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SÃO PAULO
2007
3
por
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________________________________
_________________________________
4
RESUMO
ABSTRACT
A legal contract has always been and it will always be a tool of great
importance for the circulation of wealth in society. The Civil Code mirrors the
values and principles laid down by the Federal Constitution and thus, all judicial
powers, such as the contract, embody a social function.
No abusive clauses are allowed within this context. The Civil Code
foresees the instances where the revision or resolution of the contract is allowed.
This situation has already been observed in consumer affair regulations, with
examples of clauses considered to be abusive. In Civil contracts, without
expressed provisions, the interpreter and enforcer of the law can make use of
general clauses or apply the Introduction Law of the Civil Code to moderate the
practice of such abuses. In this way, the contract is preserved so that it can reach
its goal, which is that of assisting the contractors in the fulfillment of their social
goals.
This dissertation has as its objective the study of the social function
of contracts as general clauses that may contribute to moderate the practice of
abusive clauses in civil contracts.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................... 9
CONCLUSÃO.................................................................................................. 185
INTRODUÇÃO
podemos traduzi-los como qualidade, que torna algo inestimável, o que, por si, já
novos valores, na medida em que a sociedade assim exija, a fim de garantir, que os
acertadamente nos presenteou com um novo Código Civil pautado nos princípios da
excessiva, entre outros, e, ainda, através das cláusulas gerais, que também servirão
diploma aos contratos civis, considerando que o aplicador da lei poderá se utilizar,
jurídica, mantida em todos os negócios jurídicos, tudo para que a paz social seja
alcançada.
cláusula geral não poderá servir como máscara para esconder o inadimplente, uma
abandonado a fase da barbárie, embora não se tenha notícia de qual seja a data
Romano, que pode representar, sem medo de errar, um ponto de partida para o
estudo dos contratos, pois o modelo e a estrutura dos contratos, dele advindos,
foram utilizados pelo mundo ocidental, justamente por ser reconhecido como modelo
de civilização jurídica.
termos eram utilizados para o mesmo fim, tais como conventio, cum venire e pacis
si, cujos significados seriam convenção, vir junto e pacto, enfim, todas estas
sentido mais restrito, na medida em que dizia respeito apenas e tão somente a criar
1
Arnold Wald. O contrato: Passado, Presente e Futuro. Revista Cidadania e Justiça: 1º semestre de
2000. RJ. Publicação da Associação dos Magistrados Brasileiros. Pág. 43. “Poucos institutos
sobreviveram por tanto tempo e se desenvolveram sob formas tão diversas quanto o contrato, que se
adaptou a sociedades com estruturas e escala de valores tão distintas quanto às que existiam na
Antiguidade, na Idade Média, no mundo capitalista e no próprio regime comunista”.
2
Pablo Stolze Galgliano e Rodolfo Pamplona Filho.Novo Curso de Direito Civil. Contratos. Pág 2.
“Não podemos fixar, ao longo da história, uma data específica de surgimento do contrato e a sua
ocorrência confunde-se com a própria evolução moral da humanidade, a determinação de uma data
ou de um período predefinido seria formulação de alquimia jurídica, sem validade científica”.
3
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos.
Pág.364.
12
especificidade.
Todos esses termos traduziam o acordo entre duas ou mais pessoas acerca
de um objeto, porém não bastavam por si só para que surgisse uma obrigação5
juridicamente exigível.
sua diferença em relação ao direito moderno, uma vez que, enquanto, no direito
jurídicas.
Verificamos que nessa fase as formas tinham uma importância tão grande
que eram equiparadas a um sacramento, dado o rigor com que eram exigidas,
mesmo que essas não expressassem, exatamente, a vontade das partes. Assim,
Assim como na época da Lei das XII tábuas, em que a intenção das partes
4
José Carlos Moreira Alves. Direito Romano. Pág. 108. “Somente em textos pós-clássicos ou
interpolados o termo contractus indica negócios, que não são acordos de vontade, ou relações que
não nascem do acordo de vontades”.
5
José Cretella Junior. Curso de direito romano: O Direito Romano e o Direito Civil Brasileiro. Pág.
246.
“Menciona o autor que apenas os contratos ditos consensuais se formavam pelo mútuo
consentimento, os quais, por essa característica, eram tidos como insólitos nesse sistema contratual.
Tais contratos eram quatro: venda, locação, mandato e sociedade”.
6
J.M. Leoni Lopes de Oliveira. Teoria Geral do Direito Civil. Pág.549.
13
acordo de vontades, daí porque, durante algum tempo, somente esses contratos
correspondente a esses quatro pactos, o que significava uma ação própria a cada
um deles.
7
Idem. “Analogamente a outros institutos do direito romano, o contrato também tem sua história que
se desenvolve por mais de mil anos de contínuas transformações. Não havendo como vimos um só
direito romano, mas como que vários direitos romanos, porque o império atravessou os tempos,
preservando em suas linhas gerais o extraordinário monumento jurídico, é fácil concluir que o
contrato dos primeiros tempos se apresenta com fisionomia bem diversa da que caracteriza, por
exemplo, nos período clássico e justinianeu. Do formalismo para o não-formalismo, do apego
excessivo à forma para um abrandamento ininterrupto, em benefício do conteúdo, da intenção das
partes – eis o sentido exato da evolução contratual do direito romano”.
14
para este não havia possibilidade de ação, sendo que ambos eram inseridos
não havia uma teoria geral aplicada aos contratos, mas apenas alguns tipos de
contratos.
cada um e, a esse respeito, o Ministro José Carlos Moreira Alves10 esclarece, com
muita sabedoria e simplicidade, que o pactum não gerava obrigação, mas sim
exceção e, por essa razão, não era tutelado por uma ação (actio), mas, de modo
stipulatio.
8
Caio Mario. Lesão nos Contratos. Pág. 9. “... Todos, porém, genericamente batizados de
conventiones, expressão que revive em Pothier, como gênero, do qual o contrato é uma espécie,
como ainda no nosso Teixeira de Freitas (art. 1.830 da Consolidação).”
9
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. pág
365. “A solenidade dava força às convenções. Cada uma dessas convenções, sob certas
formalidades, constituía um contractus. Não conhecia, portanto o Direito Romano uma categoria geral
de contrato, mas somente alguns contratos em particular”.
10
José Carlos Moreira Alves. Direito Romano. Pág. 110.
11
Clóvis Veríssimo do Couto e Silva. A obrigação como processo. Pág. 225. “A determinação do
direito pela atividade processual e o rígido formalismo, que marcaram caracteristicamente a primeira
fase do direito romano, fizeram com que, mesmo no período clássico, a vontade fosse sempre
considerada como algo fático, não se reconhecendo, à sua autonomia a posição de princípio jurídico”.
15
de contrato, o pressuposto, que faz surgir a obrigação, não era o elemento subjetivo
formais, entre os quais, cita a doutrina, aqueles considerados reais, tais como o
e o contrato de sociedade.
fazendo uma comparação com o direito moderno, restringiam-se apenas aos típicos
ou nominados13.
12
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos.
“Posteriormente, na história romana, foram sendo reconhecidos outros pactos, que se utilizavam
para certos negócios. Só com Justiniano é que se confere uma ação (actio praescriptis verbis) para
qualquer convenção entre as partes (contratos inominados)”.
13
José Carlos Moreira Alves. Direito Romano. Pág 108. “Quanto aos contratos obrigatórios (aos
quais, em geral, nos referimos somente com o termo contrato), o direito moderno, ao lado dos
contratos típicos ou nominados (acordo de vontades que se ajustam a um dos tipos de contrato
descritos na lei), admite amplamente os contratos atípicos ou inominados (acordos de vontade que
não se amoldam, estritamente, a nenhum dos tipos estabelecidos na lei, mas que se destinam a
constituir relações jurídicas obrigacionais merecedoras de tutela, segundo a ordem jurídica)”.
14
Álvaro Villaça Azevedo. Teoria Geral dos contratos típicos e atípicos. Pág. 39. “No século III da era
cristã, com a Constituição de Diocleciano e Maximiliano, teria surgido à idéia de que um contrato
poderia resolver-se, quando trouxesse desvantagens para um dos contratantes. Acontecia no caso de
venda de imóvel, quando o vendedor fosse forçado a vendê-lo, em condições desvantajosas, por
preço inferior à metade de seu valor real”.
16
imposta por uma das partes ao outro contratante, há registros de que, no século III
Para suprir as possíveis falhas do ius civile, havia a figura do pretor, a quem
lacunas do ordenamento16.
tábuas, com a finalidade de indicar as fórmulas, que seriam apreciadas, desde que
15
Raimundo Mendes. A proteção do consumidor, segundo Hammurabi.Pág.166-168. “Esse escrito
compreendido entre 1955 a 1913 a.C.compreendia disposições acerca da regulamentação da
atividade comercial no que tange a preços, quantidade e qualidade de produtos. Desse Código
podemos mencionar o seguinte dispositivo: ‘(...) e o inquilino deu ao proprietário (da casa) toda a
prata do aluguel de um ano, (se) o proprietário da casa disse ao inquilino para sair antes de terminar
o prazo, o proprietário da casa (dará) a prata que o inquilino (lhe) deu, porque (fez) o inquilino sair de
sua casa antes de terminar o prazo”.
16
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos.
Pág 365. “A intervenção do pretor mostrou-se importante no preenchimento das lacunas do
ordenamento”.
17
criadas pelos pretores, não eram garantidos pela lei17, mas somente reconhecidos
pelo pretor, que detinha o poder de aplicar a lei, nos casos por ela não previstos.
17
Caio Mario da Silva Pereira. Lesão nos Contratos. Pág. 5. “Corrigindo, secundando, ou suprindo as
deficiências do ius civile, baixavam os pretores editos, afixados em tábuas brancas (álbum) frente ao
tribunal respectivo, nos quais indicavam as fórmulas que lhes podiam ser pleiteadas e em que
condições eles as concederiam. Conferiam assim proteção aos direitos reconhecidos mas não
garantidos pela lei, estendiam o império desta a casos não previstos, abrandavam o seu rigor, e até
corrigiam a lei, insurgindo-se contra as suas prescrições.”
18
José Carlos Moreira Alves. Direito Romano. Pág 110. “(...) Graças à jurisprudência, ao pretor e ao
imperador, certos pactos (os pactos vestidos, na pitoresca linguagem dos autores medievais: pactos
adjetos, pretorianos e legítimos) passam a gerar obrigações, embora os juristas romanos não os
enquadrem entre os contractus (contratos)”.
19
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho. Novo Curso de Direito Civil. Obrigações.Pág. 25.
“Atribui-se a Gaio a catalogação das fontes das obrigações, dentre as quais se incluía o contrato
como uma delas”.
18
adotada na época20, não se confunde com o entendimento técnico, que se tem hoje,
a respeito do contrato.
José Carlos Moreira Alves21, é que se admite uma categoria abstrata de contratos,
esclarecendo que: “Não é no direito romano que se deve buscar a origem histórica
20
Idem.“Deve-se ao jurisconsulto Gaio o trabalho de sistematização das fontes das obrigações,
desenvolvidas posteriormente nas Institutas de Justiniano, que seriam distribuídas em quatro
categorias de causas eficientes”:
a) O contrato – compreendendo as convenções, as avenças firmadas entre duas partes;
b) O quase-contrato – tratava-se de situações jurídicas assemelhadas aos contratos, atos
humanos lícitos equiparáveis aos contratos, como a gestão de negócios;
c) O delito – consistente nos ilícito dolosamente cometido, causador de prejuízo para outrem;
d) O quase-delito – consistente nos ilícitos em que o agente atuou culposamente, por meio de
comportamento carregado de negligência, imprudência ou imperícia.
21
José Carlos Moreira Alves. Direito Romano.Pág. 110 e seguintes. “Possivelmente no direito pós-
clássico a tipicidade contratual sofre abalo com a admissão da categoria dos contratos inominados,
isto é, contratos atípicos, que formam uma categoria abstrata, e que tem, em comum, a unidade de
ação que os tutela e o fato gerador da obrigação: a execução, por um dos contratantes, de sua
prestação faz nascer, para o outro, a obrigação de efetuar a contraprestação”.
22
Orlando Gomes. Contratos. Pág.6. “A moderna concepção de contrato, tal qual concebemos hoje,
consistente em acordo de vontades por meio do qual as pessoas formam um vínculo jurídico a que se
prendem, somente se esclarece à luz da ideologia individualista típica do regime capitalista de
produção”.
19
normativa, a partir do iluminismo, movimento que marcou época na França, por não
23
Fabio Ulhoa Coelho. Manual de Direito Comercial. Pág. 6. “O comercio gerou e continua gerando
novas atividades econômicas. Foi a intensificação das trocas pelos comerciantes que despertou em
algumas pessoas o interesse de produzirem bens de que não necessitavam diretamente; bens feitos
para serem vendidos e não para serem usados por quem os fazia. É o início da atividade que, muito
tempo depois, será chamada de fabril ou industrial. Os bancos e os seguros, em sua origem,
destinavam-se a atender necessidades do comerciantes. Deve-se ao comércio eletrônico a
popularização da rede mundial de computadores( internete), que estimula diversas novas atividades
econômicas.
24
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos.
Pág. 366. “A preponderância da autonomia da vontade no direito obrigacional, e como ponto principal
do negócio jurídico, nos vem dos conceitos traçados para o contrato no código francês e no código
alemão”.
20
sua grande maioria, foram, ou ainda preservam alguns traços, inspirados no Código
francesa.
jurídica ainda revelava, até bem pouco tempo, os reflexos advindos daquela cultura,
25
Ana Prata. A tutela Constitucional da Autonomia Privada. Pág.7. “Há, desde logo, que observar que
sujeito jurídico, propriedade e autonomia privada não são conceitos universais: eles pertencem ao
domínio das relações entre proprietários. A atribuição de personalidade jurídica e,
consequentemente, de capacidade negocial, encontra-se estreitamente vinculada ao surgimento da
posse privada e do direito de propriedade: reivindicando a posse, ou afastando ‘judicialmente’ as
turbações na posse do bem, a pessoa a quem esse bem foi atribuído surge como capaz de realizar
actos produtores de efeitos jurídicos. Mas porque só a ela foi repartida-atribuída a posse de certa
terra, só ela pode praticar esses actos que à terra respeitam e que produzem efeitos jurídicos.Quando
a pessoa passa a poder dispor do bem – e não apenas a ter o poder de o usar e assegurar a sua
utilização produtiva – então ela afirma-se exclusiva titular de um poder de produzir efeitos jurídicos, já
não só como meio de transmissão do próprio bem”.
26
Cristiano Heineck Schmitt. Cláusulas abusivas nas relações de consumo. Pág. 42.
“A autonomia da vontade como princípio norteador da ordem jurídica privada só alcançará seu
apogeu, no entanto, no século XIX, época do primado liberal”.
27
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das obrigações e dos contratos. Pág. 362.
“Nosso legislador de 1916 tinha a seu dispor as orientações do velho Código Francês de 1804, ainda
em vigor, no qual se inspiraram o revogado Código Italiano de 1865 e o Código Alemão de 1896, que
entrou em vigor em 1º de Janeiro de 1900”.
21
poder não mais emanava do soberano ou de Deus, mas sim do povo e da nação.
Cabe lembrar que, até o ano de 1789, o poder, a que nos referimos e que
Nacional”.
tange à segurança jurídica, já que, até então, esse direito dependia do poder político
proprietários. Isto porque não haveria o risco de serem privados dos seus bens, já
da revolução.
sendo que entre eles está, justamente, aquele que assegura o tão almejado direito
28
Roberto Catelli Junior.O mundo dos cidadãos. Pág. 40. “A Bastilha era uma prisão,
verdadeiramente uma fortaleza dentro de Paris onde estavam confinados os presos políticos e que foi
tomada em 14 de julho de 1789 pela multidão formada por camponeses, artesãos, pequenos
comerciantes e burguesia. Muitos dos que defendiam a bastilha foram enforcados e suas cabeças,
exibidas pelas ruas de Paris”.
29
Roberto Catelli Junior. O mundo dos cidadãos. Pág 43.
