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por
Anthony Hoekema
Além disso, a Bíblia não usa uma linguagem científica exata. Ela usa
termos como alma, espírito e coração mais ou menos indistintamente. Isto
é por causa
das partes do corpo que são tidas, não primariamente do ponto de vista de
suas diferenças ou de suas inter-relações com outras partes, mas como
significando ou enfatizando os diferentes aspectos do homem total em
relação a Deus. Do ponto de vista da psicologia analítica e da fisiologia, o
NOTAS:
[a Bíblia] não nos fornece uma psicologia popular ou científica mais do que
ela nos proporciona uma narrativa [schets] da história, geografia,
astronomia ou agricultura...Mesmo se alguém desejasse tentar, seria
impossível retirar da Bíblia uma psicologia que pudesse satisfazer as
nossas necessidades. Porque não somente seria impossível ter uma
narrativa completa de todos os vários dados, mas também as palavras que
a Bíblia usa, tais como espírito, alma, coração e mente, foram emprestadas
da linguagem popular dos judeus daqueles dias, ordinariamente
possuindo um conteúdo diferente daquele que associamos com esses
termos, e nem sempre usados no mesmo sentido. As Escrituras nunca
usam conceitos abstratos e filosóficos, mas sempre falam a rica linguagem
do dia a dia.4 [4]
2[2] John A. T. Robinson, The Body (London: SCM Press, 1952), p. 16.
TRICOTOMIA OU DICOTOMIA?
Vez por outra, entretanto, tem sido sugerido que o homem deveria ser
entendido como consistindo de certas ―partes‖ especificamente distintas.
Um desses entendimentos é usualmente conhecido como tricotomia — a
idéia que, segundo a Bíblia, o homem consiste de corpo, alma e espírito.
Um dos proponentes mais antigos da tricotomia, como vimos, é Irineu, que
ensinava que enquanto os incrédulos possuiam somente almas e corpos,
os crentes adquiriam espíritos adicionais, que eram criados pelo Espírito
Santo.7 [7] Um outro teólogo que usualmente está associado com a
tricotomia é Apolinário de Laodicéa, que viveu de 310 a aproximadamente
390 AD. A maioria dos intérpretes atribuem a ele a idéia de que o homem
consiste de corpo, alma e espírito ou mente (pneuma ou nous), e que o
Logos ou a natureza divina de Cristo tomou o lugar do espírito humano na
natureza humana que Cristo assumiu.8 [8] Berkouwer, contudo, assinala
que Apolinário desenvolveu primeiro a sua cristologia errônea em um
contexto de dicotomia.9 [9] Mas J. N. D. Kelly diz que é uma questão de
importância secundária se Apolinário era um dicotomista ou
tricotomista.10 [10]
Primeiro, ela deve ser rejeitada porque ela parece fazer violência à unidade
do homem. A palavra em si mesma sugere que o homem pode ser separado
em três ―partes‖: a palavra tricotomia é formada de duas palavras gregas,
tricha, ―tríplice‖ e temnein, ―cortar. Alguns tricotomistas, incluindo Irineu,
até sugeriram que certas pessoas tinham os seus espíritos cortados,
enquanto que outras não.
14[14] Theology of the Old Testament, edit. G. E. Day (1873; Grand Rapids:
Zondervan), 149-51.
18[18] The Scofield Reference Bible (New York: Oxford University Press,
1909), no texto de 1 Ts 5.23; The New Scofield Reference Bible (New York:
Oxford University Press, 1967) no texto de 1 Ts 5.23.
uma aguçada antítese entre as coisas visíveis e as invisíveis. O mundo
como substância material não foi criado por Deus, diziam os gregos, mas
sempre esteve contra ele. Um poder intermediário se fazia necessário para
que pudesse haver ligação entre o mundo e Deus, e, assim, haver
harmonia entre eles — este era o mundo da alma. A idéia do homem,
encontrada no pensamento grego, pensa Bavinck, é semelhante: o homem
é um ser racional que possui razão (nous), mas ele é também um ser
material que tem um corpo. Entre esses dois deve haver uma terceira
realidade que age como mediador: a alma, que é capaz de dirigir o corpo
em nome da razão.19 [19]
Devemos rejeitar também a tricotomia porque ela faz uma aguda distinção
entre o espírito e a alma que não encontra suporte algum nas Escrituras.
