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Apostilas de Biomas e
Ecossistemas da Amazônia 2007
Professor Thierry R. Gasnier
tgasnier@ufam.edu.br
Conteúdo
1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 2
O QUE SÃO BIOMAS? .......................................................................................................................................... 2
O QUE SÃO ECOSSISTEMAS E ECORREGIÕES?.................................................................................................. 7
2. NOÇÕES DE CLIMATOLOGIA................................................................................................................ 9
POR QUE É QUENTE NOS TRÓPICOS? ................................................................................................................ 9
POR QUE É ÚMIDO NOS TRÓPICOS E OS DESERTOS ESTÃO CONCENTRADOS NAS LATITUDES 30º N E 30º S ?9
SAZONALIDADE CLIMÁTICA ............................................................................................................................... 10
3. ENTENDENDO O RELEVO.................................................................................................................... 12
MONTANHAS EM MOVIMENTO ........................................................................................................................... 12
O RELEVO NUMA ESCALA LOCAL ...................................................................................................................... 14
A INFLUÊNCIA DO RELEVO SOBRE O CLIMA ...................................................................................................... 15
O RELEVO E A DRENAGEM DE ÁGUA ................................................................................................................. 16
4. HIDROLOGIA: MARES DE ÁGUA DOCE ........................................................................................... 16
OS TIPOS DE ÁGUA ........................................................................................................................................... 17
POR QUE EXISTEM AS CHEIAS E VAZANTES DOS RIOS AMAZÔNICOS .............................................................. 19
CARACTERÍSTICAS DA PAISAGEM AMAZÔNICA PRÓXIMA AOS GRANDES RIOS ................................................. 20
5. DIFERENÇAS ENTRE VEGETAÇÕES ................................................................................................ 22
AS NECESSIDADES VEGETAIS ........................................................................................................................... 22
ESTRATÉGIAS VEGETAIS E SUAS RELAÇÕES COM OS BIOMAS....................................................................... 32
6. ECOSSISTEMAS AMAZÔNICOS DE TERRA FIRME....................................................................... 40
FLORESTA DENSA. ........................................................................................................................................... 40
A FLORESTA DE BAIXIO .................................................................................................................................... 42
A CAMPINARANA E CAMPINA ............................................................................................................................ 43
A SAVANA AMAZÔNICA ..................................................................................................................................... 44
7. ECOSSISTEMAS PERIODICAMENTE INUNDÁVEIS ....................................................................... 46
A VÁRZEA.......................................................................................................................................................... 46
O IGAPÓ ............................................................................................................................................................ 50
1
1. INTRODUÇÃO
2
d) floresta temperada decídua (FTD) ocorrem em clima temperado, possuem pou-
cas espécies de árvores, na maioria Angiospermas, e quase todas as árvores e ar-
bustos perdem as suas folhas durante o inverno;
e) florestas e
bosques esclero-
filos (FBE) tam-
bém ocorrem em
clima temperado,
mas do tipo medi-
terrâneo, que tem
época seca no
verão. Por isto, as
árvores mantêm
as suas folhas du-
rante o inverno.
Estas folhas têm
adaptações para
resistir à falta de
água que ocorre
no inverno. É uma
floresta com baixa
diversidade com
predomínio de An-
giospermas.
f) florestas de
coníferas ou tai-
ga, ocorrem em
locais com inver-
nos mais longos e
extremos que a
FTD e tem baixa
diversidade de
árvores, com pre- Cinco biomas: floresta temperada decídua; deserto quente; estepe;
domínio de Gim- tundra e floresta tropical
nospermas (pi-
nheiros), cujas folhas se mantêm durante o inverno e geralmente tem forma de agu-
lhas.
3
h) estepe- formação vegetal aberta de clima temperado, constituída por uma vasta
planície desprovida de árvores, é comum no sudeste da Europa e da Ásia e no cen-
tro da América do Norte. ;
i) tundra: Vegetação aberta das regiões polares onde o verão é curto e com tempe-
raturas constantes. Não há árvores, apenas ervas, musgos e liquens. O solo da tun-
dra permanece gelado o ano todo e a vegetação geralmente fica coberta pela neve
boa parte do ano;
j) deserto seco: áreas de baixa precipitação com vegetação escassa (ou ausente)
caracterizada por adaptações morfológicas extremas contra a seca e/ou ciclos de
vida adaptados a chuvas eventuais.
Estas descrições são vagas, são só para se ter uma idéia. Nas aulas passaremos
filmes em que veremos melhor o “jeitão” de cada bioma. Mas ver não basta, temos
que entender o porquê de cada um ser como é.
Os Biomas e o clima.
Pelas descrições acima, já fica claro que os diferentes tipos de vegetação são de-
terminados principalmente pelo clima, mesmo em vegeta-
ções de locais distantes com composições de espécies mui-
to diferentes. É o resultado de convergência evolutiva após
evolução em condições semelhantes por muito tempo. Por
exemplo, em regiões áridas as plantas precisam ter reser-
vas de água e defesas contra animais interessados nesta
água (e.g. espinhos
e látex venenoso).
Muitas famílias dife-
rentes de plantas
de lugares distantes
evoluíram por mi-
lhares de anos nes-
tas condições, por
isto, não surpreende
que o “jeitão” da ve-
getação seja o mes-
mo entre continentes
distantes. A dependência dos biomas em relação ao clima
pode ser observada na comparação dos mapas das distribui-
ções dos biomas e dos climas de nosso planeta (figura da
próxima página). São três os fatores climáticos principais que
determinam a distribuição dos biomas: temperatura (calor),
precipitação, e sazonalidade (ou estacionalidade) climática.
(sazonalidade= variações ao longo do ano, que se repetem
todos os anos aproximadamente da mesma forma no clima,
nos ciclos de vida de animais e plantas, e no cotidiano humano).
4
Sobreposição dos mapas dos Biomas e de climas. A semelhança entre os mapas reflete a estreita rela-
ção que existe entre clima e vegetação.
5
O gráfico abaixo mostra quais os biomas esperados em função da temperatura mé-
dia e da precipitação média de um local. Este gráfico é válido em geral, mas é uma
simplificação, pois sabemos que é bem diferente um lugar com 1500 mm de chuva
anual com chuva bem distribuída ao longo do ano comparado com um local que ti-
vesse quase toda a chuva concentrada em poucos meses. No primeiro local prova-
velmente haveria uma floresta exuberante, enquanto no segundo provavelmente ha-
veria uma vegetação
rala e adaptada à
seca. O mesmo po-
de se dizer da tem-
peratura. Na tundra,
o clima é frio com
um verão curto e um
inverno longo. No
alto de uma grande
montanha no equa-
dor, o clima é frio,
mas sem sazonali-
dade temperatura.
Há diferenças entre
estas duas situa-
ções frias, como
veremos adiante.
Portanto, para en-
tendermos os Bio-
mas, teremos que
entender o que de-
termina os diferen-
tes climas da terra e Biomas esperados em uma região com base na temperatura
a sazonalidade cli- media e na precipitação anual.
mática (capítulo 2).
Depois de olhar para cima para estudar o clima, olharemos para baixo para estudar
o solo. O relevo e o tipo de solo influem na disponibilidade de água e nutrientes pa-
ra as plantas. O relevo, porque afeta o clima local e porque determina a drenagem
da água (isto é, como ela escorre por dentro do solo). E o tipo de solo, porque solos
arenosos têm capacidade muito menor de reter água e nutrientes. Veremos o efeito
do relevo sobre o clima e o solo no capítulo 3. O relevo também determina locais
onde a água se acumula, formando ecossistemas complexos. A hidrologia é impor-
tante para entendermos estes ecossistemas, e será abordada no capítulo 4.
