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PROF.

BRUNO ALMEIDA
História | Aula 02

OBJETO DE CONHECIMENTO: CIDADANIA E DEMOCRACIA NA ANTIGUIDADE.


H22 - Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H24 - Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
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A CIDADANIA ENTRE OS ROMANOS ditadores. Mesmo quando não patrícios passaram a ser
aceitos no Senado, com o decorrer do período da República,
Segundo a tradição, a cidade de Roma foi fundada foram chamados de "conscritos" e não podiam votar. Entre o
em 753 a.C. e caracterizou-se desde as origens pela restante da população havia o "povo" e a "plebe", palavras
diversidade de povos e costumes. Na região viviam povos que se ligam à ideia de multidão, massa. A noção de plebe
latinos, pastores e agricultores, mas um fator determinante na como grupo surgiu no processo histórico de luta contra os
história romana foi a chegada dos etruscos – povo oriundo do privilégios dos patrícios. Era um termo para englobar todos os
norte da Península Itálica. cidadãos romanos sem os mesmos direitos dos oligarcas. Na
A sociedade etrusca era formada por dois grandes sua base estavam os camponeses livres de poucas posses,
grupos: a nobreza, que compunha o conselho de anciãos, e aos quais se juntaram os artesãos urbanos e os
o restante da população, em posição subalterna e sem comerciantes. Ao que tudo indica, a plebe incluía também
direitos de cidadania. Essa bipartição social foi transferida a descendentes de estrangeiros residentes em Roma.
Roma na posterior consolidação de dois grupos sociais, os Para além da dicotomia entre patrícios e plebeus
patrícios (detentores da "nobreza de sangue") e os plebeus. havia mais dois grupos: os clientes e os escravos. Os clientes,
"aqueles que obedecem a um patrício", mantinham relação
Pobreza e Escravidão de fidelidade ao patrono, a quem deviam serviços e apoios
Entre os romanos, os patrícios agrupavam-se em diversos e de quem recebiam terra e proteção. Clientes
grandes famílias, conhecidas como gentes, unidas pela podiam ganhar independência e passar a integrar a plebe, e
convicção de descender de antepassados comuns. Os vice-versa, mas isso não era comum. Já os escravos, até o
patrícios formavam uma oligarquia de proprietários rurais e século III a.C., eram basicamente domésticos. Integravam o
mantinham o monopólio dos cargos públicos e mesmo dos conjunto de propriedades do patriarca e faziam parte da
religiosos. Eram, assim, os únicos cidadãos de pleno direito. família. A pobreza de camponeses e trabalhadores urbanos
Na guerra, combatiam a cavalo e em carros, detendo com levava-os à escravidão. Assim, embora houvesse rigidez na
isso também um grande poder militar. O restante da sociedade romana, os pobres podiam mudar de posição. É
população romana era formada por subalternos excluídos da verdade que quase sempre para situação pior – de livre para
cidadania. Pouco a pouco, foram adquirindo um nome escravo ou de plebeu para cliente. É nesse contexto que se
próprio, "povo" (populus). Em grande parte, a história de pode entender a grande luta entre patrícios e plebeus durante
Roma pode ser vista como uma luta pelos direitos sociais e a república romana.
pela cidadania entre aqueles que tinham direitos civis plenos A luta pelos direitos civis dos plebeus foi o grande
e os demais grupos. De início, possuíam direitos de cidadania motor das transformações históricas a partir da República, por
apenas os proprietários rurais. A família patrícia formava uma dois séculos (V e IV a.C.). Parte da plebe urbana conseguiu
unidade econômica, social e religiosa, encabeçada pelo pai acumular riquezas pelo artesanato e pelo comércio, sem que
de família (pater familias), dotado de autoridade moral pudesse gozar de igualdade de direitos em relação aos
(auctoritas) e poder discricionário (imperium) sobre os outros patrícios. Os plebeus urbanos preocupavam-se, portanto,
membros da família: esposa, filhos, escravos. Cada família com os direitos políticos e sociais: queriam ocupar cargos,
patrícia podia ter, ainda, um sem número de clientes, votar no Senado e até mesmo casar-se com patrícios, o que
agregados que atuavam como força auxiliar dos aristocratas, lhes era vedado. Em um movimento paralelo, parte da plebe
tanto na paz como na guerra. Chamados de "homens bons", rural teve as terras confiscadas pelo endividamento e lutava
os patrícios eram os únicos que podiam usar sinais de pelo fim da escravidão por dívida e pelo direito a parte da terra
distinção social – como o anel de ouro, uma faixa púrpura na conquistada de outros povos. Apesar dos interesses diversos,
túnica e a capa curta adotada pelos cavaleiros. Grandes os plebeus não tiveram dificuldades para unir-se contra o
proprietários rurais, os oligarcas romanos desprezavam as patriciado na luta pela cidadania.
atividades urbanas e mesmo o fruto do trabalho na terra que Os conflitos internos na sociedade romana tornaram-
não fosse feito por escravos ou agregados subalternos. se mais evidentes a partir da República, quando os romanos
Durante a Monarquia (753-509 a.C.) e no início da República passaram a guerrear em outras cidades sem a retaguarda
(509-31 a.C.), essa elite da sociedade romana constituía uma etrusca da época monárquica. O poder de barganha da plebe
nobreza de sangue, hereditária. Por um bom tempo este foi aumentava, uma vez que o exército passou a depender cada
um grupo fechado, um verdadeiro estamento, inacessível. Tal vez mais dos soldados plebeus, tanto cavaleiros não patrícios
condição deu origem a tensões sociais e a lutas, por parte de quanto infantes. Isso resultou nas chamadas "secessões" da
outros membros da sociedade, pelo acesso a direitos plebe, que ameaçava abandonar a defesa da cidade se os
reservados apenas aos patrícios. patrícios não concedessem direitos civis. Os dois grandes
Até a introdução da infantaria, no século V a.C., os episódios do gênero foram em 494 e 449 a.C., abrindo
patrícios desempenhavam papel militar único e detinham o caminho para conquistas da cidadania.
grosso das presas de guerra. Formavam o conselho de
anciãos, o Senado, composto originalmente pelos pais de Os plebeus ganham espaço
família patrícios, os patres. Eram os únicos que podiam Os senadores, a barriga da sociedade, procuravam
exercer as magistraturas, como pretores, cônsules ou justificar sua posição no organismo social em crise. Em 494


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Adaptado de: FUNARI, Pedro Paulo. A cidadania entre os Romanos. In: PINSKY, Jaime &
PINSKY, Carla Bassanezi (Orgs). História da Cidadania. São Paulo: Contexto, 2014.

