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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE BELAS-ARTES

OS MONSTROS NA ILUSTRAÇÃO PARA A


INFÂNCIA

A ponte que liga o medo à sua resolução

Beatriz Túbal Carapuça

Dissertação

Mestrado em Educação Artística

Dissertação orientada pela Profª Doutora Cristina Tavares e pela Profª Doutora Ana Bela
Mendes

2017
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Resumo

Desde tenra idade que começa a nossa relação com os monstros: o medo do escuro, do
desconhecido, da solidão. Imaginamos o que não conseguimos compreender e isso pode
ser assustador. A sensação de medo é uma forma do nosso organismo nos avisar que
existem situações de perigo, físico ou emocional.

Criaturas monstruosas, algumas com aparência humana, outras híbridas, surgiam


descritas na mitologia greco-romana. As Esfinges, com corpo de leão e rosto humano,
protegiam os templos egípcios, criaturas sobrenaturais assombravam os indígenas na
América do Norte e os espíritos demoníacos oni faziam parte da tradição japonesa. Na
Idade Média a Europa medieval estava repleta de histórias fantásticas com dragões que
cuspiam fogo e gigantes que comiam homens.

Autores de fábulas, contos de fadas, contos tradicionais e moralistas tentaram, ao longo


dos anos, descrever ao público infantil, juvenil e adulto, de forma simples e objetiva, o
significado do medo e como enfrentá-lo. O psicanalista Bruno Bettelheim dedicou-se ao
estudo dos contos de fadas e que impacto teriam na vida das crianças. As crianças
identificam-se com as personagens: a solidão, os medos e os receios do herói.

Com o maravilhoso legado que escritores e ilustradores, portugueses e internacionais,


nos deixaram neste novo milénio, surge uma nova abordagem no cuidado dado à
ilustração na literatura infantil. Em todo o mundo são organizados festivais, exposições
e conferências, onde os melhores autores e artistas/ilustradores são premiados.

Atualmente, na Península Ibérica existem editoras especializadas em publicações para


crianças e jovens e que estão a ter sucesso em mercados além fronteiras. Destacam-se:
“Planeta Tangerina”, “Pato Lógico” e “Kalandraka”.

Nos livros infantis modernos predomina a presença do humor, e é desta maneira que as
histórias selecionadas apresentam a visão do medo, com monstros brincalhões,
demónios, bruxas, fantasmas inofensivos e animais fantásticos que espalham magia
desde o nascimento da civilização.

Palavras-chave: monstro; medo; ilustração; infância; literatura infanto-juvenil.

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Abstract

Since young age that our relation with monsters begins: fear of the dark, the unknown,
the loneliness. We imagine what we can’t understand and that can be frightful. The
sensation of fear is a way for our body to warn us about danger situations, physical or
emotional.

Monstrous creatures, some with human appearance, other hybrids, appeared described
in graeco-roman mythology. The Sphinxes, with lion body and human face, protected
the egypcian temples, supernatural creatures haunted North America’s natives and
demonic spirits “oni” made part of the Japanese tradition. In Middle Age medieval
Europe was filled with fantastic stories about fire breathing dragons and giants who ate
men.

Authors of fables, fairy tales, traditional and moralist tales tried, over the years, to
describe to children, young and adult people, in a simple and objective way, the
meaning of fear and how to face it. Psychoanalyst Bruno Bettelheim dedicated himself
to the study of fairy tales and what impact they would have on children’s lives. Children
identify with the characters: the loneliness, the fears and restlessness of the hero.

With the wonderful legacy that writers and illustrators, Portuguese and international,
have left us in this new millennium, a new approach arises in care given to illustration
in children’s literature. Around the world festivals, exhibitions and conferences are
organized, where the best authors and artists/illustrators are awarded.

Currently, in Iberian Peninsula there are book publishers specialized in publications for
children and young people, who are succeeding in markets across borders. Some of the
most relevant are: “Planeta Tangerina”, “Pato Lógico” and “Kalandraka”.

In modern children’s books the presence of humor predominates, and in this way the
selected stories introduce the vision of fear, with playful monsters, demons, witches,
harmless ghosts and fantastic animals that spread magic since the birth of civilization.

Keywords: monster; fear; illustration; childhood; children’s literature.

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Agradecimentos

Ninguém cresce sozinho!

Sem a ajuda da Orientadora Cristina Tavares e da Coorientadora Ana Bela Mendes esta
dissertação não teria sido possível. No entanto, não me posso esquecer os esforços da
Coorientadora inicial, a professora Sara Bahia. Também quero agradecer aos amigos,
colegas de mestrado, pessoal ao serviço nas bibliotecas públicas a que me dirigi, ao
Agrupamento de Escolas de Ferreira do Alentejo e seus alunos e aos ilustradores que
partilharam comigo elementos do seu trabalho.

Quero agradecer à minha família todo o esforço e empenho que tiveram na minha
formação pessoal. Sem eles, não seria a pessoa que sou hoje.

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Índice

Introdução ......................................................................................................................... 7

1 - O papel pedagógico dos “monstros” ......................................................................... 10

1.1 - Os monstros na pedagogia...................................................................................... 10

1.2 – A abordagem do “medo” na infância..................................................................... 14

1.2.1 – A visão do “medo” nas artes e no mundo do espectáculo .................................. 21

2 - Contextualização da ilustração infanto-juvenil portuguesa no novo milénio (2000-


2016) ............................................................................................................................... 22

2.1 – A ilustração na literatura................................................................................... 22

2.1.1 – Breve resumo das origens da literatura e da ilustração infanto-juvenil .............. 22

2.1.2 - A ilustração infanto-juvenil no novo milénio...................................................... 33

2.2 –Ilustradores portugueses mais relevantes do século XXI ....................................... 35

2.2.1 – Editora Pato Lógico ............................................................................................ 35

2.2.2 – Editora Planeta Tangerina................................................................................... 36

2.2.3 – Editora Kalandraka ............................................................................................. 37

3 – Abordagem teórica e abordagem plástica das ilustrações infanto-juvenis portuguesas


relacionadas com a temática dos medos e monstros....................................................... 39

3.1 - Medos ..................................................................................................................... 39

3.2 - O Desconhecido ..................................................................................................... 46

3.3 - Monstros ................................................................................................................. 51

3.4 – Mitologia, Figuras Bíblicas e Criaturas Fantásticas .............................................. 55

3.5 – Diabos .................................................................................................................... 64

3.6 - Bruxas e Feiticeiros ................................................................................................ 69

3.7 - Fantasmas ............................................................................................................... 71

3.8 – Extraterrestres ........................................................................................................ 73

3.9 – Obras, autores e ilustradores internacionais relacionados com a temática do medo


e dos monstros ................................................................................................................ 75

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

4 – Atividade “Desenhar o medo” .................................................................................. 79

Conclusão ....................................................................................................................... 84

Índice de Imagens ........................................................................................................... 86

Bibliografia Geral ........................................................................................................... 89

Bibliografia de Livros de Ilustração infanto-juvenil ...................................................... 91

Webgrafia ....................................................................................................................... 94

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Introdução

A literatura e a ilustração para crianças é algo relativamente recente. Os contos de fadas


e os clássicos da literatura infantil dos irmãos Grimm e de Perrault foram, na altura da
sua publicação, dedicados a um público adulto. Só com a ascensão da burguesia e a
construção de uma visão de família diferente é que a criança começa a ser vista como
um ser diferente do adulto, com necessidades e características próprias.

As obras que me proponho apresentar pertencem à “nova vaga” de literatura para


crianças. Estes novos escritores e ilustradores revelam um grande investimento, tanto ao
nível da apresentação gráfica e ilustração, como ao nível da escrita e dos assuntos
abordados. A sociedade mudou, as crianças mudaram e a forma como os assuntos são
abordados junto delas também se alterou muito nas últimas décadas.

As dúvidas e as questões colocadas pelas crianças deste século não podem ser as
mesmas que as crianças do século XVIII ou XIX colocavam; se a literatura para a
infância tinha uma função propedêutica e em muitos casos era uma forte arma para
instruir e educar, hoje, é também uma forma de estimular a imaginação e desenvolver o
espírito crítico. No entanto, muitas das dúvidas existencialistas continuam a ser comuns
a muitas gerações… Continuamos a procurar um sentido para a nossa vida e um
caminho para a felicidade.

No primeiro capítulo, intitulado de O papel pedagógico dos “monstros”, irei fazer uma
breve abordagem do mundo dos monstros de uma forma fabulosa/fantástica, remetendo
ao imaginário infantil, e ao imaginário do adulto que “se põe no papel da criança”
abordando a ideia de monstro desde a mitologia grega até aos escritores do
Romantismo.

O antropólogo David D. Gilmore refere quais os monstros mais temidos ao longo dos
séculos em diversas culturas, enquanto o historiador Luiz Nazário agrupa os monstros
em cinco classes e classifica em dezasseis conceitos as características dos monstros e
dos episódios do quotidiano que suscitam o medo.

Em tempos, o medo, a ansiedade e o pânico foram vistos como uma sensação corporal.
Nos nossos dias, a ciência localizou a origem das células nervosas que espoletam essa
sensação. As crianças pequenas não sabem exprimir os sentimentos por palavras e

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fazem-no indiretamente através do medo do escuro e do medo dos monstros. A


abordagem do medo para o público infantil começou pelos contos de fadas que
tradicionais e moralistas, simbolizam o mal através de seres monstruosos, desfigurados,
gigantes…

O conceito do medo também é bastante explorado ao nível cinematográfico, na dança e


na música.

No segundo capítulo, intitulado de Contextualização da ilustração infanto-juvenil


portuguesa no novo milénio (2000-2016), encontra-se um breve resumo da literatura e
da ilustração infanto-juvenil ao longo das épocas, com maior foco em autores
portugueses. As primeiras histórias para as crianças foram as fábulas e as cartas de
sílabas ou cartilhas que ajudavam as crianças a aprender a ler e continham ilustrações
maravilhosas.

Com o desenvolvimento das novas tecnologias, os ilustradores, deste novo milénio têm
uma maior facilidade em editar os seus trabalhos, pois os ambientes digitais conseguem
simular diferentes técnicas artísticas: aguarela, carvão, tinta da china, óleo, acrílico, etc.
Neste capítulo também é feita uma apresentação do trabalho, no âmbito da temática
abordada, de alguns ilustradores portugueses com provas dadas em três editoras
dedicadas à publicação de obras para a infância. Foram escolhidos alguns ilustradores
participantes da Feira do Livro Infantil e Juvenil de Bolonha.

No terceiro capítulo, intitulado de Abordagem teórica e abordagem plástica das


ilustrações infanto-juvenis portuguesas relacionadas com a temática dos medos e
monstros, irei fazer um levantamento de livros com ilustrações focados no mundo
fantástico dos monstros, nos receios das crianças, e em alguns casos os medos dos
próprios monstros. O capítulo está organizado em oito categorias: “Medos”; “O
Desconhecido”; “Monstros”; “Mitologia, Figuras Bíblicas e Criaturas Fantásticas”;
“Diabos”; “Bruxas e Feiticeiros”; “Fantasmas”; “Extraterrestres”. Em cada categoria os
livros estão organizados segundo o ano da primeira publicação.

De forma a contextualizar as obras de novos artistas e autores irei recorrer a algumas


publicações do século XX, no entanto, os livros a que vou dar maior ênfase são de
autoria portuguesa e foram publicados entre os anos 2000 e 2016. Na vertente ilustração
vou dar uma atenção especial à sua plasticidade, tal como o tema da dissertação indica.

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Por último, no quarto capítulo, intitulado de Estudo de Caso, vou remeter para uma
atividade realizada na Escola Básica de Ferreira do Alentejo, no âmbito da
comemoração do “Dia das Bruxas”, onde vários alunos se disponibilizaram a desenhar o
“medo”.

Objetivo

O objetivo desta dissertação é dar a conhecer autores e ilustradores portugueses, cujas


obras literárias e artísticas se focam no maior medo das crianças: os monstros, o escuro
e o desconhecido.

Metodologia do trabalho prático

No âmbito do projeto multidisciplinar sobre a comemoração do “Dia das Bruxas” foi


realizada uma leitura expressiva, em voz alta, da obra “A Bruxa Arreganhadentes” de
Tina Meroto e ilustrada por Maurizio A. C. Quarello. Após a leitura foi elaborada uma
exploração oral das ilustrações. As crianças tiveram a oportunidade de falar sobre o que
sentiam, o que pensavam, o que lhes sugeria, cada uma das ilustrações que acompanham
a história. No seguimento, foi lançada a proposta de uma atividade de expressão
plástica. Cada aluno recebeu uma folha com instruções visuais e escritas e material para
a realização de uma pequena bruxa montada numa vassoura. Com a ajuda do professor e
seguindo o guião, as crianças, foram construindo primeiro a bruxa e depois a vassoura.
No dia seguinte, foi proposto por mim, após uma breve explicitação do pretendido a
realização de uma atividade de desenho. As crianças desenharam a temática
apresentada: o “medo”.

No final da atividade, cada um entregou o seu trabalho. Estes trabalhos constam no


capítulo 4.

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

1 - O papel pedagógico dos “monstros”

1.1 - Os monstros na pedagogia

Desde tenra idade que as crianças são atormentadas pelo medo do escuro, da noite, do
desconhecido e dos monstros.

“O corpo do monstro incorpora — de modo bastante literal — medo, desejo, ansiedade


e fantasia.”1

Na Grécia Antiga, os monstros surgiam muitas vezes referidos na mitologia. Monstros


como cíclopes, centauros, criaturas híbridas que devido às suas características humanas
e animalescas aparentavam ser verídicos e suscitavam o medo aos grandes heróis
clássicos. Paul Newman refere no seu livro “História do Terror: O medo e a angústia
através dos tempos” que da mitologia grega nasceu a expressão de “pânico” do deus-
bode Pan, que atacava qualquer pessoa que interrompesse a sua sesta.

De acordo com Jacques Le Goff, muita da imaginação destas criaturas provinha da


curiosidade e do mistério das terras orientais. Os escritos de Ctésia de Cnido, no início
do século IV a.C., e de Megástenes, no ano 300 a.C., estão na origem das fábulas
relativas à Índia, conotada como “mundo maravilhoso dos sonhos do Ocidente”2 , que
descreviam criaturas fantásticas. Os deuses descritos na religião hindu são
particularmente seres híbridos.

Na Idade Média todas as histórias eram contadas através do discurso oral. As narrações
eram reforçadas de forma a mostrar aos ouvintes a veracidade, a bestialidade e a
malvadez desta histórias fantásticas. Insistia-se na descrição e na credibilidade através
do excesso de caracteristicas reais: os monstros apresentavam corpos desfigurados e
deformados, desproporcionais, ora exageradamente altos ou com falta de partes do
corpo.

1
Jeffrey Jerome Cohen (2007) p. 26 e 27
2
Jacques Le Goff (1980) para. 604

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Os Monstros na Ilustração para a Infância

Tal como na maioria dos mitos, dos contos tradicionais e dos contos de fadas, os
receios, os desejos proibidos e os medos dos indivíduos são personificados nos
monstros. Medo este que era combatido através da inteligência e da força do herói.

No Renascimento, de acordo com Gil, o monstro era “produzido” igualmente


por uma vontade de saber científico, para aumentar a erudição sobre os novos
mundos e para conhecer o mundo em que se vivia.3

No renascimento os monstros são encarados com um olhar científico. Já não são


somente fruto da imaginação e são também características complementares de pessoas
reais, as chamadas de aberrações.

Alex Martoni escreveu um ensaio intitulado de “A estética gótica na literatura e no


cinema”, onde refere que existe um fascínio por monstros que vem do “romance gótico”
do príncipio do século XIX. Os escritores da época vitoriana viram o potencial dos
corpos mumificados e inspiraram-se em personagens que voltam à vida após a morte.
Os famosos romances de horror ocidentais como o Frankenstein de Mary Shelley e o
Drácula de Bram Stoker trouxeram o terror a um outro nível. A primeira história na
literatura inglesa sobre um vampiro foi da autoria de John Polidori e intitulava-se de
“Vampyre”, escrito em 1819.

Neste fim de século4 , os monstros proliferam: vemo-los por todos os lados, no


cinema, na banda desenhada, em gadgets e brinquedos, livros e exposições de
pintura, no teatro e na dança. Invadem o planeta, tornando-se familiares. 5

David D. Gilmore, professor de antropologia e autor de vários livros, estudou o mundo


fascinante dos monstros imaginários. Na sua obra “Monsters: Evil Beings, Mythical
Beasts, and All Manner of Imaginary Terrors” descreve, ao longo das épocas, quais
foram os monstros mais temidos das diversas culturas. Desde as esculturas
monumentais de esfinges protectoras dos templos egípcios, como os monstros e deuses
mitológicos relatados nas aventuras do herói Hércules e nas obras Odisseia e Ilíada de
Homero, a criatura sobrenatural wendigo, que faz parte do folclore dos indígenas da
América do Norte, até aos demónios descritos na tradição japonesa, intitulados de
espíritos oni, e ao monstro asiático mais célebre: “Godzilla”.

3
Fernando M. M. Arnaldo Pinto da Silva (2007) p. 88
4
Remetendo ao final do século XX.
5
José Gil (2007) p. 167

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Graças à imaginação sentida na magia da Idade Média, por contraste com os contos de
fadas ao relatarem de forma moralista e infantilizada esta magia, a Europa medieval está
repleta de folclore, os dragões eram alguns dos monstros mais temidos e na Europa do
norte, na Escandinávia e na antiga Germânia, acreditava-se na existência de gigantes
que comiam homens.

O escritor de contos de fadas Charles Perrault (1628-1703) inspirou-se no medo à volta


da criatura lobisomem para criar a história do Capuchinho Vermelho.

Como os pesadelos dos homens são universais, muitos dos monstros partilham
características comuns: são gigantes, agressivos, comem humanos, têm corpos bizarros
e deformados.

No livro “Da Natureza dos Monstros”, escrito pelo historiador brasileiro Luiz Nazário,
o autor, através de teorias da monstruosidade, faz um paralelismo entre os monstros e o
cinema. Agrupa os monstros em cinco classes: os “monstros antropomorfos” que são
seres humanos alterados por natureza ou por ciência e criaturas sobrenaturais com
características híbridas humanas; os “monstros zoomorfos” que englobam animais
únicos, alterados por experiência ou com características sobrenaturais; os “monstros
vegetais” que, tal como o nome diz, são criaturas que tomam a forma de plantas
monstruosas; os “monstros polimorfos” em que as criaturas têm formas indefinidas e
matérias informes e disformes; e, por fim, os “monstros microscópicos”,
microorganismos como vírus, bactérias e germes.

Para classificar os diversos atríbutos dos monstros ou episódios do quotidiano que


suscitem o terror e o medo, Nazário faz referências a vários conceitos: “Agarramento”,
é o medo que sentimos ao ser agarrados, por um estranho em plena luz do dia ou por um
monstro; “Ubiquidade”, ver alguém ou algo num local inesperado, o monstro pode estar
em toda a parte e atacar quando menos se espera; “Unicidade”, monstros únicos e de
origens misteriosas, com características divinas primitivas e devastadoras;
“Invisibilidade”, capacidade de ver e não ser visto, possibilidade de se deslocar no
espaço e no tempo sem restrições; “Ferocidade”, monstros mutantes de dimensões
extraordinárias com características de animais ferozes e selvagens; “Voracidade”,
monstros que devoram tudo o que encontram; “Imortalidade”, muitos homens procuram
a juventude eterna, e nos mitos populares aqueles que a encontram tornam-se criaturas
monstruosas, como por exemplo a personagem principal do livro “O Retrato de Dorian

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Gray”, de Óscar Wilde; “Materialidade”, monstros com características concretas, têm


corpos musculados, pêlos, dentes aterradores, garras, etc.; “Progressividade”, todas as
histórias assustadoras têm uma evolução crescente, em que no início o mal reina e no
grande final o bem triunfa, ou não; “Indestrutibilidade”, monstros resistentes a todos os
ataques; “Hereditariedade”, mal que se transmite pelo sangue de forma hereditária;
“Reprodutibilidade”, monstros que se reproduzem através de ovos, virús, parasitas, etc.,
ou até deles próprios, dividindo-se, e que dão origem a uma nova geração de criaturas;
“Mutabilidade”, o processo de metamorfose no corpo; “Contaminação”, corpo
contagiado e que sofre uma transformação, perdendo a identidade e padecendo de
deterioração moral e decomposição física; “Despersonalização”, o corpo perde a sua
identidade e converte-se à monstruosidade; “Reversão”, suspeitar que os humanos não
são humanos na realidade, o que vemos é uma casca e o que se esconde por dentro leva
à paranoia.

