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ARQUITETURA E URBANISMO
ANDRÉ ARAÚJO
ELOAH MARTINS
FERNANDA RÍGOLO
PRESIDENTE PRUDENTE
2019
ANDRÉ ARAÚJO
ELOAH MARTINS
FERNANDA RÍGOLO
PRESIDENTE PRUDENTE
2019
1. Expor a analogia entre o visível e o inteligível.
Platão relaciona a alma às essências a partir da imagem do sol. Assim, pode-se destacar
que a luz do sol é o elemento que permite a percepção dos objetos sensíveis, de modo que aquilo
que é bom torna-se um elemento propagador para compreender as essências pela alma, ou seja,
quando a alma é sustentada pela verdade, aquela compreende e aponta deter de inteligência,
todavia, se se sustentar no que é obscuro, sua visão fica turva e assemelha-se a alguém
desprovido de inteligência. Nota-se, a analogia entre o olho e a alma, assim como entre a vista
e a inteligência. A partir disso, é possível depreender assim como o sol é a causa da visão, de
maneira análoga, o bem o é da inteligência. Ainda, da mesma forma que a visão depende da
presença do sol, assim também, só haverá inteligência na alma se esta estiver na presença do
bem.
No último trecho da imagem do sol, Sócrates traz, novamente, o sol e o bem e ressalta
a relação analógica entre estes.
- Imagina então – comecei eu – que, conforme dissemos, eles são dois e que reinam,
um na espécie e no mundo inteligível, o outro no visível. Não digo ‹‹no céu››, não vás
tu julgar que estou a fazer etimologias com o nome. Compreendeste, pois, estas duas
espécies, o visível e o inteligível? – Compreendi. 2
1
Platão, República, 508a-c
2
Platão, República, 509d
Com base na citação exposta acima, fica explicito e definido que há duas dimensões,
desiguais, que compõem o todo da realidade: a visível e a inteligível.
Supões então uma linha cortada em duas partes desiguais; corta novamente cada um
dos segmentos segundo a mesma proporção, o da espécie visível e o da inteligível; e
obterás, no mundo visível, segundo a sua claridade ou obscuridade relativa, uma
secção, a das imagens.2 Chamo imagens, em primeiro lugar, às sombras;
seguidamente, aos reflexos nas águas, e àqueles que se formam em todos os corpos
compactos, lisos e brilhantes, e a tudo o mais que for do mesmo gênero, se estás a
entender-me. 33
Sócrates descreve o segmento inteligível a partir do modo como a alma conduz sua
busca e os instrumentos nos quais utiliza para investigar. Daí, deve-se salientar que o segmento
inteligível caracteriza-se pela presença da imagem a partir do movimento da alma na busca por
inteligibilidade. Durante a busca pela inteligibilidade, a alma é levada a criar imagens, campo
em que busca hipóteses que levam a outras hipóteses, gerando deste processo, suas próprias
conclusões. Para exemplificar, Sócrates trata dos geômetras, uma vez que estes criam as
3
Platão, República, 509d-510a
imagens matemáticas e em seguida deduzem seus raciocínios a partir destas. A segunda parte
do inteligível caracteriza-se pela ausência da imagem no movimento de busca da alma, a partir
de uma hipótese, de uma conclusão. Novamente, Sócrates exemplifica para Gláucon a atividade
dos geômetras, os quais ao se utilizarem de noções-imagens que levam a deduzir um raciocínio,
chegam a uma conclusão. Assim, torna-se possível afirmar que o investigador se baseia de
formas visíveis, seja direta ou indiretamente, para chegar naquilo que a forma visível tem
semelhança. Sócrates esclarece isto quando cita que os geômetras
Fazem os seus raciocínios por causa do quadrado em si ou da diagonal em si, mas não
daquela cuja imagem traçaram, e do mesmo modo quanto às restantes figuras. 4
A reflexão utiliza a imagem como forma de aproximar daquilo que não pode ser visto
por imagem, nos levando a observar sensivelmente aquilo o qual só pode ser visto pelo olhar
da inteligibilidade. De maneira geral, a reflexão só pode gerar raciocínios se apoiada por
imagens nas quais são recursos criados pela própria reflexão e não as realidades verdadeiras,
promovendo confusão em relação às imagens com aquilo de que são imagens.