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a.C., o povo conseguiu que fosse instituído o Tribunado da determinada pela Lei Poetélia Papíria, de 326 a.C. Até então,
Plebe, magistratura com poder de veto às decisões dos os cidadãos pobres não tinham direito de manter a própria
patrícios. Os plebeus puderam criar suas próprias reuniões, liberdade. Escravizados, ainda que temporariamente,
os "concílios da plebe", assim como adotar resoluções, os perdiam todos os direitos civis.
plebiscitos. Outro grande avanço da cidadania deu-se quando A última grande conquista plebeia foi a aprovação da
os plebeus conseguiram que todos os romanos fossem Lei Hortênsia, em 287 a.C., resultado de uma série de
divididos em tribos geográficas, e não mais hereditárias. No agitações e secessões. A lei permitia que os plebiscitos
início eram quatro tribos urbanas e 16 rurais. Os antigos tivessem força de lei mesmo sem a aprovação final do
comícios de cúrias, dominados pelos patrícios e seus clientes, Senado.
foram completados por comícios de tribos, nos quais O século III a.C. testemunhou grandes progressos
prevalecia a plebe. Em meados do século V a.C. foi publicada na cidadania romana e trouxe benefícios diretos para as
a Lei das Doze Tábuas. Embora fosse a codificação da camadas plebeias superiores, que passaram a integrar a elite
legislação tradicional, que previa grande poder aos patriarcas, aristocrática. Os grandes conflitos sociais deslocaram-se do
estabeleceu-se ali o importante princípio da lei escrita. De choque entre patrícios e plebeus para os confrontos entre
fato, o chamado direito consuetudinário, baseado na tradição, dominantes e subalternos, romanos e não romanos aliados,
gerava grande insegurança – já que, em caso de divergência, senhores e escravos. De uma forma ou de outra, a questão
a palavra final era sempre dos patrícios. Com a publicação da da cidadania sempre esteve em jogo nesses embates, pois
lei, todos podiam recorrer a um texto conhecido para reclamar mesmo os escravos, por meio da alforria, passavam a fazer
direitos sem depender da boa vontade dos poderosos. parte do corpo cidadão e a lutar por direitos. No interior da
Instituiu-se também a classificação das pessoas pelas elite dominante, um grupo restrito consolidou-se como uma
posses. Isso beneficiou os plebeus ricos, cuja importância aristocracia de patrícios e plebeus, com privilégios,
social começou a ser reconhecida. propriedades fundiárias e fortuna, chamada de "nobreza"
Nos séculos seguintes, as conquistas da cidadania (nobilitas). Esse restrito círculo era composto por pouco mais
romana ligaram-se à expansão militar, causa de modificações de vinte famílias. Aqueles que tentavam aceder aos mais
profundas e duradouras para a sociedade. Até o final do altos cargos passaram a ser chamados de "homens novos".
século V a.C., a estrutura social romana conservava as Com origens sociais modestas, às vezes sem sobrenome de
características de uma cidade arcaica, ainda que a luta entre família, destacavam-se pela dedicação e perseverança – em
patrícios e plebeus tenha levado a uma nova configuração raras ocasiões, obtinham sucesso. A nobreza controlava as
social. A antiga sociedade que opunha dois estamentos, magistraturas e assembleias plebeias, de forma que os
patrícios e plebeus, tornava-se, com a crescente avanços sociais beneficiavam mais diretamente as elites
diferenciação social, cada vez mais complexa. No decorrer do plebeias do que o conjunto dos cidadãos romanos. As antigas
século IV a.C., as tensões sociais tornaram-se mais agudas, clientelas foram revigoradas, com a incorporação de
em parte como resultado da expansão romana no interior da comunidades itálicas inteiras à esfera de influência dos
Península Itálica, uma vez que as novas terras conquistadas "nobres", uma vez que tanto patrícios como plebeus ricos
por mérito da infantaria plebeia não eram distribuídas entre passaram a contar com grande contingente de clientes.
os cidadãos em geral – passavam às mãos dos grandes
proprietários de terras. A Expansão Militar
Começou a forjar-se uma aliança de setores
patrícios com plebeus enriquecidos, o que gerou, em 368
a.C., a nomeação de um mestre de cavalaria plebeu por um
ditador patrício e a admissão de plebeus em um colégio de
sacerdotes. No ano seguinte, foram aprovadas leis –
propostas pelos tribunos da plebe Caio Licínio e Lúcio Séxtio
– que asseguravam maiores direitos políticos aos plebeus
enriquecidos e criavam alguns benefícios sociais para as
camadas mais pobres. Diversos cargos até então reservados
a patrícios passaram a poder ser exercidos também por
plebeus. As relações entre devedores e credores começaram
a ser reguladas por lei e nenhum cidadão poderia receber do
Estado mais do que 500 jeiras (ou 125 hectares) de terras
públicas. No campo religioso, os livros sagrados (livros
sibilinos), antes controlados pelos patrícios, passaram para o
cuidado de uma comissão de dez pessoas, os decênviros,
cinco dos quais plebeus. Essas importantes leis, conhecidas
como Licínias Séxtias (367 a.C.), foram votadas pela
assembleia popular, com aprovação do Senado. As decisões Mapa do Império Romano em 117, durante o reinado de Trajano, antecessor de Adriano.
Disponível em:
da assembleia popular podiam, também, ser anuladas pelo https://pt.wikipedia.org/wiki/Muralha_de_Adriano#/media/File:RomanEmpire_117-pt.svg.
Senado. Em 339 a.C., no entanto, a Lei Publília restringiu o Acesso em: 20 jan. 2016.
direito de veto do Senado. Em 300 a.C., com a Lei Ogúlnia,
os plebeus tiveram, por fim, acesso a todos os cargos – tanto Durante o século III a.C., Roma expandiu-se pela
políticos quanto religiosos. Um cidadão condenado à pena Itália antiga e aumentou o número de escravos. À diferença
máxima passou a ter o direito de recorrer à assembleia dos gregos, sempre ciosos do direito de cidadania, os
popular em busca de perdão ou diminuição da pena – medida romanos a utilizavam como mecanismo de cooptação da
importante para que os líderes populares não fossem lealdade de outros povos. A concessão de cidadania a aliados
submetidos aos ditames do patriciado. era um fator importante para a acomodação das elites nos
Outra medida de igual – ou talvez até maior – territórios conquistados. Foi uma época de mudanças na
importância social foi a abolição da servidão por dívida, sociedade romana, em parte desencadeadas pela Segunda
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Guerra Púnica (218-201 a.C.) e suas consequências. Essa Tibério, nascido em 163 a.C., teve educação
guerra levou o combate entre púnicos e romanos para a filosófica esmerada e seguiu carreira pública digna de seus
Península Ibérica e a vitória romana representou significativo predecessores familiares. Ao atravessar a Etrúria romana, no
aumento da área dominada. Formava-se um domínio romano norte da Península Itálica, para dirigir-se à Península Ibérica,
