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CNBB

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não


fecheis os corações!” (Cf. Sl 94)

Roteiros Homiléticos da Quaresma,


Ano B - Fevereiro/Abril 2012

Projeto Nacional de Evangelização


O Brasil na Missão Continental

Go
Coções CNS?
C748d Conferência Nacional dos Bispos do Brasil / “Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os
corações!” (Cf. SI 94):Roteiros Homiléticos da Quaresma — Ano B — Fevereiro / Abril de 2012.
Brasília, Edições CNBB. 2012.

72 p.:14x21 cm
ISBN: 978-85-7972-120-5
1. Liturgia;
2. Quaresma.

CDU: 264.941.4

Coordenação:
Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia
Coordenação Editorial:
Mons. Jamil Alves de Souza
Revisão Doutrinal:
Pe. Hernaldo Pinto Farias, SSS
Revisão:
Lúcia Soldera
Projeto Gráfico e Capa:
Henrique Billygran da Silva Santos
Diagramação:
Isabela Souza Ferreira

12 Edição - 2012

Todos os direitos reservados

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SUMÁRIO

Apresentação... rererserseerrerrerereerserrereeearseaneeesersaaaão 7

Introdução ......... ir irermereieeseertereeeeerermeeeerererererarerrerereerenrer 9

QUARTA-FEIRA DE CINZAS
22 de fevereiro de 2012............................n
rr errererereeerereraraserereeno 17

1º DOMINGO DA QUARESMA
26 de fevereiro de 2012.....................ssicsseteres

2º DOMINGO DA QUARESMA
04 de março de 2012... e re er er e re erre rerrreseeeneerereaeseesrererans

3º DOMINGO DA QUARESMA
11 de março de 2012 cer e a cerco eererereeeeoreorcescereseeraceaea

4º DOMINGO DA QUARESMA
18 de março de 2012... rerererereereererrererrerrererento

5º DOMINGO DA QUARESMA
25 de março de 2012................creerereeneereereereeeeererrenaes

DOMINGO DOS RAMOS E DA PAIXÃO


1º de abril de 2012 63

Viver a Semana Santa... 70

Oração CF 2012. 72
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

APRESENTAÇÃO
Novamente, a Quaresma, tempo forte do Ano Litúrgico, vem
confrontar e iluminar as nossas Comunidades eclesiais com a celebração
do Mistério Pascal de Jesus Cristo. Com riqueza de textos e ritos, a
Quaresma nos quer aproximar do manancial da fé da Igreja, seja pelo
viés das expressões decantadas e oficiais da Tradição litúrgica do Povo
de Deus, como também pela sugestiva vertente das manifestações
devocionais, frutos de uma fecunda piedade popular. À Quaresma,
no seu conjunto, é “sacramento” de vida nova para a humanidade, pois
todos somos salvos pelo mistério de Cristo Morto e Ressuscitado.
Eis aqui, em nossas mãos, mais um subsídio bíblico-litúrgico que
é oferecido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil —- Comis-
são Episcopal Pastoral para a Liturgia; um subsídio para a prepara-
ção pessoal e comunitária das celebrações da Eucaristia, ou da Cele-
bração Dominical da Palavra de Deus, nos domingos da Quaresma
de 2012 — Ano B. Agradecemos de coração ao Pe. Gustavo Haas que
elaborou e nos prestou este serviço pastoral.
Na liturgia da Quaresma, Deus nos dá a graça de retornar a
saborear a beleza da esperança cristã, ao buscarmos em Cristo Salva-
dor, com todos os homens e mulheres de boa vontade, condições de
vida feliz e livre das estruturas do pecado. Assim, o tema da Campa-
nha da Fraternidade promovida pela Igreja do Brasil nesta Quares-
ma, “Fraternidade e Saúde Pública”, pode nos ajudar a voltar o nosso
“Oxalá ouvisseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

coração ao projeto de Deus, num compromisso pascal, agindo para


“Que a saúde se difunda sobre a terra” (Cf. Eclo 38,8).
As leituras bíblicas do segundo ciclo da liturgia da Quaresma,
Ano B, acentuam o tema da Mliança e do Mistério Pascal de Cristo:
Jesus, no seu mistério salvífico, sacrificando-se a Si mesmo, renova
a aliança, tornando-a “nova e eterna”. Deste modo, celebrar a Qua-
resma significa celebrar com a vida, e na vida de cada dia, o mistério
da nossa Aliança para sempre com Cristo e com os irmãos. Uma
Aliança que brota do Batismo, nos faz novas criaturas, Povo Santo de
Deus, partícipes da vitória do Ressuscitado. Uma Aliança de sangue,
para que o mundo creia e viva.

+ Dom Fernando Panico, M.S.€.


Bispo diocesano de Crato — CE
Membro da Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

INTRODUÇÃO
Entramos na Quaresma, cantando um convite especial do Senhor:
“Eis o tempo de conversão! Eis o dia da salvação! Ao Pai voltemos,
juntos andemos! Eis o tempo de conversão”.
É o convite feito, na Quarta-feira de Cinzas, para a festa da Vi-
gília Pascal, no Sábado Santo, na solene celebração da Páscoa, me-
mória da nossa fé, centro do ano litúrgico e da história da humanida-
de: Jesus ressuscitou “no primeiro dia da semana” (Mt 28,1).
Às primeiras comunidades começaram a se reunir todas as sema-
nas para festejar a vitória de Jesus sobre a morte no domingo, um dia
depois do sábado (páscoa semanal). Ainda bem no começo, os cris-
tãos sentiram a necessidade de solenizar, de maneira muito especial,
o acontecimento que mudou os rumos da história. Decidiram fazer,
uma vez por ano, uma grande festa, com cuidadosa preparação, para
celebrar intensamente a Páscoa de Jesus Cristo. A maior de todas
as festas, a Festa das festas, o Domingo dos domingos (páscoa anual).
Toda festa que se preze merece uma boa e prolongada prepa-
ração. Não podia ser diferente a preparação da festa da Páscoa. À
Igreja definiu estes quarenta dias que, com o tempo, receberam o
nome de Quaresma.
Na determinação da duração de quarenta dias, teve grande peso a
tipologia bíblica dos quarenta dias, por exemplo: o jejum de quarenta
dias de nosso Senhor Jesus Cristo; os quarenta anos transcorridos
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94)

com povo de Deus no deserto; os quarenta dias em que Moisés esteve


no Monte Sinai; os quarenta dias em que Golias, o gigante filisteu,
desafiou Israel, até Davi avançar contra ele; os quarenta dias durante
os quais Elias, fortificado pelo pão cozido sob as cinzas e pela água,
chegou ao monte de Deus, o Horeb; os quarenta dias nos quais Jonas
pregou a penitência aos habitantes de Nínive.
Quaresma passou a significar o caminho para a festa, preparada
no coração, através da oração, do jejum e da caridade. É também o
tempo de conversão e entrada na prática e na solidariedade de Jesus.
Não é um tempo de luto ou tristeza, mas de profunda expectativa e
inteligente concentração para viver intensamente as alegrias da Res-
surreição do Senhor.
Marcos, evangelista do Ano B, inicia seu Evangelho, apresentan-
do Jesus Cristo. O convite é renovado hoje a toda a comunidade dos
batizados: Convertei-vos! À festa da Páscoa se aproxima. “O Reino de
Deus está no meio de vós”.

Em que consiste a preparação para a Páscoa?


Desde os tempos mais antigos, a Quaresma foi considerada como um
tempo de renovação espiritual, de revigoramento das promessas do Ba-
tismo e fortalecimento interior para o testemunho do Evangelho. Isso
através de três práticas muito significativas: a oração, a esmola, o jejum.
À oração como experiência de fé e gratuidade para pedir a Deus
forças e nos convertermos, para viver o Evangelho e permanecer no
bom caminho.

O jejum como espaço privilegiado de exercício para dominar as


paixões, vencer o egoísmo e cultivar o bem.
À caridade como expressão do seguimento do Mestre que exige
abandono de nós mesmos e doação aos irmãos.
Às três atitudes - oração, jejum, esmola — complementam-
se, não são atitudes isoladas ou temporárias na vida do cristão.
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

“Nós vos prescrevemos o jejum, lembrando-vos não só a


abstinência, mas também as obras de misericórdia. Desse modo,
o que tiverdes economizado nos gastos normais, se transforme
em alimento para os pobres” (São Leão Magno).
Tudo isso para fazermos da Quaresma uma verdadeira participação
no mistério pascal de Cristo. Sofremos com Cristo para participar de sua
glória e sentir, na vida, a alegria de sua Ressurreição (cf. Rm 8,17).

Quaresma, memória do Batismo


/ o .

O grande liturgista Bergamini diz que a Quaresma tem caráter es-


sencialmente batismal, sobre o qual se assenta o caráter penitencial.
Na verdade, a Igreja é comunidade pascal porque é batismal. Isso
deve ser afirmado não só no sentido de que nela entramos mediante
o Batismo, mas, sobretudo, no sentido de que a Igreja é chamada a
exprimir, com vida de contínua conversão, o sacramento que a gera.
Daí também o caráter eclesial da Quaresma. Ela é o tempo da gran-
de convocação de todo o povo de Deus, para que se deixe purificar e
santificar pelo seu salvador e Senhor!
A Quaresma, portanto, está ligada ao Batismo. Neste tempo,
intensificam-se a preparação dos catecúmenos com a catequese e as
celebrações diárias ou semanais com um itinerário pedagógico e ca-
tequético, objetivando ajudar o catequizando a penetrar nos grandes
eventos da história da salvação.
Para os batizados, o tempo da Quaresma é sempre uma nova
oportunidade de recolocar a vida nos trilhos da Salvação e renovar
a aliança batismal. É tempo de conversão, de aprofundamento da
fé e um processo de crescimento na vida da Igreja como “casa da
=9 2
iniciação à vida cristã”.

1 Cf. Bergamini. A. Cristo, festa da Igreja. SP, Paulinas, 1994, pp. 277-279.
2 Cf CNBB, Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2011-2015, nn. 37-43.
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94) 12

O que é a Quaresma na vida do cristão?


Irmã Penha Carpanedo e Pe. Marcelo Guimarães têm uma explicação
primorosa. Escrevem: “Celebrar a Quaresma é festejar o refazer a
aliança de Deus com a gente e que o nosso pecado e nossa negligência
romperam. É renunciar aos nossos instintos egoístas e abrir-nos
mais ao plano do Deus da vida. Celebrar a Quaresma é intensificar
a oração, O jejum e a caridade, para vivermos mais consagrados ao
Deus que nos reconciliou com ele. Celebrar a Quaresma é deixar-
se conduzir ao deserto, para que o Senhor nos fale ao coração. É
rever as linhas de conduta, corrigir os erros de trajetória, aprofundar
a unidade entre nós. É assumir e reconhecer o negativo, a morte, o
sofrimento, para vencê-los e superá-los. Como o grão de trigo que
morre para nascer. Como a mulher que está para dar à luz e sofre as
dores do parto. Como a uva que se esmaga para fazer o vinho que
alegra o nosso coração”.
Quaresma é, portanto:
- tempo abençoado e privilegiado na vida da Igreja;
- tempo de conversão, purificação e glorificação do Senhor;
- tempo de abrir o coração para a novidade do Evangelho, tendo
como centro a cruz de Cristo, sinal de salvação e reconciliação da
humanidade;
- tempo de renovação da aliança, de revitalização das promessas
do Batismo e inserção consciente na comunidade;
- tempo de se envolver, de corpo e alma, na libertação das pes-
soas excluídas e oprimidas, vítimas de tanta corrupção, violência e
descasos com a vida;
- tempo de abandonar os ídolos e de renovar, por meio da escuta
da Palavra e da oração, nossa fidelidade ao Deus de Jesus Cristo;
- tempo único e precioso de subir com Jesus ao monte Tabor,
de viver na intimidade com ele, de conhecer seus desígnios;

3 Carpanedo, P. e Guimarães, M. Dia do Senhor - guia para as celebrações das comunidades,


ciclo pascal. SP, Paulinas, 2002, p. 28.
Re PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

- tempo de nos deixarmos acolher e tocar pela misericórdia


do Senhor;
- tempo de ressuscitarmos com Cristo e nos colocarmos a serviço
de seu Reino.

Quaresma e Campanha da Fraternidade


Trazemos presentes as palavras do Secretário Geral da CNBB, Dom
Leonardo Ulrich Steiner, expressando, na apresentação do Texto
Base, o sentido da Campanha da Fraternidade de 2012, dentro do
espírito quaresmal:
“Atingidos por Ele e transformados n'Ele, percebemos que to-
das as realidades devem ser transformadas, para que todas as pessoas
possam ter a vida plena do Reino.
À Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) promove
a Campanha da Fraternidade, desde o ano de 1964, como itinerário
evangelizador para viver intensamente o tempo da Quaresma.
À Igreja propõe como tema da Campanha deste ano: 4 frater-
nidade e a Saúde Pública, e com o lema Que a saide se difunda sobre a
terra (Cf. Eclo 38,8). Deseja assim, sensibilizar a todos sobre a dura
realidade de irmãos e irmãs que não têm acesso à assistência de Saúde
Pública condizente com suas necessidades e dignidade. É uma reali-
dade que clama por ações transformadoras. À conversão pede que as
estruturas de morte sejam transformadas.
À Igreja, nessa Quaresma, à luz da Palavra de Deus, deseja
iluminar a dura realidade da Saúde Pública e levar os discípulos
missionários a serem consolo na doença, na dor, no sofrimento e na
morte. E, ao mesmo tempo, exigir que os pobres tenham um aten-
dimento digno em relação à saúde. Que ela se difunda sobre a terra,
pois a salvação já nos foi alcançada pelo Crucificado”.
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94)

Sugestões para as Celebrações


do Tempo da Quaresma

1. Aoração, o jejum, o silêncio, a solidariedade são intensificados


e permeiam todo o tempo da Quaresma. São práticas concretas,
exercícios livremente assumidos que alavancam nossa preparação
para a festa da Páscoa.
2. O segredo da preparação da homilia e da celebração não é
o recurso a roteiros previamente preparados e colocados à dispo-
sição das equipes de liturgia. O primeiro passo deve ser sempre a
leitura orante dos textos bíblicos e litúrgicos (orações, prefácios,
letras dos cantos...). Tudo isso, tendo presente o povo reunido para
a celebração: sua situação social, suas aspirações e necessidades,
suas atividades profissionais. E, não por último, tendo presente a
natureza e o sentido da celebração litúrgica. Não pode ser dispen-
sada a adequada preparação pela oração pessoal.
3. A celebração litúrgica torna presente e atual o maior gesto de
amor do Pai para conosco: a cruz e a ressurreição de seu Filho, que
iluminou as trevas e reavivou a esperança de um mundo novo. Como
povo peregrino, comemos de seu pão, antecipando, na fé, a realização
da comunhão entre nós, com a comunidade, com a humanidade e
com Deus. Por isso, a cruz, pela qual fomos marcados no Batismo,
é destacada no espaço celebrativo. Ela lembra que somos discípulos
missionários de Jesus Cristo. Ele superou o fracasso humano da cruz
com o amor que vence a morte e traz vida em abundância para todos.
4. Alguns gestos e ações simbólicas são mais valorizados neste
tempo, como: o ajoelhar-se, o silêncio nos momentos previstos, o
recolhimento, o ato penitencial.
5. Na Quaresma, é oportuno usar mais frequentemente as
orações eucarísticas da Reconciliação, as mais indicadas para esse
tempo, sem esquecer os prefácios próprios que são de uma densidade

4 Cf. Sivinski, Marcelino. Convertei-vos! O Reino de Deus está próximo. Roteiros Homiléticos
da Quaresma, 2009, Brasilia, Edições CNBB.
E o) PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

pascal muito grande. E bom valorizar ainda as bênçãos previstas para


o final da celebração que se encontram no missal.
6. As cinzas colocadas em nossas cabeças
Ç lembram a necessi-
dade de conversão e de fé no Evangelho.
B “Lembra-te q que és po,pó, e ao
pó hás de voltar!”

7. Preparar o espaço litúrgico, levando em conta o tempo quaresmal:


o ambiente despojado e austero, valorizando o que é essencial para a
celebração do mistério de Cristo, ou seja, o altar, o ambão (de onde se
proclama a Palavra), a cadeira presidencial e a pia batismal.
8. O cartaz da CF seja apresentado no momento da abertura
oficial da Campanha e depois fixado na entrada da igreja ou em local
que possa ser bem visualizado. Não é aconselhável fixar o cartaz no
altar ou no ambão (mesa da Palavra).
9. Tudo é importante na celebração, pois nós celebramos a li-
turgia com palavras, gestos, cantos e orações. Celebramos com nosso
corpo, com nossos sentimentos, com nossa atitude espiritual. E im-
portante integrar tudo isso no mistério que estamos celebrando.

