Nesta conferência pronunciada em 1969 perante à Sociedade Francesa de Filosofia,
Foucault propõe se a analisar a figura do autor como uma função do sujeito dentro da ordem do discurso. Depois de contornar e problematizar duas noções anexas a de autor: a de “obra” e a de “escritura”, como obstáculos críticos que substituem ou perpetuam o mesmo estatuto originário para o discurso, Foucault tenta localizar os espaços e as “funções livres” deixadas pelo progressivo apagamento da figura do autor como categoria crítica. Para tanto centra-se em quatro rasgos ou características-problema da “função-autor” e suas condições de existência numa dada sociedade discursiva:
1) O nome do autor apresenta uma situação ambígua e problemática em relação ao uso
dos demais nomes próprios, fica entre a “designação” de um indivíduo e a “descrição” de um certo modo particular de configuração do discurso, que permite caracterizá-lo e classificá-lo no interior de uma sociedade discursiva. O nome do autor transita no limite dos textos e seu modo singular de circulação e funcionamento dentro da ordem do discurso. 2) Por tanto, a função-autor serve como “objeto de apropriação” jurídica do discurso perante um regime de propriedade, instaurado na modernidade. 3) A atribuição da função-autor a um discurso não dá-se de maneira uniforme e universal em todas as épocas, dependendo do “valor de verdade” adjudicado a este dentro de uma dada formação discursiva. A legitimação e a autenticação da função-autor para um discurso define-se por meio de uma serie de operações analíticas complexas no interior deste, que permitem construí-lo como uma “projeção” do “tratamento aplicado aos textos”, das “continuidades admitidas” ou das “exclusões praticadas”. Não se “constrói” da mesma maneira um “autor filosófico” do que um “poeta” 4) A função-autor não remite a um indivíduo real e exterior ao texto, o escritor, nem ao gesto mesmo da escritura como marca, senão a uma pluralidade de egos (escritor, personagem, narrador) postos em funcionamento pelas distintas instancias textuais (pronomes pessoais, advérbios de tempo e lugar, conjugação verbal) e para textuais (prólogos, prefácios, posfácios, anexos, comentários) num livro ou produção intelectual, dando lugar a diferentes posições-sujeito que diferentes indivíduos podem ocupar.
Foucault procura nesse delineamento ir além da constatação do apagamento do autor,e tenta
configurar uma rede discursiva onde a função-autor se exerce como uma função complexa do discurso, portanto do sujeito, passível de ser mudada ou extinta.