Trajetória Evolutiva de uma Vida,

com Final Feliz

 O direito ao exercício da liberdade nos convida também a
assumir nossa parcela de responsabilidade, fraternidade e solidariedade para
construir uma vida melhor.
É preciso saber manusear o direito de crítica com
destreza e leveza, para não destruir vidas e não interromper os sonhos do
futuro. Embora nossas possibilidades sejam infinitas, devemos focar com
determinação o pensamento na transformação positiva, para que o amanhã
seja, assim, melhor do que hoje.

2
 Índice

Prefácio.............................................................................................................................. 4
Agradecimentos ................................................................................................................. 6
Introdução.......................................................................................................................... 7

PARTE I – A HISTÓRIA NARRADA DA FAMÍLIA .................................................... 9

A origem das raízes ......................................................................................................... 10
O despertar de um sonho ................................................................................................. 11
Os primeiros passos na capital ........................................................................................ 13
A grande mudança da família.......................................................................................... 15
O encontro com Immaculada .......................................................................................... 16
A nova fase da família Cândido ...................................................................................... 17
Algumas passagens pessoais ........................................................................................... 18
Minha família, minhas pérolas ........................................................................................ 19
Lembranças nas gotas do tempo...................................................................................... 24

PARTE II – HISTÓRICO FOTOGRÁFICO .................................................................. 26

PARTE III – PENSAMENTOS E REFLEXÕES ........................................................... 38

Sobre o homem e o universo ........................................................................................... 39
Perspectivas da Vida Feliz .............................................................................................. 41
Reflexões sobre a Vida .................................................................................................... 43
Realizando a realidade .................................................................................................... 45
Recordações poéticas ...................................................................................................... 46
Aforismos colhidos pela estrada ..................................................................................... 47
Máximas de uma sabedoria inata .................................................................................... 49
Epílogo ............................................................................................................................ 49

3

PREFÁCIO
Dizem que, para se realizar, um homem deve
plantar árvores, ter filhos e escrever um livro.
Meu pai, ao longo de sua vida, plantou inúmeras
árvores – eu mesmo testemunhei isso várias vezes. Teve
oito filhos que foram muito bem encaminhados. E agora
escreveu este livro, para o qual tive a honra e o privilégio
de poder redigir este pequeno prefácio.
Estávamos passeando em Natal quando surgiu a
idéia. Isso foi em maio de 2006, há quatro anos. Durante
nossa viagem, principalmente quando ficávamos proseando
na varanda do hotel depois do jantar, eu ouvia
atentamente as histórias que meu pai me contava sobre
sua infância e mocidade, sobre os personagens de sua
terra natal, sobre meus avós e tios – histórias que ele
sempre mencionava em algumas ocasiões especiais, que
eu e meus irmãos tínhamos ouvido desde quando éramos
crianças e que já habitavam nosso imaginário há tempos.
Assim, foi muito natural a sugestão: por que não escrever
um livro?
Mas foi só no início de 2010 que a idéia foi
retomada e levada a sério, depois que nossa família
incentivou bastante a empreitada. Em fevereiro deste ano
os manuscritos começaram a ser redigidos por meu pai em
ritmo forte; em cerca de apenas dois meses todo o
material estava escrito por ele, o qual eu ia gradualmente
transcrevendo para o formato digital no computador.
Confesso que, quando li as primeiras páginas escritas à
mão, fiquei impressionado com a clareza de expressão,
com a lembrança exata de datas e acontecimentos e,
principalmente, com o conteúdo que muito extrapolava a
simples narrativa histórica – enganei-me pensando que o
assunto se limitaria apenas a fatos sobre o passado da
família. É claro que nestas memórias temos o resgate de
uma fantástica história, cujo rico testemunho se estenderá
agora para gerações no futuro com muito valor; mas temos
aqui também a oportunidade de conhecer a perspectiva
larga do pensamento de um homem que descreveu e
continua descrevendo uma trajetória formidável ao longo
de sua vida.
Os leitores terão a oportunidade, assim, de
conhecer um pouco da história da família Cândido.
Detalhes interessantes e fatos marcantes serão
apresentados, muitos deles descritos com uma riqueza de
informações inédita. A primeira parte do livro trata desta
jornada; a história de uma numerosa família de lavradores
do interior de Minas Gerais que saiu de uma situação de
extremas dificuldades para buscar melhores condições de
vida na capital Belo Horizonte. E o responsável, o pivô
central de toda essa mudança é justamente o autor deste
livro. Um homem que, aos 20 anos de idade e sem
dinheiro, sem alfabetização e sem nada mais além de um
forte ideal no coração, partiu da estação de trem de
Resplendor em direção à capital desconhecida e estranha,
onde sozinho foi então criar as condições para um futuro
melhor. Cinco anos mais tarde este mesmo homem – já
então como 3º Sargento da Polícia Militar – retorna para
resgatar a todos da família na terra natal. Na segunda
parte do livro é apresentado um interessante histórico
fotográfico dessa trajetória. E na terceira e última parte o essa história chegará às gerações do futuro através deste
autor nos presenteia com pensamentos, reflexões e livro escrito pelo homem que realizou tudo isso.
ensinamentos que colheu neste longo e belo caminho. Recordo-me de uns versos que meu pai escreveu
Este livro celebra a vida e a felicidade. Enganar- em um pedaço de papel, há mais de 20 anos atrás, e os
se-ão aqueles que acharem que se trata apenas de um colocou na borda de um quadro em nossa antiga casa de
relato de fatos passados, como eu mesmo me enganei no campo. Eles diziam mais ou menos assim, se minha
princípio. Está recheado de filosofia, de poesia, de memória não me falha:
ensinamentos e de sabedoria; é direto, autêntico e belo
como o cantarolar de um pássaro que muito voou e muito
tem a dizer. “... E eu vinha para a vida a fim de ser rico e famoso.
Eu não poderia deixar de mencionar aqui a Então, no caminho para minhas conquistas,
admiração amorosa que tenho por essas coisas que meu Vi pássaros em bando cantando e brincando.
pai realizou. Quando imagino o jovem Manoel com uma Foi assim que me esqueci de tudo o que ia conquistar,
mala na mão e sozinho na estação de trem de Resplendor, E foi assim que fiquei ali, conquistado, no meio da vida.”
penso então que foi dele que herdei o espírito predisposto
para as andanças e para as aventuras. Mas mesmo tendo
eu conhecido muitos lugares e povos diferentes, confesso É este o escritor das próximas páginas. É este o
que encontrei poucos homens que realizaram a realidade autor desta Trajetória que será agora apresentada aos
da forma como meu pai o fez. Em minhas viagens sempre caros leitores.
busquei muito o conhecimento e a sabedoria, mas depois
de algum tempo percebi que um grande mestre estava
dentro da minha própria casa. Por isso, eu também não
poderia deixar de agradecer aqui por tudo o que foi feito no Gustavo Cândido, junho de 2010.
passado por ele e também por minha mãe, sua
companheira de toda uma vida – e acredito que estou
agradecendo em nome de todos da família. As árvores que
foram plantadas por eles no passado já ofertam seus frutos
maduros e doces, além da sombra e do frescor que agora
beneficiam outros seres. Os filhos cresceram e ergueram-
se para conquistar novos horizontes, sempre apoiados pela
base firme que foi generosamente ofertada. E agora toda

5
 AGRADECIMENTOS

Apresento os meus profundos agradecimentos

pelo incentivo e apoio dados por minha esposa
Immaculada, meus filhos e irmãos; sem eles esta jornada
seria desgastante e muito esforço desnecessário teria sido
despendido.
Esta obra é uma forma de retribuição, e assim
gostaria de oferecer a vocês algumas lembranças de fatos Dedico este trabalho à
e passagens de nossas vidas, o que farei aqui com muita minha esposa Immaculada de
Araújo Cândido, aos meus filhos
emoção e respeito ao culto da memória de nossa grande
e netos.
família. Um livro que se
Nossa história não pode ser ignorada. Tem de publica é como um filho que
ser conhecida e transmitida para todos os integrantes da parte do seio do lar para a vida;
família, com todo cuidado e consideração. Aqui, neste com os pais fica a esperança de
pequeno livro, tenho o compromisso de lançar as sementes que ele transmita ao mundo um
de união, camaradagem e compreensão. A discórdia só pouco da história de suas raízes.
desagrega e também só faz gerar fracasso.
Nossa história é um desabrochar constante em
cada contato que temos com os familiares e com os
semelhantes da humanidade. Dirijo a todos vocês minha
sincera reverência de agradecimento.

Manoel Cândido, maio de 2010.

6
 Introdução
Na origem dos grandes vultos e de seus grandes
feitos sempre encontraremos aqueles que deram os
primeiros passos; são aqueles que cederam os ombros
para que outros pudessem se apoiar e enxergar mais
longe.
Ao mesmo tempo, sempre há uma interrogação
insondável: qual a origem da vida?
Qualquer tipo de poder ou feito humano
certamente possui uma origem, que nem sempre está
isenta de dúvidas e incertezas.
Uma criança que aprende a andar necessita de
apoio seguro para ensaiar seus primeiros movimentos.
Seus passos, ainda inseguros e cambaleantes, são dados
com algum tipo de ajuda.
O homem primitivo, que vivia na escuridão e no
frio das cavernas, foi buscar ajuda no calor e na luz do fogo
que ele testemunhava na natureza. Manipulou pedra e
outros materiais até que do atrito entre eles foi capaz de
produzir as primeiras faíscas. Hoje, nossa ciência nos
permite transformar os mais diversos elementos da
natureza e inclusive produzir a poderosa energia nuclear.
No passado remoto os povos nômades cobriam
longas distâncias caminhando a pé ou a andando a cavalo.
Mas hoje, aviões supersônicos rasgam o céu e imensos
navios cruzam os sete mares do planeta. Graças a
inúmeros pensadores que alavancaram a humanidade o
homem conquistou inclusive o espaço sideral, e já deixou
suas pegadas na Lua.
Temos também nossa tecnologia virtual que
cresce rapidamente na atualidade, mas que igualmente
teve suas origens nos estudos pioneiros da eletricidade e
dos átomos, sem os quais não haveria nenhuma
possibilidade para o desenvolvimento de tais idéias
revolucionárias.
Assim, entendemos que nada existe por si só,
nada que acontece nasce sem um passado consistente.
Tudo o que existe é fruto de uma cooperação
mútua entre causas e condições. Sem a semente não pode
haver uma raiz, mas também sem um solo fértil e úmido
as raízes não podem se aprofundar e assim secam. Por
isso, a árvore é resultado de algumas causas presentes e
de várias condições concomitantemente satisfatórias.
A família Cândido vivia, no passado, em precárias
condições, imersa em uma situação onde havia várias
dificuldades.
Hoje, graças aos primeiros passos que foram
dados no sentido de melhorar estas condições, o que
vemos é um quadro completamente distinto daquele
original. Poderíamos até dizer que as expectativas mais
otimistas foram ultrapassadas, pois seria difícil para quem
vivia naqueles tempos de extrema pobreza imaginar que
tantas coisas boas foram realizadas. Mas pobreza nunca foi
um demérito; em nosso caso, foi a mola propulsora de
tudo.
Agora o que vemos são os descendentes
desfrutando de condições muito mais favoráveis do que as
que tínhamos na origem. Temos hoje em nossa família
professores universitários, médicos, biólogos, empresários,
engenheiros e toda uma sorte de outras realizações que,
7
sem dúvida, não teriam ocorrido se nossas condições
passadas não tivessem sido melhoradas. Isso, por si só, já
é motivo de grandes felicidades.
Ao escrever este pequeno livro quis resgatar uma
grande história. Uma história que não pode ser perdida no
tempo, que precisa ser contada no presente para os que
aqui estão e no futuro para os que ainda virão, para que
saibamos um pouco mais sobre nossa própria origem. Pois
a estabilidade de uma árvore é conhecida pela
profundidade de suas raízes.
Nunca busquei agradecimentos ou elogios pelo
que fiz; sempre encarei minha trajetória como meu dever.
Assim, este livro está livre de egoísmos, orgulhos ou
vaidades. Esta obra é um legado que ofereço a todos.
Meu único desejo foi, é e sempre será a saúde,
paz e união entre todos os familiares.

