgada indica a situação em a coisa-
objeto se encontra quando tiver definitivamente resolvida.O efeito da coisa julgada
é o efeito da resolução do processo quando for decidido definitivamente” (1952, p. 528).
E, de acordo com o saudoso Pitombo, em julgado do extinto TASP, só existe
coisa julgada de autoridade absoluta “quando se forma em face de sentença, ou
acórdão, de natureza declaratória ou constitutiva (...). Coisa julgada de autoridade
relativa é adstrita à sentença penal de natureza declaratória, a qual se pode ver revogar
ou modificar a qualquer tempo, seja mediante ação penal de habeas corpus, seja por
via de ação de revisão criminal”(1) (grifo nosso).
Assim, conforme Marcelo de Cunha de Araújo, no processo penal, “se a coisa
julgada é plena nos casos de sentenças de absolvição (a imutabilidade aqui é absolu-
ta), o mesmo não ocorre com a sentença condenatória, que apresenta imutabilidade
relativa, pois pode ser alterada a qualquer tempo (p. 212).
Ora, se uma das partes (a parte ré) não é atingida de forma absoluta pela coisa
julgada ao se findar o processo, é evidente que o que ocorre é somente uma preclusão
recursal para o Estado e para a defesa.
Explica-se: para a parte ré o que existe é uma preclusão para se interpor
recursos, mas não para se interpor a revisão criminal. Se é assim, fica em aberto a
revisão da decisão, e se fica em aberto para uma das partes, em aberto também fica
para a acusação ou para o Estado. Para o Estado ou MP, assim, no processo penal,
também não se poderia tecnicamente se falar em coisa julgada, pois a decisão pode
ser modificada.
Se a decisão pode ser modificada, mesmo que seja por ato apenas da outra par-
te, ela não pode ser considerada imodificável ou intangível, e, assim, só há mesmo

(1) TASP, Revisão 262.126/5, j. 15.03.95, Rel. Juiz Sérgio Pitombo.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 457

uma preclusão, mesmo que para o MP ou o Estado esta seja mais forte. Novamente
relembrando: a coisa julgada material ou definitiva só se dá quando a decisão é
totalmente imutável.
Por hábito, costuma-se afirmar em obras de processo penal que, nessa área
do direito, “não há coisa julgada material para a defesa, tão só para o MP”. Porém,
como visto, inexiste até mesmo para o MP a coisa julgada material, já que a decisão
pode se alterada, e, se pode, não se deve falar propriamente em coisa julgada. Existe
apenas preclusão recursal, aberta a possibilidade de alteração por ato da defesa, e a
alteração atingirá a decisão e a todos.
Conclui-se que só haveria uma coisa julgada depois da revisão criminal. De
novo a pergunta: será por isso que o legislador do CPP fala somente em “processo
findo” como pressuposto da ação de revisão criminal? E o chamado trânsito em
julgado poderia ser considerado quando ocorre a preclusão ou só quando ocorre a
verdadeira coisa julgada? Todas essas indagações trarão consequências, por exem-
plo, ao se aferir o prazo inicial da chamada prescrição da pretensão executória e da
retroativa, como se verá.
Mas uma coisa parece certa: o termo trânsito em julgado é utilizado mais no
processo penal do que no processo civil. E a explicação parece ser que o termo
“trânsito em julgado” tenha mais afinidade com preclusão do que coisa julgada
material. No processo penal, ao se utilizar o termo “trânsito em julgado”, evita-se o
“inconveniente” de se afastar muito da chamada teoria geral do processo (que é toda
dirigida ao processo civil) e se admitir uma “coisa julgada imutável e soberana”, já

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


que no processo penal a decisão pode (mesmo que dependente de uma impugnação
da defesa), a todo tempo, mesmo após a extinção da punibilidade, ser mutável ou
desconstituída. Uma evidente contradição com a “coisa julgada” da teoria geral do
processo. Melhor, assim, se falar em “trânsito em julgado”, que reflete melhor a
mera preclusão.

4. UM PROBLEMA PRÁTICO: O TRÂNSITO EM JULGADO E A


PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA
Em dissertação sobre o tema, Giovana Gurpilhares (2007, p. 49-66) traça uma
análise histórica sobre a legislação processual penal brasileira que regeu o trânsito
em julgado em material penal.
Tomando como base o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil (1890) até
a Lei nº 6.016/73, que promoveu algumas alterações no Código Penal, se dispunha
que o trânsito em julgado ocorria em um único momento para todas as partes no
processo penal, não havendo menção a momentos diferenciados para a acusação e
a defesa.
A compreensão inicial desse instituto no âmbito do direito penal seguia, assim,
os moldes conceituais da teoria geral do processo, como acima explanado, tomando
por base a estabilização da demanda, sem fazer referências subjetivas. Todavia, isso
estava em descompasso com o CPP, que não fala em trânsito julgado e/ou coisa julga-
458 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

da, e sim em “processo findo” e permite a alteração da decisão em tempo não fixado
para a defesa com a revisão criminal, aliás, com base em mandamento constitucional.
Com o advento da Lei nº 7.209/84, o art. 112 do CP sofreu pequena, mas, no
ponto em exame, muito significativa alteração, passando para a seguinte redação:
“Art. 112. No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr:
I – do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a
acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento
condicional.” (grifo nosso)
Frise-se que o art. 110, § 1º (prescrição retroativa), também se refere a um
“trânsito em julgado para a acusação”.
A partir da alteração legislativa, a doutrina e a jurisprudência passaram a uma
interpretação literal dos dispositivos, admitindo a possibilidade de desmembrar o
momento do trânsito em julgado da sentença penal para as partes, sem que houvesse
maiores preocupações qual o real objetivo da mudança de redação.
O PL nº 1.656/83, que alterou o Código Penal, não trouxe motivo expresso
para justificar o novo texto a respeito da contagem do prazo com base “no trânsito
em julgado para a acusação”, tampouco houve debate sobre o tema ao longo de
todo o trâmite legislativo, sendo o projeto aprovado de forma inquestionável pelos
parlamentares.
Para Franco e Stoco (2007, p. 591), a alteração objetivou consolidar o en-
tendimento jurisprudencial da época que, em prestígio ao princípio da vedação da
majoração da pena, já se considerava a possibilidade de divisão do momento do
trânsito em julgado para as partes, a fim de impedir que a acusação, uma vez inerte,
se insurgisse posteriormente para o recrudescimento da pena.
Destarte, ainda que em um juízo especulativo, pode-se concluir que a suposta
divisão do momento do trânsito em julgado para as partes no âmbito em matéria
penal buscava essencialmente garantir a impossibilidade de reformatio in pejus da
decisão, já que houve um desinteresse do MP em recorrer. É evidente que apenas se
dividiu o momento preclusivo por não mais poder o MP recorrer.
Mas o que é certo é que a redação dada ao citado dispositivo do Código Penal
contribui para aumentar a confusão entres os institutos da preclusão, do trânsito
em julgado e da coisa julgada, culminado com a distorção dos conceitos na esfera
penal. Como já visto, pela teoria geral do processo, trânsito em julgado deveria
tecnicamente se dar de maneira simultânea para todos os sujeitos da ação penal,
estabilizando a demanda e formando o título judicial a partir da formação da verda-
deira coisa julgada, enquanto a preclusão seria apenas capaz de obstar a interposição
de novos recursos pela parte.
Mas não é o que ocorre no processo penal, pois, caso o MP ou o querelante não
recorra da decisão prolatada, estariam diante da preclusão temporal, consubstanciada
na perda do direito de recorrer e na impossibilidade de o réu ter sua situação piorada.
Porém, não seria possível falar em coisa julgada, porquanto a decisão ainda não foi
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 459

estabilizada, pois pode sofrer as consequências de uma eventual ação por parte da
defesa: a revisão criminal e, assim, não seria possível se falar em uma verdadeira
coisa julgada justamente por ausência de uma de suas principais características: a
imutabilidade da decisão.
A posição adotada no direito penal parece partir do simples fato de que, embora
possa a condenação ser reduzida ou desconstituída em face de possibilidade de revisão
criminal, a possibilidade de atuação acusatória já estaria encerrada quando houvesse
o fim do prazo para o recurso da acusação. Daí se falar em “trânsito em julgado para
a acusação”. O que é certo é que, em não havendo recurso do MP, ainda pode restar
o recurso defensivo, quando poderá ter possibilidade de redução da pena ou de ab-
solvição do acusado e mesmo não havendo recurso defensivo, poderá no futuro, em
caso de uma ação de revisão criminal por parte da defesa, haver a redução da pena,
a nulidade ou mesmo a absolvição, o que comprova a situação precária da decisão.
No estudo da teoria geral do processo não se cogita de uma “divisão” da coisa
julgada ou mesmo do trânsito em julgado, considerando-se os sujeitos da deman-
da, e quando muito se fala em formação de coisa julgada de capítulos da decisão,
mas não para partes processuais, porquanto esse fenômeno deve, necessariamente,
convergir para um único momento, qual seja quando mais nenhuma alteração possa
advir para qualquer um dos atores processuais sobre qualquer ponto da sentença.
O que ocorre no processo penal, por suas características especiais, é que o
simples fato de uma ou ambas as partes não terem recorrido não é condição sufi-
ciente para considerar a ocorrência de coisa julgada, ainda que parcial. Isso se dá

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


porque, sendo o MP (o que primeiro a ter a vista pessoal) intimado e deixar recorrer,
poderá o réu (ou sua defesa) ainda fazê-lo ao tomar ciência no prazo de lei (e não
poderá ter recurso adesivo do Parquet, já que esse é inexistente no processo penal).
E mesmo não havendo recurso defensivo, sempre poderá, ainda, ser proposta a ação
de revisão criminal por parte do réu ou dos seus sucessores e, assim, poderá haver
uma significativa modificação da decisão.
Como visto, a simples irrecorribilidade da decisão para uma ou ambas as partes
não é suficiente para a formação da coisa julgada material no processo penal, já que
é possível a qualquer tempo ação de revisão criminal.
O que parece ocorrer é que, dada a dificuldade de se adotar no processo penal
aquela teoria geral do processo que, na verdade, é voltada para o processo civil, o
legislador aponta como “transito em julgado” a preclusão temporal ou lógica, por não
ter havido ou impossível o recurso por uma das partes, e é assim que se interpreta
majoritariamente o art. 112, I, do CP na doutrina nacional.
Nas palavras de Damásio de Jesus
“O inciso I da disposição citada menciona como primeiro marco da
prescrição da pretensão executória o dia do trânsito em julgado da sentença
condenatória para a acusação. Literalmente, a decisão de condenação somente
transita em julgado quando não cabe mais recurso para nenhuma das partes,
acusação e defesa. Assim, uma primeira interpretação leva à conclusão de que
460 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

somente começa a correr o prazo prescricional referido quando, não cabendo


mais recurso da sentença condenatória, realmente surge a pretensão execu-
tória. Entretanto, a jurisprudência, apreciando o texto do primitivo CP de
1940, decidiu que a expressão ‘do dia em que passado em julgado a sentença
condenatória’ se referiria à acusação, prescindindo-se até de intimação do réu.
Daí a reforma penal de 1984 haver acrescentado ao texto a expressão ‘para a
acusação’.”(2) (2010, p. 121)
Como se vê, no processo penal se faz uma divisão dos efeitos preclusivos,
reconhecendo um “transito em julgado para a acusação e outro para a defesa” e em
momentos diversos.
Apesar de parecer que, dadas as características do processo penal, a solução
seria a mais adequada, não se pode dizer que esta é uma posição tranquila em sede
doutrinária ou jurisprudencial. Na verdade, não se pode dizer que existente um
consenso sobre a interpretação dada aos dispositivos legais, tanto que o STF reco-
nheceu repercussão geral ao ARE 848.107 RG/DF, ainda que com o foco voltado para
a análise da prescrição da pretensão executória, nos seguintes termos:
“Extinção da punibilidade. Termo inicial para a contagem da prescrição
na modalidade executória. Trânsito em julgado somente para a acusação. Art.
112, I, do CP. Necessidade de harmonização do referido instituto penal com o
ordenamento jurídico constitucional vigente, diante dos postulados da estrita
legalidade e da presunção de inocência (CF, art. 5º, II e LVII). Questão eminen-
temente constitucional. Matéria passível de repetição em inúmeros processos,
a repercutir na esfera do interesse público. Tema com repercussão geral.” (ARE
848.107 RG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 11.12.2014, Processo Eletrônico, DJe-033
Divulg. 19.02.2015, Public. 20.02.2015)
Nesse sentido deve-se destacar o posicionamento doutrinário de Alberto Silva
Franco e Rui Stoco (2007, p. 577-578), no sentido de que somente com o trânsito
em julgado para ambas as partes é que surgiria o título penal.
Portanto, é forçoso concluir que, a uma primeira vista, seria uma improprieda-
de da divisão do trânsito em julgado para as partes no processo penal, visto toda a
perspectiva lógica do ordenamento jurídico e do sistema da teoria geral do processo
e seus institutos. Não se pode confundir a mera preclusão recursal para a acusação,
cujo objetivo é a vedação da reformatio in pejus para o réu, com a coisa julgada,
éeisso não pode significar o trânsito em julgado se esse instituto for visto como uma
consequente formação da coisa julgada (como no cível o é).
Mas o que parece ocorrer é que a lei penal quer desconhecer a técnica processual
que dá significado ao trânsito em julgado como relacionada ao significado de coisa
julgada. Por política criminal e ante os postulados do favor rei, primeiro se reconhece
um “trânsito julgado para a acusação” quando essa deixa passar in albis o prazo de
recurso, o que não pode, como visto, por impropriedade significar a coisa julgada.

(2) Fala-se que isso era necessário, porque a prisão era automática com a condenação.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 461

O termo no processo penal, portanto, só é um sinônimo de mera preclusão, pois


coisa julgada não se daria, seja se ainda houver a possibilidade de propositura, no
prazo de lei, de um recurso, ou seja, ainda, porque a qualquer tempo pode se dar a
propositura pela defesa de ação de revisão criminal.
E mais, se conclui que existe no processo penal uma divisão do trânsito em
julgado ou seus efeitos em relação às partes, talvez por se considerar que no processo
penal a vista pessoal se dá primeiro para a acusação pública e este pode tomar ciên-
cia e não recorrer e, como a vista, posteriormente, deverá ser dada ao réu e, ainda,
ao seu advogado (e assim haverá um espaço temporal considerável de diferença),
já se começaria por fazer “precluir” o prazo recursal para acusação, e o chamado
“trânsito em julgado” da lei penal quer se referir certamente a isso, para fins de se
poder contar, a partir dali, o lapso da prescrição.
Essa, sem dúvida, é a intenção legislativa, mesmo que não se ajuste à técnica
da teoria geral do processo. A questão é por imperativo de um necessário favor rei.
O princípio que torna o processo penal sempre mais benéfico para a defesa.
Para se aceitar tal posicionamento, em suma, há de se entender que o termo
“trânsito em julgado” na lei penal quer se identificar com a mera preclusão recur-
sal, não levando em conta a verdadeira coisa julgada propriamente, pois essa não
ocorre de forma absoluta, e sim meramente relativa no processo penal, já que ainda
é possível a alteração da decisão com base em eventual ação de revisão criminal.
Aliando-se o processo penal e o direito penal, e considerado o fenômeno da

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


prescrição executória, temos, assim, um “trânsito em julgado” que se equivaleria
à preclusão, com sua divisão entre as partes, distanciando-o ainda mais do que se
reconhece como a verdadeira coisa julgada, pois essa inexiste no processo penal ante
a mutabilidade da decisão penal pela revisão criminal ou só poderia existir quando
julgada a revisão interposta.

5. CONCLUSÃO
A discussão deste estudo não se trata de mera ilação acadêmica, pois possui
significativas consequências no curso das ações penais, especialmente no que tange
ao regime de prescrição penal, especialmente no que se refere à prescrição executória
da pena (e também da retroativa).
Em primeiro lugar se demonstra, de forma inequívoca, que a teoria da coisa
julgada deve ser entendida de forma diversa no processo penal, daquela tradicional
visão da teoria geral do processo ou do processo civil.
De outra parte, isso traz efeitos, por exemplo, na área penal no momento de
se considerar o prazo inicial da contagem do prazo prescricional.
A concepção de prescrição nos remete à perda do direito de punir do Estado
pelo não exercício de sua prerrogativa em um determinado espaço de tempo. Trata-
se de causa de extinção da punibilidade.
462 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Nos termos do ordenamento penal, a prescrição pode ser contabilizada a partir


da pena em abstrato ou da pena em concreto. No primeiro caso, utiliza-se a pena
máxima cominada em tese ao delito para se chegar a uma das hipóteses previstas no
art. 109 do Código Penal, enquanto no segundo a prescrição é regulada pela pena
concretizada na sentença e subdivide-se em prescrição da pretensão punitiva, da
retroativa, da intercorrente e da executória.
Essa última, em especial, considerada por Nucci (2007, p. 587) como a perda
do direito de aplicar efetivamente a pena, concretamente estabelecida, considerando
o lapso percorrido entre a data do trânsito em julgado da decisão condenatória para a
acusação e o início do cumprimento da pena, sem dúvida é afetada pela diferenciação
entre a teoria da coisa julgada no processo civil e penal.
Isso decorre do fato de que a partir de uma interpretação conforme a teoria geral
do processo e a doutrina a essa ligada, o início do prazo da prescrição executória
deveria ser o momento em que ocorre o trânsito em julgado para ambas as partes, ou
seja, tanto para a acusação como para a defesa, até mesmo porque a divisão do trân-
sito em julgado é considerada inapropriada. Mas isso não ocorre no processo penal.
É certo que quando ocorre a preclusão para o MP este não mais poderá recorrer,
mas também é certo que durante um certo lapso de tempo posterior, no processo
penal, ainda haverá possibilidade de interposição de recurso pela defesa e, portanto,
em vista disso, o Estado não poderia iniciar o cumprimento da pena só em vista de
sua preclusão, até porque existiria uma vedação de ordem constitucional decorrente
do princípio da presunção de inocência.
Mas, não obstante tudo isso, passa a se constar o lapso prescricional, mesmo
não sendo iniciado o cumprimento da pena, com a modificação feita na redação dada
ao art. 112 do Código Penal, que incluiu como condição para tal só o trânsito em
julgado para a acusação. Ocorreu uma divisão do “trânsito em julgado”, e mesmo
que isso implique na subversão dos conceitos e dos efeitos tradicionais da teoria
geral do processo sobre a coisa julgada, há de se convir que a adequação foi efetuada
para atender às características especiais do processo penal.
Se é imprópria uma divisão do “trânsito em julgado” perante a teoria geral do
processo, tal não o é no processo penal, se considerado que no processo penal a vista
pessoal se dá primeiro para a acusação, já que essa pode tomar ciência e não recorrer
e a vista depois deverá ser dada, depois, tanto ao réu como ao seu advogado, e isso
faz advir um espaço temporal considerável entres as ciências, e, assim, ao efetuar
a modificação na lei penal, o legislador optou pela contagem imediata do lapso da
prescrição executória ao ocorrer a preclusão para o MP, de forma a autorizar a con-
tagem da prescrição da pretensão executória do réu.
Essa foi, sem dúvida, a intenção legislativa, por uma questão de favor rei, e
mesmo não se tomando partido sobre as divergências a respeito da questão penal
utilizada como exemplo neste estudo, há de se entender que o termo trânsito em
julgado na lei penal quer se identificar com a mera preclusão recursal, não levando
em conta a verdadeira coisa julgada, pois esta no processo penal não ocorre de forma
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 463

absoluta, e sim de forma meramente relativa, já que sempre será possível a alteração
da decisão com base em eventual ação de revisão criminal.

REFERÊNCIAS
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DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


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TUCCI, Rogério Lauria. Jurisdição e processo penal. Belém: ED Cejup, 1984.
CONDUÇÃO COERCITIVA EM CPI: A LEGALIDADE
DA CONDUÇÃO COERCITIVA DE TESTEMUNHA,
DETERMINADA POR COMISSÃO PARLAMENTAR DE
INQUÉRITO

Renato Marcão
Jurista; Membro do Ministério Público do Estado de São Paulo; Autor, dentre
outros, dos seguintes livros: Curso de Processo Penal; Curso de Execução Penal;
Lei de Execução Penal Anotada; Execução Penal; Prisões Cautelares, Liberdade
Provisória e Medidas Cautelares Restritivas; Crimes Ambientais; Crimes contra
a Dignidade Sexual; Estatuto do Desarmamento; Crimes de Trânsito; Tóxicos e
Código de Processo Penal Comentado (no prelo).

Rodrigo Tanamati
Juiz de Direito no Estado de São Paulo.

RESUMO
O presente trabalho visa buscar saber se as Comissões Parlamentares de In-
quérito têm poderes para determinar a condução forçada daquele que deixar de
comparecer voluntariamente.
Palavras-Chave: Condução Coercitiva de Testemunha. Comissão Parlamentar
de Inquérito – CPI. Legalidade.

TITLE: Coercive driving Parliamentary Inquiry Committee: legality of witness


coercive driving, determined by the Parliamentary Inquiry Committee.

ABSTRACT
This study aims to seek whether the Parliamentary Inquiry Committees have powers
to determine the conduct forced him who fails to appear voluntarily.
Keywords: Coercive Driving Witness. Parliamentary Inquiry Committees. Legality.

SUMÁRIO
1 Introdução. 2 Poderes Constitucionais das Comissões Parlamentares de
Inquérito. 3 Possibilidade Jurídica de Condução Coercitiva de Testemunha Deter-
minada por CPI. 4 Conclusão.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 465

1. INTRODUÇÃO
A atual crise política brasileira tem exigido, mais uma vez, a atuação efetiva do
Congresso Nacional no exercício de seu poder/dever de fiscalizar, por intermédio
das Comissões Parlamentares de Inquérito.
Em episódio ocorrido em um passado recente, uma das Comissões, no trans-
correr das investigações, determinou a condução coercitiva de testemunha que,
intimada, não compareceu à sessão designada para sua oitiva.
De tal proceder decorre a inquietação que constitui objeto do presente trabalho
e que visa buscar saber se as Comissões têm poderes para determinar a condução
forçada daquele que deixar de comparecer voluntariamente.

2. PODERES CONSTITUCIONAIS DAS COMISSÕES PARLAMENTARES DE


INQUÉRITO
O fiel desempenho da salutar missão constitucional incumbida às Comissões
representa uma garantia do Estado Democrático de Direito e é corolário da inde-
pendência e harmonia entre os Poderes da República.
Para obtenção dos resultados colimados pela carta política, as Comissões Par-
lamentares de Inquérito foram dotadas de poderes instrutórios, visando à apuração
de fatos delimitados, objeto de investigação.

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Segundo o § 3º do art. 58 da Constituição Federal, as Comissões Parlamentares
de Inquérito têm poderes de investigação próprios das autoridades judiciárias, além
de outros previstos nos regimentos das respectivas casas. Dentre os poderes enfeixa-
dos nas mãos das Comissões, inclui-se a possibilidade de intimar e ouvir testemunha.
Conforme Julio Fabbrini Mirabete, “a pessoa arrolada como testemunha está
obrigada a comparecer a juízo no local e na hora designados para o depoimento,
em qualquer ação penal. Salvo as hipóteses previstas em lei (arts. 207, 220, 221,
252, II, 258 e 564, I, do CPP), se a testemunha regularmente notificada deixar de
comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial
sua apresentação, ou determinar que seja ela conduzida por oficial de justiça, que
poderá solicitar auxílio da força pública”(1).
Disso decorre que a testemunha regularmente intimada tem o dever legal de
comparecer à sessão realizada pela Comissão Parlamentar de Inquérito e responder
aos questionamentos que lhe forem dirigidos, ressalvadas as exceções legais. Caso
não compareça espontaneamente, poderá ser determinada sua apresentação mediante
condução coercitiva.

(1) Código de Processo Penal interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
466 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

3. POSSIBILIDADE JURÍDICA DE CONDUÇÃO COERCITIVA DE


TESTEMUNHA DETERMINADA POR CPI
Verificada a ausência da testemunha, indaga-se: as Comissões Parlamentares
de Inquérito têm poder jurídico para determinar diretamente a condução coercitiva
da testemunha ausente ou necessita socorrer-se do Poder Judiciário para que esse
órgão verifique se ocorreu hipótese legal de cabimento da medida extrema?
O tema foi inicialmente regrado pela Lei nº 1.579/52, que dispõe sobre normas
gerais das Comissões Parlamentares de Inquérito. O art. 3º do referido diploma legal
dispõe: “Indiciados e testemunhas serão intimados de acordo com as prescrições
estabelecidas na legislação penal”.
O seu § 1º estabelece que, “em caso de não comparecimento da testemunha
sem motivo justificado, a sua intimação será solicitada ao juiz criminal da localidade
em que resida ou se encontre, na forma do art. 218 do Código de Processo Penal”.
Após, a Constituição Federal de 1988 dispôs no § 3º do art. 58 que as Comissões
Parlamentares de Inquérito terão os mesmos poderes instrutórios das autoridades
judiciais.
Daí a questão: a Lei nº 1.579/52 foi ou não recepcionada pela nova ordem
constitucional? Em outras palavras, dentro dos “poderes instrutórios” conferidos
pela Carta Magna às Comissões Parlamentares de Inquérito, está incluída a possi-
bilidade de determinar diretamente a condução coercitiva da testemunha faltante?
Sobre o tema, existem dois posicionamentos.
Para alguns, o mencionado dispositivo legal não foi recepcionado pela atual
Constituição, uma vez que esta conferiu poderes para a CPI realizar diretamente
suas atividades, sendo dispensável socorrer-se do Judiciário para tal desiderato. Por
adotar esse entendimento, Alexandre de Moraes(2) inclui dentre os poderes da CPI a
possibilidade de determinar a condução coercitiva de testemunha.
Seguindo essa orientação, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reco-
nheceu a ausência de interesse de agir em pedido de condução coercitiva de teste-
munha formulado, em jurisdição voluntária, pelo presidente de CPI instalada na
esfera municipal, fundamentando que a Constituição Federal “concedeu poderes
de investigação próprios das autoridades judiciais às comissões parlamentares de
inquérito, pelo que não se vislumbra necessidade na prestação jurisdicional almejada”
(Apelação Cível 308.048-5/2-00, 5ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Ricardo
Anafe, j. 04.09.03).
O Supremo Tribunal Federal sinalizou para a possibilidade de condução coer-
citiva pela CPI, ao conceder, em caráter preventivo, ordem de habeas corpus contra
ameaça de constrangimento à liberdade de locomoção, materializada na “intimação
do paciente para depor em CPI, que contém em si a possibilidade de condução

(2) Direito constitucional. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2001.


Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 467

coercitiva da testemunha que se recuse a comparecer” (HC 71.261, Tribunal Pleno,


Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 11.05.94, DJ 24.06.94).
Para outros, e dentre eles Cássio Juvenal Faria(3), a Lei nº 1.579/52, nesse
particular, permanece em vigor, competindo ao Poder Judiciário aferir a legalidade
e determinar a condução coercitiva, se for o caso, por se tratar de medida que afeta
direitos fundamentais e, dessa forma, incluída entre as atribuições precípuas da
função jurisdicional.
Registre-se que está em tramitação no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº
2.266/07, que dispõe sobre a possibilidade de condução coercitiva de testemunhas
e indiciados determinada por Comissão Parlamentar de Inquérito, dando nova
redação à Lei nº 1.579/52.

4. CONCLUSÃO
A relevância do papel jurídico-constitucional conferido pela Carta Magna às
Comissões Parlamentares de Inquérito demanda que sejam elas dotadas de instru-
mentos eficientes no desempenho de suas atividades.
Sob esse prisma, é de se admitir que, respeitados os limites impostos pelo
ordenamento jurídico, são amplos os poderes investigatórios das Comissões.
Assim sendo, a possibilidade de determinar condução coercitiva diretamente,
sem intervenção do órgão jurisdicional, é inerente às atribuições constitucionalmente
outorgadas às Comissões, como forma de garantir a celeridade e a efetividade das

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — DOUTRINAS


investigações e, consequentemente, da atividade fiscalizatória atrelada ao Poder
Legislativo. Nessa seara, não incide o princípio constitucional da “reserva de juris-
dição”. Fica resguardado, todavia, o direito daquele que se sentir lesado, de buscar
junto ao Poder Judiciário, instituição estatal imparcial e que tem como função pre-
cípua aplicar o direito ao caso concreto, apreciar eventual ameaça ou lesão a direito.

(3) Comissões Parlamentares de Inquérito. 2 ed. São Paulo: Paloma, 2002.


SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

HABEAS CORPUS Nº 118.891-SP


Primeira Turma (DJE 20/10/2015)

Relator: Ministro Edson Fachin


Data do julgamento: 01/09/2015

77/184 — EMENTA: DELITO SOCIETÁRIO. CRIME DE AUTORIA


COLETIVA. DENÚNCIA GENÉRICA. INÉPCIA. INOCORRÊNCIA. OBSER-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


VÂNCIA DO ART. 41 DO CPP. SUFICIENTE DESCRIÇÃO DO FATO TIDO
COMO CRIMINOSO. PODER DE GESTÃO NA PESSOA JURÍDICA. INDÍCIO
MÍNIMO DE AUTORIA. NÃO CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.
1. Não se admite habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, sob pena
de ofensa ao regramento do sistema recursal previsto na Constituição Federal.
2. Não há abuso de acusação na denúncia que, ao tratar de crimes de
autoria coletiva, deixa, por absoluta impossibilidade, de esgotar as minúcias
do suposto cometimento do crime.
3. Há diferença entre denúncia genérica e geral. Enquanto naquela se
aponta fato incerto e imprecisamente descrito, na última há acusação da prá-
tica de fato específico atribuído a diversas pessoas, ligadas por circunstâncias
comuns, mas sem a indicação minudente da responsabilidade interna e indi-
vidual dos imputados.
4. Nos casos de denúncia que verse sobre delito societário, não há que se
falar em inépcia quando a acusação descreve minimamente o fato tido como
criminoso.
5. O poder de gestão configura indício mínimo da autoria das práticas
delitivas realizadas, em tese, por meio de pessoa jurídica.
6. Habeas corpus não conhecido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Senhora Ministra Rosa
Weber, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unani-
midade de votos, em não conhecer da impetração, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 1º de setembro de 2015.
Ministro Edson Fachin – Relator
470 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator):
Trata-se de habeas corpus, aparelhado com pedido de medida liminar, impe-
trado contra acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, assim ementado:
“HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA FORMAL DA DENÚN-
CIA. INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.
1. A dificuldade de apuração de certos fatos, tal como os delitos societá-
rios, não é suficiente para afastar a garantia constitucional da personalidade da
responsabilidade penal, mas, a depender da situação, admite temperamentos
ao princípio ortodoxo da individualização da conduta de cada denunciado
(v.g., STF, HC 85.549, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 13.09.05, DJ 14.10.05).
2. Daí que, tratando-se de crimes societários, em que não se verifica, de
plano, que ‘as responsabilidades de cada um dos sócios ou gerentes são dife-
renciadas, em razão do próprio contrato social relativo ao registro da pessoa
jurídica envolvida’, não há inépcia da denúncia pela ausência de indicação
individualizada da conduta de cada indiciado, sendo suficiente a de que ‘os
acusados sejam de algum modo responsáveis pela condução da sociedade sob
ao qual foram supostamente praticados os delitos’ (v.g., STF: HC 85.579, Rel.
Min. Gilmar Mendes, j. 24.05.05, DJ 24.06.05; HC 89.985 AgR, Rel. Min.
Sepúlveda Pertence, j. 05.12.06, DJ 19.12.06; e HC 94.670, Relª Minª Cármen
Lúcia, j. 21.10.08, DJe 23.04.09; STJ: RHC 19.076/MG, Relª Minª Maria The-
reza de Assis Moura, DJ 04.06.09; e HC 111.107/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves
Lima, DJe 24.11.08).
3. No caso, enfatizou o Tribunal de origem, com base nos fatos e nas pro-
vas que permeiam a lide, que ‘a denúncia esclarece e comprova com a juntada
de documentos a condição dos acusados como administradores da empresa
em ordem a estabelecer a vinculação dos resultados delitivos com o exercício
das funções de gestão a eles atribuídas’; a circunstância de os pacientes terem
sido denunciados na condição de dirigentes, aos quais cabem, em princípio,
as decisões atinentes ao exercício das atividades da sociedade empresária, deve
ser tida, ao menos, como indício suficiente de autoria, o qual é suficiente para
o recebimento da denúncia.
4. Acrescente-se, por fim, que a denúncia expôs os fatos de modo a per-
mitir a compreensão da imputação e, em consequência, o exercício da ampla
defesa, com a indicação da qualificação dos pacientes, a data e o local dos fatos,
bem como a forma de execução dos crimes, razão pela qual não há falar, no
caso, em inépcia da denúncia.
5. Ordem denegada.” (HC 132.959/SE Rel. Min. Celso Limongi [Des.
Conv. do TJSP], Sexta Turma, j. 19.10.2010, DJe 16.11.2010)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 471

Ao indeferir o pleito liminar, o Ministro Ricardo Lewandowski, meu anteces-


sor na relatoria deste feito, com a costumeira propriedade, assim resumiu a marcha
processual:
“Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por Arnaldo
Malheiros Filho, José Eduardo Rangel de Alckmin e Thiago Diniz Barbosa Ni-
colai, em favor de Rafael José Hasson, Marco Pólo Marques Cordeiro e Ederval
Rucco, contra acórdão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que
denegou a ordem pleiteada no HC 132.959/SP, Rel. Min. Celso Limongi (Des.
Conv. do TJSP).
Os impetrantes noticiam, de início, que os pacientes foram denunciados
em razão do ‘escândalo dos precatórios’, quando obtiveram ‘lucros extraordi-
nários’ por instituições financeiras que participaram de ‘operações day trade’
– operação de compra e venda simultânea de determinado lote de títulos.
Informam que a negociação desses títulos fora iniciada por instituições
financeiras envolvidas no que a CPI dos Precatórios denominou de ‘cadeia da
felicidade’, sendo que entre as referidas instituições se encontrava o Banco In-
terfinance S/A, o qual teve seus dirigentes acusados de formação de quadrilha,
gestão fraudulenta e negociações de títulos irregulares emitidos pelo Estado
de Alagoas (Lei nº 7.492/86, art. 7, II).
Esclarecem que o Juízo Federal de Primeira Instância absolveu os acu-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


sados com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal (‘não
constituir o fato infração penal’). No entanto, o Tribunal Regional Federal da
3ª Região, por maioria de votos, proveu parcialmente o recurso de apelação
interposto pelo Ministério Público Federal, para condenar os acusados pela
prática dos delitos previstos nos arts. 4º e 7º, II, ambos da Lei nº 7.492/86, c/c
os arts. 29, 70 e 71 do Código Penal.
Assim, o primeiro paciente foi condenado à pena de 8 (oito) anos e 2
(dois) meses de reclusão, a ser cumprida no regime semiaberto, e 135 (centro
e trinta e cinco) dias-multa; o segundo paciente, à pena de 6 (seis) anos, 9
(nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, a ser cumprida no regime inicial
semiaberto, e 108 (cento e oito) dias-multa; e o terceiro paciente, à pena de 5
(cinco) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão, a ser cumprida no
regime inicial semiaberto, e 81 (oitenta e um) dias-multa.
Contra a parte não unânime do julgado foram interpostos embargos in-
fringentes e, concomitantemente, houve a interposição de recurso especial e
a formalização do Habeas Corpus 132.959/SP no Superior Tribunal de Justiça.
Os impetrantes informam que os embargos infringentes foram parcial-
mente recebidos, para absolver os acusados da prática do crime de emissão
fraudulenta de títulos (art. 7º, II, da
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Lei nº 7.492/86), mantendo-se a conde-
nação no tocante ao delito de gestão fraudulenta.
472 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

O recurso especial não foi admitido, sendo interposto Agravo no Recurso


Especial – AREsp 75.419/SP. A Ministra Alderita Ramos de Oliveira não co-
nheceu do recurso, por ser intempestivo.
O agravo regimental formalizado contra essa decisão foi desprovido e, na
sequência, foram rejeitados os embargos declaratórios apresentados pela defesa.
Por fim, houve a inadmissão do recurso extraordinário protocolado pela
defesa, em face da ausência de repercussão geral da questão constitucional,
sendo negado seguimento ao agravo no recurso extraordinário.
Está pendente de apreciação, pela Corte Especial do Superior Tribunal de
Justiça, o agravo regimental interposto contra essa última decisão.
No Habeas Corpus 132.959/SP, que teve curso no Superior Tribunal de
Justiça – impetrado concomitantemente com a interposição do recurso espe-
cial –, impugnou-se o acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3â
Região, mediante o qual, por maioria, foi parcialmente provido o recurso de
apelação do Ministério Público Federal. Arguiu-se, mais uma vez, a inépcia da
denúncia. Contudo, a ordem foi indeferida.
É contra esse acórdão que se insurgem os impetrantes.
Sustentam, em síntese, que a denúncia oferecida contra os pacientes é
inepta, sob o argumento de que a conduta descrita pela acusação se funda
apenas em razão dos cargos à época ocupados pelos agentes, apoiando-se a
imputação tão somente na responsabilidade objetiva.
Aduzem que a mera condição de sócio ou de diretor da instituição bancá-
ria é suficiente para imputar a alguém a prática de ato criminoso, motivo pelo
qual pretendem a anulação do Processo-Crime 2000.61.81.008198-3, em curso
na Justiça Federal de São Paulo, no Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
(...)
Ao final, pleiteiam a concessão definitiva da ordem para assentar a inépcia
da denúncia, por meio da qual se imputa aos pacientes a prática do crime de
gestão fraudulenta pela mera ‘condição de dirigentes’ da instituição financeira,
anulando-se o Processo-Crime 2000.61.81.008198-3 desde o oferecimento da
denúncia, inclusive.”
Em síntese, os impetrantes postulam o reconhecimento de constrangimento
ilegal decorrente da inépcia da denúncia, visto que, segundo alegam, a peça acusató-
ria não teria descrito de forma individualizada a conduta criminosa, supostamente
praticada pelos acusados. Argumentam que a denúncia limita-se a apontar, a título
de conteúdo acusatório, que os pacientes figuravam como dirigentes do Banco
Interfinance S/A, de modo que a condenação, lastreada puramente em tais circuns-
tâncias, implica ilegítima responsabilização penal objetiva. Nas palavras da defesa:
“A denúncia impede o exercício da defesa, pois todas as ações nela
descritas são imputadas apenas à instituição financeira e não às pessoas dos
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 473

acusados. Nenhuma pessoa física é acusada de fazer ou deixar de fazer alguma


coisa, apenas de integrar o conjunto de ‘representantes legais’ da instituição.”
E ainda:
“Os pacientes foram condenados a penas corporais e pecuniárias somente
porque seus nomes constavam do estatuto social de uma instituição financeira.
Inobstante a patente inépcia de inicial posta nestes termos, a colenda
Corte a quo assentou que não há ilegalidade alguma em denunciar os pacientes
pela mera ‘condição de dirigentes’ (fl. 453, doc. n. 1).
Com isso o v. acórdão fere gravemente o art. 41 do Código de Processo
Penal e despreza o exercício da defesa, razão pela qual é imperiosa a concessão
de habeas corpus para anular, desde o oferecimento da denúncia, o processo
movido contra os pacientes.”
Indeferida a liminar pleiteada (e.doc. 13).
Prestadas as informações pela autoridade coatora (e.doc. 24), o Ministério
Público Federal opinou pela denegação da ordem (e.doc. 25).
É o relatório.

VOTO
O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator): Inicialmente, insta consignar que se
trata de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, sendo que a inobservância ao

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


regramento do sistema recursal, disposto no texto constitucional, somente desafiaria a
concessão da ordem de ofício em caso de patente teratologia ou flagrante ilegalidade.
Acerca do tema, destaco:
“Habeas corpus. Substitutivo do recurso constitucional, inadequação da via
eleita, latrocínio tentado, quadrilha armada, prisão preventiva fundamentada. 1.
Contra a denegação de habeas corpus por Tribunal Superior prevê a Constituição
Federal remédio jurídico expresso, o recurso ordinário. Diante da dicção do art.
102, II, a, da Constituição da República, a impetração de novo habeas corpus em
caráter substitutivo escamoteia o instituto recursal próprio, em manifesta burla ao
preceito constitucional. 2. Havendo condenação criminal, ainda que submetida
à apelação, encontram-se presentes os pressupostos da preventiva, a saber,
prova da materialidade e indícios de autoria. Não se trata, apenas, de juízo de
cognição provisória e sumária acerca da responsabilidade criminal do acusado,
mas, sim, de julgamento condenatório, precedido por amplo contraditório e
no qual as provas foram objeto de avaliação imparcial, vale dizer, de um juízo
efetuado, com base em cognição exaustiva, de que o condenado é culpado de
um crime. Ainda que a sentença esteja sujeita à reavaliação crítica por meio de
recursos, a situação difere da prisão preventiva decretada antes do julgamento.
3. Se as circunstâncias concretas da prática do crime indicam a periculosidade
e o risco de reiteração delitiva, está justificada a decretação ou a manutenção
da prisão cautelar para resguardar a ordem pública, desde que igualmente
474 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

presentes boas provas da materialidade e da autoria, como na hipótese. 4. Ha-


beas corpus extinto sem resolução do mérito. Prejudicado o agravo regimental
manejado contra o indeferimento da liminar.” (HC 115.877, Relª Minª Rosa
Weber, Primeira Turma, j. 21.05.2013, Processo Eletrônico, DJe-105, Divulg
04.06.2013, Public 05.06.2013, grifei)
No mérito, em suma, os impetrantes apontam que a denúncia apresentada não
preenche seus requisitos de aptidão, visto que não descreve, de forma pormenori-
zada e individual, as contribuições de cada acusado para a consumação dos crimes
objeto de imputação.
Anoto, de início, que a irresignação limita-se a rechaçar a deflagração da ação
penal por meio de denúncia inepta, notadamente em razão da apontada ausência
de descrição mínima de condutas potencialmente criminosas.
Sendo assim, a efetiva contribuição típica de cada acusado no que toca ao
fenômeno criminoso, reconhecida em grau exauriente pelas instâncias ordinárias,
desborda da impetração e, por consequência, não se submete à rediscussão pela via
eleita. A partir disso, não há como se alcançar, ao menos de forma direta, o mérito
das manifestações jurisdicionais que, repito, em cognição plena, julgaram perfecti-
bilizada a formação da culpa dos pacientes. Em outras palavras: a impetração não se
destina a rediscutir, de forma imediata, o provimento condenatório, de modo que a
insurgência é dirigida tão somente ao combate formal da peça acusatória.
Ademais, como já relatado, os recursos excepcionais interpostos contra o acór-
dão condenatório não foram admitidos, providência que não deve ser subvertida,
ainda que por via oblíqua, pela utilização descomedida de habeas corpus.
Feito esse esclarecimento, passo a analisar a legalidade da instauração da ação
penal.
Com efeito, a ordem constitucional vigente impõe ao dominus litis que a peça
acusatória, nos termos do art. 41 do CPP, indique, de forma clara e precisa, os fatos
penalmente relevantes, e suas respectivas circunstâncias, que possam ser atribuídos
ao acusado:
“A denúncia deve projetar todos os elementos – essenciais e acidentais – da
figura típica ao caso concreto.” (Inq 3.752, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda
Turma, j. 26.08.2014)
“A denúncia deve conter a exposição do fato delituoso, descrito em toda
a sua essência e narrado com todas as suas circunstâncias fundamentais. (...)
Denúncia que deixa de estabelecer a necessária vinculação da conduta individual
de cada agente aos eventos delituosos qualifica-se como denúncia inepta.” (HC
84.580/SP, Rel. Min. Celso de Mello, DJe n. 176, publ. 18.09.09)
Tal exigência tem como supedâneo o balizamento da atuação jurisdicional
vindoura, adstrita ao juízo de correlação que gravita em torno da manifestação
acusatória. Sendo assim, não se cogita de condenações que surpreendam os atores
processuais.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 475

Os requisitos da peça acusatória ainda visam garantir o amplo exercício da de-


fesa. Isso porque, à obviedade, não há como o denunciado se insurgir, com paridade
de armas, contra o que não conhece. Nessa perspectiva, chancelar a materialização da
atividade acusatória por meio do recebimento de denúncia absolutamente genérica
significa, desavisadamente ou não, anuir com uma atmosfera processual compatível
com processos kafkianos que, inevitavelmente, escapam do devido processo legal.
Não bastasse, a exigência de que a denúncia preencha certos requisitos também
tem como norte impedir que a peça exordial seja fruto da vontade caprichosa ou
arbitrária de seu subscritor. De tal modo, incumbe ao agente ministerial demonstrar
a mínima viabilidade da deflagração da ação penal.
Logo se nota, portanto, a relevância dos requisitos da denúncia, os quais devem
ser lidos a partir da limitação do poder-dever de acusar e, de acordo com a ambiência
da vedação do arbítrio estatal em que estão inseridos, sempre com a observância
do devido processo legal. Esse é o pano de fundo que justifica, legitimamente, a
limitação do agir ministerial.
Ao meu sentir, contudo, não há abuso de acusação na denúncia que, ao tratar
de crimes de autoria coletiva, deixa, por absoluta impossibilidade, de esgotar as
minúcias do suposto cometimento do ilícito, porque, “em não raras oportunidades,
as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo
que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual” (RE 548.181,
Relª Minª Rosa Weber, Primeira Turma, j. 06.08.2013). Na mesma toada, colaciono
os seguintes precedentes:

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


“A alegação de que nos delitos societários é necessário que a denúncia
individualize a participação de cada um dos acusados não encontra apoio na
orientação da jurisprudência desta Corte, que não considera condição ao ofe-
recimento da denúncia a descrição mais pormenorizada da conduta de cada sócio
ou gerente, mas apenas que se estabeleça o vínculo de cada um ao ilícito.” (HC
74.791, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, j. 04.03.97)
“A condição de gestores da empresa, nos sucessivos períodos da prática dos
fatos delituosos, basta a fundar a imputação inicial feita a cada um dos pacientes,
não se prestando o habeas corpus à verificação do efetivo exercício da gestão, no
período em que por ela responsável.” (HC 85.549, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
Primeira Turma, j. 13.09.05)
Cumpre assinalar, por relevante, a diferenciação entre denúncia genérica (fato
incerto e imprecisamente descrito) e geral. Na última, tem-se a acusação da prática
de fato específico atribuído a diversas pessoas, ligadas por circunstâncias comuns,
mas sem a indicação da responsabilidade interna individual do fato. A título de es-
clarecimento, trago a seguinte lição sobre denúncia geral (sem grifo no original):
“Ocorre, entretanto, que quando o órgão de acusação imputa a todos,
indistintamente, o mesmo fato delituoso, independentemente das funções exer-
cidas por eles na empresa ou sociedade (e, assim, do poder de gerenciamento
ou de decisão sobre a matéria), a hipótese não será nunca de inépcia da inicial,
476 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

desde que seja certo e induvidoso o fato a eles atribuídos. A questão relativa à efe-
tiva comprovação de eles terem agido da mesma maneira é, como logo se percebe,
matéria de prova, e não pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo.
Com efeito, quando se diz que todos os sócios da determinada sociedade,
no exercício da sua gerência e administração, com poderes de mando e decisão,
em data certa, teriam deixado de recolher, ‘no prazo legal, contribuição ou outra
importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento
efetuado a segurados, a terceiros (...) (atual art. 168-A, CP), está perfeitamente
delimitado o objeto da questão penal, bem como a respectiva autoria. Não há, em
tais situações, qualquer dificuldade para o exercício da defesa ou para a correta
capitulação do fato imputado aos agentes.
A hipótese não seria de acusação genérica, mas geral. Acaso seja provado que
um ou outro jamais teria exercido qualquer função de gerência ou administração
na sociedade, ou que cumpria função sem qualquer poder decisório, a solução
será de absolvição, mas nunca de inépcia. É nesse sentido a decisão da Suprema
Corte, no julgamento do HC 85.579/MA, Rel. Min. Gilmar Mendes, 24.05.05
(Informativo STF n. 389, 01.06.05).
Questão diversa poderá ocorrer quando a acusação, depois de narrar
a existência de vários fatos típicos, ou mesmo várias condutas que contri-
buem ou estão abrangidas pelo núcleo de um único tipo penal, imputá-las,
genericamente, a todos os integrantes da sociedade, sem que se possa saber,
efetivamente, quem teria agido de tal ou qual maneira. Nesse caso, e porque
na própria peça acusatória estaria declinada a existência de várias condutas
diferentes na realização do crime (ou crimes), praticadas por vários agentes,
sem especificação da correspondência concreta entre uma (conduta) e outro
(agente), seria possível constatar a dificuldade tanto para o exercício amplo da
defesa quanto para a individualização das penas. A hipótese seria de inépcia
da inicial, por ausência de especificação da medida da autoria ou participação,
por incerteza quanto à realização dos fatos.
O que deve ser observado, pois – e insistimos nisso – é o preenchimento,
pela peça acusatória, das exigências relativas à tutela da efetividade do processo
(correta classificação do fato, pelo juiz) e da ampla defesa.
Somente sob tal perspectiva explica-se a orientação jurisprudencial no sen-
tido de que, tratando-se de crimes de autoria coletiva, é admitida uma imputação
geral aos acusados, reservando-se à fase instrutória a delimitação precisa de cada
uma delas (STF, HC 22.265/BA, DJ I, 17.02.03).” (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli
de. Curso de processo penal. 10. ed. Lumen Juris, 2008. p. 153-154)
Ainda pela aceitação de que a denúncia contenha certo grau de generalidade
na hipótese de crimes de autoria coletiva, colaciono os seguintes precedentes:
“1. Habeas corpus. Crimes contra a ordem tributária (Lei nº 8.137, de
1990). Crime societário. 2. Alegada inépcia da denúncia, por ausência de
indicação da conduta individualizada dos acusados. 3. Tratando-se de crimes
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 477

societários, não é inepta a denúncia em razão da mera ausência de indicação


individualizada da conduta de cada indiciado. 4. Configura condição de admissibi-
lidade da denúncia em crimes societários a indicação de que os acusados sejam de
algum modo responsáveis pela condução da sociedade comercial sob a qual foram
supostamente praticados os delitos. Precedentes (HC 80.812/PA, DJ 05.03.04;
RHC 65.369/SP, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 27.10.87; HC 73.903/CE, Rel.
Min. Francisco Rezek, DJ 25.04.97; HC 74.791/RJ, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ
09.05.97; e RHC 59.857/SP, Rel. Min. Firmino Paz, DJ 10.12.82). 5. No caso
concreto, a denúncia é apta porque comprovou que todos os denunciados
eram responsáveis pela representação legal da sociedade comercial envolvida.
6. Habeas corpus indeferido.” (HC 86.294, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda
Turma, j. 27.09.05)
“HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. ALEGADA
INÉPCIA DA DENÚNCIA. ORDEM INDEFERIDA. 1. A jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal é firme em considerar excepcional o trancamento
da ação penal pela via processualmente acanhada do habeas corpus (HC 86.786,
da relatoria do Ministro Carlos Ayres Britto; e HC 84.841, da relatoria do Mi-
nistro Marco Aurélio). 2. Quando se trata de apreciar alegação de inépcia de
denúncia ou de sua esqualidez por qualquer outra razão, dois são os parâmetros
objetivos, seguros, que orientam tal exame: os arts. 41 e 395 do Código de
Processo Penal. 3. Em se tratando de crime societário ou de gabinete, o Supremo
Tribunal Federal não aceita uma denúncia de todo genérica, mas admite uma de-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


núncia mais ou menos genérica. É que nos delitos dessa natureza fica muito difícil
individualizar condutas que são organizadas e quase sempre executadas a portas
fechadas. 4. A peça de acusação está embasada em elementos de convicção que
sinalizam a prática delitiva. Além de que permite ao acusado o exercício do
direito de defesa. 5. Ordem indeferida.” (HC 92.246, Rel. Min. Carlos Britto,
Primeira Turma, j. 11.11.08)
Compulsando o caso concreto, verifico que a denúncia, considerando o contexto
dos crimes de autoria coletiva, descreve minimamente o fato tido como criminoso,
cuja responsabilização é atribuída aos acusados. Inicialmente, a denúncia descreve
a ambiência inicial do fenômeno típico, inclusive com a contextualização do que
intitulou de “o escândalo dos precatórios”.
“I – INTRODUÇÃO. O FUNCIONAMENTO DO ‘ESQUEMA DOS PRE-
CATÓRIOS’.
A presente denúncia refere-se aos fatos amplamente divulgados pela
imprensa que ficaram conhecidos como ‘o escândalo dos precatórios’, especi-
ficamente no que diz respeito à realização de operações financeiras irregulares
nas negociações de letras financeiras estaduais e municipais, vinculadas ao
pagamento de precatórios no mencionado período, por meio de participações
em cadeias de operações day trade (‘cadeias da felicidade’, conhecidas também
no mercado como ‘operações esquenta-esfria’), nas quais foram apurados lu-
478 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

cros muito acima dos praticados em mercado, envolvendo a participação dos


representantes legais da instituição financeira Banco Interfinance S/A.
(...)
Conforme as informações consignadas no relatório final elaborado da
CPI dos Títulos Públicos (publicado no Diário do Senado Federal, sup. ao n.
150, de 27.08.97), tem-se que:
‘(...)
a) A Constituição permitiu que os precatórios pendentes de pagamento
até 05.10.1988, bem como seus juros e correção monetária, fossem parcelados
em oito pagamentos anuais, a partir de 01.07.89 (art. 33 do Ato das Disposições
Constituições Transitórias – ADCT);
b) Para ter direito a tal parcelamento, o Poder Executivo da União, dos
Estados ou dos Municípios precisaria editar medida neste sentido, no prazo
de até cento e oitenta dias após a promulgação da Constituição (art. 33 do
ADCT). Tal prazo esgotou-se em 03.04.89;
c) Os precatórios que foram parcelados podem ter seus pagamentos finan-
ciados pela emissão de títulos públicos (art. 33, parágrafo único, do ADCT); e
d) Não podem ser financiados pela emissão de títulos públicos:
– os precatórios que se tornaram pendentes de pagamento após 05.10.88
(art. 5º da EC nº 3/93);
– os precatórios pendentes de pagamento até 05.10.88 que não foram
parcelados, ou seja, aqueles cujo Poder Executivo devedor não editou medida
parcelando o pagamento;
– os precatórios pendentes de pagamento até 05.10.88 que não tenham
sido parcelados, de fato, ainda que o Poder Executivo devedor tenha editado
medida determinando o parcelamento do pagamento (mas não tenha posto
em prática o parcelamento); e
– os precatórios de natureza alimentar.’
A fase inicial da trama consistia na elaboração de cálculos que superesti-
mavam o volume de precatórios pendentes de pagamento e, por consequência,
estabeleciam o montante da emissão a ser pleiteada. Neste contexto, inspeções
realizadas por equipes de fiscalização do Banco Central identificaram que
algumas instituições financeiras estavam obtendo lucros extraordinários em
negociações de títulos públicos, mediante operações day trade – operação de
compra de determinado lote de títulos e sua venda simultânea, integral ou
parcial, num mesmo dia. Essa operação foi denominada, por membros da CPI
dos títulos públicos, de cadeia da felicidade.
A fase inicial da trama consistia na elaboração de cálculos que superesti-
mavam o volume de precatórios pendentes de pagamento e, por consequência,
estabeleciam o montante da emissão a ser pleiteada.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 479

(...)
Autorizadas as emissões, os títulos foram postos em oferta pública, como
dispõe a Resolução CMN nº 565, de 20.09.79, e a respectiva autorização do
Senado.
Os deságios concedidos pelos Estados quando da colocação dos títulos no
mercado, atingindo até 9,79% a.a., após as negociações day trade, chegavam,
no fim do dia, aos tomadores finais com descontos ainda menores, a maioria
abaixo de 2,0% a.a. No curso das cadeias de compra e venda, a diferença entre
o deságio concedido pelos Estados e o que foi recebido pelos compradores
finais foi distribuída entre as instituições financeiras participantes. Como os
títulos deveriam ser colocados por intermédio de leilão público, nos termos da
Resolução CMN nº 565, de 20.09.79, os Estados publicaram os editais relativos
ao lançamento das letras, onde foi concedido o exíguo prazo de 24 horas para
a apresentação das ofertas. Ao mesmo tempo, foi estipulado um preço mínimo
equivalente ao valor nominal, ou seja, sem qualquer deságio.
Vencido o prazo de 24 horas, os Estados/Municípios publicaram editais
informando que haviam alcançado proposta ao valor nominal do papel. Por
essa divulgação de resultado, induzia-se ao entendimento de que os leilões
efetivamente ocorreram e que os papéis foram colocados ao preço nominal,
sem deságio.
Uma vez concluída essa parte da operação, os Fundos de Liquidez dos

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Estados/Municípios envolvidos, de posse dos papéis emitidos, iniciavam o
processo de colocação dos títulos no mercado, mediante a concessão de ele-
vados deságios.
Propiciaram assim a apuração de lucros extraordinários a várias insti-
tuições.
Nessa fase, atuaram as instituições financeiras envolvidas no esquema,
coordenando e apresentando as propostas de compra por parte de terceiros ou
por parte delas mesmas. As vendas dos papéis ocorreram na data da publicação
dos editais que informavam o resultado dos pretensos leilões públicos. No
mesmo dia da colocação inicial foram realizadas cadeias de negociações day
trade envolvendo um determinado grupo de instituições, onde a maior parte
dos deságios concedidos pelos Estados foi apropriada por alguns dos partici-
pantes. Outra parte dos deságios iniciais, em parcela menor, foi distribuída por
meio de operações realizadas em datas posteriores às das colocações primárias.
Conforme consta de fl. 162 da Representação Criminal 08100.000067/99-
13, ‘as instituições envolvidas participantes dessas cadeias não possuíam
capacidade econômico-financeira suficiente para adquirir o volume de títulos
transacionados, o que demonstra a existência de esquema de negociação
montado exclusivamente para a distribuição de lucros. No encerramento das
cadeias day trade, para que a venda realmente pudesse se concretizar, sempre
480 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

havia a presença de uma instituição de grande porte ou fundos de investimento


e de previdência privada, atuando como comprador final’.
As empresas que mais se beneficiaram com os lucros apurados nas cadeias
de operações day trade e nas negociações posteriores, com lastro em títulos
emitidos pelos Estados de Alagoas, Pernambuco e Santa Catarina e Municípios
de Osasco e Guarulhos, vinculados ao pagamento de precatórios, estão relacio-
nadas a seguir. Entretanto, a maior parte desses resultados não foi incorporada
ao patrimônio das empresas; os recursos foram repassados a diversas pessoas
físicas e jurídicas, para dificultar a identificação do real beneficiário.
Segue relação das empresas beneficiadas com as operações day trade,
bem como a quantidade de participações nas cadeias de negociações de títulos
públicos vinculados a precatórios.
(...)”
Em seguida, a peça acusatória descreve a participação da instituição financeira
supostamente dirigida pelos pacientes (sem grifo):
“II – DA
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PARTICIPAÇÃO DO BANCO INTERFINANCE S/A NAS NE-
GOCIAÇÕES DE LETRAS FINANCEIRAS DESTINADAS AO PAGAMENTO
DE PRECATÓRIOS
No período compreendido entre o 2º semestre de 1995 e o 1º semestre de
1996, fiscalização realizada pelo Bacen detectou, na análise das negociações
realizadas por algumas instituições financeiras com títulos destinados ao
pagamento de precatórios do Estado de Alagoas, existência de estreito re-
lacionamento entre as empresas, que chegaram a lucrar R$ 13.134.651,91
(treze milhões, cento e trinta e quatro mil, seiscentos e cinquenta e um reais
e noventa e um centavos) com as operações do tipo day trade, conforme
quadro demonstrativo a fl. 171.
Com relação ao Banco Interfinance S/A, apurou-se que a instituição, por
meio de seus representantes legais, atuava, precipuamente, no início das cadeias de
negociação ‘day trade’, obtendo desta forma seus resultados mais expressivos. Do
total de lucros no valor de R$ 1.515.000,00 (um milhão, quinhentos e quinze
mil reais), a instituição obteve R$ 1.464.000,00 (um milhão, quatrocentos
e sessenta e quatro mil reais) nos dias em que atuou no mercado primário,
comprando as Letras diretamente do Fundo de Liquidez e mais R$ 50.816,04
(cinquenta mil, oitocentos e dezesseis reais e quatro centavos) em mais nove
participações, negociando com diversas instituições financeiras envolvidas
no ‘escândalo dos precatórios’, sendo que em duas operações, realizadas em
02.05.96 e 23.09.96, não obteve lucro Extra Selic, conforme demonstrativo
constante de fl. 173.
Os lucros foram obtidos pelo Banco Interfinance S/A no esquema através
das seguintes operações com a série A002 das LFT do Estado de Alagoas:
Constata-se que os acusados, responsáveis legais pelo Banco Interfinance S/A,
realizaram operações cujos valores a instituição não poderia suportar pela falta
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 481

de condição financeira. Apenas para exemplificar, o valor da operação realizada


no dia 21.12.95 foi de R$ 29.681.741,97, enquanto que o patrimônio líquido
da instituição, em 31.12.95, era de R$ 9.108.017,50. Prova disso é que efetu-
ava a sua venda imediata a terceiros, que, na maioria das vezes, também não
possuíam tais condições, sucedendo-se diversas operações de compra e venda
simultâneas, até que, ao final do dia, os papéis chegavam ao efetivo comprador,
que fornecia sustentação financeira para a concretização da série de transações,
fato de conhecimento dos intermediários da cadeia.
Os delitos perpetrados pelos acusados por meio do Banco Interfinance
S/A podem ser assim descritos:
A) NEGOCIAÇÃO IRREGULAR DOS TÍTULOS
Os acusados, na qualidade de responsáveis legais pelo Banco Interfi-
nance S/A, realizaram diversas negociações de títulos públicos emitidos para
o pagamento de precatórios de forma irregular, porquanto estavam eivados de
fraude em sua origem, uma vez que a emissão especial foi autorizada com base
em precatórios irrisórios ou totalmente inexistentes, obtendo, com a negociação
dos mesmos, lucros indevidos da ordem de R$ 1.515.000,00 (um milhão, qui-
nhentos e quinze mil reais).
B) INFRAÇÕES GRAVES NA CONDUÇÃO DOS NEGÓCIOS DA SO-
CIEDADE
Além dos fatos descritos no item anterior, os acusados, à frente do Banco

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Interfinance S/A, assumiram outros riscos incompatíveis com a situação econô-
mico-financeira da instituição, praticando, conscientemente, atos ilícitos com o
emprego de fraudes, obtendo vantagens indevidas com a aquisição dos títulos,
incorporando-os ao seu patrimônio. Na condução dos negócios da sociedade, os
acusados contrataram operações de alto risco com pessoas jurídicas não financeiras,
cuja situação econômica era incompatível com o risco assumido.
Verificaram-se, portanto, as seguintes irregularidades perpetradas pelos
acusados, responsáveis legais pelo Banco Interfinance S/A: a) realização de
negociações com títulos irregularmente registrados, pois a obtenção da autoriza-
ção para sua emissão foi fraudulenta, por terem sido forjadas as condições que a
possibilitaram; e b) gestão fraudulenta, decorrente de graves infrações na condução
dos interesses da instituição.
IV – DA RESPONSABILIDADE PENAL DOS ACUSADOS
De acordo com os estatutos sociais vigentes à época dos fatos, os denunciados
Rafael José Hasson, José Henrique de Gouvea Guerra, Marco Polo Marques Cor-
deiro, Carlos Américo de Arruda Campos, Ederval Rucco, integraram a diretoria
e a administração da instituição durante todo o período das condutas delituosas,
sendo que os denunciados Caio Eduardo Tripoli e Ricardo Humberto Rocha da
Silva respondem apenas pelas condutas delituosas praticadas após 11.04.06, data
em que passaram a ocupar os cargos de diretor comercial e diretor financeiro,
respectivamente.
482 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

V – DA CAPITULAÇÃO
Pelo exposto, o Ministério Público Federal denuncia os acusados Rafael
José Hasson, José Henrique de Gouvea Guerra, Marco Polo Marques Cordeiro,
Carlos Américo de Arruda Campos, Ederval Rucco, Caio Eduardo Tripoli e
Ricardo Humberto Rocha da Silva, por gerirem fraudulentamente a instituição
Banco Interfinance S/A, como incursos nas penas dos arts. 4º, caput, da Lei nº
7.492 e 7º, inciso II, do mesmo estatuto legal, por negociarem títulos obtidos
fraudulentamente, e, consequentemente, irregularmente registrados; (...) com
a ressalva de que os denunciados Caio Eduardo Tripoli e Ricardo Humberto
Rocha da Silva deverão responder apenas pelas condutas delituosas perpetradas
após 11.04.96 (...).”
Como se vê, a denúncia narra que os pacientes, na condição de dirigentes do
Banco Interfinance S/A, praticaram, “conscientemente, atos ilícitos com o emprego de
fraudes, obtendo vantagens indevidas com a aquisição dos títulos, incorporando-os
ao seu patrimônio. Na condução dos negócios da sociedade, os acusados contra-
taram operações de alto risco com pessoas jurídicas não financeiras, cuja situação
econômica era incompatível com o risco assumido”. Ainda detalha que os pacientes,
“na qualidade de responsáveis legais pelo Banco Interfinance S/A, realizaram diver-
sas negociações de títulos públicos emitidos para o pagamento de precatórios de
forma irregular, porquanto estavam eivados de fraude em sua origem, uma vez que
a emissão especial foi autorizada com base em precatórios irrisórios ou totalmente
inexistentes, obtendo, com a negociação dos mesmos, lucros indevidos da ordem
de R$ 1.515.000,00 (um milhão, quinhentos e quinze mil reais)”.
Ao contrário do sustentando pelos impetrantes, compreendo que a mera alusão
aos pacientes como representantes legais da instituição, quando, na verdade, atua-
vam na condição de representantes contratuais, constitui formalidade irrelevante,
visto que, além de não constituir elemento essencial da imputação, não prejudica a
intelecção de seu conteúdo.
Portanto, não se trata de denúncia que visa à responsabilização penal objetiva,
como quer fazer crer a defesa, visto que o Ministério Público imputou aos pacientes
a prática consciente e efetiva de condutas que entendeu criminosas.
Ademais, a acusação infere, de forma plausível, que o poder de gestão, concen-
trado pelos pacientes, configuraria indício mínimo da autoria das práticas delitivas
realizadas, em tese, por meio da pessoa jurídica. O efetivo exercício de função de
comando pelos administradores e a possibilidade de domínio da situação fática,
contudo, são circunstâncias cuja solução jurídica reclama instrução processual que,
por óbvio, empreende-se após o juízo de admissibilidade da peça incoativa.
Diante disso, não se verifica inépcia da denúncia, pois não se pode depreender,
a partir de sua atenta leitura, o desejo de responsabilização objetiva ou sem con-
duta específica, razão pela qual considero apta a denúncia vergastada. Sendo assim,
a confirmação da tese acusatória constitui tema de mérito, alheio à impetração, já
solucionado pelas instâncias ordinárias, soberanas quanto ao juízo fático.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 483

Pelo exposto, voto pelo não conhecimento do habeas corpus e pela não concessão
da ordem de ofício.
O Senhor Ministro Marco Aurélio – Vossa Excelência me permite?
O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator) – Sim.
O Senhor Ministro Marco Aurélio – O Supremo sempre distinguiu a situação
concreta em que desde o início se impugna a denúncia daquela em que, já na fase
recursal, alega-se vício dessa mesma peça. Sedimentou jurisprudência no sentido
de que, no primeiro caso, não há a preclusão, em que pese a existência de título
condenatório.
O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator) – Ministro Marco Aurélio, parece-me
exatamente ser a hipótese, por isso passo ao exame dos argumentos e das circuns-
tâncias atinentes à denúncia.
A segunda observação que faria, e a ela voltarei ao final, é que, da tribuna e
também do memorial foi aduzido um argumento que não está na impetração, que é
o julgamento pela esfera administrativa. Para não deixar in albis esse argumento, não
tratei dele no voto, porque não está na impetração, mas a ele voltarei mais adiante.
Cinjo-me, agora, examinar este argumento da alegada inaptidão da denúncia.

VOTO
O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso – Presidente, também eu, cumprimen-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


tando o Relator, entendo que a hipótese é de habeas corpus substitutivo de recurso
ordinário, na linha da nossa jurisprudência prevalecente, também eu tampouco estou
conhecendo. E, à vista da minuciosa exposição do eminente Ministro Luiz Edson
Fachin, concluo que não há inépcia na denúncia e, consequentemente, a hipótese
não é de trancamento, estou acompanhando Sua Excelência.
O Senhor Ministro Marco Aurélio – Presidente, no caso, a liberdade de ir e vir
não foi, por enquanto, alcançada. O que se tem é a condenação e articula-se com
o defeito da própria peça primeira da ação penal. O habeas surge, realmente, como
substitutivo do recurso ordinário constitucional.
No mais, cumprimento o profundo voto formalizado pelo Ministro Fachin e
digo que, no crime societário, não no episódio ligado à organização criminosa, fica
muito difícil, na denúncia, de início, individualizar-se a prática de cada qual dos
acusados. Apenas sobeja uma condenação: pela gestão fraudulenta. Caiu a conde-
nação pela falsificação criminosa.
Houve, na denúncia, a notícia sobre a qualificação dos envolvidos. Seriam eles
diretores gestores da entidade financeira. A definição da culpabilidade ficou para a
fase de instrução do processo-crime. Quanto às responsabilidades administrativa,
cível, jurisdicional e penal, tem-se a elucidação no Código Civil, no art. 935. Res-
saltou o Ministro Fachin, citando o ministro Luís Roberto Barroso, que apenas há
vinculação quando, na área penal, define-se a existência ou não do fato e também
484 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

da autoria. Então, sim, o que decidido no campo penal repercute no administrativo


e no cível; a recíproca não é verdadeira.
Por isso, acompanho Sua Excelência. Não é caso para implementar-se a ordem
de ofício e entendo inadequada, na primeira parte, a impetração.

VOTO
A Senhora Ministra Rosa Weber (Presidente) – Eu, da mesma forma.
Também haurindo meu voto nos substanciosos fundamentos do eminente
Relator, não visualizo aqui, com todo o respeito, em qualquer dos pacientes, a figura
do Joseph K. de O Processo, de Kafka. Sabiam eles sim, a denúncia possibilitou sim
a apresentação da defesa e sabiam eles do que estavam sendo acusados. Por óbvio,
não podemos examinar os crimes societários com o mesmo olhar que dirigimos
aos crimes perfeitamente subjetivos e atribuíveis aos agentes, na execução, de uma
forma concreta, que permita essa individualização.
Acompanho o eminente Relator.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

HABEAS CORPUS Nº 129.554-SP


Primeira Turma (DJE 15/10/2015)

Relatora: Ministra Rosa Weber


Data do julgamento: 29/09/2015

77/185 — EMENTA: SÚMULA Nº 691/STF. AFASTAMENTO. TRÁFICO


DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ARTS. 33 E 35
DA LEI Nº 11.343/06. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔ-
NEA. MOTIVAÇÃO GENÉRICA E ABSTRATA. CONCESSÃO DA ORDEM.
1. Em casos excepcionais, viável a superação do óbice da Súmula nº 691
desta Suprema Corte. Precedentes.
2. O decreto de prisão cautelar há de se apoiar nas circunstâncias fáticas
do caso concreto, evidenciando que a soltura, ou a manutenção em liberdade,
do agente implicará risco à ordem pública, à ordem econômica, à instrução

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


criminal ou à aplicação da lei penal (CPP, art. 312).
3. A motivação genérica e abstrata, sem elementos concretos ou base empí-
rica idônea a amparar o decreto prisional esbarra na jurisprudência consolidada
deste Supremo Tribunal Federal, que não lhe reconhece validade. Precedentes.
4. Substituição da prisão preventiva por medidas cautelares previstas no
art. 319 do Código de Processo Penal, a serem fixadas pelo juízo de primeiro
grau.
5. Ordem de habeas corpus concedida para revogar a prisão preventiva
dos pacientes, sem prejuízo da imposição, pelo magistrado de primeiro grau,
se assim o entender, das medidas cautelares ao feitio legal.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência da Senhora Ministra Rosa
Weber, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por una-
nimidade, em conceder a ordem de habeas corpus para revogar a prisão preventiva,
nos termos do voto da Relatora.
Brasília, 29 de setembro de 2015.
Ministra Rosa Weber – Relatora
486 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Trata-se de habeas corpus, com
pedido de liminar, impetrado por Renan Gonçalves Antunes em favor de Cleyton
Araújo Faria, João Lucas Rodrigues da Silva Siqueira, Luis Henrique Rodrigues da
Silva e Matheus Ferreira Barbosa contra decisão monocrática da lavra da Ministra
Laurita Vaz, no exercício da Presidência do Superior Tribunal de Justiça, que inde-
feriu a liminar no HC 329.235/SP.
Os pacientes foram presos em flagrante delito, em 20.06.2015, e, posteriormen-
te, denunciados pela suposta prática dos crimes de tráfico de drogas e associação para
o tráfico, tipificados nos arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06. O magistrado de primeiro
grau converteu o flagrante em prisão preventiva forte na garantia da ordem pública,
na conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal.
Inconformada, a defesa impetrou habeas corpus perante o Tribunal de Justiça
do Estado de São Paulo, que indeferiu a medida cautelar.
Submetida a questão à apreciação do Superior Tribunal de Justiça no HC
329.235/SP, a Ministra Laurita Vaz indeferiu a liminar.
No presente writ, o impetrante pugna, preliminarmente, pelo afastamento da
Súmula nº 691/STF. Para tanto, assevera a ilegalidade das prisões em flagrante diante
do uso indevido de algemas e da alegada violência perpetrada pelas autoridades
policiais, apontando, como elementos comprobatórios dos fatos alegados, as decla-
rações prestadas pelos moradores do local do flagrante. Alega, ainda, a inexistência
dos pressupostos autorizadores das prisões preventivas e a falta de fundamentação
idônea. Afirma que os pacientes possuem residência fixa, não são reincidentes, nem
possuem maus antecedentes, “salvo João Lucas Rodrigues da Silva Siqueira, que
ostenta, já que tem uma condenação para porte e uso de entorpecentes”. Requer,
em medida liminar e no mérito, a revogação das custódias preventivas ou, suces-
sivamente, a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão (art. 319 do CPP).
Em 07.08.2015 indeferi a liminar.
O Ministério Público Federal, em manifestação da lavra da Subprocuradora-
Geral da República Cláudia Sampaio Marques, opina pelo não conhecimento do
pedido e, sucessivamente, pela denegação da ordem de habeas corpus.
É o relatório.

VOTO
A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): O objeto do presente habeas corpus
diz com a validade da prisão preventiva decretada contra os pacientes.
Extraio do ato dito coator:
“(...)
Cumpre anotar, de início, que o entendimento firmado pelo Supremo
Tribunal Federal e por este Superior Tribunal de Justiça é no sentido de não
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 487

se admitir habeas corpus contra decisão denegatória de liminar proferida em


outro writ na instância de origem, sob pena de indevida supressão de instância.
É o que está sedimentado no Verbete Sumular nº 691 do STF ‘não compete
ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra de-
cisão do Relator que, em habeas corpus requerido a Tribunal Superior, indefere
a liminar’, aplicável mutatis mutandis a este Superior Tribunal de Justiça (...).
A despeito de tal óbice processual, tem-se entendido que, casos excepcio-
nais, deve se preponderar a necessidade de se garantir a efetividade da prestação
da tutela jurisdicional de urgência, para que flagrante constrangimento ilegal ao
direito de liberdade possa ser cessada, tarefa a ser desempenhada caso a caso.
Todavia, esse atalho processual não pode ser ordinariamente usado, senão
em situações em que se evidenciar decisão absolutamente teratológica e des-
provida de qualquer razoabilidade, na medida em que força o pronunciamento
adiantado da Instância Superior.
Na hipótese em apreço, não é viável, em um juízo de conhecimento
sumário, acolher-se a pretensão do impetrante, já que a custódia cautelar
encontra-se justificada pela garantia da ordem pública, por conveniência da
instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal (fl. 47).
Assim, a espécie em testilha não se enquadra nas hipóteses excepcionais
passíveis de deferimento do pedido em caráter de urgência, por não veicular
situação configuradora de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade sanável

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


no presente juízo perfunctório, devendo a controvérsia ser decidida após a
tramitação completa do feito.
Ante o exposto, indefiro o pedido de liminar.”
A falta de pronunciamento final do colegiado do Superior Tribunal de Justiça,
a pretensão esbarra na Súmula nº 691/STF: “Não compete ao Supremo Tribunal
Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em
habeas corpus requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar”.
A compreensão expressa em tal verbete sumular tem sido abrandada em jul-
gados desta Corte em hipóteses excepcionais, de flagrante ilegalidade, teratologia
ou abuso de poder na denegação da tutela de eficácia imediata. Nesse sentido, v.g.,
as seguintes decisões colegiadas: HC 125.783/BA, de minha relatoria, 1ª Turma, DJe
27.03.2015; HC 124.052/PR, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 24.11.2014;
e HC 120.274/ES, Relª Minª Cármen Lúcia, 2ª Turma, DJe 20.06.2014.
No tocante à ilegalidade da prisão pelo uso indevido de algemas e da alegada
violência perpetrada pela autoridade policial, reputo inviável o acolhimento da tese
defensiva, pois demandaria o reexame e a valoração de fatos e provas, para o que
não se presta a via eleita.
Por outro lado, constato que o decreto prisional carece de fundamentação
idônea.
488 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Revelam os autos que os pacientes foram presos em flagrante delito, e, pos-


teriormente, denunciados pela suposta prática dos crimes de tráfico de drogas e
associação para o tráfico, tipificados nos arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06, tendo sido
apreendidos 34 (trinta e quatro) invólucros contendo cocaína e 11 (onze) porções de
maconha. O flagrante foi convertido em prisão preventiva em decisão assim exarada:
“(...)
Em sucinta análise, certo é que a ação levada a efeito, normativamente
qualificada como hedionda, desencadeia catastróficas consequências coletivas,
uma vez que a disseminação das drogas, além de representar grande prejuízo
individual ao usuário, pressupõe, inegavelmente, a ocorrência de diversos
outros crimes, especialmente os patrimoniais.
O cenário caótico semeado pelo traficante alarma a população, o que
justifica a momentânea privação de sua liberdade, com vistas ao pronto resta-
belecimento do contexto profanado. Outrossim, os denunciados ostentam
outros antecedentes.
O tráfico de drogas, ademais, não é suscetível de fiança ou liberdade provisória
(art. 44, caput, da Lei nº 11.343/06).
Diante disso, presentes os pressupostos legais, converto as prisões em
flagrante dos indiciados Cleyton Araújo Faria, João Lucas Rodrigues da Silva
Siqueira, Luis Henrique Rodrigues da Silva e Matheus Ferreira Barbosa em
prisão preventiva, nos termos do art. 310, inciso II, do CPP, o que faço para
garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar
a aplicação da lei penal, já que existe prova da existência de crime e indícios
de que os imputados sejam os seus autores.”
A custódia cautelar, por sua característica de medida excepcional, exige de-
monstração inequívoca de sua necessidade, em observância ao princípio constitu-
cional da presunção de inocência ou da não culpabilidade, sob pena de antecipação
da reprimenda a ser cumprida quando da condenação (HC 105.556/SP, Rel. Min.
Celso de Mello, 2ª Turma, DJe 30.08.2013).
Dessa forma, o decreto de prisão cautelar há de se apoiar nas circunstâncias
fáticas do caso concreto, evidenciando que a soltura colocará em risco a ordem pú-
blica, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, conforme
art. 312 do Código de Processo Penal.
Na hipótese, sem qualquer alusão ao caso concreto e ao desamparo de base
empírica idônea, o magistrado de primeiro grau fez referências genéricas e abstratas
acerca da necessidade da custódia cautelar.
É certo que todo delito comporta uma gravidade em sua essência, mas afir-
mar que o crime de tráfico de drogas, por se inserir no grupo de crimes hediondos,
representa verdadeira ameaça à ordem pública e justifica a supressão da liberdade
individual traduz juízo genérico acerca das circunstâncias que o envolvem na espé-
cie. Aliás, sequer indicados elementos pertinentes aos requisitos da conveniência
da instrução criminal e da aplicação da lei penal.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 489

O risco à ordem pública, a conveniência da instrução criminal e a aplicação


da lei penal elencados no decreto prisional em absoluto podem ser inferidos da
gravidade abstrata dos delitos imputados para justificar a prisão preventiva. A
jurisprudência desta Corte Suprema reputa inidônea a fundamentação de prisão
preventiva lastreada em circunstâncias genéricas e impessoais (HC 121.286/PE, Rel.
Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, DJe 30.05.2014; HC 121.250/SE, Rel. Min.
Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 22.05.2014; HC 116.491/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª
Turma, DJe 25.06.2013).
Ademais, o decreto prisional lastreia-se em dispositivo normativo que padece
de inconstitucionalidade, já reconhecida pelo Plenário desta Suprema Corte, em
sessão de julgamento realizada no dia 10.05.2012, nos autos do HC 104.339/SP,
Rel. Ministro Gilmar Mendes. Naquela ocasião, este STF invalidou parcialmente o
art. 44 da Lei nº 11.343/06, pertinente à vedação abstrata da liberdade provisória
em crimes de tráfico de drogas.
Inobstante o decreto prisional consigne “que os denunciados ostentam outros
antecedentes”, a defesa juntou documentos indicativos de que os pacientes não pos-
suem maus antecedentes, salvo o paciente João Lucas Rodrigues da Silva Siqueira,
condenado à pena de prestação de serviços à comunidade pelo prazo de 3 (três)
meses, pela prática do delito de porte de drogas para consumo pessoal, tipificada no
art. 28 da Lei nº 11.343/06, resultante da desclassificação dos crimes dos arts. 33 e
35 do referido diploma legal (Ação Penal 0003610-43.2014.8.26.0306).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Sem vincular meu entendimento ao julgamento do RE 635.659/SP, em que se
discute a constitucionalidade do art. 28 da Lei de Drogas (pedido de vista pendente
do Ministro Teori Zavascki), reputo, na hipótese, desproporcional a consideração
deste delito de menor potencial ofensivo como mau antecedente ensejador, por si
só, da constrição cautelar.
De todo modo, à falta de fundamentação idônea para a prisão cautelar no
decreto prisional, tenho por imperativa a concessão da ordem de habeas corpus
para revogar a prisão preventiva dos pacientes, sem prejuízo da imposição, pelo
magistrado de primeiro grau, se assim o entender, das medidas cautelares do art.
319 do Código de Processo Penal.
Ante o exposto, supero excepcionalmente o óbice da Súmula nº 691/STF e con-
cedo a ordem de habeas corpus para revogar a prisão preventiva dos pacientes Cleyton
Araújo Faria, João Lucas Rodrigues da Silva Siqueira, Luis Henrique Rodrigues da
Silva e Matheus Ferreira Barbosa, sem prejuízo da imposição, pelo magistrado de
primeiro grau, se assim o entender, das medidas cautelares objeto do art. 319 do
Código de Processo Penal.
É como voto.

VOTO
O Senhor Ministro Edson Fachin – Acompanho Vossa Excelência, Presidente.
490 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Do exame que fiz, também concluí por esta pleonasticamente excessiva gene-
ralidade da decisão. Há trechos da decisão que, obviamente, podem estar fundados
em percepções da realidade em geral, mas não contêm a especificidade necessária.
Por exemplo, um dos trechos que está certamente na base da decisão de Vossa Ex-
celência acentua que
“(...) a ação levada a efeito, normativamente qualificada como hedionda,
desencadeia catastróficas consequências coletivas, uma vez que a disseminação
das drogas, além de representar grande prejuízo individual ao usuário, pres-
supõe, inegavelmente, a ocorrência de diversos outros crimes, especialmente
os patrimoniais.”
Não está em discussão que este é um fato sociologicamente verificado e merece-
dor de sanção, mas é fundamental que, no decreto da prisão, haja essa especificidade.
Portanto, acompanho integralmente Vossa Excelência.
O Senhor Ministro Marco Aurélio – Em jogo a liberdade de ir e vir, admito a
impetração e, em passo seguinte, implemento a ordem.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

HABEAS CORPUS Nº 129.818-MG


Segunda Turma (DJE 21/10/2015)

Relator: Ministro Dias Toffoli


Data do julgamento: 22/09/2015

77/186 — EMENTA: PERMITIR OU ENTREGAR DIREÇÃO DE VEÍ-


CULO AUTOMOTOR A PESSOA NÃO HABILITADA. ART. 310 DO CÓDIGO
DE TRÂNSITO BRASILEIRO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXCEP-
CIONALIDADE NA VIA DO HABEAS CORPUS. PRECEDENTES. ALEGADA
ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. CRIME DE PERI-
GO ABSTRATO. PRESCINDIBILIDADE DO RESULTADO NATURALÍSTICO.
PRECEDENTE. ORDEM DENEGADA.
1. A concessão de habeas corpus com a finalidade de trancamento de
ação penal em curso só é possível em situações excepdonalíssimas, desde que
constatada, sem necessidade de dilação probatória, inequívoca improcedência

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


do pedido, seja pela patente inocência do acusado, seja pela atipicidade ou pela
extinção da punibilidade (RHC 125.787/RJ-AgR, Segunda Turma, Rel. Min.
Gilmar Mendes, DJe 03.08.2015).
2. A permissão ou a entrega de direção de veículo automotor a pessoa não
habilitada tipificada no art. 310 do Código de Trânsito Brasileiro, classifica-
se como crime de perigo abstrato, que prescinde do resultado naturalístico.
Precedente.
3. Ordem denegada.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda
Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Senhor Ministro Dias
Toffoli, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unani-
midade de votos, em denegar a ordem, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 22 de setembro de 2015.
Ministro Dias Toffoli – Relator

RELATÓRIO
O Senhor Ministro Dias Toffoli (Relator):
492 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de Paulo Ferreira


da Silva, apontando como autoridade coatora a Terceira Seção do Superior Tribunal
de Justiça, que deu provimento ao REsp 1.485.830/MG, interposto pelo Ministério
Público estadual, Relator para o acórdão o Ministro Rogerio Schietti Cruz.
Sustenta a impetrante, em síntese, que a conduta tipificada no art. 310 do
Código de Trânsito Brasileiro, imputada ao paciente, seria atípica, pois, no seu en-
tender, “não basta a simples entrega do veículo a pessoa não habilitada, fazendo-se
necessária a demonstração de perigo concreto de dano decorrente de tal conduta”
(fl. 9 da inicial).
Defende a impetrante que o entendimento deste Supremo Tribunal Federal
acerca do tipo penal descrito no art. 309 do Código de Trânsito, consolidado no
enunciado da Súmula nº 720/STF, deve ser aplicado à conduta tipificada no art. 310
do mesmo diploma legal.
Requer o deferimento da liminar para suspender os efeitos do acórdão profe-
rido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.458.830/MG e, no mérito, pede a
concessão da ordem para o trancamento da ação penal à qual responde o paciente.
Ausentes seus pressupostos, indeferi a liminar requerida e, por estar a impe-
tração devidamente instruída, foram dispensadas as informações.
O Ministério Público Federal, em parecer de lavra da Subprocuradora-Geral
da República Dra. Cláudia Sampaio Marques, opinou pelo não conhecimento do
writ e, caso dele conheça a Corte, pela denegação da ordem.
É o relatório.

VOTO
O Senhor Ministro Dias Toffoli (Relator):
Conforme relatado, volta-se a impetração contra ato da Terceira Seção do
Superior Tribunal de Justiça, que proveu o REsp 1.485.830/MG, interposto pelo
Ministério Público estadual, Relator para acórdão o Ministro Rogerio Schietti Cruz.
Narra a impetrante, na inicial, que
“foi impetrado habeas corpus contra ato da 2ª Turma Recursal Criminal,
em favor do acusado Paulo Ferreira Silva, denunciado por violação ao art.
310 do Código de Trânsito Brasileiro, objetivando, com writ, o trancamento
do procedimento criminal.
A liminar foi deferida, conforme decisão de fls. 80/81 (e-STJ, fl. 247).
A Sexta Câmara Criminal concedeu ordem para trancar a ação penal,
por entender que o fato previsto no art. 310 do CTB é atípico, pela ausência
de perigo concreto de dano.
Inconformado da referida decisão, foi interposto recurso Especial por
parte do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, com fundamento no
art. 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 493

O Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso da acusação,


por maioria (...).” (fl. 2)
Transcrevo a ementa daquele julgado:
“RECURSO ESPECIAL. PROCESSAMENTO DE ACORDO COM O ART.
543-C. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. CRIME DE TRÂNSITO.
ART. 310 DO CTB. BEM JURÍDICO. SEGURANÇA DO TRÂNSITO. CRIME
DE PERIGO ABSTRATO. DESNECESSIDADE DE LESÃO OU EXPOSIÇÃO
A PERIGO DE DANO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Recurso especial processado de acordo com o regime previsto no art.
543-C, § 2º, do CPC, c/c o art. 3º do CPP, e na Resolução nº 8/08 do STJ. Tese:
é de perigo abstrato o crime previsto no art. 310 do Código de Trânsito Brasi-
leiro. Assim, não é exigível, para o aperfeiçoamento do crime, a ocorrência de
lesão ou de perigo de dano concreto na conduta de quem permite, confia ou
entrega a direção de veículo automotor à pessoa não habilitada, com habilita-
ção cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu
estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições
de conduzi-lo com segurança.
2. Embora seja legítimo aspirar a um Direito Penal de mínima interven-
ção, não pode a dogmática penal descurar de seu objetivo de proteger bens
jurídicos de reconhecido relevo, assim entendidos, na dicção de Claus Roxin,
como ‘interesses humanos necessitados de proteção penal’, qual a segurança

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


do tráfego viário.
3. Não se pode, assim, esperar a concretização de danos, ou exigir a de-
monstração de riscos concretos, a terceiros, para a punição de condutas que,
a priori, representam potencial produção de danos a pessoas indeterminadas,
que trafeguem ou caminhem no espaço público.
4. Na dicção de autorizada doutrina, o art. 310 do CTB, mais do que
tipificar uma conduta idônea a lesionar, estabelece um dever que garante ao
possuidor do veículo automotor. Neste caso estabelece-se um dever de não
permitir, confiar ou entregar a direção de um automóvel a determinadas pessoas,
indicadas no tipo penal, com ou sem habilitação, com problemas psíquicos
ou físicos, ou embriagadas, ante o perigo geral que encerra a condução de um
veículo nessas condições.
5. Recurso especial provido.” (fls. 433/434 – anexo 3 – grifos do autor)
Essa é a razão pela qual se insurge a impetrante.
Pelo que se tem no julgado proferido pela Terceira Seção do Superior Tribunal
de Justiça, não se vislumbra ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia que
justifique a concessão da ordem. Pelo contrário, o acórdão ora impugnado encontra-
se suficientemente motivado, restando justificado o convencimento formado.
Diga-se, ademais, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está con-
solidada no sentido de que a concessão de habeas corpus com a finalidade de tranca-
494 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

mento de ação penal em curso só é possível em situações excepcionalíssimas, desde


que constatada, sem necessidade de dilação probatória, inequívoca improcedência
do pedido, seja pela patente inocência do acusado, seja pela atipicidade da conduta
ou pela extinção da punibilidade (RHC 125.787/RJ-AgR, Segunda Turma, Rel. Min.
Gilmar Mendes, DJe 03.08.2015), o que não se vislumbra na espécie.
Consoante se infere dos autos, o paciente, ao permitir e confiar a direção de
sua motocicleta a terceiro não habilitado legalmente, incorreu na conduta tipificada
no art. 310 do Código de Trânsito Brasileiro, verbis:
“Art. 310. Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor
a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir
suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde física ou mental, ou por
embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança:
Pena – detenção, de seis meses a um ano, ou multa.”
Não obstante a divergência doutrinária a respeito da classificação do tipo pe-
nal em voga, estou convencido de que ele é de perigo abstrato, sendo prescindível,
portanto, resultado naturalístico.
Para Fernando Capez e Victor Gonçalves, o legislador
“elevou à categoria de crime a conduta de entregar veículo a pessoa não
habilitada, pouco importando se o condutor, posteriormente, venha ou não a gerar
perigo de dano. Ao agir dessa forma, a intenção do legislador foi evidente: para
o condutor, só haverá crime se ele dirigir o automóvel de forma irregular; para
quem entrega o veículo, todavia, a punição é automática, não podendo ficar
na dependência da conduta posterior do motorista, já que isso está fora de
seu controle (e de seu dolo). Quis o legislador evidenciar que o simples fato de
entregar veículo a pessoa não habilitada gera conduta perigosa e merece punição.”
(CAPEZ, Fernando; GONÇALES, Victor Eduardo Rios. Aspectos criminais do
Código de Trânsito Brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 59)
Nesse sentido, ensina Guilherme de Souza Nucci, ao classificar a conduta como
de perigo abstrato, não se exigindo prova da probabilidade de ocorrência do dano
(Leis penais e processuais penais comentadas. 6. ed. São Paulo: RT, 2012. p. 722).
Em linha de convergência com meu ponto de vista, destaco o julgamento do
HC 120.495/MG:
“HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. SUBSTITUTIVO
DE RECURSO CONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
PERMISSÃO OU ENTREGA TEMERÁRIA DA DIREÇÃO DE VEÍCULO AU-
TOMOTOR. ART. 310 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO – LEI Nº
9.503/97. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. FALTA DE JUSTA CAUSA.
ATIPICIDADE DA CONDUTA NÃO VERIFICADA. 1. Contra acórdão exarado
em recurso ordinário em habeas corpus remanesce a possibilidade de manejo
do recurso extraordinário previsto no art. 102, III, da Constituição Federal.
Diante da dicção constitucional, inadequada a utilização de novo habeas cor-
pus, em caráter substitutivo. 2. O trancamento da ação penal na via do habeas
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 495

corpus só se mostra cabível em casos excepcionalíssimos, quando manifesta


a atipicidade da conduta, a presença de causa extintiva de punibilidade ou a
ausência de suporte probatório mínimo de autoria e materialidade delitivas. 3.
Conformidade da descrição da conduta atribuída à paciente ao crime previsto no
art. 310 da Lei nº 9.503/97. 4. Habeas corpus extinto sem resolução do mérito.”
(HC 120.495/MG, Primeira Turma, Relª Minª Rosa Weber, DJe 15.05.2014)
Naquela assentada, conforme bem pontuou o Ministro Marco Aurélio,
“o crime descrito no art. 310 do Código de Trânsito Nacional é de perigo
abstrato, porque não se condiciona o fato jurídico ao sinistro:
‘Art. 310. Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor
a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir
suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por
embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança.’
Ou seja, o tipo penal contenta-se com esses núcleos previstos no dispo-
sitivo, não exigindo, portanto, a ocorrência de um desastre, de um sinistro.”
Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.
É como voto.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

EXTENSÃO NO HABEAS CORPUS Nº 126.070-ES


Primeira Turma (DJE 29/10/2015)

Relatora: Ministra Rosa Weber


Data do julgamento: 08/09/2015

77/187 — EMENTA: CRIME DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. ART.


