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2134/2007

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Relator: GRANJA DA FONSECA
Descritores:CONTRATO DE FORNECIMENTO
DEVER DE INFORMAR
CADUCIDADE

Nº do RL
Documento
:
Data do 29-03-2007
Acordão:
Votação: UNANIMIDADE
Texto S
Integral:

Meio APELAÇÃO
Processual:
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO

Sumário: 1 - Tratando-se de um serviço público essencial, como é a água,


incumbe ao prestador do serviço o dever de informação das
condições em que o serviço de fornecimento desse bem é realizado e
a prestação de todos os esclarecimentos que se justifiquem de acordo
com as circunstâncias, sendo que esse dever contempla, sobretudo, a
disponibilização de uma facturação detalhada, pois que apenas assim
é possível que o utente verifique a aplicação concreta do tarifário por
parte do prestador do serviço.
2 - Por conseguinte, impende sobre o prestador de serviços o ónus de
demonstrar o cumprimento de todas as obrigações decorrentes da
celebração de um contrato de um bem essencial, designadamente, a
obrigação de apurar os consumos reais de água gasta pelo utente e a
obrigação de o informar do valor do consumo real por ele efectuado.
3 - Logo, não obstante se tenha tornado prática corrente a facturação
baseada em meras estimativas de consumo, continua a impender
sobre o prestador de serviços a obrigação de disponibilizar aos seus
utentes uma facturação detalhada do consumo real efectuado e do
preço devido por aquele mesmo consumo.
4 - Donde, no caso concreto, cabia à autora, na qualidade de
prestadora de serviços de bens essenciais, demonstrar que cumpriu
todas as obrigações decorrentes do contrato celebrado com o
apelado, entre as quais a obrigação de proceder à leitura do consumo
efectivo de água na sua residência, cabendo ainda à apelante
demonstrar, atentas as regras do ónus da prova e os mecanismos
legais de protecção dos consumidores, que o não cumprimento de tal
obrigação não resultou de culpa sua.
5 - Não existe um dever do consumidor comunicar a leitura à
fornecedora, nem de se certificar que tal leitura é efectuada
periodicamente, não obstante a prestadora colocar à disposição do
consumidor variados meios para facilmente efectuar a comunicação,
pois a obrigação de apurar os consumos reais é do prestador do
serviço e não do utente; a modalidade de cobrança do consumo por
mera estimativa reverte em benefício da entidade cobradora, e não o
inverso.
6 - Donde, a ausência para a realização de leituras por parte
da EPAL consubstancia uma verdadeira falha do prestador do serviço.
7 - A impossibilidade de se fazer a rigorosa correspondência
temporal entre as diferenças de consumo apuradas e os pagamentos
(por estimativa) inferiores que foram sendo feitos pelo réu resulta da
metodologia – a estimativa – adoptada pela autora durante mais de
três anos, pelo que não recai sobre o réu o ónus de demonstrar quais
as datas em que havia efectuado pagamentos inferiores aos
consumos realmente efectuados até essas mesmas datas.
8 - Logo, a caducidade do direito da autora ocorreu por erro seu uma
vez que não procedeu à leitura do contador da água existente na
residência do réu senão decorridos cerca de quarenta meses após a
última leitura, sendo certo que a realização atempada das leituras
teria permitido não só apurar o consumo real de água, mas também a
sua liquidação em prazo razoável para o efeito.
(G.F.)

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:


1.
[EPAL.] intentou, no 7º Juízo Cível de Lisboa, contra [R. E.
C. J.] a presente acção declarativa, em processo sumário,
pedindo a condenação do Réu a pagar à Autora a quantia
de € 4.508,56, acrescida dos juros legais vincendos
calculados sobre o capital de € 3.998,51, até integral
pagamento.
Alegou, em síntese, que, ao abrigo do contrato de
fornecimento de água celebrado com o Réu, tem vindo a
abastecer o domicílio deste, sendo que, não obstante a ter
recebido e utilizado, este não a pagou, estando vencida a
factura no valor de € 3.998,51.

Contestando, afirmou o Réu que a Autora utilizou o


método de estimativa entre 14/03/2000 e 4/07/2003, a
esta sendo imputável a circunstância de não ter
providenciado pela leitura do consumo real em tal
período, pelo que não tem meios para determinar se a
factura apresentada a pagamento corresponde ao gasto
efectivo da água. Mas, de qualquer modo, sempre está
verificada a caducidade do direito reclamado pela Autora,
por efeito do artigo 10º, n.º 2 da Lei 23/96, de 26/07, na
medida em que a falta de leitura do consumo efectivo
consubstancia erro do prestador do serviço.