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Os Monstros na Ilustração para a Infância

1.2 – A abordagem do “medo” na infância

(…) a sensação de medo é produzida em caminhos minúsculos entre células


nervosas numa pequena porção de tecido em forma de amêndoa chamada
amígdala. (…) O medo tem sido dividido em quatro componentes: a experiência
subjectiva de se estar nervoso ou apreensivo: mudanças fisiológicas; efeitos
exteriores, como tremores ou tensão; e a tendência para recuarmos perante
certas situações ou para as evitarmos. 6

Paul Newman7 refere que em tempos o medo era visto como uma sensação corporal, os
joelhos tremem, o estômago contrai-se e cria uma sensação de ansiedade e pânico, mas
com a evolução da ciência, mesmo não sendo totalmente exacto, foi possível sintetizar
estas sensações a um único local: a amígdala. Fisiologicamente, o medo é semelhante à
curiosidade e à excitação, o que diferencia é a maneira como é interpretado de forma
psicológica. Um método terapêutico de tratar o medo é obter conhecimento e
experiência de modo a controlar as emoções e a enfrentá-lo.

O autor fala sobre a comercialização do medo, e como por exemplo refere que as
pessoas tinham medo de ir à rua e ser atacadas até ser colocada iluminação, desde então
esse medo apaziguou mas resultou num outro: o medo de ser assaltado e os bens serem
roubados. Quantos mais bens necessários, mais apólices de seguro são vendidas.

Segundo David Guedes no texto informativo da exposição “Experimentar emoções”


refere que:

As emoções estão envolvidas em quase tudo o que fazemos. (…) A todo o


momento da nossa interação com o mundo estamos a sentir alguma coisa. Por
vezes, somos capazes de traduzir certos aspectos desta experiência interior e

6
Paul Newman (2004), p. 11, 13
7
Paul Newman é um escritor e leitor universitário residente no Reino Unido. É autor de várias obras
como Os Deuses Perdidos de Albion (1998) e Haunted Cornwall (2005). No livro História do Terror: O
medo e a angústia através dos tempos (2000) descreve a sensação de medo desde os espíritos ancestrais
da pré-história, o medo do desconhecido, o fascínio medieval pelo inferno, a caça às bruxas, num sentido
profundo e emocional como é explorado no romântismo, até ao fenómeno moderno da possível existência
de extraterrestres.

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Os Monstros na Ilustração para a Infância

utilizamos palavras como “tristeza”, “medo” ou “alegria” para comunicar aos


outros aquilo que estamos a sentir. 8

Mais adiante refere ainda:

Mais cedo ou mais tarde, é expectável que cada um de nós passe por
experiências de perda, conquistas, perigos ou frustações. (…) Em grande parte
dos casos, conseguimos identificar alterações no nosso corpo quando sentimos
uma emoção, tais quais como as “borboletas no estômago” na paixão, o “nó na
garganta” associado à ansiedade, o coração a palpitar com o medo ou o
ruborescer das faces com a vergonha. 9

Embora o conhecimento possa ser construído a partir de origens irracionais, antes de


tudo, é a partir dos pais e de quem cuida da criança que esta encontra um sentido na
vida.

Bettelheim10 (1903-1990) considera que: “Quando as crianças são pequenas, é a


literatura que da melhor maneira contém essa informação”. 11 É a partir dos livros
infantis e através de histórias tradicionais, moralistas ou informativas que as crianças
batalham com o seu consciente interior, em que para além de aprenderem a enfrentar
problemas também se divertem com essa mesma aprendizagem. Enriquecem a forma
como encaram a vida e como solucionam problemas que as pertubam, com base na
estimulação da imaginação, no desenvolvimento do intelecto e das emoções. É essencial
na educação a leitura e o ouvir ler. As crianças precisam de compreender o que se
sucede no seu consciente para poder enfrentar as questões do subconsciente.
Familiarizando-se com este por meio de devaneios para responder a tensões
inconscientes.

Dos dois anos e meio aos três anos de idade começa a relação da criança com os
monstros, quando aprende a substituir os objetos por imagens mentais desses mesmos
objetos, o que faz com que ela consiga imaginar coisas como figuras monstruosas e
objetos inanimados com vida.

8
David Guedes (2016), texto de apresentação do folheto da exposição “Exprimentar Emoções”.
9
Idem, ibidem.
10
Bruno Bettelheim é um psicanalista austro-americano. Estudou literatura, história de arte e estética.
Durante 30 anos foi diretor da Escola Ortogénica em Chicago, um centro terapêutico para crianças com
perturbações graves do comportamento, inclusive autismo e esquizófrenia.
11
Bettelheim (1998), p. 10

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As histórias infantis e as histórias tradicionais e moralistas, tais como os contos de


fadas, oferecem à imaginação das crianças novas dimensões que seria impossível ela
descobrir por si só.

Segundo Paul Newman, Sigmund Freud diz que o medo advém do condicionamento e
de estimulos negativos, por parte de padrões familiares, de experiências pessoais ou até
mesmo da lei.

De acordo com Bettelheim os pais desenvolvem a ideia de que as crianças têm que ser
poupadas daquilo que mais as perturba, fazendo com que os filhos acreditem que todos
os homens são bons, que os homens não são monstros. Em fase precoce, as crianças não
sabem exprimir sentimentos por palavras e fazem-no de forma indirecta como o medo
do escuro, o medo de animais, o medo de monstros.

Em muitas histórias para crianças, como os contos de fadas, a virtude e a maldade estão
presentes nas personagens, as quais são boas ou são más, não existe meio termo,
contrariamente aos contos modernos. Este mal é simbolizado por bruxas, gigantes,
dragões, etc. Luiz Nazário faz esse paralelismo acerca da história da “Bela Adormecida”
adaptada em animação pelos estúdios do Walt Disney para o cinema:

(…) é um dragão negro, com asas de morcego, dominando a tela inteira,


expelindo fogo, revolucionando o universo com sua aparição, empurrando para
o abismo o pequeno herói desarmado, que representa todo o Bem. Nesse
imaginário, o Mal é identificado à primeira vista, por uma característica fisica
que pode ser o gigantismo (…).12

Não é o facto da virtude ganhar no fim que promove a moralidade, mas sim que o herói
é simpático e a criança identifica-se com ele, pois quer parecer-se com uma pessoa boa.
Nalguns livros de ilustração para a infância, a que irei fazer referência, os próprios
monstros reencarnam a personagem do herói, ou o seu fiel companheiro.

Há muitas histórias que proporcionam esperança de que os fracos e os hediondos


também podem triunfar e ser heróis. Mostram às crianças a necessidade de sermos
amados e o medo de sermos descartáveis e inúteis, o amor pela vida e o medo pela
morte.

12
Luiz Nazário (1998) p. 11

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Os Monstros na Ilustração para a Infância

Ainda dentro do estudo da psicanálise, Bettelheim considera que os contos tradicionais


mostram que para encontrarmos o amor numa relação interpessoal é preciso haver um
desapego do amor dos pais. É enfrentando a vida que a criança se vai encontrar e
relacionar com a personagem das histórias: a solidão, os medos e os receios do herói. As
crianças de hoje identificam-se com estes heróis pois também se sentem sozinhas,
aborrecidas e angustiadas; por outro lado, têm medo de não se identificarem com a
personagem bondosa, e têm medo de serem abandonadas e desprezadas. Estes medos
são comuns a crianças e a adultos.

Remetendo aos primórdios da pedagogia e da educação, o filósofo Platão compreendia


as ideias e defendia uma educação literária a partir do mito. Mesmo Aristóteles, mestre
da razão pura, concorda com os ensinamentos através do mito. O mito é fonte de
conhecimento. A morte é metafórica, pois a alma irá renascer num plano superior de
existência.

Segundo Michelle Taylor, um dos agentes encontrados nos livros infantis com histórias
de monstros é a catarse, termo utilizado por Aristóteles para purgar as emoções na
“Poética”. Através das histórias a criança consegue indiretamente expulsar os
sentimentos violentos e de medo.

Os contos infantis projectam o alívio nas tensões que atormentam as crianças e


oferecem formas de resolver estes problemas com soluções felizes.

Os episódios, nas histórias, são contados de forma casual. São acontecimentos


improváveis apresentados de uma maneira vulgar. As crianças obtêm mais conforto dos
contos e histórias do que o intelectual e o racional dos adultos.

Segundo Piaget13 (1896-1980), as crianças são egocêntricas e exigem que tudo tenha
uma explicação, o que espoleta um pensamento animista até à puberdade. As crianças
estão convictas de que os seus brinquedos possuem vida, acariciam os seus peluches
porque estão convencidas que eles gostam de ser tratados daquela forma, tal como elas
próprias. Falam com os seus brinquedos e pensam que eles sentem emoções e

13
Jean Piaget, de origem suíça e fundador da Epistemologia Genática, foi considerado um dos grandes
pensadores do século XX. Estudou matemática, biologia, química, geologia, filosofia, epistemologia e
lógica. Dedicou-se à investigação do desenvolvimento inteletual da criança e redigiu mais de quinhentos
artigos e cinquenta livros.

17
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

necessidades como elas, tal como lêem e ouvêm nas histórias. Também os heróis muitas
das vezes são ajudados por objetos mágicos para triunfar nos seus objetivos.

Nos contos e histórias, quando a personagem principal se torna amigo de uma


personagem menos improvável e que à primeira vista parece desagradável, ajuda as
crianças a formar laços de amizade entre si sem preconceitos. Os leitores acreditam que
também são capazes de se comportar como a personagem principal ao tornarem-se
amigos de crianças desconhecidas, estranhas e que aparentemente as assustem.

Desde os primordios da humanidade que a crença em deuses sempre deu segurança aos
homens que não compreendiam a origem e a razão da sua existência. Com o progresso
social, científico e tecnológico, o homem libertou-se deste medo constante e tornou-se
mais racional.

Segundo Michelle Taylor, debruçando-se no trabalho do psicólogo Arthur Jersild, a


maior parte das crianças em idade pré-escolar já experienciaram o medo dos monstros
ou medos relacionados com monstros, muitas das vezes relacionados com a hora de
dormir, com o escuro e o ser deixado sozinho.

Ainda dentro do pensamento de Bettelheim, as histórias fantásticas estimulam o lado


emocional da criança e as histórias reais estimulam a capacidade racional. O maior
medo do homem está identificado como sendo a morte, mas no consciente das crianças
pequenas, essa é uma questão que elas ainda não conseguem compreender. Estas
histórias exploram, de forma personificada, os maiores medos das crianças: o escuro; o
desconhecido; a solidão; o abandono; a rejeição. Para assegurar a confiança da criança,
o herói é protegido, por exemplo, pelas fadas madrinhas ou por amuletos da sorte.

A criança cede muito facilmente ao aborrecimento quando alguém estimado não lhe dá
a atenção de que ela precisa, ou fica impaciente quando a fazem esperar. Surgem
sentimentos de raiva e estes desejos furiosos também são demonstrados nas histórias:
um trágico desfecho quando desejamos algo demasiado, ou porque não esperamos que
as coisas aconteçam ao seu tempo.

Em muitas histórias o herói é inicialmente depreciado e considerado estúpido, tal como


as crianças se sentem em relação aos adultos. Isto faz com que a criança se identifique,
mais uma vez, com a personagem.

18
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Cheri J. Meiners14 , pedagoga americana, é a autora do livro infantil “Quando tenho


medo: Como ensinar as crianças a combaterem os seus medos”, ilustrado por Meredith
Johnson.

As crianças pequenas podem ter medo do escuro, dos trovões, das aranhas e dos
monstros. Podem ficar assustadas depois de observarem personagens, criaturas
ou acontecimentos na televisão. Podem temer desastres, como terramotos,
incêndios, cheias ou violência de que tenham sido vítimas, que tenham
observado ou de que tenham ouvido falar.15

De forma muito objetiva e de fácil compreensão para os mais novos, no seu livro, a
autora explora os mais profundos receios das crianças: pensam em coisas que podem
acontecer, imaginam coisas que as assustam, no escuro ou em sonhos, os filmes de
terror... Podem ser coisas imaginárias ou coisas reais, como a guerra, sensações menos
boas como a tristeza, a zanga, o susto. Infelizmente estas coisas acontecem
frequentemente, incluindo factos irreversíveis como a morte de alguém familiar, no
entanto existem pessoas que gostam das crianças e as escutam: a mãe, o pai, a família, o
professor. É bom ter um adulto chegado à disposição, que faça companhia à criança
para enfrentar a solidão, que dê segurança, que a conforte, que a ajude a distinguir o
imaginário do real. Os amigos também são fundamentais no crescimento emocional,
falar, brincar e rir ajuda a ultrapassar e esquecer as preocupações. Ter um lugar onde a
criança se sinta em segurança, onde possa dizer palavras agradáveis, respirar fundo,
pensar sobre as coisas que a fazem feliz.

O livro apresenta algumas sugestões para ajudar a tranquilizar e a dar soluções às


crianças para enfrentarem o medo: Escutar e fazer perguntas, as crianças gostam de
atenção, perguntar do que têm medo; falar com simplicidade e honestidade, dar
respostas verdadeiras consoante a idade; falar baixo e calmamente, ser gentil para não
alimentar o pânico da criança; esclarecer confusões, ajudar a distinguir o que é
imaginário e o que é real; pôr os medos em perspectiva, tranquilizar a criança e
demonstrar que ela não é a causadora dos seus medos; ler livros que falem sobre o
medo, oferecer instrumentos visuais e didáticos para aumentar a coragem e as crianças
identificarem-se com as personagens; ajudar as crianças a concentrarem-se nas coisas

14
Cheri, especializada em ensino primário e mestre em educação elementar e educação sobredotada, é
professora de pedagogia na Universidade do estado do Utah, nos Estados Un idos da América.
15
Cheri J. Meiners (2004) p. 36

19
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

positivas; estar disponível, pois as crianças podem sentir medo a qualquer momento;
dizer às crianças que se gosta delas, as crianças devem sentir-se amadas; deixar as
crianças saberem que nunca estarão sozinhas, as crianças devem saber quem é o
responsável pelo bem-estar; manter abertas as linhas de comunicação entre a casa e a
escola, discutir os receios em ambiente escolar; seguir uma rotina saudável, manter o
equilíbrio físico e emocional; supervisionar a televisão e os jogos, pois deve-se ter
cuidado com o que vêem na televisão, controlar o nível de violência; encorajar o jogo
saudável, exprimir emoções através da arte, da escrita, jogos criativos; preparar para
mudanças e emergências, para não entrar em stress; ajudar as crianças a ajudarem os
outros, como no caso de instituições, por exemplo enviar cartas aos bombeiros; ensinar
as crianças a perceberem as diferenças, as pessoas têm características, culturas, hábitos
diferentes; caso o medo limite a vida da criança deve-se procurar ajuda profissional
junto a um pediatra, um psicólogo ou um orientador pedagógico.

20
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

1.2.1 – A visão do “medo” nas artes e no mundo do espectáculo

O conceito de medo e de monstro é cada vez mais comercializado e explorado a nível


social, científico e artístico. Na literatura o universo fantástico dos monstros remete para
as histórias mitológicas, os contos de tradição oral, os contos de fadas e os romances
góticos. No cinema estas histórias são adaptadas para o grande ecrã, com efeitos
especiais e ruídos de fundo, criando múltiplas sensações nos espectadores.

Podemos exemplificar com diferentes situações:

Como grande impulsionador da partilha de sensações arrepiantes, o Festival


Internacional de Cinema de Terror de Lisboa, Motel X, deu a conhecer a produção de
curtas metragens e filmes portugueses neste género cinematográfico nos últimos dez
anos.

Não é só na literatura e no cinema que os medos dos mais pequenos têm destaque, a
pianista Joana Gama em colaboração com o coreógrafo Victor Hugo Pontes criaram o
espétaculo “Nocturno”, inspirado nos medos das crianças acerca do escuro e da noite,
em que “Aranhas, trovoadas, sombras, roupa ou brinquedos que ganham vida, sons e
silêncios que se ampliam, são convocados para este espetáculo, debaixo de um gigante
lençol estrelado (…).”16 (ver Anexo 1)

O “Monstro no Labirinto” é uma ópera multimédia do inglês Jonathan Dove que estreou
no Festival d’Aix en-Provence, na França, em julho de 2015. Junta adultos e crianças, e
o espetáculo conta o mito grego sobre a viagem de Teseu em busca do Minotauro, para
resgatar as crianças que tinham sido oferecidas como sacrifício ao monstro de Creta.

16
Agência Lusa (2017) artigo na revista digital “O Observador”.

21
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

2 - Contextualização da ilustração infanto-juvenil portuguesa no novo


milénio (2000-2016)

2.1 – A ilustração na literatura

2.1.1 – Breve resumo das origens da literatura e da ilustração infanto-


juvenil

Antes de existir a escrita, os homens comunicavam por desenhos figurativos. Na pré-


história eram desenhados e pintados nas paredes das cavernas episódios do quotidiano
como as caçadas. Na civilização egípcia o interior das pirâmides, dos mausoléus e dos
locais de culto eram decorados com pinturas, e manuscritos como, por exemplo, o livro
dos mortos que era ilustrado com imagens.

Na Grécia os feitos mitológicos eram pintados nas cerâmicas. Durante o Império


Romano, as paredes da cidade de Pompeia, antes de ser devastada pelo vulcão Vesúvio,
estavam decoradas com frescos que representavam episódios mitológicos.

Na Idade Média temos exemplos de imagens ilustrativas na tapeçaria, nos vitrais, nos
baixo-relevos nas colunas. As igrejas eram decoradas com episódios bíblicos para
instruir as pessoas que não tinham o previlégio a uma educação escolar e literária. As
iluminuras ilustravam os livros das horas e as xilogravuras ilustravam o antigo e o novo
testamento na Bíblia dos pobres. Em Portugal temos exemplos de narrativas ilustradas
nas esculturas nas frentes das igrejas, iluminuras e azulejos.

A ilustração é uma interpretação de um texto, ideia, etc. Pretende transmitir algo, pois:

(…) estimula a fantasia do leitor, clarificar o conteúdo literário tornando-o


mais acessível, contribuir para criar (recriar) a atmosfera do texto, acentuar os
aspectos recreativos e permitir uma síntese de parte do conteúdo.17

17
Emílio Távora Vilar (1997)

22
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

No caso da literatura para crianças, as imagens contam uma história, e a beleza dessas
imagens permite persuadir e motivar a que estas se interessem mais pela leitura.

Os contadores de histórias têm um papel importante na transmissão do conto de


tradição oral, da passagem do testemunho dos mais velhos para os mais novos. A
tradição oral é o gesto de contar e ouvir histórias, e é das atividades mais antigas
praticadas pelo homem. Numa época recuada, o desconhecido e o extraordinário
constituíam mistério para a cabeça humana, e a imaginação e a fantasia, transcrita para
fábulas, mitos e lendas, eram uma tentativa de explicar estes fenómenos naturais e,
alegadamente, sobrenaturais.

Na obra “História da Literatura Infantil Portuguesa”, originalmente publicado em 1982,


a autora Maria Pires refere que as fábulas orientais, como por exemplo os dois maiores
épicos clássicos da Índia, o Mahabharata e o Ramayana, serviram de inspiração às
fábulas ocidentais.