121, § 2º, DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRA-
ZO PRISIONAL CONFIGURADO. EXTENSÃO DA ORDEM. ART. 580 DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
1. Esta Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade,
concedeu a ordem de habeas corpus (HC 126.070/SP, de minha relatoria, j.
12.05.2015, DJe 25.06.2015), para revogar a constrição cautelar do paciente,
porquanto configurado o excesso de prazo na formação da culpa.
2. Identidade de situações entre o paciente e os corréus enseja, na hipótese,
a aplicação do art. 580 do Código de Processo Penal – “No caso de concurso
de agentes (Código Penal, art. 25), a decisão do recurso interposto por um
dos réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente
pessoal, aproveitará outros”.
3. Pedido de extensão da ordem de habeas corpus deferido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência da Senhora Ministra Rosa
Weber, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unani-
midade de votos, em deferir o pedido de extensão, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, 8 de setembro de 2015.
Ministra Rosa Weber – Relatora

RELATÓRIO
A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Trata-se de pedido de extensão
da presente ordem de habeas corpus concedida em favor de Rondinelli Ribeiro do
Nascimento Amaral Ferreira, por esta Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal,
em sessão de julgamento realizada no dia 12.05.2015.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 497

Na presente via, argumenta a Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo,


em síntese, que o paciente beneficiado com o deferimento do writ está em situação
fática idêntica aos demais corréus – Ozéias Oliveira da Costa, Rodolpho Nascimento
do Amaral Ferreira, Diego Ribeiro Nascimento e Janes Antônio de Almeida. Requer,
em medida liminar e no mérito, a extensão dos efeitos da ordem concedida no pre-
sente feito, nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal.
O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Subprocurador-Geral da
República Edson Oliveira de Almeida, opina pelo deferimento do pedido de extensão.
É o relatório.

VOTO
A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): O presente habeas corpus diz com
a extensão da ordem deferida por esta Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal
neste HC 126.070/ES.
Em 12.05.2015, esta Primeira
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Turma
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do Supremo Tribunal Federal, por una-
nimidade, concedeu de ofício ordem de habeas corpus em benefício do paciente
Rondinelli Ribeiro do Nascimento Amaral Ferreira, em acórdão assim ementado:
“HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. SÚMULA Nº 691/STF. AFAS-
TAMENTO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO
DE PRAZO PRISIONAL CONFIGURADO. CONCESSÃO DA ORDEM.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


1. Em casos teratológicos e excepcionais, viável a superação do óbice da
Súmula nº 691 desta Suprema Corte. Precedentes.
2. Embora a razoável duração do processo não possa ser considerada de
maneira isolada e descontextualizada das peculiaridades do caso concreto, dian-
te do decurso de mais de 4 (quatro) anos e 10 (dez) meses sem que o paciente,
preso preventivamente, tenha sido julgado em primeiro grau e sem que tenha
dado causa à demora, não se sustenta a manutenção da constrição cautelar.
3. Ordem de habeas corpus concedida.”
Colho excertos do voto condutor do acórdão:
“(...)
Inobstante, entendo que, excepcionalmente, a superação da Súmula nº
691/STF se impõe, fundado o writ no excesso de prazo.
Com efeito, o paciente, preso cautelarmente em 07.07.2010, veio a ser
denunciado, com outros 4 (quatro) corréus, pela suposta prática do crime de
homicídio qualificado, tipificado no art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal. De
acordo com denúncia, no seu caso, a acusação pela prática, em tese, do crime
de homicídio decorreu da circunstância de, ao conhecer ‘dos fatos que seriam
realizados e com promessa de receber alguma quantia’, ter emprestado uma
arma de fogo para a consumação do delito.
498 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Expõe o decreto de prisão preventiva: conforme ‘apurado pela autoridade


policial, os réus têm ligação com um mandante ou mandantes, este ou estes
ainda não identificados; entre o réus, pelo menos um é useiro e vezeiro na
prática de crimes com violência contra a pessoa, segundo os cupinchas dele;
dois dos réus estiveram no velório da vítima fazendo perguntas aos presentes
e agindo com sarcasmo; os réus não demonstram ter vínculo de emprego com
qualquer pessoa, não demonstram exercer qualquer trabalho autônomo nem
demonstram ter residência fixa em qualquer lugar. Esses fatos indicam veemen-
temente que, soltos, os réus colocarão em risco a ordem pública, a instrução
processual, a produção da prova e a aplicação da lei penal’.
Após a instrução criminal, o magistrado de primeiro grau, no dia
01.11.2012, ao exarar sentença de pronúncia, negou o direito de o paciente
recorrer em liberdade forte no fato de que ‘enclausurado durante a instrução,
deve permanecer preso quando da sentença de pronúncia’ e na manutenção
dos motivos ensejadores da prisão preventiva.
O paciente se encontra preso desde 07.07.2010, ou seja, há 4 (quatro)
anos, 10 (meses) e 05 (cinco) dias.
Ao rejeitar a tese defensiva do excesso do prazo prisional, o voto vencedor
do acórdão exarado pela Corte estadual ressaltou que, ‘no caso concreto, onde
se tem no polo passivo cinco réus, diversos incidentes motivados por todas as
partes e tratando-se de caso de ampla repercussão e complexidade, não vejo
como desarrazoada a extensão matemática do prazo’.
De acordo com as informações prestadas pelo Juízo de Direito da Segunda
Vara da Comarca de Conceição da Barra/ES), os autos da ação penal de origem
(Processo 0000938-05.2010.8.08.0015) ‘foram remetidos ao egrégio Tribunal
de Justiça do Estado do Espírito Santo, em 25.11.2013, devido à interposição
de recurso, conforme demonstra o andamento processual em anexo, sendo
que até a presente data não retornou à comarca de origem’.
Vislumbro atrasos pouco justificáveis na tramitação da ação penal. A
denúncia formulada na Justiça Estadual do Espírito Santo foi recebida em
30.08.2010, a sentença de pronúncia foi exarada em 01.11.2012, e o recurso em
sentido estrito, manejado pelo correu Ozéias Oliveira da Costa em 23.01.2013,
foi remetido à Corte Estadual em 25.11.2013. Até o momento, passados quase 5
(cinco) anos, o feito ainda não foi julgado em primeiro grau de jurisdição.
Nesse contexto, além de o parecer ministerial enfatizar que está ‘confi-
gurado o excesso de prazo’, assinala que, ‘embora a notícia do julgamento do
recurso em sentido estrito (18.03.2015), não há data prevista para a realização
do júri, ainda dependente da baixa dos autos à Vara do Júri’.
A ação penal é de relativa complexidade, com cinco acusados, represen-
tados por advogados distintos e com diversas testemunhas. Abrange, contudo,
em síntese, um fato criminoso não tão complexo.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 499

Certamente, como já decidi anteriormente, em casos de maior complexi-


dade envolvendo crimes de acentuada gravidade concreta, é tolerável alguma
demora (HC 107.629/PB, Relª p/ o acórdão Minª Rosa Weber, 1ª Turma, DJe
15.03.2012).
Há, porém, limites que não podem ser ultrapassados, sob pena de vul-
neração dos princípios da presunção de inocência e da razoável duração do
processo (art. 5º, LVII e LXXVII, da Constituição Federal de 1988). É o caso
dos autos, em que sequer a causa da demora pode ser imputada a medida
defensiva do paciente.
Nessa linha os seguintes precedentes desta Casa:
‘PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS
PREJUDICADO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. EXCESSO DE PRAZO. 1. O
julgamento monocrático do habeas corpus pelo Ministro-Relator, na linha da
jurisprudência da Corte, não viola o princípio da colegialidade. Precedentes.
2. A superveniência da sentença de pronúncia que mantém a prisão cautelar
prejudica a análise da ordem de prisão anterior. Precedentes. 3. As peculiari-
dades do caso concreto evidenciam que o excesso de prazo da prisão preventiva
(quase cinco anos) não pode ser imputado exclusivamente à defesa do paciente.
Hipótese em que três sessões do júri foram adiadas pelo não comparecimento
do órgão acusatório. Precedentes. 4. Agravo regimental desprovido. Ordem
concedida de ofício.’ (HC 125.139-AgR/PE, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª
Turma, DJe 04.05.2015)

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


‘1. Habeas corpus. 2. Homicídio simples tentado (arts. 121, caput, 14,
inciso II, ambos do Código Penal). 3. Conversão da prisão em flagrante em
preventiva. Ausência dos requisitos autorizadores da prisão cautelar. Constran-
gimento ilegal configurado. 4. Excepcionalidade da prisão. Possibilidade da
aplicação de outras medidas cautelares. Art. 319 do CPP. 5. Paciente preso há
mais de 3 anos e 4 meses. Não encerramento da fase inaugural do rito bifásico do
Júri. Excesso de prazo configurado. 6. Ordem concedida para revogar a prisão
preventiva decretada em desfavor do paciente, se por algum outro motivo não
estiver preso e sem prejuízo da aplicação de medidas cautelares previstas na
nova redação do art. 319 do CPP.’ (HC 123.586/PA, Rel. Min. Gilmar Mendes,
2ª Turma, DJe 16.12.2014)
‘HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL.
SEQUESTRO. DUPLO HOMICÍDIO QUALIFICADO. ESTUPRO DE VUL-
NERÁVEL. OCULTAÇÃO DE CADÁVER. ALEGAÇÃO DE DEMORA NA
FORMAÇÃO DA CULPA. RÉU PRONUNCIADO. ALEGAÇÃO DE EXCESSO
DE PRAZO. ADVENTO DA SENTENÇA DE PRONÚNCIA. EXCESSO DE
PRAZO CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. O excesso de prazo
da prisão em razão da demora no julgamento do processo-crime, sem que
a ela possa ser imputada a desídia da defesa do segundo paciente, configura
constrangimento ilegal à liberdade de locomoção. 2. Ordem concedida.’ (HC
109.128/SP, Relª Minª Cármen Lúcia, 2ª Turma, DJe 04.04.2013)
500 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

‘HABEAS CORPUS. PRISÃO CAUTELAR. DURAÇÃO IRRAZOÁVEL QUE


SE PROLONGA, SEM CAUSA LEGÍTIMA, POR MAIS DE TRÊS (03) ANOS.
CONFIGURAÇÃO, NA ESPÉCIE, DE OFENSA EVIDENTE AO STATUS LIBER-
TATIS DO PACIENTE. INADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. INJUSTO CONSTRANGIMENTO CONFIGURADO.
HABEAS CORPUS DEFERIDO. O excesso de prazo, mesmo tratando-se de
delito hediondo (ou a este equiparado), não pode ser tolerado, impondo-se,
ao Poder Judiciário, em obséquio aos princípios consagrados na Constituição
da República, a imediata revogação da prisão cautelar do indiciado ou do
réu. A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar de alguém
ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da pessoa humana, que
representa – considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º,
III) – significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma
e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso país e que
traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre
nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito
constitucional positivo. Constituição Federal (art. 5º, incisos LIV e LXXVIII).
EC nº 45/04. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (art. 7º, ns. 5 e
6). Doutrina. Jurisprudência.’ (HC 98.579/SP, Rel. p/ o acórdão Min. Celso de
Mello, 2ª Turma, DJe 30.04.2010)
‘HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. EX-
CESSO DE PRAZO. CONFIGURAÇÃO. Cumprimento de três anos e um mês de
prisão sem culpa formada. Ausência de previsão quanto ao julgamento de recurso
em sentido estrito, no qual a defesa visa à reforma da decisão que operou a
desclassificação dos crimes de tentativa de roubo qualificado e homicídio para
o delito de latrocínio tentado. Excesso de prazo caracterizado. Hipótese em que
não se pode afirmar ser o excesso atribuível a comportamento protelatório da
defesa, em razão do fato de ter recorrido, porquanto não se pode exigir que o
réu renuncie a essa garantia constitucional. Ordem concedida.’ (HC 93.688/
SP, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJe 15.08.08)
Superando, pois, o óbice da Súmula nº 691/STF, diante da prisão por quase
cinco anos do paciente, concedo a ordem para que o paciente seja colocado
em liberdade, sem prejuízo da aplicação das medidas cautelares previstas no
art. 319 do Código de Processo Penal, a critério do juízo de primeiro grau.
Ante o exposto, concedo a ordem de habeas corpus, para colocação em
liberdade do paciente, salvo se por outro motivo tiver que permanecer preso.”
A ordem concedida anteriormente neste HC 126.070/ES assentou a existência
de limites que não podem ser ultrapassados sob pena de vulneração dos princípios
constitucionais da presunção de inocência e da razoável duração do processo.
Ademais, após 5 (cinco) anos da prisão cautelar dos requerentes (07.07.2010),
inexiste designação de data para a realização do Júri.
Reitero que a denúncia formulada na Justiça Estadual do Espírito Santo foi
recebida em 30.08.2010, a sentença de pronúncia foi exarada em 01.11.2012, e o
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 501

recurso em sentido estrito, manejado em 23.01.2013, foi remetido à Corte Estadual


em 25.11.2013. O recurso defensivo, distribuído em 03.02.2014, não foi provido pelo
Tribunal de Justiça (18.03.2015). Os autos retornaram ao Juízo de primeiro grau em
24.07.2015. Após, o feito foi encaminhado ao Ministério Público para manifestar
quanto ao pedido de desaforamento (01.09.2015).
Quanto ao pedido de extensão pertinente à revogação da prisão preventiva pelo
excesso de prazo para a formação da culpa, reputo aplicável o disposto no art. 580
do Código de Processo Penal – “No caso de concurso de agentes (Código Penal, art.
25), a decisão do recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não
sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará outros” –, porquanto idêntica
a situação fática do paciente Rondinelli Ribeiro do Nascimento Amaral Ferreira e
dos demais requerentes do presente pedido de extensão da ordem.
Na esteira do entendimento preconizado pelo parecer ministerial, “a situação
dos requerentes é similar à do beneficiado pela concessão da ordem, que foi pronun-
ciado como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal. Apesar
de os corréus James António de Almeida e Diego Ribeiro do Nascimento terem
sido pronunciados também nas sanções do art. 163, parágrafo único, inciso II, e no
art. 155, § 4º, inciso IV, na forma do art. 69, todos do Código Penal, a denúncia, o
decreto de prisão preventiva e a decisão de pronúncia são os mesmos para todos
os corréus, de forma que para eles também está configurado o excesso de prazo da
custódia cautelar”.
Tendo em vista o excesso de prazo na formação da culpa, uma vez presos os

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


requerentes há mais de 5 (cinco) anos sem previsão de data para julgamento da
ação penal perante o Juízo de primeiro grau, fundamento utilizado para conceder a
ordem em benefício de Rondinelli Ribeiro do Nascimento Amaral Ferreira, impõe-
se, na espécie, a extensão da ordem, para que os requerentes sejam colocados em
liberdade, sem prejuízo da aplicação das medidas cautelares previstas no art. 319
do Código de Processo Penal, a critério do juízo de primeiro grau.
Ante o exposto, nos termos do julgamento deste HC 126.070/ES por esta ���� Pri-
meira Turma, defiro o pedido de extensão da ordem em habeas corpus, para colocação
em liberdade dos requerentes, salvo se por outro motivo tiverem que permanecer presos.
É como voto.

VOTO
O Senhor Ministro Edson Fachin – Eminente Presidente, Senhora Relatora, eu
vou acompanhar o voto de Vossa Excelência, porque, do exame da matéria que fiz,
cheguei a uma conclusão similar. Sem embargo de me permitir apenas registrar que,
em meu modo de ver, a situação dos corréus, do ponto de vista da contribuição e do
grau do envolvimento nesta perpetração de ato ilícito, parece-me bastante distinta.
A Senhora Ministra Rosa Weber (Presidente e Relatora) – É distinta.
O Senhor Ministro Edson Fachin – São cinco corréus. Aquele que já obteve a
soltura estava numa posição que a manifestação do Ministro Barroso, por ocasião
502 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

daquele julgamento, colocou em realce. Estava sendo a ele imputado o empréstimo


de uma arma para o cometimento do delito. O grau de envolvimento desses outros
quatro que restam é bastante acentuado.
Mas, nada obstante este registro, o que me leva a acompanhar Vossa Excelên-
cia é que não me parece que possamos subjetivar a objetivação do motivo, que é o
transcurso do prazo, uma circunstância muito objetiva. Aliás, o parecer do Ministério
Público Federal também foi nesta direção.
Sem embargo, portanto, deste registro dessa situação distinta dos corréus, na
conclusão, acompanho Vossa Excelência nesta mesma direção e com a extensão
pleiteada.
A Senhora Ministra Rosa Weber (Presidente e Relatora) – Exatamente, Ministro
Luiz Edson, a situação é diferente, o grau de envolvimento do paciente lá de maio
era bem diferente.
E essa afirmação de que a situação fática é idêntica no meu voto está entre
aspas, na verdade, estou transcrevendo o parecer do Ministério Público. Mas Vossa
Excelência tem toda razão em enfatizar esse aspecto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 523.477-GO


Quinta Turma (DJE 28/10/2015)

Relator: Ministro Gurgel de Faria


Data do julgamento: 13/10/2015

77/188 — EMENTA: ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ELEMENTOS DO


TIPO PENAL. ATO LIBIDINOSO. MENOR DE 14 ANOS. DESCLASSIFICA-
ÇÃO. INADEQUAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. CRIME SUBSIDI-
ÁRIO. ADEQUAÇÃO TÍPICA.
1. A definição da correta adequação típica das ações delituosas não repre-
senta reexame de provas, mas revaloração dos critérios jurídicos empregados
para a tipificação penal do delito.
2. O bem juridicamente tutelado pelo tipo descrito no art. 146 do Código
Penal é a liberdade individual da pessoa, tanto física quanto psíquica. O crime
em tela (art. 146 do CP) possui natureza subsidiária e somente será conside-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


rado se o constrangimento não for elemento típico de outra infração penal.
3. Se a intenção do agente é a satisfação de seu desejo sexual, estando
presentes os demais elementos constantes no tipo descrito no art. 217-A do
Código Penal, evidencia-se a hipótese do delito de estupro de vulnerável,
autorizando a imposição da reprimenda ali contida.
4. Na expressão “ato libidinoso” estão contidos todos os atos de natureza
sexual, que não a conjunção carnal, que tenham a finalidade de satisfazer a
libido do agente.
5. Hipótese em que a conduta do réu constitui efetivo contato lascivo, vo-
luptuoso e corpóreo, de libidinagem, com o propósito de satisfação de sua lascívia.
6. Agravo regimental a que se dá provimento.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unani-
midade, dar provimento ao agravo regimental nos termos do voto do Sr. Ministro-
Relator. Os Srs. Ministros Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas, Felix Fischer
e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro-Relator.
Brasília, 13 de outubro de 2015 (Data do Julgamento).
Ministro Gurgel de Faria – Relator
504 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):
Trata-se de agravo regimental interposto pelo Ministério Público de Goiás
contra decisão da lavra do em. Ministro Moura Ribeiro, proferida às fls. 322/325,
que negou seguimento ao recurso especial por óbice da Súmula nº 7 do STJ.
Às fls. 342/350 há julgamento da e. Quinta Turma não conhecendo do pre-
sente agravo regimental, à vista da ilegitimidade do Parquet estadual para atuar nos
tribunais superiores.
Interposto o extraordinário, o Supremo Tribunal Federal deu provimento ao
recurso para determinar que o agravo regimental fosse analisado (fls. 418/424).
No mérito, pleiteia o MPGO o afastamento do óbice da Súmula nº 7 do STJ
para que, conhecido o recurso, seja dado provimento ao especial, a fim de reformar
o acórdão de apelação e restabelecer a condenação, como delineada na sentença,
pela conduta descrita no art. 217-A do Código Penal.
É o relatório.

VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):
A questão apresentada no presente apelo nobre cinge-se a definir a correta ade-
quação típica da ação delituosa perpetrada pelo recorrente contra a vítima B.R.S.B.,
definida pelo Juízo de origem como estupro de vulnerável e desclassificada pela
Corte de origem para constrangimento ilegal previsto no art. 146 do Código Penal.
Inicialmente, ao contrário do que ficou decidido monocraticamente, entendo
que o deslinde da questão aqui apresentada não implica reexame de fatos e provas.
A matéria ora debatida – eminentemente de direito – versa sobre o enqua-
dramento jurídico adequado das ações criminosas praticadas pelo recorrente, cuja
avaliação não representa reexame de provas, mas, sim, revaloração dos critérios
jurídicos empregados para a tipificação penal do delito.
Condenado o recorrente em primeiro grau à pena de 8 (oito) anos de reclusão,
pelo crime do art. 217-A, do Código Penal (fls. 151/163), a defesa interpôs apela-
ção, provida pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás para afastar a imputação
do delito de estupro de vulnerável, sob a seguinte fundamentação (fls. 241/242):
“Em juízo, a vítima confirma seu depoimento prestado na fase inquisi-
torial e afirma que o ora apelante a encostou na parede e, dizendo ‘vem no
titio!’, apertou seu corpo de encontro ao dela a ponto de a ofendida sentir-lhe
a ereção, constrangendo-a com o mencionado contato físico, traduzindo o
abuso, em sua linguagem infantil, assim:
‘(...) o tio estava vestido com um short fino e passava ‘aquilo’ nela (...)’
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 505

Conta, ainda, que foi surpreendida pelo irmão, que adentrou no quarto
presenciando o acima narrado, momento no qual, ambos conseguiram sair
correndo e esconderam-se no banheiro.
O referido menor Bruno, que salvou sua irmã, irrompendo no quarto sem
aviso, não foi ouvido em quaisquer das fases procedimentais.
A tia da vítima, S.M.B., ouvida em juízo (fl. 102 – mídia), complementa
seu depoimento na fase inquisitorial, assim:
‘(...) confirma os fatos, mas esclarece que os fatos se deram no mesmo
dia em que ficou sabendo e que Erlei não deitou Bruna na cama (...) que Lucas
falou que Erlei havia sentado Bruna no colo; que questionando Bruna ela disse
que ele não a beijou e não passou a mão nas partes íntimas dela; que ele havia
apertado ela sobre suas partes íntimas, e dito ‘vem cá no titio!’ (...) que Bruna
falou que sentiu as partes íntimas dele; que após o ocorrido ela demonstrou
medo e vergonha (...).’
Tem-se dos depoimentos colacionados que o apelante não insistiu, não
se utilizando de força física ou ameaça de mal ao sujeito passivo.
Diante disso, havendo o acusado apenas agarrado a criança e se esfregado
nela, a questão que se apresenta é se os atos perpetrados por ele não carac-
terizariam estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), melhor se encaixando
em outro tipo legal, qual seja o previsto no art. 146 do mesmo diploma legal.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Muito embora o digno sentenciante tenha enquadrado a ação do acusado
como estupro de vulnerável, há de ser observado que tão somente o ato de
demonstrar sua concupiscência, sentando a criança no colo, fazendo-a sentir
sua ereção, não se amolda ao primeiro tipo penal, posto que a ação daquele
foi muito menos ofensiva do que a exigida no tipo penal em que condenado.
Por certo, o fato de o processado ter roçado sua ereção nas partes intimas da
ofendida, por breve instante, embora que para ter satisfeita sua lascívia, não
o fez com violência ou grave ameaça, é impossível configurar, em todas as
elementares do tipo, o crime de estupro de vulnerável, contudo, inegável o
constrangimento a que foi submetida.”
Nos termos do que foi consignado acima, entendo que o enquadramento das
referidas condutas no tipo descrito no art. 146 do Código Penal é, de fato, indevida.
Ora, embora o bem juridicamente tutelado pelo referido dispositivo seja a liberdade
individual da pessoa, tanto física quanto psíquica, se tal constrangimento causado à
vítima visa à satisfação de intenção outra, específica, que não a de ‘não fazer o que
a lei permite ou a fazer o que ela não manda’, a hipótese é de configuração desse
delito diverso.
Isso porque o delito de constrangimento ilegal possui natureza subsidiária,
isto é, somente será considerado se o constrangimento não for elemento típico de
outra infração penal.
506 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Sendo assim, se a intenção do recorrente é a de satisfazer seu desejo sexual,


a hipótese é, de fato, de configuração do delito de estupro de vulnerável, tal como
entendeu a sentença condenatória.
A reprimenda contida no art. 217-A do Código Penal, com efeito, visa à prote-
ção da liberdade, da dignidade e do desenvolvimento sexual. A lei, portanto, tutela
o direito de liberdade que a pessoa tem de dispor do próprio corpo.
Os elementos constantes no tipo descrito no art. 217-A do Código Penal são:
1) a conduta de ter conjunção carnal; 2) ou praticar qualquer outro ato libidinoso;
e 3) com pessoa menor de 14 anos.
Afastada a ocorrência efetiva de conjunção carnal, resta esclarecer o que a lei
considera como ato libidinoso apto a configurar o tipo descrito no art. 217-A do
Código Penal.
Segundo Rogério Greco (in: Curso de direito penal. Parte especial. v. 3. p. 467),
na expressão “ato libidinoso” estão contidos todos os atos de natureza sexual, que
não a conjunção carnal, que tenham a finalidade de satisfazer a libido do agente.
Luiz Regis Prado, por sua vez, arrola alguns atos que podem ser considerados
libidinosos, relacionando como tais “os toques e apalpadelas com significação sexual
no corpo ou diretamente na região pudica (genitália, seios ou membros inferiores,
etc.) da vítima; a contemplação lasciva; os contatos voluptuosos; o uso de objetos
ou instrumentos corporais (dedo, mão), mecânicos ou artificiais, por via vaginal,
anal ou bucal; entre outros” (PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro.
v. 2. p. 601).
As condutas criminosas relatadas nos autos não podem ser consideradas como
singelo contato corporal, que autorizam a desclassificação como a que promovida
pelo Tribunal a quo. Na hipótese dos autos, a conduta do réu trata-se de efetivo
contato lascivo, voluptuoso e corpóreo, de libidinagem, com o propósito de satis-
fação de sua lascívia.
Nesse ponto, correto o Juízo sentenciante que, ao descrever as condutas do re-
corrente de forma detalhada, entendeu, com base em todo o contexto fático dos autos,
que a conduta do réu se enquadrava no tipo descrito no art. 217-A do Código Penal.
Diante do exposto, dou provimento ao agravo regimental para, reformando o
acórdão recorrido e afastando a desclassificação, restabelecer a sentença condenatória
pelo crime do art. 217-A do Código Penal.
É como voto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

AGRAVO DE INSTRUMENTO NO HABEAS CORPUS Nº 265.935-SP


Sexta Turma (DJE 08/09/2015)

Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz


Data do julgamento: 20/08/2015

77/189 — EMENTA: ROUBO. REGIME INICIAL FECHADO. MOTI-


VAÇÃO INSUFICIENTE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. RECURSO
NÃO PROVIDO.
1. Deve ser mantida a fixação do regime semiaberto ao paciente primário,
condenado a 6 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão e sem registro de circuns-
tâncias judiciais desfavoráveis, a teor do art. 33, § 2º, b, do Código Penal, pois
o Tribunal de Justiça fixou o regime mais gravoso do que o correspondente à
pena aplicada de forma ilegal, com suporte apenas na gravidade abstrata do
crime de roubo, em afronta aos enunciados da Súmula nº 440 desta Corte
Superior e das Súmulas ns. 718 e 719, ambas do Supremo Tribunal Federal.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


2. Agravo regimental não provido.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da Sexta Turma, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental,
nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Néfi Cordeiro, Ericson
Maranho (Desembargador Convocado do TJSP), Maria Thereza de Assis Moura e
Sebastião Reis Júnior (Presidente) votaram com o Sr. Ministro-Relator.
Brasília (DF), 20 de agosto de 2015.
Ministro Rogerio Schietti Cruz – Relator

RELATÓRIO
O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz:
O Ministério Público Federal interpõe agravo regimental contra decisão
monocrática de minha lavra, na qual neguei seguimento à impetração, mas, dada
a evidência da coação ilegal apontada, concedi a ordem, de ofício, para fixar ao
paciente o regime inicial semiaberto de cumprimento de pena.
O agravante afirma que “as instâncias ordinárias corretamente mantiveram
a fixação do regime fechado com base em elementos concretos” (fl. 108) e que “a
508 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

fixação de regime menos gravoso não seria suficiente para assegurar a natureza
preventiva e reeducativa da pena de modo a evitar que o paciente permaneça na
delinquência” (fl. 110).
Requer a manutenção do regime inicial fechado para o desconto da pena.

VOTO
O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz (Relator):
O agravante não trouxe nenhum argumento novo capaz de infirmar os funda-
mentos da decisão agravada, que deve ser integralmente confirmada.

I – Contextualização
Consoante registrado da decisão agravada, o paciente, que é primário e teve
a pena-base fixada no mínimo legal, foi condenado a 6 anos, 2 meses e 20 dias de
reclusão e ao pagamento de 26 dias-multa, como incurso no art. 157, § 2º, II, na
forma do art. 70, caput, ambos do Código Penal. Em que pesem as considerações
do Ministério Público – sobre o fato de o roubo ter sido perpetrado em via pública
e durante o dia –, o Tribunal de origem, ao negar provimento à apelação defensiva,
fixou o regime inicial mais severo pelos seguintes fundamentos:
“(...)
Por derradeiro, a despeito da primariedade de Josenildo, mantém-se a fixa-
ção do regime fechado para o acusado, já que se cuida de roubo qualificado,
perpetrado na via pública em pleno horário comercial (aproximadamente
às 11h00min), circunstâncias estas que denotam a periculosidade e ousadia do
roubador e indicam a necessidade de segregação no regime mais rigoroso de cum-
primento de pena.” (fl. 68, destaquei).

II – Critérios para a Escolha do Regime Prisional


Sobre a questão posta em discussão, é imperioso asseverar que, para a escolha
do regime prisional, devem ser observadas as diretrizes dos arts. 33 e 59, ambos do
Código Penal, além dos dados fáticos da conduta delitiva que, se demonstrarem a
gravidade concreta do crime, poderão ser invocados pelo julgador para a imposição
de regime mais gravoso do que o permitido pelo quantum da pena (HC 279.272/SP,
Rel. Min. Moura Ribeiro, 5ª T., DJe 25.11.2013; HC 265.367/SP, Relª Minª Laurita
Vaz, 5ª T., DJe 19.11.2013; HC 213.290/SP, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura,
6ª T., DJe 04.11.2013; HC 148.130/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., DJe
03.09.2012).
Ao comentar a Reforma da Parte Geral do Código Penal de 1984, a doutrina
ressalta que:
“‘(...) a nova Parte Geral torna mais amplo o poder discricionário do juiz,
acentuando a cada passo a tarefa de individualização da sanção penal, repetindo
em diversos momentos os critérios de que deve lançar mão o magistrado na
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 509

escolha da justa medida’. Sublinha que, ‘na nova Parte Geral, se faz menção em
vários artigos à necessidade de atenção para a escolha justa da sanção aplicável,
tendo por base os critérios contidos no art. 59’, que ‘em muito difere do art.
42 do Código Penal de 1940, pois o texto atual estabelece com maior precisão
que se deve ter em vista o que se mostra necessário e suficiente para a reprovação
e prevenção do crime’.” (REALE Jr., Miguel. Penas e medidas de segurança no
novo Código. Rio de Janeiro: Forense, 1987. p. 159 e 163)
Com efeito, a escolha justa da sanção necessária e suficiente para reprovação e
prevenção do crime torna “imprescindível que o magistrado liberte-se do fetichismo
da pena mínima para ajustar o quantum da sanção e a sua modalidade, no que en-
tende ser necessário e suficiente a satisfazer a medida de justa reprovação” (REALE
Jr., Miguel, op. cit., p. 164).
A importância desse ponto de vista evidencia-se quando constatamos que a
aplicação da pena no caso concreto repercute na utilidade social que desempenha o
Direito Penal e na sua justificação política, de modo que, ao se individualizar a pena,
age-se não só em função do necessário ao réu, mas para com o necessário à sociedade.
O próprio Código Penal, na redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.84, no
seu art. 33, § 3º, dispõe que “a determinação do regime inicial de cumprimento
da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código”.
Assim, independentemente de o juiz haver, ou não, reconhecido circunstâncias
judiciais favoráveis na primeira etapa da dosimetria da pena, poderá justificar a fixa-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


ção do regime carcerário inicial com fulcro naqueles critérios previstos no art. 59 do
CP, tendo por norte a necessidade e a suficiência da reprimenda para a reprovação e a
prevenção do crime. E, para tanto, não há como coarctar-lhe a consideração de fatores
que, associados e complementares à dogmática penal, sinalizem como necessária,
para o alcance dos fins da pena, a imposição de regime mais gravoso do que indicaria
a mera correspondência da quantidade da pena à previsão legal.

III – Regime Inicial Fechado – Fundamentação Insuficiente


Sob essas premissas, constado que cabia às instâncias ordinárias, após reconhe-
cerem a consumação do delito e fixarem a pena aplicada, analisar o regime inicial
cabível, à luz do quantum da reprimenda final. Entretanto, optaram por fixar o regi-
me inicial fechado com suporte em motivação abstrata, sem apontarem circunstâncias
concretas aptas a indicar a maior gravidade da conduta. Com efeito, o Magistrado de
primeiro grau asseriu que:
“(...)
A gravidade que o delito de roubo traz em seu bojo é notória, o que
determina a fixação do regime fechado para início de cumprimento da pena,
sob pena de impunidade e desprestígio da Justiça. Com efeito, os motivos e as
circunstâncias da subtração violenta demonstram grande desvio de compor-
tamento e personalidade do sujeito ativo. Especialmente em grandes cidades
510 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

como São Paulo, condutas como a desses autos vêm crescendo em progressão
geométrica, em patamar contrário à segurança da coletividade (...).” (fl. 12)
Nesse cenário, deve ser reconhecido o constrangimento ilegal apontado na
impetração, pois a imposição de regime mais severo do que o correspondente à pena
aplicada, com base na gravidade genérica do crime de roubo afronta os princípios
constitucionais da individualização da pena e os enunciados da Súmula nº 440 desta
Corte Superior e das Súmulas ns. 718 e 719, ambas do Supremo Tribunal Federal.
Assim, à míngua de fundamentação idônea, “se a pena é inferior a 8 anos,
o condenado é primário e lhe são favoráveis as circunstâncias judiciais do art. 59
do Código Penal, tanto que fixada a pena-base no mínimo legal, o regime legal é o
semiaberto, conforme a regra do art. 33, § 2º, b, do Código Penal” (HC 302.879/SP,
Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., DJe 25.11.2014).

IV – Dispositivo
À vista do exposto, nego provimento ao agravo regimental.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

AGAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS Nº 323.661-MS


Quinta Turma (DJE 08/09/2015)

Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca


Data do julgamento: 01/09/2015

77/190 — EMENTA: CONDENAÇÃO CRIMINAL COM TRÂNSITO


EM JULGADO HÁ MAIS DE 5 ANOS. CONFIGURAÇÃO DE MAUS ANTE-
CEDENTES. POSSIBILIDADE.
1. Condenação criminal transitada em julgado há mais de 5 (cinco) anos,
embora não possa ser utilizada para configurar a reincidência (art. 64, I, do
Código Penal), pode ser considerada como maus antecedentes. Precedentes.
2. Agravo regimental a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-
das, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Newton
Trisotto (Desembargador Convocado do TJSC), Leopoldo de Arruda Raposo (De-
sembargador convocado do TJPE), Felix Fischer e Gurgel de Faria votaram com o
Sr. Ministro-Relator.
Brasília (DF), 1º de setembro de 2015 (Data do Julgamento).
Ministro Reynaldo Soares da Fonseca – Relator

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):
Trata-se de agravo regimental interposto por Luciano de Moraes contra decisão
que negou seguimento ao seu habeas corpus, ao fundamento de que, “nos termos
da jurisprudência consolidada nesta Corte, as condenações alcançadas pelo período
depurador de 5 anos, previsto no art. 64, I, do Código Penal, afastam os efeitos da
reincidência, mas não impedem a configuração de maus antecedentes” (e-STJ, fls.
292/297).
No regimental, sustenta o agravante que, “se a pena de prisão não pode ser per-
pétua, tampouco suas consequências podem ser perpétuas” (e-STJ, fl. 305).
512 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Aponta, ainda, dois julgados do Supremo Tribunal Federal que decidiu o tema
do habeas corpus de maneira diversa (HCs 110.191 e 119.200).
Ao final, requer seja reconsiderada a decisão monocrática, ou que o feito seja
levado à apreciação da Quinta Turma.
É o relatório.

VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):
Ao negar seguimento ao habeas corpus, assim fundamentei a decisão:
“Busca-se em síntese, o afastamento da valoração negativa dos anteceden-
tes e a fixação da pena-base no mínimo legal, ao fundamento de que é aplicável
ao caso o disposto no art. 64, I, do Código Penal, segundo o qual:
‘Art. 64. Para efeito de reincidência: (Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.07.1984):
I – não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento
ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo
superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do
livramento condicional, se não ocorrer revogação;’
A despeito dos relevantes argumentos aduzidos pela defesa, a pretensão
não merece prosperar, pois, nos termos da jurisprudência consolidada nesta
Corte, as condenações alcançadas pelo período depurador de 5 anos, previsto
no art. 64, I, do Código Penal, afastam os efeitos da reincidência, mas não
impedem a configuração de maus antecedentes, permitindo o aumento da
pena-base acima do mínimo legal e a devida individualização das penas.
Nesse sentido, confiram-se os precedentes desta Corte:
‘PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO
DE DROGAS. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. CONDENAÇÃO ANTERIOR.
DECURSO DO PRAZO PREVISTO NO ART. 64, INCISO I, DO CÓDIGO
PENAL. CONFIGURAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES. POSSIBILIDADE.
REGIME PRISIONAL INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 182 DO STJ.
1. Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal, condenações anteriores
transitadas em julgado, alcançadas pelo prazo depurador de 5 anos do art. 64, I,
do Código Penal, embora afastem os efeitos da reincidência, não impedem a con-
figuração de maus antecedentes, permitindo a exasperação da pena-base acima
do mínimo legal.
2. No que diz respeito ao regime prisional, observa-se que o agravante
não infirmou os fundamentos da decisão agravada, no sentido de que acórdão
proferido em sede de habeas corpus não pode servir de paradigma para fins
de comprovação do dissídio jurisprudencial, ainda que se trate de dissídio
notório, atraindo, assim, a incidência da Súmula nº 182 desta Corte de Justiça.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 513

3. Hipótese, ademais, em que não se vislumbra o interesse recursal, no


ponto, visto que foi concedido habeas corpus de ofício para, afastada a vedação
contida no art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90, determinar que o Tribunal de origem
reavalie o regime de cumprimento da reprimenda imposta ao recorrente à luz
do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal.
4. Agravo regimental conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido.’
(AgRg no REsp 1.474.765/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, 5ª T., j. 28.04.2015,
DJe 12.05.2015)
‘CONSTITUCIONAL. PENAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO EM
SUBSTITUIÇÃO A RECURSO PRÓPRIO. ROUBO SIMPLES AFASTAMENTO
DA AGRAVANTE DA DISSIMULAÇÃO (CP, ART. 61, INCISO II, C). REVOL-
VIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. VIA INADEQUADA. DOSIMETRIA DA
PENA. MAUS ANTECEDENTES. ‘PERÍODO DEPURADOR’. HABEAS CORPUS
NÃO CONHECIDO.
(...)
3. Esta Corte tem reiteradamente decidido que ‘o período depurador de cinco
anos afasta a reincidência, mas não retira os maus antecedentes’ (AgRg no AREsp
571.478/SP, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 02.10.2014; AgRg
no AREsp 288.127/MG, Rel. Min. Walter de Almeida Guilherme [Des. Conv. do
TJSP, 5ª T., j. 06.11.2014).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


4. Habeas corpus não conhecido.’ (HC 309.329/SP, Rel. Min. Newton
Trisotto [Des. Conv. do TJSC], 5ª T., j. 12.05.2015, DJe 19.05.2015)
‘PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO
EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 59 E 64, I, AMBOS DO CP.
CONDENAÇÕES COM TRÂNSITO EM JULGADO ANTERIORES A 5 ANOS
E CONFIGURAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES. ACÓRDÃO RECORRIDO
DE ACORDO COM ENTENDIMENTO DO STJ. SÚMULA Nº 83/STJ. OFENSA
AO ART. 157, § 2º, I, DO CP (1ª TESE). CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE
PENA. EMPREGO DE ARMA. APREENSÃO E PERÍCIA. DESNECESSIDADE.
COMPROVAÇÃO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. POSSIBILIDADE. ACÓR-
DÃO RECORRIDO DE ACORDO COM ENTENDIMENTO DESTA CORTE.
SÚMULA Nº 83/STJ (2ª TESE). AFASTAMENTO DA CAUSA DE AUMENTO
PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. POSSIBILIDADE DE A ARMA UTI-
LIZADA SER DE BRINQUEDO. REEXAME DE MATÉRIA��������������
FÁTICO-PROBA-
�������������
TÓRIA. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A
QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. ‘Segundo entendimento desta Corte, o período depurador de cinco anos
afasta a reincidência, mas não retira os maus antecedentes’ (HC 281.051/MS,
minha relatoria, Sexta Turma, DJe 28.11.2013). Súmula nº 83/STJ.
(...)
514 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

4. Agravo regimental a que se nega provimento.’ (AgRg no AREsp


571.478/SP, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 02.10.2014, DJe
13.10.2014)
‘HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABI-
MENTO. RESSALVA DO ENTENDIMENTO PESSOAL DA RELATORA. ROUBO.
DOSIMETRIA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. TESE
DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. MOTIVAÇÃO SUFICIENTE.
MAUS ANTECEDENTES. CONFIGURAÇÃO. MAUS ANTECEDENTES E REIN-
CIDÊNCIA. EXISTÊNCIA DE MAIS DE UMA CONDENAÇÃO COM TRÂNSITO
EM JULGADO. EXASPERAÇÃO NA PRIMEIRA E NA SEGUNDA FASE DE
FIXAÇÃO DA PENA. POSSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
EVIDENCIADO. ORDEM DE HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDA.
(...)
4. O decurso de lapso temporal superior a 5 (cinco) anos entre a data do
término da pena da condenação anterior e a data da infração posterior, embora
afaste os efeitos da reincidência, não impede o reconhecimento de maus antecedentes,
ensejando, assim, o aumento da pena-base acima do mínimo legal. Precedentes.
5. Se o réu ostenta mais de uma condenação definitiva, não há ilegalidade
na utilização de uma delas na fixação da pena-base e de outra no reconheci-
mento da reincidência, com acréscimo na segunda fase do cálculo penal. O
que não se admite, sob pena de bis in idem, é a valoração de um mesmo fato em
momentos diversos da aplicação da pena, circunstância esta não evidenciada
na hipótese. Precedentes.
6. Ordem de habeas corpus não conhecida.’ (HC 289.974/SP, Relª Minª
Laurita Vaz, 5ª T., j. 19.08.2014, DJe 28.08.2014)
‘AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO LI-
MINAR DA INICIAL. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA. SUBSTITUIÇÃO AO
RECURSO ESPECIAL CABÍVEL. IMPOSSIBILIDADE. RESPEITO AO SISTEMA
RECURSAL PREVISTO NA CARTA MAGNA. ROUBO CIRCUNSTANCIADO.
PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO. MAUS ANTECEDENTES. CONDENAÇÃO
ANTERIOR. EXTINÇÃO HÁ MAIS DE 5 (CINCO) ANOS. POSSIBILIDADE DE
CONSIDERAÇÃO NA PRIMEIRA ETAPA DA DOSIMETRIA. EXASPERAÇÃO
JUSTIFICADA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE MANIFESTA. NÃO CONHE-
CIMENTO DO MANDAMUS. DECISÃO MONOCRÁTICA CONFIRMADA.
RECURSO IMPROVIDO.
(...)
4. Ainda que assim não fosse, não se vislumbrou qualquer ameaça ou
coação ilegal ao direito de locomoção passível de ser remediada mediante ha-
beas corpus de ofício, sobretudo porque a imposição da pena-base em patamar
superior ao mínimo legal, mantida pelo Tribunal a quo, restou fundamentada na
existência de condenações anteriores já atingidas pelo decurso do prazo de 5 (cinco)
anos da extinção da pena, as quais foram consideradas como maus antecedentes
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 515

em desfavor do agravante, justificando a exasperação procedida na primeira fase


da dosimetria, entendimento que encontra suporte na doutrina e na jurisprudência
firmada por esta Corte Superior, devendo ser mantida a decisão agravada pelos
seus próprios fundamentos.
5. Agravo regimental improvido.’ (AgRg no HC 259.651/RS, Rel. Min.
Jorge Mussi, 5ª T., j. 05.02.2013, DJe 18.02.2013)
Não configurado, portanto, o alegado constrangimento ilegal.
Pelo exposto, nego seguimento ao presente habeas corpus (art. 34, XVIII
e XX, do RISTJ).” (e-STJ, fls. 293/297)
Da leitura da decisão agravada e dos julgados apontados, observa-se que as
duas Turmas da 3ª Seção deste Superior Tribunal de Justiça vêm decidindo, reitera-
damente, que condenação atingida pelo período depurador previsto do art. 64, I, do
Código Penal (5 anos), embora não possa ser utilizada para justificar a reincidência,
pode configurar os maus antecedentes.
Em julgado recente, assim decidiu o Supremo Tribunal Federal:
“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTOR-
PECENTE. TRÂNSITO EM JULGADO DO ACÓRDÃO PROFERIDO NO JUL-
GAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO DA DEFESA. IMPETRAÇÃO DE
HABEAS CORPUS NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE NÃO IMPEDE
A FORMAÇÃO DA COISA JULGADA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE
HABEAS CORPUS COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL FIXAÇÃO

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


DA PENA-BASE. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE CONDENAÇÕES
TRANSITADAS HÁ MAIS DE CINCO ANOS COMO MAUS ANTECEDENTES.
1. Trânsito em julgado do acórdão objeto da impetração no Superior
Tribunal de Justiça. Nos termos da jurisprudência deste Supremo Tribunal,
o habeas corpus não pode ser utilizado como sucedâneo de revisão criminal.
2. As condenações criminais transitadas em julgado há mais de cinco
anos podem ser consideradas como maus antecedentes do Recorrente para
fins de exacerbação da pena-base.
3. Recurso a que se nega provimento.” (RHC 116.070/RJ, Relª Minª
Cármen Lúcia, 2ª T., DJe 13.06.2014)
Assim, a decisão agravada deve ser mantida por seus próprios fundamentos.
Pelo exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
Ministro Reynaldo Soares da Fonseca – Relator
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL Nº 1.521.255-MG


Quinta Turma (DJE 08/09/2015)

Relator: Ministro Gurgel de Faria


Data do julgamento: 20/08/2015

77/191 — EMENTA: FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.


INAPLICABILIDADE. CONCURSO DE AGENTES.
1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça estabele-
ceram os seguintes requisitos para a aplicação do princípio da insignificância
como causa supralegal de exclusão da tipicidade: a) conduta minimamente
ofensiva; b) ausência de periculosidade do agente; c) reduzido grau de repro-
vabilidade do comportamento; e d) lesão jurídica inexpressiva, os quais devem
estar presentes, concomitantemente, para a incidência do referido instituto.
2. Esta Corte Superior de Justiça possui o entendimento de que não se
aplica o princípio da insignificância quando configurado o concurso de agen-
tes, o qual evidencia um alto grau de reprovabilidade no comportamento do
acusado e esmaece a circunstância do diminuto valor do objeto furtado.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unani-
midade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Reynaldo Soares
da Fonseca, Newton Trisotto (Desembargador-Convocado do TJSC), Leopoldo de
Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJPE) e Felix Fischer votaram com
o Sr. Ministro-Relator.
Brasília, 20 de agosto de 2015 (Data do Julgamento).
Ministro Gurgel de Faria – Relator

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):
Trata-se de agravo regimental interposto por A.G.N. contra a decisão de fls.
394/396, que, afastando a aplicação do princípio da bagatela, negou seguimento ao
recurso especial apresentado pela defesa.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 517

O agravante sustenta que a não aplicação do princípio da insignificância louvou-


se na circunstância de que o recorrente ingressou no domicílio da vítima mediante
a qualificadora da escalada, hipótese inocorrente nos autos, tendo em vista o decote
levado a efeito quando da prolação da sentença.
Requer, portanto, a reconsideração da decisão atacada, ou a submissão do tema
à eg. Quinta Turma.
É o relatório.

VOTO
O Exmo. Sr. Ministro Gurgel de Faria (Relator):
Não obstante os argumentos expendidos, a decisão deve ser mantida por
motivação diversa.
Consoante anteriormente explicitado, na aplicação do princípio da insignificân-
cia, devem ser utilizados os seguintes parâmetros: a) conduta minimamente ofensiva;
b) ausência de periculosidade do agente; c) reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento; e d) lesão jurídica inexpressiva, os quais devem estar presentes,
concomitantemente, para a incidência do referido instituto.
Trata-se, na realidade, de um princípio de política criminal, segundo o qual,
para a incidência da norma incriminadora, não basta a mera adequação do fato ao
tipo penal (tipicidade formal), impondo-se verificar, ainda, a relevância da conduta
e do resultado para o Direito Penal, em face da significância da lesão produzida ao

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


bem jurídico tutelado pelo Estado (tipicidade material).
No caso, muito embora este Magistrado tenha feito alusão, na decisão atacada,
à qualificadora da escalada decotada na sentença, tenho que, ainda assim, não se
encontram preenchidos os aludidos vetores para a aplicação do princípio da bagatela.
É que não há que se falar em reduzido grau de reprovabilidade no compor-
tamento do agravante, pois não se pode considerar apenas o valor dos objetos
furtados, mas também o fato de o crime ter sido praticado em concurso de agentes,
circunstância que inviabiliza a incidência do princípio da insignificância na linha
da jurisprudência assentada nesta Corte.
Nesse sentido, cito os precedentes:
“CONSTITUCIONAL. PENAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO EM
SUBSTITUIÇÃO A RECURSO PRÓPRIO. FURTO QUALIFICADO PELO
CONCURSO DE AGENTES. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFI-
CÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA.
HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. Prescreve a Constituição da República que o habeas corpus será con-
cedido ‘sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência
ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder’
(art. 5º, inciso LXVIII). O Código de Processo Penal impõe aos juízes e aos
tribunais que expeçam, ‘de ofício, ordem de habeas corpus, quando, no curso de
518 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

processo, verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação


ilegal’ (art. 654, § 2º).
Desses preceptivos infere-se que no habeas corpus devem ser conhecidas
quaisquer questões de fato e de direito relacionadas a constrangimento ou
ameaça de constrangimento à liberdade individual de locomoção. Por isso,
ainda que substitutivo do recurso expressamente previsto para a hipótese, é
imprescindível que seja processado para perquirir a existência de ‘ilegalidade
ou abuso de poder’ no ato judicial impugnado (STF, HC 121.537, Rel. p/ o
acórdão Min. Roberto Barroso, 1ª T.; HC 111.670, Relª Minª Cármen Lúcia,
2ª T.; STJ, HC 277.152, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª T.; HC 275.352, Relª Minª
Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T.).
2. De ordinário, ‘é inaplicável o princípio da insignificância quando o
delito foi praticado em concurso de agentes’ (STJ, AgRg no HC 246.784/RS,
Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª T., j. 19.08.2014; AgRg no AREsp 464.513/MG,
Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., j. 02.06.2015; AgRg no REsp
1.432.283/MG, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 10.06.2014;
STF, HC 103.359, Relª Minª Cármen Lúcia, 1ª T., j. 18.05.2010; HC 112.378,
Rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª T., j. 28.08.2012). À luz desses precedentes e
das premissas fáticas estabelecidas na sentença – de se tratar de crime qualifi-
cado pelo concurso de agentes (CP, art. 155, § 4º, inciso IV) e de que os bens
subtraídos foram avaliados em R$ 340,00 (trezentos e quarenta reais) –, não
há como aplicar o ‘princípio da insignificância’ de modo a afastar a tipicidade
da conduta delituosa.
3. Habeas corpus não conhecido.” (HC 304.252/RS, Rel. Min. Newton
Risotto [Des. Conv. do TJSC], 5ª T., DJe 03.08.2015)
“PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPE-
CIAL. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE AGENTES. VALOR
DO BEM SUBTRAÍDO APROXIMADO A 14,79% DO SALÁRIO MÍNIMO.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO REGI-
MENTAL IMPROVIDO.
1. Sedimentou-se a orientação jurisprudencial no sentido de que a
incidência do princípio da insignificância pressupõe a concomitância de
quatro vetores: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma
periculosidade social da ação; c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do
comportamento; e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.
2. A conduta consistente no furto de um botijão de gás, avaliado em
R$ 92,00, que representa, aproximadamente, 14,79% do salário mínimo vigente
à época dos fatos, praticada em concurso de agentes, não pode ser considerada
de inexpressiva lesão ao bem jurídico tutelado. Precedentes.
3. Agravo regimental improvido.” (AgRg no AREsp 550.941/MS, Rel.
Min. Néfi Cordeiro, 6ª T., DJe 26.05.2015)
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR

APELAÇÃO Nº 119-98.2013.7.07.0007-PE
Tribunal Pleno (DJMSTM 15/10/2015)

Relator: Ministro José Barroso Filho


Data do julgamento: 23/09/2015

77/192 — EMENTA: FURTO. ABSOLVIÇÃO. APELAÇÃO. PRINCÍPIO


DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. TEORIA DA AMOTIO OU
APPREHENSIO. CRIME CONSUMADO. REPARAÇÃO DA RES FURTIVA.
DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA. INCABÍVEL. EXTINÇÃO DA PUNI-
BILIDADE. PRESCRIÇÃO.
Requisitos para caracterização da incidência do princípio da insignificân-
cia ou bagatela, são inaplicáveis no presente caso, observando-se os princípios
da hierarquia e da disciplina, o contexto económico dos militares, a reprova-
bilidade, a ofensividade e a expressividade da conduta.
Teoria da amotio ou apprehensio. Para a consumação do crime é suficien-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


te que se efetive a inversão da posse, ainda que a coisa subtraída venha a ser
retomada em momento imediatamente posterior, não é necessário que a coisa
saia da esfera de vigilância da vítima.
A devolução da res furtiva imediatamente após o ocorrido, por si só, não
autoriza a desclassificação da conduta delitiva, mas faculta ao Juiz a redução
da pena.
Condenação do réu como incurso no art. 240, caput, do CPM. Recurso
ministerial provido.
Decisão unânime.
Extinção da punibilidade. Prescrição da pretensão punitiva, à luz do art.
123, inciso IV, c/c o art. 125, inciso VII, e o art. 129, todos do CPM.
Decisão unânime.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Superior
Tribunal Militar, em sessão de julgamento, sob a presidência do Ministro Ten. Brig.
Ar William de Oliveira Barros, na conformidade do extrato da ata do julgamento, por
unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso ministerial, para, reformando
a sentença, condenar o ex-Sd. Ex. Adalberto Barros da Rocha Júnior à pena de 4
520 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

(quatro) meses de reclusão, como incurso no art. 240 do CPM, com o benefício do
sursis, na forma do art. 84 da mesma Lei, nas condições estabelecidas no art. 626
do CPPM, excetuada a sua alínea a, com regime inicial prisional aberto, de acordo
com o art. 33, § 2º, alínea c, do CP comum. Por fim, por unanimidade, em declarar
a extinção da punibilidade do ex-Sd. Ex. Adalberto Barros da Rocha Júnior do
crime previsto no art. 240, caput, CPM, pela ocorrência da prescrição da pretensão
punitiva, à luz do art. 123, inciso IV, c/c o art. 125, inciso VII, e o art. 129, todos do
Estatuto Penal Militar.
Brasília, 23 de setembro de 2015.
Ministro José Barroso Filho – Relator

RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo MPM no tocante à absolvição
de Adalberto Barros da Rocha Júnior, ex-Sd. Ex., do crime previsto no art. 240,
caput, do CPM.
A denúncia imputou ao ex-militar a seguinte prática delituosa (fls. 1/A – 1/D),
in verbis:
“(...)
Consta dos autos do inquérito policial militar que no dia 6 de dezembro
de 2013, Adalberto Barros da Rocha Júnior fora preso em flagrante quando na
posse do aparelho de telefone celular marca Samsung, modelo Galaxy Young
Duos GT-S6313T, subtraído do Soldado de Efetivo Variável Ronaldo Carlos
de Dutra Júnior e, posteriormente, avaliado em R$ 449,00 (quatrocentos e
quarenta e nove reais).
Segundo as peças informativas, no dia 06.12.2013, por volta das 7h20min,
o Sd. Dutra esqueceu seu celular em cima da cama no alojamento e se dirigiu
ao Sargento Ismael Júnior para assinar o cartão de cabelo. Em seginda, entrou
em forma no saguão da Companhia para se dirigir à parada diária. Ao sair da
Companhia, lembrou-se de que havia deixado o celular em cima da cama e
pediu ao Sgto. Rômulo permissão para buscá-lo. Após procurar em cima da
cama, na mochila e em seu armário, Sd. Dutra percebeu que o celular havia
sido subtraído, comunicando o fato ao Sgt. Ismael Júnior.
Foi então realizada uma revista nos pertences dos soldados da guarnição
de serviço, ao mesmo tempo em que se ordenou aos mesmos que pegassem
seus celulares e os deixassem a mostra. Como o Sd. Adalberto não obedeceu
a tal ordem, foi então realizada uma revista em seus bolsos, tendo sido locali-
zado um aparelho celular Samsung Young, reconhecido pelo Sd. Dutra como
sendo de sua propriedade e que, ao ser ligado, exibiu como tela de fundo uma
plaqueta de identificação com o seu nome (do Sd. Dutra).
Ouvido, o ora denunciado confirmou que, por volta das 7h15min daquela
manhã, subtraiu o celular que se encontrava em cima da cama próxima ao
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 521

seu armário, colocando-o no bolso. Afirmou ainda que antes da realização da


revista, os sargentos Rômulo e Tiago perguntaram se alguém havia encontrado
um celular, mas que, nesse instante, ele permaneceu calado, o que demostra
inequivocamente sua vontade de não restituir o celular que havia subtraído.”
Mediante a decisão proferida em 11 de dezembro de 2013, foi concedida li-
berdade provisória ao réu, preso em flagrante aos 6 do mesmo mês, com alvará de
soltura cumprido em igual data da decisão (fls. 40/41 e 46).
A inicial foi recebida em 10 de fevereiro de 2014, conforme a decisão de fl. 56;
o réu foi citado (fl. 78/78v), após, qualificado e interrogado (fls. 79/80), na ocasião
declarou ser a denúncia verdadeira.
O ofendido ex-Sd. Ex. Ronaldo Carlos Dutra Júnior foi ouvido às fls. 81/83. As
testemunhas arroladas pelo MPM, Cap. Ex. Antonio Carlos de França Barros Júnior,
Sd. Ex. Willames Herculano de Oliveira, ex-Sd. Ex. Gilson Paz de Moura Júnior e
Sd. Ex. Claudemir dos Santos Gonzaga da Silva, foram ouvidas às fls. 84/85, 86/87,
88/89 e 90/91.
A DPU postulou a juntada de declarações de testemunhas abonatórias do réu,
que foi deferido pelo Juiz (fls. 96 e 98/99).
O MPM, na fase do art. 428 do CPPM, requereu a condenação do réu nos ter-
mos da denúncia (fls. 108/112). A defesa postulou a absolvição do ex-militar, com

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


fulcro no art. 240, §§ 1º e 2º, do CPM. Em caso de condenação, pleiteou a aplicação
da pena, no seu mínimo legal e a concessão do sursis (fls. 115/121).
As certidões negativas de antecedentes ericontram-se às fls. 122/125.
O Conselho Permanente de Justiça para o Exército, em sessão de 30 de junho
de 2014, à unanimidade, julgou improcedente a denúncia e absolveu o ex-Sd. Ex.
Adalberto Barros da Rocha Júnior do crime de furto, na forma da alínea b do art.
439 do CPPM (fls. 139/151).
O MPM e a DPU foram intimados em 4 e 8 de julho de 2014, respectivamente
(fls. 154 e 156). A acusação interpôs o presente recurso, tempestivamente (fl. 155).
Em suas razões, postulou a reforma da sentença, com a condenação do réu nos
termos da inicial (fls. 158/162).
Em contrarrazoes, a DPU requereu a manutenção do decisum. Em caso de
reforma, a incidência da causa especial de diminuição de pena prevista no inciso II
do art. 30 do CPM (fls. 164/168v).
A PGJM, em parecer da lavra do Dr. Roberto Coutmho, Vice-Procurador-Geral,
manifestou-se pelo provimento do recurso, para que o réu seja condenado nos termos
da inicial (fls. 178/182).
É o relatório.
522 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

VOTO
O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos legais, portanto deve
ser admitido. No mérito, impõe-se o seu provimento, pelas razões abaixo aduzidas.
O presente apelo tem como objeto a condenação do réu pela prática delitiva do
art. 240, caput, do CPM, afastando, assim, a incidência do princípio da insignificância.
O Conselho Julgador evocou jurisprudência da Suprema Corte no tocante
aos vetores a serem observados para a incidência do princípio da bagatela, a saber:
mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação,
reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da
lesão jurídica provocada.
Ao transpor tais critérios para o presente caso, verifica-se a sua não incidência,
pelas razões abaixo expostas.
A conduta do réu se mostrou altamente reprovável sob o ângulo da hierarquia
e da disciplina, da falta de respeito e de camaradagem com o seu colega de caserna.
Aproveitar-se de um descuido de seu colega e se apropriar do aparelho como se
dele fosse mostra total frieza no comportamento do ex-Sd. Ex. Adalberto. E, ao ser
indagado sobre um suposto furto do celular, declarou que não tinha conhecimento
algum, até ser descoberto o aparelho no bolso de seu uniforme.
Não há que se falar em descriminalização da conduta pelo princípio da insig-
nificância, levando-se em conta os contextos econômicos nos quais se encontram
inserido o réu e o ofendido, ambos praças do Exército, cuja remuneração ficaria
comprometida com um desfalque na quantia de R$ 449,00 (quatrocentos e quarenta
e nove reais), valor da avaliação da res furtiva.
A resposta estatal ao infrator deve ser proporcional (necessária, adequada e
sem excesso) ao fato praticado e ao fim almejado com a sanção. Trata-se de verda-
deiro juízo de intensidade (justa medida), em que são colocados meios e fim em
equação mediante um juízo de ponderação, avaliando-se se o meio utilizado é ou
não desproporcional em relação ao fim.
Observa-se que o uso excessivo da repressão penal não garante proteção aos
bens jurídicos, ao contrário, condena o sistema a uma função meramente simbólica,
levando o direito penal ao descrédito, quando se recorre ao aforismo de que o direito
penal é a ultima ratio, isso significa que o poder de criminalizar, em abstrato, uma
determinada conduta, somente será legítimo quando nenhum outro meio de solução
de conflitos tiver como funcionar.
Em outras palavras, a tarefa do legislador de instituir tipos penais deve se
pautar pela intervenção mínima do direito penal na sociedade, entretanto, a partir
do momento em que o Poder Legislativo afirmar que uma determinada conduta
configura crime, ao Estado-Juiz não é dado valorar acerca da oportunidade e da
conveniência de aplicar ou não a lei penal ao caso concreto (Precedente: Apelação
2005.01.050067-7/RS. Ministro-Relator Gen. Ex. Antonio Apparicio Ignacio Do-
mingues).
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 523

In casu, não há como reconhecer a tentativa, conforme requereu a defesa,


em caso de condenação do réu. O crime é consumado, consoante a jurisprudência
pacífica do STF e do STJ, que, nestes casos, adotam a teoria da amotio, também
chamada de apprehensio.
Destarte, para a consumação do furto, é suficiente que se efetive a inversão da
posse, ainda que a coisa subtraída venha a ser retomada em momento imediatamente
posterior, não sendo necessário que a res saia da “esfera de vigilância da vítima”,
“sendo prescindível a posse mansa, pacífica, tranquila e/ou desvigiada” (STF, HC
114.877/MG, Rel. Min. Teori Zavascki, 2ª Turma, 18.03.2014; e STJ, HC 222.888/
MG, Rel. Min. Gurgel de Faria, 5ª Turma, 16.12.2014).
No mesmo sentido, é pacífica a jurisprudência desta egrégia Corte castrense,
conforme precedente a seguir, in verbis:
“APELAÇÃO. ART. 240 DO CPM. CRIME CONSUMADO. APLICAÇÃO
DA TEORIA DA APPREHENSIO OU AMOTIO. PRELIMINAR DE NÃO OBSER-
VÂNCIA DA LEI Nº 11.719/08 NÃO CONHECIDA. MÉRITO. MANUTENÇÃO
DA SENTENÇA A QUO.
(...)
O direito brasileiro adotou a teoria da apprehensio ou amotio, em que o de-
lito de furto se consuma quando a coisa subtraída passa para o poder do agente,
mesmo que num curto espaço de tempo, independente da res permanecer sob sua
posse tranquila.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


(...) Unânime.” (Apelação 104-66.2012.7.07.0007, Rel. Min. Marcus
Vinícius Oliveira dos Santos, 03.12.2013) (grifo nosso)
No caso concreto, como houve a inversão da posse do bem furtado, ainda que
breve, o delito de furto ocorreu em sua forma consumada, e não tentada.
Não há, dessa forma, como incidirem os §§ 1º e 2º do art. 240 do CPM, porque
a coisa furtada não é de pequeno valor se avaliada dentro do contexto financeiro das
partes. E mais, ultrapassa a fiação de 1/10 (um décimo) da quantia mensal do mais
alto salário mínimo do país.
A reparação da res se deu imediatamente após o ocorrido. No entanto, por si
só, não autoriza a desclassificação da conduta delitiva, mas, sim, redução de pena.
O dispositivo faculta ao juiz considerar o delito como mera infração disci-
plinar, após sopesar todos os critérios previstos na norma, não havendo qualquer
imposição legal.
Por essas razões, a sentença deve ser reformada e o réu condenado como incurso
no art. 240, caput, do CPM, adotando para a fixação da pena os seguintes critérios.
Na primeira fase: as circunstâncias judicias previstas no art. 69 do CPM são
favoráveis ao réu, que é primário e possui bons antecedentes. Assim, deve ser fixada
no seu mínimo legal em 1 (um) ano de reclusão.
Na segunda fase: inexistem circunstâncias agravantes ou atenuantes.
524 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Na terceira fase: houve a reparação da res furtiva, de forma voluntária, ime-


diatamente após o ocorrido, ensejando a diminuição da pena na fração de 2/3 (dois
terços), tornando-se definitiva em 4 (quatro) meses de reclusão.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso do MPM, para, reformando a sen-
tença, condenar o ex-Sd. Ex. Adalberto Barros da Rocha Júnior à pena de 4 (quatro)
meses de reclusão, como incurso no art. 240 do CPM, com o benefício do sursis, na
forma do art. 84 da mesma lei, nas condições estabelecidas no art. 626 do CPPM,
excetuada a sua alínea a, com o regime inicial prisional aberto, de acordo com o art.
33, § 2º, alínea c, do CP comum.
Por fim, declaro a extinção da punibilidade do ex-Sd. Ex. Adalberto Barros
da Rocha Júnior do crime previsto no art. 240, caput, do CPM, pela ocorrência da
prescrição da pretensão punitiva, à luz do art. 123, IV, c/c o art. 125, inciso VII, e o
art. 129, todos do Estatuto Penal Militar.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0012280-59.2015.4.01.3800-MG


Quarta Turma (DJF1 21/10/2015)

Relator: Desembargador Federal Hilton Queiroz


Data do julgamento: 13/10/2015

77/193 — EMENTA: CONCESSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA.


FUMUS COMMISSI DELICTI. PERICULUM IN LIBERTATIS. EMBASAMENTO.
CUSTÓDIA CAUTELAR. IMPOSSIBILIDADE. CARACTERÍSTICA REBUS
SIC STANTIBUS DA CUSTÓDIA PROVISÓRIA. RECURSO MINISTERIAL
NÃO PROVIDO.
1. Para a decretação da prisão preventiva é necessário a existência de fu-
mus commissi delicti, consistente na prova da existência do crime e de indícios
suficientes da autoria, e do periculum in libertatis, que tem por fundamento
a garantia da ordem pública ou da ordem econômica, ou a necessidade de
assegurar a instrução criminal ou a aplicação da lei penal (art. 312 do CPP).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


2. A decretação da prisão cautelar exige o crivo da necessidade (CPP, art.
282, I), que a decisão objurgada demonstrou inocorrer.
3. Em face da característica rebus sic stantibus da prisão cautelar, ao juiz
é facultado decretá-la se no decorrer no processo sobrevierem razões idôneas.
4. Recurso ministerial desprovido.

ACÓRDÃO
Decide a Turma negar provimento ao recurso, à unanimidade.
Quarta Turma do TRF da 1ª Região – 13.10.2015.
Desembargador Federal Hilton Queiroz – Relator

RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Hilton Queiroz (Relator):
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal
(fls. 24/30) contra a decisão de fls. 17/20, da lavra da Juíza Federal Dra. Simone dos
Santos Lemos Fernandes, da 35ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais,
que deferiu o pedido de liberdade provisória formulado por Leandro Abney dos
Santos, exclusivamente em relação ao delito do art. 289, § 1º, do CP, aplicando 3
(três) medidas cautelares diversas da prisão, nos termos do art. 319 do CPP.
526 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Em suas razões de recurso o apelante sustenta, em síntese, que


“(...) in casu, a decretação da prisão preventiva do investigado é essencial
para garantir a ordem pública, estando presente os devidos requisitos.
09. De fato, constam dos autos fortes provas que apontam para a existência
do crime de moeda falsa, bem como indícios mais do que suficientes de autoria
em desfavor do investigado. Assim, no contexto da prisão em flagrante delito
comunicada, restou constatada a perpetração de outros delitos autônomos pelo
mesmo, a saber posse ilegal de arma de fogo e de substâncias entorpecentes,
os quais são de competência estadual.
10. Neste passo, vale destacar que a vertente criminosa que pauta o com-
portamento do recorrido não é atestada apenas por seus maus antecedentes,
que não possuem comprovação nos autos, mas também pelo contexto em que
se deu a sua prisão em flagrante delito.” (fl. 27)
Requer, ao final, seja provido o presente recurso em sentido estrito, com a
cassação da decisão recorrida e consequente conversão da prisão em flagrante delito
do recorrido em prisão preventiva (fl. 30).
As contrarrazões foram apresentadas às fls. 40/42v.
Decisão mantida, por seus próprios fundamentos (fl. 43).
A PRR/1ª Região, nesta instância, opinou pelo não provimento do recurso
(fls. 48/52).
É o relatório.

VOTO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Hilton Queiroz (Relator):
Examinando a comunicação de prisão em flagrante delito de Leandro Abney
dos Santos, em virtude da suposta prática dos crimes previstos nos arts. 289, § 1º,
do CP, 12 da Lei nº 10.826/03 e 28 da Lei nº 11.343/06, decidiu a magistrada nos
seguintes termos:
“Consta no APFD que, após receber ocorrência de repasse de uma cédula
de R$ 100,00 (cem reais) falsa na Drogaria Araújo de Vespasiano/MG, Policiais
Militares compareceram ao local, onde identificaram, através de imagens cap-
tadas pelo sistema de segurança do estabelecimento, o indivíduo responsável
pelo repasse e o veículo que estava utilizando. Após diligências, os policiais
lograram em localizar o aludido veículo, conduzido por Leandro Abney dos
Santos, encontrando em sua posse uma porção de maconha. Ato contínuo, os
policiais se deslocaram à residência de Leandro, onde, após autorização de seus
genitores, efetuaram buscas e localizaram um revólver tipo garrucha antigo,
duas seringas, uma ampola de medicamento com nome ‘Duratestoland’, um
pote contendo comprimidos aparentemente anabolizantes, e mais uma porção
de maconha.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 527

Sendo um dos crimes da competência da Justiça Federal, foi o preso


encaminhado à Delegacia da Polícia Federal, onde foi lavrado o APFD.
É o sucinto relatório.
DECIDO.
Inicialmente, verifico que este juízo não tem competência para analisar
a prisão do flagranteado em relação aos delitos previstos nos arts. 12 da Lei nº
10.826/03 e 28 da Lei nº 11.343/06.
É que não vislumbro qualquer tipo de conexão, material ou probatória,
entre os aludidos crimes e o delito de competência da Justiça Federal (art. 289,
§ 1º do Código Penal), sendo certo que o único elemento comum às condutas
delituosas foi a apreensão ter ocorrido numa mesma ocasião.
Da narrativa contida no APFD depreende-se que as condutas suposta-
mente praticadas pelo flagranteado – repasse de cédula falsa e posse ilegal de
entorpecente e de arma de fogo – não guardam qualquer tipo de relação entre
si, tratando-se, pois, de delitos autônomos.
O fato de a constatação da prática dos delitos ter sido conjunta não atrai
a competência da Justiça Federal para a apuração de todos eles, na medida em
que, repita-se, inexiste conexão que a justifique.
Assim, nos termos do art. 70 do Código de Processo Penal, declino da
competência para processar e julgar os crimes de posse ilegal de arma de fogo

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


e de substâncias entorpecentes para a Justiça Estadual de Lagoa Santa/MG.
Declinada a competência em relação aos demais crimes, passo à análise
do flagrante apenas quanto (sic) ao crime do art. 289, § 1º, do Código Penal.
Verifica-se do termo de fls. 08/10 e da nota de ciência das garantias
constitucionais de fl. 11 que foram assegurados ao preso os direitos e garantias
previstos na Constituição Federal e na legislação processual, notadamente a
comunicação da prisão à sua família ou pessoa por ele indicada, a assistência
da família e de advogado, e a cientificação de seus direitos, entre os quais o
de permanecer calado.
Além disso, a prisão e o local onde se encontra o preso foram informados
a este Juízo (fl. 03), a quem foi encaminhado, no prazo legal, o auto de prisão
em flagrante delito, acompanhado das oitivas colhidas, tendo sido entregue
ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o
motivo da prisão, os nomes do condutor e das testemunhas (fl. 12).
Desta forma, restam cumpridas as formalidades legais previstas nos arts.
301 e seguintes do Código de Processo Penal.
Todavia, embora seja a prisão formalmente regular, não vislumbro a ne-
cessidade de conversão do flagrante em preventiva. Senão vejamos.
A prisão cautelar, por constituir grave restrição à liberdade do indivíduo
antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, deve ser enten-
528 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

dida como medida excepcional, somente se justificando quando, havendo da


prova da materialidade de um crime e indícios da sua autoria, mostre-se abso-
lutamente necessária para o resguardo da ordem pública, da econômica, por
conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal.
Além disso, a atual sistemática do Código de Processo Penal estabelece
a prisão cautelar como medida subsidiária, tendo lugar apenas quando não se
mostrarem suficientes e necessárias as demais medidas assecuratórias diversas
da prisão, previstas no art. 282 do mesmo diploma legal.
In casu, embora presentes os elementos do tipo penal, não vejo os requi-
sitos para à prisão cautelar.
Constata-se que o flagranteado foi preso pela posse de apenas uma cédu-
la falsa, não tendo sido localizadas com ele outras cédulas contrafeitas, nem
mesmo no seu veículo ou na sua residência.
Além disso, declarou possuir ocupação lícita, trabalhando com CTPS as-
sinada na empresa Intaltec Instalações Elétricas. Quanto aos seus antecedentes,
declarou que a única vez em que esteve envolvido em ocorrências policiais
foi há cerca de seis anos, quando foi abordado com pequena quantidade de
maconha para uso próprio.
O crime pelo qual foi preso em flagrante não foi cometido com violência
ou grave ameaça à pessoa. Assim, não se pode descartar a possibilidade de que
o requerente, em caso de eventual condenação, venha a ser beneficiado com
a imposição de regime prisional a ser cumprido em meio aberto e até mesmo
a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, o que
obviamente dependerá da análise das provas produzidas durante a instrução
criminal.
Por outro lado, as especificidades do caso, especialmente a ausência de
comprovação nos autos dos seus antecedentes criminais, se, por um lado, não
justificam a medida extrema da prisão, reclamam, sim, a imposição de medidas
cautelares diversas, para que se possa garantir o regular andamento da instrução
criminal e a eventual aplicação da lei penal, na esteira do que determina o art.
282 do Código de Processo Penal.
Desta forma, tenho como necessária e, por ora, suficiente, a aplicação
das seguintes medidas cautelares diversas da prisão, nos termos do art. 319
do Código de Processo Penal:
1. Não se ausentar desta Capital, por mais de vinte (20) dias, sem prévia
autorização judicial;
2. Comunicar imediatamente a este Juízo eventual mudança de endereço;
3. Comparecer a todos os atos do processo.
Por todo o exposto, concedo a liberdade provisória a Leandro Abney
dos Santos, exclusivamente em relação ao delito do art. 289, § 1º, do Código
Penal, determinando que se expeça alvará de soltura em seu favor, do qual deve
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 529

constar a expressa observação de que, quanto aos crimes previstos nos art. 12
da Lei nº 10.826/03 e art. 28 da Lei nº 11.343/06, a regularidade do flagrante
e a sua eventual conversão em prisão preventiva deverão ser analisadas pelo
Juízo Estadual. O alvará de soltura deverá ser acompanhado por termo de
compromisso das cautelares impostas.
Considerando que o expediente forense já se encontra encerrado, enca-
minhe-se cópia integral destes autos, por meio de oficial de justiça, ao i. juiz
plantonista responsável pela Comarca de Lagoa Santa/MG para que delibere
sobre a comunicação da prisão relativamente aos crimes previstos nos art. 12
da Lei nº 10.826/03 e art. 28 da Lei nº 11.343/06, distribuindo-se os autos, em
seguida, àquela Comarca.
Comunique-se, do modo mais célere, à Polícia Federal, para que retifique
os registros relativos a esta comunicação de flagrante e ao IPL 0388/2015-4,
fazendo neles constar apenas o delito do art. 289, § 1º, do Código Penal, bem
como para que remeta os objetos relacionados aos crimes dos art. 12 da Lei nº
10.826/03 e art. 28 da Lei nº 11.343/06 à Justiça Estadual.
Publique-se. Registre-se.
Intimem-se o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União.
Não havendo insurgência recursal, extraia-se cópia da presente decisão
e do alvará de soltura devidamente cumprido, enviando-as à Polícia Federal
para juntada no Inquérito Policial 0388/2015-4.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Em seguida, dê-se baixa e arquivem-se os presentes autos.” (fls. 17/20)
Entendo que a decisão proferida em primeiro grau deve ser mantida pelos seus
próprios fundamentos. A decretação da prisão cautelar exige o crivo da necessidade
(CPP, art. 282, I), que a decisão objurgada demonstrou não ocorrer.
Com efeito, como é sabido, para a decretação da prisão preventiva é necessário
a existência de fumus commissi delicti, consistente na prova da existência do crime e
de indícios suficientes da autoria (art. 312, in fine, do CPP) e do periculum in liberta-
tis, que tem por fundamento a garantia da ordem pública ou da ordem econômica,
ou a necessidade de assegurar a instrução criminal ou a aplicação da lei penal (art.
312, primeira parte, do CPP).
In casu, apesar da existência de provas da ocorrência do delito, não restou
demonstrado o periculum in libertatis.
No que se refere ao fundamento da garantia da ordem pública, não consta dos
autos que o acusado esteja praticando novos crimes ou que encontrara os mesmos
estímulos relacionados com a infração cometida, sendo certo que invocações in
abstracto não bastam para um decreto prisional.
Quanto à conveniência da instrução criminal, não restou evidenciado que a
coleta de provas está sendo perturbada, que testemunhas estão sendo ameaçadas,
que o recorrido está investindo contra as provas, buscando destruir evidências, ou
subornando testemunhas.
530 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Também não há que se falar que o recorrido tenciona furtar-se ao cumprimento


de eventual sentença condenatória.
Assevero que em face de sua característica rebus sic stantibus, se no decorrer
do processo sobrevierem as razões da preventiva, é facultado ao juiz decretá-la.
Nesse mesmo sentido é o seguinte excerto do opinativo ministerial de fls.
48/52, da lavra do Procurador Regional da República Dr. Guilherme Zanina Schelb:
“Não assiste razão ao recorrente.
Verifica-se dos autos que não há provas dos antecedentes criminais do réu;
que o réu possui ocupação lícita com CTPS assinada e que o crime pelo qual foi
preso em flagrante não foi praticado com violência ou grave ameaça a pessoa.
Embora o indiciado tenha sido preso em flagrante, com a prova da ma-
terialidade do fato delituoso e indícios da autoria, a prisão preventiva exigiria
requisitos que não estão presentes neste caso.
Conforme mencionou o Magistrado a quo, a concessão da liberdade e a
imposição de medidas cautelares diversas garante a aplicação da lei e a instrução
processual no caso (...). (fl. 50).
(...)
Assim, a Procuradoria da República não trouxe elementos que justificas-
sem a necessidade de se impor outras medidas cautelares ao indiciado, bem
como imposição da conversão do flagrante em preventiva.” (fl. 51)
Assim, em face de todo o exposto, a manutenção da decisão que concedeu a
liberdade provisória ao recorrido é medida que se impõe.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso em sentido estrito.
É o voto.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000661-90.2010.4.02.5155


Primeira Turma Especializada (DEJF 22/10/2015)

Relator: Desembargador Antonio Ivan Athié


Data do julgamento: 30/09/2015

77/194 — EMENTA: CRIME CONTRA AS TELECOMUNICAÇÕES.


USO DE TRANSMISSOR SEM LICENÇA DA ANATEL. RÁDIO COMUNI-
TÁRIA. AUSÊNCIA DE REGISTROS DE INTERFERÊNCIA NA AERONA-
VEGABILIDADE DA REGIÃO DURANTE O PERÍODO DE OPERAÇÃO.
PRINCÍPIOS DA INSIGNIFICÂNCIA E DA INTERVENÇÃO MÍNIMA E DA
SUBSIDIARIEDADE. APELAÇÃO MINISTERIAL IMPROVIDA.
1. Não foi realizado laudo pericial no equipamento utilizado para realizar
as transmissões, por desnecessário e ante a baixíssima potência do equipamento,
constatada durante as investigações.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


2. Não foram registrados casos de interferência na aeronavegabilidade da
região, no período em que as transmissões ocorreram.
3. Apelação improvida.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indica-
das, acordam os membros da Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional
Federal da 2ª Região, por maioria, em negar provimento ao recurso, nos termos do
Voto do Relator.
Rio de Janeiro, 30.09.2015 (Data do Julgamento).
Antonio Ivan Athié Desembargador Federal – Relator

RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal, ata-
cando sentença (fls. 183/185) que absolveu Alex Fernandes da Silva da acusação
de ter praticado o crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97, nos termos do art. 386, III,
do Código de Processo Penal.
Segundo a denúncia, fls. 107/110, o apelado foi flagrado quando operava uma
rádio clandestina na cidade de Sumidouro/RJ, sem a devida licença da Anatel.
532 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

A sentença absolveu o apelado, apontando ausência de laudo pericial, bem como


por conta de depoimento do agente de fiscalização responsável, que informou inexis-
tir, no caso, interferência à aeronavegabilidade. Desse modo, o transmissor utilizado
não teria potencial lesivo suficiente para desencadear a aplicação do Direito Penal.
Em sua apelação, fls. 187/190, o Ministério Público Federal alega que o de-
lito do art. 183 da Lei nº 9.472/97 é de perigo abstrato e independe de resultado
finalístico, consumando-se com a prática da conduta típica, sendo que a autoria e
a materialidade restaram comprovadas nos autos. Pede a condenação do apelado.
Contrarrazões, fls. 192/195, de Alex Fernandes da Silva, pedindo o desprovi-
mento do recurso.
Manifestação da Procuradoria Regional da República, fls. 202/206, pelo pro-
vimento da apelação interposta.
É o relato do necessário.
Peço dia para julgamento (art. 610 do CPP).
Rio de Janeiro, 14 de agosto de 2015.
Antonio Ivan Athié Desembargador Federal – Relator

VOTO
Conheço da apelação, eis que presentes os seus pressupostos.
A sentença bem decidiu a questão, e deve ser mantida. Transcrevo-a, na parte
decisória:
“Analisando o inquérito policial e a ação penal em epígrafe, verifico que
os únicos elementos de prova em desfavor do acusado são os relatórios de fls.
43 e 45 (‘Qualificação de Atividade Clandestina’).
Destarte, constata-se que não foi lavrado qualquer auto de infração ou
elaborado qualquer laudo pericial, decorrente de qualquer diligência realizada
pelos agentes da Anatel ou mesmo pela polícia civil (federal ou estadual).
Neste sentido, vejamos a descaracterização da clandestinidade:
‘PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME CONTRA AS TELECOMUNICA-
ÇÕES. SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO MULTIMÍDIA (SCM). INTERNET.
ART. 183 DA LEI Nº 9.472/97. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERI-
MENTO DE PERÍCIA. INOCORRÊNCIA. INSIGNIFICÂNCIA. TIPICIDADE.
MATERIALIDADE. AUTORIA. DOLO. (...) A elementar ‘clandestinidade’,
prevista no art. 183 da Lei de Telecomunicações, é caracterizada pela prestação
de serviço sem autorização da agência reguladora competente. A jurisprudência
pátria tem manifestado entendimento de não se configurar a prática ilícita,
quando pleiteada a autorização administrativa antes da lavratura do auto de
infração, pois resta descaracterizada a clandestinidade. Precedentes. Absolvi-
ção, nos termos do art. 386, III, do CPP, com relação ao réu que protocolou
junto à Anatel pedido de regularização do serviço de transmissão de internet,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 533

antes da autuação administrativa. (...).’ (TRF da 4ª Região, ACR 5002009-


07.2011.404.7115, Sétima Turma, Relator p/ o Acórdão José Paulo Baltazar
Junior, DE 15.08.2013)
Por outro lado, restam apenas o depoimento tomado pela testemunha de
acusação e o interrogatório do réu.
Do depoimento da testemunha, vislumbra-se que mesmo o agente de
fiscalização estranha a ausência de auto de infração (2’20”), afirmando que os
relatórios de fls. 43 e 45 (‘Qualificação de Atividade Clandestina’) são, via de
regra, encaminhados à Polícia Federal para que só então, munido do mandado
de busca e apreensão, o agente possa lavrar o auto de infração (3’50” e 8’13”).
O ofício de fl. 42 corrobora a precariedade dos relatórios, no qual o Ge-
rente Regional da Anatel se disponibiliza a viabilizar equipe de fiscalização,
quando se desencadearem as diligências, as quais, de fato, não ocorreram.
Afora isso, a Procuradoria da República não trouxe nenhum outro ele-
mento, nem sequer se esforçou para produzir outra prova.
Ademais, ainda conforme o depoimento do agente de fiscalização da
Anatel, a atividade desenvolvida pelo réu não acarretava interferência em
aeronavegabilidade e a intervenção mais drástica da agência reguladora sobre
as atividades clandestinas de radiofusão acontece quando é iminente o perigo
de queda de aeronave, o que, provavelmente, não foi o caso (8’45”).
Do interrogatório do réu, destaca-se que a rádio em testilha operou por

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


apenas 3 (três) meses (1’40”); que o relatório de fl. 43 dá conta da única visita
de agentes da Anatel naquela localidade (3’20”); que o réu estava iniciando
tratativas junto a Anatel visando à regularização da rádio (2’35”).”
Bem viu a sentença que a conduta narrada, conquanto formalmente típica,
materialmente não o é, porquanto incapaz de lesar o bem jurídico tutelado pela
norma (segurança das telecomunicações), ou, sequer, de lhe oferecer perigo de lesão.
Do exposto, nego provimento à apelação do Ministério Público Federal.
É como voto.
Antonio Ivan Athié Desembargador Federal – Relator

VOTO-VISTA
Trata-se de apelação do Ministério Público Federal em face da sentença profe-
rida pelo MM Juiz Federal Substituto da Primeira Vara Federal de Nova Friburgo/RJ
Dr. Eduardo Francisco de Souza, que absolveu o réu pela prática da conduta descrita
no art. 183 da Lei nº 9.472/97, por ter ele desenvolvido atividade de telecomunica-
ções, consistente em operar a rádio comunitária Nova Opção FM, utilizando-se da
frequência 104,9 MHz, sem autorização do órgão competente.
Inconformado, o Ministério Público Federal apelou da sentença, objetivando a
condenação do réu. Em suas razões (fls. 187/190), aduz que o conjunto probatório
534 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

carreado aos autos mostra-se apto a demonstrar a configuração do ilícito penal perpe-
trado pelo réu. Aduz que a confissão do acusado sob o crivo do contraditório, assim
como as qualificações de atividades clandestinas que constam dos autos, lavradas por
agentes de fiscalização da Anatel comprovam claramente a caracterização do delito
e que o crime em exame é de natureza formal, ou seja, sua consumação ocorre no
momento em que o agente desenvolve a atividade clandestina, independentemente
das consequências dela advinda, não elidindo a responsabilidade do réu o fato de a
atividade desenvolvida não acarretar nenhum dano e interferência na aeronavegação.
Contrarrazões do réu às fls. 192/195.
O eminente relator negou provimento à apelação do Parquet, e deu provimento
ao apelo do réu para absolvê-lo, argumentando, em síntese, que a conduta narrada,
apesar de formalmente típica, materialmente não o seria, porquanto incapaz de le-
sar o bem jurídico tutelado pela norma (segurança das telecomunicações), sequer
oferecendo perigo de lesão, apontando, ainda, a inexistência de laudo pericial e de
auto de infração.
Pedi vistas para melhor apreciar a questão. Nesse passo, peço vênia ao eminente
Relator para discordar de seu entendimento.
Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens são, por definição,
prestados diretamente pela União, ou mediante permissão, concessão ou autorização,
consoante dispõem os arts. 21, XII, a, e 223, da Constituição Federal. Assim, se a
atividade de telecomunicação é desenvolvida de forma clandestina, resta configurado
o crime em tela.
A Lei nº 9.472/97 dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações,
definindo como crime, em seu art. 183, a conduta de quem “desenvolver clandes-
tinamente atividades de telecomunicações”.
A própria lei define os elementos do tipo, estabelecendo os conceitos de ativida-
de clandestina e de telecomunicação, em seus arts. 184, parágrafo único, e 60, § 1º:
“Considera-se clandestina a atividade desenvolvida sem a competente
concessão, permissão ou autorização de serviço, de uso de radiofreqüência e
de exploração de satélite.”
Art. 60, § 1º:
“Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita
a oferta de telecomunicações.
§ 1º Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio,
radioeletricidade, meio ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético,
de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de
qualquer natureza.”
Portanto, o crime praticado pelo acusado se amolda plenamente ao art. 183
da Lei nº 9.472/97.
A materialidade do crime restou devidamente comprovada pelos relatórios de
qualificação de atividades clandestina, emitidos pela Anatel (fls. 43/45), os quais
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 535

atestam que a rádio Nova Opção FM fazia uso indevido da frequência 104,9 MHZ,
sem a autorização do órgão competente, além da própria confissão do réu em juízo
(fls. 148/166).
Em que pese a ausência do laudo pericial ou de auto de infração, estes não são
imprescindíveis para demonstrar a materialidade do tipo, se outros meios foram idô-
neos a fazê-lo. Em que pese tratar-se de crime que deixou vestígios, o que obrigaria
à realização da perícia, a teor do art. 158 do CPP, a jurisprudência tem admitido a
comprovação por outros meios.
Sobre o tema, confira-se:
“PROCESSUAL PENAL E PENAL. PRELIMINAR DE INTEMPESTIVI-
DADE DA APELAÇÃO. REJEIÇÃO. CRIME CONTRA O ORDENAMENTO
URBANO E O PATRIMÔNIO CULTURAL (ART. 63 DA LEI Nº 9.605, DE 1998).
EXAME DE CORPO DE DELITO. DISPENSABILIDADE. COMPROVAÇÃO
DA MATERILIDADE DO DELITO POR OUTROS MEIOS DE PROVA.
1. Conforme entendimento do STF, havendo dúvida quanto à tempestivi-
dade do recurso apresentado pela defesa, devesse decidir a favor de sua admis-
sibilidade, tendo em vista o princípio da pluralidade dos graus de jurisdição. 2.
A ausência de exame de corpo de delito, ainda que o crime tenha deixado vestígios,
não torna nula a sentença condenatória, se esta teve como fundamento outras pro-
vas, como depoimentos de testemunhas, documentação fotográfica e confissão do
réu, que foram suficientes para demonstrar a materialidade do delito. Precedente

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


do STJ: Quinta Turma, RHC 15.403/MG, Relª Minª Laurita Vaz, j. 28.04.04,
unânime, DJ 07.06.04, p. 241. 3. O fato de o imóvel encontrar-se em ruína,
como asseverou o réu, não justifica a sua conduta de reformá-lo sem autoriza-
ção da autoridade competente, uma vez que as modificações realizadas não se
restringiram à manutenção da estrutura da casa, mas se destinaram também a
sua ampliação. Além disso, nada impedia o réu de requerer a autorização do
Iphan antes de iniciar a obra. 4. Apelação improvida.”(1)
O princípio do livre-convencimento motivado credencia o magistrado a buscar
os elementos para a formação mais consistente do seu entendimento. O juiz não
está adstrito à análise de todos os textos legais e todas as alegações declinadas pelas
partes, ou mesmo atrelado à existência do laudo pericial, afigurando-se suficiente
que exponha as razões determinantes da sua convicção.
Assim, a meu sentir, estão presentes elementos de prova de que a rádio clandes-
tina funcionava no local. O depoimento das testemunhas Adriano Bussoni de Jesus
e Álvaro Parra Bastos (fls. 148/166) confirmam tal conclusão, ao afirmarem que foi
constatado o funcionamento da rádio no local através do analisador de espectro e
que teriam sido impedidos de entrar no local, ocasião em que poderiam lacrar os
equipamentos, paralisando a atividade.

TRF da 5ª Região, Segunda Turma, ACR 3.088, Apelação Criminal 200183000193487/PE, Rel. Des.
(1)

Federal Francisco Cavalcanti, DJ 22.09.04, p 701.