Em suma, Sócrates estabelece as quatro afecções que surgem na alma as quais podem
ser correlacionadas as quatro partes dos dois segmentos (inteligível e visível): a inteligência
como seção súpera, já que seu escopo são os entes inteligíveis, o entendimento como intermédio
entre a opinião e a inteligência entendido como permanente apreensão, por meio da alma, de
uma realidade imutável, a fé, e a suposição afetada por imagens, ordenando-as por analogia,
uma vez que quanto mais participam da verdade, mais possuem clareza. Portanto, em uma
rápida comparação entre a analogia do sol e a correspondência desta com a linha dividida e a
analogia da caverna, pode-se depreender que o fogo está para a caverna, assim como o Sol está
para o dia, o qual implica que o Sol está para o mundo sensível, assim como o Bem está para o
4
Platão, República, 510d-e
mundo inteligível, expondo o que Platão afirma que o Sol é o filho do Bem e que o Bem gerou
o Sol – para o sensível – segundo a sua semelhança – no inteligível.
Para tratar das diferenças entre o inteligível e o visível, Platão utiliza a Alegoria da
Caverna no Livro VII da República, em que narra-se o diálogo de Sócrates com seu amigo
Glauco a respeito de uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia, onde é
descrito a situação geral na qual está inserida a humanidade. Para tratar da questão entre o
visível e o inteligível, Platão utilizou a linguagem alegórica de modo que apresentasse como os
homens estavam presos a imagens, sombras ou preconceitos e superstições, constituindo-se o
mundo visível/sensível. Platão descreve esta situação a partir da imagem de um grupo de
homens que nasceram e passaram parte de suas vidas dentro de uma caverna, imobilizados por
correntes e obrigados a olhar apenas para a parede à sua frente. Devido ao tempo que passaram
dentro da caverna, os homens estavam totalmente acostumados com esta situação, na qual
contemplavam o que pensavam ser o mundo, apenas das sombras refletidas no fundo da caverna
pela pouca luz que havia atrás destes. Em uma certa ocasião, um dos prisioneiros tomou como
decisão a sua libertação e voltou-se para o lado exterior da caverna. Ao sair, ficou cego devido
à intensa luz presente no mundo exterior. Gradativamente, os olhos deste homem foram se
acostumando à claridade e enxergaram um mundo distinto, apresentando imagens notavelmente
distintas da quais enxergava no interior da caverna.
E se lhe fosse necessário julgar daquelas sombras em competição com os que tinham
estado sempre prisioneiros, no período em que ainda estava ofuscado, antes de adaptar
a vista – e o tempo de se habituar não seria pouco – acaso não causaria o riso, e não
diriam dele que, por ter subido ao mundo superior, estragara a vista, e que não valia a
pena tentar a ascensão? E a quem tentasse soltá-los e conduzi-los até cima, se
pudessem agarrá-lo e mata-lo, não o matariam? – Matariam, sem dúvida – confirmou
ele. – Meu caro Glaúcon, este quadro – prossegui eu – deve agora aplicar-se a tudo
quanto dissemos anteriormente, comparando o mundo visível através dos olhos à
caverna da prisão, e a luz da fogueira que lá existia à força do Sol. Quanto à subida
ao mundo superior e à visão do que lá se encontra, se a tomares como a ascensão da
alma ao mundo inteligível, não iludirás a minha expectativa, já que é teu desejo
conhece-la. O Deus sabe se ela é verdadeira. Pois, segundo entendo, no limite do
cognoscível é que se avista, a custo, a ideia do Bem; e, uma vez avistada, compreende-
se que ela é para todos a causa de quanto há de justo e belo; que, no mundo visível,
foi ela que criou a luz, da qual é senhora; e que, no mundo inteligível, é ela a senhora
da verdade e da inteligência, e que é preciso vê-la para se ser sensato na vida particular
e pública. 5
5
Platão, República, 517a-c
A partir dessa alegoria, Platão divide o mundo em duas realidades: o sensível/visível
