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METODOLOGIA DA

PESQUISA 1
A CIÊNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS
E A IMPORTÂNCIA DA
PESQUISA CIENTÍFICA
APRESEN TAÇÃO
A construção do pensamento científico remonta há pelo menos 40.000
anos com o surgimento do Homo sapiens, espécie que dá origem ao homem
moderno, capaz de se comunicar com língua falada e também usufruir
os recursos naturais, através de adaptações ao meio e também através da
construção de utensílios primitivos que permitiam a sua sobrevivência. Talvez
há quem discorde dessa afirmação, mas é preciso deixar clara esta conexão
entre a evolução da consciência do homem e o pensamento científico. E é
desta forma que se percebe a evolução da humanidade, principalmente em
relação à utilização do meio ambiente no qual está inserida. Obviamente
que isso envolve a adoção e o domínio de práticas e métodos, visando à
sobrevivência, exploração e perpetuação da espécie, cuja experiência foi
amadurecendo com o passar dos séculos.

O psiquiatra Carl Gustav Jung (2008, p. 23) apresenta o processo de


dissociação da consciência humana através da perda da “alma do mato”,
fenômeno este que seria o responsável pela consciência do homem moderno
e, consequentemente, do pensamento científico.

A seguir serão abordados assuntos relativos ao surgimento da ciência,


construção do pensamento científico, a revolução científica e de que forma
esses acontecimentos moldaram e contribuíram de forma significativa para
o desenvolvimento da sociedade.

Organização Reitor da Pró-Reitora do EAD Edição Gráfica Autor


UNIASSELVI e Revisão
Elisabeth Penzlien Prof.ª Francieli Stano Luis Augusto
Tafner Prof. Hermínio Kloch Torres UNIASSELVI Ebert
.01
A CIÊNCIA E SUAS
CARACTERÍSTICAS E A
IMPORTÂNCIA DA PESQUISA
CIENTÍFICA
INTRODUÇÃO
A construção do pensamento científico remonta há pelo menos 40.000
anos com o surgimento do Homo sapiens, espécie que dá origem ao homem
moderno, capaz de se comunicar com língua falada e também usufruir
os recursos naturais, através de adaptações ao meio e também através da
construção de utensílios primitivos que permitiam a sua sobrevivência. Talvez
há quem discorde dessa afirmação, mas é preciso deixar clara esta conexão
entre a evolução da consciência do homem e o pensamento científico. E é
desta forma que se percebe a evolução da humanidade, principalmente em
relação à utilização do meio ambiente no qual está inserida. Obviamente
que isso envolve a adoção e o domínio de práticas e métodos, visando à
sobrevivência, exploração e perpetuação da espécie, cuja experiência foi
amadurecendo com o passar dos séculos.

O psiquiatra Carl Gustav Jung (2008, p. 23) apresenta o processo de


dissociação da consciência humana através da perda da “alma do mato”,
fenômeno este que seria o responsável pela consciência do homem moderno
e, consequentemente, do pensamento científico.

A seguir serão abordados assuntos relativos ao surgimento da ciência,


construção do pensamento científico, a revolução científica e de que forma
esses acontecimentos moldaram e contribuíram de forma significativa para
o desenvolvimento da sociedade.

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1 O SURGIMENTO DA CIÊNCIA
Posterior ao desenvolvimento do homem moderno e seu processo de
adaptação e sobrevivência na natureza, uma das primeiras pessoas a estruturar
suas ações em decorrência de métodos foi o francês René Descartes, nascido
em 31 de março de 1596. Assim, o surgimento da ciência e/ou pensamento
científico pode ser relacionado à vida e à obra do primeiro filósofo moderno
da história, que, pela primeira vez, sentiu a necessidade de verificar, analisar,
sintetizar e enumerar todas as coisas a que se dispunha entender. E, desta
forma, contribui de maneira significativa para as ciências naturais, a física e
a matemática.

O francês também é conhecido como pai da filosofia moderna e


considerado um dos pensadores mais importantes da história. Muitos
pesquisadores afirmam que a partir de René Descartes inaugura-se o
racionalismo, oposto ao empirismo, ou seja, a ausência de métodos para se
alcançar resultados.

E, de certa forma, toda a sociedade moderna pôde, através da matemática,


da física e da observação de fenômenos naturais, entender o seu papel no
universo e como contribuiu para a perpetuação da espécie humana. Desde a
utilização de tecnologias sofisticadas para a cura de doenças degenerativas e
letais, até viagens espaciais, visando à descoberta de novas galáxias e planetas.
Dessa forma, fica evidente que sem a sistematização das observações, assim
como a coleta de informações e observação dos diversos fenômenos, nada
disso seria possível.

FIGURA 1 - RENÉ DESCARTES, O CIENTISTA PIONEIRO DO MOVIMENTO


CIENTÍFICO

FONTE: Disponível em: <https://seuhistory.com/etiquetas/rene-descartes>.


Acesso em: 12 mar. 2017.

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É a i n d a a t ra v é s d a c o r re n t e d o p e n s a m e n t o ra c i o n a l i s t a e d o
desenvolvimento do método matemático que muitos dos principais pensadores
dos séculos XVI e XVII afirmam a capacidade do intelecto humano para a
descoberta das verdades, fundada na convicção de que a razão constitui o
instrumento fundamental para a compreensão do mundo.

1.1 O PENSAR CIÊNCIA


De acordo com Pinker (1989), a evolução do homem teria produzido um
cérebro capaz de realizar atividades especializadas, como já havia suposto
Jung (2008), através da aquisição da consciência. Dessa forma, atividades
complexas, como a matemática, a ciência e a arte, poderiam ser executadas
e também aprimoradas. Pinker (1989) ainda se pergunta se tais habilidades
poderiam conferir ao ser humano algum tipo de vantagem seletiva diante das
outras espécies. Acredita-se que sim, pois dadas as condições morfológicas
do próprio homem, ele não estaria no topo da cadeia alimentar caso não
possuísse as habilidades acima mencionadas. Mas, como surgiu a ciência?