Manoel Cândido da Silva

8
PARTE I – A HISTÓRIA NARRADA DA FAMÍLIA

A energia do pensamento é uma ferramenta que todos

possuem, e cujo domínio é uma arte a ser apreendida. Ela causa
grande influência sobre as pessoas e, sobretudo, nos dá êxito se
soubermos manejá-la com habilidade. O ser que utiliza
corretamente a energia do pensamento é um vitorioso, pois remove
mais facilmente os obstáculos do presente e do futuro.

A origem das raízes
Todos os seres humanos sabem que não existem
vitórias sem lutas.
Por isso, cada dia de uma existência representa
uma página do livro das pessoas.
O livro é um mudo que fala, um cego que vê, é
um surdo que ouve.
Assim sendo, passo a descrever resumidamente a
trajetória de minha vida, com alguns acontecimentos.
Hoje, com 84 anos de existência, sinto grandes
felicidades e não tenho palavras para agradecer tudo o que
alcancei.
Nasci no dia 05/08/1926, num lugarejo do
município de Resplendor, no estado de Minas Gerais. Meus
pais, de origem muitos simples, eram trabalhadores da
lavoura e de serviços rurais.
Éramos então três filhos, e eu já estava com
quatro anos, quando, por motivos de necessidades, nos
mudamos para uma região ainda mais longe e carente de
todos os recursos. Fomos assim morar em outro lugarejo
sem estrada de acesso, em um cômodo forrado de folhas
de coqueiro, cujo chão era de terra natural, sem nenhuma
outra proteção. Estávamos sujeitos às intempéries do
tempo, à chuva e ao frio. Era o município de Mantena,
lugar chamado de Vila Verde, por onde cortava o córrego
do Itaúna. Desta forma, ficamos por longos tempos
afastados dos parentes.
Depois de ali passarmos vários anos e por
circunstâncias das criminalidades que reinavam na região,
meu pai viu-se obrigado a sair rapidamente do local para
não ser morto covardemente, deixando minha mãe sozinha
com já cinco filhos – inclusive eu que lembro e narro estes
acontecimentos.
Decorridos alguns dias fomos retirados desta
região por um tio de nome Antônio Cândido, fazendo uma
penosa viagem praticamente sem recursos, com fortes
chuvas constantes. Viemos para o município de
Resplendor, onde estava o meu pai na casa de minha avó.
Foi com certas dificuldades que, após alguns dias,
nos mudamos novamente para outro lugarejo pobre, para
uma casa velha que tinha em volta matagais muito secos e
favoráveis ao fogo. Um vizinho avisou meu pai que iria
colocar fogo em seu terreno, e que por isso poderia atingir
a nossa casa. Assim, providenciamos algumas defesas,
mas não foram suficientes. O fogo, de fato, atingiu a nossa
casa e rapidamente devorou tudo – não sobrou nada.
Ficamos apenas com a roupa do corpo.
Graças a um vizinho de nome Manoel Modesto
que nos acolheu, ficamos em um rancho que tinha somente
cobertura em quatro esteiras (tocos de madeira). Ali
ficamos até meu pai construir uma simples moradia neste
local, de nome Córrego do Resplendor, no município de
Aimorés.
Nesta época minha mãe estava grávida da sexta
filha e eu estava com sete anos. Já ajudava meus pais em
todos os serviços do dia a dia.
Quando finalmente tínhamos nos acomodado
precariamente nesta moradia, nasceu minha irmã de nome
Lourdes. Em seguida meu pai trocou o sítio no córrego do
Resplendor por outro localizado no afluente do córrego do
Bananal. Fomos então construir ali outra casa, com muitas
dificuldades. Nesta casa eu iria permanecer até 1947,
quando finalmente partiria para concretizar meu sonho de
vida.
Com todas estas lutas, lembro que meu pai, para
me animar, sempre usava algumas frases:
– “Meu filho, o homem não deve ter medo de
nada, tudo se vence com coragem”.
O despertar de um sonho
Assim fomos vivendo com muitas dificuldades;
quando eu tinha 15 anos, éramos uma família numerosa de
12 irmãos. Foi então que minha mãe programou uma
viagem de ida ao estado do Espírito Santo, a fim de visitar
seus pais, na região de São João de Muquim. Meu pai deu-
me a responsabilidade de conduzir minha mãe com outros
dois irmãos, uma criança de 3 meses e um irmão de 12
anos. Viajamos assim de trem, partindo de Itueta até
Vitória, pela ferrovia Vale do Rio Doce. Em seguida fomos
pela ferrovia Leopoldina Raival até Cachoeira do
Itapemirim, de onde finalmente partimos no dia seguinte
para a cidade de São João do Muquim.
Minha mãe não sabia ler e nem por onde
deveríamos seguir. Eu possuía pouca experiência de
viagem, e assim caminhávamos por informações que
colhíamos. Após muitas lutas localizamos meu avô
materno, que há mais de 18 anos não via minha mãe. Foi
uma alegria total depois de uma viagem longa e cansativa
para todos nós.
Foi para mim um momento de adquirir práticas.
Para que tudo ocorresse bem, tive que tomar iniciativas
além dos meus conhecimentos.
Esta viagem me despertou para que eu tomasse
algumas providências no sentido de organizar minha vida
para o futuro. Senti que estava muito atrasado, ainda nem
sequer tinha sido registrado em qualquer cartório, bem
como meus irmãos. Por isso, em seguida a esta viagem, fui
procurar outros meios de vida. Foi quando eu e meu irmão
Aureliano viajamos até a capital do Espírito Santo para
procurar serviço.
Fomos até a cidade de João Neiva e chegamos a
uma oficina de reparos de locomotivas. Na portaria, o
senhor que nos atendeu perguntou pelos documentos –
não tínhamos nada. Ele esclareceu que não podia nos
receber sem nenhum documento. Voltamos, assim, para o
lugarejo onde morávamos com tais advertências.
Em seguida fui até uma sapataria em um arraial
que se chamava Calixto, com o mesmo intuito de encontrar
serviço. Havia ali uma sapataria cujo nome do dono era
Solão, e este senhor propôs que me ensinaria o serviço de
sapateiro pelo qual eu deveria pagar a ele uma importância
de cem mil réis por mês. Ali fiquei trabalhando por um bom
tempo, e aos sábados e domingos eu ia para a casa dos
meus pais a fim de trabalhar na lavoura, capinando,
plantando e cuidando de outros serviços a fim de conseguir
11
o dinheiro com o qual eu pagava o Sr. Solão. Depois de
algum tempo, outro senhor de nome Bertoldo que também
possuía uma sapataria fez-me uma oferta mais generosa;
eu iria trabalhar para ele e ainda receber um salário. Isso
foi importante, pois conseguir juntar algum dinheiro era
condição essencial para iniciar meus planos. Eu planejava
me registrar e também aos meus irmãos, o que felizmente
consegui depois de algum tempo. Depois de concluída esta
tarefa, continuava pensando em um futuro melhor para
dias vindouros. Mas como proceder? Como seria?
Teria que aprender a ler e a escrever em primeiro
lugar. Meu pai me disse:
– “Compra um livro e começa a soletrar as
primeiras palavras com ajuda de alguma pessoa. Assim,
você começa a assinar seu nome.”
Surgiu um senhor que se propôs a me dar
algumas explicações do pouco que sabia, por alguns dias.
Mandou que eu comprasse um livro de nome “Felisberto de
Carvalho”. Neste livro, com muita luta e dentro de poucos
dias consegui ler e escrever alguma coisa, assim como
assinar meu nome. Uma observação: neste livro havia uma
história que nunca mais me esqueci e que me inspirou para
a vida. Eis a história:
Uma professora organizou um grupo de
meninos para fazer um desfile. Um deles, de
nome Alfredo, se prontificou a comandá-los.
Entre os garotos havia um mais pobre, que não
podia se vestir como os demais para o desfile.
Alfredo então o dispensou e o garoto ficou muito
triste. Assim, o menino pegou um cabo de
vassoura e foi acompanhar de longe o
movimento. Porém, em dado momento do
desfile, apareceu um cão bravo e atacou Alfredo,
que gritava por socorro. Ao ver tal cena, o
menino com o cabo de vassoura defendeu de
imediato Alfredo, que então disse:
– Você agora faz parte do meu pelotão.
Que lição para os demais! Isso ficou gravado em
minha memória.
Com meu pequeno conhecimento de leitura,
escrevendo apenas algumas palavras, lembrava sempre do
meu pai dizendo:
– “Olha meu filho, não desanime. O mundo é a
melhor escola para se aprender de tudo e viver.”
Fui até a cidade de Governador Valadares (antiga
Figueira do Rio Doce) procurando mais uma vez um serviço
no qual pudesse trabalhar, mas a situação estava muito
difícil, sem estudo e sem profissão.
De alguma forma, através de informações que
ouvia, nascia em meus pensamentos a possibilidade de ir
para Belo Horizonte, mas sem nenhuma oportunidade
concreta, sem nenhuma lógica, pois não possuía nem
estudo e nem dinheiro. Por algumas informações colhidas
no Destacamento de Resplendor, a melhor opção seria
entrar para a Polícia Militar de Minas Gerais, mas teria de
esperar abrir o “Decreto” que oficializava a aceitação de
12
novos candidatos. O delegado regional poderia me ajudar
na época certa; comecei então a guardar pequenas
quantias de dinheiro para a futura viagem.
Determinado dia fiquei sabendo que a PM estava
aceitando novos elementos. Procurei o delegado de
Resplendor e ele me deu informações e me forneceu os
documentos necessários no intuito de me animar.
Chegando em casa, dei então a notícia de que estava
animado para ir para Belo Horizonte e ingressar na PM.
Isso foi uma surpresa para todos meus parentes, e quase
todos me desanimaram. Diziam em tom de dúvidas “olha,
o que você vai fazer?”, mas meu pai sempre dizia também
“quem tem boca vai a Roma”. Isso calou fundo em minha
consciência. Eu sempre dizia afirmativamente para mim
mesmo: “segue que vai dar certo”.
Tinha juntado o dinheiro da passagem de trem de
ida e volta – além de uma quantia de 81.000 réis para uma
emergência – uma vez que o suspense da empreitada era
tanto que eu tinha de ter ao menos a certeza de poder
voltar. Se nada desse certo pagaria a volta para casa. No
meu consciente dizia para mim mesmo:
– O mundo tornar-se-ia mais favorável se as
criaturas soubessem tudo ver, observar e, sobretudo,
raciocinar sempre com acerto.
Os primeiros passos na capital
Foi assim que no dia 23/06/1947 eu saí de casa
com destino a Belo Horizonte, juntamente com um amigo
que também desejava ingressar na PM. Cheguei então à
Capital depois de uma viagem difícil, pois não conhecia
absolutamente nada. De imediato procurei o quartel do 5º
Batalhão de BH, no bairro Santa Tereza, e lá fomos
informados que deveríamos nos dirigir ao Departamento de
Instrução (DI) no bairro Prado, para o alistamento e a
inclusão.
Chegamos ao DI e fomos recebidos pelo Sr.
Tenente Antônio Trajano, que nos atendeu com muita
atenção e respeito. Lembro-me que disse a seguinte frase:
– Como atender você, Manoel? Sem ser
alfabetizado?
Depois de longas explicações, notando as minhas
necessidades e carências de tudo na vida, disse:
– Vou fazer sua inclusão provisória, com o
compromisso de você se alfabetizar. Para isso, temos a
escola Regimental, que funciona a noite no Ginásio. A
partir de hoje você está matriculado.
– Não sei como agradecer – respondi.
– Não tem nada de agradecer; seu futuro todo
depende de você – me disse ele.
Assim, parti para a luta fazendo os exames de
saúde, e felizmente fui aprovado. Infelizmente meu
companheiro de viagem não obteve o mesmo êxito nos
exames de saúde, e por isso teve de voltar para a nossa
13
cidade de origem Resplendor. Ao nos despedirmos ele me
perguntou:
– Manoel, você está mesmo disposto a ficar em
Belo Horizonte?
Respondi de forma afirmativa, pedindo que
avisasse meus pais e lhes dissesse que estava
provisoriamente na PM a partir de 01/07/1947, até que me
alfabetizasse na Escola Regimental.
A luta foi difícil; instrução militar o dia todo e
aulas até às 22:00 horas da noite. Assim, no final do ano
de 1947 terminei o período de instrução militar, ficando
então dispensado do regime de internato do DI.
Em seguida me matriculei no Grupo Escolar
Olegário Maciel, na avenida de mesmo nome, onde estudei