no qual consiste no conhecimento obtido através dos sentidos como a visão, audição, olfato,
tato e paladar, podendo ocorrer numa experiência particular de um indivíduo com um objeto na
qual é exposta pelo exemplo de um indivíduo comendo uma maçã, conhecendo-a através de
seus sentidos, ou no diálogo de duas pessoas em que ocorre o conhecimento de ambos. Disso,
é importante observar que as proposições são frutos de experiências subjetivas nos quais devem
ser chamadas de “opiniões” (doxa). Isto fica claro no momento em que comparecem problemas
como “Para qualquer indivíduo a maçã é doce e macia? ” ou “Para qualquer indivíduo tal pessoa
é educada e outra é ansiosa? ”; todavia, a realidade inteligível diferencia-se do sensível/visível
uma vez que o conhecimento é obtido através do intelecto como pensamento, intuição
intelectual, etc. Pode ser tratado como exemplo o caso de uma pessoa leiga (não cientista) sabe
da existência de células-tronco através de uma reportagem cientifica transmitida na televisão
ou publicada em uma revista, mesmo sem ter visto quaisquer células-tronco. Trata-se, portanto,
de um conhecimento objetivo (não subjetivo) comum a qualquer pessoa. Os filósofos gregos o
denominaram de episteme (opinião verdadeira). Em suma, pode-se referir a dois fluentes do
conhecimento – sentido e razão – e, dois objetos do conhecimento nos quais tangem a uma
realidade múltipla material que sujeita-se ao espaço e tempo, objeto da opinião; e a uma
realidade imutável, una e imaterial, transcendente ao sensível e que atribui razão da existência
da diversidade das coisas (MORENTE, 1970 apud MENEGHETTI, 2004). Ainda, tratando do
que foi exposto anteriormente, Platão presumia que a verdade fixa não era alcançada devido a
diversidade e mutabilidade das coisas, como o exige o conhecimento científico (episteme). É
falso e ilusório aquilo que o mundo oferece aos sentidos, diferentemente do inteligível, local
onde se encontram as verdade, entes e realidades em estado de pureza. Portanto, é importante
destacar que cada coisa no mundo sensível tem sua ideia no mundo inteligível. Desse modo, as
ideias são essências que existem das coisas do mundo sensível. Também, Platão acreditava que
a ciência deve ter por objeto as ideias, aquilo que é real, sabendo que o conhecimento resulta
em iluminar a ação e facilitar o esforço para o Bem, este princípio da ciência e da verdade
(PLATÃO, 1973 apud MENEGHETTI, 2004). “Nosso conhecimento consiste em elevar-nos
por meio da dialética do mundo sensível a uma intuição intelectual desse mundo suprassensível,
composto de ideias” (MENEGUETTI, 2004). Um exemplo importante a ser ressaltado são as
ciências matemáticas, que segundo a teoria platônica, encontram-se no mundo inteligível,
contudo em uma região inferior a dialética. O conhecimento do ser e do inteligível adquirido
pela dialética é dissemelhante àquele o qual se tem acesso pelas ciências matemáticas, pois
nestas a alma depende dos originais do mundo visível, ou seja, procede-se a partir de hipóteses
rumo a uma conclusão, fazendo uso do raciocínio, enquanto a dialética traça um movimento
contrário, já que leva a um princípio não hipotético, o Bem, além de ser atingida por meio
exclusivo das ideias tomadas em si próprias sem o auxílio de imagens, aquelas utilizadas pelos
matemáticos.
De modo geral, para Platão, o mundo visível e inteligível são dois mundos
completamente distintos. Para o primeiro é um mundo da aparência, do devir dos contrários (o
mundo dos prisioneiros da caverna), uma cópia ou sombra do mundo verdadeiro e real, diferente
do segundo, que caracteriza o mundo verdadeiro, das essências imutáveis, sem contradições
nem oposições, sem transformações, e nenhum ser passa para o seu contraditório, o mundo da
identidade, da permanência, da verdade, conhecido pelo intelecto puro. O mundo visível é o
mundo das coisas, o mundo do Não-Ser, uma cópia deformada do mundo inteligível das ideias.