536 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

As afirmações do réu vão ao encontro do que constataram as testemunhas


mencionadas, ao afirmar, em juízo (fls. 148/166), que, na ocasião, a rádio não ficava
no ar todos os dias, mais nos finais de semana, quanto tinha evento na cidade, tendo
a mesma inclusive sido tirada do ar após a fiscalização.
A autoria, igualmente comprovada. O próprio réu confessou em juízo (fls. 27
e 148/166) que operava a rádio comunitária que era presidente da associação onde
estava a mesma localizada, e que, na ocasião, não tinham licença da Anatel para
operar, embora tivesse iniciado o procedimento.
De outro giro, creio que não há necessidade de interferência em serviço público
(aeronavegação), para comprovar a conduta delitiva. O tipo é bem claro ao descrever
a conduta: “desenvolver clandestinamente atividade de telecomunicação”.
Nesse passo, vale salientar que perfilho o entendimento de que o crime de
desenvolvimento clandestino de telecomunicações é formal, consumando-se tão
só com a prática da conduta descrita no tipo, ou seja, com o exercício da atividade
de telecomunicações sem a devida autorização da Anatel, independentemente da
produção de qualquer resultado naturalístico, caracterizando-se também como de
perigo abstrato, sendo prescindível a ocorrência de dano, a efetiva interferência nos
serviços autorizados de telecomunicações. Portanto, afasto possível tese de ausên-
cia de lesividade da conduta praticada pelo réu, em decorrência de eventual baixa
potência da rádio operada.
Nesse diapasão, ainda que existisse a certeza da baixa potência de irradiação
do equipamento de radiodifusão operada pelo acusado e do fato de se tratar de uma
rádio comunitária, ainda que sem fins lucrativos, penso ser inaplicável o princípio
da insignificância, diante da ausência de autorização do órgão competente para o seu
funcionamento, o que, por si só, já configura a figura típica em comento, consoante
o entendimento pretoriano:
“PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PRINCÍ-
PIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL
IMPROVIDO. 1. O princípio da insignificância se caracteriza pela intervenção
do direito penal apenas quando o bem jurídico tutelado tiver sido exposto a
um dano impregnado de significativa lesividade. Não havendo, outrossim, a
tipicidade material, mas apenas a formal, a conduta não possui relevância ju-
rídica, afastando-se, por consequência, a intervenção da tutela penal, em face
do postulado da intervenção mínima. 2. A conduta dos agravantes, além de
se subsumir à definição jurídica do crime de instalação e funcionamento de
emissora de rádio clandestina e se amoldar à tipicidade subjetiva, uma vez que
presente o dolo, ultrapassa também a análise da tipicidade material, uma vez
que, além de existente o desvalor da ação – por terem praticado uma conduta
relevante –, o resultado jurídico, ou seja, a lesão, também é relevante porquan-
to, mesmo tratando-se de uma rádio de baixa frequência, é imprescindível a
autorização governamental para o seu funcionamento. 3. Agravo regimental
impróvido.” (AGREsp 200802409770, Arnaldo Esteves Lima, STJ, Quinta
Turma, DJE 07.06.2010)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 537

“PENAL. TELECOMUNICAÇÕES. AUTORIA E MATERIALIDADE


COMPROVADAS. NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
PARCIAL PROVIMENTO. (...) omissis (...). 2. Não aplicação do princípio da
insignificância aos crimes contra os serviços de telecomunicações. 3. Tratan-
do-se de delito de radio difusão clandestina, a norma busca proteger toda a
operacionalidade do sistema de comunicações, razão pela qual, ainda que se
trate de rádio comunitária, que não provocou danos efetivos, o princípio da
insignificância deve ser afastado. Demais, trata-se de delito formal, prescindin-
do, assim, de resultado naturalístico. 4. Dar parcial provimento ao recurso de
apelação.” (TRF da 1ª Região, ACR 200833040003304, Juiz Tourinho Neto,
Terceira Turma, e-DJF1 29.05.09, p. 130)
“PENAL. OPERAÇÃO CLANDESTINA DE ATIVIDADES DE TELECO-
MUNICAÇÕES. ART. 183 DA LEI Nº 9.472, DE 16 DE JULHO DE 1997 (LEI
GERAL DE TELECOMUNICAÇÕES – LGT). CRIME FORMAL. AUTORIA E
MATERIALIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDA-
DE. (...) omissis (...) 6. A operação clandestina de estação de rádio é crime de
perigo abstrato ou formal, sendo o risco de lesão presumido pelo legislador
e sua consumação ocorre no momento em que o agente desenvolve a ativi-
dade clandestina, independentemente das consequências dela advindas. A
ocorrência de dano foi prevista pela norma como causa de aumento da pena.
7. O princípio da insignificância não se aplica aos delitos de operação não
autorizada de estação de radiodifusão, cujo bem jurídico protegido é a segu-
rança dos meios de comunicação. Precedente do TRF da 1ª Região (Apelação

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Criminal 2002.38.02.002651-1). 8. Apelação provida.” (TRF da 5ª Região,
ACR 200485000004143, Des. Fed. Francisco Cavalcanti, Primeira Turma, DJ
16.10.07, p. 894, n. 199)
Ressalto que por mais controverso que seja o tema do tipo de perigo abstrato,
esta é a conduta determinada pelo legislador, que não especificou a elementar “causar
risco”, bastando a atividade clandestina para a consumação do delito.
Assim, ainda que a rádio operasse com baixa potência, situação que não foi
aferida, não nos autorizaria a deixar de responsabilizar penalmente o seu respon-
sável, de vez que se trata de conduta descrita em mandamento legal. Demais disso,
compete à Administração Pública autorizar ou não o funcionamento de rádio co-
munitária, não sendo dado ao Judiciário imiscuir-se em questões afetas à esfera de
discricionariedade da Administração Pública.
Sobre o ponto, a testemunha Adriano Busson de Jesus (fls. 148/166) afirmou
que se não há autorização da Anatel, não se pode utilizar frequência de forma ne-
nhuma, ainda que por rádio comunitária, oportunidade em que ressaltou que a Lei
nº 9.612/98 regulamenta o funcionamento da rádio comunitária para quem tem
autorização, o que não é o caso dos autos.
O dolo da conduta do acusado ressai do fato de que tinha conhecimento da
necessidade de autorização da agência fiscalizadora, tanto que alegou que estava em
andamento o pedido de licença/autorização junto àquela.
538 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Assim sendo, é imperativa a condenação do réu pela prática do crime descrito


no art. 183 da Lei nº 9.472/97. O que faço e fixo a seguinte pena.
As circunstâncias judiciais do art. 59 do CP lhe são favoráveis, nada havendo
que possa determinar a aplicação da pena-base acima do mínimo legal. Assim sen-
do, fixo a pena privativa de liberdade, no mínimo legal, ou seja, em 2 (dois) anos
de detenção, pena que torno definitiva, ante à ausência de agravantes, atenuantes,
causas de aumento ou diminuição da pena.
Fixo a pena de multa no mínimo legal, de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário
de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato. Ressalto que
entendo que a multa deve ser aplicada na forma do estatuto repressivo, em que pese
a disposição legal do art. 183 da Lei nº 9.472/97, por considerar que tal regramento
afronta o princípio da individualização da pena, inscrito no art. 5º, XLVI, da CF, que
prevê que a aplicação da reprimenda deve atender às circunstâncias objetivas do fato
e às condições pessoais do agente, devendo cada um perceber a sanção adequada a
sua participação no evento.
Fixo o regime inicial aberto, nos termos do art. 33, § 2º, c, do CP.
Presentes os requisitos do art. 44 e incisos do CP, substituo a pena privativa de
liberdade imposta ao réu por duas penas restritivas de direitos, consoante os arts.
43, IV e 46, ambos do CP, a serem definidas e fiscalizadas pelo Juízo de Execução.
Diante do exposto, divirjo do voto do eminente relator, para, reformando a
sentença monocrática, condenar o acusado pela prática da conduta descrita no art.
183 da Lei nº 9.472/97.
É o meu voto-vista.
Rio de Janeiro, 30.09.2015.
Desembargador Federal Paulo Espirito Santo.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0006656-91.2013.4.03.6112-SP


Segunda Turma (DEJF 29/10/2015)

Relatora: Juíza Convocada Denise Avelar


Data do julgamento: 20/10/2015

77/195 — EMENTA: DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂN-


CIA. APLICABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1. A denúncia foi rejeitada no Juízo a quo sob o fundamento de atipici-
dade material, considerando serem os valores dos impostos aludidos inferiores
ao mínimo legalmente estabelecido para o ajuizamento de execuções fiscais.
2. A Portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012, apenas atualizou os
valores previstos na Lei nº 10.863/03, uma vez que se encontravam defasados.
Precedentes do Supremo Tribunal Federal.
3. A aplicação do princípio da insignificância não encontra óbice na

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


existência de outros processos penais anteriormente ajuizados, bem como
habitualidade extraída de autuações fiscais.
4. Recurso em sentido estrito desprovido.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade,
negar provimento ao recurso em sentido estrito, nos termos do relatório e voto, que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 20 de outubro de 2015.
Juíza Federal Convocada Denise Avelar – Relatora

RELATÓRIO
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Fe-
deral em face da decisão que rejeitou a denúncia oferecida contra Marinho Oliveira
da Silva, pela prática do delito previsto no art. 334, caput, do Código Penal.
Narra a inicial acusatória, em síntese, que o réu, agindo com consciência e
vontade, importou mercadorias de procedência estrangeiras, oriundas de Ciudad
Del Leste, Paraguai, iludindo, no todo, o pagamento dos impostos devidos.
540 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

A denúncia foi rejeitada com fundamento no art. 395, inciso III, do Código de
Processo Penal, em razão da aplicação do princípio da insignificância, considerando
que o valor dos tributos não ultrapassou o piso para o ajuizamento de execuções
fiscais, nos termos da Portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012 (fls. 65/68).
O Ministério Público Federal interpôs recurso em sentido estrito, alegando a
inaplicabilidade do princípio da insignificância ao caso em tela, considerando que
a Lei nº 10.522/02 prescreve valor inferior aos tributos iludidos neste processo,
bem como salientando a reiteração criminosa do réu em delitos análogos ao ora
apurado (fls. 70/77).
Foram apresentadas contrarrazões (fls.138/144).
O Juízo de primeiro grau manteve a decisão recorrida por seus próprios fun-
damentos (fl. 146).
Na sequência, subiram os autos a esta Corte (fl. 148).
A Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento do recurso
(fls. 149/154).
É o relatório.
Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
Juíza Federal Convocada Denise Avelar – Relatora

VOTO
O réu foi denunciado como incurso nas penas do art. 334, caput, do Código
Penal, pois, de acordo com a denúncia (fls. 56/58), no dia 27 de dezembro de 2012,
“na Rodovia SP-245, km 445, Município de Regente Feijó/SP, nesta Subseção Ju-
diciária de Presidente Prudente/SP, constatou-se que o imputado Marinho Oliveira
da Silva, agindo com consciência e vontade, importou mercadorias de Ciudad Del
Leste, Paraguai, iludindo, no todo, o pagamento de imposto devido pela entrada dos
produtos em território nacional, sendo as mercadorias de procedência estrangeira,
todas oriundas do Paraguai, como autofalantes, rádios e pen drives, desacompanhadas
de documentação legal e introduzidas clandestinamente em território nacional, con-
forme Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal 0810500/00051/13,
da Receita Federal do Brasil”.
Foram apreendidas, de acordo com o auto de infração e termo de apreensão e
guarda fiscal da Receita Federal (fls. 21/26), mercadorias avaliadas em R$ 37.153,08
(trinta e sete mil cento e cinquenta e três reais e oito centavos), com tributos in-
cidentes estimados na ordem de R$ 18.576,54 (dezoito mil quinhentos e setenta e
seis reais e cinquenta e quatro centavos).
O princípio da insignificância estabelece que o Direito Penal, pela adequação
típica do fato à norma incriminadora, somente intervenha nos casos de lesão de certa
gravidade, atestando a atipicidade penal nas hipóteses de delitos de lesão mínima,
que ensejam resultado insignificante.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 541

Relativamente ao crime de descaminho, o Supremo Tribunal Federal assentou


que deve ser adotado o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais), instituído pela Lei
nº 11.033/04, que alterou o art. 20, da Lei nº 10.522/02, para fins de aplicação do
princípio da insignificância:
“HABEAS CORPUS. DESCAMINHO. MONTANTE DOS IMPOSTOS
NÃO PAGOS. DISPENSA LEGAL DE COBRANÇA EM AUTOS DE EXECUÇÃO
FISCAL. LEI Nº 10.522/02, ART. 20. IRRELEVÂNCIA ADMINISTRATIVA DA
CONDUTA. INOBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS QUE REGEM O DIREITO
PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ORDEM CONCEDIDA.
1. De acordo com o art. 20 da Lei nº 10.522/02, na redação dada pela Lei nº
11.033/04, os autos das execuções fiscais de débitos inferiores a dez mil reais serão
arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador
da Fazenda Nacional, em ato administrativo vinculado, regido pelo princípio
da legalidade.
2. O montante de impostos supostamente devido pelo paciente é inferior ao
mínimo legalmente estabelecido para a execução fiscal, não constando da denúncia
a referência a outros débitos em seu desfavor, em possível continuidade delitiva.
3. Ausência, na hipótese, de justa causa para a ação penal, pois uma conduta
administrativamente irrelevante não pode ter relevância criminal. Princípios da
subsidiariedade, da fragmentariedade, da necessidade e da intervenção mínima
que regem o Direito Penal. Inexistência de lesão ao bem jurídico penalmente

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


tutelado.
4. O afastamento, pelo órgão fracionário do Tribunal Regional Federal da
4ª Região, da incidência de norma prevista em lei federal aplicável à hipótese
concreta, com base no art. 37 da Constituição da República, viola a cláusula
de reserva de plenário. Súmula Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal.
5. Ordem concedida, para determinar o trancamento da ação penal.”
(STF, HC 92.438-7/PR, 2ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 18.12.08, p.
925) (grifo nosso)
No mesmo sentido, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu,
por ocasião do julgamento de recurso repetitivo, que deve ser aplicado o princípio
da insignificância em relação aos débitos tributários que não ultrapassem o limite
de R$ 10.000,00, in verbis:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO REPRESENTATIVO DA CONTRO-
VÉRSIA. ART. 105, III, A E C DA CF/88. PENAL. ART. 334, § 1º, ALÍNEAS C
E D, DO CÓDIGO PENAL. DESCAMINHO. TIPICIDADE. APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
I – Segundo jurisprudência firmada no âmbito do Pretório Excelso –
Primeira e Segunda Turmas – incide o princípio da insignificância aos débitos
tributários que não ultrapassem o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a teor
do disposto no art. 20 da Lei nº 10.522/02.
542 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

II – Muito embora esta não seja a orientação majoritária desta Corte (vide
EREsp 966.077/GO, 3ª Seção, Relª Minª Laurita Vaz, DJE 20.08.09), mas em
prol da otimização do sistema, e buscando evitar uma sucessiva interposição
de recursos ao c. Supremo Tribunal Federal, em sintonia com os objetivos da
Lei nº 11.672/08, é de ser seguido, na matéria, o escólio jurisprudencial da
Suprema Corte.
III – Recurso especial desprovido.” (REsp 1.112.478/TO, de relatoria do
Ministro Félix Fischer, publ. 13.10.09)
Contudo, o art. 1º da Portaria nº 75/2012 do Ministério da Fazenda atualizou
o referido valor para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), considerando que até esse nu-
merário não serão ajuizadas execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional.
Nesse sentido, as Turmas desta e. Corte vêm aplicando reiteradamente tal
entendimento:
“PENAL. APELAÇÃO. CONTRABANDO. ART. 334, § 1º, C, CÓDIGO
PENAL. MÁQUINA CAÇA-NÍQUEL. POSSE. MATERIALIDADE E AUTORIA
DELITIVA CONFIGURADAS. ELEMENTO SUBJETIVO PRESENTE. ABSORÇÃO
PELA CONTRAVENÇÃO DE EXPLORAÇÃO DE JOGOS DE AZAR. IMPOSSIBI-
LIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DESCABIMENTO. APELAÇÃO
NÃO PROVIDA.
1. Materialidade e autoria delitiva devidamente configuradas nos autos.
2. O conhecimento da antijuridicidade dos fatos praticados é corroborado
pela forma dissimulada em que a máquina caça-níquel era disposta no local,
consoante o laudo pericial de fls. 18/23.3. Não há que se falar na aplicação do
princípio da consunção para a absorção do delito de contrabando como crime-
meio para a consumação do mencionada modalidade contravencional, tendo
em vista a disparidade entre a lesividade jurídica de uma e de outra espécie
delituosa, razão pela qual às contravenções é destinado tratamento jurídico
muito mais brando do que é dispensado aos crimes comuns.
3. O reconhecimento do princípio da bagatela se deve à irrelevância da
lesividade ao bem jurídico tutelado, de forma a tornar imerecida a repercussão
penal à conduta formalmente típica, tendo por base os postulados da fragmen-
tariedade e da intervenção mínima do Direito Penal nas relações jurídicas.
4. A adoção de um limite de insignificância nos delitos ofensivos à atividade
tributária aduaneira se justifica pelo desinteresse da Fazenda em cobrar os créditos
tributários de até determinado valor, que atualmente é de R$ 20.000,00 (vinte mil
reais), consoante o disposto na Portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012. Nestes
casos, estamos diante do crime de descaminho, cuja objetividade jurídica consiste
no interesse fiscal do Estado em seu aspecto meramente econômico.
5. Diferente é o caso em tela, no qual o enquadramento típico da conduta
se refere ao cometimento de contrabando, espécie criminosa que, conquanto
esteja também prescrita no art. 334, do Código Penal, tem como bem jurídico
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 543

tutelado a moralidade e a segurança pública, as quais são resguardadas pela


proibição legal da entrada dos itens apreendidos no território nacional.
6. Apelação desprovida. Condenação mantida.” (TRF da 3ª Região, Segun-
da Turma, ACR 0002974-55.2009.4.03.6117, Rel. Des. Fed. Cotrim Guimarães,
j. 04.12.2012, e-DJF3 Judicial 1 13.12.2012) (grifo nosso)
“PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 334 DO CP. DESCAMINHO. PRIN-
CÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA DE PIS,
COFINS E ICMS. VALOR INFERIOR AO PASSÍVEL DE EXIGÊNCIA JUDICIAL.
CONDUTA ATÍPICA. ABSOLVIÇÃO DO RÉU.
Os atos administrativos, dentre eles os de natureza fiscal, gozam de pre-
sunção relativa de legitimidade e veracidade, devendo ser considerados como
provas que não podem ser repetidas em juízo, nos termos do art. 155 do Código
de Processo Penal. O princípio da insignificância, como corolário do princípio da
pequenez ofensiva inserto no art. 98, inciso I, da Constituição Federal, estabelece
que o Direito Penal, pela adequação típica do fato à norma incriminadora, somente
intervenha nos casos de lesão de certa gravidade, atestando a atipicidade penal nas
hipóteses de delitos de lesão mínima, que ensejam resultado diminuto. A Portaria
MF nº. 75, de 22 de março de 2012 elevou o patamar outrora estabelecido para
R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Ilegítima a inclusão do ICMS, porquanto o fato
gerador desse imposto estadual é o desembaraço aduaneiro (STF, Súmula nº
661), inexistente quando a introdução é irregular e a mercadoria é apreendida

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


e submissa a perdimento. Tratando-se de introdução de mercadoria alienígena não
proibida, a carga tributária devida à União é composta pelo Imposto de Impor-
tação (II), cujo fato gerador é a entrada do produto estrangeiro no território
nacional (art. 19 do CTN); e pelo Imposto sobre Produtos Industrializados
(IPI), derivado do desembaraço aduaneiro do artigo de origem estrangeira (art.
46, I, do CTN) (TRF da 3ª Região, Rel. Des. Fed. Johonson Di Salvo, ACR
0008369-93.2010.4.03.6181/SP, DJe 05.10.2011). PIS e Cofins pertencem à
classe das contribuições, e não podem ser considerados para a imputação do
art. 334 do Código Penal, que se refere à impostos. Reconhecimento da atipici-
dade da conduta imputada ao réu em razão da insignificância da lesão ao bem
jurídico tutelado. Preliminar rejeitada. Apelação do réu a que se dá provimento,
para absolvê-lo com fulcro no art. 386, III do Código Penal.” (TRF 3ª Região,
Primeira Turma, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, j. 04.02.2014, e-DJF3 Judicial
1 12.02.2014) (grifo nosso)
Em recente julgado do Supremo Tribunal Federal, confirmou-se o patamar de
R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para aplicação do princípio da insignificância:
“PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO
CONTRA ATO DE MINISTRO DE TRIBUNAL SUPERIOR. COMPETÊNCIA DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: ART. 102, I, I, DA CF. MATÉRIA DE DIREITO
ESTRITO. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDA-
DE. HABEAS CORPUS EXTINTO. ORDEM DEFERIDA DE OFÍCIO.
544 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

1. O princípio da insignificância incide quando presentes, cumulativamente,


as seguintes condições objetivas: (a) mínima ofensividade da conduta do agente,
(b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade
do comportamento e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.
2. A aplicação do princípio da insignificância deve, contudo, ser precedida
de criteriosa análise de cada caso, a fim de evitar que sua adoção indiscrimina-
da constitua verdadeiro incentivo à prática de pequenos delitos patrimoniais.
3. No crime de descaminho, o princípio da insignificância é aplicado quando
o valor do tributo não recolhido aos cofres públicos for inferior ao limite de R$
20.000,00 (vinte mil reais), previsto no art. 20 da Lei 10.522/02, com as alterações
introduzidas pelas Portarias 75 e 130 do Ministério da Fazenda. Precedentes:
HC 120.617, Primeira Turma, Relª Minª Rosa Weber, DJe 20.02.2014; e HC
118.000, Segunda Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 17.09.2013.
4. In casu, o paciente foi denunciado como incurso nas sanções do art.
34, § 1º, alínea c, do Código Penal (descaminho), por ter, em tese, deixado de
recolher aos cofres públicos a quantia de R$ 16.863,69 (dezesseis mil oitocen-
tos e sessenta e três reais e sessenta e nove centavos) referente ao pagamento
de tributos federais incidentes sobre mercadorias estrangeiras irregularmente
introduzidas no território nacional.
5. A impetração de habeas corpus nesta Corte, quando for coator Tribunal
Superior, não prescinde o prévio esgotamento de instância. E não há de se
estabelecer a possibilidade de flexibilização desta norma, desapegando-se do
que expressamente previsto na Constituição, pois, sendo matéria de direito
estrito, não pode ser ampliada via interpretação para alcançar autoridades – no
caso, membros de Tribunais Superiores – cujos atos não estão submetidos à
apreciação do Supremo.
6. In casu, aponta-se como ato de constrangimento ilegal decisão monocrá-
tica proferida pelo Ministro Campos Marques, Desembargador Convocado do
TJPR, que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público. Verifica-
se, contudo, que há, na hipótese sub examine, flagrante constrangimento ilegal
que justifica a concessão da ordem ex officio.
7. Ordem de habeas corpus extinta, mas deferida de ofício, a fim de re-
conhecer a atipicidade da conduta imputada ao paciente, determinando, por
conseguinte, o trancamento da ação penal.” (STF, Primeira Turma, HC 118.067,
Rel. Min. Luiz Fux, j. 25.03.2014, DJE 10.04.2014) (grifo nosso)
Outrossim, eventual notícia de reiteração criminosa por parte do acusado (fls.
78/121) não configura óbice a reconhecer a insignificância da conduta narrada na
denúncia. Nesse sentido já decidiu esta e. Turma:
“PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. REITERAÇÃO DELITIVA.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 545

1. Não entrevejo omissão, contradição ou obscuridade no acórdão


embargado. O embargante busca, pela via dos embargos declaratórios, não o
aclaramento, mas a modificação de julgado desfavorável.
2. Observo que os embargos de declaração não são recurso predestina-
do à rediscussão da causa. Servem para integrar o julgado, escoimando-o de
vícios que dificultam sua compreensão ou privam a parte de obter o provi-
mento jurisdicional em sua inteireza, em congruência ao que fora postulado
na pretensão inicial.
3. Quanto à alegação acerca da inaplicabilidade do princípio da insignificân-
cia em razão da reiteração do delito de descaminho (cf. interrogatório policial do
acusado às fls. 55/56), sustentada, também em parecer, pela ilustre Procuradora
Regional da República (fls. 247/252), insta esclarecer que tal princípio se refere
ao fato e não às circunstâncias eminentemente pessoais ligadas ao agente.
4. Embargos de declaração desprovidos.” (TRF 3ª Região, Quinta Tur-
ma, ACR 0010303-41.2006.4.03.6112, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j.
16.04.2012, e-DJF3 Judicial 1 23.04.2012) (grifo nosso)
Desta forma, como o montante de impostos devidos não supera o limite de R$
20.000,00 (vinte mil reais), é de se aplicar o princípio da insignificância, excluindo
a tipicidade do fato.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
É como voto.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Juíza Federal Convocada Denise Avelar – Relatora
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0022733-41.2006.4.04.7100-RS


Oitava Turma (DEJF 30/10/2015)

Relator: Desembargador Federal Leandro Paulsen


Data do julgamento: 14/10/2015

77/196 — EMENTA: PECULATO (ART. 312 DO CP). INSERÇÃO DE


DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÕES (ART. 313-A DO CP).
SEMI-IMPUTABILIDADE. ART. 26, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP. CIRCUNS-
TÂCIAS JUDICIAIS. PERSONALIDADE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME.
1. Reconhecida a plena capacidade de entendimento dos atos e a relativa
incapacidade de determinação, impõe-se a redução da pena no mínimo legal,
1/3, pois se trata do grau mínimo de semi-imputabilidade.
2. A psicopatologia que enseja a diminuição da pena, nos termos do art.
26, parágrafo único, do CP, não possibilita a exasperação da pena-base em
razão de personalidade antissocial.
3. Ainda que integre o tipo penal, a lesão pode ser valorada negativamente
pelo juízo quando exacerbada. No caso, com relação aos crimes de peculato,
a lesão é exorbitante.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade,
dar provimento ao recurso da acusação readequando o patamar da causa de dimi-
nuição da pena do art. 26 do Código Penal, dar parcial provimento ao recurso da
defesa para afastar circunstâncias judiciais reconhecidas pelo juízo e redimensionar
as penas, nos termos do relatório, dos votos e das notas taquigráficas que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de outubro de 2015.
Desembargador Federal Leandro Paulsen – Relator

RELATÓRIO
Senhor Desembargador Leandro Paulsen:
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 547

1. Denúncia. O MPF denunciou Michel Henrique Cardoso como incurso nas


sanções dos crimes do art. 312 c/c o art. 327, § 2º, por três vezes, e art. 313-A, todos
do CP (fls. 04-08).
Conforme a peça acusatória, Michel, em 08.07.03, no Município de Gravataí/
RS, na condição de empregado da Caixa Econômica Federal – CEF, apropriou-se de
R$ 5.262,93 logo após sacar o valor da conta de Alcides Longaray Dias. Na opor-
tunidade, ludibriou o correntista solicitando a digitação de senha e a aposição de
assinatura em guia de saque, como se estivesse realizando apenas uma operação,
quando na verdade realizou duas: uma no valor de R$ 1.116,00, valor entregue a
Alcides, outra no valor de R$ 5.262,93, do qual se apropriou (fato 1).
Em 18.01.05, em Gravataí/RS, o denunciado, na condição de empregado da
CEF teria efetuado saque no valor de R$ 2.031,49 da conta de Tereza Santos da Silva,
repassando a esta R$ 531,49; disse à correntista que o restante do dinheiro da conta
deveria ser sacado em uma semana (fato 2).
Entre janeiro e agosto de 2005, em Gravataí/RS, Michel teria inserido dados
falsos nos sistemas informatizados da CEF, valendo-se da sua condição de empre-
gado, obtendo, assim, vantagem ilícita. A conduta possibilitou que se apropriasse
de R$ 203.158,31 referentes a quotas de PIS de dezenas de beneficiários. O denun-
ciado comandava saques em favor de diversas pessoas, utilizando a própria senha
ou de outros empregados da CEF; os saques eram efetuados mediante falsificação
de assinaturas em comprovantes de pagamento, nos quais registrava a autenticação
mecânica para simular a veracidade das operações (fato 3).

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Ainda consoante a denúncia, em 02.06.05, em Gravataí/RS, na qualidade de
caixa executivo, apropriou-se de R$ 11.618,32, valor que tinha posse em razão do
cargo, ao sacar da conta de FGTS de Hiroshi Homa. Para tanto, falsificou a assinatura
do trabalhador (fato 4).
Recebida a denúncia em 05.10.09 (fls. 02-03).
2. Sentença. Instruído o processo, o juízo de origem proferiu sentença, pu-
blicada em 03.05.2013, absolvendo Michel Henrique Cardoso do fato ocorrido em
18.01.05 (fato 2). O denunciado foi condenado como incursos nas sanções do art.
312, caput, duas vezes, e art. 313-A, c/c o art. 71, todos do CP, às penas de 6 (seis)
anos e 4 (quatro) meses de reclusão, acrescida de 90 (noventa) dias-multa, arbitrados
em 1/20 (um vigésimo) do salário mínimo. Decretada a perda da função pública e
fixado valor mínimo para reparação do dano (R$ 221.539,56). Fixado regime inicial
semiaberto. Afirmada a impossibilidade de substituição da pena (fls. 641-650)
3. Apelação da acusação. A acusação apelou (fl. 652) sustentando em suas razões
que a redução da pena em razão da semi-imputabilidade deveria ser fixada no mínimo
legal, 1/3, porquanto o agente, na época dos fatos, tinha plena capacidade de enten-
dimento dos atos, ainda que diminuída a capacidade de determinação (fls. 659-660).
4. Apelação da defesa. A defesa recorreu (fl. 656). Em suas razões afirma que a
exasperação da pena-base em razão da personalidade é contraditória, pois o compor-
tamento antissocial é causa de diminuição da pena (semi-imputabilidade). Sustenta
548 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

que o lucro fácil é inerente ao tipo penal, não podendo ser valorado negativamente
como motivo do crime. Quanto às consequências, sustenta que a lesão é natural
ao tipo penal, pelo que haveria bis in idem. Com relação ao fato 3, alega que o juiz
feriu a legalidade, pois aumentou a pena em razão da quantidade de vítimas; disse
ainda que o número de vítimas foi considerado para aumento da pena em razão da
continuidade. Postula o prequestionamento do art. 5º, X, e 93, IX, da Constituição
Federal, e art. 59 do CP (fls. 662-688).
Com contrarrazões (fls. 691-693 e 695-698) os autos foram remetidos a este
tribunal.
5. Parecer. PRR opina pelo provimento do apelo da acusação e desprovimento
do recurso da defesa (fls. 703-711).
É o relatório.
À revisão.
Desembargador Federal Leandro Paulsen – Relator

VOTO
O Senhor Desembargador Leandro Paulsen:
1. Materialidade e autoria. O réu foi condenado como incurso nas sanções do
art. 312, duas vezes, e art. 313-A, c/c o art. 71, todos do CP, que preveem:
“Peculato
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qual-
quer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do
cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa.
(...)
Inserção de dados falsos em sistema de informações. (Incluído pela Lei
nº 9.983, de 2000)
Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de
dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas
informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de
obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: (Incluído
pela Lei nº 9.983, de 2000)
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Incluído pela
Lei nº 9.983, de 2000)”
Analisei atentamente todas as provas colacionadas aos autos e entendo que
o magistrado de primeiro grau solveu de maneira plenamente adequada o litígio.
Registro, ainda, que os recursos não versam sobre materialidade e autoria, mas tão
somente a dosimetria. Transcrevo as razões de decidir utilizadas:
“Fato 1.
A materialidade delitiva está consubstanciada pelos documentos de fls.
67/69 que demonstram que no caixa operado pelo réu (código C060258) na
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 549

data elencada na denúncia, ou seja, 08.07.03, foram efetuados dois saques na


conta de Alcides Longaray Dias nos valores respectivos de R$ 5.262,93 e R$
1.116,00.
Alcides, ao ser ouvido em juízo (fls. 577/580), negou que a assinatura
no comprovante de saque de valor maior seria sua.
O réu, quando inquirido em juízo (fl. 618) a respeito desse fato negou a
autoria e a defesa técnica sobre o mesmo ponto da denúncia e sustentou que
a testemunha Alcides não reconheceu o acusado na audiência.
As demais testemunhas ouvidas em juízo nada esclareceram sobre este
fato, nem mesmo o depoimento da testemunha Márcia Regina Tormen (fls.
573/576) contribui de forma significativa para a elucidação da autoria delitiva.
Por outro lado, Alcides Longaray, quando ouvido em sede policial (fls.
114/115) e em juízo, reiterou que a assinatura constante no saque de valor de cinco
mil reais não era dele. ‘Não, nem perto. Essa assinatura aqui não é minha’ (fl. 578).
Curioso que a testemunha mantenha essa posição quando a coleta de
material grafotécnico dela (fl. 74) demonstra que a assinatura constante do
saque de R$ 5.262,93 no Doc. de fl. 67 é claramente sua. Contudo, essa pecu-
liaridade fica esclarecida pela peça incoativa que informa que o réu ludibriou
Alcides, fazendo-o acreditar que realizara um só saque, mas na realidade foram
dois, sendo um com a assinatura da testemunha.
Assim, a responsabilidade do réu somente lhe pode ser atribuída porque

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


foi utilizado o seu caixa em momentos seguidos para realizar ambos os saques.
Não afastou a acusado, a informação que o Código do seu caixa era o C060258
e este é o código existente no documento de (fl. 69) que mostra a ocorrência
de dois saques seguidos (14:40 e 14:41) com uso de cartão e autorizado da
conta de Alcides Longaray Dias.
Portanto, salvo a hipótese em nenhum momento discutida no processo,
da utilização do caixa do réu por terceira pessoa e com sua senha privativa, a
responsabilidade do mesmo se impõe.
(...)
Fato 3.
A materialidade delitiva está consubstanciada neste fato pelos documentos
de fls. 12/30, 163/166, 189/197 e 212/226, todos do apenso.
Quanto à autoria, o acusado, ainda que em seu depoimento em juízo
alegue que talvez não tenham sido tantas as condutas, reconhece (fl. 620) que
praticou-as, sacando valores diretamente das contas com saldo do PIS.
Nesse ponto, a procedência da ação se impõe.
Fato 4.
A materialidade delitiva deste fato está consubstanciada nos documentos
de fls. 145/148 e 172/175. Quando ouvido em juízo o réu em relação a este
550 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

fato (fl. 620), alegou não se lembrar do mesmo. A defesa técnica por seu turno
nada alegou no arrazoado final.
Por outro lado, toda a prova testemunhal é absolutamente silente sobre
este fato que somente foi discutido nos autos, quando o acusado foi interro-
gado em juízo.
Assim, a prova da responsabilidade penal do réu por este fato repousa
nas conclusões realizadas pela auditoria da empresa pública e que tem na fl.
173 o resumo da prova técnica existente contra o acusado.
Nesse passo, o tem 4.3.34.5.1 da fl. 217 do inquérito policial está a de-
monstrar que o saque em desfavor de Hiroshi Homa foi realizado na estação
financeira operada pelo réu.
Ressalte-se que a prova extrajudicial existente contra o réu neste fato,
possui natureza técnica e ainda que os peritos que a realizaram não sejam do
juízo, a defesa não apresentou argumentos que pusessem em dúvida a con-
clusão do laudo.
Ao contrário do fato 2 imputado ao réu, onde a única prova existente é
um depoimento extrajudicial, aqui, ao contrário, a prova técnica é robusta e
por sua própria natureza ampara um juízo de condenação de forma sólida.”
Passo ao exame das razões recursais.
2. Apelação do MPF. A acusação recorre alegando que a pena, em razão da semi-
imputabilidade, deve ser diminuída em 1/3, não em 1/2, como feito pelo juízo a quo.
Com relação à semi-imputabilidade, dispõe o CP:
“Inimputáveis
Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desen-
volvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da
omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.07.1984)
Redução de pena
Parágrafo único – A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o
agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento
mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984)”
Nos autos do Incidente de Insanidade Mental 0003143-39.2010.404.7100,
em apenso, a Dra. Andréa Monné, perita nomeada, conclui que o periciando possui
sintomas compatíveis com transtorno antissocial de personalidade, sendo que “é
calmo, planeja minimamente, ludibria as pessoas no intuito de satisfazer suas ne-
cessidades, sem medir as consequências para atingir seus objetivos”. Afirma que os
episódios de furtos e brincadeiras com fogo, relatados pelo periciando, não decorrem
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 551

de transtornos de hábitos (cleptomania, piromania), mas, sim, da “busca imediata


de prazer sem calcular as consequências de seus atos”. Aponta característica de
insensibilidade de sentimentos alheios. Conclui:
“De fato, é a insensibilidade aos demais e a ausência de remorso ou
culpa que representam a ‘marca registrada’ dessa variedade de transtorno de
personalidade. Esse traço de insensibilidade afetiva foi também entendido
como senso ético deficitário (Sole-Sagarra & Leonhard, 1953). A ética, como
se sabe, radica na preocupação com as consequências dos próprios atos sobre
si mesmo e os demais.
Na esfera criminal, a principal dificuldade da perícia, com relação aos
transtorno de personalidade antissocial, decorre da legislação atual, que pre-
ceitua semi-imputabilidade, do ponto de vista médico-legal, para esses casos.
É importante assinalar que essa conclusão é relativa, dependendo da avaliação
do nexo causal entre delito e perturbação. A semi-imputabilidade aplica-se a
impulsos mórbidos, ideias prevalentes e descontrole impulsivo somente quando
os fatos criminais se devem, de modo inequívoco, a comportamento parcial
do entendimento e da autodeterminação. Os delitos cometidos por pessoas
com transtorno de personalidade, nos quais se verifica pleno entendimento do
caráter ilícito dos atos, e a conduta orientada por esse entendimento (premedi-
tação, escolha de ocasião propícia para os atos ilícitos, deliberação consciente e
conduta sistemática) devem ser, do ponto de vista médico-legal, consideradas
imputáveis. Em outros países, a semi-imputabilidade simplesmente não é

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


considerada (TABORDA; CARDOSO; MORANA, 2000).
O periciando possui plena capacidade de entendimento de seus atos,
porém tem diminuída sua capacidade de determinação.
Portanto, considerado sob a ótica psiquiátrico-forense semi-imputável.”
(fls. 142-147, do incidente de insanidade mental)
Como exposto pelo laudo, em que pese a relativa incapacidade de determi-
nação, Michel tinha plena capacidade de entendimento dos atos. Conclui-se que o
denunciado apresentava grau mínimo de semi-imputabilidade, devendo a pena ser
reduzida no mínimo legal. Neste sentido:
“HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR COM VIOLÊN-
CIA PRESUMIDA. PENA-BASE. FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CIR-
CUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ATENUANTE.
PACIENTE SEPTUAGENÁRIO NA DATA DA SENTENÇA. REDUÇÃO. PRO-
PORCIONALIDADE OBSERVADA. CONTINUIDADE DELITIVA. FRAÇÃO
APLICADA INFERIOR À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL. REFORMATIO
IN PEJUS. IMPOSSIBILIDADE. ADITAMENTO DA DENÚNCIA. DESNE-
CESSIDADE. DIMINUIÇÃO DA REPRIMENDA. SEMI-IMPUTABILIDADE.
PERCENTUAL ADEQUADO.
(...)
552 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

11. Se foi reconhecido pelas instâncias ordinárias que a semi-imputabi-


lidade do paciente consistia em uma plena capacidade de entender o caráter
ilícito do fato e uma parcial capacidade de determinar-se de acordo com esse
entendimento, mostra-se fundamentada a redução da pena em 1/3, não sendo
cabível a aplicação da fração máxima prevista no art. 26, parágrafo único, do
Código Penal.
12. Ordem denegada.” (HC 135.604/RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
Sexta Turma, j. 16.08.2011, DJe 05.09.2011)
Pelo exposto, deve ser dado provimento ao recurso da apelação da acusação
para fixar a causa de diminuição da pena prevista no art. 26, parágrafo único, do
CP, no mínimo legal (1/3).
3. Apelação de Michel Henrique Cardoso. O denunciado recorre insurgindo-se
com relação à dosimetria da pena.
3.1. Personalidade. A defesa sustenta ser indevida a exasperação da pena-base
em razão da personalidade, pois o comportamento antissocial é causa de diminuição
da pena (semi-imputabilidade).
Com efeito, com relação aos três crimes pelos quais Michel é condenado, o
juízo a quo considerou o transtorno antissocial como circunstância judicial desfavo-
rável. Ocorre que, como bem destacou o recorrente, não se revela coerente majorar
a pena-base com fundamento em causa legal de diminuição da pena.
Ademais, punir alguém em razão de psicopatologia importa Direito Penal do
autor. Pune-se o autor pelo que é, não pelo que fez.
Quanto ao ponto, merece guarida a tese defensiva. Não se trata, contudo, de
violação da intimidade ou da vida privada como aventa o recorrente, mas mero error
in judicando, não havendo violação ao art. 5º, X, da Constituição Federal.
3.2. Motivo do crime. Com relação ao ponto, a defesa afirma que o lucro fácil
é inerente aos tipos dos arts. 312 e 313-A do CP.
A apropriação de valor em proveito próprio (art. 312 do CP) e a obtenção de
vantagem ilícita (art. 313-A do CP) integram o tipo penal, contudo, ao contrário
do que afirma o recorrente, tais circunstâncias não foram valoradas negativamente.
O juízo a quo, de forma sintética, afirmou que “o motivo foi o desejo de lucro fácil,
valeu-se da condição para prática delitiva, porém esta condição/circunstância é
inerente ao tipo”.
Motivos e circunstâncias não foram valorados negativamente, pelo que resta
prejudicado o recurso quanto ao ponto.
3.3. Consequências do crime. O juízo de origem considerou a lesão ao patrimônio
da empresa pública e de alguns correntistas como circunstância judicial negativa; a
defesa sustenta que a lesão é inerente ao tipo penal.
Com efeito, a lesão é inerente aos tipos penais em análise. É possível, contu-
do, que em razão de particularidades do caso concreto, o dano destoe do normal,
hipótese em que as consequências do crime poderão ser valoradas negativamente
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 553

para fins de exasperação da pena-base, conquanto que devidamente fundamentada


a decisão (art. 93, X, da Constituição).
Quanto ao primeiro fato, Michel apropriou-se de R$ 5.262,93 em detrimento
de Alcides Longaray. Considerando que a fundamentação da sentença limita-se à
lesão ao patrimônio, entendo que deve ser provido o recurso, pois o valor não é de
tal forma significativo a justificar a exasperação da pena.
Quanto ao terceiro fato (lembrando que quanto ao segundo fato descrito na
denúncia o réu foi absolvido), Michel apropriou-se de R$ 203.158,31, lesando de-
zenas de beneficiários. Com relação a este, aliás, o magistrado consignou que “em
razão da multiplicidade de vítimas deste fato é que entendo que o patamar inicial
da pena-base neste caso deve ser um pouco mais elevado do que em relação aos
outros fatos”.
Não se trata, como afirma a defesa, de nova circunstância judicial; o juiz sope-
sou de forma mais grave a consequência do crime em razão do número de pessoas
lesadas. O art. 59 do CP não estabelece critérios matemáticos para exasperação da
pena, de modo que não há ilegalidade no aumento. O dano é expressivo e atingiu
diversas pessoas; havendo fundamentação idônea, não merece reparos a sentença.
Com relação ao quarto fato, Michel apropriou-se R$ 11.618,32 de Hiroshi
Homa. Como dito acima, é possível a majoração em razão da extensão da lesão. No
caso, contudo, entendo que esta não se justifica.
Dou parcial provimento ao apelo, mantendo o aumento da pena-base aplicada

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


ao crime do art. 313-A do CP.
4. Dosimetria. Ao magistrado, valendo-se das balizas normativas estabelecidas
de forma bastante detalhada pelo Código Penal, cabe a tarefa de individualizar a
pena de forma proporcional à conduta praticada pelo réu. A meu ver, somente cabe
a intervenção deste Tribunal quando houver nítido descompasso entre os critérios
utilizados na dosimetria e os fatos em julgamento. É sob tal perspectiva que passo
a analisar a dosimetria das penas impostas ao acusado.
4.1. Art. 312 do CP (fato um). A pena-base foi elevada em dois anos porquanto
consideradas negativas a personalidade e as consequências do delito. Considerando
o provimento do recurso da defesa quanto ao ponto, fixo a pena-base em dois anos.
Não foram reconhecidas agravantes e atenuantes.
Não foi aplicada a causa de aumento do art. 327, § 2º, porquanto o réu não
era ocupante de cargo em comissão ou exercia chefia.
Em razão da semi-imputabilidade, incide a causa de diminuição da pena do
art. 26, parágrafo único, em 1/3 (conforme item 2), resultando uma pena de 1 (um)
ano e 4 (quatro) meses.
Fixo a pena de multa em 10 (dez) dias-multa, arbitrados em 1/20 (um vigésimo)
do salário mínimo vigente na data do fato.
4.2. Art. 313-A (fato três). A pena-base foi elevada em dois anos e dois meses,
porquanto consideradas negativas a personalidade e as consequências do delito,
554 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

estas, como analisado acima, majoradas dois meses a mais que os demais fatos.
Considerando que provido o recurso da defesa quanto à circunstância personalidade,
fixo a pena-base em três anos e dois meses.
Não foram reconhecidas agravantes e atenuantes.
Não foi aplicada a causa de aumento do art. 327, § 2º, porquanto o réu não
era ocupante de cargo em comissão ou exercia chefia.
Em razão da semi-imputabilidade, incide a causa de diminuição da pena do
art. 26, parágrafo único, em 1/3 (conforme item 2), resultando uma pena de 2 (dois)
anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias.
Em razão da continuidade delitiva (93 condutas) o juízo aumentou a pena em
1/6. Não havendo recurso da acusação quanto ao ponto, fica mantido o patamar,
contudo, poderia ter sido fixado em patamar superior, tendo em vista o número de
condutas. Torno definitiva a pena de 2 (dois) anos, 5 (cinco) meses e 16 (dezesseis)
dias.
Fixo a pena de multa em 26 (vinte e seis) dias-multa, arbitrados em 1/20 (um
vigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato.
4.3. Art. 312 do CP (fato quatro). A pena-base foi elevada em dois anos porquanto
consideradas negativas a personalidade e as consequências do delito. Considerando
que provido o recurso da defesa quanto ao ponto, fixo a pena-base em dois anos.
Não foram reconhecidas agravantes e atenuantes.
Não foi aplicada a causa de aumento do art. 327, § 2º, porquanto o réu não
era ocupante de cargo em comissão ou exercia chefia.
Em razão da semi-imputabilidade, incide a causa de diminuição da pena do
art. 26, parágrafo único, em 1/3 (conforme item 2), resultando uma pena de 1 (um)
ano e 4 (quatro) meses.
Fixo a pena de multa em 10 (dez) dias-multa, arbitrados em 1/20 (um vigésimo)
do salário mínimo vigente na data do fato.
4.4. Resta fixada a pena definitiva em 5 (cinco) anos, 1 (um) mês e 16 (de-
zesseis) dias, e 46 (quarenta e seis) dias-multa, arbitrados em 1/20 (um vigésimo)
do salário mínimo.
Dispositivo.
Ante o exposto, voto por (i) dar provimento ao recurso do MPF para fixar o
patamar da causa de diminuição da pena do art. 26 do CP em 1/3; (ii) dar parcial
provimento ao recurso da defesa para afastar circunstâncias judiciais valoradas
negativamente pelo juízo a quo; e (iii) redimensionar a pena e condenar Michel
Henrique Cardoso como incurso nas sanções do art. 312, duas vezes, e art. 313-A,
ambos do CP, às penas de 5 (cinco) anos, 1 (um) ano e 16 (dezesseis) dias e 46
(quarenta e seis) dias-multa, arbitrados em 1/20 (um vigésimo) do salário mínimo
vigente na data do último fato.
Desembargador Federal Leandro Paulsen – Relator
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL 0001596-06.2013.4.05.8401-RN


Quarta Turma (DEJF 23/10/2015)

Relator: Juiz Federal Convocado Manuel Maia


Data do julgamento: 20/10/2015

77/197 — EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL DA DEFESA. ART. 19 DA


LEI Nº 7.492/86. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA.
1. Utilizados documentos de terceira pessoa para obtenção, junto ao Banco
do Brasil, de financiamento relativo a recursos do Programa de Fortalecimento
da Agricultura Familiar – Pronaf, configurou-se a conduta típica prevista no
art. 19 da Lei nº 7.492/86.
2. Tratando-se de crime formal, verifica-se a consumação quando da as-
sinatura do contrato de financiamento, prescindindo da efetiva liberação das
parcelas. Precedentes do STJ.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


3. Neste caso, o financiamento junto à instituição bancária foi realizado
em 18.12.03, enquanto que o recebimento da denúncia ocorreu em 27.12.2014,
isto é, mais de dez anos depois.
Tendo em vista o trânsito em julgado da sentença condenatória para
a acusação, deve ser reconhecida a prescrição, já que o prazo prescricional
correspondente à pena em concreto fixada na sentença (3 anos e 10 meses de
reclusão) é de 8 anos (art. 109, IV, do CP).
4. Apelação criminal provida para declarar extinta a punibilidade do
crime previsto no art. 19 da Lei nº 7.492/86, nos termos do art. 107, IV, do CP.
Julgamento do mérito prejudicado.

ACÓRDÃO
Decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por una-
nimidade, dar provimento à apelação criminal, nos termos do voto do relator, na
forma do relatório e notas taquigráficas constantes nos autos, que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Recife, 20 de outubro de 2015.
Desembargador Federal Convocado Manuel Maia – Relator
556 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal Manuel Maia (Convocado): Trata-se de
apelação criminal interposta pela defesa do acusado Hudson Costa Bezerra (fls.
134/152) contra sentença proferida pelo Juízo Federal da 10ª Vara/RN (Natal) – fls.
94/103 –, integrada pela decisão proferida em embargos de declaração (fls. 122/125),
que julgou procedente a denúncia para condená-lo pela prática do crime previsto
no art. 19 da Lei nº 7.492/86 à pena de 3 anos e 10 meses de reclusão, em regime
aberto, e 156 dias-multa.
A pena foi substituída por restritivas de direitos (CP, art. 44, § 2º, segunda parte)
e foi fixado o valor de R$ 831,91 como mínimo para indenização (CPP, art. 387, IV).
Consoante a denúncia, no período de 18.12.03 a 18.12.06, o acusado obteve,
mediante fraude e uso de pessoa interposta, financiamento em instituição financei-
ra credenciada para o repasse de verbas oriundas do Programa de Fortalecimento
da Agricultura Familiar – Pronaf, o que acarretou um prejuízo não atualizado de
R$ 3.200,00 (três mil e duzentos reais).
Giza a denúncia que o acusado aliciou e convenceu Anália Alves Mendonça
dos Santos a contratar o financiamento rural e repassar-lhes os valores liberados.
Para tanto, Anália teria acompanhado o réu até o Sindicato dos Trabalhadores Rurais
de Upanema/RN para entregar documentos pessoais e assinar outros documentos,
tendo, ainda, entregue o cartão e a senha para que o acusado efetuasse os saques.
Nas suas razões recursais a defesa pugna pela reforma da sentença condena-
tória, requerendo:
I – o reconhecimento da prescrição retroativa pela pena em abstrato ou mesmo
virtual ou em perspectiva;
II – nulidade do processo, vez que o Ministério Público não teria legitimidade
para conduzir/presidir inquérito policial de forma unilateral, bem como por cer-
ceamento de defesa ante a ausência de defensor ao investigado na esfera policial;
III – a completa falta de justa causa para a ação penal, vez que inexistem provas
concretas que vinculem o acusado a qualquer empréstimo ou financiamento junto
ao Banco do Brasil;
IV – ofensa
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ao princípio da persuasão racional das provas, pois o juiz de pri-
meiro grau deixou de valorar os depoimentos das testemunhas arroladas; e
V – a absolvição, com esteio no art. 386, III e VII, do CPP, pela aplicação do
princípio da insignificância ou mesmo a atipicidade da conduta ante a ausência de
dolo, o que implicaria na não aplicabilidade da Lei nº 7.492/86, vez que em nenhum
momento o acusado teve a intenção e a vontade de fraudar o Sistema Financeiro
Nacional.
Alternativamente, pede a revisão da dosimetria da pena, alegando:
I – excesso na fixação da pena, vez que o acusado é primário, possui bons
antecedentes, sendo-lhe favorável a personalidade e a sua conduta social; e
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 557

II – que a pena deve ser fixada bem próxima ao mínimo legal e ser levado em
consideração a compensação da atenuante da confissão com a causa de aumento
prevista no art. 19, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86.
Contrarrazões pela acusação (fls. 188/201).
No Parecer de fls. 208/220, o Exmo. Sr. Procurador Regional da República,
Francisco Machado Teixeira, opinou pelo não provimento do recurso de apelação
interposto pela defesa.
É o que havia de relevante para relatar.
Ao eminente Revisor, nos termos do Regimento Interno desta Corte.
É o relatório.

VOTO
O Senhor Desembargador Federal Manuel Maia (Convocado): Consoante rela-
tado, trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de Hudson Costa Bezerra,
por meio da qual alega a ocorrência da prescrição retroativa relativamente ao crime
previsto no art. 19 da Lei nº 7.492/86.
Passemos a análise da prejudicial de mérito.
No caso em análise, Hudson Costa Bezerra foi denunciado porque teria se
utilizado de documentos de terceira pessoa para obter financiamento, junto ao
Banco do Brasil, para a utilização de recursos do Programa de Fortalecimento da

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Agricultura Familiar – Pronaf.
Essa conduta se amoldaria ao tipo penal do art. 19 da Lei nº 7.492/86, que,
ao disciplinar as condutas atentatórias ao Sistema Financeiro Nacional, previu no
referido dispositivo legal o ato de “obter, mediante fraude, financiamento em ins-
tituição financeira”.
A configuração do delito em questão depende, portanto, da prática de frau-
de visando à concessão do financiamento requerido. Entretanto, por se tratar de
crime formal (STJ, REsp 706.871/RS), prescinde da efetiva liberação das parcelas,
consumando-se com a assinatura do contrato de financiamento.
Neste caso, o financiamento junto à instituição bancária foi realizado em 18
de dezembro de 2003, data que deve ser tomada como termo a quo para a contagem
do prazo prescricional, já que, como decidido pelo Superior Tribunal de Justiça,
“I – A obtenção do financiamento não implica necessariamente na efetiva
percepção do valor financiado. O fato se esgota no ato de celebração do contrato,
realizado mediante fraude, confirmando a natureza instantânea do delito, de
efeitos permanentes.
II – A efetiva obtenção do valor financiado, com a liberação das parcelas
objeto do financiamento, ocorre posteriormente, configurando mero exaurimento
da ação delituosa.
558 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

III – Recurso desprovido.” (REsp 682.181/PR, Rel. Min. Gilson Dipp,


Quinta Turma, j. 01.09.05, DJ 26.09.05, p. 444)
Voltando-se ao fato delituoso em questão, como ocorreu antes da vigência da
Lei nº 12.234/2010, permanece a possibilidade de ocorrência da prescrição retroativa
com base no lapso temporal entre a data de consumação do delito e o recebimento
da denúncia.
Ademais, como não houve recurso da acusação, o prazo prescricional corres-
ponderá ao prazo legal correspondente à pena em concreto fixada na sentença (fls.
94/103), mais precisamente 3 (três) anos e 10 (dez) meses de reclusão.
Feitas estas observações, outra não é a hipótese senão a de reconhecimento
da prescrição da pretensão punitiva estatal, tendo em vista que o lapso temporal
entre a data da consumação do delito (18.12.05 – documento à fl. 31 do IPL) e a
data de recebimento da denúncia (27.03.2014) excede o prazo legal de oito anos
(art. 109, IV, do CP).
Finalmente, nos termos do art. 114, inciso II, do CP, também se encontra
prescrita a pena de multa.
Nestes termos, dou provimento à apelação criminal da defesa para declarar
extinta a punibilidade do crime previsto no art. 19 da Lei nº 7.492/86, imputado ao
denunciado Hudson Costa Bezerra na Ação Penal 0001596-06.2013.4.05.8401, com
fulcro no art. 107, IV, do CP, e julgo prejudicado o exame do mérito.
É como voto.
Recife, 20 de outubro de 2015.
Desembargador Federal Convocado Manuel Maia – Relator
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0456.13.002223-3/001


Quarta Câmara Criminal (DJEMG 08/09/2015)

Relator: Desembargador Doorgal Andrada


Data do julgamento: 02/09/2015

77/198 — EMENTA: FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE


OBSTÁCULO. QUEBRA DE VIDRO DE JANELA PARA ACESSAR O IMÓVEL.
ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. INCLUSÃO DA QUALIFICADORA COM
BASE NA PROVA PERICIAL. RECURSO NÃO PROVIDO.
Deve ser mantida a incidência da qualificadora de rompimento de obs-
táculo para furto, uma vez que o agente estaria usando de meio anormal para
acessar a res furtiva e atingir o seu intento de delito patrimonial, especialmente
se a situação foi provada através de perícia.

ACÓRDÃO

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Vistos, etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça
do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em negar
provimento.
Desembargador Doorgal Andrada – Relator

VOTO
Desembargador Doorgal Andrada (Relator):
Trata-se de apelação criminal interposta por L.R.B. em face da r. sentença de fls.
146/150, que julgou procedente a exordial acusatória, para condenar o acusado pela
prática do crime previsto no art. 155, § 4º, II, do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos
de reclusão e 15 (quinze) dias-multa em regime inicial semiaberto.
Narra a denúncia que no dia 3 de abril de 2013, o acusado, mediante arrom-
bamento de uma janela, subtraiu vários pertences da residência da vítima F.P.F.
O recorrente busca o decote da qualificadora, tendo em vista o fato de que não
houve prova nos autos do seu cometimento pelo réu (fls. 164/165).
Contrarrazões às fls. 166/167.
A seu turno, a d. Procuradoria de Justiça, instada a se manifestar, pronunciou-
se no sentido do não provimento do apelo (fls. 173/174).
É o relatório.
560 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.


No presente caso não se discute a autoria delitiva, pois fora confessada pelo
acusado judicialmente (fl. 138).
Sobre o decote da qualificadora, deve ser mantida nos autos.
O rompimento consiste em abrir brecha, arrombar, deslocar, serrar, perfurar,
forçar o obstáculo, visando tornar mais fácil a prática do crime.
No delito sob apuração ficou evidente que o agente praticou a conduta acima
mencionada e se enquadra na qualificadora em comento, sendo impossível a des-
classificação do delito para furto simples.
Ademais, a incidência da qualificadora foi comprovada através da perícia de
fls. 92/93.
Nesse sentido a posição do TJMG:
“PENAL. FURTO QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO.
CARACTERIZAÇÃO. A qualificadora do rompimento de obstáculo refere-se
à obstrução contra a segurança da coisa, ou seja, quando o agente, para con-
cretizar a subtração, provoca arrombamento, ruptura, demolição, destruição
(total ou parcial) de qualquer elemento exterior à coisa, que vise a impedir,
evitar ou dificultar eventual subtração. Recurso improvido. Súmula: negaram
provimento.” (Processo 1.0107.05.931469-3/001, Rel. Antônio Armando dos
Anjos, j. 10.11.06, publ. 12.12.06)
A pena do acusado foi fixada no seu mínimo legal, o que não demanda ade-
quação.
Em face do exposto, nego provimento ao recurso, nos termos do presente voto.
Custas na forma da lei.
Desembargador Corrêa Camargo (Revisor) – De acordo com o Relator.
Desembargador Amauri Pinto Ferreira (JD Convocado) – De acordo com o
Relator.
Súmula: “negaram provimento”.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO

EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0394253-79.2012.8.19.0001


Sétima Câmara Criminal (DORJ 29/10/2015)

Relator: Desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto


Data do julgamento: 27/10/2015

77/199 — EMENTA: ROUBO MAJORADO PELO EMPREGO DE ARMA


E EM CONCURSO DE PESSOAS. DIVERGÊNCIA. VOTO VENCIDO. FRA-
ÇÃO RELATIVA ÀS CAUSAS DE AUMENTO DA PENA. REDUÇÃO PARA
O MENOR PATAMAR (1/3). RESGATE. POSSIBILIDADE. EXTENSÃO DE
EFEITOS AOS CORRÉUS. NECESSIDADE. REQUISITOS DO ART. 580 DO
CPP PREENCHIDOS.
O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime circunstanciado
exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação
a mera indicação do número de majorantes. Na presente hipótese, a Juíza de

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


primeiro grau, utilizando o critério quantitativo, asseverou que “(...) na terceira
fase da pena, torno a aumentá-la de 3/8 (três oitavos) pela incidência das duas
causas especiais de aumento de pena do concurso de agentes e do emprego de
arma, restando elevada para 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão (...)”
(pasta 539). A fração eleita para majoração da reprimenda em razão das causas
de aumento da pena deve ser motivada quanto ao caso concreto, e não somente
em relação à quantidade de majorantes (Súmula nº 443 do STJ). Preenchidos
os requisitos do art. 580 do CPP, torna-se imperiosa a extensão dos efeitos da
decisão aos corréus. Embargos infringentes acolhidos.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos Infringentes e de Nuli-


dade 0394253-79.2012.8.19.0001, em que é embargante Tássio Silva de Brito e em-
bargado o Ministério Público, acordam os Desembargadores que compõem a Sétima
Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade
de votos, em acolher os embargos infringentes para resgatar o voto minoritário, com
extensão de efeitos aos corréus, nos termos do voto do Desembargador-Relator.
Rio de Janeiro, na data constante da assinatura digital.
Desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto – Relator
562 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
Trata-se de embargos infringentes interpostos por Tássio Silva de Brito,contra
o acórdão de pasta 733, no qual a Turma Julgadora, por maioria de votos, desproveu
os apelos defensivos, mantendo a r. sentença de 1º grau (pasta 539).
Em suas razões (pasta 782), pretende o embargante resgatar o voto parcialmente
vencido da eminente Desembargadora Rosita Maria de Oliveira Netto, que reduziu
a fração de aumento das majorantes, na terceira fase da dosimetria, à fração mínima
(1/3), concretizando a pena em 5 anos e 4 meses de reclusão, no regime inicial se-
miaberto, e ao pagamento de 13 dias-multa, no mínimo legal, pela prática do crime
de roubo majorado pelo emprego de arma e em concurso de pessoas (pasta 748).
O recurso foi admitido (pasta 787) e distribuído a esta c. Câmara Criminal
(pasta 791).
Instada a se manifestar, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da
lavra do Dr. Frederico A. R. Canellas, opinou pela rejeição dos embargos infringentes.
Esse é, em síntese, o relatório.
À revisão.

VOTO
Conheço do recurso, porquanto presentes os pressupostos de sua admissibi-
lidade.
Nos termos do art. 609, parágrafo único, do Código de Processo Penal, são
admitidos os embargos infringentes quando não houver decisão unânime do órgão
colegiado, desde que desfavorável ao acusado, limitando-se os embargos ao desa-
cordo parcial que lhe for benéfico, pois o objetivo de tal recurso é resgatar o voto
mais favorável, vencido no julgamento.
In casu, busca a combativa defesa resgatar o voto da lavra da eminente Desem-
bargadora Rosita Maria de Oliveira Netto, que, no julgamento da apelação, votou no
sentido de aumentar a pena dos acusados, dentre eles o ora embargante, em apenas
1/3 (um terço), pela incidência das majorantes relativas ao concurso de pessoas e
emprego de arma (pasta 748).
Depois de analisar com acuidade o v. acórdão embargado, bem como o con-
junto probatório apresentado nos autos, tenho que a pretensão defensiva merece
acolhimento.
Entendo, amparado pela jurisprudência dominante no STJ, que o aumento,
qualquer que seja a fração utilizada, deve ser feito de forma motivada, e não apenas
com base na quantidade das majorantes do caso concreto, consoante a Súmula nº
443 do STJ.
Nesse sentido:
“PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL.
INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ROUBO MAJORADO E EXTORSÃO. CON-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 563

TINUIDADE DELITIVA. INVIABILIDADE. ROUBO PRATICADO CONTRA


VÍTIMAS DIVERSAS EM UM MESMO CONTEXTO. CONCURSO FORMAL
PRÓPRIO. ADEQUAÇÃO. TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA. APREEN-
SÃO E PERÍCIA DA ARMA. DESNECESSIDADE. PRESENÇA DE MAIS DE
UMA CAUSA DE AUMENTO. MAJORAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. SÚMULA Nº 443/STJ.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA
DE OFÍCIO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior, seguindo orientação firmada
pela Primeira Turma do STF, não mais admite a utilização de habeas corpus em
detrimento do recurso adequado, situação que implica o não conhecimento
da impetração. Precedentes.
2. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido da impos-
sibilidade do reconhecimento de continuidade delitiva entre os crimes de roubo
e extorsão, tendo em vista que não são delitos da mesma espécie. Precedentes.
3. Em relação aos roubos, não há falar em crime único quando, num
mesmo contexto fático, são subtraídos bens pertencentes a pessoas diferentes,
incidindo, na espécie, a regra prevista no art. 70, primeira parte, do Código
Penal.
4. O entendimento desta Corte Superior de Justiça é no sentido de ser
desnecessária a apreensão ou perícia da arma utilizada no crime para o reco-
nhecimento da majorante da pena prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Código Penal, uma vez que o uso daquela pode ser evidenciado por outros
meios de prova. Precedentes.
5. ‘O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo
circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua
exasperação a mera indicação do número de majorantes’ (Súmula nº 443/STJ).
Hipótese em que a pena foi aumentada em fração superior a 1/3 com base apenas
no número de majorantes.
6. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para redi-
mensionar a pena do paciente.” (HC 265.544/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares
da Fonseca, Quinta Turma, j. 08.09.2015, DJe 14.09.2015)
“PENAL E PROCESSUAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE
RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. ROUBO CIRCUNSTANCIADO.
DOSIMETRIA. PENA-BASE. ELEVAÇÃO EM FACE DA PERSONALIDADE
PERIGOSA DO AGENTE. POSSIBILIDADE. CONCURSO DE AGENTES E
EMPREGO DE ARMA BRANCA (FACA). AUMENTO ACIMA DO MÍNIMO
LEGAL. CRITÉRIO MATEMÁTICO. OFENSA À SÚMULA Nº 443 DO STJ.
REGIME PRISIONAL FECHADO EM FACE DA GRAVIDADE ABSTRATA DO
DELITO. IMPOSSIBILIDADE.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, acompanhando a
orientação da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, firmou-se no
564 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

sentido de que o habeas corpus não pode ser utilizado como substituto de
recurso próprio, sob pena de desvirtuar a finalidade dessa garantia constitu-
cional, exceto quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se
concede a ordem de ofício.
2. A circunstância de o primeiro paciente estar sob o efeito de drogas no
momento em que se utilizou de uma faca para ameaçar a vítima denota a sua
periculosidade mais acentuada no caso concreto, estando, assim, justificada a
elevação da pena-base.
3. No crime de roubo circunstanciado, a fixação acima da fração mínima de
1/3 (um terço), em decorrência da existência de mais de uma causa de aumento,
exige motivação baseada em dados concretos, não servindo de justificativa a mera
quantidade de majorantes.
4. Na hipótese, as instâncias ordinárias utilizaram-se de critério matemá-
tico para justificar a fração de aumento aplicada (3/8), o que configura ofensa à
Súmula nº 443 do STJ.
5. Há de ser fixado o regime semiaberto para o início do desconto da
reprimenda imposta ao segundo paciente, uma vez que se trata de réu pri-
mário, cuja pena-base foi fixada no mínimo legal, porquanto favoráveis todas
as circunstâncias judiciais, sendo a pena definitiva superior a 4 e inferior a 8
anos de reclusão.
6. Habeas corpus não conhecido. Concedida a ordem, de ofício, para
aplicar a fração mínima de 1/3 em razão das majorantes do roubo, redimensio-
nando a pena cominada aos dois pacientes, e para estabelecer o regime inicial
semiaberto para o segundo paciente.” (HC 204.046/SP, Rel. Min. Gurgel de
Faria, Quinta Turma, j. 03.09.2015, DJe 18.09.2015)
No caso concreto, a Juíza de primeiro grau, utilizando o critério quantitativo,
asseverou que,
“(...) na terceira fase da pena, torno a aumentá-la de 3/8 (três oitavos)
pela incidência das duas causas especiais de aumento de pena do concurso de
agentes e do emprego de arma, restando elevada para 5 (cinco) anos e 6 (seis)
meses de reclusão (...).” (pasta 539)
A douta maioria da c. Sexta Câmara Criminal manteve o percentual sob os
seguintes fundamentos:
“(...) Quanto à fração de aumento da pena pela dupla qualificação do
delito, mantém-se os 3/8 (três oitavos), considerando o envolvimento de quatro
agentes no delito e o emprego de pelo menos uma arma de fogo. É o critério
qualitativo se sobrepondo sobre o quantitativo, em plena consonância com o
Verbete nº 443 das Súmulas do STJ.” (pasta 733)
A circunstância de o delito ter sido perpetrado em concurso de quatro agentes so-
mente foi destacada em sede de apelação criminal interposta pelos réus, sendo certo que
a julgadora monocrática não motivou o aumento da reprimenda em 3/8 na terceira fase
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 565

da dosimetria da pena com base naquela circunstância, como se vê dos trechos acima
transcritos, constituindo inadmissível reformatio in pejus.
Dessa forma, uma vez que foi utilizado apenas o critério quantitativo para fins
de exasperação da reprimenda, na terceira fase da dosimetria, em patamar superior
ao mínimo legalmente previsto, tenho que os embargos infringentes e de nulidade
devem ser acolhidos.
A pena do embargante fica concretizada definitivamente em 6 anos, 2 meses
e 20 dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, e em 15 dias-multa, no valor
unitário mínimo.
E nos termos do que dispõe o art. 580 do Código de Processo Penal, estendo
os efeitos desta decisão aos corréus Nathan do Valle Carvalho, Rafael Mendonça do
Nascimento e Elton Farias de Almeida.
À conta de tais considerações, acolho os embargos infringentes para resgatar o
voto minoritário, com extensão de efeitos aos corréus, nos termos acima.
É como voto.
Rio de Janeiro, na data constante da assinatura digital.
Desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto – Relator

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

HABEAS CORPUS Nº 0321043-85.2015.8.21.700


Sexta Câmara Criminal (DJERS 04/09/2015)

Relator: Desembargador Aymoré Roque Pottes de Mello


Data do julgamento: 01/09/2015

77/200 — EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. REGIME SEMIABERTO.


BENEFÍCIOS EXTERNOS.
1. Habeas corpus conhecido em caráter excepcional, pois a matéria de
fundo diz respeito à liberdade do paciente.
2. Inexigibilidade de preenchimento do requisito objetivo de 1/4 de
cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto, para a
obtenção dos benefícios externos.
3. Requisito objetivo preenchido. Determinação da devida procedimen-
talização do pedido no Juízo a quo, para análise do requisito subjetivo, pena
de supressão de um grau de jurisdição.
Ordem parcialmente concedida.

DECISÃO MONOCRÁTICA
Vistos.
1. Trata-se de habeas corpus impetrado pelo Defensor Público André Iglesias e
Silva Borges em favor de G.S.S., que cumpre condenação criminal cuja pena carce-
rária é de 13 anos, 11 meses e 6 dias de reclusão, no regime inicial fechado, perante
a Vara de Execuções Criminais da Comarca de Lagoa Vermelha. Em 20.08.2015, foi
deferida ao paciente a progressão de regime para o semiaberto, sendo indeferido, na
mesma decisão, o seu pleito de saída temporária.
No presente writ (fls. 02/14), o impetrante afirma a ocorrência de constrangi-
mento ilegal por parte da autoridade impetrada, em face da exigência do cumprimento
do requisito objetivo de cumprimento de 1/4 da pena para a concessão da saída
temporária. Afirma que tal exigência configura evidente constrangimento ilegal,
em razão da ausência de previsão legal neste sentido. Pede liminar de concessão de
saídas temporárias ao paciente/apenado.
2. De plano, conheço do presente habeas corpus em caráter excepcional, em
face da matéria de fundo dizer respeito ao direito de ir e vir do paciente/apenado,
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 567

bem assim por entender caracterizado, no caso, o constrangimento ilegal que a


autoridade coatora está impondo ao apenado, consoante passo a analisar.
Veja-se que a decisão atacada pelo impetrante está redigida nos seguintes ter-
mos, verbis (fls. 512/513v. do apenso):
“(...)
Vistos.
Considerando que a decisão de fls. 982/984 já reconheceu a presença
do requisito objetivo para fins de progressão de regime, passo à análise do
pressuposto subjetivo.
Na espécie, as condições subjetivas do apenado são favoráveis à progres-
são de regime. É o que se denota da análise dos atestados firmados pela casa
prisional, englobando o setor da administração, da atividade de segurança e
laboral (fls. 502/509).
Outrossim, em que pese haver homologação recente de falta grave (fls.
955/957), de se salientar que o art. 14, § 3º, do Regimento Disciplinar Peni-
tenciário prevê que após 60 (sessenta) dias do cometimento da falta, a conduta
é novamente considerada plenamente satisfatória. No caso dos autos, a falta
ocorreu em 14.03.2015 e a recaptura em 28.03.2015.
Com efeito, o bom comportamento carcerário, a conduta plenamente sa-
tisfatória, somados à inexistência de PAD em andamento, todos são indicativos

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


da adequação da conduta com a medida de progressão de regime. Além disso,
o apenado acata as normas e das determinações a ele impostas, respeitando os
funcionários e os colegas de infortúnio, não existindo nada que desabone sua
conduta, e durante o cumprimento da pena no regime mais gravoso, demons-
trou interesse pelo trabalho, uma vez que desempenhou atividades laborais
internamente no presídio e, após, com o serviço externo, justificando, pois,
a remição da pena. De igual forma, a avaliação psicológica recomenda a con-
cessão do benefício, revelando a possibilidade de trabalho extramuros, além
de conduta em consonância com as normas e limites impostos. Porquanto, do
cotejo de tais documentos, têm-se presente o requisito subjetivo.
Assim sendo, implementado o pressuposto objetivo e subjetivo, é de ser
concedido o benefício da progressão de regime.
Isso posto, defiro o pedido de progressão de regime do fechado para o
semiaberto, nos termos do art. 112, caput, da Lei nº 7.210/84.
2. Saída temporária para obtenção de carta de emprego
Uma vez progredido o regime de cumprimento para o semiaberto, pos-
sível a saída do apenado para atividade laboral desde que apresentada carta
de emprego.
Assim, defiro a saída do reeducando do estabelecimento penal, durante
2 (dois) dias, a critério da administração da casa prisional, a fim de que provi-
568 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

dencie carta de emprego. Enfatizo, entretanto, que o mesmo deverá recolher-se


ao PELV durante o período noturno.
3. Saída temporária
As saídas temporárias, nos termos do art. 122 da LEP, são restritas aos
sentenciados que cumprem pena em regime semiaberto e dependerão sempre
da presença dos requisitos previstos no art. 123 do mesmo Diploma Legal,
consistente no tempo mínimo de cumprimento da pena, que é de 1/6 ao con-
denado primário, e 1/4 ao reincidente, e no mérito do beneficiário durante o
período de recolhimento do apenado.
No caso vertente, não estão presentes os pressupostos legais, à luz do
expediente carcerário, pois o reeducando cumpre pena no regime semiaberto,
mas não implementou 1/4 da reprimenda, o que só ocorrerá em 16.10.2015.
Assim sendo, indefiro a saída temporária.
4. Encaminhamento para programa municipal
É de conhecimento do juízo que a casa prisional firmou convênio com
o Município de Lagoa Vermelha, a fim de que os apenados realizem serviços
junto a órgãos da municipalidade (PAC 68/2014).
Assim sendo, autorizo o administrador do presídio a encaminhar o ape-
nado para que seja incluído no supramencionado PAC a fim de que realize
trabalhos junto a órgãos da municipalidade até que não haja o aporte da carta
de emprego a ser providenciada.
5. Deliberações finais
Façam-se as devidas alterações no sistema Themis.
A presente decisão é expedida em duas vias, servindo uma delas como
ofício ao administrador do presídio, a fim de que comunique o apenado.
(...)”
Com a maxima venia, verifico não haver previsão legal de exigência de cum-
primento de 1/4 da pena para a concessão dos benefícios externos – serviço externo
e saída temporária – aos apenados do regime semiaberto, como no caso dos autos,
em que deferida a progressão do apenado para o regime semiaberto. Neste sentido
são os seguintes precedentes desta Corte, verbis:
“AGRAVO DA EXECUÇÃO (ART. 197 DA LEP). TRABALHO EXTERNO.
No caso vertente, é inexigível o cumprimento de 1/6 da pena no regime
semiaberto, para a obtenção do benefício do serviço externo, desde que também
preenchido o requisito subjetivo.
Lapso temporal que se iguala àquele exigido para o preenchimento do
requisito objetivo à progressão do apenado, no caso, para o regime aberto.
Aplicação da Súmula nº 40 do STJ. Precedentes desta Corte e do STJ.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 569

Determinação da devida procedimentalização do feito no Juízo a quo, para


análise do requisito subjetivo, sob pena de supressão de um grau de jurisdição.
Agravo parcialmente provido.” (AGE 70.064.365.323, 6ª Câmara Crimi-
nal, TJRS, Rel. Des. Aymoré Roque Pottes de Mello, j. 14.05.2015)
“AGRAVO DA EXECUÇÃO (ART. 197 DA LEP). SAÍDA TEMPORÁRIA.
O cumprimento de 1/4 da pena no regime semiaberto, ao apenado rein-
cidente, é inexigível, para fins de obtenção do benefício da saída temporária,
desde que também preenchido o requisito subjetivo.
A Lei de Execução Penal exige o cumprimento de 1/4 da pena total, não
havendo qualquer menção à necessidade de cumprimento desse período a
contar da última data-base. Aplicação da Súmula nº 40 do STJ.
Quanto ao mais, o lapso temporal se iguala e supera aquele exigido para
o preenchimento do requisito objetivo à progressão do apenado para o regime
aberto.
Diante do afastamento do óbice objetivo temporal, é imperiosa a devida
procedimentalização do feito no Juízo a quo, para análise do requisito subjetivo
do apenado, sob pena de supressão de um grau de jurisdição.
Agravo parcialmente provido.” (AGE 70.064.966.138, 6ª Câmara Crimi-
nal, TJRS, Rel. Des. Aymoré Roque Pottes de Mello, j. 25.06.2015)
“HABEAS CORPUS. MATÉRIA DE EXECUÇÃO. EXCEPCIONALIDADE.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


MANIFESTA ILEGALIDADE. TRABALHO EXTERNO. REGIME SEMIABER-
TO. DISPENSA DO REQUISITO TEMPORAL.
Diante da manifesta ilegalidade da decisão atacada – que com base em
uma portaria do Juízo de origem exigiu do apenado do regime semiaberto o
cumprimento de 1/12 de sua pena para a concessão de benefícios externos –,
é de ser conhecido o writ.
É admissível o trabalho externo aos condenados ao regime semiaberto
independentemente de requisito temporal.
Ordem concedida. Liminar ratificada.” (HC 70.056.264.302, 5ª Câmara
Criminal, TJRS, Rel. Des. Francesco Conti, j. 18.09.2013)
Ademais, não é outro o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a
matéria, consoante segue, verbis:
“(...)
Preliminarmente, releva salientar que o Superior Tribunal de Justiça, na
esteira do que vem decidindo o Supremo Tribunal Federal, não admite que
o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso próprio
(apelação, agravo em execução, recurso especial), tampouco à revisão crimi-
nal, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato
apontado como coator, em prejuízo da liberdade do(a) paciente, seja cogente
a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus.
570 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Sob tais premissas, constato a ocorrência de flagrante ilegalidade que


reclama a concessão, ex officio, da ordem.
I – Consoante explicitado na decisão de reconsideração, constato a pos-
sibilidade de afastamento da exigência de implementação de requisito objetivo
para o deferimento de trabalho externo e saída temporária ao paciente, que
cumpre a pena em regime semiaberto.
Logo, verifico que o pedido formulado reveste-se de plausibilidade jurídi-
ca, sendo o caso de se confirmar a medida de urgência. Isso porque, consoante
farta jurisprudência desta Corte Superior, ‘a exigência do cumprimento de 1/6
da pena para a concessão da benesse do trabalho externo aos que se encontram
no regime semiaberto configura constrangimento ilegal sanável, de ofício’ (HC
282.192/RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, 5ª T., DJe 22.05.2014, destaquei).
No mesmo sentido: HC 251.107/RS, Relª Minª Laurita Vaz, 5ª T., DJe
19.03.2013 e HC 255.781/RS, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T.,
DJe 20.02.2013.
Com efeito, o Juiz das execuções indeferiu o pleito, sob o mero argumento
de que o paciente ‘não implementou o requisito objetivo de 1/6 de cumprimento
da pena, na forma do art. 37 da Lei nº 7.210/84’ (fl. 75).
(...)
Noto que as instâncias ordinárias não dispensaram a devida fundamenta-
ção, com referência a circunstâncias concretas relativas a requisitos subjetivos
a justificar o indeferimento dos benefícios em comento. A simples exigência do
requisito temporal ao apenado que cumpre a reprimenda em regime semiaberto,
conforme visto, configura evidente constrangimento ilegal.
(...).” (HC 307.095/RS, 6ª Turma do STJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz,
julgamento monocrático em 05.03.2015)
Por isto, entendo configurado o constrangimento ilegal no caso. Superado o
óbice, o pedido deverá ser analisado à vista dos demais requisitos legais no Juízo das
Execuções Criminais.
3. Portanto, concedo em parte a ordem de habeas corpus para afastar a exigência
do cumprimento de 1/4 da pena pelo paciente G.S.S., para fins de exame de conces-
são de benefícios externos, determinando que o Juízo a quo examine, de imediato, o
eventual implemento dos demais requisitos legais para a concessão dos benefícios.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se, inclusive o Ministério Público nesta
Corte. Comunique-se à autoridade impetrada para implementação de urgência.
Diligências legais.
Porto Alegre, 1º de setembro de 2015.
Desembargador Aymoré Roque Pottes de Mello – Relator
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

AGRAVO REGIMENTAL Nº 2015.021119-7


Primeira Câmara Criminal (DJSC 08/09/2015)

Relatora: Desembargadora Marli Mosimann Vargas


Data do julgamento: 01/09/2015

77/201 — EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE DEFERIU


EM PARTE O PEDIDO DE REMIÇÃO, DECLARANDO REMIDOS 51 DIAS
REFERENTE AOS MESES DE MAIO E JUNHO DE 2014. RECURSO DA DE-
FESA OBJETIVANDO A HOMOLOGAÇÃO DE REMIÇÃO REFERENTE AO
MÊS DE MAIO CONFORME RELATÓRIO DA GERÊNCIA DO ERGÁSTULO
PÚBLICO.
Alegação de que desempenhava funções aos domingos. Possibilidade.
Inexistência de controle sobre o trabalho realizado. Dúvida acerca do trabalho
desempenhado aos domingos. Situação que não pode prejudicar o sentenciado.
Necessidade de considerar como trabalhado o maior número possível de dias.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Reforma do decisum. Recurso conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Agravo 2015.021119-7,


da comarca de Blumenau (3ª Vara Criminal), em que é recorrente D.M.B., e recorrido
Ministério Público do Estado de Santa Catarina:
A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recur-
so e dar-lhe provimento, a fim de reformar a decisão agravada para que se considere
o efetivo exercício de mais 4 (quatro) dias de trabalho referente aos domingos de
maio de 2014, que somados ao resto do período (02.05.2014 a 30.06.2014) tem-se
o total de 55 (cinquenta e cinco) dias trabalhados e, por conseguinte, a remição de
18 (dezoito) dias da pena, restando 1 (um) dia de trabalho para futuras remições.
Custas legais.
Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. Luiz Cesar
Schweitzer e o Exmo. Sr. Des. Júlio César M. Fereira de Melo.
Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça participou o Exmo. Sr. Procurador
Norival Acácio Engel.
Florianópolis, 1º de setembro de 2015.
Desembargadora Marli Mosimann Vargas – Presidente e Relatora
572 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

RELATÓRIO
Trata-se de recurso de agravo interposto por D.B. contra decisão proferida pelo
Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Blumenau/SC que, nos autos
da Execução Penal 0023052-07.2013.8.24.0008, concedeu em parte o benefício da
remição pelos dias trabalhados no interior do Presídio Regional de Blumenau no
período de maio/2014 (fls. 103-104).
O agravante, em suas razões recursais, alega que de acordo com a fichas de
frequência teria atendido a 55 dias de trabalho referentes aos meses de maio e junho,
na função de “regalia de manutenção”, fazendo jus, portanto, a 10 dias de remição
da pena referente ao mês de maio.
Salienta que, embora o reeducando tenha informado que exercia suas funções
normalmente de segunda-feira a sábado, afirmou que ocorria alguma manutenção
de emergência no Presídio, de forma que era obrigado a trabalhar.
Aduziu, ainda, que na audiência recordou-se ter trabalhados nos últimos do-
mingos, citando pelo menos os três anteriores.
Dessa forma, objetiva o conhecimento e provimento do recurso para reformar,
ou anular, a decisão, a fim de que seja concedido o reconhecimento da remição nos
exatos moldes da grade relacionada pela autoridade prisional (fls. 112-114v).
Em contrarrazões, requereu o agravado o conhecimento e o desprovimento
do presente recurso, mantendo-se incólume a sentença objurgada (fls. 125-127).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Raul
Schaefer Filho, manifestando-se pelo conhecimento e provimento do agravo (fls.
131-136).
Este é o relatório.

VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do reclamo e passa-
se à análise do seu objeto.
Trata-se de recurso de agravo interposto pelo representante do Ministério Pú-
blico contra decisão proferida pelo Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca
de Blumenau/SC que, nos autos da Execução Penal 0023052-07.2013.8.24.0008, não
reconheceu na integralidade o período de labor do apenado, conforme consta nas
informações enviadas pela autoridade competente para a fiscalização do exercício
de seu trabalho.
Pretende o agravante, em síntese, a reforma da decisão, para que seja homo-
logado os dias laborados nos exatos moldes da grade relacionada pela autoridade
prisional.
A respeito da remição, Julio Fabbrini Mirabete ensina:
“Pode-se definir a remição, nos termos da lei brasileira, como um direito
do condenado em reduzir pelo trabalho prisional o tempo de duração da pena
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 573

privativa de liberdade cumprida em regime fechado ou semiaberto. Trata-se


de um meio de abreviar ou extinguir parte da pena. Oferece-se ao preso um
estímulo para corrigir-se, abreviando o tempo de cumprimento da sanção para
que possa passar ao regime de liberdade condicional ou à liberdade definiti-
va. Segundo Maria da Graça Morais Dias, trata-se de um instituto completo,
‘pois reeduca o delinquente, prepara-o para sua reincorporação à sociedade,
proporciona-lhe meios para reabilitar-se diante de si mesmo e da sociedade,
disciplina sua vontade, favorece a sua família e sobretudo abrevia a condenação,
condicionando esta o próprio esforço do apenado’.
(...)
Não destingue a lei quanto à natureza do trabalho desenvolvido pelo
condenado. Assim, a remição é obtida pelo trabalho interno ou externo, manual
ou intelectual, agrícola ou industrial, não se excluindo o artesanal, desde que
autorizado pela administração do estabelecimento penal.” (Execução penal. 11.
ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 517 e 519)
Segundo se infere dos autos, a gerência do presídio juntou grade de remição
às fls. 74-78, atestando que o agravante laborou nos meses de maio e junho por 55
dias, na função “regalia de manutenção”. A Defensoria Pública requereu o reco-
nhecimento da remição nos moldes da grade relacionada pela autoridade prisional.
Todavia, a magistrada singular não concedeu a remição em sua totalidade sob
os seguintes fundamentos (fls. 9-10):

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


“Consta dos autos que o apenado trabalhou 55 dias no período de
02.05.2014 a 30.06.2014 (fls. 75 e 78). Todavia, o trabalho desempenhado
pelo condenado no período de 02.05.2014 a 30.05.2014 não condiz com a
grade enviada a este juízo.
Em 21.10.2014, o apenado foi ouvido em audiência (mídia de fl. 99),
afirmando que não laborava aos domingos, senão excepcionalmente quando
era chamado, perfazendo menos de 6 horas de labor, assim, não faz jus ao
quantum referido na grade de remição. Ademais, o ofício subscrito pelo gerente
do ergástulo confirma o descanso nos finais de semana (fl. 86). Desta feita,
considerando o período de labor entre segunda-feira a sábado, tem-se o total
de 26 dias trabalhados no mês de abril, e não 30 dias como subscrito à fl. 75.
Assim, descontado lapso supracitado, tem-se o total de 51 dias trabalhos,
correspondentes ao período de 02.05.2014 a 30.06.2014, e 17 dias de remição
a serem homologados.
Posto isso, ante as documentações apresentadas, com fundamento no art.
126 da Lei nº 7.210/84, julgo remidos 17 dias da pena.”
Como se vê, a magistrada singular não concedeu a totalidade dos dias remidos
ao agravante, ao fundamento de que não realizou as atividades aos domingos.
No entanto, em análise do caso em apreço, vê-se que merece reforma a decisão,
pois, embora o próprio agravante tenha declarado que eventualmente desempenhava
574 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

suas funções aos domingos, o relatório da gerência do ergástulo público aponta o


contrário (fl. 75), visto que consta o exercício diário de jornada de trabalho no mês
de maio, inclusive, aos domingos.
Vale salientar, malgrado o gerente do ergástulo, em ofício (fl. 86), tenha infor-
mado que o agravante exerce atividade laboral de 8 horas diárias e folga nos finais
de semana, este esclareceu que não há fiscalização do trabalho do apenado por falta
de efetivo.
E, de acordo com o relato do agravante no termo de audiência (fl. 7 – mídia
eletrônica), este trabalhava de segunda-feira a sábado, das 8h às 12h e das 13h30min
às 18h, e eventualmente aos domingos.
Portanto, vê-se que há dúvidas acerca da informação repassada pelo gerente
prisional, haja vista que segundo este o agravante não trabalhava nos finais de se-
mana, enquanto que o agravante relatou trabalhar sempre aos sábados e, quando
chamado, aos domingos. Além disso, pelo que informou, o agravante trabalhava
mais de 8 horas diárias, diferente do informado no ofício.
Assim, diante da divergência entre o informado pelo gerente prisional, o rela-
tado pelo agravante e o que consta no prontuário deste, deve prevalecer o último,
já que em casos de dúvidas a jornada de trabalho deve ser interpretada em favor, e
não contra o sentenciado.
Convém registrar que não se desconhece que a Lei de Execução Penal limita a
duração diária do tempo trabalhado e garante ao apenado o repouso aos domingos,
contudo, verifica-se que no caso em apreço o apenado, ainda que eventualmente,
laborou aos domingos, de modo que o trabalho exercido deve ser computado para
fins de remição da pena.
Sobre o tema, colhe-se da obra de Rui Carlos Machado Alvim:
“No pertinente ao restante teor daquela norma – proibição de jornada
superior a oito horas, e domingos e feriados com descanso –, jamais o alvo
de tais prescrições será a desagregação de direitos, posto seu timbre manifes-
tamente protetivo, impedindo a exploração da força de trabalho carcerário e
tutelando a saúde do preso trabalhador.
Reputa-se antijurídica e ilegítima uma interpretação que, em inadequada
inversão do significado do preceito, sirva-se do núcleo do interesse resguardado
para derrogar a amplitude legal de outro direito
(...)
A hostilidade à contagem, para o fim da remição, destas horas trabalhadas
somente incentivará a inatividade e a inércia, laureando os relapsos e castigando
os dedicados: é criar um clima de antagonismo ao trabalho e institucionalizar
a injustiça.
Tão absurda é esta interpretação quanto a que propugnasse, à luz da le-
gislação trabalhista, que os operários que trabalhassem aos domingos e feriados
não fariam jus à remuneração dobrada ou que os operários que excedessem
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 575

a jornada normal de trabalho não teriam direito ao acréscimo pelas horas


extraordinárias (...).” (O trabalho penitenciário e os direito sociais. São Paulo:
Atlas, 1991. p. 83-84)
A respeito da jornada de trabalho, o Superior Tribunal de Justiça decidiu:
“EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. REMIÇÃO DA PENA PELO
TRABALHO.�����������������������������������������������
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JORNADA NORMAL. HORAS EXTRAS. DIVISOR DIFEREN-
CIADO. ORDEM CONCEDIDA.
1. Nos termos do art. 33 da Lei de Execução Penal, a jornada normal
de trabalho do sentenciado pode variar entre 6 (seis) e 8 (oito) horas diárias,
o que permite concluir que o legislador deixou a critério do juiz estabelecer,
dentro desses expressos limites, a duração diária da jornada laboral, conforme
as peculiaridades do trabalho a ser desenvolvido pelo condenado, tendo em
vista ser razoável admitir que quanto maior a exigência de esforço, dispêndio
de energia e dedicação na realização de determinadas tarefas pelo sentenciado,
menor deve ser a duração da respectiva jornada de trabalho.
2. Esse critério deve nortear a adoção de divisor menor para o cômputo
dos dias remidos decorrentes de horas extras realizadas além da jornada normal
de 8 (oito) horas diárias, uma vez que as horas extraordinárias trabalhadas
exigem mais esforço do apenado, independentemente do tipo de serviço por
ele executado.
3. Ademais, não há como negar, também, que, em tese, quanto maior

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


o envolvimento do sentenciado com o trabalho, mais rápida será a sua rein-
tegração social, que é o objetivo maior da pena aplicada, do qual o Juízo da
Execução não deve descuidar, justificando o diferencial no que toca às horas
extras realizadas pelo paciente, em consonância com os fins a que se propõe
o referido instituto.
4. Ordem concedida para considerar cada 6 (seis) horas extras realizadas
além da jornada normal de 8 (oito) horas diárias como um dia de trabalho para
fins de remição.” (HC 39.540/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 01.07.05)
No mesmo sentido, não diverge esta Corte de Justiça:
“REMIÇÃO. DECISÃO QUE COMPUTOU DOMINGOS E FERIADOS DE
TRABALHO. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 33 DA LEP. INOCORRÊNCIA.
NORMA QUE SE DESTINA A PROTEGER O SEGREGADO. OBSERVÂNCIA
QUE INCUMBE À ADMINISTRAÇÃO DO ESTABELECIMENTO PRISIONAL
(...) RECURSO DESPROVIDO.” (Recurso de Agravo 2004.003148-3, de São
José, Rel. Juiz José Carlos Carlstens Köhler, j. 13.04.04)
Ainda:
“RECURSO DE AGRAVO. REMIÇÃO DOS DIAS TRABALHADOS EM
DOMINGOS E FERIADOS. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 33 DA LEI DE
EXECUÇÃO PENAL. INOCORRÊNCIA.
576 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

As normas de proteção ao condenado não poderão ser interpretadas em


seu prejuízo. Assim, comprovado o trabalho em domingos e feriados, assegura-
se o direito à remição.” (Recurso de Agravo 2004.001249-7, São José, Rel. Des.
Jânio Machado, j. 07.12.04)
Por fim, cumpre frisar, muito embora no caso em apreço não houve qualquer
tipo de fiscalização ou controle sobre os dias e os horários em que o detento realiza
suas atividades laborais por falta de efetivo, o sentenciado não pode ser prejudicado
por essa desídia, visto que, do contrário, serviria de desestimulo ao trabalho.
Nessa senda, Renato Marcão leciona:
“Se os documentos apresentados forem imprecisos, vagos, não constan-
do a chancela do Diretor da Cadeia Pública, são imprestáveis para instruir o
pedido de remição. Todavia, já se decidiu que ‘o sentenciado não pode ser
prejudicado por falhas no registro das horas e dias trabalhados. Havendo dú-
vida quanto ao número de dias, devem ser considerados como trabalhados o
maior número possível de dias’.” (Curso de execução penal. 7. ed. São Paulo:
Saraiva, 2009. p. 173)
Colhe-se da doutrina de Maurício Kuehne alguns julgados:
“(...) PENA. REMIÇÃO. CONDENADO QUE CUMPRE PENA EM CA-
DEIA PÚBLICA.
450 dias de trabalho na cozinha e na manutenção de veículos oficiais.
Demonstração por atestado do Delegado de Polícia. Irregularidade formal que
não pode prejudicar o sentenciado. Remição de 150 dias. Deferimento.” (TJPR,
Agravo 15.524-6, j. 05.09.91, Paraná Judiciário, 038/300)
“(...) REMIÇÃO. FALHA NO REGISTRO DE DIAS E HORAS TRABA-
LHADAS. DÚVIDA QUE NÃO PODE PREJUDICAR O SENTENCIADO. NE-
CESSIDADE DE CONSIDERAR COMO TRABALHADOS O MAIOR NÚMERO
POSSÍVEL DE DIAS.
O sentenciado não pode ser prejudicado por falhas no registro das horas
e dias trabalhados. Havendo dúvida quanto ao número de dias, devem ser con-
siderados como trabalhados o maior número possível de dias. (RJDTACRIM, v.
2, abr./jun. 1989, p. 50, Rel. Barreto Fonseca).” (Lei de Execução Penal anotada.
4. ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 397 e 401)
À luz do exposto, conhece-se a dá-se provimento ao recurso para reformar a
decisão agravada para que se considere o efetivo exercício de mais 4 (quatro) dias de
trabalho referente aos domingos de maio de 2014, que somados ao resto do período
(02.05.2014 a 30.06.2014) tem-se o total de 55 (cinquenta e cinco) dias trabalhados
e, por conseguinte, a remição de 18 (dezoito) dias da pena, restando 1 (um) dia de
trabalho para futuras remições.
Este é o voto.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

AGRAVO EM EXECUÇÃO Nº 0026141-37.2015.8.26.0000


Décima Quinta Câmara de Direito Criminal (DJESP 08/09/2015)

Relator: Desembargador Willian Campos


Data do julgamento: 13/08/2015

77/202 — EMENTA: FALTA GRAVE. INTERRUPÇÃO DO PRAZO


AQUISITIVO PARA CONCESSÃO DE NOVOS BENEFÍCIOS. LIVRAMENTO
CONDICIONAL. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA Nº 441
DO STJ. POSICIONAMENTO REVISTO.
Nos termos do pacificado e sumulado entendimento do colendo Superior
Tribunal de Justiça, a prática de falta grave não interrompe o prazo aquisitivo
e o reinício da contagem do lapso temporal para concessão de livramento
condicional. Recurso parcialmente provido com determinação.