23
instrumento que basta, por si só, para a aquisição da propriedade. Aquilo que era
possível apenas à classe dominante passa a ser possível aos indivíduos, a partir do
classe.
Salvo Venosa32, em que afirma que “No Código Francês, propriedade e liberdade
francês, opera a transferência dos direitos reais33, revelando, desta forma, mais um
30
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das obrigações e dos contratos.Pág 365 e ss.
31
Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. Pág. 3.
32
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das obrigações e dos contratos.Pág 365 e
seguintes.
33
Idem. Pág.362. “A transferência de bens passava a ser dependente exclusivamente da vontade”.
24
DE CIRCULAÇÃO DE RIQUEZAS NO
ESTADO LIBERAL.
liberdade, bem como do direito de propriedade, durante todo o século XIX e boa
parte do século XX, o contrato passa a ser reconhecido, também, como instrumento
não interferência do Estado, que foram os ideais que mais contribuíram para a
34
Cristiano Heineck Schimitt. Cláusulas abusivas nas relações de consumo. Pág. 42. “No panorama
jurídico do século XIX, a obrigação contratual tem como única fonte a vontade das partes, servindo a
lei para assegurar somente o adimplemento do acordo, abstendo-se o Estado de qualquer
intervenção nas relações entre os indivíduos.
35
Arruda Alvim. RT 815. Pág. 21. “Toda disciplina do séc. XIX gravitou, fundamentalmente, em torno
de duas realidades: a liberdade e, nesse espaço de liberdade, o exercício da atividade econômica
através dos contratos e, paralelamente, a garantia do direito de propriedade”.
36
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu controle no Direito Brasileiro. Pág. 25. “O contrato é para a
ciência do direito, em si mesmo, um conceito jurídico, altamente desenvolvido e trabalhado, e como
se percebe, pelo exame do contrato clássico – que é, ainda, o que tem sido mais trabalhado pela
doutrina – representa ele uma absorção da realidade econômico-social, ao que se somaram
princípios políticos e, mesmo ideológicos, que foram o individualismo e o liberalismo, cujas idéias
foram as mais fundamente cunhadas na configuração do que é contrato”.
25
momento histórico, como, também, todo o instituto jurídico, por mais de um século.
como já se mencionou, essa dizia respeito apenas ao aspecto formal, não existindo
Uma vez conquistado o poder, a lei foi o meio de mantê-lo, lembrando que,
nesse contexto, só era permitida, aos juízes, a estrita aplicação da lei, uma vez que
razão pela qual Montesquieu pregava, com veemência, sua aversão aos juizes,
liberdade, se, de um lado, para os juízes, não havia liberdade para interpretarem a
lei, por outro lado, a liberdade, concedida aos sujeitos do contrato, era considerada o
37
Montesquieu. O espírito das leis. Pág. 53. (a boca que pronunciava as palavras da lei).
26
bem como revela, também, a realidade socio-econômica que influenciará toda a sua
estrutura.
forma.
aduz que “O contrato é antes de tudo um fenômeno econômico. Não é uma criação
do direito”.
38
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e o seu controle no Direito Brasileiro. Pág. 25.
27
produtor”.
39
Humberto Theodoro Junior. O contrato e sua função social. Pág. 97.
40
Roberto Senise Lisboa. Contratos difusos e coletivos. Pág. 92-94.
41
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Pág. 11.
28
Prossegue o doutrinador:
brocardo denominado pacta sunt servanda43 - “Os contratos têm que ser cumpridos”
- não existindo limitação para o contrato, que não aquelas fundadas no interesse
público.
42
Arruda Alvim. RT 815. Pág. 30.
43
Arruda Alvim. RT 815. P. 21. “Este princípio é “alma” e a “vida” dos contratos, ou se quiser é a sua
ratio essendi.”.
29
perante a lei46.
judiciário não tinha nenhuma autonomia, se revela não só como fim do Absolutismo,
mas também como o encontro da verdadeira felicidade, tal qual apregoado por
44
J.M. Leoni Lopes de Oliveira. Teoria Geral do Direito Civil. Pág. 551. “A regra do pacta sunt
servanda como princípio elementar de todo o direito natural foi tema desenvolvido por Grócio,
sustentando que a vontade é soberana e que o respeito da palavra dada é uma regra de direito
natural cujo princípio deve ser aplicado não apenas entre os indivíduos, mas também entre as
nações”.
45
Ulpiano, Digesto, 2.14.
46
Fernando Noronha. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais. Pág. 66. “Essa situação
era garantida pela própria jurisprudência da época e bem refletida pelos célebres pronunciamentos,
um na Inglaterra outro nos Estados Unidos. ‘Em 1875, Sir George Jessel que era Máster of the Rolls
e de quem se afirmava ter sido ‘one of the greatest judges of the nineteenth century’, fundamentava
uma decisão dizendo que, ‘ se existe uma coisa que a ordem pública (public policy) exige mais do
que qualquer outra, é que as pessoas de maior idade e perfeito discernimento (men of full age and
competents understanding) devem ter a máxima liberdade de contratar (the utmost liberty of
contracting), e que os seus contratos, quando assumidos livre e voluntariamente (when entered into
freely and voluntarily), devem ser considerados sagrados e devem ser tutelados pelos tribunais ( shall
be held sacred and shall be eforced by courts of justice). Em 1905, a Suprema Corte norte-americana
declarou inconstitucionais leis sobre salários mínimos e duração máxima da jornada de trabalho,
argumentado tratar-se de injustificada interferência com a liberdade e a propriedade
(unwarranted interference with liberty and property)”.
30
outro lado, a afirmação de que o homem pode atingir a plena felicidade em razão de
considerado.
intangível, já que o Estado adotava uma posição de omissão total, não interferindo,
47
Jean Jacques Rousseau. Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens. Segunda
parte: “Tal foi ou deveu ser a origem da sociedade e das leis, que deram novos entraves ao fraco e
novas forças ao rico, destruíram irremediavelmente a liberdade natural, fixaram para sempre a lei da
propriedade e da desigualdade, fizeram de uma usurpação sagaz um direito irrevogável e, para lucro
de alguns ambiciosos, daí por diante sujeitaram todo o gênero humano ao trabalho, à servidão e à
miséria.”
31
de modo que tudo o que era contratado era justo48, encontra inspiração na filosofia
jusracionalista de Kant.
que, inegavelmente, foi causa de grandes tragédias humanas49, uma vez que os
contratos deveriam ser cumpridos, mesmo que uma das partes fosse
obrigatoriedade da convenção.
servanda, de forma que, caso o contrato não seja integralmente cumprido, haverá a
48
Darcy Bessone de Oliveira. Aspectos da evolução da teoria dos contratos. Pág.101. “Quem diz
contratual diz justo”. “Segundo a doutrina clássica, o contrato é sempre justo, porque, se foi requerido
pelas partes, resultou da livre apreciação dos respectivos interesses pelos próprios contratantes”.
49
Arruda Alvim. RT 815. Pág. 22. “Se nós formos perguntar qual foi a evolução em todos os países,
em relação ao ‘tamanho’ da autonomia privada, sem sombra de dúvida, a evolução pela qual passou
o espectro da autonomia privada, haver-se-á de concluir ter sido um espaço que diminuiu, porque se
verificou que a chamada “igualdade formal” levava a injustiças profundas.”
32
contrato.
força obrigatória dos contratos é a de que, o contrato válido faz lei entre as partes.
50
Maria Helena Diniz. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. Pág. 62.
51
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu Controle no Direito Brasileiro. Pág. 26.
52
Artigo 1134 do Código francês; “as convenções feitas nos contratos formam para as partes uma
regra à qual deve se submeter como a própria lei”.
53
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho. Novo Curso de Direito Civil. Pág. 5. “ Essa
tendência individualista, entretanto, acabaria por gerar sérios desequilíbrios sociais, somente
contornados pelo dirigismo contratual do século XX, reflexo dos movimentos sociais desencadeados
na Europa Ocidental, e que recolocariam o homem na sociedade, retirando-o do pedestal a que
ascendera, após a derrocada do Antigo Regime, quando pretendeu assumir o lugar de Deus.”
33
no Direito Privado, para adotar uma diretriz assentada em fundamentos não apenas
hoje de “sujeito de direito” não abstrato e isolado, mas, sim, inserido na coletividade.
54
Miguel Reale. Teoria Tridimensional do Direito. Pág. 137. “O ‘bem comum’, por conseguinte de que
falo, é o bem da ‘comunidade das pessoas’, na harmonia de ‘ valores de convivência’, distintos e
complementares, em um processo histórico que tem como fulcro a pessoa, valor-fonte de todos os
valores”.
55
Daniel Martins Boulos. A Autonomia privada, a função social do contrato e o novo Código Civil.
Pág. 128. “Basta referir que no Código de 1916, a exemplo de outros Códigos Civis, o princípio da
força obrigatória dos contratos encontrava raríssimas exceções, tais como nos casos de (a) uma das
partes não poder manifestar corretamente a sua vontade, quer por não possuir o discernimento para
tal (casos de incapacidade), quer em razão de algum motivo especial que fizesse o emitente da
declaração de vontade merecedor de proteção (casos de vícios do consentimento) ou mesmo que
fosse necessária a proteção de terceiro alheios ao ato volitivo (vícios sociais); (b) inobservância da
forma prescrita em lei ou utilização de forma nela proibida ou ainda desatendimento de alguma
solenidade nela prevista; (c) ilicitude ou impossibilidade do objeto”.
“Ou seja, o Código Civil de 1916 continha hipóteses taxativas por meio das quais era permitido ao juiz
interferir nas relações contratuais travadas entre dois particulares, de modo que o princípio pacta sunt
servanda restava, praticamente, incólume diante da legislação civil. Esse entendimento é fruto,
dentre outros motivos, de o antigo Código Civil ser “filho do século XIX”, pois, embora aprovado em
1916, é certo que o Projeto Bevilacqua de 1899, que deu origem ao Código Civil revogado
experimentou apenas mudanças de caráter formal nos dezesseis anos em que tramitou no
Congresso Nacional”.
34
privado57.
56
Mário Lucio Quintão Soares e Lucas Abreu Barroso. Revista Brasileira de Direito Privado. Nº 14.
Pág. 53. “Uma das projeções da livre iniciativa é a liberdade de participação na economia,
corroborando o capitalismo enquanto modelo econômico adotado, que traz consigo todas as mazelas
e formas de exclusão que lhe são inerentes, mas que deverá, antes de tudo, respeitar os valores
sociais do trabalho, juntamente com a livre iniciativa na posição de fundamento do Estado e preceito
da ordem econômica, visando compatibilizar o regime de produção escolhido (capital, lucro) a
dignidade da pessoa humana e a dimensão econômico-produtiva da cidadania”.
57
Rosa Maria de Andrade Nery. Noções preliminares de direito civil.pág.110 e ss.
35
sociedade brasileira, quando traduz através das Cláusulas Gerais58, os valores que
direito:
58
Daniel Martins Boulos. A autonomia privada, a função social do contrato e o novo Código Civil.
Pág.129. “Já o Código Civil Brasileiro de 2002, além de alargar as hipóteses por meios das quais a
regra (repita-se, ainda vigente) ‘ os pactos tem que ser cumpridos’ pode e deve ser afastada,
estabeleceu um regime de cláusulas gerais que contém princípios que constituem cada um dos quais,
verdadeira limitação à liberdade contratual e, em maior escala, à própria autonomia privada. Assim
ocorre, por exemplo, com a cláusula geral que veda o abuso de direito, contida no art. 187. Assim
também sucede com a cláusula geral da boa-fé objetiva (art. 422), com aquela que veda o
enriquecimento sem causa (art. 884 e ss.) e com a que prevê a extensão da responsabilidade
objetiva a casos não tipificados na lei, mas segundo critérios por ela fixados (art. 927, parágrafo
único)”.
59
Washington de Barros Monteiro. RT 200/369.
60
Miguel Reale. Teoria Tridimensional do Direito. P. 137. “O ‘bem comum’, por conseguinte de que
falo, é o bem da ‘comunidade das pessoas’, na ‘harmonia de ‘valores de convivência’, distintos e
complementares, em um processo histórico que tem como fulcro a pessoa, valor-fonte de todos os
valores.”
36
Essa evolução, ou esse progresso jurídico, que traz o homem para assumir
das falhas e das injustiças, que o princípio da igualdade formal, consagrado no pacta
61
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Contratos. Pág. 14. “O princípio da força
obrigatória do contrato significa, em essência, a irreversibilidade da palavra empenhada”.
62
Leonardo Mattieto.Problemas de Direito Civil Constitucional. Coord. Gustavo Tepedino.Pág.175.
“Nas palavras emblemáticas de Ripert, ‘O contrato já não é ordem estável, mas eterno vir a ser’. A
noção de liberdade contratual havia sido construída como projeção da liberdade individual, ao mesmo
tempo em que se atribuía à vontade o papel de criar direitos e obrigações. A força obrigatória do
contrato era imposta como corolário da noção de direito subjetivo, do poder conferido ao credor sobre
o devedor. Com a evolução da ordem jurídica, já não tem mais o credor o mesmo poder, o direito
subjetivo sofre limites ao seu exercício e não compete aos contratantes, com exclusividade, a
autodeterminação da lex inter partes, que sofre a intervenção do legislador e pode submeter-se à
revisão pelo juiz”.
63
Maria Helena Diniz. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. Pág. 62.
64
Paulo Nalin. Do Contrato: Conceito pós-moderno – Em busca de sua formulação na perspectiva
civil-constitucional. Pensamento jurídico. Pág. 109.
37
como assevera Arruda Alvim65, verifica-se que ocorreu uma minimização do princípio
códigos de países que traduzem os valores escolhidos pela sociedade, entre esses
65
Arruda Alvim. RT 815. Pág 24.
66
Código Civil Italiano.Artigo 1.467. “Contratto com prestazioni corrispetive nei contratti a ezecusione
continuata o periódica ovvero a essecuzione differita, se la prestazione di uma delle parti è divenuta
eccessivamente onerosa per il verificarsi di avvenimenti straordinari e imprevedibili, la parte Che deve
tale prestazione può domandare la risoluzione del contratto, com gli effetti stabiliti dall’art.1.458.
38
contrato, não é aquela que poderá surgir em decorrência da álea normal do contrato,
muito embora seja essa a interpretação que entendemos ser adequada para os
artigos 47867 e 47968 do nosso Código Civil, que também permitem nestas situações
a resolução do contrato.
Continua o doutrinador:
La rizoluzione nom può essere domandata se la sopravvenuta onerosità rientra nell àlea normale del
contratto. La parte contro la quale è domandata la risoluzione può evitaria offrendo de modificare
equamente lê condizioni del contratto.”
67
Código Civil artigo 478: “Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma
das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de
acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os
efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação”.
68
Código Civil artigo 479: “A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar
equitativamente as condições do contrato”.
69
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Contratos. Pág.167.
39
pátrio, busca proteger o contrato, preservando-o para que seja cumprido, e, para
possível de ser revisto, nas situações que foram consideradas e justificadas pelo
nosso legislador.
70
Orlando Gomes. Introdução ao Direito Civil. Pág. 471. “As transformações ocorridas na ordem
econômica e política da sociedade, aceleradas por fatos históricos de teor decisivo para a evolução
da humanidade, contribuíram peremptoriamente para a mudança de orientação, revelando a
impropriedade da ordem jurídica implantada na dogmática individualista”.
71
Idem.