A Autora replicou, pugnando pela improcedência da


excepção suscitada.

Foi elaborado despacho saneador, no âmbito do qual foi


seleccionada a matéria de facto assente e a base
instrutória, as quais foram posteriormente objecto de
alteração.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi


proferida decisão sobre a matéria de facto e,
posteriormente, a sentença em que, considerando-se
procedente a excepção de caducidade do direito da
Autora ao recebimento da quantia titulada pela factura
(junta aos autos com a petição inicial), com fundamento
no disposto no n.º 2 do artigo 10º da Lei n.º 23/96, de
26/07, se decidiu absolver o Réu do pedido.

Inconformada, recorreu a Autora, finalizando com as


seguintes conclusões:
1ª – A Exc. ma Juiz a quo considerou procedente a
excepção de caducidade do direito da ora recorrente ao
recebimento da quantia titulada pela factura de fls. 9, com
fundamento no disposto no n.º 2 do artigo 10º da Lei
23/96, de 26 de Julho, que dispõe o seguinte:
“Se, por erro do prestador do serviço, foi paga
importância inferior à que corresponde ao consumo
efectuado, o direito ao recebimento da diferença de preço
caduca dentro de seis meses após aquele pagamento”.
2ª – Porém, atenta a matéria de facto provada, constata-se
que o recorrido não logrou demonstrar, (como lhe
competia), que (i) se verificou um erro, (ii) que o erro
verificado é imputável ao prestador do serviço, (iii) em
que data procedeu o recorrido ao pagamento da
“importância inferior” e (iiii) que, entre a data daquele
pagamento e a data em que lhe foi, pela primeira vez,
exigido o pagamento da diferença, decorreram mais de
seis meses.
3ª - De entre os factos provados não descortinamos
nenhum que aluda à verificação de erro, ou seja não se
provou a verificação de erro. É, aliás, o recorrido quem
reconhece a não (verificação de erro subjacente ao
apuramento da medida e valor do seu consumo (na carta
de 23/07/2003, que remeteu à recorrente e que consta de a
fls. destes autos - documento n. º 42, junto com a réplica,
ao referir textualmente que "Não pondo em causa o valor
do consumo real verificado na última leitura (...)”.
4ª - E vem provado que o recorrido recebeu e consumiu a
água que a recorrente lhe forneceu no valor de € 3.998,51
conforme factura junta como doc. n.º 1 à petição inicial.
5ª – Sem conceder, se dirá que, tendo o recorrido
articulado (cfr. artigo 30º da contestação, que não foi
levado à base instrutória) que a recorrente “eximiu-se, por
iniciativa sua, de proceder à leitura do contador”, situação
que, no entender do recorrido, configuraria o erro da
recorrente;
6ª - O certo é que resultou do conjunto da prova
produzida (designadamente da prova documental carreada
para os autos pela recorrente – doc. 23 a 40, 43 e 44
juntos com a réplica - que não foram sequer impugnados
pelo recorrido) que os funcionários da recorrente
compareceram na casa do recorrido, nas datas em que lhe
comunicaram que iriam proceder à leitura e não
efectuaram, quando o mesmo não aconteceu com os
vizinhos do recorrido (cfr. também pontos 12 e 13 dos
factos provados);
7ª - O que permite supor que o facto de a recorrente não
ter efectuado (ou logrado efectuar) leitura não se ficou a
dever, por isso, nem à omissão nem à iniciativa da
recorrente, mas dificuldade de acesso ao contador (cfr.
doc. 23 a 40, 43 e 44, juntos com a réplica).
8ª – Tão pouco se desincumbiu o recorrido de provar que,
nas datas em que a recorrente se deslocou à morada do
recorrido para efectuar a leitura (datas que lhe foram
comunicadas com antecedência), o recorrido garantiu à
recorrente o acesso ao contador, nos termos a que se
encontra obrigado.
9ª - A prova documental e testemunhal produzida e os
factos considerados provados nos pontos 11, 12 e 13 são
de molde a, pelo menos, suscitar a dúvida sobre a
imputabilidade à recorrente do hipotético erro.
10ª - O recorrido também não logrou provar como lhe
competia - tão pouco articulou - e não faz(em) parte do
universo da factualidade provada(s) a(s) data(s) em que
terá procedido ao pagamento da(s) “importância(s)
inferior(es) a que alude a citada disposição legal.
11ª - Nem se encontra provado (e competiria ao recorrido
demonstrar) que entre a data do pagamento da(s)
“importância(s) inferior(es)” e a data em que lhe foi, pela
primeira vez, exigido o recebimento da diferença, terão
decorrido mais de seis meses.
12ª - O recorrido nunca questionou ter efectuado o
consumo da água que lhe foi facturado, todavia, entende
não estar obrigado ao seu pagamento por virtude da
alegada verificação de caducidade, conforme se retira da
citada carta que, em 23/07/2003, o recorrido remeteu à
recorrente - onde aquele, reportando-se à factura que
recebeu da recorrente, diz que não, põe “(...) em causa o
valor do consumo real verificado na última leitura (...).
13ª - Portanto, o recorrido reconhece ser devido à
recorrente o montante correspondente ao volume de água
fornecido e recebido pelo recorrido determinado nos
termos constantes da factura, emitida em 09/07/2003 e
vencida em 08/08/2003, que esta reclama e fez juntar fls.
(doc. n.º 1 da petição inicial), factura a que alude o ponto
3 da matéria de facto provada.
14ª - Tal reconhecimento, nos termos e para os efeitos do
artigo 331° do CC, impede a verificação da caducidade
do direito da recorrente.
15ª – Nada do que consta da factualidade provada
habilitava a Srª Juiz a quo a decidir como, por manifestos
erros de julgamento, decidiu na referida sentença, a qual,
por conseguinte, violou as normas dos artigos 331°, 342º
e 343º do CC e do nº 2 do artigo 10º da Lei n° 23/96, de
26/07.

