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rAçÃo DA :\1n:TE E oo CoRPO

Para todos nós, que ansiamos pt:la longevidade e pelo ~e­


senvolvimento espiritual, este é um livro que revela e explica
com clâreza as antigas teorias taoístas e os métodos de medita-
ção que prolongam a vida e enriquecem a nossa natureza
espiritual.
Vivemos hoje num mundo em que a psicologia e a medici-
na holística se tornaram parte da cultura ocidental. Muitas
pessoas estão começando a entender que a mente e o corpo são
inseparáveis e que se afetam e se condicionam re.ciprocamente.
Tao - Transformação da m ente e do corpo trata de forma
sistemática dos efeitos psicofisiológicos da meditação do ponto
de vista dos mais antigos praticantes das ciências da mente e
do corpo.
Qualquer pessoa que estiver realmente interessada na medi-
tação se beneficiará muito com a leitura deste livro. Seu autor,
Huai-Chin Nan, não limita a sua atenção apenas ao d esenvol-
vimento mental e espiritual, mas esclarece as relações existentes
entre o aprimoramento espiritual e as transformações físicas do
corpo. E discute ainda muitos princípios do Zen, do Budismo
Esotérico e do Taoísmo, revelando fenômenos práticos do inte-
resse de todos os que se dedicam ou pretendem se dedicar
seriamente à meditação.

TAO TRA~S1~oru. \ 1\CAO OA ~IE~l E


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TAO
Transformação da Mente e do Corpo
-
Master Huai-Chin Nan
..
Huai-Chin Nan

TAO
Transformação da Mente e do Corpo

Tradução
ZILDA HUTCHINSON SCHILD

segundo a versão em inglês de


WEN KUAN CHU, Ph. D.

EDITORA PENSAMENTO
São Paulo
Título do original:
Tao & Longevity - Mind-Body Transformation

Copyright © Dr. Wen Kuan Chu


Publicado pela primeira vez nos EUA
por Samuel Weiser, lnc. - York Beach, Ma ine

Capa: Personagem taoísta representado no ver-


so de um espelho da época T'ang.

95-96-97-9&-99

Direitos reservados
EDITORA PENSAMENTO LTDA.
Rua Dr. Mário Vicente, 374 - 04270-000 - São Paulo, SP - Fone: 272 1399
Impresso em nossas oficinas gráficas.
Sumário

Lista das flustrações 7


Prefácio do Tradutor 9
Introdução 11
1 Parte - A Natureza da Meditação 15
l. A Longevidade é Verdadeiramente Possível 17
2. A Meditação 18
3. As Condições Mentais e Físicas Durante a Meditação 20
4. Os Fenômenos Ch'i do Corpo 2 1
5. Posições de Meditação 24
6. O Uso da Mente na Meditação 31
7. Concentração no Orifício Ch 'iao na Meditação Taoísta 34

II Parte - A Natureza e as Reações do Ch 'i 38


8. A Natureza do Ch 'i 41
9. Reações do Ch 'i Durante a Meditação 43
10. Como Abrir o Jen Mai 57
11 . O Jejum e a Função do Ch 'i Central 62
12. Um Ventre Protuberante não é Tao 63
13. O Corpo Humano e a Importância dos pés 64
14. Argumentos Sobre os Canais Oz 'i 65
15. Os Canais Gz'i do Taoísmo e do Budismo 66
16. O que é oMai Central? 75
17. Por que os Canais do Ch'i Vib ram 77
18. O que Acontece Depois que os Canais do Ch 'i se Abrem? 79
19. Motivos da Meditação 80
20. A Teoria de Ozing, Oz 'i e Slzen 8 1
III Parte - O Cultivo de Ching, Ch 'i e Shen 83
21. Sincronização e Estágios da Prática 85
22. O Conceito de 01ing 86
23. Transformação do Chingem Ch'i 90
24. O Cultivo do Ch'i e a Interrupção da Respiração 93
25 . A Maravilha e o Mistério da Respiração 94
26. A Mudança de Temperamento e os Ciclos do Ch 'i 96
27. O Cultivo do Ch '.i e a Tranqüilidade da Mente 97
28. As Três Flores e os Cinco Ch 'i 98 .
29. A Meditação e o Aperfeiçoamento de Shen 101

Apêndice I : OCulti.vodoSamadhi e da Sabedoria Através


do Ch 'an (Zen) 105
Apêndice II: Ch'an (Zen) e Apontando para a Lua 123
Indice Remissivo 133
Lista das li ustra ções
Posição Perfeita de Lótus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Meia·posição de Lótus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
Posição Sentada Numa Cadeira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
Posição de Dormir ... . .. . . . . . . . . . . : . . . . . . . . . . . . . . . . 28
Posição dê Leão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
Posição Imortal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
Posição dos Seis Fomos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Posição de Bodhisattva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Posição de Cavalgar a Garça (1) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Posição de Cavalgar a Garça (2) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Os Sete Chakras e os Três Mai . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
Tu Mai, o Vaso Dirigente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
Jen Mai, o Vaso da Concepção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
Ch 'ong Mai . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
Tai Mai.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
Yang 02 'iao Mai . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
Yin Oi 'iao Mai . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
Yang Wei Mai . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
Yin ~Vei Mai . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
1
Prefácio do Tradutor

Desde criança, sempre me fascinavam as histórias sobre os imortais,


relatadas nos ensinamentos e nos livros taoístas. Eu tinha curiosidade de
saber como uma pessoa podia tornar-se imortal e alcançar a divindade. Li
centenas de livros taoístas, mas sempre ficava com uma complexa sensação
de fascínio, confusão e frustração ao temúnar a leitura. Eles pareciam ter
sido escritos de tal modo que apenas umas raras pessoas podiam entendê-
-los. A desculpa padronizada para o fato era a de que o segredo divino não
devia ser revelado. Eu não sabia dizer quais eram os bons e os maus livros e
não sabia qual, dentre esses muitos autores, era um verdadeiro imortal e
qual um impostor ou uma fraude. Desse modo, continuei na busca do TAO
na tradição taoísta, procurando um mestre legítimo e, afortunadamente,
encontrei o meu mestre em 1961. Ele é o autor deste livro.
Na China, as pessoas habitualmente meditam para conseguir o cres-
cimento espiritual e para melhorar a saúde. Vivi nos Estados Unidos duran-
te muitos anos. Para minha surpresa, as idéias e os métodos das práticas
de meditação ocidental são bastante diferentes daqueles dos chineses. A
mim me parece que a maioria dos americanos apenas medita visando à
evolução espiritual e parece que desejam expandir a consciência ou desen-
volver a percepção extra-sensorial. Quase ninguém, nos Estados Unidos, de·
monstrou que a meditação pode melhorar a saúde das pessoas e curar as
doenças. Embora a cura espiritual seja atualmente bastante popular na
América, os métodos ocidentais são muito diferentes daqueles que os chi-
neses usam.
Segundo as teorias e os m étodos de meditação taoísta, a mente e o
corpo se afetam e se condicionam reciprocamente. O aperfeiçoamento da
mente para o crescimento espiritual deveria ser acompanhado de "um
soerguimento do corpo". Porém, como nenhum dos livros taoistas ensina
como fazer isso, este livro foi escrito para fazê-lo - o primeiro de seu tipo
a aparecer em chinês e em inglês. Ele descreve detalhadamente os fenô-

9
menos e as reações fisiológicas iniciados com a meditação, ignorando a
prática tradicional chinesa do ensino particular. O professor Nan analisa
os termos vagos que aparecem nos livros taoistas e que permaneceram obscu-
ros ao estudante de nível médio, porque os antigos estavam relutantes em
revelar seu simbolismo e em ministrar instruções precisas.
Creio que qualquer pessoa que estiver genuinamente interessada na
meditação se beneficiará bastante com a leitura deste livro. O professor
Nan não limita a sua atenção apenas ao desenvolvimento mental e espiri-
tual, mas esclarece as relações existentes entre o desenvolvimento espiritual
e as transformações físicas do corpo. Ele também discute muitos princí-
pios do Zen, do Budismo esotérico e do Taoísmo, revelando os fenômenos
práticos de interesse para todos os estudantes sérios da meditação.

Wen Kuan Chu


Los Angeles, Califórnia
Setembro de 1983

10
Introdução

Um dos maiores desejos humanos é o da imortalidade. Também os


assuntos pertinentes às origens do universo, às raízes da vida, à transcen-
dência espiritual e à consciência cósmica têm sido procurados com intensa
curiosidade. Um grande número de conceitos religiosos importantes são
baseados nisso. Por exemplo, o céu, o País puro de Buda, o Shangri-Lá
e o país dos grandes imortais, todos sugerem a possibilidade do aperfei-
çoamento espiritual além do reino dos. desejos mundanos.
Nossa curiosidade sobre a natureza da vida, a inclinação de procurar
o conhecimento de suas origens essenciais e a tendência de desejar a imor-
talidade formam a base de algumas escolas não-religiosas de pensamento.
As técnicas da yoga praticadas tradicionalmente na fodia e os métodos de
meditação praticados no estilo ancestral da Chlna são métodos diferentes
de aperfeiçoamento, contudo são baseados num corpo único de conhecimen-
to. Ambos recomendam, por exemplo, que se comece a cultivar e a apri-
morar o corpo e o espírito durante esta vida. Além disso, ambos os méto-
dos abrangem a prática de técnicas que possibilitam à pessoa transcender
os limites do mundo material, atingir a vida eterna e esclarecer os mis-
térios da vida. Esses ensinamentos, de muitos modos, são semelhantes aos
ensinamentos religiosos; porém, essas escolas não são religiões. Dessa for-
ma, quem decidir praticar essas técnicas não precisa abandonar nenhuma
de suas crenças, nem precisa aderir ou se posicionar no que diz respeito
a alguma crença adicional para poder iniciá-las.
Há séculos, um grande número de livros sobre a imortalidade tem
sido escrito e cuidadosamente estudado. Quem é, porém, um verdadeiro
imortal? Já que, às vezes, parece irrazoável a expectativa de se viver uma
longa vida, não é de todo desarrazoado suspeitar-se que a teoria da imor-
talidade é baseada numa mentira. Esse tipo de suspeita não é meramente
recente. Alguns dos antigos aparentemente nutriam dúvidas muito serne-

11
lhantes. Por exemplo, Chi Kang, um dos sete homens sábios da alameda
dos bambus, desenvolveu uma teoria do sistema em que ele tentou provar
racionalmente que a imortalidade podia ser alcançada. Uma vez que Chi
Kang viveu e escreveu durante a dinastia Chin, parece que deve ter desen-
volvido a sua teoria numa tentativa de demonstrar a veracidade da teoria
da imortalidade para os homens que viviam naquela época.
Chi Kang argumentou que seguir um sistema para obter a imorta-
lidade é apropriado desde que o caminho da imortalidade nos permite
transcender a materialidade e atingir a divindade. Embora não estejamos
em condições nem de confirmar, nem de negar a suposição de Chi Kang
de que o seu sistema conduz à transcendência espiritual, em última análise,
não podemos negar que seguir o caminho da imortalidade é extremamente
útil. Uma vez que seguir um sistema desse tipo prova ser de considerável
ajuda para todos aqueles envolvidos nas artes médicas chinesas, bem como
para os engajados na moderna psicanálise, na terapia física e nas práticas
holísticas de saúde, vale a pena promovê-lo.
Uma teoria que foi transmitida de uma geração para outra, durante
milhares de anos, deve certamente ter alguma validade. Apesar de a teoria
da imortalidade não ser de fácil compreensão, não estamos autorizados a
acreditar que ela seja um simples contra-senso. Em vez disso, deveríamos
tentar descobrir por que essa teoria parece ser tão incompreensível. Existe
uma porção de fatores que contribuem para a nossa dificuldade inicial.
Primeiro, ainda que os antigos não fossem tolos, há muitas diferenças en-
tre os métodos de ensino que eles usavam então e aqueles que estamos
acostumados hoje. Segundo, o número de pessoas que investigaram a imor-
talidade em profundidade pode ser contado nos dedos, uma vez que este
tipo de pesquisa requer um esforço estupendo e a habilidade de trabalhar
sozinho. Cultivar a imortalidade não é como aperfeiçoar um esquema sim-
ples para enriquecer em pouco tempo. Os que se dedicam à prática cons-
tante do aperfeiçoamento do corpo e da mente se beneficiarão com os
seus espantosos efeitos de autocura, ao passo que os que o praticam ape-
nas em situações de emergência, não obterão tal benefício.
Segundo a teoria da "questão original", quem desejar explorar os
mistérios e transcender o mundo deverá ter um dom natural para aprender
a imortalidade. Durante a dinastia Ching, Chao 1 escreveu o seguinte poe-
ma: "Eu tinha dificuldade em escrever poesia. Quando eu era jovem, pen-
sei que fosse por que era inculto e ainda não tinha aperfeiçoado a minha
arte. Fiquei muito velho antes de compreender que isso não se obtém uni-
camente com trabalho árduo. Três décimos dependem do esforço humano,
porém o resto depende do céu." A poesia é um pequeno Tao da literatura,
mas alguns dos reveses que temos de suportar para atingi-lo são descritos

12
no poema de Chao 1. É muito difícil alguém mudar seu temperamento
em pouco tempo e dessa maneira obter a maravilha do Tao.
Desejo agradecer aos meus alunos por me fazerem perguntas e pro-
porem problemas sobre a meditação durante anos. Espero que este livro aju-
de a responder algumas questões e a corrigir algumas práticas indesejáveis de
meditação. Também espero esclarecer alguns dos pontos abstrusos e con-
ceitos obscuros que aparecem nas Tan Surras sobre a imortalidade. Embora
os antigos relutassem em dar uma explicação direta e completa, espero que
este esboço preliminar da minha pesquisa não só seja útil para os que es-
tiverem interessados no desenvolvimento de um sistema, mas também que
seja um passo inicial para novas pesquisas nos caminhos do Tao ísmo.
Neste contexto, a expressão "passo inicial" é uma curiosa escolha de
palavras e não foi usada como conseqüência da modéstia. Este livro não
contém uma análise profunda da teoria taoísta da imortalidade, porém
descreve algumas das transformações fisiológicas e psicológicas que ocor-
rem naturalmente durante a prática adequada de meditação.

Taipei, 1973

13
Sobre o Autor

O autor, Huai-Chin Nan, desde a juventude, buscou a origem e a solu-


ção da vida e do universo. Viajou por toda a China e o Tibete à procura da
verdade, e herdou o Dharma do Zen, do Taoísmo e do Budismo esotérico.
Para aperfeiçoar e analisar estas doutrinas, ele se retirou à solidão das mon-
tanhas Ornei, na província de Szechwan, durante três anos e em seguida
passou alguns anos nas montanhas Lu, na província de Chiang Hsi. Viveu
mais da metade de sua vida como um eremita; também lecionou filosofia
nas universidades. Seus conhe.cimentos são numerosos e vasta é a sua sabe-
doria. Escreveu muitos livros sobre Zen, Budismo, Taoísmo e Confucio-
nismo.

O Tradutor

Wen-Kuan Chu foi educado tanto no Oriente corno no Ocidente.


Estudou 0 Confucionismo, o Budismo e o Taoísmo no Oriente durante
muitos anos. Seu interesse pela ciência levou-o aos Estados Unidos, onde
doutorou-se em Ciência do Solo, na Universidade da Califórnia, em Ber-
keley. .
O dr. Chu devotou a vida à ciência e é versado tanto nas teorias an-
tigas como nas modernas. Seu objetivo de vida é integrar esses dois tipos
de conhecimento, por acreditar que a sua integração levará à percepção
de outras dimensões e promoverá o desenvolvimento de uma nova reali-
dade humana.

Nota sobre a Tradução

A palavra Zen foi usada em todo o texto, uma vez que é um termo
familiar para a maioria dos leitores ocidentais. Eu deveria mencionar que
Zen é, na verdade, uma palavra japonesa e que Ch 'an é a tradução chinesa
correta dessa palavra. Os leitores devem entender que esses são termos
permutáveis.

14
1Parte
A Natureza da Meditação
1. A Longevidade é Verdadeiramente Possível

Muitas pessoas têm reiteradamente perguntado: "A longevidade é


verdadeiramente possível? Pode-se atingir a imortalidade?" Quando as pes-
soas fazem essas perguntas, às vezes eu indago: "Vocês algumas vezes viram
realmente um homem longevo ou imortal?" A resposta é sempre que ou-
viram alguém dizer que em alguma parte existe uma pessoa que já viveu
por algumas centenas de anos. Eles freqüentemente mencionam Kuang
Cheng Tze, na montanha de Ornei, e Hsu Che, na montanha de Ching
Cheng, que ainda estão vivos depois de milhares de anos. Porém, absolu-
tamente ninguém afirma que pode convidar algum desses famosos imortais
para vir se encontrar com as pessoas.
Em outras ocasiões, quando me fazem essas perguntas, eu indago:
"Vocês pensam que a meditação em si mesma é a prática do Tao?" O que
é Tao?" "Como vocês podem cultivá-lo?" e "Por que vocês desejam pra-
ticar o Tao e a meditação?" Quase a metade das pessoas responde que
quer ser longeva e deseja evitar as doenças.
Muitas pessoas estão ansiosas para conhecer a meditação e a prática
do Tao. Desejam saber como abrir os canais eh 'i, os vasos da concepção,
os vasos dirigentes e os oito meridianos suplementares. Elas também que-
rem saber sobre os três condutos eh 'i e os sete chakras da yoga e do Bu-
dismo esotérico. Geralmente se esquecem dos princípios mais elevados ou
da base da teoria filosófica que está por trás da prática do Tao e da aber-
tura dos canais eh 'i para a longevidade. Se alguém praticar o Tao para
obter a longevidade pessoal, essa será a maior demonstração do egoísmo
existente na natureza humana.
Se a abertura do canal eh 'i no corpo é o resultado do Tao, então esse
Tao ainda é o cristal do materialismo. O Tao é mente ou é matéria? Muitas
pessoas não pensam profundamente a respeito.
Isso significa que não existe a possibilidade da longevidade? Não!
Em primeiro lugar, temos de entender dois pontos importantes. 1) A lon-
gevidade consiste em manter-se a saúde, em retardar o processo de enve-

17
lhecimento, em viver sem doença e sofrimento, e em morrer em paz sem
preocupar as outras pessoas. 2) A imortalidade não significa a longevida-
de física indefinida; ela indica a vida espiritual eterna. O que queremos di-
zer com "a vida espiritual" neste contexto? Ela está além da mente e da
matéria e é o primitivo início da vida..
As funções e os fenômenos da vida espiritual se manifestam no corpo
físico e na consciência. Sua natureza é muito complicada e será discutida
nos próximos capítulos. Desde a antiguidade, a derradeira meta de todas
as religiões é a busca e o retomo a uma vida espiritual eterna. Devido às
diferenças de lrnguas e de culturas, o significado de "vida espiritual" tem
sido expresso de maneiras diversas.
Se o Tao pode ser cultivado, a longevidade é realmente possível?
Eu ousaria dizer que o Tao pode ser cultivado e que a longevidade é pos-
sível. Entretanto, é necessário compreender que não se t~ata ~e um empre-
endimento meramente terreno, uma vez que envolve o ir alem das coisas
do mundo. Se alguém deseja satisfazer seus desejos mundanos e obter a
imortalidade, seus esforços serão baldados.
Há a velha história de um homem famoso que ocupava uma alta
posição no Governo e que ouviu falar sobre um taoísta que vivera mais d
duzentos anos e que ainda parecia jovem. Perguntado sobre o seu segredoe
o taoísta respondeu: "Eu nunca me aproximei de uma mulher." o oficial
ficou desapontado, exclamando: "Então, de que adianta cultivar o Tao?"
Além do desejo sexual, os homens têm outros desejos; um deles é
o desejo da imortalidade. A busca da imortalidade, embora seja um dos
mais elevados desejos humanos, constitui o maior obstáculo ao desenvol-
vimento espiritual. Uma pessoa cornwn tem de desistir de empenhar-se
em muitos campos para especializar-se nwn campo determinado. Isto é
especialmente verdadeiro quando alguém deseja se tomar imortal.
O Sutra Yin Fu do Taoísmo diz: "Acabe com um motivo de ganho
ou proveito e a eficiência de um exército pode ser aumentada dez vezes."
Da mesma forma como um indivíduo que perdeu a visão desenvolve 0
sentido da audição, enquanto a pessoa não desistir de seus desejos mun-
danos não lhe será possível conseguir a imortalidade.

2. A Meditação

Na maneira chinesa de falar, a meditação - taoista e confucionista _


consiste em "sentar-se em silêncio". Muito embora "em silêncio" seja
o método principal da meditação, há cerca de noventa e seis posições,
cujo propósito fundamental é facilitar a obtenção da "tranqüilidade".

18
. A tran~üilidade e a ação são termos relativos, e no sentido geral in-
dicam os dois lados opostos dos fenômenos físicos da natureza. Em es-
cala menor, indicam repouso e movimento - dois estados opostos dos
hwnanos. O Tao não é movimento ou tranqüilidade; o movimento e a
tranqüilidade, cada um deles é função do Tao. O Tao está contido num
movimento e está contido no silêncio. Em outras palavras, o Tao está no
~ovimento e no repouso. Por essa razão, se alguém considerar a tranqüi-
lidade como o Tao, terá wn conceito incompleto.
A tranqüilidade é básica para cuidar do corpo e é o fundamento da
meditação. Quando se cuida do corpo, a saúde e a longevidade (a fonte
de energia de toda vida) são desenvolvidos nwn estado de tranqüilidade.
O crescimento dos animais e das plantas se realiza da mesma maneira. Os
humanos necessitam de repouso depois da ação. Dormir é um modo de
descansar e o descanso adequado regenera as forças vitais.
Com muita propriedade, Lao Tsé disse: "Todas as coisas retomam
às suas raízes. O retomo às raízes é denominado tranqüilidade e é chamado
de regeneração da vida."·Aiém disso, ele afirmou: "A tranqüilidade é o
meio de dominar os efeitos da azáfama excessiva." Em A grande doutri-
na, um dos Quatro Livros, está dito: "Se alguém sabe como cessar os pen-
samentos, então há concentração; concentrando-se pode-se 'chegar à tran-
qüilidade'; por meio da tranqüilidade, pode-se ·obter a paz; com a paz se
alcança a sabedoria e com a sabedoria pode-se ter o Tao." Os princípios
descritos no Sutra da tranqüilidade evidente do Taoísmo também são ex-
traídos da observação e da imitação da natureza. No ulterior estágio do
Budismo chinês, dlzyana é traduzido por pensamento tranqüilo.
A tranqüilidade é a estufa para cultivar a sabedoria "pré-celeste" ou
o desenvolvimento espiritual. O conhecimento simples é obtido usando-se
o cérebro durante a "ulterior vida celeste". A sabedoria (prajna) é atin-
gida no estado de quietude, quando se obtém a visão interior ou se fica ilu-
minado. No Budismo, a disciplina, samadhi, e a sabedoria são as três ma-
neiras de atingir a Anasrava, ou o não-gotejar, o não-vazar ou o não-fluir.
A suposição budista é a de que o samadhi está no centro e prepara a pessoa
para atingir o prajna..
A tranqüilidade é simplesmente a tranqüilidade. Portanto, se alguém
usar a mente para buscar a tranqüilidade, isto é, se aplicar métodos para
procurá-la, essa pessoa perturbará a tranqüilidade com a sua atividade men-
tal. No Zen-budismo, um mestre pode dizer: "A sua mente está ocupada
agora, então vá descansar." Os estados físicos e mentais comuns são cer-
tamente estados ativos. Esses estados mentais incluem a consciência, o
pensamento, a percepção, a sensação, a emoção, etc., e são incessantes.

19
Considerem os estados físicos. A cada momento têm-se todos os
tipos de sensações: a circulação sangüínea, as sensações nervosas, a inspi-
ração e a expiração. A meditação, especialmente se alguém tiver alguma
doença latente, causará vibrações, calafrios, febre ou sensações de calor,
congestão, tumefações, pruridos, etc. Essas sensações são mais fortes quan-
do se está em repouso do que quando não se está. Assim como a árvore
quer se aquietar quando o vento não quer parar, a mente das pessoas se
toma mais ativa quando elas desejam ficar quietas. Os principiantes, por
esse motivo, freqüentemente se deparam com pensamentos caóticos. Al-
gumas vezes ficam até mesmo mais instáveis, perplexos e aborrecidos do
que quando não estão envolvidos com a meditação. Conseqüentemente,
eles podem pensar que não deviam meditar. Ora, influenciados pelas len-
das clúnesas e pelas novelas cavalheirescas, que muitas vezes mencionam
a geração de poderes através da meditação, os principiantes, às vezes, fi-
cam receosos de serem derrubados nos caminhos perigosos. Esses receios
verdadeiramente surgem de mal-entendidos.

3. As Condições Mentais e Físicas


Durante a Meditação
Existem muitas razões pelas quais as pessoas desejam meditar.
Alguns meditam para obter saúde e vida longa; outras, para obter uma vida
longa sem envelhecer. Outras, ainda, meditam como um meio de aperfei-
çoar o Tao e de cuidar do corpo. Há problemas físicos e mentais que sur-
gem durante a meditação. Os problemas mentais serão discutidos em pri-
meiro lugar.
Acreditava-se que o objetivo e o propósito da meditação surgiam da
mente. O conceito de mente abrange o moderno conceito de cérebro
consciência e pensamento. Apesar de esta mente pretender chegar ao si'.
lêncio através da meditação, seus primeiros esforços são constantemente
inundados com pensamentos inquietantes. Isso é verdadeiro, porque as
pessoas não têm consciência de que as suas mentes estão sempre cheias
de pensamentos, desde a manhã até a noite, do n ascimento até a morte,
como uma cachoeira que não pára de fluir. Entretanto, quando a pessoa
começa a meditar, como conseqüência do estado relativamente tranqüi-
lo que surge, ela compreende a natureza incessante e caótica dos seus pen-
samentos. Esse é, na verdade, o primeiro efeito da m editação.
Quando um copo de água está turvo, não se observa a poeira que há
nele. Porém, se um agen te purificador for adicionado quando a água está
parada, a poeira pode ser observada sedimentando-se no fundo. A poeira

20
não é produzida porque o copo de água se encontra num estado de repou-
so; ela estava lá o tempo todo. Apenas nesse estado de repouso é desco-
berta a presença da poeira. Da mesma forma, não vemos habitualmente
~ poeira no quarto, a não ser que um raio de sol atravesse de repente as
Janelas, o que possibilita ver a poeira circulando no ar, em toda a parte.
Embora observemos a poeira da mente na meditação, não é preciso
removê-la por qualquer método específico. Simplesmente permanecendo-
-se tranqüilo, não se agitando nem se movimentando e, portanto, nem au-
mentando nem diminuindo, essa poeira mental naturalmente cessará de cir-
cular ao redor.
O segundo problema que pode aparecer é a pessoa se tomar sono-
lenta cada vez que está numa condição de relativa tranqüilidade, podendo
adormecer inconscientemente. Se isso acontecer, ela deve examinar cuida-
dosamente se a sua condição de sono é de fadiga mental ou física. Se for
assim, deverá ir dormir imediatamente. Depois de um sono suficiente,
com a vitalidade renovada, deverá meditar outra vez. Se achar, entretanto,
que não existe fadiga no corpo ou na mente, é melhor levantar-se e fazer
um pouco de exercício. O espírito assim desperto ficará em condições de
manter um apropriado e estável estado de quietude.

4. Os Fenômenos Ch'i do Corpo

A ancestral ciência médica oriental e a feitiçaria têm as mesmas


origens; a medicina clúnesa não é uma exceção. Há cerca de três mil anos,
durante as dinastias de Chou e Chin, os praticantes das artes médicas chi-
nesas se voltaram das práticas do curandeirismo e do xamanismo para os
métodos e a tecnologia do Taoísmo. A ciência médica chinesa, a tecnologia
taoísta e os métodos da yoga hindu reconhecem que a fonte da vida hu-
mana está na infinita armazenagem do eh 'i, a potencial energia latente que
existe dentro do corpo. Nos seculares sutras taoístas, o primitivo ideogra-
ma .& , é usado para representar o eh 'i. Se desmembrarmos esse ideo-
grama,-'é. o antigo ideograma para ~ , significa nenhum. O ··· ·tem o
mesmo significado que ~ , fogo. Em outras palavras, eh 'i, .J.: ,
significa
sem fogo. O que se quer dizer com fogo? Os desejos sexuais, os afetos e
as atrações carregados de luxúria, os pensamentos inquietos e movimenta-
dos e uma mente descuidada são todos sugeridos pelo fogo. Sem esse fogo,
facilmente avivado e que tudo consome, estaríamos repletos de vitalidade.
Na medicina chinesa, o fogo que se movimenta intranqüilamente é chama-
do de fogo secundário, ao passo que o fogo na posição correta e na con-
dição apropriada é conhecido por fogo dominante. Quando alguém tem

21
o fogo dominante e está cheio de energia potencial, o eh 'i latente pode ser
então induzido.
Os termos energia latente, kundalini, etc. são bem conhecidos na
yoga, no Budismo esotérico e no Taoísmo. Entretanto, muitos dos que se
empenham nessas práticas interpretam mal a natureza dessa energia laten-
te, ou kundalini, e por essa razão podem morrer de pressão alta, de conges-
tão cerebral ou de psicoses senis tais como a esquizofrenia. Eles não sa-
bem que a assim chamada kundalini é o mais quente fenômeno do Dhar-
ma térmico, que no Budismo é o primeiro estágio de catus-kusala-mula
(as quatro boas raízes da fruta primaveril ou as fontes do desenvolvimen-
to). ~ fácil confundir a sensação de calor ou de tepidez em volta do baixo-
-ventre ou do períneo com o despertar da kundalini. Este é muitas vezes
um fogo prejudicial, em vez de um legítimo despertar da energia latente.
Os antigos chineses mediram o tempo pelo movimento do Sol e da
Lua e dividiram o dia em doze horas. Cada hora chinesa é dupla e equivale
a duas horas de sessenta minutos. As doze horas chinesas duplas correspon-
dem aos doze meridianos, isto é, os canais através dos quais flui a energia
vital do corpo vivo. A prática da acupuntura é baseada no principio de que 0
eh 'i (ou a energia vital) está fluindo através de um canal específico durante
cada hora dupla.
Os doze meridianos são importantes para a ciência médica ; contudo
existem condutos eh 'i adicionais que não estão incluídos entre esses doz;
e que são importantes no Taoísmo. Isso envolve os chi ching pa mai
ou os oito meridianos suplementares, que são o TuMai, o Jen Mai, 0 Ch 'on~
0
Mai, o Tai Mai, o Yang Wei, o Yin Wei, o Yang 01 'iao e o Yin 01 'iao.
Chuang Tze menciona as correlações entre o Tu Mai e o corpo hu-
mano. Este Tu Mai corresponde à medula espinhal do sistema nervoso cen-
tral. O Jen Mai corresponde ao sistema nervoso vegetativo e aos órgãos
viscerais. O Tai Mai corresponde ao sistema nervoso temperamental. o
Yang Wei e o Yin Wei têm uma futima afinidade com os sistemas nervo-
sos do cérebro, do cerebelo e do diencéfalo. 1 O Yang 01 'iao e Yin Ch 'iao
correspondem ao sistema nervoso genital, incluindo a glândula da prós-
tata e as funções nervosas das mãos e dos pés. f difícil definir o Ch 'ong
Mai, porém podemos dizer que ele flui em algum lugar entre o sistema
nervoso central e o vegetativo, embora não possua uma posição ou um or-
denamento fixos. Começa entre os testículos e o pênis de um homem e

1
Diencéfalo é um termo moderno. Os antigos não conheciam a anatomia neurológi-
ca; por essa razão, esse termo não será usado novamente. O leitor deverá entender co-
mo "centro da cabeça" ou o "topo da cabeça", que é realm ente a mais correta tradução.

22
entre a vagina e o útero de uma mulher. Aflui para cima a fim de passar
pelo estômago e o coração, e flui em seguida na direção do centrÓ da ca·
beça. Somente uma pessoa que abre alguns condutos eh 'i e verdadeiramen-
te experimenta a circulação do eh 'i ficará convencida de que o eh 'i e seus
canais são reais. 2

Tan Tien e os Chakras


No Budismo esotérico e na yoga indiana, supõe-se que há três canais
eh 'i e sete chakras. Os três canais eh 'i são os canais esquerdo, direito e cen-
tral, localizados no tronco do corpo humano. Os sete chakras correspon-
dem ao plexo nervoso principal do corpo humano. No Taoísmo, por ou-
tro lado, acredita-se que existem os canais eh 'i frontal (Jen Mai), posterior
(Tu Mai) e central (Oz'ong Mai) no tronco do corpo humano. Também
existe a teoria taoísta do Tan Tien superior, central e inferior. O Tan
Tien e os chakras são diferentes, embora exerçam funções e efeitos simi·
lares.
O Tan Tien superior está situado no centro da cabeça, atrás do pon-
to entre as sobrancelhas. O Tan Tien central está localizado num ponto
que divide o tórax, entre. os mamilos. O Tan Tien inferior fica a aproxima-
damente quatro dedos abaixo do umbigo. 3
Tan significa pílula da imortalidade; Tien quer dizer campo. Isso,
como às vezes se acredita, não quer dizer que se possa divisar dentro do
Tan Tien uma pílula, um elixir ou decacção que confiram a imortalidade.
Se possível criar uma puula da imortalidade no Tan Tien, isso seria antes
um progresso maligno que uma coisa benéfica.
Na yoga, os chakras são agora considerados como o plexo nervoso
principal. Acredita-se que o importante plexo nervoso, que vai do centro
da cabeça até o períneo, são os clzakras, porém isso é difícil de confirmar.
O fato é que os chakras e o plexo nervoso estão intimamente relacionados.

A Meditação e os Canais Ch'i


Durante a meditacão tornamo-nos mentalmente mais quietos e os
pensamentos diminuem 'ou cessam. A circulação sangüínea torna-se mais
lenta, e, desta forma, diminui a carga do coraçlio. Quando se medita numa
posição correta, sem consumir energia através da ação, a secreção endócri-

2 Não fui treinado na medicina ocidental e os termos médicos usados aqui em co-

nexão com o eh 'i são baseados no conhecimento que adquiri com a experiência e com
minhas próprias pesquisas.
3 Há um outro ponto taoísta chamado Clzong Kung {cujo significado literal é palácio
central), que está localizado entre o estôm ago e o diafragma.

23
na da glândula pituitária é uruformemente distribuída, criando gradual-
mente a sensação de se estar cheio de eh 'i. As sensações mais perceptíveis
ocorrem no sistema nervoso central, no fim da medula espinhal e nos rins,
e pode-se sentir tensão ou inchação nesses lugares. O eh 'i avança gradati-
vamente desses lugares, originando uma sensação serpeante à medida que
se move através do canal eh 'i.
Isso mostra o que ocorre no caso de uma pessoa normal, de nível
médio. Entretanto, se alguém tiver uma doença, ou tiver alguma doença
latente, ou se for mais saudável ou mais forte que uma pessoa comum
os efeitos serã:o diferentes. Cada pessoa tem condições mentais e físic~
diferentes, e, por essa razão, notará fenômenos diferentes. Uma regra não
pode ser aplicada a todos.
Na procura da tranqüilidade durante a meditação, as funções mentais
e físicas podem ser classificadas em duas partes: consciência e sensação ou
sentimento. A consciência inclui os pensamentos, as imagens, etc. o sen-
timento inclui as emoções, as sensações físicas e a circulação do e/z 'i. Am-
bas, consciência e sentimentos, são, na realidade, movimentos da mente
Quando o eh 'i começa a se rn_~>Ver, ~ maioria das pessoas se con~
centra subconscientemente na sensaçao da cuculação do elz 'i e este se to .
na mais forte. Nesse caso, o mo~en~o ~o eh 'i é ~er~urbado pela forçra
mental da pessoa, causando decepçao, ilusoes, associaçoes de idéias, esta-
dos mentais caóticos, etc. Algumas pessoas podem até supor inge nua.
mente que já abriram o canal eh 'i. Outras, por causa das ilusões causadas
pela atenção concentrada, enrijecem os nervos e se tomam mental e fisi-
camente doentes.
A meditação não enlouquece o homem. Todavia, o mau entendi-
mento originado da ignorância dos princípios da meditação pode causar
estados mentais incomuns e perturbar a tranqüilidade da meditação.

