A PIA CHEIA DE LOUÇA

(Ronaldo Rodrigues Moises)

Dia desses me peguei meio aborrecido com uma coisa banal, trivial em minha
vida, e, possivelmente, na sua também: a pia cheia de louça para lavar.
Louça é uma coisa que brota fácil não é mesmo? Algo tipo aqueles monstrinhos
Gremlins, que passavam na sessão da tarde. Pois bem, assim como eles, parece que
quanto mais água você bate na louça, mais louça surge, posto que se reproduz
velozmente....
Foi então que comecei a lavar a louça e liguei o rádio em uma emissora
qualquer, entrei no automático e fui lá eu, liga torneira, molha, fecha, ensaboa, abre,
enxagua, desliga a torneira e põe no escorredor....De repente, me chamou atenção uma
música daquelas dos bons tempos quando as letras não eram só sobre bebida, balada, e
pá tim bum, o refrão advertia que o tempo da vida corria rápido e não retrocedia....
Ouvindo o refrão, observei meu filho de seis anos brincando de correr e minha
filha de 7 meses se alimentando e hidratando o cabelo com a comida ao lado de minha
esposa que sorria da cena engraçada....Pensei então: um dia esta pia não terá tantas
panelas, possivelmente só duas sendo uma com pouco sal - para controlar a pressão, e
outra com pouco açúcar por causa do diabetes, um dia a pia só se encherá de louça em
dias festivos quando os netos vierem visitar, um dia, e, em alguns lares a pia há muito já
não está cheia porque para sujar é preciso ter o que comer, me senti envergonhado.
Assim como constatou Mário de Andrade, a bacia de cerejas um dia não terá
tantas cerejas como a pia também não terá tantas louças para se lavar, um dia o colorido
será cinza e neste dia, ah que saudade será lembrar dos dias de louça suja.