Para Mithen (2002), a capacidade de pensar cientificamente se origina


na mente humana a partir do momento em que três propriedades críticas
aparecem e interagem, a seguir apresentadas:

• Habilidade de gerar e testar hipóteses (uma propriedade presente não apenas


em humanos, mas em outras espécies animais também);
• Capacidade para desenvolver e utilizar ferramentas para resolver problemas
(para os humanos primitivos essa capacidade torna-se ainda mais relevante
com o uso de sistemas externos de memória, por exemplo, pinturas rupestres
e entalhes em madeira, que serviam para preservar as informações);
• Uso de metáforas e analogias comparativas. De acordo com Dennett (1991),
esses atributos podem se restringir a um domínio apenas, mas se tornam
muito mais poderosos quando ultrapassam os limites entre os domínios,
como na associação de uma entidade viva com algo que é inerte, ou na
geração de uma ideia sobre algo que é tangível.

Ainda segundo Mithen (2002), a capacidade de interligar essas três


propriedades e, em particular, de explorar o uso de metáforas e analogias
envolvendo elementos de diferentes domínios, se tornou possível entre 100
e 30 mil anos atrás, quando a mente humana adquiriu o que ele chamou
de “fluidez cognitiva” e consciência, como também observado e relatado
anteriormente por Jung (2008).

Vale destacar que a ciência não surgiu de repente ou foi inventada num
dado momento da história. Como condição permanente da raça humana, a
ciência evoluiu ao longo do tempo. Conforme as pessoas descobriam novas

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formas de viver, se relacionar, de utilizar o meio ambiente à sua volta, assim
como usufruir os recursos naturais através de novas ferramentas e técnicas,
também desenvolviam novas maneiras de pensar e explicar os fenômenos
no seu entorno, fato este que continua evoluindo até os dias de hoje.

No entanto, existem alguns autores que reforçam a ideia de que


o pensamento científico estivesse dissociado da condição de evolução
humana, e sim, atrelado a uma entidade mística ou espiritual. Assim, a
origem do pensamento científico poderia ter sido causada por um processo
de gênese divina. Esse fato poderia ser evidenciado através de exemplos
históricos e mesmo arqueológicos, que poderiam indicar esse fenômeno.
Mas, ainda assim, coloca-se em xeque esse tipo da condição humana, visto
que essa necessariamente precisa estar separada da condição do pensar
cientificamente, e que até hoje sustenta religiões e credos. Ou seja, o pensar
científico e o pensar amparado por crenças místicas e religiosas são duas
correntes filosóficas que não podem ser misturadas, e que continuam a existir.

De acordo com o cientista e sociólogo Émile Durkheim (2003), o papel


da religião é o de estruturar a sociedade, e para este mesmo autor, os rituais
e práticas religiosas seriam mecanismos de manifestação da solidariedade e
do espírito colaborativo. Já o pesquisador Rappaport (1999) vai mais além,
e identifica o rito como responsável pelo surgimento da própria linguagem,
característica essencial para a evolução humana.
Ainda dentro desse mesmo contexto, alguns pensadores julgam ser
necessário que a construção do conhecimento possa evoluir através da
conectividade entre as duas correntes, ou seja, a religiosa e a científica. Em
uma visão mais sistêmica e holística, ambos os pensamentos poderiam se
conectar a ponto de favorecerem um ao outro. No entanto, esse curso quer
apresentar a origem do conhecimento científico, e é isso que vamos detalhar
em seguida.

1.2 A REVOLUÇÃO CIENTÍFICA


O período compreendido entre os séculos XVI e XVIII denomina-se de
Revolução Científica, e a Ciência, que até então estava atrelada à Filosofia,
separa-se desta e passa a ser um conhecimento mais estruturado e prático,
principalmente atrelado a metodologias e técnicas que permitiam a um
pesquisador alcançar determinado objetivo. Os principais movimentos estão
atrelados ao renascimento cultural, à imprensa, à Reforma Protestante e
ao hermetismo.

De acordo com Tosi (1998), a partir do século XVII, quando a tradição


mágica ainda fazia um impacto substancial nas camadas populares, o prestígio
desta linha de pensamento, do místico, tinha declinado fortemente na classe

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erudita. A razão dessa mudança fundamental provocada nas mentalidades
é atribuída à Revolução Científica, decorrente da obra de Copérnico, das
descobertas de Galileu e Kepler e do triunfo da filosofia mecanicista.

Ainda segundo a mesma autora, esse triunfo foi duplo, pois envolvia a
rejeição e o descrédito das duas filosofias aceitas até então: a escolástica e
a magia natural. A convicção de que o universo estava sujeito a leis naturais
acabou com a crença na eficácia de fórmulas de inspiração divina. O impacto
mais decisivo foi dado pela filosofia cartesiana, ao estabelecer que não existem
forças ocultas, nem simpatias ou antipatias; que os fenômenos naturais podem
ser explicados em termos de tamanhos, formas e velocidades de partículas. Os
fenômenos ocultos ou não são reais ou têm explicação mecânica. A matéria é
inerte e desprovida de sensação e consciência. A mente humana e seu poder
de raciocínio não são propriedades materiais. A mente humana, considerada
um presente de Deus, é imaterial e imortal. A separação do mundo do espírito
do mundo da matéria foi um passo fundamental para o desenvolvimento da
ciência, pois deixava intacto o poder e a autoridade da religião no primeiro,
e permitia utilizar a experimentação para investigar o segundo.

A “filosofia cartesiana” ou “racionalismo cartesiano”  é um pensamento


estabelecido pelo filósofo René Descartes em suas obras o “Discurso do
Método” (1637) e “Meditações Metafísicas” (1641), em que expressa sua
preocupação com o problema do conhecimento. O ponto de partida é a
busca de uma verdade primeira que não possa ser posta em dúvida, e por
isso busca, através de um método, a verdade.

O pensamento cartesiano pregava a utilização de um senso crítico


mais elevado e uma maior atenção às necessidades humanas, ao contrário
do teocentrismo da Idade Média, que pregava a atenção total aos assuntos
divinos e, portanto, um senso crítico menos elevado. Este maior senso crítico
exigido pelo humanismo permitiu ao homem observar mais atentamente os
fenômenos naturais em vez de renegá-los à interpretação da Igreja Católica.

Houve antes muitas teorias revolucionárias que diferem na intensidade


com que influenciaram o pensamento humano. Algumas representaram
profundas modificações na forma do homem examinar a natureza, por exemplo,
a introdução de um tratamento matemático na descrição dos movimentos
dos planetas, pelos babilônios e depois aperfeiçoada pelos gregos. Outras
representaram microrrevoluções, como o sistema de classificação de seres
vivos, introduzido por Aristóteles.

