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marcada desde o início por instabilidades de todos os tipos - órfão de mãe aos dois
dinâmica biográfica influenciou de certa forma sua produção literária. Viveu o auge
sua hesitação diante de dois amores do passado – Sylvie e Adrienne. Mas o duplo
para o local de suas lembranças. Desce a escada de sua casa, abre a porta, toma
uma condução e vai em direção a Loisy. Durante o caminho relembra de outros fatos
que ocorreram num passado próximo da época de sua viagem. Depois da noite
insone ele chega, e constata que tudo mudou, compreende que não pode recuperar
a ilusão. Ao retornar a Paris, a história acelera, ele tem um caso com a atriz,
Aurélie, e vai à aldeia vizinha onde Sylvie é agora uma mulher casada e
com a atriz chega ao fim e ele se dirige a Sylvie, refletindo sobre suas ilusões
perdidas.
1
SILVA, Evaneide Araújo da. Para além da realidade: um conto fantástico de Gérard de Nerval.
Araraquara: Laboratório Editorial, 2009. p.501.
2
FACHIN, Lídia. Nerval e as estratégias da representação romântica. Itinerários, Araraquara, n. 25,
245-263, 2007.
francesas; esta impressão é fruto de uma interpretação equivocada, vigente no
Nerval. Os críticos de seu tempo não foram bem sucedidos em compreender a sua
técnica narrativa, que alcança uma complexa impressão temporal diegética, ao criar
sobre a vida extravagante do autor - que na Paris do século XIX participou do Clube
reduzindo-o como louco. Loucura que para Proust “não passa de um subjetivismo
excessivo [...] pois que ligada a um sonho, a uma lembrança, à qualidade pessoal da
sensação, e não aquela sensação de significado comum para todos [...] a realidade”
(1988, p.64). A loucura de Nerval era para Proust uma disposição artística, uma
reinante, com frases feitas, marcada pela recusa das expressões de toda a
3
PROUST, Marcel. “Gérard de Nerval”. In: Contre Sainte-Beuve. Notas de crítica e literatura. p.65.
4
GURIAN, Gabriel Ferreira. Notas sobre o consumo de haxixe pelos literatos parisienses do Clube
dos Haxixins. Temporalidades, Belo Horizonte, Vol. 8, n.2 (mai./ago. 2016). p.285.
impressão difícil de transmitir. Esta tendência do período de produção do autor,
aquareladas da beleza francesa, seja para alguns o único valor dessa obra. Mas,
para Proust, a obra de Nerval era de cor púrpura, uma reação à literatura vazia da
agradar.
pensamento [...] expressas em Sylvie” (PROUST, p.69). Esse marcou em sua obra o
anúncio de uma festa, em Loisy, publicado em um jornal. Este objeto que traz um
maneira como Gérard de Nerval encontrou para pintar o seu quadro com “as cores
de um sonho”, de um país que é real apenas em suas lembranças, porque este país
é oriundo delas.
tem sua bruma dissipada por Umberto Eco ao desvendar os mecanismo narrativos
que dão contorno ao sonho do sonho de Nerval. Para Eco, o leitor precisa se portar
temporais. Pois, os eventos que transcorrem durante o enredo não estão definidos
flashbacks. Gérard de Nerval organiza sua história pelo discurso narrativo, pois
formula a emoção particular de suas lembranças por meio de objetos que têm uma
Bartolomeu, até os seres, são as sombras de sua lembrança. Esta indistinção entre
Esta estratégia de voz apresenta a vida como algo transitório e que não tem um
movimento próprio.
visto também desta forma por Proust, possivelmente, por achar que “não se pode ter
feito com inteligência e gosto uma paisagem e ter imprimido num país aquela
pela força das descrições da paisagem, criando uma falsa ilusão de sensação de
alegria com natureza. Nerval na verdade expõe a Ideia do que foi e do que devia vir
lógico. Ele reflete sobre a impressão que os objetos lhe causam e que, segundo
Schiller (1795-6 p.44), é sinal distintivo do poeta sentimental. Nerval torna possível
nostalgia, mas reflexão de uma Ideia sobre o que é o passado. O sonho se torna
referência de sua força lírica, ao permitir sugestionar-se por ele, concebendo uma
poeta sentimental alcança esta ponta do eterno ao lidar com a realidade enquanto
limite de sua ideia e com a Ideia enquanto infinito. Nerval expressa a sensação que
conclusão de que o momento jamais será superado, daí o Ideal intangível definido
por Schiller. Talvez, uma outra possibilidade para a consideração de Proust sobre
futuro, sobre as quais Schiller refletiu. Entretanto, Nerval é artista sentimental, pois
faz uma meditação sobre o passado e produz comoção, ele convoca o leitor a
“são quatro horas da madrugada”, “meses se passaram”, “os dias seguintes” são
ECO, Umberto. “Os bosques de Loisy”. In: Seis passeios pelos bosques da ficção.
São Paulo, Companhia das Letras, 1997. (Trad. H. Feist). São Paulo, Iluminuras,
1988. (trad. H. Ramanzini)
SILVA, Evaneide Araújo da. Para além da realidade: um conto fantástico de Gérard
de Nerval. Araraquara: Laboratório Editorial, 2009. p.501.
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
São Paulo
2017