6
Biomas: transições graduais por fora e heterogêneos por dentro
Os biomas não têm fronteiras definidas, isto é, de um bioma para outro vizinho cos-
tuma haver uma mudança gradual. Não podemos esquecer que a categorização em
biomas é criação do homem. Ela reflete diferenças reais, mas os limites e o número
de categorias são arbitrários. Por isto, vocês encontrarão diferentes classificações
de biomas. Incluímos acima
a floresta tropical semi-
decídua, que não costuma
ser incluída em outras
classificações. O mais
importante sobre os biomas
não terem fronteiras é
ressaltar que cada bioma
não é uma entidade
independente, completa-
mente diferente dos demais
e com lógica própria, como
se fosse um país com lín-
guas e leis diferentes dos As transições entre biomas não são como fronteiras.
vizinhos. Cada local é parte
da biosfera e todas as
plantas fazem essencialmente o mesmo.
Além disto, ao categorizar os locais em biomas, temos a impressão que são unida-
des homogêneas, entretanto, temos de ressaltar que há variação dentro deles. Em
alguns desertos há chuva eventual e uma flora e uma fauna bastante significativa,
incluindo até anfíbios. Em outros, não há chuvas por décadas, e não encontramos
praticamente nada. A Amazônia está no Bioma das florestas tropicais úmidas, entre-
tanto, dentro deste bioma temos florestas de terra firme em platôs, florestas de terra
firme em baixios, campinaranas, campinas, igapós e diversos tipos de várzeas. Por
ser este o bioma em que vivemos, estudaremos os diferentes ecossistemas presen-
tes na Amazônia nos capítulos 6 e 7.
7
Por exemplo, quando falamos "ops, pisei em uma poça de água", apenas pensamos
nela como um local molhado onde podemos sujar os pés. Quando falamos no ecos-
sistema poça de água, pensamos nos organismos que vivem lá, no fato que ela po-
de secar matando muitos deles, que tem uma quantidade de oxigênio alta ou baixa,
que uns organismos alimentam-se de outros, que há épocas em que encontramos
girinos lá, etc. Existem milhares de fenômenos ocorrendo numa poça de água, basta
colocar uma gota em um microscópio
para perceber isto.
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2. NOÇÕES DE CLIMATOLOGIA
V amos tomar a nossa região como referência. Por que o clima tropical é quen-
te? E por que é úmido? Por que tem pouca sazonalidade térmica? Por que tem
sazonalidade de chuvas? Nessa seção abordaremos as causas para os pa-
drões climáticos globais. Entenderemos as tendências climáticas considerando a
posição de cada lugar na terra. No capítulo 3, iremos um pouco adiante nas noções
de climatologia explicando desvios destas tendências globais devido ao relevo.
No início do dia
o sol aquece o
solo e o solo
aquecimento o
ar superficial. O
ar da superfície
mais quente se
dilata e tem 2
características:
tem sua capaci-
dade de carre-
gar água au- O ar é como uma esponja que se dilata, absorve água e sobe levando
mentada (como esta água. Após a condensação, esta esponja segue seca para locais
uma esponja) e distantes>
torna-se mais
9
leve do que era, pois tem densidade menor (mesmo estando carregado de água).
Portanto, ele sobe e leva a água com ele. A isto chamamos evaporação. À medida
que sobe entra em contado com ar mais frio e vai se esfriando. Em certa altura a
água que contém se condensa e transforma-se em nuvens e até em chuva. Mas o ar
não para de subir até se esfriar tanto que
fica novamente pesado e começa a cair.
Este fenômeno acontece em escala local,
mas também em escala global, de forma
que se estabelecem padrões globais de
circulação de ar. No equador a água que
evaporou se precipita localmente e ar se-
co é exportado. Este ar seco acaba por
determinar regiões áridas e desérticas em
outros locais do mundo. Por outro lado, a
água que evapora nas regiões vizinhas ao
equador tendem a ser sugadas para repor
o ar exportado. Enquanto o equador é
quente e úmido, áreas vizinhas tendem a Circulação das massas de ar na terra
se tornar secas. A imagem que temos de
desertos é que são locais quentes. Alguns
realmente são. Isto acontece porque faltam nuvens para proteger o solo da incidên-
cia direta do sol. Além disto, independente de nuvens, o ar seco tem menor inércia
térmica. Por isto é mais fácil de ser esfriado e esquentado, causando extremos. Al-
gumas pessoas se surpreendem ao saber que os desertos tendem a ser muito frios
à noite. Para piorar, estas condições atrapalham o estabelecimento de vegetação
que também tem um efeito forte sobre o microclima.
Sazonalidade climática
Fenômenos sazonais são aqueles
que variam aproximadamente da
mesma forma todos os anos, por
exemplo, o clima (inverno-verão),
os ciclos de vida de animais e
plantas (estação reprodutiva, mi-
grações), e até o cotidiano humano
(colheitas, festas). Por que a sazo-
nalidade térmica é tão grande em
latitudes mais altas? Por que lá
neva numa época do ano e na ou-
tra faz sol, enquanto aqui o clima
muda pouco ao longo do ano? A
Translação e a sazonalidade climática
resposta é: Devido à inclinação do
eixo de rotação da terra (em relação ao plano de translação). Entretanto, uma res-
posta destas sem explicação ajuda pouco. Esta inclinação acaba determinando que
o número de horas varie ao longo do ano fora do Equador. Quanto mais alta a latitu-
de mais forte é este efeito (ver figura abaixo). É importante perceber que quando a
incidência solar é maior no hemisfério norte, ela é menor no Hemisfério Sul. Aconte-
ce uma situação peculiar nos pólos: um dia ou uma noite podem durar mais que 24
10
horas (em alguns lugares podem durar meses). Em resumo, a principal causa da
grande sazonalidade de temperatura (in-
verno-outono-verão-primavera) fora dos
trópicos é a variação no numero de horas
de incidência solar (aquecimento) contra o
número de horas de noite (resfriamento).
No esquema ao lado, na situação c (que
ocorre em dezembro), temos o verão do
hemisfério sul. Notem que o sol incide Per-
pendicularmente sobre a linha do Trópico
de Capricórnio. Nesta época é como se o
equador fosse lá. Dizemos que o equador
climático varia ao longo do ano. Lembrem
que no Equador chove muito. É por isto
que esta também tende a ser a época de
chuvas sobre este trópico. (Há variações
devido a outros fatores geográficos, a mai-
or chuva em São Paulo é em fevereiro, não
no final de dezembro). Sobre o Equador
seriam esperadas duas épocas de chuva,
uma na primavera e uma no outono (quan-
do o Equador Geográfico é também o Incidência solar em momentos dife-
"Equador Climático"). É assim em alguns rentes do ano
locais, como na Nigéria. Entretanto,
devido a fatores geográficos como a continentalidade e movimentos de massas de
ar, não ocorre exatamente como o esperado (2 estações por ano). O que predomina
na Amazônia é uma estação de chuvas e uma relativamente seca. Na parte da A-
mazônia que está ao sul do Equador esta seca tende a ser aproximadamen-
te/geralmente de agosto a outubro. Ao norte, como em Roraima e no Amapá, a épo-
ca seca é de Janeiro a Março, pois está no Hemisfério Norte.