10. É sumamente aconselhável “cantar a liturgia da Quaresma”,


com cantos próprios para este tempo e para cada parte da celebra-
ção. Para isso, veja-se o 'cd' da Campanha da Fraternidade, contendo
cantos quaresmais para o ano “B”. Há cantos propostos também pelo
Hinário Litúrgico da CNBB, volume II. Muitos desses cantos estão
gravados nos CDs Liturgia X/ll e X/V da Paulus. Lembramos que o
Hino da CF não foi feito para servir de canto de entrada, mas para os
encontros e as reuniões de formação e informação sobre a CF.
11. Logo após o sinal da cruz e a saudação de quem preside, é
aconselhável fazer a recordação da vida: lembrar fatos e acontecimentos
da comunidade, da cidade, da Igreja e do mundo, para mostrar que,
nessa história, está em realização a Páscoa de Cristo que celebramos
na liturgia e tem sua expressão máxima na Vigília Pascal. Aos
poucos, temos que superar o costume de fazer o “comentário” antes
da procissão de entrada. Como prevê o Missal Romano, ele pode
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

ser feito após o sinal da cruz, da saudação presidencial e da primeira


intervenção da assembleia (“Bendito seja Deus que nos reuniu no
amor de Cristo!”), o transformando em uma bela monição para a
celebração e não sendo mais uma explicação do que dizem as leituras
nem mensagens moralizantes e difíceis para o povo.
12. E muito oportuno e salutar, no tempo da Quaresma, valo-
rizar e promover as celebrações penitenciais. O Ritual da Penitência
oferece várias alternativas.
13. Um breve silêncio entre as leituras e após a homilia permite que
o diálogo entre Deus e seu povo atinja mais profundamente cada pessoa.
14. À cor litúrgica para a Quaresma é a roxa, que expressa a
dimensão maior de penitência e de disposição à conversão. No 4º
domingo (Laetare) é permitido o uso da cor rósea. No Domingo de
Ramos, a cor é a vermelha.
15. Lembrar a assembleia, no momento oportuno, do compro-
misso da coleta da Campanha da Fraternidade (CF). A CF é inserida
na Quaresma como exercício de partilha, participação na evangeli-
zação e expressão de conversão e mudança de vida. É realizada no
Domingo de Ramos. Durante o tempo da Quaresma, pode-se prever
uma Missa com todos os doentes da comunidade e administrar-lhes
o sacramento da Unção dos Enfermos, conforme as orientações do
Ritual deste sacramento.
16. Há duas solenidades que ocorrem no tempo da Quaresma, as
quais devem ser preparadas e celebradas em nossas comunidades: dia
19 de março, solenidade de S. José, esposo de Maria; dia 26 de março
(transferida do dia 25 — pois é domingo), solenidade da Anunciação
do Senhor.
QUARTA-FEIRA DE CINZAS
22 de fevereiro de 2012
Leituras: Joel 2,12-18; Salmo: 51(50),3-4.5-6a.12-13.14 e 17 (R/, cf. 32)
2Coríntios 5,20-6,2 ; Mateus 6,1-6; 16-18

"TEMBRA-TE QUE ÉS PÓ, E AQ PÓ HÁS DE VOLTAR!" (CE GN 3,19)

Situando-nos

Na Quarta-feira de Cinzas, iniciamos a Quaresma, tempo privilegiado


de preparação para a festa da Páscoa. É o único dia, juntamente com
a Sexta-Feira Santa, no qual a Igreja pede a todos os adultos que
jejuem, isto é, renunciem a uma refeição importante do dia, em sinal
de disponibilidade e solidariedade.
O rito da imposição das cinzas lembra que nós, pessoas huma-
nas, somos pó e ao pó voltaremos (cf. Gn 3,19). Diante dessa nossa
fragilidade, nos reconhecemos pecadores e aceitamos o convite de
Jesus: “convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15). Receber as
cinzas significa confirmar nossa fé na Páscoa de Cristo, na reconci-
liação, na esperança de um dia estar ressuscitados com ele.
Celebramos o convite que o Senhor nos faz à conversão e à vida
nova, ouvindo sua Palavra e deixando que ele nos purifique e nos
envie para junto dos necessitados de paz, pão, saúde, vida digna.
Com toda a Igreja no Brasil, iniciamos, também neste dia, a
Campanha da Fraternidade, com o tema “Fraternidade e saúde pú-
blica”. O lema: “Que a saúde se difunda sobre a terra!” (cf. Eclo 38,8).

Recordando a Palavra
À primeira leitura de hoje é sequência da descrição da praga dos
gafanhotos que assola a terra de Judá e devasta toda a plantação.
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94) RS:

A praga é considerada como sinal de Deus, para dizer que está


próximo o dia de Javé. O profeta Joel aproveita a ocasião para refletir
com o povo sobre o acontecido. Incentiva-o a cuidar da terra devastada
e convoca todos à conversão, à penitência, à mudança de vida.
Como entender tudo o que aconteceu e retomar o caminho que
leva ao Senhor?
O profeta pede uma renovação interior que nasça das profundezas
do nosso ser. Não pode ser algo exterior, aparente e sem consequências
práticas. Importa que o homem todo se volte para Deus. Confiando na
misericórdia de Deus, o pecador pode estar certo do perdão.
O Salmo 51 é uma oração confiante do pecador arrependido e
disposto a retomar o bom caminho. Deus nos purifica e nos lava de
todo o pecado. Só com nossas forças nada podemos. Contudo, urge
reconhecer nosso pecado e nos dar conta de nossa maldade. O verda-
deiro culto e o perfeito sacrifício consistem no coração puro e honesto.
Paulo nos coloca frente a Jesus Cristo, aquele que nos reconcilia com
Deus. À pregação, no contexto dos conflitos existentes na comunidade
e das dificuldades de aceitar o apóstolo em Corinto, é um convite, uma
exortação e uma oração para acolher, na vida, o dom da reconciliação.
Recorda que essa é a hora oportuna e o momento favorável da salvação.
Não somos nós que nos reconciliamos com Deus, mas temos que
nos deixar reconciliar. Somos livres para aceitar a reconciliação, mas
não para criá-la ou iniciá-la. À nós, cristãos, quem nos reconcilia com
Deus é Cristo, por meio de sua cruz e de sua gloriosa ressurreição.
No Evangelho, no contexto do Sermão da Montanha, Jesus nos
fala ao coração, lembrando a transparência e a veracidade de nossos
atos, a sinceridade do coração e a honestidade de nossas práticas.
Jesus dá um conselho de ouro: na medida do possível, só o Pai veja e
saiba o bem que fazemos. Aí está o segredo do homem justo e santo.
A esmola, o jejum e a oração são conselhos muito antigos e
considerados um caminho de ascese espiritual. Eles sempre foram
propostos pelos mestres nos ensinamentos aos seus discípulos e
seguidores. Jesus não faz diferente, porém tem consciência muito
clara de que eles não são suficientes e, em muitos casos, podem nos
desviar do que é essencial. Por isso, ele os coloca na relação profunda
e de intimidade na comunhão com o Pai e com seus desígnios.
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

Jesus deixa muito claro que é preciso libertar-se de vaidades e


aparências, como “praticar a justiça só para ser visto pelos outros”, E
insiste: “tua mão esquerda não saiba o que faz a tua direita; entra no
teu quarto e fecha a porta; perfuma a cabeça e lava o rosto...”.

Atualizando a Palavra
Atualizar a Palavra significa acolhê-la em nossas vidas e permitir
que ela realize em nós a salvação, em meio às diferentes realidades e
situações que nos são dadas viver e experimentar. Isso supõe abertura
do coração aos apelos do Senhor e mergulho na realidade social, po-
lítica, econômica e cultural.
Atualizar a Palavra significa não só buscar um sentido para tudo
o que acontece ao nosso lado, mas tornar a Palavra que ouvimos em
Palavra de Salvação, de Vida, de Ressurreição, de Comunhão com o
Pai, na força do Espírito Santo.
No início da Quaresma, é preciso tomar consciência de que um
dia acontecerá o julgamento de Deus que é paciente e misericordioso,
mas também exigente e ciumento: quer que façamos o jejum sagrado
e estejamos congregados em assembleia para a celebração da liturgia,
com a prece calorosa: “Perdoa, Senhor, a teu povo, e não deixes que
essa tua herança sofra infâmia”,
Da carta aos Coríntios deduzimos que a Quaresma, com as nossas
práticas e opções de vida, é momento propício de nossa salvação. Importante
nos deixarmos reconciliar com Deus. Deus respeita nossa liberdade e pede
nossa colaboração para não recebermos em vão a sua graça.
No tempo da Quaresma, somos instados a rever nossa atitude
frente à esmola, à justiça, à oração e à caridade no contexto da histó-
ria da salvação e frente aos milhões de irmãos que passam tantas ne-
cessidades. Esmola, justiça e caridade colocam-se em meio à resposta
dada à pergunta: o que podemos e devemos fazer por eles e com eles,
para garantir uma vida digna para todos?
“A Campanha da Fraternidade, celebrada na Quaresma, intensifica
o convite à conversão. Ela contribui incisivamente para que este processo
ocorra e alargue o horizonte da vivência da fé, na medida em que traz,
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94) 20

para a reflexão eclesial, temas de cunho social, portadores de sinais de


morte, para suscitar ações transformadoras, segundo o Evangelho.
A saúde integral é o que mais se deseja. Há muito tempo, ela
vem sendo considerada a principal preocupação e pauta reivindicató-
ria da população brasileira, no campo das políticas públicas.
O SUS (Sistema Único de Saúde), inspirado em belos princípios
como o da universalidade, deveria ser modelo para todo o mundo.
No entanto, ele ainda não conseguiu ser implantado em sua totali-
dade e ainda não atende a contento, sobretudo os mais necessitados
destes serviços” (Texto Base CF 2012, nn. 3-5).
Às cinzas lembram o que somos — pó — mas a misericórdia do
Senhor é imensa. À Quaresma, na graça do Senhor, é um grande
retorno ao primeiro amor e uma profunda purificação de nossas vidas
pela concretização da solidariedade.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


O grande desafio da Quaresma é cada um, conscientemente, assumir
o compromisso de fazer uma caminhada séria, honesta, provocadora
de mudanças em sua vida. Isso é graça de Deus e decisão pessoal.
Jesus, no início deste tempo litúrgico, nos mostra a firme decisão
de realizar a vontade do Pai e reconciliar a humanidade com ele. A for-
ça da sua páscoa é lembrada e atualizada em cada liturgia e vivenciada
profundamente neste tempo de preparação pascal. Na celebração, nos
tornamos muito íntimos de Jesus e de seus gestos, palavras e ações e
também do mistério do Pai que ele nos revela.
À celebração tem uma força pedagógica muito forte para que
tudo isso aconteça. À proclamação da Palavra é Deus mesmo falando
ao seu povo, o convocando a uma vida melhor, mais justa, mais santa
e solidária. À comunidade reunida é composta de pessoas amadas
por Deus, sedentas de paz, necessitadas de perdão e reconciliação.
Ás preces e os cantos são clamores nascidos no coração das pesso-
as em busca de Deus e de sua misericórdia. À preparação da mesa do
altar é a explicitação do sonho profundo da refeição comunitária, do
pão partilhado, dos bens condivididos e da fraternidade entre os povos.
PA PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

À prece eucarística, memorial da Páscoa, canta as maravilhas do


Senhor realizadas na pessoa de Jesus Cristo e hoje oferecidas para nós,
povo sacerdotal, raça eleita, povo chamado a ser discípulo missionário
nas veredas do mundo. O pão eucarístico, repartido para a comunhão
de todos, realiza, na Páscoa do Cordeiro, a profunda comunhão entre
nós, fazendo-nos um só corpo em Cristo, presença do Ressuscitado, a
serviço da vida de todos, especialmente dos mais pobres e necessitados.
Neste tempo propício, voltamos especialmente o coração para
o Senhor. Permanecemos atentos à sua Palavra, em atitude de con-
versão sincera, em espírito de penitência, no cultivo da oração, na
prática da caridade e do jejum em busca da santidade. Jejum é sinal
de disponibilidade e solidariedade, de entregar-se nas mãos de Deus.
Quaresma é tempo de volta confiante ao Senhor: “Ó Deus, vós
tendes compaixão de todos e nada do que criastes desprezais: perdo-
ais nossos pecados pela penitência porque sois o Senhor nosso Deus”
(antífona de entrada).
À comunidade recolhe-se e concentra-se na meditação da Palavra
de Deus para encontrar forças e inspiração no anúncio do Evangelho,
pois está inserida em um mundo onde existem milhões de pessoas
passando fome, onde a violência ceifa tantas vidas e a desigualdade
social é uma triste realidade que afronta o coração de Deus.
No que se refere à CF 2012, “...é possível extrair 5 temas preocu-
pantes para a saúde atualmente: doenças crônicas não transmissíveis
(doenças cardiovasculares, hipertensão, diabetes, cânceres, doenças
renais crônicas e outras); doenças transmissíveis (AIDS, tuberculose,
hanseníase, influenza e ou gripe, dengue e outras); fatores compor-
tamentais de risco modificáveis (tabagismo, dislipidemias por con-
sumo excessivo de gorduras saturadas de origem animal, obesida-
de, ingestão insuficiente de frutas e hortaliças, inatividade física e
sedentarismo); dependência química e uso crescente e disseminado
de drogas lícitas e ilícitas (álcool, crack, oxi e outras); causas exter-
nas (acidentes e violências)” (Texto Base CF 2012, n. 65).
Entramos na Quaresma em comunhão com todas as comuni-
dades que rezam com a Igreja no Brasil e assumem as propostas da
Campanha da Fraternidade.
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

Sugestões para a celebração

17. O rito da bênção e da imposição das cinzas também pode


ser realizado onde não se celebra a Missa. Neste caso, é oportuno
antepor ao rito a Liturgia da Palavra, como na Missa. Os textos para
essa celebração são tomados da liturgia do dia.
18. Preparar as cinzas antecipadamente, se possível com os ra-
mos abençoados no Domingo de Ramos do ano anterior. Às cinzas
e os recipientes com água para a aspersão devem ser colocados numa
mesa à parte, ao lado do altar. Cuidar para que o recipiente onde
estarão as cinzas seja bem visível para a assembleia.
19. Fazer a procissão de entrada com o presidente, os ministros ou
equipe de liturgia e a participação de um grupo de pessoas, levando o
cartaz da Campanha da Fraternidade, as cinzas, a água benta, tudo pre-
cedido pela cruz processional. Após a saudação inicial, pode acontecer
o lançamento da Campanha da Fraternidade, com a explicação dos ob-
jetivos e das ações a serem realizadas. O lançamento pode também ser
feito logo após a homilia ou ao final da celebração, antes da bênção final.
20. Quem preside pode tomar como referência o texto da oração
que é feita sobre as cinzas, para explicar aos fiéis o verdadeiro sentido
deste rito: “reconhecendo que somos pó e que ao pó voltaremos, con-
sigamos, pela observância da Quaresma, obter o perdão dos pecados
e viver uma vida nova, à semelhança do Cristo Ressuscitado”. Esta
segunda oração proposta, explicita a realidade profunda do homem
e seu destino em relação a Deus e a Cristo ressuscitado, novo Adão.
21. Escolher bem os cantos que serão cantados durante a im-
posição das cinzas. O Missal Romano dá sugestão de antífonas que
podem iluminar a escolha de outros cantos apropriados para este mo-
mento. Investir no uso dos salmos penitenciais.
22. Convidar as pessoas para que participem da celebração do
Sacramento da Penitência e da celebração penitencial . Seria bom, já
neste dia, comunicar os dias e horários em que serão realizadas estas
celebrações próprias do tempo da Quaresma.
£º DOMINGO DA QUARESMA
26 de fevereiro de 2012

Leituras: Gênesis 9,8-15; SI 24(25),4bc-Sab.6-7bc.8-9 (R/. cf. 10)


IPedro 3,18-22 ; Mc 1,12-15

"O ESPÍRITO LEVOU JESUS PARA O DESERTO.” (MC 1,12)

Situando-nos
Na Quarta-feira de Cinzas iniciamos a Quaresma - tempo de preparação
da comunidade e de cada cristão para a celebração Pascal, centro da vida
cristã e do Ano Litúrgico.
Quaresma é caminho marcado pela conversão através da oração,
da escuta da Palavra de Deus, do jejum, da esmola, de gestos concre-
tos de caridade.
Com Jesus vamos ao deserto: o tempo já se completou e o Reino
de Deus está no meio de nós. Importa que o Reino, que nos é dado
viver e construir, se realize em nossas vidas e na história.
Na Vigília Pascal, celebraremos em Cristo e com Cristo a vitória
sobre a morte, o pecado, a violência, a prepotência, o egoísmo e a
autossuficiência. Neste tempo, ressoa em nosso coração a oração do
salmista: “Quando meu servo chamar, hei de atendê-lo, estarei com
ele na tribulação. Hei de livrá-lo e glorificá-lo e lhe darei longos dias”
(antífona de entrada).
No horizonte maior do caminho da Quaresma está o tema da Cam-
panha da Fraternidade. No Texto Base deste ano (nn. 212 e 213), en-
contramos uma profunda reflexão sobre os enfermos no seio da Igreja:
<
Quem permanece por muito tempo próximo das pessoas que
sofrem, conhece a angústia e as lágrimas, mas também o milagre
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94) pps!

da alegria, fruto do amor. Com estas palavras, o Papa Bento XVI


descreve uma experiência edificante do sofrimento. Na Igreja, os do-
entes evangelizam e recordam que a esperança repousa em Deus.
Deste modo, no contexto eclesial, os doentes e os sofredores não se
resumem a destinatários de atenções e de cuidados. Exercem o pro-
tagonismo na evangelização com um testemunho profundo, o do so-
frimento aceito e oferecido, o milagre do amor.
Os enfermos não são somente objeto de nossa ação pastoral. Por
sua condição de fragilidade e vulnerabilidade, devido à doença e ao
sofrimento, constituem-se sinais dos valores que são essenciais em
nossa vida, em meio a tantas coisas supérfluas. Eles se tornam rada-
res de alta sensibilidade. À resposta frente a esta realidade é a nossa
solidariedade samaritana. Quantos exemplos e testemunhos heroicos
encontramos nesta área da saúde. Eles nos evangelizam!”
“Ninguém se conhece a si próprio sem ter sido provado, e nin-
guém pode vencer sem ter combatido” (S. Agostinho).