40
humanas para os contratantes, o que não significa dizer que tenha sido colocado em
dúvida o princípio da força obrigatória73, mas sim que o princípio traz, hoje, na sua
72
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Pág.162. “O contrato devia ser cumprido
no pressuposto de que se conservassem imutáveis as condições externas, mas que, se houvesse
alterações, a execução devia ser igualmente modificada: Contractus qui habent tractum successivum
et dependentiam de futuro rebus sic stantibus intelligentur. A teoria tounou-se conhecida como
cláusula rebus sic stantibus, e consiste, resumidamente, em presumir, nos contratos comutativos,
uma cláusula, que não se lê expressa, mas figura implícita, segundo a qual os contratantes estão
adstritos ao seu cumprimento rigoroso, no pressuposto de que as circunstâncias ambientes se
conservem inalteradas no momento da execução, idênticas às que vigoravam no da celebração. Os
escritores, tanto entre nós quanto no estrangeiro, procuraram adaptar a velha cláusula rebus sic
stantibus às condições atuais. Fé-lo Osto, com a teoria da superveniência; fé-lo Larenz, com a base
do negócio jurídico; fé-lo Giovene, com a teoria do erro; fé-lo Naquet com a invocação da boa-fé. A
que, a nosso ver, melhor atende às injuções sistemáticas é a da imprevisão, aqui afeiçoada e
difundida por Arnoldo Medeiros da Fonseca”.
73
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Pág. 15. “Não é posto em dúvida o
princípio da obrigatoriedade, de aceitação universal, muito embora se lhe ponham obstáculos, em
nome da ordem pública”.
41
manifestou:
E:
74
Cristiano Heineck Schimitt. Cláusulas abusivas nas relações de consumo. Pág. 52. “Até então, o
Estado não intervencionista ocupava, diante dos direitos fundamentais, uma postura estritamente
omissiva, o que agradava aos teóricos do liberalismo. Buscava-se a igualdade política deixando-se de
lado a econômica”.
75
Caio Mario da Silva Pereira. Instituição de Direito Civil. Contratos. Pág. 29.
42
econômica79.
76
Apud, Messineo Dottrina Generale del Contratto, nº 11, pág. 15.
77
J.M. Leoni Lopes de Oliveira. Teoria Geral do Direito Civil. Pág 556.
78
Idem.
79
Constituição Federal de 1988. Artigo 170, caput. “A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:”
43
preâmbulo81.
Estado, como garantidor da ordem jurídica, já que a economia passa a ser vista pela
80
Fernanda Pessanha do Amaral Gurgel.Liberdade e Direito Privado. Pág.24.
81
Constituição da República Federativa do Brasil. Preâmbulo: “... instituir um Estado Democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-
estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social”.
82
Constituição Federal de 1988. Artigo 1º, III.
44
pressuposto básico, bastando, para isso, verificar o artigo 1º, que consagrou, entre
o direito contratual.
83
Eduardo Teixeira Farah. Disciplina da Empresa e princípio da solidariedade social. Pág.679.
45
previsão constitucional, tem o dever de proteger essa iniciativa, para que se cumpra
os objetivos constitucionais.
autonomia privada, desde que observados os critérios legais, pois, como se sabe,
está comprovado, por toda a humanidade, que a idéia de que, quanto menos direito,
mais liberdade, não proporciona a realização do bem comum, nem atende à justiça
social85.
84
Constituição Federal de 1988. “Artigo 3º: Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil: inciso II: garantir o desenvolvimento nacional”.
85
J.M. Leoni Lopes de Oliveira. Teoria Geral do Direito Civil. Pág 557.
46
o consumerismo.
entre particulares exige análise com extrema cautela e prudência, pois, uma vez que
essa intervenção extrapole os limites fixados pela lei, corremos o grande risco de
curá-lo”.
Aspecto que, por outro lado, não pode ser esquecido e que justifica a
marcada pelos contratos de consumo, haja vista a necessidade dos indivíduos terem
solução pontual para problemas que, na verdade, são problemas comuns a grande
87
Humberto Theodoro Junior. O contrato e sua Função Social. Pág. 101.
88
Darcy Bessone de Oliveira Andrade. Aspectos da Evolução da Teoria dos Contratos. Pág. 109.
“Tornou-se necessário substituir um individualismo abstrato e inorgânico por outro que se ligue,
organicamente, à finalidade social do Estado e harmonize a moral individualista com a moral social,
transformando-se os códigos de puro direito privado em códigos de direito privado social”.
48
contratuais.
Parece-nos lógico que para essa sociedade massificada91, não poderia ser
89
Cristiano Heineck Schmitt. Cláusulas Abusivas nas Relações de Consumo. Pág.31. “Passaram a
ser chamados ‘contratos de massa’, pois celebrados com toda a coletividade. A massificação e a
despersonalização das relações contratuais fizeram surgir a figura do consumidor.”
90
Rogério Ferraz Donnini. A Constituição Federal e a concepção social do contrato. Pág. 74.
91
Idem. “Com efeito, os contratos de massa, celebrados entre consumidores e fornecedores, antes
do advento do CDC, tinham um tratamento inadequado no Código Civil, que tratava as partes
segundo uma igualdade formal, realizando uma evidente função individual”.
49
sistemas jurídicos específicos, para a proteção dos indivíduos que, nesse novo
para trazer maior equilíbrio entre os contratantes, bem como segurança jurídica para
Eis aqui a zona cinzenta, que paira sobre o sistema jurídico. Se, por um
privado.
92
Idem. Pág.369. “A autonomia da vontade não mais se harmoniza com o novo direito dos contratos.
a economia de massa exige contratos impessoais e padronizados; doutro modo, o individualismo
tornaria a sociedade inviável.”
50
Sem dúvida, será árdua a tarefa, que cabe aos estudiosos do direito, ao
dignidade humana.
a denominada crise contratual, que pode ser traduzida como mitigação dos
aduzia que:
93
A Constituição Federal e a concepção social do contrato. Pág. 74
94
Apud.Grant Gilmore. La morte del contratto. Milano: Giuffrè, 1988. Rogério Ferraz Donnini. Pág 74.
51
Silvio de Salvo Venosa95 afirma não existir crise no direito contratual, nem
sequer no direito privado, mas sim uma crise que está situada na própria evolução
da sociedade, posição essa que nos parece ser muito coerente diante da realidade
social.
que a autonomia da vontade, tal qual concebida no Código Civil de 1916, não mais
uma vez que a estrutura da relação jurídica deve ser mantida e os princípios que
eficácia social, o que significa dizer que o contrato deve ser cumprido, não apenas
95
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e dos Contratos. Pág. 368.
96
Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka. Contrato: Estrutura Milenar de Fundação de Direito
Privado. Pág. 248.
52
ficam a ela vinculadas, e, portanto, da união desses dois princípios fica estabelecido
partes que realizaram o negócio, o que se traduz na expressão res inter alios.
não são adversárias97, isso porque todas elas buscam o equilíbrio, para atingirem,
Dessa forma, há que se ter cautela com a utilização de alguns termos como
sociedade, mas não o contrato em si, já que o contrato que obedece a todos os
social sobre o individual, em se tratando de negócio jurídico regido pelo Código Civil
vigente.
97
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo código Civil. Pág. 69. “Em vez de
adversários, os contratantes passaram, num número cada vez maior de contratos, a serem
caracterizados como parceiro, que pretendem ter, um com o outro, uma relação equilibrada e
eqüitativa”.
53
contratar, pela função social do contrato, tema que abordaremos mais adiante.
contrato, em si, em termos de prazo, valores e garantias, diz respeito apenas aos
harmonizar o espírito da lei, que está contido nas orientações trazidas pelo Código
privados.
socialidade e operabilidade.
98
Código Civil 2002. Artigo 421. “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da
função social do contrato”.
99
Guillermo Borda. Manual de contractos. “O homem moderno já não mais aceita o dogma no sentido
de que seja justo tudo que seja livre”.
54
contrato. Isso nos permite dizer que o legislador reconhece que o contrato seja algo
dinâmico, bem como evidencia que viabilizar o seu cumprimento, consiste em admitir
social102.
100
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo código Civil. Pág.70.
101
Código Civil. Artigo 422. “ Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do
contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
102
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e o seu controle no Direito Brasileiro. Pág. 37. “Quando – neste
contexto se fala em papel social do Direito – quer-se significar ‘papel social contrariamente ao
individualismo”.
55
à realidade social:
do direito nessa nova realidade social, pois a experiência demonstrou que uma
postura exacerbadamente positivista não atende esse objetivo, o que contribuiu para
contratual.
pela diferença gritante que se estabelece entre os contratantes, haja vista o flagrante
103
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo código Civil. Pág. 71.
56
os bens são destinados a atender necessidades, cada vez mais urgentes, que,
substituição imediata daqueles bens que, até pouco tempo, eram considerados
jurídica mais flexível, que permita uma proteção jurídica diferenciada, para a
deparamos com mais uma realidade, qual seja, a de que os contratos, em sua
grande maioria, não se efetivam mais entre pessoas físicas, como ocorria no
104
Silvio de salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e dos Contratos. pág. 366. “A
idéia de um contrato absolutamente paritário é aquela ínsita ao direito privado. Duas pessoas, ao
tratarem de um objeto a ser contratado, discutem todas as cláusulas minudentemente, propõem e
contrapopõem a respeito de preço, prazo, condições, formas de pagamento etc. até chegarem ao
momento culminante, que é a conclusão do contrato”.
57
igualdade absoluta entre as partes, sendo que, ambas, são detentoras do mesmo
significa a busca de um ideal, mas “Esse ideal, na verdade, nunca foi atingido”.
jurídico não desapareceu, já que suas regras continuam presentes no Código Civil
essa forma de contratação torna-se cada vez mais rara nos dias atuais.
fundamenta o direito de contratar, base do direito privado, a que todo indivíduo tem
105
idem
58
contemporânea, que influencia na realização dos negócios jurídicos, que vem a ser
contrato assume, cada vez mais, um papel de suma importância para a vida
sociedade.
106
Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. Contratos e Atos Unilaterais. Pág. 4. “Entretanto
essa espécie de contrato, essencialmente privado e paritário, representa hodiernamente uma
pequena parcela do mundo negocial. Os contratos em geral são celebrados com a pessoa jurídica,
com a empresa, com os grandes capitalistas e com o Estado.”
107
Enzo Roppo. O contrato. 1988. “Com o progredir do modo de produção capitalista, com o
multiplicar-se e complicar-se das relações econômicas, abre-se um processo que poderemos definir
como de imobilização e desmaterialização da riqueza, a qual tende a subtrair ao direito de
propriedade (como poder de gozar e dispor, numa perspectiva estática, das coisas materiais e
especialmente dos bens imóveis) a sua supremacia entre os instrumentos de controle e gestão de
riqueza. Num sistema capitalista desenvolvido, a riqueza de fato não se identifica apenas com as
coisas materiais e com o direito de usá-las; ela consiste também, e, sobretudo, em bens imateriais,
em relações, em promessas alheias e no correspondente direito ao comportamento de outrem, ou
seja, a pretender de outrem algo que não consiste necessariamente numa res a possuir em
propriedade”.
108
Referimos-nos a empresa como atividade econômica organizada onde se verifica a conjugação
dos cinco fatores de produção, capital, trabalho, tecnologia e matéria prima.
59
contrato110.
109
Caio Mario da Silva Pereira. Lesão nos Contratos. Prefácio. “Não é de mal advertir que o instituto
da lesão nasceu sob o signo da equidade, e que há de sobreviver no propósito de reprimir a
exploração de um contratante pelo outro, incutindo na vida negocial o respeito pela eternidade
filosófica da regra moral, em um mundo cada vez mais egoísta”.
110
Cristiano Heineck Schmitt. Cláusulas Abusivas nas relações de consumo. Pág.31. “A emergência
do mercado de massa, fenômeno social, econômico e cultural do nosso tempo, decorrente da
expansão industrial ocorrida no século XIX, modificou as estruturas tradicionais do contrato”.
60
Azevedo112:
maioria das vezes, necessita de uma proteção especial, tamanha a evidência da sua
vulnerabilidade.
111
Maria Helena Diniz. Direito Civil Brasileiro. Vol. 3. Pág. 34.
112
Álvaro Villaça Azevedo. Teoria Geral dos Contratos típicos e atípicos. P.14.
113
Maria Helena Diniz. Direito Civil Brasileiro. Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais.
Pág. 35.
61
caberia ao Estado.
114
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Contratos. Pág. 28.
115
Nelson Nery Junior. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do
Anteprojeto. Pág. 502.
62
locação de imóveis.
contratos passa a sofrer fortes limitações, as normas de ordem pública, até então
116
Silvio de Salvo Venosa. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. Pág.387. “A lei
determina, pois, o conteúdo do contrato, limitando e delimitando a vontade dos contratantes ou, mais
comumente, de determinada classe de contratantes”.
63
são de altíssima relevância social e, por isso, justificam essa tutela diferenciada.
117
Arruda Alvim. Cláusulas abusivas e seu controle no Direito Brasileiro. Pág.35. “O único limite à
manifestação livre de vontade foi sempre o das normas de ordem pública, com natureza de regras
imperativas ou cogentes.”
64
abuso praticado.
Por essa razão, na sociedade contemporânea, passa a ser cada vez mais
119
Nesse sentido, ensina Paulo Luiz Neto Lôbo , que: “É veemente a
relação contratual.”
118
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu controle no Direito Brasileiro. Pág. 33. “Essa padronização
veio, justamente pelo que se acabou de dizer, a encontrar determinados limites, na ordem jurídica,
exatamente pelas circunstâncias de avantajamento de uma das partes contratantes, a dano eventual
da outra parte, que é o aderente. Tais limitações, de ordem pública, obstam certas vantagens, na
medida em que estas encontrem-se ou possam estar definidas como abusivas.”
119
Paulo Luiz Neto Lobo.Cláusulas Gerais dos Contratos e Cláusulas Abusivas. Pág. 15/16.
120
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e dos Contratos.Pág.368.
121
AgRg em AgIn 21475/ SP, proferido pela 1ª Turma, relator Ministro Moreira Alves, DJ 05.03.1999.
65
social.
A esse respeito, Arnold Wald122 faz uma observação que julgamos pertinente
ao tema, especificamente, quanto à exigência, que cada vez mais se fará presente
122
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo Código Civil. Pág. 63.
66
123
Arruda Alvim. RT 815. Pág. 22. “ O Estado havia de intervir e o controle em nosso sistema jurídico
fica deferido ao Poder Judiciário, em última análise. Isto não significa que não possam existir
organismos administrativos, que, igualmente, controlem determinados contratos, v.g., entre nós o
CADE”.
124
Maria Helena Diniz. Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. Pág. 36. “O novo
Código Civil, ante o fato de o contrato não mais representar interesses antagônicos, passando a ser
uma affectio contratus, baseada numa relação equilibrada, veio não só a recepcionar, nos artigos
317, 478,479 e 480 a rebus sic stantibus, com o escopo de manter a equação contratual, mas
também a admiti-la, insitamente nos artigos 393, 1.699, 333, III, 476, 567, 495 e 1.973”.
67
Estado pelo poder judiciário, será possível fixar uma barreira para o exercício da
apenas as normas dispositivas. Essas convivem com normas de ordem pública, que
não podem ser alteradas pela vontade das partes, e, em algumas situações, esses
contratos podem ter o seu conteúdo determinado pelo Estado, por estarem atrelados
Finalmente, sob a ótica da relevância dos bens que recebem essa tutela,
atividade econômica.
particulares passa a ser pensada sob um outro prisma, uma vez que o Estado
125
Constituição Federal de 1988 – Artigo 174: “ Como agente normativo e regulador da atividade
econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento,
sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
68
126
Maria Celina Bodin de Moraes. Constituição e Direito Civil: Tendências. Pág. 55 e 59.
127
João Hora Neto. O princípio da função social do contrato no Código Civil de 2002. Pág. 40.
“Precisamente, a abertura do sistema jurídico civil decorre da passagem do Estado liberal para o
Estado social, este marcadamente intervencionista e comprometido com o ideal de justiça. Na
Europa, já a partir da segunda metade do século XIX, e, no Brasil, com a eclosão da primeira Grande
Guerra, diversos acontecimentos históricos e movimentos sociais, de variadas matizes, como, por
exemplo, a explosão demográfica, a industrialização, a massificação das relações contratuais, a
desordenação dos centros urbanos, as doutrinas socialistas, as encíclicas sociais da igreja, o
dirigismo contratual, entre outros, ocasionaram o declínio dos dogmas do Estado liberal, e, por
conseguinte, a derrocada dos alicerces da civilística clássica, essencialmente individualista, neutra e
abstencionista”.