5. Posições de Meditação

O Confucionismo, o Budismo e o Taoísmo ensinam, desde a Anti-


guidade, noventa e seis tipos de posições de meditação, inclusive algumas
posições para dormir. A mais conhecida do Budismo é a de cruzar as per-
nas em meia posição de lótus, ou na posição perfeita de lótus.
Depois da dinastia Sung, os racionalistas começaram com seus pró·
prios métodos de meditação, que eram influenciados pelo Budismo e pelo
Taoísmo. Ch'eng Ming Tao promoveu a idéia de que se deveria cultivar a
própria natureza e a metafísica na quietude. Seu irmão, Cheng I Ch'uan,
adicionou o método de "Chung Ching" (limpar a mente através de uma

24
atitude séria). Desde então, os confucionistas praticaram a meditação sim-
plesmente sentando-se seriamente numa cadeira com as mãos nos joelhos.
O Taoísmo usa as posições de lótus e de descanso. Dependendo das
necessidades físicas e do aperfeiçoamento do canal ch'i, algumas posições
diferentes algumas vezes são usadas.

A Posição de Lótus
A posição de lótus também é chamada de método dos sete ramos
sentados, porque ela envolve sete pontos-chave do corpo.
1) Cruze ambas as pernas (posição de lótus). Se não puder fazê-lo,
então cruze uma perna, ou a perna direita sobre a esquerda, ou a perna
esquerda sobre a direita. Se não puder nem mesmo fazer um meio-lótus,
cruze as pernas à maneira dos alfaiates.
2) A cabeça, o pescoço e a espinha devem ser mantidos na vertical,
numa linha reta. Se a pessoa estiver doente ou fraca, não deve tentar .fi.
car absolutamente ereta com muito esforço.

Figura 5.1
Posição Perfeita de Lótus

25
3) Descanse a mão direita sobre a mão esquerda, palmas para cima,
com a ponta dos polegares se tocando, e descanse-as no colo. Isto se chama
o sinal samadhi.
4) Mantenha os ombros eretos, sem tensão; não deixe os ombros
pender ou cair para a frente.
5) Endireite a cabeça, puxe o queixo para trás, a fun de fazer um
pouco de pressã:o nas duas grandes artérias (esquerda e direita).
6) Abra ligeiramente os olhos, olhando sem ver. Fixe a vista mais ou
menos a uns dois metros adiante, ou mais ·além. Para os que usam mui-
to os olhos, é melhor fechá-los primeiro, na meditação.
7) Coloque a língua na glândula salivar da gengiva do incisivo. Esta é
a maneira como dorme um bebê que nã:o tem dentes.

Instruções e Posições Adicionais


1) Relaxe o corpo, o cérebro e os nervos. Relaxe também os mús.
·culos, de forma que não haja qualquer tensão. Sorria um pouco, porque os
nervos de uma pessoa se tranqüilizam ao sorrir.

Figura 5.2
Perna direita Meia·posição de Lótus Perna esquerda
sobre a perna esquerda sobre a perna direita

26
2) Os principiantes não devem meditar logo depois das refeições,
pois pode causar indigestão. Também n:ro medite quando sentir fome;
isso poderia atrapalhar a meditação.
3) Um pouco de ventilação é desejável, porém não se deve deixar o
vento soprar diretamente no corpo.
4) Não medite em lugar escuro, o que pode levá-lo a adormecer.
Também não medite sob luz forte; a conseqüência seria a de poder ficar
sob tensão.
S) Os principiantes não devem tentar meditar durante muito tempo;
de preferência, devem meditar por pouco tempo e com maior freqüência.
6) Deve ser usada uma almofada, com sua altura ajustada individual-
mente. A regra é sentir-se confortável. Uma almofada muito alta ou muito
baixa pode provqcar tensão. A firmeza da almofada também deve ser es-
coUúda tendo em vista o conforto.
7) Quando estiver frio, use um cobertor para manter os joelhos e o
pescoço quentes. Caso contrário, você pegará um resfriado e não há re-
médio para curar essa doença. Isso é importante.
8) Quando terminar a meditação, pode usar as palmas das mãos
para massagear a face e os pés antes de se levantar. Também é benéfico
fazer algum exercício adequado depois da meditação.
Se não puder assumir a posição de meio-lótus, ou se os seus pés ador-
mecerem quando estiver meditando nessa posição e desejar prosseguir na
meditação, troque para uma das posições indicadas nas figuras 5.3 a 5.10.

Figura 5.3
Posição Sentada Numa Cadeira
27
Figura 5.4
Posição de Dormir

Figura 5.5 Figura 5.6


Posição d o Leão Posição Imortal
Figura 5. 7 Figura 5.8
Posição dos Seis Fornos Posição de Bodhisattva

Figura 5.9 Figura 5.10


Posição de Cavalgar a Garfa Posição de Cavalgar a Garça
Posições da Mão - Mudras ou Gestos
Em geral, a medula espinhal é o centro do sistema nervoso do corpo
humano, com os nervos interligados distribuídos para a esquerda e para a
direita. Eles se assemelham um pouco aos galhos de uma árvore distribuí-
dos ao longo de um tronco central.
A posição· de lótus (sete ramos) cruza e interliga as mãos e os pés.
Ela produz o efeito de transmitir o ch'i da esquerda para a direita e da direita
para a esquerda, em seguida fazendo-a voltar ao centro. Em outras pala-
vras, a energia do lado esquerdo (yang) e do lado direito (yin) podem co-
murucar-se. Isso, portanto, diminui a dispersão de energia; cada lado tem
a função de se ajustar ao outro e de recobrar a primitiva vitalidade.
Nessa posição, as mãos e os pés também estão em repouso, o que
diminui a sobrecarga do coração. As funções do coração se recobrarão
portanto, quanto maior for o tempo que se despender meditando. '

Efeitos Sobre a Saúde - A Cabeça


Na posição de lótus, a cabeça está na posição adequada, o cérebro
está ligeiramente para trás, de modo que a glândula pituitária não será
comprirlÚda e será capaz de restabelecer sua função nonnal. A secreção
uruforme da glândula pituitária restabelecerá então as funções normais
da glândula tiróide, dos nodos linfáticos e das glândulas supra-renais. Em
seguida, o queixo é puxado um pouco para trás, para exercer uma leve
pressão sobre as duas grandes artérias. Por essa razão, o bombeamento do
sangue para o cérebro é mais lento. Isso permite que a tensão nervosa di-
minua e impede o curso insensato do pensamento. Essa p osição também
é importante na normalização da pressão arterial do sangue.

Efeitos Sobre a Saúde - As Pernas Cruzadas


Algumas pessoas temem que cruzar as pernas durante a meditacão
não apenas constitua um risco para a saúde, porém que a pressão sobr; os
vasos sangüíneos das pernas possa causar uma doença séria como a flebi-
te, etc. Por essa razão, um formigamento ou adonnecimento desagradável
das pernas durante a meditação faz com que essas pessoas fiquem apreen-
sivas. Trata-se de um mal-entendido. Na verdade, a saúde tem um impor-
tante relacionamento com as pernas e os pés. (Por exemplo, uma condição
tóxica do organismo pode muito bem ser um fator contribuinte para a
flebite das pernas.) Uma antiga teoria médica taoísta chinesa afirma que
"a 'vitalidade é gerada nas solas dos pés", o que é verdade. A saúde e a vida
longa de uma pessoa tem uma relação direta com a condição de seus pés
e pernas. Os bebês e as crianças pequenas movem constantemente os pés
e pernas. Depois da meia-idade, sente-se menos força abaixo da cintura

30
e aprecia-se levantar os pés, quando sentados. A degeneração e a morte
usualmente se originam nos pés e nas pernas, e se movem gradativamente
para cima, para o tronco e a cabeça. Se as nossas pernas ficam desconfortá-
veis e pesadas e adormecem durante a meditação na posição de pernas cru-
zadas, significa que temos problemas latentes de saúde e que os vasos ner-
vosos e sangüíneos das pernas não estão em boas condições (ver p. 44).
Depois de libertar as pernas e de esperar até que o torpor e o fonni-
garnen to decresçam ou enfraqueçam, sente-se um tipo de euforia nunca an-
tes experimentado. Se você puder persistir na meditação até que seu
eh 'i e seu sangue fluam livremente para as pernas, você terá um forte or-
gasmo interno, dos seus pés e pernas até a sua cintura e cost as, e mesmo
através de todo o seu corpo. Pode ter certeza disso. Nesse momento, você
não desejará livrar as suas pernas e cessar prematuramente a sua meditação.
O corpo humano pode ser comparado a uma árvore. Uma árvore
mergulha as raízes curvadas na terra. Com a luz do Sol, com o ar e com a
nutrição do solo, ela se mantém em crescimento. O homem, por outro
lado, tem as raízes na cabeça. O seu solo está no espaço. Os pés do homem são
como os gallios do ginseng. Cruzar as pernas é, pois, equivalente a dobrar
os ramos do ginseng ou de um pinheiro, cujos ramos curvados se formam
em n ós de modo que a sua força de crescimento não se disperse para fora .
Ela pode, pois, retomar à sua fonte para o aperfeiçoamento e, conseqüen-
temente, tomar-se mais forte.
Cruzar as pernas não prejudica a saúde. Na realidade, se praticannos
corretamente, isso ajudará a nossa saúde e longevidade.

6 . O Uso da Mente na Meditação

Em geral, setenta por cento das pessoas que aprendem a meditar o


fazem por razões de saúde e para obter uma vida longa. Para esses propô·
sitos, a meditação não precisa ser difícil. Vinte por cento estudam a me·
ditação por curiosidade ou porque estão em busca de algo maravilhoso e
sutil, assim como a clarividência e a telepatia. Os restantes dez por cento
estão procurando o Tao. É difícil encontrar uma pessoa em dez mil, até
mesmo entre as que estão buscando o Tao, que realmente compreenda o
Tao e o modo certo de praticá-lo. Não é fácil usar a mente com eficácia
nessa procura.
Antes de iniciar a meditação, deve-se ter uma idéia completamente
clara do que se espera realizar ao se empenhar nela. Existe um grande nú-
mero de técnicas muito diferentes de meditação e se deveria praticar um
método que possibilitasse a obtenção do tipo de aperfeiçoamento mental

31
desejado. Na China, os métodos de aperfeiçoamento mais conhecidos são
aqueles originados no Budismo e no Taoísmo. Existem, entretanto, alguns
métodos 2-ue não foram derivados nem de uma nem de outra dessas duas
tradicões.
, Os métodos budistas mais populares são a declamação dos nomes de
Buda, a prática do Ozih e Kuan (isto é, sentar-se em repouso e a contem-
plação), a observação da mente ou o emprego das técnicas zen. Para os
que acreditam realmente nos ensinamentos esotéricos, palavras mágicas, a
entoacão de mantras ou os métodos de visualizacão são considerados
ideais: Os que usam métodos de meditação budist~ geralmente supõem
que o aperfeiçoamento mental é suficiente. Como conseqüência, as trans-
formações físicas e as mudanças corporais são ignoradas.
Por outro lado, os métodos de meditação taoista dão grande ênfase
às mudanças físicas. Eles até mesmo consideram a abertura do Tu Mai
do Jen Mai e de todos os oito meridianos extraordinários, a recuperação d~
saúde e o aumento da duração do tempo de vida como efeito natural do
Tao. Se alguém sabe aperfeiçoar apenas a mente por meio dos métodos bu.
distas e não conhece as maravilhas das mudanças físicas, seu aperfeiçoa-
mento não é consistente como o Tao. É por essa razão que os taoistas
criticam os métodos budistas por mostrarem apenas "o aperfeiçoamento
de sua natureza" e não o "aperfeiçoamento da vida". Conseqüentemente
os taoistas insistem que "o aperfeiçoamento de ambos, natureza e vida"'
é o Tao genuíno, acreditando que o aperfeiçoamento da vida sem 0 aper~
feiçoamento da natureza é um erro primordial. Foi dito que "Apenas pelo
aperfeiçoamento da natureza, sem o aperfeiçoamento da vida, 0 espí-
rito yin não se tomará santo nem em dez mil kalpas". No seu comentário
sobre o I C!zing, Co?f~cio disse que. de~eríarnos "inv.estigar o princípio
em profundidade, atingir a natureza mteua e em segurda experimentar 0
auge da vida".
Quer se seja budista ou taoista, há uma pergunta no que diz respeito
à meditação que deveria ser feita: "Há algum método que negligencie ou
abandone o corpo físico, as sensações, as emoções, os estados mentais ou
os pensamentos relacionados com ele?"

Visualização e Purificação do Pensamento


Das dinastias Ch'in e Han até as dinastias Wei e Chin, a visualização
e as imagens mentais constituíram o método principal do Taoísmo. Os

"' Não é possível, neste contexto, distinguir entre as técnicas budistas e tao ístas de
meditação. Além disso, embora ambos sejam métodos tanto corretos como incor-
retos de aperfeiçoamento mental, não se pode categorizá-los aqui.

32
~tig~s sutras taoístas, como~ Huang Ting Nei Wai Ozin Ching, usaram a
VIsualização e a formação de imagens mentais corno o seu princípio cen-
tral. Chang Tao Ling, na dinastia Han, o criador de Tien Shu Tao Kou
Ch'ien Chu (outra figura importante de Tien Shu Tao) na dinastia Wei do
Norte, e o famoso taoista Tau Hong Ching, nas dinastias do Sul, usaram a
visualização e as imagens mentais como seus métodos principais. Outros,
como os budistas esotéricos, usaram a visualização como um princípio
de suas doutrinas. Além disso, a conceituação e a formação de imagens que
consideram a existência e a natureza dos deuses ou de Deus são usadas nas
orações e nos rituais de muitas religiões.
O pensamento transcendental também é mencionado no Taoísmo
ancestral. O pensamento transcendental e a visualização são bastante
dife rentes. A visualização é um método de aperfeiçoar o espírito ou o
comportamento. O pensamento transcendental é um método de aperfei-
çoar o conhecimento. O Zen-budismo foi estabilizado nas dinastias do Sul
e continuou até as dinastias de Sui e Tang. Durante as dinastias de Sung e
de Yuan, o Hua Tou e outros métodos se desenvolveram. Hua Tou é um
método de prática zen-budista. O primeiro caminho de Hua Tou consiste
em repetir continuamente uma sentença e observá-la coin a mente. Por
exemplo: poder-se-ia perguntar: "Quem sou eu ... ? Quem sou eu ... ?"
Observe as pausas ... ; na verdade, poder-se-ia parar o curso fnsensato da
mente e dilatar ao infinito os períodos de silêncio. O segundo caminho
para se trabalhar com o Hua Tou, ou "palavra principal", é repetir uma
questão com um forte ânimo interrogador, procurando a resposta por meio
do raciocínio. Esses métodos são caminhos alternativos do pensamento
transcendental.
Os métodos de visualização e de pensamento transcendental nem
envolvem a transmutação do método eh 'i, que prevaleceu na dinastia
Chin e nas dinastias do Norte e do Sul, nem o método do aperfeiçoamento
da concentração sobre a cavidade (como a concentração sobre Tan Tien)
que prevaleceu durante as dinastias de Ming e de Ch'ing. Eles não envolvem
o método do aperfeiçoamento taoista da transformação de ehing em eh 'i,
da transformacão do eh 'i em shen e da transformação do shen num Vazia.
Cada um dess~s métodos taoístas tem o seu próprio padrão e função. É
uma lástima que aqueles que aprenderam o Taoísmo tenham confundido
as diferentes tradições. Alguns estudantes pensaram que tudo o que tinham
a fazer era encontrar um bom mestre que lhes ensinasse um segredo ocul-
to, e que eles poderiam se transformar instantaneamente em imortais.
Por essa razão, ignoraram o estudo dos princípios dos métodos taoistas.
Esses métodos não estavam organizados numa ciência da imortalidade,
com princípios, regras, seqüências sistemáticas e métodos. Como canse-

33
sequencia, essas práticas levaram, antes, a um desastre em vez de levar à
obtenção da imortalidade.
Embora a visualização seja um método muito antigo, os místicos
ocidentais usaram técnicas análogas. Supõe-se que o misticismo ocidental
tenha se originado na legendária Atlântida e nas culturas egípcias. No
Oriente, na Chlna, supõe-se que o método da visualização foi legado pelos
imortais desde tempos muito remotos. Ambos os métodos podem ter-se
originado da mesma fonte. O método da visualização parece ser demasiado
avançado para ser de fácil aceitação por estudantes que estão ansiosos por
progressos rápidos. A visualização (por exemplo, de Deus, do espírito, do
céu) tem o denso espírito primitivo da religião e, como os ensinamentos
da mística ocidental, é rica de ensinamentos profundos.

7. Concentração no Orifício Ch'iao


na Meditação Taoista
O mais fácil e mais conhecido dos métodos para o treinamento da
mente é através da concentração sobre o orifício Oz 'iao. Falando em sen-
tido estrito, esse m étodo dá ênfase à fisiologia. Os que usam esse métod
pensam que poderiam começar com ele e usá-lo como a melhor técnicaº
Em outras palavras, e!es acreditam que? corp~ ~a base do Tao e im agin~
que, enquanto mantiverem este maraVIlhoso 1e1·fÕ. para o 0 1'iao e se con-
centrarem e abrirem com sucesso esse orifício 01 'iao, eles podem obter
o Tao.
Oz 'iao é um lugar do corpo para a concentração, mas quem se
concentra é a mente. Por essa razão, es te método se baseia essencialmente
nas funções m entais.
Neste contexto, poderíamos fazer algumas perguntas importantes.
Onde fica o verdadeiro Oz 'iao? Quem poderia concentrar-se no Ch 'iao e
quem não poderia fazê-lo? Qual Oz'iao os que se concentram no Ch'iao
deveriam usar? Qual Ch 'iao não deveria ser usad~ como um orifício para
a concentração? Essas considerações tendem a ser ignoradas.
A afirmação popular "Abra um Ch 'iao e cem Oz 'iao se abrirão"
nos leva a acreditar que é p ossível atingir o Tao abrindo som ente um
01 'iao. Porém, deixe-nos considerar isto. Existem nove Ch 'iao n o corpo
humano: dois olhos, dois ouvidos, duas narinas, a boca, o ânus e a uretra.
Os sete Ch 'iao da cabeça estão abertos. Se os sete Ch 'iao da cabeça estão
abertos, parece que a uretra e o ânus deveriam se abrir também. Muitas
pessoas sofrem ou de sérios problemas urinários ou de prisão de ventre.
Disto podemos concluir que os Ch 'iao da meditação não são os mesmos,

34
corno a maioria tem estado inclinada a acreditar, que os nove Clz'iao do
ccrpo humano.
O método de meditação da concentração sobre o Ch 'iao envolve
às vezes a concentração sobre um dos pontos do corpo usados na acu-
puntura. Sabe-se que, quando um ponto específico de acupuntura está fe-
chado, a energia ainda flui livremente através dos outros pontos. Quando
alguns pontos estão fechados, o ponto 'principal ainda está aberto. Dessa
forma, a afinnação "Abra um CTz'iao e cem Ch 'iao se abrirão" ainda é
nula. Alguns podem afinnar que até agora foi ao CTz 'iao do Tao que se fez
referências. Supõe-se que o Ch'iao não tem posição, nem forma e nenhuma
manifestação verdadeira, o que sigrúfica que ele não pode ser um lugar
do corpo sobre o qual se possa meditar. Em vez disso, ele é um produto
da imaginação. Quando alguém medita sobre o Oz 'iao do Tao, está usando
o sistema da visualização na meditação.
No Taoísmo, o Tan Tien superior, central e inferior, são geralmente
considerados como os três Ch'iao principais. De fato, o nome Tan Tien
não se tornou conhecido até as dinastias de Sung e de Ming. ·

Efeitos Protetores da Concentração


As pessoas que meditam preferem, geralmente, concentrar-se no
Tan Tien inferior, e frases como "Mergulhe o eh'i no Tan Tien ", "Proteja
o Tan Tien com a mente consciente", "Esconda o shen no Tan Tien",
são muito conhecidas. Algumas pessoas acreditam que, enquanto se con-
centrarem no Tan Tien inferior, podem "desligar-se do ehing e manter o
eh 'i" ou "transformar o ehing em eh'(''. Na verdade, do ponto de vista da
acupuntura, o ponto CT1 'i Hai está na frente do ponto Ming Men, na parte
de trás do Tan Tien inferior, e é considerado a parte mais importante das
glândulas supra-renais.
Um grande problema é levantado com esse método. Poderiam um
homem ou uma mulher, jovens ou idosos, saudáveis ou doentes, não im-
porta, com glândulas supra-renais bem-desenvolvidas ou degeneradas se
concentrar no Tan Tien inferior? Se a pessoa não for instruída por um
mestre experiente e sábio, essa técnica pode causar sofrimento considerá-
vel. As pessoas, por exemplo, que têm problemas renais, sonham que mo-
lham a cama, os que se satisfazem com a masturbação excessiva ou os que
sofrem de impotência, etc., agravarão seus problemas ao se concentrarem
no Tan Tien inferior. Existem, naturalmente, umas poucas exceções, mas
elas se devem a uma coincidência e dependem de outros fatores fisioló-
gicos. A meditação sobre o Tan Tien inferior não é recomendada para a
muU1er, uma vez que poderia causar hemorragia ou problemas mentais e
sexuais anormais.

35
Devemos considerar a idade, a fisiologia, as doenças, etc., antes de
nos concentrarmos no Ch 'iao superior, assim como no ponto entre as so-
brancelhas ou no ponto acima da cabeça. Concentrar-se demais no Clz 'iao
superior pode causar pressão sangüÚlea elevada, desordens nervosas, etc.
Por meditar com demasiada freqüência no Ch 'iao superior, algumas pessoas
experimentam o efeito de um enrubecimento da face. Essa pessoa se con-
sidera, e os outros passam a considerá-la, um homem do Tao. Na verdade,
um homem de idade avançada deveria tomar cuidado com possíveis aci-
dentes cerebrovasculares, assim como o derrame ou a apoplexia. Se alguém
tiver uma doença sexual latente que não foi completamente curada e medi-
tar demais sobre o Ch 'iao superior, poderá transmitir os germes ao cérebro.
Os métodos de meditação estão intimamente relacionados com as
terapias psicológicas e fisiológicas ~e a~tocura: ~u~do al?'1ém está pro-
curando a longevidade , as forças cosm1cas espmtua.is e m1sticas também
são apropriadas. Se esses princípios mais elevados forem mal-compreendi-
dos, ou se estes métodos de aperfeiçoamento forem mal-aplicados, 0 resul-
tado final poderá ser trágico. Nesse caso, por que não desistir da medita-
ção e gozar de uma vida natural?

O Princípio da Concentração
Nem sempre a concentração no Oz 'iao produz maus efeitos; toda-
via, a meditação sobre o Tan Tien não deve ser inteiramente rejeitada
Embora algumas pessoas fiquem apreensivas ao empregar essa técnica ;
Tan Tien tem sua função específica e às vezes é desejável que uma pess'oa
se concentre nele. Meditar sobre o Clz'iao é um dos meios de concentrar
o pensamento num ponto especial através da visualização, e este pode ser
claramente compreendido por qualquer pessoa que use essa técnica.
A função da visualização é concentrar a vontade e a mente. Anteri-
ormente, foi dito que o 01 'iao é um lugar sobre o qual meditar e que quem
medita sobre ele é a mente. Isso indica que, através da concentração men-
tal, pode-se atingir o estado da unificação do espírito. Por dois motivos
podem ser usados os pontos do corpo para a concentração mental. Em
primeiro lugar, todos amam o próprio corpo e desejam melhorá-lo; 0 cor-
po é uma forte representação do ego. Dessa maneira, as pessoas são enco-
rajadas a trabalhar arduamente quando começam a meditação. Exerci-
tando o corpo, as pessoas têm a oportunidade de obter a longevidade.
Em segundo lugar, as funções psicológicas e fisiológicas são dois aspectos
de uma coisa única. A mente afeta o corpo e o corpo, por sua vez, afeta
a mente. Por esse motivo, no início, o Taoísmo usou essa relação corpo-
-mente. O ponto de concentração do Ch 'iao desenvolve a própria concen-
tração. Um indivíduo deve tentar concentrar a totalidade de sua mente.

36
Se ele puder realmente se concentrar, nesse caso o propósito da concen-
tração será atingido. Por exemplo, imagine que alguém colocou uma
grande quantia de ouro, de prata e outros tesouros diante de você, e
lhe pediu para concentrar-se sobre a sua proteção. Você poderá se es-
quecer de dormir ou de comer, poderá esquecer-se até mesmo de você -
mente e corpo - a fim de concentrar-se apenas na guarda desses tesouros
de valor incalculável.
Podem aqueles que aprendem a serenidade e o aperfeiçoamento do
Tao fazer realmente bem concentrando-se no Oz 'iao? Não; muito poucos
podem fazê-lo bem. A maioria das pessoas não pode se concentrar integral-
mente nesse ponto. Reações nervosas podem causar sentimentos e sensa-
ções em pontos específicos; no entanto, os pensamentos caóticos e as ilu-
sões podem continuar a fluir, impedindo dessa forma a centralização da
mente.
Por que ocorre esse fenômeno? Porque a mente é estranha; quanto
mais se tenta concentrá-la, mais dispersiva ela se toma. Isso pode ser ilus-
trado com um exemplo tirado da física. Quando a força centrípeta está
concentrada no seu ponto máximo, a força centrífuga naturalmente reagi-
rá. Por outro lado, quando a força centrífuga chega ao seu ponto máxi-
mo, a força centrípeta será naturalmente produzida. Analogamente, se
você fechar o seu punho com firmeza, a reação dos nervos fará com que os
dedos se soltem naturalmente.
É por isso que o Taoísmo compara a atividade mental com o mer·
cúria. O mercúrio tende a se espalhar e a se dispersar. De maneira seme-
lhante, não é fácil conseguir a unificação do espírito, concentrando-se a
atenção no Ch 'iao.
Se a mente não puder ser concentrada, o canal eh 'i não pode ser
aberto de forma alguma. Algumas pessoas acreditam que abriram o canal
eh 'i, quando na verdade se trata de uma ilusão ou de uma certa sensação
fisiológica. Raramente uma pessoa pode alcançar suas metas concentran-
do-se meramente em suas sensações fisiológicas.

Concentração no Ch'iao e o Aprimoramento do Ch'i


Concentrar-se no Oi. 'iao e aprimorar o eh 'i não são técnicas taoistas
iguais. Concentrar-se no Ch 'iao envolve a mente consciente, ao passo que
aprimorar o eh 'i consiste, antes de tudo, em aprimorar a respiração atra-
vés do uso da vontade. As diferenças que existem entre esses dois mé-
todos não têm importância; todos eles usam a mente. Não importa o mé-
todo usado para a meditação; as pessoas consideram o clz 'i e a serenidade,
o eh 'i e o Tao, e o eh 'i e a técnica da longevidade como tendo uma cone-
xão absoluta. Os que se especializam em yoga e em eh 'i kung dão ênfase

37
ao eh'i O Tai Chi Chuan, que se tomou conhecido no final da dinastia
Ch'ing, envolve o princípio de submergir o eh 'i no Tan Tien. Muitas pes-
soas meditam numa tentativa de dirigir a respiração em direção ao Tan
Tien, na esperança de que o eh 'i submergirá no Tan Tien, de modo a po-
derem, assim, entrar no Tao.
Existem muitos métodos de eh 'i kung e muitas técnicas de Taoísmo.
Os que estão familiarizados com esses métodos perguntam como conden-
sar o eh'i no Tan Tien ou em outros locais. Se alguém encher uma bola de
ar, pode pretender que esse ar se localize numa parte específica da bola?
Isto é impossível. O corpo é corno uma bola. O eh 'i circula por todo ele.
Somente uma pessoa seriamente doente, que apresente problemas em al-
guma função, pode inconscientemente ter o eh 'i localizado em dado lugar.
O eh 'i de uma pessoa saudável nunca estaria nessa condição.
Algumas pesso_as acreditam que ~~ que se exercitan: na concentração
no Ch 'iao ou no apnmoramento do eh z, podem voluntanarnente manter 0
eh 'i numa determinada posição. Isso, entretanto, é uma simples ilusão
A sensação de reter o eh 'i num local espe_~~fico é, na verdade, apenas ~
empanzinamento de nervos e de vasos sangurneos que ocorre como conse-
qüência da intensa concentração mental num ~erto ponto do corpo.
0
eh 'i não pode condensar-se num, ~ugar e~ particular. I~o sugere que 0
entendimento da natureza do legitimo eh z é um dos mais difíceis prob! _
mas que acompanham a prática da meditação. e

38
li Parte
A Natureza e as Reações do Ch'i
8. A Natureza do Ch'i

O que é eh 'i ? Esse é, na verdade, o problema. Três ideogramas são


usados pelo Taoísmo para explicar o significado de eh 'i. A antiga letra para
eh 'i é .& . A porção de cima dessa letra, ;!L , significa nenhum. A
parte inferior dessa letra, . · · ·, quer dizer fogo. Os antigos sutras taoistas
usam essa letra que significa sem fogo para indicar eh 'i (ver também p. 21).
O Taoísmo e a cultura secular chinesa estão intimamente relaciona-
dos. Os cinco elementos, os ramos celestiais e os ramos mundanos são es-
pecial e amplamente usados no Taoísmo. Entre os cinco elementos, oco-
ração ou a mente pertencem ao fogo. Dizer que c/z 'i é o não-fogo (o
não-desejo ou luxúria) significa que, quando alguém atinge a serenidade
mental e não tem pensamentos ou preocupações, então é gerado o verda-
deiro e/z 'i.
A segunda letra escrita de eh'i é 1.. .Ela é escrita no estilo antigo
e representa o ar na natureza.
A terceira letra de eh 'i é i\_ . Essa letra mais moderna representa o
ar, a respiração e o gás.
Antes da dinastia Tang havia algumas técnicas taoistas especiais que
possibilitavam à pessoa absorver o eh 'i. Concentrando a mente e respi-
rando de determinada maneira, podia-se atingir um estado "que permitisse
a comunicação com o espírito do céu e da Terra". 5 Essas técnicas evoluí-
ram em muitos métodos de eh 'i kung numa era mais recente. O objetivo
da prática dos métodos de eh 'i kung é o de despertar a energia latente do
verdadeiro eh 'i. Mas, se alguém prestar atenção apenas aos exercícios res-
piratórios, nunca conseguirá atingir as mais elevadas realizações do eh 'i
kung e da yoga corporal.
O que é o verdadeiro eh 'i? Isso é difícil de descrever. Na yoga, ela
é chamada de energia do espírito (shakti) , o poder da serpente (kundalini).
s
Este método de cultivar o eh 'i leva ao mesmo progresso que a prática da antiga
yoga.

41
Na doutrina esotérica tibetana, é chamada de força do espírito ou calor
do espírito. Na terminologia moderna, podemos chamá-la de energia ini-
cial da vida ou de energia. Aqui não se trata da energia física, que muitas
pessoas acreditam ser a energia elétrica ou eletricidade. Isso é um mal-en-
tendido, desde que a suprema natureza da energia não é uma função ma-
terial. Contudo, levar essa discussão mais além nos levaria a um envolvi-
mento nas disputas centrais da filosofia e da ciência que não podem ser
resolvidas aqui.
Isso posto, pode parecer que não existe relacionamento entre a sere-
nidade mental e o ch'i. Não é este o caso. Na cultura chinesa, sentar-se
silenciosamente é um termo geral. O crescimento e o desenvolvimento de
um corpo humano pode ser comparado com o crescimento e o desenvol-
vimento de um pinheiro. O tronco, os galhos, os feixes de folhas em forma
de agulhas e as pinhas crescem a partir de uma semente germinada e se
desenvolvem numa determinada seqüência. Apesar de um pinheiro poder
ter seu crescimento tolhido (por crescer num vaso pequeno) ou ser culti-
vado em tamanhos ornamentais (como no caso dos "bonsai") 0 cresc·.
1
menta e o desenvolvimento de todos os pinheiros é basicamente 0 mesm
Assim também os que.ª tr~balham arduam:nte e ~ prati~an:1 com regularid~~
de :~atarão que a .~ed~taçao conduz a marufest~çoes fis1ologicas d o eh 'i. Os
fenomenos de eh 1 vanam com as pessoas ; porem , geralmente resultam
produção de imagens mentais. Embora diferentes pessoas tenham diferen~
tes tipos de imagens mentais, quase todas terão de lidar com as apariçõ ns
de imagens e ilusões. e
Se alguém es tiver mais ou men os familiarizado com termos tais
como oito meridianos extraordinários, grande circulação, pequena circu-
lação (isto é, a circulação do eh 'i ao lo_n~o do Je__n e do Tu Mai), K'an
( =-=) e Li ~ =:::: ) , chumb? .e me!cuno, dragao e tigre , yin e yang,
etc., esses conceitos vagos condic10narao a n atureza e a qualidade d e suas
ilusões. Quando as reações d e eh 'i se iniciam, elas são naturalmente influ-
enciadas pelos preconceitos da pessoa, que a levarão a experimentar sen-
sações que estarão de acordo com o se u estado mental específico.

Ch 'i Está Relacionado com o Ar


A maio ria das pessoas que aprendem a meditação se inclina a rela-
cionar a respiração com o eh 'i. Elas sup õem , então, que o ar é o ce ntro do
ch 'i inte rior no corpo humano. Do ponto de vista da meditação, o efeito
da respiração se limita à parte superior do diafragma. A reação do ch'i
dentro do corpo humano não está meramente ligada com a respiração.
A função da respiração é bem conhecida. Para os que aperfeiçoam
o eh 'i, o ar é semelhante ao material usado para acende r uma vela. A in-

42
finita energia latente do corpo é como um tesouro primitivo: ela vem com
a vida. No entanto, a menos que seja aprimorada de um modo razoável,
essa energia vital latente nunca será acesa e será dissipada com a morte.
A doutrina dhyana do Budismo Hinayana classifica a respiração do
ar e a energia latente do corpo humano em três categorias:
1) Vento - Indica a função comum do sistema respiratório e do ar.
Em outras palavras, as pessoas dependem da respiração para manter a vida.
Este é o estado do ar conhecido como "vento".
2) Ch 'i - Indica que, depois do aprimoramento através da medita-
ção, a respiração por si se toma leve, fácil e lenta.
3) Hsi -- Através do altamente avançado aprimoramento pela medi-
tação, a respiração se toma tão imperceptível que quase cessa. Nesse es-
tágio, o movimento de exalação e de inspiração do sistema respiratório
pára de funcionar. Entretanto, a respiração através de outras partes do
corpo não é completamente interrompida. Uma respiração natural começa
a funcionar do abdômen inferior para o Tan Tien inferio r. Isso é Hsi.
Mais tarde, os taoistas deram-lhe o nome de Tai Hsi (a respiração de um
embrião no útero). Algumas escolas de pensamento até mesmo acreditam
que a mente e Hsi são interdependentes.
Estes princípios e práticas foram desenvolvidos a partir do método
dlzyana de aperfeiçoamento, do Budismo Hinayana, durante as dinastias
Sui e Tang. Eles foram abso rvidos pela Escola Tien Tai, incluídos nos méto-
dos de ape rfeiçoamento Ozih e Kuan e, com o acréscimo de modificações
e mudanças, conservaram sua popularidade. Muito embora, antes das di-
nastias Sui e Tang, os métodos de prática taoista também enfatizassem o
ape rfeiçoamento do eh 'i, não havia, naquele tempo, teorias sobre as cor-
relações entre Tai Hsi, entre mente e Hsi.
Alguns sutras pseudo-taoístas davam a entender que eram das dinas-
tias Wei e Chin, e ocasionalmente mencionavam essas teorias. Entretanto,
esses sutras são enganadores e não se deveria confiar neles.

9. Reações do Ch'i Durante a Meditação

Discutiremos agora as relações entre a meditação e o eh 'i e as suas


fw1ções. Em primeiro lugar, deveríamos compreender que o que vem es-
crito a seguir diz respeito a adultos sexualmente maduros, aos que j á têm
uma vida sexual. Não pode ser aplicado às crianças imaturas, às meninas
que ainda não iniciaram se u ciclo menstrual, ou aos garotos que ainda não
tive ram a sensação da ejaculação do sêmen.

43
As reações físicas que ocorrem durante a meditação são· classificadas
abaixo em uma primeira, segunda, terceira reação, e assim por diante.
Isso não quer dizer que essas reações se sucedam pela ordem dessa seqüên-
cia. Algumas seguirão e outras não a essa seqüência. Depende das condi-
ções mentais e físicas da pessoa envolvida no processo de meditação.