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Com esta revolução, a ciência mudou sua forma e sua função, passando
a ser repensada nos moldes da nova sociedade que estava emergindo nesta
época. Os objetivos do homem da ciência e da própria ciência acabaram sendo
redirecionados para uma era livre das influências místicas da Idade Média.

Lenzi e Brambila (2006) destacam o fato de ainda sermos influenciados


por conceitos, métodos e pensamentos que hoje não são mais apropriados
e adequados à complexidade do mundo atual. Dessa forma, ocorre uma
quebra de paradigmas, necessitando-se de novas teorias e novos instrumentos
que nos auxiliam na interpretação e na conceituação da vida pós-moderna.
Na figura a seguir podem-se observar os principais eventos relacionados à
revolução científica.

FIGURA 2 - ALGUNS DOS PRINCIPAIS EVENTOS QUE DERAM ORIGEM À REVOLUÇÃO


CIENTÍFICA

FONTE: Disponível em: <https://pt.slideshare.net/HCA_10I/lumininsmo-a-revoluo-


cientfica-e-o-iluminismo-na-europa>. Acesso em: 20 mar. 2017.

O fato é que hoje não mais vivemos sem ciência. Muitas descobertas
derivaram e ainda estão sujeitas às leis pensadas na época. Ou seja, foi a
forma como concebemos estar aqui hoje e perpetuando a espécie humana.
E a curiosidade através de métodos científicos nos fez pensar através de
caminhos que permitissem isso. Basta olharmos para a Teoria da Evolução de
Darwin, que explica a sucessão das espécies de plantas e animais na Terra,
baseada na seleção natural.

De acordo com Gleiser (2007), essas teorias poderiam ser suposições de


ideias propostas com a intenção de explicar algo, com base em princípios ou
leis que são independentes daquilo que está sendo explicado. E também, vale

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muito a intenção do cientista. Não importa se o mesmo está fazendo ciência
teórica ou experimental, o que vale é o fato do seu comprometimento de
explicar da melhor forma possível determinado fenômeno natural. E dessa
mesma forma que nos seres humanos, caminhamos até os dias atuais.

2 O CONCEITO DA CIÊNCIA
Definido o período de revolução científica e suas principais contribuições
para a humanidade, vamos entrar agora no que vem a ser ciência. Por conceito
e epistemologia da palavra, ciência deriva do latim “scientia”, que significa
“saber ” ou, ainda, “conhecimento”. Assim, podemos entender que é um
conceito que abarca diversos tipos de saberes, e que todo o conhecimento
gerado deriva de práticas e métodos de estudo, baseados em princípios certos.
Muitas vezes está relacionada a teorias científicas, que são a comprovação de
hipóteses, ou seja, ideias sobre o comportamento de “algo” em determinada
área do conhecimento.

Mas ciência vai muito mais além. E, por isso, a ausência de preconceitos
e juízos de valor é tão importante para se alcançar o resultado esperado.
Normalmente a ciência falha, por tentativa e erro, e em muitos casos, aquilo
que é considerado correto hoje, pode não ser amanhã. E justamente é esse
o ponto que faz com que a ciência evolua. Pois se existem evidências que
comprovam determinado fenômeno hoje, mas não mais amanhã, toda a
teoria e resultados observados devem ser revistos e, se possível, deve-se
propor novas ideias. Dessa forma, a ciência não é dogmática, ou seja, não
tem “verdades absolutas”, como a maioria das religiões assim descreve.

2.1 CIÊNCIA E FÉ
Em aparente contradição, aos olhos de muitos cientistas, fé, religião
e ciência se conectam de modo interdisciplinar e buscam a compreensão
sistêmica e holística do universo. Porém, ainda existem muitas barreiras
a serem ultrapassadas. Se, por um lado, a ciência explica boa parte dos
fenômenos naturais, e através de leis universais da física se comprova parte
da origem do universo, por outro lado, muitos aspectos relacionados à sua
origem e expansão continuam sem explicação, e para isso, acreditar em um
Deus parece ser a única explicação.

Durante muitos anos, as ciências e as religiões se confrontam em ideias


numa disputa sem razão alguma. Se pensarmos nos campos em que cada
uma atua, veremos que ambas podem coexistir e discursar a respeito de um
mesmo assunto. A religião tem por finalidade "ligar" o ser humano a Deus,
divulgando uma vontade divina. Em razão disto, a Igreja deve sempre interagir

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sobre os mais diversos campos da sociedade para garantir que a vontade de
Deus está sendo atendida pela humanidade. A religião vem também explicar
o "porquê" das coisas, dos acontecimentos e de tudo o que nos cerca. Através
dela sabemos que tudo que existe na natureza procedeu de Deus, foi uma
vontade divina que deu origem ao nosso planeta, aos mares, às plantas, aos
animais e aos seres humanos (LENZI; BRAMBILA, 2006).

De acordo com os mesmos autores, para se fazer ciência é necessário


testar várias vezes a mesma hipótese até que se possa dizer se ela é verdadeira
ou não. Dentro dessa perspectiva, existem muitos pesquisadores que são
devotos de uma ou outra religião, porém o que ocorre com os cientistas é que
em suas pesquisas eles simplesmente ignoram a existência de Deus, mas isso
não significa que eles neguem a sua existência. Os cientistas que creem em
Deus sabem que os fatos se deram pela vontade de Deus, mas eles querem
saber explicar determinado fenômeno.

Existem ainda outras questões, quando aqueles devotos da corrente


religiosa afirmam que Deus, como criador universal, poderia ser entendido
como uma entidade que explicaria o porquê das coisas. Já cientistas estariam
mais preocupados em saber como tudo no universo foi criado. Assim
poderíamos ter a origem da Teoria do Big Bang, ou mesmo da evolução, de
Charles Darwin. Dessa forma, o inconformismo entre religião e ciência deveria
ter acabado há muito tempo, pois não há razões para esta disputa, sendo
que ambas teriam processos de entendimento completamente distintos. Se
ambos se respeitassem e ouvissem as ideias do outro, não teríamos tantas
diferenças entre os próprios seres humanos.

3 CARACTERÍSTICAS DA CIÊNCIA E DO SEU PESQUISADOR


No dia a dia, a vida de cientista depende muito do tipo de ciência que
se deseja fazer e que se pratica. Existem aqueles que trabalham na indústria e
que, portanto, usam a sua pesquisa para aprimorar processos ou produtos para
a empresa que os abrigam. Isso pode ocorrer, por exemplo, com a indústria
farmacêutica, que emprega biólogos e químicos, ou ainda, na indústria
aeroespacial, que emprega físicos e engenheiros (GLEISER, 2007).