O Réu contra – alegou, concluindo que a sentença deve


ser confirmada.
2.
Na 1ª instância consideraram-se provados os seguintes
factos:
1º - A Autora é uma sociedade comercial que tem por
objecto a captação, tratamento, adução e distribuição de
água para consumo humano e, bem assim, quaisquer
outras actividades industriais, comerciais, de investigação
ou de prestação de serviços, designadamente, respeitantes
ao ciclo da água, que sejam complementares daquelas ou
com elas relacionadas, estando-lhe atribuído o serviço
público de abastecimento de água a Lisboa e concelhos
circundantes.
2º - Ao abrigo de contrato de fornecimento de água
celebrado com o Réu, a Autora tem vindo a abastecer o
domicílio deste, na Rua João de Santarém, n.º 1, em
Lisboa.
3º - O Réu é cliente da Autora com o n. º 04513010.
4º - A Autora enviou ao Réu a factura n.º 20031075054,
emitida em 9/07/2003, no valor de € 3.998,51 e com data
de vencimento de 8/08/2003, da qual consta, além do
mais, o seguinte:
No campo “LEITURAS”: Anterior 369 m 3 – 2000/03/14
Actual 3469 m 3 – 2003/07/04;
No campo “CONSUMO” 3469 m 3.”
Seguidamente a estes, a expressão: “Leitura efectuada
pela Empresa; Deduzido consumo por estimativa”.
5º - Entre 14/03/2000 e 4/07/2003, a Autora utilizou o
método de estimativa para determinar o pagamento
efectuado pelo Réu.
6º - O Réu recebeu e consumiu água que a Autora lhe
forneceu no valor de € 3.998,51, conforme factura aludida
em 4 (quesito 1º).
7º - Só em 4/03/2003, quando se deslocou à morada do
Réu, a Autora apurou que o consumo de água foi superior
ao determinado por estimativa (quesito 3º).
8º - A factura aludida em 4 respeita à diferença entre o
consumo de água pelo Réu e a estimativa no período
entre 14/03/2000 e 4/07/2003 (quesito 4º).
9º - Durante o período temporal constante da factura
aludida em 4, a Autora não interrompeu o serviço
(quesito 5º).
10º - O Contador da água encontrava-se instalado na parte
exterior da casa do Réu e tem uma porta que é necessário
abrir para visualizar o consumo registado (quesito 6º).
11º - Entre 8/05/2000 e 5/11/2003, a Autora emitiu e
remeteu ao Réu as facturas constantes de fls. 74 a 95
(quesito 7º).
12º - Em 4/07/2000, em 3/01/2001, em 3/07/2001, em
3/01/2002, em 2/07/2002, em 3/01/2003 e em 2/07/2003,
a Autora deslocou-se ao local de consumo do Réu, sito na
morada deste, a fim de proceder à leitura do contador,
tendo feito constar tais datas, respectivamente, na factura
emitida no mês anterior à data em questão (quesito 8º).
13º - Em cada uma das datas referidas em 12, a Autora
não procedeu à leitura do contador (quesito 9º).
14º - No período compreendido entre 14/03/2000 e
4/07/2003, o Réu não comunicou à Autora a leitura do
contador instalado na sua morada (quesito 10º).
15º - Em 4/07/2003, a Autora procedeu à leitura do
contador sem ter avisado previamente o Réu de que ali se
iria deslocar (quesito 11º).
3.
A acção foi julgada improcedente e, em consequência, foi
o réu absolvido do pedido, com o fundamento de que se
verificara a excepção de caducidade do direito da ora
recorrente ao recebimento da quantia que a que se
arrogava, atento o disposto no n.º 2 do artigo 10º da Lei
23/96, de 26 de Julho.