Recordando a Palavra
A Palavra de Deus, proclamada neste domingo, nos apresenta a des-
truição do mundo dominado pelo mal e pela morte e nos aponta o
surgimento de um novo mundo e o nascer de uma nova sociedade.
À leitura é a conclusão da narrativa do dilúvio, essa inundação que
cobriu a terra inteira e que foi um castigo pelo pecado. O dilúvio pu-
rifica o mundo do mal e faz surgir uma nova humanidade, plantada
na gratuidade da aliança que Deus faz conosco.
Na leitura do Gênesis, encontramos uma história muito antiga.
Está na Bíblia porque tem ensinamentos muito importantes. À nova
tradução da Bíblia de Jerusalém (1998) diz sobre o dilúvio: “O tema
de um dilúvio está presente em todas as culturas, mas as narrativas
da Mesopotâmia têm particular interesse, tendo em vista suas
semelhanças com a narrativa bíblica. O autor sagrado deu a essas
tradições um ensinamento eterno sobre a justiça e a misericórdia de
sy PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

Deus, sobre a maldade do homem e a salvação concedida ao justo.


E um julgamento de Deus que prefigura o dos últimos tempos”.
Deus não castiga os homens. Somente tem amor por eles e os
quer felizes. Deus não fica indiferente diante das ações e projetos dos
homens. Suas obras boas e também maldades, egoísmos e injustiças
não passam despercebidos diante de Deus.
Como Pai, Deus intervém para criar uma nova sociedade. O
dilúvio não é um desastre provocado por Deus, mas um retrato da
ruína que os pecados provocam. À Bíblia fala em castigo, pois, na-
quele tempo, as pessoas assim se expressavam e atribuíam a Deus os
fenômenos da natureza.
No texto do Gênesis, ainda há outro ensinamento: Deus nunca
silencia diante do mal e da injustiça, mas age para reconciliar e reno-
var. Deus faz aliança com a humanidade num gesto de gratuidade. Ele
sabe que somos pecadores. Mesmo assim nos ama e nos transforma em
novas criaturas. O arco-íris, símbolo da aliança, significa a paz entre o
céu e a terra, o abraço entre Deus e a humanidade. Arco-íris passa a ser
símbolo da salvação oferecida a todos os homens em todos os tempos.
No Salmo, Deus eternamente fiel e amoroso, mostra-se como o
Deus da salvação.
Pedro proclama o kerigma, isto é, o conteúdo essencial da fé cris-
tá: a morte do Cristo pelos pecadores e sua ressurreição. Acrescenta,
todavia, um elemento original: “Ele foi também pregar aos espíritos
na prisão”. O Catecismo põe esse texto em relação com a descida de
Jesus aos infernos:
“As frequentes afirmações do Novo Testamento segundo as quais
Jesus “ressuscitou dentre os mortos! (Atos 3,15; 1Coríntios 15,20)
pressupõem, anteriormente à ressurreição, que este tenha ficado
na mansão dos mortos. Este é o sentido primeiro que a pregação
apostólica deu à descida de Jesus aos Infernos: Jesus conheceu a
morte como todos os seres humanos e com sua alma esteve com eles
na Morada dos Mortos. Mas para lá foi como Salvador, proclamando
a boa notícia aos espíritos que ali estavam aprisionados” (n. 632).
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

“A Morada dos Mortos para a qual Cristo morto desceu, a


Escritura a denomina os Infernos, o Sheol ou o Hades, visto que os
que ali se encontram estão privados da visão de Deus. Este é, com
efeito, o estado de todos os mortos, maus e justos, à espera do Redentor
— o que não significa que a sorte deles seja idêntica, como o mostra
Jesus na parábola do pobre Lázaro recebido no “seio de Abraão”. São
precisamente essas almas santas, que esperavam seu Libertador no
seio de Abraão, que Jesus libertou ao descer aos Infernos. Jesus não
desceu aos Infernos para ali libertar os condenados nem para destruir
o Inferno da condenação, mas para libertar os justos que o haviam
precedido”(n. 633)
Na 22 leitura de hoje, aparece ainda a ligação das águas do di-
lúvio com as águas do Batismo. Os efeitos da água do dilúvio estão
presentes, simbolicamente, nas águas do Batismo: destruição do ho-
mem antigo e nascimento do homem novo. É Jesus Cristo, o Ressus-
citado, que comunica pela água do Batismo a força capaz de destruir
o pecado e a morte e nos ressuscitar para uma vida nova. Ser batizado
significa entrar na Igreja, comunidade dos redimidos.
Ser batizado é se comprometer com Deus com consciência reta,
segundo a definição dada por Pedro. À Quaresma é precisamente
uma caminhada na qual se procura purificar as intenções. No evan-
gelho, Jesus está no centro de toda renovação e vida nova. Em sua
vida sempre derrotou o mal e venceu o pecado. É o novo Adão que
nos introduz na humanidade renovada.
O que Jesus nos quer ensinar com este evangelho no início da
Quaresma? O Espírito, logo depois de descer sobre Jesus no Batismo
das águas do Jordão, o envia para o lugar da tentação. Tudo acontece
no deserto durante 40 dias. Aqui, por tentação deve se entender as si-
tuações que temos que viver ou enfrentar, nas quais precisamos fazer

5 Sugerimos a leitura dos números 632 a 637 do Catecismo da Igreja Católica. Conforme as
necessidades pastorais pode ser interessante fazer pequena catequese sobre esta afirmação de
nosso Creio “proferida todos os domingos” “desceu à mansão dos mortos”.
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

opções e escolhas. São ocasiões e oportunidades para fortalecer a fé e


professar nossa fidelidade.
No Batismo recebemos o Espírito Santo, o mesmo Espírito que
animava Jesus. Isso não significa que estejamos livres de dificuldades
e provações. O Espírito nos impele e fortalece para sermos discípulos
missionários no deserto da vida, nos conflitos da sociedade, nas lutas
por justiça, pão, saúde.
Jesus é tentado no deserto durante 40 dias. “Quarenta dias” quer
dizer uma vida inteira, de manhã à noite, em todas as circunstâncias.
Deserto, na linguagem antiga, era o local onde moravam os inimigos
do bem. Marcos quer mostrar que Jesus, ao sair das águas do Jordão,
batizado por João Batista, teve que viver em luta permanente, durante
toda sua vida, contra as propostas do inimigo, opostas ao Plano de Deus.
Cada palavra, na breve narrativa da tentação de Jesus segundo
Marcos, é portadora de ensinamento:
a) batizado: é depois do Batismo que Jesus é tentado. Marcos
tem em vista o cristão cujo Batismo será seguido de muitas tentações.
Jesus torna-se o modelo da vitória contra o pecado durante sua vida;
b) o Espírito: Marcos fala pouco a respeito do Espírito Santo, à
diferença de Lucas e João. Dele fala indiretamente quando menciona
o título de profeta dado a Jesus (Marcos 8,28). Segundo os judeus,
o profeta é movido pelo espírito de Deus. Aqui, Jesus encontra-se
no deserto, o lugar de Moisés, o profeta por excelência, e de Elias,
o profeta que peregrinou à montanha da aliança (cf. 1Reis 19). Em
suma, O Espírito Santo faz Jesus compreender sua missão de profeta;
c) no deserto: o deserto foi o lugar da aliança entre Deus
e seu povo. Jesus vai mais tarde renovar a aliança pelo sangue
(Marcos 14,24). Marcos lembra, portanto, que Jesus permaneceu
no deserto, o que evoca o Sinai;
d) quarenta dias: o tempo de provação de Jesus lembra o tempo
de provação de Israel durante a caminhada para a Terra Prometida.
“Oxalá ouvisseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

À diferença do povo eleito que, durante 40 anos sucumbiu muitas


vezes à tentação, Jesus permaneceu fiel;
e) satanás - em hebraico, satã: é, antes de tudo, um verbo que
significa “submeter-se à prova”. No Livro de Jó (1,6), um anjo chama-
se Satã. É descrito como o inimigo do homem, mas não é ainda tido
como o inimigo de Deus. Mais tarde, se descobrirá nele uma das
causas da inclinação do homem para o pecado;
f) animais selvagens... anjos: Marcos parece citar aqui, implici-
tamente, o Salmo 91 que diz que o justo não terá nada a temer dos
animais selvagens e que será protegido pelos anjos. É uma maneira
de nos dizer, como o salmista, que Jesus conta inteiramente com seu
Pai. Lembra ainda Adão no paraíso, que vivia na companhia dos
animais. Lemos em Isaías que um dia a paz universal voltará: “Então,
o lobo será hóspede do cordeiro, e a pantera se deitará ao pé do ca-
brito, a criança de peito brincará junto à toca da víbora...” (Is 11,6-8).
O evangelista coloca em confronto as consequências do pecado de
Adão e a vitória de Jesus sobre o mal. À desobediência do primeiro
homem trouxe a dor, a fome, a guerra, a corrupção, a violência, a de-
sunião. À obediência de Jesus deu início à nova criação e à construção
de um novo paraíso;
g) o tempo cumprido: os judeus tinham o costume de dividir
a história do mundo em eras ou tempos que podiam durar milhares
de anos. Os tempos que deviam preceder o do julgamento de Deus
completaram-se, portanto, com a pregação de João Batista.
Jesus experimentou na carne o sofrimento, a rejeição, o ódio dos
inimigos, as ciladas dos adversários, por isso, o cristão nunca deve se
sentir sozinho. Em nós também atua a força do Espírito.
Enfim, a salvação é o ponto de convergência das leituras deste 1º
domingo da Quaresma. Jesus Cristo é o novo Adão, que, no deserto
da tentação e da oração, salva o homem de suas tentações e de seu
pecado, e o convida a entrar mediante a conversão e a fé no Reino de
Deus (Evangelho). À salvação de Cristo está como que prefigurada na
29 o PNE- BMC Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro/ Abril de 2012

salvação que Deus realizou com Noé e sua família depois do dilúvio
através do arco-íris, sinal de sua aliança salvífica (12, Leitura). À arca
de Noé, arca da salvação, prefigura, na segunda leitura, o Batismo,
pelo qual o cristão participa da salvação que Jesus Cristo trouxe aos
homens mediante sua morte.

Atualizando a Palavra
No final do evangelho, está o resumo da pregação de Jesus: “O tempo
já se completou e o Reino de Deus está próximo: convertei-vos e
crede no evangelho” (Mc 1,14-15).
Este é um convite concreto e pessoal de Jesus dirigido a todos.
Chegou o momento de mudar, abrir o coração para o novo e acolher
com alegria a proposta de Jesus. Quaresma é para isso. É um caminho
rumo à Páscoa reassumindo nosso Batismo. Isso exige conversão. É
preciso acreditar na boa notícia: Jesus pode nos redimir e salvar.
Na Vigília Pascal ouviremos: “Meus irmãos e minhas irmãs,
pelo mistério pascal fomos no Batismo sepultados com Cristo para
vivermos com ele uma vida nova. Por isso, terminados os exercícios
da Quaresma, renovemos as promessas do nosso Batismo, pelas quais
já renunciamos a Satanás e suas obras, e prometemos servir a Deus
na Santa Igreja Católica.” (Missal Romano, celebração da Vigília
Pascal, introdução à renovação das promessas do Batismo).
Esse é o resumo da caminhada quaresmal. É preciso, portanto,
nos colocarmos a caminho: intensificar a vida cristã, ouvir a Palavra
de Deus, dedicar mais tempo à oração e ao jejum, nos convertermos
ao Senhor e aos irmãos. Jesus no deserto, vencedor das tentações, é a
luz a iluminar o nosso caminho.
Na Quaresma, há um convite gratuito de Deus. Oportunidade de re-
novar nossa aliança batismal. Tempo de cultivo da nossa identidade cristã.
A conversão não é um momento pontual da vida humana
e cristã: tampouco é a reação a uma ideologia que, com sua força
4

utópica, me atrai e me deslumbra até “converter-me”. À conversão


4 . . 2 » mc
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf, Sl 94)

cristã é conversão à pessoa de Jesus Cristo, quer dizer, deixar outros


caminhos, apesar dos muitos atrativos que aparentemente dele possam
resultar, e tomar o caminho de Cristo. Igualmente, a fé com que somos
convidados a responder, não é somente uma fé humana, nem uma fé
puramente “religiosa”, mas fé em Jesus Cristo, quer dizer, em sua vida
e em sua doutrina como caminho de salvação para o homem. Uma fé
que não esteja unida ao mistério de Cristo ou que não conduza a ele é
uma fé insuficiente, que precisa ser completada e iluminada.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


É por demais significativa a reunião da comunidade, no Dia do
Senhor, para fazer memória de Jesus no deserto e com ele iniciar a
peregrinação quaresmal. Aí se toma consciência da sua missão no
mundo com tantas provocações, tentações e desafios. Faz a ligação
da vida com a liturgia.
É aí que a comunidade é chamada a celebrar a prática de Jesus
e a assumir a construção da nova sociedade. Sim, a comunidade se
reúne no deserto do mundo com Jesus, que foi tentado pelo demônio.
Aí ela ouve a Palavra de Deus. À partir da Palavra e com a Pa-
lavra de Deus a comunidade sofre as provações e é chamada a vencer
as tentações de Satanás. Confessa sua confiança no Senhor. Deixa-se
impregnar pela força pascal do Ressuscitado.
Prepara a mesa da Eucaristia para avivar, em seu coração, o com-
promisso de lutar pelo pão para todos. Canta os louvores do Senhor
para dizer que a vida está ligada a ele. Na alegria, promete servir
gratuitamente a todos.
Reza o Pai-nosso, ao redor da mesa da Eucaristia, proclaman-
do Deus como Pai e aceitando a todos como irmãos e companheiros
de jornada.