Nesse tipo de trabalho existe muita prática experimental, e esse tipo de


trabalho também é muito comum em universidades e centros de pesquisa.
No entanto, nas instituições de ensino, normalmente busca-se aprofundar o
conhecimento sobre determinada prática ou experimento, assim como nosso
entendimento sobre o meio ambiente que nos cerca. E nas universidades
vamos encontrar ainda os pesquisadores que, além de conduzirem seus
experimentos práticos, dividem suas horas em sala de aula, dedicando-se
ao ensino. Os mais teóricos tendem a trabalhar em suas salas, com ou sem

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computadores, sozinhos, ou mais comumente, em grupos de pesquisa.
Discutem-se ideias, equações e gráficos, e têm como objetivos principais a
validação de hipóteses, antes mesmo de testá-las em um laboratório.

Os cientistas que trabalham nas universidades funcionam como um tipo


de “controle de qualidade”. Isso para evitar que os cientistas experimentais
percam o seu tempo com ideias que não têm a mínima chance de estarem
corretas. E isso ocorre através da busca de erros matemáticos na formulação
da teoria, ou ainda, por erros em programas de computadores e conceitos
aplicados erroneamente.

3.1 A CIÊNCIA NO BRASIL


Diferentemente de países do primeiro mundo, no Brasil a pesquisa se faz
essencialmente nas universidades. Como vimos anteriormente, os docentes
pesquisadores normalmente validam e testam ideias ou hipóteses, mas não
é comum o desenvolvimento de produtos ou serviços. E dentro dessa ótica,
o cientista da universidade deveria se aproximar das empresas, ou ainda,
a indústria deveria investir mais em inovação. Ou seja, o cientista deveria
encontrar muito mais espaço de trabalho nas empresas, e não buscar somente
nas escolas espaços para seguir uma carreira profissional.

Esse cenário é completamente diferente nos países desenvolvidos, onde
as indústrias mais competitivas admitem pesquisadores para pensarem novos
produtos, processos e serviços. E muitas dessas ideias poderiam ter origem
na universidade, já testadas como protótipos e projetos, e se desenvolverem
para a produção em escala nas empresas. O Brasil ainda adota uma postura
passiva e prefere esperar a aquisição das tecnologias emergentes. Em suma,
não desenvolve e paga por aquilo que outros países desenvolvem. Prova
disso é que em muitos casos e áreas do conhecimento, sempre figura atrás
em rankings de inovação e desenvolvimento. Outras áreas ainda podem ser
consideradas inovadoras no Brasil, como é o caso da exploração de petróleo
em águas profundas, mas são exceção à regra. Em nosso país, o “ouro negro”
só existe em grandes profundidades, e para que esse recurso natural pudesse
ser utilizado, se fez necessário o desenvolvimento de novas tecnologias que
nem mesmo outros países dispunham.

Ao que parece, as autoridades brasileiras sabem qual é o caminho a seguir
para tornar o país mais competitivo. Nossos cientistas estão entre os mais
proeminentes, porém ainda sem o prestígio que lhes deveria ser dado. Outros
seguem carreira no exterior, nas mais prestigiosas empresas e universidades.
Enquanto isso, nadamos contra a maré, em total desvantagem na corrida do
desenvolvimento.

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Universidade: doutores que não chegam às empresas e à pesquisa na
indústria do Brasil

A maior parte dos pesquisadores brasileiros está nas instituições de Ensino


Superior – 67,5% do total em 2010 –, enquanto nas empresas a proporção
é de apenas 26,2%, bastante abaixo dos índices de Estados Unidos, Coreia,
Japão, China, Alemanha, França e Rússia. Essa situação, reconhece o
documento  Balanço das Atividades Estruturantes 2011, do MCTI, é uma
das causas da dissociação entre o avanço científico e a incorporação da
inovação tecnológica à base produtiva, especialmente na indústria do
Brasil.

De acordo com o presidente do CNPq, Glaucius Oliva, uma pesquisa


feita em 2008 com todos os doutores brasileiros formados entre 1996 e
2006 revelou que quase 80 mil deles estavam no Brasil, 97% empregados.
Desse total, 80% atuavam no setor educacional. Outros 11% estavam na
administração pública e menos de 5% nas empresas. Nos Estados Unidos,
a proporção de doutores na indústria chega a 40%, informou Oliva.

Segen Estefen, diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação


e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), afirmou durante o seminário promovido pela CCT do
Senado que, “no Brasil, os doutores não vão para as indústrias, com raras
exceções, como as estatais, a Petrobras e algumas empresas do setor
elétrico. As empresas privadas não criam núcleos para fazer interface com a
universidade. Sem um grupo de doutores, não tem como fazer a interface”.

Não é possível esperar que os menos de 50 mil cientistas que trabalham


em pesquisa na indústria brasileira possam competir com os 166 mil que
trabalham em empresas na Coreia do Sul e mais de 1 milhão de cientistas
em empresas nos EUA, de acordo com Carlos Cruz, professor da Fapesp.
“Mesmo que o Brasil tenha demonstrado alguns sucessos nessa área —
como a Embraer, a Petrobras ou o agronegócio movido pela Embrapa —,
falta-nos a capacidade de realizar isso repetida e continuamente”, alerta.

Exigências para professores das universidades públicas do Brasil, como a


dedicação exclusiva ou em tempo integral, foram consideradas por vários
dos palestrantes como entraves à parceria com empresas e à participação
desses pesquisadores em projetos inovadores fora do ambiente das
universidades. A excessiva regulamentação, a falta de autonomia das
universidades para firmar parcerias com a indústria e dispor do tempo dos
professores e dos recursos completam o cenário inóspito para a pesquisa
traçado pelos participantes do seminário.

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Glaucius Oliva cita o exemplo norte-americano: “O professor universitário
nos Estados Unidos pode abrir uma empresa no seu departamento, sem
que esteja violando a legislação do tempo integral e educação exclusiva.
No Brasil não pode. Se abrir uma empresa, pode ser processado, porque
está violando o tempo integral e você é um funcionário público”.