ultramarino, transformando o Mediterrâneo em um mar em 137 a.C., ficou chocado com a pobreza daquela terra,
romano (Mare Nostrum). A primeira metade do século II a.C. outrora tão fértil. Notou que nos campos já não havia
viria a testemunhar as consequências sociais da vitória camponeses, mas hordas de escravos provenientes de outras
romana: aumento do número de escravos e das propriedades partes do mundo mediterrâneo. Decidiu, então, combater a
fundiárias, com resultante crise na pequena agricultura que condição miserável dos agricultores e defender seus direitos
transformou parte do campesinato livre em proletários – – não somente por valorizar os soldados cidadãos, mas por
aqueles cidadãos cujos bens resumiam-se à prole. A riqueza perceber que o poderio romano estava ameaçado pela
de alguns levava à pobreza de muitos, o que não tardou a fraqueza estrutural do campesinato, base do exército. Sem
gerar novas lutas pelos direitos civis. Roma, ao extrapolar os camponeses soldados, não haveria exército romano. Como
limites da Península Itálica, passou a gerir seus novos continuar a defender o Império Romano se predominavam
territórios de forma inédita. As comunidades itálicas, aliadas latifúndios trabalhados por escravos? A terra pública, antes
ou submetidas, haviam, historicamente, sido incorporadas dividida entre os cidadãos comuns, estava agora concentrada
pelo Estado romano. Ao saírem da Península, no entanto, os nas mãos dos latifundiários.
romanos criaram um novo conceito: a província, um território Tibério candidatou-se e foi eleito tribuno da plebe,
administrado pelos romanos para seu benefício, sujeito a cargo que ocupou a partir de de 134 a.C. Propôs a Lei
tributação. Criaram-se, então, as províncias da Hispânia Semprônia, que limitava o uso ilegal das terras públicas pelos
Citerior e Ulterior (197 a.C.), seguidas da Macedônia (148 grandes proprietários, cujos fundos agrícolas não deviam
a.C.), África, com a destruição de Cartago (146 a.C.), e Ásia ultrapassar o antigo limite de quinhentas jeiras (125 hectares),
(133 a.C.). Sem direitos de cidadania, os provinciais com possíveis acréscimos de 250 jeiras por filho. As terras
presenciaram o estabelecimento de municípios e colônias de públicas retomadas seriam divididas entre os cidadãos
cidadãos romanos. Apenas com o tempo as elites locais pobres, que teriam lotes de trinta jeiras (7,5 hectares), sem
passaram a usufruir o direito de cidadania – concedido caso que pudessem vendê-las, como o faziam, forçados pelos
a caso, com base na lealdade ao poder romano. latifundiários. Para tanto, foram eleitos pelo povo triúnviros
Nesse novo contexto, a configuração social tornou- encarregados de distribuir as terras. Em sua arenga, Tibério
se ainda mais variada, pressagiando a estrutura de um utilizou-se de metáforas para explicar a situação:
verdadeiro império em formação. Além da aristocracia
senatorial, fortalecia-se a ordem equestre, composta por Os animais da Itália possuem cada um sua toca, seu
proprietários e empresários, assim como as elites locais abrigo, seu refúgio. No entanto, os homens que combatem e
itálicas e, em menor medida, provinciais. Por outro lado, os morrem pela Itália estão à mercê do ar e da luz, nada mais:
simples cidadãos camponeses passavam por crescentes sem lar, sem casa, erram com suas mulheres e crianças. Os
dificuldades, incapazes de prestar o serviço militar por tantos generais mentem aos soldados quando, na hora do combate,
anos longe de suas pequenas propriedades e acossados os exortam a defender contra o inimigo suas tumbas e seus
pelos latifundiários em expansão. A proletarização era lugares de culto, pois nenhum desses romanos possui nem
crescente, assim como a migração para as áreas urbanas. altar de família, nem sepultura de ancestral. É para o luxo e o
Também em posição precária estavam os itálicos e enriquecimento de outrem que combatem e morrem tais
provinciais livres e pobres e, em estado muito pior, os pretensos senhores do mundo, que não possuem sequer um
escravos agrícolas e mineiros, explorados e sem quaisquer torrão de terra.
direitos civis. Se os escravos podiam tornar-se cidadãos após Tibério Graco Apud: PLUTARCO. In: PINSKY, Jaime. 100 textos de história antiga. São
Paulo: Contexto, 1988.
libertados, essa possibilidade era ínfima para a massa de
escravos não domésticos. A situação descrita por Tibério refletia um processo
O número de escravos incorporados ao mundo assim descrito pelo historiador Apiano: “Os ricos tomavam a
romano não parava de crescer. A oferta era alta. A escravidão maior parte das terras públicas e, confiantes de que ninguém
doméstica dos primeiros séculos foi substituída por um nunca as retomaria, começavam a avançar nos lotes vizinhos
verdadeiro regime escravista, que utilizava a mão de obra e nos poucos acres dos pobres camponeses das redondezas,
tanto em grandes propriedades rurais como em às vezes pela persuasão, outras pela força, de forma que, ao
empreendimentos manufatureiros de massa. Esse novo final, estavam em suas mãos imensas propriedades rurais, no
escravo é tratado como mercadoria, equiparado a objetos e lugar dos antigos pequenos lotes camponeses. Usavam
animais. Em termos jurídicos, houve a passagem da escravos como agricultores e pastores, pois temiam que, se
escravidão de concidadãos para a de estrangeiros. A vida do usassem mão de obra livre, os camponeses fossem
inimigo vencido estava legalmente nas mãos do vencedor – obrigados a parar o serviço para servir no exército. A posse
poupá-la dava o direito de usar os serviços do cativo (servus, de escravos era altamente rentável, pois havia muitos à
escravo, conservado para servir). disposição e não estando sujeitos à leva militar, podiam
multiplicar-se em cativeiro. Assim, os poderosos tornaram-se
Os Irmãos Graco e a Crise Agrária ricos ao extremo e a Itália estava repleta de escravos,
Outro grande episódio das lutas pela ampliação da enquanto decrescia a população livre da Itália, abatida pela
cidadania foram as campanhas dos irmãos Graco. Membros pobreza, pelos impostos e pelo serviço militar”.
da família plebeia Semprônia, Tibério e Caio Graco faziam A reação dos senadores, grandes proprietários, à
parte da "nobreza" e tinham entre seus antepassados nomes legislação de Tibério foi a esperada. Alegaram que haviam
ilustríssimos como Cipião, o Africano (234-183 a.C.), grande obtido as terras de forma legítima, que haviam feito com que
conquistador romano. Oriundos da mais alta classe, se tornassem produtivas, que sua distribuição levaria à
protagonizaram um movimento agrário voltado à satisfação destruição da República. A aprovação da legislação de
das agruras dos cidadãos camponeses em crise iniciada Tibério foi conturbada e, ao final, os senadores acusaram-no
pelos latifundiários.
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de tramar a implantação de uma monarquia, proclamando-se O Principado e a Cidadania