ACÓRDÃO

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — ACÓRDÃOS


Vistos, relatados e discutidos estes autos do Agravo de Execução Penal 0026141-
37.2015.8.26.0000, da Comarca de Itapetininga, em que é agravante N.G., é agravado
Ministério Público do Estado de São Paulo.
Acordam, em 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São
Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram parcial provimento ao presente agravo
para cassar a decisão recorrida, com determinação de que os autos retornem ao juízo
de origem para reapreciação da pretensão ao livramento condicional, com o exame
do preenchimento do requisito subjetivo pelo agravante. V.U.”, de conformidade
com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores Encinas Manfré
(Presidente) e Ricardo Sale Júnior.
São Paulo, 13 de agosto de 2015.
Desembargador Willian Campos – Relator

VOTO Nº 34.201
Trata-se de Agravo em Execução interposto pelo sentenciado N.G. contra a
decisão de fl. 21, proferida pelo douto Juízo da Vara das Execuções Criminais da
Comarca de Itapetininga, que indeferiu seu pedido de livramento condicional porque
ausente o requisito objetivo e subjetivo.
578 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

O agravante discorda do decisum argumentando que preenchia����������������


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todas as condi-
ções legais para a concessão do benefício, pois cumpriu o requisito objetivo, já a que
a falta grave (cometimento de novo delito) não interrompe o prazo para obtenção
do livramento condicional. Além disso, possuía bom comportamento carcerário.
Assim, pleiteia a reforma da decisão de primeiro grau para que lhe seja deferida, de
imediato, a benesse negada pelo juízo a quo (fls. 23/29).
Apresentada a contraminuta (fls. 34/37) e mantida a decisão atacada (fl. 38),
a douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls.
43/48).
É o relatório.
O presente agravo merece acolhida, bem que em parte.
De fato, esta relatoria possuía entendimento no sentido de que a prática de
falta grave no curso do cumprimento da pena interrompia o prazo para obtenção de
livramento condicional, bem como de indulto e comutação de penas. Entretanto,
revê-se tal posição em face do entendimento já pacificado e sumulado pelo Supe-
rior Tribunal de Justiça, segundo o qual “a falta grave não interrompe o prazo para
obtenção de livramento condicional” (Súmula nº 441).
Assim, de acordo com o que conta do Boletim Informativo, N. preencheu o
requisito objetivo para o benefício pretendido.
Todavia, afastado esse óbice, resta ainda a aferição do requisito subjetivo, o
qual deverá ser apreciado pelo Juízo de origem sob pena de supressão de grau de
jurisdição.
Ante o exposto, dá-se parcial provimento ao presente�������������������������
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agravo para cassar a de-
cisão recorrida, com determinação de que os autos retornem ao Juízo de origem para
reapreciação da pretensão ao livramento condicional, com o exame do preenchimento
do requisito subjetivo pelo agravante.
Desembargador Willian Campos – Relator
EMENTÁRIO
• As íntegras destes acórdãos estão disponíveis na versão on-line (www.lex.com.br)
para os assinantes desta revista.

77/203 — AÇÃO PENAL. DIPLOMAÇÃO DO ACUSADO COMO DEPUTADO


FEDERAL SUBSEQUENTE AO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA NO PRIMEIRO
GRAU. IMPUTAÇÃO DO CRIME PREVISTO NO ART. 316 DO CÓDIGO PENAL.
INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DAS HIPÓTESES ARROLADAS NO ART. 397
DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. REGULAR PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO
PENAL. 1. A diplomação do acusado subsequente ao recebimento da denúncia
pelo juízo de primeira instância, quando ainda pendente a apreciação de resposta
à acusação, conduz à análise, pelo Supremo Tribunal Federal, da possibilidade de
incidência do art. 397 do Código de Processo Penal. Precedentes. 2. Não se verifi-
cando, de plano, a presença de quaisquer das hipóteses do art. 397 do Código de

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL — EMENTÁRIO


Processo Penal, deve a ação penal ter regular prosseguimento. 3. Pedidos de rejeição
da denúncia e de absolvição sumária do acusado indeferidos. (STF; AP-QO 911; DF;
2ª T.; Rel. Min. Teori Zavascki; DJE 13/10/2015; p. 59)
77/204 — AÇÃO PENAL. PREFEITO MUNICIPAL. CRIME CONTRA AS
FINANÇAS PÚBLICAS. ASSUNÇÃO DE OBRIGAÇÃO NO ÚLTIMO ANO DO
MANDATO. ART. 359-C DO CP. COMPLEMENTAÇÃO DA RESPOSTA ESCRITA
FORA DO PRAZO LEGAL. INVIABILIDADE. DENÚNCIA RECEBIDA. A resposta
extemporânea não pode ser levada em conta na decisão de recebimento da denúncia.
Assim, determina-se o desentranhamento da respectiva peça e dos documentos que
a instruem. Precedentes. Embora a alegação do denunciado de que o fato é atípico,
existe lastro probatório suficiente a indicar que ele assumiu novas obrigações nos
oito meses antes do término do mandato e não as saldou no período, por falta de
disponibilidade orçamentária, inscrevendo-as em restos a pagar. As alegações para
justificar os fatos são inaptas a afastar, de plano, a acusação. Denúncia recebida.
(TJRS; APen-PSum 0055753-10.2015.8.21.7000; 4ª C.Crim.; Rel. Des. Rogério Gesta
Leal; DJERS 03/09/2015)
77/205 — AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE
PREFEITO. NÃO APRESENTAÇÃO DE CONTAS MUNICIPAIS (ART. 1º, VII, DO
DECRETO LEI Nº 201/67). PEDIDO MINISTERIAL DE DILIGÊNCIAS. DENÚN-
CIA RECEBIDA. DILIGÊNCIAS INDEFERIDAS. DECISÃO UNÂNIME. 1. O atual
momento processual cinge-se a um juízo prévio de mera admissibilidade da acusação
com verificação apenas da congregação dos requisitos formais que lhe são inerentes,
cabendo, conforme dispõe o art. 6º da Lei nº 8.038/90, que o relator delibere sobre
o recebimento, a rejeição da denúncia ou da queixa, ou a improcedência da acusa-
ção, se a decisão não depender de outras provas. 2. Na espécie, ao que se conclui,
a materialidade e os indícios de autoria encontram substrato na prova indiciária e
no contexto da inicial acusatória, lastro mínimo a demonstrar a verossimilhança
da acusação e a viabilidade da pretensão deduzida. Inviável o acolhimento das
teses defensivas, haja vista não serem capazes de afastar, de pronto, as imputações
580 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

descritas na inicial acusatória, motivo pelo qual seu recebimento é medida que se
impõe. 3. O Ministério Público, como titular da ação penal pública, pode proceder
investigações e efetuar diligências com o fim de colher elementos de prova para o
desencadeamento da pretensão punitiva estatal. Inteligência dos arts. 129, VI e VIII,
da Constituição Federal, 8º da Lei Complementar nº 75/93 e 26 da Lei nº 8.625/93.
De consequência, o requerimento de diligências junto ao Poder Judiciário vai à
contramão da legitimidade conferida ao Parquet de realização por meios próprios.
Precedentes. 4. Denúncia recebida, com rejeição do pedido de diligências formulado
pelo Ministério Público. (TJPI; APN 2014.0001.007240-0; 1ª C.Esp.Crim.; Rel. Des.
Pedro de Alcântara da Silva Macêdo; DJPI 02/09/2015; p. 18)
77/206 — AGRAVO DA EXECUÇÃO (ART. 197 DA LEP). PRISÃO DOMI-
CILIAR SUBSTITUTIVA DO REGIME ABERTO, MEDIANTE CONDIÇÕES (SEM
MONITORAMENTO ELETRÔNICO). POSSIBILIDADE. INSURGÊNCIA MINISTE-
RIAL. As hipóteses do art. 117 da LEP não são exaustivas, devendo verificar-se, caso a
caso, o excepcional cabimento da prisão domiciliar substitutiva, mediante condições,
como forma alternativa de recolhimento de apenado que, sob regime aberto, deveria
estar cumprindo a sua pena carcerária em albergue. No caso, diante da inexistência
de casa de albergado e da situação peculiar retratada nos autos, é de ser mantida a
prisão domiciliar substitutiva concedida ao apenado sob condições, a fim de evitar
que ele cumpra a sua pena carcerária sob condições iguais ou semelhantes àqueles
que devem implementá-la sob regime mais gravoso. Paradigmas consolidados do
Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte de Justiça.
Agravo improvido. (TJRS; AG 0281405-45.2015.8.21.7000; 6ª C.Crim.; Rel. Des.
Aymoré Roque Pottes de Mello; DJERS 04/09/2015)
77/207 — APELAÇÃO. RECUSA DE OBEDIÊNCIA. MILITAR PREVIAMEN-
TE DESIGNADO EM ESCALA DE SERVIÇO. ORDEM EMANADA DE SUPERIOR
HIERÁRQUICO. NEGATIVA DE REALIZAR AS FUNÇÕES DE SARGENTO DE
DIA. ASSUNTO AFETADO AO SERVIÇO DA CASERNA. INFRAÇÃO AO PRE-
CEITO INCRIMINADOR DO ART. 163 DO CPM. SENTENÇA CONDENATÓRIA
MANTIDA. Infringe a norma penal militar prevista no art. 163 do CPM, sob a
rubrica de “recusa de obediência”, o militar escalado como sargento de dia, que,
após receber ordem do oficial de dia para assumir o posto e cumprir suas funções,
manifesta pronta negativa, ao argumento insubsistente de que se encontrava na
situação de “agregado”. O descumprimento de ordem relativa à matéria de serviço,
emanada de superior hierárquico, quando lhe era exigível conduta diversa, impõe
a responsabilização criminal do infrator. Apelo defensivo desprovido por decisão
unânime. (STM; APL 213-77.2014.7.01.0201; RJ; Rel. Min. Francisco Joseli Parente
Camelo; DJSTM 21/10/2015)
77/208 — APELAÇÃO DEFENSIVA. ABANDONO DE POSTO. AUTORIA
E MATERIALIDADE COMPROVADAS. CRIME DE MERA CONDUTA. MANU-
TENÇÃO DA SENTENÇA. CRIME DE FURTO DE USO DE ARMAMENTO. AB-
SOLVIÇÃO. CRIME DE FURTO DE USO DE AMBULÂNCIA. CONDENAÇÃO.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE DURANTE O PERÍODO DE PROVA
DO SURSIS. IMPOSSIBILIDADE. Irretocável a Sentença recorrida quanto à con-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 581

denação no delito de abandono de posto, visto que o apelante se ausentou, sem


autorização, de seu posto. O crime tipificado no art. 195 do CPM, por ser de mera
conduta e de perigo presumido, consuma-se instantaneamente com a saída do agente.
É indispensável que o sujeito ativo tenha subtraído a coisa daquele que lhe tinha a
posse ou a propriedade, retirando-a, sub-repticiamente de sua esfera de vigilância
e disponibilidade. No caso sub exemine, o apelante requisitou o fuzil ao militar sob
seu comando. Pena fixada no patamar máximo, tendo em vista o risco a que a tropa
e a população foram submetidas, em razão da subtração da única ambulância desti-
nada para o atendimento médico naquela Operação de Garantia da Lei e da Ordem
(Op GLO). Durante o período de prova do sursis estabelecido pelo Código Penal
Militar, não é imposto ao sentenciado qualquer outro ônus, a não ser aos tendentes,
a impedir a reiteração criminosa, haja vista a necessidade de uma proporção entre os
delitos e as penas aplicadas. Apelo provido, em parte. Decisão unânime. (STM; APL
114-98.2014.7.01.0301; RJ; Rel. Min. Alvaro Luiz Pinto; DJSTM 28/10/2015)
77/209 — APELAÇÕES CRIMINAIS. ART. 273, §§ 1º E 2º, DO CÓDIGO
PENAL. APLICAÇÃO A TERCEIROS, POR PROFISSIONAIS DA MEDICINA, DA
TOXINA FINE TOX. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO PELA ANVISA. PRODUTO
DE ORIGEM ESTRANGEIRA. ART. 109, IV, DA CF. SÚMULA Nº 122 DO STJ.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ALEGAÇÃO DE OBRIGATORIEDADE
DE REUNIÃO DE PROCESSOS AFASTADA. CPP, ART. 80. NÃO DEMONSTRAÇÃO
DE QUE TAL PRODUTO TEM, EM TESE, APTIDÃO PARA PROVOCAR PREJUÍZO
À SAÚDE HUMANA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE. PROVIMENTO DA APELA-

EMENTÁRIO
ÇÃO DO ACUSADO E IMPROVIMENTO DO APELO DA ACUSAÇÃO. I – Sendo
a substância objeto da ação delitiva originária de outro país, tem-se configurada
a sua internacionalização, pelo que é de se firmar a competência da Justiça Fede-
ral. Precedentes. II – Desde que submetidos ao mesmo juízo, pode o magistrado

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


utilizar-se da faculdade de não reunir processos conexos, por força do que dispõe o
art. 80 do CPP. III – É de se afastar a alegação de erro de tipo, pois, a despeito de a
toxina fine tox ter sido assiduamente aplicada, o que em parte decorria da situação
de credibilidade usufruída pelo representante comercial que a revendia, compete
ao profissional de medicina o conhecimento mínimo sobre o medicamento que
aplica ou prescreve, a revelar negligência no caso concreto. IV – O direito penal,
na atualidade, não pode se dissociar dos valores que informam o Estado Consti-
tucional, surgido e expandido depois da segunda metade do século XX, ao qual
rende vassalagem o Estado Democrático de Direito instituído pela Constituição de
1988. Desse modo, o legislador penal não pode desprezar, na produção de normas
jurídicas, os postulados constitucionais, não sendo necessária, para as incrimina-
ções, a só presença de um bem jurídico, mas, igualmente, que a conduta reprovável
cause uma efetiva lesão ou dano sobre aquele. V – Mesmo em se tratando de crime
de perigo abstrato o delito tipificado no art. 273, §§ 1º e 2º, do estatuto punitivo,
a sua configuração não se manifesta pela só ausência de registro do medicamento
na Anvisa, havendo, igualmente, a necessidade da demonstração de uma probabi-
lidade de lesão, por mínima que seja, isto é, que o produto em causa seja idôneo,
em tese, para ofender o bem jurídico tutelado pelo ordenamento, consistente na
582 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

saúde humana. VI – No caso concreto, o laudo pericial, elaborado por integrantes


do Laboratório de Imunopatologia Keizo Azami (LIKA) da Universidade Federal de
Pernambuco, e representativo de uma análise global do material apreendido, não
informou, nem de passagem, que o emprego da toxina fine tox é capaz, ao menos
em tese, de causar ofensa à saúde humana. VII – A inexistência de prova de que a
malsinada toxina é hábil para causar ofensa à saúde humana afasta a tipicidade da
conduta narrada na denúncia, harmonizando a aplicação do art. 273, §§ 1º e 2º,
do Código Penal aos valores consagrados pelo Estado de Direito Democrático (art.
1º, caput, CF de 1988). VIII – Ao contrário do sustentado pelo Ministério Público,
não se afigura possível a incidência do art. 7º, IX, da Lei nº 8.137/90, seja em razão
da hipótese, por se tratar de medicamento, envolver conflito aparente de normas,
apenas podendo, conforme o caso, retratar eventual ofensa ao art. 273 do CP, seja
por conta do laudo pericial não ser conclusivo quanto à impropriedade do produto
ao consumo. IX – Apelação do acusado provida, para o fim de ser exarado édito
absolutório. Recurso do Ministério Público Federal a que se nega provimento. (TRF
5ª R.; ACR 0010146-02.2013.4.05.8300; PE; 4ª T.; Rel. Des. Fed. Edilson Pereira Nobre
Júnior; DEJF 23/10/2015; p. 193)
77/210 — ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CONDENAÇÃO. Mantida a
condenação diante da palavra da vítima e do reconhecimento fotográfico realizado
na fase policial, confirmado em juízo, e dos depoimentos dos parentes dela que se
encontravam na casa e ouviram os gritos da ofendida, ocasião em que correram e
viram o acusado saindo do quarto e fugindo. Tentativa. Reconhecida a forma ten-
tada do delito de atentado violento ao pudor, reduzindo-se a pena em 1/3. Pena.
Dosimetria. Pena-base. Reduzida a pena-base para o mínimo legal. Reincidência.
Inocorrente a reincidência, posto que não caracterizada, afastando-se o aumento
pertinente à agravante. Regime carcerário. O regime carcerário é o aberto, eis que
na data do crime denunciado o réu ainda não possuía condenação transitada em
julgado, apenas processos em andamento. Recurso defensivo parcialmente provi-
do. (TJRS; ACr 0524698-52.2013.8.21.7000; 5ª C.Crim.; Relª Desª Genacéia da Silva
Alberton; DJERS 04/09/2015)
77/211 — ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO HOMICÍDIO. Pedido de
desclassificação para reconhecimento do ato infracional análogo ao homicídio na
modalidade culposa. Impossibilidade. Adolescente que confessou apontar arma
de fogo para a vítima assumindo o risco de matar. Materialidade e autoria do ato
infracional devidamente comprovadas nos autos. Ato infracional análogo ao crime
de homicídio qualificado por motivo fútil. Medida socioeducativa de internação
que se mostra adequada à situação descrita nos autos. Manutenção da sentença que
se impõe. Apelo conhecido e desprovido. (TJRN; AC 2015.001977-5; 1ª C.Cív.; Rel.
Des. Expedito Ferreira de Souza; DJRN 04/09/2015)
77/212 — BUSCA E APREENSÃO. VIA ADEQUADA. RADIODIFUSÃO.
RÁDIO COMUNITÁRIA. FUNCIONAMENTO SEM AUTORIZAÇÃO. ORDEM
JUDICIAL PARA APREENSÃO DE EQUIPAMENTOS. POSSIBILIDADE. INO-
CORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO INCISO XI DO ART. 5º DA CF/88. IMÓVEL
COMERCIAL QUE NÃO SE ENQUADRA NA DEFINIÇÃO DE CASA DO ART.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 583

150 DO CP. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA ANULADA. 1. Nos termos do


art. 21, XII, a, da CF/88, compete à União explorar, diretamente ou mediante au-
torização, concessão ou permissão, os serviços de radiodifusão sonora, e de sons
e de imagens, o que abrange, também, o serviço de rádio comunitária, criado pela
Lei nº 9.612/98 e regulamentado pelo Decreto nº 2.615/98. 2. Consoante já decidiu
esta Quinta Turma sob a relatoria do Desembargador Federal Néviton Guedes, “O
Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação 5.310/MT, pronunciou-
se no sentido de que, sendo realizados os atos de apreensão dos equipamentos de
rádio clandestina na vigência da Lei nº 10.871/04, com redação dada pela Lei nº
11.292/06, não se sustenta a alegação de descumprimento da Medida Cautelar na
Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.668-MC/DF, que suspendeu a eficácia do
inciso XV do art. 19 da Lei nº 9.472/97 (Rcl 5.310/MT, Pleno, Relª Minª Cármen
Lúcia, DJe-088 Divulg 15.05.08, Public 16.05.08). 4. Na situação da causa, tendo
o ato de apreensão dos equipamentos da impetrante ocorrido em maio/2008, já na
vigência, portanto, da Lei nº 10.871/04, não há que se falar em ilegalidade do ato
impugnado” (AMS 0005821-67.2008.4.01.4000/PI, e- DJF1 30.07.2015, p. 1.056).
3. Conquanto o entendimento seja pela desnecessidade de um procedimento judi-
cial de busca e apreensão, a apelante optou por esse meio certamente por entender
tratar-se de residência. Todavia, mesmo assim, teve petição inicial indeferida, por
encontrar óbice no art. 5º, XI, da CF/88; tratar-se de medida de caráter satisfativo;
e não estar amparada por ação penal ou inquérito policial. 4. Nos termos do art. 5º,
XI, da CF/88, a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar
sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou

EMENTÁRIO
para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. 5. Se no imóvel
alvo da medida, apesar das características de residenciais, funcionar emissora de
rádio clandestina (Rádio Cristo Vive FM 106.7 MHz), não se pode considerá-lo
abrangido pela proteção constitucional. 6. Para não incorrer em risco de supressão

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


de instância, o pedido liminar formulado na peça recursal deverá ser apreciado pelo
Juízo de Primeira Instância. 7. Apelação provida, sentença anulada, com devolução
dos autos para regular processamento. (TRF 1ª R.; AC 0005944-75.2015.4.01.3400;
DF; 5ª T.; Rel. Juiz Fed. Conv. Evaldo de Oliveira Fernandes Filho; DJF1 27/10/2015)
77/213 — CALÚNIA, DIFAMAÇÃO E INJÚRIA. DECLARAÇÕES PROFERI-
DAS EM AMBIENTE ELEITORAL E PARA FINS DE PROPAGANDA ELEITORAL.
EMENDATIO LIBELLI. DESCLASSIFICAÇAO. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM
NÃO RECONHECIDA. MÉRITO FAVORÁVEL AO ACUSADO. INCIDÊNCIA DO
PRINCÍPIO DO FAVOR REI. FIGURAS PÚBLICAS. DECLARAÇÕES TEMATICA-
MENTE PERTINENTES À DIALÉTICA ELEITORAL. ATIPICIDADE DE CONDUTA.
REJEIÇÃO DA QUEIXA-CRIME. 1. Os crimes contra a honra previstos nos arts. 324,
325 e 326 do Código Eleitoral se perfectibilizam quando as declarações ofensivas
ocorrem no contexto de propaganda eleitoral ou para tal efeito e, preenchidas essas
elementares objetivas do tipo, preferem aos crimes previstos respectivamente nos arts.
138, 139 e 140 do Código Penal, em razão do princípio da especialidade. Emendatio
libelli que se realiza na forma do art. 383 do CPP. 2. Natureza pública incondicionada
da persecução criminal nos delitos contra a honra previstos na legislação eleitoral.
584 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Ilegitimidade ativa ad causam que não se declara no caso concreto, em atenção ao


princípio do favor rei, presente a possibilidade de julgamento do mérito favoravel-
mente ao acusado. 3. A jurisprudência deste STF admite critérios particulares para
aferir a ofensa à honra baseados na maior ou menor exposição pública da pessoa
ofendida: “(...) Ao dedicar-se à militância política, o homem público aceita a inevitável
ampliação do que a doutrina italiana costuma chamar de a zona di iluminabilit, resig-
nando-se a uma maior exposição de sua vida e de sua personalidade aos comentários
e à valoração do público, em particular, dos seus adversários” (HC 78.426-6/SP, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 07.05.99). 4. Declarações no caso concreto
compatíveis com a dialética do jogo político, limitadas ao campo das ideias, sem
adjetivações nem desqualificação moral do interlocutor, e pertinentes ao ambiente
eleitoral em que proferidas, a revelar atipicidade de conduta quanto aos crimes de
calúnia, difamação e injúria. 5. Queixa-crime rejeitada com fundamento no art. 395,
III, do CPP. (STF; Inq 3.546; BA; 1ª T.; Relª Minª Rosa Weber; DJE 01/10/2015; p. 42)
77/214 — COMUTAÇÃO. DECRETO PRESIDENCIAL Nº 7.873/2012. IMPOS-
SIBILIDADE. Falta grave consistente em fuga cometida após pedido de benefício.
Efeitos do reconhecimento de falta grave, que torna ilógica a concessão de indulto,
ainda que parcial, ao sentenciado. Decisão mantida. Recurso desprovido. (TJSP;
AG-ExPen 7006565-17.2015.8.26.0071; Ac. 8766650; 3ª C.D.Crim.; Rel. Des. Cesar
Mecchi Morales; DJESP 08/09/2015)
77/215 — COMUTAÇÃO. DECRETO PRESIDENCIAL Nº 8.380/2014. POS-
SIBILIDADE. BASE DE CÁLCULO. Comutação concedida com base em período
de pena remanescente. A base de cálculo deve ser o período de pena já cumprido,
uma vez que tal intervalo é superior ao período remanescente de desconto da
reprimenda. Observância do art. 2º, § 1º, do Decreto. Recurso provido. (TJSP; AG-
ExPen 7009446-92.2015.8.26.0482; Ac. 8766501; 3ª C.D.Crim.; Rel. Des. Cesar Mecchi
Morales; DJESP 08/09/2015)
77/216 — CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME AMBIENTAL. DEFENSI-
VOS AGRÍCOLAS. OCORRIDO EM ASSENTAMENTO. ÁREA DE RESPONSABILI-
DADE DO INCRA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DIRETO. VÍTIMAS PARTICULARES.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. 1. A competência da Justiça Federal para
julgamento de infrações penais, nos termos do art. 109, IV, da Constituição Federal,
está configurada quando a conduta criminosa afeta bens, serviços ou interesses da
União, de suas entidades autárquicas ou empresas públicas. 2. Na hipótese dos
autos, embora a pulverização do agrotóxico tenha ocorrido em escola localizada
em área de assentamento de responsabilidade do INCRA, autarquia federal, não
há diretamente qualquer interesse, direito ou bem da União, de suas autarquias ou
empresas públicas envolvidos, sendo, se existente, meramente reflexo o interesse
do INCRA. 3. Declarada a competência do juízo suscitado. (STJ; CC 139.810; Proc.
2015/0091160-1; GO; 3ª S.; Rel. Min. Nefi Cordeiro; DJE 08/09/2015)
77/217 — CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. IMPUTAÇÃO OFEN-
SIVA À REPUTAÇÃO DA VÍTIMA. PROPAGAÇÃO EM REDE NACIONAL. CRIME
CONTINUADO. DIVULGAÇÃO EM TERRITÓRIO DE DIVERSAS JURISDIÇÕES.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 585

FIXAÇÃO PELA PREVENÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. 1.


Tratando-se o caso de crime continuado, com execução e repercussão em diversas
jurisdições, sem que haja conhecimento do lugar da consumação do crime praticado
contra a honra, a competência para processamento e julgamento do processo firmar-
se-á pela prevenção, consoante disposição contida no art. 71 do CPP. 2. Conflito de
competência procedente para declarar a competência do juízo suscitado. (TJAP; Proc
0000803-03.2015.8.03.0000; T.P.; Rel. Des. Raimundo Vales; DJEAP 08/09/2015; p. 9)
77/218 — CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO ESPECIA-
LIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA MULHER E JUÍZO CRIMINAL
COMUM. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 11.340/06 (LEI MARIA DA PENHA) NÃO
CONFIGURADA. VIOLÊNCIA BASEADA NO GÊNERO. RELAÇÃO DE SUPE-
RIORIDADE DO AGRESSOR E INFERIORIDADE DA VÍTIMA. INOCORRÊNCIA.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE. CONFLITO JULGADO IMPROCEDEN-
TE. 1. Violência baseada no gênero ocorrida no âmbito doméstico ou familiar (art.
5º da Lei nº 11.340/06) é aquela em que há motivação de gênero e há uma situação
de inferioridade ou vulnerabilidade da ofendida em relação ao agressor. 2. No caso
concreto, os fatos, em tese, ocorreram em virtude da condição de idosa da vítima,
e não de sua condição de gênero (feminino), inobstante a prática da conduta no
âmbito familiar. 3. Não havendo qualquer indicação de que a causa para o delito
supostamente praticado advenha do gênero, bem como não configurada a relação
de hipossuficiência entre os autores e a vítima, a aplicação da Lei nº 11.340/06 deve
ser afastada. 4. Competência da 4ª Vara Criminal da Capital (juízo suscitante), para

EMENTÁRIO
processamento e julgamento do feito. 5. Conflito negativo de competência julgado
improcedente. (TJAM; CC 0600005-70.2015.8.04.0030; C.Reun.; Rel. Des. Yêdo Simões
de Oliveira; DJAM 02/09/2015; p. 23)
77/219 — CONTRABANDO DE CIGARROS E QUADRILHA. DENÚNCIA.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


CORRUPÇÃO ATIVA. INVESTIGAÇÃO. PRISÃO PREVENTIVA. SUPERVENIENTE
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. FUMUS BONI IURIS. CONFIGURAÇÃO. PERI-
CULUM IN LIBERTATIS. NÃO CONSTATAÇÃO. CAUTELAS ALTERNATIVAS À
PRISÃO. MEDIDAS SUFICIENTES. PRISÃO REVOGADA. IMPOSIÇÃO DE FIANÇA
E LAVRATURA DE TERMO DE COMPROMISSO. ORDEM CONCEDIDA. I – A
investigação de origem conta com elementos de prova colhidos em interceptação
telefônica deferida judicialmente, autos de prisão em flagrante, diligências de busca
e apreensão e de condução coercitiva de alguns investigados. Indícios suficientes de
autoria em desfavor do paciente, ora corroborados pelo recebimento da denúncia. II
– Apurado nas investigações que o paciente atua na revenda dos cigarros contraban-
deados e também como “representante comercial” de coinvestigada, principalmente
no sul fluminense. Fumus boni iuris configurado. III – Apesar de as investigações
não terem sido conclusivas, ainda, no que toca ao possível cometimento de crime
de corrupção, há menção a possível “acerto” de coinvestigado com policiais civis e
militares de Volta Redonda, inclusive no sentido de ameaçar outros comerciantes de
cigarros acerca de eventual ação policial contra os “rivais” a comando dele, baseada
no citado “ajuste”. No rol de investigados figura um policial militar, que chegou a
ser preso flagrante. IV – Nem mesmo as prisões em flagrante de outros integrantes
586 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

do esquema abalaram a continuidade das atividades delituosas investigadas. V –


Periculum in libertatis não configurado, com base em dados concretos, em desfavor
do paciente. A necessidade da custódia para evitar a reiteração delitiva e diante da
gravidade em concreto dos fatos sob investigação não se aplica ao paciente. Também
não restam, por ora, configuradas as circunstâncias da conveniência da instrução
criminal, nem da asseguração da aplicação da lei penal. VI – Revogação da prisão
preventiva, com imposição de contracautelas para assegurar o juízo natural da causa.
Implementação e fiscalização das cautelas, além de expedição de alvará de soltura, a
cargo do Juízo de Primeiro Grau. VII – Ordem concedida. (TRF 2ª R.; HC 0010284-
50.2015.4.02.0000; RJ; 1ª T.Esp.; Rel. Des. Fed. Abel Gomes; DEJF 28/10/2015; p. 275)
77/220 — CRIME AMBIENTAL. DENÚNCIA. ART. 41 DA LEI Nº 9.605/98.
ELEMENTAR DO TIPO. MATA OU FLORESTA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA
E INÉPCIA DA EXORDIAL ACUSATÓRIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL
EM SEDE DE HABEAS CORPUS. POSSIBILIDADE. 1. Esta Corte de Justiça admite
o trancamento de ação penal na via do habeas corpus quando demonstradas, de
plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade, a ausência de provas
da existência do crime e de indícios de autoria ou dos requisitos processuais inscul-
pidos no art. 41 do Código de Processo Penal. 2. No caso, pela simples leitura da
denúncia, observa-se que o órgão acusatório limitou-se a descrever o fato inserido
no auto de infração – queimada de 22 ha (vinte e dois hectares) em área agropas-
toril – e atribuí-lo à responsabilidade do proprietário do imóvel rural, deixando de
mencionar a vegetação atingida pela suposta ação do acusado, bem como os efeitos
acarretados pela queimada provocada no local. 3. Sabe-se que, para a configuração
do crime previsto no art. 41 da Lei nº 9.605/98, é necessário que a área queimada
corresponda aos conceitos de “mata” e “floresta”, tratando-se, pois, de uma norma
penal em branco que exige complementação para fins de penalização da conduta
ali descrita, a qual também não foi mencionada pelo Parquet. 4. Hipótese em que
a exordial não atende aos requisitos do art. 41 do CPP, porquanto não descreve de
forma suficiente a conduta ilícita imputada ao recorrido, com todas as suas circuns-
tâncias, impossibilitando o exercício da ampla defesa. 5. Agravo regimental a que se
nega provimento. (STJ; AgRg-REsp 1.359.176; Proc. 2012/0205205-5; MT; 5ª T.; Rel.
Min. Gurgel de Faria; DJE 08/09/2015)
77/221 — CRIME AMBIENTAL. PACIENTE QUE NÃO ADOTOU MEDIDAS
PARA CRIAÇÃO DE ATERRO SANITÁRIO QUANDO PREFEITA DO MUNICÍPIO.
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ATIPICIDADE DA CONDUTA E ILEGITI-
MIDADE PASSIVA. INOCORRÊNCIA. 1. Segundo o entendimento desta Corte de
Justiça, o trancamento da ação penal, no âmbito do habeas corpus, somente é possível
quando se constatar, primo ictu oculi, a atipicidade da conduta, a inexistência de
indícios de autoria, a extinção da punibilidade ou quando for manifesta a inépcia
da exordial acusatória. 2. A peça acusatória narra que a paciente, então prefeita do
Município de Itabaiana/SE, deixou de adotar medidas para adequar a destinação
de resíduos sólidos da cidade às normas de proteção ao meio ambiente e de saúde
pública, pois, apesar de devidamente intimada em 26.04.05 da decisão proferida
em ação civil pública que determinava a apresentação, no prazo de três meses, de
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 587

projeto de aterro sanitário, não cumpriu a determinação até a data do oferecimento


da denúncia. 3. A tese de que a acusada tomou todas as medidas possíveis para evitar
o dano ambiental é matéria de prova, cabendo a sua apreciação quando da análise
do mérito da referida ação penal, pois constitui tema referente à convicção quanto
à procedência ou não da própria ação penal. 4. A conduta descrita na inaugural
acusatória e os documentos que a acompanham demonstram, em tese, a prática do
tipo penal previsto na Lei de Crimes Ambientais, haja vista que existia determina-
ção judicial para adoção de medidas para criação de aterro sanitário, da qual teve
ciência a paciente quando responsável pela administração do Município, sem que
tenha adotado as medidas adequadas. 5. A denúncia responsabiliza a acusada por ato
omissivo ocorrido durante o seu mandato como chefe do Poder Executivo municipal,
ou seja, quando era de sua responsabilidade zelar pela proteção do meio ambiente
e da saúde pública no município. Logo, possui legitimidade de figurar como ré da
ação penal. 6. Ordem denegada. (STJ; HC 179.831; Proc. 2010/0132140-6; SE; 5ª T.;
Rel. Min. Gurgel de Faria; DJE 08/09/2015)
77/222 — CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PRESCRIÇÃO. 1. O
termo inicial da prescrição da ação dos crimes materiais previstos no art. 1º da Lei
nº 8.137/90 é a data da consumação do delito, que, conforme a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal, corresponde à data da constituição definitiva do crédito
tributário. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF; RHC-
AgR 122.339; SP; 1ª T.; Rel. Min. Roberto Barroso; DJE 01/09/2015; p. 47)
77/223 — CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. CON-

EMENTÁRIO
CEITO NORMATIVO DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, PARA FINS PENAIS,
DEFINIDO PELA PRÓPRIA LEI Nº 7.492/86 (ART. 1º E PARÁGRAFO ÚNICO),
QUE ABRANGE, ATÉ MESMO, PARA ESSE EFEITO, PESSOAS NATURAIS OU
ENTIDADES QUE OPEREM SEM AUTORIZAÇÃO DO BANCO CENTRAL DO

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


BRASIL. PRETENDIDO RECONHECIMENTO DA ATIPICIDADE PENAL DO DE-
LITO DE GESTÃO FRAUDULENTA, QUE, ALEGADAMENTE, SÓ PODERIA SER
PRATICADO POR INSTITUIÇÃO FINANCEIRA REGULARMENTE CONSTITUÍDA
E AUTORIZADA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL. FUNDAMENTO INAD-
MISSÍVEL. AUTONOMIA JURÍDICA DOS CRIMES DE GESTÃO FRAUDULENTA
DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA (LEI Nº 7.492/86, ART. 4º) E DE OPERAÇÃO
DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA NÃO AUTORIZADA (LEI Nº 7.492/86, ART. 16).
CONSEQUENTE POSSIBILIDADE DA PRÁTICA DE AMBOS OS DELITOS, QUE
PODEM SER COMETIDOS EM CONCURSO. TIPICIDADE PENAL DO CRIME DE
EVASÃO DE DIVISAS (LEI Nº 7.492/86, ART. 22). POSTULAÇÃO RECURSAL QUE
IMPLICA EXAME APROFUNDADO DE FATOS E CONFRONTO ANALÍTICO DE
MATÉRIA PROBATÓRIA. INVIABILIDADE NA VIA SUMARÍSSIMA DO PROCESSO
DE HABEAS CORPUS. RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. AMPLO CONCEITO
NORMATIVO DE “INSTITUIÇÃO FINANCEIRA” PARA EFEITOS PENAIS. INTER-
PRETAÇÃO AUTÊNTICA CONFERIDA PELO PRÓPRIO LEGISLADOR (LEI Nº
7.492/86, ART. 1º E PARÁGRAFO ÚNICO). A norma inscrita no art. 1º e respectivo
parágrafo único da Lei nº 7.492/86 traduz verdadeira interpretação autêntica dada
pelo próprio legislador quando edita diplomas legislativos de caráter geral, inclusive
588 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

aqueles de conteúdo eminentemente penal. Essa cláusula normativa, em realidade,


objetiva explicitar, mediante autêntica interpretação emanada do próprio legislador,
o âmbito de incidência material da Lei nº 7.492/86, vinculando a compreensão e
a incidência dos tipos penais nela definidos ao sentido claramente abrangente da
expressão “instituição financeira”, inclusive para efeito de adequação de condutas
aos elementos que compõem as estruturas típicas constantes do art. 4º e do art. 16
de referido diploma legislativo. Consequente legitimidade do enquadramento, na
figura típica do art. 4º da Lei nº 7.492/86 (crime de gestão fraudulenta), da conduta
de pessoas físicas ou de pessoas jurídicas que operem sem autorização do Banco
Central do Brasil (hipótese em que também haverá concurso formal com o delito
tipificado no art. 16 de referido diploma legislativo), em razão da equiparação legal
de tais pessoas, para fins penais, à instituição financeira (Lei nº 7.492/86, art. 1º,
parágrafo único). AUTONOMIA JURÍDICA DOS CRIMES DE GESTÃO FRAUDU-
LENTA E DE OPERAÇÃO DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA NÃO AUTORIZADA:
CONDUTAS PUNÍVEIS QUE, POR NÃO SE REVELAREM INCOMPATÍVEIS ENTRE
SI, PODEM SER COMETIDAS EM CONCURSO. Revestem-se de caráter autônomo
as condutas tipificadas nos arts. 4º e 16, ambos da Lei nº 7.492/86, que define os
crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, de tal modo que o comportamento
do agente que comete o delito de gestão fraudulenta de instituição financeira (art.
4º) mostra-se também compatível com a prática do crime de operação de instituição
financeira não autorizada (art. 16). É que o delito de gestão fraudulenta tanto pode
ser cometido em instituição financeira autorizada quanto em instituição financeira
não autorizada pelo Branco Central do Brasil (Bacen), sob pena de atribuir-se inad-
missível tratamento privilegiado àquele – não importando se pessoa física ou jurídica
– que atua, ilegalmente, sem a necessária e prévia autorização do Bacen, nos diversos
segmentos abrangidos pelo Sistema Financeiro Nacional: (a) mercado monetário,
(b) mercado de crédito, (c) mercado de câmbio e (d) mercado de capitais. Doutrina.
(STF; RHC-AgR 117.270; DF; 2ª T.; Rel. Min. Celso de Mello; DJE 20/10/2015; p. 50)
77/224 — DENÚNCIA. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA EM PRESTA-
ÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREJUDICIAL. PRESCRIÇÃO PELA PENA
EM ABSTRATO. INOCORRÊNCIA. NATUREZA PÚBLICA, E NÃO PRIVADA, DO
DOCUMENTO. PRECEDENTES. MÉRITO. CRIME DE CAPTAÇÃO ILÍCITA DE
SUFRÁGIO. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO FORMULADO PELO PROCURADOR-
GERAL DA REPÚBLICA. ACOLHIMENTO. DELITO DE FALSIDADE IDEOLÓ-
GICA. AUSENTE DEMONSTRAÇÃO MÍNIMA DO ELEMENTO SUBJETIVO
ESPECIAL DO TIPO DO ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. IRRELEVÂNCIA DOS
EQUÍVOCOS NO CONJUNTO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS, QUE NÃO COM-
PROMETEM SEU RESULTADO. VIOLAÇÃO DA PROPORCIONALIDADE NA
CARACTERIZAÇÃO DAS INCORREÇÕES COMO FATO CRIMINOSO. AUSÊN-
CIA DE DOLO. NEGLIGÊNCIA NÃO PUNÍVEL. DENÚNCIA REJEITADA. 1. O
crime de falsidade ideológica, quando incidente sobre prestação de contas eleitoral,
é apenado com reclusão, de um a cinco anos, e multa, por se tratar de documento
de natureza pública. 2. Os erros formais ou materiais, assim considerados por força
da ausência de qualquer indício do especial fim de agir estabelecido no art. 299
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 589

do Código Penal, revelam-se penalmente irrelevantes, por ausência de punição da


conduta a título culposo. 3. É que, das incorreções narradas na denúncia, apenas
duas ficaram caracterizadas: uma omissão de um pequeno serviço prestado por um
cabo eleitoral (colocação de uma placa), cuja contraprestação foi o abastecimento do
veículo com cinco litros de combustível; e uma declaração de um serviço, também
por pessoa física, que não teria sido prestado, no valor total de quinhentos reais. 4.
In casu, os valores absolutos revelam-se ínfimos (menos de seiscentos reais ficaram
demonstrados), de importância absolutamente irrelevante, de modo que feriria o
princípio da proporcionalidade caracterizar estas pequenas e isoladas incorreções
como fato criminoso e imputá-las ao acusado a título doloso, conclusão esta que se
evidencia pelo fato de as pessoas físicas mencionadas na denúncia não possuírem
vínculo, direto ou indireto, com o acusado ou sua família, tampouco revelarem
qualquer tipo de interesse financeiro ou político na eleição do denunciado para o
cargo de deputado federal. 5. O fim especial de agir poderia ser presumido caso os
valores se revelassem relevantes, ou, v.g., se as pessoas cujos serviços foram omitidos
ou incorretamente declarados na prestação de contas possuíssem um envolvimento
qualquer com o candidato, ou interesses financeiros na sua eleição, que revelasse
a intenção do acusado de ocultar ou alterar a declaração, para os fins antijurídicos
estabelecidos no art. 299 do Código Penal. 6. A ausência de narrativa fática do fim
de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente
relevante, revela atipicidade da conduta, posto verificar-se mero erro, inépcia ou
descontrole isolado e pontual do acusado, sem repercussão penal. 7. Denúncia re-
jeitada. Arquivamento do inquérito quanto ao crime de captação ilícita de sufrágio,

EMENTÁRIO
a pedido do Procurador-Geral da República. (STF; Inq 3.128; MT; 1ª T.; Rel. Min.
Luiz Fux; DJE 15/10/2015; p. 52)
77/225 — EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. RE-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


CURSO SECUNDUM EVENTUM LITIS, PRIVATIVO DO RÉU. SUBSISTÊNCIA DO
ART. 333, I, DO RISTF. NECESSIDADE DE QUE HAJA, PELO MENOS, 4 (QUATRO)
“VOTOS DIVERGENTES” FAVORÁVEIS AO RÉU E, ASSIM MESMO, CONVER-
GENTES NO SENTIDO DE SUA ABSOLVIÇÃO. INOCORRÊNCIA, NA ESPÉCIE,
DE TAL SITUAÇÃO. DECISÃO QUE, CORRETAMENTE, NÃO CONHECE DOS
EMBARGOS INFRINGENTES. PRECEDENTES DO PLENÁRIO DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL (AP 470-TERCEIROS-EI-AGR/MG, REL. MIN. JOAQUIM
BARBOSA; AP 470-DÉCIMOS-EI-AGR/MG, REL. MIN. JOAQUIM BARBOSA; E AP
481-EI/PA, REL. MIN. DIAS TOFFOLI, V. G.). PARECER DA PROCURADORIA-
GERAL DA REPÚBLICA PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO
DE AGRAVO IMPROVIDO. Os embargos infringentes do julgado proferido pelo
Supremo Tribunal Federal em sede de processo penal originário ainda subsistem
em nosso ordenamento positivo, eis que a norma inscrita no art. 333, inciso I, do
RISTF foi recebida pela vigente Constituição da República com força e eficácia de
lei. Precedente: AP 470-AgR-Vigésimo Sexto/MG, Pleno, j. 18.09.2013. Essa mo-
dalidade recursal – de que somente a defesa pode utilizar-se contra condenações
penais originárias proferidas pelo Supremo Tribunal Federal – depende, quanto à
sua admissibilidade, da existência, em favor do réu, de pelo menos 4 (quatro) votos
590 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

vencidos de conteúdo absolutório em sentido próprio, não se revelando possível,


porém, para efeito de compor esse número mínimo, a soma de votos minoritários
de conteúdo diverso, como, p. ex., a soma de 3 (três) votos absolutórios com 2
(dois) votos meramente declaratórios de prescrição penal. Precedentes do Plenário
do Supremo Tribunal Federal. Distinção necessária, para os fins do parágrafo único
do art. 333 do RISTF, entre votos minoritários de conteúdo absolutório em sentido
próprio e aqueles que meramente declaram consumada a prescrição penal. Doutri-
na. Jurisprudência. (STF; AP-EI-AgR-Seg 409; CE; T.P.; Rel. Min. Teori Zavascki; DJE
01/09/2015; p. 41)
77/226 — EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO DE DROGAS MINORA-
DO. ABRANDAMENTO DO REGIME PRISIONAL E MODIFICAÇÃO DAS PENAS
RESTRITIVAS DE DIREITOS. NECESSIDADE. EMBARGOS ACOLHIDOS. 1. Tendo
as penas dos réus sido fixadas no mínimo legal e reduzidas na fração máxima pre-
vista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, sendo a reprimenda privativa de liberdade
substituída por restritivas de direitos, imperiosa a mitigação do regime carcerário
para o semiaberto, em observância ao art. 33, § 3º, do CP. 2. Mostrando-se as penas
restritivas de direitos desproporcionais ao caso, correta a sua modificação para outras
mais razoáveis. 3. Embargos acolhidos. V.V.P. Nos moldes do art. 33, § 3º, do Códi-
go Penal brasileiro, o magistrado, ao fixar o regime prisional ao delito, deve levar
em consideração as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal,
entretanto, em relação ao tráfico de drogas, deve preponderar a personalidade e a
conduta social do agente e a natureza e a quantidade da substância entorpecente,
conforme art. 42 da Lei nº 11.343/06. (TJMG; EI-Nul 1.0699.11.002835-3/002; 4ª
C.Crim.; Rel. Des. Eduardo Brum; DJEMG 08/09/2015)
77/227 — EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ART. 306 DO CTB). Praticado o fato
depois do advento da Lei nº 12.760/2012, afigura-se viável a demonstração da infração
prevista no art. 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro por meio de prova outra
que não a verificação do índice de alcoolemia, através da realização de teste com
etilômetro. Caso em que o estado de embriaguez do acusado vem demonstrado pela
prova oral coligida, mormente pelas declarações prestadas pelos agentes policiais,
bem assim pelo exame clínico, constatando que apresentava o recorrente, na opor-
tunidade, vestes desalinhadas, equilíbrio alterado, hálito etílico, atividade eufórica e
face de coloração ruborizada. Desacato. Induvidosa existência e autoria da infração
imputada a denunciado que, abordado, veio irrogar ofensas aos policiais militares.
Condenações mantidas. Apelo desprovido. (TJRS; ACr 0274967-03.2015.8.21.7000;
1ª C.Crim.; Rel. Des. Honório Gonçalves da Silva Neto; DJERS 04/09/2015)
77/228 — ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. INFRAÇÃO
ADMINISTRATIVA. ART. 250 DO DIPLOMA MENORISTA. ADOLESCENTE QUE
INGRESSOU EM MOTEL DESACOMPANHADA E SEM A AUTORIZAÇÃO DE
SEUS RESPONSÁVEIS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. FIXAÇÃO DE MULTA
EM 15 (QUINZE) SALÁRIOS MÍNIMOS. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINAR.
PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA. ARGUIÇÃO DE INCOMPETÊNCIA
ABSOLUTA PARA O JULGAMENTO DE MATÉRIA AFETA AO DIREITO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. INSUBSISTÊNCIA. ATO REGIMENTAL Nº
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 591

18/92. ATRIBUIÇÃO DAS CÂMARAS CRIMINAIS PARA O JULGAMENTO DE


INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. MATÉRIA DECIDIDA PELO ÓRGÃO ESPECIAL
DESTA CORTE. INVIABILIDADE DE RECONHECIMENTO EM FACE DE TAL
JULGADO. PREJUDICIAL RECHAÇADA. Nos termos do art. 2º, inciso I, alíneas a,
b e c, do Ato Regimental nº 18/92, enquanto não for alterado, e consoante iterativa
jurisprudência deste Tribunal, é das Câmaras Criminais a competência para processar
e julgar recurso interposto contra decisões proferidas no procedimento destinado à
apuração de ato infracional atribuído a adolescente, na ação penal relativa a crimes
praticados contra a criança ou adolescente e nos procedimentos relativos à apuração
de irregularidades em entidade de atendimento e infração administrativa às normas
de proteção à criança e ao adolescente (TJSC, Conflito de Competência 2012.024966-
1, de Otacílio Costa, Rel. Des. Jaime Ramos, j. 06.06.2012). MÉRITO. PLEITO DE
IMPROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS. PRETENSA
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIA-
LIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PROVA TESTEMUNHAL.
INFANTE QUE ENTROU NO MOTEL REPRESENTADO ACOMPANHADA DE UM
ADULTO. DEPOIMENTO DA MENOR COERENTE E VEROSSÍMIL. CONFIRMA-
ÇÃO DOS FATOS PELO ADULTO QUE A CONDUZIU AO ESTABELECIMENTO.
SUPORTE PROBATÓRIO SUFICIENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO
DESPROVIDO NO PONTO. A palavra dq adolescente, isenta de suspeita, de que se
hospedou em motel é prova suficiente da ocorrência da infração administrativa do art.
250 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Apelação/Estatuto da Criança e do

EMENTÁRIO
Adolescente 2014.053615-1, de Rio do Sul, Rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 09.12.2014).
PLEITO ALTERNATIVO. REDUÇÃO DA MULTA ADMINISTRATIVA. FIXAÇÃO
EM 15 (QUINZE) SALÁRIOS MÍNIMOS NO PRIMEIRO GRAU. VIABILIDADE.
ORIENTAÇÃO DESTA CORTE PARA CASOS ANÁLOGOS. VARIAÇÃO DE 10 (DEZ)

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


A 50 (CINQUENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. CASO CONCRETO. REPRESENTADO
SEM CONDENAÇÃO ANTERIOR. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA
PARA A EXASPERAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO. REDUÇÃO DA MULTA. MEDIDA
IMPOSITIVA. (...) 4. Inexistente fundamento concreto que justifique a exasperação da
pena de multa pela infração administrativa do art. 250 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, ela deve ser fixada em 10 salários mínimos, o equivalente ao mínimo antes
previsto no preceito secundário da norma (...) (TJSC, Apelação/Estatuto da Criança e
do Adolescente 2014.053615-1, de Rio do Sul, Rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 09.12.2014).
Recurso parcialmente provido. (TJSC; APL-ECA 2014.053614-4; 4ª C.Crim.; Rel. Des.
Jorge Henrique Schaefer Martins; DJSC 02/09/2015; p. 610)
77/229 — ESTELIONATO. ALIENAÇÃO DE LOTE CONCEDIDO PELO IN-
CRA. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA MANTIDA. 1. Alienação de lote de assentamento
destinado à reforma agrária que estava na posse do acusado, sem prévia autorização
do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA. Não restou com
provada a prática do crime de estelionato, tampouco prejuízo em desfavor da autar-
quia federal, mas tão somente a violação ao disposto no art. 21 da Lei nº 8.629/93,
cabendo, na hipótese vertente, sanções cíveis. 2. Recurso a que se nega provimento.
592 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

(TRF 3ª R.; RSE 0000234-52.2012.4.03.6107; SP; 2ª T.; Relª Juíza Fed. Conv. Denise
Avelar; DEJF 29/10/2015)
77/230 — ESTELIONATO MAJORADO. PROGRAMA FARMÁCIA POPULAR.
IRREGULARIDADES GRAVES. VANTAGEM INDEVIDA APURADA. PREJUÍZO
CONCRETO AOS COFRES FEDERAIS. EXPEDIENTE FRAUDULENTO CARAC-
TERIZADO. ESTELIONATO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. APE-
LO MINISTERIAL PROVIDO. 1. Tese defensiva de inépcia da denúncia rejeitada.
Preambular acusatória que contém todos os requisitos previstos no ordenamento
para seu recebimento. Pode, evidentemente, restar comprovado ao fim da instrução
processual que os réus não praticaram os atos narrados na exordial acusatória, ou
que os fatos não ocorreram daquela forma. Neste caso, todavia, não se tem caso de
inépcia da denúncia, mas, sim, como é de sabença, de sentença de mérito julgando
improcedente a pretensão punitiva estatal. 2. O Programa Farmácia Popular do
Brasil (PFPB) foi instituído pela União Federal no ano de 2004, com o intuito de
promover a distribuição de medicamentos de uso maciço a preços subsidiados pelos
cofres públicos. Programa que não se voltava à distribuição gratuita e, inclusive, a
proibia, salvo, a partir de 2011, com relação a uma lista restrita de medicamentos.
A contrapartida obrigatória do usuário constituía característica inelidível do PFPB
à época dos fatos, e assim seguiu sendo, ressalvada a exceção já referida. 3. Réus
(proprietários de farmácia que vendia medicamentos no âmbito do aqui tem farmácia
popular) que instruíram funcionária (cadastradora) para ir até residências e, por
vezes, informar que postos de saúde não mais forneceriam os medicamentos de uso
contínuo utilizados pelos moradores do local. Os remédios passariam a ser forneci-
dos, gratuitamente, pela farmácia dos apelados. Caracterizado o ardil instrumental,
na medida em que, por meio deste, propiciava-se a prática da figura típica, consis-
tente na distribuição gratuita de medicamentos sem que a União disso soubesse. 4.
Restou claro que a União pagava o valor total (100%) dos medicamentos, mas que
se declarava que a União estaria arcando com 90% dos valores. Informação falsa
dada pelos proprietários ao ente federal quanto ao real valor de venda na farmácia.
Prejuízo concreto aos cofres públicos caracterizado. Ao distribuir medicamentos
gratuitamente, os réus lesaram o programa farmácia popular e os cofres da União,
obtendo com isso vantagem indevida, qual seja a de expandir sua base de clientes
artificialmente, burlando as regras a que voluntariamente aderiram quando da ade-
são ao “aqui tem farmácia popular”. Tudo isso foi realizado em prejuízo dos cofres
públicos e em detrimento tanto dos concorrentes quanto dos próprios objetivos do
programa farmácia popular, que visa aumentar a oferta de medicamentos à popu-
lação, e não a restringi-la ou criar confusões no processo de oferta dos produtos
de primeira necessidade, e, muito menos, a criar distúrbios de concorrência entre
estabelecimentos do ramo farmacêutico. 5. Elementos convergentes no sentido de
a prática ser reiterada e corriqueira. Nos limites temporais fixados pela denúncia
(período de um mês – julho de 2009), foram individualmente provadas duas práti-
cas contra o ente federal. 6. No caso que envolveu Neide Borges dos Santos, o ardil
envolveu narrativa no sentido de que o posto de saúde da região não mais forneceria
seus medicamentos de uso contínuo, fornecimento este que passaria a ser feito (se
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 593

aceito o cadastramento) pela Drogaria Palmital. No caso de Janaina Cestari Vilardi


(que trabalhou como cadastradora na farmácia dos réus), utilizou-se seu CPF para
realização de diversas vendas de medicamentos não usados pela testemunha. Utili-
zação de CPF de clientes sem sua autorização igualmente caracterizada. Outro meio
fraudulento, a caracterizar, igualmente, o estelionato majorado apurado nestes autos.
7. Autoria e materialidade provadas. Elemento subjetivo patente. 8. Dosimetria.
8.1. Primeira fase da dosimetria. Circunstância do crime desfavorável aos agentes.
Direcionamento de informação falsa a pessoas com baixo nível de instrução (em um
dos casos comprovados nos autos, pessoa não alfabetizada). Pena-base estabelecida
acima do mínimo legal. 8.2. Reconhecidas as atenuantes previstas no art. 65, III, b e
d. Pena reduzida de um terço, mas adequada ao mínimo legal. Orientação da Súmula
do STJ (Enunciado nº 231). Pena que não pode ser reduzida aquém do mínimo
legal na segunda fase da dosimetria. Entendimento seguido. 8.3. Incidente no caso
concreto da causa de aumento prevista no art. 171, § 3º, do Código Penal. Pena
aumentada de um terço. 8.4. Continuidade delitiva caracterizada nos autos. Dois
delitos, sem especial reprovabilidade ou gravidade. Pena aumentada de um sexto.
8.5. Realizada a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de
direitos. 9. Apelação do Ministério Público Federal provida. (TRF 3ª R.; ACR 0003134-
30.2011.4.03.6111; SP; 1ª T.; Rel. Des. Fed. José Lunardelli; DEJF 02/10/2015; p. 4585)
77/231 — ESTUPRO DE COMPANHEIRA NO ÂMBITO DA CONVIVÊNCIA.
PALAVRA DA VÍTIMA NÃO DISSONANTE DOS DEMAIS ELEMENTOS PROBA-
TÓRIOS. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. 1. Nos crimes contra
a liberdade sexual, mormente aqueles praticados no âmbito doméstico, por serem

EMENTÁRIO
perpetrados longe dos olhos e intervenção de terceiros, a palavra da vítima detém
especial relevância, especialmente se não dissonante dos demais elementos probató-
rios, sendo suficiente para a condenação. 2. Apelo conhecido e improvido. (TJAP; APL
0005329-15.2012.8.03.0001; C.Un.; Relª Desª Stella Ramos; DJEAP 01/09/2015; p. 14)

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


77/232 — ESTUPRO DE VULNERÁVEL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO
DA DEFICIÊNCIA MENTAL DA VÍTIMA COMPROMETEDORA DO DISCER-
NIMENTO PARA O ATO. VULNERABILIDADE RELATIVA. ABSOLVIÇÃO. 1. A
vítima que possui deficiência mental de cunho leve não é necessariamente tida por
vulnerável para fins de imputação do delito previsto no art. 217-A, § 1º, do CP, sendo
necessária a comprovação cabal de que esta, à época do fato, não possuía o necessário
discernimento para a prática do ato, de modo que, recaindo dúvidas acerca dessa
elementar e sobre o próprio fato de que o réu era conhecedor do comprometimento
cognitivo, impõe-se a sua absolvição, pelo princípio do in dubio pro reo. 2. Apelo
improvido. (TJAP; APL 0002375-09.2011.8.03.0008; C.Un.; Relª Desª Stella Ramos;
DJEAP 01/09/2015; p. 13)
77/233 — EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO AO REGIME ABERTO IN-
DEFERIDA PELO TRIBUNAL A QUO, COM BASE NA GRAVIDADE ABSTRATA
DO DELITO E NA LONGA PENA A CUMPRIR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL
EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA
DE OFÍCIO. 1. Ressalvada pessoal compreensão diversa, uniformizou o Superior
Tribunal de Justiça ser inadequado o writ em substituição a recursos especial e or-
594 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

dinário, ou a revisão criminal, admitindo-se, de ofício, a concessão da ordem ante


a constatação de ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia. 2. In casu, foi
indeferido o benefício da progressão de regime tão somente em virtude da gravidade
abstrata do delito pelo qual foi condenado o paciente e da longa pena a cumprir. 3.
Fatores relacionados ao crime praticado são determinantes da pena aplicada, mas
não justificam diferenciado tratamento para a progressão de regime. Precedentes.
4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para, cassando o
acórdão impugnado, restabelecer a decisão do juízo de primeiro grau, concessiva
da progressão ao regime aberto. (STJ; HC 328.836; Proc. 2015/0157173-1; SP; 6ª T.;
Rel. Min. Nefi Cordeiro; DJE 29/10/2015)
77/234 — EXTORSÃO MAJORADA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPOR-
TÂNCIA. MATÉRIA DE PROVA. CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DA PENA.
AFASTAMENTO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. REGIME PRISIONAL. SÚMULA
Nº 440 DO STJ. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE
OFÍCIO. 1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção
deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas
corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível
de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão
da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. Esse entendimento objetivou
preservar a utilidade e a eficácia do mandamus, que é o instrumento constitucional
mais importante de proteção à liberdade individual do cidadão ameaçada por ato
ilegal ou abuso de poder, garantindo a celeridade que o seu julgamento requer. 2.
O habeas corpus, ação constitucional de rito célere e de cognição sumária, não é o
meio processual adequado para analisar alegações que demandem uma incursão
no conteúdo fático-probatório. 3. Na espécie, o Tribunal revisor, após uma análise
aprofundada do conteúdo informativo levantado ao longo da instrução processual,
foi enfático ao afastar a tese de participação de menor importância do paciente no
crime de extorsão com causa de aumento. Assim, não há como desconstituir essa
conclusão sem uma reavaliação do material cognitivo produzido nos autos. 4. Para
se aferir a competência do Superior Tribunal de Justiça é necessário que a matéria
questionada tenha sido analisada pela Corte de origem, consoante dispõe o art. 105,
II, da Constituição Federal, sob pena de configurar indevida supressão de instância.
5. A alegação da defesa de que a majorante relativa ao emprego de arma de fogo no
crime de extorsão não alcançaria o paciente, pois ele não esteve presente no mo-
mento em que foi empregada para praticar a grave ameaça, não foi enfrentada pelo
Tribunal revisor, sequer foi arguida pela defesa nas razões do recurso interposto na
origem, motivo pelo qual esta Corte Superior fica impedida de analisar diretamente
o pleito. 6. Tratando-se de paciente primário, com todas as circunstâncias judiciais
favoráveis, condenado à pena privativa de liberdade superior a 4 (quatro) anos de
reclusão e que não exceda a 8 (oito), é cabível o regime inicial semiaberto, conso-
ante dispõe o art. 33, § 2º, b, do Código Penal. Precedentes. 7. No presente caso,
a despeito de o paciente ter sido condenado definitivamente em 5 (cinco) anos e
4 (quatro) meses de reclusão, os motivos apontados pelo Tribunal impetrado para
agravar o regime inicial – emprego de arma e pluralidade de pessoas – não desbordam
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 595

do tipo penal do crime de extorsão com causa de aumento, sequer foram valorados
no procedimento de individualização da pena. Incidência do Enunciado nº 440 da
Súmula desta Corte. 8. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício
para restabelecer o regime inicial semiaberto fixado na sentença proferida nos autos
da Ação Penal 050.03.063909-3, controle 1248/03, da 6ª Vara Criminal da Comarca
de São Paulo. (STJ; HC 293.211; Proc. 2014/0093398-6; SP; 5ª T.; Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca; DJE 08/09/2015)
77/235 — EXTRADIÇÃO INSTRUTÓRIA E EXECUTÓRIA. PRISÃO DE-
CRETADA PELA JUSTIÇA ESPANHOLA. TRATADO ESPECÍFICO. REQUISITOS
ATENDIDOS. CRIMES DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOA PARA FIM
DE EXPLORAÇÃO SEXUAL, FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU OUTRA
FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL E REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA À
DE ESCRAVO. DUPLA TIPICIDADE. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. EX-
TRADIÇÃO DEFERIDA. 1. O pedido formulado pelo Reino da Espanha atende aos
pressupostos necessários ao deferimento, nos termos da Lei nº 6.815/80 e do tratado
de extradição específico, inexistindo irregularidades formais. 2. O Estado requerente
dispõe de competência jurisdicional para processar e julgar os crimes imputados
ao extraditando e para executar a sentença condenatória imposta, conformando-se
o caso ao disposto no art. 78, inciso I, da Lei nº 6.815/80 e ao princípio de direito
penal internacional da territorialidade da lei penal. 3. Requisito da dupla tipicidade
previsto no art. 77, inciso II, da Lei nº 6.815/80 cumprido: fatos delituosos imputa-
dos ao extraditando correspondentes, no Brasil, aos crimes de tráfico internacional
de pessoa para fim de exploração sexual, favorecimento da prostituição ou outra

EMENTÁRIO
forma de exploração sexual e redução à condição análoga à de escravo (arts. 231,
228, caput e § 2º e 149, todos do Código Penal brasileiro). 4. Na extradição, este
Supremo Tribunal Federal não detém competência para examinar o mérito da pre-
tensão deduzida pelo Estado requerente ou o contexto probatório no qual se apoia

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


a postulação extradicional. Precedentes. 5. Extradição deferida. (STF; Ext 1.377; DF;
2ª T.; Relª Minª Cármen Lúcia; DJE 16/10/2015; p. 36)
77/236 — FALTA DISCIPLINAR DE NATUREZA GRAVE. PRESCRIÇÃO.
INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PRAZO PRESCRICIONAL PREVISTO NA LEI
DE EXECUÇÃO PENAL. ADOÇÃO, POR ANALOGIA, DAQUELE FIXADO PELO
ART. 109, VI, DO CP. DANO AO PATRIMÔNIO E APOLOGIA À FACÇÃO CRIMI-
NOSA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. Prova segura com base
no relato dos agentes de segurança penitenciária e confissão do sentenciado. Danos
caracterizados por registros fotográficos, ademais. Perda de 1/3 dos dias remidos.
Compatibilidade com as circunstâncias do caso concreto. Falta disciplinar que
constitui marco interruptivo de benefício. Recurso desprovido. (TJSP; AG-ExPen
7006040-54.2013.8.26.0637; Ac. 8761924; 4ª C.D.Crim.; Rel. Des. Ivan Sartori; DJESP
04/09/2015)
77/237 — FUGA APÓS ACIDENTE DE TRÂNSITO. REJEIÇÃO DE DENÚN-
CIA. DESCONSTITUIÇÃO DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU. PRINCÍPIO DO IN
DUBIO PRO SOCIETATE. Inconformismo do MPM ante a decisão do Juízo a quo que
rejeitou a denúncia oferecida, salientando que, por se tratar o art. 281 do CPM de
596 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

crime acessório, tornava-se necessária a comprovação da responsabilidade pelo delito


principal, qual seja homicídio ou lesão corporal. Na fase preliminar, de recebimento
da exordial, cabe ao Juiz apenas verificar se foram preenchidos os requisitos exigidos
pelos arts. 77 e 78 do CPPM. Os demais aspectos, de ordem material ou processual,
deverão ser sopesados durante o processo, no qual os denunciados, pautados nas
garantias constitucionais, terão a oportunidade de provar sua inocência. Denúncia
que se encontra revestida das formalidades legais. Provido o recurso do Parquet
militar. Decisão unânime. (STM; RSE 103-57.2014.7.02.0102; SP; Rel. Min. Odilson
Sampaio Benzi; DJSTM 02/09/2015)
77/238 — FUGA DE PRESO. FORMA CULPOSA. DELITO DELINEADO E
PROVADO. PROVIMENTO DO APELO DO MPM. Como deixa entrever a dicção do
preceito primário do art. 179 do CPM, o crime imputado ao acusado aperfeiçoa-se
com a fuga do preso, em decorrência da desatenção, da falta de diligência, do desape-
go à cautela por parte de quem tem a responsabilidade pela sua vigilância e guarda.
In casu, como já antes destacado, a prova é absolutamente consistente no sentido
de que o acusado não observou as cautelas mínimas que a situação lhe impunha,
caminhando à frente do preso em direção ao xadrez – vale dizer, sem tê-lo ao alcance
de suas vistas – e sequer notando que, a partir de um dado momento, este não mais
o seguia. Como é cediço, quando se cogita a previsibilidade subjetiva como um dos
elementos configuradores da tipicidade, o que se espera é que o sujeito ativo preveja
o que normalmente pode acontecer nas condições em que se encontra. A contrario
sensu, pois, não se exige do agente que anteveja o excepcional, o extraordinário, o
inusitado. Hipótese em que o resultado naturalístico, ou seja, a fuga do preso era
naturalmente previsível pelo acusado, inclusive pela mera constatação objetiva da
existência de aparatos naturais (xadrez, etc.) e de sua própria designação como
militar de serviço de guarda, obviamente para evitá-la. Provimento do apelo do
MPM. Declaração da extinção da punibilidade do acusado, em face da ocorrência
da prescrição da pretensão punitiva estatal, com base na pena concretizada no deci-
sum. Unânime. (STM; APL 112-23.2013.7.03.0103; RS; Rel. Min. Luis Carlos Gomes
Mattos; DJSTM 08/09/2015)
77/239 — FURTO QUALIFICADO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DES-
CLASSIFICAÇÃO DO FURTO CONSUMADO PARA TENTADO. VIABILIDADE.
REDUÇÃO DA PENA IMPOSTA. CABÍVEL. ALTERAÇÃO DO CUMPRIMENTO
DE PENA. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. 1. Há provas da materialidade
e da autoria que o apelante praticou a tentativa de furto, haja vista que o fato não
se consumou por circunstâncias alheias a sua vontade. 2. O crime de furto não se
consuma se a res furtiva não chega a sair da esfera de vigilância do dono, impondo-
se a desclassificação do delito de furto consumado para a sua forma tentada. 3. Para
o cálculo da redução aplicada à tentativa, deve-se levar em conta o iter criminis
percorrido. Assim, quanto mais o agente se aproximar da consumação, menor deve
ser a redução aplicada. 4. Existentes circunstâncias judiciais desfavoráveis aos réus,
considerando que, quando da fixação das penas-base, estas restaram concretizadas
pouco acima do mínimo legal, mas há alguns fundamentos que fazem parte do
próprio tipo legal, tendo a necessidade de redução da pena imposta. 5. Recurso
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 597

provido parcialmente para o réu J.P. Aplicação da extensão da desclassificação do


furto consumado para o tentado para o réu A.S., com a consequente redução da
pena imposta, de ofício. (TJPE; APL 0041805-28.2013.8.17.0001; 1ª C.Crim.; Rel.
Des. Fausto de Castro Campos; DJEPE 01/09/2015)
77/240 — FURTO QUALIFICADO. RÉU REINCIDENTE. REGIME INICIAL
SEMIABERTO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS
DESFAVORÁVEIS. SÚMULA Nº 269 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RE-
VOGAÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS PRE-
SENTES. NECESSÁRIA ADEQUAÇÃO AO REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA.
APELO PROVIDO EM PARTE. 1. Ao réu reincidente condenado a pena inferior a
quatro anos é possível a fixação do regime semiaberto como inicial para o cumpri-
mento da pena, desde que ausentes circunstâncias judiciais desfavoráveis, de acordo
com a Súmula nº 269 do Superior Tribunal de Justiça. 2. É de se manter a custódia
cautelar quando decretada para a garantia da ordem pública para evitar a reiteração
criminosa, adequando-a, contudo, ao regime semiaberto de cumprimento da pena.
3. Apelação a que se dá parcial provimento. (TJAC; APL 0006179-86.2013.8.01.0002;
Ac. 19.632; C.Crim.; Rel. Des. Francisco Djalma; DJAC 20/10/2015; p. 36)
77/241 — FURTO QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. FRAU-
DE. CONCURSO DE AGENTES. DISPOSITIVOS “PESCADORES”. RETENÇÃO
DE ENVELOPES DE DEPÓSITO BANCÁRIO. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL.
AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO COMPROVADAS. CRIME IMPOS-
SÍVEL NÃO CONFIGURADO. CONTINUIDADE DELITIVA. DOSIMETRIA DA

EMENTÁRIO
PENA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS
DESFAVORÁVEIS. REPARAÇÃO DE DANOS DO ART. 387, IV, DO CPP. IMPOSSI-
BILIDADE. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
1. O réu foi preso em flagrante, permanecendo custodiado durante todo o processo,

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


sendo, ao final, condenado ao regime inicial fechado de cumprimento de pena, não
tendo havido mudança do quadro fático descrito na sentença a ensejar a alteração
de sua situação prisional, nos termos do art. 387, § 1º, do Código de Processo
Penal. 2. O Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, firmou o
entendimento de que o sistema de segurança no local dos fatos, por si só, não torna
o crime de furto impossível. Não se vislumbra a alegada ineficácia absoluta do meio
em pregado para a prática dos delitos. A presença de câmeras e o monitoramento
pela central de vigilância não impediu a lesão ao patrimônio da Caixa Econômica
Federal. 3. Autoria e materialidade delitivas comprovadas. 4. Os acusados devem
ser condenados como incursos no art. 155, § 4º, incisos I, II e IV, do Código Penal,
por uma vez, por furto qualificado consumado em uma das agências bancárias, c/c
o art. 14, inciso II, do Código Penal; e por três vezes (outras três agências sofreram
furto qualificado tentado), na forma dos arts. 29 e 71 do Código Penal. 5. Apesar
de as circunstâncias do crime de fato mostrarem-se bastante graves e justificarem
a reprimenda acima do mínimo legal, entendo que a ausência de comprovação nos
autos de ocupação lícita e o suposto desprezo pelas normas impostas à vida em
sociedade não consistem em fundamentação apta a agravar a pena, considerando
como conduta social “o papel do réu na comunidade, inserido no contexto da família,
598 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

do trabalho, da escola, da vizinhança, etc.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código


Penal comentado. 13. ed. São Paulo: RT, 2013. p. 431). Ademais, os réus declararam
ter ocupação lícita. 6. Impossibilidade de condenação dos réus à reparação civil
autorizada pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal, por ausência de pedido
expresso do órgão acusatório ou da empresa pública ofendida. 7. Recursos providos
em parte. (TRF 3ª R.; ACR 0010719-49.2014.4.03.6105; SP; 5ª T.; Rel. Des. Fed. Paulo
Fontes; DEJF 14.10.15)
77/242 — FURTO SIMPLES. PROVA DA AUTORIA E DA MATERIALIDADE
LASTREADA NAS PROVAS PRODUZIDAS. Havendo robusto conjunto probatório a
demonstrar, sem sombra de dúvida, a prática delitiva, de rigor o decreto condenató-
rio. RECEPTAÇÃO. CONDUZIR VEÍCULO QUE SABE SER PRODUTO DE CRIME.
MATERIALIDADE E AUTORIA SUFICIENTEMENTE PROVADAS. Diante do dolo
direto do agente no recebimento e condução de bem de origem ilícita, configura-se o
crime de receptação. Recurso não provido. (TJSP; APL 3011660-73.2013.8.26.0554;
Ac. 8715970; 15ª C.D.Crim.; Rel. Des. Willian Campos; DJESP 08/09/2015)
77/243 — HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE REVISÃO CRIMINAL.
TRÂNSITO EM JULGADO DA AÇÃO PENAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
NÃO CONHECIMENTO. DEFESA PRELIMINAR DEFICITÁRIA. PREJUÍZO NÃO
DEMONSTRADO. ART. 563 DO CPP. SÚMULA Nº 523/STF. INEXISTÊNCIA DE
NULIDADE. 1. Não se conhece de habeas corpus impetrado em face de condenação
transitada em julgado. Eventual irresignação deve ser atacada por meio de revisão
criminal. 2. Nos termos do art. 563 do CPP, “nenhum ato será declarado nulo, se
da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa”. Nesse mesmo
sentido, a Súmula nº 523/STF enuncia que “no processo penal, a falta da defesa
constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de
prejuízo para o réu”. 3. Habeas corpus não conhecido, com revogação da liminar
anteriormente concedida. Pedidos de extensão prejudicados. (STF; HC 101.489; SP;
1ª T.; Rel. Min. Marco Aurélio; DJE 29/10/2015; p. 38)
77/244 — HOMICÍDIO CULPOSO MAJORADO POR INOBSERVÂNCIA DE
REGRA TÉCNICA DE PROFISSÃO. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. DESCA-
BIMENTO. INÉPCIA DA INICIAL NÃO CARACTERIZADA. 1. A jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça, acompanhando a orientação da Primeira Turma do
Supremo Tribunal Federal, firmou-se no sentido de que o habeas corpus não pode
ser utilizado como substituto de recurso próprio, sob pena de desvirtuar a finalida-
de dessa garantia constitucional, exceto quando a ilegalidade apontada é flagrante,
hipótese em que se concede a ordem de ofício. 2. O trancamento de ação penal
constitui “medida excepcional, só admitida quando restar provada, inequivocamente,
sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático-probatório, a atipicidade
da conduta, a ocorrência de causa extintiva da punibilidade, ou, ainda, a ausência
de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito” (HC 281.588/MG,
Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 05.02.2014) e que “só deve ser adotada
quando se apresenta indiscutível a ausência de justa causa e em face de inequívoca
ilegalidade da prova pré-constituída” (STF, HC 107.948 AgR/MG, Rel. Min. Luiz
Fux, Primeira Turma, DJe 14.05.2012). 3. Hipótese em que a denúncia descreve ter
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 599

a paciente, na condição de médica plantonista, incorrido em negligência ao deixar


de realizar os exames clínicos aptos a diagnosticar a razão das dores abdominais da
vítima. Que veio a falecer, dias depois de ser novamente atendida por outro profis-
sional, de “choque séptico por abdômen agudo perfurativo” em razão de apendicite
aguda perfurada. 4. Identificar a suposta regra técnica inobservada pela denunciada
não torna inepta a peça de acusação quando ali descrita de modo suficiente à impu-
tação e aquele elemento pode ser melhor apurado no curso da instrução, devendo
ser privilegiado, na atual fase processual, o princípio do in dubio pro societate. 5. Não
apreciada, na origem, a possibilidade de suspensão condicional do processo (Lei nº
9.099/95, art. 89), descabe a este Superior Tribunal proceder a tal exame, sob pena
de incorrer em supressão de instância. 6. Habeas corpus não conhecido. (STJ; HC
325.158; Proc. 2015/0124639-9; SP; 5ª T.; Rel. Min. Gurgel de Faria; DJE 29/10/2015)
77/245 — HOMICÍDIO QUALIFICADO. DESAFORAMENTO. DÚVIDA
QUANTO À PARCIALIDADE DOS JURADOS CONFIGURADA. PRETERIÇÃO DAS
COMARCAS MAIS PRÓXIMAS. POSSIBILIDADE. ORDEM NÃO CONHECIDA. 1.
Nos termos do art. 427 do Código de Processo Penal, se o interesse da ordem pública
o reclamar ou se houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou sobre a segurança
pessoal do réu, o Tribunal poderá determinar o desaforamento do julgamento para
outra Comarca da mesma região, onde não subsistam tais motivos, com preferência
daquela mais próxima. 2. O deslocamento da competência para Comarca mais dis-
tante do distrito da culpa é possível, desde que, se transferida para Comarca mais
próxima, persistam os motivos que ensejaram a medida. 3. No caso, demonstrou-se a
existência de fundada dúvida sobre a parcialidade dos jurados, notadamente em razão

EMENTÁRIO
da acentuada influência política e econômica do acusado na Comarca, a justificar o
desaforamento do julgamento para Belo Horizonte/MG, onde tais iniciativas não têm
reflexos relevantes no corpo de jurados. 4. Ordem não conhecida. (STJ; HC 225.773;
Proc. 2011/0279422-8; MG; 6ª T.; Rel. Min. Rogério Schietti Cruz; DJE 08/09/2015)

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


77/246 — HOMICÍDIO QUALIFICADO. EXCESSO DE PRAZO PARA O FIM
DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. CONFIGURAÇÃO. PROLAÇÃO DE PRONÚNCIA.
SÚMULA Nº 21/STJ. HIPÓTESE DE AFASTAMENTO. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO. I – In casu, não obstante a incidência hipotética, do Enunciado nº 21 da
Súmula do Superior Tribunal de Justiça, porquanto proferida decisão de pronúncia,
verifica-se que o mencionado entendimento é de ser afastado. II – Não há o que
justifique a manutenção de uma prisão preventiva há mais de 4 (quatro) anos sem
ter havido um pronunciamento definitivo do Poder Judiciário, não tendo a defesa
em nada contribuído para tal demora, configurando, portanto, tal situação, odioso
e inaceitável constrangimento ilegal, por ofender os princípios da razoabilidade e
da celeridade dos processos. Recurso ordinário parcialmente provimento para, re-
vogando a prisão preventiva, determinar a aplicação de medidas cautelares diversas
da prisão, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal. (STJ; RHC 63.966;
Proc. 2015/0234486-3; BA; 5ª T.; Rel. Min. Felix Fischer; DJE 29/10/2015)
77/247 — HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO FÚTIL E POR RE-
CURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DO OFENDIDO. PRONÚNCIA. AUSÊNCIA
DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. A decisão de pronúncia se caracteriza pela
600 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

cognição sumária e superficial dos elementos probatórios, a teor do que dispõe o


art. 413 do CPP, devendo conter a devida fundamentação, conforme determina o
art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, porém, a decisão questionada não apre-
senta motivação concreta em relação às qualificadoras, o que impõe a declaração
de nulidade desta. Nulidade declarada. (TJGO; RSE 0193022-70.1998.8.09.0162; 1ª
C.Crim.; Relª Desª Avelirdes Almeida Pinheiro de Lemos; DJGO 04/09/2015; p. 423)
77/248 — INJÚRIA REAL. ELEMENTO SUBJETIVO DO DOLO NÃO COM-
PROVADO. MANUTENÇÃO DO DECRETO ABSOLUTÓRIO. Recurso ministerial
interposto para reformar sentença absolutória e condenar o réu como incurso no art.
217 do CPM. No caso, o Sargento ordenou a submersão de soldado em cocho destinado
à hidratação de equinos, em razão de o militar não ter cumprido ordem de serviço a
contento. Não restou comprovado que o graduado tenha agido para aviltar a honra
do soldado, tampouco que tenha utilizado de violência física. Restou comprovado,
sim, que o Sargento exacerbou-se na reprimenda ao perceber que os animais haviam
ficado sem água em razão da irresponsabilidade do soldado, sem, entretanto, carac-
terizar o delito. O crime de injúria real, para sua configuração, pressupõe a índole,
o dolo, a intenção de aviltar e denegrir a imagem do ofendido. Elemento subjetivo
do tipo não configurado nos presentes autos, impondo-se a manutenção do decreto
absolutório. Apelo não provido. Unânime. (STM; APL 205-08.2011.7.01.0201; RJ; Rel.
Min. Marcus Vinicius Oliveira dos Santos; DJSTM 06/10/2015)
77/249 — INQUÉRITO. DENÚNCIA CONTRA DEPUTADO FEDERAL.
CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA ELEITORAL, ART. 350 DO CÓDIGO
ELEITORAL. POSTERIOR PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME
DO ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. ALEGADA OMISSÃO DE INFORMAÇÕES NA
PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS. AFASTAMENTO DAS PRELIMINARES DE
PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA E INÉPCIA DA DENÚNCIA. ALEGADA FALTA
DE JUSTA CAUSA PARA O PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL. ACOLHIMEN-
TO. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E MATERIALIDADE
DELITIVAS. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA COM FUNDAMENTO NO ART. 395, III,
DO CPP. 1. Inviável a rejeição da denúncia por alegada prescrição em perspectiva,
por ter este Supremo Tribunal Federal jurisprudência assente na qual declara ser
“descabida a análise antecipada sobre a ocorrência da prescrição” (Ação Penal 441/SP,
Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 08.06.2012). 2. Descabe a rejeição liminar da denúncia,
por alegada inépcia, quando a peça processual atende ao disposto no art. 41 do CPP
e descreve, com o cuidado necessário, a conduta criminosa imputada a cada qual
dos denunciados, explicitando, minuciosamente, os fundamentos da acusação. 3.
Ausentes indícios consistentes de autoria e materialidade delitiva e não demonstrado
o dolo específico do crime do art. 299 do Código Penal, é de se rejeitar a denúncia
por falta de justa causa, nos termos do art. 395, inciso III, do CPP. 4. Denúncia
rejeitada. (STF; Inq 2.792; MG; 2ª T.; Relª Minª Cármen Lúcia; DJE 13/10/2015; p. 68)
77/250 — INQUÉRITO. PENAL. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA EM
PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAL. PREJUDICIAL. PRESCRIÇÃO PELA PENA
EM ABSTRATO. INOCORRÊNCIA. NATUREZA PÚBLICA, E NÃO PRIVADA, DO
DOCUMENTO. PRECEDENTES. OMISSÃO DE INFORMAÇÃO COM FIM DE AL-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 601

TERAR A VERDADE SOBRE FATO JURIDICAMENTE RELEVANTE. NARRATIVA


FÁTICA OBEDIENTE AO DISPOSTO NO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO
PENAL. DEMONSTRAÇÃO MÍNIMA DA PRÁTICA DA CONDUTA E DO ESPECIAL
FIM DE AGIR. EXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA O INÍCIO DA AÇÃO PENAL.
DENÚNCIA RECEBIDA. 1. O crime de falsidade ideológica, quando incidente sobre
prestação de contas eleitoral, é apenado com reclusão, de um a cinco anos, e multa,
por se tratar de documento de natureza pública. 2. O candidato e o administrador
financeiro da campanha são os responsáveis legais pela veracidade das informações,
nos termos dos arts. 20 e 21 da Lei nº 9.504/97. 3. A jurisprudência deste Supremo
Tribunal Federal assentou o entendimento de que “a responsabilidade na prestação
de contas das despesas realizadas com a campanha cabe ao candidato, pouco impor-
tando que outrem haja intermediado as relações jurídicas” (Inq 3.345/DF, Primeira
Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 12.08.2014, unânime). 4. In casu, os nomes dos
dois acusados constam do documento de prestação de contas objeto da acusação,
razão pela qual ambos respondem pela prática, em tese, do crime de falsum. 5. A
aplicação do método fenomenológico e ontológico ao direito penal levou à substi-
tuição do conceito causal por um conceito final de ação, cujo ponto de partida é a
consideração de que o que o comportamento humano possui de específico não é a
causalidade, mas a finalidade (isto é, o conduzir-se intencionalmente a uma meta
previamente eleita), porque as forças da natureza também operam causalmente. Só
a ação humana é “vidente” (vê para onde tende a finalidade perseguida), ao contrá-
rio dos demais processos naturais, que atuam de modo “cego”. A ação humana se
caracteriza, pois, por ser “exercício de atividade final” (PUIG, 2007, p. 156-157).