“Nos Estados Unidos, um projeto entre uma empresa e uma universidade


não passa pelo governo. Tem que ser feito dentro das linhas oficiais, mas
não existe controle governamental sobre o que a indústria pode ou não
fazer com a universidade. Se a Sloan Foundation, que dá muito dinheiro à
pesquisa, resolve dar US$ 20 milhões para pesquisa em desenvolvimento
de tecnologia de raios X espacial, por exemplo, várias universidades
vão apresentar projetos para a fundação. É uma competição duríssima,
completamente desligada do governo”, exemplifica o cientista Marcelo
Gleiser. Eles têm carga horária de seis a 12 horas de aula por semana,
devendo dedicar o restante do tempo à pesquisa.

Fonte: BRASIL, 2010. Universidade: doutores que não chegam às empresas


e à pesquisa na indústria do Brasil. Disponível em: <http://www.senado.
gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/inovacao/universidade-doutores-
empresas-pesquisa-na-industria-do-brasil.aspx>. Acesso em: 3 abr. 2017.

3.2 FINANCIAMENTO DOS PROJETOS DE PESQUISA NO


BRASIL
No Brasil, algumas agências de fomento à pesquisa atuam de forma
expressiva. Normalmente, essas autarquias provêm recursos para que os
pesquisadores, seja na indústria, ou ainda nas universidades, possam dar
continuidade a suas pesquisas. Normalmente, a cada ano, os editais são
lançados, e os cientistas precisam disputar parte dos recursos disponibilizados
pelo governo federal. É o caso do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPQ), que todos os anos disponibiliza recursos para
diversas modalidades de pesquisa, seja para acadêmicos ou pesquisadores
seniores.

O grande problema ainda é a dependência dos recursos públicos. Se
houvesse maior integração entre os setores público e privado, as chances
de caminharmos a passos mais largos seria maior. A dependência de
aporte de recursos financeiros somente dos recursos públicos diminuiria e
o desenvolvimento de produtos e processos pensados à necessidade das
empresas alcançaria patamares expressivos.

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Fora o CNPQ, outras instituições financiam projetos. Não somente
públicas, obviamente. Nos dias atuais é mais comum termos convênio entre
empresas e universidades, para a prestação de serviços ou desenvolvimento
de projetos com alguma necessidade específica, mas ainda longe do ideal.
Fundações sem fins lucrativos e de diversas naturezas oportunizam a
pesquisadores premiações distintas ou ainda valores significativos na busca
de incentivar a pesquisa nos campos experimental e teórico. Outras autarquias
públicas são as Fundações de Amparo à Pesquisa Estaduais (FAPESC, FAPESP
etc.), ou ainda, a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP). Bolsas de
pesquisa também são mais comuns entre professores-pesquisadores, e se
comprovadas experiências na sua produtividade científica, recebem recursos
para continuidade da pesquisa. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES) também auxilia professores do Ensino Superior
a realizarem seus trabalhos, seja com aporte de insumos financeiros e/ou
bolsas para mestrado e doutorado. Em alguns casos essas bolsas levam o
cientista para outros países, a fim de compartilhar experiências e fomentar o
intercâmbio e desenvolvimento de uma área específica desses países.

Em resumo, o Brasil, ainda que tenha proporcionado oportunidades aos


seus pesquisadores, precisa perceber a necessidade de investir cada vez mais
em pesquisa e desenvolvimento. Isso não implica necessariamente inventar a
roda, mas de não depender única e exclusivamente de tecnologias importadas
a um custo bem alto. Crescemos muito em nossa produção científica, ou
seja, publicação de artigos em revistas científicas, mas ainda não somos
referenciados por outros pesquisadores, justamente por não termos tradição
nessa área.

Como brasileiros, precisamos aprender a dar valor às ideias originadas


em nosso país. Nas escolas e universidades precisamos entender que a pura
repetição de conhecimento não leva a caminhos profundos de aprendizado.
E assim, entender de uma vez por todas que nosso modelo de educação
também está atrasado. Os acadêmicos e professores precisam ensinar através
de projetos e em um ambiente em que o aluno seja o protagonista. Em uma era
cada vez mais dependente de tecnologia, ainda caminhamos a passos muito
lentos dentro de uma proposta robusta para o desenvolvimento científico e
tecnológico, e muito há de ser feito. Precisamos acordar!

3.3 INÍCIO DA CARREIRA CIENTÍFICA


Certamente, todo início da carreira de um cientista, não só no Brasil,
começa com o seu envolvimento em projetos de pesquisa de caráter básico
e experimental. E nessa frente o professor que orienta o acadêmico tem papel
decisivo em estimular ou anular o futuro pesquisador. Digo isso, pois, muitas
vezes, por pura vaidade, o professor-orientador apenas utiliza a “mão de obra
aprendiz” para executar tarefas que ao cientista sênior já não interessam mais.
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E nessa etapa da educação universitária, os professores deveriam
estimular todo e qualquer candidato que se proponha a desenvolver alguma
ideia, por mais absurda que pareça. Obviamente que muitos dos acadêmicos
surgem com projetos que precisam ser lapidados, e torná-los exequíveis é
parte do processo de entendimento de que ciência se constrói de forma
contínua. É preciso entender que às vezes nossas ideias são uma pequena
porção de um todo.

Todo o processo de construção de um projeto de pesquisa, assim como


as possibilidades de financiamento, iremos ver mais adiante. Para agora, é
preciso entender que as possibilidades existem, mesmo para alunos do início
da faculdade. Normalmente, esse perfil de estudante irá seguir a carreira
acadêmica, e posterior à graduação inicia o seu mestrado, doutorado e pós-
doutorado. Por exemplo, o CNPQ, citado anteriormente, tem um programa
chamado de PIBIC, que auxilia jovens em início de carreira científica,
concedendo ao professor-orientador do projeto e também ao acadêmico,
bolsas de iniciação científica. Alguns estados da federação também concedem
esse tipo de benefício. É o caso do Estado de Santa Catarina com o programa
UNIEDU, no qual acadêmicos podem desenvolver ideias e terem descontos
em suas mensalidades.

Enfim, as oportunidades existem. Porém, o que se observa nas universidades
é que é cada vez menor o interesse do acadêmico pesquisador. Afinal de
contas, você precisa dedicar parte do seu tempo à pesquisa que se propõe.
E corroborando o fato de que estamos em um tempo onde a informação
já não é mais o problema, afinal de contas, está em todos os lugares, gerar
novo conhecimento é a grande chave para o sucesso profissional. É preciso
entender que são atividades desse caráter que irão desenvolver e diferenciar
cada acadêmico em sua trajetória profissional. É esse tipo de profissional,
criativo e inovador, que pensa soluções para as suas necessidades e empresas,
que terá as mais ricas experiências e oportunidades.