rei de Roma. Seus opositores no Senado acabaram por O assassinato de César levou a uma guerra civil e
assassinar Tibério quando este tentava reeleger-se (133 ao triunfo, em 31 a.C., de seu sobrinho, Otávio Augusto. Ele
a.C.). Sem o líder, a execução da reforma agrária seguiu a reorganizou a estrutura política e redimensionou a cidadania
passos lentos, até a eleição de Caio Graco como tribuno, em romana. O próprio Otávio Augusto deixou uma descrição de
124 a.C. Embora a legislação de Tibério visasse beneficiar a seus feitos (Res gestae), na qual se percebe tanto a
todos os camponeses, aliados itálicos dos romanos sentiram- pretensão de manter o regime republicano como a realidade
se prejudicados, o que levou Caio a repensar as medidas. Ele da concentração de poderes em suas mãos.
propôs todo um programa legislativo: lei agrária, militar, direito Manteve, na aparência, o regime republicano e, de
de cidadania romana aos aliados itálicos, distribuição de fato, o Estado continuou a chamar-se de res publica. Passou,
alimentos, reforma judiciária. O tamanho das terras no entanto, a ser dominado pelo príncipe do Senado
concedidas não seria mais de trinta, mas duzentas jeiras. (prineceps senator), conhecido também como general do
Excluiu das distribuições algumas áreas em mãos de exército (imperator). Um princípio do direito romano, "o que
senadores importantes. Foi reeleito tribuno em 123 a.C. e as agrada ao príncipe tem força de ler'', viria a caracterizar, de
reformas caminhavam, até que seus inimigos conseguiram certa maneira, os limites dos direitos civis romanos, uma vez
que sua proposta de concessão de cidadania romana aos que a satisfação do imperador passava a ser um parâmetro
itálicos fosse derrotada, pois os cidadãos romanos pobres jurídico. O historiador Moses Finley viria a interpretar tal
foram convencidos de que a extensão da cidadania poderia preceito como a prova do poder discricionário do príncipe.
prejudicar seus interesses. Conseguida essa vitória os Seria a partir de Otávio Augusto, contudo, que se
oligarcas maquinaram para que todas as suas medidas consolidariam de maneira sintomática o direito romano e as
fossem ab-rogadas e, sob o pretexto de que Caio havia prerrogativas da cidadania.
participado de um assassinato, conseguiram que o Senado A despeito do brocardo jurídico acima citado, o
declarasse a República em perigo por causa dele. príncipe não era um senhor de seus súditos. O termo
"senhor" (dominus) era usado apenas pelos escravos para se
Eleições e Cidadania dirigirem a seus donos. O regime imperial viria a concentrar o
As eleições, em Roma, constituem outro grande poder, mas, até o final do século II, os imperadores não
tesouro da cidadania. Os comícios por tribos eram muito usaram a expressão "senhor" – que viria a mudar a relação
importantes, pois elegiam questores, edis, tribunos militares entre os cidadãos e o general governante. Durante os dois
e tribunos da plebe. À diferença de muitas cidades gregas, séculos de Principado, o direito de cidadania foi, aos poucos,
em que o direito de voto era restrito, em Roma votavam expandido, atingindo um número sempre maior de habitantes
pobres e mesmo libertos. As funções das assembleias eram do mundo romano. Apenas a cidadania romana permitia que
tanto eleitorais como legislativas, e o princípio fundamental do uma pessoa gozasse de plenos direitos, ainda que a posse
voto romano era o voto por grupo, não individual. César de cidadanias locais continuasse a ser importante no que
construiu um edifício, no Campo de Marte, para as eleições tange a questões de âmbito restrito. Alguns historiadores
populares. A ampla área de 25 mil metros quadrados poderia chegaram a afirmar que o Império Romano nada mais era do
comportar setenta mil pessoas. A lista dos candidatos era que uma imensa federação de cidades autônomas, cada uma
afixada no dia do escrutínio. com sua cidadania. Não cabe dúvida de que a cidadania local
O voto secreto foi introduzido ao final da República conferia direitos diversos, tanto políticos como civis. Podia-se
e, para isso, adotou-se o voto por escrito (per tabellam, "em votar ou ter propriedade apenas com a cidadania local. Cada
uma cédula"). As lutas pela cidadania centraram-se nos cidade possuía uma câmara municipal (ordo decurionum) e
embates entre os próprios cidadãos, entre populares e magistraturas diversas, às vezes abertas até mesmo aos
oligarcas, conflitos que caracterizaram todo o período tardio libertos. A importância da cidadania romana, contudo, não
da República. pode ser subestimada, pois era a única a garantir total
O período tardio da República romana, no entanto, proteção jurídica.
testemunhou um grande avanço nas possibilidades de A concessão de cidadania, em seus aspectos
iniciativas jurídicas dos cidadãos. A implantação de cortes jurídicos e políticos, significava uma mobilidade social
com jurados e do voto secreto na assembleia garantiram voz importante. Uma vez obtida, a cidadania romana trazia
aos cidadãos em geral e explica, também, a importância da consigo privilégios legais e fiscais importantes, permitia a seu
oratória. Do êxito dos discursos dependiam as decisões nas portador o direito e a obrigação de seguir as práticas legais
reuniões populares. Isso permitiu que se adotassem medidas do direito romano em contratos, testamentos, casamentos,
contrárias aos interesses aristocráticos. Várias formas de direitos de propriedade e de guarda de indivíduos sob sua
ação coletiva faziam parte da justiça popular, como o uso da tutela (como as mulheres da família e parentes homens com
sanção moral coletiva, de modo a coagir o acusado de menos de 25 anos). No entanto, os direitos advindos da
alguma ofensa a se comportar conforme os desejos da cidadania romana não desobrigavam o indivíduo de obedecer
população. A população urbana, por diversas vezes, à cidadania original em uma cidade específica. O direito, de
promoveu manifestações de arruaça a fim de exigir um "preço certa forma, controlava e moldava a estrutura social.
justo" para o trigo. Outras manifestações comuns eram os
versos obscenos ou agressivos em relação a personagens Cidadania e Opinião Pública
políticos, vociferados em praça pública e, mais raramente, Embora no mundo antigo não houvesse
escritos nas paredes da cidade. Outra forma de justiça comunicação de massa e, menos ainda, pesquisas de opinião
popular era o linchamento, quando houvesse um crime muito pública, foi naquele ambiente que surgiu o conceito de
violento a ser punido, como no caso de autoridades que "opinião", Cícero referia-se a popularis opinio, e opinio era
abusavam do poder ou participavam de assassinatos termo usado para designar "impressão", verdadeira ou falsa.
políticos. Neste contexto, está inserida toda a legislação de Este é o sentido do termo em frase de Cícero, apud homines
estado de exceção ou emergência, em vigor no final da barbaros opinio pias ualet saepe quant res ipsa ("entre os