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3. ENTENDENDO O RELEVO
E mbora o chão seja algo concreto, entender a história do chão é algo quase
abstrato. A geologia lida com tempos tão longos que desafiam a nossa imagi-
nação.
Montanhas em movimento
A terra surgiu há cerca de 5 bilhões de anos.
A Terra teve uma superfície que era uma mar
de magma derretido, mas se esfriou forman-
do uma crosta sólida e a água da atmosfera
se condensou formando mares. Ainda hoje
encontramos parte desta crosta muito antiga,
inclusive na Amazônia.
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de anos. Cadeias de montanhas altas podem se transformar em vales. Mares interio-
res (continentais) imensos podem ser aterrados com sedimentos trazidos por rios.
Dá para imaginar?
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O relevo numa escala local
O que vimos acima ajuda a entender a formação do relevo em uma escala global.
Vamos prestar atenção aqui ao detalhe do relevo em escala local. Topografia é a
representação de uma porção de um terreno com todos os acidentes e objetos que
se achem à sua superfície. Discutiremos a topografia de áreas inundáveis nas aulas
sobre hidrologia. Chamamos a atenção para a topografia de Terra Firme (áreas que
não estão sujeitas às inundações anuais de grandes rios) da Planície Amazônica
para mostrar um exemplo de analise de relevo em escala local e porque ela ajuda a
entender diferenças de tipos de solos e de habitats em Florestas de Terra Firme.
15
O relevo e a drenagem de água
Todo mundo sabe onde procurar um igarapé: no local mais baixo. Parte da água das
chuvas pode escorrer pela superfície, mas a maior parte da água que chega ao iga-
rapé se desloca dentro da terra,
e forma uma camada úmida
chamada de lençol freático.
Esta camada pode ficar mais
profunda ou mais rasa em fun-
ção de particularidades do rele-
vo, como vemos na figura ao
lado.
M esmo nos continentes, há regiões tão cheias de água que é quase como se
fossem mares de água doce. A Amazônia e o Pantanal são áreas que se des-
tacam globalmente em relação a isto. Na nossa região, como vimos acima, o
soerguimento dos Andes, em função da deriva continental, acabou por determinar a
formação da maior bacia hidrográfica do planeta. Portanto, não falta água doce por
aqui, alguns rios são imensos e existe uma grande área inundada anualmente por
estes rios. A área sob influência das inundações é de apenas cerca de 5% da área
da Amazônia. Entretanto, nestes 5 % encontramos ecossistemas ricos em biodiver-
sidade, é ai onde se concentra a maior parte da população e da economia rural da
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região. Além disso, é uma das paisagens mais belas do planeta. Novamente, utiliza-
remos nossa região como modelo para entender aspectos bióticos de ecossistemas
de água doce tropicais.
Os tipos de água
Na foto ao lado, vemos o encontro dos
rios Negro e Solimões, que passa a
ser denominado Amazonas. O con-
traste é muito marcante. O Rio Negro
tem uma água da cor de chá preto
forte, e o rio Amazonas é barrento de
cor marrom claro a amarelada, devido
a um fino sedimento (partículas sóli- Encontro das "águas pretas" do Rio Negro
das inorgânicas) em suspensão. com as "águas brancas" do Rio Solimões.
Quando vamos ao encontro das águas
percebemos ainda que o Rio Solimões
é mais agitado e mais frio. Mas há
outras diferenças. O Rio Solimões
também é mais rico em nutrientes e
tem pH neutro ou levemente ácido.
Como conseqüência, sustenta uma
fauna (peixes, mosquitos, etc) mais
abundante (discutiremos mais sobre
isto na aula sobre os ecossistemas
aquáticos). O Rio Negro contrasta por
ter um pH bastante ácido (por volta de
4) e poucos nutrientes. A fauna não é
tão abundante, mas a biodiversidade
também é muito alta. O entorno des- Um rio de água preta com uma praia arenosa
tes rios também diverge muito, como
veremos adiante (hidrologia) e em
outra aula (os ecossistemas). O Rio Negro é considerado o principal exemplo de rio
de "água preta", outros exemplos são o Rio Urubú e outros que tem nascentes em
florestas. O Solimões-Amazonas é o principal exemplo de rio de "água branca" ou
de "água barrenta", outros exemplos são o Rio Madeira, o Purús e o Juruá. Ainda há
um terceiro tipo de rio, o rio de "água clara". Os rios de água clara, como os rios
Tapajós, Xingú e Trombetas, geralmente carregam muito pouco sedimento em sus-
pensão, como os rios de água preta, mas não são escuros como eles. Em geral são
rios relativamente pobres em nutrientes e com pH ácido, mas não tanto como os rios
de água preta. É comum que se desenvolvam algas nestes rios, tornando-os esver-
deados.
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Esta categorização de águas é útil do ponto de vista prático e didático, entretanto,
para entender o que acontece é importante reconhecer a existência de gradientes
(ver figura). As águas brancas Água Preta
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A cor escura da água preta é causada por substâncias orgânicas derivadas da de-
composição incompleta
de folhas na floresta.
Estas substâncias che-
gam aos igarapés ou
não. Se o solo for argilo-
so existe uma demora na
drenagem da água sufi-
ciente para dar tempo
para as bactérias faze-
rem a decomposição
mais completa. Além
disto, é necessário que
haja uma quantidade
grande de folhas em de- Na terra firme, encontramos igarapés com águas mais ricas
composição para que em ácidos orgânicos em locais com solos arenosos, pois a
uma quantidade signifi- drenagem é rápida e não há tempo da ação de bactérias para
cativa de ácidos decompor o húmus.
orgânicos chegue aos
igarapés. Portanto, em bacias de drenagem sobre solo argiloso ou em regiões com
vegetação aberta, os igarapés tendem a ter uma água mais do tipo "clara" que do
tipo "preta". Se o solo for arenoso, a drenagem é rápida e o pH do solo é menos fa-
vorável para a ação de bactérias, de forma que a água chega aos igarapés ainda
cheia de ácidos orgânicos da decomposição incompleta. Também nos baixios e em
áreas pantanosas, onde o solo é encharcado, a decomposição tende a ser incomple-
ta, com liberação de ácidos orgânicos para a água, devido à falta de oxigênio.
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enfrentar. Por isto, em Belém, a diferença entre o nível dos picos da cheia e da va-
zante é pequena (cerca de 2 metros em média), em Manaus é de cerca de 8 m e no
alto Solimões pode chegar a 15m.
Nas áreas de rios de água negra ou clara, temos basicamente uma margem com
florestas ou formas mais abertas de vegetação. As florestas inundáveis e são cha-
madas de Igapós. Ilhas, como as Ilhas Anavilhanas do Rio Negro são pouco co-
muns. (Aparentemente estas foram formadas a partir da deposição de sedimentos
do Rio Branco.) Há poucos lagos e não existe uma ampla várzea como nos Rios de
água branca. Quando a água baixa, geralmente ficam expostas longas praias de
areia branca.
Em rios de água
branca a várzea pode
ser imensa. Há locais
no Rio Amazonas em
que ela chega a ter
100 km de largura.
Nos locais onde os
rios não são muito
grandes e as várzeas
são estreitas, geral-
mente temos apenas
o canal do rio (com Meandros no rio Purus
muitos meandros), a
floresta inundável, e lagos de ferradura (ou de meandro sacado).