Alimenta-se do Pão e do Vinho, Corpo e Sangue dele entregues


para a salvação do mundo, para assimilar, em seu ser e em suas atitu-
des, as posturas e práticas de Jesus, sempre fiel ao Pai.
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

Sugestões para a celebração +

1. Onde for possível, a comunidade se reúna ao redor de uma


grande cruz, à frente da igreja ou em outro lugar adequado. Quem
preside faz a saudação inicial e dá o sentido da celebração. Em segui-
da, se faz a procissão de entrada, entoando um canto que expresse a
caminhada rumo à Páscoa, carregando a cruz que será colocada num
lugar de destaque, previamente preparado.
2. Acolher com carinho o Livro da Palavra de Deus, entoando
ou repetindo o refrão: “Não só de pão vive o homem, mas de toda a
Palavra que vem do Senhor” (ou outro refrão).
3. Neste tempo da Quaresma, adquirem particular importância
e relevo as celebrações penitenciais, isto é, as reuniões do povo de
Deus, inclusive em pequenos grupos, a fim de ouvir a proclamação
da Palavra de Deus, que convida à conversão e à renovação da vida,
e anuncia nossa libertação do pecado, através da morte e ressurreição
de Cristo. Há diversas formas de realizar estas celebrações peniten-
ciais. Sugerimos às equipes de liturgia consultar o Ritual da Penitên-
cia e preparar uma celebração penitencial.

À nossa vida, enquanto somos peregrinos na terra,


não pode estar livre de tentações, e o nosso aperfeiçoamento
realiza-se precisamente através das provações.
Ninguém se conhece a si mesmo se não for provado, ninguém pode
receber a coroa se não tiver vencido, ninguém pode vencer se não
combater, e ninguém pode combater se não tiver inimigos e tentações.
Cristo foi tentado pelo demônio. Mas em Cristo também tu eras tentado.
Se nEle somos tentados, nEle venceremos o demônio”.

(S. Agostinho, Comentário aos Salmos)


2º DOMINGO DA QUARESMA

04 de março de 2012
Leituras: Gênesis 22,1-2.9210-13.15-18
Salmo 115(116),10.15.16-17.18-19 (R/. Sl 114,9)
Rm 8,31b-34 ; Marcos 9,2-10 (Transfiguração)

ESCUIAL O QUE ELE DIZ (MC 9.17)

Situando-nos
Estamos no segundo domingo da Quaresma. Lentamente avançamos
para a solene celebração da Vigília Pascal. À luz do evangelho da
Transfiguração, somos convidados por Deus a um tempo especial de
conversão, de mudança de caminhos.
No domingo passado, a Igreja apresentou à nossa consideração
as tentações de Cristo, que são também as nossas tentações. Todas
elas podem ser resumidas em tentar fugir aos desígnios que Deus
tem sobre nós, isto é, em não corresponder à nossa vocação. Jesus
venceu essa tentação e avançou corajosamente para Jerusalém, a fim
de dar a vida pela salvação da humanidade.
Neste segundo domingo da Quaresma, a liturgia propõe à nossa
meditação a Transfiguração do Senhor, manifestando Cristo a sua
divindade diante dos discípulos para alentá-los na hora da cruz. Se
não nos deixarmos vencer pela tentação de seguir caminhos que não
o de Cristo, também um dia seremos transfigurados em Deus.
Ão nosso redor, tantas coisas mexem com o coração e desafiam
a nossa fé. Tantas pessoas que se afastaram das nossas comunidades.
Milhões de crianças que moram nas ruas, na mais triste pobreza.
Tantos jovens entregues às drogas. É incontável a fila de irmãos e ir-
mãs que passam fome e não tem casa para morar. Entre os poderosos
— PNE. BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

e donos do dinheiro imperam o egoísmo, a concentração de poder, os


privilégios. São milhões os sobrantes e excluídos da mesa da vida, no
dizer dos Bispos em Aparecida.
No contexto da CF 2012, como não nos lembrarmos das doen-
ças geradas pela dependência química. “O Brasil é o segundo maior
mercado de cocaína das Américas, com cerca de 870 mil usuários
adultos. (...) 2,6% da população (dados de 2005) consomem maconha
e haxixe. Segundo o Ministério da Saúde, o crack poderá tirar a vida
de, pelo menos, 25 mil jovens por ano no Brasil. A média de idade
do início do uso é de 13 anos. Ultimamente, há notícias que indicam
a rápida difusão de uma nova devastadora droga, o oxi, uma droga
mais barata e de consequências ainda mais danosas para os usuários
que o temível crack” (Texto Base da CF 2012, nn. 87-89).
O que essa situação tem a ver com a nossa preparação para a festa
da Páscoa e com o evangelho da Transfiguração de Jesus?
O projeto do Brasil na Missão Continental, a Campanha da Fra-
ternidade e as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja
no Brasil querem inspirar uma ação fraterna, solidária e profética
para mudar ou transfigurar em Cristo essa triste e dura realidade.
Com o sofrimento e o grito dos pobres, nos aproximamos hoje
da comunidade reunida e nos colocamos em oração diante do Se-
nhor, trazendo nos lábios uma súplica: “Lembrai-vos, Senhor, de
vossa misericórdia e de vosso amor, pois são eternos. Nossos inimi-
gos (a fome, a injustiça, a violência, a acomodação, o egoísmo) não
triunfem sobre nós: Libertai-nos, ó Deus, de toda angústia”.

Recordando a Palavra
O livro do Gênesis tem como personagem principal Abraão. Adão é
o exemplo da desobediência; ele contrasta, por antítese, com a fé de
Abraão que se dobra a todas as exigências de Deus. Noé, o justo, é
uma antecipação da santidade de Abraão num mundo de corrupção.
“Oxalá ouvisseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94)

Os outros patriarcas — Isaac, Jacó, José — são os responsáveis pela


fiel transmissão da promessa a Abraão feita em conformidade com
o grande ancestral. Abraão é o primeiro israelita e também pai e
modelo de todos os crentes. A história do sacrifício de seu filho é
um exemplo extraordinário de fé que inspira os atos: pelas obras sua
fé tornou-se perfeita. Ele foi chamado amigo de Deus (cf. Tg 2,23).
Na primeira leitura de hoje, há uma pergunta intrigante: como é
possível Deus pedir a um homem que sacrifique seu filho? A Bíblia,
escrita há milhares de anos, nos ajuda a recordar o modo de pensar das
pessoas daquele tempo. Hoje, nos perguntamos: será possível que um
pai seja tão cruel com seu filho? No tempo de Abraão, contudo, era cos-
tume oferecer aos deuses os próprios filhos, os queimando em fogueiras.
Na verdade, o texto quer nos mostrar que Deus condena o costu-
me pagão de sacrificar crianças. Ele é o Deus da vida e não da morte.
Os ídolos é que exigem sacrifícios humanos e não o Deus de Israel. Não
pensemos que isto é apenas coisa do passado, já superada. Por causa do
deus mercado, cujas catedrais são os shoppings, cuja espiritualidade é o con-
sumismo, cujo culto é o lucro, cujo coração é o dinheiro e não a pessoa
humana, são sacrificadas no mundo, diariamente, milhares de pessoas.
O texto ressalta a fidelidade de Abraão. Ele acreditou profunda-
mente em Deus: abandonou sua terra; deixou a segurança e a como-
didade que encontrava na família; dispensou a proteção que possuía
em sua tribo e na organização da sociedade. Deixou tudo, cortou os
laços com o passado, partiu para uma terra longínqua, porque tinha
certeza de que Deus lhe daria uma descendência numerosa. Como
resultado, dele nasceu um novo povo que caminha movido pela fé.
O texto da carta aos Romanos confirma a aliança de Deus com
Abraão e a humanidade: a salvação é oferecida a todos os homens.
Por isso, Paulo proclama bem alto: “Se Deus está conosco, quem será
contra nós? No contexto, está a multidão dos pecadores para serem
julgados. Eles reconhecem os seus pecados. Tremem de medo. Mas
eis a surpresa: ninguém aparece para acusá-los e ninguém se levanta
para condená-los ou destruí-los.
Cio PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

Deus, aquele que tudo conhece e tudo sabe, é o único capaz de


lavrar a sentença condenatória. Ele, porém, não os acusa nem os con-
dena, porque entregou seu Filho para salvá-los. Vamos mais longe:
Jesus também não os condena. Jesus morreu para destruir os pecados
e libertar os pecadores.
À cena da transfiguração ocupa lugar de importância no Evan-
gelho de Marcos. Estando situada após a primeira profecia da Pai-
xão, ela própria se torna o pivô central do seu Evangelho. Parece
completar a profecia da Paixão, apresentando uma visão da glória de
Jesus no fim dos tempos. À cena descrita visa estabelecer uma relação
com o Batismo do Senhor (o testemunho da voz do Pai) e com sua
agonia no Getsêmani (a presença dos mesmos três discípulos).
Na narrativa da Transfiguração, Jesus sobe com três discípu-
los para um monte muito alto, num lugar solitário. Naquele tempo,
quando os mestres tinham coisas importantes a comunicar a seus
discípulos, retiravam-se para lugares reservados e afastados. Jesus
age assim e, no final da narrativa, faz a recomendação importante:
que o acontecido não seja divulgado.
Para a aproximação dos lugares das manifestações do Senhor,
exigia-se santidade, justiça, fidelidade... Na montanha acontecem os
encontros de Deus com o povo, suas grandes manifestações. Moisés
e Elias receberam manifestações de Deus numa montanha. Em sín-
tese, montanha é lugar simbólico da experiência de comunhão ou de
intimidade com Deus.
Jesus sobe com os três discípulos e os introduz na lógica do Rei-
no. Introduz os discípulos em seus pensamentos e sentimentos mais
secretos. Quer que eles entrem mais profundamente nos insondáveis
desígnios de seu Pai sobre a vida e a missão do Messias.
Às vestes brancas indicam quem é Jesus. Para os israelitas a cor bran-
ca é símbolo de Deus e sinal de festa, alegria e felicidade. Elias e Moisés
representam os dois pilares do Antigo Testamento: a Lei e os Profetas.
Elias, profeta, líder, recordado na história como homem de Deus
e tido como aquele que não morreu, mas foi arrebatado aos céus, é
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

lembrado como aquele que um dia voltará para apresentar o Messias a


seu povo. No texto, ele aparece para mostrar Jesus, o Messias esperado.
Moisés está na Transfiguração porque, antes de morrer, dissera: “O
Senhor teu Deus te suscitará dentre os teus irmãos um profeta como eu:
é a ele que deveis ouvir” (Dt 18,15). Está na montanha para testemunhar
que Jesus é quem fala em nome de Deus, o profeta por excelência.
Às tendas têm um significado especial. Todos os anos, no en-
cerramento das colheitas, celebrava-se a festa das Tendas. O povo
construía tendas para lembrar a passagem pelo deserto. Era de fato
uma grande festa. Ela continha também uma inspiração voltada para
o futuro: o dia da chegada do Messias, quando todos os povos da
terra se encontrariam em Jerusalém para celebrar juntos a festa das
tendas (cf. Zc 14,16-19).
Pedro, ao falar das tendas, refere-se a este futuro e a esta festa.
Aposta na chegada do Reino de Deus: época do descanso e da festa
perene, prometida e anunciada pelos profetas. Escapa-lhe, porém,
um dado fundamental: ele pensava que seria possível entrar na festa
e no Reino de Deus sem passar pela doação da vida, sem passar pela
cruz e pelo caminho de Jesus. Marcos observa: “Ele não sabia o que
estava dizendo, porque tinha sido tomado de medo”.
À nuvem e a sombra são imagens conhecidas no Antigo Testa-
mento para indicar a presença de Deus. No evangelho de hoje ou-
vimos que “da nuvem sai uma voz”, ou seja, Deus estava presente,
agindo no acontecimento da Transfiguração.

Atualizando a Palavra
Pelo Batismo, nós constituímos o novo Povo de Deus, que caminha
para a “Terra Prometida”, onde haverá fartura de bens, suficientes
para saciar a todos. À fé experimentada por Abraão é proposta
hoje aos catecúmenos. Chamados a serem discípulos missionários,
devem abandonar muitas coisas: o consumismo, o individualismo,
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

a autossuficiência, a mediocridade, a passividade e muitas atitudes


incompatíveis com o Evangelho.
Aos que estão no catecumenato, Deus faz grandes e solenes pro-
messas: paz, perdão, alegrias, serenidade, bênçãos, acolhida na sua mi-
sericórdia... Mas, de repente, aparecem as desilusões, as horas difíceis e
as noites muito escuras, momentos de abandono, nos quais parece que
Deus não está presente e não cumpre tudo o que prometeu.
Da experiência concluímos: das coisas maravilhosas que Deus
nos prometeu percebemos, muitas vezes, apenas pequenas realiza-
ções. Aparecem apenas sinais da nova realidade que está surgindo.
No meio dos grandes sofrimentos, só temos pequenos consolos. É
aí vem a pergunta provocadora: nestes momentos, conseguimos nos
alimentar na fé de Abraão? No momento em que as esperanças so-
mem, continuamos acreditando em Deus? Contudo, Deus nunca nos
abandona, é sempre fiel e sempre está confirmando suas promessas.
Nós muitas vezes não conseguimos perceber isso.
Na leitura da carta aos Romanos, , aprendemos
AP q que o amor de Deus
Pai é imenso, 1B gratuito, B generoso, , infinito e q que não P pode ser destruído
por nenhuma quebra da aliança ou infidelidade por parte do ser humano.
Como a narrativa da Transfiguração está no centro do Evange-
lho de Marcos, o evangelista quer responder a uma pergunta bem
concreta: Quem é Jesus? (cf. Mc 1,27; 4,41; 6,2-3). O povo vai des-
cobrindo que ele é o Messias. Mas não um Messias milagreiro, rei
glorioso, vencedor, rico, poderoso, capaz de mudar rapidamente a
condição da humanidade e fazer acontecer num rito mágico a pre-
sença do Reino. Pedro, na montanha, tem essa ideia e acredita que
o Reino, simbolizado nas três tendas, pode acontecer sem a doação,
sem os sacrifícios, sem a morte e a entrega da vida. Esquece que, para
construir o Reino, o qual Jesus deixa entrever na transfiguração, é
necessário passar pelo sacrifício da própria vida.

Hoje, nas filosofias do mundo, somos contaminados por falsas


expectativas como as presentes na conversa de Pedro na montanha.
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SL 94) O 38

Ter fé significa entrar nos desígnios de Deus que frutifica na


solidariedade com os irmãos. À doação na força da páscoa de Jesus nos
transfigura por dentro e por fora. Transforma a situação e a realidade
dos abandonados e dos privados do necessário para viver e cantar a vida:
saúde, pão, terra, casa, salário digno, respeito e amor pela vida...
A fome do irmão, as crianças abandonadas nas ruas, as violências
ao ser humano são chamadas de Jesus para subirmos com ele a um
monte alto e entrarmos nos desígnios de Deus Pai, depois descermos
da montanha e fazermos a nossa parte. Páscoa é isso: passagem de
situações de menos vida para situações de mais vida, de situações de
pobreza e miséria para uma vida digna, bonita, feliz e realizada para
todos os viventes.
O ensinamento a tirar dessa cena, para todo cristão, não é
certamente a evasão deste mundo e a fuga nostálgica num mundo
celeste, nem o desejo de visões sobrenaturais. Marcos adverte cla-
ramente contra essas orientações, ao qualificar de “insensatos” os
propósitos de Pedro (não sabia o que dizer). Pelo contrário, procura
mostrar a necessidade de seguir Jesus na Paixão e na morte. Olhar
fixo no Senhor transfigurado, o discípulo de Cristo é chamado a
crer no crucificado ea segui-lo. É nele que encontra a coragem para
não se deixar abater nas provações e nas perseguições. Para ele,
ainda não é tempo de construir tendas no céu, mas de ser firme na
luta quotidiana nesta terra.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


Hoje, na montanha, inspirados no acontecimento da Transfiguração,
rezamos: “Ó Deus, que nos mandastes ouvir o vosso Filho amado,
alimentai nosso espírito com a vossa Palavra, para que, purificado o
olhar de nossa fé, nos alegremos com a visão de vossa glória”.
Toda vigília implica concentração e austeridade. A Quaresma é
tempo de bênção e conversão, é preparação e espera, situada num cli-
ma muito especial de busca do Reino de Deus. Os textos bíblicos de
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

hoje nos levam ao encontro com Deus e nos apontam o caminho da


doação e da solidariedade como caminhos de nossa Transfiguração,
Ressurreição e Salvação.
À narrativa do sacrifício de Isaac prefigura a Paixão do Cristo,
aceitando Deus a entrega de seu Filho Jesus para mostrar seu amor
na aliança com a humanidade. Na tradição judaica, Isaac é impor-
tante. Seu diálogo com o pai revela seu pleno acordo em ser a vítima
do sacrifício. À relação com a Paixão é tanto maior ao ressaltarem os
evangelistas a liberdade de Jesus. Essa narrativa ensina as exigências
da fé. Quando se ama a Deus, é preciso estar disposto a fazer coisas
que parecem contrárias à opinião comum e não são racionais. Em
muitas circunstâncias, a conformidade com mandamentos que proí-
bem o adultério, a fraude ou a mentira parecem absurdos. É preciso,
portanto, ter a solidez de Abraão.
À fé não é uma certeza ofuscante. Ela tem suas noites obscuras,
mas também consideráveis margens de luz. É uma experiência inte-
rior, inefável, que escapa a toda análise, que não se demonstra nem se
explica. O casal Sara e Abraão saiu, certamente, engrandecido desses
acontecimentos que lhe puseram à prova a fidelidade. À aliança com
Deus é imprevisível como o compromisso assumido no dia de um ca-
samento. É para a felicidade, mas envolve uma boa parte de incógnito.
Na celebração da comunidade reunida, revivemos intensamente
os desafios da fé de Abraão, entramos no coração de Paulo, ben-
dizendo a ação de Deus em nosso favor e subimos com Jesus a um
monte alto. Estamos envoltos nas nuvens e nas sombras da misericór-
dia do Senhor. Nossa atitude é permitir que o Senhor nos transfigure
e fortaleça. Com essa intenção, preparamos a mesa das oferendas e
participamos do hino de ação de graças. Na comunhão, comunga-
mos com o sentimento e a entrega de Jesus para que todos os pobres,
excluídos e sobrantes sejam acolhidos, amados e saciados na grande
festa das tendas, a festa do Reino.
Na celebração, a ação pascal de Jesus Cristo nos transfigura e
nos leva a descer da montanha para transformar o mercado da lógica
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

do capital, ressuscitar tantos abatidos pela fome, recriar o mundo de


modo que não haja tantas crianças jogadas na miséria.