69
Como sabemos, foi o horror, vivenciado na guerra, que fez com que a
128
Ana Prata. A tutela constitucional da autonomia privada. Pág. 11.
129
Miguel Reale. “A Constituição e o Código Civil”. Artigo publicado no site migalhas.com.br em 13de
novembro de 2003.
70
definir os direitos políticos e a garantir a livre iniciativa, da mesma forma, que não se
130
Maria Celina Bodin de Moraes. A caminho de um Direito Civil Constitucional. Pág.22.
131
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Contratos. Pág.X.
71
esse papel para a Constituição Federal, fato que já se constatava com o aumento,
surgindo ao longo do tempo, haja vista o Código Civil de 1916 não atender mais aos
compatíveis com a lei geral estabelecida no Código Civil de 2002, assim escreve:
(...)
132
João de Matos Antunes Varela. O movimento de Descodificação do Direito Civil. Págs. 507-509.
133
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Contratos. Prefácio, XV.
72
normas que regem as relações privadas, é oportuno salientar, muito embora não
134
Constituição Espanhola. Art. 51, n. 1: “Los poderes publicos garantizarán la defesa de los
consumidores y usuarios, protegiendo, mediante procedimientos eficaces, la seguridad, la salud y los
legítimos interesses econômicos de los mismos”.
135
Constituição Portuguesa. Art. 109, n.1: “O Estado intervém na racionalização dos circuitos de
distribuição e na formação e no controlo dos preços, a fim de combater actividades especulativas,
evitar praticas comerciais restritivas e os seus reflexos sobre os preços, e adequar a evolução dos
preços de bens essenciais aos objetivos da política econômica e social”.
73
De outra parte, temos que consignar que alguns desses direitos foram
1988, in verbis:
“Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e a propriedade, nos termos seguintes:
(...)
Título II, que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, soma-se a isso a
do consumidor”.
136
Cristiano Heineck Schimitt. Cláusulas Abusivas nas Relações de Consumo. Pág. 106.
137
Pietro Perlingieri. Perfis do Direito Civil. Introdução ao direito civil constitucional. Trad. Maria
Cristina de Cicco. “Não se pode mais discorrer sobre limites de um dogma ou mesmo sobre
exceções: a Constituição operou uma reviravolta qualitativa e quantitativa na ordem normativa. Os
chamados limites à autonomia, colocados à tutela dos contraentes mais frágeis, não são mais
externos e excepcionais, mas, antes, internos, na medida em que são expressão direta do ato e de
seu significado constitucional”.
138
Alinne Arlette leite Novais. Os novos paradigmas da teoria contratual. Pág.34. “A observância dos
princípios constitucionais na aplicação do Código Civil pode se constituir numa via de renovação do
Direito, em contraposição a antigos postulados”.
139
Miguel Reale. Exposição de motivos do novo Código Civil.
75
aos contratos de consumo, bem como do limite de sua aplicação, traçando uma
correlação com o contrato civil, a fim de bem demonstrar a diferença que há entre
direito fundamental, e, portanto, passa a ser cláusula pétrea, consoante o artigo 60,
140
Silvio Rodrigues. Direito Civil. Vol. 3. Pág. 16. “A idéia de ordem pública é constituída por aquele
conjunto de interesses jurídicos e morais que incumbe a sociedade preservar, por conseguinte, os
princípios de ordem pública não podem ser alterados por convenção entre os particulares.”
76
todos, existência digna, conforme os ditames da justiça social, desde que observado
no artigo 5º, inciso XXXII; no artigo 24, inciso VIII; no artigo 150, § 5º; no artigo 170,
141
Rogério Medeiros Garcia de Lima. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Pág. 31.
142
Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. Pág. 6/7.
143
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu Controle no Direito Brasileiro. Pág. 26. “Mas se assim foi,
essa nova estrutura e fisionomia da ordem econômica atuou sobre a sociedade e engendrando o
fenômeno da massificação, com escala industrial a que nos referimos, implicou, também em imprimir
outra fisionomia à atividade comercial, vale dizer, passou-se a viver numa escala industrial de grande
porte e numa economia de massa. Isto veio a mudar o panorama da economia, e, ao lado de grandes
conglomerados ‘vendedores” passou a existir uma ‘grande massa compradora. A dinâmica desta
atividade veio a ser marcada por grande uniformidade. A separação entre os ‘vendedores’
(=fornecedores) e os ‘compradores’ (=consumidores) resultou nítida, com interesses claramente
diferenciados, com diferenciação que se acentuou, cada vez mais”.
77
denominamos consumidores.
Por outro lado, para atender uma demanda tão grande, temos um outro
denominados fornecedores143.
que tudo, ou quase tudo, passa a ser uniformizado, isto é, tanto a necessidade,
realização dos negócios que se originam dentro deste universo, em que coexistem
fornecedores e consumidores.
144
Arruda Alvim. Idem pág. 32. “Não poucos dizem - tendo em vista a definitiva influência que a
economia teve nesse tipo de contratação – que se tem, na hipótese, altamente palpável e expressiva,
a criação do Direito através da economia”.
78
relação aos negócios, seja em relação à rapidez em que eles se consumam, não
podemos deixar de lado a realidade que também se insere nesta dinâmica, traduzida
massa146.
consumidor.
145
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu Controle no Direito Brasileiro. Pág. 26. “Essa
estandardização ou uniformidade na vida econômica, pois para satisfazer um número imenso de
pessoas, isso fez nascer a imperativa necessidade de uma maior simplicidade e celeridade nas
contratações, necessidade essa emergente da ‘própria natureza das coisas’.”
146
Mauro Cappelletti. Tutela dos interesses difusos. Pág. 169/182. “Quando uma lesão é produzida
em forma massiva, de massa, não apenas eu sendo consumidor, mas muitos, muitos outros sendo
consumidores também, o meu direito, minha lesão, não passa de um fragmento do dano total”.
79
contratual.
quando ocorrer uma situação na qual a cláusula seja omissa ou possibilite dúvidas,
a regra determina que a cláusula deva ser interpretada contra aquele que estipulou o
seu conteúdo.
147
Arruda Alvim. Cláusulas abusivas e seu controle no Direito Brasileiro. Pág.29. “Art. 1.341 –
Condições gerais dos contratos. As condições gerais do contrato (1342, 1679, e 2211) predispostas
(= elaboradas) por um dos contratantes são eficazes em relação ao outro, se no momento da
conclusão do contrato este já as conheceu ou haveria de as ter conhecido tendo em vista a
experiência ordinária. De qualquer forma não produzem efeito (1418) se não houverem sido
aprovadas por escrito, as condições que estabeleçam em favor de quem as elaborou, limitações de
sua responsabilidade ( 1299), faculdade de rescindir o contrato ( 1373) ou de suspender a execução
civil do contrato, ou se impõem a cargo do outro contratante decadência (2965), limitações à
faculdade de por exceções, restrições à liberdade contratual com terceiros (1379, 1566, 2596),
prorrogação tácita ou renovação do contrato (1597, 1899) cláusulas compromissórias (c.p.c 808) ou
derrogação da competência da autoridade judiciária (c.c.1.370; c.p.c. 6, 28,29, 30, 413).”
‘Art. 1.342. Contratos concluídos através de módulos ou formulários. Nos contratos concluídos
através da subscrição de módulos ou formulários (1.370), elaborados para disciplinar de maneira
uniforme determinadas relações contratuais, as cláusulas agregadas/inseridas no módulo ou no
formulário, prevalecem desde que sejam incompatíveis com essas outras e ainda que essas outras
não hajam sido objeto de cancelamento.”
148
Idem. Pág.31. Assim são denominadas na Itália, Argentina, e Espanha.
80
vontade, mas reconhece que a vontade, que está sendo imposta e atrai para si
desenvolvimento de um país.
apenas e tão somente, em relação às cláusulas lícitas. Isso porque, entende-se que,
comerciante era regida pelo artigo 159 do Código Civil de 1916 (Artigo 186 do
149
Georges Ripert. A regra moral nas Obrigações Civis. Pág.112-3. “Que há de contratual neste ato
jurídico? É na realidade a expressão de uma autoridade privada. O único ato de vontade do aderente
consiste em colocar-se em situação tal que a lei da outra parte venha a se aplicar. O aderente entra
neste círculo estreito em que a vontade da outra parte é soberana. E, quando pratica aquele ato de
vontade, o aderente é levado a isso pela imperiosa necessidade de contratar. É uma graça de mau
gosto dizer-lhe isso: tu quiseste. A não ser que não viaje, que não faça um seguro, que não gaste
água, gás, ou eletricidade, que não use transporte comum, que não trabalhe ao serviço de outrem, é-
lhe impossível deixar de contratar.”.
150
Arruda Alvim. Cláusulas abusivas e o seu controle no Direito Brasileiro. Pág. 33. “A adesão é
válida quando incidente sobre cláusulas havidas como lícitas”.
151
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Responsabilidade Civil. Vol.4. Pág. 159/160.
81
responsabilidade, somente nos casos previstos no § 3º, incisos I, II, e III do mesmo
artigo.
hipossuficiência.
na relação.
152
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Novo Código Civil e legislação extravagante
anotados.Pág.733.
153
Luiz Antonio Rizzatto Nunes. Comentários ao Código de defesa do Consumidor. Pág. 169 e 195.
82
“Os princípios tornados lei positiva pela lei de consumo devem ser
aplicados, sempre que oportunos e convenientes, em todo contrato e
não unicamente nas relações de consumo. Desse modo o juiz terá
sempre em mente a boa-fé dos contratantes, a abusividade de uma
parte em relação à outra, a excessiva onerosidade etc., como regras
gerais e cláusulas abertas de todos os contratos, pois os princípios
são genéricos, mormente levando-se em conta o sentido dado pelo
novo Código Civil.”
154
Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. Vol. 3. Pág.10.
155
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Vol. II, Pág. 371.
83
seara contratual.
Com muita clareza, a respeito dos princípios constitucionais, que devem ser
Nacional desde 1975, portanto, 27 anos, e, durante todo o período que antecedeu a
ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”; do artigo
17, que “equipara ao consumidor todas as vítimas do evento” e; do artigo 29, que
práticas comerciais.
restrita e a dos maximalistas, que entendem que a interpretação desse artigo deve
156
Adalberto Pasqualotto. O Código de Defesa do Consumidor em face do Novo Código Civil. Pág.98
85
Defesa do Consumidor.
relação. Esse desequilíbrio, por sua vez, requer proteção jurídica para a parte que
que:
sua essência, uma vez que não estaria mais sendo aplicada, segundo o princípio
157
Ricardo Luis Lorenzetti. Fundamentos de Direito Privado.
RT, 1998, Pág. 141.
86
certamente, o mais leigo dos cidadãos é capaz de, intuitivamente, reconhecer que
esses contratos jamais podem ser tratados pelas regras destinadas aos contratos de
consumo.
Nessa perspectiva, não podemos olvidar que o Código Civil é a lei geral e
158
Claudia Lima Marques; Eduardo Turkienicz. “Caso Teka vs. Aiglon: em defesa da teoria finalista de
interpretação do artigo 2º do CDC” pág. 236.
87
de Defesa do Consumidor.
(...)
(...)
artigo 157, sendo que o legislador define sua ocorrência, quando uma pessoa, dada
aproveitador. Por outro lado, o artigo 39, IV, não faz referência expressa à
contrato por onerosidade excessiva, desde que acarrete extrema vantagem para a
Imprevisão.
Consumidor, já que admite que, ao criador do risco, cabe suportar os efeitos da sua
entendimento das alterações, de cunho filosófico, que o Código Civil vigente firmou
mais recentes, entre eles, o Código Civil Português e o Código Civil Italiano.
Dessa forma, para interpretar o Código Civil, e aqui estamos nos referindo a
direito privado.
159
Antonio Junqueira de Azevedo. Princípios do novo Direito Contratual e Desregulamentação do
Mercado. Código Civil. Revista dos Tribunais, São Paulo v. 750,p.113-120 abr. 1998. ”Agora disposta
no artigo 421 do novo Código Civil, a função social do contrato assume definitivamente e também na
esfera do direito posto, a condição de um dos princípios contratuais, reclamando, portanto, a fixação
de um conteúdo que lhe dê operabilidade”.
160
Arruda Alvim. A Função Social dos Contratos no Novo código Civil. RT 815/ set. 2003.
92
aos contratos, pode ser verificado no caput do artigo 170162 da Constituição Federal
de 1988.
Outros artigos da Constituição Federal de 1988, tais como o 1º, III, e o artigo
161
Giorgio Del Vecchio.Evoluzione ed Involuzione del Diritto. Roma, 1945, p.11, diz respeito a “un
tentativo di conciliazione tra il valore dell’ordine e il valore della liberta.”
162
Constituição Federal de 1988, artigo 170, caput: “A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observados os seguintes princípios.”
93
esses valores, de onde resulta que, embora o contrato tenha conteúdo patrimonial,
dos contratantes, mas deverá cumprir o seu conteúdo axiológico, atendendo àqueles
operabilidade.
as exigências que lhe são próprias, deverá cumprir, também, a exigência que lhe foi
imposta através de uma cláusula geral, e isso significa, em sentido amplo, cumprir a
163
Cláudio Luiz Bueno de Godoy. Texto de apoio - Jornadas de Estudos, Direito dos Contratos.
Centro de Extensão Universitária. São Paulo, 25 de Outubro de 2003.
94
vejamos:
muito bem desempenhado, pelo fato de ter impregnado a matéria contratual, com a
cláusula geral da socialidade, que exige uma interpretação, socialmente útil, para as
normas codificadas.
164
Ruy Rosado de Aguiar Jr. Obrigações e Contratos – Projeto de Código Civil disponível no site do
CJF.
95
seguinte manifestação:
(...)
necessita ser interpretada, nas frases acima, buscamos o conteúdo conceitual, que
nos parece significar que o individualismo do Código Civil de 1916 foi superado.
O Código Civil de 1916, assim como outros códigos da mesma época, foi
contra um grupo, que dominava a sociedade, composto pelos militares, pelo clero e
165
Miguel Reale. Visão Geral do Projeto de Código Civil. Revista Literária de Direito. 23/v/1998.
96
Estado não são compatíveis com a vontade dos cidadãos, tanto que as declarações
que a preocupação maior dos ordenamentos deve ser com a cidadania, e não com o
coletivo.
uma concepção social, a qual sempre está onde está o Direito, porque o homem é
166
Jacy de Souza Mendonça. Princípios e diretrizes do novo Código Civil. Pág 32.
97
“Não somos pessoas senão num contexto, num todo, dentro de uma
comunidade. Mas isso não significa predomínio do social. O
predomínio é sempre da realização do cidadão. O direito existe
para possibilitar ao cidadão a realização de sua plenitude como
pessoa. Embora o homem só possa se realizar dentro de uma
comunidade, em harmonia com a sociedade em que vive não há
predomínio da sociedade, o predomínio é da pessoa.” (g.n.).
(...)
prevê o artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, que, para nosso bem,
através das cláusulas gerais, como ocorre com a função social do contrato,
dando início ao capítulo, que trata das disposições gerais dos contratos.
contratual.
167
Artigo 421: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do
contrato”.
98
Dessa forma, considerando que o Código Civil tenha a função de fazer com
que a Constituição, efetivamente, atue nos cidadãos, tudo o que está no Código
carga ética nas relações entre particulares, só será alcançada, através das
168
Miguel Reale. Exposição de Motivos do Anteprojeto do Código Civil. Item 22, letra c.
169
Renan Lotufo. A descaracterização da Pessoa Jurídica no Novo Código Civil. Pág.101.
170
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo Código Civil. Pág. 73.
99
“Art.5º. (...).
(...)
(...)
(...)
Código Civil:
tem sua origem no Código Civil, mas sim no texto constitucional, embora haja, sobre
Para alguns juristas, entre os quais citamos Miguel Reale e Miguel Reale
171
Miguel Reale e Miguel Reale Junior. Função social e boa-fé na valoração dos contratos. In Reale-
Reale Jr. Questões, nº. 10, pág.125.
