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José de Alencar

o guarani
1. O guarani políticas de Erasmo (1865); Ao povo: Cartas políticas de
Erasmo (1866); O sistema representativo (1866).
José de Martiniano de Alencar nasceu em Mecejana,
Ceará, em 1829. Estudou direito na faculdade do Largo do Crônica
São Francisco, em São Paulo, onde conheceu — e formou Ao correr da pena (1874).
a Sociedade Epicureia — os românticos Álvares de Aze-
vedo, Bernardo Guimarães e Aureliano Lessa. Dedicou-
se também à política, elegendo-se deputado por vários 2. O romantismo
mandatos, além de ocupar o cargo de ministro da Justiça
do imperador Pedro II. Decepcionado com a política, pas- O Romantismo, escola à qual pertence José de Alen-
sou a dedicar-se à literatura de maneira mais intensa, a car, teve a sua origem na Inglaterra, em 1798, com a
ponto de tornar-se o mais completo escritor romântico. publicação do livro Baladas líricas, dos poetas ingleses
José de Alencar morreu, em 1877, aos 48 anos de idade. Coleridge e Wordsworth.
Embora tenha surgido na Inglaterra, foi na França
OBRAS que esse movimento se consolidou, expandindo-se por
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Romances sociais (urbanos, toda a Europa. Com a Revolução Francesa (1789-1799) e


citadinos ou de costumes) a ascensão da burguesia ao poder, características como
Cinco minutos (1856); A viuvinha (1857); Lucío- o sentimento patriótico, individualismo e liberdade
la (1862); Diva (1864); A pata da gazela (1870); Sonhos marcaram intensamente o Romantismo europeu.
d’ouro (1872); Senhora (1875); Encarnação (1893). Portugal viveu um clima de guerra civil, em 1820,
quando os liberais enfrentaram os conservadores, numa
Romances indianistas luta pela instauração da democracia. O poeta Almeida
O guarani (1857); Iracema (1865); Ubirajara (1874). Garrett era um desses liberais, que se sagraram vitorio-
sos. Com a intenção de expressar a liberdade conquis-
Romances regionalistas (sertanejos) tada, Garrett publicou, em 1825, o poema Camões (em
O gaúcho (1870); O tronco do ipê (1871); Til (1874); homenagem ao poeta que foi o mais nacionalista dos
O sertanejo (1875). poetas portugueses), que marcou o início do Romantis-
mo em Portugal.
Romances históricos
As minas de prata (1865); Guerra dos mascates (1871);
Alfarrábios (1873). 3. Uma literatura do Brasil
Narrativa autobiográfica No Brasil, o Romantismo iniciou-se em 1836, com
Como e por que sou romancista (1893). a publicação da obra Suspiros poéticos e saudades, de
Gonçalves de Magalhães, e estendeu-se até 1881, com
Teatro as publicações de Memórias póstumas de Brás Cubas, de
O crédito (1857); Verso e reverso (1857); Demônio fa- Machado de Assis, e O mulato, de Aluísio Azevedo.
miliar (1857); As asas de um anjo (1858); Mãe (1860); Alguns fatos históricos tiveram papel decisivo na
A expiação (1867); O jesuíta (1875). formação da nova escola: a vinda da família real para o
Brasil, o fim do período colonial e o processo de inde-
Crítica literária e polêmica pendência.
Cartas sobre a Confederação dos Tamoios (1856); Em 1808, d. João VI e sua família vieram para o Rio de
Ao imperador: Cartas políticas de Erasmo e Novas cartas Janeiro, fugindo das tropas napoleônicas. Acostumado

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com o luxo europeu, o rei procurou reproduzir aqui as regras, nem modelos); sentimento de religiosidade (os
condições de vida que tinham. Para isso, possibilitou o românticos seguem os princípios e mandamentos cris-
desenvolvimento cultural do país. Algumas de suas cria- tãos, numa reação ao paganismo árcade); idealizações
ções foram: (da mulher, do homem e do mundo, numa tentativa de
• A Biblioteca Real, hoje Biblioteca Nacional do Rio torná-los perfeitos); valorização da burguesia (o Ro-
de Janeiro, com um acervo de mais de 400 mil li- mantismo é uma escola de burgueses escrevendo para
vros, muitos deles tão raros que não encontramos a burguesia); volta ao passado (certas obras têm como
exemplares nas próprias bibliotecas de Portugal; tempo cronológico a época medieval; o indianismo an-
• As primeiras faculdades do Brasil, como a do Largo tes do descobrimento do Brasil ou por volta de 1600 ou,
do São Francisco e a de Olinda, ambas de direito; então, na época do rei d. João VI); culto à morte (como
• A imprensa régia (circulação de jornais e revistas), forma de libertação dos males da vida, como no mal do
responsável pela divulgação de nossa literatura; século, por exemplo).
• A Escola de Belas-Artes;
• As primeiras livrarias;
• O Real Teatro de São João, fundado em 1813 no 5. A prosa romântica
Rio de Janeiro.
Cronologicamente, o romance brasileiro surgiu em
Em decorrência de numerosas manifestações ocorri- 1843, com a publicação da obra folhetinesca O filho do
das na cidade do Porto, em 1820, provocadas pela crise pescador, de Teixeira e Sousa. Entretanto, sua obra é
econômica que Portugal enfrentava, d. João VI retornou considerada incipiente no que diz respeito à ficção. Um
ao seu país. Antes, nomeou seu filho, Pedro I, regente da ano depois, em 1844, foi publicado o romance A Moreni-
colônia. nha, de Joaquim Manuel de Macedo, oficializando, des-
No início do ano seguinte, d. João VI determina que sa forma, o início da ficção nacional. Com o surgimento

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d. Pedro I também retorne a Portugal para estudar; po- da imprensa e, consequentemente, a circulação de jor-
rém, após receber um abaixo-assinado pedindo sua per- nais e revistas no Brasil, intensificou-se o interesse pela
manência no Brasil, o regente declara que ficará aqui. publicação, não só de romances, mas de outros tipos de
O dia em que ele fez essa declaração é conhecido como textos em prosa, como o conto, o teatro, a crítica literá-
“o dia do fico”. A partir desse momento, inicia-se o pro- ria, a crônica. Jornais como o Correio Mercantil e o Diário
cesso de independência do Brasil, que se concluiu em 7 do Rio de Janeiro publicaram grandes obras da literatura
de setembro de 1822. brasileira: o primeiro, Memórias de um sargento de milí-
cias, de Manuel Antônio de Almeida; o segundo, O gua-
rani, de José de Alencar.
4. Características do romantismo brasileiro Uma curiosidade: em fins do século XVIII, Teresa Mar-
garida da Silva e Orta, sob o pseudônimo de Dorothea
Além de apresentar as características que o Roman- Engrassia Tavareda Dalmira, publicou aquele que seria
tismo português apresenta, o Romantismo brasileiro o primeiro romance brasileiro: As aventuras de Diófanes.
tem características peculiares. O nacionalismo é o re- Entretanto, a crítica especializada reluta em considerá-la
flexo, na nossa literatura, da valorização da pátria após o pioneira.
processo de independência do Brasil; a valorização da
natureza é consequência desse olhar que se volta para Tipos de romances
as coisas do nosso país (descobre-se a beleza natural de O romance passa a ser amplamente difundido por
nossa terra e o homem do sertão com o seu linguajar e nossos românticos, ou em forma de folhetim ou edita-
folclore); e o indianismo tem no índio a própria origem dos em livros, por editoras portuguesas ou francesas,
do país. já que a primeira editora nacional só seria fundada no
As demais características que também encontra- início do século XX, por Monteiro Lobato. Os tipos de
mos no Romantismo português são: subjetivismo romances são:
(valorização do “eu”; egocentrismo); sentimentalismo
(predomínio do sentimento sobre a razão, isto é, “o co- Romance social
ração sobrepondo-se à cabeça”); liberdade formal (os Também conhecido como urbano, citadino ou de
românticos seguiram a proposta de Victor Hugo: “nem costumes, é uma narrativa que explora as convenções