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Nos locais com várzeas amplas temos um ambiente mais complexo. Nestas várzeas
encontramos florestas de
várzea alta, florestas de
várzea baixa, restingas,
lagos temporários, lagos
permantes, furos, Rio
Principal, Paranás e
também alguns lagos de
meando abandonado.
Na figura ao lado pode-
mos entender como se
formam os meandros e
um pouco da dinâmica
destes rios. Note que no
lado de dentro das curvas Principais elementos da drenagem da várzea A-
dos rios há deposição de mazônica: 1- igarapé; 2- furo; 3 Paraná; 4 Regos
sedimentos, no lado oposto em regos temporários; 5- Lago permanente; 6
ocorre erosão. Isto faz com Lago de meandro abandonado "sacado"; 7- Lago
que as curvas fiquem cada de barragem em antiga ria fluvial.
vez mais abertas, e uma
curva pode tocar a outra.
Quando isto acontece, o rio
muda de curso e o meandro fica abandonado, formando um lago. Note que rios co-
mo este são muito dinâmicos, há muito tempo que passa um rio drenando água por
ai (entre as 2 áreas de terra firme mostradas), mas a posição do rio muda constan-
temente. Em fotos de satélite podemos ver as "cicatrizes" dos leitos antigos.
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5. DIFERENÇAS ENTRE VEGETAÇÕES
As necessidades vegetais
Água
22
Por isto, a água é a principal necessidade vegetal e há uma forte relação entre a
quantidade e regularidade da disponibilidade de água no solo e o tipo de vegetação.
Onde há chuvas abundantes no ano todo normalmente haverá florestas. As árvores
são os organismos vegetais mais dependentes de água, mas onde esta não falta
este tipo de planta predomina por vencer a competição pela luz. Se a chuva for mais
ou menos regular e pouco abundante, a vegetação tende a ser mais aberta, mas
poderemos encontrar florestas em locais onde a topografia determina maior quanti-
dade e regularidade de água no solo, como próximo a riachos (floresta de galeria).
Onde há uma quantidade de água muito pequena na maior parte do ano, mesmo
que haja uma época chuvosa, teremos uma região de semi-árido ou deserto.
É interessante notar que o efeito da temperatura baixa sobre plantas é menos direto
(pelo seu efeito em diminuir das reações químicas do metabolismo vegetal como um
todo) do que indireto. O frio limita a capacidade das plantas em absorver água, seja
pelo congelamento do solo ou pela redução do metabolismo das raízes.
Calor
Além da falta de água, há outros importantes efeitos indiretos do calor, aqueles rela-
cionados com interações com animais e outros organismos. Os animais são forte-
mente influenciados pela redução na temperatura. Desta forma, um inverno rigoroso
pode restringir os herbívoros e as doenças. Também relações mutualisticas como a
polinização e a dispersão devem ser mais restritas em ambientes mais frios, seja um
frio sazonal (e. g. tundra ártica) ou não (e. g. tundra alpina tropical).
Luz
As plantas são autótrofas. Este termo significa que são capazes de “alimentar a si
mesmas”, isto é, fixam gás carbônico do ar em moléculas de glicose que servirão
tanto para construção como para o funcionamento do organismo vegetal. É uma fi-
xação de matéria e de energia. Para isto, a planta precisa da água que retira do so-
lo, do gás carbônico do ar e energia luminosa.
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Ao conquistar o ambiente terrestre, as plantas tiveram de desenvolver filtros contra o
excesso de luz e adaptações fisiológicas para evitar
o superaquecimento. Entretanto, estes problemas
foram superados. O problema mais comum de luz
nos ambientes naturais é a sua falta, que ocorre
principalmente devido à presença de outras plantas.
Houve três caminhos evolutivos em resposta a isto:
a) crescimento para cima em direção à luz ou b) a-
daptação a um ciclo de vida inteiro sob baixa inci-
dência solar; c) alelopatia.
A influência de uma planta sobre outra na busca por luz geralmente é chamada de
competição. Entretanto, por definição, na competição os dois organismos envolvidos
são prejudicados para existência do outro. Podemos dizer que isto ocorre no caso
da alelopatia, pois uma planta gasta energia para produzir a toxina inibitória e a ou-
tra é prejudicada por ser inibida. Competição também pode ocorrer durante a suces-
são vegetal, em que uma planta pode crescer mais rápido que outra e prejudica-la
com sua sobra. Entretanto, no caso do sombreamento de uma plântula por uma ár-
vore em uma floresta madura, seria mais apropriado chamar esta relação de amen-
salismo, pois a plântula se prejudica pela sombra da árvore, mas o oposto não acon-
tece.
Nutrientes
Sustentação e fixação
O oxigênio está em abundância no ar, de forma que não falta para as folhas. Entre-
tanto, nos locais em que o solo é encharcado, o oxigênio pode faltar para as raízes.
Existe oxigênio na água, mas o problema é que
em locais encharcados este oxigênio costuma
se consumido por organismos do solo, especi-
almente bactérias. Sem oxigênio nas raízes,
elas param de funcionar, e a planta não pode
absorver água. Curiosamente, em alguns lo-
cais, como na floresta de várzea, é na época
das enchentes que as árvores têm falta de á-
gua e perdem as suas folhas para economizar
água. Entretanto, esta estratégia tem seus limi-
tes, e, abaixo de um certo nível topográfico a
duração da seca fisiológica é longa demais para permitir a existência de árvores.
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No baixio e no mangue, onde o solo é en-
charcado, mas o nível da água sempre volta
a baixar, são comuns raízes que emergem
para fora do solo com aberturas para absor-
ver o ar chamadas de pneumatóforos.
Defesa
Então, por que os animais (herbívoros) não comem logo todas as plantas? Esta per-
gunta parece ingênua, mas não é tão ingênua assim. Muitos animais comem partes
da planta “oferecida” por ela, como néctar e frutos, mas isto é vantajoso para plantas
(como veremos adiante). Nós comemos alface entre outras plantas, mas isto é o re-
sultado de seleção artificial do homem. Nós tiramos as defesas destas plantas para
consumi-las, tanto que precisamos de agrotóxicos para defendê-las. De forma geral,
as plantas têm defesas, principalmente químicas, muito fortes, que tornam seu teci-
do tóxico para a maioria dos animais. Além das defesas químicas, o tecido vegetal é
de difícil digestão, pois em cada célula tem uma parede celulósica que exige enzi-
mas especiais para ser quebrada. Há outras defesas como espinhos, a altura das
folhas, e animais mutualistas que as defendem, especialmente as formigas. A dis-
persão/espalhamento das sementes/esporos para longe das plantas-mães e o tem-
po de dormência (especialmente em espécies anuais) também dificultam a ação dos
herbívoros (e de doenças).
Se considerarmos os insetos, por exemplo, veremos que na maioria das ordens pre-
dominam os predadores e decompositores. As formigas saúvas são importantes
destruidoras de plantas, entretanto, elas não comem diretamente as plantas, mas
fungos que utilizam as folhas como substrato dentro do formigueiro. Portanto, vemos
que o consumo de tecidos vivos de plantas é mais complexo do que parece.
Mistura Genética
Cada organismo tem uma bagagem genética limitada, com falhas e inflexível. A ba-
gagem genética da população eh muito mais ampla e dinâmica. Muitos indivíduos
podem morrer devido a uma doença nova, entretanto, se alguns tiverem em sua ba-
gagem genética condições de resistir ahh doença, então a população sobrevivera.