100
172
estando os seus fundamentos nos artigos 5º, inciso XXIII e 170, inciso III173 da
Constituição Federal.
antes de mais nada, a propriedade deve ser respeitada, e, se, por via reflexa, aplica-
serem cumpridos e, justamente, por essa razão, é que devem ter uma função social.
entende que o direito de propriedade, assim como o direito que resulta do contrato, a
não ser em razão das restrições impostas pela lei, são direitos cujo exercício não
172
Artigo 5º inciso XXIII da Constituição Federal: “A propriedade atenderá a sua função social”.
173
Artigo 170 inciso III da Constituição Federal: “função social da propriedade”.
174
Arruda Alvim. RT 815 – Setembro de 2003 – p. 12.
“Não é viável restringir-se o direito de propriedade, a tal ponto, para colocá-la única e
exclusivamente, a serviço do Estado ou da comunidade. As mudanças que possa sofrer a
conformação do direito de propriedade implicam – comparando-se o perfil atual do direito de
propriedade com aquele do passado – que se possa, nesse confronto, verificar-se uma atrofia do
direito de propriedade. Tais mutações têm ocorrido em nome e por causa da chamada função social
da propriedade, mas se as modificações operadas tiverem caráter expropriatório, essas legitimarão
pretensão indenizatória”.
175
Gilmar Ferreira Mendes. Direitos fundamentais e controle da constitucionalidade, estudos de
direito constitucional. São Paulo: Celso Bastos, IBDF, 6.2.4.3.2, p. 158.
101
cláusula geral, a fim de se preservar o contrato, uma das mais legítimas liberdades
individuais176.
Azevedo177, para quem a função social do contrato decorre do artigo 1º, inciso IV da
(...)
176
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria geral das obrigações e dos contratos.
177
Antônio Junqueira de Azevedo. Princípios do novo direito contratual e desregulamentação do
mercado. RT750/116.
178
Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil.vol. III. Contratos. Pág. 13.
102
função social do contrato decorre dos princípios inseridos no artigo 3º, inciso I da
equilíbrio entre as prestações que cada um dos contratantes assume. Caso este
equilíbrio não ocorra, desde a constituição do negócio, poderá ser aplicado o artigo
179
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Código Civil comentado e legislação
extravagante. 3ª ed. RT. Pág. 378.
180
Pietro Perlingieri. Perfis do direito civil – Introdução ao direito civil constitucional. Pág. 37. “Os
princípios da solidariedade e da igualdade são instrumentos e resultados na atuação da dignidade
social do cidadão. Uma das interpretações mais avançadas é aquela que define a noção de igual
dignidade social como o instrumento que confere a cada um o direito ao respeito inerente à qualidade
de homem, assim como a pretensão de ser colocado em condições idôneas a exercer as próprias
aptidões pessoais, assumindo a posição a estas correspondentes”.
181
Silvio Rodrigues. Direito Civil. Dos Contratos e das Declarações Unilaterais de Vontade. Pág.10.
103
Código Civil.
Para esse doutrinador, o contrato é regido por princípios que lhe são
legal.
concretização, que deve haver, em relação aos princípios que são inerentes aos
contratos. Por essa razão, chega a afirmar que a função social lhe parece ter um
uma tendência que se verifica no artigo 4º, inciso III, do Código de Defesa do
Consumidor183.
182
Silvio Rodrigues. Pág. 10 obra já citada. “Noto certo sentido demagógico no dispositivo”. (ao
referir-se ao artigo 421 do código civil).
183
Artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor: “A Política Nacional das Relações de Consumo
tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade,
saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida,
bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios.
(...) III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização
da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de
modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica. (art. 170 da Constituição
Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores”.
104
de 1988.
Assim, observamos que qualquer que seja a corrente adotada para explicar
além do conteúdo econômico, o contrato deve cumprir também uma missão social,
COMERCIAIS.
comerciais.
unificou todo o direito privado, incluindo-se o direito do trabalho, já que, entre nós, a
Comercial.
Embora a tese monista tenha sido efetivada na Itália, foi Teixeira de Freitas,
o primeiro autor de expressão no mundo jurídico, a dizer que devia haver uma
unificação, pois entendia que a separação do Direito Comercial era arbitrária, já que
Projeto do Código Civil vigente, afirmou que a dicotomia desse ramo do direito não
vista que considere o fenômeno econômico presente nos contratos civis e nos
contratos empresariais.
aduz:
“Não há, pois, que falar em unificação do Direito Privado a não ser
em suas matrizes, isto é, com referencia aos institutos básicos, pois
nada impede que do tronco comum se alonguem e se desdobrem,
sem se desprenderem, ramos normativos específicos, que com
106
características.
comercial.
a convivência harmônica entre essas duas áreas do direito, tendo em vista algumas
lembrando, inclusive, que aquele que vende sem lucro é punido pela própria
Dessa forma, sem nos aprofundarmos no tema, que não é o objeto desse
184
Luiz Antonio Guerra da Silva. Revista Jurídica.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_78/artigos/Luiz_rev78.htm
185
Fernando Passos. O Direito Empresarial no Novo Código Civil Brasileiro. Pág.77.
107
CONTRATUAL.
ordenamento jurídico.
186
Francesco Santoro Passarelli. Teoria Geral do Direito Civil. Pág.50. “Temos que a liberdade
contratual resulta em um paradoxo, pois a liberdade de contratar é um poder potencial do indivíduo,
que conflui com outros poderes individuais para formar o contrato. A liberdade individual é núcleo de
toda a sistemática contratual, que se pretende diferenciado de outras obrigações pelo fato de ser um
acordo de vontades”.
187
Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil brasileiro. Teoria Geral do Direito Civil. Pág 82. “A idéia
de personalidade está intimamente ligada à de pessoa, pois exprime a aptidão genérica para adquirir
direitos e contrair obrigações”.
108
declarada, ou seja, como é revelada essa vontade, e, para tal, não se pode olvidar
188
Cristiano Heineck Schimitt. Cláusulas Abusivas nas relações de consumo. Pág 44. “(...) Duas
foram as teorias voluntaristas que pretenderam explicar o princípio da autonomia da vontade: a teoria
da vontade (willenstheorie) e a teoria da declaração ( erklanrungstheorie).
109
injustamente prejudicado.
do voluntarismo191.
189
Fernando Noronha. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais. Pág.88.
190
Alfred Rieg. Lê role de la volonté dans la formation de l’acte juridique d’après lês doctrines
allemandes du XIXº siecle. Páginas 125-133.
191
Luis Renato Ferreira da Silva. Revisão dos Contratos: do Código Civil ao Código de Defesa do
Consumidor. Pág.21.
110
ético e social, embora esse diploma também tenha sua origem, sob a égide do
liberalismo.
concepção da chamada Teoria da Vontade, que diz respeito ao ato jurídico, tal como
Código de 2002.
Percebemos, então, que a vontade deve ser revelada, para que ocorra ou
não a aceitação da outra parte, que, por sua vez, também deverá revelar a sua
que, numa concepção adotada pelo legislador, teve um papel tão importante que
192
Orlando Gomes. Transformações Gerais do direito das Obrigações. Pág.9-14.
193
Arruda Alvim. RT 815 Setembro 2003. Pág.14.
111
negócio jurídico viesse a exigir a busca da intenção, como algo que vá ao encontro
Eis, aqui, uma visão de Arruda Alvim sobre o tema, que esclarece, de
íntegra:
194
Artigo 85 código civil 1916: “Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao
sentido literal da linguagem”. Artigo 112 do código civil de 2002: “Nas declarações de vontade se
atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.
195
Arruda Alvim. RT 815. Setembro 2003. Pág. 15.
112
através da declaração.
com a verdadeira intenção, mas esta deverá estar consubstanciada naquilo que foi
declarado.
A vontade deve ser entendida como aquela que tenha sido declarada,
Essa é a razão pela qual afirmamos que o contrato cria norma jurídica
individual, a qual prevê a conduta que será atribuída aos contratantes e, no caso
dessa conduta ser contrária ao que ficou estabelecido, a sanção será imposta pela
196
Arruda Alvim. idem. Pág. 27.
113
vontades não estatui sanção, mas sim uma conduta que, sendo fielmente assumida,
norma geral197.
traz em seu texto nada mais, nada menos, que três cláusulas gerais, conforme nos
contrato.
197
Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. 3. Pág. 24.
198
Nelson Nery Junior. Código Civil Comentado
199
Artigo 421 do Código Civil vigente: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites
da função social do contrato”.
200
Everaldo Augusto Cambler. Sobre a discricionariedade, tema abordado em aula no curso de
mestrado na FADISP em 2006. “O juiz não tem discricionariedade, a qual pertence ao âmbito do
direito admnistrativo. O arbítrio não está respaldado na norma, o que está respaldado na norma são
os valores da sociedade”.
114
fim, objetivo maior, seja cumprido, é imperioso que as partes envolvidas tenham
Boulos201:
liberdade de contratar.
lei.
201
Daniel Martins Boulos. A autonomia privada, a função social do contrato e o novo código civil.
Pág.125.
115
possibilidade de não contratar exista, desde que o indivíduo, que tem possibilidade
elétrica etc.
202
Código Civil de 2002. Artigo 425 – “É licito às partes estipular contratos atípicos, observadas as
normas gerais fixadas neste Código”.
203
Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. III volume. Pág. 21. “Contrato atípico é o que
resulta de um acordo de vontades não regulado no ordenamento jurídico, mas gerado pelas
necessidades e interesses das partes. É válido desde que estas sejam capazes e o objeto lícito,
possível determinado ou determinável e suscetível de apreciação econômica. O contrato atípico
requer muitas cláusulas minudenciando todos os direitos e obrigações que o compõem”.
204
Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. Volume III. Pág. 22.
116
Essa é a razão pela qual se verifica que, a partir do Código Civil de 2002, foi
que deve ser avaliado como algo extremamente saudável, no sentido de que essa
Ripert206, “Admitir a revisão daquilo que foi ajustado é afirmar o próprio contrato, pois
revê-lo é respeitá-lo”.
205
Daniel Martins Boulos. Autonomia Privada, a função social do contrato e o novo código civil. Pág.
126. “Neste contexto, a evolução do Direito Civil no último século está amplamente refletida no
Código Civil brasileiro de 2002, que, ao disciplinar, de forma inovadora, a figura do abuso de direito e
ao estabelecer que o limite da liberdade contratual é a função social do contrato, traçou os contornos
da autonomia privada de forma diversa daquela desenhada pelo legislador de 1916”.
206
Georges Ripert. A regra moral nas obrigações civis. Pág.81
117
pública são limites para a liberdade contratual e esses limites visam “assegurar a
ou caso fortuito, sem que, teoricamente, essa situação ensejasse revisão contratual,
contratual, baseado na função social do contrato, para toda e qualquer situação que
Da mesma forma, não deve ser permitida essa revisão, com pedido
tendo sido fielmente cumprida, pois, se essa fosse a vontade do legislador, a lei não
o Código Civil vigente, o que se verifica é uma nova extensão nessa limitação, que
207
Anteprojeto do Código civil.
118
transformação das regras contratuais, que deixaram de ser, como antes fora, regras
A função social do contrato não será a grande vilã, no que diz respeito a
limitação contratual, da mesma forma que não será a ‘fada madrinha’, que
Essa cláusula geral deve ser entendida não só como um fundamento para
pedido de revisão contratual, mas, também, como uma possibilidade de, no futuro,
208
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu Controle no Direito Brasileiro. Pág.35. “O que ocorreu,
crescentemente, ao longo do século XIX, e, mais acentuadamente neste século XX, é que, mesmo no
âmbito do contrato clássico ou tradicional, aumentou o espectro das normas de ordem pública, e por
isso mesmo, correlatamente, diminuiu o âmbito da livre manifestação dos contratantes. Pode-se
acentuar que a razão em decorrência da qual aumentou o espectro das normas de ordem pública, foi,
precisamente, a falência, aos olhos da sociedade, do modelo clássico ou tradicional, na sua originária
(início do século XIX) e absoluta pureza. Desta forma, o que se verificou, mesmo em sede do contrato
tradicional, foi a modificação paulatina – sem o desaparecimento da autonomia da vontade – do
caráter intensamente dispositivo das regras atinentes aos contratos, passando a aumentar o número
de regras imperativas.”
209
Caio Mario da Silva Pereira. Op. Cit. Pág. 15.
119
contratuais que passarão a fazer parte do mundo dos negócios, até porque atualizar
(...)
210
Rafael chagas Mancebo. A função social do contrato. Pág. 50.
211
Nelson Nery Junior. Contratos no Código Civil. Pág.406-408.
120
função quando cada parte realiza o interesse que lhe motivou a contratar, o que, por
via reflexa, cumpre função social, pois os efeitos desse contrato implicam em
desenvolvimento social.
Dessa forma, cremos que, ao menos naquilo que diga respeito ao aspecto
cumprido, naturalmente, dentro das regras impostas pelo ordenamento jurídico, toda
sociedade é beneficiada.
ordem jurídica e, portanto, o outro contratante, admitem que o contrato foi realizado
212
Mônica Bierwagen. Princípios e regras de interpretação dos contratos no novo Código Civil.
Pág.42-43.
121
contrato213.
função social.
213
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Código Civil Comentado.
214
Everaldo Augusto Cambler. Comentários ao Código Civil Brasileiro. Vol. III. Coordenação Arruda
Alvim e Thereza Alvim.Pág. 8.
122
brocardo pacta sunt servanda, uma das marcas, talvez a mais forte, do
Civil vigente.
impostos pelo seu fim econômico-social, pela boa-fé, ou pelos bons costumes,
Sobre o artigo 187 do Código Civil em vigor, Nelson Nery Junior215 faz uma
costumes.
215
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Código Civil Comentado e Legislação
Extravagante.
123
assevera :
contratos, e, pelo fato de ser norma de ordem pública, poderá ocorrer que, mesmo a
parte tendo feito um pedido que não seja, por exemplo, modificação de percentual
de juros, o juiz poderá, ex officio, adequar o contrato à sua função social, sem ser
Código Civil vigente atribuiu aos juízes, ressaltando que, através das cláusulas
nulidade do contrato, por fraude à lei imperativa; (ii) declarar sua inexistência, por
216
Ruy Rosado de Aguiar Junior. Projeto do Código Civil – As obrigações e os contratos. RT 775/23.
217
Nelson Nery Junior. Contratos no Código Civil. Pág.416-417.
218
Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro. Volume III. Pág. 8.
124
-Não cabe aplicar a multa do art. 538, parágrafo único, do CPC, nas
hipóteses em que há omissão no acórdão recorrido, ainda que tal
omissão não implique a nulidade do aresto.”
219
Enunciado nº. 22 aprovado na Jornada de Direito civil, promovida pelo Centro de Estudos
Judiciários do Conselho da Justiça Federal – CFJ - realizado entre os dias 11 e13 de setembro de
2002, sob a coordenação do Ministro Ruy Rosado de Aguiar Junior do Egrégio Superior Tribunal de
Justiça:
“A função social do contrato prevista no art. 421 do novo Código Civil constitui cláusula geral, que
reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas”.
220
STJ – REsp. 691.738/ SC (2004/0133627-7) Rel. Minª. Nancy Andrighi – Rcte. Administração,
Construção e Incorporações de Imóveis Ltda. – Sant’Ana – Adv. Everaldo Luis Restanho e outro –
Recdo. BESC S/A Crédito Imobiliário – Adv. Ivo Muller.
125
implica em prejuízo para o credor, haja vista o mesmo não ter perdido a garantia
por si próprio, já revela a função social que realiza, proporcionando aos indivíduos o
acesso à moradia, razão pela qual o agente financeiro, que viabiliza os recursos
para a realização da construção, não poderia ver-se sem a garantia ajustada, qual
seja: a hipoteca.
De outro lado, o indivíduo que adquiriu o imóvel não pode ser privado de
que determina a liberação da hipoteca, que recai sobre esse imóvel, vale dizer, da
fracionamento.