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e situações de uma determinada sociedade. No caso raça ilustre, aqui impregnou-se da seiva americana desta
específico do Romantismo, a classe social explorada é terra que lhe serviu de regaço; e cada dia se enriquece ao
a burguesia. Assim, Senhora, de José de Alencar, A Mo- contacto de outros povos e ao influxo da civilização?
reninha e O moço loiro, de Joaquim Manuel de Macedo, O período orgânico desta literatura conta já três fases.
dentre outros, são classificados como sociais. A primitiva, que se pode chamar de aborígine, são as lendas
e mitos da terra selvagem e conquistada; são as tradições
Romance indianista que embalaram a infância do povo, e ele escutava como o
É o tipo de romance em que se exploram os usos, os filho a quem a mãe acalenta no berço com as canções da
costumes, as tradições e a língua do indígena. Iracema, pátria, que abandonou. Iracema pertence a essa literatura
O guarani e Ubirajara, de José de Alencar, são exemplos primitiva, cheia de santidade e enlevo, para aqueles que
desse tipo de narrativa. veneram na terra da pátria a mãe fecunda; alma mater, e
não enxergam nela apenas o chão onde pisam.
Romance regionalista ou sertanejo O segundo período é histórico: representa o consórcio
Os romances regionalistas tratam de temas como a do povo invasor com a terra americana, que dele recebia a
cultura, as tradições folclóricas e o linguajar de uma de- cultura, e lhe retribuía nos eflúvios de sua natureza virgem
terminada região. É o caso, por exemplo, de Inocência, e nas reverberações de um solo esplêndido. Ao aconche-
de Visconde de Taunay. go dessa pujante criação, a têmpera se apura, toma asas
a fantasia, a linguagem se impregna de módulos mais
Romance histórico suaves; formam-se outros costumes, e uma existência
Os fatos grandiosos ocorridos em nosso passado são nova, pautada por diverso clima, vai surgindo. É a ges-
registrados no romance histórico, como a Guerra dos tação lenta do povo americano, que devia sair da estirpe
mascates, de José de Alencar, e A retirada da Laguna, de lusa, para continuar no novo mundo as gloriosas tradições
Visconde de Taunay. de seu progenitor. Esse período colonial terminou com a
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independência. A ele pertencem o Guarani e as Minas de


Romance autobiográfico Prata. Há aí muita e boa messe a colher para o nosso ro-
São narrativas em que o autor explora a própria vida. mance histórico; mas não exótico e raquítico como se pro-
Joaquim Manuel de Macedo narrou acontecimentos de pôs a ensiná-lo, a nós beócios, um escritor português.
sua vida no romance Memórias de um sobrinho do meu A terceira fase, a infância de nossa literatura, começada
tio, assim como José de Alencar em Como e por que sou com a independência política, ainda não terminou; espera
romancista. escritores que lhe deem os últimos traços e formem o ver-
dadeiro gosto nacional, fazendo calar as pretensões hoje
Principais representantes tão acesas, de nos recolonizarem pela alma e pelo coração,
Os principais representantes da prosa romântica já que não o podem pelo braço.
brasileira foram Joaquim Manuel de Macedo, José de Neste período, a poesia brasileira, embora balbuciante,
Alencar, Bernardo Guimarães, Franklin Távora, Visconde ainda ressoa, não já somente nos rumores da brisa e nos
de Taunay, Manuel Antônio de Almeida e, no teatro, des- ecos da floresta, senão também nas singelas cantigas do
tacaram-se Martins Pena e Qorpo-Santo. O surgimento povo e nos íntimos serões da família.
da prosa nacional revela, pela quantidade de escritores Onde não se propaga com rapidez a luz da civilização,
adeptos e pela qualidade de suas narrativas, que esse que de repente cambia a cor local, encontra-se ainda em
gênero literário, do século XIX em diante, dividirá, “de- sua pureza original, sem mescla, esse viver brasileiro. Há,
mocraticamente”, espaço com a poesia. A arte verbal de não somente no país, como nas grandes cidades, até mes-
qualidade não será apenas aquela produzida em versos. mo na corte, desses recantos, que guardam intacto, ou
quase, o passado.
O tronco do ipê, Til e O gaúcho vieram dali; embora, no pri-
6. Características gerais de José de Alencar meiro sobretudo, se note já, devido à proximidade da corte e à
data mais recente, a influência da nova cidade, que de dia em
O texto a seguir foi retirado do prefácio ao romance, dia se modifica e se repassa do espírito forasteiro.
Sonhos d’ouro, de José de Alencar: Nos grandes focos, especialmente na corte, a sociedade
tem a fisionomia indecisa, vaga e múltipla, tão natural à
A literatura nacional que outra cousa é senão a alma idade da adolescência. É o efeito da transição que se opera;
da pátria, que transmigrou para este solo virgem com uma e também do amálgama de elementos diversos.

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A importação contínua de ideias e costumes estranhos, parecia coar-se naquele raio luminoso e ir curvar-se aos
que dia por dia nos trazem todos os povos do mundo, devem pés do moço.
por força de comover uma sociedade nascente, naturalmente ALENCAR, José de. O guarani. São Paulo:
inclinada a receber o influxo de mais adiantada civilização. Companhia Editora Nacional, 2004. p. 37.

Os povos têm, na virilidade, um eu próprio, que resiste


ao prurido da imitação; por isso na Europa, sem embar- A metalinguagem, muito usada por Manuel Antônio
go da influência que sucessivamente exerceram algumas de Almeida e Machado de Assis, também se faz presente
nações, destacam-se ali os caracteres bem acentuados de em José de Alencar:
cada raça e de cada família.
Não assim os povos são feitos; estes tendem como a Demorei-me em descrever a cena e falar de algumas
criança ao arremedo; copiam tudo, aceitam o bom e o das principais personagens deste drama porque assim era
mau, o belo e o ridículo, para formarem o amálgama in- preciso para que bem se compreendam os acontecimentos
digesto, limo de que deve sair mais tarde uma individuali- que depois de passaram.
dade robusta. Deixarei porém que os outros perfis de desenhem por
Palheta, onde o pintor deita laivos de cores diferentes, si mesmos.
que juntas e mescladas entre si, dão uma nova tinta de tons ALENCAR, José de. Op. cit. p. 16.
delicados, tal é a nossa sociedade atualmente. Notam-se
aí, através do gênio brasileiro, umas vezes embebendo-se TEMPO
dele, outras invadindo-o, traço de várias nacionalidades Em 1604, época da União das Coroas Ibéricas (pe-
adventícias; é a inglesa, a italiana, a espanhola, a ame- ríodo em que Portugal vivia sob o domínio espanhol –
ricana, porém, especialmente a portuguesa e a francesa, 1580-1640):
que todas flutuam, e a pouco e pouco vão diluindo-se para
infundir-se n’alma da pátria adotiva, e formar a nova e D. Antônio desejava saber notícias do Rio de Janeiro e

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grande nacionalidade brasileira. de Portugal, onde se haviam perdido todas as esperanças
Desta luta entre o espírito conterrâneo e a invasão es- de uma restauração, que só teve lugar quarenta anos de-
trangeira, são reflexos Lucíola, Diva, A pata da gazela, e tu, pois com a aclamação do duque de Bragança.
livrinho, que aí vais correr o mundo com o rótulo de Sonhos ALENCAR, José de. Op. cit. p. 36.
d’ouro.
ALENCAR, José de. O guarani. São Paulo: […]
Companhia Editora Nacional, 2004. p. 12-3-4. Mas não antecipemos; por ora ainda estamos em 1603,
um ano antes daquela cena, e ainda nos falta contar cer-
tas circunstâncias que serviram para o seguimento desta
7. O guarani verídica história1.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 100.
Antes de ser publicado em livro em 1857, O guarani
saiu em forma de folhetim no Diário do Rio de Janeiro Espaço
alcançando estrondoso sucesso. Abaixo, os elementos Matas do Rio de Janeiro, onde d. Antônio de Mariz
narrativos que compõem este romance de caráter his- mandou construir uma verdadeira fortaleza, para viver
tórico-indianista sobre a formação do Rio de Janeiro e com a sua família. No trecho a seguir, notem a exaltação
a idealização do índio como símbolo de nossa naciona- à natureza misturada a um sentimento de religiosidade,
lidade: típico do período romântico:

Foco Narrativo A tarde ia morrendo.