Sugestões para a celebração “O

1. Preparar bem o espaço celebrativo, dando destaque a três


símbolos fortes: a cruz, a caminhada e a luz.
2. Se possível, reunir o povo fora da igreja, fazendo uma aco-
lhida muito fraterna. A equipe de celebração vai acolhendo a cada
um com um abraço ou aperto de mão. Podem ser distribuídas velas
acesas, enquanto se entoam refrões quaresmais.
3. Após o sinal da cruz e a saudação, fazer a recordação da vida,
tornando presentes as realidades que hoje precisam ser transfigura-
das, transformadas, especialmente em relação à saúde (Campanha da
Fraternidade). Em seguida, com as velas acesas, iniciar a procissão
para o interior da igreja.
4. Fazer uma prece especial pelas mulheres, no seu dia Interna-
cional, dia 08 de março.
5. Segundo Augusto Bergamini, um aspecto importante da
pastoral quaresmal é a recordação do Batismo, feita não de modo
ocasional, mas sistemático, pois a vida cristã é batismal. A Quaresma
é o tempo privilegiado da redescoberta da inserção no mistério
pascal de Cristo mediante este sacramento. Com base no Rito da
Iniciação Cristã dos Adultos (RICA) e valorizando a riqueza dos
textos batismais da Quaresma, podem ser renovados alguns gestos
significativos, como as entregas do Símbolo (Credo), dos Evangelhos,
da Oração do Senhor (cf. RICA, introdução, nn. 36-37). Outro modo
de salientar o Batismo e a realidade da mãe Igreja, que gera seus
filhos na fé, consiste no anúncio dos batismos que serão celebrados
na noite de Páscoa. As famílias das crianças serão particularmente
acompanhadas, a fim de que, durante a Quaresma, revivam seu
Batismo num caminho de fé.º

6 Cf. Bergamini, À. Cristo, festa da Igreja. SP, Paulinas, 1994, pp. 286-287.
De DEM NTE OD DA EDTA Rs A

11 de março de 2012
Leituras: Éxodo 20,1-17 ou abreviado Êxodo 20,1-3.7-8.12-17;
Salmo 18(19b),8.9.10.11 (R/. Jo 6, 680);
ICoríntios 1,22-25; João 2,13-25 (Mercadores no Templo)

A NOVA CASA DE DEUS É A COMUNIDADE DOS DISCÍPULOS MISSIONÁRIOS.

Situando-nos
Estamos no terceiro domingo da Quaresma — caminho que nos leva
à festa da Páscoa. À liturgia da Palavra e as orações nos colocam
diante do Senhor que nos pede um culto perfeito, nascido na sinceri-
dade do coração e fonte do bem, da solidariedade e da justiça.
Somos chamados a uma verdadeira purificação e a responder al-
gumas perguntas: em que consiste o nosso culto a Deus? O que esse
culto traz de novo e significativo para as nossas vidas?
O Senhor não nos pede coisas, dinheiro, liturgias pomposas,
mas obediência à sua vontade e solidariedade com todas as pessoas
frágeis, abandonadas e deixadas ao longo da estrada, da economia e
da Igreja. Somos chamados a ser santos e perfeitos com a graça e a
força de Deus. Com a antífona entramos no espírito e no sentido da
liturgia e do culto: “Quando reconhecerdes a minha santidade, eu
vos reunirei de todas as nações. Derramarei sobre vós uma água pura,
e sereis purificados de todas as faltas. Dar-vos-ei um espírito novo,
diz o Senhor” (Ez 36,23-26).
Jesus expulsa os vendilhões do Templo de Jerusalém para mos-
trar que a sua casa, a assembleia reunida, não é lugar de exploração
nem de alienação. Essa assembleia é o novo templo, construído sobre
Cristo, morto e ressuscitado, que fundamenta a nova aliança e a nova
religião em espírito e verdade.
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94) o o

Estamos em plena Campanha da Fraternidade. Tantas realidades


ligadas ao seu tema poderíamos trazer presentes nesta celebração.
Hoje, poderíamos lembrar a dependência química do álcool que
profana o templo que é o nosso corpo. Diz o Texto Base:
“A dependência do álcool é um dos graves problemas de saúde
pública brasileiro. Hoje, 18% da população adulta consomem álcool
em excesso. O uso do álcool, além de causar sérios e irreversíveis
danos a vários órgãos do corpo, está também relacionado a cerca de
60% dos acidentes de trânsito e a 70% das mortes violentas. Segundo
o Documento de Aparecida, o problema da droga é como mancha
de óleo que invade tudo. Não reconhece fronteiras, nem geográfi-
cas, nem humanas. Ataca igualmente países ricos e pobres, crian-
ças, jovens, adultos e idosos, homens e mulheres. À Igreja não pode
permanecer indiferente diante desse flagelo que está destruindo a
humanidade, especialmente as novas gerações”.

Recordando a Palavra
Na leitura do livro do Êxodo, Deus nos oferece os dez mandamentos
como condição da aliança que faz conosco. São normas curtas e fáceis
de serem guardadas e regulam as relações das pessoas entre si e com
Deus. O israelita piedoso e fiel é comprometido com a observância
dos mandamentos que envolvem toda a vida e supõem uma adesão
pessoal a Deus, que se revelou e conduz os caminhos do povo. Para o
israelita, Deus é um Pai que conhece e ama seus filhos, dialoga com
eles e lhes indica os segredos da felicidade e da realização.
Chama atenção o modo como Deus propõe os mandamentos.
Antes de tudo diz: “Eu sou o Senhor que fez sair da terra do Egito,
da casa da escravidão”. Ou seja, mostra o que fez pelo povo e depois
coloca as condições do pacto. Os mandamentos não foram decreta-
dos por um senhor poderoso e tirano, mas por um Deus libertador,
que escolheu esse povo e quer ser amigo e parceiro.
Os dez mandamentos ou as dez palavras (decálogo) formam um bloco
especial entre os 613 preceitos da lei de Moisés. São enunciados um tanto
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B + Fevereiro / Abril de 201)

separadamente dos outros no segundo livro da Bíblia (cf. Éx 20,2-17) —


nossa leitura deste domingo — e no quinto livro (ct. Dt 5,6-21). Tinham
uma importância singular: eram memorizados nos dez dedos.
Os dez mandamentos não são leis severas, difíceis, absurdas ou
impostas para cercear a liberdade. Indicam, apenas, o caminho certo.
Quem segue as orientações do Senhor foge da opressão das próprias
paixões e do fechamento sobre si. Não destrói a própria vida, mas se
torna uma pessoa livre, feliz e segura.
À primeira Carta aos Coríntios foi escrita por volta do ano 54,
ou seja, menos de cinco anos após a fundação da comunidade cristã.
De Éfeso, Paulo lhes escreve uma carta para tratar do problema da
divisão na comunidade. Os dois elementos de solução foram a fé de
todos na cruz de Cristo e seus efeitos, assim como o Batismo que foi o
mesmo para todos. Paulo afirmou com veemência que tudo fora obra
de Deus e que seu papel pessoal pouca importância tivera. “O Cristo
me enviou para anunciar o Evangelho, sem recorrer à sabedoria da
linguagem” (1ICoríntios 1,17). Quer dizer que ele não fez uso de
especulações filosóficas e de artifícios da retórica para converter o
povo. Se a fé se difundiu entre eles, não foi porque eles tivessem
tido uma inteligência profunda ou ampla cultura filosófica. Entre
os Coríntios, não há muitos sábios segundo a carne, nem muitos
poderosos, nem muitos de famílias prestigiosas (cf. 1Cor 1,26).
Na leitura de hoje encontramos o coração da pregação de Paulo:
o Cristo crucificado. Os judeus esperavam que Deus manifestasse
seu poder e destruísse todos os inimigos. Contudo, Jesus se apresen-
ta diante deles não como vencedor, mas como derrotado. Os sábios
gregos confiavam na sabedoria e no poder das ideias. Nessa ótica, a
morte na cruz não se enquadra em nenhuma lógica humana. À cruz
é uma verdadeira loucura.
Passemos ao Evangelho. À expulsão dos vendilhões do templo
acontece em pleno tempo da Páscoa dos judeus, quando Jerusalém
encontra-se apinhada de peregrinos, vindos de todas as partes do
mundo para celebrar, oferecer sacrifícios e cumprir suas promessas.
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. S| 94)

Muitos peregrinos vêm de longe e fazem economias, durante anos,


para conseguir, uma vez na vida, realizar a peregrinação santa. São
realmente dias de festa, em todos os sentidos. Os comerciantes sabem
que a festa da Páscoa é uma privilegiada ocasião de fazer muitos e bons
negócios. Em poucos dias lucram mais do que ao longo do ano.
O evangelho relata a presença e a indignação de Jesus diante des-
se comércio. Jesus vê tudo o que acontece. Não diz uma só palavra.
Faz um chicote com as cordas e expulsa os vendilhões do Templo.
Derruba as mesas, as cadeiras, o dinheiro, as gaiolas com as pombas.
À reação de Jesus é surpreendente. Por que ele reage assim?
Com duas frases ele mesmo explica tudo.

Primeira frase: “Tirai daqui tudo isso e não façais da casa de meu
Pai uma casa de negócios”. Lembra a profecia de Zacarias: no dia do
Messias “não haverá mais nenhum negócio na casa do Senhor do
universo” (Zc 14,21). Tendo purificado o templo da presença de mer-
cadores, declara que chegou o reino do Messias e condena qualquer
ligação entre religião e interesses econômicos.
À segunda frase de Jesus: “Destruí este templo e em três dias eu
o reerguerei”. Aqui, Jesus mostra a inauguração de um novo templo
e o início de um novo culto.

Mas que templo novo é esse? Tendo ressuscitado o Filho, o Pai


coloca a pedra fundamental do novo templo. Sobre essa pedra coloca
outras pedras vivas que são os discípulos missionários. Todos juntos
formam o corpo de Cristo, o novo templo onde Deus habita. Jesus
mesmo explica o significado desse templo: “Se alguém me ama, ob-
servará a minha palavra, meu Pai o amará e nós viremos a ele e nele
estabeleceremos a nossa morada” (Jo 14,23).
Portanto, a nova casa de Deus, o lugar onde ele habita, é
Cristo e com ele a comunidade dos crentes. Cristo e os membros
da comunidade cristã formam o novo santuário no qual se elevam a
Deus, em todos os momentos, os perfumes, os louvores, os cantos, os
incensos e os sacrifícios que lhe são agradáveis.
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

Atualizando a Palavra
Às perguntas que precisamos responder: por que observamos os
mandamentos de Deus? Por que temos medo do castigo? Por que
temos medo de sermos descobertos? Ou por que confiamos nas pa-
lavras de um Pai que nos ama e a quem queremos bem e, por isso,
respondemos com o nosso “sim”?
Os dez mandamentos têm sentido nos dias de hoje?
Jesus reduziu a dois todos os mandamentos: amar a Deus e amar
ao próximo (cf. Mt 22,34-40). No Evangelho de João, há um só
mandamento: amar o irmão (cf. Jo 13,34-35). Paulo vai mais longe e
diz: “Quem ama o irmão cumpriu toda a lei”. Pois os preceitos: “Não
cometerás adultério, não matarás, não furtarás, não cobiçarás” e ain-
da outros mandamentos que existem, se resumem nestas palavras:
“Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Rm 13,8-9). Logo, o
mandamento do amor engloba todos os outros.
Não podemos negar que o amor é muito mais exigente do que
qualquer lei. O amor me compromete muito mais com o irmão e com
sua história. Coloca-me em atitude de alerta permanente com a se-
guinte pergunta: o que posso e devo fazer para tornar o meu próximo
mais feliz e pleno de vida?
Os dez mandamentos exercem uma pedagogia em nosso relacio-
namento com Deus: servem para mostrar e indicar as coisas mínimas
das exigências do amor. Contudo, não esgotam a lei de Deus, porque
“somente o amor é a plena perfeição da lei” (Rm 13,10).
Relendo a carta aos Coríntios, ainda hoje encontramos pessoas, em
nossas comunidades, que são como aqueles judeus: consideram a religião
como fonte de milagres, privilégios, curas... Frequentam as celebrações
para estarem livres de desgraças. Rezam só quando estão doentes ou em
meio a dificuldades financeiras, quando estão desempregadas ou quando
precisam passar nos exames escolares no final do ano... Existem aqueles
que se comportam como os antigos gregos e pensam que é possível levar
as pessoas à fé só pelo raciocínio, reunindo provas convincentes.
À lógica do Evangelho não pode ser colocada na mesma lógica
do mundo. Ou seja, a lógica dos cristãos é a cruz de Cristo: uma vida
“Oxalá ouvisseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. S| 94)

doada, transformada em dom desinteressado. Na cena da expulsão


dos vendilhões, lembramos que a história da Igreja está permeada de
negociatas. Tantas vezes a religião foi utilizada para justificar inte-
resses, vantagens, benefícios que nada tinham a ver com o Evangelho
ou com o culto ao Deus vivo.
Nossos cantos, nossas celebrações e rezas devem ser significa-
tivas para Deus. Os sacrifícios agradáveis são as obras de amor, o
serviço prestado ao ser humano, especialmente ao doente, ao pobre,
ao faminto... À solidariedade, a partilha do pão, a acolhida fraterna
são ofertas que se elevam aos céus e nos transformam em templo
de Deus. As celebrações expressam e alimentam a solidariedade e a
partilha e nos fazem compreender melhor o significado e o alcance
do culto espiritual. Pelo poder do Espírito Santo, nas celebrações,
somos acolhidos, purificados e nos tornamos templos do Deus vivo.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


Toda celebração da Eucaristia é um divisor de águas. Nela vivemos a
tensão entre o culto perfeito e o culto baseado nos interesses pessoais
e mesquinhos. O evangelho fala da substituição do templo antigo
pelo novo. Nós já somos o novo templo, contudo, a cada momento,
precisamos ser purificados de tudo aquilo que não nos deixa ofere-
cer sacrifícios agradáveis ao Senhor. Daí a importância da escuta da
Palavra de Deus, da avaliação das nossas práticas, do afinar-se com
os desígnios do Senhor e do entrar no espírito do culto em espírito e
verdade. À liturgia transpira, do começo ao fim, o sentido e a espiri-
tualidade do culto prestado por Cristo ao Pai.
Importa nos deixarmos impregnar por esta liturgia e fazer da vida
um culto perfeito. Na celebração, bebemos na fonte que é a misericórdia
de Deus Pai. Nele aprendemos a confessar as nossas faltas. Na liturgia
importa cantar tudo que o Senhor fez por nós, antes e depois de ter
proposto o código da aliança. À oração eucarística canta exatamente
isso, tendo como centro o memorial da páscoa de Cristo.
Na fé, a cruz parece satisfazer e superar as expectativas huma-
nas. Enviar seu Filho para sofrer a morte por amor desafia todo
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

pensamento humano. Nesta Quaresma, devemos ser mais solidários


entre nós e, certamente, fazer uma loucura como a da cruz, um gesto
insensato em benefício da justiça para com os pobres.
Celebrar a Eucaristia, memória da páscoa de Cristo, significa entrar
de corpo e alma na liturgia que ele oferece eternamente ao Pai. Significa
tornar-se discípulo missionário e adorador perfeito e privilegiado.