Durante a Idade Média até ao final do século XVI predominavam os contos populares
de tradição oral, que corriam de boca em boca. Foi uma época em que poucos sabiam
ler e os livros existentes eram predominantemente de cariz religioso. Uma das formas de
uma franja da população contactar com a literatura eram nos poucos teatros de rua com
marionetas e outros acessórios que dramatizavam pequenos episódios e histórias da
tradição oral. Como não existia a preocupação de escrever para crianças e a própria
ideia de infância era algo desvalorizado ou inexistente, estes contos destinavam-se a
todos os públicos. Nos dias de hoje seria impensável apresentar a crianças contos com
tamanha violência e perversidade.

Como atrás referido, as crianças ou o público infantil não eram preocupação dos
contadores de histórias e verificamos que com a descoberta da imprensa continuam a
não o ser. As crianças liam livros que não eram adequados para a sua faixa etária.

As primeiras histórias para as crianças foram as fábulas. As fábulas, originadas na


Sumália, tiveram um papel essêncial na compreensão e educação das crianças desde
sempre. Citando Maria Pires:

23
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

As fábulas são pequenas histórias, em que geralmente intervêm animais, para


ilustrar as experiências morais dos seres humanos, explicando com sabedoria
popular uma facto da natureza. 18

Esopo (século VI a.C.), escritor grego, foi o criador deste género literário. A famosa
fábula “A cigarra e a formiga” é originalmente atribuída a Esopo, que mais tarde sofreu
reinterpretações por parte de outros autores, como o francês Jean de La Fontaine (1621-
1695).

As cartas de sílabas ou cartilhas, que continham abecedários com imagens e rimas,


ajudavam as crianças a aprender e a ler. Durante os descobrimentos, difundimos os
contos para o Brasil, Macau e Timor.

Na Idade Média também surgem os bestiários, voltando à temática da monstruosidade, e


a maioria era concebida especialmente na Inglaterra e na França. Os bestiários cujas
origens já remontavam ao período greco-romano, eram catálogos ilustrados que reuniam
informação acerca de animais reais e animais fantásticos. Citando Angélica Varandas19 ,
professora universitária, acerca dos bestiários:

O Bestiário organiza-se em torno de pequenas narrativas que descrevem várias


espécies animais, com propósitos morais e didácticos. Neste sentido, cada uma
dessas narrativas é composta por duas partes distintas: uma parte descritiva de
sentido literal (a descrição, proprietas ou naturas) e a sua moralização e
interpretação teológica de sentido simbólico-alegórico (também designada
como moralização, moralitas ou figuras).20

Os animais personificavam as qualidades humanas, como por exemplo o leão a coragem


e a coruja a sabedoria. Como irei especificar no capítulo 3 onde refiro que o escritor
Nuno Matos Valente em parceria com a ilustradora Natacha Costa Pereira criaram um
Bestiário Tradicional Português destinado a um público jovem, onde fazem uma
recolha de algumas criaturas fantásticas do folclore lusitano.

18
Maria Pires (1982) p. 38
19
Mestre e Doutorada em Literatura Inglesa Medieval, é professora auxiliar na Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa. O artigo A Idade Média e o Bestiário está disponível online na Revista
Medievalista.
20
Angélica Varandas (2006) artigo na revista digital “Medievalista”.

24
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

No século XVII continuou a predileção pela fábula. Na França foram publicadas as


Fábulas de La Fontaine, em que as histórias eram acompanhadas de ilustrações21 .

Em Portugal, o escritor e poeta D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666) foi autor de


muitas obras didáticas. Nos quatro Apólogos dialogais, uma coletânea de vários textos,
a intervenção de seres inanimados conduz-nos ao fabuloso, no entanto é um texto
híbrido, ao gosto barroco, pois existe um diálogo entre os objetos, e não uma narração
da história.

John Locke (1632-1704), filósofo inglês, aconselha o público infantil a iniciar a sua
leitura com as fábulas de Esopo e que este género literário “(…) deveria ter ilustrações a
fim de divertir as crianças e de as encorajar a ler (…)”. 22 Os educadores foram
influenciados pelas suas ideias humanistas e pela sua filosofia iluminista.

A imprensa, como processo gráfico de extensão da comunicação informativa, foi usada


desde o século XVI e a partir do século XVIII, essencialmente, na impressão de jornais.
No entanto, com o uso desta nova tecnologia foi possível “democratizar” o acesso ao
romance escrito.

No século XVIII, periodo do Romantismo, o interesse pelo passado e o fantástico,


intensifica-se.

Nos contos de fadas é descrito um mundo diferente do real, povoado de


personagens como as fadas, os gigantes, os anões, os dragões, os animais que
falam que parece corresponder à satisfação das necessidades irracionais do
público infantil, que não eram de todo consideradas nos chamados contos
morais e de formação. 23

Em França Charles Perrault (1628-1703), contemporâneo de Jean de La Fontaine, é


autor de inúmeros contos de fadas tais como “A Bela Adormecida” e a “Cinderela”.

Na Inglaterra, o escritor e ilustrador Edward Lear (1812-1888) publicou poemas de


humor e absurdos e nos contos de fadas destacou-se Lewis Carrol (1832-1898), autor da
famosa obra “Alice no País das Maravilhas”, ilustrada por John Tenniel (1820-1914).

21
Em 1995, a artista portuguesa Teresa Lima ilustrou esta colectânea de contos fabulásticos, que foi
editado pela Edinter.
22
Maria Pires (1982) p. 306
23
Idem, p. 60

25
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

O artista francês Paul Gustave Doré (1832-1883) foi um dos ilustradores mais bem
sucedidos da sua época, nomeadamente nos contos de fadas e nos contos para a
infância. (Ver Anexo 2)

(…) seu talento incomparável e seu estilo inconfundível podem ser comprovados
e aplaudidos em cada uma de suas obras, ricas em contrastes luminosos e
formas fantásticas; sua presença no imaginário iconográfico dos leitores mais
dedicados no mundo todo também é uma certeza. Seus desenhos possuem uma
materialidade plástica inigualável, não apenas acompanhando, mas também
ampliando decisivamente as metáforas e os símbolos presentes em grandes
clássicos da literatura mundial, como em obras de Honoré de Balzac, François
Rabelais, Miguel de Cervantes, La Fontaine, Charles Perrault, Edgar Allan
Poe, Victor Hugo, Dante Alighieri, e até mesmo a Bíblia.”24

O “Gato das Botas”, a “Capuchinho Vermelho” e a “Bela Adormecida” são alguns


exemplos de histórias ilustradas por Doré. As suas ilustrações serviram de referência
para as futuras gerações de artistas, não só no âmbito das artes plásticas como também
no cinema:

“Sendo uma referência iconográfica absoluta para leitores do cânone literário


mundial, a obra de Doré também teve imensa importância para várias
produções cinematográficas, mostrando que a dramaticidade de suas imagens,
ao mesmo tempo deslumbrantes e aterradoras, feéricas e demoníacas,
ultrapassa os limites da própria gravura, passando a interagir e a influenciar
não apenas a palavra escrita, mas a moderna imagem-movimento do cinema de
nosso tempo.25

Em Portugal a peça “O Auto das Fadas”, do dramaturgo Gil Vicente, é um bom


exemplo da presença dos contos de fadas no teatro português. A peça de teatro foi
apresentada no reinado de D.Manuel I e é formada por várias personagens: a Feiticeira,
o Diabo, dois Frades e três Fadas. Argumento:

A peça trata de uma feiticeira, Genebra Pereira, que se vai queixar a el-rei
porque vivia receosa de ser presa devido ao seu ofício. Perante o rei, a feiticeira

24
Giuliarde de Abreu (2017) Artigo na revista digital “Obvious”.
25
Idem Ibidem.

26
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

argumenta a necessidade do seu ofício e relata os benefícios que o mesmo tem


trazido para muita gente.26

Por sua vez, Almeida Garret (1799-1854), escritor e poeta, autor da obra “Fábulas e
Contos”, refere-se ao hábito de usar as fábulas como meio educativo.

Na literatura tradicional alemã destacam-se os irmãos Wilhelm (1786-1859) e Jacob


(1785-1863) Grimm. Publicaram contos de fadas e fábulas, onde elementos mágicos e
fantásticos são incorporados com a realidade.

Na Dinamarca, Hans Christian Andersen (1805-1875), apesar de ser poeta e romancista,


é nas histórias infantis e juvenis que vai ganhar destaque, com as suas adaptações dos
contos de tradição oral:

De facto, por culpa do escritor dinamarquês, rouxinóis e imperadores, soldados


de chumbo, reis mais ou menos vestidos, pequenas sereias e vendedeiras de
fósforos, povoam o nosso imaginário desde a mais tenra idade e são passados
de geração em geração, como verdadeiro património genético da espécie
humana.27

Em 1866 Hans Christian Andersen esteve em Portugal e descreveu detalhadamente esta


visita na sua obra “Uma visita a Portugal”. O escritor dinamarquês fez uma travessia no
rio Tejo e passou pelo Barreiro28 .

Mais tarde a inglesa Beatrix Potter (1866-1943) fascinada pelos contos de fadas e
interessada tanto na área da literatura como na área da ilustração, públicou e ilustrou
inúmeras obras dedicadas à infância. A história de “Peter Rabbit”, em português
“Pedrito Coelho”, é a sua obra mais famosa. As suas ilustrações são delicadas e
detalhadas, com traços finos e cores suaves.

Sensivelmente no mesmo período, Guerra Junqueiro (1850-1923), politico, escritor e


poeta português, publicou contos para a infância.

26
Infopédia (2003-2017) Artigos de apoio Infopédia.
27
Ju Godinho e Eduardo Filipe (2005) p. 5
28
Em 2005, O município do Barreiro, em homenagem ao bicentenário do nascimento do escritor, criou
uma iniciativa que visa promover a ilustração para a infância. Desta ideia nasceu o projecto “Ervilhas
Para Verdadeiras Princesas” que contou com a participação de 10 ilustradores portugueses e 10
ilustradores estrangeiros. (Ver Anexo 3)

27
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Mas foi Aquilino Ribeiro (1885-1963) que se destacou no contexto ao publicar em 1924
as aventuras da raposa Salta-Pocinhas, em o famoso “Romance da Raposa”, inspirado
numa história árabe, que viria a ser o seu maior êxito e uma das fábulas mais
encantadoras da literatura infantil e jovem portuguesa. Esta obra foi ilustrada pelo
francês Benjamin Rabier (1864-1939) “(…) o primeiro lápis de todas as grandes
revistas parisienses da especialidade, que expressamente fez os desenhos a cores.”29

Passada a época conturbada em relação à leitura e à produção de livros, em que o foco


foi apenas a reedição de obras, os ideais da revolução francesa simultaneamente com o
romantismo não tardaram a chegar a Portugal, e com eles a inspiração tomou como
mote o folclore português e também o galego. Ambos palco deste mundo de fantasia,
onde abundam as bruxarias, os espíritos, as lendas e os mitos da Serra de Sintra, as
fadas, as mouras encantadas dos velhos castelos, etc.

Nos contos populares distingue-se Adolfo Coelho (1847-1919) pedagogo, filólogo e


escritor que utiliza jogos e rimas infantis, na coletânea em que recolheu contos de
tradição popular, intitulada de “Contos Populares Portugueses” e que publicou em 1879.

Durante este período verificou-se um grande desenvolvimento nas áreas da literatura


infanto-juvenil, que decorria já de um interesse visível no século XIX começam a fazer-
se traduções de autores estrangeiros. Traduções do francês e de outras línguas.

No que toca à ilustração a maior parte dos artistas eram estrangeiros pois a produção
artística nacional era muito dispendiosa. As gravuras em metal e em madeira do século
XVIII foram sendo substituídas pela litografia e a impressão a quatro cores no século
XIX que vem potenciar aspetos expressivos da ilustração.

Por outro lado, obrigatoriedade do ensino primário em 1911 (Decreto de 29 de março de


1911) vai fazer surgir as bibliotecas escolares, e consequentemente o aumento da leitura
por parte dos jovens.

No século XX a literatura infantil começa a refletir as condições sociais. Adquiriu


dimensão própria, estimula a imaginação, desenvolve o sentido de humor, o gosto pela
literatura em geral, e estimula a compreensão de outras raças e países. Acentua as
diferentes faixas etárias, entre as crianças e os adultos, e os diferente géneros: o
romance na literatura feminina e as aventuras na literatura masculina.
29
Aquilino Ribeiro (1924) p. 183

28
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

A difusão de obras nacionais na literatura para as crianças e jovens foi uma solução para
combater o analfabetismo em Portugal. Os livros infantis não se destinavam só a
entreter a criança, esta vertente lúdica irá motivar os mais novos a ganhar o gosto pela
leitura, e também é essencial para o seu desenvolvimento psicológico, para a formação
do carácter e para fomentar o poder de opinião.

A literatura infantil teve um impacto muito grande durante este século, pois para além
de divertir, passou também a ter um carácter formativo, educativo e instrutivo, desde a
temas como a religião, a ciência, técnicas agrícolas, etc. É no jardim infantil que as
crianças têm um primeiro contacto com os livros. As brincadeiras à volta da fogueira e
os jogos infantis nos recintos pré-escolares modernizaram-se, e as professoras contam
histórias e os alunos ilustram através de desenhos, pinturas e dramatizações com
fantoches. Passou a ser comum nos meios modernos de comunicação, os contadores de
histórias na televisão, na rádio e nos teatros. E a partir dos anos vinte a ilustração
também ganha uma certa notoriedade, sendo que os ilustradores passam a assinar as
suas criações e começam a ser reconhecidos.

Na literatura de fantasia, a autora Rosa Silvestre 30 escreveu “A Lenda da Borboleta”,


conto ilustrado pelo pintor Roberto Araújo (1908-1969), em que este usou a técnica da
collage em folhas de cartão espesso com o texto impresso a preto em papel dourado e
prateado.

Maria Alice G. d’Andrade Santos31 , escritora e ilustradora, publicou “Bonecos e Flores”


“Nas Grutas Maravilhosas”, onde existe um mundo de animais e bruxas, e as
personagens exploram grutas horrorosas.

Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004) foi uma das figuras mais importantes
no universo da poesia e das histórias para a infância e para adultos. Citando José
António Gomes, Sophia deslumbrou-nos com um dos estilos mais originais da literatura
do século XX:

30
Pseudónimo de Maria Lamas (1893-1983). Jornalista, tradutora, ativista política, teve um importante
papel no Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, no Movimento Democrático de Mulheres e no
Movimento Unidade Democrática. É autora de romances e contos para a infância, criou revistas infantis,
organizou exposições e conferências.
31
A sua irmã Maria Teresa d'Andrade Santos escreve para a Revista “Beiral” durante o tempo do Estado
Novo.

29
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Produzindo um efeito quase encantatório, as suas obsessivas enumerações são


servidas pela sábia combinação de nome e adjectivo. Das imagens emana uma
sensorialidade que resulta também duma prosa riquíssima de recursos rítmicos
e musicais, cujo léxico se reporta fundamentalmente ao mundo natural, fixando-
se nos elementos ligados à água, à terra, ao ar e ao fogo. 32

O ilustrador português Henrique Cayatte ilustrou várias obras de Sophia Andresen,


como “O Bojador” e “O Cavaleiro da Dinamarca”.

Na ilustração Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905) e Stuart de Carvalhais (1887-1961),


numa linha mais virada para a caricatura, também chegam a ilustrar livros para crianças
e jovens. As ilustrações são livres, podem ter apenas um carácter decorativo, sem uma
relação literal com o texto, como é o caso das ilustrações do arquiteto Raul Lino (1879-
1974) para no livro “Animaes nossos amigos”, escrito pelo poeta Afonso Lopes Vieira
(1878-1940).

Na literatura tradicional Portuguesa destaca-se Ana de Castro Osório33 (1872-1935) com


“Contos Maravilhosos da tradição popular”, ilustrado pelo pintor e caricaturista Tomás
Leal da Câmara (1876-1948). Para melhor compreensão dos clássicos, o Dr. João de
Barros fez adaptações em prosa dos “Lusíadas” de Luíz Vaz de Camões e da “Odisseia”
de Homero destinadas às crianças. Temas históricos, adaptações, traduções e contos
tradicionais são muito requisitados, e na ilustração destacam-se os artistas modernistas
como António Carneiro (1872-1930), Almada Negreiros (1893-1970) e Sarah Afonso
(1899- 1983), que ilustrou vários livros de Sophia de Mello Breyner Andresen, como
por exemplo “A Menina do Mar”.

“Inconfundível Maria Keil”34 (1914-2012) foi uma figura notável na pintura, design e
na ilustração portuguesa. Para além da ilustração de livros infantis, a sua vasta
experiência como desenhadora deixou marcas na azulejaria e nos processos de
comunicação, tais como os anúncios publicitários e os cartazes. Foi, e é, uma artista que
valorizou a cor e a linha.

32
José António Gomes (2001) p. 21
33
Ana de Castro Osório é considerada a fundadora da literatura infantil em Portugal, com a obra de “Para
as Crianças” (1897). Traduziu contos dos irmãos Grimm, de Hans Christian Andersen e escreveu peças de
teatro infantil.
34
Fernando de Azevedo (2001) p. 171.

30
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Segundo Ligia Cademartori35 , os versos de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando


Pessoa (1888-1935), no poema “Dactilografia” fazem um paralelismo entre a vida
adulta e o primeiro contacto com os livros infantis e a ilustração:

Temos todos duas vidas:

A verdadeira, que é a que sonhamos na infância,

E que continuamos sonhando, adultos num substrato de névoa;

A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros,

Que é a prática, a útil,

Aquela em que acabam por nos meter num caixão.

Na outra não há caixões, nem mortes,

Há só ilustrações de infância:

Grandes livros coloridos, para ver mas não ler;

Grandes páginas de cores para recordar mais tarde. 36

Nos anos 30, devido ao domínio do Estado Novo, houve um declive na produção
literária infantil. As obras literárias publicadas visam apenas a defesa do regime político
em vigor. As traduções de livros estrangeiros são muito frequentes e o interesse
acentua-se pelos livros de carácter moralizante, histórico e apologético.

À exceção de autores de renome, as restantes ilustrações não são assinadas, o que


mostra que ainda é um trabalho com pouca relevância.

Após a revolução dos cravos, em 1974, problemáticas como a pobreza, a emigração, a


diferenciação social, os conflitos sociais e a descriminação racial eram temáticas
abordadas na produção literária infantil e juvenil.

No panorama internacional, destacou-se o escritor e ilustrador norte-americano Theodor


Seuss Geisel (1904-1991), mais conhecido por Dr. Seuss. Publicou dezenas de livros

35
Escritora de nacionalidade brasileira, é autora do livro “O Que É Literatura Infantil”.
36
Álvaro de Campos (1933) p. 301.

31
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

infantis, com ilustrações divertidas a aproximarem-se da caricatura, e todos com


mensagens educacionais e inspiradoras.

32
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

2.1.2 - A ilustração infanto-juvenil no novo milénio

Nos dias de hoje a literatura e a ilustração têm um papel fundamental. São organizados
em todo o mundo congressos, exposições, feiras e conferências, e são atribuídos
prémios aos melhores escritores e aos melhores ilustradores. Nos livros infantis
modernos predomina a presença do humor e do “nonsense”.

A ilustração tem um lugar de destaque nos livros infantis e juvenis, e passou a ser
considerada um complemento ao texto. Em alguns livros infantis a ilustração tem um
papel mais importante que o próprio texto, pois o público-alvo ainda não descodifica o
código escrito.

Foram feitas muitas adaptações dos clássicos dos contos de fadas, por exemplo, como já
referi no subcapítulo anterior, a título de exemplo a artista Teresa Lima37 que ilustrou as
“Fábulas de La Fontaine”, e Jorge Ribeiro ilustrou uma série de contos infantis, entre
eles a “Bela Adormecida”, o “Gato das Botas” e “Hansel e Gretel”, com texto adaptado
de Alice Eça Guimarães.