O mundo inteligível é o mundo das ideias, o mundo do Ser. A partir das diferentes formas de
saber fundamentadas na separação entre o mundo sensível e o mundo inteligível, deve-se
afirmar que a alma sairia do sensível, este o nível mais básico do conhecimento, a“eikasía”,
caracterizada pelo conhecimento baseado somente nas imagens dos seres, até atingir o mais alto
conhecimento, a episteme. Entre estes conhecimentos encontra-se o conhecimento da doxa e da
diánoia. O homem então sairia do conhecimento mais baixo, aquele baseado somente nas
imagens dos seres. Alcançaria, ainda no mundo visível, o conhecimento da mutabilidade e da
imperfeição, qualificado pelo conhecimento das coisas sensíveis ou materiais. Em um terceiro
momento, o homem ao alcançar o conhecimento matemático, já estaria no mundo inteligível,
pois é um modo de conhecimento abstrato e racional no qual não depende dos sentidos para
atingir a verdade. O último e mais alto estágio do conhecimento é o conhecimento por
excelência, onde o homem atingiria as ideias perfeitas, as formas inteligíveis, as essências das
coisas. Neste último estágio, o homem chegaria no conhecimento de fato. Por fim, deve-se
enfatizar que as ideias ou formas existem em um sistema hierárquico, em que no topo dessa
hierarquia estaria a ideia do Bem, a mais importante de todas as ideias. A passagem de um grau
para outro se dá através da dialética, que resume ao encontro do homem com as contradições
no nível de conhecimento inferior e passa ao grau seguinte. Em relação ao exposto, a educação
ocupa papel fundamental na filosofia platônica, já que é através desta que a alma é direcionada
de modo a contemplar a ideia do Bem.
A educação [...] seria a arte desse desejo, a maneira mais fácil e mais eficaz de fazer
dar a volta a esse órgão, não a de o fazer obter a visão, pois já a tem, mas, uma vez
que ele não está na posição correcta e não olha para onde deve, dar-lhe os meios para
isso. 6
3. O que é o devir?
Devir (do latim devenire, chegar) é um conceito filosófico que significa as mudanças
pelas quais passam as coisas. O conceito de "se tornar" nasceu no leste da Grécia antiga pelo
filósofo Heráclito de Éfeso que no século VI a.C., disse que nada neste mundo é permanente,
exceto a mudança e a transformação. Sua teoria está em oposição com a de Parmênides, outro
filósofo grego que acreditava que as mudanças ônticas ou os "tornar-se" que percebemos com
nossos sentidos é algo enganoso, que há pura perfeição e eternidade por trás da natureza, e que
esta é a verdade suprema. Na filosofia, a palavra "tornar-se" diz a respeito de um conceito
ontológico específico que não deve ser confundido com a filosofia do processo, esta última
indicando uma doutrina metafísica da teologia.
Cerca de 500 a.C. Heráclito escreveu o seguinte: “Tudo flui e nada permanece, tudo
dá forma e nada permanece fixo. Você não pode pular duas vezes no mesmo rio, pois outras
águas e ainda outras, vão fluir”.
Platão tinha interesse em construir sua teoria sobre o "devir" de modo a não anular as
perspectivas de imutabilidade do ser, tudo se passa como se o filósofo tivesse que conhecer
duas posições extremas para poder ultrapassá-las: a de Heráclito para quem tudo o que existe é
conduzido pelo fluxo do devir; e a posição antagônica de Parmênides para quem o ser não
comporta nem o nascimento nem a morte, o devir só pode ser uma ilusão, o ser é imutável ou
não é o ser. Para ele, o ser na dimensão do "tornar-se" implica a causa específica da inteligência
produtora e tudo o que ela postula, o "ser que é sempre" não está sujeito à geração e ao devir,
porque permanece sempre nas mesmas condições; ele é captado pela inteligência por meio
do raciocínio, o devir que continuamente se engendra não é nunca um verdadeiro ser justamente
porque está em contínua mudança, ele é objeto de opinião, ou seja, é captado mediante a
percepção sensorial, distinta da razão.
Nesse contexto cabe ressaltar a contribuição de Aristóteles com a postulação das leis
da lógica.
6
Platão, República, 518d
Segundo tal, nenhum raciocínio absoluto deve possuir em si contradições que o
coloque em dúvida. Para tal, é importante compreender os conceitos de: identidade, não
contradição e terceiro excluído.
O princípio da identidade afirma que tudo é idêntico a si mesmo. Por trás da obviedade
aparente do princípio da identidade, e no âmbito da lógica clássica, jazem dois outros princípios,
o princípio da não-contradição e o princípio do terceiro-excluído.