Sugestões para a celebração

1. Acolher a todos, destacando a presença dos visitantes.


2. No ato penitencial, usar uma das fórmulas próprias para o
tempo da Quaresma.
3. Proclamar bem as leituras e cantar o salmo responsorial. Um
breve silêncio entre as leituras permite que o diálogo entre Deus e seu
povo atinja mais profundamente cada pessoa.
4. Motivar os grupos que fazem os encontros da Campanha da
Fraternidade nas casas a que convidem mais pessoas para participar. Esta
é uma forma muito concreta de sermos discípulos missionários, no es-
pírito da Missão Continental — “A alegria de ser discípulo missionário”.
5. É importante, nesta caminhada quaresmal, refletirmos e
propormos para a assembleia a prática do jejum. De um lado, os
cristãos, estão perdendo o sentido e a profundidade dessa atitude
penitencial; por outro, vemos pessoas e grupos, movidos por diferentes
ideologias, fazendo jejum até a morte, como protesto e pressão para
obter reivindicações e para chamar a atenção da opinião pública
sobre problemas ou iniciativas sociopolíticas. Nós cristãos, temos
uma motivação especial para fazermos o jejum: é Jesus que nos pede.
Quem sabe, pessoalmente, em nosso grupo ou comunidade, propor
um jejum e, com o dinheiro que gastaríamos na alimentação daquele
dia ou período, promover uma ação em favor de alguma família ou
instituição necessitada. O resultado será tanto mais autêntico quanto
mais for fruto de mudança e renovação de vida.
/ tl Bo) RA H | a e V n NE J/ Es A r

18 de março de 2012
Leituras: 2Crônicas 36,14-16.19-23; Salmo 136(137),1-2.3.4-5.6 (R/.6a);
Efésios 2,4-10; João 3,14-21 (Jesus, vida e luz)

"E POR GRAÇA QUE VÓS SOIS SALVOS!" (EF 2.5)

Situando-nos
Precisamos superar uma mentalidade que concebe a Quaresma como
um tempo “pessimista”, negativo, preocupado tão somente com o pe-
cado, com a conversão e a penitência. É precisamente o contrário: é
o tempo no qual devemos aprofundar que nós estamos salvos, não
por nossos méritos, mas porque Deus nos amou primeiro. Viver a
Quaresma é aceitar a conversão a esse amor de Jesus que chegou até
a dar a vida por nós.
Na celebração de hoje, somos conduzidos pelo Espírito para o en-
contro com Jesus. Pelos cantos e orações, na escuta da Palavra e na li-
turgia eucarística, penetramos no sentido da liturgia. Ela nos apresenta
o anúncio da paixão e da entrega de Jesus como prova do seu amor à
humanidade: “Deus amou tanto o mundo que entregou o seu Filho úni-
co, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna”.
Não podemos ficar indiferentes e insensíveis ao que acontece
nessa celebração. Nós já estamos bem próximos da festa da Páscoa e
com alegria aguardamos o dia da nossa libertação. Com Isaías can-
tamos na antífona de entrada: “Alegra-te, Jerusalém! Reuni-vos, vós
todos que a amais; vós que estais tristes, exultai de alegria! Saciai-vos
com abundância de suas consolações” (Is 66,10-11).
Vindos de um mundo dividido entre trevas e luz, morte e vida,
pecado e comunhão, tristezas e alegrias, nos acercamos da assembleia,
ARO) PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

certos de que, pela força da páscoa de Cristo, cuja memória celebramos


na liturgia, podemos fazer a passagem da morte para a vida.
É necessário, contudo, fazer uma opção clara e decidida
por Jesus. Iluminados por ele e sustentados por seu espírito, esta
opção nos torna capazes de cativar os que andam nas trevas e de
desmascarar os projetos que nos mantêm nas sombras da noite da
injustiça e da pobreza.
Uma confiança extrema perpassa toda celebração: Jesus erguido
numa cruz atrai e salva a todos. Ele é a prova do quanto Deus amou
o mundo. Nossos olhos contemplam o testemunho vivo do seu amor
pela humanidade. Somos agraciados por conhecer esse mistério e
participar desse dom: “Deus é rico em misericórdia... é por graça que
vós sois salvos! Deus nos ressuscitou com Cristo e nos fez sentar nos
céus, em virtude de nossa união com Jesus Cristo...” (Ef 2,4-6).
No espírito da CF 2012, podemos nos alegrar com a presença
da Igreja em prol da saúde: “Em sua história, a Igreja gestou inú-
meros homens e mulheres de fé, que depuseram sua esperança em
Deus e, empenhando-se como Maria, serviram aos irmãos necessi-
tados. São santos e santas da caridade. Alguns, incontestavelmen-
te, despenderam a própria vida no meio dos doentes e sofredores,
como Camilo de Lellis e João de Deus. À Igreja no Brasil também
pode louvar a Deus pela vida de Santa Paulina, Beata Irmã Dulce
e S. Frei Galvão, cujas vidas foram integralmente dedicadas aos
doentes, pobres e sofredores.
No seio da Igreja, a manifestação do amor do Pai em Cristo, em
sua oferta na cruz, liberta e inspira os discípulos missionários na acei-
tação do sofrimento como participação no sacrifício redentor. Este
fato tem suscitado, em meio aos dramas da vida, ações de graças na-
queles que aprenderam 'a confiar na obra redentora de Deus. Assim,
a Igreja pode lançar, a partir de grandes testemunhos, uma luz sobre
a doença e o sofrimento, tão oportuna no contexto de uma sociedade
que tem muitas dificuldades em aceitar e viver esta realidade.
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

Neste sentido, atentemos para o que disse o Papa Bento


XVI: “a grandeza da humanidade determina-se essencialmente
na relação com o sofrimento e com quem sofre” (Texto Base,
CF 2012, nn. 223-225).

Recordando a Palavra
O livro das Crônicas foi escrito depois do exílio da Babilônia. Passaram-
se mais de duzentos anos depois que Nabucodonosor, no ano de 587
a.C., destruiu a cidade de Jerusalém e mandou para o exílio os que
escaparam da morte, reduzindo todos à escravidão. Depois de mui-
tos anos, os israelitas voltam à terra dos antepassados, porém algumas
perguntas continuam “atravessadas na garganta”: por que o povo foi
castigado com uma desgraça tão grande? Por que Deus permitiu que o
Templo e a cidade de Jerusalém fossem arrasados pelos inimigos?
A resposta é dada pelo autor do livro das Crônicas: tudo acon-
teceu por causa da infidelidade de Israel, dos chefes, dos sacerdotes
e das lideranças. O Senhor amava seu povo, enviava profetas para
indicar-lhe o caminho do bem, mas o povo não acolheu a palavra dos
profetas. Diante da crescente maldade, Deus irritou-se e a punição
foi dolorosa e longa.
Outra causa do castigo foi Israel ter desobedecido ao preceito do
descanso da terra a cada seis anos, impossibilitando aos pobres e aos
animais alimentarem-se dos frutos naturais do solo.
O que Deus fez, então? Decidiu descontar “com juros e correção
monetária” a infidelidade. Permitiu que ficassem exilados durante
setenta anos. Com isso, a terra descansou durante todo esse tempo.
Obviamente, a lógica do autor do livro nos surpreende e não se en-
caixa nos pensamentos e nas atitudes de Deus, ao longo da história
da salvação.
L

E uma maneira muito primitiva de interpretar as relações com


Deus e levanta muitos problemas. Por exemplo, como explicar os
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

sofrimentos e as angústias dos justos e a prosperidade dos maus?


Encontramos várias passagens mostrando que, quando este povo
era fiel ao Senhor, foi derrotado pelos inimigos. Então, está
errado o ensinamento do livro de Crônicas? Não, não está, se for
entendido corretamente.
O que autor nos quer dizer na linguagem própria do tempo é o
seguinte: o castigo de Deus não é outra coisa senão aquilo que acon-
tece ao homem que envereda pelo caminho do pecado. Ele mesmo
provoca sua própria ruína e a dos outros.

A carta aos Efésios mostra que o homem sozinho não conse-


gue livrar-se das situações embaraçosas e complicadas. Deus, contu-
do, em sua infinita misericórdia, vem ao seu encontro para libertá-
lo. Tal fato é um presente gratuito do Pai. Por isso, ninguém pode
vangloriar-se do bem que consegue fazer e muito menos pode des-
prezar quem ainda não abriu seu coração a uma graça tão fascinante.
O evangelho fala da serpente de bronze erguida no deserto. Na
penosa passagem pelo deserto, acontecia de tudo: o sol quente, a
sede, a falta de alimentos, as murmurações, os desânimos, as críticas
dos insatisfeitos e, para coroar a lista dos infortúnios, aparecem as
serpentes que picam mortalmente as pessoas. Moisés desesperado
dirige-se ao Senhor. Ele manda erguer uma serpente num poste. Às
pessoas picadas deveriam olhar para a serpente para serem curadas.
Parece algo muito mágico.
Os rabinos diziam que as pessoas eram curadas não porque diri-
giam o seu olhar para a serpente, mas porque erguiam o seu coração
para Deus e confiavam nele. Era o Senhor que as salvava e não o
objeto de bronze. Jesus recupera essa imagem como sinal de tudo
que lhe iria acontecer. Ele também será levantado numa cruz e todos
os que o contemplarem encontrarão a salvação para suas vidas. Na
prática, o que isso significa?
Olhar para Jesus “levantado” numa cruz significa crer nele. Crer
nele significa acolher a mensagem que ele, do alto da cruz, dirige a
"Oxalá ouvisseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. S] 94) EJA

todos os homens: a única maneira de realizar a própria vida é doá-la


por amor, como ele o fez. Crer, numa palavra, é identificar a própria
vida com a vida de Cristo, ou seja, vivê-la a serviço dos irmãos. Este
é o único caminho para conseguir a salvação.
No evangelho, temos ainda outra afirmação importantíssima:
“Deus tanto amou o mundo que lhe deu seu próprio Filho e este não
veio para julgar o mundo, mas para salvá-lo; quem, porém, não crê, já
está condenado”. Como entender essa palavra de Jesus? Estamos no
contexto da proposta feita do alto da cruz, ou seja, de dar a vida por
amor, como única maneira de valorizá-la. Diante da doação de Jesus
é preciso se definir e acolher a proposta de também entregar a vida e
fazer dela um dom para Deus e para os irmãos.

Atualizando a Palavra
À queda de Jerusalém e a destruição do Templo foram acontecimen-
tos muito significativos para o pensamento religioso de Israel. Do
mesmo modo, a restauração da Cidade Santa, começada pelo Tem-
plo, era um sinal de esperança de grande alcance.
Do livro das Crônicas concluímos: a história de amor entre Deus
e o homem nunca termina como uma condenação. Tal como acon-
teceu com os israelitas, o homem que se afasta de Deus mete-se em
complicações e desajustes e torna-se escravo dos ídolos. Deus, porém,
nunca o abandona. Não há situações desastrosas nem forças resisten-
tes que possam impedir o poder de seu amor misericordioso. Contu-
do, é grande a responsabilidade do homem que, ao negar-se a seguir
o caminho de Deus, se condena e se destrói. Entretanto, nunca será
o mal que prevalecerá, mas o amor de Deus.
Na carta aos Efésios, aparece claramente que não é o homem a
causa de sua salvação. O ser humano não se salva por seus méritos
e obras. Às boas obras são uma resposta ao amor e à ação de Deus.
São sinais que indicam que a graça de Deus conseguiu penetrar e
produzir frutos no coração do homem e da comunidade. Nós nada
53 PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

fazemos para merecer a salvação. As nossas ações maldosas nos


trazem a condenação. Deus, porém, nos ama e salva gratuitamente.
Do evangelho de hoje colhemos um ensinamento: alcança a
salvação quem tem a coragem de doar a sua vida, como fez Jesus.
Aquele que não aceita doar a vida e escolhe o egoísmo, os prazeres e
as satisfações, condena-se à morte e, portanto, destrói a própria vida.
O julgamento não acontece somente no final do mundo, mas
já no hoje da história. Cada instante é tempo de salvação ou conde-
nação. Depende da adesão a Cristo, pregado na cruz e ressuscitado.
Recusar a proposta da cruz significa condenar-se. As boas obras são a
resposta ao carinho de Deus e opção pela luz e verdade que é Cristo,
luz do caminho.
O evangelho traz uma frase difícil: “Quem nele (Jesus) crê não é
condenado, mas quem não crê já está condenado”. Embora essa palavra
tenha um valor eterno, é preciso situá-la na vida pública de Jesus para
compreender seu sentido. É principalmente nas situações de conflito
vividas por Jesus que se descobre a originalidade de sua mensagem.
À palavra de Jesus é dirigida a Nicodemos, um fariseu que veio
procurá-lo numa noite, quase em segredo. Para os fariseus, que repre-
sentam o grupo judeu mais importante da época, a justiça de Deus é
clara. Deus torna justo e santo aquele que obedece à lei. O homem
que aceita o ensinamento sobre a inteligência da lei tem, portanto,
mais chances de se justificar. O bom aluno dos fariseus estuda como
convém. Ele despreza os demais: “Mas este povo, que não conhece a
Lei, são uns malditos” (João 7,49).
Jesus, que frequenta os pecadores, dá uma última oportunidade
ao desonesto (Zaqueu), ao impuro (a mulher adúltera) ou mesmo ao
bandido (o ladrão). Aqueles que não teriam tido nenhuma ocasião de
conversão encontram Jesus. Eles creem. Eles têm fé na ternura de Deus.
Experimentaram toda a reprovação de seu meio social. Perceberam
olhares de ódio. Viveram a rejeição de pessoas respeitáveis. Ouviram
a palavra espontânea que condena sem apelação. E, depois... Jesus
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

veio. Já não esperavam nada da mediocridade humana. De repente, a


fé em Jesus transformou a vida deles.

Ligando a Palavra com a ação eucarística


No dia de hoje encontramos um motivo especial para celebrar a
Eucaristia: com o nosso sacrifício de louvor, realizado em comunidade,
no Dia do Senhor, acolhemos o Filho de Deus que iluminou as nossas
trevas e reavivou a esperança de um mundo novo. Partilhando e
comendo o Pão vivo, nesta terra, como peregrinos, antecipamos, na
fé e sacramentalmente, a realização definitiva da perfeita comunhão
entre o homem, o mundo e Deus. Por isso podemos rezar na oração
depois da comunhão: “Ó Deus, luz de todo o ser humano que vem a
este mundo, iluminai nossos corações com o esplendor da vossa graça,
para pensarmos sempre o que vos agrada e amar-vos de todo o coração”,
A assembleia reunida lembra o povo no deserto a caminho da
Terra Prometida. Ela também enfrenta todo o tipo de dificuldades.
Sente desânimos. É “picada” pelo veneno do egoísmo, do poder, da
desconfiança e pela acomodação. À Palavra proclamada lembra os
males da infidelidade e mostra que seguir os caminhos do Senhor
traz paz, segurança e salvação. Salvação presente e atualizada na pro-
clamação da Palavra, na preparação da mesa, na oração eucarística,
na partilha do pão.
Na celebração, está presente e age o Ressuscitado que a todos
atrai e salva, liberta e reconcilia com o Pai. Celebrar a liturgia é en-
trar no Mistério da Salvação e deixar-se impregnar por ele. Este é o
sinal da alegria visibilizado especialmente na celebração de hoje.