República e que tanto restringiu as liberdades civis nessa homens bárbaros, a impressão vale, muitas vezes, mais do
época. que a própria realidade"). Expressões como opinio est
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("considera-se") e opiniones omnium ("todos acham"), bem Em geral, os jogos eram realizados no Fórum, o mercado, ou,
como o sentido de "boato" que a palavra possui, conduzem- a partir de fins da República romana (século I a.C.), em
nos à percepção de um espaço público que permitia a anfiteatros. Era sempre a luta da civilização contra a barbárie,
existência não apenas do sentido individual da opinião (ut o humano contra o animal, o justo contra o injusto, um meio
mea opinio est, "na minha opinião"), como da impressão público de mostrar que a sociedade domina as forças da
tornada coletiva. Haveria, pois, necessariamente, um espaço natureza e da perversão social.
público antigo, uma esfera pública, para usar um conceito Ao contrário do que se vê em filmes, a luta de
moderno implícito na cidadania, subjacente à opinião pública. gladiadores não se destinava à mera diversão do povo, nem
Como podemos ter acesso, contudo, a essa opinião? A a luta era até a morte. Ao final de cada combate, o perdedor
maneira mais direta são as paredes de Pompeia, que devia retirar o capacete e oferecer o pescoço ao vencedor,
preservaram grande número de epígrafes cuja existência só que não podia tirar-lhe a vida. Também não cabia ao
pode ser explicada pela vitalidade de um campo de expressão magistrado ou ao imperador decidir o destino do perdedor:
da cidadania em público. Dois tipos de inscrições compõem apenas os espectadores podiam fazê-lo. A decisão, assim,
esse campo: programmata (cartazes eleitorais) e edicta estava nas mãos da multidão, a testemunhar um ato de
munerum edendorum (anúncios de apresentações no soberania popular que só teria equivalência, no mundo
anfiteatro), por um lado, e graphio inscripta (grafites), por moderno, com os referendos ou plebiscitos, em que todos se
outro. Os primeiros, feitos com tinta em letras capitais manifestam. O princípio da soberania popular manifestava-
cursivas, eram anúncios para serem vistos à distância, se, na arena, de forma direta e incisiva. Se nas eleições as
enquanto os outros eram intervenções individuais voltadas mulheres não tinham direito ao voto, na arena todos podiam
para o público. O estudo desses dois tipos de expressão manifestar-se, prerrogativa que a cidadania moderna atingiria
permite tecer algumas considerações sobre a opinião pública apenas no século XX. A condenação à morte tampouco era o
em uma cidade romana como Pompeia, por exemplo. A resultado de um simples capricho, da mera avaliação de
ubiquidade dos anúncios chamou a atenção de diversos superioridade física de um lutador sobre outro. O principal
estudiosos, que concluíram que as inscrições eleitorais eram, quesito para que o perdedor fosse poupado era ter mostrado
provavelmente, expressões do caráter competitivo da elite valentia.
local, que emergia do público nas eleições anuais e fazia-se Os romanos possuíam o conceito de "humanidade"
visível por meio dos nomes dos candidatos pintados por toda (humanitas), que tinha conotações que ultrapassavam a
a cidade. Pode notar-se que os magistrados queriam fixar, na "urbanidade" (urbanitas). Humanitas implicava educação
mente pública, a sua glória e fama. liberal, elegância de costumes, hábitos da classe alta. Assim,
O uso de expressões como oro lios faciatis (peço alguns historiadores consideram que a arena de espetáculos
que elejam), abreviada como ouf, escrita como uma sigla não servia apenas como lugar de integração de romanos ricos
única, está a indicar tanto a compreensão generalizada – da e pobres, mas também para separar os civilizados, que
expressão e da abreviatura – quanto o poder da opinião frequentavam os espetáculos, dos bárbaros.
pública de "fazer" o candidato. Entre os que se apresentam Daí a ubiquidade de arenas em cidades fronteiriças
como propugnadores das candidaturas encontramos do mundo romano, daí sua localização próxima ao limite físico
muliones ("cocheiros"), um princeps libertinorum ("primeiro que separa o recinto urbano amuralhado do campo, daí sua
entre os alforriados"), pomari ("fruteiros"), gallinarii presença no mundo de fala grega, como sinal de identidade
("galinheiros")" entre outros. Quaisquer que sejam as romana, talvez mais eloquente do que o domínio do latim –
interpretações para essas inscrições, assim como para pois se, no Oriente, poucos dominavam o latim, muitos
aquelas de mulheres que apoiam candidatos, estão todas a podiam, por meio dos espetáculos, tomar parte do ritual de
ressaltar que havia atores sociais considerados dignos de identificação com a romanidade. Em toda parte, em cidades
menção nas paredes. Não se discute o fato de que as grandes ou pequenas, no Mediterrâneo ou nas fronteiras, a
mulheres não votavam. Nem é difícil pensar que a presença arena representava um lugar de afirmação da cidadania e da
de categorias sociais subalternas pode representar uma justiça. Nem todos os romanos tinham os mesmos
inscrição paga por membros da elite. Porém, o que nos sentimentos quanto aos jogos de gladiadores; havia quem os
importa é que havia uma opinião pública que aceitava condenasse e mesmo os que os aprovavam tinham
mulheres, libertos e pobres como supostos autores de interpretações diversas sobre seu significado. Em qualquer
discursos públicos. Não se citariam esses homens humildes caso, contudo, a palavra final estava nas mãos daqueles que
e obscuros se eles não fizessem parte de um espaço público. ali se reuniam, homens e mulheres, ricos ou pobres.
2
Jogos e Cidadania A PAX ROMANA
Outro aspecto importante da participação da
cidadania na vida pública consistia nos jogos de gladiadores. Como já foi exposto acima, a pax foi um dos meios
Pode parecer estranho relacionar cidadania e esses jogos que o Império Romano lançou mão para assegurar sua
sangrentos, mas esses espetáculos foram importantes na hegemonia e justificar sua posição de mando no tempo
afirmação da cidadania. Os jogos de gladiadores têm origem antigo. Entretanto, como esta paz foi construída? A que preço
muito antiga, tendo surgido com os etruscos. Na origem, eram ela foi estabelecida? Quais os personagens históricos que, de
lutas entre guerreiros em honra de um soldado valoroso morto fato, usufruíram de todas as suas benesses? E quais os
em combate. Tinham, desde o início, um aspecto religioso, estratos da sociedade que ficaram à margem deste sistema
pois celebravam a vitória da vida sobre a morte. Com o passar ou foram completamente excluídos deste?
do tempo, as lutas de gladiadores, juntamente com as As respostas para estas indagações se constroem
caçadas e as execuções de condenados, passaram a fazer na análise dos fatos históricos concernentes a este período
parte de um ritual de caráter a um só tempo religioso e legal.