EMENTÁRIO
Consequentemente, verificada a prática de uma conduta por um indivíduo capaz
(imputável), presume-se que ele a tenha praticado consciente e voluntariamente. 6.
De modo excepcional, o comportamento humano pode derivar de culpa, que afasta
o dolo. Culpa, segundo conceitua a doutrina, é a inobservância do dever de cuidado

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


manifestada numa conduta produtora de um resultado não querido, objetivamente
previsível (BITENCOURT; CONDE, 2000, p. 199). 7. In casu, a omissão narrada
na exordial teria envolvido pagamento de despesas da campanha por uma empresa
da família do candidato acusado, empresa esta que teria sido empregada também
em supostos crimes contra a Administração Pública. 8. Assim, a inicial acusatória
apresentou argumentação suficiente para demonstrar não somente a materialidade
delitiva, como também a presença do elemento subjetivo da conduta. 9. A justa
causa revela-se demonstrada quando se analisam os documentos fiscais emitidos
pela prestadora de serviços, inscrições que os vinculam diretamente à campanha
eleitoral do acusado, elemento a que se somam os montantes omitidos, no total de
21% dos recursos declarados na prestação de contas. 10. Denúncia recebida contra
os acusados Paulo Salim Maluf e Sérgio Stefanelli Gomes. (STF; Inq 3.601; SP; 1ª T.;
Rel. Min. Luiz Fux; DJE 29/10/2015; p. 37)
77/251 — JÚRI. ART. 121, § 2º, I E III, DO CÓDIGO PENAL. PENA-BASE. RE-
DUÇÃO. VIABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DA INDENIZAÇÃO
FIXADA A TÍTULO DE REPARAÇÃO PELOS DANOS SOFRIDOS PELA FAMÍLIA
DA VÍTIMA. 1. Quando as circunstâncias judiciais forem, na quase totalidade, fa-
602 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

voráveis ao acusado, a pena-base deve ser fixada próxima ao mínimo legal. 2. Não
há necessidade de pedido formal de fixação de valor mínimo para fins de reparação
dos danos causados pela infração, nos termos do art. 387, IV, do CPP. Todavia, este
valor deve ser reduzido quando incompatível com a realidade financeira do réu.
Recurso conhecido e parcialmente provido, para reduzir a pena imposta ao apelan-
te, reduzindo-se o valor estipulado para fins de reparação dos danos causados pela
infração. (TJGO; ACr 0420686-21.2011.8.09.0000; 1ª C.Crim.; Rel. Des. Sival Guerra
Pires; DJGO 29/10/2015; p. 374)
77/252 — JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PROVA EMPRESTADA CON-
FIRMADA SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO. ANÁLISE DAS PROVAS. ATRI-
BUIÇÃO DO CONSELHO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA.
CADERNO PROCESSUAL SUFICIENTE A INDICAR A PROVA DA MATERIALI-
DADE E INDÍCIOS DA AUTORIA DOS FATOS SUPOSTAMENTE CRIMINOSOS.
IN DUBIO PRO SOCIETATE. IMPERATIVIDADE. RECURSO CONHECIDO E IM-
PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. I – Havendo provas da materialidade e indícios
suficientes da autoria criminosa, a pronúncia se impõe, eis que fundada num juízo
de plausibilidade da acusação, cabendo ao Tribunal do Júri, juízo natural dos crimes
dolosos contra a vida, dirimir qualquer dúvida porventura existente no caderno
processual. II – Em se tratando de processos em que se apuram crimes dolosos
contra a vida, cuja competência é reservada, constitucionalmente, ao Tribunal do
Júri, somente é possível retirar a causa de seu julgamento quando o feito se encontra
de tal maneira preparado que sobejam provas a reclamar uma pronta decisão do
magistrado. III – A testemunha ocular é categórica ao atribuir ao apelante a autoria
do crime, seu testemunho colhido em sede judicial afasta qualquer nulidade, visto
que não houve cerceamento de defesa, na medida em que a prova foi produzida sob
o crivo do contraditório e da ampla defesa. Ademais, a prova emprestada é admitida
no ordenamento jurídico pátrio, salvo se produzida de maneira ilícita, o que não
restou demonstrado in casu. IV – Recurso de crime conhecido e improvido. (TJAL;
RSE 0001059-67.2013.8.02.0056; C.Crim.; Rel. Des. Sebastião Costa Filho; DJAL
03/09/2015; p. 184)
77/253 — JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO POR MOTIVO TORPE E RE-
CURSO QUE IMPOSSIBILITA A DEFESA DA VÍTIMA. IRRESIGNAÇÃO QUANTO
À SANÇÃO PENAL APLICADA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. CULPABILIDADE
E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PENA-BASE
REFORMADA. AFASTAMENTO DE AGRAVANTE. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA
DE MOTIVAÇÃO FÚTIL. NÃO ACOLHIMENTO. ELEMENTOS PROBATÓRIOS
JUSTIFICADORES DA MANUTENÇÃO. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PREPON-
DERÂNCIA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. ART. 29, § 1º, DO CP.
AUSÊNCIA DE ALEGAÇÃO NO MOMENTO OPORTUNO. ART. 483, § 3º, DO
CPP. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NESTA VIA RECURSAL, SOB PENA DE
SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. REFORMULAÇÃO DA DOSIMETRIA. APELAÇÃO
CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. I – A fundamentação lançada pelo
magistrado sentenciante para valorar as circunstâncias judiciais relativas à culpabi-
lidade e às consequências do crime está adstrita ao tipo penal, pelo que devem ser
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 603

afastadas as valorações procedidas pelo juízo de primeiro grau. II – É sabido que,


por se tratar de decisão emanada do Tribunal do Júri, a exclusão de circunstâncias
agravantes somente será viável se comprovadamente dissociada de todo o elenco
probatório constante nos autos. Embora a defesa alegue que o apelante não possuía
qualquer motivação para praticar o crime, a verdade é que existe nos autos a versão
de corréu (fls. 07/08) afirmando que todos os agentes praticaram o crime a mando
do fazendeiro L.F. e que este entregou R$ 5.000,00 (cinco mil reais) reais a título de
remuneração pela execução da vítima, sendo a quantia dividida igualmente entre
todos os acusados. Assim, a manutenção da agravante é medida impositiva. III – Por
outro lado, também se percebe que o acusado confessou a autoria delitiva quando
ouvido pelas autoridades policial e judiciária. Como se sabe, a atenuante da confissão
espontânea (art. 65, III, d, do CP), em razão de seu caráter subjetivo, prepondera
sobre a agravante do motivo fútil. IV – Por força dos arts. 482 e seguintes as causas
de diminuição de pena deverão necessariamente passar pelo crivo do Tribunal do
Júri, sob pena de supressão de instância por parte da Corte revisora. Na hipótese,
a defesa deixou de requerer a aplicação da minorante constante no art. 29, § 1º,
do CP, embora tenha se manifestado nos autos por diversas vezes. Precedentes do
STJ e de outras Cortes de Justiça. V – Apelação conhecida e parcialmente provida.
(TJAL; APL 0003835-65.2000.8.02.0001; C.Crim.; Rel. Des. Sebastião Costa Filho;
DJAL 03/09/2015; p. 186)
77/254 — LATROCÍNIO. PARTICIPAÇÃO NA MORTE DA VÍTIMA. PROVA
FULCRADA EXCLUSIVAMENTE NOS ELEMENTOS INFORMATIVOS COLHIDOS

EMENTÁRIO
NA FASE DA INFORMATIO DELICTI. INSUFICIÊNCIA PARA A CONDENAÇÃO.
AUSÊNCIA DE PROVAS JUDICIALIZADAS. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA
PARA O CRIME DE FURTO. IMPERATIVIDADE. A limitação moderada em rela-
ção aos elementos informativos colhidos na fase inquisitiva, há muito acolhida na
jurisprudência pátria, faz-se hoje expressamente prevista na legislação processual

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


penal vigente diante das alterações introduzidas pela Lei nº 11.690/08, que deu nova
redação ao art. 155 do Código de Processo Penal. É de se invocar a prevalência da
dúvida se as provas judicializadas são frágeis e indiretas a apontar a participação
dos apelantes na morte da vítima, sendo medida de rigor a desclassificação da con-
duta para o crime de furto se as provas dos autos apontam apenas para a autoria
por parte deles na subtração dos bens da vítima antes ou após a sua morte. (TJMG;
APCR 1.0512.13.005284-2/001; 4ª C.Crim.; Rel. Des. Júlio Cezar Guttierrez; DJEMG
08/09/2015)
77/255 — LESÃO CORPORAL NA DIREÇÃO DE VEÍCULO E EMBRIAGUEZ
AO VOLANTE. CONDENAÇÃO. IRRESIGNAÇÃO. ALEGAÇÃO DE INEXISTÊN-
CIA DE COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DO DELITO. ARGUMENTO
INFUNDADO. AUSÊNCIA DE TESTE DE ALCOOLEMIA. INEXIGIBILIDADE.
DELITO COMETIDO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 11.760/2012. ESTADO ETÍLICO
EVIDENTE ATRAVÉS DA COMPROVAÇÃO DE OUTROS MEIOS LEGALMEN-
TE PREVISTOS NA LEI. MATERIALIDADE E AUTORIA INQUESTIONÁVEIS.
ALEGAÇÃO DE NÃO RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DE CONFISSÃO.
INOCORRÊNCIA. DOSIMETRIA REALIZADA DE FORMA ADEQUADA. REPRI-
604 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

MENDA IRRETOCÁVEL. DESPROVIMENTO. Não há como acolher o pleito abso-


lutório se constatadas a autoria e a materialidade delitivas; o acusado foi preso em
flagrante, quando se encontrava guiando seu carro, sob efeito de álcool, em plena
via de trânsito. O § 2º do art. 277 do CTB, ampliou a possibilidade das provas para
comprovar o estado de embriaguez, a saber, “exame clínico, perícia, vídeo, prova
testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à
contraprova”. Inexistindo a confissão do réu nos autos, não há falar na aplicação da
atenuante. Se o magistrado obedeceu à operação trifásica de fixação da pena, com
base em seu poder discricionário, sob a observância dos limites previstos em lei, não
há falar em injustiça no quantum da reprimenda corporal, mormente quando esta é
fixada no mínimo legal, não restando evidenciada qualquer causa de diminuição da
pena. (TJPB; APL 0016744-58.2014.815.0011; C.Esp.Crim.; Rel. Des. Márcio Murilo
da Cunha Ramos; DJPB 04/09/2015; p. 19)
77/256 — LESÃO CORPORAL QUALIFICADA. VERSÃO ACUSATÓRIA NÃO
CORROBORADA PELOS ELEMENTOS DE PROVA PRODUZIDOS NOS AUTOS.
MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 386, VI, DO CPP.
RECURSO NÃO PROVIDO. Não passando de mera suspeita a imputação do crime
ao acusado, não tendo o Ministério Público se desincumbido de provar o excesso do
réu ao repelir a agressão injusta praticada pela vítima, tudo comprovando tratar-se de
ato praticado em legítima defesa, a manutenção da absolvição é medida de rigor, na
forma do art. 386, VI, do CPP. Recurso não provido. (TJMG; APCR 1.0056.11.008978-
8/001; 4ª C.Crim.; Rel. Des. Corrêa Carmargo; DJEMG 01/09/2015)
77/257 — LESÃO CORPORAL QUALIFICADA PELA DEFORMIDADE
PERMANENTE. TRIBUNAL DO JÚRI. DESCLASSIFICAÇÃO. DECISÃO MANI-
FESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INEXISTÊNCIA. LASTRO
PROBATÓRIO SUFICIENTE. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. ERRO OU INJUS-
TIÇA NA DOSIMETRIA. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE REDUZIDA. SANÇÃO
PECUNIÁRIA NÃO PREVISTA NO TIPO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA,
APENAS PARA REDUZIR A PENA E EXCLUIR A CONDENAÇÃO PELA REPRI-
MENDA DE MULTA. Não é manifestamente contrária à prova dos autos a decisão
do Conselho de Sentença que, diante do conjunto probatório, acolhe uma das teses
submetidas ao seu crivo, desclassificando a conduta inicialmente imputada pela
figura da lesão corporal gravíssima. Proceder de forma diversa, cassando a decisão
popular, seria invadir a esfera de competência do Tribunal do Júri, vulnerando a
soberania de seus veredictos, o que não é tolerado pelo ordenamento jurídico vigen-
te. Abstrações, expressões genéricas e dados integrantes da própria conduta típica
são inidôneos para exasperar a pena-base. A lesão corporal causada por disparo de
arma de fogo, efetuado em local público, justifica o aumento da pena-base em face
da maior reprovabilidade da culpabilidade e das circunstâncias do crime, respecti-
vamente. (TJPB; APL 0003021-61.2006.815.0751; C.Esp.Crim.; Rel. Des. Luiz Sílvio
Ramalho Júnior; DJPB 04/09/2015; p. 19)
77/258 — MATERIALIDADE COMPROVADA. ADEQUAÇÃO AO TIPO LE-
GAL PREVISTO NO ART 290, CAPUT, DO CPM, NA MODALIDADE “TRAZER
CONSIGO”. RÉU CONFESSO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DOS PRINCÍ-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 605

PIOS DA INSIGNIFICÂNCIA E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA


DA LEI Nº 11.343/06. O réu confessou a prática do delito em juízo, sob a égide do
contraditório e da ampla defesa. Inaplicabilidade dos princípios da insignificância e
da proporcionalidade nos delitos de entorpecentes no âmbito das Forças Armadas.
A Lei nº 11.343/06 não revogou nem derrogou o art. 290 do Código Penal Militar,
sendo respeitada a legislação especial que retrata a conduta em locais sujeitos à Ad-
ministração Militar. Jurisprudência firme deste Tribunal no sentido da não aplicação
da Lei nº 11.343/06 na esfera militar. Apelo não provido. Decisão unânime. (STM;
APL 116-09.2013.7.05.0005; PR; Rel. Min. Alvaro Luiz Pinto; DJSTM 28/10/2015)
77/259 — MEDIDAS PROTETIVAS CONTRA A PACIENTE, DETERMINAN-
DO O AFASTAMENTO DO LAR, PROIBIÇÃO DE CONTATO E DE APROXIMAÇÃO
COM A OFENDIDA. DEFERIMENTO ANTERIOR DE MEDIDAS PROTETIVAS
REQUERIDAS PELA PACIENTE. IMPOSSIBILIDADE DE ACESSO AOS BENS QUE
SE ENCONTRAM NA RESIDÊNCIA. CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM. Se em
razão de requerimento formulado pela paciente foram impostas medidas protetivas
de afastamento do lar e proibição de contato e de aproximação em desfavor das
ofendidas e, noutro processo, as mesmas proibições foram impostas à paciente, que
ficou impedida de ter acesso aos bens que se encontram na residência, concede-se,
em parte, a ordem, confirmando-se a liminar que autorizou o ingresso da paciente
no imóvel, acompanhada por Oficial de Justiça, para resgatar seus pertences, docu-
mentos pessoais e móveis, a fim de que o imóvel seja oferecido à locação. (TJDF; HBC
2015.00.2.020696-8; Ac. 890.509; 1ª T.Crim.; Rel. Des. Romão C. Oliveira; DJDFTE
08/09/2015; p. 64)

EMENTÁRIO
77/260 — NULIDADE DO INTERROGATÓRIO. AUSÊNCIA DE AMPARO
JURÍDICO. MÉRITO CONDIZENTE À REFORMA DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA.
PRETENSÃO DE CONDENAÇÃO NO ART. 251 DO CPM. AUSÊNCIA DE TIPICI-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


DADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE FURTO DE USO. ART. 241 DO
CPM. 1. A preliminar de nulidade do interrogatório arguida pela DPU, em sede de
apelo do MPM, a pretexto de aplicação do art. 400 do CPP, com redação imposta
pela Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008, não encontra amparo na jurisprudência
do Superior Tribunal Militar, em face do princípio da especialidade do direito penal
militar. Aplicação da Súmula nº 15/STM. Rejeitada por unanimidade. 2. Conduta
moldada na apropriação temporária de arma com devolução em ato contínuo. Ma-
terialidade e autoria confessadas no interrogatório. Acervo probatório harmônico.
Desclassificação para o crime de furto de uso por adequação ao tipo do art. 241 do
CPM. Provimento parcial. Decisão majoritária. (STM; APL 63-87.2014.7.01.0301;
RJ; Rel. Min. Cleonilson Nicácio Silva; DJSTM 04/09/2015)
77/261 — PACIENTE PRESO EM FLAGRANTE E ULTERIORMENTE DE-
NUNCIANDO PELA PRÁTICA, EM TESE, DO CRIME DE FEMINICÍDIO. PRISÃO
EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. PLEITO LIBERTÁRIO INTER-
POSTO PELA DEFESA QUE RESTOU INDEFERIDO. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA
QUE ALEGA AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO E DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA
NO DECISUM, ALÉM DE EXCESSO DE PRAZO. 1. In casu, o fato de reconhecer
que o delito cuja prática em tese se imputa ao acusado é extremamente grave, as-
606 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

sim como também inapagável suas desastrosas consequências, a despeito de não


autorizar, de per si, a decretação da prisão cautelar do suposto agente, deveria ter
servido para que a douta autoridade coatora fosse mais atenta e zelosa ao exercer seu
múnus, mas não o foi. Ao exarar seu decisum fê-lo de forma desfundamentada, ao
arrepio do disposto no art. 93, IX, da Constituição da República. 2. Como assente, a
segregação cautelar não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação,
mas destina-se a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo
penal. Outrossim, o Estado Democrático exige que a atuação do aplicador do direito
esteja em consonância com as normas constitucionais. 3. No caso em apreço, a douta
autoridade coatora, ao indeferir o pleito libertário, fez uso da motivação per relatio-
nem, que é aceita na jurisprudência pátria. Contudo, olvidou-se que o decisum ao
qual se reportou havia sido exarado ao arrepio do disposto no sobredito dispositivo
constitucional. 4. Ademais disso, visando alicerçar o decreto, utilizou-se também do
argumento do “temor público” e do “aumento do índice de violência”, que, como
assente, também se mostram imprestáveis para os fins almejados. Utilizá-los, como
fez o magistrado de piso, como fundamento para a constrição cautelar da liberdade é
aniquilar postulados constitucionais, destacadamente da liberdade, da presunção da
inocência e da motivação das decisões. 5. Destarte, ante a falta de motivação idônea
para lastrear a decretação da custódia cautelar do ora paciente, lamentavelmente, al-
ternativa outra não tem esta instância que não seja a de relaxá-la. 6. Constrangimento
ilegal configurado. Ordem que se concede. (TJRJ; HC 0054178-69.2015.8.19.0000;
7ª C.Crim.; Relª Desª Maria Angelica Guimarães Guerra Guedes; DORJ 29/10/2015)
77/262 — PAD. PROVAS ILÍCITAS POR DERIVAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA.
PRESCRIÇÃO. INOVAÇÃO RECURSAL. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
A declaração de nulidade de interceptação eletrônica não gera a nulidade dos ele-
mentos probatórios colhidos nos mesmos autos que possam ser obtidos por fonte
independente, por se tratar de provas autônomas, tal como se dá com autos de fis-
calização conduzidos pelo impetrante como auditor da Receita Federal. Não há que
se falar em aplicação do prazo prescricional penal às infrações administrativas se a
condenação no processo disciplinar não se deu em razão da prática de atos confi-
guradores de conduta criminosa. No caso, a correlação entre as condutas apuradas
pela comissão e as infrações penais “prevaricação” e “advocacia administrativa”
são feitas apenas pelo próprio impetrante, não tendo constado das conclusões da
comissão processante. Inexiste omissão na decisão agravada em que se apreciam
as alegações devolvidas no recurso ordinário sem se avançar na análise de matérias
que importam em inovação recursal. Agravo não provido. (STF; RMS-AgR 31.767;
DF; 2ª T.; Rel. Min. Dias Toffoli; DJE 21/10/2015; p. 64)
77/263 — PENA. CUMPRIMENTO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM
REGIME SEMIABERTO. Superveniência de condenação à pena restritiva de direitos.
Incompatibilidade de cumprimento simultâneo das reprimendas. Unificação, de rigor.
Conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade. Art. 111, parágrafo
único, da Lei nº 7.210/84. Inaplicabilidade do art. 76 do Código Penal. Precedente do
STJ. Recurso desprovido. (TJSP; AG-ExPen 0001592-27.2015.8.26.0496; Ac. 8761835;
7ª C.D.Crim.; Rel. Des. Alberto Anderson Filho; DJESP 04/09/2015)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 607

77/264 — PENA. REGIME SEMIABERTO. PRISÃO DOMICILIAR. MONI-


TORAÇÃO ELETRÔNICA. REQUISITOS. AUSÊNCIA. A prisão domiciliar para o
condenado ao cumprimento da pena em regime semiaberto está restrita às hipóteses
previstas na lei, devendo ser reformada a decisão que a concede se a situação não
está contemplada na norma. A fiscalização do preso em regime semiaberto por
meio de monitoração eletrônica se limita às situações de saída temporária e pri-
são domiciliar, desde que estas preencham os requisitos da lei. (TJAC; AgExecPen
0800086-76.2015.8.01.0011; Ac. 19.692; C.Crim.; Rel. Des. Samoel Evangelista; DJAC
29/10/2015; p. 44)
77/265 — PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE. LEI MARIA DA PENHA.
MEDIDA PROTETIVA. DESNECESSIDADE. De acordo com o que estabelece o art.
19, § 1º, da Lei nº 11.340/06, é possível o deferimento imediato de medidas prote-
tivas de urgência, independentemente de audiência das partes, contudo, o pedido,
por si só, não enseja a concessão da medida. Do relato da ofendida não se evidencia
risco à sua segurança que justifique a concessão da medida. Ao que tudo indica,
tratou-se de evento circunstancial, que, embora comporte apuração nas esferas
competentes, não demanda a aplicação de medidas protetivas da Lei nº 11.340/06.
Apelação desprovida. (TJRS; ACr 0363639-21.2014.8.21.7000; 7ª C.Crim.; Rel. Des.
Carlos Alberto Etcheverry; DJERS 04/09/2015)
77/266 — PRESCRIÇÃO. MARCO INTERRUPTIVO. ART. 117, IV, DO CP.
SENTENÇA OU ACÓRDÃO CONDENATÓRIOS. 1. O acórdão confirmatório da
condenação não constitui marco interruptivo da prescrição. Precedentes. 2. Agravo

EMENTÁRIO
regimental improvido. (STJ; AgRg-REsp 1.028.615; Proc. 2008/0019966-3; RS; 6ª T.;
Rel. Min. Nefi Cordeiro; DJE 08/09/2015)
77/267 — PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PENAL. FURTO PRIVILEGIA-
DO. FURTO QUALIFICADO. TENTATIVA. 1. Um fato é penalmente insignificante

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


quando, para os personagens nele envolvidos ou para a comunidade que o recepciona,
nada de mais expressivo representou em suas vidas ou em suas preocupações. Nesse
sentido, a régua com que se há de medir essa grandeza não é, necessariamente, aquela
da avaliação simplesmente econômica e material, importando, e muito, as circuns-
tâncias com que o bem concretamente foi exposto e a dimensão efetiva do conflito
social daí decorrente. 2. A versão privilegiada não é tecnicamente incompatível com
as versões qualificadas do furto. Aliás, imperioso registrar o atual entendimento do
Superior Tribunal de Justiça reafirmando a possibilidade de aplicação do privilégio
em casos de furto qualificado, desde que presentes os requisitos legais (Súmula nº
511). (TJSP; APL 0095276-25.2011.8.26.0050; Ac. 8700175; 12ª C.D.Crim.; Rel. Des.
Sérgio Mazina Martins; DJESP 01/09/2015)
77/268 — PRISÃO DOMICILIAR CONCEDIDA NA ORIGEM. IRRESIG-
NAÇÃO MINISTERIAL. Adolescente filha da apenada supostamente exposta à
situação de risco. Hipótese não prevista na legislação. Ausência de comprovação da
imprescindibilidade da presença da apenada para proteção da adolescente. Excepcio-
nalidade não demonstrada. Prisão domiciliar cassada. Recurso provido. (TJSC; AG
2015.039019-4; 2ª C.Crim.; Relª Desª Salete Silva Sommariva; DJSC 08/09/2015; p. 404)
608 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

77/269 — PROGRESSÃO DE REGIME. SEGUNDA PROGRESSÃO. INSUR-


GÊNCIA DEFENSIVA. UTILIZAÇÃO DE FRAÇÃO PARA PROGRESSÃO DE REGI-
ME EM 1/6. IMPOSSIBILIDADE. O REQUISITO TEMPORAL PARA A PROGRESSÃO
DE REGIME NOS CASOS DE CRIMES HEDIONDOS É O CUMPRIMENTO DE 2/5
DA PENA PARA RÉUS PRIMÁRIOS E 3/5 DA PENA PARA RÉUS REINCIDENTES,
INDEPENDENTEMENTE DO NÚMERO DE PROGRESSÕES JÁ CONCEDIDAS.
1. Para a concessão da progressão de regime a reeducandos condenados por crimes
hediondos, deve-se ter cumprido 2/5 da pena, se o réu é primário, e 3/5 da pena, se
o réu é reincidente, independentemente da quantidade de progressões concedidas.
2. Impossível se aplicar a fração de 1/6 para a segunda progressão da pena, nos
casos de crimes hediondos, por ausência de previsão legal. 3. Agravo a que se nega
provimento. (TJAC; AG-ExPen 0005301-96.2015.8.01.0001; Ac. 19.149; C.Crim.; Rel.
Des. Francisco Djalma; DJAC 02/09/2015; p. 40)
77/270 — PROGRESSÃO DE REGIME CONCEDIDA. PROCESSO ADMI-
NISTRATIVO DISCIPLINAR EM ANDAMENTO. INSURGÊNCIA MINISTERIAL.
REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS DO BENEFÍCIO PREENCHIDOS. IM-
POSSIBILIDADE DE UTILIZAR PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM
ANDAMENTO PARA IMPEDIR A PROGRESSÃO DE REGIME. 1. A pendência de
processos administrativos disciplinares por cometimento de faltas graves não pode
ser usada para impedir a progressão de regime. 2. Agravo a que se nega provimento.
(TJAC; AG-ExPen 0800947-92.2015.8.01.0001; Ac. 19.156; C.Crim.; Rel. Des. Francisco
Djalma; DJAC 02/09/2015; p. 42)
77/271 — PROGRESSÃO PARA O REGIME SEMIABERTO. REQUISITOS
ATENDIDOS. TRABALHO EXTERNO E SAÍDAS TEMPORÁRIAS. BENEFÍCIOS
NÃO RECOMENDADOS PELO EXAME CRIMINOLÓGICO. RECURSO PROVIDO
EM PARTE. 1. Se o reeducando é primário, sem antecedentes, já cumpriu metade
da pena que lhe foi aplicada, sem nenhum ato de indisciplina, está a merecer a
transferência a regime prisional mais brando. 2. Lado outro, considerando que o
exame criminológico atesta não ser recomendável sua volta à sociedade sem prévio
acompanhamento psiquiátrico e sem as medidas que permitam o resgate de suas
relações familiares, permanecem indeferidos os benefícios do trabalho externo e
das saídas temporárias, até que haja parecer favorável a respeito. 3. Recurso provido
em parte. (TJMG; AG-ExcPen 1.0481.13.012221-3/001; 4ª C.Crim.; Rel. Des. Eduardo
Brum; DJEMG 08/09/2015)
77/272 — PRONÚNCIA. HOMICÍDIO. IMPRONÚNCIA. MATERIALIDADE
E INDÍCIOS DE AUTORIA. SUFICIÊNCIA. INCOMPORTABILIDADE. PARTICIPA-
ÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. MOTIVO FÚTIL. RECURSO QUE DIFICULTOU
OU TORNOU IMPOSSÍVEL A DEFESA DA VÍTIMA. EXCLUSÃO. INCOMPOR-
TABILIDADE. 1. Havendo prova da materialidade e indícios sérios que delineiam a
autoria do crime de homicídio duplamente qualificado, inviável nesta fase analisar
qualquer questão de mérito em relação à conduta dos agentes, que deve ser analisada
pelos jurados, sob pena de suprimir a competência do Tribunal do Júri, afastando-se,
com isso, a possibilidade de impronúncia. 2. A participação de menor importância
do agente na empreitada criminosa (art. 29, § 1º, do CP) é matéria afeta ao crivo dos
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 609

jurados e aplicada à dosimetria da pena, realizada na hipótese de condenação pelo


Conselho de Sentença. 3. A exclusão de qualificadora, em sede de pronúncia, exige
elementos de prova capazes de indicá-las como manifestamente improcedentes. A
existência de indícios de que os autores agiram de surpresa, sem possibilitar à víti-
ma qualquer defesa, e manifesta a desproporção entre o motivo e a extrema reação
homicida, circunstância que configura a qualificadora do motivo fútil, estas bastam
para viabilizar a apreciação das qualificadoras pelo Tribunal popular. 4. Recurso
conhecido e desprovido. (TJGO; RSE 0432511-03.2012.8.09.0078; 1ª C.Crim.; Rel.
Des. Nicomedes Domingos Borges; DJGO 04/09/2015; p. 420)
77/273 — PRONÚNCIA. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO RECURSO QUE
IMPOSSIBILITOU OU DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. RECURSO DA DEFESA
POSTULANDO EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA. NULIDADE DA SENTENÇA DE
PRONÚNCIA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA
E REVOGAÇÃO DO DECRETO DE PRISÃO PREVENTIVA. 1. Não é a dificuldade
ou a impossibilidade de exercitar defesa pela vítima que qualifica o homicídio pelo
modo de execução, mas a ação insidiosa do réu, tipificada na traição, na emboscada,
na dissimulação ou em outro recurso análogo. 2. Recurso parcialmente provido para
afastar a qualificadora; desprovidos os outros pleitos nos termos do voto da relatora;
parecer acolhido em parte. (TJGO; RSE 0361280-38.2014.8.09.0047; 2ª C.Crim.; Relª
Desª Carmecy Rosa Maria A. de Oliveira; DJGO 28/10/2015; p. 302)
77/274 — PROVA ORAL GRAVADA EM MEIO AUDIOVISUAL. APELAÇÃO.
MINISTÉRIO PÚBLICO. PEDIDO DE CONVERSÃO EM DILIGÊNCIA PARA DE-

EMENTÁRIO
GRAVAÇÃO. INDEFERIMENTO PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CERCEAMENTO
DE DEFESA. ART. 405, § 2º, DO CPP. PRINCÍPIO DA CELERIDADE PROCESSUAL.
RECURSO IMPROVIDO. 1. Não se verifica cerceamento de defesa no indeferimento
do pleito formulado pela Procuradoria de Justiça, de conversão do julgamento em

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


diligência, para degravação de prova oral, consoante se extrai do art. 405, § 2º, do
Código de Processo Penal, segundo o qual os registros por meio audiovisual não
requerem a respectiva transcrição. 2. O Superior Tribunal de Justiça possui entendi-
mento pacífico no sentido de que a busca da celeridade na prestação jurisdicional é
hoje imperativo constitucional, estabelecido no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constitui-
ção da República, segundo o qual “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade
de sua tramitação”. No caso, a decisão recorrida, ao não determinar a degravação e
a transcrição dos depoimentos orais registrados em meio audiovisual alinhou-se ao
espírito da referida norma constitucional (RMS 32.818/MT, Relª Minª Laurita Vaz,
Quinta Turma, j. 20.03.2012, DJe 29.03.2012). 3. Recurso improvido. (STJ; RMS
34.866; Proc. 2011/0131345-8; MT; 6ª T.; Rel. Min. Néfi Cordeiro; DJE 29/10/2015)
77/275 — RECLAMAÇÃO. RECEBIMENTO DE DENÚNCIA NA JUSTIÇA
DE PRIMEIRO GRAU. CONEXÃO E CONTINÊNCIA COM DELITOS APURA-
DOS PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPUTAÇÃO DE CRIME
À AUTORIDADE DETENTORA DE FORO PRIVILEGIADO. INOCORRÊNCIA.
POSTERIOR CISÃO DAS INVESTIGAÇÕES POR DETERMINAÇÃO DO STF.
AUSÊNCIA DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DESTA CORTE. 1. Ao apreciar
610 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

questão de ordem suscitada nas Ações Penais 871-878, em 10.06.2014, a Segunda


Turma desta Corte assentou que “as normas constitucionais sobre prerrogativa de
foro devem ser interpretadas restritivamente, o que determina o desmembramento
do processo criminal sempre que possível, mantendo-se sob a jurisdição especial,
em regra e segundo as circunstâncias de cada caso, apenas o que envolva autorida-
des indicadas na Constituição”. 2. A denúncia recebida pelo juízo reclamado não
noticiava a participação de qualquer autoridade com foro por prerrogativa de função,
não descrevendo condutas imputáveis, diretamente ou por conexão necessária, a
qualquer delas. 3. Apenas quatro dias após o recebimento da peça acusatória pelo
juízo reclamado, decisão proferida por esta Corte, nos autos das Pets 5.210 e 5.245,
acolheu manifestação do Procurador-Geral da República, dominus litis, para deferir
“os requerimentos de cisão processual, mantendo-se no Supremo Tribunal Federal
aqueles termos em que figurem detentores de prerrogativa de foro correspondente
(item VII, h), com remessa dos demais aos juízos e Tribunais indicados”. Portanto,
o próprio STF reconheceu, ainda que posteriormente ao recebimento da denúncia,
que o juízo reclamado era competente para julgar os crimes noticiados na peça
acusatória. 4. Não demonstração de persecução, pelo juízo reclamado, da prática de
atos violadores da competência do Supremo Tribunal Federal. 5. Agravo regimental
a que se nega provimento. (STF; Rcl-AgR 21.520; PR; 2ª T.; Rel. Min. Teori Zavascki;
DJE 20/10/2015; p. 42)
77/276 — RECLAMAÇÃO AJUIZADA PERANTE ESTE SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL (CF, ART. 102, I, L). EXECUÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDA-
DE. REMIÇÃO. COMETIMENTO DE FALTA GRAVE. PERDA DOS DIAS REMI-
DOS. RECEPÇÃO DO ART. 127 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL (NA REDAÇÃO
DADA PELA LEI Nº 12.433/2011) PELA VIGENTE ORDEM CONSTITUCIONAL.
SÚMULA VINCULANTE Nº 09/STF. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
IMPUGNAÇÃO RECURSAL. Pretendida nulidade processual supostamente motivada
pela ausência de remessa dos autos à Procuradoria-Geral da República para vista
(RISTF, art. 160). É dispensável o encaminhamento do processo à Procuradoria-
Geral da República, para parecer, se esta, em causas anteriores, já se pronunciou,
definitivamente, sobre idêntica controvérsia jurídica. Em ocorrendo tal situação,
a ausência de pronunciamento do Ministério Público não constituirá hipótese de
nulidade processual. Precedentes. Procedimento autorizado pelo art. 52, parágrafo
único, do RISTF. Ausência, ademais, de comprovação de prejuízo para o agravante.
Pas de nullité sans grief. Legitimação ativa ad causam do Ministério Público Estadual
para ajuizar reclamação, em sede originária, perante esta Corte Suprema. Recurso
de agravo improvido. (STF; Rcl-AgR 9290; SP; 2ª T.; Rel. Min. Celso de Mello; DJE
01/09/2015; p. 48)
77/277 — RECONVERSÃO DE PENA RESTRITIVA DE DIREITOS EM PRIVA-
TIVA DE LIBERDADE. DESCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO DA ALTERNATIVA.
POSSIBILIDADE. Se o condenado descumpre as regras impostas pelo juízo, no to-
cante ao modo de cumprimento da sanção substitutiva, a reconversão é imperativa.
Recurso não provido. (TJSP; AG-ExPen 7000033-61.2015.8.26.0189; Ac. 8716107;
15ª C.D.Crim.; Rel. Des. Willian Campos; DJESP 08/09/2015)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 611

77/278 — RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE TRÂNSITO. ART.


306 DA LEI Nº 9.503/97. RECORRIDO PARADO NA CHAMADA BLITZ DA LEI
SECA, VOLUNTARIAMENTE SUBMETIDO AO EXAME DO ETILÔMETRO, TAM-
BÉM CONHECIDO COMO BAFÔMETRO, SENDO DENUNCIADO POR CON-
DUZIR VEÍCULO AUTOMOTOR EM VIA PÚBLICA COM CONCENTRAÇÃO DE
ÁLCOOL SUPERIOR AO LIMITE LEGAL PERMITIDO. DENÚNCIA REJEITADA
SOB O FUNDAMENTO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NECESSÁRIA À PRO-
POSITURA DA AÇÃO PENAL. RECURSO MINISTERIAL NO SENTIDO DE SER
RECEBIDA A DENÚNCIA. IMPROVIMENTO DO RECURSO. 1. No caso em exame,
o recorrido foi preso em flagrante no dia 17 de junho de 2014 durante blitz da polícia
militar, denominado Lei Seca, realizada na Avenida Epitácio Pessoa, na lagoa, após
submeter-se ao teste do etilômetro, o qual registrou concentração de álcool por litro
de sangue superior ao permitido em lei. 2. A peça de denúncia em nenhum momento
trouxe como ponto válido a ocorrência de um perigo concreto, pautando-se nesse
contexto fático a assertiva de uma evidente ausência de justa causa. 3. Assim, o que
se compreende, não há elementos que cunhariam na ótica de se autorizar o pros-
seguimento dessa ação penal. Dessa forma, o que é possível, então, delinear como
infração, não na esfera penal, evidentemente, mas, sim, na esfera administrativa, é
a conduta adotada pelo recorrido, que se firma prevalente sob a égide da norma do
art. 165 do Código de Trânsito Brasileiro. 4. Exatamente à sombra desse contexto é
que se fez definida a convicção deste relator, posta na conclusão de que a hipótese
se enquadra exatamente numa situação viciosa e fora da esfera penal, apta, portanto,
a não justificar o prosseguimento da ação penal proposta pelo Ministério Público.

EMENTÁRIO
5. Nossos Tribunais e doutrinadores se posicionam em dar a máxima efetividade à
norma penal em estudo, procedendo a uma interpretação sistemática e conforme a
Constituição, que não admite a incrementação de condutas que não afetem qualquer
bem jurídico (nulla lex poenalis sine injuris). 6. Na moderna teoria da tipicidade,

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


não se concebe mais a mera subsunção do fato à tipicidade formal (tipo descrito em
lei), é preciso verificar se há tipicidade também sob o aspecto material, ou seja, se
houve ofensa ao bem juridicamente tutelado (lesividade), que, no caso em tela, é
a segurança viária. 7. Apenas para argumentar, a estatística reflete a diminuição de
acidentes, logo depois de sancionada a Lei, que foi batizada de Lei Seca, demonstra
tão somente pelo simples fato de que, anteriormente, a fiscalização praticamente
não existia e, a partir da publicação dessa norma jurídica mencionada, a fiscalização
passou a ser constante. Ademais, o bafômetro não mede o nível de álcool no sangue,
mas, sim, o metabolismo do álcool nos pulmões, o que, por si só, já vai de encontro
ao princípio da legalidade. Tal afirmação é corroborada por especialistas no assunto.
8. Conforme estudo do professor Jéferson Oliveira da Silva, da Unirio, na cadeira de
bioquímica, pesquisador da fundação Oswaldo Cruz na área de toxicologia, e perito-
legista no instituto médico legal, em brilhante depoimento prestado nos autos do
Processo 2009.001.085569-1, onde RSE 0208086-80.2014.8.19.0001, Des. Sidney
Rosa da Silva, TJRJ, Sétima Câmara Criminal, informou que “o teste do bafômetro,
isoladamente, não é suficiente para determinar a embriaguez, porque este teste mede
o produto de transformação do álcool, sem o álcool estar presente, ainda”. O citado
professor esclarece também que “o jejum prolongado ou o diabetes não tratado
612 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

podem dar positividade no teste do bafômetro”. 9. Saliente-se que várias questões


jurídicas foram devidamente registradas e em cada uma delas foi dado conta de que
a regra jurídica encampada no disposto do art. 306 da Lei nº 9.503/97 não comporta
efetivamente apenas uma alegação de que o aparelho medidor tem o condão exato
de dizer e desdizer que pessoas estariam sob o vínculo titularizado de alcoolemia.
10. Do presquestionamento. Não merece conhecimento e tampouco provimento eis
que não se vislumbra nenhuma contrariedade/negativa de vigência, ou interpretação
de norma violadora nem a demonstração de violação de artigos constitucionais, in-
fraconstitucionais, de caráter abstrato e geral. 11. Recurso conhecido e improvido.
(TJRJ; RSE 0208086-80.2014.8.19.0001; 7ª C.Crim.; Rel. Des. Sidney Rosa da Silva;
DORJ 13/10/2015)
77/279 — RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. MPM. PATROCÍNIO INDÉBI-
TO. ART. 334 DO CPM. MATERIALIDADE DO DELITO. INDÍCIOS DE AUTORIA
DEMONSTRADOS. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE. EXISTINDO
PROVA DE FATO QUE CONSTITUA CRIME E INDÍCIOS DE QUEM O COME-
TERA, DEVE SER APRESENTADA A DENÚNCIA, CONFORME DETERMINA O
ART. 30 DO CPPM. DEVE, POIS, O JUIZ, AO SE DEPARAR COM A CERTEZA DA
OCORRÊNCIA DO ILÍCITO E COM OS INDÍCIOS DA SUA AUTORIA, RECEBER
A EXORDIAL. NESSA FASE DE ADMISSÃO DA ACUSAÇÃO VIGE O PRINCÍPIO
DO IN DUBIO PRO SOCIETATE. In casu, tanto a materialidade do delito como os
indícios da sua autoria foram suficientemente demonstrados na fase de inquérito,
de modo a permitir a deflagração da ação penal proposta. Apelo ministerial provido.
Decisão por unanimidade. (STM; RSE 114-86.2014.7.02.0102; SP; Rel. Min. Alvaro
Luiz Pinto; DJSTM 21/10/2015)
77/280 — ROUBO CIRCUNSTANCIADO. TERCEIRA FASE DA DOSIME-
TRIA. MAJORAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CRITÉRIO QUANTITATIVO.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. REGIME INICIAL FECHADO.
FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE. ILEGALIDADE. ORDEM CONCEDIDA
DE OFÍCIO. 1. O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo
circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua
exasperação a mera indicação do número de majorantes. Súmula nº 443 do STJ. 2. As
instâncias ordinárias não apontaram nenhum elemento dos autos (modus operandi,
por exemplo) que efetivamente evidenciasse real necessidade de exasperação da pena,
na terceira fase da dosimetria, no patamar estabelecido. 3. Para a escolha do regime
prisional devem ser observadas as diretrizes dos arts. 33 e 59, ambos do Código
Penal, além dos dados fáticos da conduta delitiva que, se demonstrarem a gravidade
concreta do crime, poderão ser invocados pelo julgador para a imposição de regime
mais gravoso do que o permitido pelo quantum da pena. 4. As instâncias de origem
entenderam devida a fixação do regime inicial fechado de cumprimento de pena tão
somente pela gravidade abstrata do delito de roubo, bem como pela suposição de
que o crime “indica a periculosidade do agente que o pratica, identificando-o como
sendo astuto, cruel, agressivo e preparado para não só atingir o patrimônio da vítima
como também de ceifar-lhe a vida”. Não apontaram, no entanto, nenhum elemento
concreto dos autos (como o modus operandi, a potencialidade lesiva de arma ou a
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 613

desfavorabilidade de circunstâncias judiciais) que efetivamente justificasse a fixação


do regime inicial mais gravoso, nos termos do art. 33, § 3º, do Código Penal. Ressalva
do relator. 5. Ausência de peculiaridades específicas do roubo majorado nulifica a
imposição de regime prisional mais gravoso, por violação dos enunciados das Sú-
mulas ns. 440 do STJ e 718 e 719 do STF. 6. Habeas corpus não conhecido. Ordem
concedida, de ofício, para reduzir ao mínimo legal o aumento efetuado na terceira
etapa da dosimetria, com a readequação da pena final, e fixar o regime semiaberto,
confirmando-se os efeitos da liminar anteriormente deferida. (STJ; HC 283.308; Proc.
2013/0392057-1; SP; 6ª T.; Rel. Min. Rogério Schietti Cruz; DJE 08/09/2015)
77/281 — ROUBO COM FACA E CONCURSO DE AGENTES. RECURSO
DA DEFESA PLEITEANDO A ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVA.
ALTERNATIVAMENTE, REQUER O AFASTAMENTO DA MAJORANTE DA ARMA
E O RECONHECIMENTO DA TENTATIVA. 1. Impossibilidade. Palavra da vítima.
Prova firme. 2. Na hipótese, a faca utilizada pelo recorrente para ameaçar a vítima
para entregar o celular representa inegavelmente uma ameaça grave e a toda evidência
é um artefato que, por sua natureza, possui notória capacidade lesiva, podendo ser
considerada arma imprópria, justificando a configuração da majorante. 3. De igual
modo, não assiste razão à defesa quando pede que seja reconhecida a tentativa, pois,
além dos meliantes terem fugido e chegado a sair da esfera de vigilância da vítima,
a mesma não conseguiu recuperar qualquer de seus pertences, eis que apenas o réu
foi detido e seus bens estavam em poder do outro elemento. Dessa forma, o crime
restou consumado. Recurso desprovido. (TJRJ; APL 0203656-85.2014.8.19.0001; 4ª
C.Crim.; Rel. Des. João Ziraldo Maia; DORJ 01/09/2015)

EMENTÁRIO
77/282 — ROUBO DE AUTOMÓVEL MAJORADO PELO CONCURSO DE
AGENTES E EMPREGO DE SIMULACRO DE ARMA DE FOGO. Pacientes primá-
rios, sem quaisquer antecedentes policiais ou judiciais e que possuem 19 e 23 anos

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


de idade, respectivamente. Ausência de violência real e periculosidade que permite
a substituição da prisão preventiva pelas medidas cautelares previstas no art. 319,
incisos I, III e IV, do Código de Processo Penal. Ordem parcialmente concedida.
(TJRS; HC 0295264-31.2015.8.21.7000; 5ª C.Crim.; Relª Desª Genacéia da Silva Al-
berton; DJERS 04/09/2015)
77/283 — ROUBO DUPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO. TERCEIRA FASE
DA DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DE FRAÇÃO SUPERIOR A 1/3. FUNDAMENTA-
ÇÃO CONCRETA. ENUNCIADO Nº 443 DA SÚMULA DO STJ. NÃO APLICAÇÃO.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA PARA A FIXAÇÃO DE REGIME
INICIAL MAIS GRAVOSO. ENUNCIADOS NS. 440 DA SÚMULA DO STJ E 718 E
719 DA SÚMULA DO STF. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. CONCESSÃO
DA ORDEM, DE OFÍCIO, PARA FIXAR O REGIME INICIAL SEMIABERTO. O
Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribu-
nal Federal, passou a não admitir o conhecimento de habeas corpus substitutivo de
recurso previsto para a espécie. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na
inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão
da existência de eventual coação ilegal. Nos termos do disposto no Enunciado nº
443 da Súmula desta Corte, “o aumento na terceira fase de aplicação da pena no
614 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente


para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes”. Na hipótese,
o aumento da pena em fração superior ao mínimo, em razão da incidência de duas
majorantes, decorreu de peculiaridades concretas do crime – três agentes envolvidos
na empreitada criminosa e a utilização de armas variadas. Em tais condições, fica
afastada a aplicação do Enunciado nº 443 da Súmula desta Corte. Segundo o Enun-
ciado nº 440 da Súmula desta Corte, “fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado
o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da
sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito”. No caso, fixada
a pena-base no mínimo legal, a determinação de regime inicial mais gravoso não
está lastreada em fundamentação idônea. Habeas corpus não conhecido. Concessão
da ordem, de ofício, para fixar o regime inicial semiaberto. (STJ; HC 321.553; Proc.
2015/0088496-4; SP; 5ª T.; Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca; DJE 08/09/2015)
77/284 — ROUBO MAJORADO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INA-
PLICABILIDADE. VALOR SIGNIFICANTE DO BEM SUBTRAÍDO. ATENUANTE
GENÉRICA DO ART. 66 DO CÓDIGO PENAL. NÃO RECONHECIMENTO. RE-
CORRER EM LIBERDADE. NÃO CABIMENTO. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM.
FUNDAMENTAÇÃO ARROLADA NA LEI PROCESSUAL PENAL. GARANTIA DA
ORDEM PÚBLICA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. O
princípio da insignificância tem aplicabilidade quando a conduta do agente produz
lesão ou perigo de lesão de pouco ou nenhuma importância, o que não se verifica
no caso de crime de roubo, que atinge não somente o patrimônio como também
a integridade física e psíquica da vítima. A dificuldade financeira enfrentada pelo
agente, bem como as situações pessoais vividas pelo mesmo, não autoriza a aplicação
da atenuante genérica prevista no art. 66 do Código Penal, em virtude da gravida-
de do crime perpetrado. É perfeitamente admissível a técnica de fundamentação
denominada per relationem, pela qual o magistrado faz remissão aos fundamentos
utilizados em manifestação das partes, precedentes ou mesmo em decisão anterior
proferida no mesmo feito. Se das circunstâncias em que foi perpetrado o crime pode-
se aferir sua periculosidade e a decisão que decretou a prisão preventiva reconhece a
existência dos pressupostos da referida cautelar, a decisão se reveste de legalidade. As
condições pessoais do paciente, se favoráveis, por si só, não lhe garantem o direito
à liberdade provisória. (TJMG; APCR 1.0452.14.005009-0/001; 4ª C.Crim.; Rel. Des.
Júlio Cezar Guttierrez; DJEMG 08/09/2015)
77/285 — SAÍDA ESPECIAL. CÔMPUTO DA PENA. O período em que o
apenado permaneceu com o benefício excepcional deverá ser computado como pena
cumprida. Agravo provido. (TJRS; AG 0276938-23.2015.8.21.7000; 5ª C.Crim.; Relª
Desª Genacéia da Silva Alberton; DJERS 03/09/2015)
77/286 — SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO MULTIMÍDIA. TRANSMISSÃO
IRREGULAR DE SINAL DE INTERNET A TERCEIROS VIA RADIOFREQUÊNCIA.
CARACTERIZAÇÃO COMO SERVIÇO DE TELECOMUNICAÇÃO SUSCETÍVEL DE
AUTORIZAÇÃO DA ANATEL. SUBSUNÇÃO DA CONDUTA DO DENUNCIADO
AO DISPOSTO NO ART. 183 DA LEI Nº 7.492/97. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O
CRIME DO ART. 70 DA LEI Nº 4.117/62. IMPOSSIBILIDADE. LEGALIDADE NA
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 615

DOSIMETRIA DA PENA. APELAÇÃO IMPROVIDA. 1. Sentença que condenou o


réu às penas de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de reclusão e à multa de R$ 10.000,00
(dez mil reais), pela prática do delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, pela
captação de sinal de internet via rádio para retransmiti-lo a terceiros como provedor
de acesso mediante pagamento, sem devida autorização e licenciamento por parte
da Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel. 2. Em se tratando de serviço
público cuja exploração é atribuída à União, conforme o disposto no art. 21, XI,
da CF/88, a prática de atividade de telecomunicação sem a devida autorização dos
órgãos públicos competentes, a conduta do acusado subsume-se, ao menos em
tese, para à conduta típica prevista no art. 183 da Lei nº 9.472/97. 3. Presença do
elemento subjetivo do delito e da plena consciência da ilicitude de sua conduta,
ao instalar e manter em funcionamento antenas de sinais para permitir acesso in-
tegral à internet a seus clientes, de forma indevida, criando uma rede externa de
nível superior, que necessitaria de autorização da Anatel, por repetidas vezes. 4.
Impossibilidade de desclassificação do crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97 para o
crime do art. 70 da Lei nº 4.117/62. A jurisprudência do eg. Superior Tribunal de
Justiça firmou entendimento no sentido de que a exploração clandestina e habitual
de atividades de telecomunicações, entendida esta como o uso de radiofrequência
sem a devida concessão, permissão ou autorização, constitui conduta tipificada no
art. 183 da Lei nº 9.472/97, exigindo para a consumação do delito a habitualidade
da conduta, ao passo que o delito previsto no art. 70 da Lei nº 4.117/62 define como
crime a instalação ou à utilização de telecomunicações previamente autorizada, sem
observância das prescrições legais e regulamentares, não se exigindo para tanto a

EMENTÁRIO
habitualidade. 5. Inexistência de exorbitância na fixação da pena em 2 (dois) anos
e 9 (nove) meses de reclusão, acrescida da multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais)
como determinado na lei. A pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) imposta
ao apelante é definida em lei (art. 183 da Lei nº 9.472/97), em valor fixo, não ha-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


vendo possibilidade de redução em face da ausência de previsão legal. 6. Apelação
improvida. (TRF 5ª R.; ACR 0002481-12.2011.4.05.8200; PB; 3ª T.; Rel. Des. Fed. Cid
Marconi; DEJF 28/10/2015; p. 64)
77/287 — TRÁFICO DE DROGAS. ABSOLVIÇÃO E DESCLASSIFICAÇÃO
MANTIDAS. 2º RECURSO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO CONFIGURA-
DO. 3º APELO. TRÁFICO. IMPOSSIBILIDADE DE ABSOLVIÇÃO. DE OFÍCIO.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO. ABSOLVIÇÃO PELO PORTE DE UM CORRÉU.
RECEPTAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. 1. Não demons-
trada autoria e materialidade da traficância, impõe-se a absolvição. 2. Evidenciada
a posse para uso, imperiosa a desclassificação, de ofício, e manutenção quanto ao
corréu. 3. Configurado o porte ilegal de arma, impossível absolvição ou desclassifica-
ção. 4. Não comprovado o porte de arma quanto ao corréu, impositiva a absolvição,
de ofício. 5. Se preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, aplica-se a
substituição por restritiva de direitos, de ofício. Recursos desprovidos. (TJGO; ACr
0341718-68.2012.8.09.0029; 1ª C.Crim.; Rel. Des. Ivo Favaro; DJGO 29/10/2015; p. 382)
77/288 — TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº
11.343/06. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PENA FIXADA NO MÍNIMO LEGAL
616 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DE 5 (CINCO) ANOS. APLICAÇÃO DA MINORANTE DO § 4º DO ART. 33 DA


LEI DE DROGAS. PENA DEFINITIVA DE 1 (UM) ANO E 8 (OITO) MESES DE
RECLUSÃO. APELAÇÃO PROVIDA PARA RETIRAR A MINORANTE. FUNDA-
MENTO. PACIENTE DEDICADO AO TRÁFICO. GRANDE QUANTIDADE DE
ENTORPECENTE. PREMISSA NÃO CONDIZENTE COM A REALIDADE DOS
AUTOS. 25,80G (VINTE E CINCO GRAMAS E OITENTA CENTIGRAMAS) DE
COCAÍNA ACONDICIONADA EM 26 INVÓLUCROS. QUANTIDADE INAPTA A
INDUZIR À TRAFICÂNCIA REITERADA (FUNDAMENTO PARA DECOTAR A
MINORANTE). PRIMARIEDADE, BONS ANTECEDENTES, RESIDÊNCIA FIXA E
VÁRIOS REGISTROS DE EMPREGO NA CTPS. TRAFICANTE EVENTUAL MOVI-
DO PELAS CIRCUNSTÂNCIAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. WRIT CONTRA
DECISÃO MONOCRÁTICA. AUSÊNCIA DE AGRAVO REGIMENTAL. JURISDIÇÃO
NÃO EXAURIDA NO TRIBUNAL A QUO. NÃO CONHECIMENTO. ORDEM DE
HABEAS CORPUS CONCEDIDA DE OFÍCIO (ART. 654, § 2º, DO CPP). 1. A mens
legis extraída do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas consiste em punir com menor
rigor o pequeno e eventual traficante, ao possibilitar-lhe a redução da pena em até
2/3 (dois terços), de modo a distingui-lo do grande e contumaz traficante, a quem
cabe maior apenação. 2. In casu, os fatos e as provas são inequívocos; por isso, não
se trata de reexaminá-los, mas de proceder à correta revalorização para compreender
que a pequena quantidade de entorpecente (25,80g de cocaína, acondicionada em 26
invólucros), não autoriza presumir a dedicação do paciente ao tráfico, para caçar-lhe
a redução penal concedida na sentença, a fortiori em se tratando de réu primário, com
residência fixa e vários registros de emprego em carteira, impondo-se concluir que
se trata de crime isolado, o que lhe garante a aplicação da mencionada minorante. 3.
A diminuição operada pelo magistrado de primeiro grau, vale dizer por quem teve
estreito contato com as provas e com o réu, deve ser prestigiada, como sustentado,
a propósito, no parecer ofertado pelo órgão do Ministério Público federal oficiante
no Superior Tribunal de Justiça, que restou desacolhido. 4. A ausência de interposi-
ção de agravo regimental contra a decisão que negou seguimento ao writ implica o
não conhecimento da impetração, uma vez que não restou exaurida a jurisdição no
Tribunal a quo. 5. Habeas corpus não conhecido; ordem concedida, ex officio, com
fundamento no art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, para anular, no ponto,
o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, restabelecendo a causa de
diminuição da pena reconhecida na sentença. (STF; HC 129.466; SP; 1ª T.; Rel. Min.
Luiz Fux; DJE 16/10/2015; p. 35)
77/289 — TRÁFICO EM TRANSPORTE PÚBLICO. AUTORIA. PLEITO DES-
CLASSIFICATÓRIO QUE NÃO SE ACOLHE. NECESSIDADE DE TRAFICÂNCIA
NO COLETIVO. CONFISSÃO PARCIAL QUE NÃO FAZ INCIDIR A ATENUANTE.
PRIVILÉGIO. REINCIDÊNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO DE BIS IN IDEM. GRA-
TUIDADE. JUÍZO DA EXECUÇÃO. 1. Doutrina e jurisprudência estão há muito
consolidadas no sentido de que os depoimentos de policiais têm o mesmo valor
de qualquer outro testemunho, desde que aufiram credibilidade, e, na hipótese
vertente, ambos foram uníssonos em suas narrativas, afirmando, com absoluta
certeza, que o réu, ao ser preso em flagrante, admitiu que as drogas apreendidas
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 617

haviam sido adquiridas no Rio de Janeiro para ser revendidas, e não consumidas. 2.
Recentemente, as duas turmas do STF mudaram entendimento e decidiram que a
causa de aumento de pena sob enfoque (art. 40, III, da Lei nº 11.343/06) demanda
a venda ou entrega do entorpecente no veículo de transporte público, o que acabou
fazendo com que o STJ igualmente revisse seu posicionamento. 3. Não há que se
falar em aplicação da atenuante da confissão, eis que o réu, apesar de admitir estar
portando as drogas apreendidas, disse que estas seriam para seu próprio consumo,
o que se revelou falso. 4. O redutor buscado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06) só
pode incidir nos casos de criminosos primários, de bons antecedentes, que não se
dediquem a atividades criminosas, nem integrem organização criminosa, sendo certo
que o apelante é, assumidamente, reincidente, o que se comprova da FAC anexada
aos autos. 5. Essa reincidência foi considerada na segunda etapa da dosimetria como
agravante genérica e na terceira como impeditivo para o reconhecimento da causa
especial de diminuição, o que não importa em bis in idem, mas, sim, na utilização
de um mesmo parâmetro de referência em momentos e finalidades distintos. 6. O
pleito de gratuidade deve ser formulado junto ao juízo da execução, conforme inteli-
gência da Súmula nº 74 de nosso e. Tribunal. Desprovimento dos apelos. (TJRJ; APL
0010454-40.2014.8.19.0003; 4ª C.Crim.; Rel. Des. João Ziraldo Maia; DORJ 01/09/2015)
77/290 — TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁ-
FICO. PORTE DE MUNIÇÃO. CORRUPÇÃO DE MENORES. LIBERDADE CON-
CEDIDA. Paciente primário, preso em 25 de junho de 2015, pela suposta prática
dos delitos de tráfico ilícito de drogas, associação para o tráfico, porte de munição

EMENTÁRIO
e corrupção de menores. Teriam sido apreendidas, no interior da residência do pa-
ciente, 85 pedrinhas de crack, 10 papelotes de cocaína, 3 munições intactas calibre
9mm, e uma pequena quantidade de maconha – peso insignificante – sem indicação
de peso. A quantidade de droga apreendida, ainda que de naturezas distintas, não
pode ser considerada de monta expressiva – não há indicação de peso. Além disso,

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


havia outras pessoas na residência do paciente, nada tendo sido apreendido, rigo-
rosamente, em sua posse. Ademais, o paciente é primário e não está respondendo a
qualquer outro processo. Tratando-se de paciente primário, não é caso de aguardar
o julgamento do processo segregado se, na hipótese de condenação, é possível que
não lhe seja imposto o regime fechado. É possível a fixação de regime mais brando
aos condenados por crimes hediondos e equiparados, observados os demais critérios
do art. 33 do Código Penal. Não restou demonstrada, no caso concreto, a efetiva
necessidade da prisão preventiva, medida extrema e excepcional. Ordem concedi-
da. Liminar ratificada. (TJRS; HC 0256933-77.2015.8.21.7000; 3ª C.Crim.; Rel. Des.
Diógenes Vicente Hassan Ribeiro; DJERS 04/09/2015)
77/291 — TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA. NÃO OCORRÊN-
CIA. NULIDADE REJEITADA. PROVA ILÍCITA. DENÚNCIA BASEADA EM DIVER-
SOS OUTROS MEIOS DE PROVA. RECEBIMENTO DA EXORDIAL. RESPOSTA À
ACUSAÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. OCORRÊNCIA.
RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. O trancamento da ação penal por meio do
habeas corpus só é cabível quando houver comprovação, de plano, da ausência de
justa causa, seja em razão da atipicidade da conduta supostamente praticada pelo
618 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

acusado, seja da ausência de indícios de autoria e materialidade delitivas, ou, ainda,


da incidência de causa de extinção da punibilidade. Denúncia que atende aos re-
quisitos art. 41 do Código de Processo Penal e baseada em diversos meios de prova.
2. Compreende esta Turma que o constitucional dever de motivação exige seja a
denegação da absolvição sumária fundamentada, ainda que concisamente, aprecian-
do as teses relevantes e urgentes apresentadas na resposta à acusação, consignando
mesmo aquelas dependentes de instrução essa condição. 3. Nulidade configurada.
Precedentes. 4. Recurso parcialmente provido a fim de anular o processo, a partir da
decisão denegatória da absolvição sumária, devendo outra ser proferida, apreciando-
se os termos da resposta à acusação. (STJ; RHC 54.782; Proc. 2014/0336627-2; SP; 6ª
T.; Rel. Min. Néfi Cordeiro; DJE 08/09/2015)
77/292 — UNIFICAÇÃO DE PENAS. CRIME CONTINUADO. AUSÊNCIA DE
NEXO DE CONTINUIDADE ENTRE OS DELITOS PRATICADOS. CONDIÇÕES
DE TEMPO, LUGAR E MANEIRA DE EXECUÇÃO QUE INDICAM APENAS A HA-
BITUALIDADE CRIMINOSA DO AGRAVANTE. INAPLICABILIDADE. Não há que
se reconhecer a continuidade quando evidenciada apenas a habitualidade delitiva,
justificando maior rigor na reprimenda e não a unificação de penas. Recurso não
provido. (TJSP; AG-ExPen 0018677-59.2015.8.26.0000; Ac. 8716449; 15ª C.D.Crim.;
Rel. Des. Willian Campos; DJESP 08/09/2015)
77/293 — USO DE DOCUMENTO FALSO. MATERIALIDADE E AUTORIA
DELITIVAS COMPROVADAS. I – Restando devidamente comprovadas a existência
do crime e a sua autoria, resta afastado o pleito por absolvição. II – Não realização
dos exames de praxe para obtenção da carteira de habilitação, cujo recebimento se
deu mediante pagamento a terceiro. Falsidade conhecida pelo agente. III – Recurso a
que se nega provimento. Decisão unânime. (TJPE; APL 0103759-80.2010.8.17.0001;
3ª C.Crim.; Relª Desª Daisy Maria de Andrade Costa Pereira; DJEPE 04/09/2015)
77/294 — USO DE DOCUMENTO FALSO. MOTIVAÇÃO INSUFICIENTE
PARA MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. Se o réu é primário, não ostenta
registros criminais e o contexto fático que permeou a ação criminosa a ele imputada
não extrapola a gravidade inerente ao próprio tipo penal, em tese violado, inexistin-
do justificativa objetiva para sua permanência sob custódia, concede-se a liberdade
provisória. Ordem concedida, com a recomendação de imposição de medidas caute-
lares. (TJGO; HC 0246655-98.2015.8.09.0000; 1ª C.Crim.; Rel. Des. Itaney Francisco
Campos; DJGO 04/09/2015; p. 415)
77/295 — USO DE DOCUMENTO FALSO APRESENTADO PERANTE ÓR-
GÃO FEDERAL. CRIME IMPOSSÍVEL NÃO VERIFICADO. COMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO PROVIDO. Conforme consta dos autos, os policiais
não perceberam a falsidade do certificado de registro e do licenciamento do veículo
que lhes foi exibido, apenas desconfiaram e atestaram a falsidade após consulta.
Uma vez que o documento contrafeito possui mínima potencialidade de ludibriar
a fé pública, impossível concluir por sua absoluta impropriedade do objeto e crime
impossível. Recurso provido. (TRF 2ª R.; RSE 0001288-95.2015.4.02.5001; RJ; 1ª
T.Esp.; Rel. Des. Fed. Antonio Ivan Athié; DEJF 29/10/2015; p. 378)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 619

77/296 — UTILIZAÇÃO DE CERTIDÃO DE CONTEÚDO INVERÍDICO E


INDEVIDA HABILITAÇÃO DE CONCORRENTE DE TOMADA DE PREÇOS. PRÁ-
TICA DE OUTRO EXPEDIENTE QUE IMPLICA EM FRUSTRAÇÃO AO CARÁTER
COMPETITIVO DE LICITAÇÃO. VETORIAL CONSEQUÊNCIA DO CRIME. 1. O
crime tipificado no art. 90 da Lei nº 8.666/93 pressupõe que o agente frustre ou frau-
de o caráter competitivo de procedimento licitatório, mediante ajuste, combinação
ou qualquer outro expediente, com o objetivo de lograr, em seu próprio favor ou
em favor de outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação. 2.
Caracterização do delito independe de obtenção de vantagem econômica indevida
ou prejuízo ao erário, tratando-se de crime formal. 3. O tipo penal visa proteger a
lisura, a moralidade e a honestidade da competição. A norma permite, na expressão
qualquer outro expediente, o combate a todo tipo de engodo, subversão ou conduta
lesiva a competitividade dos certames licitatórios. 4. A expedição de certificado de
registro de fornecedor de teor inverídico, em favor de empresa que não reúne con-
dições técnicas para realizar obra de construção civil, permitindo a esta participar
e vencer certame licitatório, frustra o caráter competitivo de licitação e subsume-
se ao tipo penal do art. 90 da Lei das licitações na conduta “outro expediente”.
5. Na dosimetria da pena, não existindo o prejuízo apontado pela sentença, deve
a vetorial consequência do crime ser reputada neutra. (TRF 4ª R.; ACR 0000027-
05.2013.4.04.7105; RS; 8ª T.; Rel. Des. Fed. Leandro Paulsen; DEJF 30/10/2015; p. 226)
77/297 — VENDA DE CDS E DVDS FALSIFICADOS (ART. 184, § 2º, DO
CÓDIGO PENAL). Materialidade delitiva não demonstrada. Laudo pericial lacuno-

EMENTÁRIO
so. Recurso não provido. (TJSP; APL 0013426-28.2012.8.26.0077; Ac. 8695996; 15ª
C.D.Crim.; Rel. Des. Ricardo Sale Júnior; DJESP 08/09/2015)
77/298 — VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL E DE FALSIFICAÇÃO,
ADULTERAÇÃO OU ALTERAÇÃO DE PRODUTOS DESTINADOS A FINS TE-

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL —


RAPÉUTICOS OU MEDICINAIS PREVISTOS NOS ARTS. 184, § 2º, E 273, §
1º-B, INCISO I, NA FORMA DO ART. 69, TODOS DO CÓDIGO PENAL. Julgado
parcialmente procedente os pedidos contidos na denuncia para condenar os réus
Paulo Cesar e Ana Paula na forma da denuncia e o réu Carlos Alberto somente pelo
delito previsto no art. 184, § 2º, do CP absolvendo-o do delito previsto no art. 273,
§ 1º, do Código Penal por precariedade de prova. Recurso ministerial que pretende
a condenação do réu Carlos Alberto na forma da denuncia. Recurso defensivo pre-
tendendo o reconhecimento da nulidade das provas adquiridas pelos mandados de
busca e apreensão e, alternativamente, a absolvição por insuficiência probatória e
pela desproporcionalidade da pena prevista no art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal,
além da atipicidade pelo princípio da adequação social quanto ao crime de violação
de direito autoral. Mandados de busca e apreensão cumpridos de forma ilegítima e
sem a observância das normas legais. Violação ao art. 564, IV, do CPP. Absolvição
que se impõe, igualmente ante a ausência de lesão ao bem jurídico tutelado quanto
ao delito previsto no art. 273 do Código Penal e com relação ao art. 184, § 2º, do
Código Penal a absolvição se impõe, uma vez que a denuncia não identificou os
lesados cujas obras tiveram o direito autoral violado. Atipicidade da conduta que se
reconhece. Procedente o recurso defensivo restando prejudicado o recurso minis-
620 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

terial. (TJRJ; APL 0025838-02.2012.8.19.0007; 6ª C.Crim.; Rel. Des. Paulo de Tarso


Neves; DORJ 26/10/2015)
77/299 — VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AMEAÇA E DESCUMPRIMENTO DE
MEDIDAS PROTETIVAS. LIBERDADE CONCEDIDA. IMPOSIÇÃO DE MEDIDA
PROTETIVA. Paciente primário, preso em 15 de julho de 2015, pela suposta prática
do delito de ameaça e pelo descumprimento de medidas protetivas. A gravidade do
fato está no ponto de ter ocorrido no âmbito da violência doméstica. Sem dúvida,
esse tipo de ocorrência, esse tipo de cultura, deve ser banido e coibido de forma
permanente. No entanto, a constrição pessoal cautelar é medida excepcional, somente
viável em casos extremamente necessários. A presença do seu requisito, “fumaça
do cometimento do crime”, e do seu fundamento, “perigo de liberdade”, deve ser
constantemente verificada, pois se trata de medida cuja imposição é situacional.
A prisão preventiva decorrente do descumprimento de medidas protetivas ou em
situação de violência à mulher no âmbito da Lei Maria da Penha não pode ser
abusiva, ou exagerada no tempo, porque tem por finalidade justamente assegurar o
cumprimento das medidas protetivas. Ocorre que, transcorrido mais de 1 mês desde
a prisão preventiva do paciente, não foi realizada – nem ao menos designada – au-
diência com vistas a examinar alternativa diversa da prisão. Nesse contexto, viável
a concessão da liberdade. Por outro lado, tendo em vista o contexto de eventual
agressão e ameaças perpetradas em face da vítima, necessária a imposição de medida
protetiva consistente na proibição de o paciente manter qualquer espécie de contato
com a ofendida, por qualquer meio, com fulcro no art. 22, inciso III, alínea b, da Lei
nº 11.340/06. Ordem parcialmente concedida, por maioria. Imposição de medida
protetiva. Determinação de expedição de alvará de soltura na origem. (TJRS; HC
0257716-69.2015.8.21.7000; 3ª C.Crim.; Rel. Des. Diógenes Vicente Hassan Ribeiro;
DJERS 04/09/2015)
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL
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Cédula de Crédito Rural – Aval Prestado por Pessoa Física –


Nulidade – Possibilidade/Impossibilidade

77/300 → EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. NULIDADE DE AVAL


PRESTADO POR PESSOA FÍSICA EM CÉDULA DE CRÉDITO RURAL EMITIDA
TAMBÉM POR PESSOA FÍSICA. ACOLHIDA. EXTINÇÃO PARCIAL DA EXE-
CUÇÃO. FIXAÇÃO DE VERBA HONORÁRIA DEVIDA. RECURSO PROVIDO. É
nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de crédito rural emitida
também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do Decreto-Lei nº
167/67. O acolhimento do incidente de exceção de pré-executividade, mesmo que
resulte apenas na extinção parcial da execução, dá ensejo à condenação na verba
honorária, cujo valor deve ser fixado com observância da equidade pelo julgador.
(TJMS; AI 1400721-35.2015.8.12.0000; 3ª C.Cív.; Rel. Des. Fernando Mauro Moreira
Marinho; DJMS 17/06/2015; p. 15)
77/301 → EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉ-
DITO RURAL PIGNORATÍCIA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. Nulidade
de aval prestado por pessoa física. Acolhimento. Precedentes. Decisum mantido.
Recurso desprovido. (TJPR; Agr 1314865-7/01; 13ª C.Cív.; Rel. Des. Sérgio Roberto
N. Rolanski; DJPR 04/03/2015; p. 627)

DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL
77/302 ← AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE AVAL EMITIDO POR
PESSOA FÍSICA EM CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. 1. Omissis. 2. Omissis. 3. A
interpretação sistemática do art. 60 do Decreto-Lei nº 167/67 permite inferir que o
significado da expressão “também são nulas outras garantias, reais ou pessoais”, dis-
posta no seu § 3º, refere-se diretamente ao § 2º, ou seja, não se dirige às cédulas de
crédito rural, mas apenas às notas e duplicatas rurais. 4. Alteração do entendimento
desta Terceira Turma quando do julgamento do REsp 1.483.853/MS, sob a relatoria do
e. Ministro Moura Ribeiro, julgado em 04.11.2014, DJe 18.11.2014. 5. Recurso especial
a que se nega provimento por maioria, vencida a relatora. (STJ; REsp 1.440.440; Proc.
2013/0172549-1; RS; 3ª T.; Rel. p/ o Ac. Min. Paulo de Tarso Sanseverino; DJE 18/06/2015)
77/303 ← CÉDULA DE CRÉDITO RURAL EMITIDA POR PESSOA FÍSICA.
GARANTIA DE AVAL PRESTADA POR TERCEIRO. ART. 60, § 3º, DO DL Nº
167/67. VALIDADE. ENTENDIMENTO FIRMADO NO JULGAMENTO DO RESP
1.483.853/MS. TERCEIRA TURMA. 1. As mudanças no DL nº 167/67 não tiveram
como alvo as cédulas de crédito rural. Por isso elas nem sequer foram mencionadas
nas proposições que culminaram com a aprovação da Lei nº 6.754/79, que alterou
o Decreto-Lei referido. 2. A interpretação sistemática do art. 60 do DL nº 167/67
permite inferir que o significado da expressão “também são nulas quaisquer outras
garantias, reais ou pessoais”, disposta no seu § 3º, refere-se diretamente ao § 2º,
ou seja, não se dirige às cédulas de crédito rural, mas apenas às notas e duplicatas
rurais. 3. Vedar a possibilidade de oferecimento de crédito rural direto mediante a
622 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

constituição de garantia de natureza pessoal (aval) significa obstruir o acesso a ele


pelo pequeno produtor ou só o permitir em linhas de crédito menos vantajosas. 4.
Os mutuários não apresentaram argumento novo capaz de modificar a conclusão
alvitrada, que se apoiou em novo posicionamento deste órgão fracionário. Incidên-
cia da Súmula nº 83 do STJ. 5. Agravo regimental não provido. (STJ; AgRg-AREsp
607.608; Proc. 2014/0285759-6; MS; 3ª T.; Rel. Min. Moura Ribeiro; DJE 01/07/2015)

Violação de Direito Autoral – Exame Externo do Material


Apreendido – Possibilidade/Impossibilidade – Inaplicabilidade
do Princípio da Adequação Social

77/304 → VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. MATERIALIDADE NÃO


COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO. NECESSIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. Para
comprovar a materialidade do delito descrito no art. 184, § 2º, do CP, o expert não
pode se limitar ao exame externo dos CDs e DVDs arrecadados, pois, ainda que se
verifique uma falsidade, a violação dos direitos do autor somente se configura com a
certeza de que houve reprodução de alguma obra, ou seja, que existe uma gravação
não autorizada. (TJMG; APCR 1.0435.12.001836-9/001; 5ª C.Crim.; Rel. Des. Júlio
César Lorens; DJEMG 04/05/2015)
77/305 ← VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL (ART. 184, § 2º, DO CÓDIGO
PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. 1. Quadro sufi-
ciente para evidenciar a responsabilidade penal do réu. 2. Firmou-se a jurisprudência
do STJ no sentido de que a caracterização do delito de violação de direito autoral
(art. 184, § 2º, do Código Penal) não reclama a identificação das vítimas (titulares
dos direitos autorais violados), bem como a perícia em todos os bens apreendidos.
A perícia pode restringir-se às características externas do material apreendido 3.
Inaplicabilidade do princípio da adequação social. Orientação do Supremo Tribunal
Federal e do Superior Tribunal de Justiça. A conduta de vender ou expor à venda
fonograma ou videofonograma, em cujo conteúdo há violação a direito autoral,
fere bem jurídico tutelado pela Constituição Federal (art. 5º, XXVII). 4. Penas que
comportam pequena alteração. Recurso parcialmente provido. (TJSP; APL 0048930-
22.2012.8.26.0554; Ac. 8566320; 2ª C.Crim.Ext.; Rel. Des. Laerte Marrone; DJESP
30/06/2015)
JULGADOS DA OAB – CF/TED
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77/306 — ADVOGADOS CONCILIADORES E MEDIADORES NOS CENTROS


JUDICIÁRIOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS E CIDADANIA. INCOMPATIBI-
LIDADE E IMPEDIMENTO. INEXISTÊNCIA DA PRIMEIRA E EXISTÊNCIA DA
SEGUNDA. IMPEDIMENTO PARA ATUAR COMO ADVOGADO PARA AS PARTES
QUE ATENDEU COMO MEDIADOR E CONCILIADOR E NA VARA COM A QUAL
COLABOROU NAQUELA CONDIÇÃO, SOB PENA DE CONFIGURAR CAPTAÇÃO
DE CLIENTELA E CONCORRÊNCIA DESLEAL. NECESSIDADE DE SUJEIÇÃO
À CLÁUSULA DE CONFIDENCIALIDADE. INEXISTÊNCIA, EM TESE, DE VIO-
LAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA E NOBREZA DA PROFISSÃO. Não se tratando de
cargo ou função pública, mas de múnus especial, em colaboração com a tarefa de
distribuição da Justiça, não cria incompatibilidade, para seus colaboradores, com o
exercício da advocacia, nos termos do que preceituam os arts. 28 e 30 do EOAB c/c o
art. 8º e parágrafos do Regulamento Geral. Existem limites éticos que correspondem
a impedimentos e sujeições. Atividade que comunga os motivos de impedimento e
suspeição atribuídos aos juízes e serventuários da Justiça (arts. 134 e ss. do CPC).
Compromisso de imparcialidade, neutralidade e isenção, independência, competência
e diligência e, acima de tudo, o compromisso de confidencialidade. Impedimento
de atuar ou envolver-se com as partes e questões conhecidas em decorrência de sua
atuação no setor como, também, perante a Vara onde funcionou como conciliador.
Previne-se, com isto, a prática da captação de causas e clientes e a concorrência
desleal conforme precedentes deste Tribunal: E-1.696/98, E-2.172/00, E-2.383/01,
E-3.049/04, E-3.056/04, E-3.074/04, E-3153/05 e E-3.276/06. Proc. E-4.155/2012

JULGADOS DA OAB – CF/TED


– v.u., em 20.09.2012, do parecer e ementa da Relatora Dra. Mary Grun – Rev. Dr.
Zanon de Paula Barros – Presidente Dr. Carlos José Santos da Silva (...)”. (OAB/
SP-TED; Proc E-4.525/2015; Rel. Dr. Pedro Paulo Wendel Gasparini; Julg. 18/06/2015)

77/307 — AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. Viola o disposto no art.


34, XX e XXI, da Lei nº 8.906/94 profissional que retém valores de cliente por mais
de 2 (dois) anos e se recusa a prestar contas dos valores recebidos, apenas repassando
os valores após incisiva cobrança. Pena de suspensão do exercício profissional nos
termos do art. 37, I e II, do EAOAB. (OAB/CF; Rec 2007.08.05549-05; Rel. Cons. Fed.
Dr. Elton Sadi Fülber; DOU 10/12/2014; p. 174/177)

77/308 — EXERCÍCIO PROFISSIONAL. ENDEREÇO ERRADO FORNECIDO


PELO CLIENTE AO ADVOGADO. CAUTELA DO ADVOGADO NA COLETA DE
DADOS FORNECIDOS PELO CLIENTE. ISENÇÃO DE CULPA POR PARTE DO
ADVOGADO QUE NÃO COMPACTOU COM OS DADOS FORNECIDOS PELO
CLIENTE. INCIDE EM RESPONSABILIDADE O ADVOGADO QUE PACTUAR
COM SEU CLIENTE EM FORNECER AO JUÍZO ENDEREÇO ERRADO PARA
DIFICULTAR SUA LOCALIZAÇÃO. Cabe ao advogado fazer o controle da verdade
antes mesmo de propor a ação ou realizar a defesa para atender aos interesses de seu
624 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

cliente, sob pena de incorrer em situações que podem até mesmo afetar-lhe perante
a OAB, em procedimento disciplinar. Uma vez tomadas as cautelas necessárias para
preservar a veracidade das informações dadas pelo cliente, sobretudo quanto ao seu
endereço residencial, o advogado estará desobrigado de eventuais consequências
processuais que possam advir. Todavia, caso o advogado tenha ciência desta falácia,
contribuindo direta ou indiretamente para tal diante das informações prestadas
pelo cliente, responde solidariamente por danos processuais e éticos no exercício
funcional, por pactuar com a falsa informação. (OAB/SP-TED; Proc E-4.477/2015;
Rel. Dr. Cláudio Felippe Zalaf; Julg. 19/03/2015)

77/309 — HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECLAMAÇÕES TRABALHIS-


TAS. CONTRATO COM CLÁUSULA QUOTA LITIS. PRETENSÃO DE RECEBIMEN-
TO DOS HONORÁRIOS ALÉM DO PERCENTUAL AJUSTADO. HIPÓTESE DE
SUCESSO NA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ORDINÁRIO. IMPOSSIBILIDADE.
O advogado pode contratar o valor mínimo constante na tabela de honorários, nas
reclamações trabalhistas, como advogado do reclamante, quando o contrato for por
um valor fixo ou misto. Não pode postular ou cobrar valor da tabela de honorá-
rios da OAB/SP quando o contrato for quota litis ou ad exitum. Nos casos em que a
contratação dos honorários for ad exitum ou quota litis, no percentual de até 30%,
a cobrança de qualquer outro valor mínimo, ou fixado na Tabela, fere os princípios
da razoabilidade, moderação e da proporcionalidade, constantes nos arts. 36 e 37
do CED. Nos casos em que a contratação dos honorários for ad exitum ou quota
litis, o advogado assume o risco do recebimento de honorários se houver vantagem;
perdendo tudo, inclusive o trabalho, se infrutífera a demanda, condição esta íntima
e exclusivamente relacionada ao recebimento de valores e/ou benefícios advindos do
processo. Precedentes: E-3.931/2010 e E-3.596/08. (OAB/SP-TED; Proc E-4.453/2014;
Rel. Dr. João Luiz Lopes; Julg. 11/12/2014)

77/310 — INVIOLABILIDADE DO ESCRITÓRIO. RECEBIMENTO DE


CORRESPONDÊNCIA DE ENTIDADE SEM FINS LUCRATIVOS. VEDAÇÃO.
EXERCÍCIO DE FUNÇÕES INDEPENDENTES POR ADVOGADO. ENDEREÇO
PROFISSIONAL. Reiterando a Resolução nº 3/97 e os julgados da Turma Deontoló-
gica, é vedado o exercício de qualquer função alheia às atividades de um escritório
de advocacia. Essa vedação estende-se, inclusive, ao recebimento de correspondên-
cia e protocolos postais de terceiros no endereço profissional do advogado. (OAB/
SP-TED; Proc E-4.454/2014; Rel. Dr. Leopoldo Ubiratan C. Pagotto; Julg. 11/12/2014)

77/311 — PEDIDO DE REVISÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA EM


PROCESSO DE EXCLUSÃO. INEXISTÊNCIA. EXCLUSÃO DECORRENTE DE
REITERADAS SUSPENSÕES. FALTA DE ADOÇÃO DE MEDIDAS CAPAZES DE
DESCONSTITUIR AS SUSPENSÕES QUE ACARRETARAM A APLICAÇÃO DA
PENALIDADE CAPITAL PREVISTA NO ESTATUTO. IMPOSSIBILIDADE DE DIS-
CUSSÃO NO PROCESSO DE EXCLUSÃO DAS PENALIDADES ANTERIORES.
QUÓRUM QUALIFICADO COMPROVADO. MATÉRIA DEBATIDA E NÃO COM-
BATIDA POR RECURSO PREVISTO PARA A HIPÓTESE. NÃO DEMONSTRAÇÃO
DE ERRO DE JULGAMENTO OU FALSA PROVA PARA A APLICAÇÃO DA PENA
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 625

DE EXCLUSÃO. IMPROCEDÊNCIA DOS PLEITOS DE REVISÃO. 1. Defeso no


processo de exclusão fundado na reiteração de suspensões a discussão sobre as
penalidades havidas nos feitos anteriores, logo desnecessária a juntada aos autos de
exclusão dos feitos antecedentes, bastando a certificação da aplicação das penalida-
des e do trânsito em julgado. 2. Sessão de julgamento que atende as exigências de
quórum para a exclusão do representado, decisão que deve ser respeitada porque
conforme com os ditames estatutários de regência. 3. Temas debatidos em grau de
recurso pela e. 2ª Turma da 2ª Câmara do Conselho Federal e não devidamente
impugnados pela via recursal própria, impossibilidade de utilização do pedido de
revisão como sucedâneo de recurso. 4. Pedido de revisão conhecido, mas julgado
improcedente. (OAB/CF; PedRev 49.0000.2014.010265-3; Rel. p/o Ac. Cons. Fed. Dr.
Pedro Paulo Guerra de Medeiros; DOU 10/12/2014; p. 174)

77/312 — PEDIDO DE REVISÃO. INADMISSIBILIDADE POR FORÇA DO


DISPOSTO NO § 5º DO ART. 73 DO EAOAB. AUSÊNCIA DE DECISÃO DE MÉ-
RITO. INCOMPETÊNCIA DO CONSELHO FEDERAL. REJEIÇÃO DO PEDIDO
REVISIONAL POR SER INADMISSÍVEL. A competência para o julgamento da
pretensão revisional é do Conselho Federal da OAB, quando a decisão de mérito for
de sua lavra ou decorrente de processos disciplinares de sua competência originária.
Não conhecimento da pretensão. (OAB/CF; Rec 49.0000.2013.005028-6; Rel. Cons.
Fed. Dr. Alexandre Mantovani; DOU 10/12/2014; p. 174/177)

77/313 — PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. INOCORRÊNCIA. CAUSAS INTER-


RUPTIVAS. A prescrição do processo ético disciplinar está regulada no art. 43, §
2º, I, da Lei nº 8.906/94 e tem como causas interruptivas a instauração de processo
disciplinar ou pela notificação válida feita diretamente ao representado. Não tendo
ocorrido lapso temporal superior a 5 (cinco) anos entre a notificação válida e a de-
cisão condenatória pelo TED, não há que se acolher a perda da pretensão punitiva.
Decisão unânime de Seccional. Não conhecimento. Ausência de contrariedade do
acórdão recorrido à Lei nº 8.906/94, ao Regulamento Geral, ao CED e aos Provimentos
e ausência de demonstração de divergência entre a decisão recorrida e precedente
de órgão julgador do Conselho Federal ou de outro Conselho Seccional. (OAB/CF;
Rec 49.0000.2014.004303-5; Rel. Cons. Fed. Dr. Elton Sadi Fülber; DOU 10/12/2014;
JULGADOS DA OAB – CF/TED

p. 174/177)

77/314 — RECURSO AO CONSELHO FEDERAL. INADIMPLÊNCIA DE


ANUIDADES DEVIDAS À OAB. INFRAÇÃO DISCIPLINAR. SUSPENSÃO DO
EXERCÍCIO PROFISSIONAL. PRORROGAÇÃO ATÉ A QUITAÇÃO DA DÍVIDA.
AFASTAMENTO. PRESCRIÇÃO. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. RECURSO PAR-
CIALMENTE PROVIDO. 1. A jurisprudência deste Conselho Federal é pacífica no
sentido de que não é necessária a notificação pessoal, sendo suficiente a notificação
expedida nos termos do art. 137-D do Regulamento Geral, presumindo-se recebida
a correspondência enviada para o endereço constante no cadastro da Seccional,
incumbindo ao advogado manter sempre atualizado o seu endereço residencial e
profissional. 2. A suspensão do exercício profissional por inadimplência está regulada
pela Lei nº 8.906/94, a qual não foi declarada inconstitucional, estando em sede de
626 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

repercussão geral a questão (RE 647.885/RS), situação que não alcançaria os fatos
apurados neste processo, em face do parcial provimento para exclusão da prorroga-
ção da sanção pelas anuidades já fulminadas pela prescrição. 3. Constitui infração
disciplinar deixar o advogado de pagar as contribuições devidas à OAB, depois de
regularmente notificado a fazê-lo, podendo a sanção disciplinar ser prorrogada até
a quitação integral, nos termos do art. 37, § 2º, do EAOAB. 4. Porém, essa prorro-
gação está limitada pela prescrição para a cobrança dos débitos de anuidades, que
segura o prazo do art. 206, § 5º, I, do CC, que determina o prazo de cinco anos para
a cobrança de dívidas fundadas em instrumentos público ou particular. 5. Recurso
parcialmente provido apenas para excluir da condenação a prorrogação da sanção
disciplinar imposta, uma vez que as anuidades objeto do processo disciplinar foram
alcançadas pela prescrição. (OAB/CF; Rec 49.0000.2014.009319-3; Rel. Cons. Fed. Dr.
César Augusto Moreno; DOU 10/12/2014; p. 174/177)

77/315 — SIGILO PROFISSIONAL. TESTEMUNHO EM INQUÉRITO PO-


LICIAL ENVOLVENDO CLIENTE. INVOCAÇÃO DE SIGILO PROFISSIONAL.
PRECEDENTES. O advogado pode recusar-se a depor em inquérito policial ou
processo relacionado com cliente ou ex-cliente. Somente poderá quebrar o sigilo
em situações excepcionais, sempre restritas ao interesse da causa. Não há qualquer
óbice em depoimento por advogado no processo em que figure como parte cliente
ou ex-cliente, desde que não guarde relação com as causas que foram patrocinadas
pelo profissional. Também é previsto, ainda, que o advogado possa depor a respei-
to das confidências trazidas pelo seu constituinte, exclusivamente nos limites da
necessidade da defesa, desde que autorizado por este (art. 27 do CED da OAB).
Precedentes: E-2.846, E-2.969, E-3.846 e E-4.037. (OAB/SP-TED; Proc E-4.452/2014;
Rel. Dr. Sylas Kok Ribeiro; Julg. 11/12/2014)
LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE
• As íntegras das normas legais estão disponíveis na versão on-line (www.lex.com.br)
para os assinantes desta revista.

SETEMBRO

03/09/2015

DECRETO DE 2 DE SETEMBRO DE 2015


Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios de Minas e Energia
e dos Transportes e da Advocacia-Geral da União, crédito suplementar no valor de
R$ 18.017.149,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1234)

DECRETO DE 2 DE SETEMBRO DE 2015


Transfere, parcialmente, dotações orçamentárias constantes do Orçamento Fiscal
da União, no âmbito do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, no valor de
R$ 778.750.830,00.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1234)

DECRETO DE 2 DE SETEMBRO DE 2015


Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor do Ministério das Relações Exteriores, da
Advocacia-Geral da União e da Controladoria-Geral da União, crédito suplementar no
valor de R$ 236.754.102,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária
vigente. LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1243)

04/09/2015

DECRETO Nº 8.513, DE 3 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a antecipação do abono anual devido aos segurados e dependentes da Pre-
vidência Social no ano de 2015.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1236)

DECRETO Nº 8.514, DE 3 DE SETEMBRO DE 2015


Altera o Decreto nº 2.040, de 21 de outubro de 1996, que aprova o Regulamento de
Movimentação para Oficiais e Praças do Exército.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1237)
628 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DECRETO Nº 8.515, DE 3 DE SETEMBRO DE 2015


Delega competência ao Ministro de Estado da Defesa para a edição de atos relativos a
pessoal militar.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1239)

10/09/2015

LEI Nº 13.162, DE 9 DE SETEMBRO DE 2015


Inscreve o nome de Rui Barbosa de Oliveira no Livro dos Heróis da Pátria.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1240)

LEI Nº 13.163, DE 9 DE SETEMBRO DE 2015


Modifica a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, para instituir
o ensino médio nas penitenciárias.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1241)

11/09/2015

DECRETO Nº 8.516, DE 10 DE SETEMBRO DE 2015


Regulamenta a formação do Cadastro Nacional de Especialistas de que tratam o § 4º e
§ 5º do art. 1º da Lei nº 6.932, de 7 de julho de 1981, e o art. 35 da Lei nº 12.871, de
22 de outubro de 2013.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1244)

DECRETO Nº 8.517, DE 10 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a inclusão no Programa Nacional de Desestatização – PND dos Aeroportos
Internacionais Salgado Filho, no Estado do Rio Grande do Sul, Deputado Luís Eduardo
Magalhães, no Estado da Bahia, Hercílio Luz, no Estado de Santa Catarina, e Pinto
Martins, no Estado do Ceará, e dá outras providências.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1247)

16/09/2015

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 89, DE 15 DE SETEMBRO DE 2015


Dá nova redação ao art. 42 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, am-
pliando o prazo em que a União deverá destinar às Regiões Centro-Oeste e Nordeste
percentuais mínimos dos recursos destinados à irrigação.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1249)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 629

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 90, DE 15 DE SETEMBRO DE 2015


Dá nova redação ao art. 6º da Constituição Federal, para introduzir o transporte como
direito social.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1250)

17/09/2015

LEI Nº 13.164, DE 16 DE SETEMBRO DE 2015


Abre crédito extraordinário, em favor dos Ministérios do Desenvolvimento Agrário,
da Defesa e da Integração Nacional, no valor de R$ 904.756.882,00, para os fins que
especifica.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1250)

21/09/2015

DECRETO Nº 8.518, DE 18 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a carteira de identidade de militar das Forças Armadas, o documento de
identificação de seus dependentes e pensionistas e o documento de identificação dos
integrantes da Marinha Mercante.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1252)

22/09/2015

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 692, DE 22 DE SETEMBRO DE 2015


Altera a Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995, para dispor acerca da incidência de
imposto sobre a renda na hipótese de ganho de capital em decorrência da alienação de
bens e direitos de qualquer natureza, e a Medida Provisória nº 685, de 21 de julho de
LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE

2015, que institui o Programa de Redução de Litígios Tributários – Prorelit.