O novo conceito de literacia é mais vasto e engloba o desenvolvimento da capacidade


de interpretação e de entender a informação que o autor ou o ilustrador pretendem
passar.

A importância da ilustração não é só ao nível das monografias. Com o forte crescimento


nas áreas do marketing e da publicidade, a ilustração é encontrada nos anúncios,
catálogos e cartazes.

Para a nova geração de ilustradores, podemos considerar que representa um concorrente


muito forte os meios audio-visuais. São introduzidas novas técnicas como a arte
multimédia e digital que permitem simular todas as técnicas artísticas, desde a aguarela,
colagem, tinta a óleo, entre outras. Muitos livros publicados contém ilustrações digitais
que aparentemente parecem realizadas com técnicas tradicionais.

37
Teresa Lima nasceu em 1962, vive e trabalha em Lisboa, e é licenciada em Pintura pela Faculdade de
Belas Artes da Universidade de Lisboa. A partir de 1994 começou a dedicar-se à ilustração de livros
infanto-juvenis. A técnica mista (na qual junta pintura, desenho e colagem) é a predilecta e alguns dos
seus trabalhos são inspirados no imaginário de Lewis Carrol e de outros contos fantásticos. É professora
de artes visuais na Escola Vergílio Ferreira em Lisboa.

33
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Outro recurso muito utilizado na ilustração infanto-juvenil é a técnica mista, que


combina vários materiais.

O mercado dos livros infantis em Portugal não tem grande consistência e muitas vezes
as editoras optam por traduzir obras estrangeiras. No entanto, existem editoras
especializadas em publicações para crianças e jovens que estão a ter sucesso em
mercados além fronteiras. Nas editoras portuguesas para o público infantil e jovem
destacam-se “O Planeta Tangerina”, “Pato Lógico” e “Mini Orfeu”.

A pintora portuguesa Paula Rego (1935) também dedicou muito do seu trabalho aos
contos populares tradicionais e aos contos de fadas. Fez uma série de seis litografias
coloridas que ilustram o conto “O Príncipe Porco”, a história de um príncipe meio porco
meio humano, que na versão original foi publicado pelo escritor italiano Giovanni
Francesco Straparola (1480-1557). Também o conto “A Gata Branca”, da escritora
francesa Madame d’Aulnoy, mereceu destaque na obra de Paula Rego. Na sua pintura
ilustra o príncipe rodeado de gatos, entre eles a gata branca, que na verdade é uma
princesa que está enfeitaçada num corpo de um felino.

João Pedro Ferro, citando M. Helena Duarte-Santos, refere que a banda desenhada
infantil tem um importante papel na educação. Ajuda a conhecer o mundo da criança,
ensina a ver, a ler, a tomar consciência da linguagem falada, real, com as suas
singularidades, estimula a expressão oral e desperta na criança o interesse por
determinados assuntos.

34
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

2.2 –Ilustradores portugueses mais relevantes do século XXI

2.2.1 – Editora Pato Lógico

A Editora “Pato Lógico”, nome escolhido por ser engraçado e de ser fácil de memorizar,
é uma editora que nasceu em 2010. Foi criada com a parceria de pai, José Letria, e filho,
André Letria. Dos inúmeros artistas que colaboram com esta editora destaquei oito
ilustradores, dos quais alguns também são autores.

Afonso Cruz nasceu na Figueira da Foz, em 1971. Estudou na Faculdade de Belas Artes
da Universidade de Lisboa e no Instituto Superior de Artes Plásticas da Madeira.
Trabalha na área da literatura, da música, do cinema e da ilustração. Autor do livro
“Capital” editado pela Pato Lógico, e autor das obras “Os Livros que Devoraram o Meu
Pai” e “A Contradição Humana”. (Ver Anexo 4)

Alex Gozblau nasceu em Perugia, Itália, em 1971. Vive e trabalha em Lisboa, na área
da ilustração, da banda desenhada, das artes plásticas, animação, teatro, som, etc.
Ilustrou “Aristides de Sousa Mendes” da Pato Lógico. (Ver Anexo 5)

André da Loba nasceu em Aveiro, em 1979. Estudou ilustração na School of Visual


Arts em Nova Iorque. Colaborou com jornais e é professor de ilustração na Parsons
School of Design em Nova Iorque. É autor do livro “Bestial” editado pela “Pato
Lógico” e também tem colaborações com a editora “Kalandraka”. (Ver Anexo 6)

João Fazenda nasceu em Lisboa, em 1979. Vive e trabalha em Londres. Publicou livros
de banda desenhada, faz ilustrações para livros e trabalha com cinema de animação.
Ilustrou o livro “Fernando Pessoa, o menino que era muitos poetas”, “Atento ao
medicamento” e “Ilha dos Diabretes”. (Ver Anexo 7)

André Letria nasceu em Lisboa, em 1973. Estudou Pintura na Faculdade de Belas Artes
da Universidade de Lisboa e trabalha como ilustrador desde 1992. É filho do célebre
escritor José Jorge Letria, com quem tem algumas parcerias em livros infanto-juvenis.
Ilustrou para a revista Visão e para o JL, Jornal de Letras e Ideias. Participou na Bienal
de Ilustração de Bratislava em 1995 e já ganhou inúmeros prémios tanto a nível
nacional como a nível mundial. Tem livros publicados em vários países para além de

35
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Portugal como os EUA e Itália. Também realizou filmes de animação, cenários para
teatros e trabalhos em design gráfico. As técnicas mais exploradas são a aguarela sobre
papel, acrílico sobre papel, técnica mista e a colagem. As suas ilustrações estão
presentes em quatro obras que irei abordar no capítulo seguinte: “Animais Fantásticos”;
“os Estrambólicos”; “David e Golias”; “Anéis do Diabo”.

Teresa Cortez nasceu em Lisboa em 1981. É licenciada em pintura, mestre em Arte


Multimédia e pós-graduada em ilustração. Trabalha na ilustração de capas, revistas e
discos desde 2003 e foi selecionada para a Exposição Internacional de Ilustradores da
Feira do Livro Infanto-Juvenil de Bolonha. É autora do livro “Balbúrdia”. (Ver Anexo
8)

Ana Seixas nasceu em Viseu em 1984 e é licenciada em design pela Universidade de


Aveiro. Mudou-se para Barcelona onde estudou design editorial e ilustração para livros
infanto-juvenis. Dedica-se à ilustração e à serigrafia. É autora do livro “Viseu”. (Ver
Anexo 9)

Tiago Albuquerque nasceu em Lisboa em 1982. É licenciado em escultura pela


Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa e estudou banda desenhada no
Ar.Co Lisboa. Ilustrou “Almada Negreiros, viva o Almada, Pim!” e “Sou o Lince-
Ibérico, o Felino mais Ameaçado do Mundo”. (Ver Anexo 10)

Catarina Sobral é ilustradora e designer de comunicação que está a distinguir-se na


atualidade. Nasceu em Coimbra em 1985. É licenciada em design gráfico e pós-
graduada em ilustração. Usa uma paleta de cores limitada, mistura texturas que recriam
imagens bidimensionais. O livro “O Meu Avô”, da sua autoria, foi o vencedor do
Prémio Internacional de Ilustração na Feira do Livro de Bolonha 2014. Vive em Lisboa
e trabalha para várias editoras, nomeadamente a Orfeu Negro e a Kalandraka, que
públicou o livro “Não há dois iguais”. (Ver Anexo 11)

2.2.2 – Editora Planeta Tangerina

A Editora Planeta Tangerina foi criada em 1999 e dois dos seus fundadores são
Bernardo P. Carvalho e Madalena Matoso, que são simultaneamente autores e
ilustradores.

36
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Bernardo P. Carvalho nasceu em Lisboa em 1973. Entrou na licenciatura em design de


comunicação mas entretanto saiu, estudou desenho. Ilustrou “A Bola Amarela”, “Os
figos são para quem passa”, “Pê de pai”, “Obrigado a todos!” “Coleção de Cantos
Redondos – “Daqui ninguém passa”, todos eles editados pelo “Planeta Tangerina”.
Também tem ilustrações editadas pela “Kalandraka” e tem livros da sua própria autoria
com “Um dia na praia” Tem livros traduzidos em várias línguas e publicações em
França, Espanha, Noruega, Coreia, México, Estados Unidos da América, entre outros.
(Ver Anexo 12)

Madalena Matoso nasceu em Lisboa em 1974. Estudou Design de Comunicação na


Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. A técnica que utiliza é sobretudo
simples, com recorte e colagem, recorrendo ao digital e, frequentemente, representa
elementos naturalistas. É autora de obras como “Livro Clap” e “Conta-quilómetros”, e
ilustradora do livro “O que há” e “A Charada da Bicharada”. (Ver Anexo 13)

2.2.3 – Editora Kalandraka

“Kalandraka” é uma editora criada em 1998 e foi fundada pelo escritor de livros infantis
Xosé Ballesteros. A sede fica em Pontevedra, Galiza, Espanha, no entanto é uma editora
que trabalha com muitos autores e artistas portugueses.

João Vaz de Carvalho nasceu no Fundão em 1958. É autodidata e dedica-se à pintura e à


ilustração. A técnica usada nos seus trabalhos é sobretudo o acrílico e as personagens
são representadas com grandes olhos e expressão boquiaberta. É ilustrador das obras “A
Avó Adormecida”, “O Carnaval dos Animais” (livro-cd) e “28 Histórias Para Rir”,
editadas pela “Kalandraka” (Ver Anexo 14)

João Caetano nasceu em Angola em 1962. É licenciado em Pintura pela Faculdade de


Belas Artes da Universidade do Porto. Ilustrou livros como “A Casa da Mosca Fosca” e
“O fato novo do rei”. (Ver Anexo 15)

Fátima Afonso nasceu em Torres Vedras em 1962. É licenciada em Pintura pela


Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Para além de ilustradora também
é professora de Artes Visuais em Setúbal. Usa sobretudo a cor e atribui uma grande
expressividade às suas ilustrações. Tem um especial interesse em personagens históricos

37
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

e do maravilhoso. Ilustrou obras como “A Bela Desaparecida” e “Contos e Lendas de


Portugal e do Mundo”, da editora “Kalandraka” ilustrou o livro “Sonho com Asas”.
(Ver Anexo 16)

Gémeo Luís nasceu em 1965 em Maputo, Moçambique. Pseudónimo de Luís


Mendonça, é professor na Escola Superior de Artes e Desenho de Matosinhos e da
Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. A sua técnica tem influências
orientais, as figuras de papel são recortadas com bisturi. Ilustrou livros como “Azul”,
“A Boneca Palmira” e “Tanto quanto”, que foi traduzido para espanhol pela
“Kalandraka”. (Ver Anexo 17)

38
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3 – Abordagem teórica e abordagem plástica das ilustrações infanto-


juvenis portuguesas relacionadas com a temática dos medos e monstros

3.1 - Medos

Em 1991, Sérgio Godinho publicou a obra autobiografica “O Pequeno Livro dos


Medos”, editado pela “Assírio e Alvim”, já com algumas
reedições.

Nasceu no Porto em 1945, e para além de interprete,


compositor e poeta de renome, Sérgio Godinho
demonstra a sua aptidão na escrita para o público infanto
juvenil e a sua sensibilidade artística na ilustração.

As ilustrações tomam a forma de borrões. Estes borrões


de cor persupõem que a técnica eleita seja a aguarela, no Figura 1. Ilustração do “Pequeno
Livro dos M edos” (Sérgio Godinho,
entanto podemos visualizar uma mistura de técnicas, tais
1991).
como um delineador, uma caneta preta talvez, para
contornar alguns detalhes e a imagem tornar-se mais compreensível. Os elementos
figurativos e percetíveis, como por exemplo os olhos do dono do circo ou o perfil do
leão e o perfil do dono da drogaria, detalhes que estão mais visíveis na representação
dos rostos das personagens do livro, fundem-se com elementos abstractos, sendo estes
retratados com borrões e manchas de cor. No geral as imagens são simplificadas, com
uma paleta cromática muito variada, de cores suaves e não muito saturadas, em que a
ausência de tinta prevalece e o branco do papel respira.

Nesta obra Sérgio Godinho relata episódios da sua vida em que sentiu o medo. Começa
por tentar descrever o que é o medo através da definição no dicionário e de sinónimos.
Insatisfeito com o conceito de medo através de definições, tenta explicá-lo com base nas
suas memórias mais aterradoras, através de episódios que aconteceram, na realidade ou
na imaginação, durante a sua infância. A primeira história é sobre uma ida ao circo, em
que depois de Sérgio Godinho entrar sem pagar o bilhete para ver o espéctaculo, o dono
do circo assusta-o dizendo que vai soltar um leão. Outra história aterradora aconteceu na

39
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

rua da avó dele, na qual o dono da drogaria tenta assustá-lo dizendo que habita um
bicho desconhecido nas traseiras da sua loja. Uma criatura sem forma e misteriosa é
motivo para deixar muitas questões no ar, porque, o que é um bicho desconhecido?

Já imaginaram um bicho desconhecido? Nunca sabemos o que esperar dele.


Morderá, não morderá? É venenoso? Feroz ou pachorrento? Traiçoeiro? E já
agora, quantos são? Reproduzem-se muito? Invadem a terra? Trazem micróbios
para dentro de casa? Doenças? Só atacam se atacados? Ou atacam eles logo?
Enfim, mil perguntas. (…) É por isso que o desconhecido é um bicho que mete
medo e ao mesmo tempo apetece conhecer. 38

Algumas imagens, tomando como melhor exemplo o bicho desconhecido, é apenas


ilustrado com um borrão de tinta, semelhante a uma sombra e, de certo modo,
simbolizando o desconhecido.

Sérgio Godinho também tem, ou já teve, medo de bichos simpáticos. No livro dá o


exemplo de dois episódios,: no primeiro acerca de um cavalo que correu em direcção a
ele mas, por sorte e para evitar uma tragédia, abrandou o marcha, e no segundo, escreve
a respeito de uma cabra que o marrou e o atirou ao chão.

A memória mais mágica relatada no livro são os barulhos no sótão da casa da avó. Certo
dia enche-se de coragem e no sótão encontrou um bicho desconhecido de estatura média
mas mais pequeno do que grande, meio castor meio esquilo, sujo com pó e que tinha um
ramo de flores na sua mão.

Para o seu espanto, o bicho dos medos desconhecidos era muito simpático e leu-lhe um
poema intitulado “Coisas esquisitas que acontecem ao nosso corpo quando se tem
medo”. (Ver Anexo 18)

Este bicho desconhecido vivia no sótão desde sempre, também conhecia o avó e o pai
do Sérgio. O avó Francisco de Magalhães escreveu para o pai João um texto intitulado
39
“História para o meu filho João, de cada vez que tiver medo.” É uma história sobre o
João enfrentar o medo, pois não o pode expulsar, porque faz parte de si.

38
Sérgio Godinho (1991) p. 14.
39
Idem, p. 38.

40
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

“O Manel e o Miúfa: O medo medricas” é das histórias mais divertidas sobre o


mundo dos medos, e das mais extensa. A autora é Rita Taborda Duarte, a ilustração é da
autoria de Maria João Lima. A primeira publicação é de 2012, na “Editorial Caminho”.

O Manel é um menino de dez anos que acredita em tudo, nas ciências exactas, nas
ciências naturais, nas ciências ocultas, nos livros sobre história, nos livros que contam
histórias e nos medos que se apoderam dos seus sonhos. Os pais dizem que os monstros
são imaginação dele, mas as coisas que eles acreditam também não são visíveis: virús,
micróbios e bactérias.

A família dos medos vive debaixo da cama do Manel e ganha vida quando o quarto está
escuro. Têm a função de provocar emoções assustadoras às crianças e aos adultos. É
uma família constituída pelo pai Terror, a mãe Apavorante, a tia Agorafobia, a tia
Claustrofobia, a tia Xenofobia, o tio Susto, e os medos filhos, como por exemplo o filho
do medo escuro, o medo das vacinas, o medo de estar sozinho, o medo dos fantasmas, o
medo que a mãe se zangue, etc.

Há medos mais fáceis de combater do que outros, por exemplo o primeiro dia de aulas.

- Olha, que terrível é a família do escuro; olha lá o escuríssimo, marido da


enorme escuridão, gorda e feíssima, mascarada de negro, e olha as escuridades
pequeninas todas por aí fora, o que será que estão a esconder? Uhuhuh, uhuhu,
gemia o medo na minha cabeça. Olha que, com o escuro, não vês nada e nunca
se sabe o que se pode esconder por aí, se monstros, dragões lanzudos ou leões
desmedidos ou aranhas peludas ou ratazanas com os dentes amarelos todos de
fora, bem espetados. 40

Mas o escuro também tinha medo do Manel, porque quando ele acendia a luz o escuro
era derrotado. E o medo susurrava-lhe:

- Ui, aquele miúdo, o Manel, é terrível e assustador. Às vezes carrega, de


repente, num botão e zás, acende-se o candeeiro cheiinho de luz e tu, truca,
desapareces, trás, não vai sobrar nada, nadinha de ti, ó escuro. Basta ele querer
41
que tu desapareces. É terrível e perigosíssimo esse Manel…

40
Rita Taborda Duarte (2012) p. 29
41
Idem, p. 30

41
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

E foi assim que o Manel expulsou o seu medo do escuro pois é estúpido ter medo de
algo que tem medo de nós. Os medos vivem em todo o lado: na escola, nos hospitais,
nas finanças, nas casas, dentro do armário, nas florestas…

Debaixo da sua cama vivia o Miúfa, um medo muito medricas, que fora abandonado
pela sua família por ser muito assustadiço. “(…) um medo que tem medo do próprio
42
medo…”

Os barulhos que Manel ouvia debaixo da sua cama era a família do Miúfa a tentar
convencê-lo a entrar no seu ouvido e aterrorizar os seus pensamentos. O rapaz sentiu
pena do pequeno medo e resolveu ajudar o Miúfa a ganhar confiança em si próprio e
respeito pela sua família dos medos, mas Miúfa tinha receio de entrar na cabeça de um
humano.

No dia seguinte a mãe do Manel, furiosa, entra de rompante no quarto


e desata aos gritos por o filho ainda não se ter levantado. O Miúfa com
medo da mãe do Manel esconde-se dentro do ouvido dele, pois
quando um medo é mais poderoso esquece-se o primeiro. Tornou-se
chato porque o pequeno medo falava demasiado e dava muitas ordens
ao Manel. Figura 2. Ilustração
do “O M anel e o
M iúfa” (M aria João
Existia um medo na escola chamado Jaime, um miúdo com a mesma Lima, 2012)

idade do Manel mas muito mais desenvolvido fisicamente. Depois de


um acidente em que o compasso do Manel se espetou na perna do Jaime, correu um
boato na escola de que ele era perigosíssimo e o medo virou-se contra o feiticeiro: “(…)
os medos pertencem a uma família de oportunidades: mal veêm uma hipótese, galgam-
43
na logo e aproveitam-na bem.”

No entanto, os conselhos medricas do Miúfa faziam com que o Manel tivesse medo de
tudo e fosse um cobarde, e então ficou conhecido na escola por “Manel Miúfa”. Desde
sempre que o Manel era um miúdo fixe, sentava-se na fila de trás, aproveitava a
diversão e demorava nos intervalos, e desde que o Miúfa vivia na sua cabeça o Manel

42
Rita Taborda Duarte (2012) p. 45
43
Idem, p. 72

42
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

sentava-se na primeira fila, chegava antes dos professores, fazia todos os trabalhos de
44
casa. O Manel “já tinha Miúfa de olhar, Miúfa de ouvir, Miúfa de pensar.”

Para a felicidade do Manel, certo dia, numa tentativa de porrada com o Jaime, o Miúfa
sai disparado e entra na orelha dele. O Jaime apanhou Miúfa, o medo medricas ficou
mais poderoso e tornou-se o Pânico, ficando glorificado pela família dos medos.