2
Adaptado de: SERIQUE, Israel. Pax Romana e a Eirene do Cristo. In: Fragmentos de
Cultura, Goiânia, v. 21, n. 1/3, p. 119-134, jan./mar. 2011. Disponível em:
http://seer.ucg.br/index.php/fragmentos/article/viewFile/1667/1057. Acesso em: 23 mar.
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do império romano, e tomando-se como elementos de análise transformam-se em impostos; a colheita anual dos campos
– dentro daquilo que é passível de averiguação todas as torna-se tributo em forma de cereais; sob espancamentos e
vozes dos sujeitos históricos envolvidos, visto que, em todos insultos, nossos corpos e mãos são massacrados na
os fatos sociais, as vozes sempre são dissonantes, pois construção de estradas através de florestas e pântanos.
sempre existem discrepâncias nas narrativas, em paralelo, TÁCITO. Apud: REIMER, Ivone Richter (Org.). Economia no mundo bíblico: Enfoques
sociais, históricos e teológicos. São Leopoldo: CEBI/Sinodal, 2006. p. 74-75 (adaptado).
dos vencedores e dos vencidos. Como afirma Wengst:
Aqui, portanto, não apenas legitimam-se as ações
O olhar “a partir de cima” sobre o brilho de Roma não brutais mas, também, fomenta-se um quadro de completa
faz perceber toda a realidade. Ele apresenta contexto de indiferença para com os sofrimentos daqueles que eram
sentido contradito pelas vítimas. Seria importante inverter a alvejados pelos soldados romanos, visto que esses,
perspectiva numa percepção “a partir de baixo”, para que a merecidamente, estariam recebendo o castigo por tentarem
realidade experimentada como sofrimento não seja entregue colocar em perigo a paz imperial.
ao esquecimento através de glorificação e para que os Sendo assim, portanto, embora desejada e louvada
vencedores da história não triunfem novamente sobre suas por aqueles que estavam no poder, a pax oferecida,
vítimas da descrição da História. dominava, afligia e matava uma parte considerável da
WENGST, Klaus. Pax romana: pretensão e realidade: experiências e percepções da paz
em Jesus e no cristianismo primitivo. Tradução de António M. da Torre. São Paulo: Edições população do Império, ou seja, os escravos, as mulheres, os
Paulinas, 1991, p. 19. estrangeiros etc. Nesse sentido, então, é de suma
importância que se analise a pax romana sob a perspectiva
Sendo assim, portanto, como era a pax oferecida por daqueles que serviram de estrados para os pés desta
Roma e a que custo ela foi estabelecida? Sob a perspectiva conjuntura política, econômica, cultural e bélica, uma vez que,
dos interesses imperiais, a pax era a forma administrativa por detrás da gloriosa civilização romana e suas conquistas,
pela qual Roma viabilizava a sua unidade territorial e política. existiu uma multidão de vítimas do sistema imperial que não
O fim primeiro dela era o bem estar dos dominantes e a podem ser ignoradas e silenciadas.
manutenção de toda a estrutura de poder implementada pelos E das muitas guerras que se avolumavam não
romanos. Neste sentido, a pax era dos romanos e para estes. poucas pessoas eram feitas escravas. A escravidão em
Segundo Wengst: Roma seguia seu curso de coisa normal a ser aceita. Nas
palavras de Wengst:
A Pax Romana está, de acordo com isto,
indissoluvelmente ligada ao Império Romano, ao poder de O sistema de escravatura e a escravatura como
comando a partir de Roma. Com isto torna-se claro, já a partir sistema, escravatura elevada à potência como acontecimento
dos conceitos, que é uma paz determinada “de cima”, natural – este cinismo dos dominadores torna claro que a
estabelecida pelo centro do poder. liberdade da paz romana é, em primeira linha, liberdade
WENGST, Klaus. Pax romana: pretensão e realidade: experiências e percepções da paz
em Jesus e no cristianismo primitivo. Tradução de António M. da Torre. São Paulo: Edições romana. A liberdade romana e a paz baseada no poder das
Paulinas, 1991, p. 19. armas são, na realidade, dois lados da mesma medalha. A
partir de Roma, do centro, podia-se falar sobre ‘paz e
E, tomando-se isto como fato, o uso da espada, da liberdade’ de modo diferente do que na província.
violência e de tantas outras atrocidades contra gênero WENGST, Klaus. Pax romana: pretensão e realidade: experiências e percepções da paz
humano, foram facilmente justificadas sob a sentença que a em Jesus e no cristianismo primitivo. Tradução de António M. da Torre. São Paulo: Edições
Paulinas, 1991, p. 40 (adaptado).
paz estava sendo construída. Aliás, certamente não foi por
acaso que, na primeira vez que a Pax Romana foi Sendo assim, após os dados supracitados, pode-se
mencionada, a pessoa do imperador foi colocada como sendo concluir que, primeiramente, a pax romana visava tão
o chefe do exército e que o altar da paz de Augusto foi um somente os interesses egoístas do Império Romano. Sua
altar para holocausto, no Campo de Marte. generosidade estava escancarada aos poderosos de Roma,
Estes dois contundentes símbolos imperiais (a mas relativamente aberta aos estrangeiros na medida em que
pessoa do imperador e a religião) reforçavam que a o império pudesse obter algum lucro nesta relação.
estabilidade no Império era o bem maior que se poderia Em segundo lugar, os pobres, os escravos, as
almejar. Por isso, tanto o poder político (representante dos crianças, a mulheres etc., não eram contemplados como