A recorrente discorda da sentença porque, em seu


entender, a Exc. ma Juiz não terá feito uma correcta
interpretação das regras sobre o ónus da prova (artigos
342º e 343º CC), já que competiria ao apelado articular e
demonstrar determinados factos que a apelante considera
indispensáveis para a verificação da excepção da
caducidade consagrada no artigo 10º, n.º 2, da Lei 23/96,
nomeadamente, (i) que se verificou um erro; (ii) que o
erro verificado é imputável ao prestador do serviço; (iii) a
data em que procedeu ao pagamento da “importância
inferior” e (iiii) que, entre a data daquele pagamento e a
data em que lhe foi, pela primeira vez, exigido, o
recebimento da diferença, decorreram mais de seis meses.

Entendimento diferente é o do apelado. Segundo ele,


arrogando-se a apelante ser titular de um direito de
crédito no valor de € 3.998,51, resultante de um acerto de
facturação decorrente de um contrato de fornecimento de
água celebrado com o apelado, a ela competiria fazer a
prova da existência do alegado direito de crédito e, mais
ainda, que o mesmo era exigível.

Sendo estas as teses defendidas pelas partes nas suas


doutas alegações, vejamos de que lado estará a razão:

Considerando que o crédito de que a apelante se arroga


ser titular emerge de um contrato de prestação de serviços
de um bem essencial, concretamente, de um contrato de
fornecimento de água, importa atender ao regime
consagrado na Lei 23/96, de 26 de Julho, cuja disciplina
versa sobre a protecção do consumidor de bens
essenciais.

De facto, in casu, entre as partes foi celebrado um


contrato de prestação de serviço, mais concretamente de
fornecimento de água, nos termos do qual o prestador do
serviço (ora Autora) se obrigou a fornecer ao utente (ora
Réu) o bem água, mediante o pagamento, por este, das
quantias facturadas em função dos consumos efectuados.

Trata-se de um serviço público essencial, já que a água é


um bem de consumo universal.

Assim, a Lei 23/96, destinada a criar mecanismos


destinados a proteger o utente de serviços públicos
essenciais, consagrou expressamente o serviço de
fornecimento de água como um serviço público abrangido
por este regime jurídico.

O n.º 1 do artigo 4º impõe ao prestador do serviço o dever


de informação das condições em que o serviço de
fornecimento de água é realizado e a prestação de todos
os esclarecimentos que se justifiquem de acordo com as
circunstâncias. O dever de informar é, aliás, um aspecto
decisivo para a tutela dos direitos do consumidor.

Este dever de informação está também consagrado numa


dimensão mais concreta da prestação do serviço de
fornecimento – a facturação.

Estabelece o artigo 9º da citada Lei que, sobre os


prestadores de serviço de bens essenciais, impende o
dever de informação ao utente desses bens, sendo que
esse dever contempla, sobretudo, a disponibilização de
uma facturação detalhada.