O Manel e o “Miúfa” é ilustrado pela Maria João Lima. Nasceu a 1969 em Lisboa.
Tirou o curso de Design de Comunicação na Faculdade de Belas Artes da Universidade
de Lisboa. Trabalhou como designer gráfica e agora é freelancer. Ilustração a preto e
branco, o texto em harmonia com a imagem. Todas as ilustrações deste livro foram
feitas no computador, mais especificamente no Photoshop. As imagens que aparecem ao
longo do livro foram desenhadas a partir de fotografias; as ilustrações dos monstros que
aparecem no final, foram feitas com montagens de diversas imagens recolhidas - uma
espécie de corta e cola.

Rita Castanheira Alves, psicóloga clínica desde 2007, que trabalha específicamente com
crianças, é autora da obra infantil “Maria do Medo”. Foi publicada pela primeira vez
em novembro de 2015 pela “Booksmile”, uma chancela da “20|20 Editora”.

Figura 3. Ilustração de “M aria do M edo” (Carla Nazareth, 2015).

Conta a história sobre uma menina chamada Maria, filha única e que tem um quarto só
para si. Todas as noites, na hora de dormir, a Maria recebe a visita do medo: começa a
tremer, de olhos bem abertos vê sombras na parede do quarto, o coração bate rápido, e
as lágrimas escorrem pela face. Durante a noite torna-se a Maria do Medo.

Numa aula a Maria confessou os seus receios noturnos e a professora e os colegas


discutiram sobre os seus próprios medos. Escreveram soluções e ideias para enfrentar o

44
Rita Taborda Duarte (2012). p. 79

43
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

medo: ler um livro com os pais; pensar em coisas divertidas e nos amigos, pedir um
beijo à avó, cantar uma canção… No final da atividade, a professora oferece à Maria a
caixa que estava cheia de ideias.

A partir desse dia, a menina torna-se uma “Super Maria”, enfrentando de uma vez por
todas, com a ajuda do cão-peluche Mário, o medo do seu quarto escuro.

Nas últimas páginas, o livro oferece conselhos de como lidar com as emoções dos mais
pequenos: “O medo apareceu e é preciso lidar com ele… Não vale a pena desvalorizar,
ridicularizar, chamar medricas ou não permitir que haja medo, como se desaparecesse
por magia.”45

Carla Nazareth, ilustradora desta obra, nasceu em Moçambique em 1975. Viveu em


Coimbra mas de momento reside em Lisboa. É licenciada em Design de Comunicação
pela Faculdade de Belas Artes de Lisboa. É designer desde 1998 e em 2001 e inicia a
sua actividade como ilustradora infantil, colabora com diversas editoras nacionais e
internacionais, ilustra manuais escolares e contos. “Adoro “trabalhar” para gente
pequena com mente gigante e para gente grande com alma de criança.”46 A ilustração é
rica em cores, o texto em harmonia com a imagem, a personagem Maria é
extremamente carismática. Toda a página está preenchida.

Em 2016, Rodrigo Abril de Abreu publica o seu primeiro livro “Medo do quê?”,
editado pela “Presença”. Natural de Lisboa, é formado em física e doutor em
Neurociências pela Fundação Champalimaud e Universidade Nova de Lisboa.

É uma reflexão sobre o medo, que estão presentes em crianças e adultos, e como ver o
medo de outra forma, de maneira a esse mesmo medo nos ensinar algo valioso. As
sombras utilizadas para ilustrar o livro são do próprio autor, que representam o medo e a
superação do medo. O livro está dividido ao centro: na página esquerda refere um medo
e na página direita refere uma visão otimista acerca desse medo.

À primeira vista a técnica de eleição parece ser realizada com materiais aguados,
marcador preto, as sombras resultantes das mãos, com edição digital. A fotografia é de
João Abril de Abreu.

45
Rita Castanheira Alves (2015). p. 35
46
Carla Nazareth (2015). p. 38

44
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Apresenta vários medos: o medo do desconhecido; o medo do escuro; o medo de


palhaços; o medo das tempestades; o medo do silêncio; o medo das alturas; o medo de
ser pequeno; o medo de ficar sozinho; o medo da dor; o medo dos monstros; o medo de
ser diferente; medo de sonhar; medo de se perder e o medo do fim.

E apresenta várias visões otimistas desse medo: explorar o que ainda não é conhecido; é
na escuridão que nascem as estrelas; os palhaços são engraçados e fazem-nos rir;
procurar um abrigo seguro; é no silêncio que nos ouvimos a nós próprios; visto do alto
todos os medos são pequenos; podemos ser pequenos mas o mais importante é ter um
grande coração; quando estamos sozinhos a coragem é a melhor companheira; a dor é
temporária; os monstros também precisam de amigos; ser diferente é ser igual, todos
somos feitos da mesma matéria; quando sonhamos temos asas e conseguimos voar; se
nos perdermos só temos que seguir a corrente e quando há um fim, há um novo começo.

Figura 4. “Tenho medo do escuro. Aí nascem as estrelas”. (Rodrigo Abril de


Abreu, 2016).

45
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.2 - O Desconhecido

A obra de Sophia de Mello Breyner Andresen, “O Bojador”, publicado em 1961 pela


Direcção-Geral do Ensino Primário, está incluído no Plano Nacional de Leitura e é
recomendado para o 7ºano de escolaridade. A 2ª edição desta obra foi publicada em
2000 pela “Editorial Caminho” e a ilustração é da autoria de Henrique Cayatte.
Especializou-se em design multimédia e realizou inúmeros trabalhos na área de
ilustração, em 1988 o seu trabalho de ilustração foi premiado pela Fundação Calouste
Gulbenkian e foi responsável pela coordenação do design na Expo’98 em Lisboa.

Esta obra, em formato de peça dramática, retrata um dos maiores triunfos alcançados
pela coragem do povo português:

Nas viagens para descobrir a costa ocidental africana, os marinheiros


enfrentaram lendas fabulosas e um mar tenebroso. Acreditavam que o Bojador
era o fim do mundo. Mas o infante D. Henrique estava convencido do contrário
e Gil Eanes dobrou o medo em 1434.47

O primeiro quadro é um diálogo entre uma mulher, uma criança, um velho e um rapaz.
Especulam acerca do Cabo Bojador, lendas antigas inventadas pelo medo dos homens,
nenhum povo algum conseguiu dobrar este cabo. Dizem que é ali que acaba o mundo,
que se parte para o desconhecido, e o que é desconhecido é sempre motivo de
inquietude e medo: as águas do mar fervem, o nevoeiro é negro, a escuridão cai sobre o
dia, os monstros marinhos atacam os barcos.

Os cenários estão descritos ao detalhe e Henrique Cayatte, em diversos tons de azul, faz
jus às suas ilustrações:

Promontório de Sagres. Cenário esquemático e sem realismo mas com cores


puras e vivas como um desenho de criança.

Ao fundo, sozinho, voltado para o mar, vestido de escuro (única cor sombria no
meio das cores claras), de costas para a cena, para os outros personagens e
para o público, o Infante.

47
Luc Cuyvers (1998) Artigo Ensina RTP.

46
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Está sentado numa pedra, ligeiramente curvado para a frente, com o queixo
apoiado na mão direita e o cotovelo direito apoiado no joelho; o pé direito
avança à frente do outro pé. O Infante está no fundo da cena mas um pouco à
esquerda e ligeiramente voltado para a direita.

No primeiro plano, mesmo à boca da cena, falam e movem-se as outras


personagens.

Entre eles e o Infante está um vazio.

Há portanto na cena três planos que devem ser nitidamente desenhados. 48

Figura 5. Ilustração do “Primeiro Quadro”


no livro “O Bojador” (Henrique Cayatte,
2000).

No segundo quadro as personagens são o escrivão, o pajem, o segundo pajem, o Infante


e Gil Eanes. Gil Eanes dá a felicíssima noticia que dobrou o Cabo Bojador ao Infante.
Tudo o que diziam acerca do mar tenebroso não era verdade, os corajosos marinheiros
ancoraram em areias virgens, num deserto sem pessoas e animais, uma África
desconhecida pelo povo ocidental.

Acerca do cenário proposto para este quadro e mais uma vez uma belíssima e simples
ilustração de Henrique Cayatte:

Sala em casa do infante. O cenário é um pano de fundo que representa uma


parede branca com uma janela. No meio da cena, à direita, uma cadeira. À

48
Sophia de Mello Breyner Andresen (2000) p. 5

47
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

esquerda, uma mesa e uma cadeira postas de forma a que a pessoa ali sentada
fique de perfil para o público.49

“O Cuquedo” é um dos livros mais trabalhados nos espaços educacionais e mais


conhecido pelo público infantil. Foi publicado pela primeira vez em 2008 pela Editora
“Livros Horizonte”.

A autora Clara Cunha explora o medo do desconhecido através de diálogos repetidos


entre animais da savana. Os hipopótamos, as zebras, os elefantes, as girafas e os
rinocerontes, que, passando a palavra de boca em boca, questionam “Quem é o
Cuquedo?”50

Os animais demonstram-se assustados, no


entanto curiosos, espalhando a palavra aos
restantes habitantes da savana, em busca
desse tal “Cuquedo” que “é muito
assustador, prega sustos a quem estiver
parado no mesmo lugar.”51 Enfrentam o
medo no coletivo, pois à medida que a
história avança, cada vez mais animais se Figura 6. Ilustração de “O Cuquedo” (Paulo Galindro,
2008)
vão juntando à causa.

As ilustrações são de Paulo Galindro, que usa neste livro técnica mista sobre MDF,
mais sucintamente acrílico, lápis de cor, lápis de cera, pastel, caneta bic, lápis de carvão
e colagens sobre placas de madeira. O plano de fundo está em tons alaranjados, próprios
da paleta do ambiente da savana, e as sombras do “Cuquedo”, que suscitam suspense
entre os animais. Embora as personagens estejam horrizadas pela procura de quem será
o dito Cuquedo, as formas divertidas e os rostos dos animais estão muito animados e
emotivos (o medo, o espanto). Os laranjas da savana e os amarelos das girafas
contrastam com os pretos, os cinzentos e os brancos dos animais.

Paulo Galindro nasceu em 1970 e estudou arquitetura. Gosta de mostrar os bastidores


nas suas ilustrações, em que o próprio esboço muitas das vezes está presente nas
páginas dos livros.

49
Sophia de Mello Breyner Andresen (2000) p. 17
50
Clara Cunha (2008) p. 9
51
Clara Cunha (2008) p. 9

48
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Marta Cancela, licenciada na área das Línguas Modernas, em colaboração com a


ilustradora Maria João Lopes, pública em 2009 o livro infantil “Tenho um Monstro no
meu Quarto”, editado pela “Papa-Letras”.

As crianças têm medo do escuro (tal como alguns adultos), pois no escuro não
se vê. Então, é fácil acreditar na presença de monstros, insectos ou seres que
aterrorizam e que querem fazer mal.

A sensação de inquietação ligada à escuridão remonta à noite dos tempos, em


que alguns animais nocturnos ou outras pessoas podiam ser uma ameaça na
escuridão. (…)

Numa idade em que o real e o imaginário têm fronteiras muito ténues, há um


“mau” escondido no escuro, um monstro, uma bruxa, um tigre, um lobo
feroz…52

História em quadra, rimas e versos, traz ritmo e musicalidade à leitura. O quarto está
totalmente escuro, imaginar o que não conseguimos ver. Quando conhecemos melhor o
desconhecido, os segredos revelam-se.

Um rapaz mudou de casa e está ansioso por dormir na nova cama porque tem um quarto
só para si. Mas mal apagou a luz sentiu a presença de um monstro:

É do tamanho de um cão,

Mas tem olhos de moscardo,

Focinho de lobo mau

E garras de urso pardo!53

Um monstro que só gosta da escuridão. O pai deu-lhe uma ideia: quando o monstro
aparecer iluminá-lo com a lanterna e dar-lhe com o pau. No entanto, quando chegou a
noite, o rapazinho cheio de coragem não teve medo e tentou conhecer melhor o
monstro. Agora que já sabe o que se esconde na escuridão do quarto, já não tem mais
medo dele, afinal o monstro só queria ser seu amigo.

52
Marta Cancela (2009) p. 3
53
Idem, p. 11

49
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Maria João Lopes nasceu em Braga, em 1952. É licenciada em Filologia Românica, e


tirou o Curso de Desenho e o Curso de Experiências Plásticas na SNBA.

Esteve ligada ao ensino do Português e do Francês no Ensino Básico, trabalhou em


banda desenhada e em cinema de animação. Faz ilustrações para jornais, revistas e
livros didáticos para diversas editoras. No geral, utiliza uma técnica mista com ecolines,
pastéis e tinta-da-china para criar as suas ilustrações.

Neste livro o suporte foi o cartão, as ilustrações são pintadas a acrílico e contornadas
com caneta de tinta da china e esferográfica. A escolha de cores é variada, acentuando
os azuis, violetas, rosas e amarelos.

Figura 7. Ilustração de “Tenho um M onstro no meu


quarto” (M aria João Lopes, 2009).

50
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.3 - Monstros

“O Papão no Desvão” é um livro infantil da autora Ana Saldanha. A ilustração é de


Yara Kono, artista de nacionalidade brasileira mas que trabalha em Portugal. Foi
publicado pela primeira vez em 2009, pela “Editorial Caminho”.

O papão é uma criatura que só aparece no escuro e que


gosta de espreitar no desvão da escada em caracol. A
Sofia sabia que existia um papão e nunca olhava para o
desvão na hora de subir as escadas para ir dormir, fazia
de tudo para adiar esse caminho. Até que um dia a Sofia,
farta de sofrer horrores por parte do papão, diz que não
tem mais medo do monstro e que se os pais soubessem

Figura 8. Capa do livro “O Papão no da sua existência tratavam-lhe da saúde, que ele fugia
Desvão” (Yara Kono, 2009).
para as estradas e quintais. O papão afinal era bonzinho,
e diz à Sofia que se sentia sozinho e que queria companhia. Saiu do desvão e deu a mão
à menina, subiram as escadas e o papão ficou a dormir debaixo da cama da Sofia,
porque ela protegia-o da solidão.

Ilustrações simples mas muito carismáticas, fortes emoções nos rostos das personagens,
rostos geométricos, cores sólidas, página inteira preenchida.

Yara Kono estudou Farmácia Bioquímica na Universidade Estadual Paulista, no Brasil.


Durante os estudos, estagiou numa agência de publicidade e acabou por tirar um curso
de Design e Comunicação. Estudou no Centro de Design Gráfico Yamanashi, no Japão.

Em 2001 veio viver para Portugal e entrou na editora “Planeta Tangerina”, onde tem
trabalhado sobretudo na área do design de identidade e editorial e na ilustração. Em
2010 ganhou o Prémio Nacional de Ilustração.

51
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

“Pê, o Monstro da Preguiça” pode ser uma história para miúdos e graúdos, pois a
preguiça ataca todos. Foi publicado pela primeira vez em 2011 pelas “Edições Asa”. O
texto é de Maria Teresa Maia Gonzalez e a ilustração de Raquel Pinheiro. Muito
sucintamente, a história gira em torno de um menino chamado Maximiliano Henrique,
que é uma criança cheia de energia até ao dia em que aparece o Monstro da Preguiça.

Figura 9. Ilustração de “Pê, o


M onstro da Preguiça”
(Raquel Pinheiro, 2011).

Tudo começou quando a mãe o acordou para ir para o primeiro dia de escola e Max não
queria sair da cama, sentia o seu corpo pesado e a cama estava mais confortável do que
nunca. Depois de muito esforço lá foi para a escola, mas o seu rendimento estava muito
lento. Mais tarde ao chegar a casa tomou um banho e sentiu-se mais leve. Abismado
com a sua tamanha moleza, olhou-se ao espelho para ter a certeza que continuava a ser
ele mesmo. Olhou com muita atenção e reparou que tinha uma pequena nuvem no fundo
dos seus olhos. O sono era tanto que não tinha forças para fazer os trabalhos de casa.
Quando ia carregar no botão do computador:

Ainda com os olhos meio abertos, olhei para o ecrã e vi uma coisa
estranhíssima: uma cara enorme, de cor azulada, com os olhos papudos e os
cabelos ainda não despenteados do que os meus! 54

O monstro saiu de dentro do computador e apresentou-se como “Pê, o Monstro da


Preguiça”.

O meu colega Tomás já me tinha dito que acreditar em monstros e outras


criaturas estranhas era sinal de ter medo. Ora, a partir desse dia, eu decidi

54
Maria Gonzales (2011) p. 20

52
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

deixar de ter medo e a verdade é que também tinha deixado de acreditar em


monstros.55

O monstro explicou ao Max que ele só o conseguia ver porque estava a tornar-se
preguiçoso e, tal como o nome diz, a função de um monstro conhecido como preguiça é
alimentar a procrastinação e aliciar o rapaz a jogar jogos no computador o dia todo. Mas
cada vez que Max confronta o Pê, este gradualmente diminui de tamanho, e quando a
pouca vontade de fazer os trabalhos de casa e a vontade de ver televisão e jogar no
computador aumenta, o Pê também aumenta de tamanho. O rapaz tentou concentrar-se
ao máximo como o seu avô lhe tinha ensinado e conseguiu terminar os trabalhos de
casa, e Pê voltou a ficar pequeno e saiu derrotado, minúsculo, pois Max é mais
inteligente do que ele pensava.

Max aprendeu uma valiosa lição com Pê, deixar-se levar pela preguiça é das piores
coisas que lhe pode acontecer e descobriu um poder fantástico dentro de si: a força de
vontade.

A ilustração de Raquel Pinheiro é rica em padrões, pormenores e cores. As sombras dão


a sensação de uma tridimensionalidade e as personagens cabeçudas dão um toque
cómico à composição.

Nasceu no Porto em 1976 e vive em Oeiras. Em 2000 licenciou-se em Pintura pela


Faculdade de Belas Artes de Lisboa e, em 2001, inicia a sua atividade como ilustradora
Infantil. Tem o seu próprio atelier e dedica-se sobretudo à ilustração e ao design.

Mais uma vez uma obra criada em parceria pai e filho, com texto de José Jorge Letria e
ilustração de André Letria, os “Estrambólicos” é um livro escrito em poesia com
quadras e quintetos. A primeira publicação foi em 2011 pela editora “Pato Lógico”.

Só se encontra estrambólicos em locais escondidos e inacessíveis, como grutas


geladas na Antártida, uma densa floresta nórdica, ou o interior… das nossas
cabeças.56

Livro com 16 estrambólicos ao cubo, divididos em 3, o que dá 4096 combinações


diferentes, para descobrir à medida que se viram as páginas.

55
Maria Gonzales (2011) p. 25
56
José Letria (2011) p. 3.

53
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Os 16 Estrambólicos são constituidos por criaturas que se assemelham a animais e


plantas, em que as palavras estão divididas por sílabas de forma a formar novos
monstros: Sapongo (sapo); Aranhuço (aranha); Anelônzio (anéis de esponja); Caracólio
(caracol); Crustâncio (caranguejo); Viscôsio (lama viscosa); Coguménio (cogumelo);
Reptílico (réptil); Larvarico (larva); Mocholas (mocho); Moscóvio (mosca); Nevoento
(nuvém); Artólio (insecto); Arbolídio (árvore); Peixónio (peixe); Felpúdico (criatura
peluda).

Figura 10. Ilustração de “Estrambólicos”, “Ane/Tân/Nio”,


combinação de “Anelônzio”, “Crustâncio” e “Peixónio”
(André Letria, 2011).

54
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.4 – Mitologia, Figuras Bíblicas e Criaturas Fantásticas

Publicado pela primeira vez em fevereiro de 1995, pela “Civilização Editora”, “David e
Golias” conta, de forma elementar, aos meus pequenos os feitos bíblicos de uma
personagem tão apreciada na arte, com uma forte inspiração na escultura e na pintura.

O texto é de António Mota e a ilustração de André Letria. Contrapondo com outras


ilustrações de André Letria, neste livro o seu estilo direcciona-se para formas simples e
infantis, no entanto as figuras não deixam de ser carismáticas.

David é o mais novo de oito irmãos e vive em Belém.