Foco narrativo em 3ª pessoa onisciente, como se O sol declinava no horizonte e deitava-se sobre as gran-
pode perceber neste trecho: des florestas, que iluminava com os seus últimos raios.
A luz frouxa e suave do ocaso, deslizando pela verde al-
Isabel, pobre menina, fitava sobre Álvaro os seus gran- catifa, enrolava-se como ondas de ouro e púrpura sobre a
des olhos negros, cheios de amargura e tristeza; sua alma folhagem das árvores.

1. Notem a metalinguagem presente no trecho.

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Os espinheiros silvestres desatavam as flores alvas e de- • Imposição do cristianismo:
licadas; e o ouricuri abria as suas palmas mais novas, para
receber no seu cálice o orvalho da noite. Os animais retar- D. Antônio, vendo a resolução que se pintava no rosto
dados procuravam a pousada; enquanto a juriti, chaman- do selvagem, tornou-se ainda mais pensativo; quando,
do a companheira, soltava os arrulhos doces e saudosos passado esse momento de reflexão, ergueu a cabeça, seus
com que se despede do dia. olhos brilhavam com um raio de esperança.
Um concerto de notas graves saudava o pôr do sol, e Atravessou o espaço que o separava de sua filha, e, to-
confundia-se com o rumor da cascata, que parecia quebrar mando a mão de Peri, disse-lhe com uma voz profunda e
a aspereza de sua queda, e ceder à doce influência da tarde. solene:
Era a Ave-Maria. — Se tu fosses cristão, Peri!…
Como é solene e grave no meio das nossas matas O índio voltou-se extremamente admirado daquelas
a hora misteriosa do crepúsculo, em que a natureza se palavras.
ajoelha aos pés do Criador para murmurar a prece da noite! — Por quê?… perguntou ele.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 37. — Por quê?… disse lentamente o fidalgo. Porque se tu
fosses cristão, eu te confiaria a salvação de minha Cecília,
Também a casa construída por d. Antônio de Mariz e estou convencido de que a levarias ao Rio de Janeiro, à
serve de cenário para as ações do romance: minha irmã.
O rosto do selvagem iluminou-se; seu peito arquejou
A casa era edificada com a arquitetura simples e gros- de felicidade; seus lábios trêmulos mal podiam articu-
seira, que ainda apresentam as nossas primitivas habita- lar o turbilhão de palavras que lhe vinham do íntimo da
ções; tinha cinco janelas de frente, baixas, largas, quase alma.
quadradas. — Peri quer ser cristão! exclamou ele.
Do lado direito estava a porta principal do edifício, que D. Antônio lançou-lhe um olhar úmido de reconheci-
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dava sobre um pátio cercado por uma estacada, coberta mento.


de melões agrestes. Do lado esquerdo estendia-se até à — A nossa religião permite, disse o fidalgo, que na hora
borda da esplanada uma asa do edifício, que abria duas extrema todo homem possa dar o batismo. Nós estamos
janelas sobre o desfiladeiro da rocha. com o pé sobre o túmulo. Ajoelha, Peri!
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 10. O índio caiu aos pés do velho cavalheiro, que impôs-lhe
as mãos sobre a cabeça.
Temas — Sê cristão! Dou-te o meu nome.
• Miscigenação das raças no Brasil: ALENCAR, José de. Op. cit. p. 275-276.

— Cecília fica no deserto?… balbuciou ele. • Idealização do índio aos moldes do cavaleiro me-
— Sim! respondeu a menina tomando-lhe as mãos: Cecí- dieval:
lia fica contigo e não te deixará. Tu és rei destas florestas, des-
tes campos, destas montanhas; tua irmã te acompanhará. Peri, correndo mil perigos, arriscando-se a despedaçar-
— Sempre?… se nas pontas dos rochedos e a ser crivado pelas flechas
— Sempre… Viveremos juntos como ontem, como dos selvagem, ganhava a floresta, e daí a uma hora vol-
hoje, como amanhã. Te cuidas?… Eu também sou filha tava trazendo um fruto delicado, um favo de mel envolto
desta terra; também me criei no seio desta natureza. Amo de flores, uma caça esquisita, que sua senhora tocava com
este belo país!…. os lábios para assim pagar ao menos tanto amor e tanta
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 295. dedicação.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 201.
• Fundação do Rio de Janeiro (romance histórico-in-
dianista): • A conquista do sertão brasileiro:

No ano da graça de 1604, o lugar que acabamos de Naquele tempo dava-se o nome de bandeiras a essas
descrever estava deserto e inculto; a cidade do Rio de Ja- caravanas de aventureiros que se entranhavam pelos ser-
neiro tinha-se fundado havia menos de meio século, e a tões do Brasil, à busca de ouro, os brilhantes e esmeraldas,
civilização não tivera tempo de penetrar o interior. ou à descoberta de rios e terras ainda desconhecidos.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 10. ALENCAR, José de. Op. cit. p. 16.

5
Resumo que se viam, eram as cinco quinas portuguesas, diante das
Narrado em 3ª pessoa, O guarani, palavra tupi que quais todas as frontes inclinavam.
significa “guerreiro”, tem como protagonistas o índio ALENCAR, José de. Op. cit. p. 15.
goitacá Peri e a branca de origem europeia, Cecília, de
apelido Ceci. D. Antônio de Mariz, colonizador portu- A região, na serra dos Órgãos, era habitada pelos ín-
guês, fiel à sua pátria — pai de Ceci —, e inconformado dios goitacás, tribo a que pertencia o guerreiro Peri, e
com a situação dela (que perdera a sua independência pelos antropófagos aimorés, inimigos destes. O índio
política para a Espanha, por ocasião da União das Coro- Peri surge logo no começo da trama amorosa. Ele fora o
as Ibéricas) resolve construir nas matas do Rio de Janei- responsável por salvar Ceci e Isabel de serem esmagadas
ro, às margens do rio Paquequer, afluente do rio Paraíba, por uma avalanche de pedras, caindo logo nas graças de
uma verdadeira fortaleza; suas terras foram dadas por d. Antônio de Mariz. Peri, de certa forma, abandona a
Mem de Sá2 pelo bons serviços prestados como coloni- sua tribo para viver com a família portuguesa3:
zador:
Mas todos os seus esforços tinham sido baldados; o fi-
Aí o Paquequer lança-se rápido sobre o seu leito, e atra- dalgo com a sua lealdade e o cavalheirismo apreciava o
vessa as florestas como o tapir, espumando, deixando o caráter de Peri, e via nele, embora selvagem, um homem
pelo esparso pelas pontas do rochedo, e enchendo a soli- de sentimentos nobres e de alma grande. Como pai de fa-
dão com o estampido de sua carreira. De repente, falta-lhe mília, estimava o índio pela circunstância a que já aludi-
o espaço, foge-lhe a terra; o soberbo rio recua um momen- mos de ter salvado sua filha, circunstância que mais tarde
to para concentrar as suas forças, e precipita-se de um só se explicará.
arremesso, como tigre sobre a presa. ALENCAR, José de. Op. cit. p. 62.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 9.
O índio nutria por Ceci uma espécie de idolatria. Por