Quanto mais intensa for a troca genética, melhor a capacidade da população para
resistir a mudanças ambientais. E não faltam mudanças ambientais quando conside-
ramos tempo evolutivo. Doenças, novos inimigos naturais, novas oportunidades, e
ateh a manutenção do patrimônio exigem mudanças constantes. A bagagem de um
individuo basta para uma geração, mas clones deste individuo estariam predestina-
dos ahh extinção. Portanto, as trocas genéticas são essenciais, e encontraremos
adaptações importantes para otimizar as trocas genéticas das plantas.
As plantas não se deslocam depois que germinam, mas suas sementes (ou esporos)
e gametas podem ser levados para longe das “plantas pai e mãe”. Nas plantas ter-
restres primitivas (musgos e samambaias), os gametas dependem de água para a
fecundação e o deslocamento do gameta masculino (anterozóide) é muito restrita.
Portanto a fecundação sempre ocorre muito próxima das duas plantas que produ-
zem os gametas (masculinos e femini-
nos). A mistura genética eficiente de-
pende destas duas plantas terem ori-
gem de locais distantes. Por isto, estas
plantas têm um ciclo de vida dividido em
duas partes. Após a fecundação, germi-
nará um esporófito, que é uma planta
que produz esporos (a samambaia é o
esporófito). Os esporos são secos, po-
dem ser levados para longe com o ven-
to e germinam distante das plantas pai
e mãe, formando as plantas que produ-
zirão gametas. Desta forma, aumenta a
chance de fecundação entre plantas de parentesco distante, e a mistura genética é
melhor.
28
Animais que se alimentam de sementes podem perder algumas longe da planta
mãe. O prejuízo de comer as sementes pode ser pequeno comparado com às van-
tagens de levar algumas sementes para bem longe da planta mãe.. Posterioremente,
evoluíram os frutos com um tecido nutritivo para a atração do animal. Desta forma, o
animal deixou de comer (ou de digerir) a semente para realizar a dispersão. A dis-
persão por animais chama-se zoocoria.
Colonização
A dispersão é impor-
tante para a coloniza-
ção. A colonização de-
ve ser vista em um
sentido amplo. Pássa-
ros podem levar se-
mentes de capim para
uma ilha distante. Co-
queiros chegam na ilha
pela água. Alguns ha-
bitats, como ilhas pe-
quenas, praticamente
só possuem estas es-
pécies colonizadoras.
Entretanto, de certa
forma, uma clareira é
parecida com uma ilha
neste sentido. Os ga-
lhos novos de uma árvore grande também são como uma nova ilha para plantas epí-
fitas.
30
Interação entre necessidades vegetais e as estratégias vegetais
Algumas destas necessidades estão relacionadas entre si. A relação mais óbvia é a
de água com nutrientes. A falta de água não compromete apenas o balanço hídrico
das plantas, mas restringe a captação dos nutrientes. Água, em excesso no solo
também ser um problema por afetar a disponibilidade de oxigênio para as raízes.
Necessidades
Vegetais:
Contexto: Água
Clima Nutrientes
Solo Luz
Topografia Sustentação
Oxigênio (raízes)
A mesma espécie Defesa
Outros Vegetais Mistura genética
Outros organismos Colonização
31
Estratégias Vegetais e Suas Relações com os Biomas.
A mesma estratégia vegetal pode ser encontrada em vários biomas. Por exemplo, os
cactos são muitos comuns na caatinga, entretanto, também ocorrem em copas de
árvores na floresta tropical, pois no alto das árvores incide sol forte e existe um mi-
croclima muito seco. Para evitar ser repetitivo, serão abordadas as estratégias já
dentro de uma abordagem contextualizada em biomas. A floresta tropical é a melhor
referência para começarmos a apresentação das estratégias vegetais, devido à mai-
or diversidade de estratégias que encontramos lá.
33
As trepadeiras
Como vimos, as árvores têm uma juventude muito difícil. Não é fácil construir um
tronco no escuro. A estratégia das trepadeiras é uma
alternativa econômica. Apoiando-se nas árvores, elas
podem chegar até as copas com um investimento muito
menor. Em seguida, começam a crescer sobre a copa
de várias árvores, seu tronco se alarga e começam a
emitir raízes (cipós). Estes troncos grandes de trepadei-
ras são chamados lianas. Há muitas trepadeiras peque-
nas que não chegam até as copas. Algumas, como a
Arácea Jibóia, crescem alguns metros e adquirem uma
forma semelhante à de uma bromélia. Elas são chama-
das hemi-epífitas.
As epífitas
As Bromélias das copas são epífitas que encontraram os mesmos problemas das
orquídeas. A maioria das suas soluções foi parecida. Uma diferença está na forma
de armazenas água. Suas folhas estão dispostas em forma de coroa, formando um
reservatório de água. Este reservatório pode secar eventualmente, mas as suas fo-
lhas são relativamente resistentes à dessecação. A presença de cactos entre as epí-
fitas pode surpreender algumas pessoas, pois é uma vegetação mais associada a
ambientes semi-áridos. Entretanto, eles são comuns nas copas das árvores, pois o
microclima lá é seco. Orquídeas, bromélias, cactos e a maioria das epífitas são co-
mensais, isto é, não prejudicam a árvore sobre a qual cresceram.
Existem epífitas que são parasitas. Por exemplo, a erva de passarinho consegue
penetrar suas raízes dentro do tronco da plan-
ta hospedeira e retira água e sais minerais
deste tecido. No início de suas vidas, encon-
tram problemas semelhantes aos das orquí-
deas, entretanto, a sua dispersão é por pássa-
ros que ingerem suas sementes e as deposi-
tam ao defecar sobre os troncos. A semente
da erva de passarinho tem uma substância
que a adere ao tronco, reduzindo sua chance
de cair. Após desenvolverem as suas raízes
de absorção, terão água, nutrientes e luz, e
podem se desenvolver bastante, em alguns casos, a ponto de matar a planta hospe-
deira. Como absorvem água e nutrientes, ainda têm que fazer fotossíntese, por isto
são chamadas de hemiparasitas. Outras epífitas desenvolveram um parasitismo ain-
da mais extremo. Suas raízes são capazes de absorver a seiva elaborada da planta
hospedeira. A seiva elaborada é aquela que vem das folhas trazendo os produtos da
fotossíntese para alimentar as raízes e o restante do corpo vegetal. As epífitas que
absorvem esta seiva não são verdes porque não precisam fazer fotossíntese e são
chamadas de holoparasitas. Algumas holoparasitas crescem sobre a copa, como
uma convolvulácea (gênero Cuscuta), chamada popularmente de “fios de ovos” por-
35
que sua cor é semelhante à de um doce feito com a gema do ovo. Outras crescem
no interior do tronco das árvores hospedeiras, sua presença só é notada quando
produzem as suas flores.
Palmeiras da floresta
As palmeiras são plantas que ocorrem tanto em ambientes abertos como em flores-
tas. Costumam Desenvolver um tronco do tipo estipe, que geralmente não tem cres-
cimento em largura. Entretanto, podem ser bastante altas. Geralmente são sensíveis
à falta de água, provavelmente devido às suas folhas muito grandes. Palmeiras co-
mo o Buriti são indicadoras de locais com solos hidromórficos e possuem pneumató-
foros para resistir ao excesso de umidade. São comuns dentro da floresta, incluindo
algumas espécies de sub-bosque e outras de dossel. Muitas espécies de floresta
têm caule subterrâneo, como a Inajá e a Attalea. A abundância de espécies com
caules subterrâneos possivelmente esteja relacionada ao fato que a disposição de
suas folhas enermês acaba por formar um grande funil coletor das folhas das copas
das árvores, determinando um acúmulo de nutrientes à sua volta.