Ainda nessa esteira, ressaltamos que não haveria razão para que a
indivíduo, que adquiriu um imóvel para, certamente, sobre ele poder exercer todos
os direitos de proprietário.
126
adquiriu o imóvel.
verificação da eficácia da aplicação das cláusulas gerais, no âmbito para o qual foi
221
Nelson Nery Junior. Comentário ao artigo 421 do Código Civil: “ Não é regra de interpretação,
tampouco princípio geral de direito. Na prática, a cláusula geral de função social do contrato permite
que o juiz faça a lei entre as partes, isto é, o juiz vivifica, no caso concreto, a norma abstrata e
estática posta pela lei.
127
a norma de ordem geral, prevista no artigo 421 do Código Civil vigente, lembrando,
necessária vez que a álea natural à essência de determinados contratos não pode
deverá, sempre, ser observada pelas partes e pelo judiciário, o que significa que
Nossa posição é de que o contrato tenha que ser cumprido, pois, para isso,
foi realizado. Assim, não podemos permitir que, sob o manto do reconhecimento da
função social, que foi atribuída ao contrato, seja admitida sua utilização para
esconder a má-fé, a fraude, os vícios ou o desejo de inadimplir com aquilo que foi
avençado.
A função social não pode ser uma afronta à segurança jurídica, sendo
222
Everaldo Augusto Cambler. Comentários ao Código Civil Brasileiro. P.10.
223
Código Civil – artigo 2035, parágrafo único: “Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar
preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função
social da propriedade e dos contratos”.
128
224
Daniel Martins Boulos. A autonomia privada, a função social do contrato e o novo código civil.
Pág.127.
“Assim, também ocorre com outro princípio do Direito Contratual, designadamente aquele segundo o
qual os pactos devem ser cumpridos (pacta sunt servanda), que, embora muito combatido na doutrina
e limitado por normas e princípios ora existentes na legislação continuam a vigorar como corolário da
segurança jurídica, indispensável ao comércio jurídico e ao desenvolvimento da sociedade”.
225
Recurso Especial Nº.803.481 – GO (2005/0205857-0) – Relatora Ministra Nancy Andrighi –
Recorrente Cargill Agrícola S/A - Recorrido Luiz Ferreira Lima.
129
Como se vê, a aplicação desse princípio, bem como das demais cláusulas
gerais, deverá estar sempre pautada no cumprimento daquilo que foi convencionado
contrato civil, há que se ter muita atenção quando da aplicação dessa cláusula geral,
partes.
riquezas.
maneira como vimos no exemplo contido no acórdão antes referido, não estará
agindo de boa-fé, regra de conduta positivada no código Civil vigente, que exige
obrigação.
Pelo que foi expendido, podemos afirmar que o Código Civil vigente tem a
denominadas “conceitos vagos”, cujo conteúdo cabe ao juiz definir diante do caso
concreto.
226
Nelson Nery Junior. Contratos no novo Código Civil - apontamentos gerais. Pág. 427. “ O contrato
não pode mais ser visto como um negócio de interesse apenas para as partes, porque interessa a
toda a sociedade, na medida em que os standards contratuais são paradigmáticos para as outras
situações assemelhadas.”
131
Por esse motivo, Silvio de Salvo Venosa, referindo-se ao artigo 422 do novo
Código Civil, afirma não concordar com a denominação ‘cláusula geral’, vez que o
pretendeu nosso legislador, ao enriquecer o novo Código Civil com essas cláusulas.
transcrevemos in verbis:
227
Silvio de Salvo Venosa. Op. Cit. Item 32. “Essa disposição constitui modalidade que a doutrina
convencionou denominar cláusula geral. Essa rotulação não nos dá perfeita idéia do conteúdo. A
cláusula geral não é, na verdade, geral”.
228
Houaiss – Dicionário da Língua Portuguesa.
229
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Teoria Geral das obrigações e Teoria Geral dos Contratos.
Pág. 378. “Diz-se que o novo Código constitui um sistema aberto, predominando o exame do caso
concreto na área contratual”.
230
Álvaro Villaça Azevedo. Teoria Geral dos Contratos típicos e atípicos. Pág. 28.
132
Hironaka:
Essa cláusula geral, que não foi consagrada expressamente no Código Civil
legislador.
Como cita a doutrina, essa ênfase à boa-fé, que configura uma nova visão
231
Giselda M. F. N. Hironaka.Conferência proferida em 21-9-2001.
232
Código Civil italiano, de 1942. Artigo 1.337 “os contratantes no desenvolvimento das tratativas e na
formação do contrato, devem comportar-se segundo a boa-fé”.
233
Código Civil Português de 1967, artigo 227: “Quem negocia com outrem para conclusão de um
contrato deve, tanto nas preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé,
sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”.
234
Código civil alemão (BGB) § 242: “O devedor está obrigado a executar a prestação como exige a
boa-fé, em atenção aos usos e costumes”.
Código Civil alemão (BGB) § 157: “Os contratos interpretam-se como o exija a boa-fé, com
consideração pelos costumes de tráfico”.
Referência em português de Maurício Jorge Pereira da Mota. A pós-eficácia das obrigações.
Pág.190.
133
que, além dos diplomas acima citados, esses princípios são consagrados, também,
Código Civil de 1916, a boa-fé objetiva era considerada, no nosso sistema jurídico,
qualquer forma de deslealdade por parte dos contratantes, o que reafirma, por outro
aplicador da lei uma interpretação conforme o espírito que nela está contido.
235
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo código civil. Pág.74.
236
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Código civil comentado.
134
Sobre este apaixonante tema, mesmo que não se queira adentrar nas
lógica jurídica.
Ripert237, ao tratar da questão da lei moral, nos ensina que: “Essa lei bem
que tem um significado de conteúdo ético e não uma conotação de técnica jurídica
propriamente dita238.
A esse respeito, Caio Mario da Silva Pereira bem observou que cabe à
objetiva, que deve ser observada nas relações jurídicas e se expressa na fórmula do
237
Georges Ripert. A regra moral nas obrigações civis. Pág. 134.
238
Bruno Lewicki. Panorama da Boa-fé objetiva. pág.58. “A fides seria antes um conceito ético do que
propriamente uma expressão jurídica da técnica. Sua ‘juridicização’ se iria ocorrer com o incremento
do comércio e o desenvolvimento do jus gentium, complexo jurídico aplicável a romanos e a
estrangeiros”.
239
Caio Mario da Silva Pereira. Lesão nos contratos. Pág. 105. “(...)Roma que está em toda parte,
aqui responde com a pureza do seu direito, sempre admirável, aliando-a àquela força criadora da
aequitas, que trazia o sentido de humanidade ao ius romanum e o inspirava na grandeza de sua
floração.
240
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Código Civil Comentado “(...) Código Civil
Alemão, BGB, § 242, que mantém sua redação original, de 1896, que não menciona nem a fase pré-
contratual nem tampouco a pós-contratual, e nem por isso a doutrina e a jurisprudência deixaram de
incluir aquelas circunstâncias no âmbito de sua aplicação”.
241
Judith Martins Costa. A boa-fé no Direito Privado. Pág. 124. “ A fórmula Treu und Glauben
demarca o universo da boa-fé obrigacional proveniente da cultura germânica, traduzindo conotações
totalmente diversas daquelas que a marcaram no direito romano: ao invés de denotar a idéia de
135
fé objetiva.
fidelidade ao pactuado, como uma das acepções da fides romana, a cultura germânica inseriu, na
fórmula, as idéias de lealdade (itrue ou treue) e crença ( glauben ou glaube), as quais se reportam a
qualidades ou estados humanos objetivados”.
242
Álvaro Villaça Azevedo. Teoria Geral dos contratos típicos e atípicos. Pág 28. “A aplicação do
princípio da boa-fé traz para a ordem jurídica um elemento de Direito Natural, que passa a integrar a
norma de direito”.
243
Judith Martins Costa. A boa-fé no Direito Privado. Pág. 517. “É no campo da responsabilidade pré-
contratual que avulta a importância do princípio da boa-fé objetiva, especialmente na hipótese de não
justificada conclusão dos contratos”.
136
Caio Mario da Silva Pereira244, a esse respeito, entende que o fato de não
atrelado a uma falha do legislador, mas sim à força que está contida no espírito do
condizente com aquela que se espera de uma pessoa honesta no seu agir, de modo
Esta última, já existente no revogado Código Civil de 1916, diz respeito ao estado
conter, a exemplo do que ocorre com o possuidor de boa-fé245, que, justamente, por
244
Caio Mario da Silva Pereira. Lesão nos Contratos. Pág. 159 e seguintes.
245
Código Civil 2002. Artigos 1.214, 1.217 e 1.219.
246
Álvaro Villaça Azevedo. Teoria Geral dos contratos típicos e Atípicos. Pág. 28. “Daí porque todos
os códigos e todos os sistemas jurídicos são escudados no princípio da boa-fé, que supera, até, o
princípio da nulidade dos atos jurídicos, pois os atos nulos, em certos casos, produzem efeitos, e até
os atos inexistentes, para premiar a atuação de boa-fé, como é o caso da validade do pagamento ao
credor putativo, a transmissão da herança ao herdeiro aparente, dos efeitos em favor do cônjuge de
boa-fé no casamento putativo. Nestes casos, não vigora o princípio, segundo o qual o que é nulo não
produz efeito”.
137
predisposto a agir com lealdade, sente-se seguro e confia naquilo que lhe é proposto
Podemos entender, também, que esta regra obriga o juiz a inteirar-se sobre
Dessa forma, o juiz, ao proferir sua decisão, com aplicação da cláusula geral
da boa-fé objetiva, prevista na regra contida no artigo 422 do novo Código Civil,
deverá buscar aquilo que seja considerado padrão de conduta do homem médio, ou
seja, o padrão de conduta condizente com o agir de forma leal e honesta, aceita de
autonomia da vontade.
247
Álvaro Villaça Azevedo. Teoria Geral dos contratos típicos e atípicos. Pág. 28. “A boa-fé é um
estado de espírito que leva o sujeito a praticar um negócio em clima de aparente segurança. É a boa-
fé subjetiva”.
138
O legislador nos premia com a boa-fé objetiva não só no artigo 422, mas,
extraordinário.
justamente por trazer, em si, um comando ético-social que entendemos servir como
alicerce da lei, que orienta as condições gerais dos negócios jurídicos em qualquer
fase do contrato.
248
Nelson Nery Junior. Revista de Direto Privado 10/179. “Por base do negócio devem se entender
todas as circunstâncias fáticas e jurídicas que os contratantes levaram em conta ao celebrar o
contrato, que, podem ser vistas nos seus aspectos subjetivo e objetivo”.
249
Revista Forense 98/97. “Se a segurança dos contratos reside na boa-fé das partes, a aplicação da
cláusula rebus sic stantibus não a destrói, porquanto as circunstâncias que cercavam o ajuste se
modificaram de tal sorte que a boa-fé que o presidiu reclama que, ante a prova cuidadosa dos autos,
seja ele rescindido”.
139
Larenz250 nos ensina que a boa-fé objetiva, tal como se verifica no Código
Civil Alemão (BGB) § 242 e § 157, que, a título de ilustração, já mencionamos neste
se afirmar que, da mesma maneira como ocorre na Alemanha, entre nós, trata-se
sobre uma base que contém aspectos objetivos e subjetivos, que devem
permanecer, até que o contrato seja plenamente executado, o que inclui, também, a
fase pós-contratual, ou seja, até que sejam extintos, todos os efeitos do contrato, ao
psicológicos, situa-se no campo das invalidades, portanto, dizem respeito aos vícios
250
Karl Larenz. Derecho de obligaciones. Tradução de Laime Santos Briz. Madrid: Revista de
Derecho Privado, 1958. t. I, p. 145-146. “El principio del § 242 es irrenunciable, ya que representa el
precepto fundamental de la juridicidad. Pero se pergunta si el § 242 es solamente uma norma, que
como otros preceptos jurídicos coativos rige también, como estós, junto a todas lãs demás normas (
dispositivas o coactivas) y tiene el mismo âmbito de aplicación o si representa un principio supremo
del derecho de lãs relciones obligatorias, de forma que todas lãs demás normas han de medirse por
él y em cueanto se lê opongan hande ser em princípio pospuestas. La jurisprudência se há decidido,
hace ya mucho tiempo, por la segunda posición (...)” (grifos do autor).
251
Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery. Código Civil Comentado. Comentários ao artigo
422.
140
A esse respeito, Nelson Nery Junior aduz que “A quebra da base objetiva do
contrato253“.
Nelson Nery Junior254 nos ensina que, uma vez que o contratante requeira
(...)
252
Idem. Artigo 478 do Código Civil de 2002.
253
Idem. Artigos 317, 421, 422 e 478 do Código Civil de 2002. “As disposições legais invocadas pelo
embargante não infirmam o acórdão, porque o negócio jurídico não se rege apenas pela vontade das
partes, mas também pelas normas de ordem pública, entre as quais a que confere o direito À
REVISÃO CONTRATUAL”.(2º TACivSP, 10ª Câm., EDcl 653999-1/7, rel. Nestor Duarte, j.
22.10.2003, v.u) g.n.”
254
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. Código Civil Comentado.Comentários ao art.
422.
255
Enunciados aprovados na I Jornada de Direito Civil, realizada no período de 11 a 13 de setembro
de 2002.Sob a coordenação do ministro Ruy Rosado de Aguiar Junior.
141
(...)
JURÍDICA.
aos negócios.
O contrato deve ser entendido como “centro da vida dos negócios”, como um
256
Enunciado aprovado na III Jornada de Direito Civil.
257
Enunciado aprovado na IV jornada de Direito Civil.
258
Caio Mario da silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Vol. III. Contratos. Pág. 2. “A obrigação
nasce de um paralelogramo de forças cujos componentes são o fato humano e a lei, presentes na
gênese de qualquer relação jurídica, porque é a vontade do Estado que amolda o comportamento
individual permitindo que o fato do homem dê origem a uma prestação economicamente apreciável.”.
142
propriedade privada.
bilateral.
Nesse sentido, Orlando Gomes261 nos ensina que: “É o contrato a fonte por
devem entender-se”.
259
Silvio Rodrigues. Obra já citada item 11. Pág.60.
260
Silvio Rodrigues. Obra já citada item 29. “Se não se admitisse a riqueza (propriedade) privada,
esta não poderia circular e o contrato careceria inteiramente de função prática”. Cf. Doctrina general
del contrato, trad. Esp. Fontanarrosa, Sentis Melendo e Volterra, Buenos Aires, 1952, CAP.I.n1. cit.
Introdução, n.7.
261
Orlando Gomes. Introdução ao Direito Civil. Pág. 474.
143
respeito entre os contratantes, além da função psicológica, uma vez que vincula a
acordo de vontades, para que este se estabeleça como lei para as partes
contratantes.
brocardo “pacta sunt servanda”, princípio que determina que os acordos sejam
dos contratos.
262
Orlando Gomes Contratos. Pág. 28. “Esta liberdade tem tríplice aspecto: a) a liberdade de
contratar propriamente dita; b) liberdade de estipular o contrato; c) liberdade de estruturar o conteúdo
do contrato”.
263
Claudia Lima Marques. Contratos no Código de defesa do Consumidor. Pág. 44. “(...) acreditava-
se na época que o contrato traria em si uma natural equidade, proporcionaria a harmonia social e
econômica, se fosse assegurada a liberdade contratual. O contrato seria justo e eqüitativo por sua
própria natureza.”
144
apenas ao aspecto formal, sendo que, somente quando o homem toma consciência
autonomia da vontade, vai perdendo sua força, refletindo uma nova forma de pensar
os acordos264.
no consentimento das partes, já era constatada pela Igreja, representada pelo Papa
Paulo VI, que expressava, através da Encíclica “Populorum Progressio” nº. 59, a
lição de Leão XIII na “Rerum Novarum”, objetivando demonstrar que essa lição
pode ser traduzido em justiça no contrato, pois, para que se estabeleça o livre
ressaltar que o modelo clássico contratual, que vigorou durante séculos, recebeu
264
Claudia Lima Marques. Op. Já cit. Pág. 126. “O postulado da força obrigatória dos contratos
encontra-se muito modificado pelas novas tendências sociais da noção de contrato. O papel
predominante agora é o da lei, a qual com seu intervencionismo restringe cada vez mais o espaço
para a autonomia da vontade.”