Deste modo, o citado artigo 9º da Lei 23/96 estabelece


regras importantes de informação e de esclarecimento dos
utentes relativamente aos valores incluídos nas facturas
dos serviços públicos essenciais. Ao estabelecer o dever
de disponibilização de uma facturação detalhada, a Lei
reconhece que apenas assim é possível que o utente
verifique a regularidade da aplicação dos tarifários
progressivos da água, ou seja, a possibilidade de
verificação da aplicação concreta do tarifário por parte do
prestador do serviço.

Por conseguinte, impende, em nosso entender, sobre o


prestador de serviços o ónus de demonstrar o
cumprimento de todas as obrigações decorrentes da
celebração de um contrato de um bem essencial,
designadamente, a obrigação de apurar os consumos reais
de água gasta pelo utente e a obrigação de o informar do
valor do consumo real por ele efectuado.
Sucede, porém, que a facturação dos valores de consumo
de água, gás, electricidade cobrados pelos prestadores de
serviços aos seus utentes decorre, na maioria dos casos e
nos dias que correm, de um cálculo assente em meras
estimativas de consumo.

Também, no caso dos autos, a facturação era, conforme


acordado entre as partes, efectuada por estimativa, o que
significa que o cliente procede sempre ao pagamento de
uma mesma importância pré – determinada, mas está
obrigado a pagar a diferença entre o valor estimado e o
correspondente ao consumo efectivamente realizado (se
este for superior àquele), após a leitura do contador ou a
indicação, pelo próprio cliente, da leitura por si efectuada.

Não obstante se tenha tornado prática corrente a


facturação baseada em meras estimativas de consumo,
continua a impender sobre o prestador de serviços a
obrigação de disponibilizar aos seus utentes uma
facturação detalhada do consumo real efectuado e do
preço devido por aquele mesmo consumo.

Donde, no caso concreto, cabia à apelante na qualidade de


prestadora de serviços de bens essenciais, demonstrar que
cumpriu todas as obrigações decorrentes do contrato de
prestação de serviços celebrado com o apelado, entre as
quais a obrigação de proceder à leitura do consumo
efectivo de água na sua residência, cabendo ainda à
apelante demonstrar, atentas as regras do ónus da prova e
os mecanismos legais de protecção dos consumidores,
que o não cumprimento de tal obrigação não resultou de
culpa sua.

Acresce que “o legislador consagrou, no artigo 10º, o


prazo de apenas 6 meses para o prestador exigir o
pagamento do preço relativo ao fornecimento de água,
sendo que o mesmo prazo vigora para o exercício do
direito ao recebimento, por parte do fornecedor, da
eventual diferença de preço resultante de deficiente
facturação. Trata-se de uma opção do legislador que visa
proteger o utente de uma situação de acumulação de
dívidas, bem como evitar a inércia do fornecedor que
poderia prolongar por tempo inadequado a situação,
afectando a segurança do consumidor (para além de que
este prazo curto facilita qualquer exigência de prova ao
utente) António Costa, “O Contrato de Fornecimento de Água”, in Estudos
do Direito do Consumidor, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
n.º 4, 329..

Dispõe o citado artigo 10º:


1 – O direito de exigir o pagamento do preço do serviço
prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua
prestação.
2 – Se, por erro do prestador do serviço, foi paga
importância inferior à que corresponde ao consumo
efectuado, o direito ao recebimento da diferença de preço
caduca dentro de seis meses após aquele pagamento.

Como realça a sentença, citando um acórdão do STJ  Ac.


STJ, de 09.07.2003, in www.dgsi.pt, “trata-se de um normativo
que contempla, na respectiva formulação, duas diversas
situações: as de crédito do preço do serviço prestado e as
de crédito da diferença entre o preço facturado e o
correspondente ao da água fornecida. Para a primeira,
estabelece um regime de prescrição (n.º 1); sujeita a
segunda a caducidade (n.º 2)”.

Assim, um mesmo prazo curto – de 6 meses – serve para


fazer valer duas consequências jurídicas distintas,
correspondentes a dois institutos fundamentais no nosso
ordenamento jurídico, ambos destinados a regular os
efeitos do decurso do tempo: a prescrição e a caducidade.

In casu, está apenas em causa a questão da caducidade, ou


seja, a de saber se sobre o apelado deixou de impender a
obrigação de satisfazer o crédito sobre a diferença entre o
preço facturado e o correspondente ao da água fornecida.