Entorpecimento e 1nchação das Pernas


No princípio da prática da meditação, a primeira reação que a pes-
soa sente é a de que não consegue acalmar a mente e experimenta estra-
nhas sensações de reações puramente fisiológicas. Os aspectos mentais da
meditação não são abordados neste livro, pois a discussão se linúta às rea-
ções fisiológicas.
Segundo as estatísticas, oitenta a noventa por cento dos principian-
tes s~ntem entorpe~~1en~o e in;haço da:> pei:nas. !sso fará com que a pes-
soa smta dores ou untaçao e ate mesmo mqwetaçao. Do ponto de vista do
bom-senso, a maioria das pessoas acha que isso. é devido à compressão
dos vasos sangüíneos das pernas e que, portanto, é indesejável.
No en.tan~o, do ponto_de vista ~a o~servação empírica e dos princí-
pios da meditaçao, esse~. ~enomenos na.o sao causados totalmente pela pres-
são sobre os vasos sangumeos. Na realidade, resultam da reação e do mo ._
menta do eh 'i. Experimenta-se às vezes o torpor, as dores e o inchaço dV1
pernas porque o eh 'i não pode fluir livremente entre os vasos sangüíneo~
os músculos e os tendões. Essas sensações mostram que há obstáculos no;
canais eh 'i de Yin Clz 'iao e de Yang Clz 'iao. Quando não se consegue mais
suportar essa sensação, pode-se soltar as pernas. Depois de algum tempo
tem·se sensações desconhecidas e confortáveis de refrigé rio. Quando alcan:
çamos determinado estágio na meditação, não importa se cruzamos ou não
as pernas, sempre temos essas maravilhosas sensações de frescor e de eufo-
ria. Nesse estágio, somos capazes de cruzar as pernas para meditar durante
longos períodos sem sentir qualquer ~bstrução. Es~a confortável sensação
de euforia ou de êxtase toma-se gradativamente ma.is forte.

O Fortalecimento das Funções Genitais


Aqui deveríamos distinguir entre 1) funções renais ou d os rins e
2) funções genitais. No caso de um adulto, a segunda re ação da meditação
geralmente começará pelas partes renais (inclusive os rins e a cintura) e,
depois de algum tempo de prática, também reagirão os ó rgãos genitais
ou de reprodução. A reação de um homem jovem começará no seu órgão
genital.
A reação do órgão renal é tal que durante ou depois da meditação,
um homem sentirá uma sensação de dilatação, de dor, de entorpecimento,

44
etc., na cintura e nas costas. Através da meditação, podem agravar-se
os problemas dos que sofrem de impotência, dos que têm ejaculação pre-
coce (ejaculatio praecox) ou poluções noturnas (devidas talvez a proble-
mas renais). Alguns homens podem perder sêmen durante a defecação, a
micção ou a meditação. A ocorrência desses fenômenos acompanha a de-
generação dos rins ou problemas das glândulas supra-renais, genitais e da
pituitária, bem como de neurastenia. As mulheres que têm problemas re-
nais podem apresentar o fenômeno da leucorréia.
A meditação não causa esses efeitos indesejáveis. Eles se devem a
velhas doenças. Os nervos e os canais eh 'i em volta da área dos rins e da
cintura constituem obstáculos ao ch'i que é gerado durante a meditação
e que precisa abrir caminho e passar por essa área. Quem entender esse
princípio e obtiver instrução de um bom mestre sobre os remédios ade-
quados, pode superar todos esses problemas e certamente recobrará a
saúde dos órgãos renais. Se a instrução por meio de um bom mestre não
estiver disponível, então a pessoa deverá parar a meditação até recobrar a
saúde e depois recomeçá-la outra vez. Se esses fenômenos se repetirem,
interrompe-se de novo a meditação. Repetindo-se esse procedimento, ape-
sar de a meditação ser intennitente, poder-se-á ainda assim recobrar a
saúde.
Os remédios não podem ser descritos aqui, pois dependem de proble-
mas individuais específicos. Os remédios envolvem a teoria médica e os
exercícios físicos , que são complicados demais para serem descritos. O
ponto mais importante é que deveríamos nos abster de atividades sexuais
a fim de esclarecer esses problemas. Se alguém pudesse eliminar os dese-
jos sexuais, isso em si mesmo se constituiria num excelente remédio.
Neste caso, a recuperação da saúde costuma ser mais rápida. Dependendo
do sexo, da idade e da força física, as reações que ocorrem durante o res-
tabelecimento variam e muitas vezes são complicadas.
As reações dos órgãos genitais ou de reprodução são tais que, duran-
te ou depois da meditação, o pênis repentinamente fica intumescido du·
ran te longo tempo; ao mesmo tempo, uma sensação de estremecimento po-
de ser experimentada nos pequenos nervos capilares em volta dos testí-
culos, e pode-se sentir uma vibração na glândula prostática e na área do
períneo. Nas mulheres, às vezes ocorre a fibrilação ou contração
e o intumescimento dos seios. Segundo algumas escolas taoístas, isso in-
dica o retorno de yang. Assim sendo, ele ou ela pode usa~ a mente em al-
guns exercícios respiratórios para orientar a circulação do yang.
Se alguém não relacionar os fenômenos físicos da meditação com
fantasias sexuais ou anseios voluptuosos, a manifestação sexual poderá

45
indicar uma ótima condição física. Isso mostra que as glândulas pituitá-
ria, supra-renal e genital se tomaram mais vitais e transbordam de saúde.
Independentemente do sexo e da idade, quase todos temos os im-
pulsos sexuais disparados por este fenômeno. Esses impulsos sexuais po-
dem criar sensações de letargia ou de intumescimento da cabeça, ou uma
sensação incômoda no peito, etc. Se mantivermos uma relação sexual
quando isso ocorrer, não só desperdiçaremos os benefícios da meditação
anterior como também poderemos causar danos em conseqüência do au-
mento da vitalidade. Se alguém não tiver fantasia ou atividade sexual,
então se aplica, em geral, o que Lao Tsé disse sobre um bebê: "Não conhe-
cer as relações sexuais de macho e fêmea e ainda assim ter uma erecão,
significa o aparecimento de ching." Isso impulsiona a força vital lat~nte
e inicia o desenvolvimento do eh 'i. Em geral, quase todos avançam até
esse ponto e em seguida encontram grande dificuldade em ir além. Se a
pessoa não conhecer o meio de remediar iss~, m~s.mo se conseguir se repri-
mir durante muito tempo, certamente estara SUJeito a uma doença ou per-
turbação mental.6
Há mais ou menos trinta anos, um amigo meu, de meia-idade dis
que costumava medi t~ a, n01·t e com a esp~~~- S_empre que o fenômeno ' dose
estímulo sexual ocoma como uma consequencrn da meditação ele se t·
. . . ' n ia
que a sua mulher era muito mais atraente que em circunstâncias n orm ·
Por essa razão _el~ p!eferiu gozar as relações sexuais a procurar as reco~~
pensas da continenc~a sexual. Outro homem, de mais ou menos sessenta
ano~, enqu~to med1~ava ?as ~ontanhas_, tentou refrear suas sensações se-
xuais de vanas maneiras, m~lus1ve com 1mersões na água fria. Os meios
que escolheu provaram ser ineficazes, de modo que abandonou a m d"_
~ do al'1':'.1º que as relações com ~esposa podiam oferecer.
e I
tação em lavor
Esses _dois casos exemplificam be_m como a i:ied1tação aumenta os desejos
sexuais, o que me levou a pesquisar algum tipo de solução para este pro-
blema comum.
O rem~dio para a reação dos _órgãos geni~ais durante a meditação é
muito complicado. Para os que estiverem dese1osos de centralizar 0 seu
tempo e as suas energias na meditação, o método mais simples e eficaz de
aliviar esses problemas é diminuir a quantidade de alimento que consome.
Até mesmo o jejum por pouco tempo pode ser de ajuda. Um dos precei-

6
O dano é semelhante àquele causado ao se evitar a ejaculação durante as relações
sexuais. Ser capaz de meditar durante um longo período sem qualquer reação nos
órgãos genitais ind ica que a força vital desse indivíduo está prestes a ser abatida.
Depois de certo tempo, a mente da pessoa se toma uma lagoa de água estagnada e
seu corpo definha.

46
tos do Budismo é o de n ão comer depois da meia-noite. Este preceito não
ter:i ~ºri~em simplesmente num regulamento estático. Diz um provérbio
chines: Começa-se a pensar no sexo quando se está quente e repleto de
comida; nos inclinamos a pensar em roubo quando se está com frio e com
fome." Entretanto, jejuar ou comer menos não é fácil.

Nota do editor: Uma vez que os leitores ocidentais poderiam talvez ficar desconcer-
tados com as possíveis implicações das observações do autor sobre a sexualidade,
parece apropriado esclarecer os seus pontos de vista.
O autor não é contrário·às práticas sexuais e não acredita que as atividades
sexuais sejam incompatíveis com a prática do Tao. O Tantra, por exemplo, é um mé-
todo de aperfeiçoamento que envolve (e é fundamentalmente baseado sobre) a união
sexual. O ponto principal neste caso é que a vitalidade é grandemente aumentada
pela prática da meditação. Além disso, desde que a energia vital está intimamente
associada com a energia sexual (se elas não forem, de fato, a mesma energia), o au-
mento de vitalidade aumentará os desejos sexuais e os impulsos. Assim. os impulsos
sexuais originados da prática da meditação excedem o nível "normal". Quando uma
pessoa &tinge esse ponto na prática da meditação, ela tem duas opções: pode libertar
a energia acumulada ocupando-se em atividades sexuais (e, já que os seus impulsos e
desejos serão extraordinariamente fortes, terá a tendência de empenhar-se demais.
dispersando a energia que levou tanto tempo para acumular), ou pode utilizar essa
energia para atingir outro nível na meditação. A decisão fica inteiramente a critério
do estudante; porém, uma vez que o professor Nan está fundamentalmente interes-
sado na meditação, ele recomendaria, se fosse consultado, que o aluno usasse essa
energia para progredir na meditação.
Os alunos ocidentais estão familiarizados com a idéia de que a energia sexual
pode ser transformada em energia espiritual - freiras, monges, bispos, cardeais e
tantos líderes religiosos se dedicam à prática do celibato por essa mesma razão. E
os estudantes ocidentais também têm o conhecimento do ponto de vista de Freud de
que a energia sexual sublimada pode ser transformada em energia criativa e usada
para melhorar o trabal110.
Estamos conscientes dos avanços espirituais e criadores que parecem ter sido
feitos como conseqüência da sublimação de energias sexuais. Analogamente, o autor
sugere que a energia sexual é uma forma de energia vital que pode ser usada para
avançar para um nível mais elevado. se se refrear as atividades sexuais durante certos
estágios da meditação. .

47
Reacões nas Costas e Omoplatas
· No curso da prática da meditação, ou em qualquer outra ocasião,
pode-se experimentar peso ou dor nas costas ou na região das omoplatas,
ou sentir tensão dos nervos ao redor dessa área. Esta é a terceira reação
da meditação, e ela tem duas causas principais: o eh 'i está subindo atra-
vés de Tu Mai - o vaso regente - o sistema nervoso central na medula es-
pinhal, ou se trata da reação de alguma doença.
1) As reações de doença: Aplicam-se aos fracos e doentes, ou às
pessoas idosas . Incluem-se, aqui, doenças pulmonares, gástricas, e desor-
dens hepáticas, males cardíacos e várias outras condições latentes. Se uma
pessoa sofre desses males, em certo estágio da meditação sentirá dor e
peso nas costas, como uma forte pre:~ão, flacidez e debilidade ou dor na
região da cintura. Podem ocorrer caibras ou contrações convulsivas nas
costas, uma congestão nos ombros, ou dor, causando suores, calafrios e
febre.
Se ocorrerem esses fenômenos, devemos entender que esse problem
não é causado pela meditação. Além do mais, a serenidade na meditaç- ª
é um meio de repouso ; ninguém é capaz de ficar doente apenas por d ao
cansar. Deveríamos nos a1egrar, p01s, . sem o teste d a meditação pod es-.
mos não compreen er q_ue p emos a1gum ti po de d oença. As dores
d · · t ' ena.
ue
sentimos mostram ~ efeito autocurador do au~ento da vitalidade e i~-
cam que a doença amda tem cura e não progrediu de modo a não ser .
possível extirpá-la. Por exemplo: um homem pode não sentir dor numm~~
rida grave, no início; no entanto, quando a ferida começa a sarar eªl e
. , ea
sentirá. Analogamente, quan do a1guem pega um resfriado, no princ í .
os germes do resfriado ainda estão latentes: não há sintomas. Quandopio
sintomas do resfriado forem evidentes, este já estará indo embora. os
Se esses fenômenos ocorrerem durante a prática da meditação d _
vemos fazer um tratamento médico ~u:iultaneamente à cura que está~­
plícita na meditação. Enquanto existir a vontade de persistir durante
essas crises, elas podem conduzir a urna condição mais saudável.
2) As reações do eh 'i: Se se é normal e saudável, depois da primeira
e da segunda reações acima mencionadas deve-se entrar naturalmente no
estágio em que se tem uma sensação de intumescimento nas costas e nas
omoplatas. Ou pode-se sentir uma força movendo-se com dificuldade
ao longo da medula espinhal, impedida de subir. Pode-se esperar até que
essas forças atravessem a obstrução, para finalmente sentir-se relaxado e
confortável. No Taoísmo, esse fenômeno é chamado de Carruagem do Rio
que rola até o lugar de Gzia Chih. Isso acontece durante o processo de
abertura de Tu Mai. Esse é o estágio em que o eh 'i começa a alcançar 0
ponto Huang Yang.

48
Se não se puder liberar a mente e atingir o estado de esquecimento
do corpo, a pressão se tomará cada vez mais forte. Sempre que isso aconte-
cer, deve-se automaticamente focalizar a atenção nas costas, ou usar a for-
ça da consciência ou da imaginação para empurrar a pressão para cima.
Devido à concentração da atenção nesse local, os nervos do cérebro e do
estômago se tomam cada vez mais tensos. O coração se contrai e o descon-
forto das costas aumenta.
Algumas escolas do Taoísmo ensinam a guiar o eh 'i com a consciên-
cia, a empurrá-lo ou a dirigi-lo. Os estudantes são levados a imaginar a pro-
gressão da Carruagem do rio e a ocupar-se em fazer respirações profundas,
longas, embora tranqüilas (6 X 6 - trinta e seis respirações profundas;
ou 9 X 9 - oitenta e uma respirações profundas), o que numericamente
combina a Grande e a Pequena circulações do céu. Eles devem usar alguns
exercícios taoistas ou yogues para dirigir a passagem do ch'i através desse
local.
Embora esses exercícios direcionais tenham um efeito temporário
e nos façam sentir que alguma coisa passa através de Ozia Chih para cor-
rer para Yu Chen (isto é, a parte posterior da cabeça), só a força mental
pode mudar essa sensação física, mas não se trata definitivamente do fe-
nômeno do eh 'i passando através de Chia Chih.
Se alguém pode atingir o estado de "esquecimento do próprio cor-
po", ou se pode aplicar sua sabedoria numa tentativa de se esquecer de
suas sensações e permanecer quieto sem qualquer ação mental, haverá
então um momento em que, repentinamente, corno um interruptor que
faz contato, toda a tensão se vai e a mente e o corpo ficam livres e descon-
traídos. A partir desse momento decisivo, essa pessoa experimentará o es-
tado de amplitude e de esplendor da mente e a perfeição do espírito.
A pessoa cujas costas estão arqueadas nesse estágio, endireitará natural-
mente a cintura e as costas, retesará o peito e sua respiração se tornará
mais regular. Para as que ·nasceram com escoliose avançada ou para os que
a adquiriram em decorrência de um ferimento externo, essa é uma situação
difícil. 7
. Nesse estágio, a pessoa estará tão carregada que não adormecerá fa-
cilmente. Desde que esteja acostumada a donnir numa hora determinada,
ela poderá imaginar que está com insônia e sentirá medo. Devemos enten-
der que não se trata da insônia das pessoas comuns . Devemos deixar que
a natureza siga o seu curso. Se não puder donnir, não vá para a cama.

7
t impossível dar qualquer conselho no que diz respeito a essas condições, uma
vez que o tratamento requer discussão de matérias que estão além do objetivo d este li-
vro.
49
Reõções na Cabeça
A quarta reação acontece na cabeça, e essa é mais complicada que
as que ocorrem nas outras p artes do corpo. Segundo a medicina t radicional
chinesa, "a cabeça é a principal das yangs " . Po r essa razão, su as funções
são muito amplas. Do ponto de vista do Taoísmo, a cabeça inclui Yu
Chen na parte de trás e Ni Huang Palaee na parte de cima, ambos muito
importantes. De acordo com a visão da ciência médica moderna, a cabeça
está relacionada com os nervos do cerebelo e do cérebro, com o diencé-
falo e com os órgãos da glândula pituitária. Essas relações são muito com-
plicadas. A cabeça também está diretamente ligada às células nervosas dos
cinco sentidos. Algumas dificuldades sé rias p odem , portanto, surgir ao se
atingir esse estágio. Pode-se, por exemplo, começar a ter alucinações.
Para a finalidade da discussão, as regi~s da cabeça serJo considera-
das na seqüência seguinte: 1) a parte postenor da cabeça, 2) a frente da
cabeça e 3) o centro da cabeça.
As reações na parte posterior da cabeça: Algumas pessoas se satisf; _
zem com um es~ado. t~anqüilo d~ rn:_nte ; consideram essa quietude so~­
tária como o efeito uruco da meditaçao. Para essas pessoas, uma discu _
·· · 1 A - {:,' · - ssao
avançad_a não. é e_xequ1ve: s reaç?~s J zszeas sao ne~~ssariamente simul-
tâneas a m ed1taçao. Depois dos estagios em que o eh 1 passa pelos 6 -
. . pe1a cmtura
. 1 t 1 b. . rgaos
genitais, e pe_ as cos
. as, e e su ira naturalmente até a p a. rt e
de tr ás a ca beça. A reaçao mais comum que se se nte quando 0 eh 'i r _
d
ge este ponto, é a falta de clareza e de vivacidade da mente , quandª m
sent.e uma espéci~ de letargia até o p~nto de dormitar sem donnir. Par~~:
budistas que praticam Dhyana ou Ouh e Kuan, esse fenômeno é cons·d _
rado um dos obstáculos à prática do Tao, porque em Chilz e em K~ e
acredita-se que se poderia manter a mente clara e iluminada durant:n~
tempo todo.
Algumas escolas do Taoísmo interpretam mal esse fe nôm eno e 0
tornam pelo estado de Hung Tung - isto é, a infusão da força vital em seu
estado o riginal. Ou o confundem com Tso Wang - quer dizer, com 0
sentar-se num estado mental de abstração, esquecendo-se de si mesmo e
de tudo o mais. Entretanto, na verdade esse estado não é Hung Twzg ou
Tso Wang, embora seja semelhante a eles.
Pelo fato de os taoístas darem ~nfase ao aperfeiçoarne n to do corpo,
eles consideram a energia fisiológica VItal como o ponto de partida, acredi-
tando, portanto, que esse estado de let argia seja um fenômeno maravillioso.
Os budistas iniciam a prática pelo trabalho mental, pretendendo
abandonar o satkayadrsti, isto é, a ilusão de que este corpo o u ego é real,
e esperam entrar diretamente na Natureza Original. Conseqüentemente, os
budistas consideram o donnitar, bem como o pensamen to desenfreado,

50
como impedimentos aos fenômenos claros e luminosos da sua Natureza
Original. Eles pretendem que essas condições são obstáculos que impedem
~ obtenção de suas metas. Desde que entendamos os princípios, não é
unportante decidir se eles são certos ou errados. .
As diferenças básicas entre Budismo e Taoísmo se referem aos mé-
todos e aos objetivos iniciais, que não são os mesmos. Não se pode evitar
os efeitos das relações que existem entre o corpo e mente. Mesmo se não
quisennos dar uma atenção maior ao co.rpo ao entrarmos num estado de
tranqüilidade, não podemos ignorar as atividades corporais. Precisa-se
depender do corpo quando se espera romper o invólucro que o escraviza.
Portanto, a teoria de " usar o corpo falso para aperfeiçoar o verdadeiro"
foi adotada pelos taoístas durante as dinastias Sung e Yuan.
Quando o eh 'i sobe até a parte posterior da cabeça, sente-se letar·
gia. Uma pessoa poderá adormecer se não possuir resistência física sufi.
ciente ou se estiver mental e fisicamente cansada e poderá não ser capaz de
manter a posição de meditação. Isso pode ocorrer por causa da oxigenação
insuficiente do cérebro. O bocejo acompanha naturalmente o estado de
cansaço e o cochilar. Se não se tiver energia vital suficiente e se o eh 'i
ascender até a parte posterior da cabeça, pode-se sentir escurecimento dia·
ante dos olhos ao estar semi-adonnecido. Gradativamente, passa-se a um
estado semelhante ao do sonho, e certamente aparecerão imagens. Isso
acontece porque o eh 'i afeta os nervos da parte posterior da cabeça, afetan·
do, conseqüentemente, os nervos oculares. Muitas pessoas sonham com
imagens associadas a sentimentos de amor e alegria ou de tristeza e pesar.
Essas imagens e .sentimentos estimulam funções subconscientes que dão
origem aos estados mentais, aos pensamentos e aos conceitos. Nesse está·
gio, podem acontecer os estados de Mara, ou ilusão demoníaca. Esses es·
tados dependem da sabedoria, do pensamento, da personalidade, das ten-
dências fisiológicas e das condições psicológicas das pessoas. Eles são muito
complicados. Sem a orientação de um mestre muito sensível, sem auto·
confiança, sem uma inteligência saudável e sem pensamento correto, po·
de-se ser conduzido ao caminho errado.
Quando se entende isso, pode-se ignorar os fenômenos dessa espé·
cie, sabendo que a luz segue as trevas. Depois de passar por esse estágio,
sente-se mais acordado. Pontos de luz semelhantes a uma estrela fluo·
rescente podem aparecer diante dos olhos, cintilando, em diferentes for·
matos e cores. Essas cores e luzes estão relacionadas com a fisiologia e se·
rão discutidos adiante com mais ponnenores.
Se uma pessoa que não estiver interiormente sã tiver uma doença
cerebral, alguma desordem em qualquer dos cinco órgãos dos sentidos, se
sofrer de indigestão, de inflamação no trato intestinal, de desarranjos es-

51
tomacais ou intestinais ou de qualquer outra doença, nesse caso, o estado
de meditação pode causar congestão da córnea ou um tinido ou sensação
de pressão nos ouvidos. Os que têm cáries podem sentir dor de dentes ou
eles podem tiritar. Resfriados crônicos ou outros problemas podem ir-
romper, assim como inflamação dos nodos linfáticos ou dor em algumas re-
giões do cérebro. Todavia, qualquer pessoa deveria compreender que esses
males crônicos podem ser descobertos, porém não, na verdade, causados
pela meditação. Em outras palavras, a meditação aumenta a vitalidade in-
terior e começa a curar o corpo. Pela meditação persistente e um trata-
mento médico apropriado, pode-se recuperar a saúde. Portanto, já em tem-
pos remotos se acreditava que uma pessoa que praticasse o Tao também
·deveria entender de medicina.

Reações na Parte Posterior da Cabeça


No momento em que o ch'i atingir a parte de trás da cabeça, tere-
mos feito grande progresso na meditação e devemos ficar contentes. Essa
é a quinta reação: trata-se de um estágio complicado, que é freqüente-
mente acompanhado por urna grande quantidade de problemas. Qualquer
pessoa deveria usar de cautel~ .e de bom-se~so ~urante esse estágio. O es-
tudo de alguns métod~s auxiliares de .meditaçao .~ aperfeiçoamento tam-
bém podem ajudar, assim como o caminho do clz r, a acupuntura e as dro-
gas medicinais. Este, entretanto, é um estágio feliz porque, depois de pas-
sar por ele, pode-se abrir o canal eh 'ido sistema nervoso central e do cére-
bro. Porém, nesse estágio, os que têm uma constituição física doentia uma
doença cerebral ou mental tendem a ir pelo caminho errado. Uma p'essoa
mais velha ou de meia-idade poderá ter uma sensação de desconforto seme-
lhante à hipertensão. Todavia, não existe absolutamente a possibilidade de
ser esse estágio a causa da hipertensão. Se uma pessoa tenta se concentrar no
Tan Tien s.up~rior, sua face fica.rã e.orada, o que é um sintoma de hiperten-
são. A maiona das pessoas se inclina a supor que uma face avermelhada
seja o efeito do aperfeiçoamento do Tao; no entanto, ninguém deve acredi-
tar nisso.
Quando o ~h 'i ~tinge a part~ P.º~terior da c~beça, a pessoa poderá
ouvir lindos sons mtenores ou ouVJr hrudos ou sentir pressão nos ouvidos.
Esse fenômeno é causado pelo eh 'i ao tentar abrir o canal eh 'i no cérebro.
A vibração ou o estremecimento do eh 'i ocasiona uma onda de atividade
cerebral. Se a inteligência da pessoa não for suficientemente clara e bri-
lhante, isso redundará n as ilusões profundamente arraigadas no subcons-
ciente.
Quem tiver profundas crenças religiosas pode ter a ilusão de ouvir
a voz de Deus ou de Buda. Freqüentemente , a voz falará sobre o passado

52
ou o futuro, e essa informação pode estar bastante correta, a priori, pelo
menos nas pequenas coisas. Dessa forma, essa pessoa poderia pensar que
tem a clariaudiência. Na verdade, o que ela ouve é uma grande montagem:
trata.se de uma mistura de experiência anterior do que antes foi ouvido,
pensado e conhecido. Esse tipo de clariaudiência poderia ser usado para
predizer pequenos assuntos, mas não dará resultados com os grandes acon-
tecimentos. A pessoa se atém à idéia de que essas vozes são reais, entra
num estado de Mara, ou ilusão. Isso mostra que a mente é receptiva às
impressões, mas não se trata de um caso de verdadeira clariaudiência. Nin-
guém deveria ficar intrigado ou comovido com essa reação. Em vez disso,
poderia algumas vezes engolir a saliva e liberar as sensações na sua cabeça.
Isso requer uma mente forte e uma vontade persistente. Dirigindo o ch'i
para baixo, esse estágio será superado, passando-se para o seguinte.
Idealmente deveríamos usar o Kung Fu interior taoista, os exer-
cícios corporais especiais e os métodos da yoga e do Budismo esotérico, e
requisitar tratamentos médicos sempre que necessário.
Toda vez que ocorrerem transformações do eh 'i durante os diversos
estágios da meditação, a atenção da pessoa muitas vezes recairá sobre suas
sensações. Quando o eh'i chega ao cérebro, a atenção a essas sensações tor-
na-se especialmente forte. Isso pode causar a contração da parte inferior do
abdômen e a contração da parte superior do diafragma, ou a perda de ape·
ti te e prisão de ventre temporária.~ correto o uso de agentes antiinflamató-
rios ou catárticos de vez em quando. É melhor, no entanto, ter algum co-
nhecimento e experiência de medicina, não importa se de medicina popu-
lar chinesa ou ocidental.
Segundo a medicina chinesa, os pulmões e o intestino grosso estão
intimamente ligados um ao outro. Segundo se vê, o coração, o intestino
delgado e a bexiga também estão relacionados. Algumas vezes pode-se
fazer uso de exercícios respiratórios para acalmar o eh 'i nos pulmões a fim
de ajudar a curar a prisão de ventre. Demasiada tensão no ~oração po.de
ocasionar mudanças na bexiga; às vezes micção anormal, assim como a m-
continência urinária num caso de extremo terror. Isso comprova o fato de
que os estados mentais podem afetar a fisiologia. Portanto, se uma pessoa
não puder encontrar um mestre criterioso para instruí-la, deve recorrer às
fontes m édicas numa tentativa de encontrar auxílio.

Reações na Parte Anterior da Cabeça


Depois de passar pela parte de trás da cabeça, o eh 'i passa para a
parte da frente . A sexta reação da meditação não é complicada como a
quinta, que acabamos de comentar. O fenômeno mais caracte.rístico é
uma sensação de dilatação nas têmporas e, novamente, certa sonolência.

53
Aqueles cuja energia e eh 'i são relativamente abundantes exp erimentam
muitas vezes uma sensação de inchaço ou um leve estímulo na ponta do
nariz e no ponto central entre as sobrancelhas. No entanto, pensamentos
e imagens serão naturalmente mais frac~ e em menor número. Embora
a pessoa possa sentir-se levemente letárgica, as pressões fisiológicas e men-
tais são consideravelmente menores que os sintomas descritos nos pará-
grafos anteriores. Contudo, o desconforto pode ser causado por uma pos-
sível congestão nos olhos e por estrias vermelhas na conjuntiva.
Quer uma pessoa abra ou feche os olhos, verá luzes como a do Sol
ou a da Lua, ou mesmo fluorescências. A luz será relampejante ou imóvel.
Algumas vezes pode-se observar as pessoas e os fatos acontecendo dentro
dessa luz e pode-se compreender o que acontecerá no futuro. Algumas pes-
soas pensam que se trata de clatividência. Algumas, por causa do mau en-
tendimento da doutrina do Budismo, acreditam que esse fenômeno de luz
é a luz de sua própria Natureza Ori~al. Os zen-budistas chamam a isso
de ilusão da luz e os taoistas também j.!f consideram uma ilusão. Essa luz
certamente é devida às flutuações do eh 'i no cérebro, o que provoca pen-
samentos ou imagens e altera os padrões das ondas mentais. Esse é um
fenômeno temporário e não pode ser considerado real.
A visão de cores incertas e cambiantes, quer em visões, quer em so-
nhos, pode ser devida a doenças latentes das vísceras. Se os rins e os ner-
vos genitais se deteriorarem, enfraquecerem ou adoecerem, o fato se refle-
tirá no fenômeno da luz que será vista na fonna de pontos pretos ou na cor
preta sólida. Se a doença for no fígado, a cor parecerá ser azul; se 0 cora-
ção ficar doente, a cor visível será a vermelha; se os pulmões não forem
saudáveis, a cor que se verá será a branca; se o baço ou o estômago esti-
verem doentes, a cor vista será a amarela; se a vesícula biliar estiver mal,
a cor vista será o verde.
Do ponto de vista da mística chinesa, ver a cor preta nos sonhos vi-
sões ou alucinações denota costumeiramente problemas e desastres'. A
cor azul indica tristeza, luto ou pesar, e o verde significa obstáculos causa-
dos por alucinações, ou Mara. O vermelho indica mau-agouro. O amarelo
e o branco são cores auspiciosas, indicando pessoas calmas e situações re-
gulares. Todavia, estas não são regras fixas.
Devemos compreender que todos os fenômenos são causados pela
mente. A mente pode distorcer, bem como transformar as coisas. Se po-
sicionarmos o corpo e a mente de forma que fiquem corretos, os estados
de Mara ou de alucinação podem ser transformados em estados de san-
tidade. .b tudo uma questão da mente. O princípio correto é refletir sobre
o nosso comportamento mental e examiná-lo.

54
Se alguém não souber como dirigir e ajustar convenientemente o
eh 'i na p arte anterior da cabeça, então ele fluirá para o nariz e ativará os
males latentes de suas cavidades. O muco pode escorrer continuamente dos
seios nasais. Uma escola taoista considera essa perda o ehing e o eh '1:
Por causa disso, devemos voluntariamente inibir a descarga de modo que
nada de vital seja perdido. Evitar a perda do muco nasal poderia ser útil
para certos fins; entretanto, a questão é como evitar essa perda. Em pri-
meiro lugar, é essencial fazer um exame para ve rificar se o muco não con-
tém toxinas ou bactérias.
Somente se um médico determinar que o muco é inofensivo se po-
derá aspirá-lo de volta pelo nariz e impunemente drená-lo para o estômago.
Nessas condições clinicamente aprovadas, o corrimento nasal cessará
depois de alguns dias e se poderá entrar num estado melhor de meditação.
Algumas pessoas n ão sabem que esses tratamentos são exeqüíveis e tolera-
rão o corrimento nasal durante anos até que este provoque uma outra do-
ença.
Muitos monges e taoístas que se adiantaram até o estágio onde o
eh 'i atinge a parte da frente da cabeça não sabem como tratar da coriza.
Eles gostam de citar os casos de Dan Ts'an e de Han Shan que, para aten-
de r aos requisitos da etiqueta e por causa de escrúpulos, permitiram o cor-
rimento de muco nasal até que este atingisse os ombros. Esse fenômeno
me incomodou durante três anos, até que um dia eu, repentinamente, com-
preendi a possibilidade de inal<U" e deglutir o muco, como um meio de re-
solver o problema. Depois de tratá-lo desse modo, consegui avançar mais.
Minha experiência poderá ser de valia para os que se estiverem ap roximan-
do desse estágio da meditação. Depois que se passa desse estágio, começa-
-se a sentir fragrâncias. Trata-se dos aromas naturais de nossas vísceras e
não de perfumes místicos do meio ambiente.

Reações no Alto da Cabeça


No momento em que o eh 'i passa além da frente da cabeça e corre
para o nariz (compenetre-se de que pod~ dirigi-lo de volta, à vontade),
ele circulará na forma de 'f .Nessa sétima reação, ele chegará ao ce~tro
do cérebro e do cerebelo antes que suba ao alto da cabeça. Quando isso
ocorre, a pessoa naturalmente endireita a sua posição e experimenta um
grande samadlzi
Os taoistas chamam o alto da cabeça de Palácio de Ni Huang, e os
yogues, de A Coroa. Alguns taoistas acreditam que esse é o fenômeno da
abertura completa do Tu Mai. Porém, não é esse o caso. Trata-se apenas
de mudanças ao longo do Tu Mai, mudanças que acompanham essa abertu-
ra inicial do sistema nervoso central. A isso segue-se o estímulo do funcio-

55
narnento do alto da cabeça para aumentar a distribuição uniforme das
secreções endócrinas. Entretanto, nesse ponto, algumas pessoas sentirão
uma dor passageira ou urna sensação de peso no alto da cabeça, corno se
ela estivesse sendo pressionada, ou sentirão urna grande tensão. Isso se
deve ao fato de o canal ch'i na cabeça não estar completamente aberto ou
porque a atenção da pessoa é indevidamente atraída para os sentimentos
e sensações, o que causa preocupação. Se a pessoa conseguir desviar a aten-
ção e esquecer-se da cabeça, deixando-a naturalmente, nesse caso urna sen-
sação muito confortável e revigorante será progressivamente gerada e fluirá
para baixo a partir do alto da cabeça. Esse fenômeno é o antecessor de
Ching An, que significa claridade e calma na meditação budista, incluindo
Chih e Kuan. Neste estágio, ~ensamentos e ilus&:s se enfraquecem e, por
esse motivo, entra-se na primeira etapa do samadhL
Se aflorar uma doce saliva fria, trata-se da secreção endócrina da
glândula pituitária. Isso é descrito pelos taoistas como T'i Hu Kuang Tin
uma iniciação ou consagração pela aspersão de um líquido espumanf'
como manteiga fervente sobre a cabeça. Fala-se nisso às vezes como ~
"Doce orvalho esparramado sobre a Montanha Swneru" ou com
"Néctar do jade líq~ido". Os taoistas ~ vêem como um vinho tônic~ d~
rejuvenescimento e vida long~. Embora isto soe como algo místico ou hi-
potético, tem realmente o efeito de curar doenças e de contribuir para
longa vida. Isso poderá estimular o apetite das pessoas e elas perceb ~a
que podem digerir rapidamente e absorver todos os elementos nutriee~ao
da comida, mesmo depois de comer em demasia. Ao mesmo tempo, ~e~~
tirão muito pouca fome mesmo se ficarem sem comer ou se chegarem a
engolir ar para acab~r com essa f~rne. ~aturalmente, nesse estágio, a pessoa
está repleta de espínto, que se evidenciará em seu semblante iluminado.
_Além disso, ~~3:11d_o o ~h 'i.~stá realmente passando através da cabeça,
havera sons como p1 pt pai pai na cabeça. Essa é a reação induzida pelo
eh 'i nos nervos, pelo trabalho de abertura dos caminhos. O som nada tem
de estranho; é como o som que ouvimos quando tapamos os ouvidos com
a palma das m ãos e só ouvimos o nosso próprio coração e a circulação do
sangue. Entretanto, se a atenção for absorvida por esses sons ou se h ouver
alguma doença latente no Aquecedor Superior,8 então virá o desejo de
sacudir freqüentemente a cabeça. Se a pessoa não conhecer o tratamento
para isso, ou se não conseguir desviar a atenção do fato, se criará uma espé-
cie de estado doentio. Por o utro lado, se o meditante sabe como ficar cal-

8
O Aquecedor Superior faz parte do Aquecedor Tríplice Meridiano, conhecido dos
acupunturistas. O Aquecedor Tríplice inclui o Aquecedor Superior, localizado na par-
te superior do abdômen, e o Aquecedor Inferior, situado na parte in fe rior do abdômen.