O Mata-pau ou apui é uma estratégia que evoluiu apenas em dois gêneros de plan-
tas (Fícus e clusia), entretanto, é uma estratégia que pode ser considerada importan-
te, pois estas árvores são relativamente abundantes na floresta tropical. A planta
nasce como uma epífita, na copa das árvores, onde há bastante luz. Entretanto, dife-
rente das epífitas, sua raiz cresce até atingir o solo. Ao chegar neste estágio, a plan-
ta tem a luz das copas e a água e os nutrientes do chão, e começa a desenvolver
mais esta raiz, que começa a cobrir o tronco da hospedeira. Sua raiz não tem a ca-
pacidade de apertar o tronco da hospedeira, entretanto, ela termina por morrer por-
que não pode impedir o desenvolvimento natural do seu tronco, comprimindo os va-
sos que levam seiva.
36
As Holoparasitas de raízes. Nem todas as holoparasitas são epífitas. A maior flor
simples do mundo pertence a uma holopara-
sita de raízes, Rafflesia arnoldii, da Indoné-
sia, que se desenvolve dentro da raiz de uma
trepadeira. Algumas parasitas de raízes se-
quer entram em contato direto com as suas
hospedeiras e produzem flores bem peque-
nas. Suas raízes são parasitas de fungos de
micorrizas, que são mutua-
listas de árvores. Micorrizas
são associações entre fun-
gos e plantas, na qual o fungo recebe alimento da planta e a planta
recebe nutrientes do solo que os fungos tem maior capacidade de
absorver. Praticamente todas as plantas fazem estas associações,
mas as árvores em especial, especialmente se o solo for pobre. As
plantas holoparasitas de micorrizas se associam ao fungo, mas ao
invés de fornecer alimento, retiram o alimento que o fungo obteve
de outra planta. Não é uma estratégia muito comum, entretanto,
vale a pena ser citada para verificarmos que existem possibilidades de estratégias
vegetais bem diferentes das mais comuns.
As árvores de savanas são diferentes das árvores de dossel da floresta tropical. Su-
as raízes são profundas, porque seu fator limitante é água. O mesmo ocorre com os
arbustos. Na maioria das savanas, predominam os arbustos, e as árvores são muito
baixas. Costumam ter copas baixas, isto é, ramos deste a base. A savana africana
um pouco é diferente. Lá há mais árvores altas com copas altas devido à abundân-
cia de herbívoros que atacam os ramos mais baixos. Devido à abundância de capim
que seca na época sem chuvas, a ocorrência de fogo é relativamente comum neste
37
bioma. Entretanto, é um fogo que passa rapidamente. Por isto, os arbustos costu-
mam ter cortiças grossas ao redor do tronco, que é uma defesa que costuma ser
suficiente contra o fogo. O fogo costuma matar gemas apicais, e gemas laterais bro-
tam após o fogo. Este é um dos motivos destes arbustos terem uma aparência con-
torcida.
É comum encontrarmos arbustos com folhas bastante duras. Isto é chamado de es-
cleromorfismo. Esta é uma adaptação para prolongar bastante a vida útil de uma
folha, tornando-a mais resistente à herbivoria e ao desgaste mecânico. Na savana, a
produtividade dos arbustos costuma ser baixa, especialmente na época seca para
as plantas que não atingem o lençol freático, por isto, é difícil produzir folhas novas.
Embora estas folhas não sejam tão eficientes como folhas novas trocadas constan-
temente, esta estratégia é mais efetiva quando é necessária uma a economia de
nutrientes.
Ervas anuais. Algumas plantas têm um ciclo de vida curto, devido a uma forte seca
sazonal (como nas savanas) ou ao frio sazonal (como nas estepes e nas tundras).
Na época favorável elas germinam, crescem, produzem flores e sementes e mor-
rem. As sementes ficam em um banco de sementes aguardando a próxima época
favorável. Em alguns desertos o intervalo supera um ano. Após anos, basta uma
chuva forte para as plantas germinarem e completarem todo o ciclo em poucas se-
manas. Na tundra, esta é a vegetação predominante.
O frio influi na fisiologia das plantas de formas diferentes dependendo da sua inten-
sidade. Se a temperatura não for inferior a zero graus, praticamente o único efeito
será uma redução na velocidade das reações químicas. O efeito neste caso é muito
pequeno, e a planta volta ao normal quando a temperatura voltar a subir. Nesta situ-
ação, provavelmente o efeito maior deste inverno brando seja apenas a redução da
atividade de insetos prejudicando a polinização.
Se a temperatura chegar a poucos graus abaixo de zero por pouco tempo, poderá
haver formação de cristais de gelo que destroem tecidos vegetais (geada). Algumas
plantas resistem à geada porque possuem substâncias
inibidoras da formação de gelo. Existe uma diferença
significativa na composição de espécies de plantas pou-
cos graus acima e abaixo da faixa onde ocorrem gea-
das.
Se a temperatura for inferior a zero por vários meses, então o tempo favorável é
mais curto. Possivelmente seja esta a causa das Gimnospermas serem as espécies
predominantes nesta situação, pois elas não descartam as suas folhas no inverno, e
estão prontas para produzir novamente quando a temperatura voltar a subir.
39
6. ECOSSISTEMAS AMAZÔNICOS DE TERRA FIRME.
Floresta Densa.
A “Floresta Densa” típica é encontrada em áreas planas com solos argilosos e esta-
ção seca inexistente ou curta. A ausência da seca, a drenagem boa (isto é, a água
não se acumula prejudicando as raízes), e o solo argiloso, que retem água e nutrien-
tes, determinam que a estratégia vegetal mais favorecida é a de árvores altas e
sempre verdes. Entretanto, há condições de microclima para muitas outras estraté-
gias, como foi descrito no capítulo 5. O resultado é uma floresta muito exuberante.
Muitos livros sugerem que a existência desta floresta exuberante é possível devido à
eficiente ciclagem de nutrientes. Estes livros estão invertendo causa e conseqüên-
cia. 1) A distribuição de florestas está claramente relacionada com a disponibilidade
de água. Isto pode ser visto tanto em escala global (os biomas florestais ocorrem em
climas mais úmidos), como em escala regional (em savanas encontramos matas
próximo aos riachos). 2) A água é um elemento limitante para a existência de árvo-
res, os nutrientes apenas em casos extremos que nunca ocorrem em solos argilosos
bem drenados. Como já vimos, na periferia da floresta tropical úmida há uma floresta
semidecíduas. As árvores são obrigadas a perder suas folhas para economizar á-
gua. A estrutura de uma floresta sobre solo argiloso rico é, no mínimo, difícil de se
distinguir de uma floresta sobre solo argiloso pobre. A produtividade da primeira é
certamente maior, as árvores certamente chegam à idade adulta mais cedo e produ-
zem mais frutos, entretanto, o tamanho das árvores adultas é o mesmo. 3) A Flores-
40
ta Densa está muito longe do mínimo necessário de nutrientes para haver uma flo-
resta. Veremos adiante que a situação na Campinarana e nos Igapós é muito pior, e
mesmo assim são também ecossistemas florestais. 4) Quem tem planta em casa
sabe que elas morrem sem água, entretanto, muito raramente é necessário se a-
crescentar nutrientes. É evidente que a causa da floresta ser exuberante é a abun-
dância de água regularmente o ano inteiro.