Tal como ficou provado, é ponto assente que não foi paga
à Autora a totalidade da quantia devida pelo fornecimento
de água ao Réu. Durante cerca de três anos, este liquidou
apenas os montantes titulados pelas facturas emitidas com
base em meras estimativas de consumo e não os
montantes correspondentes ao consumo real, muito
superior àquele cálculo por estimativa.

Igualmente, todos aceitam que a factura apresentada a


pagamento corresponde a consumo efectivamente
debitado à residência do Réu, durante o período que
mediou entre as leituras do contador (cerca de quarenta
meses) efectuadas pela Autora.

A questão fundamental é a de saber se houve ou não


qualquer erro, isto é, falha, lapso ou engano do prestador
do serviço na cobrança do fornecimento de água que
impeça a facturação dos consumos como correcta, isto é,
correspondente à realidade dos consumos efectuados e,
em caso afirmativo, se o prestador de serviços foi
impedido pela autora no acesso ao contador da água.

Aqui chegados, não podemos esquecer que não existe um


dever do consumidor comunicar a leitura à fornecedora,
nem de se certificar que tal leitura é efectuada
periodicamente, não obstante a prestadora colocar à
disposição do consumidor variados meios para facilmente
efectuara a comunicação. Na verdade, a obrigação de
apurar os consumos reais é do prestador do serviço e não
do utente; a modalidade de cobrança do consumo por
mera estimativa reverte em benefício da entidade
cobradora, e não o inverso.

Donde, a ausência tão prolongada para a realização de


leituras por parte da EPAL consubstancia uma verdadeira
falha do prestador do serviço.

Mas terá a Autora sido impedida pelo Réu de poder


aceder ao contador da água?

Efectivamente, ficou provado que os funcionários da


apelante se deslocaram ao local de consumo e que,
(apesar disso), aquela leitura não se chegou a realizar
(quesitos 8º e 9º).

Tal circunstância não permite, porém, inferir, como infere


a apelante, que foi por dificuldade de acesso ao contador,
imputável ao Réu, que não se efectuou a leitura do
contador da residência do apelado.

Na verdade, como salienta o apelado, a Autora não logrou


demonstrar que deu efectivo conhecimento ao apelado de
quais as datas em que iria efectuar a leitura do contador
da água existente em sua casa, assim como não
demonstrou que, uma vez na residência do apelado para
proceder à leitura do seu consumo real, aquele não lhe
garantiu o acesso ao contador.

Pelo contrário, a leitura real, que deu origem à correcção


da facturação, foi feita sem dificuldades e sem que a
apelante tivesse avisado o apelado de que a iria realizar
(cfr. resposta ao quesito 11º).

Soçobra, pois, a tese, avançada pela Autora, de que a


leitura do consumo de água na residência do apelado não
se mostrou possível porque aquele não garantiu o acesso
ao contador.

Lógica, pois, a conclusão da sentença, quando salienta


que a apelante não logrou provar que a circunstância de
não ter procedido a leituras do consumo efectivo, na
residência do Réu, lhe não é imputável. E, contrariamente
ao que defende a apelante, era ao prestador do serviço que
cabia aquele ónus de prova, pois a norma do n.º 2, do
artigo 10º, da Lei 23/96, tem como escopo o interesse e a
protecção do consumidor.

O facto do apelado não colocar em causa a veracidade da


facturação ou a leitura do consumo real levada a cabo
pela recorrente não significa que o recorrido se tenha
conformado com a exigência do pagamento dos valores
que lhe são facturados pela apelante a título de acerto de
contas. Como é evidente, uma coisa é aceitar o quantum
do valor medido, outra coisa é aceitar pagar o seu preço,
facturado cerca de três anos e quatro meses depois da
última leitura ao consumo real.

O apelado, contrariamente ao alegado pela apelante,


nunca se reconheceu devedor dos valores que lhe foram
facturados pela apelante a título de acerto de contas, pelo
que se não verifica qualquer causa impeditiva da
caducidade prevista no artigo 331º do Código Civil.

O apelado sempre insistiu que aquele acerto resultava de


falha imputável à apelante, que não havia procedido à
leitura do contador de água existente na sua casa, durante
mais de três anos, apesar desta bem saber que, se, por erro
seu, enquanto prestador do serviço, foi paga importância
inferior à que corresponde ao consumo efectuado, o
direito de recebimento da diferença de preço caduca
dentro de seis meses após aquele pagamento (cfr. artigo
10º, n.º 2 da Lei 23/96).