56
mo e tranqüilo e puder ignorar essas sensações, então atingirá naturalmente
o Ching An descrito anteriormente. Há algumas pessoas que experimentam
esse ~enômeno em sua juventude, sem praticar a meditação. Podemos pen-
sar msso como se fosse um tipo de neurose; mas, se não for estimulada por
outros fatores, não se trata de uma doença.
Se acontecerem reações que envolvem a cintura, as costas, a parte
posterior da cabeça, o alto da cabeça e a área atrás das sobrancelhas no
centro da cabeça, poder.se-á supor que houve a abertura do Tu Mai To-
davia, essas reações não indicam que o Tu Mai está aberto; elas são simples-
mente as reações físicas iniciais. Quando o Tu Mai for aberto realmente,
haverá sintomas especiais e sempre em correspondência· direta com Jen
Mai. As sensações e impressões fisiológicas mencionadas anteriormente
são de somenos importância.
Quandó o ch'i está circulando na cabeça, tem-se continuamente a
sensação de intumescimento, de dor e outras sensações de desconforto.
Ou então, pode-se dormir profundamente e com muita freqüência, ou
permanecer adormecido durante um longo período. O ch'i afeta os nervos
das órbitas, a membrana dos tímpanos, a conjuntiva e a cavidade nasal
e à vezes causa sintomas semelhantes às doenças. Além disso, algumas pes-
soas sentem que a cabeça fica pesada e os pés leves, ou se tornam irritá-
veis, facilmente zangadas, constipadas ou excitadas, de modo a sofrer in-
sônia ou a não poder dormir tranqüilas. Os leitores não devem se atemori-
zar com a possibilidade desses efeitos danosos causados pela abertura do
Tu Mai através da meditaçã'o. Nem todos sofrerão os fenômenos acima
descritos; o que acontece depende do sexo, da idade, dos estados mentais
e fisiológicos de cada um. Além do mais, as sensações de dor causadas
pela meditação não são na verdade as dores de uma doença verdadeira,
embora sejam semelhantes.
Concluindo, no momento em que o ch'i sobe à cabeça, a pessoa já
terá experimentado certo número de efeitos. Ela deve acalmar a mente
para manter a serenidade e esperar a descida de eh 'i até a laringe, a área
epigástrica, a área do peito, a área do estômago, ao Ta11 Tien inferior,
e à área renal, de onde o eh 'i flui para o ápice dos órgãos genitais. Essa
seqüência é o Jean .Mai das artes médicas chinesa e taoista, e corresponde
às áreas mais importantes do sistema nervoso vegetativo da medicina
ocidental.

10. Como Abrir o Jen Mai


Se o eh 'i desce para passar ao longo do Jen Mai, segundo a seqüên-
cia mencionada acima, esse é um problema prático. Os que praticam a me-

57
ditação e o Tao, usualmente seguem os textos taoístas, bem como outros
livros de meditação. Essas pessoas, geralmente, não têm experiência ou
estão preocupadas com os próprios pontos de vista, que às vezes são fei·
tos de ilusões inteiramente subjetivas. Conseqüentemente, elas consideram
o uso do Jen Mai como o passo seguinte à ocupação do Tu Mai. A técnica
de tentar dirigir voluntariamente o eh 'i por sua própria consciência leva a
pessoa a esperar ter essa impressão ou a tirar essa conclusão. Entretanto,
do ponto de vista da prática do Tao através da meditação, esse é um con-
ceito superficial. Este capítulo tentará esclarecer o modo pelo qual o eh 'i
passa através do JeanMai; assim, o leitor será capaz de entender e integrar
estas noções.

O Centro do Jen Mai é a "Casa Central"


Segundo as artes médicas do Taoísmo e da China, "Casa Central"
é um termo abstrato. ~ m~or área de sua _operação é o estômago, que
pertence à terra. Isso e de_nvado d~s conceitos abstratos de yin-yang, e
dos oito trigramas do I Chmg, dos cmco elementos: água, terra, fogo, ma.
deira e metal.
Durante as dinastias Clún e Yuan havia duas escolas d~ medicina hi
nesa. Uma delas enfatizava o tratamento do eh 'i estomacal. A outra us cal~
mente e nfatizava a nut~ção d?s ~s, qu_: eram ass~ciados com 0 ele~e~to
1
água: K an. Esses conceitos pmrutivos sao todos onginários do simboli
.
abstrato de ymg-yang e dos 01·to t ngramas.
. Os quatro diagramas e os cinco
smo
elementos sã'o baseados na terra. As nove casas e os oito trigramas não
podem ser separados do Jen, que fonna a base dessas teorias. Jen é um d
ramos celestiais e pertence ao elemento água. os
O baço_~ o estômago são_ m~to i!1'1portan~e~ para a saúde, a longe-
vidade e a pratica ~o Tao. O pnme1ro sintoma seno .de qualquer doença é
a mudança no apetite. Por exemplo: as pessoas resfnadas ou gripadas não
têm bom apetite: indício de problemas intestinais e estomacais. Porém
apanhar uma gripe ou resfriado não faz muita diferença para os que tê~
boa digestão. O estômago é ligado, acima, ao esôfago e, abaixo, com 0 in-
testino grosso, o que afeta o funcionamento dos rins e das glândulas
sexuais.
O primeiro sinal da abertura do Jen Mai é o da vibração ou da efer-
vescência do eh 'i no intestino e no estômago; sente-se essas vibrações como
ar borbulhando dentro do estômago. Depois dessa reação inicial, existem
duas possibilidades. Em primeiro lugar, sente-se um forte apetite, caso em
que não se deve comer demais. Em vez disso, deve-se ter o cuidado de
comer alimentos nutritivos e que possam ser facilmente digeridos e absor-
vidos pelo organismo. Em segundo lugar, perde-se o apetite e sente-se

58
como se se estivesse repleto de eh 'i. Nesse caso, deve-se comer menos ou
continuar jejuando até o apetite voltar. Depois, pode-se comer menos mas
com maior freqüência.
Como complemento do primeiro sintoma descrito acima, pode-se
ter soluços, bocejos, gazes intestinais ou todos os três ao mesmo tempo.
Algumas pessoas acreditam que expelir os gases intestinais corresponde
a uma perda de vitalidade, ou de eh 'i, porque entendem mal os sutras
taoístas ou porque foram mal-informados pelos seus professores. Conse-
qüentemente, elas tentam em geral contrair vigorosamente o músculo
do esfíncter para evitá.los. Isso causa o acúmulo de gases que irritam as
vísceras e resultam em prisão de ventre, em fístulas anais e em outros
males das entranhas. Geralmente, a teoria de que não 'se deve permitir a
dissipação da própria vitalidade ou eh 'i não se aplica neste estágio. Deve-
mos, pois, soluçar, bocejar e expelir os gases intestinais sempre que for
necessário, para aliviar a pressão.
Dois fenômenos necessitam de esclarecimentos:
1) Temos soluços e longos bocejos como se estivéssemos doentes do
estômago;
2) Defecamos durante dez a quinze dias como se tivéssemos uma
disenteria séria.

Soluços e bocejos freqüentes são um sintoma do ch'i que se move


para cima (tal como o prana ascendente da ioga), fluindo através do esô-
fago. Depois que o eh 'i se precipita e abre o canal do esôfago, sente-se
um frescor na cabeça e no peito. Além disso, uma salivação doce e refres-
cante fluirá continuadamente das glândulas salivares. Os livros taoistas
descrevem isso como um sintoma do vinho da longa vida, um jato de or-
valho doce ou de jade líquido e de néctar. No passado, aqueles que apren-
deram os ensinamentos esotéricos budistas na província de Hsi Kang e
no Tibe te davam grande valor aos que emitiam longos soluços e grandes
bocej os, desde que esses sintomas indicavam que a pessoa tinha atingido
um resultado considerável no aperfeiçoamento de seus canais de
ch'i.
Uma pessoa normal, que defeca freqüentemente , quer tenha ou não
diarréia, poderia ter um sério desarranjo estomacal ou wna dolorosa doen-
ça intestinal, como a colite. Por outro lado, quem sente esse fenômeno
através da reação do c/1 'i induzida pela meditação não terá dores, mas sensa-
ções refrescantes na cabeça e nas entranhas. Se a pessoa sentir uma ligeira
fraqueza, não tem importância. Deverá evacuar uma espécie de líquido
denso de cor púrpura escura no fim do fenômeno, semelhante à disen-
teria. Esse denso líquido vermelho-escuro indica que todos os resíduos

59
sujos depositados no intestino e no estômago serão completamente elimi-
nados. Depois desse estágio, entra-se num novo estágio, ou num samadhi
mental, ou num estágio de sensação fisiológica. Mas ainda é preciso ter
cuidado com a dieta, para não comer demais ou comer à-toa.
Nesse momento, deve-se evitar o relacionamento sexual. Se você
tiver um marido ou uma mulher, deve manter relações o mais distanciadas
possíveis. Os que não puderem seguir estas advertências sobre sexo e dieta
terão de recomeçar tudo de novo e meditar por muito tempo, até que o
fenômeno parecido com a diarréia tome a ocorrer. Falando de modo geral,
as pessoas muitas vezes progridem e então falham, começando repetidas
vezes o processo .da meditação. Es:e é um d~s. po~tos-chave. Se alguém
favorecer os deseJOS mwidanos - e desnecessano dizer -, não atingirá 0
objetivo da meditação.

Início do Ch 'i Estomacal


A faringe comunica-se com o esôfago, na parte de trás, que leva
estômago, e com a traquéia, na pa:te da frente, qu~ leva aos pulmões. ;~
alguém tiver ~guma doença no siste1:1a da tr~qu~ia, ou se apanhar um
resfriado ou gnpe, ocorre a tosse. EX1stem dois tipos de tosse. u .
. · ma e a
tosse seca, sem catarro, e a outra e a tosse com catarro A tosse
. A1 . · seca
geralmente se deve à bronqmte. gumas tosses catarrais estão relacio d
com os males do estômago, que é ligado ao esôfago. na as
A pessoa que pratica a meditação, depois do início do eh 'i est
• d . oma-
cal e do fenomeno os so1uços persistentes e dos longos bocejos pod .
sentir alguma coisa bloqueando o peito, algo que deseja vomitar mas e!a
pode. Se esperar ate· fi1car rep leto de eh •·z as.cen dente, repentinamente vomi-
nao
tará um catarro denso de uma cor turva cmza-escuro. Isso indica a abert _
ra inicial do eh 'i através do esôfago. Os taoistas se referem a isso como ~s
"doze pavimentos repetidos". Os budistas esotéricos chamam-no de
chakra da garganta. Na verdade, ambas as expressões se referem ao siste-
ma da laringe para o esôfago e ao estômago.
·Os praticantes da doutrina esotéri~a muitas vezes acreditam que
uma pessoa cessará de ser perturbada por ilusões depois que 0 seu chakra
da garganta, o canal ch'i, estiver aberto. Isso não está claro. Depois de abrir
o chakra da garganta, o pensa.n_:ento diminui e os pr~~emas n ascidos das
emoções e das preocupações sao acalmados. Mas 1sso ·-capacitará a pessoa
a atingir completamente a "não-ilusão", que não pode ser alcançada sem
a prática de samadhi mental.
Qual a importância do esôfago para a saúde mental e fisiológica?
Ele é extremamente importante. Uma vez que é o caminho principal
para o transporte do alimento, os resíduos da comida são depositados·

60
em suas paredes. Esses resíduos não são removidos automaticamente ape·
nas pelas funções fisiológicas. Dia a dia, os depósitos se acumulam nas pa·
redes do esôfago e podem causar muitos problemas, como o câncer. Por
exemplo, se se encher um copo com leite, não importa o que acontecer
ao leite, algumas partículas dele aderem à superfície do copo. Alguns yo-
gues tentam limpar o esôfago e o estômago engolindo uma tira de pano
comprida. Porém, limpar o esôfago através da subida do eh 'i é muito mais
primoroso que limpá-lo usando esse método.

"As Pontes Superiores e Inferiores dos


Pequenos Pãssaros" dos Taoístas
Depois que o esôfago é aberto pelo eh 'i estomacal ascendente, o
peito abre-se e amplia-se. Quando as pessoas estão num estado de extre-
ma tranqüilidade, elas podem até mesmo ouvir sons estalantes em volta
do coração. Em seguida, o eh 'i, entrando no abdômen inferior, causará
duas reações quase espontâneas: uma sensação de algo se afundando
e o enrolamento da língua. Um dos mudras básicos de meditação no Bu-
dismo, no Taoísmo e nos ensinamentos esotéricos da yoga é o de curvar
a língua a fim de tocar a gengiva do incisivo. Falando de modo geral, o
propósito de tocar essa parte da gengiva é estimular e facilitar a secreção
da saliva. Parte da saliva é secretada pela glândula pituitária, que produz
o rejuvenescimento. Portanto, na meditação, pode-se encher a boca desa-
liva colocando-se a língua na glândula salivar da gengiva do dente incisivo;
essa saliva pode ser engolida. Algumas vezes ela até tem um sabor ligeira·
mente adocicado e aromático.
Quando o eh 'i estomacal ascende para passar através do esôfago, a
laringe pressiona espontaneamente para baixo e a língua se curva para to-
car a úvula, a fim de fechar a laringe. Nesse estágio, a respiração, a inala-
ção e a exalação, quase param. Isso é descrito como a utilização das "pon-
tes superiores dos pequenos pássaros", como "a subida da escadaria do
céu". Na yoga, recebe o nome de clz'i enga"afado. O fenômeno de um
"condor gritando na parte posterior da cabeça" é percebido como sons es-
talantes. O que é conhecido como "a luz dourada que aparece diante dos
olhos" se toma cada vez mais claro. A mente fica mais tranqüila e sem
ilusões.
Deve-se dedicar uma atenção especial para o eh'i descendente que é ge-
rado no estômago para alcançar o Tan Tien Inferior. Para uma criança sem
nenhum conhecimento ou experiência de sexo e que cultiva o Tao, este
problema é diferente . Para uma pessoa que já se iniciou nas atividades se-
xuais, como a masturbação e as poluções noturnas, não é fácil o eh 'i al-
cançar Tan Tien. Quando o eh 'i descendente está passando para o Tan Tien

61
inferior, os nervos que se estendem para cima do baixo-ventre e do púbis
registrarão uma dor aguda. Depois que passar essa dor, no caso do homens,
o ch'i alcançará diretamente o períneo e irá através do pênis; no caso das
mulheres, porém, ele chegará apenas até o útero. Neste momento, apenas
uma pequena atenção poderá fazer o eh 'i retroceder. A glândula prostá-
tica e a área do períneo se contrairão firmemente; o baixo-ventre se forta-
lecerá com a respiração interna, que é o fenômeno da respiração leve na
parte inferior do abdômen. Isso é conhecido no Taoísmo como a "ponte
inferior dos pequenos pássaros".
Depois de avançar mais, a respiração que sai da boca e do nariz,
bem corno a respiração interna, cessarão por completo. Os órgãos genitais
e os testículos do homem se retrairão compactamente, como os de um be-
bê. Esse fenômeno inicial, conhecido como "o pênis retráctil igual ao do
cavalo", é um dos trinta e dois sinais de um Buda. Nesse estágio, nem 0
comer demais ou o jejuar engolindo a~ faz qualquer di!er~nça, desde que se
deu 0 primeiro passo para o samadh1. Entretanto, ha amda um longo
minha a percorrer antes que se atinja a verdadeira abertura de Tu k' ~a-
de Jen Mai, o verdadeiro. sarnadlu. e o es t agio
. .
que fi1ca além do homem
ia1 ee
do céu.
Nas seções anteriores discutimos as diversas reações que 0 eh 'i c
em Tu Mai e Jen .Mai. Em geral, as pessoas vêem essas reações aos fiau~a
,.,.., u· · d r u . eno-
menos como a abertura de 1 u ma1 e e Jen mal. Essa é uma idéia absu d
Esses fenômenos serão úteis para a saúde e a vida longa se cuidarmos dr ª·
. . e1es
de forma adequa d a. S e uma pessoa deseJa sinceramente cultivar 0 T
então deve distinguir com cuidado o falso e o ve rdadeiro, e não consi~~~
raro ilusório como real.

11. O Jejum e a Função do Ch 'i Central

Se o eh 'i estomacal se acende verdadeiramente no Palácio Central


da pessoa e galga doze pavimentos para passar pelo esôfago, a língua natu-
ralmente tocará a ponte supen·or dos pequenos pássaros, ou a úvula e a
respiração localizada nas cavidades internas do nariz. A língua receberá
diretamente a secreção endócrina distribuída pela glândula pituitária, ou
a saliva que desce da cabeça. A pessoa pode engolir constantemente esse
doce líquido fragrante. ·
Dentro em pouco não.se necessitará de nariz para respirar e a respi-
ração inferior cessará naturalmente. Busca-se obter esse estágio forçando-se
a pessoa a praticar o eh'i enga"afado da yoga e a respiração auto-obstrui-
dora do Taoísmo. Finalmente, será maior a resistência às condições ex-

62
teri.ores, como o calor, o frio, a umidade e o comer ou o jejum. Nesse es-
t~?1º• a pessoa será capaz de jejuar durante um longo período e, conse-
quentemente, necessitará de menos sono. No entanto, é preciso orientação
de um professor sábio para restringir o alimento e a bebida da maneira
apropriada, até que finalmente se possa jejuar.
. Surge um tipo de samadhi nunca antes experimentado, embora esse
SeJa apenas o passo inicial. Contudo, ainda se necessita de alimento nutri-
tivo para manter a força interior necessária à abertura dos carfis eh 'i das
glândulas genitais, assim como os de Yin Ch 'iao, Yang Clz 'iao, Yin Wei e
Yang Wei dos oito meridianos suplementares.
Quando se deve parar de comer temporariamente e quando se deve
recomeçar a comer? Isso depende da situação do momento e não pode ser
escrito no papel como se fosse a estratégia de uma batalha. No Taoísmo,
essa situação é chamada de Ho Hou, a força do fogo para cozinhar. Tra·
ta-se de ajustar a força de um fogo para cozinhar desde que isso requer um
auto-entendimento e atenção pessoal. Regras inflexíveis e instruções não
devem ser adotadas, pois é benéfico manter a capacidade para mudanças.

12. Um Ventre Protuberante não é Tao

Quando houver a mais ligeira indicação de que o Jen Mai se abriu,


a respiração interior ou a respiração em tomo da área do Tan Tien inferior
começa a funcionar. A maioria das pessoas se inclina a mergulhar natural-
mente o eh 'i em Tan Tien, e fazem com que a baixo-ventre se encha e. se
tome convexo. Então, elas imaginam que conseguiram o estado descnto
num poema pelo imortal Lu Tong Ping: "Com o tesouro em Tan Tien não
se precisa buscar o Tao com a não-mente contra o mundo fenomenológico
não se precisa procurar' 0 Zen." De fato, isso é um fenômeno bastante in-
desejável.
Se alguém continuar a se concentrar no Tan Tien , causará efeitos
adeversos nos rins, nas glândulas genitais e no intestino d~lgado e gross~,
e não poderá abrir 0 Tai Mai ou o canal eh'i em volta da cintura com faci-
lidade. Nesse estágio, deve-se contrair ou diminuir o baixo-ventre do púbis
até o umbigo e forçar o eh 'i a abrir a área do Tai Mai. Porém, não se deve
prestar muita atenção a isso, senão se fica preso por essas sensações.
Depois de um longo tempo, o eh 'i será gerado do períneo, seguindo
os meridianos e veias de ambas as pernas e pés. O eh 'i se moverá para
baixo, passo a passo, até atingir a sola dos pés e gradualmente eliminará
qualquer sensação, dor, palpitação, inchaço, entorpecimento, letargia e
prurido. Quentes e suaves sensações brilhantes de ausência de pressão ou

63
de insignificância e um orgasmo de felicidade acontecerão em cada nervo
e, talvez, em cada célula das pernas e dos pés. Nesse estágio, fica-se feliz
por cruzar as pernas e meditar durante longo tempo para continuar nesse
êxtase maravilhoso. -
Depois de meditar bastante tempo ne~te estágio, o eh•; seguirá nova-
mente a rota do Tu Mai, subindo para a cintura e as costas e em seguida
circulando livremente entre o plexo nervoso das omoplatas na direção da
palma das mãos e da ponta dos dedos. O corpo inteiro se toma tão flexí-
vel que parece não ter ossos. O eh 'i circulará de novo e subirá à frente da
cabeça e descerá enchendo o corpo todo - braços, pernas e pés - , seguin-
do-se uma respiração fraca. A pessoa sente como se seu corpo não exis-
tisse.
Como afirmou Lao Tsé, "Pode-se trabalhar com o eh•; para se tor-
nar tenro como um bebê!" Nesse estágio, conseguiu-se a abertura inicial
do Jen e do Tu Mai. Para uma longa vida saudável ou para o cultivo adian-
tado do Tao, a importância da_ab7rtura d~s canais eh 'i em ambas as pernas,
através do ch'i descendente, nao e menos unportante que a abertura de .J, n
e Tu Mai. Quem não experimentou o "orgasmo de felicidade", de Cal e
maciez e leveza d as pernas nao- pode supor que a bnu . o Jen
r e 0 Tu u or,.
JYlQl.

13. O Corpo Humano e a Importância dos Pés

A vida vegetal se origina das raízes que penetram fundo no solo


O formato das raízes de ginseng é muito semelhante ao do corpo humano.
com suas duas pernas e pés. Logo, podemos usar essa analogia para ilus~
trar a importância dos pés.
Os humanos são a forma ?e vida mais dotada de espiritualidade.
Diferentemente das plantas, as ra1zes do corpo humano ; se situam no ápi-
ce da cabeça. O espaço acima da cabeça humana é semelhante ao solo abai-
xo das plantas. As pernas e pés do humanos são parecidos com os ramos e
folhas de uma planta.
Se, na prática da meditação, o eh'i não pode alcançar as pernas e os
pés e circular livremente através dos terminais nervosos dos braços e das
pernas, embora o tronco não se degenere, o corpo será como uma árvore
com ramos e folhas mortas. Nesse caso, não se terá a capacidade de reco-
brar a vitalidade através .da meditação, pois se estará meramente esperando
a morte .
Se o eh 'i pode fluir livremente nas pernas e nos pés, a cintura natu-
ralmente se endireitará e os músculos dos quadris podem ser suavemente
contraídos e relaxa~os . Ao caminhar, sente-se como se se estivesse cami-

64
nhando nas nuvens ou o chão parece um cobertor macio, ou talvez possa sen-
tir-se como que caminhando sobre uma esponja. Se se for bom em artes
marciais, sente-se o corpo leve como uma folha, ou como se se pudesse
suportar o peso do corpo apenas num dedo do pé por muito tempo, sem
se cansar. Por outro lado, quem estiver doente ou muito fraco pode ter

(
sensações semelhantes. Entretanto, embora sejam sensações parecidas com
as descritas acima, elas certamente não são de modo algum do mesmo tipo.
Deve-se cuidar para não confundi-las.
Essa rude caracterização das reações que acontecem na abertura do
Jen Mai não revela todos os detalhes. Na verdade, o Jen Mai é muito mais
difícil de abrir que o Tu Mai.
A maioria dos livros sobre meditação linúta-se a descrever as mais
óbvias reações do Tu .Mai e os mínimos detalhes são onútidos. Além disso,
os autores desses livros falham ao descrever as reações que ocorrem quan-
do o Jen Mai é aberto.
No Taoísmo e nas artes médicas chinesas, o Jen Mai inclui o siste-
ma nervoso vegetativo e todas as funções do sistema endócrino e visceral.
Se uma pessoa puder abrir o Jen Mai e o eh 'i puder circular livremente,
será então muito saudável e terá reações ótimas em todas as vísceras e nas
funções metabólicas. No Taoísmo se diz que, "quando um canal Mai ou
do eh 'i é aberto, cem Mai se abrirão". Esse único Mai é o Jen Mai.

14. Argumentos Sobre os Canais Ch'i


Em tempos remotos, as discussões sobre Jen Mai, Tu Mai e os oito
meridianos suplementares foram encobertas por estranhos e ambíguos
disfarces. Fez-se uma tentativa para remover algumas dessas coberturas
criadas por explicações anteriores.
O processo e as reações de abertura dosCh 'i Mai são diferentes para
as diferentes pessoas, dependendo do sexo, da idade, do vigor e da debi-
lidade do corpo. Além disso, pessoas diferentes experimentarão diferentes
sensações durante esse processo devido às diferenças de inteligência e de
estados mentais. Contudo, os princípios e os processos descritos acima são
bastante generalizados para se aplicarem a quase todas as pessoas.
Além disso, o Tu Mai e o Jen Mai do Taoísmo, o Budismo esotérico
e a yoga indiana também enfatizam a importância dos canais c(z 'i. Contu-
do, o último enfatiza os três Mai e os quatro chakras ou os três Mai e os
sete chakras, que são muito dife rentes dos oito meridianos suplementares
do Taoísmo.
Surgiram argumentos, refutações e contradições arrasadoras entre
os que praticavam o Taoísmo, o Budismo esotérico e a yoga. O ponto-cha-

65
ve é que essas pessoas não pensaram com bastante profundidade para com-
preender todos os lados da querela. Se uma pessoa está estudando o Tao-
ísmo, o Budismo esotérico ou a yoga, deveria entender que o único meio
de confirmar esses ensinamentos é supor que a mente e o corpo são ins-
trumentos para experimentar esses métodos e comprovar as exigências
da realização. Não existe outro meio.
Desde que estejamos usando a mente e o corpo na prática, é pos-
sível, por usarmos métodos diferentes, a recolocação da posição das vís-
ceras, dos nervos e do esqueleto em arranjos diversos? É claro que não!
Não há fatos concretos que provem que existam reais diferenças entre
essas diversas escolas. Entretanto, a teoria que uma pessoa aceitar irá
influenciar seus conceitos e sensações e produzirá as correspondentes alu-
cinações. Se alguém insistir que há diferenças reais, isso é porque presta
atenção a certas sensações e enfatiza conceitos específicos, o que não sig-
nifica que a mente e o corpo de alguém possam se r reorganizados de mui-
tas maneiras.

15. Os Canais Ch'i do Taoísmo e do Budismo


No Taoísmo, o ch'i Mai foi discutido pela primeira vez por Chuang
Tze, num capítulo de um de seus livros intitulado A nutrição da vida
Nesse capítulo, ele recomenda "seguir Tu Mai como se fosse um meridia~
no" e proclama que todos os canais eh 'i esfão situados no alto da cabeca.
Desde então, Tu Mai e Jen Mai foram considerados importantes para' 0
aperfeiçoamento da meditação. As figuras .15.2 a 15.9 mostram os vários
canais e revelam como a energia vital corre através do corpo.
Além do Jen Mai e Tu Mai, que são os principais canais do eh 'i
os oito merídianos suplementares estão centralizados no sistema de canai~
do eh 'i. Entretanto, a doutrina esotérica tibetana, que se originou nas an-
tigas tradições hindus, é inteiramente diferente dos métodos taoís tas
de aperfeiçoamento. Aceita-se que existem três Mai ou três canais de
eh 'i e sete chakras no corpo humano: o Mai esquerdo, o direito e o central.
Os sete chakras mencionados na doutrina esotérica tibetana são, a partir
da base, o chakra raiz, o chakra do umbigo, o chakra do coração, o cha-
kra da garganta, o chakra da sobrancelha, o chakra da coroa e, acima da
cabeça, o chakra sagrado (ver Fig. 15.1).
A teoria do Mai de eh 'i no Budismo esotérico e na yoga ab range as
funções do eh 'i dos cinco elementos e do Buda das cinco direções, que
incluem o ch 'i ascendente, o ch'i descendente, o movimento de ch 'i no
ventrículo central, o eh 'i em movimento lateral para a esquerda e do eh 'i
e~ movimento lateral para a direita.

66
o------ Chakra sagrado
Chakra da coroa

Chakra da sobrancelha

Chakra da garganta

Chakra do coração

Chakra do umbigo

Mai direito
Mai central
Mai esquerdo Chakra da raiz

Figura 15.1
Os Sete Chakras e os Três Mai
5 5 5

~
3

,,
:.;..!. . ~.
: ~ .:

d ·
.... -1)

Figura 15.2
Tu Mai, o Vaso Dirigenre

O Tu. Mai começa na cavidade pélvica, passando através da ponta do cóc-


cix e sobe pelo centro da coluna vertebral (1 ). Move-se pelas costas, co·
municando-se com os rins na região lombar (2) e continua a subir pela es·
pinha (3). Passa através de um ponto na altura da extremidade superior
das orelhas (4) e alcança o alto da cabeça (5). Daqui, desce pelo meio do
rosto (6), move-se na direção da ponta do nariz (7) e termina abaixo do
septo, sob o lábio superior.
O Jen Mai se origina no perf-
neo (1 ), e se move através
da região púbica (2), subindo
ao longo do centro do abdô-
men e do peUo (3). Em se-
guida se dirige para cima atra-
vés do esterno, correndo para
j/
um ponto bem acima da gar-
ganta (4). Daqui, sobe até um
ponto bem embaixo do lábio
~ /

inferior (5) e flui em volta da 1 : :


boca (6), antes de terminar
num ponto no centro das gen-
~. ~
givas, bem embaixo do lábio 1
superior (7).

Figura 15.3
Jen Mai, o Vaso da Concepção
Figura 15.4
Ch'ongMai

Este canal se origina na cavidade pélvica


e desce ao períneo, onde se divide (1 ).
Um ramo superficial sobe ao longo da co-
luna vertebral (2). O canal principal corre
para dentro do abdômen (3). Ele é dis-
persado no peito (4), mas em seguida
flui para encontrar a garganta e para cir-
cular em volta dos lábios (5). ''
'
1
'r1
1
1
4•1
\ 1
1
1
\
\
1
\

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2_,. /
,I , . ,
,,

\ \ 1
', <-' ,. /
f.

Figura 15.5
Tai Mai

Este canal circula a cintura no nivel da


14. 0 vértebra da espinha, bem como o
um bigo, na frente d o corpo. Tai significa
cinto e este canal segue um curso que en·
volve a cintura, ligando os canais yin e
yang.
Figura 15.6
Yang Ch'iao Mai

Este canal começa no lado externo do cal-


canhar (1} e sobe até um ponto abaixo do
osso exterior do tornozelo (2). Em seguida,
passa pela margem externa da fíbula (3).
Corre para cima pelo lado da perna através
da parede abdominal (4), subindo à parte
de trás dos ombros (5). Ziguezagueia atra-
vés do alto dos ombros (6), move-se para a
borda ex terior da boca (7) e então se apro-
funda no osso da face (8). O canal continua
sobre a cúpula da cabeça e termina na sua
base (9).

3
Figura 15.7
Yi n Ch'iao Mai
I
f\ Este canal se origina num ponto
abaixo do artelho interno (1) e
\
1 se move em volta do lado inter-
1
\ 1 ,' no do tornozelo até o ponto na

V
base da perna (2). Sobe ao longo
do lado de dentro da perna e da
coxa (3) e traça um caminho
entre os genitais e o peito (4).
3 Então se volta para dentro, na
direção da garganta (5), e atra-
vessa o maxilar antes de alcançar
o canto interno do olho (6).

I
Figura 15.8
Yang Wei Mai

Este canal se origina no lado do


pé, embaixo do artelho externo
(1 ). Sobe pelo lado externo da
perna (2) e chega até um ponto {
da nádega (3). Em seguida sobe
pelo lado externo do antebra-
ço (4), atravessando os ombros /3
(5) e movendo-se do lado do
pescoço até o lado da cabeça,
na frente da orelha· (6). Então
desce através da testa até um
ponto acima da sobrancelha (7).
Da sobrancelha retrocede, movi-
mentando-se através do alto da
cabeça, terminando na região
atrás da orelha (8).

J
Figura 15.9
Yin Wei Mai

Este canal se origina a mais ou


menos cinco polegadas acima do
artelho, do lado interno do tor-
nozelo (1 ), e sobe ao longo do
lado interno da coxa até um
ponto no baixo-ventre (2). Corre
ao longo do abdômen e cruza a
metade direita do peito antes de
se desviar para dentro para atra-
vessar a parte superior do peito,
movendo-se na diagonal para al-
cançar a borda da parte proemi-
nente da laringe (3). Finalmente,
move-se através do queixo e do
maxilar e sobe até a fronte (4).
Antes das dinastias Wei e Ching, os taoistas enfatizavam a importân-
cia desses cinco elementos e dos eh 'ide cinco cores. Usavam termos como
gavião vermelho, para indicar a frente, tartaniga preta, para se referir às
costas, dragão azul e tigre branco, para designar respectivamente os lados
esquerdo e direito. Essas expressões se referem ao ch'i dos cinco elemen-
tos. Desde a dinastia Sung, os taoístas basearam suas teorias de aperfeiçoa-
mento em J en Mai, em Tu Mai e nos oito meridianos suplementares. Eles
também enfatizaram a importância das funções dos canais clz'i da esquerda
e da direita ou o do dragão azul e o do tigre branco.
Se alguém acumular e unir os conceitos superiores de cada escola
num estudo amplo, num ex.ame cuidadoso, através de pensamento profun-
do e de claro entendimento, saberá que, depois que uma pessoa abre real-
mente o Jen Mai e o Tu Mai durante o progresso feito pela meditação, des-
cobrirá naturalmente a importância do Mai direito, do .Mai esquerdo e do
Mai central.
Se uma pessoa não abrir verdadeiramente oMai esquerdo e o direito
além do Mai central, será absolutamente impossível para ela entrar no
samadhi genuíno, ou na experiência da condensação de slzen, do acúmulo
do eh 'i e do aperfeiçoamento do eh 'i para transmudá-lo em slzen, a fim de
entrar no estado que o Taoísmo denomina de céu dentro do céu. Em ou-
tras palavras, depois que o Jen Mai for aberto, o canal .Mai esquerdo e di-
reito do Budismo esotérico e da yoga naturalmente se abrirão e, conse-
qüentemente, o eh 'i poderá circular sem obstrução. Nesse estágio, come-
ça-se a entrar no Tao e a mover-se além da prática das técnicas da medita-
ção apenas. Poder-se-á também começar a ter alguma esperança de abrir
oMai central ou do meio, que restou.

16. O que é o Mai Central?

A natureza do Mai do meio ou central é um problema interessante.


Tanto os adeptos do Taoísmo como os do Budismo esotérico indagam se
o Mai central tem forma ou se não a tem, e se oMai central é verdadeira-
mente Tu Mai ou Jen Mai. Algumas pessoas acreditam que somente quem
pratica o Budismo esotérico entende o.Mai central. Elas crêem que os anti-
gos taoistas não conheciam a existência doMai central e, portanto, pensam
que os m é todos taoistas da prática são imperfeitos.
Esses argumentos sob re o Mai central nasceram de um mal-entendi-
do. É verdade que os livros que apareceram durante e depois da dinastia
Sung falharam ao mencionar o Mai central. Entretanto, o Huang Ti Nei
Ching, o Clássico da medicina interior do Imperador Amarelo, o Huang

75
Ting Nei Chin Ching, ou A visão do sutra interior do recinto amarelo do
antigo Taoísmo, incluíram discussões sobre o tema.
No Nei Ching, a teoria do .Mai central ( •r
/~)foi apresentada. To·
davia, foi chamado de Ch 'ong Mai ( Ar li\ ). O Huang Ting Nei Chin
Ching pressupõe a importância do palácio do meio ou central; apenas não
enfatiza o Mai central da maneira como o fazem o Budismo esotérico e a
yoga.
Depois que se entende esse conceito e em seguida se estuda a corren-
te principal do Taoísmo na cultura tradicional chinesa, toma-se óbvio que
o Tu Mai e o Jen Mai não são considerados como o Mai central. Por essa
razão, não há necessidade àe se defender a existência do Mai central. Os
livros e os sutras taoistas que apareceram durante a dinastia Sung e depois
parecem ter sido influenciados por seus autores e podem representar apenas
as idéias deles. Eis por que não descrevem o espectro total da principal cor·
rente do Taoísmo. Esse fato não deve ser mal-interpretado. Se uma pessoa
não atingiu o verdadeiro estado do "palácio central eh 'i que resulta em paz
e harmonia" e o estado conhecido como "Quando o ch'i central está har-
monizado, o ch'i está naturalmente estável e o shen será condensado no
lugar certo; a beleza está no interior e flui para os membros" ,9 então essa
pessoa estará falando em vão ao clamar que abriu os oito meridianos su·
plementares mencionados pelos taoistas. De outro modo, não se pode en·
tender o verdadeiro fenômeno da abertura do Mai centrai.
Se alguém abrir os oito meridianos suplementares, atingirá o estado
que Chuang Tzé descreveu como "Nada de sensações de corpo ou mem·
bros, nada de ilusões, uma forma vivente esquecendo a inteligência. Essa
é a grande comunicação (ou a comunicação com o universo inteiro). Cha-
ma-se a isso sentar-se para esquecer".
Nesse estágio, o funcionamento do Mai central será iniciado. Em pri·
meiro lugar, sentimo-nos como se houvesse uma comunicação para cima e
para baixo com o infinito. Um claro estado vazio de "nem uma nuvem em
dez mil milhas de céu azul" aparecerá naturalmente. Quer seja dia ou noite,
as estrelas cintilantes de todo o céu aparecerão diante dos nossos olhos à
semelhança de alguém "que observa a fruta Amra de sua palmeira", como
se supõe ter feito o Buda. Nesse estado, a pessoa pode esquecer todas as
sensações e sentimentos que tem em tempos comuns e pode dispensar
completamente conceitos mundanos como o do ego, bem como pode es-
quecer-se dos argumentos sobre quem está certo e sobre quem está errado.