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LEITURA COMPLEMENTAR
A ciência da fé

“Como você professa sua fé?”, pergunta o médico Paulo de Tarso Lima
a seus pacientes na primeira consulta. Conversar sobre isso virou rotina no
setor de oncologia em um dos mais conceituados hospitais do Brasil, o Albert
Einstein, em São Paulo, onde Lima é coordenador do Serviço de Medicina
Integrativa. Se o doente vai à missa, ele anota na receita: aumentar a frequência
aos cultos. Se deseja a visita de um padre, rabino ou pastor, o hospital manda
chamar. Se quiser meditar, professores de ioga são convocados. No hospital,
a fé é uma arma no tratamento de doenças graves.

A Santa Casa de Porto Alegre também trabalha nesse sentido. O hospital


está realizando uma pesquisa inédita, em parceria com a Universidade
Duke, nos Estados Unidos, para mensurar os benefícios biológicos da fé. O
objetivo é descobrir se os pacientes espiritualizados submetidos à cirurgia
de ponte de safena têm menos inflamações no pós-operatório – hipótese já
levantada por outros estudos. “Existe um marcador de inflamação que parece
apresentar menores níveis em religiosos”, explica o cardiologista Mauro Pontes,
coordenador do Centro de Pesquisa do Hospital São Francisco, um dos sete
hospitais do complexo Santa Casa da capital gaúcha.

Hoje, as principais faculdades de medicina americanas dedicam uma


disciplina exclusiva ao assunto. E, na última década, uma série de estudos
mostrou que os benefícios da fé à saúde têm embasamento científico. Devotos
vivem mais e são mais felizes que a média da população. Após o diagnóstico
de uma doença, apresentam níveis menores de estresse e menos inflamações.
“O paciente com fé tem mais recursos internos para lidar com a doença”, diz
Paulo Lima. Fé tem uma participação especial no que médicos e terapeutas
chamam de coping: a capacidade humana de superar adversidades. “Não
posso prescrever bem-estar, mas posso estimular que o paciente vá em busca
de serenidade para encarar um momento difícil”, explica o médico. É por isso
que mais profissionais têm defendido essa relação. “Atender às necessidades
espirituais tem de ser, sim, tarefa do médico”, defende o cirurgião cardíaco
Fernando Lucchese, que está escrevendo o livro A Revolução Espiritual com
o psiquiatra americano Harold Koenig, autoridade no assunto.

Há um século, o canadense William Osler, ícone da medicina moderna,


já defendia isso. Em 1910, ele escreveu um artigo cheio de floreios elogiosos
às crenças das pessoas: “a fé despeja uma inesgotável torrente de energia”.

A designer Juliana Lammel, 33 anos, vivenciou isso. Em 2005, cansada de


tantas operações sem sucesso para corrigir um estreitamento no ureter, canal
que liga os rins à bexiga, ela resolveu fazer uma cirurgia espiritual, mesmo

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sem ter nenhuma ligação com o espiritismo. “Para mim, era sinônimo de filme
de fantasma”, lembra. Ela topou – e sem ceticismo. Para ter resultado, Juliana
teria de acreditar piamente, já que o tratamento espírita exige fé do paciente.

Uma vez por semana, por um mês, na mesma hora, ela deitava na
própria cama por 30 minutos, ao mesmo tempo em que o grupo espírita fazia
a concentração. Ela em São Paulo, eles no Rio de Janeiro. No fim, Juliana
voltou ao médico com novos exames. Ele viu os resultados e não conseguia
explicar por que os componentes alterados do rim tinham voltado a níveis
quase normais. Juliana foi operada mesmo assim, mas o procedimento foi bem
menos agressivo do que o previsto, graças, segundo ela, à cirurgia espiritual.
O episódio mudou a forma como a designer lida com a fé. “Antes, me forçava
a acreditar em algo. Depois disso, passei a acreditar de verdade”.

Vantagens no dia a dia

Uma das maiores pesquisas feitas até hoje, divulgada em 2009, revisou
42 estudos sobre o papel da espiritualidade na saúde, que envolveram mais
de 126 mil pessoas. O resultado mostrou que quem frequenta cultos religiosos
pelo menos uma vez por semana tem 29% mais chances de aumentar seus
anos de vida em relação àqueles que não frequentam. Não é intervenção
divina. Não é feitiçaria. É comportamento. Os entrevistados que são religiosos
apresentaram um comprometimento maior com a própria saúde. Iam mais
ao dentista, tomavam direitinho remédios prescritos, bebiam e fumavam
menos. A pesquisa confirmou ainda os dados de um estudo populacional
feito em 2001 pelo Centro Nacional de Adição e Abuso de Drogas dos EUA:
adultos que não consideram religião importante em suas vidas consomem
muito mais álcool e drogas do que os que acham os credos relevantes. É a
versão real dos Simpsons e seus exageros estereotipados. Homer faz pouco
de qualquer fé, é obeso e alcoólatra. Já seu vizinho, o carola Ned Flanders, é
regrado, tem saúde perfeita e corpo sarado.

Andar na linha é mais comum entre os crentes, e a razão está no poder


de autocontrole, dizem os cientistas. É o que defende o psicólogo Michael
McCullough. Professor da Universidade de Miami e parceiro de Harold Koenig
em pesquisas sobre espiritualidade, ele diz que a fé facilita a árdua tarefa
de adiar recompensas, algo fundamental para muita coisa, de fazer dieta a
estudar para concursos.

A fé também tem uma relação íntima com a felicidade. Um estudo feito


na Europa mostrou que pessoas espiritualizadas se dizem mais satisfeitas
do que aquelas que não se consideram como tal. Parte disso se explica na
natureza de ateus e céticos em geral. Quem não acredita em nada pode ter
mais propensão ao pessimismo porque faz uma leitura objetiva da vida, sem

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crer em algo divino que mude as coisas. Por outro lado, a certeza da existência
de uma recompensa divina muda a vida das pessoas. E não é questão somente
de otimismo. Tem algo pragmático aí.