Estes livros estão certos em uma coisa, a ciclagem de nutrientes na Floresta Densa
é eficiente. Entretanto, isto é uma conseqüência adicional da disponibilidade regular
de água. Em primeiro lugar, ao contrário dos outros biomas, as raízes das Florestas
Densas não precisam ser profundas, pois há água próximo da superfície o ano todo.
As raízes não precisam ser profundas. Em segundo lugar, dizer que os nutrientes
não são vitais para a exuberância da floresta não é o mesmo de dizer que não existe
uma pressão seletiva forte para uma busca eficiente dos nutrientes. Os nutrientes
efetivamente influem na produtividade da floresta. Quanto mais uma árvore for efici-
ente para obter nutrientes, mais frutos ela produzirá, e maior a chance dela perpetu-
ar seus genes. Esta eficiência resulta de raízes superficiais que cobrem uma área
muito grande e com associações com micorrizas. As raízes são superficiais porque
na floresta a concentração de
nutrientes é significativamente
maior próximo da superfície,
onde há uma camada de sera-
pilheira em decomposição. As
micorrizas já foram citadas
anteriormente, são associa-
ções com fungos que permi-
tem uma absorção maior de
alguns tipos de nutrientes. As
raízes são superficiais, mas
normalmente estão dentro do
solo, veremos na Campinara-
na uma situação ainda mais
extrema.
A floresta de Baixio
No capítulo 3, vimos uma representação topográfica de uma área de terra firme. O
baixio normalmente é uma superfície relativamente plana dentro da qual encontra-
mos o igarapé. O solo é arenoso, porque ao longo de muito tempo a água da bacia
hidrográfica local lentamente vai retirando a argila contida nele. O lençol freático está
próximo da superfície e aflora no igarapé, entretanto, o solo não está completamente
encharcado o tempo todo, especialmente nas áreas mais próximas à vertente. Isto
significa que nem todas as plantas necessitam de resistência ao solo permanente
encharcado. Entretanto, especialmente próximo do igarapé, estas adaptações são
necessárias. A planta mais representativa dos igarapés é a palmeira Buriti, com seus
abundantes pneumatóforos. O solo arenoso é menos estável que o solo argiloso, por
isto, as raízes escora e
tabulares são comuns
neste ecossistema.
A Campinarana e Campina
Os solos argilosos normalmente mantêm as suas características sob a floresta. En-
tretanto, em baixios e vertentes, devido ao deslocamento lateral da água, o solo po-
de se tornar arenoso. É um processo que pode demorar, mas uma vez arenoso, ele
tende a se manter desta forma. Em alguns lugares, o solo pode ser arenoso devido
à formação deste solo pela decomposição de uma rocha arenosa, ou porque havia é
uma área que foi igapó no passado. Por isto, geralmente encontramos solos areno-
sos ou argilosos, os solos intermediários são mais raros.
43
Outra vegetação destes solos arenosos é a Campina. Trata-se de uma vegetação
arbustiva com solo exposto entre os arbustos. Próximo
aos arbustos, devido a um microclima um pouco menos
quente, algumas ervas crescem, formando moitas. Muitos
arbustos têm folhas escleromórficas, que é uma adapta-
ção para economia de nutrientes, pois leva ao aumento da
duração da vida da folha. Não há uma camada de raízes
formando um tapete como na Campinarana.
A Savana Amazônica
Já vimos as principais características das savanas no capítulo 1 e 5. Trata-se de
uma vegetação tropical aberta onde
há predomínio de capim, outras
gramíneas mais baixas, ciperáceas
e uma quantidade de arbustos variá-
vel. Este capim cresce na estação
das chuvas e depois seca, podendo
causar fogo. Os arbustos têm adap-
tações contra o fogo como cortiças
grossas. Muitos arbustos têm raízes
profundas, para resistir à seca. São
comuns plantas com folhas esclero-
morfas, o que indica que economi-
zam nutriente retendo as folhas. O
solo costuma ser pobre, especial-
mente devido ao pH, que torna al-
guns nutrientes mais difíceis de se-
rem absorvidos. Embora a fertilidade
do solo seja comparável à fertilidade de vários solos de Florestas Densa, a situação
de nutrientes é mais grave. No cerrado, não existe a camada de matéria em decom-
44
posição perto da superfície. Ainda que haja alguma matéria em decomposição na
superfície, as raízes precisam ir para o fundo do solo devido à falta de água.
Esta vegetação ocorre em função de uma estação seca que tem uma duração muito
longa para a existência de uma floresta. Partindo-se de Manaus em direção a Brasí-
lia, a duração da época seca aumenta gradualmente, e isto explicaria a transição de
uma Floresta Densa para uma Floresta Semi-Descídua e depois uma savana. Entre-
tanto, como ex-
plicar a existên-
cia de manchas
de savana den-
tro da Amazô-
nia. Para alguns
autores, estas
manchas são
um resquício de
épocas mais
secas do pas-
sado.
Entretanto, pode
se questionar se
o tempo neces-
sário para o re-
torno à vegeta-
ção de Floresta Densa não está longo demais. Uma capoeira pode se transformar
em uma floresta muito semelhante a uma floresta primária em uma centena de anos,
e a última glaciação já passou há muitos séculos. Provavelmente há fatores que es-
tão contribuindo para a permanência deste tipo de vegetação nos locais onde elas
se encontram.
Em alguns casos, como no caso da Savana de Roraima, podemos dizer que se trata
de uma área externa ao Bioma da Floresta Tropical Úmida. Entretanto, em Alter-do-
Chão, próximo de Santarém no Pará, há algumas manchas de savanas rodeadas
por florestas. Estas manchas não parecem estar retrocedendo. O clima ai tem uma
estação seca relativamente longa, mas as florestas ao redor mostram que a seca
não é suficiente longa para impedir o estabelecimento de árvores. A resposta está
no solo. Nesta área, onde há solo arenoso encontramos cerrado, onde há solo argi-
loso encontramos florestas. Aparentemente, o solo arenoso, por não reter bem a
água, tem um efeito semelhante a uma ampliação da época seca, impedindo o re-
torno da floresta.
45
7. ECOSSISTEMAS PERIODICAMENTE INUNDÁVEIS
A várzea.
O termo várzea refere-se a um terreno baixo mais ou menos plano que se en-
contra junto às margens de rios. Na Amazônia, este termo ganha um significa-
do especial, pois, dadas as dimensões dos rios e a altura a que sobem as á-
guas com as enchentes, formam-se imensas áreas de várzea, de até 100 km de lar-
gura. E estas regiões planas enormes se formam pela deposição de sedimentos car-
regados por rios de água branca. Portanto, na Amazônia, "várzea" é um termo que
se restringe às regiões inundadas por rios de água branca.
Como vimos nas aulas de hidrologia, o entorno dos rios de água branca é muito
mais complexo do que o entorno de rios de água preta ou clara. Nestes últimos, ba-
sicamente temos um rio e suas margens, eventualmente encontramos conjuntos de
ilhas, e os lagos são relativamente pouco comuns. Na várzea, os sedimentos trazi-
dos pela água moldam uma planície cheia de lagos de tipos diversos, "paranás", "fu-
ros", e ilhas, além do fato que as margens e ilhas estão em um processo dinâmico
de queda e reconstrução.