9 Essa é uma alusão ao Hexagrama 2 do I Ching. As linhas do texto são interpretadas


do ponto de vista da meditação.

76
Quando se abre o Mai central, n ão significa que o fruto total do Tao
foi obtido. A abertura do Mai central nos dá a segurança real para entrar
no Tao. Desta fronteira profunda e sutil, precisamos trabalhar árdua e cui-
dadosamente e necessitamos da instrução de um mestre brilhante.
O Mai esquerdo e o Mai direito se abrirão antes do Mai ~ntral.
Os exercícios respiratórios da yoga, destinados a abrir oMai esquerdo e di-
reito, não podem atuar sozinhos. As pessoas que verdadeiramente abriram
oMai esquerdo e direito descobrirão que seu pescoço está redondo e cheio.
Parecerá que têm um colar em volta do pescoço. Sem este sinal, ninguém
pode afirmar que abriu o Mai esquerdo e direito sem estar falando à-toa.

17. Por que os Canais do Ch'i Vibram

O relacionamento entre a meditação e o clz 'i Mai, as mudanças no Ch 'i


Mai e as reações fisiológicas e seus fenômenos foram descritos nos capí·
tulos anteriores. Entretanto, as reações fisiológicas do eh 'i Mai não são
sempre as mesmas para todos os que praticam a meditação.
Por que as pessoas diferentes com corpos hwnanos semelhantes têm
reações variadas? É porque técnicas e métodos diferentes de meditação
resultam em efeitos e reações desiguais no clz 'i? Isso pode ser explicado de
duas maneiras.
Primeiramente, as reações do elz'i são tais que ele sempre segue,
passo a passo, o Jen e o Tu Mai. Não existe outro caminho do ponto de
vista da meditação e da prática do Tao.
Em segundo lugar, há diferenças entre o eh 'i Mai e seus efeitos fi.
siológicos que dependem de fatores tais como força física, saúde, idade
e sexo.
Técnicas e métodos de meditação diferentes podem ocasionar rea-
ções diferentes, porém essa não é a razão principal para as diferentes rea-
ções dos indivíduos; trata-se de uma simples explicação parcial.
Muitas das pessoas que praticam a meditação experimentam vibra-
ções no corpo. Essa vibração interna às vezes se transforma em contrações
externas do corpo inteiro e de todos os seus mesmbros, caso em que a
pessoa poderá adotar movimentos e posições diferentes, semelliantes às
usadas na yoga e no Tai Chi Chuan. Os aficionados do misticismo podem
considerar o fato como algo de maravilhosamente místico.
No passado, alguns indivíduos se especializaram na prática do boxe
divino, que nasceu por causa da ocorrência desse fenômeno na meditação.
Os praticar1 tes do pugilismo celestial e as pessoas que praticam "acrobacias
nas nuvens'', modalidades originadas desse fenômeno, freqüentemente sen-
tem efeitos e conseqüências desastrosas.
77
É místico esse fenômeno? De modo algum. Em parte ele é fisiológico
e, em parte, psicológico. Até mesmo a metade fisiológica dessa reação parece
ser causada por auto-sugestão. A tensão nervosa mui tas vezes ocorre quando
a pessoa se esforça em demasia. Essa tensão se reflete namente subconsciente
que, por sua vez, causa o tremor dos nervos e dos músculos. Subseqüente-
mente, esses estímulos subconscientes passam, naturalmente, para a cons-
ciência, o que então intensifica as vibrações e o estremecimento. Através
dessas auto-sugestões subconscientes, a pessoa freqüentemente começa a
sacudir e a movimentar o corpo inteiro e os membro numa espécie de pa-
drão regular.

Infelizmente, as pessoas comuns nem sempre podem determinar o


motivo dessas vibrações e desse tipo de estremecimento. Algumas ficam
com medo de fazer alguma coisa errada e desistem imediatamente da me-
ditação. Outras acreditam que já alcançaram os poderes divinos, ou que
chegaram à base do Tao e se satisfazem com esses movimentos e vibrações.
Além disso, o eh 'i não pode entrar em suas genuínas órbitas de Jen e de
Tu Mai, devido a essas sacudidelas do corpo e, assim, ela se limita a circu-
lar entre os ligamentos e os músculos. Poucas pessoas são suficientemente
introspectivas para discernir que a causa desses movimentos é, na verdade,
a tensão nervosa resultante da auto-sugestão.

Se alguém pretende meditar para ter corpo e mente sadios, ou para


Nei Kung (treinar os órgãos internos a desenvolver força e resistência),
nesse caso está certo deixar que esse tipo de movimento corporal se desen-
volva. Quem não tiver esse objetivo deve aquietar a mente interior e rela-
xar os nervos e músculos a fim de "subir mais um andar", ou erguer-se a
um nível mais elevado e entrar num estado de tranqüilidade.

Algumas pessoas aprendem a meditar porque sofrem as dores de


doenças como as pulmonares, gástricas, hepáticas, renais, ou de doenças
neurológicas~ É muito comum que essas pessoas sintam o eh 'i circulan-
do em certas regiões do corpo durante a meditação. Em geral, as pessoas
cujos pulmões e rins estão se enfraquecendo e degenerando, muitas vezes
sentem o eh 'i circulando padronizadamente em torno dos lados direito e
esquerdo do corpo. As que têm problemas com os intestinos e com o estô·
mago, freqüentemente sentem o eh'i movimentar-se ao redor do abdômen.
Os que têm problemas no coração e no fígado poderão sentir algo blo-
queado dentro do peito ou no diafragma. Quem conseguir romper esse
tipo de bloqueio sentirá repentinamente um tipo de desobstrução e pode
mesmo excretar um líquido pegajoso.

78
18 O que Acontece Depois que os Canais
do Ch'i se Abrem?

Seguindo-se os princípios costumeiros de meditação, a Grande CTr-


culação do Céu e a Pequena Circulação do Céu descritas no Taoísmo po-
derão ocorrer regularmente, se alguém puder abrir o Jen e o Tu Mai. E
quanto aos três canais de ch'i e aos sete chakras do Budismo esotérico?
O que acontece quando eles estão todos abertos e se está dentro do objeti-
vo do aperfeiçoamento do Tao? Essa é uma questão muito importante. A
abertura do Jen Mai e do Tu Mai e a rotação da carruagem do rio são os
segredos mais elevados, segundo acreditam os taoistas que as praticam para
tomar-se imortais.
· Muitas vezes as pessoas acreditam que a rotação da carruagem do rio
é importantíssima e esquecem de perguntar sobre a questão principal que
é: por quanto tempo o eh 'i poderia circular? Devemos ter consciência de
que a rotação da carruagem do rio e a abertura dos oito meridianos suple-
mentares não são os resultados derradeiros do aperfeiçoamento ·do Tao.
No sentido rigoroso da questã°o, a rotação da carruagem do rio e a circulação
do eh 'i nos oito meridianos suplementares são bons para a sáude e o reju-
venescimento, porém nada mais são do que o trabalho de base para o aper·
feiçoamento e a obtenção do Tao.
Depois que a carruagem do rio começa a circular e que o eh 'i circula
pelos oito meridianos suplementares durante um certo tempo, num está-
gio ótimo o eh 'i automaticamente cessará de circular. Ele não circula por-
que é pleno.
Gradualmente, o corpo ficará leve, claro, quente e macio e atingi·
remos o estado de "esquecer-se do corpo e o esvaziamento do ser'.' . Somen·
te nessa ocasião é que a pessoa se observa repentinamente e reconhece a
plenitude e a iluminação da origem da natureza e da vida. Na verdade, po-
demos nos separar do corpo e nos unirmos com o último corpo astral, que
tem feitio e forma e então combinar mais uma vez a natureza original
com este último coq,o astral (ou fornalha) e com a mente (ou caldeirão),
a fim de continuar o aperfeiçoamento. Dessa maneira, pode-se ou separar
ou unir esse corpo e essa mente e, assim, construir uma base sólida para o
aperfeiçoamento do Tao. Nesse estágio, podemos afirmar legitimamente
que temos o fruto inicial.
Acredita-se que o estágio e a situação, depois da rotação da carrua-
gem do rio e da circulação do eh 'i, eram um segredo divino e que por isso
não foram mencionados nos livros e nos sutras taoistas. "As estrelas do
unive rso pararam a sua revolução e o Sol e a Lua estão juntos"; essa afir-
mação tem sido usada para descrever o fim da rotação do eh 'i e a clareza

79
e o vazio da mente e do corpo. Em tempos mais remotos, os estudantes
falharam no entendimento do significado disso e ficaram confusos, sem
saber em que acreditar. Parece paradoxal que os antigos que obtiveram al-
gum grau de compreensão quisessem ajudar as outras pessoas e, ao mesmo
tempo, desejassem manter tudo em segredo.
A separação e a unificação da natureza original e do corpo não foram
explicitamente descritos nos livros taoistas. No máximo, expressões sim-
ples tais como "reentrar na fornalha e no caldeirão" ou " reorganizar o
Ch'ien (=) e o K 'un <= =)" eram empregadas como imagens e exemplos
imprecisos. Novamente, a desculpa típica foi a de que os homens de com-
preensão temiam o castigo dos céus, caso revelassem o segredo. Todavia,
o céu tem a virtude de auxiliar a vida. Até mesmo se uma pessoa for puni·
da pelo céu por aprimorar e cultivar a bondade, ela poderá ainda ousar
ajudar os outros. Caso contrário, o homem não seria simplesmente um
egoísta?
Bem poucas pessoas conseguem a verdadeira rotação da carruagem
do rio e a circulação do eh 'i no meio dos oito meridianos suplementares.
Menos pessoas ainda entendem realmente o estágio da separação e da uni-
ficação do corpo, da mente e da origem da Natureza. Portanto, mesmo que
alguém deseje sinceramente ensinar isso, é raro encontrar um aluno que
tenha a capacidade de receber essas instruções supremas. Depois desse es-
tágio, a pessoa transcende as coisas do mundo, penetrando no reino meta-
físico. Mesmo que um professor quisesse descrever com detalhes esse es·
tado, seria uma exceção encontrar um estudante com sabedoria e experiên-
cia suficientes para ouvir essas explicações, que se situam além do reino do
mundo dos homens.

19. Motivos da Meditação

A maioria das pessoas é levada à prática da meditação por três moti-


vos: emoções religiosas, explorações místicas e uma vida longa com boa
saúde. Todos esses três motivos estão no âmbito do reino da meditação.
Geralmente uma pessoa é influenciada pelas idéias de aperfeiçoar a imor-
talidade descrita pelos taoístas sem dar importância ao se u motivo princi-
pal, seja ele qual for.
O dogma principal da imortalidade taoista é o de que "um corpo
humano possui o remédio para curar a si mesmo". Neste contexto, o remé-
dio não se refere apenas ao remédio material. O remédio material é o Tan
dourado exterior, segundo a teoria da imortalidade. Tan significa alguma
coisa que a pessoa precisa tomar para tomar-se imortal, e é verdade que o

80
Tan dourado exterior pode ser uma ajuda para algwnas pessoas em certos
estágios do desenvolvimento da meditação.
. . O Taoísmo, no entanto, enfatiza o aperfeiçoamento do Tan dourado
mtenor. Eu me recordo de muitos imperadores e celebridades descritos
na história chinesa que quise ram tomar-se imortais. Uma porção dessas
pessoas tornou remédios exteriores que se acreditava promover a longe-
vidade e que, no entanto, as envenenaram.
Os Tan Sutras, que exploram os métodos de obter a imortalidade,
só servem para aumentar a confusão, já que não se encontra em nenhum
deles urna definição de Tan.

20. A Teoria de Ching, Ch'i e Shen

Durante a dinastia .Ming e depois dela, a teoria da transmutação de


ching em ch'i, a transmutação de ch'i em shen e a transmutação de shen
no Vazio era muito conhecida entre os que praticavam a meditação e cul-
tivavam a imortalidade. A frase "desintegre o espaço vazio para entrar no
estado do grande imortal dourado" também era conhecida. Por essa razão,
a maioria das pessoas olhava o ching dentro do corpo humano como a mãe
do Tan dourado. Frases como "mantenha o ching em plenitude para as-
segurar a harmonia" e "mantenha o ching para cultivar o ch't' enfatizam
a transmutação de ching como a base da longevidade e da imortalidade.
As escolas de Wu Chong Hsu e Liu Hwa Yang desenvolveram seus ensina-
mentos a partir desses conceitos e supuseram que estas idéias eram o fun-
damento básico da imortalidade.
No fim da dinastia Ch'ing e no começo da República da China, um
mestre budista atacou violentamente os taoístas que praticavam a imorali·
dade e os acusou de serem os filhos do demônio. Esse ataque não foi
apenas insensato, mas também foi contrário aos humildes ensinamentos de
"alguém que jurou aprender os indefinidos tipos de Dharma" no Budismo.
Quer se siga o Taoísmo ou o Budismo, enquanto se aceitar que o ponto de
partida é uma mente limpa e sem desejo, ostenta-se um bom comporta-
mento segundo a escola Vinaya. Quem ataca essa suposição e afirma que
ela é má, danifica a grande virtude do Budismo que abrange dez mil fe-
nômenos.
Desde a dinastia Clúng, os monges budistas chamam de sonhos mo-
lhados o "vazamento de Tan". Eles descrevem os que ficam sentados du-
rante um longo período sem nunca se deitar como aqueles que "não têm
escoamento ou esvaziamento de Tan" . A suposição é a de que nenhum

81
vazamento de ching é a base para Sila. (Em chinês, esperma é um dos sen-
tidos de ching, e Sila se refere à continência sexual.) O ponto-chave é en-
tender o verdadeiro ching e a relação entre esperma, óvulos e ching na li-
gação com a transmutação de ching em eh 'i.

82
Ili Parte
O Cultivo de Chíng, Ch'í e Shen
21. Sincronização e Estágios da Prática

. Desd: a dinastia Ming, devido à promoção feita pela escola de Wu


Liu, a teona que diz respeito à seqüência de como tomar-se imortal através 1

da prática do Tao ficou muito popular. Ela corresponde à teoria dos três
estágios da prática. ·
Diz-se que "construir as bases em cem dias" é o estágio preliminar
necessário para a transmutação de ehing em eh 'i, e que "a gravidez durante
dez meses" é o estágio preliminar necessário para a transformação de eh 'i
em slzen. " Amamentar por três anos" é o início da transmutação de slzen
no vazio ou no vácuo. Finalmente, "ficar diante da parede durante n ove
10
anos" é o último passo necessário para destruir o espaço vazio.
Algumas pessoas comparam essa teoria com os métodos de aperfei-
çoamento do Budismo esotérico. Talvez isso possa ser comprovado. As
seqüências mencionadas acima são semelhantes às experimentadas por
:r...marepa durante seu cultivo do Tao. Por esse motivo, essa seqüência está
profundamente enraizada nos corações das pessoas. Ela também pode
ser obse rvada nas afinnações originadas da experiência autêntica, assim
como, "Quando o ehing está repleto, não se tem desejo de sexo; quando o
eh 'i está re pleto, não se tem vontade de comer; quando se está cheio de
shen, não se deseja donnir". Dessa forma, os efeitos reais dos três estágios
da transmutacão acham-se estabilizados.
Desde ~ dinastia Ming, oito ou nove pessoas dentre dez, que prati-
cam a meditação ou cultivam a imortalidade, sempre aceitam que traba-
lhar sobre o ching e o ch 'i é o ponto inicial. Algumas técnicas taoístas, in-
feriores às da escola de Wu Llu, também se tomaram bastante conhecidas.
Seus seguidores faziam um tipo de pressão nos pontos de acupuntura e
usavam m étodos de comunicação para agradar seus próprios espíritos,
considerando essas práticas como o segredo máximo necessário para pôr
fim à raiz dos desej os sexuais. Trata-se deveras de urna distorção!

10
Esta frase é do primeiro patriarca zen, o Bodi-Dharma, que se colocou diante de
uma parede para meditar duran te nove anos, no Templo de Shau Lin.

85
22. O Conceito de Ching

Realizaram-se progressos notáveis na medicina que não se comparam


aos métodos enfatuados de outrora. Existem seções atuais da medicina que
se especializam na investigação do eh 'i, do sangue e do espírito. Não deve-
mos ignorar os novos conhecimentos para aderir a uma velha teoria, nem
devemos confiar inteiramente nesse novo conhecimento ignorando total~
mente as velhas teorias. A ciência progride de uma forma incerta. Não é
como as velhas teorias chinesas que afirmam com arrogância que o proble-
ma foi resolvido de uma vez por todas.
O Ching nas Artes Médicas Taofstas Tradicionais
Os que praticam a meditação para obter a longevidade e o rejuvenes-
cimento e os que praticam as antigas artes médicas chinesas consideram
o ching, da maneira corno acontece no corpo humano, o mais essencial
elemento de vida. 11 Os métodos taoístas para a imortalidade acham que a
transfonnação de ching é a rota principal de aperfeiçoamento. O antepas-
sado dos textos médicos chineses, o Oássico da medicina interior do Im-
perador Amarelo, considera que o cultivo do clting é o método básico para
"nutrir a vida e a longevidade" e "para manter-se longe da doença, prolon-
gando a vida". Ele diz: "Dois espíritos rolam um sobre o outro e se inter-
penetram para tornar forma. Aquele que nascer antes do corpo é chamado
ching." Além disso, o livro afirma que "se não se armazenar ching no in-
verno, ficar-se-á doente na primavera. Se não se armazenar clzing no verão,
ter-se-á uma desordem intestinal no outono". Isso demonstra a importân-
cia do ch ing na nutrição da vida.
Este conceito foi depois desenvolvido pelos taoístas em seus méto-
dos de desenvolvimento da imortalidade, que destacava a renovação do
cérebro através do retomo de ching como o requisito b ásico para a obten-
ção da longevidade e do rejuvenescimento. As maneiras como deveríamos
agir para renovar o cérebro através do retomo de ching e a natureza do
ching nunca foram esclarecidos, e sobre isso existem numerosas teorias.
O Ching na Ciência Médica Moderna
As teorias médicas modernas sobre a ejaculação e as relações sexuais
são exatamente opostas às teorias taoístas. Segundo a ciência médica mo-
derna, um adulto deveria ejacular a certos intervalos, e acredita-se que é
prejudicial se um homem suprimir o seu comportamento sexual e tentar
evitar a ejaculação.

11
t importante lembrar que esper ma é um dos significados de ching.

86
A produção de esperma e de óvulos é um fenômeno natural do cor-
po humano. Supõe-se que, se alguém acreditar que a eliminação da ejacu-
l~ção possa de algum modo aumentar a saúde e aumentar a duração da
VIda, supõe-se que essa pessoa está sofrendo de ilusões originadas de uma
vida sexual anormal e de estranhos estados mentais. Acredita-se que essas
afi rmações não passam de mentiras inocentes.
Essas teorias envolvem a fisiologia, a psicologia sexual, a neurologia
e a bioquímica; porém, apesar de darem numerosos indícios, falham nas
conclusões fmais . Entretanto, acha-se que é impossível que um homem
pura e simplesmente nunca possa ejacular em toda a duração de sua vida
ou que possa viver uma vida mais saudável e longa que a maioria das ou-
tras pessoas. Ao contrário, as pessoas que refreiam freqüentemente a eja-
culação são melancólicas, devido aos estados sexuais e mentais anormais,
e morrem de apoplexia cerebral ou de câncer. Portanto, do ponto de vista
da moderna ciência médica, as teorias que advogam "a renovação do cé-
rebro pelo retomo de clzing de modo a poder viver mais tempo" e "a trans-
formação de ehing em eh 'í" são puro contra-senso.

Saída Lateral Esquerdado Tao, ou


Taoísmo Heterodoxo
Como complemento da principal ciência médica taoista, existem al-
gumas escolas que divergem da "escola do aperfeiçoamento limpo'', o que
requer que não haja meditação sobre o sexo. Elas consideram que a reno~a­
ção do cérebro através do retomo de ehing e da transformação de ehmg
em eh 'i são princípios indestrutíveis. Técnicas especiais, embora normais,
de relações sexuais são necessárias para que se possa "retomar o ching"
para renovar o cérebro. A frase do comentário do I Ching, "Um Yin e
um Yang são chamados de Tao", se aplica neste caso, e o seu significado
muitas vezes é ampliado para influenciar as pessoas, através de linguagem
floreada, no que diz respeito à meditação sobre o sexo.
Durante a dinastia Tang e desde então, houve métodos "taoistas
de viver sobre brasas" para os homens que tinham esp~sas. Métodos tân-
tricos de meditação sexual no Budismo esotérico foram populares no
Tibete e na Mongólia. Esses dois métodos são muito semelhantes.
As anes médicas do comportamento sexual se disseminaram secre-
tamente entre as pessoas. Livros como The Yellow Emperor's Plain Woman
Sutra e The Secrets o[ the Jade Bedroom, um tipo de psicologia sexual,
tornaram-se secretos. Além disso, algumas pessoas seguidamente ensinam
às outras como pressionar os pontos acupunturais para interromper o es-
coamento de sêmen. Os que aprendem essas técnicas, muitas vezes tornam-
-se impotemes, mas acredita-se que eliminaram o desejo de sexo através

87
do Tao. Algumas dessas pessoas ficam com problemas estomacais, vonú-
tam sangue, desenvolvem epistaxe, apoplexia ou loucura. Pessoas que con-
tanúnaram o sangue por evitar a ejaculação geralmente ficam magras e suas
faces apresentam uma leve palidez. Podem perder a alegria de vive r; no en-
tanto, ainda são felizes se comparadas aos verdadeiros grandes desastres.
Apesar disso, as afirmações desses livros taoístas sobre a ejaculação, o es-
coamento e os métodos de viver harmoniosamente com a força vital, com
a vitalidade e a idade são compatíveis com os resultados das pesquisas
feitas pela ciência médica moderna.
Os antigos diziam: "Embora se trate de um pequeno Tao, ele é deve-
ras alguma coisa." Do ponto de vista de um estudo amplo e do pensamento
cuidadoso, uma saída lateral também é uma porta, e o Tao esquerdo,
ou um desvio de Tao, também é Tao. Não se pode ignorar ou negar com-
pletamente isso.

Reconhecimento do Verdadeiro Ching


As teorias que advogam a renovação do cérebro através do retomo
do ching e acentuam a transformação de ching em eh 'i seriam apenas idéias
fantásticas? t necessário entender os conceitos dos antigos e dos novos en-
sinamentos taoistas e das ciências médicas e em seguida voltar a essas teo-
rias para discuti-las. Essa é a melhor abordagem.
No Taoísmo, o ching primário é definido como a "vitalidade origi-
nal e natural da vida". A descrição feita por Lao Tsé de um menino nos dá
a melhor explicação. Ele disse: "Não conhecer as relações sexuais entre o
macho e a fêmea e ainda assim ter uma ereção significa o surgimento de
ching." Por exemplo, quando um menino crescido está adormecido, ele
não tem absolutamente consciência de desejos sexuais; todavia, pode ter
uma ereção. Isso exemplifica a distribuição do ching original, ou da vita-
lidade, e seu funcionamento durante o crescimento.
Uma vez que a criança tenha conhecimento e necessidade de sexo,
uma ereção pode causar estados mentais de desejo sexual e os desejos se-
xuais podem ocasionar uma ereção. A mente e o corpo se afetam reci-
procamente. Ou a mente. ou o corpo dão começo ao desejo sexual. O
estímulo desse desejo causa reações nas glândulas e nos hormônios. Pela
interação mútua da mente e do corpo, as secreções endócrinas estimulam
reações nos testículos e no útero que, por sua vez, produzem o esperma ou
os óvulos. As relações sexuais terminam com a ejaculação e o orgasmo.
Se entendermos esses princípios, veremos que a restauraça:o do cé-
rebro, através do retomo do ching e da transformação do ching em ch'i,
pode ser praticada com um estado mental sem o mínimo desej o sexual, e
ainda assim os órgãos genitais funcionarem instintivamente, como no caso

88
de uma ereção. Mas, enquanto pudermos manter a mente completamente
livre do desejo sexual, o ching arrefecerá naturalmente e seguirá a circu-
lação do sangue. Pode-se obter o estado do retomo sem que haja retomo e
restauração sem renovação, de forma bastante natural.
Se uma pessoa acende o desejo para atear fogo às atividades dos ór-
gãos genitais, uma atividade correspondente será gerada nas glândulas, nos
hormônios e no sêmen. Se nesse momento quisermos controlá-la para con-
servar o u fazer retomar o ching, fazendo o clzing retroceder por esforços
físicos e mentais, isso adicionará uma porção de refugos ao trato urinário,
à bexiga e ao sangue, e afetará o funcionamento da glândula prostática,
aumentando a sua carga. Pior ainda, isso poderá afetar seriamente o cora-
ção, os pulmões, o fígado, os nervos e o cérebro. Nos livros e sutras taoís-
tas, aconselha-se diferenciar entre "origens limpas e turvas da água". Isso
se refere à diferença que existe entre fazer verdadeiramente o retomo de
ching e o fenômeno que acabo de descrever.
Entre as pessoas que praticam a meditação e o Tao, muito poucas
podem ter uma ereção sem sentir o mínimo desejo. Alguém poderia sen-
tir acidentalmente a ausência de desejo nessas circunstâncias, porém, de-
vido à pressão que essas atividades fisiológicas exercem sobre a mente,
é muito difícil manter uma mente pura.
Do ponto de vista de "construir as bases numa centena de anos" e
da "transformação do ching em eh 'i", é lamentável que existam tantas
pessoas que cultivam o Tao como existem pêlos num boi , mas tão poucas
12
que o conseguem como há chifres na corça.
Se a uma pessoa falta o desejo sexual por causa da idade, da doen-
ça, da impotência ou porque suas glândulas sexuais perderam a capacidade
de reavivar-se devido à prática da saída lateral esquerda do Tao, ou ao
Taoísmo heterodoxo, nesse caso ela já acabou com o seu sistema regene-
rador de vitalidade e, a não se r que reavive sua vitalidade da maneira cer-
ta, não haverá perspectivas de prática posterior.
Explicamos ching e eh 'i nos termos de uma abordagem nada sutil.
Quem desejar prosseguir e delinear as origens do ching e do clz 'i, deve pes-
quisar o clzing mental do Budismo, que pode levar à revelação dos prin-
cípios do ve rdadeiro clzing no supremo Tan Dhanna, o Dhanna da imor-
talidade.

12 Corça é a fabulosa fêmea de um animal que se parece com o gamo. A expressão


chifres de corça é usada para descrever coisas muito raras, uma vez que a corça não
tem chifres!

89
23. Transformação do Ching em Ch'i

A fim de compreender o significado real da transformação do ching


em eh 'i, devemos prestar atenção às ligações existentes entre as frases
Ching Shen, Ching 01 'i, Força de Ching e Força Mental Na cultura tradi·
cional chinesa, os nomes ching, eh 'i e shen eram originalmente separados e
completamente independentes. Em tempos mais rece_!lteS, ehing e shen fo-
ram combinados para formar um nome próprio. E difícil definir clara-
mente Ozing Shen.
Durante e depois da dinastia Han, os taoístas constituíram ching,
eh 'i e shen nos componentes principais da medicina para a imortalidade.
Isso se baseou no Qássico de medicina interior do Imperador Amarelo
e no Huang Ting Ching ou Sutra do campo amarelo. No Huang Tin;g Ozing
diz-se que " o ápice das três medicinas é shen, eh 'i e ehing". Isso aconteceu
antes que a importância de ehing, de eh 'i e de shen fosse acentuada para o
cultivo da imortalidade. É difícil definir claramente ehing, eh 'i e slzen,
mas eles podem assemelhar-se a calor, força e luz. CT1ing é o calor da vida,
ch'i é a força e shen é a luz. Se calor, força e luz faltam a um ser humano,
isso é símbolo de morte. ·
Como fenômenos físicos universais, ching, elz 'i e shen estão separa-
dos na vida humana; porém, passo a passo, eles penetram um no outro.
Shen atua no cérebro; eh 'i age no peito e no estômago; ching funciona no
baixo-ventre, nos rins e nos órgãos genitais. O funcionamento do ehing
está intimamente associado com todo o sistema endócrino na ciência mé-
dica moderna. No entanto, se observarmos do ponto de vista de que o ch'i
precisa ser separado do ching e de que o shen deve ser gerado do eh 'i, po-
deremos perceber como essa teoria é pobre.
Do ponto de vista da física, calor e força são gerados da luz. Analo-
gamente, ehing e eh 'i certamente surgem de slzen. Na loucura, ching e
eh 'i tendem naturalmente a ser fracos e delicados.
Deveríamos compreender que a sensação de "felicidade orgástica"
vem de ching; a detemúnação e a firmeza de vontade provêm das ativida-
des da força de eh 'i quando é plena; e a agilidade visível da perspicácia e
da sabedoria surgem da quietude ou de samadhi, de shen.
O Budismo acentua o cultivo da mente e a nutrição da natureza.
Ele promete modificar o nível mental das pessoas através do pensamento
reflexivo. Esse é o ponto inicial. Os efeitos e as realizações dos budistas
são os dois tipos de clz 'i e shen, análogos ao supremo Tan Dhanna ou aos
métodos usados dos que querem se tomar taoistas imortais. Os budistas
aprimoram a prática do ching a partir do interior.

90
Na dinastia Sung e depois dela, os taoístas acentuaram a importância
da "transformação de ehing em eh'i",da "transformação de eh'i em shen"
e da "transformação de shen em nada". Esses métodos são semelhantes aos
três grandes princípios do Budismo: disciplina (ou a observação de Si/a),
aperfeiçoamento de samadhi (ou silêncio) e sabedoria. Quem dominar isso,
notará que não existe diferença entre essas formas de Taoísmo e o Bu-
dismo.
Sabemos que, se uma pessoa insistir em que o esperma e o~ óvulos
são a base do aperfeiçoamento de Tao e da meditação, ela deverá examinar
esse problema cuidadosamente, nos detalhes. Entretanto, esses conceitos
e métodos terão significados diferentes para as pessoas que já tenham cor-
pos fracos e degenerados ou que passaram da meia-idade, entrando na
velhice. O cultivo do Tao e a meditação requerem conhecimento. Não
podem ser iniciados e tenninados com fé cega ou insistência obstinada
num ponto de vista preconcebido.
A vida humana é a combinação da mente e do corpo. As principais
atividades do corpo são ehing e eh 'i, que pertencem ao reino da sensação.
A atividade principal da mente pertence, numa palavra, ao domínio da
percepção e da consciência, shen.
Nós englobamos as reações fisiológicas do corpo ou a dinâmica dos
canais do eh 'i. Tudo isso pertence ao âmbito da sensação. A sensação é
o paraíso futuro com contínuas mudanças. A conquista inicial da prática
começa com a sensação, volta à sensação e percepção e entra num estado.
de unificação. Não existe meio de cultivo sem a sensação.
Todos deveriam entender que abrir o Jen Mai e o Tu Mai, e todos os
oito meridianos suplementares, são efeitos da conquista da sensação. Du-
rante a transfonnação de ching em ch'i há reações dos canais fluentes do
eh 'i, e as reações são diversas à medida que Kung Fu 13 avança. Durante a
transformação do eh 'i em shen, também há reações dos fluentes canais do
eh 'i, diferentes das que ocorrem durante a transformação de ehing em ch'i.
Desde tempos remotos, as "nove rotações que formam o Tan" são descri-
tas no Tan Sutra. Em tempos mais recentes, algumas pessoas ampliaram o
sentido disso de modo que correspondesse às reações dos canais de eh 'i.
Elas descreveram como se devia circular o eh 'i em tomo do Jen Mai, a
fim de perfazer nove vezes nove. Embora isso pareça artificial, uma pessoa
poderia usar essas idéias para explicar o tríplice aperfeiçoamento de ehing,

13
Neste contexto, Kung Fu não se refere ao Kung Fu exterior, uma das artes marciais,
mas ao Kung Fu interior. Kung Fu Interior se refere às várias técnicas de meditação,
assim co mo às posições, aos exercícios respiratórios e à circulação da energia.

91
de ch'i e de shen, que passariam, passo a passo, por mudanças interiores.
Não se pode protestar contra isso.
A fim de reconhecer o Kung Fu da Transfonnação de chingem ch'i,
devemos entender a natureza do verdadeiro · ching, não deveríamos negar
por completo o funcionamento da força ching do paraisa ulterior e não de·
veríamos identificar erroneamente o esperma e os óvulos do paraíso ul·
terior, que são a representação absoluta de ching. A força de ching dopa-
raíso ulterior é, na verdade, a manifestação do verdadeiro ching. Em ou-
tras palavras, a fonte da nova força vital tem uma relação absoluta com as
glândulas tiróide e pituitária, e com as glândulas sexuais.
Quando as glândulas sexuais estão em atividade e não se sente o
mínimo desejo sexual, nesse momento estamos muito perto do verda·
deiro ching. Se esse estado puder ser mantido durante algum tempo, uma
força que se moverá até a raiz dos nervos, na base da espinha, será produzi·
da naturalmente, devido à plerútude da atividade das glândulas sexuais.
Essa força ascenderá, passo a passo, até que se movimente para baixo, a
partir do topo, para estimular a função regenera dora da glândula pituitá-
ria. A glândula salivar será estimulada, o que aumentará a atividade da glân-
dula tiróide. O coração, a mente e o peito ficarão abertos e cheios de pra-
zer. t difícil descrever essa sensacão de felicidade.
Esses fenômenos irúciais c~acterizam um estado durante a transfor-
mação do ching em eh 'i, ao longo do Tu Mai. A conquista de Tao não ter-
mina aqui. Para um homem que pratica Kung Fu, todas as células do seu
corpo mudarão e sua pele fi cará macia e bonita. Isso é mais evidente nas
células e músculos da face. Se você olhar para esse homem cuidadosa-
mente, notará um brilho indefinível em seu rosto. Por outro lado, se as
células dos músculos faciais não apresentarem mudança evidente e a pessoa
tiver a face avermelhada, trata-se de um tipo de encruzilhad a e deve-se
considerar a possibilidade de pressão arterial alta. Isso pode ser causado
por apegos fortes da mente, as migrações do fogo auxiliar, ou pode ser de·
vido aos desejos sexuais.
A abertura do Jen Mai que inclui a abertura do sistema n ervoso ve-
getativo, pode acontecer depois que o estudante absorveu todas as expe·
riências que passaremos a descrever. A plenitude do eh 'i no palácio central
do estômago causará uma sensação de afogamento. Nesse estágio, o ho-
mem pode limpar a mente, esperar calmamente por contrações espontâ-
neas dos testículos e do períneo ou, se for uma mulher, sentir contrações
uterinas e reações nos seios; ele ou ela sentirão como se h ouvesse uma linha
de força que se movimentasse pela parte interna do púbis, numa arreme-
tida ao Tan Tien Inferior, encontrando o eh 'i que desce do palácio cen-
tral. Isso repentinamente reavivará a atividade da glândula da juventude

92
ou do abdômen, e um tremendo orgasmo, que excede o orgasmo sexual,
ocorrerá. Esse orgasmo fluirá ao longo do interior das pernas e dos pés e
alcançará as solas e os dedos dos pés. Nesse momento, a alegria e o prazer
é o que uma pessoa sente ao beber um bom vinho de ótima safra. A pessoa
sentir-se-á muito confortável e bem-disposta. Esse é verdadeiramente o pri-
meiro passo da conquista da transformação do ehing em eh 'i.
As mudanças e reações serão diferentes, de acordo com a pessoa, de-
pendendo do sexo, da idade, da força e fraqueza corporais e de diversos ta-
lentos naturais. Nesse estágio de Kung Fu existe a possibilidade de o Kung
Fu se perder em qualquer momento devido a alguma causa desconhecida.
Se a pessoa não tomar cuidado, se falhar ao salvaguardar-se ou em desen-
volver o bom-senso, tudo terminará como se fora um simples jogo interes-
sante.
A transformação do ehing em eh 'i é uma etapa do Kung Fu que desa-
ta o nó da glândula da juventude. Ninguém deve ficar cheio de si ou vai-
doso por tão pequena conquista. Todas essas situações pertencem ao do-
mínio das sensações e, em sua maioria, são uma evidência dos efeitos da
ação do Kung Fu. Ainda há um longo caminho a percorrer antes de atingir
o Tao. No entanto, se alguém alcança esse estágio, o rejuvenescimento para
uma longa vida sem doenças não será problema.