O pai acordava-o cedo para ele ir pastorear as ovelhas
no deserto. Tocava harpa e atirava pedras para se
entreter. Os três irmãos mais velhos eram soldados na
guerra, ao comando do rei israelita Saul. Durante um
combate com o exército dos filisteus, um gigantesco
soldado saiu do meio do exército. Chamava-se Golias e
Figura 11. Capa do livro “David e
Golias” (André Letria, 1995). fez uma proposta ao exército israelita:

- Escolhei entre vós um homem que tenha a coragem de vir lutar contra mim! Se
ele me vencer, e me matar, vós ganhais a batalha e todos nós seremos vossos
escravos. Mas… se for eu o vencedor, então todos vós sereis nossos escravos.57

O exército israelita ficou amedrontado e durante quarenta dias ninguém teve coragem de
enfrentar o gigante Golias. A mando do seu pai, David levou comida para os três irmãos
que estavam no acampamento a prepararem-se para a batalha. Ao chegar ouviu Golias
novamente a dizer o desafio e perguntou-lhe quem era ele para insultar o exército de
Israel. Toda o povo de Israel ficou a saber que o pequeno David fez frente ao gigante, e
o rei Saul mandou chamá-lo aos seus aposentos. David diz ao rei que ele próprio vai
enfrentar o gigante, que pode ser pequeno mas tem experiência em proteger o seu
rebanho de ovelhas contra os predadores. Como não tinha experiência com armas nem
força para carregar o capacete, foi buscar o seu cajado e cinco pedras. No campo de
batalha foi troçado por Golias e, nada obstante, o corajoso David lançou a primeira
pedra com a funda e acertou exatamente na testa do gigante, que perdeu as forças e

57
António Mota (1995) p. 10

55
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

tombou. Com a própria espada do gigante, David cortou-lhe a cabeça, os filisteus


fugiram e Israel venceu a batalha.

O escritor José Jorge Letria em parceria com o ilustrador, e filho, André Letria criam o
livro “Os Animais Fantásticos”, publicado pela “Ambar” em 2004. Uma divertida
“enciclopédia de monstros” onde através de versos o autor descreve os maiores feitos,
qualidades e defeitos, dos dezoito animais fantásticos que todos conhecemos dos mitos
e dos contos de fadas. Segundo as características que o historiador Luiz Nazário atribui
aos monstros, podemos enquadrar estas criaturas, sobretudo as de caracter mitológico,
no conceito de Unicidade:

Unicidade. Há monstros cuja característica principal é a existência única.


Animal raro, de origem misteriosa, mutante singular de sua espécie, torna-se
objeto de um culto selvagem (…). Enquanto outros representantes da
monstruosidade dispensam denominações, o monstro único possui nome (…).58

Figura 12. Ilustração de “Animais Fantásticos”, “O Grifo” (André Letria,


2004).

O primeiro é o Basilísco, uma criatura mitológica e híbrida de um galo e de uma


serpente, tem espinhos e patas de galo, e quem o olha nos olhos fica enfeitiçado. O
Bucéfalo é o cavalo de Alexandre o Grande, que participou em grandes combates nos
tempos da Grécia antiga. Foi um cavalo famoso pelas suas vitórias e em sua honra
Alexandre deu o seu nome a uma cidade. Enquadrado na mitologia greco-romana, o
Centauro é uma criatura metade homem e metade cavalo. Tem a bravura de um homem
e a velocidade de um cavalo. O Cérbero, na mitologia grega, é um cão de três cabeças
que guarda as portas do submundo. O Ciclope possui um só olho no meio da testa e é
um dos três filhos de Urano. A personagem do ciclope Polifemo está presente na obra

58
Luiz Nazário (1998) p. 34

56
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

“Odisseia” de Homero. O Dragão é um monstro muito popular nas fábulas e nos contos
de fadas, expira fogo pelas narinas e pela boca, combate guerreiros e rapta princesas. Na
china os dragões representam pássaros e serpentes. A Esfinge do Egipto tem corpo de
leão e cabeça de faraó, é sábia e eterna. O Fauno é uma criatura híbrida de homem com
cabra, vive nos bosques e persegue raparigas. A Fénix faz parte dos mitos do Egipto,
tem penas de ouro e de fogo e renasce das cinzas. O Grifo tem cabeça de águia, corpo
de leão e asas de pássaro. A famosa Hidra de Lernas cujas nove cabeças for cortadas por
Hércules. Por cada cabeça que era cortada havia outra que nascia, sendo a cabeça do
meio imortal. O Lobisomem meio homem e meio lobo, de tamanho e força bruta,
assombra as florestas nas noites de quinta-feira e de lua cheia. O Minotauro nas
histórias da mitologia grega é um touro gigante que vivia no labirinto do rei Minos. O
Ogre é um monstro que devora crianças, e é conhecido como papão em alguns países. O
Pégaso é um cavalo alado e é descrito na obra “Teogonia” de Hesíodo. A Salamandra é
um réptil da família dos lagartos que já foi símbolo de magia e que não se queimava
com o fogo. A Sereia é metade mulher metade peixe, que gosta de cantar e enfeitiçar os
navegadores para estes naufragarem. A Serpente Marinha é uma cobra gigante
representada em muitas obras de arte, e acreditava-se que atacava os navegadores. E,
por último, o famoso Unicórnio, um cavalo que tem um chifre mágico e que vive nas
florestas encantadas.

André Letria recorre a técnicas mistas, com colagem e acrílico. De um ponto de vista
geral, a ilustração é detalhada, com texturas e sobreposições a partir de colagens. As
cores são fortes e os fundos com aspeto degastado, possivelmente para simbolizar os
quão antigos são os mitos que envolvem estes animais fantásticos.

Ainda no tópico dos monstros fantástico, o livro “Um Dragão na Banheira” percorre a
amizade entre uma menina chamada Ana e um dragão marinho. Obra escrita por Tiago
Salgueiro e ilustrada por José Manuel Saraiva, foi publicada em 2004 pelas “Edições
Gailivro”.

Fazendo um breve resumo deste livro, o autor conta a história a partir do momento em
que Ana se prepara para tomar banho e um dragão marinho entra pela torneira, e a
menina, simpatizando com o bichinho, batiza-o de Jupo. Como na maioria dos livros
infantis, a simplicidade das palavras nunca demonstra reacções agressivas por parte das
personagens, de modo a não ferir a susceptibilidade das crianças, e desta forma, os pais

57
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

da Ana aceitaram o Dragão como se fosse um bicho de estimação. No entanto, para


demonstrar o lado mais selvagem da natureza animal, o pai da Ana estava com receio
que o dragão fosse mau e feroz então comprou-lhe uma coleira. Mas o dragão, muito
mansinho e traquinas, cresceu e cresceu ficando do tamanho dos móveis da casa.

Remetendo à temática dos receios das crianças, Ana deixou de ter medo dos seus
pesadelos pois tinha a protecção do seu dragão. De forma divertida, o autor relata que o
dragão Jupo contava histórias à Ana, que a sua mãe lhe tinha contado, acerca de dragões
que tinham que fugir dos príncipes, pois eles não
gostavam que estes brincassem com as suas
namoradas. Sendo um dragão marinho tinha o
curso de nadador salvador, mas devido às histórias
que a sua mãe lhe contava, tinha medo de vir ao de
cima e de um homem lhe tentar fazer mal. Nesta
história, o medo é inerente a ambas as
personagens. Figura 13. Ilustração do “Um Dragão na
Banheira” (José M anuel Saraiva, 2004).

José Manuel Saraiva nasceu no Porto em 1974.


Licenciou-se em Design de Comunicação na Faculdade de Belas Artes da Universidade
do Porto e de momento é professor na Escola Superior de Artes e Design em
Matosinhos. Já ganhou inúmeros prémios e participou em exposições de ilustração
internacionais, como por exemplo na Feira Internacional do Livro Infantil e Juvenil de
Bolonha. Também tem obras escritas, assinando pelo pseudónimo Tiago Salgueiro.

A técnica utilizada é lápis de cor, canetas, guache e photoshop. A inspiração surge de


variadas maneiras, o desenho ingénuo dos seus filhos e o seu gosto pela Arte Bruta que
o ajudaram a ser um pouco mais direto no uso dos materiais para as suas ilustrações. A
paleta cromática é essencialmente dominada pelo vermelho, o branco e o azul.

A sua ilustração é peculiar, sendo constante nos seus trabalhos dedicados à infância.
Ilustra os episódios vividos entre a Ana e o Jupo com um efeito riscado e cores
contrastantes, os vermelhos quentes com os azuis e turquesas, com perspectivas
distorcidas criando um ambiente de fantasia e de brincadeira.

58
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Com influências do folclore escocês, António Antunes Carvalho escreve “O Monstro”,


ilustrado por Anabela Cotrim, história que retrata um monstro chamado Acácio que tem
como missão ser assustador. A primeira publicação foi em 2006 pela “Porto Editora”.

Anabela Cotrim escolhe materiais riscadores como


técnica de eleição, as ilustrações são figurativas e
abonecadas, cheias de linhas curvas. As cores são
saturadas, onde predominam os verdes, os amarelos, os
azuis e os vermelhos.

Um monstro chamado Acácio vivia num lago muito


profundo e todas as criaturas que viviam com ele eram
Figura 14. Capa do livro “O M onstro” especialistas em assustar quem se aproximava. Tinha um
(Anabela Cotrim, 2006).
aspecto físico horrendo: era verde, cuspia fogo, era muito
comprido pois media cerca de 15 metros e tinha cristas ao longo do dorso. A sua missão
era partir alguns barcos de pesca, roubar peixes aos pescadores, roubar piqueniques, e
lançar umas cuspidelas de fogo.

No primeiro dia de trabalho como monstro assustador, Acácio ao tentar assustar um


pescador levou com um remo na cabeça. Ficou traumatizado: “Então as pessoas já se
atrevem a não ter medo dos monstros!?”59

O pescador contou a toda a gente que no lago vivia um monstro, e exagerando ia


dizendo que tinha uns trinta metros. Acácio, ganhando fama por ter sido derrotado por
um pescador, planeia pregar o maior susto da sua carreira. Depois de assustar uns
miúdos, um rapazinho chamado Joãozinho fica esquecido junto ao lago e tornam-se
amigos. O monstro não era mau, só tinha a missão de assustar as pessoas que fossem
para junto do lago, e isto não passava de um trabalho. Contudo, não tinha nascido para
ser um monstro assustador e Acácio passou a ter a missão de brincar com as crianças no
lago.

(…) o miúdo “super-herói” lhe explicou que, em muitos desenhos animados,


havia monstros amigos das crianças e apenas os adultos podiam fazer mal aos
monstros e até matá-los.60

59
António Antunes Carvalho (2006) p. 10
60
Idem Ibidem

59
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

“Bestiário Tradicional Português: As criaturas fantásticas do imaginário popular”


é uma enciclopédia ilustrada que reune texto e pesquisa de Nuno Matos Valente e
ilustração de Natacha Costa Pereira. A primeira edição é de 2016 e a segunda edição é
de 2017, ambas pela “Edições Escafandro”.

Cerca de quarenta criaturas do folclore português estão agrupadas em sete categorias


diferentes, e foram recolhidas de diversas fontes como obras publicadas da autoria de
etnógrafos, conversas diretas, etc.

Recorrendo a seres mágicos, explicaram-se fenómenos difíceis de entender,


como o estado do tempo, a doença ou a sorte; atríbuia-se sentido à vida,
reconhecendo o papel da reprodução, do crescimento e da morte; educavam-se
as crianças para que continuassem as tradições e os modos de vida que
garantiam a sua sobrevivência e a das suas comunidades. 61

Na primeira categoria, “Medos e Papões”, encontramos o “Homem do Saco” que rouba


crianças e as transporta dentro de um saco; a “Maria Gancha” que vive dentro do poço,
tem ganchos em vez de dedos e ataca as pessoas que atiram pedras para o poço; o
“Bicho Papão” esconde-se nos cantos escuros das casas e come crianças; A “Coca” tem
uma cabeça de abóbora e alimenta-se de crianças desobedientes; o “Insonho”, que usa
uma carapuça vermelha na cabeça, senta-se em cima da pessoa e alimenta-se dos seus
sonhos, provocando pesadelos; a “Maria da Manta” mora nos rios e afoga as crianças
que se aproximam da água.

A segunda categoria, “Os Corredores de Fado” são pessoas que foram amaldiçoadas,
são muito pálidas e têm olhos massados e mãos quentes. Destacam-se as “Peeiras de
Lobos”, que são a versão feminina dos corredores, vivem entre os lobos; o “Tardo” é
alguém que pode tomar a forma de um animal, e se ao fim de sete anos a maldição não
estiver quebrada transforma-se num “lobisomem”; o “Lobisomem” alimenta-se de
animais e humanos, se morrer sem a sua maldição ser quebrada, ou seja se não o
fizerem sangrar ou disparar uma bala contra a sua própria sombra irá transformar-se
num “Corrilário”; o “Corrilário” é a alma penada de um “lobisomem”, obrigado a
vaguear para sempre na forma de um cão.

61
Nuno Matos Valente (2017) p. 5

60
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

São quatros os “Animais” raros alguma vez avistados na terceira categoria. O “Verdugo
Barbudo” é uma cobra muito grande com barba; a “Zorra Berradeira” é uma alma
penada que toma a forma de uma raposa e apenas os seus berros a distinguem de uma
raposa normal; o “Bicho Cidrão” vive numa montanha da ilha da Madeira e é o
resultado da união da alma de um pastor e do seu cão; o “Cavalo do Pensamento” tem
asas de morcego e deita fogo pelos olhos, pela boca e pelas narinas, e aparece quando
alguém pensa muito nele, nem sempre pelos bons motivos.

Na quarta categoria, as “Fadas Moiras e Bruxas” são criaturas femininas que habitam o
imaginário do fólclore português. As “Jãs” são fadas do tamanho da mão, vivem nas
casas das pessoas e entretêm-se a fiar linho; as “Hirãs” têm a cabeça muito grande e
apenas a mais nova de sete irmãs se transforma nesta criatura, quando cumprem o seu
décimo segundo aniversário transformam-se em cobras; as “Moiras Encantadas” podem
tomar a forma de uma bela mulher ou uma mistura de mulher com um animal, têm
longos cabelos e guardam grandes tesouros que prometem oferecer a quem quebrar o
seu encantamento; as “Bruxas Lavadeiras” podem ser vistas durante a noite junto a
lagos e rios, lavando a roupa, vestem-se de branco e podem assumir a forma de patos ou
gansos; as “Mulheres Marinhas” são as sereias portuguesas, têm metade do corpo
coberto de escamas, pés de cabra e umas orelhas enormes; a “Velha da Égua Branca”,
durante as noites de lua cheia, aparece montada na sua égua e quando passa pelos
campos solta os animais que estão a pastar.

Da quinta categoria “Espíritos, Fantasmas, Bruxos e Demónios” fazem parte oito


perigosas criaturas. Os “Borborinhos” são pequenos remoinhos de vento que podem
conter no seu interior almas penadas, demónios e bruxas; o “Tatro Azeiteiro” provoca o
nevoeiro e tem um ligeiro cheiro a azeite; as “Aventesmas” são fantasmas muito altos
que usem batinas ou camisas, quanto mais se olha para um mais ele cresce; o “Secular
das Nuvens” é quem provoca as tempestades e as transporta pelo céu; o “Dianho” é um
demónio que tem a forma de um bezerro com cornos; o “Homem do Chapéu de Ferro” é
uma criatura gigante que usa um chapéu de ferro, tem o corpo da cor do bronze e a boca
rasgada, anda sempre acompanhado por um animal; o “Homem das Sete Dentaduras” é
um ser maléfico que aparece quando está muito calor; o “Entreaberto” surge
normalmente ao meio-dia e à meia-noite, e carrega brasas nas suas costas que causam a
morte a quem olha.

61
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

“Criaturas Diminutas” encontram-se na sexta categoria e são seres muito pequenos. Os


“Trasgos” vivem nas casas das pessoas e durante a noite dedicam-se às travessuras; os
“Fradinhos da Mão Furada” são semelhantes aos “Trasgos”, mas é mais frequente
realizarem favores aos donos das casas onde vivem; os “Maruxinhos” são “Trasgos”
que vivem nos montes, grutas e ruínas e guardam tesouros dos sítios onde moram; os
“Moirinhos Encantados” têm olhos enormes, são vistos nas ruas, junto às árvores ou
sentados num muro; os “Labregos” vivem no mar e no mato e transportam pedaços de
madeira.

“Gigantes” é a última categoria desta odisseia de criaturas mágicas. Os “Olharapos”


podem ter até três olhos, são muito violentos e comem tudo o que encontram; as
“Almajonas” aparentam ser mulheres muito altas que carregam os filhos às costas; os
“Bisarmas” são as maiores criaturas que se encontram em Portugal, são desajeitados,
desproporcionais, não usam roupa e têm uma voz horrível.

A artista Natacha Costa Pereira estudou na Faculdade de Belas Artes pela Universidade
do Porto e trabalha em teatro de marionetas. Nas palavras de Natacha, o processo que
adotaram na criação das ilustrações foi o seguinte:

O Nuno forneceu-me uma lista de quarenta e tal personagens com as suas


descrições (…). O que fiz foi tentar saber o menos possível sobre elas, (mesmo
sobre as personagens mais conhecidas como a coca ou o homem do saco), para
tentar criar uma visão mais minha de raiz, e comecei por fazer uns desenhos
digitais, bastante complexos tecnicamente. Na fase inicial ainda não tínhamos
definido se o projeto iria ser para crianças ou para adultos. Depois concluímos
que seria mais apelativo se o livro fosse para todas as idades e comecei por
fazer estudos em papel até chegar a um resultado plástico que agradasse aos
dois, pois a ideia não era infantilizar demasiado as personagens. Foi um
processo que demorou alguns meses, cerca de 6 ou 7, porque à medida que ía
construindo as imagens, ía debatendo-as com o Nuno, centrando-nos nos pontos
comuns do nosso imaginário. O nosso consenso passou mais por debater
pormenores da personagem, como acessórios e ambientes, do que propriamente
debater a plasticidade das ilustrações.

62
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

A técnica que usei foi desenho a grafite sobre papel que depois sublinhei (fiz o
outline), a caneta Staedtler pigment liner 0,1. Digitalizei e colori digitalmente,
usando o Photoshop e o corel painter X3.62

Figura 15. Ilustração de “O Bestiário Tradicional Português”


(Natacha Costa Pereira, 2016).

62
Natacha Costa Pereira (2017) resposta a e-mail.

63
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.5 – Diabos

À medida que se intensificou a tendência para o monoteísmo, os princípios do


Bem e Mal separaram-se e a noção de um demónio-chefe ou de um génio
maléfico que presidisse a todos os outros enraizou-se em várias culturas. (…)
Conhecido de várias maneiras como Diabo, Satanás, Mafarrico, Belzebu ou
“príncipe das trevas”, ele era um génio maligno cujo dever era fazer com que
os homens caíssem cada vez mais em tentação. 63

Alice Vieira, jornalista e escritora de renome, em parceria com o ilustrador André


Letria, publicou em 1998 “Os Anéis do Diabo”, uma obra que faz parte da coleção das
“Histórias Tradicionais Portuguesas”, editada pela “Caminho”.

Conta a história sobre um soldado que, como não tinha emprego na sua área, vai
trabalhar para a casa de um mercador e apaixona-se pela filha do mesmo. Depois de
lavar a casa, passar a roupa e cozer o pão durante sete anos, pede em casamento a filha
do mercador. Ele só concede a mão da sua filha em casamento ao soldado se este for ao
inferno e trouxer os três anéis do diabo.