Platão faz a síntese de Heráclito e Parmênides, tese e antítese, sintetizando a teoria das
ideias, separação do mundo material do mundo das ideias, onde a ascensão do mundo material
para o das ideias representa a aproximação da verdade, que deve ser feito pelo questionamento
do mundo material e não pelos sentidos.
Que julgas tu que ele diria, se alguém lhe afirmasse que até então ele só vira coisas
vãs, ao passo que agora estava mais perto da realidade e via de verdade, voltado para
objetos mais reais? 7
Platão apresenta a figura do homem acomodado a sua ignorância, que não busca
acrescentar conhecimento a sua vida, para este homem as coisas são da maneira que aí se vê,
não há necessidade de buscar uma explicação para suas sensações. Porém quando ele cai em si,
em uma passagem dolorosa e conturbada do mundo sensível para o mundo inteligível, este
homem torna-se capaz de buscar e encontrar o bem desejado, a contemplação das coisas
superiores e, assim, esclarecer-se. Somente esse duro processo de ascensão das coisas mutáveis
para as eternas é capaz de produzir, como resultado, um conhecimento verdadeiro dos conceitos
procurados e, consequentemente, a alegria daquele que se sente liberto da cegueira em que
estava mergulhado.
7
Platão, República, 515d
da contraposição de ideias e opiniões, pode-se chegar a um conceito verdadeiro e único daquilo
que se busca e, assim, à contemplação do Bem verdadeiro.
A segunda demonstração, por sua vez, se baseia na ideia de que cada parte da alma
tem o seu próprio prazer e que cada prazer corresponde a um tipo de caractere humano.
Uma parte era aquela pela qual o homem aprende, outra, pela qual se irrita; quanto à
terceira, devido à variedade de formas que ostenta, não dispomos de um nome único
e específico, mas designámo-la por aquilo que nela é mais eminente e mais forte:
chamámos-lhe concupiscência, devido à violência dos desejos relativos à comida, à
bebida, ao amor e a tudo quanto o acompanha; e chamámos-lhe amiga do dinheiro,
porque é sobretudo com dinheiro que satisfazem os desejos dessa espécie.9
Assim como exposto na citação acima, os prazeres próprios de cada parte da alma são
o prazer pelo dinheiro, ou seja, a concupiscência, na qual relaciona-se à parte apetitiva da alma;
o prazer pela honra, ou seja, a cólera, na qual diz respeito à parte irascível; e o prazer pela
sabedoria, correspondente a parte intelectual. Sócrates, a partir disso, define então três tipos de
vida correlacionando respectivamente aos três tipos de prazeres descritos anteriormente, sendo,
a vida do amante do dinheiro ou a do interesseiro, a vida do amante da honra ou a do ambicioso
e a vida do amante da sabedoria, isto e, a do filósofo.
8
Platão, República, 580b-c
9
Platão, República, 580d-e
Destes três tipos de vida, pode-se afirmar que a vida do filosofo seria aquele que teve
experiência em todos os tipos de prazeres, enquanto a vida do interesseiro e do ambicioso, ainda
que tentassem, não alcançariam os prazeres do filósofo. Ainda, o filosofo é aquele no qual,
dentre eles, agrega experiência e inteligência, uma vez que o sendo o amante da sabedoria,
aquele que possui o raciocínio como instrumento da atividade que lhe é própria. Somente o
filosofo satisfaz os critérios estabelecidos previamente, sendo o único caractere capaz de julgar
qual das três formas é a mais prazerosa, sendo para o filosofo, a vida filosófica a mais prazerosa,
já que prefere a vida da sabedoria.
Ao tratar de prazer, é possível ressaltar que prazer puro consiste naquele prazer no qual
não se mistura com a dor. Platão propõe a dor como algo contrário ao prazer e ainda, o estado
de alma no qual não se sente nem prazer nem dor, o estado neutro. De modo a exemplificar
isso, podemos ressaltar os doentes que quando sofrem, afirmam que a saúde é o mais agradável
e importante, contudo, antes de ficarem doentes não tinham noção em relação a isso. Ou seja,
quando alguém sofre alguma dor, nada se compara com a cessação desta. Diferentemente, o
prazer quando cessado, o repouso subsequente é a dor. Platão então conclui que prazer e dor
constituem um movimento e quando não há ambos, revela-se o estado intermediário
denominado como estado neutro. Aqueles prazeres provenientes da cessação da dor não são
verdadeiros.