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Na casa-grande moram a sua família – composta pela ela, era capaz de fazer qualquer coisa, até sair em bus-
mulher, d. Lauriana; o filho, d. Diogo; a filha, Cecília; a ca de uma onça, pedido feito, de brincadeira pela bela
prima destes (que na verdade era meio-irmã, já que era moça, levado a sério pelo índio:
filha de d. Antônio com uma índia), a mestiça Isabel; o
fidalgo d. Álvaro, além dos homens da guarda, que não No dia seguinte, ao raiar da manhã, Cecília abriu a por-
passavam, na verdade, de mercenários em busca de tinha do jardim e aproximou-se da cerca.
minas de prata, comandados pelo fiel escudeiro de d. — Peri! disse ela.
Antônio de Mariz, Aires Gomes. Dentre esses homens, O índio apareceu à entrada da cabana; correu alegre,
estava o vilão, Loredano: mas tímido e submisso.
Cecília sentou-se num banco da relva; e a muito custo
Assim vivia, quase no meio do sertão, desconhecida e conseguiu tomar um arzinho de severidade, que de vez em
ignorada essa pequena comunhão de homens, governan- quando quase traía-se por um sorriso teimoso que lhe que-
do-se com as duas leis, os seus usos e costumes; unidos en- ria fugir dos lábios.
tre si pela ambição da riqueza, e ligados ao seu chefe pelo Fitou um momento no índio os seus grandes olhos azuis
respeito, pelo hábito da obediência e por essa superiorida- com uma expressão de doce repreensão; depois disse-lhe
de moral que a inteligência e a coragem exercem sobre as em um tom mais de queixa do que de rigor:
massas. — Estou muito zangada com Peri!
Para d. Antônio e para seus companheiros a quem ele O semblante do selvagem anuviou-se.
havia imposto sua fidelidade, esse torrão brasileiro, esse — Tu, senhora, zangada com Peri! Por quê?
pedaço de sertão, não era senão um fragmento de Portu- — Porque Peri é mau e ingrato; em vez de ficar perto
gal livre, de sua pátria primitiva; aí só se reconhecia como de sua senhora, vai caçar em risco de morrer! disse a moça
rei ao duque de Bragança, legítimo herdeiro da Coroa; ressentida.
quando se corriam as cortinas do dossel da sala, as armas — Ceci desejou ver uma onça viva!

2. Mem de Sá (1550-1572), irmão do poeta português Francisco Sá de Miranda, foi nomeado terceiro governador-geral do Brasil em sucessão a Duarte da Costa.
3. Vale aqui ressaltar que José de Alencar escreveu três romances indianistas com a seguinte intenção: em Iracema a figura do branco colonizador assimila a cultura
indígena; em O Guarani a figura do indígena assimila a cultura europeia; em Ubirajara, por se passar antes de 1500, não há a presença do colonizador, portanto,
somente índios, por esse motivo é considerada a mais aborígine obra de José de Alencar.

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— Então não posso gracejar? Basta que eu deseje uma Loredando, ex-frade carmelita, de nome frei Ângelo
coisa para que tu corras atrás dela como um louco? di Luca, que assassinara um homem desarmado, rou-
— Quando Ceci acha bonita uma flor, Peri não vai bus- bando-lhe o mapa que o levaria às minas do bandeiran-
car? perguntou o índio. te Robério Dias, tinha um plano: matar todos da família,
— Vai, sim. raptar Ceci e explorar a tal mina. Enquanto não executa-
— Quando Ceci ouve cantar o sofrer, Peri não o vai pro- va o seu plano, passava-se por um dos homens da guar-
curar? da da fortaleza de d. Antônio de Mariz:
— Que tem isso?
— Pois Ceci desejou ver uma onça, Peri a foi buscar. Fr. Ângelo di Luca achava-se então no pouso como mis-
Cecília não pôde reprimir um sorriso ouvindo esse silo- sionário, incumbido da catequese e cura das almas entre o
gismo rude, a que a linguagem singela e concisa do índio gentio daquele lugar; em seis meses que apostolava con-
dava uma certa poesia e originalidade. seguira aldear algumas famílias que esperava breve trazer
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 50-51. ao grêmio da igreja.
Um ano havia que obtivera do prior-geral da ordem do
Além de Peri, dois outros homens disputavam tam- Carmo a graça de passar do seu convento de Santa Ma-
bém o coração de Ceci: d. Álvaro, que nutria por ela uma ria Transpontina, em Roma, para a casa que a sua ordem
espécie de amor fidalgo, e Loredano, que por ela nutria tinha fundado em 1590 no Rio de Janeiro, a fim de empre-
uma paixão ardente. Assim, três sentimentos distintos gar-se no trabalho das missões.
disputavam o coração de Ceci: idolatria, amor e paixão: Tanto o geral como o provincial de Lisboa, tocados por
esse ardente apostólico, o haviam recomendado expressa-
As cortinas da janela cerraram-se; Cecília tinha-se dei- mente a fr. Diogo do Rosário, então prior do convento do
tado. Carmo no Rio de Janeiro, pedindo-lhe que empregasse no
Junto da inocente menina, adormecida na isenção de serviço do Senhor e na glória da ordem da Beatíssima Vir-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

sua alma pura e virgem, velavam três sentimentos profun- gem do Monte Carmelo, o zelo e o santo fervor do irmão fr.
dos, palpitavam três corações bem diferentes. Ângelo di Luca.
Em Loredano, o aventureiro de baixa extração, esse ALENCAR, José de. Op. cit. p. 84.
sentimento era um desejo ardente, uma sede de gozo,
uma febre que lhe requeimava o sangue; o instinto brutal […]
dessa natureza vigorosa era ainda aumentado pela im- Enquanto o frade se esforçava para ler, o moribundo
possibilidade moral que a sua condição criava, pela barrei- agonizava na última aflição, esperando talvez a absolvi-
ra que se elevava entre pobre colono e a filha de d. Antônio ção final e a extrema-unção do penitente.
de Mariz, rico fidalgo de solar e brasão. Mas o religioso não via nesse momento senão o papel que
[…] tinha nas mãos; deixou-se cair em um banco, e com a cabeça
Em Álvaro, cavalheiro dedicado e cortês, o sentimento pendida sobre o braço, entregou-se a funda meditação.
era uma afeição nobre e pura, cheia de graciosa timidez Que pensava ele?…4
que perfuma as primeiras flores do coração, e do entusias- Não pensava, delirava. Diante de seus olhos, a imagi-
mo cavalheiresco que tanta poesia dava aos amores da- nação exaltada lhe apresentava um mar argênteo, um
quele tempo de crença e lealdade. oceano de metal fundido, alvo e resplandecente, que ia se
[…] perder no infinito. As vagas desse mar de prata, ora acha-
Em Peri, o sentimento era um culto, espécie de idola- malotavam-se, ora rolavam formando flocos de espumas,
tria fanática, na qual não entrava um só pensamento de que pareciam flores de diamantes, de esmeraldas e rubins
egoísmo; amava Cecília não para sentir um prazer ou ter cintilando à luz do sol.
uma satisfação, mas para dedicar-se inteiramente a ela, ALENCAR, José de. Op. cit. p. 90.
para cumprir o menor dos seus desejos, para evitar que
a moça tivesse um pensamento que não fosse imediata- Apesar de d. Álvaro de Sá amar Cecília, Isabel era
mente uma realidade. quem o amava perdidamente. A bela morena sentia-se
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 46-47. inferior a Cecília, justamente por sua mestiçagem:

4. Notem a onisciência do narrador.

7
— Ora, Cecília, como queres que se trate um selvagem descobrira um meio de vencer ele só aos inimigos, apesar
que tem a pele escura e o sangue vermelho? Tua mãe não do seu número e da sua força.
diz que um índio é um animal como um cavalo ou um cão? […]
Estas últimas palavras foram ditas com uma ironia O costume dos selvagens, de não matar na guerra o ini-
amarga, que a filha de Antônio de Mariz compreendeu migo e de cativá-lo para servir ao festim da vingança, era
perfeitamente. para Peri uma garantia e uma condição favorável à execu-
— Isabel!… exclamou ela ressentida. ção do seu projeto.
— Sei que tu não pensas assim, Cecília; e que o teu bom […]
coração não olha a cor do rosto para conhecer a alma. Mas Segundo as leis tradicionais do povo bárbaro, toda a
os outros?… Cuidas que não percebo o desdém com que tribo devia tomar parte no festim: as mulheres moças to-
me tratam? cavam apenas na carne do prisioneiro; mas os guerreiros
— Já te disse por vezes que é uma desconfiança tua; to- a saboreavam como um manjar delicado, adubado pelo
dos te querem, e te respeitam como devem. prazer da vingança; e as velhas com a gula feroz das har-
Isabel abanou tristemente a cabeça. pias que se cevam no sangue de suas vítimas.
— Vai-te bem o consolar-me; mas tu mesma tens visto Peri contava, pois, com toda a segurança que dentro
se eu tenho razão. de algumas horas o corpo envenenado da vítima levaria a
— Ora, um momento de zanga de minha mãe… morte às entranhas de seus algozes, e que ele só destruiria
— É um momento bem longo, Cecília! respondeu a toda uma tribo, grande, forte, poderosa, apenas com o au-
moça com um sorriso amargo. xílio dessa arma silenciosa.
— Mas escuta, disse Cecília, passando o braço pela cin- Pode-se agora compreender qual tinha sido o seu de-
tura de sua prima e chamando-a a si, tu bem sabes que sespero vendo esse plano inutilizado; depois de ter deso-
minha mãe é uma senhora muito severa mesmo para co- bedecido à sua senhora, depois de haver tudo realizado;
migo. quando só faltava o desfecho, quando o golpe que ia sal-

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— Não te canses, prima; isto só serve para provar-me var a todos caía, mudar-se de repente a face das coisas e
ainda mais o que já te confessei: nesta casa só tu me amas, ver destruída a sua obra, filha de tanta meditação!
os mais me desprezam. ALENCAR, José de. Op. cit. p. 250-251.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 29-30.
Nas matas, Peri encontra o corpo de d. Álvaro, morto
Certo dia, numa caçada, d. Diogo mata, acidentalmen- em combate pelos aimorés. O seu corpo é levado à casa
te, uma índia aimoré. Alguns índios, com o intuito de se de d. Antônio de Mariz. Isabel, ao ver o corpo sem vida
vingarem, espiam Ceci se banhar nas águas do rio, para do amado, suicida-se, tombando sobre ele:
depois matá-la, mas são mortos pelas flechas certeiras de
Peri. Uma índia relata aos índios da tribo o que viu. Estes Isabel não tinha mais forças para resistir e realizar o seu
juram atacar a casa de d. Antônio de Mariz. Temendo pela heroico sacrifício; deixou cair a cabeça desfalecida, e seus
morte de Ceci e de sua família, Peri envenena-se e segue lábios se uniram outra vez num longo beijo, em que essas
para a tribo dos aimorés. O guerreiro, sabendo da tradição duas almas irmãs, confundindo-se numa só, voaram ao
do “I-Juca Pirama” (“aquele que é digno de ser morto”)5, céu, e foram abrigar-se no seio do Criador.
lutaria sozinho contra os aimorés e morreria. Morto, seria As nuvens de fumaça e de perfume se condensavam
comido pelos inimigos (já que acreditavam que comendo cada vez mais e envolviam como um lençol aquele grupo
um guerreiro inimigo se fortaleceriam), morrendo todos, original, impossível de descrever.
pois sua carne estava envenenada. Peri, nesta passagem, Por volta de duas horas da tarde, a porta do gabinete,
provou que morreria pela sua amada. Entretanto, d. Álva- impelida por um choque violento, abriu-se; e um turbilhão
ro e alguns homens conseguem retirá-lo dos aimorés com de fumo lançou-se por essa aberta, e quase sufocou as pes-
vida. Peri toma um antídoto, retirado de uma erva, elimi- soas que aí estavam.
nando o veneno: Eram Cecília e Peri.
A menina inquieta pela longa ausência de sua prima,
Confiando nesse veneno que os índios conheciam com soube de Peri que ela estava no seu quarto; mas o índio
o nome de curare, e cuja fabricação era um segredo de ocultou parte da verdade, e não disse onde deitara o corpo
algumas tribos, Peri com a sua inteligência e dedicação de Álvaro.

5. “I-Juca Pirama”, poema indianista de Antônio Gonçalves Dias (1823-1864).

8
Duas vezes Cecília viera até à porta, escutara e nada — Sê cristão! Dou-te o meu nome.
ouvira; por fim resolveu-se a bater, a falar a Isabel, e não Peri beijou a cruz da espada que o fidalgo lhe apresen-
teve a menor resposta. Chamou Peri e contou-lhe o que se tou, e ergueu-se altivo e sobranceiro, pronto a afrontar to-
passava; o índio, tomado de um pressentimento meteu o dos os perigos para salvar sua senhora.
ombro à porta e abriu-a. — Escuso exigir de ti a promessa de respeitares e defen-
Quando a corrente de ar expeliu a fumaça do aposento, deres minha filha. Conheço a tua alma nobre, conheço o
Cecília pôde entrar e ver a cena que descrevemos. teu heroísmo e a tua sublime dedicação por Cecília, mas
A menina recuou, e respeitando esse mistério de um quero que me faças um outro juramento.
amor profundo, fez um gesto a Peri e retirou-se. — Qual? Peri está pronto para tudo.
O índio fechou de novo a porta e acompanhou sua se- — Juras que, se não puderes salvar minha filha, ela não
nhora. cairá nas mãos do inimigo?
— Ela morreu feliz! disse Peri. — Peri jura que ele levará a senhora à tua irmã; e que se
Cecília fitou nele os seus grandes olhos azuis, e corou. o Senhor do céu não deixar que Peri cumpra a sua promes-
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 269. sa, nenhum inimigo tocará em tua filha; ainda que para
isso seja preciso queimar uma floresta inteira.
Loredando resolve executar o seu plano e matar d. — Bem; estou tranquilo. Ponho minha Cecília, sob tua
Antônio de Mariz. Entretanto, é descoberto, preso e con- guarda; e morro satisfeito. Podes partir.
denado a morrer na fogueira como um traidor: — Manda fechar todas as portas.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 276.
Antes de obedecerem à ordem de d. Antônio de Mariz,
eles tinham executado a sua sentença proferida contra Ceci e Peri deixam a casa, que é totalmente destruí-
Loredano; e quem passasse então sobre a esplanada veria da, devido à explosão no paiol. Vão os dois para o rio Pa-
em torno do poste, em que estava atado o frade, uma lín- raíba. Cai uma tempestade torrencial, lembrando o dilú-
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gua vermelha que lambia a fogueira, enroscando-se pelos vio. As águas do Paraíba sobem rapidamente. Ceci não
toros de lenha. vê saída, já pressentindo a morte dos dois. Entretanto,
O italiano sentia já o fogo que se aproximava e a fuma- Peri lhe conta a história de Tamandaré e de sua esposa:
ça, que, enovelando-se, envolvia-o numa névoa espessa; é
impossível descrever a raiva, a cólera e o furor que se apos- “Foi longe, bem longe dos tempos de agora. As águas
saram dele nesses momentos que precederam o suplício. caíram, e começaram a cobrir toda a terra. Os homens su-
Mas voltemos à sala em que se achavam reunidos os biram ao alto dos montes; um só ficou na várzea com sua
principais personagens desta história, e onde se vão pas- esposa.
sar as cenas talvez mais importantes do drama6. “Era Tamandaré; forte entre os fortes; sabia mais que
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 272-273. todos. O Senhor falava-lhe de noite; e de dia ele ensinava
aos filhos da tribo o que aprendia do céu.
Os aimorés resolvem atacar a fortaleza. Sem mais o “Quando todos subiram aos montes ele disse:
que fazer, d. Antônio de Mariz resolve morrer ali dentro ‘Ficai comigo; fazei como eu, e deixai que venha a água’.
com a sua família. Peri pede permissão a ele para tirar “Os outros não o escutaram; e foram para o alto; e dei-
Ceci da casa. D. Antônio de Mariz não aceita, pois Peri xaram ele só na várzea com sua companheira, que não o
não era cristão e sua filha não poderia viver com um abandonou.
gentio. Porém, Peri é convertido ao cristianismo, rece- “Tamandaré tomou sua mulher nos braços e subiu com
bendo o nome de Antônio: ela ao olho da palmeira; aí esperou que a água viesse e
passasse; a palmeira dava frutos que o alimentavam.
D. Antônio lançou-lhe um olhar úmido de reconheci- “A água veio, subiu e cresceu; o sol mergulhou e surgiu
mento. uma, duas e três vezes. A terra desapareceu; a árvore desa-
— A nossa religião permite, disse o fidalgo, que na hora pareceu; a montanha desapareceu.
extrema todo homem possa dar o batismo. Nós estamos “A água tocou o céu; e o Senhor mandou então que
com o pé sobre o túmulo. Ajoelha, Peri! parasse. O sol olhando só viu céu e água, e entre a água
O índio caiu aos pés do velho cavalheiro, que impôs-lhe e o céu, a palmeira que boiava levando Tamandaré e sua
as mãos sobre a cabeça. companheira.