265
Atílio Aníbal Alterini. Os contratos de consumo e as cláusulas abusivas. Revista de Direito do
Consumidor. Pág. 5-19.
266
Arruda Alvim. Cláusulas abusivas e seu controle no direito brasileiro. Pág. 20-37. “Se o direito
canônico contribuiu para a fisionomia e estrutura clássica do contrato, pelo valor e pelo respeito à
vontade humana, de outra parte, no caso do século XIX, veio a se manifestar a Igreja, pelos seus
145
um papel social para o direito, o contrato não deixa de manter a sua essência, qual
seja, a de cunho patrimonial, pois, uma vez realizado o pacto, certamente haverá
econômico268.
por ser da sua essência, entendemos que cumpre uma função social, pois está
jurídico que protege valores, razão pela qual entendemos que o objeto contratual,
sob o ponto de vista de sua utilidade, é requisito objetivo do contrato, por ter uma
aquele que gera interesse, ao qual é atribuído um valor, que o transforma em bem
juridicamente tutelável.
Papas, decisivamente, e, com certo pioneirismo, no campo das idéias, em prol do papel social do
direito”.
267
Rafael Chagas Mancebo. A Função Social do Contrato. Pág.89. “A doutrina se divide entre
aqueles que entendem o acordo de vontades como o elemento caracterizador do contrato e aqueles
que, além da vontade, entendem a ele inerente a natureza patrimonial. A economicidade do objeto
como requisito do contrato não é estipulado no atual código civil”.
268
Idem. Pág. 91. “Se o contrato ocorre em ambiente econômico, relembramos que este ambiente
insere-se num contexto mais abrangente, a sociedade, cuja complexidade possibilita acordos de
vontades que versem sobre valores importantes ao substrato social, muitas vezes informadores,
outras vezes estranhos ao senso estrito da economicidade.”
146
lei demonstra preocupação com a proteção dos negócios, haja vista a forma taxativa
com que o Código Civil trata a questão das nulidades e restringe as anulabilidades.
uma vulnerabilidade269 maior, haja vista o extenso conteúdo do artigo 51, cujo teor
permite afirmar tratar-se de numerus apertus, bem como a referência, de forma clara
possa existir para o contrato de adesão previsto no artigo 423 do Código Civil
vigente.
contratos civis, significa uma vulnerabilidade aceita pela sociedade e positivada pelo
calculada e previsível, uma vez que, mesmo nessas situações, os contratantes estão
269
Arruda Alvim. RT 815. pág. 24. “ Se os códigos de direito privado não podem conviver com um
sistema extenso de nulidades, porque isso traria uma desestabilização do negócio jurídico e dos
contratos, se fomos ler, nesse ponto, o Código do Consumidor, vamos ver que ele adotou um sistema
manifestamente oposto.
270
Arruda Alvim. RT 815. pág. 24.
147
visíveis no direito processual civil271, o que nos permite dizer, sem medo de errar,
alguns conceitos, que foram considerados absolutos, não é tarefa das mais fáceis.
incontroverso.
sociedade, razão por que há que se ter muita cautela com a interpretação que se
como querem alguns, que a sobrevivência dos contratos esteja em risco, até porque
271
Arruda Alvim. Idem. “O que se deseja sublinhar é que os referenciais valorativos do Direito
alteraram-se em sua base, incluindo-se em mais de um ramo do Direito. O que se quer dizer é que a
noção liberal de segurança não só informou o direito privado, como, também, informou o direito
processual civil. Por exemplo, no Direito Processual Civil era impossível pensar em poder cautelar
geral do juiz, por razões que se nos afiguram muito similares àquelas pelas quais não se podia
cogitar de um maior enfraquecimento do contrato”.
272
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo Código Civil. Pág. 72.
148
isso implicaria no caos social, uma vez que o contrato, felizmente, ainda é,
mais equânime quando, no caso concreto, aplicar, por exemplo, a boa-fé objetiva, ou
273
Judith Martins Costa. As cláusulas gerais como fatores de mobilidade do sistema jurídico. “Num
‘sistema aberto’, o ordenamento jurídico não se sujeita mais à lei como mera servidão formal.
Juntamente com o direito positivo passam a conviver princípios gerais do direito, os postulados de
direito natural, e o sentimento de justiça e a equidade experimentados pela sociedade à qual serve o
magistrado, afastando a interpretação e a aplicação do direito a partir de si mesmo. Por outro lado é
preciso atentar para o fato de que a extrema abertura do sistema não conduza à sua própria
desaparição, porquanto tal caminho levaria a um estado de incerteza inconciliável com os próprios
postulados da democracia: é preciso manter um determinado patamar de segurança nas relações
jurídicas, seja ela na relação dos privados entre si, seja na relação entre estes e o Estado sob pena
de ser instaurada a lei do mais forte, assentando que o princípio da certeza jurídica é essencial às
funções de tutela e garantia às quais o direito se opõe.”
274
Arnold Wald. A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo Código Civil. Pág.72
149
obrigatória dos contratos, da mesma maneira que não concordamos com o discurso,
que se faz defendendo a revisão dos contratos, sob o fundamento de que a função
livremente contratar, com a certeza que esse negócio jurídico é válido e eficaz, o
acordo de duas ou mais vontades que, atendendo aos limites impostos pela lei, vão
estabelecer as cláusulas, que deverão ser cumpridas nos seus exatos termos.
que nos orienta para o alcance do que seja cláusula abusiva. Já em outra fase da
“cláusulas leoninas”.
exatamente, a força e o poder desse mamífero, que o faz ser reconhecido como
275
Cristiano Heineck Schimitt. As cláusulas abusivas no Código de Defesa do Consumidor. Pág.164.
276
Ruy Rosado de Aguiar Junior. Cláusulas abusivas no Código de Defesa do Consumidor.Pág 15.
151
oriundos do contrato.
quando da sua execução. Não se confundem com cláusulas ilícitas, uma vez que
objeto ilícito, cujo motivo determinante seja ilícito, ou, ainda, que tenha por objetivo
fraudar lei imperativa e, em geral, quando a lei proibir- lhe a prática, ou, ainda,
277
Oscar José de Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico. Pág. 173. “Cláusula Leonina. Assim se dirá a
cláusula que, disposta em um contrato, tenha o objetivo de atribuir a uma ou a algumas das partes
contratantes vantagens desmesuradas em relação às outras, seja concedendo-lhes lucros
desproporcionais em relação à sua contribuição contratual, em face da contribuição também prestada
pelas demais partes, seja porque as isenta de quaisquer ônus ou responsabilidades, somente se lhes
outorgando direitos”.
278
Cristiano Heineck Schimitt. Cláusulas abusivas nas relações de consumo. Pág.84. “A existência de
uma cláusula abusiva em um contrato é atual, isto é, a sua estipulação é concomitante à celebração
do negócio, situação diferente daquela que ocorre por motivos ulteriores à pactuação.”
279
Fernando Noronha. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais: autonomia privada,
boa-fé, e justiça contratual cláusulas abusivas. Pág. 299.
280
Código Civil – Artigo 166: É nulo o negócio jurídico quando: (...), II- for ilícito, impossível ou
indeterminável o seu objeto; (...) VI- tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII- a lei taxativamente o
declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
152
lesão enorme282.
ocasionando tanto a oferta, quanto a demanda por produtos, bens e serviços, numa
ou fabricantes.
281
Claudia Lima Marques. Contratos no código de defesa do Consumidor. Pág. 404. “O abuso de
direito seria a falta praticada pelo titular de um direito, que ultrapassa os limites ou que deturpa a
finalidade do direito que lhe foi concedido. Assim, apesar de presente o prejuízo (dano) causado a
outrem pela atividade (ato antijurídico) do titular do direito (nexo causal), a sua hipótese de incidência
é diferenciada. O que ofende o ordenamento é o modo (excessivo, irregular, lesionante) com que foi
exercido um direito, acarretando um resultado, este sim, ilícito.”
282
Cristiano Heineck Schimitt. Pág. 86. “A lesão enorme demonstra nítida preocupação econômica
com a parte mais fraca do contrato podendo esgotar-se somente nesse aspecto”.
283
Cavalieri Filho. O direito do consumidor no limiar do século XXI. “ O direito do consumidor veio a
lume para eliminar as desigualdades criadas nas relações de consumo pela revolução industrial,
notadamente a partir da segunda metade do século XX, revolução essa que aumentou quase que ao
infinito a capacidade produtiva do ser humano. Se antes era manual, artesanal, mecânica,
circunscrita ao número familiar ou a um pequeno número de pessoas, a partir dessa revolução a
produção em massa, em grande quantidade, até para fazer frente ao aumento da demanda
decorrente da explosão demográfica. Houve também modificação no processo de distribuição,
causando cisão entre a produção e a comercialização. Se antes era o próprio fabricante que se
encarregava da distribuição dos seus produtos, pelo que tinha total domínio do processo produtivo,
sabia o que fabricava, o que vendia e quem vendia, a partir de um determinado momento essa
distribuição passou também a ser feita em massa, em cadeia, em grande quantidade pelos mega-
153
mercado cada vez mais competitivo, no qual todas as necessidades podem ser
supridas rapidamente.
vocacionadas a ser cada vez mais gritantes, o que provocou a busca pelo
relações de consumo285 .
capitalistas.
285
Cristiano Heineck Schmitt. Op cit. Pág. 31. “Uma das formas pelas quais esses abusos passaram
a ser praticados consiste nas cláusulas abusivas, elementos inseridos nos negócios para garantir o
predomínio econômico de um dos contratantes, notadamente o mais forte, representado pelo
industrial, ou o grande comerciante, em detrimento do mais fraco, o cidadão comum.”
286
Fernando Noronha. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais: autonomia privada,
boa-fé, e justiça contratual cláusulas abusivas.Pág. 299.
287
Carlos Alberto da Mota Pinto. Contratos de adesão. Pág.33.
155
No Código civil, conforme os artigos 423 e 424, a proteção para essa forma
relação entre direitos e obrigações, assumidos pelas partes, de forma que a boa-
vulnerável.
288
Eliseu Jusefovicz. Contratos – Proteção contra cláusulas abusivas. Pág. 13.
289
Nelson Nery Junior. Código Civil Comentado e Legislação Extravagante. CDC, Art. 51. Pág.988.
156
básica para o equilíbrio das relações contratuais, já que o artigo 4º, I, do Código de
necessidade291.
serviço.
Ressalte-se que sua fragilidade não está adstrita à sua condição financeira,
mas sim à sua inexperiência, ou até mesmo impotência, diante do absoluto domínio
exploração do mais fraco pelo mais forte, que buscará, sempre, através do contrato,
Por essa razão, entendemos que são abusivas todas as cláusulas que, de
vantagens com o negócio que estão realizando. A abusividade a que nos referimos,
pelo fato de apenas uma das partes fixar, como queira, o conteúdo do contrato.
292
Arruda Alvim.Cláusulas abusivas e seu controle no direito brasileiro. Pág. 34.
293
Fábio Konder Comparato. A Evolução Histórica e os Princípios Fundamentais dos Direitos
Humanos. Texto de apoio para palestra no curso de Direitos Humanos, da Escola Paulista de
Magistratura de São Paulo, outubro de 2000, p-10-11. Citado no texto de Cláudio Luiz Bueno de
Godoy, nota rodapé n.9.
158
ordenamento jurídico, uma vez que as cláusulas abusivas são também repudiadas
contratual seja absoluta, pois, além do poder econômico, pode ocorrer que o
contemporânea295.
294
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu Controle no Direito Brasileiro. Pág.36. “(...) designam-se
por cláusulas abusivas, no direito inglês por Unfair Terms; no norte americano por unconscionable
Contract or Clause e no direito alemão por Generalklausel..
295
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu controle no Direito Brasileiro. Pág.34 “(...) ao lado do
consumidor ter pressa, e, ainda, ser o consumidor continuadamente bombardeado pela propaganda,
isso que implica uma verdadeira predisposição de sua parte para consumir, em decorrência de uma
influência na sua psique, que, ademais, resta sintonizada com essa predisposição psíquica coletiva, o
que conduz a que, além da vontade individual, é esta alimentada pela comparação com os demais
membros da sociedade e, particularmente, da classe sócio econômica do consumidor, ainda, deve-se
159
acentuar que o consumidor vive na contingência de ter de ser consumidor, diante das necessidades
contemporâneas que, só podem ser, numa escala quase que absoluta, satisfeitas pela compra de
coisas industrializadas, inclusive, no patamar mais primário de suas necessidades, a própria
alimentação, bem como pela necessidade de utilização de certos e determinados serviços.”
296
Caio Mario da Silva Pereira. Lesão nos Contratos. Pág.212. “A norma genérica do respeito à
comutatividade das prestações leva sempre a uma solução que reprime os excessos do
individualismo, e prestigia a justa proporcionalidade das prestações, no negócio jurídico bilateral”.
297
Antonio Bento Betiolo. Introdução ao Direito. Lições de propedêutica jurídica. Pág. 387/388. ”A
justiça comutativa, como princípio diretor das relações entre particulares, tem um campo amplo de
aplicação, não se restringindo ao dos contratos. Ela preside, assim, tanto às relações de troca, como
as demais relações entre particulares. A justiça comutativa versa, pois, sobre o que é de cada pessoa
por direito próprio”.
298
Georges Ripert. Op. Cit. Item 18. Pág. 116.
160
aquela destinada ao contratante, nos negócios jurídicos regidos pelo Código Civil300.
valer-se dos critérios de equidade, enquanto que, no Código Civil, essa possibilidade
por esse diploma já nasceram marcados pelo interesse público, conforme comprova
que pretenda livremente concordar com uma cláusula abusiva, a conseqüência será
a declaração de nulidade.
299
Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil. Vol.4. Responsabilidade Civil. 4ª ed. Atlas. “Pode-se dizer
que o próprio direito contratual encontra um divisor de águas no Código de Defesa do Consumidor:
após a edição desta lei, a interpretação dos contratos, não importando se dentro ou fora do âmbito
consumerista, sofre verdadeira revolução no direito brasileiro”.
300
Arruda Alvim. Op. Cit. 7. “A proteção que é deferida ao consumidor é necessariamente maior do
que aquela que possa ter sido reconhecida àquele que seja havido como contratante fraco, dentro do
sistema do Código Civil”.
161
todo o contrato.
pelo seu conteúdo axiológico, percebemos que a função social, que, expressamente,
8.078/90.
estarem inseridas dentro do instituto geral das nulidades, tratadas no Código Civil,
301
Cristiano Heineck Schmitt. Cláusulas Abusivas nas Relações de Consumo. Pág. 63 “Em razão de
ser contrária ao bom direito, a cláusula abusiva recebe a sanção da nulidade que no sistema jurídico
brasileiro, é o mais alto grau de invalidade atribuível.”.
302
Ruy Rosado de Aguiar Junior.Cláusulas Abusivas no Código de Defesa do Consumidor.In: Claudia
Lima Marques (coord) Estudos sobre a proteção do Consumidor no Brasil e no Mercosul.p.27 /30.
“(...) as disposições que cominam a sanção de nulidade reunidas no micro-sistema do Código do
Consumidor inserem-se dentro do instituto geral das nulidades, assim estruturado no Código Civil,
com as peculiaridades que são próprias às relações de consumo. Não há razões para criar um novo
sistema sobre nulidades cada vez que o legislador se defrontar com a necessidade de regulamentar
um segmento das relações sociais. Portanto, a ‘nulidade de pleno direito’ a que se refere o art. 51 do
CDC é a ‘nulidade’ do nosso Código Civil. Como tal, pode ser decretada de ofício pelo juiz e alegada
em ação prevista para violação de preceito de ordem pública e interesse social (art. 1º)”.