Não vamos então persuadir-nos de que o prazer puro é a libertação da dor, e a dor, a
do prazer.10
Em suma, o prazer puro é aquele não proveniente de nenhuma dor, nem é sucedido por
nenhuma dor. O prazer puro é identificado como o próprio conhecimento e seu exercício, em
que é possível ressaltar, quando Platão afirma, que o filosofo detém dos prazeres mais puros e
verdadeiros, uma vez que agrega experiência e inteligência, sendo o amante da sabedoria.
6. Tomando do Hípias Maior que o belo é o prazer que nos vem pela visão e
audição, poderíamos dizer que esses prazeres são puros?
Não, pois se o belo fosse somente o prazer que nos vem pela visão e audição, então os
demais prazeres não teriam beleza. E segue-se o raciocínio utilizando-se a ideia de grupos,
10
Platão, República, 584c
dizendo que se ambos são belos em conjunto, a beleza teria de vir do fato de ter sido visto ou
ouvido, o que não os tornaria belo em particular. Sócrates ao questionar Hípias no diálogo sobre
o que é belo, ele afirma “não toda espécie de prazer”:
“(...) se denominássemos belo o que nos proporciona prazer, isto é, não toda espécie
de prazer, mas apenas os que alcançamos pela vista e pelo ouvido, de que modo
poderíamos defender-nos? É fora de dúvida, Hípias, que os belos homens, as coisas
variegadas, os trabalhos de pintura e de escultura nos são agradáveis à vista, quando
belos, como também se dá com os belos sons, a música em todas as suas
manifestações, os discursos e a poesia; de forma que, se respondêssemos àquele
sujeito impertinente: O belo, caro amigo, é o que nos deleita por meio da vista e do
ouvido, não te parece que poríamos fim ao seu atrevimento? ” 11
Hípias, com a ajuda de Sócrates, elabora diversas respostas plausíveis sobre o que é o
belo, equivalendo aos termos gregos prepon (conveniente), chrêsimon (utilizável) e hedonê
(prazer), que não constituem a resposta efetiva ao que é o belo na perspectiva socrático-
platônica.
Hípias observa que a beleza não pode se dar sem implicar diretamente uma sensação
de prazer, e que, portanto, não poderia conceber a beleza senão como o prazer evocado pela
visão e pela audição. Tal ideia havia sido sugerida em questionamento de Sócrates para Hípias,
e logo é refutada, pois existem também prazeres incontestáveis proporcionados pelo olfato, pelo
tato e pelo paladar, assim como pode existir beleza sem prazer sensível.
Ao fim do diálogo, Hípias passa a pensar no belo não enquanto sensação particular,
mas em sua apreensão absoluta, não enquanto aparência, mas como ser, e não enquanto
potência, mas enquanto conhecimento.
Platão, através de Sócrates, afirma apenas que a beleza não pode ser encontrada sob
nenhum desses signos da aparência, que ela não se identifica nem como uma coisa específica,
nem com o conveniente, nem com o utilizável e muito menos com a sensação de prazer evocada
pela audição e pela visão.
Para Platão, o Belo está pautado na noção de perfeição, de verdade, a Beleza existe em
si mesma, no mundo das ideias, separada do mundo sensível, as coisas seriam mais ou menos
belas a partir de sua participação nessa ideia suprema de Beleza, independentemente da
11
Platão, Hípias Maior, 298 a.
interferência ou do julgamento humano. O belo não necessita de ser útil para ser belo. A beleza
é fim de si mesma.
Vale ressaltar que Hípias Maior é um diálogo aporético; expõe um problema, mas não
o resolve. Como finaliza Sócrates:
“Uma coisa, pelo menos, Hípias, presumo haver aproveitado em vossa companhia:
imaginar que compreendo o significado do provérbio: O belo é difícil. ” – Hípias
Maior 12
O livro X possui três objetivos, sendo estes, esclarecer a natureza da mimesis, esta
como base da educação grega; mostrar que os poetas não detêm do conhecimento verdadeiro
daquilo que eles falavam e iludiam os cidadãos por meio da poesia; e mostrar a poesia como a
pior parte da alma, a qual prejudica o racional.