deuses na terra) como o poder religioso (o próprio deus prioridade na pax romana. Crianças eram vendidas como
Marte) estavam unidos nesta mesma “guerra” por estabelecer escravas, mulheres eram violentadas, os pobres ainda mais
a paz. eram explorados. O sistema injusto de Roma não oferecia às
Tal assertiva equivalia dizer que, se o próprio deus pessoas dos estrados mais baixos da sociedade
Marte estava envolvido nesta empreitada, então, os que se possibilidades de crescimento. Havia, sim, um esquema de
opunham a ele deveriam sofrer as consequências de suas achatamento e exploração social das camadas mais pobres
ações por meio dos seus braços históricos que eram as do Império.
legiões romanas. Uma boa ilustração sobre o que foi isto, nós Em terceiro lugar, as relações de gênero na pax
a encontramos na citação que Reimer faz de Tácito: alargavam as assimetrias e fomentavam um clima de
desvalorização e exploração da mulher. Como já foi exposto
Mais perigosos do que todos são os romanos. Esses acima, em tempos de pax romana, muitas mulheres foram
ladrões do mundo, depois de não mais existir nenhum país violadas, humilhadas e mortas. Não se encontrava nestas a
para ser devastado por eles, revolvem até o próprio mar dignidade de um ser humano no mesmo pé de igualdade com
saquear, matar, roubar – isto é o que os romanos falsamente homem. A pax, além de ser para os romanos, era também
chamam de domínio, e ali onde, através de guerra, criam um para os homens.
deserto, isto eles chamam de paz. As casas são Por fim, os poderosos de Roma utilizavam a pax
transformadas em ruínas, os jovens são recrutados para a como meio ideológico para legitimar as atrocidades que eram
construção de estradas. Mulheres, quando conseguem praticadas. Todas as ações se tornavam legítimas em nome
escapar das mãos dos inimigos, são violentadas por aqueles da boa ordem e funcionalidade do Império. Neste esquema
que se dizem amigos e hóspedes. Bens e propriedades
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de poder, portanto, aqueles que procuravam denunciar as há um só que tenha o seu altar doméstico, o seu jazigo
injustiças tinham a voz silenciada e, geralmente, a via para familiar. Eles combatem e morrem para alimentar a opulência
isto era a morte. e o luxo de outros. Dizem que são senhores do universo, mas
eles não são donos sequer de um pedaço de terra.
Plutarco. Vidas paralelas. Barcelona: Ibéria, 1951. v. 4, p. 150.
EXERCÍCIOS
Segundo Plutarco, essas foram palavras proferidas por
01. (ENEM) Tibério Graco, político romano, em um discurso público sobre
A Lei das Doze Tábuas, de meados do Século V o agravamento das contradições sociais durante o período da
a.C., fixou por escrito um velho direito costumeiro. No relativo Republica romana. A iniciativa proposta pelos Graco
às dívidas não pagas, o código permitia, em última análise,
matar o devedor; ou vendê-lo como escravo “do outro lado do a) pode promover uma reforma social que aplacou o clima
Tibre” — isto é, fora do território de Roma. de tensão vivido na época.
CARDOSO, C. F. S. O trabalho compulsório na Antiguidade. Rio de Janeiro: Graal, 1984.
b) reafirmou o poder da aristocracia romana, confirmando o
A referida lei foi um marco na luta por direitos na Roma Antiga, direito a terras e indenização em caso de expropriação.
pois possibilitou que os plebeus c) reconhecia que a distribuição de terras seria a solução
para atender às necessidades de uma plebe
a) modificassem a estrutura agrária assentada no latifúndio. marginalizada.
b) exercessem a prática da escravidão sobre seus d) defendia uma maior participação política dos
devedores. comerciantes para promover o desenvolvimento da
c) conquistassem a possibilidade de casamento com os economia romana.
patrícios. e) incitava o povo a apoiar os ditadores, sendo os generais
d) ampliassem a participação política nos cargos políticos os únicos capazes de assumir o governo em época de
públicos. crise.
e) reinvindicassem as mudanças sociais com base no
conhecimento das leis. 04.
O governo da República romana estava dividido em
02. (ENEM) três corpos tão bem equilibrados em termos de direitos que
TEXTO I ninguém, mesmo sendo romano, poderia dizer, com certeza,
Sólon é o primeiro nome grego que nos vem à mente se o governo era aristocrático, democrático ou monárquico.
quando terra e dívida são mencionadas juntas. Logo depois Com efeito, a quem fixar a atenção no poder dos cônsules a
de 600 a.C., ele foi designado “legislador” em Atenas, com constituição romana parecerá monárquica; a quem fixá-la no
poderes sem precedentes, porque a exigência de Senado ela mais parecerá aristocrática e a quem fixar no
redistribuição de terras e o cancelamento das dívidas não poder do povo ela parecerá claramente democrática.
POLÍBIOS. Historia. Brasília: Ed. da UnB, 1985. Livro VI, 11. p. 333.
podiam continuar bloqueados pela oligarquia dos
proprietários de terra por meio da força ou de pequenas Políbios descreve a estrutura política da República romana
concessões. (509-27 a.C.), idealizando o equilíbrio entre os poderes. Não
FINLEY, M. Economia e sociedade na Grécia antiga. São Paulo: WMF Martins Fontes,
2013 (adaptado). obstante, a prática política republicana caracterizou-se pela