até o segundo ano primário, ao mesmo tempo em que me
preparava para o curso de cabo. Repetia para mim mesmo:
“viver não é difícil; o que é difícil é a criatura se dispor de
fato a viver racionalmente”.
Em 1948, ao visitar meus familiares, através de
algumas informações fiquei sabendo que meu pai poderia
ganhar um abono de família por ter uma prole numerosa
de 15 filhos, o que era contemplado em uma Lei do
Presidente da República Getúlio Vargas. Assim, providenciei
a documentação e trouxe tudo para Belo Horizonte,
entregando os papéis no Ministério do Trabalho.
Enquanto aguardava o andamento deste processo
e sempre estudando para obter benefícios, procurei tirar
minha carteira de habilitação como motorista, pois naquela
altura pretendia sair da PM por alguns motivos. Mesmo
assim fiz o curso de cabo, por medida de segurança, mas a
promoção estava demorando muito para sair. Estava
acompanhando o processo de abono do meu pai, e tive
informações de que o mesmo tinha ido parar no Rio de
Janeiro, no Ministério do Trabalho.
Há coisas que se criam na imaginação, que se
tornam volumosas no pensamento e assim aparentam
serem difíceis, mas que no fim nada têm de dificuldade.
Entrei de férias na PM por 15 dias e fui para o Rio de
Janeiro, com o objetivo de ver o andamento do processo de
abono e para que tudo desse certo. E caso arrumasse um
serviço lá eu pediria minha saída da PM. Consegui então,
com sucesso, destravar o processo do abono, que depois
disso foi concedido. Mas não tinha encontrado nenhum
serviço que motivasse minha saída da PM.
Ao retornar a Belo Horizonte tinha sido
promovido a cabo, isso no final de 1948. Mediante este
avanço, fui me preparar para fazer o curso de sargento,
estudando com diversos professores militares e civis
(Tenente Rubens, Tenente Alcides, etc). Tinha um
professor civil na rua Rubi, para o qual pagava 150.000
réis e que me preparou para o curso. No ano de 1949 tinha
ido à casa dos meus pais, dando a notícia do abono que
tinha sido aprovado e, ao mesmo tempo, que estava
matriculado no curso de sargento. Disse que assim que
terminasse o curso, iria providenciar a vinda de todos para
Belo Horizonte, o que de fato aconteceu e causou muitos
comentários.
No ano seguinte, em 1950, eu estava fazendo o
curso e meu irmão Jorge veio a Belo Horizonte, já pela
segunda vez, sendo que na primeira tentativa ele não
14
conseguiu ingressar na PM por motivos de saúde. Mas
desta vez, por intermédio de alguns amigos, consegui
incluí-lo na PM, no Regimento da Cavalaria.
No final do ano de 1950 terminei então o curso, e
fui servir no Batalhão Geral (BG) ainda como cabo, pois as
promoções saiam sempre atrasadas. No dia 04/08/1951,
finalmente fui promovido a 3º Sargento da PM,
continuando assim a servir no mesmo quartel.
A grande mudança da família
Em 1952 comecei a amadurecer a idéia de trazer
todos da minha família para Belo Horizonte. Comecei,
assim, a grande luta para realizar um sonho.
Já tinha comprado um lote no bairro São João
Batista, hoje Santa Cruz, onde moro desde então. Comecei
então a orientar todos os meus familiares no intuito de
preparar sua saída do interior. Meu pai, assim, vendeu seu
pequeno terreno pouco valorizado e mandou, por
intermédio do meu tio Idamarino, a importância de 7.000
réis para começar o serviço de construção de uma pequena
moradia. Este valor foi investido, juntamente com minhas
economias, na construção de uma casa no lote que havia
comprado. Foi um negócio de filho para pai e de pai para
filho. Nesta casa foi onde meu pai e meus irmãos moraram
de 1952 até 1963.
No mês de julho de 1952 segui para Resplendor,
com a finalidade de conduzir todos para Belo Horizonte.
Nesta ocasião éramos uma família numerosa; meu pai João
Francisco Cândido, minha mãe Sebastiana Pereira Cândido,
meus irmãos Aureliano Cândido, Maria do Carmo (in
memorian), Jorge Francisco Cândido (in memorian),
Waldemar Cândido (in memorian), Lourdes Cândido, Josefa
Cândido, Nelson Cândido, Sebastião Cândido (in
memorian), José Cândido, Mercedes Cândido, Maria da
Penha Cândido, Antônio Cândido, Luiz Cândido, Nair
Cândido (in memorian). Contando comigo, que fui o
segundo filho mais velho, éramos 15 irmãos. Destes, dois
já se encontravam recém chegados a Belo Horizonte
(Aureliano e Jorge) e somente outros dois não quiseram vir
para a capital naquela ocasião: Maria do Carmo, que
estava casada e morando no Paraná, e Waldemar, que
disse que também iria se casar e não desejava vir para
Belo Horizonte, pois tinha receio de também ter de
ingressar na PM. Desta forma, nesta grande viagem de
mudança do ano de 1952, eu seria o único responsável por
conduzir meus pais e mais 9 irmãos e ainda controlar
aquela situação tão inusitada. Assim, senti o peso da luta
que estava enfrentando.
Nesta oportunidade gostaria de esclarecer a
todos da família o motivo pelo qual em alguns nomes dos
meus irmãos constam hoje o sobrenome Silva e outros
não, e talvez algumas divergências de datas de nascimento
ou outras informações. Antes de me registrar, com a idade
de 16 anos, meu tio Antônio Cândido estava nos visitando
e disse, em uma conversa informal com meu pai, que ele
teve de se registrar para que pudesse se casar. Disse ele,
então, que na ocasião do registro tinha achado seu nome
pequeno, e que por isso acrescentou o sobrenome Silva.
15
Esta conversa ficou gravada em minha memória. Anos
mais tarde, quando fui me registrar, coloquei o Silva em
meu nome também. Em 1948, quando fui providenciar a
documentação para conseguir o abono de família para meu
pai como já foi descrito, tive que fazer os registros de
todos os meus irmãos no cartório de Resplendor. Naquela
situação de urgência, muita pressa e de informações que
muitas vezes eu não possuía, ocorreu que
desapercebidamente fiz constar o sobrenome Silva em
alguns nomes e outros não. Mas tudo isso foi feito com as
melhores intenções, e por isso peço a compreensão de
todos.
No trem em que viajávamos tive a oportunidade
de conhecer o Sr. Antônio Franco de Araújo. Homem muito
alegre, contou-me que tinha militares na família, filho e
genro, e citou os nomes Miguel e Paulo Reis. Deu-me o
endereço de sua casa e disse que tinha filhas muito
bonitas, mas devido às minhas responsabilidades e
ocupações com minha família não dei atenção àquele
senhor e não o procurei em Belo Horizonte. Um fato
curioso é que, depois desse episódio, voltei a encontrá-lo
na cidade por algumas vezes, e ele sempre cobrava minha
falta em visitá-lo.
O encontro com Immaculada
O tempo foi passando. De 1952 a 1953 fiz o
curso de Escrivão na Academia da Polícia Civil, que me
conferiu poderes para trabalhar em delegacias. Conclui
este curso em 1954 com bom aproveitamento e também
com uma pequena festa e muita alegria.
Naquela época, um meio de transporte muito
usado na cidade era o bonde elétrico. E foi dentro do bonde
que algo me chamou a atenção e desencadeou um fato
muito curioso. Por diversas vezes eu via ali uma moça
muito bonita e que, aparentemente, não possuía alianças
ou compromissos. Depois de alguns olhares e conversas
casuais, foi em março de 1955 que tivemos realmente a
oportunidade de nos aproximarmos – estávamos
enamorados um pelo outro. Seu nome: Immaculada. Em
minha mente observava o seguinte: “quem nasceu,
cresceu, viveu e não casou, passou pela vida e não viveu”.
Determinado dia resolvi que era o momento de
ir até a casa dela e me apresentar. E qual não foi minha
surpresa quando, estando na sala de visitas, vejo o pai de
Immaculada chegando pelo portão – era o Sr. Antônio
Franco de Araújo, o mesmo homem que eu tinha
encontrado no trem de Resplendor e que me dera o
endereço de sua casa! Foi uma alegria total, além de uma
grande coincidência para nós. Firmamos então o namoro
em 1955, e a partir de então eu esperei completar 10 anos
de serviço na PM para obter melhores salários e realizar o
casamento, que dura até os dias de hoje. Desta forma nos
casamos em 1957.
Em 1959 meu sogro, já viúvo, veio a falecer. Foi
uma situação difícil, pois minha esposa estava grávida da
segunda filha, mas felizmente tudo ocorreu bem. Em
seguida tivemos mais 6 crianças, totalizando 8 filhos muito
saudáveis. Hoje estão todos formados intelectual e
16
fisicamente, e são minha grande felicidade, minha fonte de
muitas alegrias, que me fazem sentir um pai muito
honrado.
A nova fase da família Cândido
No período de 1952 até as datas dos falecimentos
dos meus pais tive a responsabilidade e obrigação de
cuidar deles, o que naturalmente incluiu também cuidados
aos meus irmãos, como narro a seguir.
Em 1952 matriculei de imediato 4 irmãos no
turno noturno do grupo escolar Mariano de Abreu, no bairro
Cachoeirinha, e outros 3 para estudar durante o dia. Tive
que lutar muito para conseguir empregos para alguns,
como, por exemplo, na Fábrica Cachoeirinha, assim como
em diversos outros lugares.
Alguns anos mais tarde meu irmão Waldemar,
que tinha ficado em nossa cidade natal, acabou por vir
também para Belo Horizonte, devido às necessidades que
estava enfrentando. Assumi, assim, a tarefa nada fácil de
tentar colocar na PM tanto o Waldemar quanto meu irmão
mais velho Aureliano, pois os dois já tinham ultrapassado a
idade limite de ingresso na corporação (na época, 30
anos), eram casados (o que, para ingresso na corporação,
não era permitido na época) e não tinham experiência em
outra profissão. Recorri, assim, ao Comandante Geral da
Polícia Militar solicitando autorização para dispensa do
estado civil e do limite de idade para ambos, e meu pedido
foi atendido. Os dois irmãos trabalharam, então, na Polícia
Militar até que fossem para a reserva, Aureliano como 3º
Sargento e Waldemar como Cabo.
Matriculei no Colégio Tiradentes da PM o irmão
José Cândido, o que consegui com muita ajuda de amigos,
pois eu não tinha esse direito pelo fato de meu irmão não
ser meu dependente direto. Graças à boa consideração dos
Srs. Cel. Argentino Madeira e Manoel Doro Pereira, ambos
falecidos, para os quais em memória não posso deixar de
manifestar meus agradecimentos, meu irmão conseguiu
assim estudar e fazer diversos cursos como o C.F.O. (Curso
de Formação de Oficiais), e hoje é Coronel Reformado da
PM.
Em 1954 meu pai, que estava trabalhando na
Cia. Manesmann onde havia conseguido um emprego por
intermédio do Cel. Vicente Torres, foi dispensado da
empresa. Ele não possuía mais condições de saúde para
trabalhar, e assim tive que partir para a empreitada de
conseguir sua aposentadoria por invalidez, que dependia de
uma série de requisitos e de documentos que
comprovassem a incapacitação para o trabalho. Recorri a
um médico da PM e amigo, Dr. Salvador Silveira Santos,
que deu o atestado de incapacidade laboral para meu pai, e
fomos orientados pela advogada Dra. Juracy Leal Paixão.
Assim foi feito e encaminhado o processo, que consumiu 10
anos de muito trabalho até sua decisão final favorável e
positiva. Meu pai então recebeu esta aposentadoria até
1988, e ao falecer deixou este benefício para minha irmã
que a continua recebendo até hoje.
Em 1963, eu e meu pai fizemos um balanço e um
acerto dos valores envolvidos na casa. Meu pai tinha
17
investido na casa o valor de 63.441,00 réis. Com todas as
correções devidas, mais os juros correspondentes, devolvi
ao meu pai a importância de 215.000,00 réis depois de 11
anos do seu investimento na moradia, com todos os
comprovantes legalizados. Com este dinheiro, meu pai
comprou uma casa na rua Luiz Castanhedes do mesmo
bairro, onde morou de 1963 a 1988, quando então veio a
falecer.
Não é minha intenção neste livro narrar nenhum
tipo de acontecimento que possa causar constrangimento
em algum familiar. Relato, aqui, apenas os acontecimentos