(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1254)

29/09/2015

DECRETO Nº 8.519, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.204 (2015), de 24 de
fevereiro de 2015, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que altera o regime de
sanções sobre o Iêmen para estender o período de aplicação das sanções estabelecidas
pela Resolução nº 2.140 (2014).
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1280)
630 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DECRETO Nº 8.520, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.174 (2014), de 27 de
agosto de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que altera o embargo de
armas aplicável à Líbia e autoriza a imposição de sanções a indivíduos e a entidades.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1280)

DECRETO Nº 8.521, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.161 (2014), de 17
de junho de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que trata de sanções
a indivíduos, grupos, iniciativas e entidades da Al-Qaeda e associados.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1281)

DECRETO Nº 8.522, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.160 (2014), de 17 de
junho de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que renova o regime de
sanções aplicável ao Talibã e dá outras disposições.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1281)

DECRETO Nº 8.523, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.136 (2014), de 30 de
janeiro de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que altera o embargo
de armas aplicável à República Democrática do Congo.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1282)

DECRETO Nº 8.524, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.142 (2014), de 5 de
março de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que altera o embargo de
armas aplicável à Somália.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1283)

DECRETO Nº 8.525, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.182 (2014), de 24 de
outubro de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que altera o embargo
de armas aplicável à Somália.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1283)

DECRETO Nº 8.526, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.199 (2015), de 12 de
fevereiro de 2015, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que reafirma obriga-
ções impostas aos Estados-membros para combater o terrorismo e o financiamento do
terrorismo e para coibir o comércio de armas e materiais conexos com o Estado Islâmico
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 631

no Iraque e no Levante, com a Frente Al-Nusra e com indivíduos, grupos, empresas e


entidades associados à Al-Qaeda.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1284)

DECRETO Nº 8.527, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.198 (2015), de 29 de
janeiro de 2015, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que renova o embargo
de armas aplicável à República Democrática do Congo.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1284)

DECRETO Nº 8.528, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.184 (2014), de 12 de
novembro de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que altera o embargo
de armas aplicável à Somália.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1285)

DECRETO Nº 8.529, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.207 (2015), de 4 de
março de 2015, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que estende o mandato
do Painel de Peritos do Comitê de Sanções relativo à República Popular Democrática
da Coreia (Comitê 1718) até 5 de abril de 2016.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1286)

DECRETO Nº 8.530, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.178 (2014), de 24 de
setembro de 2014, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que trata de comba-
tentes terroristas estrangeiros.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1286)

DECRETO Nº 8.531, DE 28 DE SETEMBRO DE 2015


LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE

Dispõe sobre a execução, no território nacional, da Resolução nº 2.127 (2013), de 5


de dezembro de 2013, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que, entre outras
disposições, estabelece embargo de armas à República Centro-Africana.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1287)

LEI Nº 13.165, DE 29 DE SETEMBRO DE 2015


Altera as Leis nºs 9.504, de 30 de setembro de 1997, 9.096, de 19 de setembro de 1995, e
4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral, para reduzir os custos das campanhas
eleitorais, simplificar a administração dos Partidos Políticos e incentivar a participação
feminina.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1259)
632 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

30/09/2015

DECRETO DE 30 DE SETEMBRO DE 2015


Abre ao Orçamento da Seguridade Social da União, em favor dos Ministérios da Educação,
da Previdência Social e da Saúde, crédito suplementar no valor de R$ 2.554.769.052,00,
para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1294)

DECRETO DE 30 DE SETEMBRO DE 2015


Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, em favor de diversos órgãos
do Poder Executivo, crédito suplementar no valor de R$ 57.731.807,00, para reforço de
dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1294)

DECRETO Nº 8.532, DE 30 DE SETEMBRO DE 2015


Altera os Anexos VIII, IX e XI do Decreto nº 8.456, de 22 de maio de 2015, que dispõe
sobre a programação orçamentária e financeira e estabelece o cronograma mensal de
desembolso do Poder Executivo para o exercício de 2015.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1292)

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 693, DE 30 DE SETEMBRO DE 2015


Altera a Lei nº 12.780, de 9 de janeiro de 2013, que dispõe sobre medidas tributárias
referentes à realização, no Brasil, dos Jogos Olímpicos de 2016 e dos Jogos Paraolímpicos
de 2016, e altera a Lei nº 10.593, de 6 de dezembro de 2002, para dispor sobre o porte
de arma de fogo institucional pelos servidores integrantes da Carreira de Auditoria da
Receita Federal do Brasil.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1287)

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 694, DE 30 DE SETEMBRO DE 2015


Altera a Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, para dispor sobre o imposto sobre a
renda incidente sobre juros de capital próprio, a Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004,
e a Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005, para dispor sobre os benefícios fiscais do
Regime Especial da Indústria Química e para suspender, no ano-calendário de 2016, os
benefícios fiscais de que tratam os arts. 19, 19-A e 26 desta Lei.
(LEX – FEDERAL – 2015 – IX – p. 1290)

OUTUBRO

01/10/2015

DECRETO Nº 8.533, DE 30 DE SETEMBRO DE 2015


Regulamenta o disposto no art. 9º-A da Lei nº 10.925, de 23 de julho de 2004, que dispõe
sobre o crédito presumido da Contribuição para os Programas de Integração Social e
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 633

de Formação do Patrimônio do Servidor Público – PIS/Pasep e da Contribuição para o


Financiamento da Seguridade Social – Cofins relativo à aquisição de leite in natura, e
institui o Programa Mais Leite Saudável.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1307)

DECRETO Nº 8.534, DE 30 DE SETEMBRO DE 2015


Altera o Decreto nº 7.560, de 8 de setembro de 2011, que dispõe sobre os procedimentos
a serem observados pelos órgãos da administração pública federal quanto às ações do
Poder Executivo federal no âmbito da Autoridade Pública Olímpica – APO.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1314)

02/10/2015

DECRETO DE 1º DE OUTUBRO DE 2015


Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor da concessionária
Rodovia do Aço S.A., os imóveis que menciona, localizados no Município de Sapucaia,
Estado do Rio de Janeiro.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1318)

DECRETO DE 1º DE OUTUBRO DE 2015


Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor da MGO Rodovias –
Concessionária de Rodovias Minas Gerais Goiás S.A., o imóvel que menciona, localizado
no Município de Ipameri, Estado de Goiás.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1318)

DECRETO DE 1º DE OUTUBRO DE 2015


Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor da concessionária
Autopista Fluminense S.A., os imóveis que menciona, localizados nos Municípios de
Macaé, Rio das Ostras e Casimiro de Abreu, Estado do Rio de Janeiro.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1331)
LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE

DECRETO Nº 8.535, DE 1º DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre a contratação de serviços de instituições financeiras pelos órgãos e entidades
do Poder Executivo federal.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1316)

LEI Nº 13.166, DE 1º DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre a prestação de auxílio financeiro pela União aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios, relativo ao exercício de 2014, com o objetivo de fomentar as
exportações do País.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1315)
634 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

05/10/2015

DECRETO Nº 8.536, DE 2 DE OUTUBRO DE 2015


Altera o Anexo ao Decreto nº 6.129, de 20 de junho de 2007, que dispõe sobre a vinculação
das entidades integrantes da administração pública federal indireta.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1331)

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 695, DE 2 DE OUTUBRO DE 2015


Autoriza o Banco do Brasil S.A. e a Caixa Econômica Federal a adquirirem participação
nos termos e condições previstos no art. 2º da Lei nº 11.908, de 3 de março de 2009, e
dá outras providências.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1318)

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 696, DE 2 DE OUTUBRO DE 2015


Extingue e transforma cargos públicos e altera a Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003,
que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1327)

06/10/2015

DECRETO DE 5 DE OUTUBRO DE 2015


Institui a Comissão Especial de Reforma do Estado.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1339)

DECRETO Nº 8.537, DE 5 DE OUTUBRO DE 2015


Regulamenta a Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013, e a Lei nº 12.933, de 26 de de-
zembro de 2013, para dispor sobre o benefício da meia-entrada para acesso a eventos
artístico-culturais e esportivos e para estabelecer os procedimentos e os critérios para a
reserva de vagas a jovens de baixa renda nos veículos do sistema de transporte coletivo
interestadual.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1332)

07/10/2015

DECRETO Nº 8.538, DE 6 DE OUTUBRO DE 2015


Regulamenta o tratamento favorecido, diferenciado e simplificado para as microempre-
sas, empresas de pequeno porte, agricultores familiares, produtores rurais pessoa física,
microempreendedores individuais e sociedades cooperativas de consumo nas contratações
públicas de bens, serviços e obras no âmbito da administração pública federal.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1351)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 635

LEI Nº 13.167, DE 6 DE OUTUBRO DE 2015


Altera o disposto no art. 84 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução
Penal, para estabelecer critérios para a separação de presos nos estabelecimentos penais.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1340)

LEI Nº 13.168, DE 6 DE OUTUBRO DE 2015


Altera a redação do § 1º do art. 47 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1341)

LEI Nº 13.169, DE 6 DE OUTUBRO DE 2015


Altera a Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988, para elevar a alíquota da Contri-
buição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL em relação às pessoas jurídicas de seguros
privados e de capitalização, e às referidas nos incisos I a VII, IX e X do § 1º do art. 1º
da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001; altera as Leis nºs 9.808, de 20
de julho de 1999, 8.402, de 8 de janeiro de 1992, 10.637, de 30 de dezembro de 2002,
10.833, de 29 de dezembro de 2003, 11.033, de 21 de dezembro de 2004, 12.715, de 17
de setembro de 2012, 9.249, de 26 de dezembro de 1995, 11.484, de 31 de maio de 2007,
12.973, de 13 de maio de 2014, 10.150, de 21 de dezembro de 2000, e 10.865, de 30 de
abril de 2004; e dá outras providências.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1343)

09/10/2015

DECRETO DE 8 DE OUTUBRO DE 2015


Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor dos Ministérios da Educação e da Justiça e
de Encargos Financeiros da União, crédito suplementar no valor de R$ 775.942.295,00,
para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1368)
LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE

DECRETO Nº 8.539, DE 8 DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre o uso do meio eletrônico para a realização do processo administrativo no
âmbito dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica
e fundacional.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1359)

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 697, DE 8 DE OUTUBRO DE 2015


Abre crédito extraordinário, em favor dos Ministérios da Justiça, das Relações Exteriores,
dos Transportes, da Defesa e da Integração Nacional, no valor de R$ 950.246.149,00,
para os fins que especifica.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1365)
636 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

13/10/2015

DECRETO Nº 8.540, DE 9 DE OUTUBRO DE 2015


Estabelece, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacio-
nal, medidas de racionalização do gasto público nas contratações para aquisição de
bens e prestação de serviços e na utilização de telefones celulares corporativos e outros
dispositivos.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1363)

14/10/2015

DECRETO Nº 8.541, DE 13 DE OUTUBRO DE 2015


Estabelece, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional,
medidas de racionalização do gasto público no uso de veículos oficiais e nas compras de
passagens aéreas para viagens a serviço.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1367)

16/10/2015

DECRETO DE 15 DE OUTUBRO DE 2015


Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, em favor de diversos órgãos
do Poder Executivo, de Encargos Financeiros da União e de Transferências a Estados,
Distrito Federal e Municípios, crédito suplementar no valor de R$ 25.150.032,00, para
reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1371)

19/10/2015

DECRETO Nº 8.542, DE 16 DE OUTUBRO DE 2015


Promulga o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo
da República Islâmica do Irã sobre a Isenção de Visto para Portadores de Passaportes
Diplomáticos, firmado em Brasília, em 23 de novembro de 2009.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1372)

LEI Nº 13.170, DE 16 DE OUTUBRO DE 2015


Disciplina a ação de indisponibilidade de bens, direitos ou valores em decorrência de
resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas – CSNU.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1369)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 637

21/10/2015

DECRETO DE 20 DE OUTUBRO DE 2015


Transfere dotações orçamentárias constantes do Orçamento de Investimento para 2015
da empresa Amazonas Distribuidora de Energia S.A. para a empresa Amazonas Geração
e Transmissão de Energia S.A.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1383)

22/10/2015

DECRETO DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor da MGO Rodovias
– Concessionária de Rodovias Minas Gerais Goiás S.A., os imóveis que menciona, loca-
lizados no Município de Catalão, Estado de Goiás.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1388)

DECRETO DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor da Via 040 – Con-
cessionária da BR-040 S.A., os imóveis que menciona, localizados no Município de
Cristalina, Estado de Goiás.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1396)

DECRETO DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Abre aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, em favor de diversos órgãos
do Poder Judiciário e do Poder Executivo, do Ministério Público da União, de Encargos
Financeiros da União e de Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, cré-
dito suplementar no valor de R$ 8.762.319.438,00, para reforço de dotações constantes
da Lei Orçamentária vigente.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1414)
LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE

DECRETO Nº 8.543, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Altera o Decreto nº 8.415, de 27 de fevereiro de 2015, que regulamenta a aplicação do
Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportado-
ras – Reintegra.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1396)

DECRETO Nº 8.544, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Altera o Decreto nº 7.819, de 3 de outubro de 2012, que regulamenta os arts. 40 a 44
da Lei nº 12.715, de 17 de setembro de 2012, que dispõe sobre o Programa de Incentivo
à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores –
638 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Inovar-Auto e o Decreto nº 7.660, de 23 de dezembro de 2011, que aprova a Tabela de


Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – Tipi.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1397)

LEI Nº 13.171, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre o empregador rural; altera as Leis nºs 8.023, de 12 de abril de 1990, e
5.889, de 8 de junho de 1973; e dá outras providências.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1384)

LEI Nº 13.172, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Altera as Leis nºs 10.820, de 17 de dezembro de 2003, 8.213, de 24 de julho de 1991, e
8.112, de 11 de dezembro de 1990, para dispor sobre desconto em folha de pagamento
de valores destinados ao pagamento de cartão de crédito.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1385)

LEI Nº 13.173, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre autorização para a realização de obras e serviços necessários ao forneci-
mento de energia elétrica temporária para os Jogos Rio 2016; altera as Leis nºs 11.473,
de 10 de maio de 2007, que dispõe sobre cooperação federativa no âmbito da segurança
pública, 11.977, de 7 de julho de 2009, que dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha
Vida e a regularização fundiária de assentamentos em áreas urbanas, 12.035, de 1º de
outubro de 2009, que institui o Ato Olímpico, e 12.462, de 4 de agosto de 2011, que
institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC); e revoga o art. 5º-A da
Lei nº 12.035, de 1º de outubro de 2009.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1389)

LEI Nº 13.174, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Insere inciso VIII no art. 43 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece
as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir, entre as finalidades da educação
superior, seu envolvimento com a educação básica.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1393)

LEI Nº 13.175, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Acrescenta art. 2º-A à Lei nº 10.962, de 11 de outubro de 2004, que dispõe sobre a
oferta e as formas de afixação de preços de produtos e serviços para o consumidor, para
obrigar a informação do preço por unidade de medida na comercialização de produtos
fracionados em pequenas quantidades.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1394)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 639

LEI Nº 13.176, DE 21 DE OUTUBRO DE 2015


Acrescenta inciso IX ao art. 964 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código
Civil, para outorgar privilégio especial, sobre os produtos do abate, ao credor por animais.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1394)

23/10/2015

LEI Nº 13.177, DE 22 DE OUTUBRO DE 2015


Altera a Lei nº 12.869, de 15 de outubro de 2013, acerca do regime de permissão de
serviços públicos.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1395)

LEI Nº 13.178, DE 22 DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre a ratificação dos registros imobiliários decorrentes de alienações e concessões
de terras públicas situadas nas faixas de fronteira; e revoga o Decreto-Lei nº 1.414, de
18 de agosto de 1975, e a Lei nº 9.871, de 23 de novembro de 1999.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1399)

LEI Nº 13.179, DE 22 DE OUTUBRO DE 2015


Obriga o fornecedor de ingresso para evento cultural pela internet a tornar disponível
a venda de meia-entrada por esse veículo.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1404)

LEI Nº 13.180, DE 22 DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre a profissão de artesão e dá outras providências.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1405)

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 698, DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Altera a Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, para dispor sobre operações de financia-
LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE

mento habitacional com desconto ao beneficiário concedido pelo Fundo de Garantia do


Tempo de Serviço – FGTS para aquisição de imóveis no âmbito do Programa Minha Casa
Minha Vida construídos com recursos do Fundo de Arrendamento Residencial – FAR.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1403)

26/10/2015

DECRETO DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Declara de utilidade pública obra essencial de infraestrutura portuária de interesse
nacional destinada ao serviço público de transporte marítimo.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1401)
640 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DECRETO DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Define a área do Porto Organizado do Forno, Estado do Rio de Janeiro.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1410)

DECRETO Nº 8.545, DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Promulga o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da
República da Guiné Equatorial sobre o Exercício de Atividade Remunerada por Parte de
Dependentes do Pessoal Diplomático, Consular, Militar, Administrativo e Técnico das
Missões Diplomáticas, Repartições Consulares e Perante Organizações Internacionais,
firmado em Malabo, em 5 de julho de 2010.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1407)

DECRETO Nº 8.546, DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Promulga o Instrumento de Adesão da República Federativa do Brasil ao Banco de De-
senvolvimento do Caribe, firmado em 20 de dezembro de 2010.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1408)

DECRETO Nº 8.547, DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Promulga o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da
República de Moçambique no Domínio da Defesa, firmado em Maputo, em 26 de março
de 2009.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1409)

DECRETO Nº 8.548, DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Promulga o Acordo entre a República Federativa do Brasil e a República Oriental do
Uruguai sobre Transporte Fluvial e Lacustre na Hidrovia Uruguai-Brasil, firmado em
Santana do Livramento, em 30 de julho de 2010.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1410)

DECRETO Nº 8.549, DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Promulga o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da
República de Honduras sobre Cooperação no Domínio da Defesa, firmado em Teguci-
galpa, em 27 de julho de 2007.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1411)

DECRETO Nº 8.550, DE 23 DE OUTUBRO DE 2015


Dispõe sobre a execução do Nono Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Eco-
nômica nº 59 (9PA-ACE59), firmado entre a República Federativa do Brasil, a República
Argentina, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai, Estados Partes
do Mercosul, a República da Colômbia e a República do Equador, Países-Membros da
Comunidade Andina, e a República Bolivariana da Venezuela, de 22 de dezembro de 2011.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1412)
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 641

30/10/2015

DECRETO DE 29 DE OUTUBRO DE 2015


Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, em favor da Via 040 – Con-
cessionária da BR-040 S.A., os imóveis que menciona, localizados no Município de
Congonhas, Estado de Minas Gerais.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1414)

DECRETO Nº 8.551, DE 29 DE OUTUBRO DE 2015


Altera o Decreto nº 8.407, de 24 de fevereiro de 2015, que dispõe sobre a realização, no
exercício de 2015, de despesas inscritas em restos a pagar não processados.
(LEX – FEDERAL – 2015 – X – p. 1413)

LEGISLAÇÃO EM DESTAQUE
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

I – MATÉRIA CÍVEL
—A—
A CAUSA PETENDI DA AÇÃO RESCISÓRIA
— Artigo de Gisele Leite................................................................................................................. 72
A PETIÇÃO INICIAL NO NOVO CPC
— Artigo de Clovis Brasil Pereira.................................................................................................... 68
A VIOLÊNCIA SEXUAL DO GÊNERO É CAUSA DE INDIGNIDADE
— Artigo de Alinne de Souza Marques............................................................................................ 98
AÇÃO ANULATÓRIA
— Acordo. Partilha de bens. Coação moral evidenciada. Doação universal de todos os bens
pertencentes somente à cônjuge virago em favor da sua filha. Ato disposição isolado. Lesão
evidenciada. Ausência de garantia do mínimo patrimonial necessário a assegurar o primado
da dignidade da pessoa humana. Ofensa aos arts. 548 do CC e 1º, III, da CF. Nulidade. TJES
(Em. 77/22)................................................................................................................................ 294
— Ato jurídico. Sucessivos empréstimos tomados junto aos réus pela empresa autora. Transfe-
rência da propriedade de bens móveis e imóvel no decorrer dos anos. Alegação, deduzida em
sede de alegações finais, de que a transferência patrimonial consubstanciaria pacto comis-
sório. Art. 765 do CC/1916, com consentâneo no art. 1.428 do CC/02. Substrato probatório
absolutamente exíguo e inconclusivo a respeito. Coação tampouco indemonstrada. Alegada
quitação do débito indemonstrada. Divergência entre os valores informados pelas partes. TJSC
(Em. 77/23)................................................................................................................................ 295
— Casamento. Recusa em manter relações sexuais com o cônjuge. Sentença que homologou o
acordo celebrado entre as partes e decretou a anulação do casamento. Recurso do MP. Direito
indisponível que não admite transação. Nulidade do processo a partir do protocolo do acordo.
TJSC (Em. 77/42)....................................................................................................................... 305
— Débito fiscal. Isenção tributária. Cobrança indevida de ICMS sobre produtos isentos. Com-
provação. Necessidade de restringir apenas aos produtos hortifrutigranjeiros elencados no

ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
anexo VII do D. 3.803/04. TJMT (Em. 77/85)............................................................................ 322
— Multa ambiental. Deposição irregular de resíduos. A área atingida foi devidamente delimitada
e o cálculo da multa obedeceu aos critérios legais. O recorrente era, à época dos fatos, o único
proprietário do imóvel. Aplicação do art. 1.245, § 1º, do CC. TJSP (Em. 77/19)...................... 293
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
— Bem não tombado. Prova do valor histórico. Dever de conservação pelo proprietário. No caso,
está devidamente comprovado que o Moinho Backhaus é relevante para o patrimônio histó-
rico da comunidade de Rolante, devendo os proprietários adotar as medidas de conservação
requeridas na ACP ajuizada pelo MP. TJRS (Em. 77/28)............................................................ 297
— Bem público. Doação. Encargo. Prescrição. Termo inicial. Contagem. Não ocorrência. Julga-
mento antecipado. Teoria da causa madura. Inaplicabilidade. Na doação com encargo em que
não há prazo estipulado para o seu cumprimento, o termo inicial para a contagem do prazo
prescricional surge com a lesão ao direito do doador. TJAC (Em. 77/25).................................. 296
— Dano ambiental. Reparação do dano. Cumulação com indenização. Impossibilidade no caso
concreto. Não sendo irrecuperáveis os danos, não há que se falar no pagamento de indenização.
TJRS (Em. 77/26)........................................................................................................................ 296
— Guarujá. Serra do Guararu. Loteamento Taguaíba. Cancelamento da autorização para desmate
e construção. Ato administrativo. Nulidade. Autotutela. Os agentes constataram intervenções
em APP (proximidade a curso d’água e declividade acentuada), bem como canalização de
córrego sem autorização do DAEE. Ausente a prova pericial, único meio para desconstituir
os motivos que levaram à anulação dos atos administrativos, não há como afastar a decisão
administrativa. TJSP (Em. 77/18)............................................................................................... 293
— Jogos de azar. Bingos, caça-níqueis e afins. Súmula Vinculante 2/STF. Vedação pela Lei 9.981/00.
Inexistência, por ora, de legislação que autorize a atividade. Indenização por dano moral
coletivo. Cabimento. O dano moral coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento
644 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

e de abalo psicológico, pois tal comprovação, embora possível na esfera individual, torna-se
inaplicável quando se cuida de interesses difusos e coletivos. STJ (Em. 77/27)........................ 296
— Matadouro público. Condições precárias. Risco de dano ambiental à saúde e à vida da popu-
lação circunvizinha. Realização de obras necessárias. Multa diária. Desproporcionalidade no
valor fixado de R$ 10.000,00 (dez mil reais), limitado ao valor de R$ 200.000,00 (duzentos
mil reais). Reduzo de ofício a multa diária ao valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitado ao
valor de R$ 30.000,00, eis que os valores apresentam-se elevados. Responsabilização pessoal
do agente público. Impossibilidade. TJSE (Em. 77/34).............................................................. 300
— Obras de infraestrutura em loteamento. Liminar que determina a adoção de medidas para
cessar o risco de desabamento em área de risco. Recurso que tenta afastar a responsabilidade
do Município de Manaus. Art. 30, VIII, da CF/88. Impossibilidade. Hipótese de responsabili-
dade solidária dos entes públicos municipal e estadual. Liminar que deve ser mantida. Multa
diária ao ente municipal por descumprimento da decisão. Possibilidade. TJAM (Em. 77/29).. 297
— Obrigação de fazer. Fornecimento de água potável. Convênio entre Funasa e Município.
Descumprimento do prazo. Serviço essencial. Violação aos princípios constitucionais da
eficiência da Administração Pública e da dignidade da pessoa humana. A política nacional
de saneamento básico deve se amoldar às garantias constitucionais, por isso não se identifica
que o julgamento de procedência da ACP, com o fim de garantir o abastecimento de água
potável à população, contrarie a Lei 11.445/07 (art. 2º, I, II e XII, e caput do art. 19). TJAP
(Em. 77/30)................................................................................................................................ 298
— Parcelamento do solo urbano. Regularização de loteamento privado. Responsabilidade
subsidiária do município. Art. 40 da Lei 6.766/79. Procedimento facultativo. É facultativo o
procedimento previsto no art. 40 da Lei 6.766/79, o qual possibilita ao município o ressarci-
mento dos custos financeiros pela realização de obras de infraestrutura em loteamento privado
irregular, quando o loteador não as realiza. É subsidiária a responsabilidade do ente municipal
pelas obras de infraestrutura necessárias à regularização de loteamento privado, quando ainda
é possível cobrar do loteador o cumprimento de suas obrigações. STJ (Em. 77/31)................. 298
— Parque da cidade. Irregularidade na exploração de espaços públicos. A omissão do Distrito
Federal quanto à exploração de área pública por particular justifica a sua condenação em
obrigação de fazer para a adoção de medidas necessárias à regularização do uso. TJDF (Em.
77/32)......................................................................................................................................... 299
— Patrimônio histórico nacional. Tombamento. Lei 11.483/07. Bem da extinta RFFSA. Estação
ferroviária. Controle judicial sobre decisões administrativas. O reconhecimento do valor
artístico, histórico e cultural para o tombamento de determinado bem na esfera estadual
não conduz, necessariamente, a idêntico posicionamento no âmbito federal. Inexistindo
tombamento pelo IPHAN, é inviável a condenação da União Federal e dos demais apelados
à elaboração e à execução de projeto de recuperação do imóvel, a ser submetido à aprovação
da referida autarquia. TRF 2ª R. (Em. 77/33)............................................................................. 299
— Poluição ambiental. Vazamento de óleo de embarcação. Agente marítimo. Legitimidade ad
causam passiva. Tutela antecipatória. Cumprimento. Perda intercorrente de interesse proces-
sual. Inocorrência. Demora na contenção. Responsabilidade objetiva. Procedência. TJRJ (Em.
77/38)......................................................................................................................................... 302
— Poluição sonora. Ministério Público. Legitimidade reconhecida. Dano moral coletivo. Redução
da indenização. STJ (Em. 77/39)................................................................................................ 303
— Proteção de faixa marginal de curso d’água, na qualidade de área de preservação permanen-
te. Decisão interlocutória que deferiu parcialmente as medidas de urgência postuladas pelo
Parquet. Característica própria dos cursos d’água intermitentes, cujas margens são APP. Art.
4º, I, da Lei 12.651/2012. Ausência, ademais, de licenças ambientais. Incidência dos princí-
pios da prevenção e da precaução. Prevalência da proteção ambiental no caso de incerteza
técnica. Paralisação das obras. Medida necessária à conservação do aventado curso d’água e
sua respectiva APP. Publicidade à demanda por meio de averbação na matrícula do imóvel e
colocação de placa indicativa no local. Suficiência da averbação. TJSC (Em. 77/40)................ 304
— Queima da palha da cana-de-açúcar. Pretendida condenação das corrés à obrigação de não fazer
consistente na abstenção da prática de queima da palha da cana-de-açúcar. Impossibilidade.
Prática que não é ilícita quando autorizada pelos órgãos ambientais competentes. Pretendida
condenação ao pagamento de indenização pelos danos ambientais decorrentes da queima.
Impossibilidade. Ausência de demonstração do efetivo dano, apto a dar ensejo à indenização.
TJSP (Em. 77/35)........................................................................................................................ 300
— Tombamento. Conjunto arquitetônico e paisagístico no Município de Santa Cruz Cabrália/
BA. Construção irregular. Pavimento superior. Descaracterização após o tombamento. Con-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 645

figuração. Laudos técnicos. Poder Público. Ora, se o Poder Público, diante das circunstâncias
concretas da lide, não pudesse adotar as medidas consignadas na sentença recorrida, tal
omissão esvaziaria a eficácia do mencionado dispositivo constitucional e deixaria um flanco
aberto para toda sorte de vulneração ao postulado fundamental de preservação do patrimônio
histórico e cultural do país. TRF 1ª R. (Em. 77/36)................................................................... 301
— Uso excessivo e imotivado de força policial. Comunidades quilombolas e segmentos da so-
ciedade civil. Dano moral coletivo. Cabimento. Responsabilidade civil objetiva do Estado de
Minas Gerais. Na hipótese dos autos, comprovados o nexo de causalidade e o evento danoso,
resultante do uso injustificado de força policial excessiva, por parte de agentes públicos do
EMG, mediante a realização de prisão ilegal, o uso indevido de algemas e a exposição de
membros de comunidades quilombolas à execração pública, com o intuito de intimidar e de
inibir, à margem da lei, a sua atuação, na defesa do exercício do seu direito à posse de terras,
resta caracterizado o dano moral coletivo, do que resulta o dever de indenizar, nos termos do
referido dispositivo constitucional. TRF 1ª R. (Em. 77/37)....................................................... 301
AÇÃO DE COBRANÇA
— Acórdão do STJ – Serviços advocatícios prestados de forma individualizada ao HSBC e ao Ba-
merindus. Solidariedade. Impossibilidade. Não ocorrência de sucessão universal. Necessidade
de delimitação da responsabilidade de cada uma das partes demandadas................................. 189
— ECAD. Direitos autorais. Indenização pela realização de eventos musicais. Comprovação pelo
autor. Fatos impeditivos. Ônus da prova do réu. Litigância de má-fé. Ausência. TJDF (Em.
77/44)......................................................................................................................................... 306
— Hospital em face dos consumidores. Material usado em procedimento que não foi reembolsado
pelo plano de saúde. Inadimplência confessada. Responsabilidade civil configurada. A denun-
ciação da lide deve, até pela aplicação do princípio da celeridade, impor ao réu denunciado
o dever de efetuar o pagamento diretamente aos réus da ação principal, como solidário. TJRJ
(Em. 77/46)................................................................................................................................ 307
— Incorporação imobiliária. Averbação relativa a negócio jurídico que envolve o empreendimento.
Custas e emolumentos. Ato de registro único. Aplicação do art. 237-A, § 1º, da LRP. TJDF
(Em. 77/45)................................................................................................................................ 306
— Prestação de serviços. Contrato verbal. Ausência de prova impeditiva/modificativa do direito
da reclamada. Trata-se no caso de contrato informal de prestação de serviços de empreitada,
inexistindo vínculo empregatício ou de subordinação. TJAC (Em. 77/155).............................. 349
— Seguro de vida. Cobertura para morte por acidente. Segurado que faleceu por queda do avião
que pilotava. Contrato de adesão. Aplicação do CDC que não impede a aplicação de cláusulas
limitativas de direito. Dever de serem redigidas de forma expressa e clara. Prévia cientificação
do consumidor comprovada. TJPR (Em. 77/47)........................................................................ 307
— Seguro de vida. Prestamista. Falecimento da consorciada. Ilegitimidade ativa dos herdeiros.
Não se trata de seguro de vida, mas de proteção financeira (prestamista), que tem por objetivo
garantir a quitação de uma dívida do segurado, no caso de sua morte ou invalidez ou até mesmo
desemprego involuntário. O primeiro beneficiário deste tipo de seguro, até o limite da dívida,
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

será sempre a estipulante, ou seja, a administradora do consórcio. TJMG (Em. 77/175).......... 357
— Seguro de vida em grupo. Empregadora mandatária. Seguro facultativo. Prescrição ânua. A
ação de cobrança da seguradora contra a empregadora-estipulante relativa a prêmios não pagos
de seguro de vida em grupo sujeita-se ao prazo prescricional de um ano. STJ (Em. 77/176).... 357
AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO
— Mútuo imobiliário. Hipótese que, em princípio, era desnecessária a propositura da cautelar
para consignar prestações vencidas no curso da lide principal a fim de afastar a mora. Hipó-
tese, ademais, em que demonstrada a recusa injustificada pelo credor. Pedido consignatório
procedente com a liberação da devedora das prestações do financiamento depositadas nos
autos. TJSP (Em. 77/48)............................................................................................................. 307
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INDIGNIDADE
— Demanda movida em face dos herdeiros de suposto autor de homicídio contra o irmão da
autora, que era seu pai adotivo. Suposto indigno que também já faleceu. Impossibilidade de
extensão dos efeitos da dignidade aos sucessores deste. Exclusão pretendida que tem caráter
pessoal. Inteligência do art. 1.816 do CC (art. 1.599 do CC/1916). TJSP (Em. 77/177)........... 357
AÇÃO MONITÓRIA
— Duplicata prescrita. Prazo prescricional de cinco anos, contados do vencimento da obrigação.
Art. 206, § 5º, I, do CC. STJ (Em. 77/71)................................................................................... 317
646 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

— Entrega de mercadoria. Ausência de liquidez. Nota fiscal sem assinatura do adquirente. Do-
cumento unilateral. Inadmissibilidade. TJAP (Em. 77/151)...................................................... 348
— Juntada de documento com a apelação. Possibilidade. Art. 397 do CPC. É possível a juntada
a posteriori de documentos com a apelação, desde que tais documentos sejam acerca de fatos
já alegados ou para contrapor-se a outros fatos que foram produzidos nos autos, nos termos
do art. 397 do CPC. STJ (Em. 77/72)......................................................................................... 317
AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE
— Vide Negatória de Paternidade.
AÇÃO POPULAR
— Condições da ação. Ajuizamento para combater ato lesivo à moralidade administrativa. Pos-
sibilidade. Reafirmação de jurisprudência. Repercussão geral reconhecida. STF (Em. 77/74).. 318
AÇÃO RESCISÓRIA
— Artigo de Gisele Leite: “A Causa Petendi da Ação Rescisória”.................................................... 72
— Falência ajuizada sob a vigência do DL 7.661/45. Sentença que decretou a falência com
base na nova Lei de Falências e recuperação judicial. Lei 11.101/05. Desobediência ao art.
192 da Lei 11.101/05. Violação à literal disposição de Lei. Art. 485, V, do CPC. Ausência de
documentos necessários à propositura da ação falimentar, ex vi do art. 15 da Lei 5.474/68 e
da Súmula 361/STJ. Interpretação e incidência dos princípios do devido processo legal, do
contraditório e da ampla defesa – CF, art. 5º, LIV e LV – e da regra insculpida no art. 284 do
CPC. Rescisória julgada procedente, em parte. Devolução do valor do depósito previsto no
art. 488, II, do CPC. TJAL (Em. 77/75)...................................................................................... 318
— Sentença meramente homologatória. Divergência doutrinária. Existência de duas correntes.
Filio-me ao primeiro entendimento, de que não cabe rescindendo na sentença meramente
homologatória. Em ressunta, a sentença que se pretende rescindir é meramente homologatória
do acordo celebrado entre as partes, sem análise do mérito de direito material controvertido.
Cabível a anulação do ato realizado entre as partes (art. 486 do CPC), não a propositura de
AR (art. 485 e seus incisos), se o vício alegado se refere ao acordo, não à sentença. TJCE (Em.
77/80)......................................................................................................................................... 320
AÇÃO REVISIONAL
— Alimentos. Maioridade do alimentando. Isonomia na obrigação alimentar. Art. 227, § 6º, da
CF. No caso concreto, embora não se vislumbre o suposto empobrecimento e a incapacidade
financeira do apelante em continuar pagando a obrigação alimentar no importe a um salário
mínimo e meio, a incontroversa nos autos corroborada por documentos, de que o alimentante
paga quantia equivalente a um salário mínimo para outro filho dele, também maior de idade,
e, em situação semelhante do apelado, autoriza a revisão dos alimentos para adequar-se os
valores pagos, para que não se venha a alegar ofensa ao primado constitucional da isonomia
dos alimentos aos filhos. TJAP (Em. 77/174)............................................................................. 357
— Cédula de crédito bancário. Financiamento de veículo. Incidência do CDC. Revisão que é
possível em face da onerosidade excessiva. Arts. 6º, IV e V, e 51, IV, ambos do CDC. “Registro de
contrato”. Cobrança desta despesa que nunca foi vedada. “Serviços de terceiros”. Encargo que,
apesar de pactuado, não está devidamente especificado, desconhecendo-se quais os serviços
prestados ao mutuário. Ilegalidade da cobrança. Nova orientação da Câmara. Repetição do
indébito. Direito assegurado, na forma simples, para o fim de evitar o enriquecimento ilícito
e que independe da prova do erro no pagamento. TJSC (Em. 77/64)........................................ 315
— Contrato bancário. Cheque especial. Aplicabilidade CDC. Juros. Taxa média. Capitalização
mensal. Possibilidade. Sob a égide do CDC, adequar-se-á o princípio pacta sunt servanda,
tornando-o relativo, em face da à função social do contrato e da boa-fé das partes, proporcio-
nando a defesa do consumidor em caso de pactos abusivos, sem que isso enseje insegurança
jurídica. TJMG (Em. 77/173)..................................................................................................... 356
— Contrato bancário. Comissão de permanência. Tarifa de avaliação do bem. Tarifa de serviço
de terceiros. Tarifa de registro de contrato. É possível a cobrança de comissão de permanência,
desde que limitada à soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato,
não podendo sua cobrança ser cumulada com correção monetária, juros remuneratórios e
moratórios e multa contratual. As tarifas de avaliação de bem, de serviços de terceiros e de
registro de contrato figuram-se abusivas, por se tratarem de serviços de exclusivo interesse
da instituição financeira. TJMG (Em. 77/77)............................................................................. 319
— Cooperativa de crédito. Aplicação do CDC. Tarifa de adiantamento de depositante. Repetição
e/ou compensação de indébito. No caso, não há demonstração de contratação explícita entre
as partes, o que afasta a cobrança da tarifa. Compensação. Repetição. TJRS (Em. 77/76)......... 318
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 647

— Leasing. Arrendamento mercantil. Tanto na conclusão quanto na execução dos contratos,


as partes devem observar os princípios da probidade e da boa-fé. Perfeitamente cabível a
cobrança da tarifa de cadastro, pois em total consonância com as disposições emanadas pelo
Banco Central e pelo CMN, conforme entendimento do STJ em sede de recurso repetitivo. Não
pode a arrendadora requerer o pagamento de valores sem informar a consumidora, de forma
detalhada e clara, a que se referem. Se o seguro de proteção era facultativo, e a arrendatária
aceitou sua contratação, não há que se falar em cobrança indevida. TJSP (Em. 77/87)............ 323
ACIR DE MATOS GOMES E FÁBIO CANTIZANI GOMES
— Artigo: “Cabimento de Ações Coletivas para a Alteração de Nomes de Logradouros Públicos
que Homenageiam Representantes da Ditadura Militar”............................................................ 138
ACORDO
— Alimentos. Cônjuges sob o mesmo teto. Alimentos para ex-cônjuges. Requisitos. Não preen-
chimento. Cônjuges que permanecem com o vínculo marital e convivem de forma harmoniosa
sob o mesmo teto, com regular prestação do dever de assistência e sustento, não fazem jus à
percepção de alimentos. TJDF (Em. 77/79)................................................................................ 319
— Partilha de bens. Coação moral evidenciada. Doação universal de todos os bens pertencentes
somente à cônjuge virago em favor da sua filha. Ato disposição isolado. Lesão evidenciada.
Ausência de garantia do mínimo patrimonial necessário a assegurar o primado da dignidade
da pessoa humana. Ofensa aos arts. 548 do CC e 1º, III, da CF. Nulidade. TJES (Em. 77/22).. 294
ADJUDICAÇÃO
— Acórdão do TRF 2ª R. – Propriedade industrial. Marca. Prescrição observada em relação a um
dos pedidos. Excepcionalidade da adjudicação. Não comprovada a má-fé no caso. Em via de
consequência, improcedente a pretensão adjucatória em relação ao registro 822.431.998....... 256
ADOÇÃO À BRASILEIRA
— Investigação de paternidade. Julgamento monocrático. Possibilidade. Princípios constitucio-
nais. Observância. Paternidade socioafetiva e biológica. A tese segundo a qual a paternidade
socioafetiva sempre prevalece sobre a biológica deve ser analisada com bastante ponderação e
depende sempre do exame do caso concreto. Afastar a possibilidade de o filho maior pleitear o
reconhecimento de paternidade biológica em seu assento de nascimento, no caso de “adoção
à brasileira”, significa impor-lhe que se conforme com essa situação, criada à sua revelia e à
margem da lei. TJGO (Em. 77/56).............................................................................................. 311
ADVOGADO
— Acórdão do TJRJ – Termo de inventariança. Requerimento de assinatura pelo patrono. Ad-
missibilidade. CPC, art. 38. Recurso conhecido e provido para autorizar que o advogado do
agravante assine o termo de inventariança................................................................................. 279
— Ausência de prestação de contas. Viola o disposto no art. 34, XX e XXI, da Lei 8.906/94 pro-
fissional que retém valores de cliente por mais de dois anos e se recusa a prestar contas dos
valores recebidos, apenas repassando os valores após incisiva cobrança. Pena de suspensão
do exercício profissional nos termos do art. 37, I e II, do EAOAB. OAB/CF (Em. 77/307)....... 623
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Exclusão decorrente de reiteradas suspensões. Falta de adoção de medidas capazes de descons-
tituir as suspensões que acarretaram a aplicação da penalidade capital prevista no estatuto.
Impossibilidade de discussão no processo de exclusão das penalidades anteriores. OAB/CF
(Em. 77/311).............................................................................................................................. 624
— Exercício profissional. Endereço errado fornecido pelo cliente ao advogado. Cautela do advo-
gado na coleta de dados fornecidos pelo cliente. Isenção de culpa por parte do advogado que
não compactuou com os dados fornecidos pelo cliente. Cabe ao advogado fazer o controle
da verdade antes mesmo de propor a ação ou realizar a defesa para atender aos interesses
de seu cliente, sob pena de incorrer em situações que podem até mesmo afetar-lhe perante
a OAB, em procedimento disciplinar. Todavia, caso o advogado tenha ciência desta falácia,
contribuindo direta ou indiretamente para tal diante das informações prestadas pelo cliente,
responde solidariamente por danos processuais e éticos no exercício funcional, por pactuar
com a falsa informação. OAB/SP-TED (Em. 77/308)................................................................. 623
— Inadimplência de anuidades devidas à OAB. Infração disciplinar. Suspensão do exercício
profissional. Prorrogação até a quitação da dívida. Afastamento. Prescrição. Constitui infração
disciplinar deixar o advogado de pagar as contribuições devidas à OAB, depois de regularmente
notificado a fazê-lo, podendo a sanção disciplinar ser prorrogada até a quitação integral, nos
termos do art. 37, § 2º, do EAOAB. Porém, essa prorrogação está limitada pela prescrição
para a cobrança dos débitos de anuidades, que segura o prazo do art. 206, § 5º, I, do CC,
648 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

que determina o prazo de cinco anos para a cobrança de dívidas fundadas em instrumentos
público ou particular. OAB/CF (Em. 77/314)............................................................................. 625
— Incompatibilidade e impedimento. Advogados conciliadores e mediadores nos centros judi-
ciários de solução de conflitos e cidadania. Inexistência da primeira e existência da segunda.
Impedimento para atuar como advogado para as partes que atendeu como mediador e con-
ciliador e na vara com a qual colaborou naquela condição, sob pena de configurar captação
de clientela e concorrência desleal. Necessidade de sujeição à cláusula de confidencialidade.
OAB/SP-TED (Em. 77/306)........................................................................................................ 623
— Inviolabilidade do escritório. Recebimento de correspondência de entidade sem fins lucrativos.
Vedação. Exercício de funções independentes por advogado. Endereço profissional. OAB/
SP-TED (Em. 77/310)................................................................................................................. 624
— Pedido revisional. A competência para o julgamento da pretensão revisional é do Conselho
Federal da OAB, quando a decisão de mérito for de sua lavra ou decorrente de processos
disciplinares de sua competência originária. Não conhecimento da pretensão. OAB/CF (Em.
77/312)....................................................................................................................................... 625
— Processo ético disciplinar. Prescrição quinquenal. Inocorrência. Causas interruptivas. A
prescrição está regulada no art. 43, § 2º, I, da Lei 8.906/94 e tem como causas interruptivas a
instauração de processo disciplinar ou pela notificação válida feita diretamente ao represen-
tado. Não tendo ocorrido lapso temporal superior a cinco anos entre a notificação válida e a
decisão condenatória pelo TED, não há que se acolher a perda da pretensão punitiva. OAB/
CF (Em. 77/313)......................................................................................................................... 625
— Sigilo profissional. Testemunho em inquérito policial envolvendo cliente. Invocação de sigilo
profissional. O advogado pode recusar-se a depor em inquérito policial ou processo relacio-
nado com cliente ou ex-cliente. Somente poderá quebrar o sigilo em situações excepcionais,
sempre restritas ao interesse da causa. OAB/SP-TED (Em. 77/315)........................................... 626
AGÊNCIA DE TURISMO
— Dano moral e material. Falha na prestação de serviço. Não configurado. É de responsabili-
dade exclusiva da autoridade consular a concessão ou não do visto solicitado. O serviço ora
contratado constitui-se na assessoria à obtenção do visto, sendo considerado efetivamente
prestado independente do resultado final. TJES (Em. 77/106).................................................. 330
AGRAVO
— Art. 544 do CPC. Aplicação da sistemática da repercussão geral pelo Tribunal de origem (art.
543-B do CPC). Interposição do agravo previsto no art. 544 do CPC. Não cabimento. Prin-
cípio da fungibilidade recursal. Devolução dos autos ao Tribunal de origem para julgamento
do recurso como agravo interno. Cabimento somente para os recursos interpostos antes de
19.11.09. Configuração de erro grosseiro. STF (Em. 77/86)...................................................... 323
ÁGUA POTÁVEL
— Fornecimento. Ação civil pública. Obrigação de fazer. Convênio entre Funasa e Município.
Descumprimento do prazo. Serviço essencial. Violação aos princípios constitucionais da
eficiência da Administração Pública e da dignidade da pessoa humana. A política nacional
de saneamento básico deve se amoldar às garantias constitucionais, por isso não se identifica
que o julgamento de procedência da ACP, com o fim de garantir o abastecimento de água
potável à população, contrarie a Lei 11.445/07 (art. 2º, I, II e XII, e caput do art. 19). TJAP
(Em. 77/30)................................................................................................................................ 298
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA
— Acórdão do TJSC – Conversão do procedimento. Busca e apreensão convertida em depósito.
Localização do veículo. É plenamente possível o cumprimento da liminar se o bem é localizado
após a conversão. Inteligência do art. 905 do CPC.................................................................... 284
— Busca e apreensão. Deferida liminarmente. Purgação da mora. Inocorrência. Mora contratual
configurada. Devolução das parcelas pagas. Inadmissibilidade. Devedor tem direito somente
ao crédito remanescente da venda do bem pelo credor. TJSP (Em. 77/43)................................ 306
ALIMENTOS
— Ação revisional. Maioridade do alimentando. Isonomia na obrigação alimentar. Art. 227, § 6º,
da CF. No caso concreto, embora não se vislumbre o suposto empobrecimento e a incapacidade
financeira do apelante em continuar pagando a obrigação alimentar no importe a um salário
mínimo e meio, a incontroversa nos autos corroborada por documentos de que o alimentante
paga quantia equivalente a um salário mínimo para outro filho dele, também maior de idade,
e, em situação semelhante do apelado, autoriza a revisão dos alimentos para adequar-se os
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 649

valores pagos, para que não se venha a alegar ofensa ao primado constitucional da isonomia
dos alimentos aos filhos. TJAP (Em. 77/174)............................................................................. 357
— Avós. Fixação. Cabimento. Valor reduzido. Marco final da obrigação alimentar. Descabimen-
to. A obrigação alimentar avoenga é “subsidiária” ou “complementar”. Hipótese em que vai
mantida a obrigação da avó prestar alimentos à neta. Tratando-se de alimentando maior de
idade e recém formado, não se justifica a manutenção da obrigação alimentar, sem qualquer
termo final, como requerido pela alimentanda. TJRS (Em. 77/82)............................................ 321
— Cônjuges sob o mesmo teto. Alimentos para ex-cônjuges. Requisitos. Não preenchimento.
Cônjuges que permanecem com o vínculo marital e convivem de forma harmoniosa sob o
mesmo teto, com regular prestação do dever de assistência e sustento, não fazem jus à per-
cepção de alimentos. TJDF (Em. 77/79)..................................................................................... 319
— Divórcio. Decisão liminar que indeferiu a fixação de alimentos provisórios. Pedido de an-
tecipação dos efeitos da tutela formulado em impugnação à contestação. Requerimento de
divisão antecipada dos lucros mensais. Divisão de lucros mensais albergada pelo instituto dos
alimentos compensatórios. Distinção entre alimentos decorrentes da relação familiar. Lucros
da empresa que se confundem com os lucros dos sócios. Impossibilidade de divisão de lucros
da maneira pretendida pela agravante. Alimentos compensatórios fixados em R$ 4.000,00.
TJPR (Em. 77/51)....................................................................................................................... 308
— Execução. Penhora. Valores depositados na conta da empresa. Aplicação da disregard doctrine.
Pagamentos in natura. Compensação. Descabimento. Se o devedor possui bens passíveis de
garantir a execução, descabe a aplicação do disposto no art. 50 do CC, não se cogitando de
confusão patrimonial ou desvio de finalidade. TJRS (Em. 77/123)............................................ 336
— Execução. Prisão civil. Devedor de alimentos. Choque de direitos fundamentais. Liberdade
x direito a alimentos. Aparente antinomia. Solução à luz da ponderação de interesses e do
princípio da proporcionalidade. Prisão como medida adequada e necessária, mas, no entanto,
desproporcional. Malefícios superam benefícios. Possibilidade de causar perda do emprego
do paciente. Liberdade como instrumento garantidor do direito de alimentos dos filhos do
impetrante. Ordem concedida. Liminar confirmada. TJAM (Em. 77/136)................................ 341
— Execução. Prisão civil. Pagamento parcial. Irrelevância. Restabelecimento do mandado de
prisão. O adimplemento parcial da dívida não é capaz de elidir a prisão civil do devedor de
alimentos. Liminar revogada. TJAC (Em. 77/124)..................................................................... 337
— Filha menor. Pleito de redução do percentual fixado. No caso, analisada a prova documental
apresentada nos autos, sobretudo os contracheques do apelante, suas despesas e as da me-
nor, tenho que restou demonstrada a impossibilidade de arcar com o valor dos alimentos no
percentual estipulado pelo sentenciante (30%), impondo-se a redução dos alimentos para o
equivalente a 20% de seus rendimentos, o que considero mais condizente com a sua possibi-
lidade e com as despesas regulares da menor demonstradas nos autos. TJSE (Em. 77/83)....... 322
ALIMENTOS GRAVÍDICOS
— Manutenção dos avós paternos no polo passivo da demanda. Manutenção do valor arbitrado
pela magistrada de origem. Valor que reflete as necessidades decorrentes da gravidez e a
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
possibilidade dos genitores. O suposto pai da criança se licenciou do cargo de auditor fiscal
estadual que ocupava, sem percepção de vencimentos, passando a residir nos Estados Unidos,
onde conta com a ajuda financeira de seus pais, que também residem no exterior. Embora a
agravada exerça atividade remunerada, atuando como bancária, os alimentos gravídicos devem
ser suportados não só por um genitor, mas, sim, por ambos, na proporção de seus recursos.
TJES (Em. 77/41)........................................................................................................................ 305
ALIMENTOS PROVISÓRIOS
— Investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos e anulação do registro de
nascimento. Adequação ao trinômio necessidade, possibilidade, razoabilidade. Majoração
devida. Comprovada a privilegiada situação financeira do prestador, bem como a necessidade
presumida da criança e a ausência de estrutura econômica da mãe, merecem ser majorados os
alimentos estabelecidos na decisão proferida pelo julgador singular, evidenciado que aquele
valor é insuficiente à manutenção das despesas mensais ordinárias da menor. TJGO (Em.
77/57)......................................................................................................................................... 312
ALINNE DE SOUZA MARQUES
— Artigo: “A Violência Sexual do Gênero É Causa de Indignidade”.............................................. 98
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
— Educação de Jovens e Adultos – EJA. Aluno cursando o módulo II do ensino médio. Aprova-
ção em vestibular. Ausência de frequência mínima. Não se reconhece o direito do aluno em
650 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

ser submetido à avaliação escolar que lhe permita avançar em nível educacional, quando ele,
matriculado no módulo II, equivalente ao segundo ano do ensino médio da modalidade de
ensino a distância, para a Educação de Jovens e Adultos – EJA, não comprovar o prazo mínimo
de frequência no ensino médio, essencial para a pretensão vindicada. TJDF (Em. 77/179)...... 358
APELAÇÃO
— Juntada de documento com a apelação. Possibilidade. Art. 397 do CPC. É possível a juntada
a posteriori de documentos com a apelação, desde que tais documentos sejam acerca de fatos
já alegados ou para contrapor-se a outros fatos que foram produzidos nos autos, nos termos
do art. 397 do CPC. STJ (Em. 77/72)......................................................................................... 317
— Recebida em seu duplo efeito. Impossibilidade de execução provisória. Art. 521 do CPC.
Necessidade de extinção do procedimento executório e liberação dos valores bloqueados. Em
razão do efeito suspensivo atribuído ao apelo, nenhum ato de constrição pode ser efetuado
antes do julgamento, de forma que deve haver a suspensão do procedimento de execução
provisória. TJAL (Em. 77/70)..................................................................................................... 316
APREENSÃO DE VEÍCULO CICLOMOTOR
— Registro e licenciamento. Competência municipal. Ausência de regulamentação da matéria.
Condução sem habilitação ou autorização. Diárias de depósito limitadas a 30 dias. Apreendido
veículo ciclomotor em razão de condução sem habilitação, em conformidade com o disposto
no art. 162, I, do CTB, cabível a exigência de pagamento de despesas de remoção e diárias de
depósito, estas limitadas em 30 dias. TJRS (Em. 77/148)........................................................... 347
AQUISIÇÃO DE VEÍCULO
— Acórdão do TRF 5ª R. – Portador de deficiência física. IPI. Isenção. Lei 8.989/95, art. 1º, IV,
§ 1º. Possibilidade....................................................................................................................... 272
ARROLAMENTO DE BENS
— União estável post mortem. Decisão que determinou a inclusão da agravada como herdeira
para lhe atribuir o equivalente a 2/3 da herança, caso comprovada a condição de irmã do
de cujus. Insurgência da agravante, companheira do de cujus. Tendo o de cujus deixado uma
irmã, cabe à agravante apenas 1/3 da herança, além do direito à meação sobre o imóvel, como
corretamente decidiu a decisão agravada. TJSP (Em. 77/88)..................................................... 323
ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA
— Acórdão do TJSP – Cumprimento de sentença. Alienação, pelo executado, de bens imóveis
aos filhos após o trânsito em julgado do acórdão que confirmou a sentença condenatória,
reduzindo-o à insolvência. Fraude à execução caracterizada. Imposição de multa por ato
atentatório à dignidade da justiça que atende ao preceito expresso e objetivo do art. 600, I, do
CPC. Penalidade mantida em 20% do valor atualizado do débito, dada a gravidade da conduta
do executado............................................................................................................................... 287
AVAL
— Cédula de crédito rural. A interpretação sistemática do art. 60 do DL 167/67 permite inferir
que o significado da expressão “também são nulas outras garantias, reais ou pessoais”, disposta
no seu § 3º, refere-se diretamente ao § 2º, ou seja, não se dirige às cédulas de crédito rural,
mas apenas às notas e duplicatas rurais. STJ (Em. 77/302)........................................................ 621
— Cédula de crédito rural emitida por pessoa física. Garantia de aval prestada por terceiro. Art.
60, § 3º, do DL 167/67. Validade. Entendimento firmado no julgamento do REsp 1.483.853/
MS. Vedar a possibilidade de oferecimento de crédito rural direto mediante a constituição de
garantia de natureza pessoal (aval) significa obstruir o acesso a ele pelo pequeno produtor
ou só o permitir em linhas de crédito menos vantajosas. STJ (Em. 77/303).............................. 621
— Nulidade. É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de crédito rural emitida
também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do DL 167/67. TJMS (Em.
77/300)....................................................................................................................................... 621
— Nulidade. É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de crédito rural emitida
também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do DL 167/67. TJPR (Em.
77/301)....................................................................................................................................... 621
— Nulidade. Outorga uxória. Ausência. Ato anulável. Execução extinta. Preceitua o CC, art. 1.647,
III, que, “ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do
outro, exceto no regime da separação absoluta, prestar fiança ou aval”. TJMG (Em. 77/91).... 325
AVALIAÇÃO JUDICIAL DA “REPRESENTAÇÃO ADEQUADA” DAS ENTIDADES
LEGITIMADAS PARA AS AÇÕES COLETIVAS NO BRASIL – ESTUDO DO CASO
JULGADO PELO STJ NO RESP 1.213.614/RJ
— Artigo de Demócrito Reinaldo Filho........................................................................................... 11
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 651

AVÓS
— Alimentos. Fixação. Cabimento. Valor reduzido. Marco final da obrigação alimentar. Desca-
bimento. A obrigação alimentar avoenga é “subsidiária” ou “complementar”. Hipótese em
que vai mantida a obrigação de a avó prestar alimentos à neta. Tratando-se de alimentando
maior de idade e recém formado, não se justifica a manutenção da obrigação alimentar, sem
qualquer termo final, como requerido pela alimentanda. TJRS (Em. 77/82)............................. 321
— Alimentos gravídicos. Manutenção dos avós paternos no polo passivo da demanda. Manutenção
do valor arbitrado pela magistrada de origem. Valor que reflete as necessidades decorrentes
da gravidez e a possibilidade dos genitores. O suposto pai da criança se licenciou do cargo
de auditor fiscal estadual que ocupava, sem percepção de vencimentos, passando a residir
nos Estados Unidos, onde conta com a ajuda financeira de seus pais, que também residem
no exterior. Embora a agravada exerça atividade remunerada, atuando como bancária, os
alimentos gravídicos devem ser suportados não só por um genitor, mas, sim, por ambos, na
proporção de seus recursos. TJES (Em. 77/41).......................................................................... 305

—B—
BEM DE FAMÍLIA
— Penhora. Embargos. Imóvel rural. Lei 8.009/90. Impenhorabilidade reconhecida na senten-
ça, com exceção da área sem construções, benfeitorias e plantações. Imóvel que possui área
correspondente à pequena propriedade rural, conforme a conceituação que é dada pela Lei
8.629/93. Módulo fiscal estabelecido pela Instrução Especial/INCRA 20, de 28.05.80. Des-
membramento que se mostra inviável, pois resultaria em área inferior ao módulo fiscal do
município. Impenhorabilidade que deve abranger a área total do imóvel. TJSC (Em. 77/118). 334
BEM PÚBLICO
— Ação de desobstrução de logradouro público. Art. 435 do CPC. Comparecimento do perito
em audiência. Prescindibilidade no caso. Nulidade de sentença. Não ocorrência. Quesitos
respondidos. Ausência de prejuízo. STJ (Em. 77/49)................................................................. 308
— Doação com encargo. Finalidade da doação alcançada. Comprovação de atividades religiosas.
Cumprimento do encargo. Vale ressaltar que não foi imposta como condição a utilização
integral do terreno doado, mas apenas a construção do templo religioso no prazo legal e o
exercício da atividade religiosa, motivo pelo qual não há motivo para a revogação da doação.
TJPR (Em. 77/147)..................................................................................................................... 347
— Doação com encargo. Prescrição. Termo inicial. Contagem. Não ocorrência. Julgamento anteci-
pado. Teoria da causa madura. Inaplicabilidade. Na doação com encargo em que não há prazo
estipulado para o seu cumprimento, o termo inicial para a contagem do prazo prescricional
surge com a lesão ao direito do doador. TJAC (Em. 77/25)....................................................... 296
— Parque da cidade. Irregularidade na exploração de espaços públicos. A omissão do Distrito
Federal quanto à exploração de área pública por particular justifica a sua condenação em
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

obrigação de fazer para a adoção de medidas necessárias à regularização do uso. TJDF (Em.
77/32)......................................................................................................................................... 299
BINGOS, CAÇA-NÍQUEIS E AFINS
— Ação civil pública. Jogos de azar. Súmula Vinculante 2/STF. Vedação pela Lei 9.981/00. Inexis-
tência, por ora, de legislação que autorize a atividade. Indenização por dano moral coletivo.
Cabimento. O dano moral coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo
psicológico, pois tal comprovação, embora possível na esfera individual, torna-se inaplicável
quando se cuida de interesses difusos e coletivos. STJ (Em. 77/27).......................................... 296
BRENDA BANDOLI VIEIRA, HELBER CAMPOS DE OLIVEIRA, CARLOS HENRIQUE
MEDEIROS DE SOUZA E MARGARETH VETIS ZAGANELLI
— Artigo: “Útero Sub-Rogado nas Uniões Homoafetivas”.............................................................. 114

—C—
CABIMENTO DE AÇÕES COLETIVAS PARA A ALTERAÇÃO DE NOMES DE
LOGRADOUROS PÚBLICOS QUE HOMENAGEIAM REPRESENTANTES DA DITADURA
MILITAR
— Artigo de Acir de Matos Gomes e Fábio Cantizani Gomes........................................................ 138
652 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

CADASTRO DE INADIMPLENTES
— Existência de múltiplas inscrições. Autonomia das anotações. Prazo máximo de manutenção.
Possibilidade de postular o cancelamento individual. Existência de interesse de agir. STJ (Em.
77/92)......................................................................................................................................... 325
— Inscrição. Banco. Dano moral. Contrato bancário não reconhecido. Não demonstrada con-
tração por parte do autor. Inscrição imerecida em órgãos de restrições creditórias. TJBA (Em.
77/167)....................................................................................................................................... 355
— Inscrição. Banco. Dano moral. Utilização de documentos pessoais legítimos da autora, por
terceira pessoa, sem o seu consentimento e presença, com a finalidade da contratação de
empréstimo para o financiamento de veículo. Falta de prova da vinculação da autora ao con-
trato inadimplido e que gerou restrição cadastral ao seu nome. Omissão da casa bancária na
apresentação do contrato celebrado e dos documentos pessoais utilizados no ato da celebração
do ajuste. Negligência da instituição financeira evidenciada. Culpa concorrente da autora
evidenciada pelo fato de ter entregue seus documentos pessoais a sua prima, ainda que com
finalidade diversa, que não tem o condão de afastar a responsabilidade do banco, conquanto
sirva de critério delimitador do arbitramento da cifra indenizatória. TJSP (Em. 77/168)......... 355
— Inscrição. Cessão de crédito. Falta de notificação do devedor. Art. 290 do CC/02. Efeitos.
Inscrição do nome do devedor, “cedido”, em cadastros de proteção ao crédito. Ausência de
impedimento. STJ (Em. 77/68)................................................................................................... 316
— Inscrição. Dano moral. Desnecessidade de prova do prejuízo ou dano. Basta mera comprova-
ção do ato ou conduta ilícita. Inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito. Abalo à
imagem e ao crédito frente ao comércio em geral. Imposição creditícia. TJDF (Em. 77/103)... 329
— Inscrição. Nos casos de inscrição indevida em cadastros de proteção ao crédito, o dano moral
se configura in re ipsa, derivado inexoravelmente do fato danoso. TJSP (Em. 77/169)............. 355
CANA-DE-AÇÚCAR
— Queima da palha. Ação civil pública. Pretendida condenação das corrés à obrigação de não fazer
consistente na abstenção da prática de queima da palha da cana-de-açúcar. Impossibilidade.
Prática que não é ilícita quando autorizada pelos órgãos ambientais competentes. Pretendida
condenação ao pagamento de indenização pelos danos ambientais decorrentes da queima.
Impossibilidade. Ausência de demonstração do efetivo dano, apto a dar ensejo à indenização.
TJSP (Em. 77/35)........................................................................................................................ 300
CARTÃO DE CRÉDITO
— Recebíveis. Administradoras de cartões de crédito e débito. Faturamento. Caracterização.
Penhora. Possibilidade. TJDF (Em. 77/131)............................................................................... 339
CASAMENTO
— Ação anulatória. Recusa em manter relações sexuais com o cônjuge. Sentença que homolo-
gou o acordo celebrado entre as partes e decretou a anulação do casamento. Recurso do MP.
Direito indisponível que não admite transação. Nulidade do processo a partir do protocolo
do acordo. TJSC (Em. 77/42)..................................................................................................... 305
CÉDULA DE CRÉDITO RURAL
— Ação declaratória de nulidade de aval emitido por pessoa física. A interpretação sistemática
do art. 60 do DL 167/67 permite inferir que o significado da expressão “também são nulas
outras garantias, reais ou pessoais”, disposta no seu § 3º, refere-se diretamente ao § 2º, ou
seja, não se dirige às cédulas de crédito rural, mas apenas às notas e duplicatas rurais. STJ
(Em. 77/302).............................................................................................................................. 621
— Emitida por pessoa física. É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de
crédito rural emitida também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do
DL 167/67. TJMS (Em. 77/300).................................................................................................. 621
— Emitida por pessoa física. É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de
crédito rural emitida também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do
DL 167/67. TJPR (Em. 77/301).................................................................................................. 621
— Emitida por pessoa física. Garantia de aval prestada por terceiro. Art. 60, § 3º, do DL 167/67.
Validade. Entendimento firmado no julgamento do REsp 1.483.853/MS. Vedar a possibilidade
de oferecimento de crédito rural direto mediante a constituição de garantia de natureza pessoal
(aval) significa obstruir o acesso a ele pelo pequeno produtor ou só o permitir em linhas de
crédito menos vantajosas. STJ (Em. 77/303).............................................................................. 621
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 653

CERCEAMENTO DE DEFESA
— Livre-convencimento motivado (art. 131 do CPC). Prova documental suficiente para o julga-
mento da lide. Desnecessidade de produção de prova testemunhal. Ausência de cerceamento
de defesa. TJPR (Em. 77/147)..................................................................................................... 347
CERTIDÃO DE REGULARIDADE FISCAL
— Expedição. Medida cautelar. Oferecimento de caução idônea. Possibilidade. Exegese do art.
206 do CTN. Desnecessidade de se atentar à ordem do art. 11 da LEF. TJSC (Em. 77/24)....... 295
CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA
— Caução. Ordem de preferência. Inteligência do art. 11 da Lei 6.830/80. Não configura hipótese
de suspensão da exigibilidade do crédito. TJMT (Em. 77/65)................................................... 315
CESSÃO DE CRÉDITO
— Falta de notificação do devedor. Art. 290 do CC/02. Efeitos. Inscrição do nome do devedor,
“cedido”, em cadastros de proteção ao crédito. Ausência de impedimento. STJ (Em. 77/68)... 316
CITAÇÃO
— Hora certa. O simples fato de a epístola descrita no art. 229 do CPC ter sido recebida por
terceira pessoa não autoriza a conclusão de nulidade do ato citatório, pois, consoante reman-
soso entendimento, a expedição da carta traduz mera formalidade complementar. TJSP (Em.
77/162)....................................................................................................................................... 353
CLOVIS BRASIL PEREIRA
— Artigo: “A Petição Inicial no Novo CPC”................................................................................... 68
COAÇÃO MORAL
— Acordo. Partilha de bens. Doação universal de todos os bens pertencentes somente à cônjuge
virago em favor da sua filha. Ato disposição isolado. Lesão evidenciada. Ausência de garantia
do mínimo patrimonial necessário a assegurar o primado da dignidade da pessoa humana.
Ofensa aos arts. 548 do CC e 1º, III, da CF. Nulidade. TJES (Em. 77/22).................................. 294
COISA JULGADA
— Ação de impugnação da presunção de paternidade julgada extinta, sem resolução do mérito,
ante a coisa julgada formada em anterior ação declaratória de inexistência de filiação julgada
igualmente improcedente. Relativização da coisa julgada. Inaplicabilidade no caso concreto.
Prevalência do princípio da segurança jurídica. TJRS (Em. 77/52)............................................ 309
COMISSÃO DE PERMANÊNCIA, TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM, TARIFA DE
SERVIÇO DE TERCEIROS, TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO
— Vide Ação Revisional. Contrato Bancário. Devolução de Valores.
COMPETÊNCIA
— Ação de modificação de guarda acolhida. Pedido de deslocamento da competência para o
domicílio do trabalho dos genitores. Impossibilidade. Competência para processar a ação deve
ser a do domicílio dos pais ou responsáveis. Inteligência do art. 147, I, do ECA. O menor,
representado por sua guardiã legal, pode optar entre o foro comum e o especial, porém tal
circunstância não pode ser imposta àquele. TJDF (Em. 77/120)............................................... 336
— Ação de obrigação de fazer, ajuizada na Comarca de Araçatuba, contra autarquia estadual.
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

Exceção de incompetência não acolhida. Art. 100, IV, d, do CPC. Possibilidade de a ação ser
ajuizada em comarca do interior. STJ (Em. 77/58)..................................................................... 312
— Indenização por danos morais e materiais decorrentes de violência doméstica. Lei 11.340/06.
Juizado especializado de violência doméstica e familiar contra a mulher. Pretensão de natureza
exclusivamente cível. Conflito conhecido e julgado procedente para declarar competente para
processar e julgar o pedido de indenização por danos morais e materiais o Juízo da Vara Cível.
TJDF (Em. 77/95)....................................................................................................................... 326
— Recuperação judicial (Lei 11.101/05). Ação de despejo c/c cobrança de aluguéis. Demanda
ilíquida. Execução. Montante apurado. Habilitação do crédito no juízo da recuperação judicial.
STJ (Em. 77/96).......................................................................................................................... 327
— Taxa de juros bancários. O STF já decidiu pela validade da Lei 4.595/64, na parte que outorga
poderes ao Conselho Monetário Nacional para dispor sobre as taxas de juros bancários. STF
(Em. 77/93)................................................................................................................................ 326
— Rescisão contratual. Intermediação. Stand de vendas montado pela vendedora, com atendimen-
to por corretores por ela disponibilizados, para a comercialização das unidades. Obrigação de
pagamento da comissão de quem contratou o corretor. Contrato de adesão. Imputar o paga-
mento da corretagem e a contratação da taxa Sati ao consumidor como condição à aquisição
do bem é prática abusiva. Venda casada. Devolução das quantias adimplidas. Percentual de
retenção majorado para 20% sobre os valores pagos. TJSP (Em. 77/94).................................... 326
654 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

— Rescisão contratual. Relação de consumo. Partes que preenchem os requisitos estabelecidos


pelos arts. 2º e 3º do CDC. Legitimidade passiva quanto à comissão de corretagem. Cabimen-
to. Aplicação do art. 7º, parágrafo único, do CDC. Ausência de interesse recursal quanto à
iniciativa pela resolução contratual. Aplicação do art. 499 do CPC. TJSP (Em. 77/94)............. 326
— Resolução de contrato particular com pedido de reintegração possessória. Descabimento da
exceção de usucapião invocada. Em razão do inadimplemento do preço, tem-se que a posse
exercida pelo compromissário comprador é meramente precária. Ausência de animus domini.
Ocupação do imóvel sem a devida contraprestação, desde outubro de 1996. Perdimento,
excepcional, de todos os valores pagos como compensação pelo uso do bem. Ausência de
violação ao preceito do art. 53 da Lei 8.078/90. Construções realizadas no bem. Acessões.
Necessidade de justa indenização. Direito de retenção da coisa até o efetivo adimplemento.
TJSP (Em. 77/162)...................................................................................................................... 353
CONSELHEIRO TUTELAR
— Remuneração. Servidor público efetivo licenciado do cargo de assistente social para exercício
de mandato eletivo. Manutenção dos direitos decorrentes do cargo. Percepção de férias e
respectivo terço constitucional. Também prevista na legislação municipal (Leis 1.033/91 e
2.147/02). Direito configurado. TJSC (Em. 77/98).................................................................... 327
CONSIDERAÇÕES SOBRE O REGIME DE COBRANÇA ADMINISTRATIVA ESPECIAL
DA PORTARIA RFB Nº 1.265/2015
— Artigo de Victor Hugo Marcão Crespo........................................................................................ 158
CONTRADITÓRIO COLABORATIVO E POSTURA DOS SUJEITOS DO PROCESSO: UMA
REFLEXÃO NECESSÁRIA
— Artigo de Rafael Calmon Rangel................................................................................................. 38
CONTRATO BANCÁRIO
— Ação revisional. Cédula de crédito bancário. Financiamento de veículo. Incidência do CDC.
Revisão que é possível em face da onerosidade excessiva. Arts. 6º, IV e V, e 51, IV, ambos do
CDC. “Registro de contrato”. Cobrança desta despesa que nunca foi vedada. “Serviços de
terceiros”. Encargo que, apesar de pactuado, não está devidamente especificado, desconhecen-
do-se quais os serviços prestados ao mutuário. Ilegalidade da cobrança. Nova orientação da
Câmara. Repetição do indébito. Direito assegurado, na forma simples, para o fim de evitar o
enriquecimento ilícito e que independe da prova do erro no pagamento. TJSC (Em. 77/64)... 315
— Ação revisional. Cheque especial. Aplicabilidade CDC. Juros. Taxa média. Capitalização
mensal. Possibilidade. Sob a égide do CDC, adequar-se-á o princípio pacta sunt servanda,
tornando-o relativo, em face da função social do contrato e da boa-fé das partes, proporcio-
nando a defesa do consumidor em caso de pactos abusivos, sem que isso enseje insegurança
jurídica. TJMG (Em. 77/173)..................................................................................................... 356
— Ação revisional. Comissão de permanência. Tarifa de avaliação do bem. Tarifa de serviço de
terceiros. Tarifa de registro de contrato. É possível a cobrança de comissão de permanência,
desde que limitada à soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato,
não podendo sua cobrança ser cumulada com correção monetária, juros remuneratórios e
moratórios e multa contratual. As tarifas de avaliação de bem, de serviços de terceiros e de
registro de contrato figuram-se abusivas, por se tratarem de serviços de exclusivo interesse
da instituição financeira. TJMG (Em. 77/77)............................................................................. 319
CONTRATO DE CESSÃO DE MARCA MISTA
— Utilização de assinatura pessoal e artística como marca. Direito de personalidade latente.
Autorização expressa e limitada. Transferência definitiva de propriedade. Retomada de marca
ou prática de ato contraditório. Impossibilidade. A cessão de marca é instrumento apto a
transferir os direitos de propriedade da marca transacionada, legitimando o cessionário ao uso,
fruição, disposição e reivindicação e, por consequência, a opor-se, ainda que preventivamente,
à pretensão de registro por terceiro, inclusive o próprio cedente. STJ (Em. 77/183)................. 359
CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP
— Substituição tributária. Gás liquefeito de petróleo. Ressarcimento. Prova. O ressarcimento
da contribuição para o PIS paga sob o regime de substituição tributária, na aquisição de gás
liquefeito de petróleo, está condicionado à comprovação de que a contribuição fora efetiva-
mente apurada, retida e recolhida pelo substituto. CARF (Em. 77/100)................................... 328
COOPERATIVA
— Ação revisional. Aplicação do CDC. Tarifa de adiantamento de depositante. Repetição e/ou
compensação de indébito. No caso, não há demonstração de contratação explícita entre as
partes, o que afasta a cobrança da tarifa. Compensação. Repetição. TJRS (Em. 77/76)............. 318
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 655

— Acórdão do TRF 4ª R. – Liquidação extrajudicial. Suspensão da execução fiscal. Descabimen-


to................................................................................................................................................. 269
CORREÇÃO MONETÁRIA
— Acórdão do TRF 3ª R. – IPI. Crédito-prêmio. Índices e expurgos inflacionários utilizados.
Orientação do STJ. Divergência. Retratação............................................................................... 264
CORRETAGEM
— Compra e venda. Rescisão contratual. Stand de vendas montado pela vendedora, com atendi-
mento por corretores por ela disponibilizados, para a comercialização das unidades. Obriga-
ção de pagamento da comissão de quem contratou o corretor. Contrato de adesão. Imputar
o pagamento da corretagem e a contratação da taxa Sati ao consumidor, como condição à
aquisição do bem é prática abusiva. TJSP (Em. 77/94).............................................................. 326
CULPA CONCORRENTE/RECÍPROCA
— Dano moral e material. Acidente de trânsito. Motocicleta do pai e esposo das autoras que
colidiu na traseira do veículo de tração animal (carroça) do requerido, que trafegava sobre
a Rodovia Estadual SC-477. Falecimento do condutor da motocicleta. Previsibilidade da
ocorrência em razão da movimentação de veículos agrícolas no local. Culpa concorrente dos
envolvidos evidenciada. Dano moral suportado pelas autoras presumido em decorrência da
perda do pai e esposo (in re ipsa). Danos materiais decorrentes das despesas do funeral da
vítima. Pedido de fixação de pensão mensal. Dependência econômica da filha menor e da
esposa presumida. Pensão mensal devida no montante equivalente a 2/3 do salário mínimo.
Constituição de capital. TJSC (Em. 77/53)................................................................................. 309

—D—
DAÇÃO EM PAGAMENTO
— Ação anulatória. Ato jurídico. Sucessivos empréstimos tomados junto aos réus pela empresa
autora. Transferência da propriedade de bens móveis e imóvel no decorrer dos anos. Alegação,
deduzida em sede de alegações finais, de que a transferência patrimonial consubstanciaria
pacto comissório. Art. 765 do CC/1916, com consentâneo no art. 1.428 do CC/02. Substrato
probatório absolutamente exíguo e inconclusivo a respeito. Coação tampouco indemonstrada.
Alegada quitação do débito indemonstrada. Divergência entre os valores informados pelas
partes. TJSC (Em. 77/23)............................................................................................................ 295
DANO MORAL
— Acidente de ônibus. É obrigação da transportadora conduzir o passageiro são e salvo a seu
local de destino. Em tendo sido atingida a incolumidade física do passageiro, deve a apelante
indenizar-lhe os danos morais. TJRJ (Em. 77/165).................................................................... 354
— Acórdão do STF – Imunidade parlamentar. Nexo de causalidade entre a manifestação e o
exercício do mandato. Inexistência. Indenização devida............................................................ 173
— Banco. Contrato bancário não reconhecido. Não demonstrada contração por parte do autor.
Inscrição imerecida em órgãos de restrições creditórias. TJBA (Em. 77/167)............................ 355
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Banco. Utilização de documentos pessoais legítimos da autora, por terceira pessoa, sem o
seu consentimento e presença, com a finalidade da contratação de empréstimo para o finan-
ciamento de veículo. Falta de prova da vinculação da autora ao contrato inadimplido e que
gerou restrição cadastral ao seu nome. Omissão da casa bancária na apresentação do contrato
celebrado e dos documentos pessoais utilizados no ato da celebração do ajuste. Negligência da
instituição financeira evidenciada. Culpa concorrente da autora evidenciada pelo fato de ter
entregue seus documentos pessoais a sua prima, ainda que com finalidade diversa, que não
tem o condão de afastar a responsabilidade do banco, conquanto sirva de critério delimitador
do arbitramento da cifra indenizatória. TJSP (Em. 77/168)....................................................... 355
— Cadastro de inadimplentes. Nos casos de inscrição indevida em cadastros de proteção ao
crédito, o dano moral se configura in re ipsa, derivado inexoravelmente do fato danoso. TJSP
(Em. 77/169).............................................................................................................................. 355
— Corpo estranho de metal não identificado no interior do biscoito. Produto impróprio para
consumo. Dano configurado, ainda que o produto não tenha sido ingerido pelo consumidor.
Situação irregular do produto impróprio para consumo caracteriza potencial risco à saúde do
consumidor e provoca sentimentos de insegurança, vulnerabilidade e repugnância, caracte-
rizando danos morais passíveis de indenização. TJBA (Em. 77/172)......................................... 356
— Desavença entre vizinhas. Animal de estimação (porca) com nome igual ao da vizinha. Dano
configurado. Valor indenizatório reduzido para R$ 300,00. TJAC (Em. 77/108)...................... 331
656 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

— Desnecessidade de prova do prejuízo ou dano. Basta mera comprovação do ato ou conduta


ilícita. Inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito. Abalo à imagem e ao crédito
frente ao comércio em geral. Imposição creditícia. TJDF (Em. 77/103).................................... 329
— Inexistência de débito. Desconto indevido em conta-corrente. Ausência de contratação com
a editora. Inexistência de autorização do desconto em conta-corrente. Ato ilícito. Dever de
indenizar. TJRS (Em. 77/163)..................................................................................................... 353
— Ofensas praticadas em campanha eleitoral. Críticas acirradas contra adversários políticos que
não extrapolam os limites da tolerância. Dever de indenizar refutado. TJCE (Em. 77/105)..... 330
— Plano de saúde coletivo. Falecimento do titular. Cancelamento do plano com menos de um
mês da data do óbito. Dependente que, idosa, necessitou contratar novo plano no valor de
R$ 1.900,00 mensais. Cláusulas contratuais que preveem a manutenção do dependente por
cinco anos sem pagamento das mensalidades em caso de óbito e pagamento de seguro de
morte por acidente que não foram cumpridas pela parte ré. Reativação do plano com o prazo
de carência de cinco anos e devolução em dobro dos valores gastos, além do pagamento do
seguro e indenização por dano moral. Sentença de procedência. TJRJ (Em. 77/133)................ 340
— Serviço de internet. Bloqueio indevido. Caracterizados os danos morais pela falha na prestação
do serviço, cabível a indenização pretendida, acrescida de correção monetária pelo IGP-M,
a partir desta decisão, na forma da Súmula 362/STJ, e dos juros moratórios de 1% ao mês,
contados da citação, por se tratar de relação contratual. TJRS (Em. 77/54).............................. 310
— União estável. Suposta infidelidade. Ainda que a união estável imponha o dever de fidelidade
recíproca e de lealdade, a violação pura e simples de um dever jurídico familiar não é suficiente
para caracterizar o direito de indenizar. A prática de adultério, isoladamente, não se mostra
suficiente a gerar um dano moral indenizável, sendo necessário que a postura do cônjuge
infiel seja ostentada de forma pública, comprometendo a reputação, a imagem e a dignidade
do companheiro. TJES (Em. 77/180).......................................................................................... 358
DANO MORAL COLETIVO
— Ação civil pública. Jogos de azar. Bingos, caça-níqueis e afins. Súmula Vinculante 2/STF. Ve-
dação pela Lei 9.981/00. Inexistência, por ora, de legislação que autorize a atividade. O dano
moral coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, pois
tal comprovação, embora possível na esfera individual, torna-se inaplicável quando se cuida
de interesses difusos e coletivos. STJ (Em. 77/27)..................................................................... 296
— Ação civil pública. Poluição sonora. Ministério Público. Legitimidade reconhecida. Redução
da indenização. STJ (Em. 77/39)................................................................................................ 303
— Ação civil pública. Responsabilidade civil do Estado. Uso excessivo e imotivado de força poli-
cial. Comunidades quilombolas e segmentos da sociedade civil. Cabimento. Na hipótese dos
autos, comprovados o nexo de causalidade e o evento danoso, resultante do uso injustificado de
força policial excessiva, por parte de agentes públicos do EMG, mediante a realização de prisão
ilegal, o uso indevido de algemas e a exposição de membros de comunidades quilombolas à
execração pública, com o intuito de intimidar e de inibir, à margem da lei, a sua atuação, na
defesa do exercício do seu direito à posse de terras, resta caracterizado o dano moral coletivo,
do que resulta o dever de indenizar, nos termos do referido dispositivo constitucional. TRF
1ª R. (Em. 77/37)........................................................................................................................ 301
DANO MORAL E MATERIAL
— Acidente de trânsito. Motocicleta do pai e esposo das autoras que colidiu na traseira do
veículo de tração animal (carroça) do requerido, que trafegava sobre a Rodovia Estadual
SC-477. Falecimento do condutor da motocicleta. Previsibilidade da ocorrência em razão da
movimentação de veículos agrícolas no local. Culpa concorrente dos envolvidos evidenciada.
Dano moral suportado pelas autoras presumido em decorrência da perda do pai e esposo (in
re ipsa). Danos materiais decorrentes das despesas do funeral da vítima. Pedido de fixação
de pensão mensal. Dependência econômica da filha menor e da esposa presumida. Pensão
mensal devida no montante equivalente a 2/3 do salário mínimo. Constituição de capital.
TJSC (Em. 77/53)....................................................................................................................... 309
— Acidente de trânsito. Taxista que deixou de laborar enquanto submetido a tratamento médico-
hospitalar. Lucros cessantes devidos. Discussão relativa à base estimativa da remuneração
diária devida e ao termo final dos lucros cessantes. É possível a utilização de declaração de
entidade representativa de classe para cômputo dos lucros cessantes. Termo final modificado,
ante a data da última consulta médica realizada. TJSP (Em. 77/78).......................................... 319
— Acórdão do STJ – Acidente de trânsito. Pensão. Termo final. Prescrição. Inocorrência. Suspen-
são. Aplicação do art. 200 do CCB. Responsabilidade por fato de terceiro. Empregado da ré
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 657

condenado criminalmente por homicídio culposo. Responsabilidade objetiva da empregadora.


Arts. 932 e 933 do CCB. Pensionamento. Alegada falta de comprovação de rendimentos da
vítima e da parcela destinada ao sustento da viúva. Descabimento............................................ 180
— Demanda proposta contra médico e entidade hospitalar privada. Relação de consumo. Res-
ponsabilidade pelo fato do serviço. Art. 14 do CDC. Responsabilidade do hospital. Menor
internado com infecção respiratória. Pediatra de sobreaviso. Acompanhamento presencial
realizado uma vez ao dia. Prescrição medicamentosa adequada. Estado de saúde que não
exigia atendimento diverso. Tratamento adequado. Remoção do menino para hospital de
outra cidade, durante a madrugada, após desentendimento dos familiares com o facultativo.
Iniciativa exclusiva dos pais. Encaminhamento corretamente realizado pelo médico. Desídia
ou negligência profissional. Inocorrência. TJRS (Em. 77/104).................................................. 329
— Erro médico. Parto. Uso de fórceps. Cesariana. Indicação. Não observância. Lesão no mem-
bro superior esquerdo. Médico contratado. Culpa configurada. Hospital. Responsabilidade
subjetiva. Ação de regresso. Procedência. Valor. Razoabilidade. STJ (Em. 77/107)................... 330
— Falha na prestação de serviço. Agência de turismo. Não configurado. É de responsabilidade
exclusiva da Autoridade Consular a concessão ou não do visto solicitado. O serviço ora
contratado constitui-se na assessoria à obtenção do visto, sendo considerado efetivamente
prestado independente do resultado final. TJES (Em. 77/106).................................................. 330
— Indenização decorrentes de violência doméstica. Lei 11.340/06. Juizado especializado de
violência doméstica e familiar contra a mulher. Pretensão de natureza exclusivamente cível.
Conflito conhecido e julgado procedente para declarar competente para processar e julgar
o pedido de indenização por danos morais e materiais o Juízo da Vara Cível. TJDF (Em.
77/95)......................................................................................................................................... 326
— Responsabilidade civil do Estado. Cirurgia de laqueadura tubária. Posterior gravidez. Réu que
não comprova o cumprimento do dever de informar ao paciente sobre o risco do insucesso da
cirurgia. Art. 37, § 6º, da CF. Dano moral configurado. Comprometimento do planejamento
familiar. Pensão mensal devida. TJRJ (Em. 77/166)................................................................... 354
— Responsabilidade civil do Município. Acidente de trânsito. Defeitos em via municipal. Ausên-
cia de sinalização. Óbito do companheiro e pai dos autores. Responsabilidade caracterizada.
Abalo moral. Dano moral in re ipsa. Pensão mensal devida à companheira e aos filhos menores.
Dependência econômica. Juros de mora. TJSC (Em. 77/145).................................................... 346
— Responsabilidade civil do Município. Acidente de trânsito. Esposa do autor que, transporta-
da em citada ambulância, veio a falecer. Indenização devida pelo dano moral caracterizado.
Presunção de culpa do motorista da ambulância, que bateu na parte traseira de caminhão que
seguia à frente, reconhecida. TJSP (Em. 77/171)....................................................................... 356
DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA
— Expedição de ofício à Receita Federal. Declaração de Operações Imobiliárias (DOI). Apresen-
tação das três últimas DIR. Possibilidade. Cabe lembrar que, nos termos do disposto no art.
5º, LXXVIII, da CF, o Poder Judiciário deve garantir a celeridade no trâmite dos processos
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
judiciais. TJRS (Em. 77/129)...................................................................................................... 338
DEFICIENTE FÍSICO
— Acórdão do TRF 5ª R. – Isenção. IPI. Veículo adquirido por portador de deficiência física. Lei
8.989/95, Art. 1º, IV, § 1º. Possibilidade..................................................................................... 272
DEMÓCRITO REINALDO FILHO
— Artigo: “Avaliação Judicial da ‘Representação Adequada’ das Entidades Legitimadas para as
Ações Coletivas no Brasil – Estudo do Caso Julgado pelo STJ no REsp 1.213.614/RJ”............. 11
DENÚNCIA VAZIA
— Locação. Ação de despejo. Contrato de locação não residencial. Prazo indeterminado. Caso
concreto. Matéria de fato. Preenchimento dos pressupostos para a concessão do pedido li-
minar. Incidência do inciso VIII do § 1º do art. 59 da Lei do Inquilinato, acrescido pela Lei
12.112/09. TJRS (Em. 77/50)...................................................................................................... 308
DENUNCIAÇÃO À LIDE
— Ação de cobrança promovida pelo hospital em face dos consumidores. Material usado em
procedimento que não foi reembolsado pelo plano de saúde. Inadimplência confessada. Res-
ponsabilidade civil configurada. A denunciação da lide deve, até pela aplicação do princípio
da celeridade, impor ao réu denunciado o dever de efetuar o pagamento diretamente aos réus
da ação principal, como solidário. TJRJ (Em. 77/46)................................................................. 307
658 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DEVOLUÇÃO DE VALORES
— Ação revisional. Cédula de crédito bancário. Financiamento de veículo. Incidência do CDC.
Revisão que é possível em face da onerosidade excessiva. Arts. 6º, IV e V, e 51, IV, ambos
do CDC. “Registro de contrato”. Cobrança desta despesa que nunca foi vedada. “Servi-
ços de terceiros”. Encargo que, apesar de pactuado, não está devidamente especificado,
desconhecendo-se quais os serviços prestados ao mutuário. Ilegalidade da cobrança. Nova
orientação da Câmara. Repetição do indébito. Direito assegurado, na forma simples, para
o fim de evitar o enriquecimento ilícito e que independe da prova do erro no pagamento.
TJSC (Em. 77/64)....................................................................................................................... 315
— Alienação fiduciária. Busca e apreensão deferida liminarmente. Purgação da mora. Inocorrência.
Mora contratual configurada. Devolução das parcelas pagas. Inadmissibilidade. Devedor tem
direito somente ao crédito remanescente da venda do bem pelo credor. TJSP (Em. 77/43)...... 306
— Compra e venda. Rescisão contratual. Intermediação. Stand de vendas montado pela vende-
dora, com atendimento por corretores por ela disponibilizados, para a comercialização das
unidades. Obrigação de pagamento da comissão de quem contratou o corretor. Contrato
de adesão. Imputar o pagamento da corretagem e a contratação da taxa Sati ao consumidor
como condição à aquisição do bem é prática abusiva. Venda casada. Devolução das quantias
adimplidas. Percentual de retenção majorado para 20% sobre os valores pagos. TJSP (Em.
77/94)......................................................................................................................................... 326
— Cooperativa de crédito. Aplicação do CDC. Tarifa de adiantamento de depositante. Repetição
e/ou compensação de indébito. No caso, não há demonstração de contratação explícita entre
as partes, o que afasta a cobrança da tarifa. Compensação. Repetição. TJRS (Em. 77/76)......... 318
— Resolução de contrato particular com pedido de reintegração possessória. Descabimento da
exceção de usucapião invocada. Em razão do inadimplemento do preço, tem-se que a posse
exercida pelo compromissário comprador é meramente precária. Ausência de animus domini.
Ocupação do imóvel sem a devida contraprestação, desde outubro de 1996. Perdimento,
excepcional, de todos os valores pagos como compensação pelo uso do bem. Ausência de
violação ao preceito do art. 53 da Lei 8.078/90. Construções realizadas no bem. Acessões.
Necessidade de justa indenização. Direito de retenção da coisa até o efetivo adimplemento.
TJSP (Em. 77/162)...................................................................................................................... 353
DIREITO À INFORMAÇÕES
— Habeas data. Acesso às informações constantes de sistemas informatizados de controle de
pagamentos de tributos. Sistema de Conta-Corrente da Secretaria da Receita Federal do
Brasil – Sincor. Art. 5º, LXXII, da CRFB/88. Lei 9.507/97. Direito subjetivo do contribuinte.
STF (Em. 77/137)....................................................................................................................... 342
DIREITO À VIDA E À SAÚDE
— Astreintes. Fixação contra o Estado. Possibilidade. Indisponibilidade do direito à saúde. Valor
proporcional que não gera enriquecimento indevido. TJAM (Em. 77/111)............................... 332
DIREITO AUTORAL
— Ação de cobrança. ECAD. Indenização pela realização de eventos musicais. Comprovação
pelo autor. Fatos impeditivos. Ônus da prova do réu. Litigância de má-fé. Ausência. TJDF
(Em. 77/44)................................................................................................................................ 306
DIREITO DE VISITAS
— Regulamentação. Suspeita de agressão sexual da madrasta. Processo criminal. Absolvição por
falta de provas. Estudo psicossocial. Indícios. Melhor interesse da criança. Monitoramento
das visitas. Desnecessidade. Desenvolvimento do menor. Maior discernimento. Perda da
convivência paterna. Reconstrução do convívio. Alienação parental. Não ocorrência. TJDF
(Em. 77/161).............................................................................................................................. 352
DISCRIMINAÇÃO RACIAL
— Alegação de ofensas proferidas. Ausência de comprovação suficiente para a demonstração dos
pressupostos ensejadores de danos morais. Ônus que lhe incumbia diante do art. 333, I, do
CPC. TJRS (Em. 77/164)............................................................................................................ 354
DIVÓRCIO
— Alimentos. Decisão liminar que indeferiu a fixação de alimentos provisórios. Pedido de an-
tecipação dos efeitos da tutela formulado em impugnação à contestação. Requerimento de
divisão antecipada dos lucros mensais. Divisão de lucros mensais albergada pelo instituto dos
alimentos compensatórios. Distinção entre alimentos decorrentes da relação familiar. Lucros
da empresa que se confundem com os lucros dos sócios. Impossibilidade de divisão de lucros
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 659

da maneira pretendida pela agravante. Alimentos compensatórios fixados em R$ 4.000,00.