303
Nelson Nery Junior. Código Civil Comentado e Legislação Extravagante. Pág. 988/989. “ O CDC
tem seu próprio sistema de nulidades, de modo que aos contratos de consumo não se aplicam,
inteiramente, as disposições sobre nulidades do CC, CPC e de outras leis extravagantes. No micro-
sistema do CDC as cláusulas abusivas são nulas de pleno direito, porque ofendem a ordem pública
de proteção do consumidor. No micro-sistema do CDC restou superado o entendimento de que as
nulidades pleno iure independem de declaração judicial e de que as nulidades absolutas precisam de
sentença para produzirem seus efeitos no ato ou negócio jurídico.”
162
utilização desses institutos faça parte de outro universo, cujas regras são
de consumo, uma transformação absoluta, uma vez que, para regular essa relação,
micro-sistema.
como se verifica nos artigos 51, §2º, bem como no artigo 6º, inciso V, do Código de
(...)
(...)
163
Nota-se que pela relevância social, que há nos negócios jurídicos realizados
dentro desse universo, determina-se que, sempre que possível, seja preservado o
contrato de consumo, prevendo a legislação que, nos casos em que for declarada a
Justamente por premiar a boa-fé, e isto significa respeitar a vontade que foi
304
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu Controle no Direito Brasileiro. Pág.55. “O princípio da
conservação do contrato resta mantido, ao lado do princípio da intangibilidade (art.. 51, § 2º). Nem
pelo fato de se ter percebido que o consumidor é “mais vulnerável” nas relações de consumo e em
sede contratual, no setor, o contrato é válido enquanto nascido de manifestação de vontades (art. 6º,
V do CDC), inexistindo razão para que deixe de ter validade.”.
305
Cristiano Heineck Schimitt. Cláusulas abusivas nas relações de consumo. Pág. 140. “Por outro
lado , em caso de nulidade absoluta de determinada cláusula contratual, é possível ao juiz recorrer
não só à lei supletiva da vontade das partes, o Código de Defesa do Consumidor, mas também ao
próprio contexto do contrato e às demais cláusulas, obtendo, assim, a disposição que falta, criando
uma nova cláusula contratual, numa autêntica interpretação integrativa, que é também uma
interpretação pró-consumidor, prevista no art. 47 do CDC”.
164
cláusula declarada abusiva, entendemos que a aplicação das perdas e danos, para
do art. 4º, inciso III308, cuja aplicação permite o controle da prática de cláusulas
Defesa do Consumidor, tutelando os bens que são, desde a sua origem, marcados
306
Claudia Lima Marques. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. Pág. 104. “O direito
desenvolve uma “teoria contratual com função social” quando deixa de lado o ideal positivista e
dedutivo da ciência, reconhecendo a influência do social (costume, moralidade, harmonia, tradição),
passando a assumir posições ideológicas, voltando-se para solução de problemas por meio da
utilização de conceitos e princípios mais abertos, criando figuras jurídicas, como os conceitos
indeterminados e as cláusulas gerais.”
307
Claudia Lima Marques. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. Pág.286. “Trata-se do
princípio da transparência, que significa informação clara e correta sobre o produto a ser vendido,
sobre o contrato a ser firmado, significa lealdade e respeito nas relações entre fornecedor e
consumidor.”
308
Artigo 4º, inciso III Código de Defesa do Consumidor: “A Política Nacional das Relações de
Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua
dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua
qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os
seguintes princípios”:
Inciso III: “harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e
compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e
tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica. (art. 170 da
Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e
fornecedores”.
165
haja vista que o Código Civil protege os bens, que são marcados pelo interesse
privado, em cujo âmbito prevalece, até certo ponto, a vontade das partes309.
Código Civil vigente e, a esse respeito, aduz que “São as estipulações que dão a
mencionar, fica caracterizado o poder que o mais forte vai exercer sobre o mais
fraco, e o exemplo típico citado pela doutrina, está estampado no artigo 1.008 do
Código Civil, que considera nula a cláusula que exclua o sócio de participar dos
artigo 184 do Código Civil vigente, não haverá prejuízo para todo o contrato,
permanecendo a parte considerada válida, previsão essa que foi seguida pelo
legislador, no artigo 51, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o
309
Daniel Martins Boulos. A autonomia privada, a função social do contrato e o novo Código Civil.
Pág. 131. “Trata-se, bem analisada a questão, de um meio de que se vale o Estado para reconduzir a
autonomia privada à sua matriz originária, desautorizando o seu exercício abusivo tendente a gerar,
não os efeitos originariamente pretendidos na concepção estatal da autonomia privada, mas outros
que o ordenamento jurídico repele”.
166
do Código Civil vigente, cujo teor determina ser nula a cláusula que autoriza o credor
não for paga no vencimento, sendo certo que essa previsão também estava
Cláudia Lima Marques, sobre a questão, aduz que “As cláusulas leoninas e
310
Código Civil vigente – Art. 1.428 – É nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético
ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento.
311
Código Civil de 1916 – Artigo 765 – É nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético
ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento.
312
Código Civil de 2002 – Artigo 478 – Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a
prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a
outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a
resolução do contrato. Os efeitos retroagirão à data da citação.
313
Código Civil de 2002 – Artigo 479 – A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a
modificar equitativamente as condições do contrato.
167
sem a exigência, que faz o Código Civil vigente, do fato superveniente ser
imprevisível.
deva ser aplicado em outras áreas, fora do âmbito do consumo, tendo em vista a
de Defesa do Consumidor pode ser aplicado, por extensão, aos contratos de direito
privado (civil e comercial), tendo por finalidade coibir a prática de cláusulas abusivas.
314
Fabiana Rodrigues Barletta. A revisão contratual por onerosidade superveniente à contratação
positivada no Código de Defesa do Consumidor sob a perspectiva civil-constitucional. Pág. 288.
315
Eliseu Jusefovicz. Contratos Proteção Contra Cláusulas Abusivas. Pág.148.
316
Nelson Nery Junior. Código Civil Comentado e Legislação Extravagante. Pág. 989. “Dado que a
ilicitude das cláusulas abusivas é matéria que não fica restrita às relações de consumo, pois pertence
à teoria geral do direito contratual, o sistema do CDC, do art. 51 deve ser aplicado, por extensão, aos
contratos de direito privado (civil e comercial)”.
168
contratos civis.
Além do que, considerar que o Código Civil vigente seja insuficiente para
atribuída a ele.
próprio sistema, que, como se sabe, é aberto. Dessa forma, não há que se pensar
em “engessar” um código que, certamente, foi projetado para acolher situações que,
Ressalte-se ainda que o Código Civil, além das cláusulas gerais que,
317
Código Civil 2002. Art. 884. “Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será
obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
318
Código civil 2002. Art. 157. “Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou
por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação
oposta. § 1º- Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em
que foi celebrado o negócio jurídico. § 2º - Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido
suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.
319
Claudia Lima Marques. Diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil:
do “diálogo das fontes” no combate às cláusulas abusivas. Pág. 78.
320
Idem. Pág. 79.
170
Civil vigente - Lei 10.406/2002, o que não poderia ser diferente, sendo oportuno citar
tendo em vista que os protagonistas possuem linguagens que são próprias de cada
um.
321
Norberto Bobbio. Teoria do Ordenamento Jurídico. Pág. 113.
322
Idem.Pág. 77. “Assim, em resumo, haveria o diálogo sistemático de coerência, o diálogo
sistemático de complementariedade e subsidiariedade em antinomias e o diálogo de coordenação e
adaptação sistemática.
171
sendo uma delas preventiva, que tem o objetivo de impedir o cometimento do dano,
determinado contrato, mesmo que este ainda não tenha sido utilizado formalmente,
Veja-se:
(...)
Ministério Público, conforme disposto nos artigos 82323, inciso I, e 81, parágrafo
único e incisos, todos do Código de Defesa do Consumidor, o que implica dizer que
Portanto, isso nos permite afirmar que os legitimados, no artigo 51, § 4º, do
não é causa, por si só, suficiente para que se atribua ao Ministério Público, o dever
323
Código de Defesa do Consumidor. Artigo 82. “Para os fins do art. 81, parágrafo único, são
legitimados concorrentemente.I- o Ministério Público.”
324
Hugo Nigro Mazzilli.A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor, e
outros interesses difusos e coletivos.Pág. 93. “O Ministério Público só pode promover a defesa de
interesses individuais homogêneos quando isso convenha à coletividade como um todo (como
quando, embora individuais, se trate de interesses indisponíveis ou quando haja tal abrangência de
lesados que se torne francamente proveitosa para a sociedade a substituição processual dos
interessados pela Instituição). A não ser assim, estaria atuando o Ministério Público fora dos
parâmetros de sua destinação institucional (art.127, caput da CF)”.
173
estatais.
que essa forma de controle pode ocorrer, também, pela via judicial. Já o controle
conteúdo do contrato.
contribuem com o estudo das cláusulas abusivas, porém, naquilo que diz respeito à
325
Cristiano Heineck Schimitt. Cláusulas Abusivas nas relações de consumo. Pág.146.
326
Código de Defesa do Consumidor. Artigo 56. “ As infrações das normas de defesa do consumidor
ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza
civil, penal e das definidas em normas específicas: I – multa; II – apreensão do produto; III –
inutilização do produto; IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente; V – proibição
de fabricação do produto; VI – suspensão do fornecimento de produtos ou serviços; VII – suspensão
temporária de atividade; VIII – revogação de concessão ou permissão de uso; IX – cassação de
licença do estabelecimento ou de atividade; X – interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de
obra ou de atividade; XI- intervenção administrativa; XII – imposição de contrapropaganda.
Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela autoridade administrativa, no
âmbito de sua atribuição, podendo ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar
antecedente ou incidente de procedimento administrativo.”
327
Cristiano Heineck Schimitt. As cláusulas Abusivas no Código de Defesa do Consumidor. Revista
de Direito do Consumidor. Pág. 176.
328
Código de defesa do Consumidor. Artigo 46. “Os contratos que regulam as relações de consumo
não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio
de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a
compreensão de seu sentido e alcance”.
174
Com efeito, para o consumidor, o controle judicial pode lhe conferir maiores
do ônus da prova.
sociedade, não só, no controle das cláusulas abusivas, atuando como fiscalizadores,
apertus.
afirma que “Há cláusulas abusivas não explicitadas ou não referidas nominalmente
329
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu controle no Direito Brasileiro. Pág. 58
175
330
Código de defesa do Consumidor. Artigo 51, inciso IV. “Estabeleçam obrigações consideradas
iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis
com a boa-fé ou a equidade”.
176
pleno direito, como expressa o artigo 51, isso significa nulidade absoluta, porém,
pelo fato de estarem inseridas no Código de Defesa do Consumidor, podem vir a ser
admitida333.
331
Ruy Rosado Aguiar Júnior. Cláusulas abusivas no Código de Defesa do Consumidor. Pág. 28 a
30.
332
Código de Defesa do Consumidor. Artigo 51 § 2º. “A nulidade de uma cláusula contratual abusiva
não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer
ônus excessivo a qualquer das partes.”
177
sistema.
conteúdo das cláusulas abertas, construindo uma regra que permita a realização da
333
Arruda Alvim. Cláusulas abusivas e seu Controle no Direito Brasileiro. Pág. 59. “No art. 51, I, 2ª
frase, sucessivamente prescreve-se – valendo os mesmos tempos verbais – estarem vedadas
cláusulas que ‘impliquem renúncia ou disposição de direitos”. Quaisquer modalidades – salvo numa
escala absoluta diminuta (art. 54, § 4º) - de abdicação de direitos não podem validamente constar do
contrato, mas, é possível renunciar a direitos ou deles dispor em outra sede, ulterior ao contrato, v.g.,
em juízo, numa transação, ou no âmbito de compromisso, ainda que a ‘utilização compulsória de
arbitragem’ seja vedada.
(art. 51, VII). Válido será o compromisso, propriamente dito, pendente o juízo.
334
Idem pág.61.
335
Decreto 2.181/1997. Artigo 22.
178
337
Arruda Alvim , com propriedade, resolve a questão explicando que: “É só
Civil vigente. Tarefa que, em si mesma, não representa novidade para o judiciário,
Maria Helena Diniz338, sobre o importante papel do judiciário para que ocorra
336
Ruy Rosado Aguiar Junior. Projeto do Código Civil: as obrigações e os contratos. pág.18.
337
Arruda Alvim. Cláusulas Abusivas e seu controle no Direito Brasileiro. Pág. 33.
338
Maria Helena Diniz. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. Pág. 7.
179
nas relações jurídicas fosse alcançado, o que, aliás, foi muito bem realizado, haja
vista os princípios que hoje vigoram ter suas bases fixadas não só em conceitos
necessidades atuais da sociedade, bem como as que estão para chegar com as
próximas gerações.
339
Miguel Reale. Filosofia do Direito. Pág. 386.
340
Daniel M. Boulos. Abuso do Direito no Novo Código Civil. Pág. 291.
180
que habitavam o nosso ordenamento. Isso implica dizer que os mesmos eram
com o artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, que dispõe: ”Na aplicação da
lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum”.
181
ordenamento.
premissa acima referida seja verdadeira, a determinar que: “Quando a lei for omissa,
de direito”.
considerar “que tudo o que não está juridicamente proibido, está permitido”.
341
Maria Helena Diniz. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. Pág. 4.
342
Hans Kelsen. Teoria pura do direito.
182
valores éticos na sua decisão, não terá elaborado a norma individual fora do
sistema.
jurídica, para que, através do devido processo legal, o juiz possa restabelecer
Civil vigente.
343
Eliseu Jusefovicz. Contratos proteção contra cláusulas abusivas. Pág. 189.
183
Introdução ao Código Civil, fórmulas valorativas que são o bem comum e o fim
social.
No Código Civil vigente temos o artigo 421, que expressa que o contrato tem
Como observa Tércio Sampaio Ferraz Jr.344, a função social, assim como o
fim social, são, na verdade e antes de mais nada, do direito, já que a ordem jurídica
ser anti-sociais, ou abusivas, mesmo que não haja previsão literalmente expressa,
Maria Helena Diniz345, sobre a questão, esclarece que: “Os fins a serem
344
Tercio Sampaio Ferraz Jr. Introdução ao Estudo do Direito. Pág. 265.
345
Maria Helena Diniz. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. Pág. 172.
184
utilidade social; concluindo que: “Todo sistema jurídico se inspira numa concepção
do bem comum, isto é, nos fins pelos quais a sociedade optou, porque ela os
considera bons.”
entendimento, como bem assevera Tercio Sampaio Ferraz Jr346, de que “É a decisão
valores, consignados no Código Civil vigente, através das cláusulas abertas, tais
desenvolvimento da sociedade.
346
Tércio Sampaio Ferraz Junior. Introdução ao estudo do direito. Pág. 313.
185
CONCLUSÃO
necessidades negociais.
das normas de ordem pública no lugar do Estado Liberal, tem destaque jurídico a
pacta sunt servanda, sofre uma mitigação, já que o contrato não está mais inserido
ambiente, ou, ainda, que imponha cláusulas consideradas abusivas, que contrariem
Consumidor.
relação entre os particulares deve ter a finalidade de evitar a prática de abusos, pela
vulnerável, nos contratos de consumo. Por essa razão, o legislador faz previsão
contratos.
12. Para os contratos civis, o legislador não faz previsão expressa de rol
14. Os contratos regidos pelo Código Civil também são protegidos contra a
Código Civil vigente, em todos os artigos que permitem a revisão ou, até mesmo, a
15. Além disso, entendemos que, através das cláusulas gerais, ou da Lei de
Introdução ao Código Civil, será possível obter apoio para combater a prática de
abusos através dos contratos, em razão de que sustentamos não ser necessária a
contrato, deva ser exercida pelo judiciário com extrema cautela, a fim de que o
contrato não sofra alteração da sua essência, que sustentamos ser econômica.
poderá servir para mascarar inadimplentes, que não queiram assumir a álea normal
a qualquer contrato. A função social não poderá ser fator de desestímulo à iniciativa
privada, o que significa dizer que a segurança jurídica não pode ser deixada de lado,
daí, porque a função social não deva ser confundida com assistencialismo, pois
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