6. Notem a metalinguagem presente no trecho lido.

9
“A corrente cavou a terra; cavando a terra, arrancou a Quando a cavalgata chegou à margem da clareira, aí
palmeira; arrancando a palmeira, subiu com ela; subiu aci- se passava uma cena curiosa.
ma do vale, acima da árvore, acima da montanha. Em pé, no meio do espaço que formava a grande abó-
“Todos morreram. A água tocou o céu três sóis com três boda de árvores, encostado a um velho tronco decepado
noites; depois baixou; baixou até que descobriu a terra. pelo raio, via-se um índio na flor da idade.
“Quando veio o dia, Tamandaré viu que a palmeira es- Uma simples túnica de algodão, a que os indígenas
tava plantada no meio da várzea; e ouviu a avezinha do chamavam “aimará” apertada à cintura por uma faixa de
céu, o guanumbi, que batia as asas. penas escarlates, caía-lhe dos ombros até ao meio da per-
“Desceu com a sua companheira, e povoou a terra.” na, e desenhava o talhe delgado e esbelto como um junco
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 300-301. selvagem.
Sobre a alvura diáfana do algodão, a sua pele, cor do
A cena parece se repetir: Peri, numa luta desuma- cobre, brilhava com reflexos dourados; os cabelos pretos
na com a palmeira, arranca-a do solo, fazendo boiar o cortados rentes, a tez lisa, os olhos grandes com os cantos
seu tronco. Ceci e Peri sobem no tronco e descem o rio exteriores erguidos para a fronte; a pupila negra, móbil,
Paraíba: estavam a salvo7: cintilante; a boca forte mas bem modelada e guarnecida
de dentes alvos, davam ao rosto pouco oval a beleza incul-
A cúpula da palmeira, embalançando-se graciosamen- ta da graça, da força e da inteligência.
te, resvalou pela flor da água como um ninho de garças ou ALENCAR, José de. Op. cit. p. 21-22.
alguma ilha flutuante, formada pelas vegetações aquáti-
cas. A seguir, o trecho em que Peri, numa luta feroz con-
Peri estava de novo sentado junto de sua senhora qua- tra a natureza, vence-a, evidenciando a sua “super-he-
se inanimada: e, tomando-a nos braços, disse-lhe com um roicidade”:
acento de ventura suprema:

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— Tu viverás!… Três vezes os seus músculos de aço, estorcendo-se, incli-
Cecília abriu os olhos, e vendo seu amigo junto dela, naram a haste robusta; e três vezes o seu corpo vergou, ce-
ouvindo ainda suas palavras, sentiu o enlevo que deve ser dendo a retração violenta da árvore, que voltava ao lugar
o gozo da vida eterna. que a natureza lhe havia marcado.
— Sim?… murmurou ela: viveremos!… lá no céu, no Luta terrível, espantosa, louca, esvairada: luta da vida
seio de Deus, junto daqueles que amamos!… contra a matéria; do homem contra a terra; luta da força
O anjo espanejava-se para remontar ao berço. contra a imobilidade.
— Sobre aquele azul que tu vês, continuou ela, Deus Houve um momento de repouso em que o homem,
mora no seu trono, rodeado dos que o adoram. Nós iremos concentrando todo o seu poder, estorceu-se de novo con-
lá, Peri! Tu viverás com tua irmã, sempre…! tra a árvore; o ímpeto foi terrível; e pareceu que o corpo ia
Ela embebeu os olhos nos olhos de seu amigo, e lângui- despedaçar-se nessa distensão horrível.
da reclinou a loura fronte. Ambos, árvore e homem, embalançaram-se da terra já
O hálito ardente de Peri bafejou-lhe a face. minada profundamente pela torrente.
Fez-se no semblante da virgem um ninho de castos ru- A cúpula da palmeira, embalançando-se graciosamente,
bores e límpidos sorrisos: os lábios abriram como as asas resvalou pela flor da água como um ninho de garças ou algu-
purpúreas de um beijo soltando o voo. ma ilha flutuante, formada pelas vegetações aquáticas.
A palmeira arrastada pela torrente impetuosa fugia… ALENCAR, José de. Op. cit. p. 302.
E sumiu-se no horizonte.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 302. Cecília
Filha de d. Antônio de Mariz:
PERSONAGENS
Peri Os grandes olhos azuis, meio cerrados, às vezes se
Peri, índio goitacá, é considerado o primeiro “super- abriam languidamente como para se embeberem de luz,
-herói” da literatura brasileira: e abaixavam de novo as pálpebras rosadas.

7. Notem o final em aberto, o que causou certo descontentamento na época em que fora lançada em folhetim. O público leitor, romântico, esperava uma definição
direta com relação ao amor entre Peri e Ceci, isto é, um “beijo final”, que caracteriza o final romântico, hoje típico de nossas telenovelas.

10
Os lábios vermelhos e úmidos pareciam uma flor da Português de antiga têmpera, fidalgo real, entendia
gardênia dos nossos campos, orvalhada pelo sereno da que estava preso ao rei de Portugal pelo juramento da no-
noite; o hálito doce e ligeiro exalava-se formando um sorri- breza, e que só a ele devia preito e menagem. Quando pois,
so. Sua tez alva e pura como um floco de algodão, tingia-se em 1582, foi aclamado no Brasil d. Filipe II como o sucessor
nas faces de uns longes cor-de-rosa, que iam, desmaiando, da monarquia portuguesa, o velho fidalgo embainhou a
morrer no colo de linhas suaves e delicadas. espada e retirou-se do serviço.
O seu traje era do gosto o mais mimoso e o mais origi- […]
nal que é possível conceber; mistura de luxo e simplicidade. Isso se passara em abril de 1593; no dia seguinte, co-
Tinha sobre o vestido branco de cassa um ligeiro saiote meçaram os trabalhos da edificação de uma pequena
de rico azul apanhado à cintura por um broche; uma espé- habitação que serviu de residência provisória, até que os
cie de arminho cor de pérola, feito com a penugem macia artesãos vindos do reino construíram e decoraram a casa
de certas aves, orlava o talho e as mangas; fazendo realçar que já conhecemos.
a alvura de seus ombros e o harmonioso contorno de seu ALENCAR, José de. Op. cit. p. 13.
braço arqueado sobre o seu seio.
Os longos cabelos louros, enrolados negligentemente D. Lauriana
em ricas tranças, descobriam a fronte alva, e caíam em Esposa de d. Antônio de Mariz, mãe de Cecília e Diogo:
volta do pescoço presos por uma rendinha finíssima de
fios de palha cor de ouro, feita com uma arte e perfeição Sua mulher, d. Lauriana, dama paulista, imbuída de to-
admirável. dos os prejuízos de fidalguia e de todas as abusões religio-
A mãozinha afilada brincava com um ramo de acácia que sas daquele tempo; no mais, um bom coração, um pouco
se curvava carregado de flores, e ao qual de vez em quando egoísta, mas não tanto que não fosse capaz de um ato de
segurava-se para imprimir à rede uma doce oscilação. dedicação.
Esta moça era Cecília. ALENCAR, José de. Op. cit. p. 15.
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ALENCAR, José de. Op. cit. p. 26-27.