O soldado aceita o desafio e no caminho encontra várias personagens que o ajudam na


procura do inferno. Na primeira encruzilhada um rei que estava a caçar disse-lhe para
seguir a estrada de espinhos e cardos e para perguntar ao diabo onde estava o anel que
havia perdido, e não encontra. Na segunda encruzilhada um rei que estava à pesca disse-
lhe para seguir a estrada em volta da Lagoa das Trevas, e perguntar ao diabo onde
estava o filho dele que tinha viajado pelo mundo e ainda não tinha voltado. Na terceira
encruzilhada encontrou um rei que andava a colectar raízes e disse-lhe para seguir a
estrada onde estava a erva-do-enforcado e a erva-das-setes-cabeças, e para perguntar ao
diabo que doença tinha a filha dele pois ninguém a conseguia curar.

Quando chegou ao final da estrada encontrou um velho que lhe disse que o diabo vivia
do outro lado do mar e que só poderia regressar se encarasse o diabo de frente. Um
grande pássaro ajudou-o a fazer a travessia e encontrou do outro lado a mãe do diabo,
que depois de ouvir a sua história de amor prometeu ajudá-lo.

63
Paul Newman, (2004) p. 25

64
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

“(…) o soldado teve tanto medo do diabo quando o olhou de frente que por
pouco não desatou a gritar por socorro.” 64

A mãe com muito jeitinho tirou o primeiro anel da sua mão direita, o diabo estava a
sonhar com o rei da primeira encruzilhada e disse-lhe que tinha sido o vento que tinha
levado o anel para o fundo do areal. Depois tirou o anel que estava na mão esquerda e o
diabo estava a sonhar com o rei da segunda encruzilhada, dizendo que o filho do rei
estava junto com uma princesa e não voltaria. Por fim a mãe tirou o anel que tinha na
língua e o diabo sonhando com o rei da terceira encruzilhada diz que a filha do rei
estava doente por causa do sapo que lançava veneno no enxergão.

Figura 16. Ilustração do “Os Anéis do Diabo” (André Letria, 1998).

Na manhã seguinte o soldado partiu com os três anéis do diabo. Nas três encruzilhadas
encontrou os três reis, que agradeceram pela informação que o diabo lhe tinha contado e
concedendo-lhe três dias com os seus poderes. No primeiro dia deu trabalho a toda a
gente da aldeia, no segundo dia ordenou que todos os habitantes da aldeia podiam casar
com quem quisessem e no terceiro dia o soldado encontrou-se com o mercador. Este
mesmo depois de receber os três anéis do diabo, não queria que o soldado casasse com a
sua filha. Felizmente o amor triunfa nesta historia, o teimoso mercador transforma-se
numa nuvem de fumo e o soldado casa com o amor da sua vida.

A ilustração é típica do artista André Letria, as personagens são expressivas e a paleta


de cores extensa.

De forma caricata e cómica, José Vaz publica em 2003 o livro infanto-juvenil “Mala
Diabo!”, ilustrado por Helena Magalhães e das “Edições Gailivro”.

64
Alice Vieira (1998) p. 9

65
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Conta a história de Nelito, que a seguir ao Quim Xanato, é o homem mais popular na
Aldeia Nova. Com 50 anos de idade, tinha uma mentalidade de criança inocente, para
ele a maldade era inexistente e tinha medo de trovões e da noite, cantando para
afugentar o medo.

No programa de festas, o Tono Prego era o guardador da mala que continha as roupas
das personagens da representação teatral “O Auto das Barcas do Inferno”. Entretanto
dá-lhe uma valente dor de barriga e pede ao Nelinho para guardar a mala, dizendo-lhe
que tem lá dentro as roupas do diabo. Quando a procissão termina o fogueteiro lança um
foguete, Nelinho assustado pensando que era um trovão aponta para a mala e desata a
gritar:

“- Mala Diabo! Mala Diabo! Mala Diabo!”65

A população fica eufórica e pensa que Santanás está dentro da mala. A população vai
chamar o Presidente da Junta de Freguesia pois tinha o cargo mais importante da aldeia
e deveria ser ele a enfrentar o diabo. O medricas recusou. O bombeiro João Pequeno,
destemido, apetrechado com um machado abre a mala, dá um grito dá-lhe uma
machadada. Não aconteceu nada, então João Pequeno levantou a tampa da mala com
muita cautela, viu um pano de cetim e uns cornos brancos e deu uma gargalhada. O
medo deu lugar ao riso que durou até à noite.
Então o Nelito veste as roupas e mascara-se
de satanás até o teatro começar.

Ilustração mista e rica, colagens, tecido,


texturas. Padrão azul, no céu, no chão,
pontilhado na natureza. Personagens
humanas com rostos desenhados com
materiais riscadores (o que se assemelha a Figura 17. Ilustração de “M ala Diabo!” (Helena
M agalhães, 2003).
carvão ou grafite) e padrões na roupa.

“Diabos, diabritos e outros mafarricos: Contos e Lendas de tradição oral” é uma


colectânea de dez contos de tradição oral, que envolvem o mundo da superstição e dos
demónios, com propostas diabólicas e tentadoras. A autoria é de Alexandre Parafita e a
ilustração de Fátima Buco. Foi publicado em abril de 2003 pela “Texto Editora”.

65
José Vaz (2003) p. 10

66
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

As histórias deste livro fazem parte da tradição oral transmontana, e são


versões recontadas pelo autor a partir dos documentos originais incluídos numa
vasta colecção de literatura oral tradicional que o mesmo tem vindo a compilar
e a estudar. 66

Este livro incluí histórias sobre um diabo com propostas tentadoras, diabos com medo
de crianças, corvos de aspeto sinistro que são a transfiguração do próprio diabo, diabos
que comem fruta amarga… Segundo algumas superstições quando uma pessoa espirra
ou boceja pode vir a ser possuída pelo diabo. Existem lendas que dizem que o diabo foi
construtor de pontes, crianças que morreram sem ser baptizadas e que se tornaram
diabretes conhecidos por “trasgos”,
diabretes estes que atormentam as pessoas
durante a noite.

As ilustrações são coloridas, ocupam a


página inteira, com contorno a preto e
preenchimento que se assemelha a aguarela.
Diabo é representado com uns grandes
olhos verdes, corpo vermelho a segurar Figura 18. Ilustração do conto “O diabo e o lavrador”
no livro “Diabos, diabritos e outros mafarricos” (Fátima
num tridente. Buco, 2003).

“O Diabo do Alfusqueiro” conta a história da construção da ponte67 que une as


margens do rio Alfusqueiro. Foi escrito por Maria da Conceição Vicente e ilustrado por
Flávia Leitão, publicado em outubro de 2011 pela “Trinta por uma linha”.

Conta a história sobre um homem cristão que ficou encarregue de construir uma ponte
sobre o rio Alfusqueiro, rio que desce a Serra do Caramulo e desagua no rio Àgueda.
Comprometeu-se em construir a ponte mas era uma tarefa muito complicada para um
simples homem até que apareceu o diabo com uma proposta tentadora. Disse-lhe que a
ponte ficaria terminada até ao cantar do galo na noite de Natal, e em troca o cristão
pagaria com a sua própria alma.

O cristão começava a ficar com remorso em ter vendido a alma ao diabo, e perante o seu
desespero, uma fada apareceu e disse-lhe para, no aproximar da hora do cantar do galo,

66
Alexandre Parafita (2003) p. 32
67
Tal como no conto “O diabo, a menina e a ponte”, que faz parte do livro apresentado anteriormente, nas
lendas de tradição oral algumas pontes são obra do diabo.

67
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

o homem dirigir-se à ponte e atirar um ovo ao diabo antes deste colocar a ultima pedra.
Assim o fez, e no momento que atirou o ovo saiu de lá um galo a cantar. O diabo
quebrou a promessa e o contrato ficou sem efeito.

Ilustrações feitas com colagens, são utilizados texturas, padrões, imagens impressas de
tecidos, lãs, pedras, contornos com picotados. Tons verdes da serra, azul do rio,
cinzento da ponte.

Figura 19. Ilustração de “O Diabo do Alfusqueiro” (Flávia Leitão, 2011).

68
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.6 - Bruxas e Feiticeiros

O evento de gala das bruxas era a reunião de feiticeiros. Tradicionalmente, esta


tinha lugar depois da meia-noite de uma sexta-feira, pelo menos uma vez por
ano, em lugares remotos e desertos, charnecas altas ou montanhas (…). 68

A “Dona Bruxa Gorducha” é um livro muito engraçado escrito pela Anabela Mimoso
e ilustrado pelo João Caetano. Foi publicado pela primeira vez em 1995 e editado pela
“Livraria Arnado”, com sede em Coimbra. A edição mais recente é ilustrada por Pedro
Pires.

Figura 20. Capa do livro Figura 21. Capa do livro


“Dona Bruxa Gorducha” “Dona Bruxa Gorducha”
(João Caetano, 1995). (Pedro Pires, 2007).

Esta história acompanha as peripécias da Dona Bruxa Gorducha na procura de uma


solução para o seu problema de peso, o qual tem que ser solucionado até “à reunião
semanal das Bruxas, Fadas, Feiticeiros & Profissões similares (B. F. F. & Ps)”69 , que se
realizava todos os sábados à meia noite. Os problemas de peso são uma preocupação
que cada vez mais tem impacto nas vidas das pessoas, seja por uma questão de saúde ou
pura estética, e, de forma caricata, são aprofundados nesta história adaptada para os
mais novos.

A dona Bruxa Gorducha tinha um grande problema, era tão gorda que nenhuma
vassoura aguentava com o seu peso. De modo a encontrar uma solução, ao longo da
história vai apelando às personagens que a ajudem. Pede ao bruxo-vassoureiro que lhe
fizesse uma vassoura personalizada, mas ele desconhecia qualquer feitiço ou material
que aguentasse com a estatura da sua cliente. O Geringonças, um bruxo todo moderno,

68
Paul Newman (2004) p. 40
69
Anabela Mimoso (1995) p. 3

69
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

sugeriu um aspirador gigante, umas asas de morcego, uma trotineta, uns patins com asas
ou uma prancha voadora. E sempre que as propostas não eram do agrado da bruxa, com
tristeza, voltava a comer desalmadamente e engordar cada vez mais. Experimentou uma
poção para se transformar numa ave de rapina veloz e forte, uma águia-real.
Infelizmente para azar seu, esqueceu-se de adaptar as medidas da poção para o seu porte
massivo e a transformação não ficou completa. Tentou outra poção chamada “Filtro
Mágico”70 , que estava no livro de receitas da avó Adamastora, que dava para todos os
tipos de feitiços e que era infalível. Desta vez, exagerou na dose e acabou por se
transformar numa tartaruga.

Final da história: envergonhada de todos os seus falhanços, a bruxa saiu de casa e andou
e andou… Até que certa noite, dois anos depois de andar à deriva, viu uma claridade no
meio da floresta. Era o Congresso Anual das B. F. F. & Ps. Tão magra por andar sem
parar e não se lembrar de comer, o Bruxo-Mor e todos os feiticeiros felicitaram-na pelo
objectivo alcançado, e por “mostrar como a perseverança dá os seus frutos”.71

João Caetano nasceu em Moçambique em 1962. Fez o curso de Pintura na Faculdade de


Belas-Artes da Universidade de Lisboa, antiga ESBAP. Muito diferente da típica
ilustração infantilizada, João Caetano deu vida às páginas com ilustrações complexas e
ricas, de um cariz que faz lembrar a banda desenhada. Meticulosamente bem
trabalhadas, as texturas e os rabiscos complementam-se com cores frias, a puxar para
um semblante do universo da feitiçaria e bruxaria.

70
Anabela Mimoso (1995) p. 18
71
Idem, p. 30

70
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.7 - Fantasmas

Os fantasmas são facetas exiladas da personalidade; eles assombram porque


lhes é negado o seu habitat natural. Assim, não se deve afugentar um fantasma
mas sim integrá-lo (…).72

Luísa Ducla Soares publica pela primeira vez a história infantil “O Fantasma” em
1982. Em 2007, por cortesia da “Civilização Editora”, o livro foi revisto pela autora e as
ilustrações simples da 1ª edição, pintadas com lápis de cor rosa e verde, e delineadas
com caneta preta/tinta da china são substituídas pelo maravilhoso trabalho da ilustradora
Maria João Lopes. A técnica da ilustração é mista, com muita textura e colagem. Utiliza
uma camada prévia de gesso acrílico, de modo a criar textura, coberta de tinta acrílica,
em que o suporte é o cartão. Foi o primeiro trabalho em que utilizou o gesso acrílico, e
é, portanto, bastante experimental. As cores são garridas, fora do comum
fantasmagórico, as perspetivas são distorcidas, e as personagens cabeçudas, redondas e
animadas.

Figura 22. Capa do livro “O Fantasma”


(M aria João Lopes, 2007).

A história desenrola-se acerca de um fantasma, chamado Prega-Sustos


Fantasmagóricos, que vive num castelo em ruínas e está farto da sua rotina. A sua
família incentivava-o a ser assustador, contudo ele era um menino bem-comportado e o
que ele mais queria era sair do castelo e conhecer a terra dos homens. Até que um dia,
para quebrar a monotonia, um grupo de militares acampou junto ao castelo. Os
fantasmas, eufóricos, resolveram pregar-lhes um grande susto. Como era carnaval, não

72
Paul Newman (2004) p. 67?

71
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

foram levados a sério por os soldados pensarem que se tratava de uma brincadeira, e
com o barulho frenético das armas militares ninguém os conseguia ouvir.

Desiludido com a vida que levava, o fantasma ruma à cidade, onde também existiam
fantasmas, só que mascarados… “Muito se enganou o meu avô (…) Afinal aqui
também há fantasmas. E usam sapatos por debaixo dos lençóis para não criarem calos.
Assim é que é!”73

Entrou numa festa e dançou com a Isabel, mais conhecida por Menina do Capuchinho
Vermelho, ele que nunca tinha estado tão próximo de uma pessoa. Bateu a meia noite e
a menina, pensando que o seu companheiro de dança era um menino mascarado,
convence-o a ficar em sua casa.

Após confessar que era um fantasma verdadeiro, o pai chama uns especialistas: um
médico, um psicólogo, um astronauta, o chefe da polícia e o dirigente da Liga dos
Direitos e Liberdades e todos debateram as características e os direitos do fantasma.

A Isabel sugeriu levar o fantasma para a escola mas a diretora tinha medo do fantasma,
e os colegas gozavam com ele. Para se inscrever, precisava de tirar o bilhete de
identidade, era impossível medir a altura do fantasma porque ele pairava no ar. Sem
identidade não podia ir à escola mas podia trabalhar. Fez de fantasma num filme.

Sentia saudades do castelo assombrado e da sua família, mas se voltasse ia sentir


saudades da cidade e da sua amiga. Com o dinheiro que ganhou como ator, o fantasma
voltou ao castelo e ofereceu prendas a todos, lençóis novos, uma televisão para verem
filmes de terror, novelos de lã e agulhas de tricotar e uma máquina de lavar a roupa para
terem os lençóis sempre limpos, e ofereceu ao pai um livro que mostra como concertar o
castelo. Para si próprio, comprou-o um telemóvel para poder falar com a Isabel. Todos
os fantasmas adoraram as suas prendas, contudo não se sentiam felizes porque não
tinham pessoas para assustar, mas felizmente Prega-Sustos Fantasmagórico teve a ideia
uma ideia fantástica! Meteu um anúncio a publicitar um espetáculo assustador no
castelo assombrado. Foi o furor e os fantasmas voltaram a sentir-se como verdadeiros
génios assustadores.

73
Luísa Ducla Soares (2007) p. 13

72
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.8 – Extraterrestres

“O Gatuno e o Extraterrestre Trombudo”, conta a história sobre um gato que tem


uma certa implicância por uma criatura de outro mundo, que mais parece um ET mas na
verdade é um aspirador de pó.

Foi publicado pela primeira vez em 2012 pela “Dinalivro”, tem autoria de Maria João
Lopes e ilustração de Paulo Galindro. Natural de Guimarães, Maria João Lopes é
jornalista e colaboradora do jornal Público. Este texto foi vencedor do Prémio
Branquinho da Fonseca 2011, atribuído pela Fundação Calouste Gulbenkian e pelo
jornal Expresso.

O gatuno tem medo de um estranho objecto que vive na marquise: é verde como os
extraterrestres, não fala a língua dos humanos, tem rodas e uma tromba. Os felinos são
conhecidos pela sua curiosidade e o gatuno sente-se ameaçado porque este extraterrestre
tem direito a mordomias: partilha a marquise com ele, não se lambe, não come, e ainda
recebe duas horas de atenção por parte dos humanos. Os donos permitem tudo ao
extraterrestre, até desviam móveis, levantam os tapetes e andam com ele pela casa
inteira.

Furioso planeia a sua vingança contra o inimigo, no entanto, após algum uso, o
extraterrestre estraga-se e acaba abandonado no lixo. O pequeno André, o dono mais
novo, recebe uma bicicleta que fica guardada na marquise. Agora o gatuno tinha um
novo inimigo.

A ilustração é do Paulo Galindro. A técnica utilizada é a colagem e recorte de papéis


previamente pintados com tinta acrílica. Nas ilustrações os esboços estão visíveis e na
última página que cola à capa estão três fotografias do método utilizado. (Ver Anexo
19)

Um facto curioso foi que uma menina de dez anos, residente na Suíça, com problemas
de autismo, foi sujeita a terapia, e a partir dos desenhos que viu neste livro e do método
de ilustração utilizado ela tentou imitar e criar.

73
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

As ilustrações são bastante engraçadas, as personagens muito expressivas, fundos


brancos onde é possível notar o relevo das colagens. Última ilustração é uma referência
ao ET.

Figura 23. Ilustração do “O Gatuno e o Figura 24. Ilustração do “O Gatuno e o Extraterrestre


Extraterrestre Trombudo” (Paulo Trombudo” (Paulo Galindro, 2012).
Galindro, 2012).

74
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

3.9 – Obras, autores e ilustradores internacionais relacionados com a


temática do medo e dos monstros

“Onde vivem os Monstros”, de Maurice Sendak, é das obras infantis mundialmente


mais conhecidas entre crianças e adultos. Foi publicado pela primeira vez em 1963 nos
Estados Unidos da América e a tradução portuguesa de Elisabete Ramos foi publicada
pela “Kalandraka” em 2009.

O albúm ilustrado por excelência, que foi adaptado ao cinema, transporta o


leitor para uma inesquecível viagem de ida e volta até ao território da
imaginação.74

O pequeno Max gostava de se mascarar de lobo e só fazia trapalhices por casa. A mãe
ordena-o a ir para o quarto e a nessa noite acontece algo mágico. O quarto transforma-se
numa enorme floresta, com um oceano para o Max navegar de barco, até chegar onde os
monstros vivem. Eram assustadores, tinham dentes, olhos e garras terríveis. Max
mandou-os estarem quietos e os próprios monstros, que não eram assim tão
monstruosos, ficaram com medo do menino, que para eles era um monstro. Max tornou-
se o rei dos monstros, brincaram muito até que o menino ficou aborrecido e queria
voltar para um sítio onde gostassem dele. Desistiu de ser o rei dos monstros e voltou
para casa.

Figura 25. Ilustração de “Onde vivem os M onstros” (M aurice Sendak, 1963).

74
Catálogo Kalandraka Portugal (2017), p. 23

75
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Mercer Mayer, escritor e ilustrador norte-americano, publicou em 1968 “Um pesadelo


no meu armário” editado pela “Dial Books”. Em 2004 a “Kalandraka” editou para
português, traduzido por Dora Isabel Batalim.

Conta a história sobre um rapazinho que antes de dormir fecha a porta do armário pois
existe um pesadelo lá dentro. Como em todas as histórias sobre crianças corajosas,
numa noite decidiu enfrentar esse pesadelo, colocou um capacete na cabeça, brinquedos
na cama para o protegerem e quando o quarto ficou escuro o pesadelo apareceu. O
rapazinho ameaçou-o dizendo que se ele não desaparecesse lhe dava um tiro com uma
arma de brincar. Ele disparou a fingir e o pesadelo desatou a chorar. O rapazinho com
pena do pesadelo consolou-o e aconchegou-o.