Podemos ver isto mais claramente quando observamos que as palavras
hebraica e grega traduzidas como alma e espírito são freqüentemente
usadas indistintamente nas Escrituras.
22[22] Cf o meu livro A Bíblia e o Futuro, (pp 86-87 edição em inglês). Sobre
este ponto ver também Berkouwer, Man, 212-22.
Mas mesmo à parte do entendimento grego da dicotomia, que é claramente
contrário à Escritura, devemos rejeitar o termo dicotomia como tal, visto
que ele não é uma descrição exata da visão bíblica do homem. A palavra
em si mesma é objetável. Ela vem de duas raízes gregas: diche,
significando ―dupla‖ ou ―em duas‖; e temnein, significando ―cortar‖. Ela,
portanto, sugere que a pessoa humana pode ser cortada em duas ―partes‖.
Mas o homem nesta presente vida não pode ser separado dessa maneira.
Como veremos, a Bíblia descreve a pessoa humana como uma totalidade,
um todo, um ser unitário.
29[29] F. H. Von Meyenfeldt, Het Hart (Leb, Lebab) in het Oude Testament
(Leiden: E. J. Brill, 1950), 218-19.
32[32] The Christian Doctrine of Man (Edinburgh: T. & T. Clark, 1911), 26.
Basar pode algumas vezes denotar a pessoa total, não apenas o aspecto
físico.36 [36] Mas ela pode também ser juntada com nephesh em maneiras
que referem ao homem total. Clarence B. Bass, comentando as palavras do
Antigo Testamento para ―corpo‖, afirma:
Corpo e alma são usados quase que indistintamente, sendo que a alma
indica o homem como um ser vivo, e corpo (carne) denota-o como uma
criatura corporalmente visível...Esta unidade de corpo e alma [tem]
conduzido alguns escritores a concluir que o Antigo Testamento carece de
uma idéia do corpo físico como uma entidade discreta...Mais
propriamente, contudo, o Antigo Testamento vê o corpo e a alma como
coordenadas que se interpenetram em funções para formar um todo
simples.37 [37]
35[35] Anthropologie des Alten Testaments (Munich: Chr. Kaiser, 1973), 55.
Em uma seção de sua Dogmatics na qual ele trata com ―o homem como
alma e corpo‖, Karl Barth, falando do coração no Novo e no Antigo
Testamentos, diz:
UNIDADE PSICOSOMÁTICA
53[53] Ibid.
56[56] John Cooper, ―Dualism and the Biblical View of Human Beings‖,
Reformed Journal 32, no. 9 e 10 (Setembro e Outubro de 1982).
O ESTADO INTERMEDIÁRIO
61[61] Ibid., 83. Mais nesse livro (p. 101) MacKay descreve a vida futura do
cristão dum modo no qual ele parece deixar lugar somente para a
ressurreição do corpo e não para uma existência continuada do crente no
estado intermediária (ver abaixo, p. 218-22). Se esta é a posição de
MacKay, eu não concordaria com ele. Podemos ainda, contudo, aceitar as
afirmações feitas nas citações acima como descrições corretas da unidade
da mente com o cérebro durante esta presente vida.
62[62] Ver esse assunto no meu livro A Bíblia e o Futuro, capítulos 17 e 20.
uma espécie de corpo intermediário, para ser substituído mais tarde por
um corpo ressuscitado?
63[63] Ver meu trabalho The Four Major Cults (Grand Rapids: Eerdmans,
1963), 345-71.