Assim, ao longo da passagem, Deus é o autor da cama real, como objeto essencial,
uno. O marceneiro é o artífice da cama, porém, inspirada naquela desenvolvida por Deus. Já o
pintor, também é considerado como artífice, contudo, reconhecido como imitador daquilo que
os outros são artífices.
Considera então o seguinte: relativamente a cada objeto, com que fim faz a pintura?
Com o de imitar a realidade, como ela realmente é, ou a aparência, como ela aparece?
É imitação da aparência ou da realidade? – Da aparência. – Por conseguinte, a arte de
imitar está bem longe da verdade, e se executa tudo, ao que parece, é pelo facto de
atingir apenas uma pequena porção de cada coisa, que não passa de uma aparição. Por
exemplo, dizemos que o pintor nos pintará um sapateiro, um carpinteiro, e os demais
artífices, sem nada conhecer dos respectivos ofícios. Mas nem por isso deixará de
ludibriar as crianças e os homens ignorantes, se for bom pintor, desenhando um
12
Platão, Hípias Maior, 304 e.
carpinteiro e mostrando-o de longe com a semelhança, que lhe imprimiu, de um
autêntico carpinteiro. 13
Com base na citação anterior, pode-se compreender que os poetas aparentam ser
aqueles que dominam todo tipo de oficio através de suas obras, como o pintor citado no diálogo
acima, onde se mostram imitadores de tudo o que existe e o que é a arte de outro, por meio de
frases, sem entende-las, apenas imitando-as.
A poesia imitava a forma humana, através do modo como era utilizada. Na cidade, a
poesia imitava a aparência e elevava as piores partes da alma, a concupiscível e irascível,
dominando a alma e assumindo a função do racional.
Fazendo uso do pintor para referir-se a qualquer tipo de imitador, Sócrates diz que
[...] o imitador não tem conhecimentos que valham nada sobre aquilo que imita, mas
que a imitação é uma brincadeira sem seriedade; e os que se abalançam à poesia
trágica em versos iâmbicos ou épicos, são todos eles imitadores, quanto se pode ser. 14
Imitações, imagens ou aparências são termos que remetem a mimese, o termo faz
alusão à ação de produzir uma cópia, imitação, onde, a partir de um modelo anterior, cria-se
uma reprodução, parecida, semelhante com o modelo em que se ancora.
13
Platão, República, 598b-c
14
Platão, República, 602b
15
Carlos Ceia, Mímesis ou Mimese, 2010
A mimese é compreendida como tendência da alma, responsável pela formação, e
como modo de elocução do mito, contraposto a diégesis. A imitação, enquanto uma tendência
da alma, fundamenta toda a proposta paidêutica inicial centrada no ambiente sensível.
O termo é combatido por Platão e defendida por Sócrates, para Platão ela engana, para
Aristóteles ela educa. Para Platão, a imagem seduz as partes mais fracas de nossa alma, para
Aristóteles, ela é eficaz, justamente pelo prazer que essa sedução proporciona. A única imagem
válida, para Platão, é a imagem “natural” (reflexo ou sombra) que é a única passível de se
transformar em ferramenta filosófica. O estilo imitativo é apresentado por Sócrates como
portador de um grande poder formador, poder que é a causa da sua desqualificação enquanto
modo de elocução.
As produções dos imitadores não passam de aparência, carecem de existência real, não
possuem um saber restrito, podem mimetizar qualquer coisa, tal qual um espelho, que ao ser
devidamente posicionado dá origem ao todo do real.
Platão condena não a peça poética propriamente dita, mas a experiência que a arte
imprime nos cidadãos. A condenação do filósofo é em relação à poesia enquanto meio de
formação e pensamento de um povo.
A verdade, segundo Platão, precisa estar sempre sendo buscada. A verdade não é algo
palpável, não é algo concreto. Não se pode dizer dela: essa, a verdade. Ou a verdade das
verdades. Tudo é relativo. Ainda segundo Platão, o real é o natural, ou seja, é o que existe
independente do ser. A verdade é tida como algo concebido ao homem, mas que ele esqueceu,
portanto, por meio da natureza, ele consegue ter acesso, visto que esta já está impregnada nele,
pois o homem também pertence ao meio natural.