24. O Cultivo do Ch'i e a Interrupção


da Respiração

Descrevemos a transformação do ehing em eh 'i e nos dedicaremos


agora à transformação do eh 'i em shen. O ehing pode ser convertido em
eh 'i pelo aperfeiçoamento; porém, como podemos transformar eh 'i em
shen? Essas são idéias fascin~tes; restam, porém, muitas dificuldades.
14

Gzing não é apenas sêmen e eh 'i não é meramente o ar que respira-


mos. A prática efetiva consiste na aplicação do eh 'i da respiração, para dis-
parar o verdadeiro eh 'i, que está latente no corpo humano. É especialmen-
te difícil definir o verdadeiro eh 'i de forma a que meus amigos estrangeiros
entendam. Nos países do Ocidente existe a tendência de relacionar o ch 'i
com o prana e com a kundalini. Essas palavras não querem dizer exata-
mente a mesma coisa como o verdadeiro eh 'i no samadhi do Taoísmo.
Há semelhanças nos detalhes, mas, na verdade, há ainda diferenças entre

14
Algumas dessas dificuldades serão examinadas nos próximos capítulos.

93
esses conceitos. A moderna idéia científica sobre a energia vital do corpo
humano está um tanto mais próxima do significado do verdadeiro eh'i
do que o conceito indiano de prana.
Enquanto ocorrerem as diversas sensações durante a meditação,
muitas pessoas se inclinam a acreditar que j á completaram a transfonna·
ção do ehing em eh 'i. Se essas sensações se espalharem ao longo da espinha
ou se ocorrerem em volta do peito ou do abdômen, elas geralmente pensa-
rão · que o eh'i está se movimentando pelo Tu 111ai e que já abriram o Jen
Mai e o Tu Mai. Enquanto se tem saúde ou se sofre apenas de uma pequena
doença, é possível meditar numa determinada posição durante um longo
período e mais cedo ou mais tarde se experimentará essas sensações.
Todavia, esses não são definitivamente os efeitos autênticos da transfor-
mação do ehing em eh 'i. Essas sensações são os efeitos desejáveis da medi·
tação; porém, talvez a pessoa ainda não tenha se aperfeiçoado suficiente-
mente para realmente construir uma base sólida para a verdadeir.a trans-
formação do ehing em eh 'i.

25. A Maravilha e o Mistério da Respiração

O fenômeno da interrupção espontânea. da respiração durante a me·


ditação precisa ser explicado para caracterizar com clareza o fenômeno da
transmutação de ehing em eh 'i.
A cessação espontânea da respiração durante a meditação é 01ih
Hsi. Nas quatro dhyana e nas oito concentrações da meditação budista,
ela é conhecida por retenção do eh 'i. Esse é o ve rdadeiro Kung Fu do
eh 'i engarrafado da yoga. Os que praticam a yoga geralrnen te praticam di-
ferentes métodos de controle e retenção da respiração, porém essa não é
a mais elevada conquista possível. A autêntica garrafa de eh 'i é a cessação
espontânea da respiração durante a meditação, a que os budiStas esotéricos
dão o nome de tesouro da garrafa de eh 'i.
Durante a meditação, uma pessoa pode sentir ocasionalmente a
cessaç.ã o da respiração. Quando acontecer isso, devido a excesso de con-
centração mental, ela sentirá rigidez e entorpecimento e a tensão corporal
aumentará gradativamente. Isso resultará na interrupção da respiração,
mas não se trata de verdadeira Chih Hsi ou de um autêntico caso de re-
tenção de eh'i; trata-se simplesmente de tensão nervosa. Se alguém não
puder se relaxar e voltar ao estado natural nessas circunstâncias, sua mente
virtualmente definhará e morrerá. Se isso continuar, ela eventualmente
poderá sentir rigidez em cada junta do seu corpo inteiro. Isso é uma doen-
ça. A única cura possível é relaxar, tanto quanto possí'v'.el, a mente e o

94
corpo. Além disso, pode-se aliviar a tensão exalando repetidas vezes va-
garosamente. Geralmente é uma boa idéia expirar o ar bem devagar ao emi-
tir o som Haaaaaaa. Isso deve ser repetido até que se possa voltar a respi-
rar normalmente, como quem dorme. Se isso for feito por pouco tempo, ter-
-se-á a capacidade de avancar a um nível mais elevado e de subir mais um
andar. Muitas pessoas pednanecerão entorpecidas, apesar de tentarem se-
riamente relaxar, e precisarão de instruções especiais do Budismo esotéri-
co ou do Taoísmo.
A pessoa que está verdadeiramente repleta da força ehing. está cal-
ma de mente e de corpo e começou a entrar no estágio de transfonnação de
elzing em eh 'i, em primeiro lugar notará que todo o seu corpo ficou tenro
e macio e que parece carecer de força. Progredindo mais, sentirá como se
não tivesse ossos. O eh 'i preenche todo o corpo e se espalha através dele,
na ausência de toda e qualquer sensação.
Lao Tsé perguntou: "Você pode se concentrar no eh 'i e ser suave
e tenro como um bebê?" Essa pergunta caracteriza esse estado, descrito
também por Mencius, quando disse: "O semblante é radiante, as costas
(Tu lllfai) estão abertas e se está fluindo nos membros."
Nesse estado, a pessoa esquece as percepções mentais e as sensações
físicas e se sente corno se ela e o universo se tivessem fundido numa coisa
só. Ela terá a sensação de Hung Tung descrita nos Surras taoistas, e a afir-
mação de Chuang Tsé de que não há sensações no corpo e nenhuma ilu-
são na mente pode ser confirmada. Essas afirmações significarão mais do
que um ideal vazio.
Atingir o samadhi e permanecer dessa maneira tranqüilo fará com
que sintamos o ar se movendo através das narinas, tomando-se cada vez
mais fraco até que a respiração nos pulmões quase cessa, o Tan Tien, que
está no baixo-ventre, abaixo do umbigo, começará a funcionar como os
pulmões. Isso é a respiração interior ou o fenômeno de Tai Hsi. Tai é um
embrião e Hsi é o alento; dessa forma, Tai Hsi se refere à respiração fetal
ou à respiração como a de um embrião.
O esôfago e a região que vai dos brônquios até a língua estarão sol-
tos, fluidos e confortáveis quando os órgãos internos estiverem cheios de
eh 'i. Ao mesmo tempo, a respiração interior de Tan Tien enfraquecerá e
chegará a uma paralisação. A glândula da juventude, que esteve adorrne·
cida, recobrará sua atividade e nos sentiremos como crianças, sem luxúria
ou paixão. Isso causará um forte orgasmo. Os testículos se contrairão e o
eh 'i subirá através do Jen Mai e fará com que a ponta da língua se enrole
para cima a fim de cobrir a úvula. Quando a respiração cessa dessa maneira
espontânea, começou o fenômeno inicial da transformação do ching em
ch 'i.

95
26. A Mudanca de Temperamento e os
· Ciclos do Ch'i

Neste capítulo, analisarei o conceito confucionista de eh 'i clzih, ou a


mudança de temperamentos. Essa mudança é a mais óbvia conquista dos
que estudam para obter o conhecimento. Se as pessoas souberem como
aplicar o seu conhecimento no aperfeiçoamento, tornar-se-ão perfeitamen·
te calmas e tratarão as outras com elegância. Serão capazes de lidar com as
outras pessoas e com os seus negócios de uma maneira que não envolva os
sentimentos pessoais.
Esse tipo de aperfeiçoamento começa com o comportamento mental
e pertence ao Kung Fu do aperfeiçoamento mental. Neste contexto,
eh'i indica a aparência da pessoa ou a maneira como ela parece ser, e chih
se refere à matéria ou substância. Quando se diz que o chih muda, a pessoa
converte não apenas o seu comportamento mental mas também as suas
funções e processos fisiológicos. Sem o aperfeiçoamento fisiológico reque-
rido para se atingir um estado em que "o ch'i está calmo e o shen é fácil",
a mudança de temperamento é apenas uma máxima ideológica, antes do
que um Kung Fu prático.
As técnicas de meditação da Escola Tien Tai budista, assim como
as de acompanhar a respiração, contá-la, observá-la, o ponto de vista taoís-
ta de que a mente e o corpo são mutuamente dependentes, as muitas téc·
nicas de Ch 'i Kung, bem como algumas das técnicas descritas anteriormen-
te , estão todas relacionadas muito de perto com a transfonnação de ching
em eh 'i, e com a transformação de eh 'i em shen.
As teorias sobre os canais eh 'i no corpo h umano, descritas no Tan
Sutras e nos livros de meditação, geralmente se baseiam em princípios mé-
dicos primitivos encontrados no livro O clássico da medicina interior do
Imperador Amarelo e no Nan sutra. Esses dois livros explicam o movi-
mento do eh 'i e as atividades dos canais do eh 'i em termos abstratos. Des-
de tempos remotos até os dias de hoje, muitos dos que cultivam o Tao e
dos que meditam são devotados a essas teorias herdadas do passado. Essas
pessoas acreditam que essas são teorias perfeitas e que, por isso, uma
grande porção do seu precioso tempo e do seu espírito são desperdiçados
na aquisição do abstrato, em vez de na prática do Kung Fu.
As ciências primitivas do passado muitas vezes usam as teorias dos
números abstratos da antiga astrologia e do J Ching. Muitos Tan sutras
e livros taoistas explicam as funções dos canais do eh 'i nos termos das
cinco condições, seis eh 'i, trezentos e sessenta graus de céu e sessenta e
quatro hexagramas do I Ching. Conseqüentemente , séculos mais tarde,
as pessoas tentaram viver de acordo com essas teorias ancestrais. Essas

96
antigas teorias dos números não apenas são vagas, porém podem confundir
os modernos estudiosos.
Por exemplo, na antiga astrologia afirmava-se que o firmamento ti-
nha trezentos e sessenta e cinco graus e um quarto; o Sol girava em volta
da Terra urna vez por dia e se movimentava um grau. Um ano consistia
em trezentos e cinco dias e de vinte e cinco Ke. Na antiga escala de tempo
chinesa, um dia tem cem Ke. Leva um ano para o Sol circular pelo firma-
mento. A cada quatro anos se acumula um dia. Uma vez que o corpo hu-
mano é uma miniatura do céu e da Terra, o número de movimentos dos
canais do eh 'i deveria seguir essas regras.
Segundo essas antigas teorias, "o pulso move três ts'un (mais ou
menos 1/10 de pés) numa inalação e três ts'un numa exalação. Numa res-
piração, o pulso bate seis ts'un. Num dia e numa noite, um homem respira
treze mil e quinhentas vezes. Portanto, o pulso faz cinqüenta ciclos do cor-
po". Isso equivale a dizer que "durante duzentas e setenta respirações, o
pulso move trinta e seis chang (ligeiramente mais do que dez pés) e dois
eh 'ih (ligeiramente mais do que um pé) num único ciclo. Cinqüenta ciclos
ao redor do corpo serão compostos de treze mil e quinhentas respirações,
enquanto o pulso moverá cerca de oitocentos e onze chang".
Os que cultivam o Tao ou a meditação, freqüentemente. praticam
seus exercícios respiratórios segundo os princípios dessas teorias. Na ver-
dade, o método usado pelos antigos, de medir o tempo pela clepsidra, não
é muito exato. Os números usados nessas teorias deveriam ser postos em
dúvida e não ser tomados como certos. Segundo a medicina moderna, a
velocidade média normal da respiração é de 18 vezes por minuto; a veloci-
dade média normal do pulso é de 72 vezes por minuto, quatro vezes ave-
locidade da respiração. A velocidade da respiração de um homem do tipo
médio chega a 25.920 vezes por dia - exatamente o mesmo número de
anos do Grande Ano Sideral. Um Grande Ano Sideral é a duração de
tempo necessária para que todos os planetas do sistema solar retomem às
suas posições originais.

27. O Cultivo do Ch'i e a Tranqüilidade da Mente

Se a mente e o corpo permanecerem num estado de perfeito silên-


cio, não haverá perturbações interiores da parte dos pensamentos, das
ilusões, das preocupações, dos pesares, tristezas ou irritações. Se não há
compulsão externa para o trabalho ou exercício, uma pessoa inalará e
exalará naturalmente e sem atordoamento, sonolência ou confusão mental.
Depois de um dia e uma noite, toda a energia e a vitalidade física natural

97
recobram o seu primitivo estado de plenitude. Isso se parece com o retorno
dos planetas às suas posições durante os Grandes Ciclos Siderais do Sistema
Solar.
Em seu estado de plenitude, a respiração automaticamente cessará
por um curto espaço de tempo, indicando que a respiração e o eh 'i alcan-
çaram o ponto de saturação. Se pudermos manter esse estado de plenitude
com verdadeira calma e tranqüilidade mental, ele chegará ao ponto da
transformação de ehing em eh 'i e de eh 'i em shen. É lastimável que tantas
pessoas que cultivam o Tao e a meditação desconheçam esse princípio.
A maioria das pessoas adere às velhas teorias. do Tall Sutra e dos li-
vros taoistas; por causa de suas próprias opiniões preconcebidas, muitas
vezes errôneas, freqüentemente trabalham dia e noite "exalando o velho e
inalando o novo". Acreditam estar exercitando o Kung Fu da transforma-
ção. Que pena! "A riqueza e o renome são exatamente como os sonhos.
Não existe um imortal que não estude."
Acredito sinceramente que os exercícios respiratórios e Ch 'i Kung
não são tão benéficos como tranqüilizadores da mente. Acalmando a men-
te, a pessoa pode atingir o estado que lhe permita provar as verdadeiras
origens de Natureza Original para efetivar a transformação da vida. 15

28. As Três Flores e os Cinco Ch'i


Que tipo de eh 'i está envolvido na transmutacão de ehing em c/z 'i?
Na língua chinesa, apoplexia significa atingido pelo ~enro. O elz 'i que exis-
te no sangue eh 'i da ciência médica chinesa e o vento da apoplexia são
iguais ou diferentes do eh 'i mencionado pelos taoistas? Trata-se de uma
pergunta importante.
Desde a dinastia Han, o vento das correntes aéreas e o eh 'ida respi-
ração humana foram considerados, de modo geral, como a mesma coisa
pela arte médica chinesa. Na parte anterior do livro, o eh 'i foi definido
como a energia vital; mas os que meditam e cultivam a longevidade não
consideram o ar atmosférico e o eh 'i da respiração como sendo o mesmo
eh 'i mencionado pelos taoístas e pelo Budismo esotérico. De outro modo,
poderíamos confundir as reacões nervosas e musculares da circulacão do
verdadeiro eh 'i e, conseqüent~mente, essas reações se restringiriam ·ao do-
mínio das sensações fisiológicas e dos sentimentos.

is Os diferentes exercícios resp iratórios e de Ch 'i Kung são úteis para a saúde huma-
na; porém seria necessário escrever outro livro para analisar isso d etalhadamente.

98
Se alguém pensar que as únicas conquistas obtidas com o cultivo
do eh 'i são as que pertencem à respiração e à fisiologia, precisa saber que
deve h aver dezenas, ou mesmo centenas de métodos de cultivo do eh 'i no
Tao ísmo, no Budismo esotérico e na yoga. Pode parecer que esses mé-
todos são semelhantes, diferindo apenas nos detalhes. Não se pode negar
que a respiração humana pela boca, pelo nariz, pela pele e pelos outros
órgãos é o instrumento básico para esse aperfeiçoamento, mas não deve-
mos, e rroneamente, tomar isso como a essência da meditação, o sustento
da vida ou o Tan Dlzanna do Taoísmo.
Devemos prestar aten ção a duas expressões taoistas populares para
po~er antecipar os fenômenos que acompanham a transmutação bem-su-
cedida de ching em clz 'i. Essas expressões são: "Três flores aparecem na
parte mais alta", e "cinco clz 'i vão para Yuan". Três flores e cinco clz 'i
são expressões simbólicas. Ching, eh 'i e slze11 são as tr~s flores; o coração,
o fígado, o baço, os pulmões e os rins são os cinco clz'i, embora algumas
vezes o simbolismo dos cinco elementos clúneses - .metal, madeira, água,
fogo e terra - seja usado.
Na yoga indiana há cinco pranas: o prana ascendente, o pra11a des-
cendente, o prana que se move pelo centro, o prana que se move para a
esquerda e o prana que se move para a direita. Os cinco pranas são idên-
ticos aos cinco clz'i que os taoistas mencionam. No alto, está Baihui, o
lugar do alto da cabeca onde o pólo superior das orelhas se encontra com
a sutura sagital no se~ ponto central. No Taoísmo, isso é conhecido corno
o Palácio do Nirvana, que está relacionado com o chakra da coroa e com o
chakra sagrado do Budismo esotérico.
Por~ outro lado, existem muitas considerações diferentes sobre a na-
tureza de Yuan. Algumas pessoas acreditam que Yuan é a localização do
ponto de acupuntura Kuan Yuan, um ponto que se situa algumas pole-
gadas abaixo do umbigo, conhecido como Tan Tien inferior. Outras acre-
ditam que Yuan é Huei Yin, ou o períneo, que é chamado Hai Tai Ti
(isto é, o âmago do oceano) nos sistemas do Budismo esotérico e da yoga.
A menos que um imortal de verdade apareça e esclareça este assunto, não
há maneira evidente de finalizar este debate e resolver a controvérsia.
Porém, na filologia clúnesa, Yuan é o fenômeno da origem ou da fonte,
e esse ponto de vista pode ser verificado empiricamente.
Quando se diz que os cinco eh 'i vão para Yuan, o que se quer dize r
é que o c/z 'i das vísceras retorna à sua fonte ou posição original. Ele se
toma perfeito, equalizado, harmôruco, e não está bloqueado.
Em primeiro lugar, desejo explicar as três flores que assomam no
alto. Quando uma pessoa abre e de ixa fluir os oito meridianos suple-
ment ares e progrediu em sua meditação atingindo o estado da transmu-

99
tação do ching em eh 'i, ela esquece gradativamente suas sensações corpo-
rais. O corpo tanto parece como não parece existir. Nessa hora, as únicas
sensações que se experimenta são as resultantes das reações na cabeça. A
tranqüilidade dá origem ao fenômeno das visões auto-refletidas, isto é:
o olho do espírito se atira para o interior em vez de se voltar para o exte-
rior e, de repente, entra-se num estado de esquecimento de si mesmo.
O Baikui (isto é, o alto da cabeça) se sente como uma janela alta com o Sol
brilhando através dela; ela está aberta e clara, bem como incomparavel-
mente fresca e agradável. É como se uma lufada de ar fresco tivesse descido
e percorrido o corpo inteiro. Esse fenômeno é descrito no texto taoís-
ta como T'i Hu Kuang Ting. 16
E lastimável que as pessoas muitas vezes falhem ao entender as teo-
rias e tenham conceitos vagos. A pessoa que tiver um mínimo de ilusão,
de firme consciência religiosa ou se tiver qualquer ideologia subcons-
ciente pode, durante esse estágio, fazer uma viagem astral. Muitas experiên-
cias que parecem místicas poderão ocorrer combinadas com outras ilu-
sões; mas fenômenos desse tipo devem ser erradicados a fim de evitar-se
um retrocesso; deve haver um avanço para níveis mais elevados.
Em segundo lugar, desejo explicar o fenômeno dos cinco eh 'i que
se dirigem para Yuan. A pessoa sentirá repentinamente a cessação da res-
piração, inclusive da respiração do Tan Tien Inferior, na ocasião, ou logo
depois que as três flores aparecerem no alto. Todo o corpo ficará macio
como algodão e haverá uma agradável sensação de calor sem a respiração
do paraíso ulterior. Este estágio me recorda aquelas horas agradáveis
do dia, quando tudo está calmo e em silêncio. A mente e o corpo, por'
dentro e por fora, o céu e a Terra, e tudo o mais, parecem ocupar o seu
próprio centro ou parecem estar numa posição neutra; trata-se de um esta-
do de paz e de harmonia absoluta. Não se tem consciência do corpo ou
da existência ou da não-existência. Os pensamentos e as sensações super-
ficiais desaparecem sem deixar vestígios.
Quem experimentar isso apenas uma vez será como um gato cego
que pega um rato morto porque acidentalmente se chocou contra ele. As
bases ainda não foram estabelecidas. Para evoluir a partir desse estágio até
a transfonnação de eh 'i em shen, o indivíduo precisa ir além do reino da
meditação e tornar-se um com o Tao.

16 Ti Hu é a manteiga clarificada e Kuang Ting é a água espargida sobre a cabeça por

ocasião do batismo.

100
29. A Meditação e o Aperfeiçoamento de Shen
Sobre a Natureza do Shen
Para passar além da meditação até as fronteiras do Tao, precisa-
mos entender alguns dos conceitos de slzen usados nas artes médicas chi-
nesas, no Taoísmo e na Tan Tao. 17
Segundo o comentário do I Ching, "Shen não tem direção e não
tem forma ... Aquilo que não pode ser medido por Yin e Yang é chamado
de shen."
O clássico da medicina interior do Imperador Amarelo constata:
"Oh Shen. Teu som não pode ser ouvido com os ouvidos. Quando o
olho é brilhante e a mente está aberta e atenta, Shen se revela.
Ele pode ser descrito com a boca; apenas a consciência reflete tudo o que é
visível. Algumas vezes o shen brilha no campo periférico da visão e, quan-
do alguém rela..xa a atenção, desaparece por completo. Todavia, o shen ilu-
mina t odas as coisas e, quando ele se toma claro, é como se o vento ti-
vesse dispersado as nuvens. É por isso que se chama shen."
Su Ma Chien , famoso historiador da dinastia Han, e seu filho, Su Ma
Tan, caracterizaram os conceitos t aoístas de slzen: " A primeira força pri·
mitiva a gerar a vida humana é slzen, e a vida depende da forma ... Slzen é
a origem àa vida e a forma é a sua concha exterior ... Slzen usa o eh 'i, eh 'i
assume a forma ... Sem a inteligência e a sabedoria de um santo, quem pode
alcançar o slzen do universo e usá-lo para criar?"
O Sutra do campo amarelo, que aparece durante as dinastias de Han
e de Wei, associa slzen com todo e qualquer órgão do corpo humano. Em
cada órgão e célula existe um she11. Depois de tudo isso estar explicado,
deveria estar claro que shen de Tan Tao não é um simples conceito religio-
. :'. mas está tão bem associado com as ciências biológicas como qualquer
ot1tro.

Transformando Ch'i em Shen


Depois que se atinge as "três flores que assomam no 'topo" e os
"cinco eh 'i que são para yuan", entraremos naturalmente na fase de aper-
feiçoamento de shen. Uma vez que a transformação de eh 'i em shen é
muito mais sutil que a transformação de ching em eh 'i, podemos ser des-
viados do caminho nessa fase da meditacão. O processo da transformação
de eh 'i em shen geralmente é acompanhado da ocorrência de estados e
processos psicológicos e mentais que se assemelham de perto com as neu-

17
Tan Tao é a escola taoísta devotada aos imortais e à imortalidade.

101
roses, psicoses e assim por diante. Desta forma, o perigo consiste em po·
dennos interpretar enganosamente alguma forma de psicose como um po-
der sobrenatural e injustamente nos congratularmos por isso, o que poderia
levar-nos finalmente à nossa própria não-realização. Não devemos, entre·
tanto, nos tomar excessivamente preocupados ou amedrontados com essa
possibilidade. Em vez disso, é mais importante saber que existe essa pos-
sibilidade, de modo a estarmos aptos a distinguir entre os estados neu-
róticos ou psicóticos e os poderes mentais que acompanham a transfor·
mação de eh 'i em shen. Deveria ser fácil evitar esses problemas, desde que
naturalmente nos inclinássemos a desenvolver o tipo certo de conheci·
mento, à medida que progredíssemos na meditação.
O verdadeiro conhecimento do Tao é cultivado com boas ações e
com a prática da virtude. Uma vez que as sementes do Tao não podem ser
plantadas a menos que se faça boas ações e se adquira a virtude, os que fa.
lharem na assistência aos semelhantes e na meditação por razões egoís·
tas, adquirirão apenas um pouco mais de conhecimento.
Na verdade, muito poucas pessoas atingem esse estado da trans-
formação de eh'i em shen. Os sutras taoistas e livros budistas freqüen-
temente discutem essa fase da meditação usando enigmas ou outras afir-
mações inescrutáveis. Parece existir a idéia de que não é necessário des-
crever isso com clareza, pois espera-se que apareça uma divindade para
instruir os que atingirem esse nível de saber.
Para pôr um fim à análise dos efeitos psicológicos da meditação,
talvez seja útil responder a algumas perguntas sobre o que poderia acon·
tecer durante a transformação de eh 'i em slzen.
O que indica o começo da transformação do eh 'i em shen? Geral-
mente, uma pessoa que atinge "as três flores que assomam no topo" e
"os cinco eh 'i que vão para yuan" durante a meditação, passará tanto por
transformações psicológicas como por transformações fisiológicas. Por
exemplo, o corpo pode ficar quente, como se fosse primavera, e macio
como uma nuvem. Pode parecer que o corpo realmente desapareceu e a
pessoa se esquece totalmente de si mesma. Não há dor - apenas prazer
transbordante. Mente e corpo, interna e externamente, são impregnados
de iluminação. O mundo exterior se contrai e se derrete, enquanto que a
esfera interior se expande em todas as direções e se evapora no espaço
infinito. A consciência e todo o cosmo se fundem para formar uma total
unidade indivisível. Esses são os sinais do início do processo da trans-
formação de eh 'i em slzen.
O espírito realmente deixa o corpo durante a transformação de
clz 'i em shen? Os Tan Sutras e muitos livros taoistas contêm descrições
vivas e fantasiosas do espírito deixando o corpo. Desde o período da

102
dinastia Ming, as escolas Wu e Liu deram grande ênfase aos métodos de
aperfeiçoamento desse fenômeno. Há muitas descrições de como estar grá-
vida durante dez meses, amamentar o bebê durante três anos e encarar a
parede durante nove anos, que levaram algumas pessoas a acreditar que a
meditação bem-sucedida precisa envolver a projeção astral. Existe a supo-
sição de que o espírito ou o si-mesmo divino têm um corpo fetal próprio,
que finalmente jorra do alto da cabela e ascende aos céus. Acreditar que
este é um modo de transformar eh 'i em she11 é um erro grave.
Segundo a escola Tan Tao, yang shen (ou o espírito positivo) e yin
s~1e11 (o espírito negativo) podem ambos concorrer para a projeção do espí-
n to para fora do corpo.
Yang shen pode deixar o corpo de carne e sangue e ainda ser um
corpo físico com forma material e aparência visível. Pode comportar-se
exatamente como um corpo humano comum e, ainda assim, trata-se de
um corpo espiritual com fonna física e com existência independente.
Acredita-se que Ya11g shen é a projeção do verdadeiro espírito.
Uma pessoa que diz ter um corpo invisível e imaterial, com ou sem
forma, que entra e sai do seu corpo físico à vontade, está falando do corpo
de yin shen. Yin shen é semelhante àqueles corpos que aparecem nos so-
nhos, só que não são muito mais claros e mais distintos que os corpos de
"sonho" comuns. Os taoístas afirmam que a projeção de ya11g she11 é a
última conquista da meditacão e do cultivo do Tao. Mas se alguém ima-
ginar que a projeção de yil; shen é o último objetivo do Tao, então se
trata de uma pessoa comum ou que se encontra no estado yin de um espí-
rito ou de um fantasma.
Os que meditam sobre o Tao e o cultivam não terão qualquer dificul-
dade para projetar yin shen para fora do corpo. Alguns podem ter uma ex-
periência desse tipo muito antes de atingirem o estágio da transformação
de clz 'i em shen. Por exemplo: quando a ligação entre o espírito e o corpo
se degenera e enfraquece, pode ocorrer espontaneamente a projeção de
yin slzen. Se isso pode acontecer por si, nas circunstâncias .~e ~tre~s •. o e~­
tuda.nte deve entender que, com o treinamento, essa expenencta vtra mais
facilmente e sem a necessidade desse cansaço excessivo.
Algumas pessoas de temperamento nervoso que se engajam na prá-
tica da meditação podem ter a sensação da projeção de yin shen .. Esse
fenômeno é influenciado freqüentemente pela mente subconsciente,
quando ela está sintonizada com o eh 'i que ascende à cabeça. Quem
entende de psicologia e que reflete introspectivamente sobre a sua mente
subconsciente, não precisa se desiludir com isso. Contudo, alguns não são
infalíveis. Raramente uma pessoa é enganada pelos outros, porém é fre-
qüente ela se iludir com seus próprios pensamentos, sentimentos, emoções

103
e atos. A pessoa pode se decepcionar quer vivendo wna vida comum, quer
cultivando o Tao da imortalidade.
O cultivo de shen é um processo válido? A pesquisa teórica, bem co-
mo experiências de primeira mão, me convenceram de que o aperfeiçoa-
mento do shen é válido. Entretanto, a fim de participar desse processo, de-
veríamos ser totalmente donos de nós mesmos.
Fundir-se com o cosmo é uma condição prévia para o reconheci-
mento do nosso próprio espírito e do nosso Eu divino. É isso o que faculta
a uma pessoa evoluir. Isso permite que ela condense o shen e congrege o
eh 'i; que ela projete ou evite a projeção; que saiba discernir o tamanho do
corpo projetado e sair e voltar para o corpo físico conforme a sua vontade.
Isso permite que a pessoa trabalhe no cultivo do shen e na conquista do
Tao por meio da meditação. Sem o conhecimento perfeito, sem a virtude,
sem a harmonia e sem a bênção não há como ir além disso.

104
Apêndice 1

O Cultivo do Samadhi e da Sabedoria


Através do Ch'an (Zen)
A disciplina (sila), a quietude (samadhi) e a sabedoria (prajna) são
os tres aspectos de Anasrava (isto é, do não-escoamento). Essas atividades
são. benéficas. A quietude, ou samadhi, é o centro da disciplina e da sabe·
dona. A sabedoria, ou prajna, é o fundamento que usamos para identifi·
car e compreender o caminho de Buda. Para aperfeiçoar o Budismo, preci-
sa-se, em primeiro lugar, desenvolver o samadhi.
Uma pessoa que tenha atingido o samadhi descobrirá o corpo solene
de si/a, ou da disciplina. O conhecimento lhe será revelado e ela se tornará
wna iluminada.
Há 84.000 caminhos do DhannanoBudismo, cada um deles deriva-
do do samadhi. O samadhi conduz ao oceano de Bodlzi. É muito importan-
te entender que no Budismo o cultivo não pode ser separado do samadhi
O cultivo do samadhi não consiste simplesmente em sentar-se na po-
sição de meditação. Os budistas dividem as posições da vida diária em qua-
tro formas que inspiram respeito: sentar, andar, ficar em pé e deitar-se. Se
alguém deseja atingir o samadhi, precisa meditar sempre que se sentar, an-
dar, ficar em pé ou se deitar. O samadlzi pode ser aperfeiçoado em qual-
quer uma dessas posições.
Existem setenta e duas posições para se sentar de uma forma apro-
priada para o cultivo do samadlzi, e este é alcançado mais facilmente na po-
sição sentada, ao menos no princípio. Segundo os ensinamentos budistas,
cruzar as pernas na posição de lótus é a posição mais auspiciosa.
Deveríamos prestar atenção ao modo como nos sentamos, ficamos
em pé, andamos ou descansamos, e deveríamos ficar atentos para manter-
mos o samadhi durante todo o tempo, mesmo ao falar ou ao agir. Se pu-
dennos verdadeiramente fazer isso, nosso samadhi será muito forte.

105
Depois de desenvolver o samadlzi, estaremos aptos a identificar o Bo-
dhi. Isso pode ser facilmente realizado, como se colhêssemos frutas de uma
árvore. Entretanto, quem conceber incorretamente esses assuntos ou per-
cebê-los de forma imprecisa, terá uma visão distorcida da verdade.
Um estudante pode aumentar seu conhecimento estudando sutras e
praticando o cultivo do samadhi. Os sutras dhyana e de contemplação são
excelentes e os livros sobre os métodos Chih e Kuan da escola Tien Tai,
além dos textos sagrados do Budismo esotérico, são altamente recomen-
dados. Os estudantes sérios devem procurar entender este material.

Passos em Direção ao Samadhi


No início do cultivo do samadhi e do conhecimento, é importante
ter determinação e força de vontade, isto é, ter feito a firme resolução de
atingir o Bodhi. Em segundo lugar, uma vez que o nosso cultivo depende
do mérito, devemos agir fazendo boas ações e atos de caridade meritórios,
sempre que possível. Semeando a conduta correta, alcançaremos recompen·
sas abundantes. A pessoa terá sucesso em entrar no Tao se tiver força de
vontade e a oportunidade de exercitar-se num ambiente fértil.
Os processos exotéricos e esotéricos de cultivo requerem o desenvol-
vimento e a corporificação de quatro qualidades nobres, isto é, a gentileza
ilimitada, a piedade ilimitada, a alegria ilimitada e a ilimitada indiferença.
Determinação firme e mérito acumulado são os alicerces do Tao. Uma vez
que se é facilmente desviado da verdade se houver carência de uma dessas
qualidades, elas são os pré-requisitos básicos para o sucesso.
Os chineses gostam de dizer que o trabalhador precisa ter boas fer·
ramentas se espera fazer bem o seu trabalho. A situação é a mesma para
quem pratica a meditação e aperfeiçoa o samadhi. Ele precisa ter boas fer·
ramentas, embora não se possa adquiri-las no mundo exterior. Os seis in-
driyas, ou órgãos dos sentidos, nos provêm com excelentes fe rramentas pa·
ra entrar em samadhi.
Os seis indriyas são o olho, o ouvido, o nariz, a língua, o corpo e a
mente. São confrontados com seis gunas, ou visões, sons, odores, sabores,
sensações táteis e idéias. Essas mithya ou ilusões estão sempre indo e vin-
do. Quando uma pessoa supõe erroneamente que esses fantasm as são reais,
ela perde a sua natureza original.
Na Surangama Sutra, os seis indriyas são chamados de os seis ladrões.
"Os olhos, os ouvidos, o nariz, a língua, a pele e a mente são os lad rões.
Eles roubam o nosso tesouro precioso. Os seres humanos viventes são sem-
pre derrubados por essas coisas, o que explica por que é t ão difícil trans-
cender este mundo t erreno." As pessoas que praticam o samadlzi e que de-

106
sejam voltar à sua natureza original podem usar os seis indriyas como
ferramentas.
. É melhor que a pessoa escolha uma dessas seis ferramentas para o
cultivo. Ela pode praticar usando a que escolher, até familiarizar-se com
ela. Pode concentrar-se sob re ela até que alcance o primeiro estágio dosa-
madhi, o que significa que pode fixar a mente num ponto único sem que
sua atenção oscile.
Cada órgão dos sentidos e cadaguna pode ser desenvolvido de várias
n:aneiras. Uma explicação detalhada disso seria muito complicada. Buda
disse que em cada pensamento existem oitenta e quatro mil sofrimentos
mortais. Tem-se dito que "Buda ensinou todo o Dhanna (caminhos) por-
que ele desejava salvar todas as mentes. Se não tenho todas as mentes, por
que deveria usar todos os caminhos?" Cada pessoa é diferente. Cada pessoa
deve escolher o caminho a que se adapte melhor. 18

Métodos que Envolvem a Visão


Em primeiro lugar, analisarei os métodos que usam os olhos e o sen-
tido da visão. A fim de cultivar o samadlzi com esse método, devemos
encontrar um objeto apropriado sobre o qual focalizar nossa atenção vi-
sual. Uma estátua de Buda, ou qualquer coisa que brilhe um pouco, é ideal.
Devemos concentrar-nos no objeto fixando o olhar sobre ele e nos descon-
traindo.
A cor do objeto é muito importante e deve ser cuidadosamente esco-
lhida de acordo com a nossa condição fisiológica e psicológica. A cor apro·
priada não pode ser determinada por uma nomia fixa, mas deve fundamen-
tar-se na situação de cada um. Por exemplo, o verde é a melhor para os que
são extremamente sensíveis, 0 vermelho é bom para as pessoas que sofrem
de fadiga e de exaustão nervosa e o azul é muito benéfico para as pessoas
desmedidamente inquietas e impacientes. Mudar a cor d? objeto s~bre o
qual nos concentramos pode se tomar uma desvantagem: e melhor nao tro-
car a cor do objeto que se usa para a concentraçã'o. .
Se alguém quiser se concentrar sobre a iluminação ou na própna luz,
poderá olhar para uma pequena lâmpada ou vela, ou então observar a luz
do Sol, da Lua ou das estrelas. Muitas vezes os hipnotizadores usam a luz
de um cristal ou de um pêndulo. É melhor quando a luz incide lateralmen-
te nos olhos em vez de brilhar diretamente sobre eles. Pode-se ou olhar pa·

18 Alguns métodos de cultivo serão descritos na parte seguinte do livro. Se alguém


quiser pesquisá-los, deverá estudar todos os ensinamentos exotéricos e esotéricos. O
Sarangama Surra, por exemplo, descreve o dharma-paryaya ou a porta para a ilumina-
ção dos vinte e cinco Bodhisattvas.