mais marcantes de nossa trajetória como uma família.
Inclusive, o que foi narrado até aqui foi testemunhado
pelos meus irmãos.
No tocante à minha vida militar, não vou adentrar
em pormenores ocorridos que dizem respeito a assuntos
exclusivos da profissão, que é cheia de restrições e
severidades devido à natureza do ofício.
Algumas passagens pessoais
Nesta trajetória da minha vida, que aqui foi
narrada até a minha promoção a 3º Sargento, caminhei
por longas estradas lutando sempre para estabilizar a vida
de meus irmãos.
A partir de 1954 tivemos muitas mudanças na
vida militar, devido aos movimentos que emergiram em
nossa Nação. Em 1954 ocorreu a transição do Presidente
Getúlio Vargas, e em 1959 a renúncia do Presidente Jânio
Quadros. Em 1964 ocorreu a Revolução Militar no país, e
com ela muitas alterações políticas vieram. Por tudo isso,
todos os militares foram afetados de uma forma ou de
outra.
No decorrer dos anos seguintes fui promovido
para 2º e 1º Sargento, e ainda para Sub-Tenente da Polícia
Militar, graduação na qual permaneci até 1976. Neste ano
fui transferido para a reserva e recebi ainda a promoção
para o posto de 2º Tenente, e isso foi uma grande alegria
da minha vida.
Estando na reserva em 1976, e acostumado a
trabalhar desde os 7 anos de idade, senti a necessidade de
continuar na atividade produtiva buscando sempre
melhorar as condições de vida. Assim, procurei em
diversas empresas algum tipo de serviço. Consegui ser
admitido nas Forjas Acesita no município de Santa Luzia
como responsável pela segurança, onde trabalhei por um
bom tempo. Mas como a empresa era longe de casa, pedi
então para ser dispensado. A seguir, fui trabalhar em outra
empresa, na Transoto, também como chefe da segurança
por outro bom período.
Posteriormente tive outra proposta para voltar
para a Sede da Acesita em Belo Horizonte, a fim de montar
um esquema de Segurança e Higiene do trabalho. Aceitei e
trabalhei ali por mais vários anos até que, completando 65
anos de idade, me aposentei também pelo regime
trabalhista.
Em 1984 comprei um terreno de 8.700 m2 no
município de Betim, com a finalidade de construir ali uma
pequena chácara. Com poucos recursos preparei o terreno
18
e ali então ergui uma rústica casa, com a ajuda da minha
esposa e de meus filhos. Fizemos diversas plantações de
árvores frutíferas que em cada colheita nos davam muito
prazer. Ali recebemos também muitas visitas. Tivemos um
trabalho muito grande para manter este imóvel, pois
diversas vezes foi invadido e roubado em nossa ausência.
Em 2005, estando um pouco decepcionado com a situação
do imóvel, decidi vendê-lo por um valor bem abaixo do
mercado.
Desde 1976 – quando se deu minha reforma na
Polícia Militar – eu e minha esposa realizamos diversos
passeios e viagens. Estivemos nas praias de Carapebus,
Rio de Janeiro, Porto Seguro, Porto de Galinhas, Fortaleza;
visitamos Caldas Novas, Goiás, Campinas, Resende, Porto
Alegre e boa parte do Rio Grande do Sul.
Em 2006 estava passeando em Natal, no estado
do Rio Grande do Norte, com minha esposa e meu filho
Gustavo, e em pleno canal do Oceano Atlântico recebo um
telefonema de minha filha avisando-me que eu iria receber
a Medalha do Dever Cumprido, concedida àqueles que
completam 30 anos de reserva na Polícia Militar. Foi uma
grande alegria para todos. Assim, foi um momento muito
especial ver esposa, filhos, genros, noras e netos reunidos
na solenidade que ocorreu na Academia da Polícia Militar e
na qual fui agraciado com a medalha, em uma
comemoração festiva com todas as honras militares.
Em 2007 ocorreu um dos acontecimentos mais
marcantes de minha vida. Juntamente com minha esposa e
companheira de toda uma jornada de 50 anos de história,
comemoramos nossas Bodas de Ouro no Clube dos Oficiais
da PM, em uma grande festa onde estavam presentes
todos da família e inúmeros amigos. Fomos homenageados
por cada um de nossos filhos, que transmitiram um a um
palavras e mensagens de agradecimentos que ficaram
gravadas em nossos corações.
Acredito que são estas lembranças que nos
motivam a viver e a continuar nossa jornada. São
recordações como estas que somam toda minha alegria de
existir. A maior felicidade que um ser humano pode
receber neste mundo provém de uma consciência tranqüila
do dever cumprido, servindo à família, à coletividade e a
pátria a que pertence.
Quando estivemos em Natal, no ano de 2006,
contei algumas passagens de minha vida para meu filho
Gustavo que, depois de ouvi-las, sugeriu que eu escrevesse
algumas dessas lembranças e assim documentasse minha
história. Creio que foi neste momento que nasceu a idéia
deste pequeno livro.
Minha família, minhas pérolas
Nesta Trajetória até aqui narrada não entrei em
detalhes no tocante à minha família, sendo que fiz constar
apenas algumas passagens superficiais sobre ela. Por isso,
gostaria de dedicar algum tempo descrevendo um pouco
mais pormenorizadamente sobre minha experiência com
esposa e filhos, o que é motivo de muita satisfação para
mim.
19
 Creio que a remodelação da humanidade começa
pela remodelação dos costumes da família. Os filhos são,
via de regra, o retrato de seus pais.
Inicialmente, gostaria de falar de minha esposa
Immaculada. Nada na vida se constrói sozinho, sempre
dependemos dos outros. Por isso, é com muita gratidão
que relembro minha vida de casamento com Immaculada,
que há 53 anos tem estado ao meu lado juntamente com
meus filhos, sempre dedicando esforços imensuráveis em
nosso cotidiano. Com coragem, carinho e bondade,
demonstrou inabalável entusiasmo em todos os momentos
de nossa vida conjugal, e isso me ajudou muito a
atravessar as dificuldades profissionais e pessoais que
encontrei ao longo dos dias e noites em que
compartilhamos cada momento dessa história. Por tudo
isso, tenho a tranqüilidade de reafirmar que ao lado de um
homem realizado sempre existe uma grande mulher.
Sempre quando conversamos sobre nosso
passado e relembramos nossa história de convivência, de
dificuldades e também de felicidades, minha esposa
sempre diz: “olha, eu estaria pronta para começar tudo de
novo se fosse preciso, sempre ao seu lado”.
O meu primeiro filho foi Cláudio Manoel Cândido,
e a sua chegada foi um impulso em nossas vidas. Eu e
minha esposa pudemos, assim, reformular todo nosso
sentido de viver. Por ser o primeiro filho, ele ficou muito
conectado com os pais devido ao carinho recebido. Quando
menino, estudando em um grupo escolar, fez uma surpresa
inesquecível para a mãe: trouxe sua professora e os alunos
de sua sala para visitar uma horta muito “grande” em sua
casa, o que na verdade eram dois pés de couve, dois de
alface e mais dois de tomate. Minha esposa, um pouco
desconcertada com a visita inesperada, contornou então
com habilidade aquela situação... Sempre foi um bom
aluno com bons aproveitamentos, passando pelo Colégio
Tiradentes e formando-se na Escola Técnica Federal no
curso de Mecânica. Posteriormente obteve sua formação
universitária em Gestão de Negócios, tendo atuado em
diversas empresas como multinacionais da área de
mineração. Hoje é proprietário de um centro automotivo, e
sua gestão eficiente apresenta ótimos resultados. Sempre
foi um filho carinhoso, está sempre ligado com os pais e os
irmãos e é muito popular – gosta de passear sempre.
A minha segunda filha foi Márcia Cândido, e
chegou ao nosso lar com alegria total. Como a partir de
então eram um casal de filhos, minha esposa lhe fez um
pequeno cartão comemorando seu nascimento, com os
dizeres: “aqui, nesta casa, quem manda sou eu”. Isso lhe
deu um ânimo que até hoje deixa transparecer. Passou
pelos estudos com muita facilidade, formando-se
inicialmente em magistério e depois como jornalista.
Durante sua infância ajudou muito sua mãe no cuidado
com seus irmãos, o que a fez muito próxima de todos, e
isso lhe deu grande capacidade de socialização. Atua hoje
como jornalista da PM, o que faz com muita energia,
dedicação e gosto.
Então veio minha filha Maria Aparecida, que
compôs nosso lar com muita beleza e felicidade. Estávamos
esperando seu nascimento para o dia 12 de outubro, dia
das crianças, mas, no entanto, se deu no dia 14, em meio
às festividades das crianças e dos professores. Certa vez,
quando eu estava lendo o jornal bem tranqüilo na varanda,
20
ela aparece com um pedaço de pão na mão e diz: “papai,
toma, é seu”. Então eu perguntei onde ela tinha
conseguido aquilo, mas ela apenas não respondeu nada –
vida pura e doce de criança! Também se saiu muito bem
nos estudos, formando-se em magistério, e hoje é,
juntamente com sua irmã mais nova, proprietária,
professora e diretora de uma escola infantil que funciona
há mais de 20 anos. Com essa valorosa e nobre profissão,
já encaminhou muitas crianças nos primeiros passos pela
vida de estudante, e contribui assim muito positivamente
para o futuro da nossa comunidade.
Logo em seguida nasceu o meu filho Wagner
Cândido em uma época muito bonita e viva, em pleno mês
de maio. Quando criança era um menino muito esperto e,
mesmo com seu pequeno porte comparado na época ao de
seus irmãos mais velhos, era responsável por fazer festas e
alegrias que distraiam a todos. Certa vez, estando em
casa, assustou sua mãe que, ao chegar à varanda, o pegou
batendo em um vaso de samambaia. Intrigada com aquela
atitude, perguntou para ele porque estava fazendo aquilo,
e assim veio a resposta: “me disseram que esta
samambaia é chorona, quero ver se chora mesmo”. Muito
estudioso, assim como seus irmãos, passou também pelo
Colégio Tiradentes e logo depois se formou em Biologia
pela UFMG, disciplina que leciona há vários anos em
diversas escolas renomadas de BH. Concilia esta atividade
profissional com a carreira pública na Prefeitura de Belo
Horizonte. Casado, tem dois filhos – Marcelo e Ana Luiza –
que são meus netos muito queridos.
Minha quinta filha Janete Cândido teve o
privilégio muito importante de ter nascido no dia 25 de
dezembro, o que para nós foi o maior presente de Natal
que poderíamos ter tido naquela época de festas.
Interessante é que meu tio Idamarino havia mandado um
peru vivo de presente e que estávamos guardando para a
nossa ceia de Natal, e foi muito divertido na hora de abatê-
lo, pois tivemos que dar um pouco de cachaça para o peru
beber para que assim ficasse mais dócil; foi uma
verdadeira farra. Desta maneira inusitada comemoramos a
chegada de Janete com o tradicional festejo natalino.
Completou seus estudos com facilidade e formou-se em
Engenharia Mecânica, atuando desde cedo em diversas
empresas de grande porte como engenheira, sendo que
hoje exerce importante cargo na Vale do Rio Doce. É uma
pessoa de visão muito ampla e muito amorosa com toda
sua família.
Assim, então, recebemos nossa sexta filha,
Margareth Cândido, que por ser sempre muito tranqüila e
calma recebeu o carinhoso apelido de “quetinha”. Sua
chegada trouxe muito equilíbrio e muitas coisas
harmoniosas para nossa família. Uma passagem curiosa:
certa vez minha esposa se deparou com ela conversando
com as flores de um de nossos vasos na nossa casa,
gesticulando e falando como se fosse realmente com uma
pessoa, o que para nós foi prova de sua sensibilidade com
o mundo ao redor. Sempre foi aluna aplicada em seus
estudos, formou-se em magistério e hoje, ao lado de sua
irmã Aparecida, dirige e leciona na escola infantil por onde
já passaram muitas crianças que hoje já são adultos em
pleno exercício profissional. Atua assim, de forma
importante em nossa sociedade. Tem uma filha que se
21
chama Maria Mariana, que é o xodó da casa, do vovô, da
vovó e de todos os tios e tias.
Meu sétimo filho foi Gustavo Cândido, que chegou
ao nosso lar e encontrou seis irmãos que ajudaram
bastante a cuidar bem dele. Um ponto interessante é que o