65[65] Ver Calvino, Tracts and Treatises of the Reformed Faith, ,vol. 3,
(Grand Rapids: Eerdmans, 1958), 413-90.
Mas isto não responde à nossa pergunta sobre o que acontece ao ser
humano entre a morte e a ressurreição. Quando a Dooyeweerd foi
perguntado: Que espécie de funções podem ainda ser deixadas para a
―alma‖ (anima rationalis separata, alma racional separada) quando ela
separada de sua conjunção temporal com as funções pre-psíquicas 70[70]
(i.e., pós a morte), sua resposta foi: ―Nada‖ (niets!).71 [71] Em sua
resposta, contudo, Dooyeweerd
Entretanto, se o viver na carne traz fruto para o meu trabalho, já não sei o
que hei de escolher. Ora, de um e de outro lado estou constrangido, tendo
o desejo de partir e estar com Cristo, o que é incomparavelmente melhor.
(Fp 1.22-23)
Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma‖ (Mt 10.28).
Quando ele abriu o quinto selo, vi debaixo do altar as almas daqueles que
tinham sido mortos por causa da palavra de Deus e por causa do
testemunho que sustentavam (Ap 6.9).
Pois também Cristo morreu, uma única vez, pelos pecados, o justo pelos
injustos, para conduzir-vos a Deus; morto, sim, na carne, mas vivificado
no espírito, no qual também foi e pregou aos espíritos em prisão, os quais
noutro tempo foram desobedientes quando a longanimidade de Deus
aguardava nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca, na qual poucos,
a saber, oito pessoas, foram salvos, através da água. (1 Pe 3.18-20)
Assim, às vezes, o Novo Testamento diz que nós que somos crentes,
continuaremos a existir num estado provisório de alegria entre a morte e a
ressurreição, enquanto que em outras vezes ele diz que as ―almas‖ ou
―espíritos‖ dos crentes ainda existirão durante aquele estado. Mas a Bíblia
não usa palavras como ―alma‖ e ―espírito‖ no mesmo modo que nós o
fazemos; dessa forma, estas passagens estão pretendendo tão somente nos
dizer que os seres humanos continuarão a existir entre a morte e a
ressurreição, enquanto esperam a ressurreição do corpo. A Bíblia não nos
dá qualquer descrição antropológica da vida nesse estado intermediário.
Podemos especular a respeito dela, podemos tentar imaginar a que esse
estado será, mas não podemos formar nenhuma idéia clara da vida entre a
morte e a ressurreição. A Bíblia ensina sobre ela, mas não a descreve.
Como Berkouwer diz, o que o Novo Testamento nos conta a respeito do
estado intermediário não é nada mais do que um sussurro.75 [75]
75[75] De Wederkomst van Christus, vol. 1 (Kampen: Kok, 1961), 79. Sobre
o estado intermediário, ver adicionalmente Berkouwer, The Return of
Christ, (Grand Rapids: Eerdmans, 1972), 32-64; e A Bíblia e o Futuro, 92-
108 (texto inglês)
Embora o homem exista agora no estado de unidade psico-somática, esta
unidade poderá ser temporariamente rompida no tempo da morte. Em 2
Coríntios 5.8 Paulo ensina claramente que os seres humanos podem
existir à parte de seus corpos presentes. O mesmo ponto é assinalado em
duas outras passagens do Novo Testamento:
IMPLICAÇÕES PRÁTICAS
80[80] Ibid.
citação dos versos da Bíblia pode ser tudo o de que necessita para ajudar o
membro da igreja a resolver um difícil problema espiritual. Mas um
entendimento do homem como uma pessoa total conduz-nos a perceber
que tal abordagem pode ser totalmente inadequada. David G. Benner, num
artigo no qual ele desafia a opinião comum de que a personalidade
87[87] Karl Menninger The Vital Balance (New York: Viking Press, 1963),
335.