As ilustrações são detalhadas, em tons de verde e laranja, riscador preto para contornar e
fazer texturas. O Pesadelo está ilustrado sobre a forma de monstro, com umas grandes
orelhas que fazem lembrar asas de morcego, manchas verdes a cobrir o corpo, cabelos
na cabeça, dois dentes de fora, e um rabo com uma ponta de picos, três dedos em cada
mão e três dedos em cada pé.

Figura 26. “No meu armário havia um pesadelo” (M ercer


M ayer, 1968).

“The Gruffalo”, na versão portuguesa “O Grufalão”, é uma obra infantil original da


autora Julia Donaldson, com ilustração de Axel Scheffler. Foi publicado pela primeira
vez em 1999 pela editora “Macmillan” (UK). A primeira tradução é de Maria da Fé
Peres, publicado pela “Jacarandá Editora” e a tradução de 2003 é de João Magalhães
Guedes, publicado pela “Editorial Verbo”.

Ilustrações mais infantilizadas, contornadas a preto, cores saturadas contrastando as


cores quentes com as cores mais neutras como os castanhos, amarelos e ocres da terra

76
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

da floresta, da cor do ratinho; laranjas da raposa, da coruja, dos olhos do grufalão;


castanhos dos troncos das árvores e do corpo do grufalão; verdes da vegetação, das
folhas das árvores; cinzentos das rochas e da cor da cobra; azuis claros do rio.

Um ratinho encontra uma raposa e diz-lhe que vai almoçar com


o grufalão, mas o que é um grufalão?

– Tem umas presas terríveis, e umas garras terríveis, e uns


dentes terríveis numa boca terrível. 75

– Tem umas patas nodosas, os dedos revirados e uma borbulha


venenosa na ponta do nariz. 76

Figura 27. Capa do livro “O


Grufalão” (Axel Scheffler,
– Tem olhos cor de laranja, a língua preta e, espetados nas
1999). costas, espinhos violeta.77

O ratinho inventa que existe um monstro terrível chamado Grufalão que come animais:
faz assado de raposas, gelado de coruja, cobra mexida. Até que o ratinho encontra
mesmo o monstro terrível que tinha inventado para escapar aos animais que o queriam
comer. Para dar a volta ao grufalão e não ser comido, o ratinho disse-lhe que todos os
animais da floresta tinham medo dele. Usando o grufalão como protecção, pois já tinha
avisado todos os animais da floresta que ele os queria comer, todos os animais fugiram
do monstro, ou como o ratinho fez o gurfalão acreditar, nele mesmo.

- Bem, Grufalão – disse o rato -, estás a ver? Todos os animais têm medo de
mim! Mas sinto que a barriga me está a dar horas. E sabia-me bem um belo
puré de grufalão! – Puré de grufalão? – disse o Grufalão. Deu logo meia volta e
fugiu sem demoras. 78

Em 2004, Julia Donaldson públicou o volume seguinte, “A Filha do Grufalão”, que em


2010 foi editado pela “Pi”.

Em 2014 foi públicado o livro “A Minha Professora é um Monstro! (Não sou, não)”,
da autoria e ilustração de Peter Brown. Foi traduzido para diversas línguas, entre as

75
Julia Donaldson (2004) p. 5, 6.
76
Idem, p. 10.
77
Idem, p. 14.
78
Idem, p. 25.

77
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

quais o português. A tradução é de Rui Lopes e foi editado pela “Orfeu Negro”, na
Colecção Orfeu Mini.

Para o Frederico a professora Dona Lurdes é um monstro, porque mandava calar os


alunos e quem atirava aviões de papel na aula não podia ir ao intervalo. Um dia, num
sábado de manhã, o Fred encontra a professora no jardim e a partir dai começa uma
aventura entre os dois. Depois de recuperar o chapéu da Dona Lurdes que voou com o
vento, a professora começa a simpatizar com ele e o Fred mostra-lhe o seu sitio
preferido do parque. Em chegando à hora de almoço os dois despedem-se e a professora
transforma-se, depois de um processo ao longo da história, numa linda senhora, não é
mais um monstro para o Frederico… até que ele volta a lançar outro avião de papel
durante a aula.

As imagens são simples, geométricas e rígidas. Inicialmente as ilustrações têm tons


acastanhados, tons terra e o verde da professora monstruosa. As imagens vão expandido
e destaca-se o verde da vegetação e do parque onde o Frederico encontra a professora
Lurdes. A imagem ocupa a folha inteira e está harmonizada com o texto. No diálogo
entre aluno e professora a ilustração toma uma dimensão de banda desenhada, com
balões, no narrador são frases corridas. As imagens começam a tornar-se mais
preenchidas.

A técnica mista desenhada na ilustração é a tinta da china, a aguarela e o guache, que


foram editadas e coloridas digitalmente. O texto é composto por caracteres Archer e
Chelsea Market Pro.

Figura 28. Ilustração “A M inha


Professora é um M onstro!” (Peter
Brown, 2014).

78
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

4 – Atividade “Desenhar o medo”

79
“If your child can draw a picture of a monster, the monster may be less terrifying. ”

No seguimento de uma conversa sobre a comemoração do "Dia das Bruxas", com os


alunos da Escola Básica de Ferreira do Alentejo, numa turma mista de 3º e 4º ano, foi
sugerida a elaboração de um desenho. Previamente, a professora bibliotecária leu a
história “A Bruxa Arreganhadentes”80 e os alunos construíram uma bruxa em papel com
uma vassoura feita de um pau de espetada e ráfia.

Participaram na atividade sete alunos representativos da turma. Dois alunos com


necessidades educativas especiais, três alunos de português língua não materna e dois
alunos de currículo normal a frequentar o 3º ano.

Foi pedido, aos alunos, que desenhassem o "medo". Disponibilizaram-se folhas brancas,
lápis de cores variadas e marcadores também de cores variadas. Foi estabelecido um
período de tempo entre os 30 e os 45 minutos para a realização da atividade proposta.

Figura A

O aluno é do sexo masculino, frequenta o 3ºano e tem nove anos de idade. A criança
desenha uma figura central com vários componentes: seis braços, todos diferentes, duas
orelhas e dois pés. Tem olhos, uns óculos protectores e uma boca. Esta figura de
configuração oval é muito colorida. Por cima desta figura central foi desenhado, o que
parece ser uma núvem, de cor cinzenta mas contornada a vermelho e azul.

79
Farah Lofti Kashani (2005) p. 747
80
Livro infantil escrito por Tina Meroto e ilustrado por Maurizio A. C. Quarello. Conta a história de três
irmãos que, perdidos no bosque, decidem entrar na casa da bruxa.

79
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Figura B

É uma criança do sexo feminino, tem nove anos e está a frequentar o 3ºano. Utilizou
todo o espaço disponível da folha e desenhou três figuras centrais: uma personagem
semelhante a uma bruxa montade numa vassoura, com uma varinha mágica e um
coração; uma torre que tem uma figura prisioneira e o que parece ser uma escada; e por
último uma árvore desfolhada. Na parte superior da folha desenhou uma lua cheia, duas
núvens e um morcego. Sombreou o fundo a cinzento para escurecer a cena. Deu
especial relevância à noite.

Figura C

Esta criança é do sexo masculino e tem dez anos, frequenta o 4ºano e integra o regime
da educação especial, em currículo específico. É um aluno com dificuldades cognitivas
permanentes.

Por coincidência o dia escolhido para a realização da tarefa foi também o dia que o pai
da criança fazia dois anos que tinha falecido.

Desenhou vários elementos ao longo da folha parecendo querer relatar diferentes tipos
de medo. Em primeiro plano surge uma figura que parece estar em chamas, a flutuar ou
prisioneiro. Em seguida uma figura fantasmagórica e ao lado estão duas tabuletas com a

80
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

inscrição "não ir". No plano de fundo surgem algumas figuras que poderão ser
interpretadas como um fantasma, uma casa, uma bruxa e um homem pendurado pela
cabeça. Do lado direito uma forma azul que parece representar uma tempestado ou um
tornado. Fez questão de salientar sombreando a cinzento que as figuras estavam na
noite.

Figura D

Esta criança é do sexo masculino, tem nove anos, é de nacionalidade romena e frequenta
o 3ºano.

Desenhou trinta e nove quadrados de tamanhos semelhantes e cores variadas. As


primeiras quatro fileiras de quadrados representam um padrão, quatros quadrados da
mesma cor, dois quadrados de cor igual, dois quadrados de cor igual, quatro quadrados
de cor igual. Nas últimas três fileiras os quadrados e as cores são aleatórios.

Figura E

Esta criança é do sexo feminino, tem dez anos e anda no 3ºano de escolaridade. É de
nacionalidade romena. Representa no desenho uma criatura semelhante a um morcego,
uma cobra, uma bruxa, uma vassoura e uma árvore desfolhada com um morcego nos
ramos. As figuras caminham em direcção à árvore. No plano superior uma lua cheia, a

81
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

folha está sombreada para representar a noite. As cores utilizadas são sombrias e
neutras.

Figura F

Esta criança é do sexo feminino, tem dez anos, frequenta o 4ºano e integra o regime de
educação especial, currículo específico. Inspirou-se numa série televisiva sobre
vampiros.

Representa duas figuras femininas, uma delas montada numa vassoura e com uma
varinha mágica que envia ondas de amor para derrotar a "chica vampira". Por baixo da
bruxa foi desenhado uma forma semelhante a uma chama ou uma árvore. No plano
superior estão dois morcegos sorridentes e uma núvem escura entre eles.

Figura G

É a aluna mais velha do grupo de participantes na atividade. Tem doze anos e frequenta
o 3ºano, é de nacionalidade romena.

É o desenho mais simples, representa duas árvores desfolhadas, e uma bando de sete
morcegos a voar. O céu está sombreado a cinzento e com uma lua cheia de fundo. As
cores utilizadas são em tons de cinza e castanho, com uns laivos de verde na base.

82
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

No geral todas as crianças identificaram a noite como o período relacionado com os


medos. Verificamos que existem estereótipos: morcegos, bruxas, lua cheia, que
aparecem na grande maioria dos trabalhos.

Os dois rapazes mais novos fugiram às cores neutras e escuras e realizaram


representações do medo coloridas com cores garridas, quentes, fortes. As suas
representações parecem conectadas a situações virtuais como por exemplo jogos de
computador, vídeos, animação.

A figura C elaborada por um aluno com dificuldades permanentes ao nível da cognição


e organização de pensamento parece representar essas mesmas dificuldades e apresenta
uma representaçao do medo algo confusa.

Todos os elementos empenharam-se na tarefa e revelam um grau satisfatório de


imaginação, todos representam uma cena com exceção da figura D.

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Conclusão

Uma biblioteca é um labirinto. Não é a primeira vez que me perco numa. Eu e o


meu pai temos isso em comum. Penso que foi o que lhe aconteceu. Ficou
perdido no meio das letras, dos títulos, perdido no meio de todas as histórias
que lhe habitavam a cabeça. Porque nós somos feitos de histórias, não é de a-
dê-enes e códigos genéticos, nem de carne e músculos e pele e cérebros. É de
histórias.81

Porque todos nós somos feitos de histórias. Histórias que definem, em muitos casos, a
forma como encaramos a vida. Desmistificar os medos é dar ferramentas que abrem a
porta da felicidade, da esperança e do conhecimento.

Os livros destinados a crianças e jovens são uma realidade recente e o cuidado na sua
ilustração é algo dos nossos dias. Hoje, verificamos que, em muitas publicações, o
ilustrador aparece no mesmo plano do escritor e em alguns casos ilustrador e escritor
são a mesma pessoa. Com a criação de concursos/prémios internacionais de ilustração
sentiu-se uma crescente valorização do trabalho artístico do ilustrador. Algumas
publicações para crianças são autênticas obras de arte ao nível da ilustração e temos, em
Portugal, algumas editoras que se especializaram na ilustração da literatura infantil. Por
exemplo a editora “Planeta Tangerina” tem editado títulos muito criativos ao nível da
ilustração e que até têm ganho importantes prémios nacionais e internacionais, nessa
área.

Nas publicações analisadas verifica-se que o ilustrador tem um cuidado especial em


acrescentar informação ao próprio texto. Estas ilustrações têm vida própria e contam de
forma gráfica e artística a sua própria história. A ilustração deixou de ser um mero
complemento ao texto escrito e tornou-se parte dele.

No que concerne ao tema do meu trabalho, tenho a referir que, a nova vaga de
ilustradores portugueses, apresenta graficamente a temática “Os Monstros na Ilustração
para a Infância” de forma divertida, colorida, com humor, com recurso a técnicas
mistas, texturas, etc. As cores utilizadas nas figuras centrais são predominantemente
cores fortes e garridas. Em quase todas as ilustrações o único elemento que representa o

81
Afonso Cruz (2010) p. 27.

84
Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

medo é a própria sombra projectada no fundo da ilustração. Aos monstros são dadas
qualidades ou particularidades humanas que os tornam próximos do público alvo: são
trapalhões, desajeitados, medrosos, solitários e procuram quase sempre um amigo.

Ao projetar os medos das crianças nos próprios monstros é-lhes permitido pensar que os
seus próprios medos são ultrapassáveis. Pois se o próprio monstro tem o mesmo
problema da criança torna-se solidário com ela. A identificação do próprio medo é o
primeiro passo para a sua resolução. Penso que a representação gráfica dos diferentes
medos: do escuro, dos monstros, dos fantasmas, do desconhecido, da morte, da solidão,
ajuda a criança a desmistificar a imagem criada na sua cabeça. Acaba por formar uma
nova imagem, mais clara, mais objectiva e mais humana. Muitas vezes, a criança tem
medo sem saber do quê, por isso existir um livro que é um objeto de conforto a dar
forma e cor àquilo que ela não consegue exteriorizar, leva a que interiorize de forma
mais positiva e tenha uma atitude mais assertiva perante os seus próprios medos.

Após um trabalho prévio de pesquisa sobre a ilustração de livros para a infância que
abordassem a temática dos monstros e medos, verifiquei que existe muita recolha,
análise e produção sobre esta temática nas vertentes cinema, literatura e videojogos, mas
pouca no âmbito da ilustração infantil portuguesa.

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Índice de Imagens

Figura 1. Sérgio Godinho. Ilustração do “Pequeno Livro dos Medos” (1991). Fonte da
imagem: http://catatu.catalivros.org/janela_papel/m_pequeno_livro_medos.jpg

Figura 2. Maria João Lima. Ilustração do “O Manel e o Miúfa” (2012). Fonte da


imagem: própria.

Figura 3. Carla Nazareth. Ilustração de “Maria do Medo” (2015). Fonte da imagem:


própria.

Figura 4. Rodrigo Abril de Abreu. “Tenho medo do escuro. Aí nascem as estrelas”


(2016). Fonte da imagem: própria.

Figura 5. Henrique Cayatte. Ilustração do “Primeiro Quadro” no livro “O Bojador”


(2000). Fonte da imagem:
http://www.casadaleitura.org/portalbeta/bo/outros_materiais/000445_BOJ.jpg

Figura 6. Paulo Galindro. Ilustração de “O Cuquedo” (2008). Fonte da imagem:


http://www.casadaleitura.org/portalbeta/bo/outros_materiais/001265_m_o_cuquedo.jpg

Figura 7. Maria João Lopes. Ilustração de “Tenho um Monstro no meu quarto” (2009).
Fonte da imagem: própria.

Figura 8. Yara Kono. Capa do livro “O papão no desvão” (2009). Fonte da imagem:
http://www.leyaonline.com/fotos/produtos/500_9789722120999_papao_no_Desvao.jpg

Figura 9. Raquel Pinheiro. Ilustração de “Pê, o Monstro da Preguiça” (2011). Fonte da


imagem: própria.

Figura 10. André Letria. Ilustração de “Estrambólicos”, “Ane/Tân/Nio”, combinação de


“Anelônzio”, “Crustâncio” e “Peixónio” (2011). Fonte da imagem: própria.

Figura 11. André Letria. Capa do livro “David e Golias” (1995). Fonte da imagem:
http://c4.quickcachr.fotos.sapo.pt/i/Be9043d14/13351147_I2s5s.jpeg

Figura 12. André Letria. Ilustração de “Animais Fantásticos”, “O Grifo” (2004). Fonte
da imagem: http://catatu.catalivros.org/janela_papel/m_os_animais_fantasticos.jpg

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Figura 13. José Manuel Saraiva. Ilustração do “Um Dragão na Banheira” (2004). Fonte
da imagem: http://catatu.catalivros.org/janela_papel/m_ um_dragao_na_banheira.jpg

Figura 14. Anabela Cotrim. Capa do livro “O Monstro” (2006). Fonte da imagem:
https://static.fnac-
static.com/multimedia/PT/images_produits/PT/ZoomPE/2/2/8/9789720718822/tsp2011
1018204328/O-Monstro.jpg

Figura 15. Natacha Costa Pereira. Ilustração de “Bestiário Tradicional Português”


(2016). Fonte da imagem: própria.

Figura 16. André Letria. Ilustração do “Os Anéis do Diabo” (1998). Fonte da imagem:
http://www.casadaleitura.org/portalbeta/bo/outros_materiais/000647_AD.jpg

Figura 17. Helena Magalhães. Ilustração de “Mala Diabo!” (2003). Fonte da imagem:
própria.

Figura 18. Fátima Buco. Ilustração do conto “O diabo e o lavrador” no livro “Diabos,
diabritos e outros mafarricos” (2003). Fonte da imagem: própria.

Figura 19. Flávia Leitão. Ilustração do “O Diabo do Alfusqueiro” (2011). Fonte da


imagem: própria.

Figura 20. João Caetano. Capa do livro “Dona Bruxa Gorducha” (1995). Fonte da
imagem: http://bibliotecas.cm-
loures.pt/nyron/Library/catalog/winlibimg.aspx?skey=401FF7E193FB4536A3FB1F289
06C35D4&doc=18184&img=12901&thb=true&pag=1&res=150

Figura 21. Pedro Pires. Capa do livro “Dona Bruxa Gorducha” (2007). Fonte da
imagem: https://img.wook.pt/images/dona-bruxa-gorducha-anabela-
mimoso/MXwxOTIzMzR8MjQzMDc5fDEzODM1MjMyMDAwMDA=/500x

Figura 22. Maria João Lopes. Capa do livro “O Fantasma” (2007). Fonte do imagem:
https://static.fnac-
static.com/multimedia/PT/images_produits/PT/ZoomPE/8/4/8/9789722624848/tsp2010
0806201230/O-Fantasma.jpg

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

Figura 23. Paulo Galindro. Ilustração de “O Gatuno e o Extraterrestre Trombudo”


(2012). Fonte da imagem: http://www.paulogalindro.com/wp-
content/uploads/2012/06/Ilustra%C3%A7%C3%A3o01_PauloGalindro.jpg

Figura 24. Paulo Galindro. Ilustração de “O Gatuno e o Extraterrestre Trombudo”


(2012). Fonte da imagem: http://www.paulogalindro.com/wp-
content/uploads/2012/06/Ilustra%C3%A7%C3%A3o02_PauloGalindro.jpg

Figura 25. Maurice Sendak. Ilustração de “Onde vivem os Monstros” (1963). Fonte da
imagem: https://image.slidesharecdn.com/onde-vivem-os-monstros-livro-
130717010854-phpapp02/95/onde-vivem-os-monstros-17-638.jpg?cb=1374023384

Figura 26. Mercer Mayer. “No meu armário havia um pesadelo” (1968). Fonte da
imagem: http://catatu.catalivros.org/janela_papel/m_um_pesadelo_no_meu_armario.jpg

Figura 27. Axel Scheffler. Capa do livro “O Grufalão” (1999). Fonte da imagem:
https://img.wook.pt/images/o-grufalao-julia-
donaldson/MXwxNjA0NTg4NnwxMTU5MDkyMXwxNDE1NTc3NjAwMDAw/250x

Figura 28. Peter Brown. Ilustração de “A Minha Professora é um Monstro!” (2014)


Fonte da imagem: https://recursos.wook.pt/recurso?&id=10944777

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Beatriz Túbal Carapuça
Os Monstros na Ilustração para a Infância

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