seu signo coincidiu com o de seu pai. Foi uma criança
amorosa e ligada aos pais e irmãos. Um belo dia, quando
vê sua mãe preparando o jantar para todos, ele diz com
certa preocupação: “capricha no meu prato, mamãe!”. Sua
mãe, achando engraçado, responde: “faço igual para todos,
meu filho”. Também se saiu bem nos estudos, foi Cadete
do Exército na Academia Militar das Agulhas Negras, mas
deixou a vida militar e formou-se em Física pela UFMG;
hoje atua na área de Gestão de Pessoas e também como
servidor efetivo do Tribunal de Justiça Militar de MG. Gosta
muito de viajar, e já esteve em vários outros países.
Fechando com chave de ouro esta bela família
veio então minha filha Raquel Cândido, cuja chegada nos
brindou com alegrias e felicidades. Sendo a caçula, recebeu
assim muito carinho dos demais irmãos, que estavam
sempre presentes para ajudar em qualquer situação que
fosse necessária. Uma passagem interessante se deu na
época em que cursava o grupo escolar e foi eleita Rainha
da Pipoca nas comemorações das festas juninas, o que
chamou a atenção de toda a meninada. Como todos os
irmãos, passou com êxito pelo Colégio Tiradentes e
posteriormente formou-se também em Física pela UFMG
com ótimo aproveitamento. Foi aprovada em concurso
público para atuar na Secretaria de Educação do Estado,
onde já desenvolveu várias atividades de planejamento e
atuação na área educacional.
Depois de ter escrito muito resumidamente a
história de cada um dos filhos, gostaria de relembrar
alguns outros acontecimentos que, durante todos estes
anos, ficaram marcados nossas memórias. São pequenas
passagens da época em que meus filhos cresciam, da
época saudosa em que eles estavam sendo preparados
para a vida, e creio que este é um bom momento para tais
lembranças.
Como fazíamos todos os anos, eu e minha esposa
tínhamos o hábito de comprar brinquedos para todos no
Natal. Certo ano, fizemos as compras em uma loja e
combinamos ali que eles deveriam ser entregues em nossa
casa na véspera do Natal. Entretanto, a entrega atrasou, e
no dia 24 de dezembro não tínhamos ainda recebido os
presentes. As crianças, naturalmente, estavam cheias de
expectativas, e começaram a perguntar sobre os
brinquedos e a ficar ansiosas. Eu tentava acalmar os
ânimos da criançada dizendo para esperar só um pouco
mais que Papai Noel já estava a caminho, mas o fato é que
eu também já começava a ficar preocupado, pois a noite ia
chegando e nada. Eis que, num dado momento, os carros
de entrega apareceram na frente da nossa casa com as
encomendas – foi uma alegria total, uma explosão de
emoção da meninada depois daquele momento de tensão.
Isso tornou aquele Natal inesquecível para nós...
No decorrer dos anos seguintes eu já possuía
automóvel e trabalhava no quartel localizado no bairro
Gameleira, na divisa do município de Contagem. Na época
de pagar os emplacamentos e impostos (hoje IPVA), era
mais conveniente fazê-lo em Contagem, pois lá havia
menos movimento e assim eu ganhava tempo. Um dia, saí
22
cedo para o quartel levando comigo meus filhos Cláudio e
Wagner – era uma quarta-feira, e nesse dia o expediente
terminava ao meio dia. Minha idéia era seguir após o
trabalho com eles para emplacar meu “Doge”, com certa
pressa a fim de retornar logo ao lar e dar apoio para minha
esposa que estava com os demais filhos. Mas, ao
atravessar com pressa os trilhos de uma estrada de ferro,
dirigia com mais velocidade que o normal e assim houve
um grande impacto e o radiador do carro acabou furando.
Com certa dificuldade chegamos a uma oficina para
consertar o Doge e voltar para casa, mas o tempo foi
passando e a noite logo chegou – todos nós sem almoçar e
sem meios de comunicação com a esposa. Somente por
volta das 20 horas chegamos então em casa e sem fazer o
emplacamento! Como pai das crianças eu passei um sufoco
neste dia, mas o gosto da aventura ficou em nós como
lembrança para sempre...
Desde quando chegou meu primeiro filho a minha
preocupação principal era transmitir para eles todos os
conhecimentos necessários ao bom viver. Quando comprei
meu primeiro automóvel meu filho Cláudio se interessou
muito em me ajudar, e passamos assim a cuidar, limpar e
andar no carro juntos, o que despertou nos outros irmãos o
mesmo interesse em participar daqueles momentos. Com
isso passei a ensinar um a um as primeiras lições de
direção, o que certamente contribuiu para o aprendizado
deles como motoristas e também para nossas lembranças
compartilhadas. Certo dia, quando eu estava limpando o
carro, o Wagner e a Janete estavam lá comigo e, como
todos os outros, estavam exercitando a curiosidade de
criança. Foi numa fração de tempo enquanto eu me distraí
na garagem que os dois entraram no banco do motorista e,
com muito espírito aventureiro, soltaram o freio de mão do
carro, que saiu e foi de encontro ao muro da casa de
frente. E qual não foi minha surpresa quando ouvi, ao dar
uma leve bronca nos dois: “você está pegando o boi, nós
fizemos o carro parar!”.
Hoje, essas e inúmeras outras passagens são
fonte de alegria e amor em nossos corações.
Também hoje, observando atentamente tudo o
que passamos juntos, cheguei a uma conclusão: a
evolução faz-se sentir em tudo nesta existência, nas
pequenas e nas grandes coisas.
O pensamento se cultiva, se aperfeiçoa e se
aprimora fortalecido pelo poder consciente da vontade.
Todos deveriam procurar se unir e ajudar uns aos
outros, para que todos progridam juntos e vivam como é
necessário viver.
Caminhemos, assim, apoiados em pensamentos
positivos, porque isto fazendo estaremos ajudando a
levantar este país e seu povo, e assim virão dias melhores
com paz e alegrias.
Sempre assim pensando, procurei eu mesmo pôr
em prática os belos ensinamentos que a vida me ofereceu
junto aos meus familiares. Felizmente tudo deu certo. Por
isso entendo que a família deve ser unida, e seus membros
devem se ligar uns aos outros com pensamentos de
harmonia em torno de ideais comuns para o progresso de
todos.
23
Lembranças nas gotas do tempo
O homem virtuoso é parecido com as árvores de
nossas florestas, cuja sombra beneficia as plantas que as
rodeiam com a frescura da vida. Por estas e outras razões
me sinto uma pessoa realizada, tendo conseguido o que
almejava e continuando vendo tudo; o passado, o presente
e o futuro de minha existência. Não sei como agradecer às
Forças Superiores que regem todo o Universo.
Distinguir o falso do verdadeiro é o único meio de
ver claras as ações e de caminhar com segurança nesta
vida. Um perfeito conhecimento que o homem pode ter de
todas as coisas é tão necessário para regular nossos
costumes como o uso dos olhos para guiar-nos os passos.
Trabalhar para bem pensar, eis o princípio da moral.
Há sempre um ponto de interrogação para
aqueles que desejam investigar a arte de saber viver. A
vida é um livro que se folheia dia a dia e dentro do qual há
lições para receber. As passagens e os comentários da
Trajetória de Uma Vida deixam claro como é o caminhar do
ser humano nesta existência. Seja rico ou pobre, cada um
vive de acordo com seu merecimento. É, portanto, a vida
um livro aberto e sábio no qual todos devem saber estudar
para aprender, conhecer a si próprios e aos seus
semelhantes e procurar vencer as dificuldades,
reconhecendo assim seus valores, defeitos e qualidades.
Para aprender a folhear o livro da vida, as
pessoas têm de conhecer a verdade e condenar a mentira.
Gostaria muito de ver os seres trabalhando e lutando
contra as suas imperfeições, sem se importarem com as
imperfeições dos outros. Aqueles que têm a felicidade de
conhecerem a si mesmos procuram fazer o bem e não
julgam seus semelhantes, e assim não são também
julgados.
A natureza nos dá muitos exemplos
interessantes. Vejamos quantas alegrias existem nos
pássaros que cantam pelo prazer de cantar enquanto
procuram seus alimentos. Este é o trabalho que realizam
para o sustento. Nenhum pássaro espera que o outro o
sustente, cada um trabalha por si mesmo e sem nenhuma
vaidade.
Tenho muitas lembranças do passado, da minha
infância, adolescência e mocidade quando vivia na zona
rural até a idade de 20 anos. Recordar o passado é viver
duas vezes. Nesta fase da minha vida pude aprender muito
com a natureza, conheci muitos pássaros grandes e
pequenos e muitos outros animais das matas selvagens.
Por intermédio do meu pai, que era bom caçador e abatia
diversos animais para comermos, conheci espécies como
antas, macacos, queixadas, catitus, capivaras, pacas e até
jacaré. Aprendi o comportamento de muitas aves como
macuco, jaó, pavão, mutum, codorna, jacutinga, tucano e
muitas outras. Tudo isso se deu na região de Mantena, às
beiras do córrego do Itaúna.
Tenho também lembranças do Rio Doce e de
quando, juntamente com meu pai, atravessamos do norte
para o sul, em barcos e canoas. Embora um pouco
perigoso, foi uma experiência muito bonita. Quando vim
para Belo Horizonte o trem foi margeando por um grande
percurso o Rio Doce, e esta viagem ficou gravada em
minha memória eternamente. Este foi um período de
24
muitas lutas, mas que deixou saudades e boas
recordações.
Quando cheguei à capital tive também muitos
momentos bons e alegres. Muitas pessoas me deram apoio
e consideração nesta jornada. Como eu estava só, minhas
referências foram meus professores e instrutores da PM,
que usavam frases animadoras que muito me
incentivavam, pois estava longe da minha família. Das
melhores frases eu nunca me esquecerei: “todos os
militares são irmãos de farda; a PM é uma mãe carinhosa.”
Durante cinco anos convivi com pessoas diversas,
estranhas ao mundo de onde vim, mas mesmo assim
sempre fui feliz nas minhas relações com elas.
Durante toda minha permanência na PM tive
bons momentos e alegrias, devido ao reconhecimento
profissional que obtive em virtude de meus esforços e
dedicação. Em minha caminhada pela vida militar recebi
sete promoções, de recruta até o posto de 2º Tenente; as
que mais me entusiasmaram foram as de Cabo, 3º
Sargento e 2º Tenente.
Quando esperava a promoção de Cabo estava no
Rio de Janeiro, e ao chegar a Belo Horizonte fui
surpreendido com a boa notícia. Em 04/08/1951, quando
fui promovido a 3º Sargento por ter feito o curso, estava
esperando com muita ansiedade este ato do Comandante
Geral, pois esta promoção iria garantir as demais da minha
carreira militar.
Justificando e comprovando o ditado que diz ser a
PM uma mãe carinhosa para os militares e seus familiares,
faço demonstrações categoricamente confirmadas. Por
exemplo, o Colégio Tiradentes, que foi fundado pelo
inesquecível Coronel Argentino Madeira, que andava pelos
quartéis angariando recursos para a construção do que
hoje é a unidade Central, no bairro Santa Tereza. Todos os
militares mais antigos se lembram de como foi o
procedimento do Cel Argentino, que assim se pronunciava
quando ia solicitar os descontos de cada um em favor da
construção:
– “Este Colégio é o futuro para vocês e
seus filhos. Dentro de poucos anos muitos de
vocês e de seus familiares passarão pelo Colégio
e lá serão formados, para que posteriormente
continuem os estudos e sejam diplomados como
médicos, advogados, engenheiros e outras
carreiras, inclusive a militar.”
Tudo isso de fato ocorreu e ainda continua
acontecendo nos dias de hoje. É uma grande satisfação
citar que meus oito filhos estudaram no Colégio Tiradentes
e hoje estão formados. Assim, sou muito grato ao apoio
que recebi da Polícia Militar.
Sinto-me realizado por tudo que sou, sinto que
meus desejos foram atendidos e somente tenho a
obrigação e o dever de agradecer a tudo e a todos com
quem convivo e convivi, com gratidão e carinhosa saudade
dirigidas a estas pessoas.
25
PARTE II – HISTÓRICO FOTOGRÁFICO