Sugestões para a celebração E

1. Preparar o espaço da celebração com sinais de alegria: algumas


flores e a cor rósea, substituindo o roxo, nas toalhas e vestes litúrgicas.
55 Lo PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

Os instrumentos musicais podem dar um toque de festividade a toda


a celebração.
2. Fazer entrada solene da cruz, acompanhada de velas e de
algum objeto ligado à CF. Colocar a cruz em lugar de destaque.
3. No Ato Penitencial, cantar (ou rezar) a 3º invocação do tem-
po da Quaresma(cf. MR, p. 397).
4. Durante a proclamação do Evangelho, erguer a cruz diante
da comunidade.
5. Fazer a profissão de fé e as preces dos fiéis diante da cruz
erguida e, se for possível, com velas acesas.
6. Lembrar que amanhã, dia 19 de março, celebramos a soleni-
dade de São José, homem justo e fiel.
7. “A Pastoral da Quaresma cuidará para que as constatações
de conversão cristã não aconteçam
ç apenas
Pp em nível individual, mas
também comunitário. À Quaresma é o grande tempo da conversão
da 8 Igreja.
) Existem P pecados, 2 em todo 8 grupo
P ou comunidade, , q que não
são imputáveis aos indivíduos, mas à coletividade. As celebrações
penitenciais comunitárias terão também esta finalidade: individuar,
denunciar e remediar este tipo de pecado coletivo”.

“Eu cansei mais de ofendê-lo do que ele de me perdoar”.

(S. Teresa d' Ávila)

Uma das encíclicas mais notáveis de João Paulo II é a Dives in


misericordia (rico em misericórdia). Ele dizia: O amor de Deus é capaz
de se tornar próximo de cada filho pródigo, de cada miséria humana.
Aquele que é assim objeto de sua misericórdia não se sente humilhado,
mas como reencontrado e revalorizado. À conversão a Deus consiste
sempre numa descoberta de sua misericórdia, quer dizer, desse amor
paciente e terno como o é Deus Criador e Pai (cf. nn. 5-6).

7 Bergamini, À. op. cit., pp. 287-288.


5º DOMINGO DA QUARESMA
25 de março de 2012
Leituras: Jeremias 31,31-34; Salmo 50(51),3-4.12-13.14-15 (R/. 123);
Hebreus 5,7-9; João 12,20-33 (Morte e glorificação)

"FOI PRECISAMENTE PARA ESTA HORA QUE EU VIM!" (JO 12,27)

Situando-nos
Estamos chegando ao final da Quaresma. No próximo domingo
iniciaremos a Semana Santa, com o Domingo de Ramos. Neste dia,
também concluiremos a primeira etapa da Campanha da Fraternidade
2012. Com o gesto concreto da coleta manifestamos nossa atitude de
partilha e solidariedade.
Na celebração de hoje somos convidados a ver Jesus em sua mis-
são recebida do Pai. Seguimos os passos dos gregos que subiram a
Jerusalém para adorar a Deus. Mas eles querem ver Jesus. O que
significa ver Jesus? Por que ver Jesus? Ver Jesus é compreender sua
atitude e desvendar seu projeto. Jesus mesmo o explica, fazendo uma
meditação sobre a “hora”.
“Hora” é o final de sua vida terrestre. Tudo caminha para essa
hora. À “hora” é o momento no qual o amor gratuito de Deus, mate-
rializado em seu carinho pelos pobres, encontra-se com a força social
e religiosa que o rejeita: o pecado. Esse conflito expressa-se na cruz.
Por isso, a cruz é levantada como denúncia daquilo que leva Jesus à
morte e como testemunho de sua entrega de amor.
À Solenidade da Anunciação do Senhor é transferida para o dia
de amanhã.
57 PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro
/ Abril de 2012

Recordando a Palavra
No livro de Jeremias, no capítulo 31, é anunciado que um dia Deus
estabelecerá uma nova aliança com o seu povo. Este é um texto refe-
rencial no Antigo Testamento.
Após o reinado desastroso e corrupto de Manassés, sobe ao tro-
no o rei Josias. Ele é muito criança quando assume o poder, mas,
aos poucos, revela-se muito piedoso e inicia uma profunda reforma
religiosa. Jeremias observa tudo em silêncio e mostra-se favorável à
escolha do novo monarca.
Em todos despertam esperanças de dias melhores. Está em anda-
mento uma renovação espiritual e política. Enfim, Israel poderia voltar
a ser um povo unido, poderoso e forte, como nos tempos de Davi e Sa-
lomão. Nos bastidores dos novos tempos há, porém, uma inquietante
reflexão: é preciso descobrir os erros do passado e tomar providências
para que certas coisas não mais se repitam. Jeremias lembra um fato
histórico decisivo: cem anos antes as tribos do Norte foram aniquiladas
pelos assírios. E pergunta: por que Deus permitiu tal desgraça?
Nos versos 31 e 32, o Senhor responde dizendo: “o reino do Nor-
te foi destruído por causa da sua infidelidade à aliança”. Sim, algu-
mas centenas de anos atrás, os israelitas no Sinai tinham feito uma
aliança com Deus que os tirou do Egito e que tinha se comprometido
a defendê-los e fartá-los de bens; havia-lhes prometido uma vida feliz
e próspera. Essa promessa tinha, no entanto, uma condição: que eles
observassem seus mandamentos e ouvissem seus profetas. O povo
tinha jurado fidelidade, mas, na prática, tinha acontecido o contrário.
Como reatar essa aliança? Com que garantias? Em que contex-
to? É necessário estabelecer uma nova aliança. A aliança e a lei de-
verão ser escritas não em pedras frias, mas no coração das pessoas.
Gravadas pela força do Espírito. Quem recebe esse Espírito é capaz
de vencer todas as tentações.
Quando se realizará essa profecia? À profecia começa a realizar-
se na Páscoa de Cristo, quando ele, morrendo e entrando na glória do
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94)

Pai, enviou o Espírito Santo. À partir daquele dia, a lei de Deus foi
gravada em nosso coração.
A Nova Aliança que Deus vai estabelecer, após soberanamente
ter perdoado o rompimento da antiga, não consiste nem numa modi-
ficação das diretrizes dadas no Sinai e dos compromissos ali assumi-
dos, nem num novo culto puramente espiritual: ela consiste, em vez,
no fato de as diretrizes e os compromissos de outrora serem inscritos,
doravante, no fundo do coração, no íntimo do homem. À estrutura
da personalidade será de tal modo regenerada que cada um, instruído
no seu íntimo, conhecerá e fará a vontade do Senhor.
Na carta aos Hebreus, encontramos um Jesus humano. Ele não
fingiu ser homem, ele passou verdadeiramente por todas as dificul-
dades e tentações comuns aos seres mortais. Tudo isso, porém, com
uma diferença: nunca se deixou vencer pelo mal ou pelo pecado e
sempre se manteve fiel ao Pai.

Hoje aparece claramente a reação de Jesus frente à morte e ao so-


frimento. Sentiu na carne aquilo que se passa com o ser humano nessas
situações. Dirigindo-se ao Pai pediu que ele o ajudasse e, se possível, o
poupasse da dor e da morte. Orou, sentiu necessidade de invocar o Pai
para descobrir a sua vontade e para ter forças para realizá-la.
No Evangelho de João é narrado um fato acontecido poucos dias
antes da última páscoa de Jesus. Um grupo de gregos ou de estran-
geiros que se tinham convertido à religião judaica ouvira falar de
Jesus e queria encontrá-lo, ou melhor, vê-lo.
Para João, ver Jesus não significa só contemplá-lo com os olhos,
mas conhecê-lo em profundidade, descobrir quem ele é realmente.
Os gregos querem penetrar no íntimo da pessoa de Jesus. Eles antes
eram pagãos, adoravam ídolos e tinham práticas supersticiosas. Um
dia, porém, conheceram o Deus de Abraão e aceitaram a religião
hebraica. Por ocasião da Páscoa, sobem até Jerusalém não para fazer
turismo, mas para rezar, para encontrar-se com Deus e descobrir o que
ele ainda quer deles. Tomam consciência que ainda não alcançaram
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos cla Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

aquilo que o Senhor lhes pede. Sentem que Deus quer que eles se
diriam a Cristo. Eles, no entanto, não se dirigem diretamente a
Jesus, mas a Felipe e André, os únicos apóstolos com nome grego,
portanto, os interlocutores e mediadores mais apropriados.

Atualizando a Palavra
Na primeira leitura temos a profecia de Jeremias sobre a nova aliança
a qual nós vivemos hoje. Em Cristo repousa a nova aliança. Para
estar nessa aliança, precisamos da força pascal do Cristo. Essa força
nós recebemos no Batismo e continuamos recebendo na celebração
dos sacramentos e na oração da Igreja: é o Espírito de Cristo, a lei da
nova aliança, escrita no coração de cada um de nós.
Em Hebreus, colhemos uma lição preciosa: Jesus não é um se-
nhor sentado nos palácios, desligado da situação real das pessoas.
Jesus não permaneceu nos céus, contemplando as nossas angústias,
mas tornou-se companheiro de viagem. Percorreu o caminho da hu-
milhação e da morte. Por tudo isso, podemos confiar nele e aceitar o
convite que nos faz para sermos discípulos missionários. Dessa forma,
a segunda leitura nos convida a seguir o mesmo caminho de Cristo,
um caminho semeado de dificuldades. Ele, porém, o percorreu antes
de nós e por isso compreende nossas dificuldades e incertezas, nossos
receios e fraquezas.
Foi escolhido, para este domingo, o texto que comenta a agonia de
Jesus. A Paixão é ali descrita como uma oferenda suplicante, toda pe-
netrada de respeito à vontade de Deus. O autor, um discípulo de Paulo,
afirma, ao mesmo tempo, que essa prece foi ouvida e que o Cristo deve
sofrer e obedecer. O atendimento consiste numa transformação que se
opera por meio da própria morte. À obediência termina numa glorifi-
cação, aqui expressa em termos de sacerdócio: em vez de ser adorado e
saudado com o título de Senhor, o Cristo é reconhecido como salvador
e proclamado sumo sacerdote (cf. v. 5). Na busca incansável de um
culto em espírito e em verdade (cf. João 4,23), Jesus chegara inclusive
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. S| 94)

a purificar o Templo com a expulsão dos vendedores (cf. João 2,15).


Ele soube realizar esse gesto com seus riscos e perigos. À decisão
se inspirou na consciência de pertencer a um sacerdócio de ordem
mais elevada.
O episódio do evangelho de hoje situa-se entre a ressurreição
de Lázaro e a última Ceia, segundo o quarto Evangelho. À agres-
sividade dos adversários de Jesus chegou ao auge. À Paixão já é
tramada nos gabinetes. Os sumos sacerdotes haviam dado ordens:
Se alguém soubesse onde Jesus estava, o indicasse, para que o pren-
dessem (João 11,57).
No evangelho, no entanto, Jesus convida seus discípulos a se-
guirem o gesto prudente do agricultor que semeia. Diz-lhes para
não terem medo de perder a própria vida, porque quem morre por
amor entra na glória de Deus. O evangelho interpreta a morte de
Jesus como uma manifestação de seu amor. Para ele o homem cres-
ce e se realiza somente quando ama, ou seja, quando doa sua vida
pelos irmãos.
O grupo dos gregos representa todos os pagãos que querem co-
nhecer Cristo. Não se sabe se os gregos se encontraram com Jesus.
Fica, porém, uma palavra importante de Jesus: o grão de trigo para
se transformar em espiga deve morrer embaixo da terra. Igualmen-
te o homem, se quiser valorizar sua vida, se quiser fazer surgir um
mundo novo, deve antes ter a coragem de morrer, ou seja, doar a si
mesmo por amor. Para Cristo, o homem atinge o ponto mais alto da
realização de sua vida quando se entrega à morte por amor aos seus.
O homem quer frutificar sem morrer, mas é impossível. Jesus
aceita ser grão que morre debaixo da terra para dar fruto abundante.
Em Jesus se dão as mãos duas realidades fortemente antagônicas: a
morte e a fecundidade. Na conjunção de perder o mundo para ganhar
o mundo resume-se o mistério pascal de Jesus Cristo.
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

Ligando a Palavra com a ação eucarística


Logo mais entraremos na Semana Santa e a liturgia de hoje tem a
finalidade de preparar os cristãos para o acontecimento da Páscoa.
Hoje o Pai nos entrega Jesus, o grão fecundado pela força do Espíri-
to, feito Pão da Vida para nossa salvação.
À liturgia deste domingo procura nos persuadir sobre a eficácia do
sofrimento vivido no amor. Podemos ficar na superfície, como a mul-
tidão que observa, curiosa, os feitos e gestos de Jesus. Podemos, pelo
contrário, fazer nossas as disposições dos gregos. Eles são atraídos pela
cruz que salva. “Quando eu for elevado na terra, atrairei todos a mim”.
Às vésperas da festa da Páscoa, reunidos em assembleia, atentos
na escuta da Palavra, permitimos que a ação do Espírito nos purifi-
que. Na oração eucarística, renovemos a aliança que o Pai nos oferece
no sangue de seu Filho. Partilhando o pão da eucaristia, comungan-
do em seu sacrifício, acolhemos a cruz em nossa vida como passagem
necessária para a salvação e a realização plena de nossas vidas.
Jesus pregado na cruz revela, com sua morte, o Deus da vida.
Este é o Jesus que será visto pelos gregos e que nós encontramos
na celebração de hoje. Vindos de uma sociedade marcada por tan-
tos conflitos, injustiças, violência, mortes, fome, guerras, vamos ao
Senhor e dele recebemos o ensinamento do grão que cai na terra e o
anúncio de sua morte e glorificação.
Ao participar da liturgia, descobrimos a relação profunda que
existe entre a realidade complexa e conflitiva e o mistério do grão de
trigo. À antífona da Missa de hoje nos anima a celebrarmos a Páscoa
do cordeiro: “A mim, ó Deus, fazei justiça, defendei a minha causa
contra a gente sem piedade; do homem perverso e traidor, libertai-
me, porque sois, é Deus, o meu socorro”.
O pão e o vinho são os sinais da Nova Aliança. É o corpo e o san-
gue de Jesus. Que aqueles que deles se nutrem desenvolvam em si pró-
prios autênticos sentimentos de aliança com Deus e entre eles mesmos!
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. SI 94)

Sugestões para ad celebração “TT

1. Fazer a procissão de entrada com a cruz, velas e vasilha com


terra e alguns grãos de trigo.
2. Logo após a saudação inicial, quem dirige a celebração
pode convidar a assembleia a lembrar dos acontecimentos e das
ações da comunidade que são sinais de vida e ressurreição: a Pás-
coa de Jesus acontecendo em nossa Páscoa. Ter presente a exis-
tência de tantos mártires que, como grãos fecundos, entregaram a
vida pela vida de muitos.
3. Na homilia, é importante ligar a Palavra recebida com a
ação celebrativa.
4. Motivar para a coleta da CF que será realizada no próximo
domingo em todas as igrejas do Brasil.
5. O gesto de cobrir as cruzes e as imagens na igreja, a partir
deste domingo, pode ser uma forma de ajudar as pessoas a percebe-
rem a proximidade da Semana Santa.
DOMINGO DOS RAMOS
E DA PAIXÃO
1º de abril de 2012
Leituras: Marcos 11,1-10 (antes da bênção dos ramos); Isaías 50,4-7;
Salmo 21(22),8-9.17-182.19-20.23-24 (R/. 22)
Filipenses 2,6-11; Marcos 14,1-15,47 ou abrev.
Marcos 15,1-39 (Paixão do Senhor)

HOSANA! BENDITO O QUE VEM EM NOME DO SENHOR! BENDITO SEJA O REINO


QUE VEM! (MC IL9-10)

Situando-nos
Com a celebração de hoje, entramos na Semana Santa. O que é a Semana
Santa? Por que ela é tão importante na dinâmica do ano litúrgico?
Na Semana Santa celebramos a história da salvação de um Deus
que se humilhou e tornou-se homem para caminhar conosco, conhe-
cer a nossa história e nos apontar caminhos de vida. Mas não é só
isso. No Getsêmani, Jesus experimenta uma grande tristeza e sente a
dor da angústia. Suspenso entre o céu e a terra numa cruz, ele vive o
doloroso abandono por parte do Pai. Enfrenta a traição de Judas que,
com um beijo, o entrega aos seus inimigos. Pedro não o reconhece na
presença de uma empregada. Os discípulos, seus amigos prediletos,
fogem e o deixam sozinho nas mãos dos soldados. À condenação
forjada é tramada para eliminar sua pessoa e os desígnios de Deus
nele manifestos. Jesus, o Servo Sofredor, despido de toda dignidade
é reduzido a um farrapo. humano.
Essa experiência de Jesus na Semana Santa é a história
viva da humanidade. Contemplando a paixão e morte de Jesus,
fazemos memória dos sofrimentos, das injustiças e das violências
experimentados por milhões de seres humanos. Ele assume e faz seus
“Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94) 64

todos esses sofrimentos. Em sua morte e ressurreição, estão presentes


todos os sofrimentos humanos.
A Semana Santa, tempo de comunhão e solidariedade com e em Je-
sus, é um tempo santo e precioso para entrarmos na História da Salvação e
da Libertação. Somos convidados a tomar parte nesta história como agen-
tes, como discípulos missionários, não permitindo que o pecado, que levou
Jesus à morte e ainda destrói tantas vidas, invada o nosso ser e o nosso agir.
Nessa Semana, meditamos o Evangelho de Jesus, contemplamos
sua prática, acolhemos sua proposta de doação e partilha, entramos
em sua atitude de obediência ao Pai e de serviço à humanidade. Na
oração da coleta, imploramos a graça de conversão e mudança de
vida, dizendo ao Pai: “concedei-nos aprender o ensinamento da sua
paixão e ressuscitar com ele em sua glória”.
Unidos com toda a Igreja no Brasil, concluímos hoje a primeira
etapa da Campanha da Fraternidade 2012. Além da nossa conscien-
tização sobre o problema, os desafios e as perspectivas da saúde em
nosso país, hoje é o dia de realizarmos o gesto concreto, pois a CF se
expressa concretamente pela oferta de doações em dinheiro, na Co-
leta da Solidariedade. É um gesto concreto de fraternidade, partilha
e solidariedade, feito em âmbito nacional, em todas as comunidades
cristãs, paróquias e dioceses. À Coleta da Solidariedade é parte inte-
grante da Campanha da Fraternidade. O gesto fraterno da oferta tem
um caráter de conversão quaresmal, condição para que advenha um
novo tempo marcado pelo amor e pela valorização da vida.