Religiões estimulam algo essencial para o ser humano: o espírito de


comunidade. Devotos normalmente não estão sozinhos, o que ajuda nos
problemas da vida. Para Andrew Clark, um dos autores desse estudo europeu
e professor da Escola de Economia de Paris, as religiões ajudam as pessoas a
superar choques ou a pelo menos não se desesperar tanto com os tropeços
da vida. Por exemplo, segundo a pesquisa, a queda no indicador de bem-estar
foi menor entre os desempregados religiosos do que entre os não religiosos.
“A religião oferece ‘proteção’ contra o desemprego”, diz Clark. Na hora do
aperto, há sempre alguém para estender a mão. Outra pesquisa, feita pela
Universidade de Michigan, EUA, comparou duas formas de amparo recebidas
por idosos: o oferecido pelas igrejas e o proporcionado por serviços sociais
estatais. A discrepância a favor do suporte religioso foi tão significativa que o
autor do estudo, o gerontologista Neal Krause, acredita haver algo de único
nesse tipo de apoio.

Até mesmo os ateus são beneficiados pelo espírito solidário oferecido


pelas instituições religiosas. Um estudo feito por Clark investigou o efeito da
religiosidade dos outros sobre o bem-estar de uma comunidade. A descoberta
foi intrigante. As pessoas sem religião de regiões de maioria ateia são menos
felizes do que aquelas sem religião de áreas onde a maior parte da população
professa uma fé. “Isso não é nada bom para os ateus: eles parecem menos
felizes e também fazem os outros menos felizes”, concluiu Clark. A explicação
para isso pode estar na compaixão incentivada pelas religiões. A escritora e
ex-freira inglesa Karen Armstrong, autora de mais de 20 livros sobre o tema,
acredita que o princípio da compaixão está no centro de todas as tradições
religiosas. É ela que nos leva a pensar no próximo e a fazer de tudo para aliviar
o sofrimento e as angústias dele.

Antônio Gilberto Lehnen, 78 anos de catolicismo ativo, sentiu os efeitos


dessa rede de apoio após enfrentar duas cirurgias que quase lhe custaram a
vida. Aos 67 anos, ele teve de passar por um transplante cardíaco. Na lista de
espera por um novo coração, sem saber ao certo se aguentaria, sua atitude era
de gratidão. “Lembro de ele me dizer, com toda a tranquilidade: ‘Planeja tudo
aqui que o papai do céu está cuidando de mim’. Era uma atitude confiante”,
lembra o cirurgião Fernando Lucchese, que fez a operação. Antônio é grato
até hoje. “Não sei quem foi o doador, mas não deixo nem um dia de rezar por
ele e pela felicidade da sua família”, diz.

Na Antiguidade, as religiões eram essenciais para unir uma comunidade.


“Nas sociedades primitivas, a religião sempre exigiu tanto esforço (de união)
que não pode ser encarada só como um acidente evolutivo”, diz Nicholas Wade,
autor de The Faith Instinct (“O instinto da fé”, sem edição no Brasil). Essa união

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foi questão de sobrevivência por milênios. É o que afirma Karen Armstrong
em Os 12 Passos para uma Vida de Compaixão. Organizado em pequenos
grupos, o homem primitivo precisava partilhar os parcos recursos a mão.
Muito antes do surgimento das grandes religiões, altruísmo e generosidade
já eram características primordiais a um bom líder tribal.

A genética também ajuda a explicar a origem da fé. O geneticista


americano Dean Hamer causou rebuliço no meio científico em 2004 ao
anunciar a descoberta dos genes da fé – ou, como ele preferiu chamar, o
gene de Deus. Batizado de VMAT2, trata-se de um conjunto de genes que
ativam substâncias químicas que dão significado às nossas experiências.
Eles atuam no cérebro regulando a ação dos neurotransmissores dopamina,
ligada ao humor, e serotonina, relacionada ao prazer. Durante a meditação,
por exemplo, esses neurotransmissores alteram o estado de consciência.
“Somos programados geneticamente para ter experiências místicas. Elas
levam as pessoas para algo novo, ouvem Deus falar com elas”, explica Hamer.
O pesquisador aplicou um questionário para medir o grau de espiritualidade
em um grupo de 1.001 voluntários. Desenvolvido pelo psiquiatra Robert
Cloninger, da Universidade de Washington, o levantamento trazia perguntas
ligadas a crenças e rituais. Hamer avaliou os genes dos voluntários e percebeu
que as diferenças nas respostas estavam relacionadas com as variações no
gene de Deus. Essas variações explicariam por que algumas pessoas são mais
espiritualizadas que outras.

Dá para visualizar isso, literalmente. Exames de neuroimagem mostram


a atividade de crenças espirituais no cérebro. O time de cientistas liderado
por Andrew Newberg, professor da Universidade da Pensilvânia, nos EUA, e
autor do livro How God Changes Your Brain (“como Deus muda o seu cérebro”,
sem edição no Brasil), demonstrou que Deus é parte da nossa consciência:
quanto mais pensamos nele, mais nossos circuitos neurais são alterados.
No primeiro de seus estudos a respeito, Newberg avaliou o impacto da
fé ao analisar imagens cerebrais de freiras rezando e budistas meditando.
Ele detectou aumento de atividade em áreas relacionadas às emoções e
ao comportamento e redução na zona que dá senso de quem somos. A
diminuição de trabalho nessa região específica, segundo Newberg, representa
a possibilidade de atingir com a meditação um estado em que se perde a
noção de individualidade, espaço e tempo. “Você se torna um único ser com
Deus ou com o Universo”, escreveu. É o mesmo efeito descrito por Hamer. A
ciência não pode provar que Deus existe, mas consegue medir os efeitos da
crença no divino nas pessoas.

Seria possível, então, transformar esses efeitos da fé em um botão no


cérebro, que poderíamos ativar quando quiséssemos? O canadense Michael
Persinger quis provar que sim ao criar o “capacete de Deus”. Trata-se de
um aparelho que estimula uma área específica do cérebro, onde nascem
pensamentos místicos e espirituais. Persinger queria saber se dava para simular

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a sensação de uma prece intensa ou da meditação apenas estimulando essa
região cerebral. Ele recrutou voluntários religiosos e não religiosos para o teste.
Depois de ficarem uma hora com o capacete, quatro de cada cinco pacientes
relataram sentir um estado de transe, com uma sensação de deslocamento
para fora do corpo. A maioria dessas pessoas tinha uma predisposição à fé,
mas, mesmo assim, o aparelho conseguiu simular experiências religiosas em
laboratório. Ou seja, com ele não é preciso rezar para sentir os mesmos efeitos
benéficos descritos na reportagem. Da mesma forma que não é preciso seguir
uma religião para ter esses benefícios.