TJPR (Em. 77/51)....................................................................................................................... 308
— Violação dos arts. 4º, II, do CC e 8º, 9º, I, e 13 do CPC. Alegação de incapacidade da agravada
rechaçada pelo Tribunal de origem. Inversão do julgado. Impossibilidade. STJ (Em. 77/113).. 332
DOAÇÃO
— Pedido de nulidade. Vício de consentimento e inoficiosidade. Ilegitimidade ativa. Se o autor
foi adotado em tenra idade e se somente houve o reconhecimento da maternidade após o
óbito, em sentença que determinou o registro do vínculo jurídico de filiação, desconstituindo
a maternidade adotiva, então ele não tem legitimidade para reclamar qualquer participação
na herança, pois ele não ostentava a condição de filho no momento da abertura da sucessão.
TJRS (Em. 77/114)...................................................................................................................... 333
DOAÇÃO COM ENCARGO
— Bem público. Prescrição. Termo inicial. Contagem. Não ocorrência. Julgamento antecipado.
Teoria da causa madura. Inaplicabilidade. Na doação com encargo em que não há prazo
estipulado para o seu cumprimento, o termo inicial para a contagem do prazo prescricional
surge com a lesão ao direito do doador. TJAC (Em. 77/25)....................................................... 296
— Imóvel público. Finalidade da doação alcançada. Comprovação de atividades religiosas. Cum-
primento do encargo. Vale ressaltar que não foi imposta como condição a utilização integral
do terreno doado, mas apenas a construção do templo religioso no prazo legal e o exercício
da atividade religiosa, motivo pelo qual não há motivo para a revogação da doação. TJPR (Em.
77/147)....................................................................................................................................... 347
DRAWBACK SUSPENSÃO
— Acórdão do CARFMF – Aspectos formais. Adimplemento do compromisso de exportar, na
medida em que ocorreu a efetiva saída das mercadorias discriminadas no ato que formalizou
a concessão do respectivo regime, inclusive no que diz respeito às transações acordadas para
se realizarem sem cobertura cambial.......................................................................................... 248
DUPLICATA PRESCRITA
— Ação monitória. Prazo prescricional de cinco anos, contados do vencimento da obrigação.
Art. 206, § 5º, I, do CC. STJ (Em. 77/71)................................................................................... 317

—E—
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
— Aluno cursando o módulo II do ensino médio. Aprovação em vestibular. Ausência de frequência
mínima. Não se reconhece o direito do aluno em ser submetido à avaliação escolar que lhe
permita avançar em nível educacional, quando ele, matriculado no módulo II, equivalente ao
segundo ano do ensino médio da modalidade de ensino a distância, para a Educação de Jovens
e Adultos – EJA, não comprovar o prazo mínimo de frequência no ensino médio, essencial
para a pretensão vindicada. TJDF (Em. 77/179)........................................................................ 358
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Contra decisão interlocutória no agravo regimental no agravo de instrumento. Cabimento.
É pacífico no âmbito do STJ o entendimento de que os embargos de declaração podem ser
opostos contra qualquer decisão judicial, interrompendo o prazo para interposição de outros
recursos, salvo se não conhecidos em virtude de intempestividade. TJES (Em. 77/119)........... 335
ENSINO SUPERIOR
— Menor de 18 anos. Requerimento de matrícula em curso supletivo. Realização do exame final
de ensino médio. Certificado de conclusão de curso para matrícula em instituição de nível
superior. Possibilidade. Lei 9.394/96. Art. 208, V, da CF/88. TJDF (Em. 77/149)..................... 348
ESPAÇO PÚBLICO
— Reintegração de posse. Bar que serve escola estadual. Termo de autorização de uso. Em se
tratando de imóvel como bem público, decorra a titularidade de direito real ou pessoal, e não
estando os bens públicos sujeitos à usucapião, deve o espaço utilizado como bar de escola es-
tadual ser desocupado, para fins de que seja licitada a exploração da área. TJRS (Em. 77/61).. 314
ESTABELECIMENTO COMERCIAL
— Regularidade da instalação de letreiro luminoso na fachada. Alegação autoral de adequação
às normas previstas na Lei Municipal 758/85, que trata da instalação de anúncios indicativos
em imóveis edificados. Notificação promovida pelo ente municipal amparada nas disposições
contidas no D. 35.507/2012, que determinou à apelante as competentes providências no
prazo estabelecido, retirada ou adequação do anúncio fixado na fachada de imóvel comercial.
660 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

Impossibilidade. Situação fática que revela a completa ilegalidade da exigência contida na


notificação de fl. 30, que sequer faz referência ao artigo violado, contrariando expressamente
a Lei Municipal 758/85. TJRJ (Em. 77/69)................................................................................. 316
EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE
— É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de crédito rural emitida também
por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do DL 167/67. TJPR (Em. 77/301). 621
— É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de crédito rural emitida também por
pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do DL 167/67. TJMS (Em. 77/300)....... 621
EXECUÇÃO
— Acórdão do TJDF – Penhora. Veículo. Bem essencial ao exercício da atividade profissional.
Nos termos do art. 649, V, do CPC, são absolutamente impenhoráveis os livros, as máquinas,
as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao
exercício de qualquer profissão.................................................................................................. 276
— Acórdão do TJRS – Embargos. Efeito suspensivo. Existência cumulativa dos requisitos elen-
cados no § 1º do art. 739-A do CPC. Imperiosa a sua concessão............................................... 281
— Desconsideração da personalidade jurídica. Presença de pressupostos para deferimento da
medida. Aplicabilidade do art. 50 do CC. Indícios de práticas irregulares nas atividades em-
presariais. Abuso de personalidade evidenciado. TJPR (Em. 77/125)........................................ 337
— Instrumento particular de confissão e composição de dívida. Prescrição intercorrente confi-
gurada. Processo que ficou paralisado por mais de 10 anos por desídia do exequente. Ação de
execução ajuizada na vigência do CC/1916. Prescrição vintenária que, a partir da entrada em
vigor do CC/02, passou a ser de cinco anos. Aplicação dos arts. 206, § 5º, I, e 2.028, ambos
do novo diploma legal. Manutenção da decisão que extinguiu a ação de execução. TJSC (Em.
77/121)....................................................................................................................................... 336
— Locação. Fiança. Falsidade da assinatura atribuída à cônjuge virago. Validade da garantia
prestada pelo varão. Nulidade por inexistência de outorga uxória. Declaração de ofício. In-
viabilidade. TJMG (Em. 77/117)................................................................................................ 334
— Locação. Fiança. Interrupção da prescrição do devedor principal prejudica o fiador. Inteligência
do art. 204, § 3º, do CC. Declaração de inexistência de débito. Entrega das chaves pelo fiador.
Não responsabilidade pelos fatos posteriores ocorridos. Preservação da boa-fé. Fica liberado
o fiador das obrigações posteriores à entrega das chaves do imóvel, salvo inequívoca ciência
da prorrogação contratual. TJSE (Em. 77/116).......................................................................... 334
— Realização de acordo para pagamento da dívida. Ausência de animus novandi. Extinção da
execução. Ofensa ao art. 792 do CPC. Suspensão aplicável. TJSE (Em. 77/122)....................... 336
— Título judicial formado em mandado de segurança coletivo. Associação. Representação.
Necessidade de autorização expressa dos associados. STF (Em. 77/126).................................. 337
EXECUÇÃO DE ALIMENTOS
— Penhora. Valores depositados na conta da empresa. Aplicação da disregard doctrine. Pagamen-
tos in natura. Compensação. Descabimento. Se o devedor possui bens passíveis de garantir
a execução, descabe a aplicação do disposto no art. 50 do CC, não se cogitando de confusão
patrimonial ou desvio de finalidade. TJRS (Em. 77/123)........................................................... 336
— Prisão civil. Pagamento parcial. Irrelevância. Restabelecimento do mandado de prisão. O
adimplemento parcial da dívida não é capaz de elidir a prisão civil do devedor de alimentos.
Liminar revogada. TJAC (Em. 77/124)....................................................................................... 337
EXECUÇÃO FISCAL
— Acórdão do TRF 1ª R. – Penhora. Art. 620 do CPC. Princípio da menor onerosidade para o
devedor. Art. 649, V, do CPC. Faturamento da empresa. Impossibilidade. A penhora sobre o
faturamento da empresa só é admitida em circunstâncias excepcionais e desde que, entre outros
requisitos, não implique o comprometimento da atividade da pessoa jurídica executada......... 253
— Acórdão do TRF 4ª R. – Cooperativa. Liquidação extrajudicial. Suspensão. Descabimento...... 269
— Adesão a programa de parcelamento. Penhora de bens pelo convênio Bacen Jud. Desbloqueio.
Possibilidade. A adesão do executado a programa de parcelamento gera a suspensão da exigi-
bilidade do crédito tributário, de modo que não mais se justifica a manutenção de bloqueio
de valores por meio do convênio Bacen Jud. TRF 1ª R. (Em. 77/127)....................................... 338
— Dívidas tributárias da filial. Responsabilidade da matriz. Possibilidade. Pessoa jurídica única.
A filial, na condição de espécie de estabelecimento, é um bem, um instrumento, uma univer-
salidade de fato que integra o patrimônio da sociedade empresária, e não uma pessoa distinta
desta. STJ (Em. 77/128).............................................................................................................. 338
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 661

— Expedição de ofício à Receita Federal. Declaração de Operações Imobiliárias (DOI). Apresen-


tação das três últimas Declarações de Imposto de Renda (DIR). Possibilidade. Cabe lembrar
que, nos termos do disposto no art. 5º, LXXVIII, da CF, o Poder Judiciário deve garantir a
celeridade no trâmite dos processos judiciais. TJRS (Em. 77/129)............................................ 338
— Penhora. Faturamento de empresa. Art. 655, VII, do CPC. Requisitos autorizadores. Presen-
ça. Percentual da penhora. Redução. 15% para 5%. Caso concreto. Possibilidade. Restrição.
Filial. Geradora do tributo. Impossibilidade. Unidade patrimonial da pessoa. Nomeação de
depositário. Art. 655-A, § 3º, do CPC. Necessidade. Sócio administrador. Recomendação.
Recebíveis. Administradoras de cartões de crédito e débito. Faturamento. Caracterização.
Penhora. Possibilidade. TJDF (Em. 77/131)............................................................................... 339
— Penhora on line. Conta-corrente conjunta. Penhora da totalidade. Possibilidade. O valor depo-
sitado pode ser penhorado em garantia da execução, ainda que somente um dos correntistas
seja responsável tributário pelo pagamento do tributo. STJ (Em. 77/130)................................ 338
— Redirecionamento. Sócio que detinha poderes de gestão à época da dissolução irregular da
sociedade. Irrelevância da data da ocorrência do fato gerador ou do vencimento da obrigação.
STJ (Em. 77/132)........................................................................................................................ 340
EXECUÇÃO PROVISÓRIA
— Apelação. Recebida em seu duplo efeito. Impossibilidade de execução provisória. Art. 521
do CPC. Necessidade de extinção do procedimento executório e liberação dos valores blo-
queados. Em razão do efeito suspensivo atribuído ao apelo, nenhum ato de constrição pode
ser efetuado antes do julgamento, de forma que deve haver a suspensão do procedimento de
execução provisória. TJAL (Em. 77/70)..................................................................................... 316
EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À RECEITA FEDERAL
— Execução. Declaração de Operações Imobiliárias (DOI). Apresentação das três últimas
Declarações de Imposto de Renda (DIR). Possibilidade. Cabe lembrar que, nos termos do
disposto no art. 5º, LXXVIII, da CF, o Poder Judiciário deve garantir a celeridade no trâmite
dos processos judiciais. TJRS (Em. 77/129)............................................................................... 338

—F—
FALÊNCIA
— Avocação. Impossibilidade. Processo em trâmite. Justiça trabalhista. Redirecionamento. Sócios.
Negativa de prestação jurisdicional. A jurisprudência desta Corte firmou posicionamento no
sentido de que não se justifica a remessa dos autos ao juízo falimentar se a execução promo-
vida contra pessoa jurídica foi direcionada para atingir os sócios, pois o patrimônio da falida
permanece livre de constrição. STJ (Em. 77/134)...................................................................... 340
FERNANDO RUBIN
— Artigo: “Polêmicas Supressões Encartadas pelo Novo CPC”...................................................... 25
FGTS
— Contribuição de caráter não tributário. Base de cálculo. Natureza das parcelas pagas ao em-
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

pregado. Indenizatória/remuneratória. Irrelevância para fins de incidência da contribuição do


FGTS. TRF 1ª R. (Em. 77/135)................................................................................................... 341
FIANÇA
— Execução. Locação. Falsidade da assinatura atribuída à cônjuge virago. Validade da garantia
prestada pelo varão. Nulidade por inexistência de outorga uxória. Declaração de ofício. In-
viabilidade. TJMG (Em. 77/117)................................................................................................ 334
— Locação. Execução. Interrupção da prescrição do devedor principal prejudica o fiador. Inteli-
gência do art. 204, § 3º, do CC. Declaração de inexistência de débito. Entrega das chaves pelo
fiador. Não responsabilidade pelos fatos posteriores ocorridos. Preservação da boa-fé. Fica
liberado o fiador das obrigações posteriores à entrega das chaves do imóvel, salvo inequívoca
ciência da prorrogação contratual. TJSE (Em. 77/116).............................................................. 334
FRAUDE À EXECUÇÃO
— Acórdão do TJSP – Cumprimento de sentença. Alienação pelo executado de bens imóveis
aos filhos após o trânsito em julgado do acórdão que confirmou a sentença condenatória,
reduzindo-o à insolvência. Fraude à execução caracterizada. Exegese do art. 593, II, do CPC.
Imposição de multa por ato atentatório à dignidade da justiça que atende ao preceito expresso
e objetivo do art. 600, I, do CPC. Penalidade mantida em 20% do valor atualizado do débito,
dada a gravidade da conduta do executado................................................................................ 287
662 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

—G—
GÁS LIQUEFEITO DE PETRÓLEO
— Contribuição para o PIS/Pasep. Substituição tributária. Ressarcimento. Prova. O ressarcimento
da contribuição para o PIS paga sob o regime de substituição tributária, na aquisição de gás
liquefeito de petróleo, está condicionado à comprovação de que a contribuição fora efetiva-
mente apurada, retida e recolhida pelo substituto. CARF (Em. 77/100)................................... 328
GISELE LEITE
— Artigo: “A Causa Petendi da Ação Rescisória”............................................................................. 72
GUARDA DE MENOR
— Ação de modificação de guarda acolhida. Pedido de deslocamento da competência para o
domicílio do trabalho dos genitores. Impossibilidade. Competência para processar a ação deve
ser a do domicílio dos pais ou responsáveis. Inteligência do art. 147, I, do ECA. O menor,
representado por sua guardiã legal, pode optar entre o foro comum e o especial, porém tal
circunstância não pode ser imposta àquele. TJDF (Em. 77/120)............................................... 336

—H—
HABEAS DATA
— Acesso às informações constantes de sistemas informatizados de controle de pagamentos de
tributos. Sistema de Conta-Corrente da Secretaria da Receita Federal do Brasil – Sincor. Art.
5º, LXXII, da CRFB/88. Lei 9.507/97. Direito subjetivo do contribuinte. STF (Em. 77/137).... 342
HELIO DEIVID AMORIM MALDONADO
— Artigo: “Marco Inicial do Prazo da Inelegibilidade por Rejeição de Contas: Reconstrução do
Significado de ‘Decisão Irrecorrível’”.......................................................................................... 76
HERANÇA
— Exclusão. Ação declaratória de indignidade. Demanda movida em face dos herdeiros de su-
posto autor de homicídio contra o irmão da autora, que era seu pai adotivo. Extinção do feito
sem resolução do mérito. Inconformismo da autora. Descabimento. Notória falta de interesse
processual. Suposto indigno que também já faleceu. Impossibilidade de extensão dos efeitos
da dignidade aos sucessores deste. Exclusão pretendida que tem caráter pessoal. Inteligência
do art. 1.816 do CC (art. 1.599 do CC/1916). TJSP (Em. 77/177)............................................ 357
— Regime de separação convencional de bens. Herdeiro necessário. Concorrência com descenden-
tes. Possibilidade. Art. 1.829, I, do CC. Admite-se ao cônjuge casado sob o regime de separação
convencional de bens a condição de herdeiro necessário, possibilitando a concorrência com
os descendentes do falecido. STJ (Em. 77/97)............................................................................ 327
HILDELIZA LACERDA TINOCO BOECHAT CABRAL, MICHELLE DUTRA PERES,
CARLOS HENRIQUE MEDEIROS DE SOUZA E VÍVIAN BOECHAT CABRAL CARVALHO
— Artigo: “Mediação de Conflitos no Direito das Famílias”........................................................... 50
HONORÁRIOS DE ADVOGADO
— Acórdão do STJ – Ação de cobrança. Serviços advocatícios prestados de forma individualizada
ao HSBC e ao Bamerindus. Solidariedade. Impossibilidade. Não ocorrência de sucessão uni-
versal. Necessidade de delimitação da responsabilidade de cada uma das partes demandadas. 189
— Exceção de pré-executividade. O acolhimento do incidente de exceção de pré-executividade,
mesmo que resulte apenas na extinção parcial da execução, dá ensejo à condenação na verba
honorária, cujo valor deve ser fixado com observância da equidade pelo julgador. TJMS (Em.
77/300)....................................................................................................................................... 621
— Reclamações trabalhistas. Nos casos em que a contratação dos honorários for ad exitum ou
quota litis, no percentual de até 30%, a cobrança de qualquer outro valor mínimo, ou fixado
na Tabela, fere os princípios da razoabilidade, moderação e da proporcionalidade, constantes
nos arts. 36 e 37 do CED. OAB/SP-TED (Em. 77/309).............................................................. 624

—I—
IMISSÃO NA POSSE
— Alienação de bem imóvel adquirido durante a constância da união estável. Outorga uxória.
Necessidade. Comunhão parcial de bens. Presunção absoluta. Art. 1.725 do CC/02. Direitos
patrimoniais da companheira. Art. 226 da CF/88. Terceiro de boa-fé. Direito à indenização.
Deve-se suspender a imissão na posse determinada pelo juízo a quo em face da ausência de
autorização expressa da agravante para a alienação do bem objeto da lide, resguardando-se
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 663

ao terceiro de boa-fé o direito que lhe assiste de pleitear eventual indenização por danos que
tenha sofrido. TJAL (Em. 77/140).............................................................................................. 344
IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS
— Operação interestadual. Adesão ao simples nacional que não afasta a exigência relativa à
operação interestadual. Art. 13, § 1º, XIII, g, da LC 123/06. Ofensa à anterioridade anual.
Inocorrência. STJ (Em. 77/139).................................................................................................. 343
— Repasse constitucional aos municípios. Retenção pelo Estado. Impossibilidade. STF (Em.
77/141)....................................................................................................................................... 344
IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS
— Acórdão do TRF 3ª R. – Crédito-prêmio. Correção monetária. Índices e expurgos inflacionários
utilizados. Orientação do STJ. Divergência. Retratação.............................................................. 264
— Acórdão do TRF 5ª R. – Isenção. Veículo adquirido por portador de deficiência física. Lei
8.989/95, Art. 1º, IV, § 1º. Possibilidade..................................................................................... 272
— Crédito presumido. Ocorrência da exportação. Aquisição de insumos junto a pessoas físicas
e cooperativas. A aquisição de insumos atrelados ao processo produtivo junto a pessoas
físicas e cooperativas deve ser considerada no cálculo do crédito presumido do IPI. Custos
com energia elétrica. Multas e juros decorrentes de pagamento em atraso e contribuição para
o custeio do serviço de iluminação pública. Inaplicabilidade. Peças de reposição. Máquinas.
Não cabimento. CARF (Em. 77/143)......................................................................................... 344
— Multa regulamentar. DIF-Papel imune. A falta e/ou o atraso na apresentação da Declaração
Especial de Informações Relativas ao Controle de Papel Imune a tributo – DIF-Papel Imune,
pela pessoa jurídica obrigada, sujeita o infrator à multa regulamentar prevista na Lei 11.945/09.
CARF (Em. 77/142).................................................................................................................... 344
IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS
— Arrendamento mercantil. Local da prestação de serviço, assim entendido o local onde se
comprove haver unidade econômica ou profissional da instituição financeira com poderes
decisórios suficientes à concessão e à aprovação do financiamento – núcleo da operação de
leasing financeiro e fato gerador do tributo. TJMG (Em. 77/20)................................................ 293
— Manipulação de medicamentos. Pretensão à declaração de não incidência de ICMS sobre a
atividade (fórmulas). Atividade sujeita ao ISSQN, e não ao ICMS. Tipificação no item 4.07
da lista anexa da LC 116/03. TJSP (Em. 77/66).......................................................................... 315
— Serviço de tapeçaria. Item 14.11 da lista de serviços. Alegação de que a atividade consiste em
comercialização de acessórios de couro para automóveis. Provas documentais que autorizam
a tributação do ISS. TJSP (Em. 77/21)........................................................................................ 294
— Serviços bancários. LC 116/03. Taxatividade dos itens da lista anexa. Possibilidade de inter-
pretação extensiva. Serviços impugnados: tarifa interbancária. Inexistência de prestação de
serviço contratual. Contratação de operações ativas. ISSQN devido pela adequação ao item
15.08 da lista anexa à LC 116/03. Adiantamento a depositantes. Imposto exigível com fun-
damento no item 15.08 da lista anexa à LC 116/03. Multa de 40%. Art. 26 da LC Municipal
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
de Curitiba 40/01. Falta de pagamento do tributo apurado em procedimento administrativo
fiscal. Multa corretamente aplicada. Efeito confiscatório. Vedação relacionada aos tributos, e
não às penalidades pecuniárias. TJPR (Em. 77/115).................................................................. 333
IMUNIDADE PARLAMENTAR
— Acórdão do STF – Dano moral. Nexo de causalidade entre a manifestação e o exercício do
mandato. Inexistência. Indenização devida................................................................................ 173
INCIDENTE DE FALSIDADE DOCUMENTAL
— Sentença de procedência do pedido para declarar a falsidade do documento. Art. 395 do CPC.
Admissão do agravo de instrumento pela aplicação do princípio da fungibilidade. Ausência
do documento original não impede o regular processamento do incidente de falsidade. Depoi-
mento elucidativo do oficial de registro que evidencia a falsidade do documento. Confrontação
dos seus dados com o livro de registro cartorário. TJES (Em. 77/144)...................................... 345
INCOMPATIBILIDADE E IMPEDIMENTO
— Advogados conciliadores e mediadores nos centros judiciários de solução de conflitos e
cidadania. Inexistência da primeira e existência da segunda. Impedimento para atuar como
advogado para as partes que atendeu como mediador e conciliador e na Vara com a qual cola-
borou naquela condição, sob pena de configurar captação de clientela e concorrência desleal.
Necessidade de sujeição à cláusula de confidencialidade. OAB/SP-TED (Em. 77/306)............. 623
664 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA
— Ação de cobrança. Averbação relativa a negócio jurídico que envolve o empreendimento.
Custas e emolumentos. Ato de registro único. Aplicação do art. 237-A, § 1º, da LRP. TJDF
(Em. 77/45)................................................................................................................................ 306
INFRAÇÃO DISCIPLINAR
— Advogado. Inadimplência de anuidades devidas à OAB. Suspensão do exercício profissional.
Prorrogação até a quitação da dívida. Afastamento. Prescrição. Constitui infração disciplinar
deixar o advogado de pagar as contribuições devidas à OAB, depois de regularmente notificado
a fazê-lo, podendo a sanção disciplinar ser prorrogada até a quitação integral, nos termos do
art. 37, § 2º, do EAOAB. Porém, essa prorrogação está limitada pela prescrição para a cobrança
dos débitos de anuidades, que segura o prazo do art. 206, § 5º, I, do CC, que determina o prazo
de cinco anos para a cobrança de dívidas fundadas em instrumentos público ou particular.
OAB/CF (Em. 77/314)................................................................................................................ 625
INELEGIBILIDADE
— Artigo de Helio Deivid Amorim Maldonado: “Marco Inicial do Prazo da Inelegibilidade por
Rejeição de Contas: Reconstrução do Significado de ‘Decisão Irrecorrível’”.............................. 76
INTERDIÇÃO
— Perícia médica concluindo que a interditanda pode gerir seus atos. Ausência de prova tes-
temunhal pela incapacidade. Improcedência dos pedidos iniciais. O fato de a interditanda
encontrar-se nervosa e misturando as palavras em sede de interrogatório não faz presumir
que seja incapaz, até porque é normal que pessoas leigas, diante de um magistrado, fiquem
nervosas, em razão de um certo temor de audiência judicial. TJAL (Em. 77/55)...................... 311
INTERNET
— Serviço. Bloqueio indevido. Caracterizados os danos morais pela falha na prestação do ser-
viço, cabível a indenização pretendida, acrescida de correção monetária pelo IGP-M, a partir
desta decisão, na forma da Súmula 362/STJ, e dos juros moratórios de 1% ao mês, contados
da citação, por se tratar de relação contratual. TJRS (Em. 77/54).............................................. 310
INVENTÁRIO
— Acórdão do TJRJ – Termo de inventariança. Requerimento de assinatura pelo patrono. Ad-
missibilidade. CPC, art. 38. Recurso conhecido e provido para autorizar que o advogado do
agravante assine o termo de inventariança................................................................................. 279
— Arrolamento de bem. União estável post mortem. Decisão que determinou a inclusão da
agravada como herdeira para lhe atribuir o equivalente a 2/3 da herança, caso comprovada a
condição de irmã do de cujus. Insurgência da agravante, companheira do de cujus. Tendo o de
cujus deixado uma irmã, cabe à agravante apenas 1/3 da herança, além do direito à meação
sobre o imóvel, como corretamente decidiu a decisão agravada. TJSP (Em. 77/88).................. 323
INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE
— Ação de impugnação da presunção de paternidade julgada extinta, sem resolução do mérito,
ante a coisa julgada formada em anterior ação declaratória de inexistência de filiação julgada
igualmente improcedente. Relativização da coisa julgada. Inaplicabilidade no caso concreto.
Prevalência do princípio da segurança jurídica. TJRS (Em. 77/52)............................................ 309
— Cumulada com pedido de alimentos e anulação do registro de nascimento. Alimentos provi-
sórios. Adequação ao trinômio necessidade, possibilidade, razoabilidade. Majoração devida.
Comprovada a privilegiada situação financeira do prestador, bem como a necessidade pre-
sumida da criança e a ausência de estrutura econômica da mãe, merecem ser majorados os
alimentos estabelecidos na decisão proferida pelo julgador singular, evidenciado que aquele
valor é insuficiente à manutenção das despesas mensais ordinárias da menor. TJGO (Em.
77/57)......................................................................................................................................... 312
— Julgamento monocrático. Possibilidade. Princípios constitucionais. Observância. Paternidade
socioafetiva e biológica. A tese segundo a qual a paternidade socioafetiva sempre prevalece
sobre a biológica deve ser analisada com bastante ponderação e depende sempre do exame
do caso concreto. Afastar a possibilidade de o filho maior pleitear o reconhecimento de pa-
ternidade biológica em seu assento de nascimento, no caso de “adoção à brasileira”, significa
impor-lhe que se conforme com essa situação, criada à sua revelia e à margem da lei. TJGO
(Em. 77/56)................................................................................................................................ 311
INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE POST MORTEM
— Parte autora beneficiária da gratuidade de justiça. Inversão do ônus da prova. Teoria da dis-
tribuição dinâmica do ônus da prova. Cabimento. Peculiaridades do caso concreto. Diante da
notória dificuldade da autora/agravada, beneficiária da gratuidade de justiça, em promover a
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 665

realização do exame de DNA, a se efetivar por carta rogatória na França, mediante a colheita
de material genético de parentes do falecido e dos réus/agravantes ou por meio da exumação
do cadáver também naquele país. Inversão do ônus da prova para determinar aos réus/agra-
vantes que arquem com os custos de sua realização, incluindo as despesas de tradução da
carta rogatória e demais despesas a serem incorridas quando do seu cumprimento na França,
sob pena de se inviabilizar a solução da lide, cujo trâmite, aliás, já se arrasta por mais de uma
década. TJDF (Em. 77/146)........................................................................................................ 346
ISENÇÃO
— Ação anulatória. Débito fiscal. Cobrança indevida de ICMS sobre produtos isentos. Compro-
vação. Necessidade de restringir apenas aos produtos hortifrutigranjeiros elencados no anexo
VII do D. 3.803/04. TJMT (Em. 77/85)...................................................................................... 322
— Acórdão do TRF 5ª R. – IPI. Veículo adquirido por portador de deficiência física. Lei 8.989/95,
Art. 1º, IV, § 1º. Possibilidade..................................................................................................... 272

—J—
JUNTADA DE DOCUMENTOS
— Apelação. Possibilidade. Art. 397 do CPC. É possível a juntada a posteriori de documentos com
a apelação, desde que tais documentos sejam acerca de fatos já alegados ou para contrapor-se
a outros fatos que foram produzidos nos autos, nos termos do art. 397 do CPC. STJ (Em.
77/72)......................................................................................................................................... 317
JUROS BANCÁRIOS
— Taxa. Competência. O STF já decidiu pela validade da Lei 4.595/64, na parte que outorga
poderes ao CMN para dispor sobre as taxas de juros bancários. STF (Em. 77/93).................... 326

—L—
LEASING
— Ação revisional. Arrendamento mercantil. Tanto na conclusão quanto na execução dos contra-
tos, as partes devem observar os princípios da probidade e da boa-fé. Perfeitamente cabível a
cobrança da tarifa de cadastro, pois em total consonância com as disposições emanadas pelo
Banco Central e pelo CMN, conforme entendimento do STJ em sede de recurso repetitivo. Não
pode a arrendadora requerer o pagamento de valores sem informar a consumidora, de forma
detalhada e clara, a que se referem. Se o seguro de proteção era facultativo, e a arrendatária
aceitou sua contratação, não há que se falar em cobrança indevida. TJSP (Em. 77/87)............ 323
— ISS. Arrendamento mercantil. Local da prestação de serviço, assim entendido o local onde se
comprove haver unidade econômica ou profissional da instituição financeira com poderes
decisórios suficientes à concessão e à aprovação do financiamento – núcleo da operação de
leasing financeiro e fato gerador do tributo. TJMG (Em. 77/20)................................................ 293
LEGITIMIDADE DE PARTE
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Execução. Título judicial formado em mandado de segurança coletivo. Associação. Represen-
tação. Necessidade de autorização expressa dos associados. STF (Em. 77/126)........................ 337
LOCAÇÃO
— Ação de despejo. Denúncia vazia. Contrato de locação não residencial. Prazo indeterminado.
Caso concreto. Matéria de fato. Preenchimento dos pressupostos para a concessão do pedido
liminar. Incidência do inciso VIII do § 1º do art. 59 da Lei do Inquilinato, acrescido pela Lei
12.112/09. TJRS (Em. 77/50)...................................................................................................... 308
— Ação de despejo. Retomada do imóvel. Empresa em recuperação judicial. Suspensão do curso
da ação. Possibilidade. A retomada da posse direta do imóvel locado à sociedade empresária
em recuperação judicial tem aptidão de impactar na continuidade de suas atividades, não se
coadunando com os fins teleológicos almejados por esse instituto. TJDF (Em. 77/110)........... 332
— Fiança. Execução. Interrupção da prescrição do devedor principal prejudica o fiador. Inteli-
gência do art. 204, § 3º, do CC. Declaração de inexistência de débito. Entrega das chaves pelo
fiador. Não responsabilidade pelos fatos posteriores ocorridos. Preservação da boa-fé. Fica
liberado o fiador das obrigações posteriores à entrega das chaves do imóvel, salvo inequívoca
ciência da prorrogação contratual. TJSE (Em. 77/116).............................................................. 334
— Fiança. Falsidade da assinatura atribuída à cônjuge virago. Validade da garantia prestada pelo
varão. Nulidade por inexistência de outorga uxória. Declaração de ofício. Inviabilidade. TJMG
(Em. 77/117).............................................................................................................................. 334
666 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

LOTEAMENTO
— Vide Ação Civil Pública. Uso e Ocupação do Solo. Obras de Infraestrutura. Responsabilidade.
LUCROS CESSANTES
— Acidente de trânsito. Taxista que deixou de laborar enquanto submetido a tratamento médico-
hospitalar. Lucros cessantes devidos. Discussão relativa à base estimativa da remuneração
diária devida e ao termo final dos lucros cessantes. É possível a utilização de declaração de
entidade representativa de classe para cômputo dos lucros cessantes. Termo final modificado,
ante a data da última consulta médica realizada. TJSP (Em. 77/78).......................................... 319

—M—
MANDADO DE SEGURANÇA
— Menor de 18 anos. Requerimento de matrícula em curso supletivo. Realização do exame final
de ensino médio. Certificado de conclusão de curso para matrícula em instituição de nível
superior. Possibilidade. Lei 9.394/96. Art. 208, V, da CF/88. TJDF (Em. 77/149)..................... 348
MANIPULAÇÃO DE MEDICAMENTOS
— Pretensão à declaração de não incidência de ICMS sobre a atividade (fórmulas). Atividade
sujeita ao ISSQN, e não ao ICMS. Tipificação no item 4.07 da lista anexa da LC 116/03. TJSP
(Em. 77/66)................................................................................................................................ 315
MARCO INICIAL DO PRAZO DA INELEGIBILIDADE POR REJEIÇÃO DE CONTAS:
RECONSTRUÇÃO DO SIGNIFICADO DE “DECISÃO IRRECORRÍVEL”
— Artigo de Helio Deivid Amorim Maldonado............................................................................... 76
MATADOURO MUNICIPAL
— Condições precárias. Risco de dano ambiental à saúde e à vida da população circunvizinha.
Realização de obras necessárias. Multa diária. Desproporcionalidade no valor fixado de R$
10.000,00, limitado ao valor de R$ 200.000,00. Reduzo de ofício a multa diária ao valor de
R$ 1.000,00, limitado ao valor de R$ 30.000,00, eis que os valores apresentam-se elevados.
Responsabilização pessoal do agente público. Impossibilidade. TJSE (Em. 77/34)................... 300
MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NO DIREITO DAS FAMÍLIAS
— Artigo de Hildeliza Lacerda Tinoco Boechat Cabral, Michelle Dutra Peres, Carlos Henrique
Medeiros de Souza e Vívian Boechat Cabral Carvalho............................................................... 50
MEDIDA CAUTELAR
— Expedição de certidão de regularidade fiscal. Oferecimento de caução idônea. Possibilidade.
Exegese do art. 206 do CTN. Desnecessidade de se atentar à ordem do art. 11 da LEF. TJSC
(Em. 77/24)................................................................................................................................ 295
MEDIDA PROTETIVA
— Afastamento do lar. Discussão de propriedade do imóvel. Via inadequada. Decisão interlocu-
tória que manteve o cônjuge virago na residência do casal. Dúvida acerca da união estável.
Matéria de competência do juízo cível. Capacidade econômica do cônjuge varão bem superior
à do cônjuge virago. TJES (Em. 77/119).................................................................................... 335
MENOR DE 18 ANOS
— Requerimento de matrícula em curso supletivo. Realização do exame final de ensino médio.
Certificado de conclusão de curso para matrícula em instituição de nível superior. Possibili-
dade. Lei 9.394/96. Art. 208, V, da CF/88. TJDF (Em. 77/149).................................................. 348
MENOR SOB GUARDA
— Pensão por morte. Garantia do princípio integral da criança e do adolescente. Dignidade da
pessoa humana. Os direitos constitucionais, ratificados pelo ECA, asseguram, com efeito, os
direitos previdenciários à criança sob guarda, em que pese o regramento da MP 1.523/96,
posteriormente convertida na Lei 9.528/97. TJAC (Em. 77/150)............................................... 348
MULTA
— Ação anulatória. Deposição irregular de resíduos. A área atingida foi devidamente delimitada
e o cálculo da multa obedeceu aos critérios legais. O recorrente era, à época dos fatos, o único
proprietário do imóvel. Aplicação do art. 1.245, § 1º, do CC. TJSP (Em. 77/19)...................... 293
— Art. 475-J DO CPC. Sentença. Cumprimento. Intimação do executado na pessoa de seu
advogado. Necessidade. Descabida a imposição de multa automaticamente, apenas com a
prolação de despacho para cumprimento do acórdão. TJSP (Em. 77/101)................................ 328
— Autuação pelo Procon. Lojistas. Desconto para pagamento em dinheiro ou cheque em detri-
mento do pagamento em cartão de crédito. Prática abusiva. Cartão de crédito. Modalidade
de pagamento à vista. Pro soluto. Descabida qualquer diferenciação. STJ (Em. 77/90).............. 324
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 667

— IPI. DIF-Papel imune. A falta e/ou o atraso na apresentação da Declaração Especial de In-
formações Relativas ao Controle de Papel Imune a tributo – DIF-Papel Imune, pela pessoa
jurídica obrigada, sujeita o infrator à multa regulamentar prevista na Lei 11.945/09. CARF
(Em. 77/142).............................................................................................................................. 344
— Matadouro público. Condições precárias. Risco de dano ambiental à saúde e à vida da população
circunvizinha. Realização de obras necessárias. Multa diária. Desproporcionalidade no valor
fixado de R$ 10.000,00 limitado ao valor de R$ 200.000,00. Reduzo de ofício a multa diária
ao valor de R$ 1.000,00, limitado ao valor de R$ 30.000,00, eis que os valores apresentam-se
elevados. Responsabilização pessoal do agente público. Impossibilidade. TJSE (Em. 77/34)... 300
MULTA DE TRÂNSITO
— Autos de infração de trânsito lavrados por sociedade de economia mista. Declaração de
nulidade dos AIIMS. Legalidade da lavratura dos autos de infração pela Transerp, desde que
expedidos por policial militar ou equipamento eletrônico (radar). No entanto, no caso dos
autos, as autuações foram promovidas por agente civil de trânsito, padecendo, desse modo,
de nulidade. TJSP (Em. 77/89)................................................................................................... 324

—N—
NEGATÓRIA DE PATERNIDADE
— Exame de DNA. Recusa da mãe que inclusive aponta o nome do pai biológico. Paternidade
socioafetiva. Ausência. Confissão da mãe. Prevalência. Erro no reconhecimento da filiação.
Interesse do menor. Provada a ausência de vínculo afetivo entre o autor e a menor e pela
confissão da mãe, que declara ser a filha de outrem, procede o pedido de negatória de pater-
nidade. TJDF (Em. 77/73).......................................................................................................... 317
NOME DA MULHER
— Vide Patronímico. Registro Civil. Retificação.
NOTIFICAÇÃO PRÉVIA
— Plano de saúde coletivo. Rescisão unilateral. Inadimplemento superior a 60 dias. Possibilidade.
É possível a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde quando houver o não pagamento
das mensalidades por mais de 60 dias, consecutivos ou não, e cumulativamente, e houver a
prévia notificação do consumidor. TJDF (Em. 77/154).............................................................. 349
NULIDADE
— Ato administrativo. Autotutela. Autorização para desmate e construção. Os agentes constata-
ram intervenções em APP (proximidade a curso d’água e declividade acentuada), bem como
canalização de córrego sem autorização do DAEE. Ausente a prova pericial, único meio para
desconstituir os motivos que levaram à anulação dos atos administrativos, não há como afastar
a decisão administrativa. TJSP (Em. 77/18)............................................................................... 293
— Aval. É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de crédito rural emitida
também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do DL 167/67. TJMS (Em.
77/300)....................................................................................................................................... 621
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Aval. É nulo o aval prestado por terceiro, pessoa física, em cédula de crédito rural emitida
também por pessoa física, nos termos do disposto no art. 60, § 3º, do DL 167/67. TJPR (Em.
77/301)....................................................................................................................................... 621
— Aval. Outorga uxória. Ausência. Ato anulável. Execução extinta. Preceitua o CC, art. 1.647,
III, que, “ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do
outro, exceto no regime da separação absoluta, prestar fiança ou aval”. TJMG (Em. 77/91).... 325
— Multa de trânsito. Autos de infração de trânsito lavrados por sociedade de economia mista.
Declaração de nulidade dos AIIMS. Legalidade da lavratura dos autos de infração pela Transerp,
desde que expedidos por policial militar ou equipamento eletrônico (radar). No entanto, no
caso dos autos, as autuações foram promovidas por agente civil de trânsito, padecendo, desse
modo, de nulidade. TJSP (Em. 77/89)........................................................................................ 324

—O—
OUTORGA UXÓRIA
— Alienação de bem imóvel adquirido durante a constância da união estável. Outorga uxória.
Necessidade. Comunhão parcial de bens. Presunção absoluta. Art. 1.725 do CC/02. Direitos
patrimoniais da companheira. Art. 226 da CF/88. Terceiro de boa-fé. Direito à indenização.
Deve-se suspender a imissão na posse determinada pelo juízo a quo em face da ausência de
autorização expressa da agravante para a alienação do bem objeto da lide, resguardando-se
668 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

ao terceiro de boa-fé o direito que lhe assiste de pleitear eventual indenização por danos que
tenha sofrido. TJAL (Em. 77/140).............................................................................................. 344
— Ausência. Aval. Ato anulável. Execução extinta. Preceitua o CC, art. 1.647, III, que, “ressalvado
o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no
regime da separação absoluta, prestar fiança ou aval”. TJMG (Em. 77/91)................................ 325
— Execução. Locação. Fiança. Falsidade da assinatura atribuída à cônjuge virago. Validade da
garantia prestada pelo varão. Nulidade por inexistência de outorga uxória. Declaração de
ofício. Inviabilidade. TJMG (Em. 77/117).................................................................................. 334

—P—
PACTO COMISSÓRIO
— Inocorrência. Ação anulatória. Ato jurídico. Sucessivos empréstimos tomados junto aos réus
pela empresa autora. Transferência da propriedade de bens móveis e imóvel no decorrer dos
anos. Alegação, deduzida em sede de alegações finais, de que a transferência patrimonial
consubstanciaria pacto comissório. Art. 765 do CC/1916, com consentâneo no art. 1.428
do CC/02. Substrato probatório absolutamente exíguo e inconclusivo a respeito. Coação
tampouco indemonstrada. Alegada quitação do débito indemonstrada. Divergência entre os
valores informados pelas partes. TJSC (Em. 77/23)................................................................... 295
PARTILHA
— União estável. Ação de reconhecimento e dissolução. Delimitação dos marcos estabelecidos na
sentença. Manutenção. Partilha de imóvel financiado. Valorização posterior. Meação que deve
recair sobre o valor obtido da subtração entre o saldo devedor junto à instituição financeira
e o valor de mercado do bem. TJSE (Em. 77/60)........................................................................ 313
— União estável post mortem. Ação de reconhecimento e dissolução. União estável evidenciada.
Regime de bens aplicável. Reconhecida a união estável, deve ser observado o regime de co-
munhão parcial de bens, nos termos do art. 1.725 do CC. TJGO (Em. 77/59).......................... 313
PATRIMÔNIO HISTÓRICO NACIONAL
— Ação civil pública. Bem não tombado. Prova do valor histórico. Dever de conservação pelo
proprietário. No caso, está devidamente comprovado que o Moinho Backhaus é relevante
para o patrimônio histórico da comunidade de Rolante, devendo os proprietários adotar as
medidas de conservação requeridas na ACP ajuizada pelo MP. TJRS (Em. 77/28).................... 297
— Tombamento. Conjunto arquitetônico e paisagístico no Município de Santa Cruz Cabrália/
BA. Construção irregular. Pavimento superior. Descaracterização após o tombamento. Con-
figuração. Laudos técnicos. Poder Público. Ora, se o Poder Público, diante das circunstâncias
concretas da lide, não pudesse adotar as medidas consignadas na sentença recorrida, tal
omissão esvaziaria a eficácia do mencionado dispositivo constitucional e deixaria um flanco
aberto para toda sorte de vulneração ao postulado fundamental de preservação do patrimônio
histórico e cultural do país. TRF 1ª R. (Em. 77/36)................................................................... 301
— Tombamento. Lei 11.483/07. Bem da extinta RFFSA. Estação ferroviária. Controle judicial
sobre decisões administrativas. O reconhecimento do valor artístico, histórico e cultural
para o tombamento de determinado bem na esfera estadual não conduz, necessariamente, a
idêntico posicionamento no âmbito federal. Inexistindo tombamento pelo IPHAN, é inviável
a condenação da União Federal e dos demais apelados à elaboração e à execução de projeto
de recuperação do imóvel, a ser submetido à aprovação da referida autarquia. TRF 2ª R. (Em.
77/33)......................................................................................................................................... 299
PATRONÍMICO
— Registro civil. Retificação. Casamento e divórcio realizados no exterior. Assentos registrados
no Brasil após traslado da sentença estrangeira, que decretou o divórcio, devidamente homo-
logada pelo STJ. Pretensão de supressão do patronímico do ex-marido. Possibilidade. Exegese
do art. 32, § 1º, da Lei 6.015/73. TJPR (Em. 77/62)................................................................... 314
— Registro civil. Retificação. Inclusão do nome do marido da mãe. Descabimento. É juridicamente
impossível o pedido da parte para que conste no seu registro civil de nascimento os dados
relativos ao marido da sua mãe, com acréscimo do patronímico dele e exclusão dos dados
referentes ao seu pai biológico e registral. Se o pai registral é o pai biológico, então inexiste
possibilidade jurídica de sua exclusão. TJRS (Em. 77/160)....................................................... 352
— Registro civil. Retificação. Sentença de procedência para acrescer ao sobrenome da autora o
patronímico do marido. Justificativa idônea. Identificação personalíssima da entidade familiar.
Interpretação conjunta da regra dos arts. 109 da LRP (Lei 6.015/73) e 1.056 do CC. TJPR
(Em. 77/63)................................................................................................................................ 314
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 669

PENHORA
— Acórdão do TJDF – Veículo. Bem essencial ao exercício da atividade profissional. Nos termos
do art. 649, V, do CPC, são absolutamente impenhoráveis os livros, as máquinas, as ferramen-
tas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de
qualquer profissão...................................................................................................................... 276
— Acórdão do TRF 1ª R. – Faturamento da empresa. Impossibilidade. Art. 620 do CPC. Princípio
da menor onerosidade para o devedor. Art. 649, V, do CPC. A penhora sobre o faturamento
da empresa só é admitida em circunstâncias excepcionais e desde que, entre outros requisitos,
não implique o comprometimento da atividade da pessoa jurídica executada.......................... 253
— Embargos. Imóvel rural. Bem de família. Lei 8.009/90. Impenhorabilidade reconhecida na
sentença, com exceção da área sem construções, benfeitorias e plantações. Imóvel que possui
área correspondente à pequena propriedade rural, conforme a conceituação que é dada pela Lei
8.629/93. Módulo fiscal estabelecido pela Instrução Especial/INCRA 20, de 28.05.80. Desmem-
bramento que se mostra inviável, pois resultaria em área inferior ao módulo fiscal do município.
Impenhorabilidade que deve abranger a área total do imóvel. TJSC (Em. 77/118)...................... 334
— Faturamento de empresa. Art. 655, VII, do CPC. Requisitos autorizadores. Presença. Percentual
da penhora. Redução. 15% para 5%. Caso concreto. Possibilidade. Restrição. Filial. Geradora
do tributo. Impossibilidade. Unidade patrimonial da pessoa Nomeação de depositário. Art.
655-A, § 3º, do CPC. Necessidade. Sócio administrador. Recomendação. Recebíveis. Adminis-
tradoras de cartões de crédito e débito. Faturamento. Caracterização. Penhora. Possibilidade.
TJDF (Em. 77/131)..................................................................................................................... 339
PENHORA ON LINE
— Conta-corrente conjunta. Penhora da totalidade. Possibilidade. O valor depositado pode ser
penhorado em garantia da execução, ainda que somente um dos correntistas seja responsável
tributário pelo pagamento do tributo. STJ (Em. 77/130)........................................................... 338
— Desbloqueio. Execução fiscal. Adesão a programa de parcelamento. Possibilidade. A adesão
do executado a programa de parcelamento gera a suspensão da exigibilidade do crédito tri-
butário, de modo que não mais se justifica a manutenção de bloqueio de valores por meio do
convênio Bacen Jud. TRF 1ª R. (Em. 77/127)............................................................................ 338
PENSÃO POR MORTE
— Menor sob guarda. Garantia do princípio integral da criança e do adolescente. Dignidade da
pessoa humana. Os direitos constitucionais, ratificados pelo ECA, asseguram, com efeito, os
direitos previdenciários à criança sob guarda, em que pese o regramento da MP 1.523/96,
posteriormente convertida na Lei 9.528/97. TJAC (Em. 77/150)............................................... 348
PENSÃO VITALÍCIA
— Acidente de trânsito. Motocicleta do pai e esposo das autoras que colidiu na traseira do
veículo de tração animal (carroça) do requerido, que trafegava sobre a Rodovia Estadual SC-
477. Falecimento do condutor da motocicleta. Dependência econômica da filha menor e da
esposa presumida. Pensão mensal devida no montante equivalente a 2/3 do salário mínimo.
Constituição de capital. TJSC (Em. 77/53)................................................................................. 309
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Acórdão do STJ – Acidente de trânsito. Dano moral e material. Pensão. Termo final. Prescrição.
Inocorrência. Suspensão. Aplicação do art. 200 do CCB. Responsabilidade por fato de terceiro.
Empregado da ré condenado criminalmente por homicídio culposo. Responsabilidade objetiva
da empregadora. Arts. 932 e 933 do CCB. Pensionamento. Alegada falta de comprovação de
rendimentos da vítima e da parcela destinada ao sustento da viúva. Descabimento.................. 180
— Responsabilidade civil do Estado. Cirurgia de laqueadura tubária. Posterior gravidez. Réu que
não comprova o cumprimento do dever de informar ao paciente sobre o risco do insucesso da
cirurgia. Art. 37, § 6º, da CF. Dano moral configurado. Comprometimento do planejamento
familiar. Pensão mensal devida. TJRJ (Em. 77/166)................................................................... 354
— Responsabilidade civil do Município. Acidente de trânsito. Defeitos em via municipal. Ausên-
cia de sinalização. Óbito do companheiro e pai dos autores. Responsabilidade caracterizada.
Abalo moral. Dano moral in re ipsa. Pensão mensal devida à companheira e aos filhos menores.
Dependência econômica. Juros de mora. TJSC (Em. 77/145).................................................... 346
PERSONALIDADE JURÍDICA
— Acórdão do STJ – Desconsideração. O encerramento das atividades ou dissolução da sociedade,
ainda que irregulares, não são causas, por si sós, para a desconsideração................................. 177
— Desconsideração. Execução. Alimentos. Penhora. Valores depositados na conta da empresa.
Aplicação da disregard doctrine. Pagamentos in natura. Compensação. Descabimento. Se o
devedor possui bens passíveis de garantir a execução, descabe a aplicação do disposto no
670 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

art. 50 do CC, não se cogitando de confusão patrimonial ou desvio de finalidade. TJRS (Em.
77/123)....................................................................................................................................... 336
— Desconsideração. Execução. Presença de pressupostos para deferimento da medida. Aplica-
bilidade do art. 50 do CC. Indícios de práticas irregulares nas atividades empresariais. Abuso
de personalidade evidenciado. TJPR (Em. 77/125).................................................................... 337
— Desconsideração. Requisitos do art. 50 do CC. O encerramento das atividades ou dissolução
da sociedade, ainda que irregulares, não são causas, por si sós, para a desconsideração da
personalidade jurídica, nos termos do Código Civil. STJ (Em. 77/109).................................... 331
PLANO DE SAÚDE
— Cobertura em hospital não abrangido pela modalidade contratada. Impossibilidade. Manu-
tenção do equilíbrio econômico-financeiro da avença. Se os hospitais indicados pela apelante
são conhecidos nacionalmente pela sua excelência, possuindo tratamento e acomodações dife-
renciadas, não é razoável que a apelante adesiva decida, unilateralmente e fora do seu plano,
se submeter à cirurgia em nosocômio não conveniado, sob pena de inviabilizar o equilíbrio
econômico-financeiro do contrato e causar enriquecimento sem causa. TJMG (Em. 77/152).. 348
— Tratamento. Uso domiciliar. Medicamento. Negativa de cobertura. Cláusula abusiva. Multa
diária. Incidência e valor. Proporcionalidade. TJDF (Em. 77/153)............................................ 349
PLANO DE SAÚDE COLETIVO
— Falecimento do titular. Cancelamento do plano com menos de um mês da data do óbito.
Dependente que, idosa, necessitou contratar novo plano no valor de R$ 1.900,00 mensais.
Cláusulas contratuais que preveem a manutenção do dependente por cinco anos sem paga-
mento das mensalidades em caso de óbito e pagamento de seguro de morte por acidente que
não foram cumpridas pela parte ré. Reativação do plano com o prazo de carência de cinco
anos e devolução em dobro dos valores gastos, além do pagamento do seguro e indenização
por dano moral. Sentença de procedência. TJRJ (Em. 77/133).................................................. 340
— Rescisão unilateral. Inadimplemento superior a 60 dias. Notificação prévia. Possibilidade. É
possível a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde quando houver o não pagamento
das mensalidades por mais de 60 dias, consecutivos ou não, e cumulativamente, e houver a
prévia notificação do consumidor. TJDF (Em. 77/154).............................................................. 349
POLÊMICAS SUPRESSÕES ENCARTADAS PELO NOVO CPC
— Artigo de Fernando Rubin.......................................................................................................... 25
POLUIÇÃO AMBIENTAL
— Vazamento de óleo de embarcação. Agente marítimo. Legitimidade ad causam passiva. Tutela
antecipatória. Cumprimento. Perda intercorrente de interesse processual. Inocorrência. Demora
na contenção. Responsabilidade objetiva. Procedência. TJRJ (Em. 77/38)................................ 302
POLUIÇÃO SONORA
— Ministério Público. Legitimidade reconhecida. Dano moral coletivo. Redução da indenização.
STJ (Em. 77/39).......................................................................................................................... 303
PORTA GIRATÓRIA
— Travamento. Dano moral. Agente penitenciário com arma de fogo. Identificação funcional e
porte de arma. Acesso ao interior da agência negado. Ato ilícito. Vexame e humilhação não
comprovados. Exercício regular de direito visando garantir a segurança do estabelecimento e
dos clientes. Inexistente comprovação de excesso. Mero aborrecimento. Ausentes os pressu-
postos caracterizadores do instituto da responsabilidade civil. Dever de indenizar afastado.
TJAC (Em. 77/102)..................................................................................................................... 328
PRESCRIÇÃO
— Seguro de vida em grupo. Empregadora mandatária. Seguro facultativo. Prescrição ânua. A
ação de cobrança da seguradora contra a empregadora-estipulante relativa a prêmios não pagos
de seguro de vida em grupo sujeita-se ao prazo prescricional de um ano. STJ (Em. 77/176).... 357
PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE
— Execução. Instrumento particular de confissão e composição de dívida. Processo que ficou
paralisado por mais de 10 anos por desídia do exequente. Ação de execução ajuizada na vi-
gência do CC/1916. Prescrição vintenária que, a partir da entrada em vigor do CC/02, passou
a ser de cinco anos. Aplicação dos arts. 206, § 5º, I, e 2.028, ambos do novo diploma legal.
Manutenção da decisão que extinguiu a ação de execução. TJSC (Em. 77/121)....................... 336
PRISÃO ALBERGUE
— Devedor de alimentos. Prisão civil. Choque de direitos fundamentais. Liberdade x direito a
alimentos. Aparente antinomia. Solução à luz da ponderação de interesses e do princípio da
proporcionalidade. Prisão como medida adequada e necessária, mas, no entanto, despropor-
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 671

cional. Malefícios superam benefícios. Possibilidade de causar perda do emprego do paciente.


Liberdade como instrumento garantidor do direito de alimentos dos filhos do impetrante.
Ordem concedida. Liminar confirmada. TJAM (Em. 77/136).................................................... 341
PRISÃO CIVIL
— Devedor de alimentos. Choque de direitos fundamentais. Liberdade x direito a alimentos.
Aparente antinomia. Solução à luz da ponderação de interesses e do princípio da proporcionali-
dade. Prisão como medida adequada e necessária, mas, no entanto, desproporcional. Malefícios
superam benefícios. Possibilidade de causar perda do emprego do paciente. Liberdade como
instrumento garantidor do direito de alimentos dos filhos do impetrante. Ordem concedida.
Liminar confirmada. TJAM (Em. 77/136).................................................................................. 341
— Execução de alimentos. Pagamento parcial. Irrelevância. Restabelecimento do mandado de
prisão. O adimplemento parcial da dívida não é capaz de elidir a prisão civil do devedor de
alimentos. Liminar revogada. TJAC (Em. 77/124)..................................................................... 337
PROCESSO ÉTICO DISCIPLINAR
— Advogado. Prescrição quinquenal. Inocorrência. Causas interruptivas. A prescrição está
regulada no art. 43, § 2º, I, da Lei 8.906/94 e tem como causas interruptivas a instauração
de processo disciplinar ou pela notificação válida feita diretamente ao representado. Não
tendo ocorrido lapso temporal superior a cinco anos entre a notificação válida e a decisão
condenatória pelo TED, não há que se acolher a perda da pretensão punitiva. OAB/CF (Em.
77/313)....................................................................................................................................... 625
PRODUTOS HORTIFRUTIGRANJEIROS
— Ação anulatória. Débito fiscal. Isenção tributária. Cobrança indevida de ICMS sobre produtos
isentos. Comprovação. Necessidade de restringir apenas aos elencados no anexo VII do D.
3.803/04. TJMT (Em. 77/85)...................................................................................................... 322
PROPRIEDADE INDUSTRIAL
— Acórdão do TRF 2ª R. – Pedido de adjudicação de marca. Prescrição observada em relação a
um dos pedidos. Excepcionalidade da adjudicação. Não comprovada a má-fé no caso. Em via
de consequência, improcedente a pretensão adjucatória em relação ao registro 822.431.998... 256
— Indeferimento de registro de marca mista. Alegação de colidência. Exame do signo marcá-
rio como um todo. Distintividade conferida pelo conjunto dos elementos nominativos e
figurativos. Arredada a possibilidade de haver concorrência parasitária, indução do público
consumidor a erro, dúvida ou confusão, na hipótese, pois, ainda que haja leve afinidade em
relação ao ramo de negócio – clínicas atuantes na área da saúde –, ambas as empresas têm
porte modesto e são prestadoras de serviço conhecidas apenas regionalmente, além de estarem
localizadas em diferentes Estados da Federação, há mais de 2.000 km de distância uma da
outra. TRF 2ª R. (Em. 77/157)................................................................................................... 350
— Nulidade da patente de invenção. Cabimento. Não preenchimento do requisito da atividade
inventiva. Restou claro no laudo pericial que a patente de invenção PI 9203658-9 não atende
ao requisito da atividade inventiva. Releve-se que o parecer técnico juntado pela empresa
Master Sas di Ronchi Franceso SC., assim como o parecer técnico do INPI, não conseguiu
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
afastar a credibilidade do laudo pericial que elucidou de forma clara e específica as questões
postas nos autos pelas partes. TRF 2ª R. (Em. 77/158).............................................................. 351
— Nulidade da patente modelo de utilidade. Cabimento. Não preenchimento dos requisitos
necessários para esta modalidade. Apresentação de nota fiscal de venda de uma desnatadeira
modelo 29 AE, que conjuntamente com o catálogo Libro de Instrucciones comprovava a sua
existência anteriormente ao depósito do pedido de patente MU 7802799-3. TRF 2ª R. (Em.
77/156)....................................................................................................................................... 350
— Registro de marca. Impossibilidade. Identidade. Segmentos mercadológicos afins e mesma
clientela. Possibilidade de confusão. Ocorrência. Art. 124, XIX, da LPI. Verifica-se que os
termos “Schin/Skin” não são evocativos de cerveja, refrigerante ou bebidas em geral, não
sendo de uso comum no ramo, podendo ser considerados como um termo forte, distintivo,
que identifica os produtos daquela determinada empresa, sendo, desta maneira, expressões
merecedoras de um escopo maior de proteção. A empresa apelante, ao registrar sua marca
(Skan) com um termo muito próximo ao utilizado pela empresa apelada, pode levar o público
consumidor a acreditar que a marca da apelante seja uma nova linha de produto inserida no
rol da família de marcas da apelada. TRF 2ª R. (Em. 77/159).................................................... 351
— Utilização de assinatura pessoal e artística como marca. Direito de personalidade latente.
Autorização expressa e limitada. Contrato de cessão de marca mista. Transferência definitiva
de propriedade. Retomada de marca ou prática de ato contraditório. Impossibilidade. A cessão
672 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

de marca é instrumento apto a transferir os direitos de propriedade da marca transacionada,


legitimando o cessionário ao uso, fruição, disposição e reivindicação e, por consequência, a
opor-se, ainda que preventivamente, à pretensão de registro por terceiro, inclusive o próprio
cedente. STJ (Em. 77/183).......................................................................................................... 359
PROVA
— Inversão do ônus. Investigação de paternidade post mortem. Parte autora beneficiária da gratui-
dade de justiça. Teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova. Cabimento. Peculiaridades
do caso concreto. Diante da notória dificuldade da autora/agravada, beneficiária da gratuidade
de justiça, em promover a realização do exame de DNA, a se efetivar por carta rogatória na
França, mediante a colheita de material genético de parentes do falecido e dos réus/agravantes
ou por meio da exumação do cadáver também naquele país. Inversão do ônus da prova para
determinar aos réus/agravantes que arquem com os custos de sua realização, incluindo as
despesas de tradução da carta rogatória e demais despesas a serem incorridas quando do seu
cumprimento na França, sob pena de se inviabilizar a solução da lide, cujo trâmite, aliás, já
se arrasta por mais de uma década. TJDF (Em. 77/146)............................................................ 346

—Q—
QUEIMA DA PALHA DA CANA-DE-AÇÚCAR
— Ação civil pública. Pretendida condenação das corrés à obrigação de não fazer consistente na
abstenção da prática de queima da palha da cana-de-açúcar. Impossibilidade. Prática que não
é ilícita quando autorizada pelos órgãos ambientais competentes. Pretendida condenação ao
pagamento de indenização pelos danos ambientais decorrentes da queima. Impossibilidade.
Ausência de demonstração do efetivo dano, apto a dar ensejo à indenização. TJSP (Em.
77/35)......................................................................................................................................... 300

—R—
RAFAEL CALMON RANGEL
— Artigo: “Contraditório Colaborativo e Postura dos Sujeitos do Processo: uma Reflexão Ne-
cessária”...................................................................................................................................... 38
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
— Ação de despejo. Retomada do imóvel. Suspensão do curso da ação. Possibilidade. A retomada
da posse direta do imóvel locado à sociedade empresária em recuperação judicial tem aptidão
de impactar na continuidade de suas atividades, não se coadunando com os fins teleológicos
almejados por esse instituto. TJDF (Em. 77/110)...................................................................... 332
— Ação de despejo c/c cobrança de aluguéis. Lei 11.101/05. Demanda ilíquida. Execução. Mon-
tante apurado. Habilitação do crédito no juízo da recuperação judicial. STJ (Em. 77/96)........ 327
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
— Retenção com base no art. 542, § 3º, do CPC. Descabimento. STF (Em. 77/81)....................... 321
REDIRECIONAMENTO
— Execução fiscal. Sócio que detinha poderes de gestão à época da dissolução irregular da so-
ciedade. Irrelevância da data da ocorrência do fato gerador ou do vencimento da obrigação.
STJ (Em. 77/132)........................................................................................................................ 340
REGIME DE BENS
— União estável post mortem. Ação de reconhecimento e dissolução. União estável evidenciada.
Reconhecida a união estável, deve ser observado o regime de comunhão parcial de bens, nos
termos do art. 1.725 do CC. TJGO (Em. 77/59)........................................................................ 313
REGISTRO CIVIL
— Ação declaratória de inexistência de filiação e anulatória de registro público. Duplo registro
de paternidade. Multiparentalidade. Pai socioafetivo. Ausência de manifestação nos autos.
Demonstração de interesse em figurar na certidão de nascimento do menor. Inocorrência. Dis-
posição futura de bens. Possibilidade. Esta Corte tem entendimento no sentido de ser possível
o duplo registro na certidão de nascimento do filho nos casos de adoção por homoafetivos.
Não se justifica o pedido do MP para registro de dupla paternidade quando não demonstrado
prejuízo evidente ao interesse do menor. STJ (Em. 77/67)........................................................ 315
— Anulação cumulada com investigação de paternidade. Vínculo biológico e liame socioafetivo.
Não merece qualquer reparo a sentença que julgou a ação procedente e, acolhendo o pedido,
desconstituiu o liame registral, para nele constar o nome do pai biológico. É manifestamente
descabida a pretensão dos réus no sentido de que permaneça hígido o registro anterior, apenas
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 673

incluindo o nome do pai biológico, isto é, mantendo também o nome do pai registral, pois
desapareceu o vínculo jurídico deste com a ré. TJRS (Em. 77/84)............................................. 322
— Retificação. Casamento e divórcio realizados no exterior. Assentos registrados no Brasil após
traslado da sentença estrangeira, que decretou o divórcio, devidamente homologada pelo STJ.
Pretensão de supressão do patronímico do ex-marido. Possibilidade. Exegese do art. 32, § 1º,
da Lei 6.015/73. TJPR (Em. 77/62)............................................................................................. 314
— Retificação. Inclusão do nome do marido da mãe. Descabimento. É juridicamente impossível
o pedido da parte para que conste no seu registro civil de nascimento os dados relativos ao
marido da sua mãe, com acréscimo do patronímico dele e exclusão dos dados referentes ao
seu pai biológico e registral. Se o pai registral é o pai biológico, então inexiste possibilidade
jurídica de sua exclusão. TJRS (Em. 77/160)............................................................................. 352
— Retificação. Sentença de procedência para acrescer ao sobrenome da autora o patronímico do
marido. Justificativa idônea. Identificação personalíssima da entidade familiar. Interpretação
conjunta da regra dos arts. 109 da LRP (Lei 6.015/73) e 1.056 do CC. TJPR (Em. 77/63)....... 314
— Suscitação de dúvidas. Criança. Assento. Indicação de paternidade. Procuração outorgada
pelo pai. Princípio do maior interesse do menor. Possibilidade. Definição da circunscrição e
do cartório. Endereço dos pais. O instrumento procuratório possui concordância de ambos
os pais, instrumento este dotado de fé pública, acerca da filiação do menor. Tem-se que nesta
ocasião o pai reconheceu a paternidade do filho, podendo em conjunto ser procedido o assento
da criança com a indicação da paternidade, com a devida averbação. Ademais, inexistente
qualquer vício a obstar a pretensão deduzida nos autos. TJAC (Em. 77/178)........................... 358
REINTEGRAÇÃO DE POSSE
— Espaço público. Bar que serve escola estadual. Termo de autorização de uso. Em se tratando
de imóvel como bem público, decorra a titularidade de direito real ou pessoal, e não estando
os bens públicos sujeitos à usucapião, deve o espaço utilizado como bar de escola estadual
ser desocupado, para fins de que seja licitada a exploração da área. TJRS (Em. 77/61)............. 314
— Resolução de contrato particular com pedido de reintegração possessória. Imóvel. Descabi-
mento da exceção de usucapião invocada. Em razão do inadimplemento do preço, tem-se
que a posse exercida pelo compromissário comprador é meramente precária. Ausência de
animus domini. Ocupação do imóvel sem a devida contraprestação, desde outubro de 1996.
Perdimento, excepcional, de todos os valores pagos como compensação pelo uso do bem.
Ausência de violação ao preceito do art. 53 da Lei 8.078/90. TJSP (Em. 77/162)...................... 353
REPERCUSSÃO GERAL
— Aplicação da sistemática da repercussão geral pelo Tribunal de origem (art. 543-B do CPC).
Interposição do agravo previsto no art. 544 do CPC. Não cabimento. Princípio da fungibilidade
recursal. Devolução dos autos ao Tribunal de origem para julgamento do recurso como agravo
interno. Cabimento somente para os recursos interpostos antes de 19.11.09. Configuração de
erro grosseiro. STF (Em. 77/86)................................................................................................. 323
RESPONSABILIDADE CIVIL
— Acidente de trânsito. Taxista que deixou de laborar enquanto submetido a tratamento médico-
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
hospitalar. Lucros cessantes devidos. Discussão relativa à base estimativa da remuneração
diária devida e ao termo final dos lucros cessantes. É possível a utilização de declaração de
entidade representativa de classe para cômputo dos lucros cessantes. Termo final modificado,
ante a data da última consulta médica realizada. TJSP (Em. 77/78).......................................... 319
— Acórdão do STF – Dano moral. Imunidade parlamentar. Nexo de causalidade entre a mani-
festação e o exercício do mandato. Inexistência. Indenização devida........................................ 173
— Acórdão do STJ – Acidente de trânsito. Dano moral e material. Pensão. Termo final. Prescrição.
Inocorrência. Suspensão. Aplicação do art. 200 do CCB. Responsabilidade por fato de terceiro.
Empregado da ré condenado criminalmente por homicídio culposo. Responsabilidade objetiva
da empregadora. Arts. 932 e 933 do CCB. Pensionamento. Alegada falta de comprovação de
rendimentos da vítima e da parcela destinada ao sustento da viúva. Descabimento.................. 180
— Banco. Dano moral. Contrato bancário não reconhecido. Não demonstrada contração por
parte do autor. Inscrição imerecida em órgãos de restrições creditórias. TJBA (Em. 77/167)... 355
— Banco. Dano moral. Travamento da porta giratória. Agente penitenciário com arma de fogo.
Identificação funcional e porte de arma. Acesso ao interior da agência negado. Ato ilícito.
Vexame e humilhação não comprovados. Exercício regular de direito visando garantir a
segurança do estabelecimento e dos clientes. Inexistente comprovação de excesso. Mero
aborrecimento. Ausentes os pressupostos caracterizadores do instituto da responsabilidade
civil. Dever de indenizar afastado. TJAC (Em. 77/102).............................................................. 328
674 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

— Banco. Dano moral. Utilização de documentos pessoais legítimos da autora, por terceira pessoa,
sem o seu consentimento e presença, com a finalidade da contratação de empréstimo para o
financiamento de veículo. Falta de prova da vinculação da autora ao contrato inadimplido
e que gerou restrição cadastral ao seu nome. Omissão da casa bancária na apresentação do
contrato celebrado e dos documentos pessoais utilizados no ato da celebração do ajuste.
Negligência da instituição financeira evidenciada. Culpa concorrente da autora evidenciada
pelo fato de ter entregue seus documentos pessoais a sua prima, ainda que com finalidade
diversa, que não tem o condão de afastar a responsabilidade do banco, conquanto sirva de
critério delimitador do arbitramento da cifra indenizatória. TJSP (Em. 77/168)....................... 355
— Cadastro de inadimplentes. Inscrição. Dano moral. Desnecessidade de prova do prejuízo ou
dano. Basta mera comprovação do ato ou conduta ilícita. Abalo à imagem e ao crédito frente
ao comércio em geral. Imposição creditícia. TJDF (Em. 77/103)............................................... 329
— Dano moral. Acidente de ônibus. É obrigação da transportadora conduzir o passageiro são e
salvo a seu local de destino. Em tendo sido atingida a incolumidade física do passageiro, deve
a apelante indenizar-lhe os danos morais. TJRJ (Em. 77/165)................................................... 354
— Dano moral. Corpo estranho de metal não identificado no interior do biscoito. Produto im-
próprio para consumo. Dano configurado, ainda que o produto não tenha sido ingerido pelo
consumidor. Situação irregular do produto impróprio para consumo caracteriza potencial risco
à saúde do consumidor e provoca sentimentos de insegurança, vulnerabilidade e repugnância,
caracterizando danos morais passíveis de indenização. TJBA (Em. 77/172).............................. 356
— Dano moral. Discriminação racial. Alegação de ofensas proferidas. Ausência de comprovação
suficiente para a demonstração dos pressupostos ensejadores de danos morais. Ônus que lhe
incumbia diante do art. 333, I, do CPC. TJRS (Em. 77/164)..................................................... 354
— Dano moral. Inexistência de débito. Desconto indevido em conta-corrente. Ausência de
contratação com a editora. Inexistência de autorização do desconto em conta-corrente. Ato
ilícito. Dever de indenizar. TJRS (Em. 77/163).......................................................................... 353
— Dano moral. Nos casos de inscrição indevida em cadastros de proteção ao crédito, o dano
moral se configura in re ipsa, derivado inexoravelmente do fato danoso. TJSP (Em. 77/169)... 355
— Dano moral. Ofensas praticadas em campanha eleitoral. Críticas acirradas contra adversários
políticos que não extrapolam os limites da tolerância. Dever de indenizar refutado. TJCE (Em.
77/105)....................................................................................................................................... 330
— Dano moral. Suposta infidelidade. Ainda que a união estável imponha o dever de fidelidade
recíproca e de lealdade, a violação pura e simples de um dever jurídico familiar não é suficiente
para caracterizar o direito de indenizar. A prática de adultério, isoladamente, não se mostra
suficiente a gerar um dano moral indenizável, sendo necessário que a postura do cônjuge
infiel seja ostentada de forma pública, comprometendo a reputação, a imagem e a dignidade
do companheiro. TJES (Em. 77/180).......................................................................................... 358
— Dano moral e material. Acidente de trânsito. Motocicleta do pai e esposo das autoras que
colidiu na traseira do veículo de tração animal (carroça) do requerido, que trafegava sobre
a Rodovia Estadual SC-477. Falecimento do condutor da motocicleta. Previsibilidade da
ocorrência em razão da movimentação de veículos agrícolas no local. Culpa concorrente dos
envolvidos evidenciada. Dano moral suportado pelas autoras presumido em decorrência da
perda do pai e esposo (in re ipsa). Danos materiais decorrentes das despesas do funeral da
vítima. Pedido de fixação de pensão mensal. Dependência econômica da filha menor e da
esposa presumida. Pensão mensal devida no montante equivalente a 2/3 do salário mínimo.
Constituição de capital. TJSC (Em. 77/53)................................................................................. 309
— Dano moral e material. Demanda proposta contra médico e entidade hospitalar privada. Relação
de consumo. Responsabilidade pelo fato do serviço. Art. 14 do CDC. Responsabilidade do
hospital. Menor internado com infecção respiratória. Pediatra de sobreaviso. Acompanhamento
presencial realizado uma vez ao dia. Prescrição medicamentosa adequada. Estado de saúde que
não exigia atendimento diverso. Tratamento adequado. Remoção do menino para hospital de
outra cidade, durante a madrugada, após desentendimento dos familiares com o facultativo.
Iniciativa exclusiva dos pais. Encaminhamento corretamente realizado pelo médico. Desídia
ou negligência profissional. Inocorrência. TJRS (Em. 77/104).................................................. 329
— Dano moral e material. Erro médico. Parto. Uso de fórceps. Cesariana. Indicação. Não obser-
vância. Lesão no membro superior esquerdo. Médico contratado. Culpa configurada. Hospital.
Responsabilidade subjetiva. Ação de regresso. Procedência. Valor. Razoabilidade. STJ (Em.
77/107)....................................................................................................................................... 330
— Dano moral e material. Falha na prestação de serviço. Agência de turismo. Não configurado. É
de responsabilidade exclusiva da autoridade consular a concessão ou não do visto solicitado.
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 675

O serviço ora contratado constitui-se na assessoria à obtenção do visto, sendo considerado


efetivamente prestado independente do resultado final. TJES (Em. 77/106)............................. 330
— Desavença entre vizinhas. Animal de estimação com nome igual ao da vizinha. Dano moral
configurado. Valor indenizatório reduzido para R$ 300,00. TJAC (Em. 77/108)...................... 331
— Plano de saúde coletivo. Falecimento do titular. Cancelamento do plano com menos de um
mês da data do óbito. Dependente que, idosa, necessitou contratar novo plano no valor de
R$ 1.900,00 mensais. Cláusulas contratuais que preveem a manutenção do dependente por
cinco anos sem pagamento das mensalidades em caso de óbito e pagamento de seguro de
morte por acidente que não foram cumpridas pela parte ré. Reativação do plano com o prazo
de carência de cinco anos e devolução em dobro dos valores gastos, além do pagamento do
seguro e indenização por dano moral. Sentença de procedência. TJRJ (Em. 77/133)................ 340
— Serviço de internet. Bloqueio indevido. Caracterizados os danos morais pela falha na prestação
do serviço, cabível a indenização pretendida, acrescida de correção monetária pelo IGP-M,
a partir desta decisão, na forma da Súmula 362/STJ, e dos juros moratórios de 1% ao mês,
contados da citação, por se tratar de relação contratual. TJRS (Em. 77/54).............................. 310
— Transporte marítimo internacional de mercadorias. Cobrança de despesas de sobre-estadia,
ante a devolução de contêineres com atraso. Inaplicabilidade do CDC. Responsabilidade civil
contratual. Cômputo dos juros de mora a partir da data da citação, e não do vencimento da
obrigação. TJSP (Em. 77/99)...................................................................................................... 327
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
— Ação civil pública. Uso excessivo e imotivado de força policial. Comunidades quilombolas e
segmentos da sociedade civil. Dano moral coletivo. Cabimento. Na hipótese dos autos, com-
provados o nexo de causalidade e o evento danoso, resultante do uso injustificado de força
policial excessiva, por parte de agentes públicos do EMG, mediante a realização de prisão
ilegal, o uso indevido de algemas e a exposição de membros de comunidades quilombolas à
execração pública, com o intuito de intimidar e de inibir, à margem da lei, a sua atuação, na
defesa do exercício do seu direito à posse de terras, resta caracterizado o dano moral coletivo,
do que resulta o dever de indenizar, nos termos do referido dispositivo constitucional. TRF
1ª R. (Em. 77/37)........................................................................................................................ 301
— Cirurgia de laqueadura tubária. Posterior gravidez. Réu que não comprova o cumprimento
do dever de informar ao paciente sobre o risco do insucesso da cirurgia. Art. 37, § 6º, da CF.
Dano moral configurado. Comprometimento do planejamento familiar. Pensão mensal devida.
TJRJ (Em. 77/166)...................................................................................................................... 354
— Morte de mulher em cadeia pública durante visita íntima. Pretensão dos filhos ao percebimen-
to de pensão mensal. Descabimento. Inexistência de elementos que permitam concluir pela
falha no serviço público. Vítima que fazia visitas íntimas frequentes. Falta de provas de que
vítima e autor dos fatos estivessem sofrendo extorsão por parte do crime organizado. TJSP
(Em. 77/170).............................................................................................................................. 355
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO
— Acidente de trânsito. Ambulância. Esposa do autor que, transportada em citada ambulância,
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
veio a falecer. Indenização devida pelo dano moral caracterizado. Presunção de culpa do
motorista da ambulância, que bateu na parte traseira de caminhão que seguia à frente, reco-
nhecida. TJSP (Em. 77/171)....................................................................................................... 356
— Acidente de trânsito. Defeitos em via municipal. Ausência de sinalização. Óbito do companhei-
ro e pai dos autores. Responsabilidade caracterizada. Abalo moral. Pensão mensal. Dever de
indenizar. Dano moral in re ipsa. Pensão mensal devida à companheira e aos filhos menores.
Dependência econômica. Juros de mora. TJSC (Em. 77/145).................................................... 346
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
— Vide Execução Fiscal.

—S—
SEGURO DE VIDA
— Ação de cobrança. Cobertura para morte por acidente. Segurado que faleceu por queda do
avião que pilotava. Contrato de adesão. Aplicação do CDC que não impede a aplicação de
cláusulas limitativas de direito. Dever de serem redigidas de forma expressa e clara. Prévia
cientificação do consumidor comprovada. TJPR (Em. 77/47)................................................... 307
— Prestamista. Falecimento da consorciada. Ilegitimidade ativa dos herdeiros. Não se trata de
seguro de vida, mas de proteção financeira (prestamista), que tem por objetivo garantir a
quitação de uma dívida do segurado, no caso de sua morte ou invalidez ou até mesmo de-
676 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

semprego involuntário. O primeiro beneficiário deste tipo de seguro, até o limite da dívida,
será sempre a estipulante, ou seja, a administradora do consórcio. TJMG (Em. 77/175).......... 357
SEGURO DE VIDA EM GRUPO
— Empregadora mandatária. Seguro facultativo. Prescrição ânua. A ação de cobrança da segu-
radora contra a empregadora-estipulante relativa a prêmios não pagos de seguro de vida em
grupo sujeita-se ao prazo prescricional de 1 ano. STJ (Em. 77/176).......................................... 357
SENTENÇA
— Acórdão do TJSP – Cumprimento. Alienação pelo executado, de bens imóveis aos filhos após
o trânsito em julgado do acórdão que confirmou a sentença condenatória, reduzindo-o à
insolvência. Fraude à execução caracterizada. Exegese do Art. 593, II, do CPC. Imposição de
multa por ato atentatório à dignidade da justiça que atende ao preceito expresso e objetivo
do art. 600, I, do CPC. Penalidade mantida em 20% do valor atualizado do débito, dada a
gravidade da conduta do executado........................................................................................... 287
— Apelação. Recebida em seu duplo efeito. Impossibilidade de execução provisória. Art. 521
do CPC. Necessidade de extinção do procedimento executório e liberação dos valores blo-
queados. Em razão do efeito suspensivo atribuído ao apelo, nenhum ato de constrição pode
ser efetuado antes do julgamento, de forma que deve haver a suspensão do procedimento de
execução provisória. TJAL (Em. 77/70)..................................................................................... 316
— Cumprimento. Intimação do executado na pessoa de seu advogado. Necessidade. Multa do
art. 475-J do CPC. Descabida a imposição de multa automaticamente, apenas com a prolação
de despacho para cumprimento do acórdão. TJSP (Em. 77/101)............................................... 328
SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA
— Homologação. Matéria infraconstitucional. O STJ homologou sentença arbitral estrangeira
valendo-se da aplicação da legislação pertinente ao caso, qual seja a Lei 9.307/96 (Lei de
Arbitragem) e o CPC, não havendo que se cogitar de questões constitucionais. STF (Em.
77/138)....................................................................................................................................... 343
SENTENÇA MERAMENTE HOMOLOGATÓRIA
— Ação rescisória. Divergência doutrinária. Existência de duas correntes. Filio-me ao primeiro
entendimento, de que não cabe rescindendo na sentença meramente homologatória. Em res-
sunta, a sentença que se pretende rescindir é meramente homologatória do acordo celebrado
entre as partes, sem análise do mérito de direito material controvertido. Cabível a anulação
do ato realizado entre as partes (art. 486 do CPC), não a propositura de AR (art. 485 e seus
incisos), se o vício alegado se refere ao acordo, não à sentença. TJCE (Em. 77/80).................. 320
SERVIÇOS BANCÁRIOS
— ISS. LC 116/03. Taxatividade dos itens da lista anexa. Possibilidade de interpretação extensiva.
Serviços impugnados: tarifa interbancária. Inexistência de prestação de serviço contratual.
Contratação de operações ativas. ISSQN devido pela adequação ao item 15.08 da lista anexa
à LC 116/03. Adiantamento a depositantes. Imposto exigível com fundamento no item 15.08
da lista anexa à LC 116/03. Multa de 40%. Art. 26 da LC Municipal de Curitiba 40/01. Falta
de pagamento do tributo apurado em procedimento administrativo fiscal. Multa corretamente
aplicada. Efeito confiscatório. Vedação relacionada aos tributos, e não às penalidades pecuni-
árias. TJPR (Em. 77/115)............................................................................................................ 333
SIMPLES NACIONAL
— Adesão. ICMS. Adesão ao simples nacional que não afasta a exigência relativa à operação
interestadual. Art. 13, § 1º, XIII, g, da LC 123/06. Ofensa à anterioridade anual. Inocorrência.
STJ (Em. 77/139)........................................................................................................................ 343
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
— Contribuição para o PIS/Pasep. Gás liquefeito de petróleo. Ressarcimento. Prova. O ressarci-
mento da contribuição para o PIS paga sob o regime de substituição tributária, na aquisição
de gás liquefeito de petróleo, está condicionado à comprovação de que a contribuição fora
efetivamente apurada, retida e recolhida pelo substituto. CARF (Em. 77/100)......................... 328

—T—
TAXA PARA EMISSÃO DE ANOTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE TÉCNICA
— Acórdão do STF – Lei 6.994/82. Princípio da reserva legal. Fixação de valor máximo. Possui
repercussão geral a matéria alusiva à validade da exigência....................................................... 167
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 677

TOMBAMENTO
— Conjunto arquitetônico e paisagístico no Município de Santa Cruz Cabrália/BA. Construção
irregular. Pavimento superior. Descaracterização após o tombamento. Configuração. Laudos
técnicos. Poder Público. Ora, se o Poder Público, diante das circunstâncias concretas da lide,
não pudesse adotar as medidas consignadas na sentença recorrida, tal omissão esvaziaria a
eficácia do mencionado dispositivo constitucional e deixaria um flanco aberto para toda sorte
de vulneração ao postulado fundamental de preservação do patrimônio histórico e cultural
do país. TRF 1ª R. (Em. 77/36)................................................................................................... 301
TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL
— Cobrança de despesas de sobre-estadia, ante a devolução de contêineres com atraso. Inapli-
cabilidade do CDC. Responsabilidade civil contratual. Cômputo dos juros de mora a partir
da data da citação, e não do vencimento da obrigação. TJSP (Em. 77/99)................................. 327

—U—
UNIÃO ESTÁVEL
— Ação de reconhecimento e dissolução. Delimitação dos marcos estabelecidos na sentença.
Manutenção. Partilha de imóvel financiado. Valorização posterior. Meação que deve recair
sobre o valor obtido da subtração entre o saldo devedor junto à instituição financeira e o valor
de mercado do bem. TJSE (Em. 77/60)...................................................................................... 313
— Alienação de bem imóvel adquirido durante a constância da união estável. Outorga uxória.
Necessidade. Comunhão parcial de bens. Presunção absoluta. Art. 1.725 do CC/02. Direitos
patrimoniais da companheira. Art. 226 da CF/88. Terceiro de boa-fé. Direito à indenização.
Deve-se suspender a imissão na posse determinada pelo juízo a quo em face da ausência de
autorização expressa da agravante para a alienação do bem objeto da lide, resguardando-se
ao terceiro de boa-fé o direito que lhe assiste de pleitear eventual indenização por danos que
tenha sofrido. TJAL (Em. 77/140).............................................................................................. 344
— Companheiro casado. Impedimento legal e insuficiência probatória. Embora o relacionamento
afetivo do casal tenha perdurado ao longo de 35 anos, com dois filhos, a autora sempre se
manteve residindo na casa de seus pais, e lá mantinha seus encontros com o agora de cujus.
Jamais, portanto, mantiveram vida em comum sob o mesmo teto. Assim, afora o impeditivo
legal à caracterização da união estável – decorrente da constância do casamento do varão –,
a ausência do intuito de constituir família (pois a autora permaneceu sempre residindo com
os pais), não se vê como configurada entidade familiar entre o casal. TJRS (Em. 77/181)........ 359
— Dano moral. Suposta infidelidade. Ainda que a união estável imponha o dever de fidelidade
recíproca e de lealdade, a violação pura e simples de um dever jurídico familiar não é suficiente
para caracterizar o direito de indenizar. A prática de adultério, isoladamente, não se mostra
suficiente a gerar um dano moral indenizável, sendo necessário que a postura do cônjuge
infiel seja ostentada de forma pública, comprometendo a reputação, a imagem e a dignidade
do companheiro. TJES (Em. 77/180).......................................................................................... 358
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Medida protetiva. Afastamento do lar. Discussão de propriedade do imóvel. Via inadequada.
Decisão interlocutória que manteve o cônjuge virago na residência do casal. Dúvida acerca
da união estável. Matéria de competência do juízo cível. Capacidade econômica do cônjuge
varão bem superior à do cônjuge virago. TJES (Em. 77/119).................................................... 335
UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM
— Ação de reconhecimento e dissolução. União estável evidenciada. Regime de bens aplicável.
Reconhecida a união estável, deve ser observado o regime de comunhão parcial de bens, nos
termos do art. 1.725 do CC. TJGO (Em. 77/59)........................................................................ 313
— Arrolamento de bem. Decisão que determinou a inclusão da agravada como herdeira para
lhe atribuir o equivalente a 2/3 da herança, caso comprovada a condição de irmã do de cujus.
Insurgência da agravante, companheira do de cujus. Tendo o de cujus deixado uma irmã, cabe à
agravante apenas 1/3 da herança, além do direito à meação sobre o imóvel, como corretamente
decidiu a decisão agravada. TJSP (Em. 77/88)........................................................................... 323
UNIÃO HOMOAFETIVA
— Artigo de Brenda Bandoli Vieira, Helber Campos de Oliveira, Carlos Henrique Medeiros de
Souza e Margareth Vetis Zaganelli: “Útero Sub-Rogado nas Uniões Homoafetivas”.................. 114
UNIÃO HOMOAFETIVA: ÚTERO SUB-ROGADO NAS UNIÕES HOMOAFETIVAS
— Artigo de Brenda Bandoli Vieira, Helber Campos de Oliveira, Carlos Henrique Medeiros de
Souza e Margareth Vetis Zaganelli.............................................................................................. 114
678 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

USO E OCUPAÇÃO DO SOLO


— Ação civil pública. Obras de infraestrutura em loteamento. Liminar que determina a adoção
de medidas para cessar o risco de desabamento em área de risco. Recurso que tenta afastar a
responsabilidade do Município de Manaus. Art. 30, VIII, da CF/88. Impossibilidade. Hipótese
de responsabilidade solidária dos entes públicos municipal e estadual. Liminar que deve ser
mantida. Multa diária ao ente municipal por descumprimento da decisão. Possibilidade. TJAM
(Em. 77/29)................................................................................................................................ 297
— Ação civil pública. Parcelamento do solo urbano. Regularização de loteamento privado. Res-
ponsabilidade subsidiária do município. Art. 40 da Lei 6.766/79. Procedimento facultativo. É
facultativo o procedimento previsto no art. 40 da Lei 6.766/79, o qual possibilita ao município
o ressarcimento dos custos financeiros pela realização de obras de infraestrutura em loteamento
privado irregular, quando o loteador não as realiza. É subsidiária a responsabilidade do ente
municipal pelas obras de infraestrutura necessárias à regularização de loteamento privado,
quando ainda é possível cobrar do loteador o cumprimento de suas obrigações. STJ (Em.
77/31)......................................................................................................................................... 298
— Ação civil pública. Proteção de faixa marginal de curso d’água, na qualidade de área de pre-
servação permanente. Decisão interlocutória que deferiu parcialmente as medidas de urgência
postuladas pelo parquet. Característica própria dos cursos d’água intermitentes, cujas margens
são APP. Art. 4º, I, da Lei 12.651/2012. Ausência, ademais, de licenças ambientais. Incidência
dos princípios da prevenção e da precaução. Prevalência da proteção ambiental no caso de
incerteza técnica. Paralisação das obras. Medida necessária à conservação do aventado curso
d’água e sua respectiva APP. Publicidade à demanda por meio de averbação na matrícula do
imóvel e colocação de placa indicativa no local. Suficiência da averbação. TJSC (Em. 77/40).. 304
USUCAPIÃO
— Acórdão do STJ – Imóvel rural. Função social da propriedade. Módulo rural. Área mínima
necessária ao aproveitamento econômico do imóvel. Previsão de área máxima a ser usucapida.
Inexistência de previsão legal de área mínima............................................................................ 196
USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA
— Oposição do Município. Metragem do imóvel inferior à previsão da lei municipal. Irrelevância.
A função social da propriedade supera a questão da legislação infraconstitucional a respeito
do zoneamento e parcelamento do solo. TJPR (Em. 77/182)..................................................... 359
ÚTERO SUB-ROGADO NAS UNIÕES HOMOAFETIVAS
— Artigo de Brenda Bandoli Vieira, Helber Campos de Oliveira, Carlos Henrique Medeiros de
Souza e Margareth Vetis Zaganelli.............................................................................................. 114

—V—
VEÍCULO
— Acórdão do TJDF – Penhora. Bem essencial ao exercício da atividade profissional. Nos termos
do art. 649, V, do CPC, são absolutamente impenhoráveis os livros, as máquinas, as ferramen-
tas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de
qualquer profissão...................................................................................................................... 276
VICTOR HUGO MARCÃO CRESPO
— Artigo: “Considerações sobre o Regime de Cobrança Administrativa Especial da Portaria RFB
nº 1.265/2015”............................................................................................................................ 158

II – MATÉRIA CRIMINAL
—A—
A DUALIDADE HAVIDA (A VIDA): SERIA O ABORTO QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA
OU DE POLÍTICA CRIMINAL?
— Artigo de Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso............................................................... 361
A VÍTIMA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO
— Artigo de Rômulo de Andrade Moreira...................................................................................... 368
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 679

ABANDONO DE POSTO
— Autoria e materialidade comprovadas. Crime de mera conduta. O crime tipificado no art. 195
do CPM, por ser de mera conduta e de perigo presumido, consuma-se instantaneamente com
a saída do agente. STM (Em. 77/208)......................................................................................... 580
ABORTO
— Artigo de Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso: “A Dualidade Havida (a Vida): Seria o
Aborto Questão de Saúde Pública ou de Política Criminal?”..................................................... 361
ABSOLVIÇÃO
— Estupro de vulnerável. Ausência de comprovação da deficiência mental da vítima compro-
metedora do discernimento para o ato. Vulnerabilidade relativa. In dubio pro reo. TJAP (Em.
77/232)....................................................................................................................................... 593
— Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios.
Aplicação a terceiros, por profissionais da medicina, da toxina fine tox. Inexistência de registro
pela Anvisa. Produto de origem estrangeira. Art. 109, IV, da CF. Súmula 122/STJ. Competência
da Justiça Federal. Não demonstração de que tal produto tem, em tese, aptidão para provocar
prejuízo à saúde humana. Ausência de tipicidade. Mesmo em se tratando de crime de perigo
abstrato o delito tipificado no art. 273, §§ 1º e 2º, do CP, a sua configuração não se manifesta
pela só ausência de registro do medicamento na Anvisa, havendo, igualmente, a necessidade
da demonstração de uma probabilidade de lesão, por mínima que seja, isto é, que o produto
em causa seja idôneo, em tese, para ofender o bem jurídico tutelado pelo ordenamento, con-
sistente na saúde humana. TRF 5ª R. (Em. 77/209)................................................................... 581
— Injúria real. Crime militar. Elemento subjetivo do dolo não comprovado. No caso, o Sargento
ordenou a submersão de soldado em cocho destinado à hidratação de equinos, em razão de o
militar não ter cumprido ordem de serviço a contento. O crime de injúria real, para sua con-
figuração, pressupõe a índole, o dolo, a intenção de aviltar e denegrir a imagem do ofendido.
Elemento subjetivo do tipo não configurado nos presentes autos, impondo-se a manutenção
do decreto absolutório. STM (Em. 77/248)................................................................................ 600
— Lesão corporal qualificada. Versão acusatória não corroborada pelos elementos de prova
produzidos nos autos. Não passando de mera suspeita a imputação do crime ao acusado, não
tendo o MP se desincumbido de provar o excesso do réu ao repelir a agressão injusta praticada
pela vítima, tudo comprovando tratar-se de ato praticado em legítima defesa, a manutenção
da absolvição é medida de rigor, na forma do art. 386, VI, do CPP. TJMG (Em. 77/256).......... 604
— Tóxicos. Tráfico. Absolvição e desclassificação mantidas. Não demonstrada autoria e mate-
rialidade da traficância, impõe-se a absolvição. Evidenciada a posse para uso, imperiosa a
desclassificação, de ofício, e a manutenção quanto ao corréu. TJGO (Em. 77/287).................. 615
— Violação de direito autoral. Falsificação, adulteração ou alteração de produtos destinados a
fins terapéuticos ou medicinais previstos nos arts. 184, § 2º, e 273, § 1º-B, I, na forma do art.
69, todos do CP. Julgado parcialmente procedente os pedidos contidos na denuncia para con-
denar os réus Paulo Cesar e Ana Paula na forma da denuncia e o réu Carlos Alberto somente
pelo delito previsto no art. 184, § 2º, do CP, absolvendo-o do delito previsto no art. 273, §
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
1º, do CP por precariedade de prova. Mandados de busca e apreensão cumpridos de forma
ilegítima e sem a observância das normas legais. Violação ao art. 564, IV, do CPP. Absolvição
que se impõe, igualmente ante a ausência de lesão ao bem jurídico tutelado quanto ao delito
previsto no art. 273 do CP e com relação ao art. 184, § 2º, do CP a absolvição se impõe, uma
vez que a denuncia não identificou os lesados cujas obras tiveram o direito autoral violado.
Atipicidade da conduta que se reconhece. TJRJ (Em. 77/298)................................................... 619
— Violação de direito autoral. Necessidade. Para comprovar a materialidade do delito descrito
no art. 184, § 2º, do CP, o expert não pode se limitar ao exame externo dos CDs e DVDs arre-
cadados, pois, ainda que se verifique uma falsidade, a violação dos direitos do autor somente
se configura com a certeza de que houve reprodução de alguma obra, ou seja, que existe uma
gravação não autorizada. TJMG (Em. 77/304)........................................................................... 622
— Violação de direito autoral. Venda de CDs e DVDs falsificados (art. 184, § 2º, do CP). Mate-
rialidade delitiva não demonstrada. Laudo pericial lacunoso. TJSP (Em. 77/297).................... 619
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA
— Resposta à acusação. Ausência de fundamentação. Nulidade. Ocorrência. Compreende esta
Turma que o constitucional dever de motivação exige que seja a denegação da absolvição
sumária fundamentada, ainda que concisamente, apreciando as teses relevantes e urgentes
apresentadas na resposta à acusação, consignando mesmo aquelas dependentes de instrução
essa condição. STJ (Em. 77/291)................................................................................................ 617
680 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

— Tóxicos. Tráfico. Absolvição e desclassificação mantidas. Não demonstrada autoria e mate-


rialidade da traficância, impõe-se a absolvição. Evidenciada a posse para uso, imperiosa a
desclassificação, de ofício, e a manutenção quanto ao corréu. TJGO (Em. 77/287).................. 615
AÇÃO PENAL
— Trancamento da ação penal em sede de HC. Possibilidade. Ausência de justa causa e inépcia
da exordial acusatória. STJ (Em. 77/220)................................................................................... 586
ACORDO DE LENIÊNCIA E SEUS REFLEXOS PENAIS
— Artigo de Flávio Augusto Maretti Sgrilli Siqueira....................................................................... 408
ANTECEDENTES CRIMINAIS
— Acórdão do STJ – Sentença com trânsito em julgado há mais de cinco anos. Configuração de
maus antecedentes. Possibilidade. Embora não possa ser utilizada para configurar a reinci-
dência (art. 64, I, do CP), pode ser considerada como maus antecedentes............................... 511
APREENSÃO DE EQUIPAMENTOS
— Radiodifusão. Rádio comunitária. Funcionamento sem autorização. Busca e apreensão. Via
adequada. Ordem judicial. Possibilidade. Imóvel comercial que não se enquadra na definição
de casa do art. 150 do CP. TRF 1ª R. (Em. 77/212).................................................................... 582
ARMA DE FOGO
— Porte ilegal. Configurado o porte ilegal de arma, impossível absolvição ou desclassificação.
Não comprovado o porte de arma quanto ao corréu, impositiva a absolvição, de ofício. Se
preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, aplica-se a substituição por restritiva de direitos,
de ofício. TJGO (Em. 77/287).................................................................................................... 615
ASSUNÇÃO DE OBRIGAÇÃO NO ÚLTIMO ANO DO MANDATO
— Prefeito municipal. Crime contra as finanças públicas. Art. 359-C do CP. Complementação
da resposta escrita fora do prazo legal. Inviabilidade. Denúncia recebida. TJRS (Em. 77/204). 579
ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR
— Tentativa. Reconhecida a forma tentada do delito de atentado violento ao pudor, reduzindo-
se a pena em 1/3. Pena. Dosimetria. Pena-base. Reduzida a pena-base para o mínimo legal.
Reincidência. Inocorrente a reincidência, posto que não caracterizada, afastando-se o au-
mento pertinente à agravante. Regime carcerário. O regime carcerário é o aberto. TJRS (Em.
77/210)....................................................................................................................................... 582

—C—
CALÚNIA, DIFAMAÇÃO E INJÚRIA
— Declarações proferidas em ambiente eleitoral e para fins de propaganda eleitoral. Emendatio
libelli. Desclassificação. Ilegitimidade ativa ad causam não reconhecida. Mérito favorável ao
acusado. Incidência do princípio do favor rei. Figuras públicas. Declarações tematicamente
pertinentes à dialética eleitoral. Atipicidade de conduta. Rejeição da queixa-crime. STF (Em.
77/213)....................................................................................................................................... 583
— Imputação ofensiva à reputação da vítima. Propagação em rede nacional. Crime continuado.
Divulgação em território de diversas jurisdições. Fixação pela prevenção. Competência do
juízo suscitado. TJAP (Em. 77/217)........................................................................................... 584
CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL – AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO E
COMPETÊNCIA CRIMINAL
— Artigo de Gustavo Filipe Barbosa Garcia.................................................................................... 428
CERCEAMENTO DE DEFESA
— Prova oral gravada em meio audiovisual. Apelação. Ministério Público. Pedido de conversão
em diligência para degravação. Indeferimento pelo Tribunal de Justiça. Não se verifica cer-
ceamento de defesa no indeferimento do pleito formulado pela Procuradoria de Justiça, de
conversão do julgamento em diligência, para degravação de prova oral, consoante se extrai
do art. 405, § 2º, do CPP, segundo o qual os registros por meio audiovisual não requerem a
respectiva transcrição. STJ (Em. 77/274)................................................................................... 609
COISA JULGADA
— Artigo de Marcellus Polastri Lima e Marciley Boldrini: “Reflexões e Particularidades sobre a
Preclusão, a Coisa Julgada e o Chamado ‘Trânsito em Julgado’ Penal”...................................... 446
COMPETÊNCIA
— Artigo de Gustavo Filipe Barbosa Garcia: “Carteira de Trabalho e Previdência Social – Ausência
de Anotação e Competência Criminal”...................................................................................... 428
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 681

— Crime ambiental. Defensivos agrícolas. Assentamento. Área de responsabilidade do INCRA.