Recordando a Palavra
A leitura do profeta Isaías fala do Servo do Senhor ou Servo
Sofredor. Quem é ele? Ele é o escolhido, dotado de dons, capaz
de atrair e provocar a adesão dos ouvintes. Esses dons lhe são
concedidos em vista da missão: transmitir uma mensagem a quem
perdeu toda a confiança.
À característica mais surpreendente no personagem do Servo é
sua inocência. Ele é um justo. No entanto, ele sofre e seu sofrimento
é absolutamente imerecido.
O PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

A leitura mostra as disposições interiores do Servo do Senhor:


vive na permanente escuta da Palavra de Deus; o coração e os ouvidos
estão abertos para não deixar escapar nada do que o Senhor lhe revela.
A missão implica, porém, muitos sofrimentos. Sua pregação denuncia
injustiças, atinge aqueles que exploram e escravizam, aponta a corrupção
política e moral... Tudo isso lhe acarreta perseguição. Ele é flagelado e es-
pezinhado. Qual sua reação? Resiste firme, não abre a boca, não reclama,
mas confia no Senhor, porque sabe que ele está ao seu lado. Jesus é o Servo
que dedicou sua vida para libertar e consolar os oprimidos,
Na história do Servo Sofredor e de Jesus, é fácil reconhecer a história
de todos os homens e mulheres que querem praticar e proclamar a justiça.
O evangelho nos mostra que Jesus aceitou livremente sua morte,
porque compreendeu seu sentido. Ele se sabia inocente. Compreen-
dia que a morte de um justo não podia ser senão o bem dos outros
prostrados pelo pecado.
À segunda leitura projeta uma luz sobre a missão de Jesus Cris-
to, seu esvaziamento que nos valeu a salvação. À comunidade dos fi-
lipenses, amada e muito querida por Paulo, encontra-se em situações
de ciumeiras, desavenças, fofocas, disputas de poder. Paulo reage com
palavra forte: “Nada façais por espírito de partido ou vanglória, mas que
a humildade vos ensine a considerar os outros superiores a vós mesmos.
Cada qual tenha em vista não os seus próprios interesses e sim os dos ou-
tros” (F12,3-4). Ele recorre a um hino muito antigo para fundamentar a
intervenção de Deus nesta história (cf. F1 2,6-11). O poema na forma de
hino, que é proposto aos filipenses, comporta dois movimentos: o des-
pojamento voluntário do Cristo (v. 6-8) e sua elevação por Deus (v. 9-11).
“O Cristo Jesus, ele que tinha a condição divina, não considerou
o ser igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente”. Parece ha-
ver um contraste entre o que vai fazer o Filho de Deus e o que Adão
fez. O Cristo escolheu na terra a humildade e a obediência em vez do
orgulho e da revolta de Adão que se quis fazer igual a Deus. E vós
sereis como deuses, disse a serpente (cf. Gn 3,5).
“Ele se despojou assumindo a condição de servo”. E a Encarnação
que é descrita como uma kénosis (esvaziou-se a si mesmo). Essa kénosis ou
"Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94)

esvaziamento não implica que Jesus deixe de ser igual a Deus ou de ser a
imagem de Deus. É em seu próprio esvaziamento que ele revela o ser e o
amor de Deus. Os cinco verbos seguintes descrevem esse esvaziamento:
“assumindo a condição de servo, tornado semelhante aos homens e reco-
nhecido como um homem em seu comportamento, ele humilhou-se a si
mesmo, fazendo-se obediente até à morte e morte de cruz”.
O movimento de elevação vem em seguida. “Por isso Deus o
sobre-exaltou grandemente”. Do mesmo modo, como na parte ante-
rior, o hino retoma as expressões que expõem o destino do misterioso
Servo do Livro de Isaías. À elevação está ligada com a ressurreição ou
a ascensão, que é a ação soberana do Pai. O paralelo deve ser feito com
o lirismo do Livro da Consolação: Eis que meu Servo há de prosperar,
ele se elevará, será exaltado, será posto nas alturas (cf. Is 52,13).
A entrada de Jesus em Jerusalém é descrita por Marcos com todas
as características de uma reportagem enriquecida por um diálogo com os
donos do burrinho, não faltando um colorido político pela aclamação do
povo. Não se fala do “filho de Davi”, mas do “reino do pai Davi”.
À narração da Paixão segundo Marcos é a narração mais breve
e mais antiga. Marcos escreve dando importância às testemunhas
oculares destes fatos. Jesus apresenta-se em toda a sua fragilidade
humana, entregue à solidão, à angústia. Mas, com sua morte, é ma-
nifestada sua divindade nas palavras do centurião romano: “verda-
deiramente este homem era Filho de Deus”. Durante o processo que
foi movido, Jesus guarda silêncio, confiando unicamente em Deus, a
quem no Horto das Oliveiras chama “Abba” (paizinho).
O Evangelho de Marcos é o que com mais realismo e até com
certa crueldade nos narra a paixão de Jesus. Ele realiza e vive uma
paixão física, que atinge todo o seu corpo; mas também uma paixão do
coração. No Getsêmani, Jesus sofre pavor, angústia, tristeza e é preso
e amarrado com violência pelo povo que veio a ele com espada e paus,
dando-lhe bofetadas. No pretório, os soldados romanos teceram uma
coroa de espinhos e colocaram-na sobre sua cabeça. Aí mesmo, lhe
golpearam na cabeça com uma vara, lhe cuspiam e, colocando-se de
joelhos, lhe faziam reverência. Depois o crucificaram. O evangelista
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos cla Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

termina o relato dizendo: Jesus, dando um forte grito, expirou. Grito


de dor, grito que resume toda a paixão: do corpo e do coração.
Como se comportam os seus? Judas o trai, Pedro o nega, todos
os discípulos o abandonam e fogem. As autoridades também agem
de forma violenta e brutal. Jesus, o inocente, é julgado e condenado.
Ele, o Senhor, é esbofeteado por um servo, escarnecido pelos solda-
dos, objeto de zombaria do povo.
Este evangelho, descrevendo o realismo da paixão de Jesus, não
nos pode deixar indiferentes.

Atualizando a Palavra
A Palavra que ouvimos na celebração de hoje é muito forte. Ela
nos confronta com nossa própria fé, com o modo como a vivemos e
testemunhamos. No evangelho que segue a bênção dos ramos, vemos
Jesus a caminho de Jerusalém. Em que ponto deste caminho nós
estamos? Estamos à frente, atrás ou nos mantemos à beira da estrada?
Exultamos convictos: “bendito o que vem em nome do Senhor” ou o
fazemos superficialmente, levados pelo “embalo da multidão”?
Não basta clamar “bendito o que vem em nome do Senhor”.
Urge agir e ser para que efetivamente haja espaço para ele se tornar
presente em nossa sociedade. Há várias formas de buscar que isto se
realize, uma delas é nos fazermos portadores da paz, que é fruto da
justiça. É assumir, apesar de todas as pedras no caminho, o chamado
que nos é feito e, a exemplo do servo sofredor, poder dizer: “não lhe
resisti nem voltei atrás... sei que não sairei humilhado”.
Esta certeza nos é reforçada pelo próprio Cristo que se esvaziou, se
humilhou e depois foi por Deus Pai exaltado. Participar da Eucaristia
significa viver o mistério de Jesus Cristo em sua totalidade. Hoje, porém,
somos chamados a viver mais intensamente sua paixão e morte e, com o
hino da Campanha da Fraternidade, reafirmar: “Tu, que vieste para que
todos tenham vida, cura teu povo dessa dor em que se encerra; que a fé
nos salve e nos dê força nessa lida, e que a saúde se difunda sobre a terra”.
“Oxalá ouvisseis hoje a sua voz: não fecheis os corações!” (Cf. Sl 94)

O evangelho da Paixão nos conduz à contemplação. O sofrimento


intenso de Jesus nos faz ver o quanto o projeto de amor e paz que ele
trouxe entra em choque com o contexto mundano. À grande lição da
Paixão é a da paciência em meio às provações. Dedução muito fácil
de fazer, mas difícil de pôr em prática. Somos convidados à firmeza
de Jesus em meio às contrariedades.
É preciso ousar fazer o mesmo que fez Paulo, que não hesitou em
recomendar a contemplação do próprio mistério da kénosis para animar a
vida quotidiana dos cristãos. À humildade, à imagem do Cristo, contri-
bui para a qualidade de vida entre os membros da comunidade. “Tende
um mesmo amor, numa só alma, num só pensamento; nada façais por
competição e vanglória, mas com humildade, julgando os outros como
superiores a si mesmo, não visando ao próprio interesse, mas ao dos ou-
tros. Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus” (F1 2,2-5).

Ligando a Palavra com a ação eucarística


À celebração do Domingo de Ramos nos coloca em um ambiente de
contraste entre a exaltação da chegada de Jesus a Jerusalém e sua pai-
xão e morte. Sacudidos pelo contexto divergente destes dois polos,
pedimos ao Pai “concedei-nos aprender o ensinamento da sua paixão
e ressuscitar com ele em sua glória” (oração do dia).
Na última Ceia, Jesus faz um gesto solene, que ficará como o mais
conhecido por simbolizar sua morte e que nos toca ainda agora. Oferece
pão e vinho como sacramento do que ele vive interiormente na hora de
morrer. À palavra sobre o cálice é muito clara: “Isto é meu sangue, o san-
gue da aliança, que vai ser derramado em favor de muitos” (Mc 14,24).
Sim, Jesus sentia-se muito só nesse momento. Mas ele realiza um
gesto de partilha, mostrando que sua morte será vivida em comunhão
com todos os homens. Mais ainda, o ouvimos falar de muitos. Antes
havia declarado: O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para
servir e dar a sua vida em resgate por muitos (cf. Mc 10,45) Outrora,
Moisés aspergiu com sangue os israelitas membros da aliança do Sinai
(cf. Ex 24,8). Hoje, Jesus diz que o sangue derramado em sua Paixão
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

simboliza também a aliança, desta vez estendida misticamente a todos.


A morte de Jesus criou vínculos novos de fraternidade entre os homens.
Todo o sentido do sacrifício de Jesus emerge na oração sobre as ofe-
rendas e no prefácio quando, pela voz de quem preside, dizemos: “O Deus,
pela paixão de nosso Senhor Jesus Cristo, sejamos reconciliados convosco,
de modo que, ajudados pela vossa misericórdia, alcancemos pelo sacrifício
de vosso Filho o perdão que não merecemos por nossas obras”.
E também afirmamos “sua morte apagou nossos pecados e sua
ressurreição nos trouxe a vida”,
Com esta celebração, inicia-se a Semana Santa durante a qual,
incessantemente, pediremos ao Pai: “como pela morte de vosso
Filho nos destes esperar
Pp o q que cremos, ) dai-nos P pela sua ressurreição
ç
alcançar o que buscamos” (oração após a comunhão).

Sugestões para a celebração +

1. Os ritos iniciais desta celebração, nos quais se dá a bênção


dos ramos, devem ser realizados a certa distância da igreja, para que
depois se possa fazer uma verdadeira procissão.
2. Pode-se também providenciar ramos e ervas medicinais
para entregar para as pessoas, à medida que vão chegando para a
celebração.
3. Preparar a forma como será feita a coleta da CF e um re-
cipiente onde as pessoas poderão deixar sua oferta. Perto, também
pode ser colocado um cartaz da CF 2012.
4. Amanhã, dia 26 de março celebramos a solenidade da Anun-
ciação do Senhor (transferida do dia de hoje).

« mo . . Do é .
Não sejas apenas um irmão para mim, Jesus,
mas sé para mim um Deus.”

(Pierre Teilhard de Chardin)


VIVES A SEMANA SANTA
Para muitos, um feriado; para outros, uma devoção; para o comércio,
oportunidade fantástica de vendas; para outros ainda, um momento
especial de meditação, oração e renovação da fé. E para você, o que
significa “viver a Semana Santa”?
Existe um jeito, um lugar, um momento muito especial no qual
aprenderemos a “viver a Semana Santa”. É o que nos aponta o sau-
doso Papa Paulo VI: “Se há uma liturgia que deveria encontrar-nos
todos juntos, atentos, solícitos e unidos para uma participação plena, dig-
na, piedosa e amorosa, esta é a hturgia da grande semana. Por um moti-
vo claro e profundo: o Mistério Pascal, que encontra na Semana Santa a
sua mais alta e comovida celebração, não é simplesmente um momento do
“no Litúrgico: ele é a fonte de todas as outras celebrações do próprio Ano
Litúrgico, porque todas se referem ao mistério da nossa redenção, isto é,
ao Mistério Pascal”.

Eis o sentido do que significa “viver a Semana Santa”: fazer


memória do mistério do amor de Deus que se manifestou na
entrega confiante de Jesus ao Pai, até a morte na cruz, por fide-
lidade à sua missão. Mais ainda, significa celebrar o mistério
do amor de Deus que sustentou Jesus em seu calvário e o ressus-
citou, o glorificou, o fez sentar-se à sua direita, constituindo-o
Cristo, Messias e Senhor.
“Viver a Semana Santa” significa fazer memória destas ações
maravilhosas de Deus. Mais, saber que estamos “re-vivendo” todos
estes fatos. “De geração em geração, cada um de nós é obrigado a ver-se
asi próprio, com os olhos penetrantes da fé, como tendo ele mesmo estado
lá no Calvário, na primeira sexta-feira santa, e diante do sepulcro vazio,
na manhã da ressurreição. Floje, todos nós, aqui reunidos para celebrar a
eucaristia, estávamos Já, prontos a morrer na morte de Cristo e a ressus-
citar em sua ressurreição. Será exatamente nossa comunhão com o corpo
PNE - BMC - Roteiros Homiléticos da Quaresma Ano B - Fevereiro / Abril de 2012

sacramental do verdadeiro Cordeiro que nos tornará realmente presentes


aquele eterno presente” *

Acolhamos o convite de S. Gregório de Nazianzo, bispo do séc.


IV, que certamente também nos dá uma dica de como “viver a Se-
mana Santa”: “Se és Simão Cireneu, toma a cruz e segue a Cristo. Se,
qual o ladrão, estás crucificado com Cristo, como homem íntegro, reco-
nhece a Deus. Adora aquele que foi crucificado por tua causa. Se és José de
Arimateia, pede o corpo a quem o mandou crucificar; e assim será tua a
vítima que expiou o pecado do mundo. Se és Nicodemos, aquele adorador
noturno de Deus, unge-o com perfumes para a sua sepultura. Se és Ma-
ria, ou a outra Maria, ou Salomé, ou Joana, derrama tuas lágrimas por
ele. Levanta-te de manhã cedo, procura ser o primeiro a ver a pedra
do túmulo afastada, e a encontrar talvez os anjos, ou melhor ainda, o
próprio Jesus":
Aí sim, poderemos exclamar: “FELIZ PÁSCOA"

8 Césare Giraudo, Redescobrindo a Eucaristia, Loyola, p. 83.

9 Liturgia das Horas, vol. II, p. 352

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