26
A primeira fotografia de Manoel na Aqui já incorporado
chegada solitária a BH, em 1947. na PM, em 1951.
No coração, um sonho e uma missão.

Em 1952, já então 3º Sgt da PM,

Com o irmão Jorge da Cavalaria.

Primeiro em pé à esquerda, junto com outros

alunos do Curso de Formação de Sargentos.
Foram árduos anos de empenho na sólida formação necessária Com a elegância de quem realizou um sonho,
para forjar a têmpera que cortaria os obstáculos do caminho. o então 3º Sgt preparava-se para buscar a família no interior.
 Foto usada na carteira de trabalho de João Cândido,
pai de Manoel Cândido, em 1954 já na cidade de BH.

Sebastiana e João Cândido, em meados dos anos 80 em BH.

Foram mais de 36 anos vivendo na capital mineira com uma
dignidade que teria sido difícil conseguir em meio aos obstáculos
e incertezas da vida como lavradores da região de onde vieram.
A família Cândido nos primeiros dias na capital Belo Horizonte.
Os numerosos irmãos iriam pouco a pouco se adequando à nova
rotina. Sebastiana, esposa de João Cândido, é a 2ª à esquerda.

28
 Immaculada aos sete anos A jovem Immaculada em
de idade na cidade de BH. 1951 e sua beleza peculiar.

Em 1962 com os filhos Cláudio e Márcia na área livre da casa.

O tempo era dividido entre as atividades profissionais e a família.

Foto de 1957, no dia do casamento de Manoel e Immaculada.

50 anos mais tarde os dois estariam novamente passeando de Papai coruja observando os filhos brincando.
carro, mas desta vez seria para comemorar as Bodas de Ouro.

29
 Em 1962 já eram três filhos: Cláudio, o mais velho, à direita.
Márcia no centro; à esquerda, a recém nascida Maria Aparecida. Com a caçula recém nascida Raquel, que completou assim o
elenco de oito filhos. Foto tirada em 1976, na varanda da casa.

O simpático casal e sua convivência sempre harmônica.

Manoel com Gustavo brincando de “cavalinho” na perna.

Foto de meados dos anos 70, tirada na frente da casa.

30
 Manoel e Immaculada na porteira do “Sítio do Manezinho”,
localizado no município de Betim (MG), em 1986.
O homem do campo nunca esquece suas raízes...
Em 1993 na Academia Militar das Agulhas Negras - AMAN (RJ).
Immaculada e Manoel na solenidade de entrega do espadim do
filho Gustavo, então cadete do Exército.

Em 1987, preparando a terra do sítio para plantio e produção.

A destreza e a intimidade com a natureza, herança das origens, A família se reúne para comemorar a chegada de Marcelo,
nunca foram perdidas, mas agora plantar e colher eram lazer. o primeiro neto, nascido em 1994.

31
Em 1996, 49 anos depois de ter deixado a cidade de Resplendor,
Manoel visita sua terra natal. Na foto, o irmão mais velho
Aureliano e Immaculada. Esta é a estação de trem de onde um
dia partiu em direção a um futuro melhor. Visitando o local do nascimento com Aureliano e o filho Cláudio,
no Córrego do Beija Flor. Da antiga casa onde morava a avó
nada sobrou.

Na terra natal, visitando a antiga sapataria onde trabalhou nos

dias de mocidade (portas menores à esquerda). Com os parentes, ainda na visita a Resplendor, em frente à casa
de um tio construída pelos anos de 1950.

32
 As cinco filhas de Manoel comemorando o aniversário de
Immaculada em 2002. Da esquerda para a direita: Margareth,
Raquel, Aparecida, Janete e, sentada à frente, Márcia. Aqui o casal comemora alegremente o aniversário de 45 anos de
casamento, em 2002.

Manoel e Immaculada passeando em Caldas Novas, uma das

várias viagens realizadas pelo casal. Aproveitando as delícias das praias do nordeste...

33
Viagem na cidade de Natal, em 2006, com Gustavo. Foi nessa
viagem que surgiu a idéia deste livro.
Em 2006, com os familiares na solenidade de recebimento da
Medalha “Dever Cumprido” na Academia da Polícia Militar.
Atualmente, esta condecoração é dada aos que completam 60
anos no quadro da PM – 30 anos de ativa e 30 anos de reserva.

Ainda em Natal, cruzando um canal do Atlântico. Foi nesta

embarcação que a notícia do recebimento da medalha “Dever Assinando o diploma Com o Comandante Geral da PMMG
Cumprido” foi dada a Manoel. da condecoração. no momento do recebimento da
medalha.

34
Como há 50 anos, o casal passeia de carro pelas ruas da cidade. Os filhos prestam uma homenagem ao casal, e cada um faz um
Enfim, a comemoração das Bodas de Ouro do casamento. breve discurso. O filho mais velho Cláudio abre a homenagem.

Entrando no salão nobre do Clube dos Oficiais para a festa, O casal, a família e muitos amigos celebram com muita alegria as
acompanhado pelo filho Wagner e ao som do violino de Gustavo. Bodas de Ouro em uma inesquecível e grande festa.

35
Natal de 2009, com o filho mais velho Cláudio. Como sempre, a
passagem natalina é comemorada com muita união e alegria.

Comemorando o ano novo de 2010, em Boa esperança. A alegria

e felicidade sempre visíveis, marcas de toda uma trajetória.

Na festa de Natal de 2009 os netos já estavam elegantes:

Marcelo em pé, Ana Luiza ao lado de Immaculada e Maria Março de 2010, o autor trabalhando na produção do livro e
Mariana ao lado de Manoel. conferindo algumas passagens com esposa e filho.

36
 Com a obra quase finalizada, o autor faz as últimas conferências.
Maio de 2010, trabalhando com Gustavo na “Trajetória”.
Dos primeiros manuscritos ao livro pronto para tiragem dos
exemplares, foram cerca de 5 meses de intenso trabalho.

37
PARTE III – PENSAMENTOS E REFLEXÕES

“Viver não é difícil; difícil é saber como viver.”