TEXTO II a) manutenção do caráter oligárquico com a ordem equestre


A “Lei das Doze Tábuas” se tornou um dos textos dos "homens novos" assumindo cargos na administração
fundamentais do direito romano, uma das principais heranças e no exército.
romanas que chegaram até nós. A publicação dessas leis, por b) preservação do caráter aristocrático dos patrícios que
volta de 450 a.C., foi importante, pois o conhecimento das controlaram o Senado, a Assembleia Centuriata e as
“regras do jogo” da vida em sociedade é um instrumento Magistraturas.
favorável ao homem comum e potencialmente limitador da c) adoção da medida democrática de concessão da
hegemonia e arbítrio dos poderosos. cidadania romana a todos os homens livres das províncias
FUNARI, P. P. Grécia e Roma. São Paulo: Contexto, 2011 (adaptado).
conquistadas.
d) administração de caráter monárquico com o poder das
O ponto de convergência entre as realidades sociopolíticas assembleias baseado no controle do exército e da plebe.
indicadas nos textos consiste na ideia de que a e) organização de uma burocracia nomeada a partir de
critérios censitários, isto é, de acordo com os rendimentos.
a) discussão de preceitos formais estabeleceu a
democracia. 05.
b) invenção de códigos jurídicos desarticulou as Ao longo do século II a.C., começaram a surgir nas
aristocracias. regiões próximas a Roma fazendas de tamanho médio,
c) formulação de regulamentos oficiais instituiu as dedicadas à produção de um único produto. Junto com as
sociedades. guerras, a adoção desse tipo de propriedade gerava dois
d) definição de princípios morais encerrou os conflitos de efeitos. Por um lado, contribuía para o enriquecimento dos
interesses. homens mais ricos; por outro, fazia com que os camponeses,
e) criação de normas coletivas diminuiu as desigualdades de que possuíam pequenas propriedades, ficassem cada vez
tratamento. mais pobres.
MACHADO, Carlos Augusto Ribeiro. Roma e seu império. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 15-
03. 16 (adaptado).

Os generais os enganam quando os exortam a


combater pelos templos de seus deuses, pelas sepulturas de As transformações mencionadas no texto produziram, entre
seus pais. Isto porque de um grande número de romanos não outros efeitos,

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a) o agravamento das tensões sociais nos campos e o 08. (ENEM)
surgimento de propostas de reforma agrária.
b) a intensificação do esforço militar para obtenção de novos
mercados para o excedente da produção agrícola.
c) o fim do equilíbrio social até então existente no Império
Romano e o início de diferenças sociais entre seus
habitantes.
d) a ampliação do emprego de mão de obra assalariada nas
lavouras e a abolição da escravidão em todos os territórios
do Império.
e) o êxodo de parte da população rural dos arredores de
Roma em direção às áreas longínquas do Império, como
a Gália e o norte da África.

06.
Havia outros prazeres que só eram encontrados na
cidade; faziam parte das vantagens da vida urbana e eram
proporcionados pelo evergetismo. Tais prazeres consistiam
nos banhos públicos e nos espetáculos. Eram pagos, mas o
preço do ingresso era módico. Todo mundo tinha acesso;
vinha gente de longe para ver os gladiadores numa cidade. O
banho não era uma prática de higiene, e sim um prazer
complexo. Não havia cidade sem pelo menos um banho
público e, se necessário, um aqueduto para alimentá-lo e
alimentar as fontes públicas. Por alguns cêntimos, os pobres
Disponível em: www.metmuseum.org. Acesso em: 14 set. 2011.
passavam horas num ambiente luxuoso que constituía uma
homenagem das autoridades – imperador ou notáveis.
VEYNE, Paul (Org.). História da Vida Privada: Do Império Romano ao ano mil - Vol. 1. São A figura apresentada é de um mosaico, produzido por volta
Paulo: Companhia das Letras, 2009. (adaptado). do ano 300 d.C., encontrado na cidade de Lod, atual Estado
de Israel. Nela, encontram-se elementos que representam
A prática do evergetismo na Roma Antiga consistia no uma característica política dos romanos no período, indicada
patrocínio de espaços públicos de lazer e diversão que em:
atendia aos interesses
a) Cruzadismo – conquista da terra santa.
a) políticos das elites romanas. b) Patriotismo – exaltação da cultura local.
b) sociais de patrícios e plebeus. c) Helenismo – apropriação da estética grega.
c) militares dos generais romanos. d) Imperialismo – selvageria dos povos dominados.
d) econômicos da plebe marginalizada. e) Expansionismo – diversidade dos territórios conquistados.
e) urbanísticos dos engenheiros romanos.

07.
Na Roma do século II, cerca de quatro meses do ano
eram dedicados aos espetáculos e jogos, que costumavam
durar do amanhecer ao pôr do sol.
Nos anfiteatros ou no circo o povo se acomodava
seguindo certa hierarquia. A sociedade romana inteira estava
representada por pessoas de todas as categorias sociais.
Além de integrar o corpo cívico, os espetáculos também eram
ocasião para a multidão expressar sua opinião sobre os
acontecimentos da cidade e as personagens políticas. Era
uma obrigação das autoridades participar, presidindo a
apresentação.
CORASSIN, Maria Luiza. Sociedade e política na Roma antiga. São Paulo: Atual, 2001
(adaptado).

De acordo com o texto, é correto afirmar que, na Roma antiga,


os espetáculos e jogos

a) mostravam o dinamismo da economia.


b) eram espaço de tomada de decisões políticas. GABARITO
c) reforçavam o caráter democrático do governo.
d) provocaram o fim da hierarquia social. 01. E 02. E 03. C 04. B 05. A 06. A 07. E 08. E
e) tinham uma função cívica e política.

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