Se o homem permanece passivo no olhar, apenas nas aparências das coisas, nas
sombras destas, este morre na ignorância conhecendo apenas a superfície sombria das
aparências. Portanto para conhecer a verdade é necessário agir, caminhar, voltar-se em busca
do conhecimento, da luz. As sombras são toda a realidade e toda a verdade para aqueles que
não saem da caverna e se concentram em acreditar nelas. Se toda verdade é relativa, essa
relatividade mostra que verdades anteriores a um conhecimento mais amplo se mostram
sombrias quando se alcança um conhecimento mais abrangente e atual. Portanto, o ser necessita
movimentar-se em direção a essa amplitude.
A cópia está relacionada com o produto que provem da mão do artesão, ou seja, trata-
se de algo que possui desempenho, a grande diferença entre a cópia e a imagem é justamente o
16
Platão, República, 517b-c
fato da primeira possuir palpabilidade, ou seja, quando um marceneiro constrói uma mesa, este
visa o seu uso, ou seja, a cópia possui desempenho no devir natural.
Essa hierarquia refere-se aos homens. Assim sendo, o produtor refere-se ao artesão
que possui a crença certa, ou seja, capaz de realizar a reprodução intelectual do modelo em algo
que possui desempenho. Não faz o modelo, porém produz produtos que relembram o modelo,
ou seja, as coisas reais. A decorrência disso é uma lista fechada de ocorrências, ideia de que o
homem não cria nada novo, algo contraditório atualmente.
O usuário é aquele que conhece e sabe tudo que algo pode ser e, dessa forma, consegue
utiliza-lo.
Já o imitador trata-se do artista que possui a opinião certa, detém uma imagem mental
certeira capaz de reproduzir imitações coerentes. Vale frisar que o imitador está duas vezes
afastado da verdade, visto que produz uma imagem degradada a partir da cópia. Enquanto o
artesão fixa o olhar no modelo para criar seus produtos, o artista fixa-se na cópia, por isso duas
vezes afastado da verdade. Platão negava a transcendência por meio da arte, para ele, a arte
tinha o objetivo de confundir e seduzir, ocasionando o engano. Enquanto o artesão se debruça
na realidade das coisas, o artista preocupa-se com a aparência, portanto não é capaz de produzir
coisa alguma. Enquanto uma mesa produzida por um marceneiro pode ser usada, a mesa pintada
por um artista trata-se apenas de uma mera aparência.
Dentro da hierarquia dos produtores, aquele que detém mais verdade é o usuário, visto
que o usuário conhece tudo que algo pode ser no tempo (suas várias possibilidades de
desempenho). O usuário entende do desempenho, que nada mais é a passagem entre o modelo
inteligível e a cópia, ou seja, o aparecimento real das coisas no mundo sensível. Assim sendo,
como exemplo, o usuário da flauta retira melodias que estavam lá e que correspondem à ideia
da flauta: um instrumento de sopro, que toca melodias com uma sonoridade determinada.
Essa passagem permanente entre a ideia e a sua passagem para o mundo sensível é
compreendida pelo usuário e, apesar do artesão mirar o modelo para produzir seu produto, este
não conhece o desempenho, e até mesmo esse contemplar do modelo passa pelas instruções
dadas pelo usuário.
Num sentido geral, designa o caráter indispensável e natural de algumas ações, tais
como as necessidades de causa fisiológica, como a alimentação e a dependência do ser vivo em
relação a outras coisas ou seres, no que diz respeito à vida ou a quaisquer interesses. Qualquer
tipo ou forma possível de relação entre o homem e as coisas, ou entre o homem e os outros
homens, pode ser considerado sob o aspecto da necessidade, implicando que o ser humano
depende dessas relações.
De acordo com Aristóteles a necessidade é algo que tem de ser assim e não pode ser
de outra forma, é algo imprescindível à vida; condição de alcançar o bem e evitar o mal, é
imposto ao Homem sem a sua vontade. Necessidade é uma “condição à priori”, é o que não
deixa a opção de não existir. É necessário, por exemplo, que o triângulo tenha três lados, para
ser um triângulo, é necessário que o homem seja dotado de razão, para ser um ser racional.