107
ra o céu para observar a sua luz natural, ou olhar para a luz produzida por
um fogo, ou ainda verificar a luz refletida por um corpo liso na água. No
entanto, geralmente não é uma boa idéia fixar-se na própria imagem refle-
tida no espelho, pois esse tipo de concentração pode incentivar uma expe-
riência fora do corpo.
Os budistas, os taoistas e os membros de outras escolas religiosas
adotaram esses métodos. Os estudantes devem compreender que esses mé-
todos são apenas métodos para facilitar a entrada dos principiantes nos es-
tados elementares. Se alguém se ativer somente a esses métodos, será des-
viado do verdadeiro. Se a pessoa ficar preocupada com essas técnicas, sua
mente ficará confusa e pode ficar difícil alcançar o estágio em que a men-
te está fixada firmemente em um só ponto.
Fenômenos de diferentes tipos podem ser produzidos no decorrer
da prática. Trabalhar com luz e cor pode produzir visões e fantasmas, bem
como a clarividência. Instruções de um bom professor podem ser aconse-
lháveis se isso acontecer.
Existem também muitas pessoas que atingiram a il'!fiÍnação vendo
repentinamente alguma coisa. Por exemplo, Sakya Buddha tomou-se um
iluminado quando viu uma estrela brilhante no céu. Llng Yung, um ances-
tral mestre de Zen, tomou-se um iluminado quando viu uma flor de pesse-
gueiro. Ele escreveu um poema para celebrar o ocorrido, dizendo: "Estive
olhando durante muitos anos para o cabo da espada. Quantas vezes as fo-
lhas caíram e germinaram novas? Desde que vi a flor do pessegueiro, nun-
ca duvidei novamente." Um dos discípulos de Llng Yung também escre-
veu um poema descrevendo a iluminação do mestre : "Llng Yung viu ape-
nas uma vez a flor do pessegueiro. Galhinhos vermelhos e brancos não car-
regam flores. Os pescadores no barco vêm à praia par.a pescar peixe e cama-
rão. Isso é aborrecido!" Quem quer que possa dar semelhante passo, não
está evidentemente limitado por métodos acanhados.

Métodos que Envolvem o Som


Analisaremos agora alguns dos métodos que envolvem o som. Os
sons físicos do corpo se fazem ouvir de acordo com o método interior. Po-
de-se entoar o nome de Buda, entoar sutras ou recitar mantras. Há três
técnicas de cantar: cantar em voz alta, murmurar ou repetir silenciosamen-
te os sons dentro da mente. Quando uma pessoa canta, ela ouve. Isso quer
dizer que, por um lado, há a própria canção e, por outro, há o fato de ou-
vir o resultado do som. No início, pode-se ouvir apenas intermitentemente
um canto contínuo, mas com o passar do tempo o som decresce e se toma
concentrado, até que a mente silencie.

108
Há métodos de escuta de sons exteriores. Qualquer som pode provar-
se útil, embora a audição de água corrente, do som de uma cachoeira, do
vento a soprar, de guizos ou de sinos, dos sutras entoados no templo pare-
çam produzir os melhores efeitos.
O Surangama Sutra descreve o dhannaparyaya, ou a porta através da
qual os vinte e cinco Bodhisattvas passam ao entrar na iluminação. A dhar-
maparyaya de Kuan-Yin era para entrar no Tao através do som, e esse mé-
todo parece ser um dos melhores. Diz-se que "o verdadeiro corpo que ensi-
na neste lugar, puro e limpo, é derivado da audição de um som".
A mente pode ser posta em ordem, concentrando-se num som que
pode ser ouvido sem que se fique sonolento ou sem que se pense em qual-
quer outra coisa. Se a prática disso for contínua, de repente a pessoa po-
de entrar num reino muito tranqüilo, onde nã"o se ouvem sons. Nesse caso,
ela atinge o estado de samadhi e tem a sensação da extrema tranqililidade.
Esse é o "vínculo da quietude" mencionado nos sutras budistas.
Ninguém deve ansiar por reter o · "vínculo da quietude". Devemos
compreender que "o vínculo da quietude" é um fenômeno, enquanto que o
ruído é outro. Devemos transcender ambos. Nunca devemos desejar aban-
donar o barulho nem permanecer num estado de quietude. É importante
compreender o não-nascimento do caminho do centro e entrar na observa·
ção da sabedoria.
Quando a pessoa observa a natureza da audição, ela sabe que esta
não pertence nem ao movimento nem à quietude, não é contínua nem
intennitentc.
O corpo não nasceu; não há nascimento óu morte para o corpo. Mui-
tos dos antigos mestres zen não passaram por todas essas etapas para conse-
guir a iluminação; eles foram iluminados ouvindo wn som específico. Por-
tanto, os que entraram no Tao praticando o Zen sempre ~ompreender~
que o dhannaparyaya de Kuan-Yin da audição do som e deveras muito
grande.
Sob a direção do mestre Pai Chang, um monge ficou iluminado por
ouvir o som de um sino. Pai Chang disse: "Maravilhoso! Este é o caminho
do dhannaparyaya de Kuan-Yin." Hsian Yen ficou iluminado enquant~ es-
tava fustigando um bambu, e Yuan Wu ficou iluminado quando OUVIU o
vôo de uma galinha da montanha.
'O Quinto Patriarca escreveu: "O vento sopra o Sul; o canto do tem-
plo fica um pouco frio." Um poema de amor escrito durante a dinastia
Tang diz: "Freqüentemente chamo sem motivo o nome da donzela Sheau
yu ; eu simplesmente quero que minha amada ouça e reconheça a minha
voz." Essas pessoas ficaram iluminadas pelo som. Isso é muito grande e
muito bQnito. Muitas pessoas usam o princípio do ouvido dhannaparyaya

109
(isto é, o som), mas muito poucas entendem que "os dois fenômenos do
movimento e da tranqüilidade não são trazidos à vida".
Se uma pessoa parte do som exterior e nada tem a ver com tudo isso,
ela naturalmente atingirá o samadlzL Dos dois fenômenos, movimento e
quietude, o samadhi {o fenômeno do silêncio. Mente e corpo constituem
o fenômeno do movimento. Se alguém acreditar que a quietude do sama-
dhi é a Natureza Original, então se desviou; porém, se puder ir além, en-
trará pelo portão.

Métodos que Envolvem a Respiração


Também se pode atingir o samadhi usando m étodos que envolvem a
respiração. A Escola Tien Tai e os ensinamentos esotéricos tibet<mos acen-
tuam a respiração nasal dhannaparyaya. Isso inclui o cultivo dos canais de
eh 'i, de eh 'i kung, da respiração contada e cfa mente seguindo a respiração.
Quando a respiração se toma mais uniforme e refinada, até quase cessar,
trata-se de Hsi.
O princípio fundamental dessas técnicas é que a mente e a respiração
estão intimamente ligadas. O controle da mente através da respiração é o
método mais fácil para as pessoas que pensam demais ou para as que têm
pensamentos desordenados. Se alguém atingir o samadhi e refletir cuidado-
samente sobre o fato, descobrirá que a mente e a respiração são interde-
pendentes: urna depende da outra.
O pensamento é gerado pela respiração. A respiração é manifestada
no pensamento. Quando a respiração é lenta e igual, o pensamento é lento
e tranqüilo. Pensamento, respiração e quietude não são o conteúdo do
Tao, mas funcionam como o poder da Natureza Original.
Os taoistas supõem que o eh'i do pré-paraíso se dispersa a fim de
criar o eh 'i. Eles imaginam que, quando o eh 'i é recolhido, ele assume um
feitio ou forma específicos. O eh 'i foi considerado como a raiz da vida e da
Natureza Original, m as isso é um engano. Se alguém se identificar muito
com alguma coisa, a ponto de perder sua própria razão, não pode entender
a idéia da Natureza Original e suas manifestações. Isso exemplifica a dife-
rença que existe entre o Dhanna correto e as escolas divergentes.
Devemos obter alguma compreensão da Natureza Original. Se a pessoa
entender que a mente e a respiração são interdependentes, estará livre. Se
alguém supuser que a mente e a matéria são derivadas de urna única fonte,
entenderá que os métodos de obtenção da iluminação são meramente in-
ventados para a conveniência dos estudantes.

110
Métodos que Envolvem as Sensações Físicas
Alguns métodos de desenvolver o samadhi envolvem as sensações do
corpo. Há dois tipos de dhamzaparyaya físicos.
No sentido ge ral, isso inclui todas as técnicas que pertencem aos seis
órgã?s dos sentidos. Além do mais, a pessoa usa o corpo ao praticar essas
té:mcas. Onde estariam os seis órgãos dos sentidos sem o corpo? Todos os
metodos de aperfeiçoamento requerem o corpo. No sentido estrito, o dlzar-
maparyaya do corpo requer a concentração num único ponto físico, isto é,
o ponto entre as sobrancelhas, o topo da cabeca, o Tan Tien, a sola dos
pés, o c?ccix ou o períneo. Pode-se ficar atento ,à respiração ou usar técni-
cas de vtsualização a fun de concentrar-se num ponto único do corpo du-
rante a meditação.
As sensações de frio ou de calor, de maciez ou de rigidez, as palpita-
ções ou as dores podem acontecer como um resultado da prática dessas
técnicas. t muito fácil ter a sensação de várias reações fisiológicas e, assim,
nos tomarmos apegados aos fenômenos causados por esses métodos.
Exemplificando: embora os fenômenos que acontecem nos canais do ch'i
nos pennitam discernir a profundidade da nossa meditação, eles fazem
com que naufraguemos se ficarmos presos aos fenômenos.
No Diamond Sutra, esse tipo de ligação é conhecido como o "dog-
ma da individualidade e do egoísmo permanentes". Esse dogma implica
que todos os indivíduos são verdadeiros e têm desejo de imortalidade. Os
Bodhisattvas autênticos não vêem as coisas dessa maneira. Os métodos de
aperfeiçoamento do Budismo esotérico e do Taoísmo podem fazer com
que uma pessoa fique apegada a certo fenômeno, uma vez que é muito di-
fícil libertar-se da ilusão de que a mente e o corpo são reais. O r:iestre zen
Huang Po costumava suspirar sobre a dificuldade de esquecer o s1_-mes~o e
o corpo. No Sutra da iluminação perfeita diz-se que "os homens imagm~
falsamente que os quatro elementos são as manifestações de s~u.próp~o
corpo e acreditam que os seis órgãos dos sentidos e seus objetivos sao
manifestações da própria mente". As pessoas sempre cometeram esse erro .
Por essa razão Yuno Cllia o mestre zen, disse: "Deixe que os quatro ele-
' o '
mentos vão embora; não tente apanhá-los, apenas coma e beba na Nature-
za tranqüila."
Podemos ima!!inar como uma pessoa pode livrar-se dessa ilusão antes
de alcançar a santidade. Pode-se usar a ilusão para aperfeiçoar o que é ver-
dadeiro. Usar o corpo físico para aperfeiçoar a nossa Verdadeira Natureza
é um dhannaparyaya conveniente. O corpo pode ser usado para entrar no
Tao, desde que se compreenda que se trata apenas de um método. Não de-
vemos perder a cabeça e nos identificarmos com a sua sombra, ou imaginar
que essa sombra é verdadeira. Se alguém se identificar com a própria som-

111
bra, afundará e achará difícil voltar à t ona. Lao Tsé disse:" A razão de eu
ter tantos aborrecimentos é que eu tenho um corpo." Essa é uma verdadei-
ra regra! Os antigos mestres zen não desejavam discutir sobre os canais do
eh 'i, pois esperavam que seus discípulos evitassem ligar-se a eles. Esse é um
método superior de ensino.

Métodos que Envolvem a Consciência


Analisaremos agora os métodos que envolvem a consciência. O por-
tão através do qual podemos alcançar o Tao contém todos os outros e inclui
oitenta e quatro mil métodos. A consciência é a dona das "cinco consci-
ências"; cada uma delas corresponde a um determinado órgão dos sentidos
e a seus objetivos. Essas consciências menores puxam os cordéis e o rei da
mente move o boneco.
O Dhanna, portanto, é manufaturado pela consciência. Todavia, pa-
rece razoável acreditar que a própria consciência em si mesma nos deveria
armar com determinado método de cultivo. Os métodos de observação da
mente, Chih e Kuan, e o trabalho sobre o Zen, entre outros, incluem-se no
próprio Dhanna da consciê~cia.
Ninguém pode observar a Natureza Original da Mente Real no iní-
cio deste trabalho. Observemos o nascimento e a morte, ou o aparecimento
e o desaparecimento do pensamento. Em outras palavras, este Dhanna
revela a mente falsa da consciência. Na meditação, devemos refletir intros-
pectivarnente sobre a natureza da consciência, a fim de revelar o falso espí-
rito dos pensamentos que podem aparecer e desaparecer em rápida suces-
são. Observaremos a origem e a destruição de pensamentos específicos e
notaremos de onde eles vieram e para onde vão. Observando desta maneira
uma série de pensamentos, romperemos a corrente da consciência. Pensa-
mentos precedentes já desapareceram e podem ser esquecidos. Pensarnen·
tos subseqüentes ainda não apareceram e podem ser facilmente ignorados.
Quando os pensamentos anteriores desapareceram e os posteriores ainda
não apareceram, tudo está quieto. É como um elefante perfumado atraves-
sando o rio. Um gigantesco elefante perfumado pula na água; não importa
a força da correnteza, o elefante a ignora e atravessa o rio. Seu corpo que-
bra a continuidade do fluxo da correnteza. No Budismo, esse fenômeno é
conhecido como Samatha ou parada.
No entanto, esse fenômeno é samatha; trata-se de um domútio tran-
qüilo muito semelhante ao vazio, embora não seja o vazio autêntico. Note-
se que a existência provém do vazio e que o vazio se baseia na existência.
Existência e vazio são manifestações da Natureza Original, e a Natureza
Original é a fonte da existência e do vazio.

112
Nesse estágio não nos preocuparemos com os dois lados, mas obser-
varemos o meio. Finalmente, não ignoraremos cada um dos lados, mas des-
consideraremos o centro. No Budismo, isso é conhecido como a observa-
ção com sabedoria.
Se continuarmos trabalhando depois de atingirmos o samatha, even-
tualmente atingiremos o samadhi E se continuarmos a progredir depois de
atingir a observação com sabedoria, certamente adquiriremos a sabedoria.
Uma pessoa que continue a aperfeiçoar-se, avançará, passo a passo, através
dos dez estágios do desenvolvimento bodhisattva e, com certeza, atingirá o
Bodhi perfeito ou a iluminação. Esse tipo de aperfeiçoamento inclui os en-
. sinarnentos da seita Tien Tai, o tratado sobre a tocha Tao do bodlzisattva
da seita amarela do Lamaísrno, a meditação sobre o significado, ou o cen-
tro, e samyagdrist (ou visões corretas).
Nos primórdios da escola zen chinesa, nenhum método formal foi
ensinado aos alunos. Há um ditado que diz que "Quando a linguagem é
cortada pela raiz, todo o comportamento mental se extingue"· ·Assim,
não havia método. Em tempos mais recentes, os estudantes de Zen usaram
os métodos da disposição inquiridora ou exercitaram o Kung Fu. Tudo isso
pertence ao Dhanna da consciência, embora as técnicas Zen usem a consci-
ência de um modo diverso dos outros Dharmas.
O que significa a disposição inquiridora no Zen? Ela nem é a observa-
ção com sabedoria, nem é a dúvida auspiciosa mencionada no discurso so-
bre A Porta ao conhecimento dos fenómenos universais. A disposição
inquiridora penetra profundamente no alaya vijnana ou na totalidade da
consciência, que tanto é relativa como absoluta, tanto é pessoal com~
impessoal. É a consciência mental fundamental de todos os seres consci-
entes, que armazena e apreende as sementes de todos os acontecimentos,
quer passados, quer futuros. Antes, a mente e o corpo estavam uni~os nu·
ma única totalidade. Antes da iluminação, parecia haver alguma c01sa blo-
queando dentro do peito, alguma coisa que não podia escapar. Ess~ ten-
são só se desfará sob condições adequadas, o que inclui a oporturudade
certa, as condições externas necessárias, as instruções corretas e somente
quando tudo se combinar num único momento. É por isso que se diz que
"a divina luz que brilha sozinha, parte dos objetos do pensamento, do sen·
timento e da sensação". Também se diz que "todos esses fenômenos são
ilusórios".
O último estágio não pode ser descrito com palavras. São tentativas
de descrevê-lo: "Mesmo até que seja dita a última sentença singular, ele
chegará a uma barreira sólida. Controle o importante ponto de transporte
que não se comunica com as massas ou com os santos." Isso é atribuído
ao "Buda do Grande Sol" e atribuído ao "Primeiro Buda do Kalpa vazio",

11 3
também conhecido como Bhisma-garfita-ghosa-svara-raja. Em outras pala-
vras, não tem começo. Dificihnente podemos esperar entender isso com
nossos próprios pensamentos, pois tais assuntos são difíceis de analisar
mesmo com mil santos.

A Imagem do Samadhi e da Sabedoria


A prática do Budismo Hinayana começa com si/a ou a disciplina.
Quando uma pessoa acata si/a, ela avança para o samadlzi. Em samadlzi, ela
pode adquirir a sabedoria e alcançar a liberação. Finalmente, ela atinge o
Nirvana.
Os estudos da Mahayana começam com a doação de esmolas, com a
guarda dos mandamentos, com a paciência diante das provocações, com ze-
lo e meditação, e termina com a sabedoria.
Samacha (ou parada) e contemplação budista induzem samadlzi e
sabedoria; contudo, são apenas o início da prática.
O cultivo através dos seis órgãos dos sentidos e seus objetivos se
desenvolve em oitenta e quatro mil Dharmas. Todos esses Dharmas são de-
sejados para aquietar os pensamentos da pessoa. Quando os pensamentos
cessam, há samadhi. A extensão do samadhi difere conforme o que se con-
seguiu ou s·e conquistou.
Alguns métodos de cultivo de samadhi comecam com a vida e envi-
dam vários esforços para alcançar o vazio. Alguns m'iciarn com o vazio. Em
outras palavras, esvazie toda a sua existência e compreenda a realidade ab-
soluta. Embora existam vários métodos, todos visam o samadhi.
Se uma pessoa puder concentrar a mente num único objeto e focali-
zar seu pensamento num lugar, sem perturbação, então alcançou o estágio
de ·cessação, que é a base para entrar no samadhi.
A natureza do samadhi não é nem o instável pensamento incansá-
vel, nem o torpor apático. Em samadhi estamos alertas. Em samadhi es-
tamos conscientes e silenciosos, silenciosos e alertas. O samadhi se parece
com o fogo que está quase extinto, porém retém a semente da chama em
suas cinzas. Quando o fenômeno da consciência e da quietude se conju-
gam, ocorre o samadhi. .
Não dependa da mente. Não dependa do corpo. Não dependa da
não-dependência. Em samadhi o pensamento não reside na mente, o pensa-
mento não reside no corpo e o pensamento não depende da não-dependên-
cia. Tudo está abandonado. Isso é samadhi.
Quando se começa a cultivar o samadhi, geralmente se está ou in·
quieto ou letárgico. Todos os seres humanos, estão às vezes, inquietos e, ou-
tras vezes letárgicos. Nós vivemos nesses estados no dia-a-dia, durante a
nossa vida, sem tomar consciência desse fato.

114
Em primeiro lugar, analisarei a inquietação. Quando o pensamento
de uma pessoa não tem refinamento, ele é facilmente dispersivo, esparso e
freqüentemente caótico. Quando o pensamento é mais aprimorado, ele se
toma um tanto mais elevado.
Ao cultivarmos o samadlzi, nossa mente não pode ficar estacionada
num lugar. O pensamento das pessoas é uma mescla. Suas cabeças estão
cheias de idéias, de lembranças e assim por diante. Essas são as operações
da mente mais vulgar.
Quando a mente da pessoa se torna mais aprimorada, parece que ela
pode descansar o pensamento num lugar apenas, e então pensamentos deli-
cados aparecem e desaparecem como a névoa ou como teias de aranha.
Embora isso não seja muito incômodo, permanece um tipo de terna liga-
ção acontecendo na mente. Esse estado é um pouco mais elevado e é co-
nhecido como Tiao Chu.
A maioria das pessoas que meditam vivencia este fenômeno. Algumas
delas não reconhecem os tênues pensamentos migratórios e acreditam que
já atingiram o samadlzi. Isso é completamente errado.
Se alguém não puder parar de pensar, a mente ficará confusa e não
poderá se acalmar. Para os principiantes, o melhor plano é esgotar-se atra-
vés de exercícios, de prostrações diante do Buda, e assim por diante. Em
seguida, controlar o próprio corpo até que a respiração se tome unifonne e
fácil e esteja apto a meditar novamente. Por não prestar atenção à mescla
de pensamentos e, no entanto, por se concentrar num só pensamento é que
alguém certamente se sentirá bem e será capaz de descansar a mente em
wn objeto apenas.
Se a mente está repleta de pensamentos confusos e variados, trate·
os como trataria os hóspedes que sempre estão vindo e indo embóra. E~­
quanto um anfitrião não aceitar nem rejeitar seus hóspedes, eles um dia
irão embora. Da mesma forma, os pensamentos embaralhados gradativa-
mente cessarão.
Sempre que a mente embaralhada quase chegar a uma parada, a pes-
soa pode sentir que está chegando a uma parada. Esse sentimento é um
pensamento falso. Sempre que esse falso pensamento parar, um outro apa·
recerá e tudo se repete outra vez. Por isso, é muito difícil entrar no domí·
nio da cessação.
Se alguém quiser aprimorar o samadhi, é melhor não pensar sobre o
cultivo de samadlzi. Toda vez que acontecer esse pensamento de parada, a
pessoa não deve se concentrar na idéia de que irá conseguir atingir o sa-
madhi. Desse modo, pode entrar gradualmente no estado de deter essa cor-
rida louca da mente.

115
Durante a meditação, muitas vezes sentimos que os pensamentos são
mais copiosos do que em tempos comuns. Isso é um indício de progresso.
. ~ colocar alúrnen num copo de água suja e observar a sujeira assentar no
fundo. Embora a água pareça estar clara, sabemos que está suja. Analoga·
mente, quando um raio de sol penetra pela abertura da porta, pode·se ver
a poeira revoluteando no ar. A sujeira na água e a poeira no ar existem ori·
ginalmente. Não tomamos consciência delas, mas sob certas condições é
mais fácil percebê-las. Embora pareça haver mais pensamentos durante a
meditação, a pessoa realmente tem muito mais pensamentos anterionnen·
te. Eles são percebidos mais facilmente durante a meditação. Portanto, isso
não é problema.
Se uma pessoa tem pensamentos em demasia e o poder do pensamen·
to desordenado é grande demais para ser interrompido, ela pode contar as
resRirações, ou visualizar um ponto brilhante ou na região abaixo ?º
u~bi·
go 9 ou no centro da sola do pé, a fim de acalmar essa mente mqmeta.
Uma outra maneira de lidar com essa abundância de pensamentos é cantar
Amita Buddha: "Na-Mo-Oh·Mi-To-Fu." Quando uma pessoa alcança o Fu,
ela deve dragá-lo durante muito tempo, como se estivesse dragando a pró-
pria mente, o próprio corpo, até uma profundidade infinita.

Torpor
Agora quero falar sobre o torpor. O torpor comum é o sono, enquan-
to que o torpor mais sutil é a letargia.
Sempre que a mente ou o corpo estão cansados, desejamos dormir.
Sempre que uma pessoa necessite donnir, não deve forçar-se a meditar.
Deveríamos ter donnido o suficiente antes de iniciar a meditação; de outra
forma, poderemos adquirir o hábito de adormecer durante a meditação.
A pessoa que fizer isso jamais terá sucesso.
Quando uma pessoa está num estado de sonolência, sua mente pare-
ce estar tranqüila. Ela nem se concentra numa só coisa, nem abriga pensa-
mentos grosseiros, mas se encontra num estado de torpor. Embora n ão
possa ter consciência de sua mente ou de seu corpo, acha-se num estado de
sono, mais do que num estado de meditação.
A pessoa que estiver cultivando o samadhi pode cair facilmente num
estado de torpor. Se ela não entender isso, e confundi-lo com um tipo de
samadhi, lamentavelmente fracassará. Sumatikirti, o fundador da seita

19 Para as mulheres, pode ser prejudicial fo calizar a atenção no ponto alguns dedos
abaixo do umbigo, conhecido por Tan Tien. Por isso, recomendamos que as mulhe·
res focalizem a atenção num brilhante ponto preto no centro da sola do pé. Convém
verificar também a página.45. (N. T.)

116
Amarela, disse que se uma pessoa confunde esse tipo de torpor com o sama-
dhi, depois da morte ela se reencarnará num animal. Portanto, a pessoa de-
ve ter muito cuidado.
A visualização poderá ser usada para vencer os estados de torpor. Por
exemplo: podemos visualizar um brilhante ponto vermelho dentro do nos-
so umbigo e imaginar que ele está correndo para cima. Quando esse bri-
lliante pomo vermellio atingir o topo de nossa cabeça, ele se dispersará.
~utra téqtica é o uso de toda a nossa força para gritar "PEI!". Ou, além
disso, podemos pressionar as narinas a fim de interromper a respiração até
que isso se tome insuportável e, então, deixar o ar retido sair rapidamente.
Finalmente, podemos tomar um banho frio ou fazer alguns exercícios
apropriados. As . pessoas que praticam exercícios respiratórios não podem
cair facilmente nos estados de torpor. Acredita-se freqüentemente que o
torpor é Wang Kong, isto é, que é a estupidez ou o vazio. Entretanto, isso
é incorreto. O termo Wang Kong aplica-se a um idiota, a um simplório que
não tem clareza de pensamento.

Iluminação
Quando ambos, torpor e inquietação, desaparecem, e a mente repen-
tinamente se fürn numa única coisa, sem que haja sono e inquietação, ocor-
re a iluminação. Para alguns, essa sensação começa no topo da cabeça en-
quanto para outros ela se inicia na sola dos pés.
Quando a iluminação começa no topo da cabeça, a pessoa sente aí
um frio, como se alouém
o estivesse gentilmente derramando um creme ,.
sobre ela. Os budistas e os taoístas chamam a isso de "batismo interior · ·
Essa sensação circula por todo o corpo, a mente fica descansada, o corpo
descontraído e a pessoa se sente tão macia e flexível que muitas vezes pa-
rece que os próprios ossos se desfizeram. É natural, então, que o corpo fi-
que ereto como um pinheiro. A mente está clara e não há sensação de in-
quietação ou de torpor em resposta ao meio ambiente. Tem-se a sensação
de um estado natural de prazer. Essa experiência de iluminação, no entan-
to, certamente desaparece.
Quando a iluminação se inicia na sola dos pés, a pessoa tem sensa-
ções de calor ou de frio, que se movem para cima até o alto da cabeça. Pa-
rece que essa iluminação vai além de limites físicos para penetrar no céu.
A iluminação que se origina na sola dos pés é muito mais fácil de reter do
que a que se origina no alto da cabeça. Ela não desaparece tão facilmente.
Os confucionistas dizem que uma pessoa tem o sentido da primavera
quando ela atinge o estado de quietude. A primavera induz às sensações de
calor, de crescimento, de frescor e de prazer. Essas sensações acompanham
as experiências de iluminação durante a meditação.

117
A iluminação diminui gradativamente quando somos forçados a lidar
com os negócios mundanos e não podemos sustentar nosso esforço para
progredir mais. Portanto, se for possível, é melhor para a pessoa que atin-
giu esse estado que viva sozinha num lugar tranqüilo.
Muitas vezes, quem continuar a se aperfeiçoar notará que esse fenô-
meno da iluminação enfraquece, porém isso não significa que ele verdadei-
ramente se esvai. Ao contrário, se alguém permanecer nesse estado durante
um bom p~ríodo, a sensação de iluminação não parecerá tão forte como
no início. E como o ato de comer uma iguaria nova pela primeira vez. No
começo, o sabor é intensamente novo, mas a ingest ão continuada desse
mesmo alimento, dia após dia, tornará insípido o gosto e ele não parecerá
tão revigorante como no início.
Se alguém continuar a manter ininterruptamente o estado de ilumi-
nação, o seu samadhi se tornará firme e estável. Essa pessoa se sentirá cal-
ma e esclarecida. Os canais do eh 'i por todo o corpo sofrerão muitas mu-
danças e o corpo se sentirá quente e harmonioso, como se a pessoa sentis-
se um forte orgasmo interior. Essas sensações são difíceis de descrever,
mas os chineses freqüentemente dizem que somos "tocados interiormen-
te por prazeres maravilhosos". Uma pessoa pode libertar-se dos desejos
mundanos apenas por progredir até este ponto.

O Estágio mais Elevado


A força vital toma-se altamente ativa quando as correntes eh 'i e yang
eh 'i começam a circular através de todo o corpo. Se alguém esquecer de
focalizar a atenção num único fenômeno, seus desejos sexuais se tomarão
mais fortes. Isso pode ser perigoso; portanto, devemos ter cuidado. Uma
vez passado esse estágio, ter-se-á passado pelo estágio "quente" e avança-
do até o estágio do "topo" . Então o eh 'i e a respiração retomarão às suas
origens, a mente cessará e o ambiente exterior ficará calmo e tranqüilo.
O Samadhi si/a profüe a revelação da natureza exata desse estado,
mas ele é também muito difícil de descreve r. Devemos saber como lidar
com as várias mudanças que ocorrem na mente e no corpo, a fim de garan-
tir o sucesso. Si/a, ou a disciplina, profbe explicações posteriores.
A pessoa que atinge esse ponto no aperfeiçoamento de samadhi po-
de sentir a interrupção da respiração e do pulso. No Budismo, bem como
nos outros ensinamentos, isso é descrito com grandes detalhes. É maravi-
lhoso ouvir essas descrições, embora seja muito difícil atingir esses estados.
Shao Yung, por exemplo, escreve: "Todos os trinta e seis palácios são pri-
mavera, quando vêm e vão ao abrigo do céu e· aos aposentos da Lua."

118
Os Poderes Sobrenaturais
A esta altura, parece apropriado dar algumas explicações a respeito
dos poderes sobrenaturais. Se alguém realmente atingir e em seguida manti-
ver o estado de samadlzi, então possuirá os cinco poderes sobrenaturais:
a clarividência, a clariaudiência, a telepatia, o conhecimento das existên-
cias anteriores, suas e dos outros, e o poder de ir para onde quiser e de fa-
zer o que quiser, à vontade. A clarividência é a mais difícil de iniciar; mas,
uma vez começada, os outros poderes sobrenaturais podem desenvolver-
se sucessivamente.
Algumas pessoas têm a capacidade de desenvolver apenas um poder
sobrenatural, enquanto que outras t êm a habilidade de desenvolver simul-
taneamente dois ou mais desses poderes. Isso parece depender de dotes
pessoais, naturais.
Não importa se os olhos da pessoa estão abertos ou fechados quando
ela atinge a clarividência: ela pode ver nitidamente as dez direções. 20 Mon·
tanhas, rios, a grande terra e finas partículas de poeira podem ser claramen-
te observadas sem a menor obstrução e parecem ser vistas através de um vi-
dro transparente. A pessoa clarividente pode ver o que quiser ver assim que
manifeste a intenção de fazê-lo. Coisas análogas acontecem no caso de cada
um dos quatro outros poderes sobrenaturais.
Quem se ocupar com a prática e desenvolver poderes sobrenaturais
antes de atingir o conhecimento pode facilmente ser desencaminhado por
pensamentos incorretos, e será esmagado por esse poder. Essas pessoas
muitas vezes se perdem e perdem a visão justamente de seus anseios ori-
ginais de cultivo. Qualquer pessoa que usar o seu poder Piara entreter ou
1
fascinar os outros, certamente trilhará o caminho deMara.
Assim sendo, quem quer que suponha que o samadhi é o derradeiro
fim do cultivo, se parece com um tolo que anda por uma estrada desconhe-
cida numa noite escura; pode muito facilmente tomar~ direção errada e se
surpreender caminhando por regiões muito perigosas. E preciso estar aten-
to e ser cauteloso, uma vez que existem encruzilhadas de heresia e de Mara
espalhados ao longo do caminho.
Algumas pessoas desenvolvem um samadlzi muito forte e permane-
cem tão firmes que podem controlar a mente e o corpo de forma total. Po-

<i:>As dez direções são as quat ro direções cardeais (Norte, Sul, Leste e Oeste), as qua-
tro direções intermediárias (Nordeste, Noroeste , Sudeste e Sudoeste), o zênite (em ci·
ma) e o nadir (embaixo).
21
O Caminho de Mara impo ssibilita o progresso da pessoa e dos outros. Trata·se de
um ponto de vista incorreto, que pode surgir de fontes psicológicas, fisiológi cas e ma·
tcriais exteriores.

119
dem estar aptas a interromper à vontade a respiração ou a batida do cora-
ção e, ainda, ao mesmo tempo, podem n ão possuir qualquer dos poderes
sobrenaturais. Qualquer pessoa que atinja o samadhi - assim como muitos
dos brâmanes e yogues indianos - pode operar milagres. Alguns chineses
desenvolvem e utilizam técnicas especiais do manejo da espada. Pelo con·
trole da mente e do corpo, eles estão aptos a forjar o corpo e a espada nu-
ma unidade única. Podem voar com a espada ou arremessá-la como um fa•.
cho de luz. Na verdade, eles freqüentemente surpreendem e estarrecem o
mundo. Todavia, é preciso abandonar todas as coisas mundanas e despen-
der longos anos ocupado num esforço contínuo para conseguir sucesso nes-
sas áreas. Essas coisas não acontecem ao acaso, nem tampouco num golpe
de sorte.

A Destruição do Nascimento e da Morte


Samadhi e sabedoria são os alicerces de toda a doutrina budista. De-
pois de ·atingir o samadhi, que é a base de tudo o que se segue, uma pessoa
deveria desistir de qualquer idéia sobre samadhi e viver niµn reino onde "a
calma e a extinção aparecem depois que o nascimento e a morte são ani·
quilados". Durante esse estágio, todo nascimento e toda morte são destruí-
dos, apesar de o nosso corpo e de a nossa mente não existirem mais. Natu·
ralmente , o reino que o nosso corpo e a nossa mente alcançaram também
desaparece, porque qualquer reino que possamos obter está ainda dentro
do elemento de nascimento e de morte. Dessa fonna, no Surangama Sutra
está escrito que "embora uma pessoa possa atingir nove graus de sarna·
22
dhi, ela não pode parar a corrente da transmigração para tornar-se um
Arhan. Isso acontece porque ela se apega a falsos pensamentos de nasci-
mento e de morte e os consider a verdadeiros".
Por outro lado, se uma pessoa abandona todo o pensamento de sa-
madhi e permanece no reino da quietude e da extinção, nesse caso, ·apare-
cerá nesse estágio "o vácuo natural". Esse é o objetivo do Budismo Hinaya-
na. Liberamos a posse do ego e esvaziamos a nossa personalidade.
Qualquer um que cultive o caminho de um bodhisattva Malrnyana
desistirá ocasionalmente desse estado de vazio. Ele se concentrará, con-
templará e, finalmente, verá a morte e o n ascimento propriamente ditos.
Ficará consciente do aparecimento e desaparecimento de todos os fenôme-
nos ilusó rios, que su rgem do não-nascido e ascendem à existência. Mas
nunca devemos nos apegar ao vazio nem ansiar pela existência. Devemos
também deixar o caminho do meio e abandonar até mesmo esse apego, de

22
Os nove graus de samadhi consistem nas quatro dhyanas, dos quatro reinos que es-
tão além da fonna. e de samadhi, além dos pensamentos e das sensações.