[…]
D. Antônio de Mariz D. Lauriana era uma senhora de cinquenta e cinco
Nobre português, pai de Cecília (Ceci) e Diogo. Casa- anos; magra; mas forte e conservada como seu marido;
do com d. Lauriana. tinha ainda os cabelos pretos matizados por alguns fios
brancos que escondia o seu alto penteado, coroado por
De seu chapéu de feltro pardo sem pluma escapavam- um desses antigos pentes tão largos que cingiam toda a
-se os anéis de cabelos brancos, que caíam sobre os om- cabeça, e fingiam uma espécie de diadema.
bros; através da longa barba alva como a espuma da cas- Seu vestido de lapim cor de fumo, de cintura compri-
cata, brilhavam suas faces rosadas, sua boca ainda expres- da, um pouco curto na frente, tinha a cauda respeitável,
siva, e seus olhos pequenos mas vivos. que ela arrastava com um certo donaire de fidalga, res-
Este fidalgo era d. Antônio de Mariz que, apesar de seus to de sua beleza, há muito perdida. Longas arrecadas de
sessenta anos, mostrava um vigor devido talvez à vida ati- ouro com pingentes de esmeralda, que lhe roçavam quase
va; trazia ainda o porte direito, e tinha o passo firme e se- os ombros, e um colar com uma cruz de ouro ao pescoço
guro como se estivesse na força da idade. eram todos os seus ornatos.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 32. Quanto ao moral, já dissemos que era uma mistura de
fidalguia e devoção; o espírito de nobreza que em d. Antô-
Vale registrar que d. Antônio de Mariz construiu sua nio de Mariz era um realce, nela tornava-se uma ridícula
fortaleza nas matas do Rio de Janeiro por fidelidade a exageração.
Portugal e indignado com relação à União das Coroas ALENCAR, José de. Op. cit. p. 34.
Ibéricas em 1580:
[…]
A derrota de Alcácer-Quibir e o domínio espanhol que se
8
Só em um ponto a sua firmeza tinha sido baldada; e
lhe seguiu vieram modificar a vida de d. Antônio de Mariz. fora em vencer a repugnância que d. Lauriana tinha por sua

8. Em 1578, d. Sebastião, jovem rei português, participou da batalha em Marrocos, norte da África (conhecida como Alcácer-Quibir, “grande fortaleza”), na tentativa
de expandir a fé cristã entre os mulçumanos. Teria desaparecido no areal, deixando Portugal sem um herdeiro para a Coroa. Em 1580. D. Filipe II, rei da Espanha,
propôs a unificação das coroas espanhola e portuguesa.

11
sobrinha; mas como o velho fidalgo sentia talvez doer-lhe a a touça de cardos junto da qual se passou a última cena
consciência nesse objeto, deixou sua mulher livre de proceder que narramos; examinou-a por todos os lados e sorriu de
como lhe parecesse, e respeitou os seus sentimentos. satisfeito. Trepando à árvore, e escorregando pelo cipó, en-
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 35. traram ele e o selvagem na área que já conhecemos; o sol
tinha nascido há pouco.
D. Diogo No dia seguinte, por volta de duas horas da tarde, saiu
Irmão de Ceci, filho de d. Antônio de Mariz e d. Lauriana: deste lugar um só homem; não era ele o frade nem o sel-
vagem. Era um aventureiro destemido e audaz, em cuja
Seu filho, d. Diogo de Mariz, que devia mais tarde pros- fisionomia se reconheciam ainda os traços do carmelita fr.
seguir na carreira de seu pai, e lhe sucedeu em todas as Ângelo di Luca.
honras e forais; ainda moço, na flor da idade, gastava o Este aventureiro chamou-se Loredano.
tempo em correrias e caçadas. Deixava naquele lugar e sepultado no seio da terra um
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 15. terrível segredo; isto é, um rolo de pergaminho, um burel
de frade e um cadáver.
Isabel Cinco meses passados, o vigário da ordem participava
Tratada como sobrinha por d. Antônio de Mariz, mas, ao geral em Roma que o irmão fr. Ângelo di Luca morrera
em verdade, era filha dele com uma índia: como santo e mártir no zelo de sua fé apostólica.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 89-90.
Neste ponto do seu sonho, a portinha interior do jardim
abriu-se, e outra moça, roçando apenas a grama com o D. Álvaro
seu passo ligeiro, aproximou-se da rede. Nobre, que morava na casa de d. Antônio de Mariz.
Era um tipo inteiramente diferente do de Cecília; era o Nutria por Cecília um amor puro. Entretanto, era Isabel
tipo brasileiro em toda a sua graça e formosura, com o en- quem o amava. Ao morrer, em um combate com os ín-

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cantador contraste de languidez e malícia, de indolência e dios aimorés, Isabel suicida-se, caindo sobre o seu cadá-
vivacidade. ver, que fora levado à casa de d. Antônio por Peri:
Os olhos grandes e negros, o rosto moreno e rosado, ca-
belos pretos, lábios desdenhosos, sorriso provocador, da- Álvaro, em atenção a ser o seu primeiro dia de chegada,
vam a este rosto um poder de sedução irresistível. fora emprezado pelo velho fidalgo para tomar parte nessa
Ela parou em face de Cecília meio deitada sobre a rede, coleção da família, o que havia recebido como um favor
e não pôde furtar-se à admiração que lhe inspirava essa imenso.
beleza delicada, de contornos tão suaves; e uma sombra O que explicava esse apreço e grande valor, dado por
imperceptível, talvez de um despeito, passou pelo seu ros- ele a um tão simples convite, era o regime caseiro que d.
to, mas esvaeceu-se logo. Lauriana havia estabelecido na sua habitação.
Sentou-se numa das bandas da rede, reclinando sobre ALENCAR, José de. Op. cit. p. 39.
a moça para beijá-la ou ver se estava dormindo.
Cecília, sentindo um estremecimento, abriu os olhos e Aires Gomes
fitou-os em sua prima. Fiel escudeiro de d. Antônio de Mariz:
— Preguiçosa! — disse Isabel sorrindo.
ALENCAR, José de. Op. cit. p. 28. O outro velho, que caminhava a seu lado com o cha-
péu na mão, era Aires Gomes, seu escudeiro e antigo com-
Loredano panheiro de sua vida aventureira; o fidalgo depositava a
O vilão de O guarani. Identificado na trama como o maior confiança na sua discrição e zelo.
“gênio do mal”, Loredando, ex-frade carmelita, de nome A fisionomia deste homem tinha, quer pela sagacidade
fr. Ângelo di Luca, possuía o mapa do bandeirante Ro- inquieta que era a sua expressão ordinária, quer pelos seus
bério Dias. Apaixonado por Ceci — um desejo ardente traços alongados, uma certa semelhança com o focinho
— intencionava matar a família da moça, raptá-la e ex- da raposa, semelhança que era ainda mais aumentada
plorar as minas de prata: pelo seu trajo bizarro. Trazia sobre o gibão de belbutina
cor de pinhão uma espécie de véstia do pelo daquele ani-
O carmelita acompanhado pelo selvagem partiu: va- mal, do qual eram também as botas compridas, que lhe
gou pela floresta e pelo campo em todas as direções; al- serviam quase de calções.
guma coisa procurava. Ele avistou depois de duas horas ALENCAR, José de. Op. cit. p. 32.

12
8. Bibliografia
ALENCAR, José de. O guarani, São Paulo: Companhia
Editora Nacional, 2004.
___________. Sonhos d’ouro, São Paulo: Saraiva, 1959.