Ausência de interesse direto. Vítimas particulares. Competência do juízo suscitado. STJ (Em.
77/216)....................................................................................................................................... 584
— Imputação ofensiva à reputação da vítima. Propagação em rede nacional. Crime continuado.
Divulgação em território de diversas jurisdições. Fixação pela prevenção. Competência do
juízo suscitado. TJAP (Em. 77/217)........................................................................................... 584
— Violência doméstica. Incidência da Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) não configurada.
Violência baseada no gênero. Relação de superioridade do agressor e inferioridade da vítima.
Inocorrência. Competência da Quarta Vara Criminal da Capital (juízo suscitante), para pro-
cessamento e julgamento do feito. TJAM (Em. 77/218)............................................................. 585
CONDUÇÃO COERCITIVA EM CPI: A LEGALIDADE DA CONDUÇÃO COERCITIVA DE
TESTEMUNHA, DETERMINADA POR COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO
— Artigo de Renato Marcão e Rodrigo Tanamati............................................................................ 464
CONFISSÃO ESPONTÂNEA
— Pena. Júri. Homicídio qualificado. Motivo torpe e recurso que impossibilita a defesa da ví-
tima. Irresignação quanto à sanção penal aplicada. Circunstâncias judiciais. Culpabilidade
e consequências do crime. Fundamentação inidônea. Pena-base reformada. Afastamento de
agravante. Alegação de ausência de motivação fútil. Não acolhimento. Elementos probatórios
justificadores da manutenção. Preponderância. Participação de menor importância. Art. 29, §
1º, do CP. Ausência de alegação no momento oportuno. Art. 483, § 3º, do CPP. Impossibilidade
de análise nesta via recursal, sob pena de supressão de instância. Reformulação da dosimetria.
TJAL (Em. 77/253)..................................................................................................................... 602
CONTRABANDO
— Prisão preventiva. Revogação. Contrabando de cigarros e quadrilha. Denúncia. Corrupção
ativa. Investigação. Superveniente recebimento da denúncia. Fumus boni iuris. Configuração.
Periculum in libertatis. Não constatação. Cautelas alternativas à prisão. Medidas suficientes.
Prisão revogada. Imposição de fiança e lavratura de termo de compromisso. Ordem concedida.
TRF 2ª R. (Em. 77/219).............................................................................................................. 585
CRIME AMBIENTAL
— Competência. Defensivos agrícolas. Assentamento. Área de responsabilidade do INCRA.
Ausência de interesse direto. Vítimas particulares. Competência do juízo suscitado. STJ (Em.
77/216)....................................................................................................................................... 584
— Denúncia. Art. 41 da Lei 9.605/98. Elementar do tipo. Mata ou floresta. Ausência de justa causa
e inépcia da exordial acusatória. Trancamento da ação penal em sede de HC. Possibilidade.
Sabe-se que, para a configuração do crime previsto no art. 41 da Lei 9.605/98, é necessário
que a área queimada corresponda aos conceitos de “mata” e “floresta”, tratando-se, pois, de
uma norma penal em branco que exige complementação para fins de penalização da conduta
ali descrita, a qual também não foi mencionada pelo Parquet. STJ (Em. 77/220)...................... 586
— Denúncia. Paciente que não adotou medidas para criação de aterro sanitário quando prefeita
do município. Trancamento da ação penal. Atipicidade da conduta e ilegitimidade passiva.
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
Inocorrência. A denúncia responsabiliza a acusada por ato omissivo ocorrido durante o seu
mandato como chefe do Poder Executivo municipal, ou seja, quando era de sua responsa-
bilidade zelar pela proteção do meio ambiente e da saúde pública no município. STJ (Em.
77/221)....................................................................................................................................... 586
CRIME CONTRA AS TELECOMUNICAÇÕES
— Vide Rádio Comunitária. Princípio da Insignificância.
CRIME DE RESPONSABILIDADE
— Prefeito municipal. Crime contra as finanças públicas. Assunção de obrigação no último
ano do mandato. Art. 359-C do CP. Complementação da resposta escrita fora do prazo legal.
Inviabilidade. Denúncia recebida. TJRS (Em. 77/204)............................................................... 579
— Prefeito municipal. Não apresentação de contas municipais (art. 1º, VII, do DL 201/67).
Denúncia recebida, com rejeição do pedido de diligências formulado pelo MP. TJPI (Em.
77/205)....................................................................................................................................... 579
CRIME MILITAR
— Abandono de posto. Autoria e materialidade comprovadas. Crime de mera conduta. O crime
tipificado no art. 195 do CPM, por ser de mera conduta e de perigo presumido, consuma-se
instantaneamente com a saída do agente. STM (Em. 77/208).................................................... 580
— Acórdão do STM – Furto. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Teoria da amotio ou
apprehensio. Crime consumado. Devolução da res furtiva. Desclassificação da conduta. Inca-
682 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

bível. A devolução imediatamente após o ocorrido, por si só, não autoriza a desclassificação
da conduta delitiva, mas faculta ao Juiz a redução da pena........................................................ 519
— Fuga após acidente de trânsito. Rejeição de denúncia. Desconstituição da decisão de primeiro
grau. Princípio do in dubio pro societate. Na fase preliminar, de recebimento da exordial, cabe
ao Juiz apenas verificar se foram preenchidos os requisitos exigidos pelos arts. 77 e 78 do
CPPM. Denúncia que se encontra revestida das formalidades legais. STM (Em. 77/237)......... 595
— Fuga de preso. Forma culposa. Delito delineado e provado. Provimento do apelo do MPM.
Art. 179 do COM. Declaração da extinção da punibilidade do acusado, em face da ocorrência
da prescrição da pretensão punitiva estatal, com base na pena concretizada na decisão. STM
(Em. 77/238).............................................................................................................................. 596
— Furto de uso. Conduta moldada na apropriação temporária de arma com devolução em ato
contínuo. Materialidade e autoria confessadas no interrogatório. Acervo probatório harmônico.
Desclassificação para o crime de furto de uso por adequação ao tipo do art. 241 do CPM. STM
(Em. 77/260).............................................................................................................................. 605
— Furto de uso de ambulância. Condenação. Prestação de serviço à comunidade durante o
período de prova do sursis. Impossibilidade. STM (Em. 77/208)............................................... 580
— Furto de uso de armamento. Absolvição. É indispensável que o sujeito ativo tenha subtraído
a coisa daquele que lhe tinha a posse ou a propriedade, retirando-a, sub-repticiamente, de
sua esfera de vigilância e disponibilidade. STM (Em. 77/208)................................................... 580
— Injúria real. Elemento subjetivo do dolo não comprovado. Absolvição. No caso, o Sargento
ordenou a submersão de soldado em cocho destinado à hidratação de equinos, em razão de o
militar não ter cumprido ordem de serviço a contento. O crime de injúria real, para sua con-
figuração, pressupõe a índole, o dolo, a intenção de aviltar e denegrir a imagem do ofendido.
Elemento subjetivo do tipo não configurado nos presentes autos, impondo-se a manutenção
do decreto absolutório. STM (Em. 77/248)................................................................................ 600
— Patrocínio indébito. Art. 334 do CPM. Materialidade do delito. Indícios de autoria demons-
trados. Princípio do in dubio pro societate. Existindo prova de fato que constitua crime e
indícios de quem o cometera, deve ser apresentada a denúncia, conforme determina o art. 30
do CPPM. STM (Em. 77/279)..................................................................................................... 612
— Recusa de obediência. Militar previamente designado em escala de serviço. Ordem emanada
de superior hierárquico. Negativa de realizar as funções de sargento de dia. Assunto afetado
ao serviço da caserna. Infração ao preceito incriminador do art. 163 do CPM. Sentença con-
denatória mantida. STM (Em. 77/207)....................................................................................... 580
— Tóxicos. Adequação ao tipo legal previsto no art. 290, caput, do CPM, na modalidade “trazer
consigo”. Réu confesso. Impossibilidade de aplicação dos princípios da insignificância e da
proporcionalidade. Não incidência da Lei 11.343/06. STM (Em. 77/258)................................. 604

—D—
DA CRIMINALIZAÇÃO REGULAMENTAR EM MATÉRIA DE EFLUENTES AMBIENTAIS
— Artigo de Magno Federici Gomes e Fernando Marques Khaddour............................................ 434
DANO AO PATRIMÔNIO E APOLOGIA À FACÇÃO CRIMINOSA
— Autoria e materialidade comprovadas. Prova segura com base no relato dos agentes de segurança
penitenciária e confissão do sentenciado. Danos caracterizados por registros fotográficos, ade-
mais. Perda de 1/3 dos dias remidos. Compatibilidade com as circunstâncias do caso concreto.
Falta disciplinar que constitui marco interruptivo de benefício. TJSP (Em. 77/236)................ 595
DEFESA PRELIMINAR DEFICITÁRIA
— Prejuízo não demonstrado. Art. 563 do CPP. Súmula 523/STF. Inexistência de nulidade. STF
(Em. 77/243).............................................................................................................................. 598
DENÚNCIA
— Ação penal. Diplomação do acusado como deputado federal subsequente ao recebimento da
denúncia no primeiro grau. Imputação do crime previsto no art. 316 do CP. Inexistência de
quaisquer das hipóteses arroladas no art. 397 do CPP. Regular prosseguimento da ação penal.
Pedidos de rejeição da denúncia e de absolvição sumária do acusado indeferidos. STF (Em.
77/203)....................................................................................................................................... 579
— Contra deputado federal. Crime de falsidade ideológica eleitoral, art. 350 do Código Eleito-
ral. Posterior pedido de desclassificação para o crime do art. 299 do CP. Alegada omissão de
informações na prestação de contas eleitorais. Afastamento das preliminares de prescrição
em perspectiva e inépcia da denúncia. Alegada falta de justa causa para o prosseguimento da
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 683

ação penal. Acolhimento. Ausência de indícios suficientes de autoria e materialidade delitivas.


Rejeição da denúncia. STF (Em. 77/249)................................................................................... 600
— Contrabando de cigarros e quadrilha. Corrupção ativa. Investigação. Prisão preventiva. Super-
veniente recebimento da denúncia. Fumus boni iuris. Configuração. Periculum in libertatis. Não
constatação. Cautelas alternativas à prisão. Medidas suficientes. Prisão revogada. Imposição
de fiança e lavratura de termo de compromisso. Ordem concedida. TRF 2ª R. (Em. 77/219)... 585
— Crime ambiental. Art. 41 da Lei 9.605/98. Elementar do tipo. Mata ou floresta. Ausência
de justa causa e inépcia da exordial acusatória. Trancamento da ação penal em sede de HC.
Possibilidade. Sabe-se que, para a configuração do crime previsto no art. 41 da Lei 9.605/98,
é necessário que a área queimada corresponda aos conceitos de “mata” e “floresta”, tratando-
se, pois, de uma norma penal em branco que exige complementação para fins de penalização
da conduta ali descrita, a qual também não foi mencionada pelo Parquet. STJ (Em. 77/220)... 586
— Crime ambiental. Paciente que não adotou medidas para criação de aterro sanitário quando
prefeita do município. Trancamento da ação penal. Atipicidade da conduta e ilegitimidade
passiva. Inocorrência. A denúncia responsabiliza a acusada por ato omissivo ocorrido du-
rante o seu mandato como chefe do Poder Executivo municipal, ou seja, quando era de sua
responsabilidade zelar pela proteção do meio ambiente e da saúde pública no município. STJ
(Em. 77/221).............................................................................................................................. 586
— Crime de falsidade ideológica em prestação de contas de campanha. Prejudicial. Prescrição
pela pena em abstrato. Inocorrência. Natureza pública, e não privada, do documento. Pre-
cedentes. Mérito. Crime de captação ilícita de sufrágio. Pedido de arquivamento formulado
pelo Procurador-Geral da República. Acolhimento. Delito de falsidade ideológica. Ausente
demonstração mínima do elemento subjetivo especial do tipo do art. 299 do CP. Irrelevância
dos equívocos no conjunto da prestação de contas, que não comprometem seu resultado. Vio-
lação da proporcionalidade na caracterização das incorreções como fato criminoso. Ausência
de dolo. Negligência não punível. Denúncia rejeitada. STF (Em. 77/224)................................ 588
— Crime de falsidade ideológica em prestação de contas eleitoral. Prejudicial. Prescrição pela
pena em abstrato. Inocorrência. Natureza pública, e não privada, do documento. Omissão de
informação com fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Narrativa fática
obediente ao disposto no art. 41 do CPP. Demonstração mínima da prática da conduta e do
especial fim de agir. Existência de justa causa para o início da ação penal. Denúncia recebida
contra os acusados Paulo Salim Maluf e Sérgio Stefanelli Gomes. STF (Em. 77/250)............... 600
— Crime militar. Fuga após acidente de trânsito. Princípio do in dubio pro societate. Na fase
preliminar de recebimento da exordial cabe ao Juiz apenas verificar se foram preenchidos
os requisitos exigidos pelos arts. 77 e 78 do CPPM. Denúncia que se encontra revestida das
formalidades legais. STM (Em. 77/237)..................................................................................... 595
— Inépcia. Não ocorrência. Nulidade rejeitada. Prova ilícita. Denúncia baseada em diversos outros
meios de prova. Recebimento da exordial. Resposta à acusação. Ausência de fundamentação.
Nulidade. Ocorrência. Compreende esta Turma que o constitucional dever de motivação
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
exige que seja a denegação da absolvição sumária fundamentada, ainda que concisamente,
apreciando as teses relevantes e urgentes apresentadas na resposta à acusação, consignando
mesmo aquelas dependentes de instrução essa condição. STJ (Em. 77/291)............................. 617
— Prefeito municipal. Crime contra as finanças públicas. Assunção de obrigação no último
ano do mandato. Art. 359-C do CP. Complementação da resposta escrita fora do prazo legal.
Inviabilidade. Denúncia recebida. TJRS (Em. 77/204)............................................................... 579
— Prefeito municipal. Crime de responsabilidade. Não apresentação de contas municipais (art.
1º, VII, do DL 201/67). Denúncia recebida, com rejeição do pedido de diligências formulado
pelo MP. TJPI (Em. 77/205)........................................................................................................ 579
— Rejeição. Embriaguez ao volante. Denúncia rejeitada sob o fundamento de ausência de justa
causa necessária à propositura da ação penal. A peça de denúncia em nenhum momento trouxe
como ponto válido a ocorrência de um perigo concreto, pautando-se nesse contexto fático a
assertiva de uma evidente ausência de justa causa. Ademais, o bafômetro não mede o nível de
álcool no sangue, mas, sim, o metabolismo do álcool nos pulmões, o que, por si só, já vai de
encontro ao princípio da legalidade. Tal afirmação é corroborada por especialistas no assunto.
O teste do bafômetro, isoladamente, não é suficiente para determinar a embriaguez, porque
este teste mede o produto de transformação do álcool, sem o álcool estar presente, ainda”. O
citado professor esclarece também que “o jejum prolongado ou o diabetes não tratado podem
dar positividade no teste do bafômetro”. TJRJ (Em. 77/278)..................................................... 611
684 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

DENÚNCIA GENÉRICA
— Acórdão do STF – Inépcia. Inocorrência. Delito societário. Crime de autoria coletiva. Obser-
vância do art. 41 do CPP. Suficiente descrição do fato tido como criminoso. Poder de gestão
na pessoa jurídica. Há diferença entre denúncia genérica e geral. Enquanto naquela se aponta
fato incerto e imprecisamente descrito, na última há acusação da prática de fato específico
atribuído a diversas pessoas, ligadas por circunstâncias comuns, mas sem a indicação minu-
dente da responsabilidade interna e individual dos imputados.................................................. 469
DESACATO
— Induvidosa existência e autoria da infração imputada a denunciado que, abordado, veio irrogar
ofensas aos policiais militares. TJRS (Em. 77/227)..................................................................... 590
DESAFORAMENTO
— Júri. Dúvida quanto à parcialidade dos jurados configurada. Preterição das comarcas mais
próximas. Possibilidade. STJ (Em. 77/245)................................................................................ 599
DESCAMINHO
— Acórdão do TRF 3ª R. – Princípio da insignificância. Aplicabilidade. Existência de outros
processos penais anteriormente ajuizados, bem como habitualidade extraída de autuações
fiscais. Irrelevância...................................................................................................................... 539
DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME
— Furto qualificado. Desclassificação do furto consumado para tentado. Viabilidade. Redução da
pena imposta. Cabível. Alteração do cumprimento de pena. O crime de furto não se consuma
se a res furtiva não chega a sair da esfera de vigilância do dono, impondo-se a desclassificação
do delito de furto consumado para a sua forma tentada. TJPE (Em. 77/239)............................ 596
— Latrocínio. Participação na morte da vítima. Prova fulcrada exclusivamente nos elementos
informativos colhidos na fase da informatio delicti. Insuficiência para a condenação. Ausência
de provas judicializadas. Desclassificação da conduta para o crime de furto. Imperatividade.
TJMG (Em. 77/254).................................................................................................................... 603
— Lesão corporal qualificada. Deformidade permanente. Júri. Desclassificação. Decisão mani-
festamente contrária à prova dos autos. Inexistência. Lastro probatório suficiente. Soberania
dos veredictos. Erro ou injustiça na dosimetria. Pena privativa de liberdade reduzida. Sanção
pecuniária não prevista no tipo. Abstrações, expressões genéricas e dados integrantes da
própria conduta típica são inidôneos para exasperar a pena-base. TJPB (Em. 77/257)............. 604
DIREÇÃO INABILITADA DE VEÍCULO
— Acórdão do STF – Permitir ou entregar direção de veículo automotor a pessoa não habilitada.
Crime de perigo abstrato. Prescindibilidade do resultado naturalístico..................................... 491

—E—
EMBARGOS INFRINGENTES
— Ação penal originária. Necessidade de que haja, pelo menos, quatro “votos divergentes”
favoráveis ao réu e, assim mesmo, convergentes no sentido de sua absolvição. Inocorrência,
na espécie, de tal situação. Os EI do julgado proferido pelo STF em sede de processo penal
originário ainda subsistem em nosso ordenamento positivo, eis que a norma inscrita no art.
333, I, do RISTF foi recebida pela vigente CR com força e eficácia de lei. Distinção necessária,
para os fins do parágrafo único do art. 333 do RISTF, entre votos minoritários de conteúdo
absolutório em sentido próprio e aqueles que meramente declaram consumada a prescrição
penal. STF (Em. 77/225)............................................................................................................ 589
— Tóxicos. Tráfico de drogas minorado. Abrandamento do regime prisional e modificação das
penas restritivas de direitos. Necessidade. Embargos acolhidos. Tendo as penas dos réus
sido fixadas no mínimo legal e reduzidas na fração máxima prevista no art. 33, § 4º, da Lei
11.343/06, sendo a reprimenda privativa de liberdade substituída por restritivas de direitos,
imperiosa a mitigação do regime carcerário para o semiaberto, em observância ao art. 33, §
3º, do CP. TJMG (Em. 77/226)................................................................................................... 590
EMBRIAGUEZ AO VOLANTE
— Denúncia rejeitada sob o fundamento de ausência de justa causa necessária à propositura da
ação penal. A peça de denúncia em nenhum momento trouxe como ponto válido a ocorrên-
cia de um perigo concreto, pautando-se nesse contexto fático a assertiva de uma evidente
ausência de justa causa. Ademais, o bafômetro não mede o nível de álcool no sangue, mas,
sim, o metabolismo do álcool nos pulmões, o que, por si só, já vai de encontro ao princípio
da legalidade. Tal afirmação é corroborada por especialistas no assunto. O teste do bafômetro,
isoladamente, não é suficiente para determinar a embriaguez, porque este teste mede o produto
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 685

de transformação do álcool, sem o álcool estar presente, ainda. O citado professor esclarece
também que “o jejum prolongado ou o diabetes não tratado podem dar positividade no teste
do bafômetro”. TJRJ (Em. 77/278)............................................................................................. 611
— Lesão corporal na direção de veículo. Condenação. Irresignação. Alegação de inexistência de
comprovação da materialidade do delito. Argumento infundado. Ausência de teste de alcoole-
mia. Inexigibilidade. Delito cometido sob a égide da Lei 11.760/2012. Estado etílico evidente
através da comprovação de outros meios legalmente previstos na lei. TJPB (Em. 77/255)........ 603
— Praticado o fato depois do advento da Lei 12.760/2012, afigura-se viável a demonstração da
infração prevista no art. 306, caput, do CTB por meio de prova outra que não a verificação do
índice de alcoolemia, através da realização de teste com etilômetro. Caso em que o estado de
embriaguez do acusado vem demonstrado pela prova oral coligida, mormente pelas declarações
prestadas pelos agentes policiais, bem assim pelo exame clínico, constatando que apresentava
o recorrente, na oportunidade, vestes desalinhadas, equilíbrio alterado, hálito etílico, atividade
eufórica e face de coloração ruborizada. TJRS (Em. 77/227)..................................................... 590
ESTELIONATO
— Alienação de lote concedido pelo INCRA. Rejeição da denúncia mantida. Não restou compro-
vada a prática do crime de estelionato, tampouco prejuízo em desfavor da autarquia federal,
mas tão somente a violação ao disposto no art. 21 da Lei 8.629/93, cabendo, na hipótese
vertente, sanções cíveis. TRF 3ª R. (Em. 77/229)....................................................................... 591
ESTELIONATO QUALIFICADO
— Programa farmácia popular. Irregularidades graves. Vantagem indevida apurada. Prejuízo
concreto aos cofres federais. Expediente fraudulento caracterizado. Estelionato configurado.
Réus (proprietários de farmácia que vendia medicamentos no âmbito do aqui tem farmácia
popular) que instruíram funcionária (cadastradora) para ir até residências e, por vezes, infor-
mar que postos de saúde não mais forneceriam os medicamentos de uso contínuo utilizados
pelos moradores do local. Pena. Dosimetria. Primeira fase da dosimetria. Circunstância do
crime desfavorável aos agentes. Realizada a substituição da pena privativa de liberdade por
penas restritivas de direitos. TRF 3ª R. (Em. 77/230)................................................................ 592
ESTUPRO
— Companheira no âmbito da convivência. Palavra da vítima não dissonante dos demais ele-
mentos probatórios. Autoria e materialidade comprovadas. TJAP (Em. 77/231)...................... 593
ESTUPRO CONTRA VULNERÁVEL
— Absolvição. Ausência de comprovação da deficiência mental da vítima comprometedora do
discernimento para o ato. Vulnerabilidade relativa. In dubio pro reo. TJAP (Em. 77/232)......... 593
— Acórdão do STJ – Elementos do tipo penal. Ato libidinoso. Menor de 14 anos. Desclassificação.
Inadequação. Constrangimento ilegal. Crime subsidiário. Adequação típica. Hipótese em que
a conduta do réu constitui efetivo contato lascivo, voluptuoso e corpóreo, de libidinagem,
com o propósito de satisfação de sua lascívia............................................................................. 503
EVASÃO DE DIVISAS E GESTÃO FRAUDULENTA
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
— Crimes contra o SFN. Conceito normativo de instituição financeira, para fins penais, de-
finido pela própria Lei 7.492/86 (art. 1º e parágrafo único), que abrange, até mesmo, para
esse efeito, pessoas naturais ou entidades que operem sem autorização do Banco Central do
Brasil. Pretendido reconhecimento da atipicidade penal do delito de gestão fraudulenta, que,
alegadamente, só poderia ser praticado por instituição financeira regularmente constituída e
autorizada pelo Banco Central do Brasil. Fundamento inadmissível. Autonomia jurídica dos
crimes de gestão fraudulenta de instituição financeira (Lei 7.492/86, art. 4º) e de operação
de instituição financeira não autorizada (Lei 7.492/86, art. 16). Consequente possibilidade
da prática de ambos os delitos, que podem ser cometidos em concurso. Tipicidade penal do
crime de evasão de divisas (Lei 7.492/86, art. 22). STF (Em. 77/223)....................................... 587
EXCESSO DE PRAZO
— Acórdão do STF – Prisão preventiva. Homicídio qualificado. Excesso de prazo prisional
configurado. Extensão da ordem. Art. 580 do CPP.................................................................... 496
— Prisão preventiva. Configuração. Homicídio qualificado. Prolação de pronúncia. Súmula 21/
STJ. Hipótese de afastamento. No caso, não obstante a incidência hipotética, da Súmula 21/
STJ, porquanto proferida decisão de pronúncia, verifica-se que o mencionado entendimento
é de ser afastado. Não há o que justifique a manutenção de uma prisão preventiva há mais de
quatro anos sem ter havido um pronunciamento definitivo do Poder Judiciário, não tendo a
defesa em nada contribuído para tal demora, configurando, portanto, tal situação, odioso e
686 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

inaceitável constrangimento ilegal, por ofender os princípios da razoabilidade e da celeridade


dos processos. STJ (Em. 77/246)................................................................................................ 599
EXTORSÃO QUALIFICADA
— Participação de menor importância. Matéria de prova. Causa especial de aumento da pena.
Afastamento. Supressão de instância. Regime prisional. Tratando-se de paciente primário, com
todas as circunstâncias judiciais favoráveis, condenado à pena privativa de liberdade supe-
rior a quatro anos de reclusão e que não exceda a oito, é cabível o regime inicial semiaberto,
consoante dispõe o art. 33, § 2º, b, do CP. STJ (Em. 77/234)..................................................... 594
EXTRADIÇÃO INSTRUTÓRIA E EXECUTÓRIA
— Prisão decretada pela justiça espanhola. Tratado específico. Requisitos atendidos. Crimes de
tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual, favorecimento da prostituição
ou outra forma de exploração sexual e redução à condição análoga à de escravo. Dupla tipi-
cidade. Inocorrência de prescrição. Extradição deferida. STF (Em. 77/235)............................. 595

—F—
FALSIDADE IDEOLÓGICA ELEITORAL
— Denúncia contra deputado federal. Art. 350 do Código Eleitoral. Posterior pedido de des-
classificação para o crime do art. 299 do CP. Alegada omissão de informações na prestação
de contas eleitorais. Afastamento das preliminares de prescrição em perspectiva e inépcia da
denúncia. Alegada falta de justa causa para o prosseguimento da ação penal. Acolhimento.
Ausência de indícios suficientes de autoria e materialidade delitivas. Rejeição da denúncia.
STF (Em. 77/249)....................................................................................................................... 600
— Prestação de contas eleitoral. Prejudicial. Prescrição pela pena em abstrato. Inocorrência.
Natureza pública, e não privada, do documento. Omissão de informação com fim de alterar
a verdade sobre fato juridicamente relevante. Narrativa fática obediente ao disposto no art.
41 do CPP. Demonstração mínima da prática da conduta e do especial fim de agir. Existência
de justa causa para o início da ação penal. Denúncia recebida contra os acusados Paulo Salim
Maluf e Sérgio Stefanelli Gomes. STF (Em. 77/250).................................................................. 600
FALSIFICAÇÃO, ADULTERAÇÃO OU ALTERAÇÃO DE PRODUTOS DESTINADOS A
FINS TERAPÉUTICOS OU MEDICINAIS
— Julgado parcialmente procedente os pedidos contidos na denuncia para condenar os réus
Paulo Cesar e Ana Paula na forma da denuncia e o réu Carlos Alberto somente pelo delito
previsto no art. 184, § 2º, do CP, absolvendo-o do delito previsto no art. 273, § 1º, do CP por
precariedade de prova. Mandados de busca e apreensão cumpridos de forma ilegítima e sem
a observância das normas legais. Violação ao art. 564, IV, do CPP. Absolvição que se impõe,
igualmente ante a ausência de lesão ao bem jurídico tutelado quanto ao delito previsto no
art. 273 do CP e com relação ao art. 184, § 2º, do CP a absolvição se impõe, uma vez que a
denuncia não identificou os lesados cujas obras tiveram o direito autoral violado. Atipicidade
da conduta que se reconhece. TJRJ (Em. 77/298)...................................................................... 619
FALSIFICAÇÃO, CORRUPÇÃO, ADULTERAÇÃO OU ALTERAÇÃO DE SUBSTÂNCIA OU
PRODUTOS ALIMENTÍCIOS
— Aplicação a terceiros, por profissionais da medicina, da toxina fine tox. Inexistência de registro
pela Anvisa. Produto de origem estrangeira. Art. 109, IV, da CF. Súmula 122/STJ. Competência
da Justiça Federal. Não demonstração de que tal produto tem, em tese, aptidão para provocar
prejuízo à saúde humana. Ausência de tipicidade. Mesmo em se tratando de crime de perigo
abstrato o delito tipificado no art. 273, §§ 1º e 2º, do CP, a sua configuração não se manifesta
pela só ausência de registro do medicamento na Anvisa, havendo, igualmente, a necessidade
da demonstração de uma probabilidade de lesão, por mínima que seja, isto é, que o produto
em causa seja idôneo, em tese, para ofender o bem jurídico tutelado pelo ordenamento, con-
sistente na saúde humana. TRF 5ª R. (Em. 77/209)................................................................... 581
FALTA GRAVE
— Acórdão do TJSP – Interrupção do prazo aquisitivo para concessão de novos benefícios. Nos
termos do pacificado e sumulado entendimento do STJ, a prática de falta grave não interrompe
o prazo aquisitivo e o reinício da contagem do lapso temporal para concessão de livramento
condicional................................................................................................................................. 577
— Prescrição. Inocorrência. Ausência de prazo prescricional previsto na LEP. Adoção, por analo-
gia, daquele fixado pelo art. 109, VI, do CP. Perda de 1/3 dos dias remidos. Compatibilidade
com as circunstâncias do caso concreto. Falta disciplinar que constitui marco interruptivo de
benefício. TJSP (Em. 77/236)..................................................................................................... 595
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 687

FEMINICÍDIO
— Paciente preso em flagrante e ulteriormente denunciando pela prática, em tese, do crime de
feminicídio. Prisão em flagrante convertida em preventiva. Pleito libertário interposto pela
defesa que restou indeferido. Irresignação defensiva que alega ausência de motivação e de
fundamentação idônea na decisão, além de excesso de prazo. Constrangimento ilegal confi-
gurado. Ordem que se concede. TJRJ (Em. 77/261)................................................................... 605
FERNANDO GENTIL GIZZI DE ALMEIDA PEDROSO
— Artigo: “A Dualidade Havida (a Vida): Seria o Aborto Questão de Saúde Pública ou de Política
Criminal?”.................................................................................................................................. 361
FLÁVIO AUGUSTO MARETTI SGRILLI SIQUEIRA
— Artigo: “Acordo de Leniência e seus Reflexos Penais”............................................................... 408
FUGA DE PRESO
— Forma culposa. Delito delineado e provado. Provimento do apelo do MPM. Art. 179 do CPM.
Declaração da extinção da punibilidade do acusado, em face da ocorrência da prescrição da
pretensão punitiva estatal, com base na pena concretizada na decisão. STM (Em. 77/238)...... 596
FURTO
— Acórdão do STJ – Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Concurso de agentes. Alto
grau de reprovabilidade no comportamento do acusado e esmaece a circunstância do diminuto
valor do objeto furtado............................................................................................................... 516
— Acórdão do STM – Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Teoria da amotio ou ap-
prehensio. Crime consumado. Devolução da res furtiva. Desclassificação da conduta. Incabível.
Devolução imediata após o ocorrido, por si só, não autoriza a desclassificação da conduta
delitiva, mas faculta ao Juiz a redução da pena.......................................................................... 519
— Prova da autoria e da materialidade lastreada nas provas produzidas. Havendo robusto con-
junto probatório a demonstrar, sem sombra de dúvida, a prática delitiva, de rigor o decreto
condenatório. TJSP (Em. 77/242)............................................................................................... 598
FURTO DE USO
— Ambulância. Condenação. Prestação de serviço à comunidade durante o período de prova do
sursis. Impossibilidade. STM (Em. 77/208)................................................................................ 580
— Arma. Conduta moldada na apropriação temporária de arma com devolução em ato contínuo.
Materialidade e autoria confessadas no interrogatório. Acervo probatório harmônico. Desclas-
sificação para o crime de furto de uso por adequação ao tipo do art. 241 do CPM. STM (Em.
77/260)....................................................................................................................................... 605
— Armamento. Absolvição. É indispensável que o sujeito ativo tenha subtraído a coisa daquele
que lhe tinha a posse ou a propriedade, retirando-a, sub-repticiamente, de sua esfera de vigi-
lância e disponibilidade. STM (Em. 77/208).............................................................................. 580
FURTO QUALIFICADO
— Acórdão do TJMG – Rompimento de obstáculo. Quebra de vidro de janela para acessar o
imóvel. Inclusão da qualificadora com base na prova pericial. Mantida.................................... 559
— Desclassificação do furto consumado para tentado. Viabilidade. Redução da pena imposta.
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
Cabível. Alteração do cumprimento de pena. O crime de furto não se consuma se a res furtiva
não chega a sair da esfera de vigilância do dono, impondo-se a desclassificação do delito de
furto consumado para a sua forma tentada. TJPE (Em. 77/239)................................................ 596
— Pena. Réu reincidente. Regime inicial semiaberto. Possibilidade. Ao réu reincidente condenado
à pena inferior a quatro anos é possível a fixação do regime semiaberto como inicial para o
cumprimento da pena, desde que ausentes circunstâncias judiciais desfavoráveis, de acordo
com a Súmula 269/STJ. É de se manter a custódia cautelar quando decretada para a garantia da
ordem pública para evitar a reiteração criminosa, adequando-a, contudo, ao regime semiaberto
de cumprimento da pena. TJAC (Em. 77/240)........................................................................... 597
— Princípio da insignificância. Furto privilegiado. Tentativa. Um fato é penalmente insignificante
quando, para os personagens nele envolvidos ou para a comunidade que o recepciona, nada
de mais expressivo representou em suas vidas ou em suas preocupações. A versão privilegia-
da não é tecnicamente incompatível com as versões qualificadas do furto. Aliás, imperioso
registrar o atual entendimento do STJ reafirmando a possibilidade de aplicação do privilégio
em casos de furto qualificado, desde que presentes os requisitos legais (Súmula 511). TJSP
(Em. 77/267).............................................................................................................................. 607
— Rompimento de obstáculo. Fraude. Concurso de a gentes. Dispositivos “pescadores”. Retenção
de envelopes de depósito bancário. CEF. Autoria e materialidade do delito comprovadas. Crime
impossível não configurado. Continuidade delitiva. Dosimetria da pena. Pena-base acima do
688 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

mínimo legal. Circunstâncias judiciais desfavoráveis. Reparação de danos do art. 387, IV, do
CPP. Impossibilidade. Ausência de pedido expresso. TRF 3ª R. (Em. 77/241).......................... 597

—G—
GESTÃO FRAUDULENTA E EVASÃO DE DIVISAS
— Crimes contra o SFN. Conceito normativo de instituição financeira, para fins penais, de-
finido pela própria Lei 7.492/86 (art. 1º e parágrafo único), que abrange, até mesmo, para
esse efeito, pessoas naturais ou entidades que operem sem autorização do Banco Central do
Brasil. Pretendido reconhecimento da atipicidade penal do delito de gestão fraudulenta, que,
alegadamente, só poderia ser praticado por instituição financeira regularmente constituída e
autorizada pelo Banco Central do Brasil. Fundamento inadmissível. Autonomia jurídica dos
crimes de gestão fraudulenta de instituição financeira (Lei 7.492/86, art. 4º) e de operação
de instituição financeira não autorizada (Lei 7.492/86, art. 16). Consequente possibilidade
da prática de ambos os delitos, que podem ser cometidos em concurso. Tipicidade penal do
crime de evasão de divisas (Lei 7.492/86, art. 22). STF (Em. 77/223)....................................... 587
GUSTAVO FILIPE BARBOSA GARCIA
— Artigo: “Carteira de Trabalho e Previdência Social – Ausência de Anotação e Competência
Criminal”.................................................................................................................................... 428

—H—
HABEAS CORPUS
— Ação penal. Trancamento da ação penal em sede de HC. Possibilidade. Ausência de justa causa
e inépcia da exordial acusatória. STJ (Em. 77/220).................................................................... 586
HOMICÍDIO CULPOSO
— Médica(o). Inobservância de regra técnica de profissão. Trancamento de ação penal. Des-
cabimento. Inépcia da inicial não caracterizada. Hipótese em que a denúncia descreve ter a
paciente, na condição de médica plantonista, incorrido em negligência ao deixar de realizar
os exames clínicos aptos a diagnosticar a razão das dores abdominais da vítima, que veio a
falecer, dias depois de ser novamente atendida por outro profissional, de “choque séptico por
abdômen agudo perfurativo” em razão de apendicite aguda perfurada. STJ (Em. 77/244)....... 598
HOMICÍDIO QUALIFICADO
— Acórdão do STF – Prisão preventiva. Excesso de prazo prisional configurado. Extensão da
ordem. Art. 580 do CPP.............................................................................................................. 496
— Motivo fútil e por recurso que dificultou a defesa do ofendido. Pronúncia. Ausência de funda-
mentação. Nulidade. A decisão de pronúncia se caracteriza pela cognição sumária e superficial
dos elementos probatórios, a teor do que dispõe o art. 413 do CPP, devendo conter a devida
fundamentação, conforme determina o art. 93, IX, da CF, porém, a decisão questionada não
apresenta motivação concreta em relação às qualificadoras, o que impõe a declaração de
nulidade desta. TJGO (Em. 77/247)........................................................................................... 599

—I—
INDULTO
— Comutação. Decreto Presidencial 7.873/2012. Impossibilidade. Falta grave consistente em
fuga cometida após pedido de benefício. Efeitos do reconhecimento de falta grave, que torna
ilógica a concessão de indulto, ainda que parcial, ao sentenciado. TJSP (Em. 77/214)............. 584
— Comutação. Decreto Presidencial 8.380/2014. Possibilidade. Base de cálculo. Comutação con-
cedida com base em período de pena remanescente. A base de cálculo deve ser o período de
pena já cumprido, uma vez que tal intervalo é superior ao período remanescente de desconto
da reprimenda. Observância do art. 2º, § 1º, do Decreto. TJSP (Em. 77/215)........................... 584
INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA
— Adolescente que ingressou em motel desacompanhada e sem a autorização de seus responsá-
veis. Sentença condenatória. Fixação de multa em 15 salários mínimos. Pretensa aplicação do
princípio in dubio pro reo. Impossibilidade. Materialidade e autoria devidamente comprovadas.
Prova testemunhal. Infante que entrou no motel representado acompanhada de um adulto.
Depoimento da menor coerente e verossímil. Inexistente fundamento concreto que justifique
a exasperação da pena de multa pela infração administrativa do art. 250 do ECA, ela deve ser
fixada em 10 salários mínimos, o equivalente ao mínimo antes previsto no preceito secundário
da norma. TJSC (Em. 77/228).................................................................................................... 590
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 689

INJÚRIA REAL
— Crime militar. Elemento subjetivo do dolo não comprovado. Absolvição. No caso, o Sargento
ordenou a submersão de soldado em cocho destinado à hidratação de equinos, em razão de o
militar não ter cumprido ordem de serviço a contento. O crime de injúria real, para sua con-
figuração, pressupõe a índole, o dolo, a intenção de aviltar e denegrir a imagem do ofendido.
Elemento subjetivo do tipo não configurado nos presentes autos, impondo-se a manutenção
do decreto absolutório. STM (Em. 77/248)................................................................................ 600
INQUÉRITO
— Crime de falsidade ideológica em prestação de contas eleitoral. Prejudicial. Prescrição pela
pena em abstrato. Inocorrência. Natureza pública, e não privada, do documento. Omissão de
informação com fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Narrativa fática
obediente ao disposto no art. 41 do CPP. Demonstração mínima da prática da conduta e do
especial fim de agir. Existência de justa causa para o início da ação penal. Denúncia recebida
contra os acusados Paulo Salim Maluf e Sérgio Stefanelli Gomes. STF (Em. 77/250)............... 600
— Denúncia contra deputado federal. Crime de falsidade ideológica eleitoral, art. 350 do Código
Eleitoral. Posterior pedido de desclassificação para o crime do art. 299 do CP. Alegada omissão
de informações na prestação de contas eleitorais. Afastamento das preliminares de prescrição
em perspectiva e inépcia da denúncia. Alegada falta de justa causa para o prosseguimento da
ação penal. Acolhimento. Ausência de indícios suficientes de autoria e materialidade delitivas.
Rejeição da denúncia. STF (Em. 77/249)................................................................................... 600
INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÕES
— Acórdão do TRF 4ª R. – Pena. Peculato (art. 313-A do CP). Semi-imputabilidade. Art. 26,
parágrafo único, do CP. Circunstâncias judiciais. Personalidade. Consequências do crime...... 546
INTERNAÇÃO
— Medida socioeducativa. Ato infracional análogo ao homicídio. Pedido de desclassificação para
reconhecimento do ato infracional análogo ao homicídio na modalidade culposa. Impossibi-
lidade. Adolescente que confessou apontar arma de fogo para a vítima assumindo o risco de
matar. TJRN (Em. 77/211).......................................................................................................... 582
INTERROGATÓRIO
— Nulidade. Ausência de amparo jurídico. A preliminar de nulidade do interrogatório arguida
pela DPU, em sede de apelo do MPM, a pretexto de aplicação do art. 400 do CPP, com reda-
ção imposta pela Lei 11.719/08, não encontra amparo na jurisprudência do STM, em face do
princípio da especialidade do direito penal militar. STM (Em. 77/260)..................................... 605

—J—
JÚRI
— Desaforamento. Dúvida quanto à parcialidade dos jurados configurada. Preterição das comarcas
mais próximas. Possibilidade. STJ (Em. 77/245)........................................................................ 599
— Homicídio qualificado. Motivo torpe e recurso que impossibilita a defesa da vítima. Irresignação
quanto à sanção penal aplicada. Circunstâncias judiciais. Culpabilidade e consequências do
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
crime. Fundamentação inidônea. Pena-base reformada. Afastamento de agravante. Alegação
de ausência de motivação fútil. Não acolhimento. Elementos probatórios justificadores da
manutenção. Confissão espontânea. Preponderância. Participação de menor importância. Art.
29, § 1º, do CP. Ausência de alegação no momento oportuno. Art. 483, § 3º, do CPP. Impos-
sibilidade de análise nesta via recursal, sob pena de supressão de instância. Reformulação da
dosimetria. TJAL (Em. 77/253).................................................................................................. 602
— Homicídio qualificado. Pena. Redução. Viabilidade. Impossibilidade de exclusão da inde-
nização fixada a título de reparação pelos danos sofridos pela família da vítima. Quando as
circunstâncias judiciais forem, na quase totalidade, favoráveis ao acusado, a pena-base deve
ser fixada próxima ao mínimo legal. Não há necessidade de pedido formal de fixação de valor
mínimo para fins de reparação dos danos causados pela infração, nos termos do art. 387, IV,
do CPP. TJGO (Em. 77/251)....................................................................................................... 601
— Homicídio qualificado. Prova emprestada confirmada sob o crivo do contraditório. Análise
das provas. Atribuição do Conselho de Sentença. Ausência de prova inequívoca. Caderno
processual suficiente a indicar a prova da materialidade e indícios da autoria dos fatos supos-
tamente criminosos. In dubio pro societate. Imperatividade. A testemunha ocular é categórica
ao atribuir ao apelante a autoria do crime, seu testemunho colhido em sede judicial afasta
qualquer nulidade, visto que não houve cerceamento de defesa, na medida em que a prova
foi produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Ademais, a prova emprestada
690 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

é admitida no ordenamento jurídico pátrio, salvo se produzida de maneira ilícita, o que não
restou demonstrado no caso. TJAL (Em. 77/252)...................................................................... 602

—L—
LATROCÍNIO
— Participação na morte da vítima. Prova fulcrada exclusivamente nos elementos informativos
colhidos na fase da informatio delicti. Insuficiência para a condenação. Ausência de provas
judicializadas. Desclassificação da conduta para o crime de furto. Imperatividade. TJMG (Em.
77/254)....................................................................................................................................... 603
LENIÊNCIA
— Artigo de Flávio Augusto Maretti Sgrilli Siqueira: “Acordo de Leniência e seus Reflexos Pe-
nais”............................................................................................................................................ 408
LESÃO CORPORAL QUALIFICADA
— Deformidade permanente. Júri. Desclassificação. Decisão manifestamente contrária à prova dos
autos. Inexistência. Lastro probatório suficiente. Soberania dos veredictos. Erro ou injustiça
na dosimetria. Pena privativa de liberdade reduzida. Sanção pecuniária não prevista no tipo.
Abstrações, expressões genéricas e dados integrantes da própria conduta típica são inidôneos
para exasperar a pena-base. TJPB (Em. 77/257)......................................................................... 604
— Versão acusatória não corroborada pelos elementos de prova produzidos nos autos. Não pas-
sando de mera suspeita a imputação do crime ao acusado, não tendo o MP se desincumbido de
provar o excesso do réu ao repelir a agressão injusta praticada pela vítima, tudo comprovando
tratar-se de ato praticado em legítima defesa, a manutenção da absolvição é medida de rigor,
na forma do art. 386, VI, do CPP. TJMG (Em. 77/256).............................................................. 604
LIBERDADE PROVISÓRIA
— Acórdão do STF – Tóxicos. Tráfico e associação. Arts. 33 e 35 da Lei 11.343/06. Prisão preven-
tiva. Fundamentação inidônea. Motivação genérica e abstrata. Súmula 691/STF. Afastamento.
Concessão da ordem. Substituição da prisão preventiva por medidas cautelares previstas no
art. 319 do CPP, a serem fixadas pelo juízo de primeiro grau.................................................... 485
— Acórdão do TRF 1ª R. – Fumus commissi delicti. Periculum in libertatis. Embasamento. Custódia
cautelar. Impossibilidade. Característica rebus sic stantibus da custódia provisória................... 525
— Roubo qualificado. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Valor significante do bem
subtraído. Atenuante genérica do art. 66 do CP. Não reconhecimento. Recorrer em liberda-
de. Não cabimento. Motivação per relationem. Fundamentação arrolada na lei processual
penal. Garantia da ordem pública. Condições pessoais favoráveis. Irrelevância. TJMG (Em.
77/284)....................................................................................................................................... 614
— Tóxicos. Tráfico. Associação para o tráfico. Porte de munição. Corrupção de menores. Liber-
dade concedida. Paciente primário, preso em 25 de junho de 2015, pela suposta prática dos
delitos de tráfico ilícito de drogas, associação para o tráfico, porte de munição e corrupção
de menores. Teriam sido apreendidas, no interior da residência do paciente, 85 pedrinhas de
crack, 10 papelotes de cocaína, 3 munições intactas calibre 9mm e uma pequena quantidade
de maconha – peso insignificante – sem indicação de peso. A quantidade de droga apreendida,
ainda que de naturezas distintas, não pode ser considerada de monta expressiva – não há
indicação de peso. Não restou demonstrada, no caso concreto, a efetiva necessidade da prisão
preventiva, medida extrema e excepcional. Ordem concedida. Liminar ratificada. TJRS (Em.
77/290)....................................................................................................................................... 617
— Uso de documento falso. Prisão preventiva. Motivação insuficiente para manutenção. Se o réu
é primário, não ostenta registros criminais e o contexto fático que permeou a ação criminosa
a ele imputada não extrapola a gravidade inerente ao próprio tipo penal, em tese violado,
inexistindo justificativa objetiva para sua permanência sob custódia, concede-se a liberdade
provisória. TJGO (Em. 77/294).................................................................................................. 618
— Violência doméstica. Ameaça e descumprimento de medidas protetivas. Liberdade concedida.
Imposição de medida protetiva. Paciente primário, preso em 15 de julho de 2015, pela suposta
prática do delito de ameaça e pelo descumprimento de medidas protetivas. A prisão preventiva
decorrente do descumprimento de medidas protetivas ou em situação de violência à mulher
no âmbito da Lei Maria da Penha não pode ser abusiva, ou exagerada no tempo, porque tem
por finalidade justamente assegurar o cumprimento das medidas protetivas. Ocorre que,
transcorrido mais de um mês desde a prisão preventiva do paciente, não foi realizada – nem
ao menos designada – audiência com vistas a examinar alternativa diversa da prisão. Nesse
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 691

contexto, viável a concessão da liberdade. Determinação de expedição de alvará de soltura


na origem. TJRS (Em. 77/299).................................................................................................... 620
LICITAÇÃO
— Utilização de certidão de conteúdo inverídico e indevida habilitação de concorrente de tomada
de preços. Prática de outro expediente que implica em frustração ao caráter competitivo de
licitação. Vetorial consequência do crime. Caracterização do delito independe de obtenção de
vantagem econômica indevida ou prejuízo ao erário, tratando-se de crime formal. Na dosimetria
da pena, não existindo o prejuízo apontado pela sentença, deve a vetorial consequência do
crime ser reputada neutra. TRF 4ª R. (Em. 77/296)................................................................... 619
LIMITES E PERSPECTIVAS PARA A JUSTIÇA CRIMINAL
— Artigo de Paulo José Freire Teotônio, Luís Augusto Freire Teotônio, Luan Guilherme Dias e
Luís Augusto Freire Teotônio Júnior.......................................................................................... 416
LIVRAMENTO CONDICIONAL
— Acórdão do TJSP – Falta grave. Interrupção do prazo aquisitivo para concessão de novos be-
nefícios. Nos termos do pacificado e sumulado entendimento do STJ, a prática de falta grave
não interrompe o prazo aquisitivo e o reinício da contagem do lapso temporal para concessão
de livramento condicional.......................................................................................................... 577

— M—
MAGNO FEDERICI GOMES E FERNANDO MARQUES KHADDOUR
— Artigo: “Da Criminalização Regulamentar em Matéria de Efluentes Ambientais”..................... 434
MARCELLUS POLASTRI LIMA E MARCILEY BOLDRINI
— Artigo: “Reflexões e Particularidades sobre a Preclusão, a Coisa Julgada e o Chamado ‘Trânsito
em Julgado’ Penal”...................................................................................................................... 446
MEDIDA SOCIOEDUCATIVA
— Internação. Ato infracional análogo ao homicídio. Pedido de desclassificação para reconhe-
cimento do ato infracional análogo ao homicídio na modalidade culposa. Impossibilidade.
Adolescente que confessou apontar arma de fogo para a vítima assumindo o risco de matar.
TJRN (Em. 77/211)..................................................................................................................... 582
MULTA
— Infração administrativa. Adolescente que ingressou em motel desacompanhada e sem a autori-
zação de seus responsáveis. Sentença condenatória. Fixação de multa em 15 salários mínimos.
Pretensa aplicação do princípio in dubio pro reo. Impossibilidade. Materialidade e autoria
devidamente comprovadas. Prova testemunhal. Infante que entrou no motel representado
acompanhada de um adulto. Depoimento da menor coerente e verossímil. Inexistente funda-
mento concreto que justifique a exasperação da pena de multa pela infração administrativa do
art. 250 do ECA, ela deve ser fixada em 10 salários mínimos, o equivalente ao mínimo antes
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

previsto no preceito secundário da norma. TJSC (Em. 77/228)................................................. 590

—N—
NULIDADE
— Pronúncia. Homicídio qualificado. Motivo fútil e por recurso que dificultou a defesa do
ofendido. Ausência de fundamentação. A decisão de pronúncia se caracteriza pela cognição
sumária e superficial dos elementos probatórios, a teor do que dispõe o art. 413 do CPP,
devendo conter a devida fundamentação, conforme determina o art. 93, IX, da CF, porém, a
decisão questionada não apresenta motivação concreta em relação às qualificadoras, o que
impõe a declaração de nulidade desta. TJGO (Em. 77/247)....................................................... 599

—O—
OBTER, MEDIANTE FRAUDE, FINANCIAMENTO EM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
— Acórdão do TRF 5ª R. – Recursos do programa de fortalecimento da agricultura familiar –
Pronaf. Utilizados documentos de terceira pessoa para obtenção, configurou-se a conduta
típica prevista no art. 19 da Lei 7.492/86. Crime formal, prescindindo da efetiva liberação
das parcelas................................................................................................................................. 555
692 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

—P—
PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA
— A participação de menor importância do agente na empreitada criminosa (art. 29, § 1º, do CP)
é matéria afeta ao crivo dos jurados e aplicada à dosimetria da pena, realizada na hipótese de
condenação pelo Conselho de Sentença. TJGO (Em. 77/272)................................................... 608
PATROCÍNIO INDÉBITO
— Crime militar. Art. 334 do CPM. Materialidade do delito. Indícios de autoria demonstrados.
Princípio do in dubio pro societate. Existindo prova de fato que constitua crime e indícios de
quem o cometera, deve ser apresentada a denúncia, conforme determina o art. 30 do CPPM.
STM (Em. 77/279)...................................................................................................................... 612
PAULO JOSÉ FREIRE TEOTÔNIO, LUÍS AUGUSTO FREIRE TEOTÔNIO, LUAN
GUILHERME DIAS E LUÍS AUGUSTO FREIRE TEOTÔNIO JÚNIOR
— Artigo: “Limites e Perspectivas para a Justiça Criminal”............................................................ 416
PECULATO
— Acórdão do TRF 4ª R. – Pena. Inserção de dados falsos em sistema de informações (Art.
313-A do CP). Semi-imputabilidade. Art. 26, parágrafo único, do CP. Circunstâncias judiciais.
Personalidade. Consequências do crime.................................................................................... 546
PENA
— Acórdão do STJ – Roubo. Regime inicial fechado. Motivação insuficiente. Ordem concedida
de ofício. Deve ser mantida a fixação do regime semiaberto ao paciente primário, condenado
a seis anos, dois meses e 20 dias de reclusão e sem registro de circunstâncias judiciais desfa-
voráveis, a teor do art. 33, § 2º, b, do CP................................................................................... 507
— Acórdão do STJ – Sentença com trânsito em julgado há mais de cinco anos. Configuração de
maus antecedentes. Possibilidade. Embora não possa ser utilizada para configurar a reinci-
dência (art. 64, I, do CP), pode ser considerada como maus antecedentes............................... 511
— Acórdão do TJRJ – Roubo qualificado. Emprego de arma e em concurso de pessoas. Divergência.
Voto vencido. Fração relativa às causas de aumento da pena. Redução para o menor patamar
(1/3). Resgate. Possibilidade. Extensão de efeitos aos corréus. A fração eleita para majoração
da reprimenda em razão das causas de aumento da pena deve ser motivada quanto ao caso
concreto, e não somente em relação à quantidade de majorantes (Súmula 443 do STJ)........... 561
— Acórdão do TJRS – Regime semiaberto. Benefícios externos. Inexigibilidade de preenchimento
do requisito objetivo de 1/4 de cumprimento da pena privativa de liberdade........................... 566
— Acórdão do TJSC – Remição. Declarando remidos 51 dias referente aos meses de maio e junho
de 2014. Alegação de que desempenhava funções aos domingos. Possibilidade. Necessidade
de considerar como trabalhado o maior número possível de dias.............................................. 571
— Acórdão do TRF 4ª R. – Peculato. Inserção de dados falsos em sistema de informações (Art.
313-A do CP). Semi-imputabilidade. Art. 26, parágrafo único, do CP. Circunstâncias judiciais.
Personalidade. Consequências do crime.................................................................................... 546
— Atentado violento ao pudor. Tentativa. Reconhecida a forma tentada do delito de atentado
violento ao pudor, reduzindo-se a pena em 1/3. Pena-base. Reduzida a pena-base para o míni-
mo legal. Reincidência. Inocorrente a reincidência, posto que não caracterizada, afastando-se
o aumento pertinente à agravante. Regime carcerário. O regime carcerário é o aberto. TJRS
(Em. 77/210).............................................................................................................................. 582
— Embriaguez ao volante. Lesão corporal na direção de veículo. Condenação. Irresignação.
Alegação de inexistência de comprovação da materialidade do delito. Argumento infun-
dado. Ausência de teste de alcoolemia. Inexigibilidade. Delito cometido sob a égide da Lei
11.760/2012. Estado etílico evidente através da comprovação de outros meios legalmente
previstos na lei. TJPB (Em. 77/255)............................................................................................ 603
— Estelionato qualificado. Programa farmácia popular. Irregularidades graves. Vantagem indevida
apurada. Prejuízo concreto aos cofres federais. Expediente fraudulento caracterizado. Este-
lionato configurado. Réus (proprietários de farmácia que vendia medicamentos no âmbito do
aqui tem farmácia popular) que instruíram funcionária (cadastradora) para ir até residências
e, por vezes, informar que postos de saúde não mais forneceriam os medicamentos de uso
contínuo utilizados pelos moradores do local. Primeira fase da dosimetria. Circunstância do
crime desfavorável aos agentes. Realizada a substituição da pena privativa de liberdade por
penas restritivas de direitos. TRF 3ª R. (Em. 77/230)................................................................ 592
— Extorsão qualificada. Participação de menor importância. Matéria de prova. Causa especial
de aumento da pena. Afastamento. Supressão de instância. Regime prisional. Tratando-se de
paciente primário, com todas as circunstâncias judiciais favoráveis, condenado à pena privativa
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 693

de liberdade superior a quatro anos de reclusão e que não exceda a oito, é cabível o regime
inicial semiaberto, consoante dispõe o art. 33, § 2º, b, do CP. STJ (Em. 77/234)....................... 594
— Fraude à licitação. Utilização de certidão de conteúdo inverídico e indevida habilitação de
concorrente de tomada de preços. Prática de outro expediente que implica em frustração ao
caráter competitivo de licitação. Vetorial consequência do crime. Caracterização do delito
independe de obtenção de vantagem econômica indevida ou prejuízo ao erário, tratando-se
de crime formal. Na dosimetria da pena, não existindo o prejuízo apontado pela sentença,
deve a vetorial consequência do crime ser reputada neutra. TRF 4ª R. (Em. 77/296)............... 619
— Furto qualificado. Desclassificação do furto consumado para tentado. Viabilidade. Redução da
pena imposta. Cabível. Alteração do cumprimento de pena. O crime de furto não se consuma
se a res furtiva não chega a sair da esfera de vigilância do dono, impondo-se a desclassificação
do delito de furto consumado para a sua forma tentada. TJPE (Em. 77/239)............................ 596
— Furto qualificado. Réu reincidente. Regime inicial semiaberto. Possibilidade. Ao réu reincidente
condenado à pena inferior a quatro anos é possível a fixação do regime semiaberto como inicial
para o cumprimento da pena, desde que ausentes circunstâncias judiciais desfavoráveis, de
acordo com a Súmula 269/STJ. É de se manter a custódia cautelar quando decretada para a
garantia da ordem pública para evitar a reiteração criminosa, adequando-a, contudo, ao regime
semiaberto de cumprimento da pena. TJAC (Em. 77/240)........................................................ 597
— Furto qualificado. Rompimento de obstáculo. Fraude. Concurso de gentes. Dispositivos
“pescadores”. Retenção de envelopes de depósito bancário. CEF. Autoria e materialidade do
delito comprovadas. Crime impossível não configurado. Continuidade delitiva. Dosimetria
da pena. Pena-base acima do mínimo legal. Circunstâncias judiciais desfavoráveis. Reparação
de danos do art. 387, IV, do CPP. Impossibilidade. Ausência de pedido expresso. TRF 3ª R.
(Em. 77/241).............................................................................................................................. 597
— Júri. Homicídio qualificado. Motivo torpe e recurso que impossibilita a defesa da vítima.
Irresignação quanto à sanção penal aplicada. Circunstâncias judiciais. Culpabilidade e
consequências do crime. Fundamentação inidônea. Pena-base reformada. Afastamento de
agravante. Alegação de ausência de motivação fútil. Não acolhimento. Elementos probatórios
justificadores da manutenção. Confissão espontânea. Preponderância. Participação de menor
importância. Art. 29, § 1º, do CP. Ausência de alegação no momento oportuno. Art. 483, §
3º, do CPP. Impossibilidade de análise nesta via recursal, sob pena de supressão de instância.
Reformulação da dosimetria. TJAL (Em. 77/253)...................................................................... 602
— Lesão corporal qualificada. Deformidade permanente. Júri. Desclassificação. Decisão mani-
festamente contrária à prova dos autos. Inexistência. Lastro probatório suficiente. Soberania
dos veredictos. Erro ou injustiça na dosimetria. Pena privativa de liberdade reduzida. Sanção
pecuniária não prevista no tipo. Abstrações, expressões genéricas e dados integrantes da
própria conduta típica são inidôneos para exasperar a pena-base. TJPB (Em. 77/257)............. 604
— Progressão ao regime aberto indeferida pelo Tribunal a quo, com base na gravidade abstrata
do delito e na longa pena a cumprir. Constrangimento ilegal evidenciado. HC não conhecido.
Ordem concedida de ofício. Fatores relacionados ao crime praticado são determinantes da
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
pena aplicada, mas não justificam diferenciado tratamento para a progressão de regime. STJ
(Em. 77/233).............................................................................................................................. 593
— Progressão de regime. Processo administrativo disciplinar em andamento. Insurgência minis-
terial. Requisitos objetivos e subjetivos do benefício preenchidos. Impossibilidade de utilizar
PAD em andamento para impedir a progressão de regime. TJAC (Em. 77/270)........................ 608
— Progressão de regime. Saída especial. Cômputo da pena. O período em que o apenado perma-
neceu com o benefício excepcional deverá ser computado como pena cumprida. TJRS (Em.
77/285)....................................................................................................................................... 614
— Progressão de regime. Segunda progressão. Insurgência defensiva. Utilização de fração para
progressão de regime em 1/6. Impossibilidade. Para a concessão da progressão de regime
a reeducandos condenados por crimes hediondos, deve-se ter cumprido 2/5 da pena, se o
réu é primário, e 3/5 da pena, se o réu é reincidente, independentemente da quantidade de
progressões concedidas. TJAC (Em. 77/269)............................................................................. 608
— Progressão de regime. Semiaberto. Requisitos atendidos. Trabalho externo e saídas tempo-
rárias. Benefícios não recomendados pelo exame criminológico. Permanecem indeferidos
os benefícios do trabalho externo e das saídas temporárias, até que haja parecer favorável a
respeito. TJMG (Em. 77/271)..................................................................................................... 608
— Reconversão. Pena restritiva de direitos em privativa de liberdade. Descumprimento injustifi-
cado da alternativa. Possibilidade. Se o condenado descumpre as regras impostas pelo juízo,
694 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

no tocante ao modo de cumprimento da sanção substitutiva, a reconversão é imperativa. TJSP


(Em. 77/277).............................................................................................................................. 610
— Redução. Júri. Homicídio qualificado. Viabilidade. Impossibilidade de exclusão da indenização
fixada a título de reparação pelos danos sofridos pela família da vítima. Quando as circunstân-
cias judiciais forem, na quase totalidade, favoráveis ao acusado, a pena-base deve ser fixada
próxima ao mínimo legal. Não há necessidade de pedido formal de fixação de valor mínimo
para fins de reparação dos danos causados pela infração, nos termos do art. 387, IV, do CPP.
TJGO (Em. 77/251).................................................................................................................... 601
— Regime semiaberto. Prisão domiciliar. Monitoração eletrônica. Requisitos. Ausência. A fis-
calização do preso em regime semiaberto por meio de monitoração eletrônica se limita às
situações de saída temporária e prisão domiciliar, desde que estas preencham os requisitos
da lei. TJAC (Em. 77/264).......................................................................................................... 607
— Regime semiaberto. Superveniência de condenação à pena restritiva de direitos. Incompatibi-
lidade de cumprimento simultâneo das reprimendas. Unificação, de rigor. Conversão da pena
restritiva de direitos em privativa de liberdade. Art. 111, parágrafo único, da Lei 7.210/84.
Inaplicabilidade do art. 76 do CP. TJSP (Em. 77/263)................................................................ 606
— Roubo duplamente qualificado. Terceira fase da dosimetria. Aplicação de fração superior
a 1/3. Fundamentação concreta. Súmula 443/STJ. Não aplicação. Ausência de funda-
mentação concreta para a fixação de regime inicial mais gravoso. Súmulas 440/STJ, 718
e 719/STF. Concessão da ordem, de ofício, para fixar o regime inicial semiaberto. STJ
(Em. 77/283).................................................................................................................. 613
— Roubo qualificado. Terceira fase da dosimetria. Majoração acima do mínimo legal. Critério
quantitativo. Constrangimento ilegal evidenciado. Regime inicial fechado. Fundamenta-
ção insuficiente. Ilegalidade. Ordem concedida, de ofício, e fixação do regime semiaberto,
confirmando-se os efeitos da liminar anteriormente deferida. STJ (Em. 77/280)...................... 612
— Serviço de comunicação multimídia. Transmissão irregular de sinal de internet a terceiros via
radiofrequência. Caracterização como serviço de telecomunicação suscetível de autorização
da Anatel. Subsunção da conduta do denunciado ao disposto no art. 183 da Lei 7.492/97.
Desclassificação para o crime do art. 70 da Lei 4.117/62. Impossibilidade. Legalidade na do-
simetria da pena. Inexistência de exorbitância na fixação da pena em dois anos e nove meses
de reclusão, acrescida da multa de R$ 10.000,00 como determinado na lei. TRF 5ª R. (Em.
77/286)....................................................................................................................................... 614
— Substituição. Arma de fogo. Porte ilegal. Configurado o porte ilegal de arma, impossível ab-
solvição ou desclassificação. Não comprovado o porte de arma quanto ao corréu, impositiva
a absolvição, de ofício. Se preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, aplica-se a substituição
por restritiva de direitos, de ofício. TJGO (Em. 77/287)............................................................ 615
— Tóxicos. Tráfico. Art. 33, caput, da Lei 11.343/06. Sentença condenatória. Pena fixada no
mínimo legal de cinco anos. Aplicação da minorante do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. Pena
definitiva de um ano e oito meses de reclusão. Apelação provida para retirar a minorante.
Fundamento. Paciente dedicado ao tráfico. Grande quantidade de entorpecente. Premissa não
condizente com a realidade dos autos. 25,80g de cocaína acondicionada em 26 invólucros.
Quantidade inapta a induzir à traficância reiterada (fundamento para decotar a minorante).
Primariedade, bons antecedentes, residência fixa e vários registros de emprego na CTPS.
Traficante eventual movido pelas circunstâncias. Constrangimento ilegal. Ordem de HC
concedida de ofício (art. 654, § 2º, do CPP). STF (Em. 77/288)............................................... 615
— Tóxicos. Tráfico de drogas minorado. Abrandamento do regime prisional e modificação das
penas restritivas de direitos. Necessidade. Embargos acolhidos. Tendo as penas dos réus
sido fixadas no mínimo legal e reduzidas na fração máxima prevista no art. 33, § 4º, da Lei
11.343/06, sendo a reprimenda privativa de liberdade substituída por restritivas de direitos,
imperiosa a mitigação do regime carcerário para o semiaberto, em observância ao art. 33, §
3º, do CP. TJMG (Em. 77/226)................................................................................................... 590
— Tóxicos. Tráfico em transporte público. Autoria. Pleito desclassificatório que não se acolhe.
Necessidade de traficância no coletivo. Confissão parcial que não faz incidir a atenuante.
Privilégio. Reincidência. Não configuração de bis in idem. Gratuidade. Juízo da execução.
Depoimentos de policiais têm o mesmo valor de qualquer outro testemunho, desde que
aufiram credibilidade, e, na hipótese vertente, ambos foram uníssonos em suas narrativas,
afirmando, com absoluta certeza, que o réu, ao ser preso em flagrante, admitiu que as drogas
apreendidas haviam sido adquiridas no Rio de Janeiro para ser revendidas, e não consumidas.
Não há que se falar em aplicação da atenuante da confissão, eis que o réu, apesar de admitir
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 695

estar portando as drogas apreendidas, disse que estas seriam para seu próprio consumo, o
que se revelou falso. TJRJ (Em. 77/289)..................................................................................... 616
— Violação de direito autoral. Sentença condenatória. Quadro suficiente para evidenciar a respon-
sabilidade penal do réu. Firmou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que a caracterização
do delito de violação de direito autoral (art. 184, § 2º, do CP) não reclama a identificação
das vítimas (titulares dos direitos autorais violados), bem como a perícia em todos os bens
apreendidos. A perícia pode restringir-se às características externas do material apreendido
Penas que comportam pequena alteração. TJSP (Em. 77/305)................................................... 622
PERMITIR OU ENTREGAR DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR A PESSOA NÃO
HABILITADA
— Acórdão do STF – Crime de perigo abstrato. Prescindibilidade do resultado naturalístico....... 491
PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE
— Lei Maria da Penha. Medida protetiva. Desnecessidade. Do relato da ofendida não se evidencia
risco à sua segurança que justifique a concessão da medida. TJRS (Em. 77/265)...................... 607
PRECLUSÃO
— Artigo de Marcellus Polastri Lima e Marciley Boldrini: “Reflexões e Particularidades sobre a
Preclusão, a Coisa Julgada e o Chamado ‘Trânsito em Julgado’ Penal”...................................... 446
PREFEITO MUNICIPAL
— Crime contra as finanças públicas. Assunção de obrigação no último ano do mandato. Art.
359-C do CP. Complementação da resposta escrita fora do prazo legal. Inviabilidade. Denúncia
recebida. TJRS (Em. 77/204)...................................................................................................... 579
— Crime de responsabilidade. Não apresentação de contas municipais (art. 1º, VII, do DL
201/67). Denúncia recebida, com rejeição do pedido de diligências formulado pelo MP. TJPI
(Em. 77/205).............................................................................................................................. 579
PRESCRIÇÃO
— Crime contra a ordem tributária. O termo inicial da prescrição da ação dos crimes materiais
previstos no art. 1º da Lei 8.137/90 é a data da consumação do delito, que, conforme a ju-
risprudência do STF, corresponde à data da constituição definitiva do crédito tributário. STF
(Em. 77/222).............................................................................................................................. 587
— Falta grave. Inocorrência. Ausência de prazo prescricional previsto na LEP. Adoção, por ana-
logia, daquele fixado pelo art. 109, VI, do CP. Perda de 1/3 dos dias remidos. Compatibilidade
com as circunstâncias do caso concreto. Falta disciplinar que constitui marco interruptivo de
benefício. TJSP (Em. 77/236)..................................................................................................... 595
— Marco interruptivo. Art. 117, IV, do CP. Sentença ou acórdão condenatórios. O acórdão con-
firmatório da condenação não constitui marco interruptivo da prescrição. STJ (Em. 77/266).. 607
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
— Acórdão do STJ – Furto. Inaplicabilidade. Concurso de agentes. Alto grau de reprovabilidade no
comportamento do acusado e esmaece a circunstância do diminuto valor do objeto furtado... 516
— Acórdão do STM – Furto. Inaplicabilidade. Teoria da amotio ou apprehensio. Crime consu-
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
mado. Devolução da res furtiva. Desclassificação da conduta. Incabível. Imediatamente após
o ocorrido, por si só, não autoriza a desclassificação da conduta delitiva, mas faculta ao Juiz
a redução da pena....................................................................................................................... 519
— Acórdão do TRF 2ª R. – Rádio comunitária. Ausência de registros de interferência na aero-
navegabilidade da região durante o período de operação. Princípios da insignificância e da
intervenção mínima e da subsidiariedade................................................................................... 531
— Acórdão do TRF 3ª R. – Descaminho. Aplicabilidade. Existência de outros processos penais
anteriormente ajuizados, bem como habitualidade extraída de autuações fiscais. Irrelevância. 539
— Furto privilegiado. Furto qualificado. Tentativa. Um fato é penalmente insignificante quando,
para os personagens nele envolvidos ou para a comunidade que o recepciona, nada de mais
expressivo representou em suas vidas ou em suas preocupações. A versão privilegiada não é
tecnicamente incompatível com as versões qualificadas do furto. Aliás, imperioso registrar o
atual entendimento do STJ reafirmando a possibilidade de aplicação do privilégio em casos de
furto qualificado, desde que presentes os requisitos legais (Súmula 511). TJSP (Em. 77/267). 607
PRISÃO DOMICILIAR
— Irresignação ministerial. Adolescente filha da apenada supostamente exposta à situação de
risco. Hipótese não prevista na legislação. Ausência de comprovação da imprescindibilidade
da presença da apenada para proteção da adolescente. Excepcionalidade não demonstrada.
Prisão domiciliar cassada. TJSC (Em. 77/268)........................................................................... 607
696 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

— Regime semiaberto. Monitoração eletrônica. Requisitos. Ausência. A fiscalização do preso


em regime semiaberto por meio de monitoração eletrônica se limita às situações de saída
temporária e prisão domiciliar, desde que estas preencham os requisitos da lei. TJAC (Em.
77/264)....................................................................................................................................... 607
— Substitutiva do regime aberto, mediante condições (sem monitoramento eletrônico). Possibili-
dade. No caso, diante da inexistência de casa de albergado e da situação peculiar retratada nos
autos, é de ser mantida a prisão domiciliar substitutiva concedida ao apenado sob condições,
a fim de evitar que ele cumpra a sua pena carcerária sob condições iguais ou semelhantes
àqueles que devem implementá-la sob regime mais gravoso. TJRS (Em. 77/206)..................... 580
PRISÃO PREVENTIVA
— Acórdão do STF – Homicídio qualificado. Excesso de prazo prisional configurado. Extensão
da ordem. Art. 580 do CPP......................................................................................................... 496
— Acórdão do STF – Revogação. Tóxicos.Tráfico e associação. Arts. 33 e 35 da Lei 11.343/06.
Prisão preventiva. Fundamentação inidônea. Motivação genérica e abstrata. Súmula 691/STF.
Afastamento. Concessão da ordem. Substituição da prisão preventiva por medidas cautelares
previstas no art. 319 do CPP, a serem fixadas pelo juízo de primeiro grau................................ 485
— Excesso de prazo. Configuração. Homicídio qualificado. Prolação de pronúncia. Súmula 21/
STJ. Hipótese de afastamento. No caso, não obstante a incidência hipotética, da Súmula 21/
STJ, porquanto proferida decisão de pronúncia, verifica-se que o mencionado entendimento
é de ser afastado. Não há o que justifique a manutenção de uma prisão preventiva há mais de
quatro anos sem ter havido um pronunciamento definitivo do Poder Judiciário, não tendo a
defesa em nada contribuído para tal demora, configurando, portanto, tal situação, odioso e
inaceitável constrangimento ilegal, por ofender os princípios da razoabilidade e da celeridade
dos processos. STJ (Em. 77/246)................................................................................................ 599
— Revogação. Tóxicos. Tráfico. Associação para o tráfico. Porte de munição. Corrupção de me-
nores. Liberdade concedida. Paciente primário, preso em 25 de junho de 2015, pela suposta
prática dos delitos de tráfico ilícito de drogas, associação para o tráfico, porte de munição e
corrupção de menores. Teriam sido apreendidas, no interior da residência do paciente, 85
pedrinhas de crack, 10 papelotes de cocaína, três munições intactas calibre 9mm, e uma pe-
quena quantidade de maconha – peso insignificante – sem indicação de peso. A quantidade
de droga apreendida, ainda que de naturezas distintas, não pode ser considerada de monta
expressiva – não há indicação de peso. Não restou demonstrada, no caso concreto, a efetiva
necessidade da prisão preventiva, medida extrema e excepcional. Ordem concedida. Liminar
ratificada. TJRS (Em. 77/290)..................................................................................................... 617
— Substituição. Roubo qualificado. Automóvel. Concurso de agentes e emprego de simulacro
de arma de fogo. Pacientes primários, sem quaisquer antecedentes policiais ou judiciais e que
possuem 19 e 23 anos de idade, respectivamente. Ausência de violência real e periculosidade
que permite a substituição da prisão preventiva pelas medidas cautelares previstas no art. 319,
I, III e IV, do CPP. TJRS (Em. 77/282)......................................................................................... 613
— Violência doméstica. Ameaça e descumprimento de medidas protetivas. Liberdade concedida.
Imposição de medida protetiva. Paciente primário, preso em 15 de julho de 2015, pela suposta
prática do delito de ameaça e pelo descumprimento de medidas protetivas. A prisão preventiva
decorrente do descumprimento de medidas protetivas ou em situação de violência à mulher
no âmbito da Lei Maria da Penha não pode ser abusiva, ou exagerada no tempo, porque tem
por finalidade justamente assegurar o cumprimento das medidas protetivas. Ocorre que,
transcorrido mais de um mês desde a prisão preventiva do paciente, não foi realizada – nem
ao menos designada – audiência com vistas a examinar alternativa diversa da prisão. Nesse
contexto, viável a concessão da liberdade. Determinação de expedição de alvará de soltura
na origem. TJRS (Em. 77/299).................................................................................................... 620
PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR
— Provas ilícitas por derivação. Não ocorrência. Prescrição. No caso, a correlação entre as condu-
tas apuradas pela comissão e as infrações penais “prevaricação” e “advocacia administrativa”
são feitas apenas pelo próprio impetrante, não tendo constado das conclusões da comissão
processante. Inexiste omissão na decisão agravada em que se apreciam as alegações devolvi-
das no recurso ordinário sem se avançar na análise de matérias que importam em inovação
recursal. STF (Em. 77/262)........................................................................................................ 606
PRONÚNCIA
— Homicídio qualificado. Impronúncia. Materialidade e indícios de autoria. Suficiência. In-
comportabilidade. Participação de menor importância. Motivo fútil. Recurso que dificultou
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 697

ou tornou impossível a defesa da vítima. Exclusão. Incomportabilidade. A participação de


menor importância do agente na empreitada criminosa (art. 29, § 1º, do CP) é matéria afeta
ao crivo dos jurados e aplicada à dosimetria da pena, realizada na hipótese de condenação
pelo Conselho de Sentença. A existência de indícios de que os autores agiram de surpresa, sem
possibilitar à vítima qualquer defesa, e manifesta a desproporção entre o motivo e a extrema
reação homicida, circunstância que configura a qualificadora do motivo fútil, estas bastam
para viabilizar a apreciação das qualificadoras pelo Tribunal popular. TJGO (Em. 77/272)...... 608
— Homicídio qualificado. Motivo fútil e por recurso que dificultou a defesa do ofendido. Ausência
de fundamentação. Nulidade. A decisão de pronúncia se caracteriza pela cognição sumária
e superficial dos elementos probatórios, a teor do que dispõe o art. 413 do CPP, devendo
conter a devida fundamentação, conforme determina o art. 93, IX, da CF, porém, a decisão
questionada não apresenta motivação concreta em relação às qualificadoras, o que impõe a
declaração de nulidade desta. TJGO (Em. 77/247).................................................................... 599
— Homicídio qualificado. Recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa da vítima. Recurso da
defesa postulando exclusão da qualificadora. Nulidade da sentença de pronúncia. Absolvição
sumária. Afastamento da qualificadora e revogação do decreto de prisão preventiva. Não é
a dificuldade ou a impossibilidade de exercitar defesa pela vítima que qualifica o homicídio
pelo modo de execução, mas a ação insidiosa do réu, tipificada na traição, na emboscada, na
dissimulação ou em outro recurso análogo. TJGO (Em. 77/273).............................................. 609
PROVA EMPRESTADA
— Confirmada sob o crivo do contraditório. Análise das provas. Atribuição do Conselho de
Sentença. Ausência de prova inequívoca. Caderno processual suficiente a indicar a prova da
materialidade e indícios da autoria dos fatos supostamente criminosos. In dubio pro societate.
Imperatividade. A testemunha ocular é categórica ao atribuir ao apelante a autoria do crime,
seu testemunho colhido em sede judicial afasta qualquer nulidade, visto que não houve cerce-
amento de defesa, na medida em que a prova foi produzida sob o crivo do contraditório e da
ampla defesa. Ademais, a prova emprestada é admitida no ordenamento jurídico pátrio, salvo
se produzida de maneira ilícita, o que não restou demonstrado no caso. TJAL (Em. 77/252).. 602
PROVA ILÍCITA
— Violação de direito autoral. Falsificação, adulteração ou alteração de produtos destinados a
fins terapéuticos ou medicinais previstos nos arts. 184, § 2º, e 273, § 1º-B, I, na forma do
art. 69, todos do CP. Mandados de busca e apreensão cumpridos de forma ilegítima e sem
a observância das normas legais. Violação ao art. 564, IV, do CPP. Absolvição que se impõe,
igualmente ante a ausência de lesão ao bem jurídico tutelado quanto ao delito previsto no
art. 273 do CP e com relação ao art. 184, § 2º, do CP a absolvição se impõe, uma vez que a
denuncia não identificou os lesados cujas obras tiveram o direito autoral violado. Atipicidade
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
da conduta que se reconhece. TJRJ (Em. 77/298)...................................................................... 619
PROVA ORAL
— Gravada em meio audiovisual. Apelação. Ministério Público. Pedido de conversão em diligência
para degravação. Indeferimento pelo Tribunal de Justiça. Cerceamento de defesa. Art. 405,
§ 2º, do CPP. Princípio da celeridade processual. Não se verifica cerceamento de defesa no
indeferimento do pleito formulado pela Procuradoria de Justiça, de conversão do julgamento
em diligência, para degravação de prova oral, consoante se extrai do art. 405, § 2º, do CPP,
segundo o qual os registros por meio audiovisual não requerem a respectiva transcrição. STJ
(Em. 77/274).............................................................................................................................. 609

—Q—
QUEIXA-CRIME
— Calúnia, difamação e injúria. Declarações proferidas em ambiente eleitoral e para fins de
propaganda eleitoral. Emendatio libelli. Desclassificação. Ilegitimidade ativa ad causam não
reconhecida. Mérito favorável ao acusado. Incidência do princípio do favor rei. Figuras pú-
blicas. Declarações tematicamente pertinentes à dialética eleitoral. Atipicidade de conduta.
Rejeição da queixa-crime. STF (Em. 77/213)............................................................................. 583
698 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

—R—
RÁDIO COMUNITÁRIA
— Acórdão do TRF 2ª R. – Ausência de registros de interferência na aeronavegabilidade da região
durante o período de operação. Princípios da insignificância e da intervenção mínima e da
subsidiariedade........................................................................................................................... 531
— Apreensão de equipamentos. Radiodifusão. Funcionamento sem autorização. Busca e apre-
ensão. Via adequada. Ordem judicial. Possibilidade. Imóvel comercial que não se enquadra
na definição de casa do art. 150 do CP. TRF 1ª R. (Em. 77/212)................................................ 582
RECEPTAÇÃO
— Conduzir veículo que sabe ser produto de crime. Materialidade e autoria suficientemente
provadas. Diante do dolo direto do agente no recebimento e condução de bem de origem
ilícita, configura-se o crime de receptação. TJSP (Em. 77/242)................................................. 598
RECLAMAÇÃO
— Execução de pena privativa de liberdade. Remição. Cometimento de falta grave. Perda dos
dias remidos. Recepção do art. 127 da LEP (na redação dada pela Lei 12.433/2011) pela
vigente ordem constitucional. Súmula Vinculante 09/STF. Reclamação julgada procedente. É
dispensável o encaminhamento do processo à Procuradoria-Geral da República, para parecer,
se esta, em causas anteriores, já se pronunciou, definitivamente, sobre idêntica controvérsia
jurídica. Em ocorrendo tal situação, a ausência de pronunciamento do Ministério Público
não constituirá hipótese de nulidade processual. STF (Em. 77/276)......................................... 610
— Recebimento de denúncia na justiça de primeiro grau. Conexão e continência com delitos
apurados perante o STF. Imputação de crime à autoridade detentora de foro privilegiado. Ino-
corrência. Posterior cisão das investigações por determinação do STF. Ausência de usurpação
de competência desta Corte. STF (Em. 77/275)......................................................................... 609
RECUSA DE OBEDIÊNCIA
— Militar previamente designado em escala de serviço. Ordem emanada de superior hierárquico.
Negativa de realizar as funções de sargento de dia. Assunto afetado ao serviço da caserna.
Infração ao preceito incriminador do art. 163 do CPM. Sentença condenatória mantida. STM
(Em. 77/207).............................................................................................................................. 580
REFLEXÕES E PARTICULARIDADES SOBRE A PRECLUSÃO, A COISA JULGADA E O
CHAMADO “TRÂNSITO EM JULGADO” PENAL
— Artigo de Marcellus Polastri Lima e Marciley Boldrini............................................................... 446
REINCIDÊNCIA
— Furto qualificado. Pena. Regime inicial semiaberto. Possibilidade. Ao réu reincidente con-
denado à pena inferior a quatro anos é possível a fixação do regime semiaberto como inicial
para o cumprimento da pena, desde que ausentes circunstâncias judiciais desfavoráveis, de
acordo com a Súmula 269/STJ. É de se manter a custódia cautelar quando decretada para a
garantia da ordem pública para evitar a reiteração criminosa, adequando-a, contudo, ao regime
semiaberto de cumprimento da pena. TJAC (Em. 77/240)........................................................ 597
RENATO MARCÃO E RODRIGO TANAMATI
— Artigo: “Condução Coercitiva em CPI: a Legalidade da Condução Coercitiva de Testemunha,
Determinada por Comissão Parlamentar de Inquérito”............................................................. 464
REPARAÇÃO DE DANOS
— Impossibilidade de exclusão da indenização fixada a título de reparação pelos danos sofridos
pela família da vítima. Não há necessidade de pedido formal de fixação de valor mínimo para
fins de reparação dos danos causados pela infração, nos termos do art. 387, IV, do CPP. TJGO
(Em. 77/251).............................................................................................................................. 601
RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA
— Artigo: “A Vítima no Processo Penal Brasileiro”......................................................................... 368
ROUBO
— Acórdão do STJ – Pena. Regime inicial fechado. Motivação insuficiente. Ordem concedida de
ofício. Deve ser mantida a fixação do regime semiaberto ao paciente primário, condenado a
seis anos, dois meses e 20 dias de reclusão e sem registro de circunstâncias judiciais desfavo-
ráveis, a teor do art. 33, § 2º, b, do CP....................................................................................... 507
ROUBO DUPLAMENTE QUALIFICADO
— Pena. Terceira fase da dosimetria. Aplicação de fração superior a 1/3. Fundamentação concreta.
Súmula 443/STJ. Não aplicação. Ausência de fundamentação concreta para a fixação de regime
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 699

inicial mais gravoso. Súmulas 440/STJ, 718 e 719/STF. Concessão da ordem, de ofício, para
fixar o regime inicial semiaberto. STJ (Em. 77/283).................................................................. 613
ROUBO QUALIFICADO
— Acórdão do TJRJ – Emprego de arma e em concurso de pessoas. Divergência. Voto vencido.
Fração relativa às causas de aumento da pena. Redução para o menor patamar (1/3). Resgate.
Possibilidade. Extensão de efeitos aos corréus. A fração eleita para majoração da reprimenda
em razão das causas de aumento da pena deve ser motivada quanto ao caso concreto, e não
somente em relação à quantidade de majorantes (Súmula 443 do STJ)..................................... 561
— Automóvel. Concurso de agentes e emprego de simulacro de arma de fogo. Pacientes primá-
rios, sem quaisquer antecedentes policiais ou judiciais e que possuem 19 e 23 anos de idade,
respectivamente. Ausência de violência real e periculosidade que permite a substituição da
prisão preventiva pelas medidas cautelares previstas no art. 319, I, III e IV, do CPP. TJRS (Em.
77/282)....................................................................................................................................... 613
— Faca e concurso de agentes. Na hipótese, a faca utilizada pelo recorrente para ameaçar a vítima
para entregar o celular representa inegavelmente uma ameaça grave e a toda evidência é um
artefato que, por sua natureza, possui notória capacidade lesiva, podendo ser considerada
arma imprópria, justificando a configuração da majorante. De igual modo, não assiste razão
à defesa quando pede que seja reconhecida a tentativa. TJRJ (Em. 77/281).............................. 613
— Pena. Terceira fase da dosimetria. Majoração acima do mínimo legal. Critério quantitativo.
Constrangimento ilegal evidenciado. Regime inicial fechado. Fundamentação insuficiente.
Ilegalidade. Ordem concedida, de ofício, e fixação do regime semiaberto, confirmando-se os
efeitos da liminar anteriormente deferida. STJ (Em. 77/280)..................................................... 612
— Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Valor significante do bem subtraído. Atenuante
genérica do art. 66 do CP. Não reconhecimento. Recorrer em liberdade. Não cabimento. Mo-
tivação per relationem. Fundamentação arrolada na lei processual penal. Garantia da ordem
pública. Condições pessoais favoráveis. Irrelevância. TJMG (Em. 77/284)............................... 614

—S—
SAÍDA ESPECIAL
— Cômputo da pena. O período em que o apenado permaneceu com o benefício excepcional
deverá ser computado como pena cumprida. TJRS (Em. 77/285).............................................. 614
SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO MULTIMÍDIA
— Transmissão irregular de sinal de internet a terceiros via radiofrequência. Caracterização como
serviço de telecomunicação suscetível de autorização da Anatel. Subsunção da conduta do
denunciado ao disposto no art. 183 da Lei 7.492/97. Desclassificação para o crime do art. 70
da Lei 4.117/62. Impossibilidade. Legalidade na dosimetria da pena. Inexistência de exorbi-
tância na fixação da pena em dois anos e nove meses de reclusão, acrescida da multa de R$
10.000,00 como determinado na lei. TRF 5ª R. (Em. 77/286)................................................... 614

—T—
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO

TÓXICOS
— Acórdão do STF – Tráfico e associação. Arts. 33 e 35 da Lei 11.343/06. Prisão preventiva.
Fundamentação inidônea. Motivação genérica e abstrata. Súmula 691/STF. Afastamento.
Concessão da ordem. Substituição da prisão preventiva por medidas cautelares previstas no
art. 319 do CPP, a serem fixadas pelo juízo de primeiro grau.................................................... 485
— Adequação ao tipo legal previsto no art. 290, caput, do CPM, na modalidade “trazer consigo”.
Réu confesso. Impossibilidade de aplicação dos princípios da insignificância e da proporcio-
nalidade. Não incidência da Lei 11.343/06. STM (Em. 77/258)................................................. 604
— Pena. Tráfico de drogas minorado. Abrandamento do regime prisional e modificação das penas
restritivas de direitos. Necessidade. Embargos acolhidos. Tendo as penas dos réus sido fixadas
no mínimo legal e reduzidas na fração máxima prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06,
sendo a reprimenda privativa de liberdade substituída por restritivas de direitos, imperiosa
a mitigação do regime carcerário para o semiaberto, em observância ao art. 33, § 3º, do CP.
TJMG (Em. 77/226).................................................................................................................... 590
— Tráfico. Absolvição e desclassificação mantidas. Desclassificação para uso. Não demonstradas
autoria e a materialidade da traficância, impõe-se a absolvição. Evidenciada a posse para uso,
imperiosa a desclassificação, de ofício, e manutenção quanto ao corréu. TJGO (Em. 77/287). 615
— Tráfico. Art. 33, caput, da Lei 11.343/06. Sentença condenatória. Pena fixada no mínimo legal
de cinco anos. Aplicação da minorante do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. Pena definitiva
700 Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015

de um ano e oito meses de reclusão. Apelação provida para retirar a minorante. Fundamento.
Paciente dedicado ao tráfico. Grande quantidade de entorpecente. Premissa não condizente
com a realidade dos autos. 25,80g de cocaína acondicionada em 26 invólucros. Quantidade
inapta a induzir à traficância reiterada (fundamento para decotar a minorante). Primariedade,
bons antecedentes, residência fixa e vários registros de emprego na CTPS. Traficante eventual
movido pelas circunstâncias. Constrangimento ilegal. Ordem de HC concedida de ofício (art.
654, § 2º, do CPP). STF (Em. 77/288)....................................................................................... 615
— Tráfico. Associação para o tráfico. Porte de munição. Corrupção de menores. Liberdade con-
cedida. Paciente primário, preso em 25 de junho de 2015, pela suposta prática dos delitos de
tráfico ilícito de drogas, associação para o tráfico, porte de munição e corrupção de menores.
Teriam sido apreendidas, no interior da residência do paciente, 85 pedrinhas de crack, 10
papelotes de cocaína, três munições intactas calibre 9mm, e uma pequena quantidade de
maconha – peso insignificante – sem indicação de peso. A quantidade de droga apreendida,
ainda que de naturezas distintas, não pode ser considerada de monta expressiva – não há
indicação de peso. Não restou demonstrada, no caso concreto, a efetiva necessidade da prisão
preventiva, medida extrema e excepcional. Ordem concedida. Liminar ratificada. TJRS (Em.
77/290)....................................................................................................................................... 617
— Tráfico em transporte público. Autoria. Pleito desclassificatório que não se acolhe. Necessi-
dade de traficância no coletivo. Confissão parcial que não faz incidir a atenuante. Privilégio.
Reincidência. Não configuração de bis in idem. Gratuidade. Juízo da execução. Depoimentos de
policiais têm o mesmo valor de qualquer outro testemunho, desde que aufiram credibilidade,
e, na hipótese vertente, ambos foram uníssonos em suas narrativas, afirmando, com absoluta
certeza, que o réu, ao ser preso em flagrante, admitiu que as drogas apreendidas haviam sido
adquiridas no Rio de Janeiro para ser revendidas, e não consumidas. Não há que se falar em
aplicação da atenuante da confissão, eis que o réu, apesar de admitir estar portando as drogas
apreendidas, disse que estas seriam para seu próprio consumo, o que se revelou falso. TJRJ
(Em. 77/289).............................................................................................................................. 616
TRABALHO EXTERNO
— Acórdão do TJRS – Pena. Regime semiaberto. Benefícios externos. Inexigibilidade de preen-
chimento do requisito objetivo de 1/4 de cumprimento da pena privativa de liberdade........... 566
TRABALHO EXTERNO E SAÍDAS TEMPORÁRIAS
— Pena. Progressão de regime. Semiaberto. Requisitos atendidos. Benefícios não recomendados
pelo exame criminológico. Permanecem indeferidos os benefícios do trabalho externo e das
saídas temporárias, até que haja parecer favorável a respeito. TJMG (Em. 77/271).................. 608
TRANSMISSÃO IRREGULAR DE SINAL DE INTERNET
— Terceiros via radiofrequência. Caracterização como serviço de telecomunicação suscetível de
autorização da Anatel. Subsunção da conduta do denunciado ao disposto no art. 183 da Lei
7.492/97. Desclassificação para o crime do art. 70 da Lei 4.117/62. Impossibilidade. Legalidade
na dosimetria da pena. Inexistência de exorbitância na fixação da pena em dois anos e nove
meses de reclusão, acrescida da multa de R$ 10.000,00 como determinado na lei. TRF 5ª R.
(Em. 77/286).............................................................................................................................. 614

—U—
UNIFICAÇÃO DE PENAS
— Crime continuado. Ausência de nexo de continuidade entre os delitos praticados. Condições
de tempo, lugar e maneira de execução que indicam apenas a habitualidade criminosa do
agravante. Inaplicabilidade. TJSP (Em. 77/292)......................................................................... 618
— Regime semiaberto. Superveniência de condenação à pena restritiva de direitos. Incompatibi-
lidade de cumprimento simultâneo das reprimendas. Unificação, de rigor. Conversão da pena
restritiva de direitos em privativa de liberdade. Art. 111, parágrafo único, da Lei 7.210/84.
Inaplicabilidade do art. 76 do CP. TJSP (Em. 77/263)................................................................ 606
USO DE DOCUMENTO FALSO
— Apresentado perante órgão federal. Crime impossível não verificado. Competência da Justiça
Federal. Uma vez que o documento contrafeito possui mínima potencialidade de ludibriar a
fé pública, impossível concluir por sua absoluta impropriedade do objeto e crime impossível.
TRF 2ª R. (Em. 77/295).............................................................................................................. 618
— Prisão preventiva. Motivação insuficiente para manutenção. Se o réu é primário, não ostenta
registros criminais e o contexto fático que permeou a ação criminosa a ele imputada não ex-
trapola a gravidade inerente ao próprio tipo penal, em tese violado, inexistindo justificativa
Revista Jurídica LEX Nº 77 — Set-Out/2015 701

objetiva para sua permanência sob custódia, concede-se a liberdade provisória. TJGO (Em.
77/294)....................................................................................................................................... 618
— Restando devidamente comprovadas a existência do crime e a sua autoria, resta afastado o
pleito por absolvição. Não realização dos exames de praxe para obtenção da carteira de ha-
bilitação, cujo recebimento se deu mediante pagamento a terceiro. Falsidade conhecida pelo
agente. TJPE (Em. 77/293)......................................................................................................... 618

—V—
VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL
— Absolvição. Necessidade. Para comprovar a materialidade do delito descrito no art. 184, §
2º, do CP, o expert não pode se limitar ao exame externo dos CDs e DVDs arrecadados, pois,
ainda que se verifique uma falsidade, a violação dos direitos do autor somente se configura
com a certeza de que houve reprodução de alguma obra, ou seja, que existe uma gravação
não autorizada. TJMG (Em. 77/304).......................................................................................... 622
— Julgados parcialmente procedentes os pedidos contidos na denuncia para condenar os réus
Paulo Cesar e Ana Paula na forma da denuncia e o réu Carlos Alberto somente pelo delito
previsto no art. 184, § 2º, do CP, absolvendo-o do delito previsto no art. 273, § 1º, do CP por
precariedade de prova. Mandados de busca e apreensão cumpridos de forma ilegítima e sem
a observância das normas legais. Violação ao art. 564, IV, do CPP. Absolvição que se impõe,
igualmente ante a ausência de lesão ao bem jurídico tutelado quanto ao delito previsto no
art. 273 do CP e com relação ao art. 184, § 2º, do CP a absolvição se impõe, uma vez que a
denuncia não identificou os lesados cujas obras tiveram o direito autoral violado. Atipicidade
da conduta que se reconhece. TJRJ (Em. 77/298)...................................................................... 619
— Sentença condenatória. Quadro suficiente para evidenciar a responsabilidade penal do réu.
Firmou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que a caracterização do delito de violação
de direito autoral (art. 184, § 2º, do CP) não reclama a identificação das vítimas (titulares
dos direitos autorais violados), bem como a perícia em todos os bens apreendidos. A perícia
pode restringir-se às características externas do material apreendido. Penas que comportam
pequena alteração. TJSP (Em. 77/305)....................................................................................... 622
— Venda de CDs e DVDs falsificados (art. 184, § 2º, do CP). Materialidade delitiva não demons-
trada. Laudo pericial lacunoso. Absolvição. TJSP (Em. 77/297)................................................ 619
VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO
— Apreensão de equipamentos. Radiodifusão. Rádio comunitária. Funcionamento sem autori-
zação. Busca e apreensão. Via adequada. Ordem judicial. Possibilidade. Imóvel comercial que
não se enquadra na definição de casa do art. 150 do CP. TRF 1ª R. (Em. 77/212)..................... 582
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
— Ameaça e descumprimento de medidas protetivas. Liberdade concedida. Imposição de medida
protetiva. Paciente primário, preso em 15 de julho de 2015, pela suposta prática do delito
de ameaça e pelo descumprimento de medidas protetivas. A prisão preventiva decorrente do
descumprimento de medidas protetivas ou em situação de violência à mulher no âmbito da
ÍNDICE ALFABÉTICO-REMISSIVO
Lei Maria da Penha não pode ser abusiva, ou exagerada no tempo, porque tem por finalidade
justamente assegurar o cumprimento das medidas protetivas. Ocorre que, transcorrido mais
de um mês desde a prisão preventiva do paciente, não foi realizada – nem ao menos desig-
nada – audiência com vistas a examinar alternativa diversa da prisão. Nesse contexto, viável
a concessão da liberdade. Determinação de expedição de alvará de soltura na origem. TJRS
(Em. 77/299).............................................................................................................................. 620
— Competência. Incidência da Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) não configurada. Violência
baseada no gênero. Relação de superioridade do agressor e inferioridade da vítima. Inocorrên-
cia. Competência da Quarta Vara Criminal da Capital (juízo suscitante), para processamento
e julgamento do feito. TJAM (Em. 77/218)................................................................................ 585
— Medidas protetivas contra a paciente, determinando o afastamento do lar, e a proibição de
contato e de aproximação com a ofendida. Impossibilidade de acesso aos bens que se encon-
tram na residência. Concede-se, em parte, a ordem, confirmando-se a liminar que autorizou
o ingresso da paciente no imóvel, acompanhada por Oficial de Justiça, para resgatar seus
pertences, documentos pessoais e móveis, a fim de que o imóvel seja oferecido à locação.
TJDF (Em. 77/259)..................................................................................................................... 605

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