Manoel Cândido

38

Sobre o homem e o universo
Escrever o passado é viver duas vezes. Sempre
tive o hábito de fazer reflexões e retrospectos a respeito
das minhas origens. O que se vê atualmente em nossa
sociedade é que poucos valorizam a tradição, as raízes do
passado; este culto, porém, é fundamental para guiar
nossa constante evolução no futuro, pois assim tomamos
consciência no presente das nossas origens e de suas
influências sobre nós.
Por isso, levando em consideração este aspecto
tão importante, é que recordo constantemente do tempo
em que realizava meus primeiros estudos quando ingressei
na PM em 1947, que foram a base para da compreensão
que tenho hoje. Sinto-me no dever de apontar a
importância que tiveram os vários professores que tive ao
longo da minha preparação, que com suas disciplinas e
seus métodos de ensino tanto me inspiraram. Por exemplo,
o Coronel Antônio Machado Neto, que naquela época
ensinava com maestria diversos assuntos profundos das
Ciências Naturais, e o Sr. Augusto Brina, que transmitia
seus grandes conhecimentos dos estudos desenvolvidos no
exterior. Não é difícil imaginar como foi para mim um
desafio poder acompanhar estes estudos com as minhas
quase inexistentes bases escolares, mas felizmente tudo
deu certo depois de muitos esforços realizados durante os
cinco anos de formação.
Assim, tive muitos professores, cada um com seu
método de ensino para a disciplina que lecionava e
também de acordo com o conhecimento que possuíam.
Durante os cinco anos em que fiquei na Academia
estudando e analisando os assuntos que me eram
apresentados, percebi que deveria manter certos
ensinamentos em minha mente – eles me poderiam ser
úteis no futuro. Apliquei esta idéia não somente aos
assuntos relativos à minha formação profissional, mas
também aos estudos que posteriormente realizei ao longo
de vários anos no campo do autoconhecimento e da
natureza humana. Então, com o passar do tempo guardei
comigo os conhecimentos que poderia aplicar em minha
trajetória, e desta aplicação paulatina entre teoria e prática
nasceu a sabedoria que pude extrair desta jornada.
Desta forma, gostaria aqui de apresentar
resumidamente quais foram estes conhecimentos que pude
apreender e aplicar em minha própria existência; são
assuntos ligados aos estudos da mente, do pensamento, da
evolução e transformação da Força e Matéria presentes na
Vida.
A Vida é uma Ciência que todos os seres
humanos estão sempre estudando, sempre aprendendo e
sempre buscando obter os melhores resultados. Como toda
ciência, o desconhecimento de alguns detalhes encobre a
compreensão de outros, e isso gera a necessidade de
aprofundarmos mais na análise nos princípios básicos aos
quais estamos submetidos. Estes princípios podem ser
identificados, basicamente, como componentes e
derivações da Força e Matéria presentes no Universo. Em
outras palavras, tudo o que existe está sob forma de
matéria densa ou sob forma de energia que se manifesta;
como a matéria é hoje compreendida também como uma
forma de energia condensada, vê-se que tudo no Universo
é, em síntese, energia. Tudo, inclusive o próprio fenômeno
do pensamento que se manifesta de forma tão diferenciada
nas pessoas. Em torno deste intercâmbio entre Força
(energia) e Matéria gira a Vida e sua Evolução.
Este modelo que descreve a composição
fundamental do Universo baseada em um aspecto
energético motriz (Força) e outro aspecto material
(matéria), aspectos estes que se relacionam de forma
interdependente, já foi defendido por grandes pensadores e
vários estudiosos que demonstraram as bases consistentes
desta idéia. Assim, a energia e a matéria se transformam
continuamente no processo evolutivo sempre atuante na
Vida, desde as partículas subatômicas presentes em um
pequenino grão de areia até as longínquas e imensuráveis
galáxias deste Universo. E, acompanhando todo este
processo de evolução, está também o ser humano
aprimorando sua inteligência e suas ações.
De acordo com esta visão geral, a Vida se
manifesta através de quatro grandes reinos: mineral,
vegetal, animal e hominal. Já no primeiro reino podemos
constatar os intermináveis processos de transformação da
energia através da matéria, dos elementos químicos, dos
átomos e partículas que compõe nosso mundo físico. Esta
energia também se transfere para o reino dos vegetais
através das trocas gasosas, da fotossíntese, do
crescimento, nascimento e morte das espécies deste reino.
No reino animal a energia continua a se transformar e a se
propagar através das cadeias alimentares, da respiração e
dos processos vitais presentes nos animais do planeta, que
evoluem lentamente através de estágios adaptativos.
Finalmente esta energia – a Força motriz da Vida – chega
aos homens através de complexos e refinados processos de
interações e trocas com os demais reinos, se manifestando
inclusive através do fenômeno mais peculiar da raça
humana: o pensamento racional reflexivo.
O pensamento, que pode ser definido como um
fenômeno mental, expressa a contraparte imaterial do ser
humano, e por isso deve ser entendido como um aspecto
da Força (energia) motriz no Universo. Esta energia,
embora seja oriunda da mesma fonte universal, se revela
de forma diferenciada em cada um de nós, o que explica a
diversidade mental em nossa raça. Uma comparação que
pode se aproximar deste fato é o da energia elétrica que
passa através de diferentes lâmpadas em nossa casa; em
cada uma delas, embora a energia que passa seja a
mesma, temos um brilho de intensidade e características
diferentes. Por isso podemos afirmar que existem
diferentes tipos de níveis evolutivos para o ser humano, e
cada um desses níveis expressa certo estágio evolutivo
possível ao homem. Assim, embora evoluamos em
conjunto dentro do mesmo Universo, devemos entender
que é natural que existam diferentes grupos afins de
homens em diferentes estágios evolutivos, e esta
constatação nos permite compreender o porquê de tanta
diversidade entre os homens. Mesmo assim, para não cair
na armadilha da discriminação e do julgamento alheio,
devemos também ter sempre em mente que todos os seres
são impulsionados pela mesma energia insondável que
tudo rege no Universo, e por isso nossa diversidade
acontece dentro em uma estrutura que tem como base
uma profunda igualdade.
40
 Os grandes vultos da humanidade, os pensadores
e estudiosos da natureza da Vida humana sempre
defenderam que o processo evolutivo do homem está
intimamente relacionado com a transformação da Força e
Matéria presentes no Universo. Hermes Trimesgisto, já no
Egito Antigo, defendia em seus preceitos herméticos a
constante transmutação dessa energia universal nos planos
físico e mental; Buddha, na Índia do século VI antes de
Cristo, já mostrava que o caminho da plenitude é resultado
do equilíbrio entre mente e corpo; nos portais do Templo
de Delfos, na Grécia Antiga, os filósofos gregos
inscreveram os dizeres: “homem, conhece-te a ti mesmo e
conhecerás os Deuses e o Universo”; pensadores modernos
como o grande filósofo indiano Krishnamurti já apontaram
a realização plena humana como sendo uma experiência de
transformação, emancipação e libertação do ser.
Assim, fica claro que a Vida é verdadeiramente
uma Ciência e para realmente compreendermos suas bases
devemos dirigir nossos esforços e pensamentos a fim de
desobstruir a marcha de nossa própria evolução. Nossa
passagem nesta Terra é marcada por lutas, e a alavanca
do sucesso é o pensamento elevado que transforma todo
tipo de energia desqualificada e grosseira. Por isso, quem
promove o bem está também fazendo o bem a si próprio,
pois assim amplifica as energias positivas em nosso
Universo.
Foi baseado nos pontos centrais de minha própria
existência descrita aqui na “Trajetória de uma Vida” que
deixo estas breves palavras e ilustrações sobre meu melhor
entendimento a respeito da Força e da Matéria que existem
em nosso Universo. Através destes dois aspectos
complementares é que se explica todo o funcionamento da
Vida, que é regida através de leis naturais e imutáveis.
Perspectivas da Vida Feliz
O título deste livro, que norteia as idéias contidas
nele, traz duas palavras fundamentais que centralizam
todos os assuntos que foram apresentados; são as
palavras Vida e Feliz. Sei que são palavras amplas, usadas,
traduzidas e compreendidas através de muitas perspectivas
diferentes, e por isso não pretendo aqui insinuar que os
significados por mim atribuídos a elas sejam absolutos.
Considerando todos os conceitos e observações que
apresentei nesta obra, alguns deles profundos
conhecimentos comprovados e enunciados não por mim,
mas por grandes pensadores da humanidade que
detectaram as origens da Vida, não tenho dúvidas de que
este é um assunto muito vasto, complexo e diverso.
Os seres humanos e tudo mais o que existe neste
Universo são regidos por Leis naturais e imutáveis; nós não
somos capazes de modificá-las. Essas Leis atuam através
de ações e reações, fundamentadas no mecanismo de
causa e efeito. Assim foi gerado o germe da Vida desde os
tempos remotos, e estudos mostraram que nosso provável
berço foi a água dos mares com seus movimentos e ondas;
entre marés fortes e mansas, neste eterno vai e vem que
combinou os átomos dos elementos químicos essenciais,
surgiu uma massa pastosa mole e viscosa chamada
41
protoplasma, composta pela matéria orgânica que deu
origem aos primeiros organismos simples unicelulares.
Houve um estudioso brasileiro, médico e cientista
chamado Antônio Pinheiro Guedes que foi pioneiro nas
pesquisas sobre a origem da Vida. Sua obra muito me
impressionou, e transcrevo aqui um trecho de um livro que
publicou em 1901 na Academia da Universidade de
Medicina do Rio de Janeiro com o apoio de diversos outros
cientistas da época:
“... É no meio líquido, e no
seio dos mares, nesse ambiente
quase vivo; porquanto, o mar é
como que tem vida. E se não a tem
propriamente, a imita e a arremeda,
oferece seu simulacro, apresenta
sua imagem; ele se agita, move-se,
palpita, tem vozes; ora brame
furioso, atirando-se de encontro aos
cachopos, despedaça e destrói tudo
quanto encontra. Outras vezes
murmura apenas como quem geme
e chora, e se lança brandamente
sobre as praias onde se deita
sonolento.”
Ciência Espírita – 6ª
edição, 1981.
Foi a partir desta perspectiva que escolhi a
palavra Vida para compor o título deste livro.
A palavra Feliz possui significados amplos que,
generalizados, representam para todos os seres humanos a
somatória de seus momentos de alegrias e satisfações. São
os momentos onde a consciência revela sua sensibilidade
máxima, deixando claro que a plenitude do ser se
experimenta em tais momentos. Dizemos que a felicidade
não se compra e não se vende; existem pessoas que
naturalmente transmitem felicidades para todos num
simples cumprimento, e isso demonstra o aspecto
dinâmico, livre e fluido deste estado de consciência.
Conhecemos também o aspecto relativo da felicidade, uma
vez que não existe felicidade completa ou absoluta em
virtude da grande variedade e diversidade de pessoas
neste mundo.
Vejamos em nossa sociedade as divergências
entre as pessoas; umas alegres, outras mal humoradas.
Algumas satisfeitas com o que possuem, outras
reclamando e querendo sempre mais e mais, deixando ver
que no fundo são pessoas infelizes. São pessoas que
acham que o dinheiro é tudo de importante na vida; no
entanto não é bem assim, com o dinheiro não se compra o
sono ou o sossego...
Posso afirmar com tranqüilidade que sou muito
feliz. Sou feliz por ter tido a oportunidade e as condições
de trazer meus pais e irmãos do interior para Belo
Horizonte e tudo ter dado certo. Sinto muitas felicidades
por ter educado meus oito filhos e ter dado a eles
condições necessárias para que alcançassem, em diversos
níveis, uma formação sólida que os permitiu ser úteis à
humanidade em diversos setores da sociedade. Tenho
também alegrias e felicidades por ter chegado à idade que
42
tenho com plena lucidez e com a mente intacta,
percebendo todo o caminho da Vida, relembrando tudo o
que fiz para a minha família de modo geral. Pela
oportunidade que tive de estudar, mesmo em idade
avançada, e concluir os cursos que fiz – eis aí mais
felicidade. Olho com orgulho para meus diplomas da
Academia de Polícia Militar e Civil, para a Carta Patente que
me promoveu a Oficial, para a Medalha do Dever Cumprido
– quanta alegria! Sou muito mais feliz ainda por ter casado
com minha esposa Immaculada e por ter tido meus oito
filhos, sendo essa realização o maior orgulho e felicidade
da minha Vida.
Ao relembrar de tudo isso, lanço o olhar para trás
e vejo aquele jovem de 20 anos chegando a Belo
Horizonte, praticamente sem nada nas mãos e
completamente sozinho. Que tamanha alegria ao
contemplar a perspectiva desta trajetória de uma vida com
final feliz!
Reflexões sobre a Vida
Baseado no que foi dito até agora na Trajetória
de Uma Vida, gostaria de fazer uma pequena síntese do
que apreendi ser a Vida.
Tudo o que existe em nosso planeta é regido por
leis, sendo que as duas principais são a de Evolução e a de
Retorno. Tomo, por base, exemplos que colhi em minha
vida, em meu próprio campo de experiências, em meu
caminhar no tempo da minha existência, desde a minha
tenra idade até hoje, aos 84 anos.
Em relação ao que se denomina de Lei da
Evolução, constatei que tudo evolui no planeta, da mesma
forma que uma pequena planta cresce até chegar a uma
gigantesca árvore na floresta. Uma criança nasce, cresce,
começa a estudar as primeiras letras, chega aos estudos
superiores, torna-se um grande cientista. Esta Lei da
Evolução tudo rege no Universo. É um impulso motriz que
existe em todas as coisas, é o irreversível avanço no tempo
e espaço da existência.
A Lei do Retorno configura a forma da Evolução.
Tudo o que se faz tem o seu resultado, positivo ou
negativo. Ao mesmo tempo, para todo resultado podemos
encontrar suas causas e condições. Por isso, na medida do
possível devemos somente praticar o bem, pois alcançar
bons resultados é o que todos queremos. Para isto, é
importante não se apegar a acontecimentos desagradáveis,
pois o mal que se alimenta nos persegue como a sombra
do corpo.
No Universo não há nada de novo e também não
há nada que se perde – tudo nele está criado. Há somente
transformação de matéria e evolução da energia, o que é
regido por leis naturais. Por isso entendemos que, por mais
sábios que sejam os seres humanos, eles não são capazes
de modificar as Leis Naturais do Universo.
Ao caminhar no tempo da Vida é preciso dar os
primeiros passos para poder seguir a longa estrada que se
estende à nossa frente. Ao percorrer esta trajetória
encontrei caminhos sinuosos e tortuosos pelos quais tive
que passar para poder semear as sementes de árvores
43
frutíferas em bom terreno, para depois colher frutos
saborosos. Encontrei boas pessoas que me ajudaram a
contornar as pedras que rolavam em meu caminho. Creio
que todos compreendem a importância dos primeiros
passos em qualquer caminhada; entretanto, não há a
necessidade de apontar as passadas de ninguém, pois
todos estão avançando juntos nesta jornada.
Há 64 anos atrás eu buscava as possibilidades e
as condições para realizar meus sonhos. O maior desejo
que eu tinha nasceu quando eu era ainda menino e percebi
as lutas de meus pais naquela vida proletária, enfrentando
aquelas situações de dificuldades extremas na lavoura.
Ficava pensando como poderia algum dia ajudá-los a
suavizar tal situação. O tempo foi passando, a família
sempre aumentando – 15 filhos – e as coisas sempre
ficando mais difíceis.