1 (Fuvest-SP) Assim, o amor se transformava tão com- IV. O final do livro marca o retorno a um passado mítico,
pletamente nessas organizações, que apresentava três pois Peri e Cecília simbolicamente regressam à época
sentimentos bem distintos: um era uma loucura, o outro do dilúvio.
uma paixão, o último uma religião. Então, estão corretas:
__________ desejava; ____________ amava; a) I e II.
______________ uma religião. b) I, II e III.
Neste excerto de O guarani, o narrador caracteriza os c) I, II e IV.
diferentes tipos de amor que três personagens mascu- d) I, III e IV.
linas sentem por Ceci. Mantida a sequência, os trechos e) Todas.
pontilhados serão preenchidos corretamente com o
nome das personagens: 4 (Fuvest-SP) Leia o fragmento da obra O guarani, de
a) Álvaro/Peri/d. Diogo José de Alencar, para responder ao teste:
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

b) Loredano/Álvaro/Peri
c) Loredano/Peri/d. Diogo De um dos cabeços da serra dos Órgãos desliza um fio
d) Álvaro/d. Diogo/Peri de água que se dirige para o norte, e engrossado com os
e) Loredano /d. Diogo / Peri mananciais que recebe no seu curso de dez léguas, torna-
-se rio caudal.
2 (Fuvest-SP) – Sobre o romance indianista de José de É o Paquequer: saltando de cascata em cascata, enros-
Alencar, pode-se afirmar que: cando-se como uma serpente, vai depois se espreguiçar na
a) analisa as reações psicológicas da personagem como várzea e embeber no Paraíba, que rela majestosamente
um efeito das influências sociais. em vasto leito. Dir-se-ia que vassalo e tributário desse rei
b) é um composto resultante de formas originais do conto. das águas, o pequeno rio, altivo e sobranceiro contra os
c) dá forma ao herói, amalgamando-o à vida da natureza. rochedos, curva-se humildemente aos pés do suserano.
d) apresenta contestação política ao domínio português. Perde, então, a beleza selvática; suas ondas resvalam sobre
e) contém-se preso aos modelos legados pelos clássicos. elas: escravo submisso, sofre o látego do senhor.

3 (PUC-SP) O romance, O guarani, de José de Alencar, Considere as afirmações a seguir e assinale a alterna-
publicado em 1857, é um marco da ficção romântica tiva correta:
brasileira. Dentre as características mais evidentes do I. O texto é predominantemente descritivo e carrega-
projeto romântico que sustentam a construção dessa do de recursos de linguagem poética. Um exemplo
obra, destacam-se: é a prosopopeia “curva-se humildemente aos pés do
I. A figura do protagonista, o índio Peri, que é um típi- suserano”.
co herói romântico, tanto pela sua força física como II. O narrador mostra a relação entre os rios Paraíba e
pelo seu caráter. Paquequer a partir de uma analogia com o mundo
II. O amor do índio Peri por Cecília, uma moça branca, feudal, na qual o primeiro surge como “rei das águas”
sendo que esse amor segue o modelo medieval do e o segundo como “vassalo”.
amor cortês. III. No modo de qualificar a paisagem, há uma forte co-
III. O fato de o livro ser ambientado na época da coloni- notação de hierarquia.
zação do Brasil pelos portugueses, dada a predileção a) Estão incorretas todas as afirmações.
dos românticos por narrativas históricas. b) Estão corretas as afirmações I e II.

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c) Estão corretas as afirmações I e III. a) O cenário da obra é a mata atlântica.
d) Estão corretas as afirmações I, II e III. b) O narrador nunca faz parte da história, apesar de
e) Está correta somente a afirmação III. contá-la.
c) A obra é narrada em 3ª pessoa, com narrador onis-
5 (Fuvest-SP) A oposição natureza / cultura é o eixo ciente que conta a história.
mais importante da sustentação da narrativa e de ca- d) A obra é narrada em versos.
racterização de personagens de O guarani, de José de e) No momento da destruição da casa de d. Antônio de
Alencar. A partir dessa oposição, podem-se determinar Mariz, ocorre a trágica morte de Cecília e Peri.
várias relações antitéticas, de acordo com o ponto de
observação adotado. 8 (Fuvest-SP) Leia o trecho de O guarani, de José de
Assinale a alternativa em que essa oposição não se Alencar, para responder ao teste:
expressa:
a) Peri e os demais índios aimorés representam o ho- Álvaro fitou no índio um olhar admirado. Onde é que
mem em seu estado natural, enquanto d. Antônio de este selvagem sem cultura aprendera a poesia simples,
Mariz e os aventureiros representam a cultura pró- mas graciosa; onde bebera a delicadeza de sensibilidade
pria da civilização europeia. que dificilmente se encontra num coração gasto pelo atrito
b) Peri em si mesmo simboliza a oposição natureza/cul- da sociedade?
tura, pois é o indígena livre que transita com adequa-
ção e elegância entre os brancos europeus. Em relação ao trecho, pode-se afirmar:
c) Índios aimorés contrapõem-se pela violência antro- a) Nele se adota uma das principais teses naturalistas,
pofágica ao mundo organizado pelas leis cavalhei- pelo fato de se atribuir à terra a determinação do ca-
rescas que definem as relações entre d. Antônio de ráter de seus habitantes primitivos.
Mariz e os aventureiros. b) Representa o reconhecimento de características ina-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
d) A fortificação de muralhas de pedras que caracteriza tas dos indígenas, as quais não se verificam em habi-
a casa da família Mariz é símbolo de contraste entre a tantes das cidades civilizadas da Europa.
exuberante paisagem natural e a arquitetura do ho- c) A inautenticidade com que se apresenta o índio bra-
mem branco colonizador. sileiro revela um ângulo de observação que combina
e) Álvaro, espécie de cavaleiro medieval, lembra a hon- com o desejo de enaltecimento das raízes da pátria.
ra e a lealdade determinadas pelas relações culturais d) Faz parte da primeira obra da literatura brasileira que
do branco europeu e Loredano, vilão da narrativa, manifesta interesse em traduzir e explicar a realidade
simboliza a insubordinação, deslealdade e ambição da vida indígena.
que se alastram num espaço primitivo, selvagem, do e) A idealização do selvagem está diretamente associa-
tempo da colonização brasileira. da às fantasias egocêntricas românticas e, portanto,
não pode ser entendida como expressão de um cará-
6 (Fuvest-SP) Ao final da narrativa, Ceci decide perma- ter genérico, nacional.
necer na selva com Peri: “— Peri não pode viver junto de
sua irmã na cidade dos brancos, sua irmã fica com ele no 9 Com relação às três obras indianistas de José de
deserto, no meio da floresta”. A decisão de Ceci traduz: Alencar, responda: qual a intenção de José de Alencar
a) a supremacia da cultura indígena sobre a branca eu- ao escrever exatamente três romances indianistas?
ropeia.
b) a capacidade de renúncia da mulher que, por amor, 10 Sobre O guarani, de José de Alencar, assinale a alter-
submete-se a intensos sacrifícios. nativa incorreta:
c) a impossibilidade de Peri habitar a cidade, entre os a) A obra se passa na época da União das Coroas Ibéri-
civilizados. cas.
d) o entrelaçamento da civilização branca europeia e da b) Peri é considerado o primeiro “super-herói” da litera-
cultura natural indígena. tura brasileira.
e) o reconhecimento de que o ambiente natural é o es- c) O romance, além de indianista, tem um caráter histórico.
paço perfeito para a realização amorosa. d) As duas tribos exploradas na obra são: goitacá e ai-
moré.
7 (U. F. Lavras-MG) Com relação à obra O guarani, de e) Peri e Ceci não ficam juntos devido ao paganismo do
José de Alencar, pode-se afirmar: índio.

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1. b

2. b

3. e

4. d

5. e

6. d

7. c

8. a

9. Em Iracema, o autor procurar mostrar a figura do europeu (Martim) assimilando a cultura indígena (Iracema); em
O guarani, tem-se o oposto, isto é, a figura do índio (Peri) assimilando a cultura europeia (Cecília); em Ubirajara,
há somente índios, portanto, sem a presença do europeu.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

10. e

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