Como trabalhar sua fé

Que fique claro, fé e religião são coisas diferentes. A religião é uma


maneira institucionalizada para se praticar a fé, por meio de regras específicas
e dogmas. Já a fé é algo pessoal, ligado à espiritualidade, à busca para
compreender as respostas a grandes questões sobre a vida, o universo e
tudo mais. Isso pode ou não levar a rituais religiosos. Você pode buscar essas
respostas pulando sete ondinhas, acendendo velas, consultando o horóscopo
da Susan Miller, pregando faixas de Santo Expedito ou investigando quilos de
livros de física quântica. Cada um tem seu jeito próprio.

Vale até ficar louco de cogumelo. Foi o que Roland Griffiths, professor
da Universidade Johns Hopkins, nos EUA, propôs. Sua equipe deu a 36
voluntários cápsulas com altas doses de psilocibina, substância presente em
cogumelos alucinógenos. O grupo deitou em sofás com olhos vendados
ao som de música clássica. Depois de uma sessão de seis horas, passado o
efeito, a maioria relatou ter experimentado uma forte conexão com os outros,
um sentimento de união, amor e paz. Até aí, parecia papo de doidão. Mas
o professor voltou a falar com os voluntários um ano depois. Eles disseram
que se sentiam diferentes. A experiência os tornou pessoas melhores, o que
foi confirmado pelas famílias deles. “Se a psilocibina pode causar sensações
místicas idênticas àquelas que ocorrem naturalmente, isso prova que esse
tipo de experiência é biologicamente normal”, disse Griffiths no fórum de
palestras TED. Mais que isso: talvez, drogas alucinógenas tenham benefícios.

Mesmo sem cogumelos alucinógenos ou um capacete de Deus, é


possível atingir artificialmente as benesses da fé. Cientistas garantem que
basta ter uma forte crença em algo – e nem precisa ser uma divindade ou
força superior. Pode ser qualquer coisa realmente importante para a pessoa.
“Se para os crentes é Deus, para os ateus pode ser família ou amigos”, diz
Michael Shermer, diretor da Sociedade Cética e autor do livro The Believing
Brain (“o cérebro crente”, sem edição no Brasil). “Teoricamente, um ateu pode
ter uma poderosa experiência mística”, endossa Andrew Newberg. O pai do
gene de Deus, Dean Hamer, segue a mesma linha. “Algumas das pessoas mais
espiritualizadas que conheço não acreditam em divindade nenhuma”, escreveu

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no trabalho em que relatou a descoberta genética. Outra grande autoridade
no assunto, o psicólogo Kenneth Pargament, do Instituto de Espiritualidade e
Saúde do Centro Médico do Texas, sugere cultivar a espiritualidade exercitando
o que ele chama de santificação ateísta. Significa dar a algo importante da
vida um status sagrado, mesmo sem acreditar em Deus. A foto do seu filho
quando bebê pode ser muito mais sagrada para você que a imagem de Santo
Antônio, por exemplo.

Não se trata de banalizar a sacralização, mas o contrário: exercitar a fé


dessa forma é uma postura antibanalização da vida, qualquer aspecto pode
assumir um caráter divino. E esse hábito de sacralizar aspectos do cotidiano
é capaz até de alterar nosso comportamento, segundo uma pesquisa que
acompanhou recém-casados. Os casais que consideravam o casamento e
o sexo sagrados estavam mais felizes – e transavam mais! No trabalho é a
mesma história. Outro estudo, realizado no ano passado, avaliou 200 mães
de família que haviam acabado de concluir uma pós-graduação. Apesar da
dupla jornada, aquelas que encaravam a carreira como parte de algo maior
(e não só a fonte de renda para pagar as contas do mês) se disseram muito
mais felizes profissionalmente – e menos cansadas.

Em tese, portanto, é possível usufruir de benefícios semelhantes aos


proporcionados pelas crenças divinas apenas focando as energias naquilo
que faz bem a você. O psicólogo Elisha Goldstein, autor do best-seller The
Now Effect (“o efeito ‘agora'”, sem edição no Brasil), desenvolveu um método
que consiste em cultivar momentos sagrados. Primeiro, você escolhe objetos
que trazem boas lembranças. Valem fotos de infância, o relógio do avô, uma
carta de amor, o primeiro gibi. Todos os dias, preste atenção a esse amuleto
por no mínimo cinco minutos. Deixe que os pensamentos invadam sua
mente. Relaxe. Após três semanas, avalie suas emoções. Segundo Goldstein,
os voluntários que participaram do experimento relataram sentimentos de
gratidão, humildade e empatia. Isso porque eles se reconectaram àquilo
que realmente importa. Consequentemente, se sentiram menos ansiosos e
pessimistas e mais dispostos a ajudar quem precisa. Isso sem ter de orar ou
meditar seguindo preceitos religiosos.

Esses benefícios dependem da intensidade da crença. Quem vai à igreja


e fica jogando Candy Crush Saga no celular dificilmente vai usufruir das
vantagens da fé. Newberg resolveu passar isso a limpo e pediu a um grupo de
ateus que pensassem em Deus. Nenhuma mudança significativa ocorreu. Para
eles, não fazia o menor sentido. Então, o melhor é se engajar em atividades
em que você realmente acredita. Se seu negócio não é integrar uma igreja,
o psicólogo Michael McCullough lembra que algumas ONGs têm regras de
conduta e convivência semelhantes, reproduzindo os mesmos mecanismos
das religiões que incentivam compaixão, autocontrole, senso de comunidade
e comportamento ético.

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Da mesma forma que é possível ter os benefícios da fé mesmo sem
religião, há ocasiões em que ela faz mal – e nem precisamos entrar no mérito
das guerras religiosas. Atribuir a Deus poder milagroso pode levar pacientes a
abandonar tratamentos. Há também um outro componente preocupante. Em
algumas pessoas, ocorre o que os especialistas chamam de conflito religioso,
sentimento que leva a acreditar que a doença ou os sofrimentos são punição
divina. Nesses casos, a religião tem um efeito desastroso. Um estudo publicado
na revista científica americana Archives of Internal Medicine mostrou que esse
conflito está associado a depressão, ansiedade e maior índice de mortalidade.
Se fosse bom, fé cega não teria esse nome.

Fonte: REVISTA SUPERINTERESSANTE, 2015. A Ciência da Fé. Disponível em: <http://super.abril.com.br/


ciencia/a-ciencia-da-fe/>. Acesso em: 3 abr. 2017.

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