120
modo a conquistar a ilwninação universal e sobrenatural, as duas formas
mais elevadas de iluminação.
Qualquer pessoa que possua o fruto da iluminação universal e sobre-
. natural entende que não é verdadeiramente necessário cultivar o vazio des-
de que compreenda que todos os seres se encontram originalmente num es-
tado de samadhi. A maioria dos ensinamentos do Buda versa sobre isso, e
explanações ulteriores não parecem ser oportunas. Se não há samadhi, não
há alicerce. Quem quer que fale sobre teorias desse tipo, sem evidenciá-las
por experiência pessoal, possui wna sabedoria árida e expressa pontos de
vista vazios. Ele pode acompanhar a corrente que passa, mas não pode mo-
ver-se contra ela a fim de retornar às suas fontes. Esse indivíduo não pode
ser o seu próprio senhor e todo o seu falatório é vazio e falso.
Muitas pessoas estão repletas de conhecimento e são muito boas na
explicação de princípios e de teorias. Seus discursos são tão maravilhosos
que parece que a flor-de-lótus está brotando de suas línguas, embora elas
não tenham sequer a mínima porção de aperfeiçoamento. A pessoa que
apenas fala sobre teorias e princípios tem "pedras grandes fazendo a sua
cabeça inclinar-se" em resposta a todo o seu lindo falatório e não tem valor
para si mesma. 23 Um antigo mestre zen disse que "é melhor agir uma pole-
gada do que falar um pé". O budista deve examinar-se totalmente e corrigir
o erro e falar sobre alguma coisa sem realizá-la. Devemos acompanhar a se-
qüência dos cinco veículos para completar a prática, etapa por etapa.

23 Os chineses usariam a expressão: " ele é tão persuasivo que até as pedras se incli-
nam concord ando" - para referir-se ao homem que é orador brilhante e comovente.
Quan do eles dizem que "o homem tem pedras grandes fa zendo a sua cabeça inclinar-
se", eles não estão apenas se referindo à expressão "que as pedras se inclinam em con-
cordância", mas também estão sugerindo que as pedras estão na sua cabeça!

121
Apêndice li

Ch'an (Zen) e Apontando Para a Lua

O Zen não é meditação, mas não pode ser separado da meditação.


Quem quiser trabalhar seriamente com o Zen, deve estar determinado e ter
de~ejos fortes e firmes aspirações. Se alguém deseja se aproximar do bo-
dhz supremo para conquistar diretamente a iluminação, precisa compreen-
der que apenas as pequenas virtudes e méritos acumulados não podem ser
levados em conta para qualquer grande sucesso.
. Não se pode saltar adiante, queimando etapas importantes rumo à
iluminação. Por exemplo : em primeiro lugar, devemos trabalhar sobre o
veículo do ser humano antes de começar a trabalhar sobre o veículo de um
deva ou ser celestial. Apenas então continuaremos com o Mahayo/1ª• as
seis paramitas (isto é, a caridade, a pureza, a paciência, a devoção, a medi-
tação e o conhecimento), e os dez mil condutos abrangidos pelos cinco veí-
culos, realizando boas ações e cultivando a virtude e o samadhi.
. É impossível alcançar o reino de bodlzi sem grande sacrifício e per-
si_stentes esforços. Bodhidharma diz que "O Tao dos Budas é árduo e difí-
cil. Leva uma eternidade de esforços, de paciência e de trabalho duro. Co-
mo se pode esperar conquistar o Tao com pouco merecimento e pouca sa-
bedoria? Como se pode tentar atingir o Tao enquanto fonnos arrogantes e
pensarmos que é muito fácil? Se alguém tentar fazer assim, tentará em
Vão".
Se uma pessoa estiver sinceramente detenninada a adquirir as virtu-
d~s, o merecimento e as bênçãos, ao lhe ser dada uma oportunidade, ela se-
ra bastante inteligente para escolher o caminho certo e para movimentar.se
na direção do êxito. Por essa razão se disse que "para aprender o Tao, é preci-
so ser um homem de ferro. Homens de ferro se aproximam diretamente do
bodhi supremo e ignoram tudo, o certo e o errado".

123
Além disso, a pessoa precisa encontrar o mestre adequado para
aprender o Tao. Um estudante que procure sinceramente o Tao deve seguir
um mestre que tenha vivenciado o Tao.
Quem quer que busque o Tao, atingirá o Tao. Os que falharem nes-
ta vida podem esperar ter êxito na próxima encarnação. Não há motivo pa-
ra que se tenha uma fé inquebrantável e um esforço inflexível por não con-
seguir êxito na obtenção do Tao em três encarnações.
Um antigo mestre disse: "Procure apossar-se de uma Hua Tou (uma
técnica zen) e mantenha-se nela com firmeza. Em seguida, mesmo que
não seja iluminado durante esta vida, ao menos não será presa de qualquer
mau destino na hora da morte. Em vez disso, estará livre para escolher sua
vida futura e pode decidir entre o mundo humano e um reino celestial." Os
mestres antigos, nem se iludiam a si mesmos, nem enganavam os demais.
Eles entendiam a natureza da relação entre causas e efeitos e podemos con-
fiar no que disseram.
Hua Tau é como uma muleta que se usa ao entrar no Tao. Um bom
professor é como um cavalo velho que conhece o caminho. Um estudante
de Zen leva uma muleta e monta num bom cavalo. O cavalo corre sem pre-
cisar de açoite assim que vê a sombra do chicote. O cavalo se liberta dos
seus grilhões assim que ouve o som da corneta.
O estudante zen tem respeito por si mesmo e respeita os demais. Tor-
na-se iluminado sob a cuidadosa orientação de um bom mestre. Então ele
entende que nunca esteve perdido e se admira com o que a iluminação
representa.
A disposição inquiridora, Hua Tou e as técnicas de Kung Fu afetam
o Zen , ainda que esses efeitos não sejam o verdadeiro Dhanna. Dizer às
pessoas que tal coisa é o Dhanna e tal coisa é a verdade é o mesmo que
contar uma mentira. Insistir que "eu não tenho mente" é sempre uma toli-
ce. Usar esses métodos como uma régua graduada para medir-se ou medir
os outros é como transformar leite em veneno. É pecaminoso desperdiçar o
tempo ou perder a vida devido a essas coisas.
Se alguém desprezar a disposição inquiridora, exercitando Hua Tau
ou Kung Fu, ou se alguém acreditar que essas técnicas não são o verdadei-
ro Dharma zen, ·esse. alguém pode ser comparado ao Lorde Yeh. Lorde
Yeh apreciava um bocado as pinturas de dragões, mas quando um dragão de
verdade apareceu para uma visitinha, ele ficou completamente apavorado.
O mestre zen Ching Yuan Wei Hsin disse: "Trinta anos atrás, antes
que eu iniciasse o estudo do Zen, eu vi a montanha como uma montanha e
a água como a água. Mais tarde, eu obtive algum discernimento estudando
com um professor erudito e vi que aquela montanha não era uma monta-
nha e que aquela água não era água. Agora encontrei um lugar para descan-

124
sar e vejo que a montanha ainda é uma montanha e a água ainda é água.
Essas observações são diferentes ou são a mesma coisa? Se alguém puder
decifrar isso, por favor, me procure pessoalmente."
O estudante zen precisa trabalhar realmente com o Zen para obter a
iluminação. Quem se limitar a falar, embora possa parecer iluminado, es·
tará em erro. Um mestre ancestral avisou: " Trabalhe (no Zen) quando tra-
balha e seja iluminado quando estiver iluminado."
Se trabalharmos diligentemente com o Zen, então, quando entrar-
mos no estágio da grande morte, tomar-nos-emos verdadeiramente vivos.
O reino da iluminação aparece espontaneamente. Quer em movimento,
quer em repouso, não podemos voluntariamente possuir nosso próprio cor-
po ou mente porque, na verdade, nem a mente e nem o corpo existe.
Um antigo mestre disse que isso é "como andar na sombra de uma
lâmpada" . Nesse estado, a pessoa dorme sem sonhar e alcança o lugar onde
estar acordado é o mesmo que sonhar.
O Terceiro Patriarca disse: "Se a mente não é diferente, todas as coi-
sas estão unidas num todo único. Se os olltos não donnirem, os sonhos de-
saparecerão automaticamente." Essa descrição não é conversa fiada sobre o
Dhanna: ela expressa a verdade.
O oficial Lu, falando com o mestre zen, Nan Chuang, disse: "f ma-
ravilhoso! Você disse que o céu, a Terra e eu somos da mesma raiz. Cada
coisa pertence a um único corpo." Nan Chuang respondeu, apontando uma
peônia do jardim a cujo respeito disse: "Eu vejo esta flor no sonho." Nan
Chuang apontou para essa mesma flor dizendo que ela era uma ilusão e que
a realidade é um sonho. Isso está de acordo com os sutras budistas e corres-
ponde aos fatos verdadeiros.
Qualquer pessoa que atinja um nível onde estai: acordado não é. di-
ferente de estar dormindo, deveria proteger essa conquista. Nossa capacida-
de de fazer isso depende da nossa profundidade. O mestre zen, Hsueh Yen,
ensinou a Tao Wu como fazê-lo. O mestre Hsueh Yen ensinou Tao Wu a
usar um bambu para evitar perder os seus feitos, e dessa maneira ele ensi-
nou a seu discípulo como manter o Kung Fu que havia obtido. Uma idéia
semelltante foi expressa por Pai Chang durante uma palestra com Chang
Ching. Pai Chang disse: "É como um vaqueiro que leva ~a mão uma corda
que nem permite que a vaca corra pelos campos nem deixa que ela coma a
plantação." Se alguém não resguardar cuidadosamente os seus feitos, po-
derá perdê-los.
Vários estudantes zen que alcançaram o estado em que estar acorda-
do e sonhandq são indiferenciâveis não o conseguiram através da prática
diligente. Em vez disso, eles o alcançaram por sorte. Eles se parecem muito
com os gatos cegos que se chocam contra um rato morto: suas conquistas

125
são puramente acidentais e não podem ser mantidas com controles apro-
priados. Mas se um estudante de Zen puder guardar suas conquistas como
o vaqueiro protege os campos e a plantação das vacas desobedientes, ele
avançará naturalmente para um nível mais profundo de realização.
Quando se chega pela primeira vez a esse estágio, pode ocorrer a do-
ença zen. Pode-se ficar repleto de indescritível alegria e isso ainda deverá
ser manipulado com cuidado.
Como um aviso para Liu Ching Cheng, o mestre de Zen Shao Shan dis-
se: "No futuro você experimentará um fenômeno incomum, sentindo um
tremendo prazer. Se puder pôr um rápido paradeiro a ele, você será capaz
de tomar-se um Buda. Se não puder controlá-lo, você poderá enlouquecer."
Como urna palavra de cautela para Llng Yuang Ching, o mestre zen
Huang Long Hsin disse: "Os que obtiverem o Dhanna do vazio, em geral,
primeiro ficarão muito felizes. Essa alegria poderá eventualmente conduzir
à distração e à inquietude e, dessa maneira, terão um sono profundo."
Portanto, devemos focalizar a atenção de modo a não ficarmos men-
talmente derrotados. Devemos guardar nossos feitos, evitando as coisas do
mundo. Podemos cultivar um embrião de santidade até que a fruta do Tao
amadureça. Quando alguém compreende que todas as aparências terrenas
não se distinguem da realidade, então pode praticar nesse mundo munda-
no, bem como no mundo que fica além.
Quando a fruta do Tao está madura, a pessoa pode fazer sempre o
que diz, quer esteja no reino da Terra, quer esteja no mundo que fica além
dela. Isso é a unificação da iluminação e da conduta. A pessoa que alcan-
çou isso não terá pontos de vista desviados ou crenças divergentes. Fica dis-
posta a fazer o que tiver de fazer, devido às obrigações morais ou à virtude,
mesmo que se precise pular dentro das chamas do fogo ou mergulhar num
caldeirão de água fervendo. Aprimorando-se dessa maneira, pode-se usar a
mente com liberdade, com ou sem pensamentos.
Nesse ponto, porém, a pessoa ainda não alcançou o fim. Ela deve
abandonar a idéia de que tudo é ilusório e sair do reino em que nada é real.
De outro modo, ficará ligada ao Dhanna do corpo.
A fruta do Nirvana ainda não está madura. A pessoa preeisa passar
por alguns estágios de nascimentos e mortes sucessivas, antes de chegar no
lugar onde a mente e o corpo são uma coisa só. Certamente, ela alcançará
o ponto onde a mente pode dominar a matéria de forma construtiva.
Se uma pessoa puder controlar tudo isso, sua mente resplandecerá
pura e brilhante como a Lua cheia, clara como cristal. Mas isso ainda per-
tence aos fenômenos da iluminação inicial. Devemos avaliar com muito
cuidado as palavras de Ts'ao Shan: "A iluminação inicial é o mesmo que
a não-iluminação."

126
Enquanto Nan Chuang estava observando o luar, um monge lhe per-
guntou: "Quando o senhor alcançou o estágio onde a sua mente é seme-
lhante à Lua? Nan Chuang, cujo último nome era Wang, replicou: "O pro-
fessor Wang chegou a esse estágio há vinte anos." Então o monge pergun-
tou: " O que o senhor está fazendo agora?" Nan Chuang o ignorou e voltou
para o seu quarto de abade.
Por que temos de trabalhar além do estágio da iluminação inicial? Por
qu~ temos de ultrapassar a íngreme barreira dupla até que mente e matéria
se mtegrem? Talvez essas perguntas possam ser respondidas citando-se os
velhos mestres.
Kuei Chang disse: "A divina luz original não pode ser posta total-
mente em jogo por causa da barreira criada pela matéria e pelo corpo."
Nan Chuang disse: "O maravilhoso funcionamento do original poder
onipresente não depende da matéria. O poder do Tao não depende de
n~da. Porém, o Tao precisa manifestar-se na matéria, caso contrário ele
nao poderá ser visto."
Nan Chuang também disse: "O nascimento não surge da causa do
nascimento." Isso sugere que não se pode criar qualquer fenômeno como
um resultado da iluminação.
Manjusri disse: "Quando tudo for esvaziado, não será para criar um
fenômeno vazio."
Chia Shan disse: "Não háDharma diante dos olhos. O manas ou pen-
samento e cálculo estão diante dos olhos. Não se apegue ao Dhanna que es·
tá diante dos olhos. A verdadeira natureza não pode ser alcançada através
dos olhos e dos ouvidos."
Entender o que os velhos mestres dizem é insufi~ie~te. Devemos ~s­
tar aptos a colocar em prática essas idéias. Uma vez atingido esse estágio,
a pessoa não deve permanecer aí, mas deve arremessá-lo para o lado. .
Das Palavras do Dharma de Ling Yung, é preciso lembrar o seguinte:

Ch'ang Shen perguntou: "De onde veio a vida no começo do mundo,


antes que as coisas fossem diferenciadas?"
O mestre disse: "Foi como um pólo grávido de orvalho."
Ch'ang Shen perguntou: "Como eram as coisas depois que o mundo
foi diferenciado?"
O mestre disse: "Como uma mancha de nuvem no grande céu."
Ch'ang Sheng perguntou: "O céu foi contanúnado por essa mancha?
O mestre não respondeu.
Ch' ang Sheng continuou a perguntar: "Por que a vida não apareceu?"
Novamente o mestre recusou-se a responder.

127
Então Ch'ang Sheng perguntou: "O que me diz sobre um céu puro
sem a mancha?"
O mestre disse: "Ele ainda está fluindo de sua verdadeira natureza."
Ch'ang Sheng perguntou: "O que é fluir da natureza verdadeira?"
O mestre disse: "É corno um espelho, que é brilhante e claro para
sempre."
Ch'ang Cheg perguntou: "Há algo além disso?"
O mestre disse: "Sim, se você quebrar o espelho, então eu o verei."
Ch'ang Cheng perguntou: "Se o espelho está quebrado, isso signifi-
ca que já se percorreu todo o caminho?"
O mestre disse:" Ainda não."
Ch'ang Cheng perguntou: "Corno se pode executar tudo isso?"
O mestre disse: "Você não ouviu? Mil santos n ão pregarão do alto da
estrada. Entretanto, descreverei um caminho para você; o verdadeiro iní-
cio é o próprio fim. O mais raso é o mais fundo. Acalente a bondade. Não
faça nada de mau."

Teoricamente, essa descrição é correta e, na prática, efetivamente


verdadeira. O que é Dharma e o que não é? Cada um precisa escolher por si
mesmo.
A pessoa talentosa não será iludida pelas outras pessoas. Entretanto,
não deveria falar sobre o Zen e sobre o Tao a seu bel-prazer, sem estar em
primeiro lugar apto a praticar o que prega, ou na falta da conquista de uma
mínima porção de aperfeiçoamento. Ela não deve imaginar que é grande,
se apenas tem entendimento intelectual.
Um mestre antigo disse "a grande iluminação dezoito vezes, e a pe-
quena iluminação um número infinito de vezes". Alguém poderia pensar
que esse mestre já se esqueceu do corpo e da mente, não conhece nada, e
ingressou no estado de quietude, bem como uma porção de vezes nas gran-
des mortes e nos grandes nascimentos sem alcançar a mais elevada realiza-
ção. Como podemos falar de maneira tão simples?
Esse problema pode ser explicado. A grande e a pequena ilumina-
ção, discutidas pelo antigo mestre, não foram realmente efetivadas. Elas
apenas indicam o discernimento intelectual. Isso pode infundir coragem
em alguns dos retardatários, mas também pode afastar algumas pessoas.
O grande nascimento e a grande morte, bem como a entrada em Sa-
madhi podem ser vividos muitas vezes. Essas experiências fazem parte do
merecimento que a prática traz. Elas também são a conduta e o implemen-
to usados depois da iluminação. "Ele não é diferente da pessoa que era em
tempos anteriores, mas sua conduta é diferente." Essa frase descreve al-
guém que foi iluminado. A pessoa iluminada é a mesm a pessoa que era an-

128
tes, embora sua conduta não seja a mesma. Uma boa conduta é mérito
da prática. Também é importante lembrar que a pessoa aperfeiçoada não
fica presa ao mérito do cultivo, embora lhe dê enfase.
Uma pessoa altamente cultivada pode explorar diretamente as raí-
zes da origem e tocar no ponto crucial do problema a fim de tomar-se
iluminada. Ela se assemelha ao ladrão que entra num aposento vazio. Ele
pode entrar e sair dele à vontade. Não há nada com que se aborrecer ou
com que se preocupar. Todos os fatos e princípios que forem compreendi·
dos estão resolvidos. Isso não constitui problema.
Apesar de isto poder parecer simples, a iluminação requer luta e
suor. Ela não pode ser comparada com o fato de se delinear as sobrance-
lhas ou de fazer uma maquilagem para encobrir a superfície. A ênfase deve
recair na palavra suor. Algumas pessoas obtiveram a iluminação sem suor,
mas esse tipo de iluminação sem esforço árduo não é sólida nem concreta.
O mestre zen Pu Wun Dragon Lake era o filho do Imperador Hsi
Chang, um imperador da dinastia Tang. Apesar de ser um príncipe coroado
da dinastia T ang, Pu Wun não nasceu para usar uma coroa. Em vez disso,
ele tinha equilíbrio divino e nasceu para ser vegetariano. Hsi Chang ten-
to~- ~om afinco transformá-lo, porém falhou. Quando Hsi Chang. buscou
retug10 em Szechwan, ele raspou a cabeça e viajou. Ninguém sabia quem
era ele. Ele visitou o mestre Su Shuang. Certa tarde, Pu Wun entrou no
aposento do mestre e perguntou: "Pode transmitir o ensinamento contro-
vertido do Patriarca Bodhidharrna para mim?" O mestre disse: "Não ca-
lunie o Patriarca." Pu Wun disse: "Se esse pensamento controvertido é
mundialmente reconhecido, como poderia ser falso?" O mestre disse:
"Você pensa que é verdadeiro?" Pu Wun respondeu: "Qual o seu ponto
de vista sobre o assunto?" O mestre disse: "Espere até que o Monte An
concorde e então eu explicarei para você." Pu Wun abaixou a cabeça e
disse: "Que maravilha!" Em seguida começou a transpirar. Mais tarde ele
viveu em Dragon Lake e desenvolveu miraculosos poderes sobrenaturais.
O mestre zen Tieh Nieu era o filho de Wang de Tai Ho Pan Hsi.
Seu avoengo, Tsan, da dinastia Sung, tinha um alto cargo político e estava
encarregado de todos os deveres da secretaria do Governo. Tieh Nieu des-
cendia de Tsan pela nona geração. Tieh Nieu era pobre, porém honesto,
limpo e resoluto. Ele queria abandonar a materialidade do mundo. Com
trinta anos, Tieh Nieu visitou Hsi Fong, raspando a cabeça. Ouviu o ensi·
namento controvertido do Patriarca e em seguida foi estudar com Hsueh
Yen Ching. Ele permaneceu na manjedoura para se ocupar com trabalhos
físicos. Certo dia, Ching instruiu a multidão: "Irmãos, trabalhem ardua-
mente para se aperfeiçoarem. Se puderem manter um pensamento sem
interrupção durante sete dias e sete noites e não obtiverem qualquer dis-

129
cemimento, vocês podem cortar a núnha cabeça e usá-la como recipiente
para fezes." Tieh Nieu aceitou tranqüilamente essa instrução e se pôs a
trabalhar com afinco. Naquela ocasião, ele estava com disenteria, porém
não tomou nenhum fluido ou remédio. Manteve o pensamento certo, sem
dormir, durante sete dias. À meia-noite, ele repentinamente se sentiu como
se o mundo inteiro fosse de neve e seu corpo não podia ser contido no céu
e na Terra. Mais t arde, ele ouviu o som emitido por madeira batendo em
madeira e estava iluminado. Todo o seu corpo começou a transpirar e sua
doença foi curada. Ele relatou tudo ao mestre. O mestre Ching o inter-
rogou seguidas vezes e então ordenou-lhe que se tornasse monge.
Wu Tsu Yen trabalhava com o mestre Pai Yun Zuei, que era mestre
zen. Ele perguntou sobre a conversa de Nan Chuang a respeito do jade
Mani. Pai Yun ralhou com ele. Yen obteve o discernimento e escreveu um
poema: "Um campo tranqililo em frente da montanha. Bater de mãos.
Ele refletiu repetidamente sobre os antepassados. Venda o campo e com-
pre-o de volta repetidas vezes para ter uma terna consideração pelo pi-
nheiro e pelo bambu que atraem as brisas." Pai Yun aprovou esse poema
que demonstrava algum grau de iluminação. Mais tarde, Pai Yun lhe disse:
"Há algumas pessoas da Montanha Lu que são zen. Todas possuem percep-
ção. Elas podem falar sobre os princípios. Se você lhes pedir para que di-
gam algumas palavras sobre os Koans, elas também farão isso. Mas elas não
estão absolutamente certas!" Yen se tomou muito cético e se perguntou:
"Se uma pessoa é iluminada e pode falar de sua iluminação de modo· que as
outras possam entendê-la com clareza, por que não estaria certa?" Pensou
nisso durante alguns dias e, de repente, conseguiu a resposta. Imediatamen-
te, ele largou tudo o que havia amealhado. Foi ver Pai Yun. Este ficou
tão feliz que agitou os braços e dançou de alegria. Yen apenas sorriu. Mais
tarde, Yen disse: "Compreendi a camada inferior do vento limpo porque
uma vez fui tomado de suores."
Essas histórias nos falam de perto ao coração e nos deixam a impres-
são de que podemos obter rapidamente a iluminação. Qualquer pessoa que
insista em frases como " grande morte imensamente viva", " as árvores
murchas têm flores", "as cinzas frias cozinham o feijão" e "um trovão no
alto", descreve o Dhanna verdadeiro e espera que algo de concreto acon-
teça, não será capaz de localizar o Dharma da Mente Suprema no Zen,
nem mesmo em seus sonhos. Ela simplesmente estará provocando o riso
dos que verdadeiramente compreendem. Mas, alguém que perceba que
essas descrições são apenas cópias que nada têm a ver com os fatos, é como
um idiota falando sobre um sonho sem saber que é idiota.
O homem que se iluminou através do Zen precisa acaso ape rfeiço11r
o samadhi? A resposta que oferecemos tem dois aspectos e diz que sim e

130
não. A idéia foi captada neste poema: "Não o pegue, não o deixe livre,
deixe-o completamente à vontade; não vir, não ir, movimentar-se livre-
mente." Coma arroz diariamente, mas não morda um único grão de arroz.
Use roupas todos os dias, mas não vista um único fio. Não se pode alfi-
netar nada que for materialmente tangível. Querdizer: como um pássaro
voando n o céu, não se pode tentar apanhar a Lua numa lagoa fria.
Se uma pessoa realiza tudo isso e ainda se sente instável, então todo
o Dlzanna é como uma realidade sobre a qual se pode pensar indefinida-
mente. Isso não importa. Está certo começar tudo de novo.
O professor de Zen Ling Chi escreveu um poema quando estava perto
de morrer: "Fluindo, o rio não pode ser interrompido. O que poderíamos fa-
zer? A iluminação infinita está próxima disso. As pessoas não entendem.
Ela está longe dos fenômenos e dos nomes. Uma espada afiada, uma vez
usada, terá de ser afiada novamente."
A pessoa iluminada precisa sentar-se em meditação? Que tipo de per·
gunta é esta? Deveríamos ser capazes de entrar em samadlzi em qualquer
tempo e lugar, utilizando as quatro fonnas de impor respeito ao compor-
tamento na vida diária. Essas formas são andar, ficar de pé, sentar e deitar-
-se. Nunca diríamos que sentar para meditar seja samadlzi, nem que sentar
para meditar não sej a samadhi A pessoa iluminada medita naturalmente.
Existe um pequeno. poema que diz: "Eu estico as minhas pernas
para tirar uma soneca e, quando acordo, o céu e a Terra continuam os mes-
mos de antes." Existe alguma coisa que não seja a mesma, tanto antes
como depois? Não é sem razão que o mestre Huang Long Hsin chamou
Chiu Rong de um tigre a dormir.
Depois que Ling Chl ficou iluminado, ele dorrrúu no vestíbulo dos
monges. O abade Huang Po entrou n o vestíbulo, viu que ele estava dor-
mindo e bateu na parede de madeira com um chicote. Llng Chi levantou
a cabeça e viu que era Huang Po, e adormeceu novamente. Huang Po ba-
teu novamente na p arede e entrou em outro aposento onde o monge
principal estava sentado em meditação. Huang Po disse: "O ret ardatário
está meditando no vestíbulo, mas por que o senhor está sonhando acorda-
do aqui dentro?"
Depois que foi iluminado, Tieh Nieu estava dormin.do no v_estíbulo.
O Mestre Hsueh Yen Clúng inspecionou o vestíb.ul~ e o viu d~;mm~o. ~1~
dirigiu Tieh Nieu para 0 quarto do abade e falou nsp1damente: Eu v:stone1
o vestíbulo e encontrei você dormindo. Se puder me dar uma boa razao para
isso, eu me esquecerei do assunto. Se você não falar tudo, precisa abandonar
agora esta montanha." Imediatamente Tieh Nieu respondeu: " O touro
de fe rro não tem força e é preguiçoso demais para arar os campos. Por isso,
ele dorme na neve com a corda e o arado. A grande terra está toda coberta

131
de prata branca. Teh Shan, um mestre zen, não tem lugar para brandir
seu chicote dourado." Ching disse: "Que bom touro de ferro!" Tieh Nieu
assumiu então esse nome com o qual o conhecemos, que significa o touro
de ferro.
Muitos dos estudantes do grupo de Zen do mestre Su Shuang nunca
se deitavam para donnir e sentavam-se em meditação durante vinte anos
contínuos. Eles eram como as raízes de uma árvore murcha, que evitam
que eia caia ao solo. O mestre Su Shuang não disse que dormir era uma
idéia boa, e ralhava com eles chamando-os de multidão de árvores mur-
chas. Ele também não lhes disse que dormir é o Tao.
Quando o mestre Hsuan Sa viu um monge morto, disse à multidão:
"O monge está morto, contudo a Natureza Bod.hi Original está manifes-
tada em qualquer lugar. Há dez mil milhas de luz divina envolvendo o
corpo." As pessoas não entenderam isso e ficaram confusas. Hsuan Sa re-
citou outro poema: "Há dez mil milhas de luz divina ao redor do corpo;
para onde você olha? O assunto já está resolvido. Fazemos urna pausa.
Isso pode ser visto em qualquer lugar. Tão logo uma pessoa toque o pon-
to, um homem de grande sabedoria arrumará o quadro inteiro logo em se-
guida. Se alguém perder esse momento, p erderá a cabeça."
Samadhi e meditação na escola zen são descritos no Tan Sutra do
Sexto Patriarca e nos anais de outros monges zen. Portanto, não conti-
nuarei a falar sobre esses pontos de vista.
Eu gostaria de encerrar este livro citando o mestre zen, Nan Chuang:
Diz-se que no décimo estágio, o bodhisattva fica cm surangama samadhi. onde
obtém o secreto armazenamento do Dharma dos Budas e obtém natural-
mente todos os tipos de samadhi, de liberação e de ooder sobrenatural. Ele
pode manifestar o seu corpo físico em todos os mundos a fim de mostrar que
obteve o conhecimento completo e perfeito, o bodhi dos Budas. Ele pode ro-
dar a grande roda do Dharma para entrar no Nirvana. Pode condensar coisas
infinitas num poro. Pode explicar uma sentença do sutra por kalpas infinitos
e ainda assim não exaurir o seu significado. Ele pode ensinar os seres dotados
de formas diferentes de vida. Pode aperfeiçoar a paciência rio não-nascimento.
A despeito de todas essas realizações, ele dirá que é um tolo e que sabe muito
pouco sobre os pontos extremamente sutis. Como isso é difícil! Tenha
cuidado!
O Sutra do Diamante diz: " O Dharma que eu prego é como uma jan-
gada. O Dharma deve ser abandonado. Ainda assim, também o não-Dhar-
ma deve ser abandonado."
O leitor deve supor que as palavras deste livro são apenas conversas
num sonho. Se alguém aceitar essas descrições como reais, transformará
manteiga derretida em veneno. O homem que fala não tem mente; a pessoa
que ouve perde tempo.

132
índice Remissivo

Alaya Vijnana, 113 Han Shan,55


HoHou, 63
Bodi-Dharma. 85n, 123 Hsian Yen, 109
Budismo Hinayana, 43, 114, 120 Hsuan Sa, 132
Hsu Che, 17
Cabeça Hsueh Yen, 125, 129, 131
regiões anteriores, 50, 5 3-5 Huang Long Hsin, 126
regiões centrais, 22, 22n, 50, 55-1 Huang Po, 111, 131
regiões posteriores 50 52-3 55 Huang TiNei Ching, 15
Catus-kusala-mula, 22' ' ' · Huang Thing Nei Ching Ching, 15-6
Chakras, 17, 23, 66, 75 Huang Thing Nei Jllai Ching Ching, 33
Chang Tao Ling, 33 Hua Tou. 33, 124
Cheng I Ch'uan, 24 Hung Tung, 50, 95
Ch'eng Ming Tao 24
Or'i Kung, 37, 4i, 96, 98, 110 I Oring, 32, 58, 76n, 87, 96, 101
Oria Chih, 49
Oria Hsi, 94 Jen Mai, 22-3, 32, 42, 57-78, 91-3
Orih Kuan, 32, 43, 50, 56, 106 112
Ching An, 56 ' Kou Ch'ien Chu, 33
Ching Shan, mestre Zen, 127 Kuang Cheng, 17
Ching Yuan Wei Hsin, 124 Kuan-Yin, 109
Chong Kung, 23s . Kuei Chang, 127
Ch'ong Mai, 22, 23, 76 Kundalini,22,41 , 93
ChuangTze,22,66, 76,95 Kung Fu, 53, 91-3, 124
Cinco elementos, 99
Cinco pranas. 99 Lao Tsé, 19, 46, 64, 88, 95, 112
Clariaudiência, 5 3, 119 Ling Chi, 131
Clarividência, 108, 119 Ling Yung, 108, 127
Confúcio, 32, 96 Liu HwanYang, 8 1
Lu Tong Ping, 63

Doze meridianos, 22 Mai


central, 66, 75-7
Escola Tien Tai, 43, 96, 110 direito, 66-77
esquerdo, 66, 75-7
Fogo dominante, 21 Manjusri, 127
Fogo secundário, 21 Mara, 51-4, 11 9, 119n
Mencius, 95
Grande Doutrina A, 19 Milarepa, 85

133
Nan Chung, 125, 132 Tan dourado, 80, 81
Nan Sutra, 96 Tan Sutra, 81, 91, 96-7 , 102, 132
Ni Huang Palace (Palácio de Ni Huang), Tan Tao, 101
50, 55 Tan Tien, 23, 33, 35-8, 43, 52, 57, 61-3,
Nirvana, 114, 126 92, 95, 111
Tau Hong Ching, 33
Pai Chang, 109, 125 Telepatia, 119
Pai Yun, 130 Templo de Shau Lin, 85n
Pu Wun, 129 T'i Hu Kuang Ting, 56, 100
Tiao Chu, 115
Rio, Cauuagem do, 48, 79 Tieh Nieu. 129, 131
Tien Shu Tao, 33
Ts'ao Shan, 126
Sakya Buddha, 108 Tso Wang, 50
Samatha, 112 Tu Mai, 22-3, 32, 42, 48, 55-7, 62, 64-
Satkayadmi, 50 77, 91
Secrets of the Jade Bedroom Tlze 87
Seis gunas, 106 ' '
Seis indriyas, 106 Wang Kong, 117
Seis paramitas, 123 Wu Chong Hsu. 81
Sete ramos sentados, método dos, 25-30 Wu Tsu Yen , 130
Shao Shan, 126
Shao Yung, 118
Sumatikirti, 116 Yang Ch'iao, 22, 44 , 63
SurangamaSutra, 106, 107n, 109, 120 Yang shen, 103
Su Shuang, 129, 132 Yang Wei, 22, 63
Sutra da iluminação perfeita, 111 Yeh, Lord, 124
Sutra da tranqüilidade evidente, 19 Yellow lmperor's Plain Woman Sutra,
Sutra do campo amarelo, 90, 101 17ie, 87
Sutra do diamante, 111, 132 Yin e Yang, 30, 42, 58 , 87
Sutra Yin Fu, 18 Yin Oz 'iao, 22, 44, 63
Yin shen, 103
TaiChiChuan,38,77 Yin Wei, 22, 63
Tai Hsi, 43, 95 Yuan Wu, 109
Tai Mai, 22, 63 Yu Ozen, 49, 50
Yung Chia, 111

134
Leia também
Richard Wilhelm
.TCHING
O Livro das .Mutações
Prólogo de C. G. Jung

. . Depois de amplamente divulgada em alemão, inglês, francês,


1tah~no e espanhol, aparece pela primeira vez em português a mais
abalii;ada tradução d_:ste clássico ·da sabedoria oriental - o J Ching,
ou Li~r~ das Mutaçoes - , segundo a versão realizada e comentada
pelo smologo alemão Richard Wilhe!Jn.

Tendo como mestre e mentor o venerável sábio Lao Nai Haüan


que lhe possibilitou o acesso direto aos textos escritos em chinê~
arcaico, Richard Wilh~lm pôde captar o significado vivo do texto
original, o utorgando à sua versão uma profundidade de perspectiva
que nunca poderia provir de um conhecimento puramente acadêmico
da filosofia chinesa.
~ti lizado. como oráculo desde a mais remota antiguidade, o
1 Ch111g, considerado o mais antigo livro chinês, é também o mais
moderno, pela notável influência que vem exercendo, de uns anos
para cá, na ciência, na psicologia e 11a literatura do Ocidente, devido
não só ao fato de sua filosofia coincidir, de maneira assombrosa, com
as concepções mais atuais do mundo, como também por sua função
como instrumento na exploração do inconsciente individual e coletivo.
C. G. Jung, o grande psicólogo e psiquiatra suíço, autor do pre-
fácio da edição inglesa, incluído nesta ve rsão, e um dos principais
responsáveis pelo ressurgimento do interesse do mundo ociden tal pelo
l Ching, resume da seguinte forma a atit.ude com a qual o leitor
ocidental deve se aproximar deste Livro dos Oráculos:
" O I Ching não oferece provas nem resultados; não faz alarde
de si nem é de fácil abordagem. Como se fora uma parte da natureza,
espera até que o descubramos. Não oferece nem fatos nem poder, mas,
para os· amantes do autoconhecimento e da sabedoria - se é que
existem-, parece ser o livro indicado. Para alguns, seu espírito pare-
·cerá tão claro como o dia; para outros, sombrio como o crespilsculo;
para outros ainda, escuro como a noite. Aqueles a quem ele não
, agradar .,não têm por que usá-lo, e quem se opuser a ele não é
obrigado a achá-lo verdadeiro. Deixem-no ir pelo mundo para benefí-
cio do:s que forem capazes de discernir sua significação."

EDITORA PENSAMENTO
Editora Pensamento
Rua Dr. M ário Vicente, 374
04270 São Paulo, SP

Gráfica Pensamento
Rua D omingos Paiva , 60
03043 São Pau lo, SP

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