46
Com a enchente, as águas do rio invadem lagos, locais com vegetação baixa e até
florestas. A correnteza do rio vai variar, e ele receberá maior carga de sedimentos
das margens em certas épocas do ano que em outras. Entretanto, comparado às
áreas inundáveis, As mudanças no rio em si são muito menores do que nos ecossis-
temas que ele inunda, pois continua sendo basicamente um canal de água barrenta
com certa correnteza.
Por outro lado, a fauna do rio muda. Há períodos (curtos) em que a pesca no rio é
farta e períodos (longos) em que é
mais difícil pescar. Para ilustrar as
mudanças na fauna, vamos falar
de peixes, mas isto vale também
para outros animais. A fauna en-
contrada nos rios muda ao longo
do ano principalmente devido às
mudanças dramáticas que ocorrem
nas áreas inundadas. Para a maio-
ria das espécies de peixes, os la-
gos são ambientes muito mais fa-
voráveis do que os turvos rios de
água branca. Lá existe mais ali- Rio Solimões em um período intermediário
mento e proteção, e eles não tem entre os picos da cheia e da vazante.
de lutar muito contra a correnteza
para se deslocar. Entretanto, quando as águas baixam, diminui a quantidade de ali-
mento, os predadores se concentram, e o lago pode até secar, de forma que muitas
espécies abandonam os lagos. Outra razão para abandonar os lagos é a dispersão,
e o conseqüente aumento da mistura genética, que é algo favorável para cada es-
pécie. Portanto, o rio é apenas uma es-
trada para a maioria dos peixes da vár-
zea.
Os sedimentos carregados pelos rios de água branca são ricos em nutrientes mine-
rais. Entretanto, a produtividade de rios de água branca em si é baixa, pois a luz do
sol não consegue penetrar na água barrenta, de forma que a fotossíntese é quase
nula. Por outro lado, nos lagos os sedimentos vão para o fundo, permitindo a pene-
47
tração da luz do sol, e os nutrientes ficam na água, de forma que ocorre bastante
fotossíntese por algas. Além disto, há muita entrada de nutrientes da decomposição
de matéria orgânica das margens, tanto do capim como da floresta. Na várzea há
um intenso desenvolvimento de plantas aquáticas, como a Vitória Amazônica, agua-
pés, e alguns tipos de capim adaptados à enchente. Parte desta flora serve de ali-
mento para alguns animais, como o peixe-boi, e também enriquece o ambiente com
matéria orgânica quando se decompõe. A floresta inundável contribui com a decom-
posição de galhos, folhas e flores e com o importante aporte de frutos.
Nas áreas que secam na época da vazante, geralmente desenvolve-se uma vegeta-
ção terrestre. O que encontramos depende muito da topografia. As áreas mais bai-
xas que secam ficam sob a água mais tempo, e em alguns lugares encontramos a-
penas o capim flutuante que morre com a seca. Em áreas mais altas, que ficam pou-
cos meses sob a água, encon-
tramos grandes árvores. Em
posições intermediárias encon-
tramos diferentes vegetações
mais baixas e abertas que re-
sistem à inundação, ou que bro-
tam na época mais seca e re-
produzem-se antes da chegada
das águas. As árvores não re-
sistem a longos períodos de
inundação porque o solo en-
charcado perde o oxigênio ne-
cessário ao metabolismo das
raízes. Paradoxalmente, em
solo encharcado as árvores so- Vegetação crescendo em área de várzea que fi-
frem de falta de água, pois suas cou sob a água .
raízes estão incapazes de ab-
sorvê-la. Muitas árvores da várzea perdem suas folhas durante a enchente. Possi-
velmente perdem as folhas devido à falta de água (sofrendo com a "seca" fisiológi-
ca), ou como forma de economizar água, pois reduzem a superfície de transpiração
("prevenindo-se" contra ela).
Na vazante, muitos peixes e outros animais aquáticos ficam presos em lagos tempo-
rários e tornam-se alimento para jacarés e ariranhas, predadores da terra firme, co-
mo as onças, e para aves, como gaivotas, garças e mergulhões, ou simplesmente
morrem pela falta da água, tornando-se alimento para carniceiros, como os urubus e
os lagartos teiú. Esta fase também atrai herbívoros terrestres ou semi aquáticos,
como veados e capivaras, que se alimentam da vegetação que está brotando. É por
isto que as espécies que vivem na várzea têm seus ciclos fortemente relacionados
com a variação no nível das águas.
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Outro fenômeno importante que ocorre na Amazônia, especialmente em áreas mais
ao sul, como em Rondônia e Mato
Grosso, é a ocasional mortandade de
peixes devido à friagem. A friagem ocor-
re entre maio e julho, quando uma frente
fria vinda do sul atinge a Amazônia. Os
lagos tem uma estratificação térmica,
isto é, são mais quentes na superfície
do que no fundo. Isto faz com que a á-
gua da superfície não se misture com a
água do fundo. No fundo do lago há
muita matéria em decomposição que é
Peixes mortos devido à friagem. tóxica para a maioria dos peixes. Quan-
do vem uma friagem a superfície esfria e
a água do fundo se mistura com a da
superfície.
O Igapó
Igapó é um termo de origem tupi que significa mata inundada. O termo é aplicado
por alguns para indicar qualquer floresta inundável por grandes rios na Amazônia.
Entretanto, especialmente no que se refere a nutrientes disponíveis no solo, a condi-
ção é muito diferente se a mata for
inundável por água branca ou por
água preta. Por isto, na literatura
científica biológica, o termo igapó
geralmente se restringe apenas às
florestas inundáveis por água pre-
ta ou por água clara. Esta é a ter-
minologia que usaremos nesta
apostila. Na verdade, não vamos
falar apenas do Igapó, mas de
todo o ecossistema de água preta,
que inclui rios e lagos.
O efeito da riqueza do solo é que as matas de várzea são muito mais produtivas que
as de igapó. As árvores da várzea crescem muito mais rápido e produzem muito
mais frutos. Várias árvores de várzea se descartam de suas folhas com a enchente,
de forma a evitar os efeitos da seca fisiológica (ver apostila anterior). Quando volta o
período de vazante, suas folhas crescem novamente, pois não faltam nutrientes para
isto. As árvores do Igapó demoram muito mais a crescer, produzem menor quanti-
dade de frutos (ou passam maiores intervalos de anos entre produções de frutos), e
raramente se descartam de folhas para reduzir a perda de água, pois a reposição de
folhas é difícil em solos pobres. Outra diferença está no tamanho de sementes. Em-
bora a luz costume ser o principal fator limitante para plântulas em uma floresta, a
falta extrema de nutriente pode tornar-se limitante, e encontramos sementes despro-
porcionalmente grandes em várias espécies de árvores do igapó, de forma a garantir
nutrientes na fase inicial de crescimento. Entretanto, apesar da diferença na riqueza
do solo, na produtividade, e no tempo de crescimento necessário para as árvores
chegarem à maturidade, o resultado final é praticamente o mesmo: uma floresta e-
xuberante resistente às enchentes.
51
Esta diferença de produtividade tem conseqüências sobre os organismos do ecos-
sistema. A principal delas é que há menos matéria disponível no ecossistema para
os animais se alimentarem. Como conseqüência, o igapó é muito mais pobre em
quantidade de animais (peixes, jacarés, macacos, aves, etc). A população humana
que vive ao seu redor também é escassa. Algumas pessoas chamam os rios de á-
gua preta de rios da fome. (É verdade que a abundância de alimentos é muito menor
ai, mas este termo é um pouco exagerado.)
52
Questões sobre Biomas e Ecossistemas Amazônicos
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