E o objectivo do legislador, ao consagrar a fórmula do n.º


2 do citado artigo 10º, foi o de proteger os consumidores
de bens essenciais contra a possibilidade de, a todo o
tempo, poderem ser surpreendidos, pelos prestadores de
serviço, com a exigência de cobrança de importâncias
decorrentes de acertos de facturação com origem no
apuramento de diferenças entre os consumos facturados e
pagos e os consumos realmente efectuados, cuja concreta
medição só ao prestador de serviços incumbe.

Por conseguinte, naquele diploma legal, estabeleceu-se


assumidamente que o não exercício desses direitos de
crédito pelo prestador de serviços durante certo período
de tempo acarretaria a sua caducidade.

Já se salientou que o recorrido, entre 14/03/2000 e


4/07/2003, por razões que só a apelante poderá explicar,
apenas foi chamado a liquidar os montantes titulados
pelas facturas emitidas com base numa mera estimativa
de consumo e não o valor correspondente ao consumo
real, sendo que só em 9/07/2003 a apelante entendeu por
bem cobrar ao apelado a diferença entre o consumo
facturado e o consumo real ao longo dos últimos três
anos.

E só à apelante caberá a responsabilidade pela eventual


dificuldade em apurar a quais dos pagamentos efectuados
pelo apelado, naquele período de quarenta meses, se
deverão imputar as diferenças de preços globalmente
calculados pela recorrente, com respeito a um único
período temporal que decorreu de 14/03/2000 a
4/07/2003, pelo que se entendeu por bem socorrer-se de
estimativas para facturar os consumos de água ao
apelado, deve arcar com todas as consequências que daí
decorrem.

Por conseguinte, a caducidade do direito ao recebimento


das diferenças de preço, apuradas com respeito aos
consumos reais alegadamente efectuados pelo apelado,
foi repetidamente ocorrendo nos sucessivos períodos de
seis meses após o pagamento pelo apelado de cada uma
das facturas que a apelante lhe foi enviando, com
estimativas de consumo, no período compreendido entre
14/03/2000 e 4/07/2003.

A impossibilidade de se fazer a rigorosa correspondência


temporal entre as diferenças de consumo apuradas e os
pagamentos (por estimativa) inferiores que foram sendo
feitos pelo apelado resulta da metodologia – a estimativa
– adoptada pela apelante durante mais de três anos, pelo
que seria impossível, como pretende a apelante, que o
apelado demonstrasse quais as datas em que havia
efectuado pagamentos inferiores aos consumos realmente
efectuados até essas mesmas datas.

Temos, assim, que, atenta a matéria de facto tida por


provada, a caducidade do direito da apelante ocorreu por
erro seu uma vez que não procedeu à leitura do contador
da água existente na residência do apelado senão em
4/07/2003, sendo certo que a realização atempada daquela
leitura teria permitido não só apurar o consumo real de
água, mas também a sua liquidação em prazo razoável
para o efeito.

E, repete-se, era à Autora que incumbia provar que não


foi por culpa sua que, durante um longo período de tempo
(superior aos seis meses a que se refere o n.º 2 do artigo
10º da Lei 23/96), não houve leitura dos consumos reais
do Réu.

Por conseguinte, não fora o erro e a inércia da apelante,


não teria esta continuado a fornecer ao apelado, por tão
longo período de tempo, um bem cujo consumo real não
se encontrava a ser liquidado na sua totalidade.

E o erro da apelante é grosseiro e evidente, pois estimou


os consumos de modo de tal forma deficiente que a sua
estimativa se veio a mostrar absolutamente errada,
quando confrontada com o consumo real medido. E
estando ao seu alcance corrigir aquela estimativa – errada
– mediante leituras regulares e reais dos consumos
efectuados, aceitou manter-se no desconhecimento desses
mesmos consumos, omitindo as leituras durante um
período de mais de três anos.
4.
Pelo exposto, na improcedência da apelação, confirma-se
a sentença recorrida.
Custas pela apelante.

Lisboa, 29 de Março de 2007.


Granja da Fonseca
Pereira Rodrigues
Fernanda Isabel Pereira
___________________________
António Costa, “O Contrato de Fornecimento de Água”, in Estudos do Direito
do Consumidor, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, n.º 4, 329.
Ac. STJ, de 09.07.2003, in www.dgsi.pt

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