Quando chegou o dia em que tomei a decisão de
partir para encontrar uma solução que atenuasse aquela
situação, segui com firmeza para um mundo desconhecido
por mim em direção a Belo Horizonte. Meu maior desejo
era ajudar meus pais e meus irmãos a encontrar melhores
condições de vida. Não medi esforços nas lutas desiguais
que tive que travar.
Consegui, assim, realizar meu sonho.
Hoje sou muito feliz e satisfeito por ter alcançado
o que pretendia, e muito mais ainda quando vejo a
satisfação de meus próprios familiares desfrutando boas
condições de vida. Ter presenciado meus pais vivendo
alegres e felizes aqui na capital, de 1952 a 1988 e 1989,
deu-me ainda mais felicidades – minha mãe sempre
comentava com gratidão o que tinha sido feito para eles e
para toda a família de modo geral. Assim é a vida,
caminhando com dificuldades e também experimentando
felicidades.
Algumas pessoas poderão se perguntar por que
somente agora está sendo transcrito este livro; já são
passados 58 anos desde que trouxe minha família do
interior. Há tempos eu queria fazer estas observações,
contar esta história para minha família, mas estava
esperando completar algumas fases de mudanças na vida
de todos nós. Hoje, em boa hora, vejo que todos já estão
estabilizados; a família caminha na terceira geração e é um
bom momento de ver e rever todo o passado e agradecer o
tão desejado momento presente.
Uma árvore plantada em terrenos férteis precisa
ser cuidada para crescer e dar bons frutos. Primeiramente
vêem os espinhos, depois mais tarde brotarão as flores e
então virão os frutos. Para colhê-los é preciso ter cautela
para não desperdiçá-los e nem machucar a consciência da
colheita. Assim é o viver dos seres humanos no cotidiano.
A palavra Vida dita ao longo da Trajetória
encontra sentido importante nas ações de cada um neste
mundo. No meu viver e observar durante minha própria
existência compreendi aspectos que agora descrevo aqui;
viver é uma arte sutil, é como cultivar uma árvore que
necessita de constantes cuidados. Há muitos que julgam
que para viverem felizes nesta terra bastam as fortunas;
mas não é bem só isso... Talvez por esta razão haja muitos
que não cultivam plenamente esta arte de cuidar. De fato,
todos nós estamos vivos, mas realmente saber viver são
poucos os que sabem.
44
 Creio que seja preciso a disposição de viver com
alegrias verdadeiras para sermos felizes. Mesmo assim,
nossas vidas são muito complexas e trazem muitas vezes
surpresas das mais diversas. Mas o mundo não é tão mau
como se pinta, o que colore o mundo de forma negativa
são as tintas mal postas que provém dos sentimentos
desqualificados e grosseiros das pessoas. Do preparo dos
homens depende, assim, o êxito da Vida no futuro.
Realizando a realidade
Ninguém deve querer construir ou arquitetar a
felicidade sem primeiramente realizar uma reforma dentro
de si mesmo. Sabemos bem que a felicidade está no modo
de viver do ser humano, com sua família e todos os
semelhantes.
Todos nós devemos ter objetivos na vida; neste
mundo há lugar para todos. A pessoa que vai mais longe é
geralmente aquela que está disposta a fazer a caminhada,
construindo e realizando seu próprio futuro.
A Vida oferece milhões de lições, opções,
advertências, experiências e oportunidades que nos
convidam a buscar meios apropriados para vivermos de
forma melhor. Quando um sonho abstrato é transformado
por nossa mente e nossas ações em algo concreto, então
realizamos o que se chama de felicidade. Se com nossa
inteligência colocássemos cada coisa em seu devido lugar,
então teríamos assim uma vida melhor e diferente, e nosso
caminhar através dos tempos seria mais adequado. Creio
que todos nós temos o direito – e quase o dever – de
seguir sempre em frente na estrada da Vida. Por este
motivo, não podemos exigir nem censurar de ninguém
aquilo que nós mesmos não fazemos.
É muito grande o valor e o poder de um sorriso
acolhedor e de uma palavra amiga; se você os der de
forma sincera a partir de si mesmo, então estará dando um
dos mais preciosos presentes que podem ser ofertados.
Este dom de dar de si, esta doação, está ao alcance de
todas as idades, de todas as inteligências e de todas as
bolsas, porque quanto mais você dá mais você terá para
dar. A meu ver, é nos relacionamentos com a família e a
sociedade que estão as chaves do entendimento humano,
bem como o preparo das novas gerações.
A vida é construída a cada minuto, e a cada
segundo temos a chance de agir e de realizar a realidade;
às vezes um pequeno momento pode marcar mais do que
anos e anos juntos. Cada instante traz dentro de si toda a
eternidade.
Deveríamos agradecer quando nos deparamos
com uma dificuldade em nosso caminho, pois isso é um
sinal de que estamos vivendo e temos então um desafio e
uma possibilidade de transpor um obstáculo através da
nossa vontade. É através deste dinamismo que temos a
oportunidade de realizarmos nossa própria realidade.
45
Recordações poéticas
Olha que saudades que tenho!
Em 1949 eu estava estudando com diversos
professores e me preparando para fazer o curso de
Sargento, buscando fortalecer minhas bases e assim
alargar os conhecimentos que tinha. Matriculei-me, desta
forma, em aulas particulares e cursos preparatórios,
adquirindo vários livros necessários naquela época para
minha preparação: História Geral, Matemática, Gramática,
Línguas e muitos outros.
Hoje, revendo alguns destes livros antigos,
deparei-me com um deles que muito admirei e gostei do
seu conteúdo: chama-se Antologia Ginasial, de Mario
Casasanta, e traz poesias e comentários de grandes
escritores como Joaquim Nabuco, Luís de Camões,
Machado de Assis, Rui Barbosa e outros. Que alegria e que
saudade ao reler aqueles versos que tanto dizem da minha
própria história! Por isso gostaria de transcrever aqui
alguns deles...
Canções e Elegias – A vida no campo
Luís Vaz de Camões
“... Oh! lavradores, bem-aventurados
se conhecessem seu contentamento!
Como vivem no campo sossegados!
Dá-lhes a justa terra o mantimento,
dá-lhes a fonte clara a água pura,
mungem suas ovelhas cento a cento.
Não vêem o mar irado, a noite escura,
por ir buscar a pedra do Oriente;
não temem o furor da guerra dura.
Vive um com suas árvores contente,
sem lhe quebrar o sono repousado
a grã cobiça do ouro reluzente.
...”
Na Roça
Gonçalves Crespo
“Cercada de mestiças, no terreiro,
Cisma a Senhora Moça; vem descendo
A noite, e pouco e pouco escurecendo
O vale umbroso e o monte sobranceiro.
Brilham insetos no capim rasteiro,
Vêm das matas os negros recolhendo;
Na longa estrada ecoa esmorecendo
O monótono canto de um tropeiro.
46
 Atrás das grandes, pardas borboletas,
Crianças nuas lá se vão inquietas
Na varanda correndo ladrilhada.
Desponta a lua; o sabiá gorjeia;
Enquanto às portas do curral ondeia
A mugidora fila da boiada...”
União
Gonçalves Crespo
Se a união faz a força
É necessário que vivam unidos
Criando ao redor de si uma couraça
Com pensamentos bem regidos.
Pensamentos, base principal de tudo
Depende e defende ambiente sadio sem igual,
Os resultados até surpreendem.
Todos movem, todos buscam,
Dentro do bom senso da razão
Colher no tempo certo frutos
Da amizade e da união.
A humanidade seria mais feliz
Se ao invés de semear ódio semeasse amor
E uma vivência que condiz
Com o esclarecimento e o valor.
O bem não aproxima do mal,
Os bons pensamentos defendem
Aquele de vida bem natural
Que a vida o ser compreende.”
Aforismos colhidos pela estrada
Sobre os métodos
Entre o saber e a ignorância existe um espaço
que precisa ser apreendido. Nem todos nós somos sábios,
mas isso também não significa que precisamos nos manter
voluntariamente na ignorância. Há os que dizem que essa
jornada que transforma a ignorância em sabedoria é coisa
fácil; os que assim afirmam ou não sabem o que estão
dizendo ou querem enganar a si mesmos.
Muitas vezes, na busca de nosso aprimoramento
como seres humanos, nós desprezamos aquilo que
consideramos como “mais ou menos bom”. Entretanto, não
existem obras grandes ou pequenas – todas as obras são
importantes e todas merecem a devida consideração.
47
 Os afins se atraem e os contrários se repelem.
Dizer que os fins justificam os meios é uma idéia errônea,
pois a mentira só pode atrair a mentira.
Em certo sentido relativo, este é um mundo de
desvios. Conheço pouquíssimas pessoas que vivem
corretamente. Pensando bem, absolutamente correta eu
não conheço nenhuma. Por isso, para fazer o melhor que
pode ser feito em cada situação é preciso duas coisas:
paciência e perseverança. Para atingir um fim desejado é
preciso saber querer. Querer com vontade forte, mas com
consciência dos limites da própria vontade, é de
fundamental importância. Quem depende apenas da vitória
está à beira de um colapso, pois a Vida é feita de vitórias e
também de derrotas.
Acredito no trabalho em grupo, pois quanto mais
pessoas envolvidas em uma obra, mais conhecimento e
evolução para todos.
Sobre os recursos humanos
Em um mundo físico em que os seres disputam o
melhor bem estar para si, muitos benefícios adquiríveis
estão na evolução e no uso pleno da Vida através do corpo
material. Entretanto, qualquer valor puramente material
perde sua grandeza diante do capital humano vivificado
pelo valor máximo da natureza.
O capital humano deve, pois, ser tratado com o
maior desvelo, com a mais profunda dedicação e com
cuidado total. Todas as obras meritórias, os serviços de
filantropia e os esforços para a recuperação do homem
visam proteger e resgatar este imenso valor constituído
pelo capital humano.
Uma nação cresce, floresce, civiliza-se, enriquece
seu patrimônio científico, impõe-se através de sua
literatura e de suas artes; tudo isso só é realizado na
medida direta do valor dado aos seus filhos.
A valorização do homem é conhecida pela
demonstração do seu caráter, da sua honestidade e
benevolência. Também se manifesta através de sua
capacidade produtiva, iniciativa e inteligência cultivada.
Sobre as idades
Em muitas etapas da vida procurei por novos
horizontes. Passei da infância para a adolescência, e desta
para a juventude com os sonhos de erguer castelos, o que
é muito comum nestas fases. Depois, indo precocemente
da juventude para a maturidade, meus ideais tornaram-se
mais concretos nas responsabilidades de organização da
família e de adequação no convívio social. Aos 20 anos de
idade comecei então a esbarrar em uma série de
obstáculos de ordem social, todos naturais para a idade e
para a transição que estava fazendo. Consolidei minha fase
da maturidade ao longo de muitos anos de vivências.
A transição que experimentei em seguida para a
fase da terceira idade foi extremamente difícil para mim.
Nesta mudança tive que buscar novos pontos de referência
para minha vida. Procurei ao redor e encontrei uma
infinidade de coisas que me proporcionaram o que fazer na
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terceira idade, e algumas dessas coisas eram também de
utilidade para meus semelhantes.
Considerando hoje as experiências acumuladas
em todas as idades da minha existência, bem como os
esforços de reparação dos erros cometidos ao longo do
caminho, creio que tudo isso tenha contribuído de forma
significativa para o conjunto de conhecimentos que possuo.
Acredito também que o cabedal de experiências de um
homem pode ser sempre útil para ajudar alguém em algum
momento de dificuldades.
Máximas de uma sabedoria inata
Meu pai me surpreendeu várias vezes em nossa
convivência. Em muitas ocasiões, estávamos juntos
capinando a terra, colhendo alimentos ou simplesmente
caminhando juntos e eu ouvia algumas frases que ele dizia
e que ficaram guardadas em minha memória. Eram frases
e máximas de uma sabedoria do campo, inata, que eu
sinceramente não sei de onde ele tirava a inspiração para
compô-las, ou por que ele as dizia. De qualquer forma,
achei interessante registrar algumas delas neste livro.
Por exemplo, ao discutir com certos homens
perigosos, pistoleiros da região: “Olha, Não brinca comigo,
atrás de um morro tem sempre outro mais alto.” Ou:
“Antes de você me jantar eu te almoço”. E ainda: “Você
não me engana, eu conheço a madeira é pela casca”. Creio
que foi por causa desta sabedoria e habilidade em lidar
com aqueles homens perigosos é que conseguimos sair
daquela região ilesos.
Algumas outras frases, em outras situações,
vinham com um recheio de humor: “Se um burro te dá um
coice, você não deve cortar as pernas dele, pois outra hora
você pode precisar delas para montar nele.” Ou: “Pelo
cantar do carro de boi eu já sei o que vem dentro”.
Acredito também que herdei de meu pai um
espírito aventureiro. Quando parti da minha terra para Belo
Horizonte eu estava naturalmente muito ansioso, mas
esqueci todos os pensamentos e comentários negativos e
concentrei-me na esperança de que tudo daria certo. Viajei
com muita coragem e certeza, e ao chegar à estação
central de BH tive uma grande sensação de muita alegria
que não podia explicar, e ainda que não soubesse ao certo
como aquela aventura toda iria acabar, naquele momento
de extremo bem estar senti-me realizando um sonho
antigo.
Epílogo
Na Trajetória evolutiva foi descrito brevemente o
que se passou com a família Cândido desde suas origens.
Entretanto, há inúmeras outras lembranças que ficaram
arquivadas na minha memória; outros acontecimentos do
passado ficam para posteriores oportunidades com minha
família.
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 Durante toda minha vida de criança e de Neste livro todos poderão concluir e compreender
mocidade, indo dos 5 aos 20 anos de idade, tive uma que o trabalho aqui feito foi simplesmente uma recordação
convivência muito forte com meu pai. Sempre o do passado da família Cândido.
acompanhava por todas as partes, através dos lugarejos Não desejo receber nenhum tipo de
ermos por onde passávamos e pelos lugares difíceis onde reconhecimento por este trabalho. Gostaria apenas que os
vivemos. Tenho lembranças saudosas: tudo o que é vivido conteúdos e as idéias que apresentei fossem bem
com dificuldades deixa marcas na Vida e tem seu valor compreendidos, assim como as finalidades desta
reconhecido. publicação.
Meu pai deixou boas lembranças que ficaram Espero que todos da família Cândido realmente
fortemente gravadas em meus pensamentos, juntamente percebam que meus sentimentos de consideração e estima
com a amorosa imagem de minha mãe que sempre me são distribuídos igualmente para todos com o mesmo valor
defendia dos perigos em certos momentos delicados. e respeito, da mesma forma como a chuva é distribuída
Os meus pais sempre me ensinaram que a união equitativamente sobre uma planície.
da família é a melhor forma de convivência para todos. A
união faz a força, e contra esta força não há resistências.
Para os que tiveram a oportunidade de ler os FIM
conteúdos deste livro, peço que não levem em
consideração as possíveis falhas e divergências que
porventura possam ter sido cometidos em algum tipo de
informação referente à família Cândido.
Este trabalho foi feito em termos reduzidos,
apenas para dar uma noção dos acontecimentos que
ocorreram com nossa família. Muitos outros detalhes que
não constam neste livro ficam para a posteridade. Desta
forma, espero que os fatos, os conceitos, as idéias e os
argumentos que aqui foram apresentados sirvam como um
ponto de partida para outros estudos e trabalhos futuros,
para que aqueles que queiram dar continuidade na nossa
história possam assim ter uma referência na qual poderão ... Mas a caminhada continua...
se basear.

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