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Revista trimestral | n.

º 80 Janeiro/Março 2010 | e 3,00 (Isento de IVA)

Dossier Entrevista
José Morais
Educação para e a aprendizagem
o Desenvolvimento da leitura e da escrita
Sustentável
Alunos com multideficiência Unidades de Ensino Estruturado ALUNOS CEGOS
e com surdocegueira congénita para Alunos com Perturbações e com BAIXA VISÃO
do Espectro do Autismo Orientações Curriculares
Organização da resposta educativa
Normas Orientadoras

Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular


Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular

EDUCAÇÃO BILINGUE DE ALUNOS SURDOS

Manual de Apoio à Prática


Sumário
Ficha Técnica

Directora
Maria Emília Brederode Santos
05 Editorial
Editora O TERCEIRO D
Teresa Fonseca
Produtor Maria Emília Brederode Santos
Rui Seguro
Redacção
Elsa de Barros, Helena Skapinakis 06 Notícias... entre nós
Secretariado de redacção
Carla Delfino
09 Notícias... além fronteiras
Colaboradores permanentes
Carlos Batalha, Teresa Gaspar
Colaboram neste número 10 Diário de um professor
Adelaide Borges, Ana Paiva, Dora Pacheco, Susana Dolores
Eunice Peixoto, João Paulo, Manuel Carvalho Gomes,
Manuel Pedroso, Maria Alexandra Forte, O contacto com a realidade que encontrou
Mariana Hancock, Patrícia Ramalho,
na Comissão de Protecção de Crianças e
Pedro Miguel Dias, Sérgio Nogueira,
Susana Dolores, Viriato Soromenho-Marques Jovens (CPCJ) de Grândola transformou
Revisão
António Simões do Paço (Edições Pluma) a visão que esta professora
Fotografia de Língua Portuguesa tinha
Jorge Padeiro, Ana Maria Bettencourt
Ilustração e capa da escola.
Dinis Mota
Destacável
Célia Martins, Elisa Travessa, Ilusinda Logrado,
Isabel Preto e Julieta Mendes
Projecto gráfico
14 Lá fora
Entusiasmo Media/White Rabbit Cooperação europeia em educação
Paginação
Atelier Gráficos à Lapa e formação: o Quadro Estratégico para 2020
Rua S. Domingos à Lapa, n.º 6 Teresa Gaspar
1200-835 Lisboa
Impressão Neste artigo, dá-se conta dos objectivos
Editorial do Ministério da Educação
Estrada de Mem Martins, n.º 4 – S. Carlos
e resultados alcançados com o
Apartado 113 – 2726-901 Mem Martins programa de trabalho Educação
Distribuição
CTT – Correios e Formação 2010 e apresenta-se
Rua de São José, n.º 10 o Quadro Estratégico para a
1166-001 LISBOA
Tiragem Educação e Formação 2020.
13 500
Periodicidade
Trimestral
Depósito legal
N.º 41105/90 18 Entrevista a José Morais
ISSN Níveis de referência para melhorar
a aprendizagem da leitura e da escrita
0871-6714
Propriedade
Direcção-Geral de Inovação
e de Desenvolvimento Curricular Elsa de Barros
Av. 24 de Julho, n.º 140 José Morais, coordenador do estudo sobre os níveis de
1399-025 Lisboa
Preço referência de desenvolvimento da leitura e da escrita,
e 3 (Isento de IVA) fala sobre os principais objectivos deste estudo,
como está a decorrer no terreno e qual o
Isento de registo ao abrigo do Decreto
Regulamentar 8/99 de 9/6 antigo 12.º, n.º 1B impacto esperado no sistema educativo.
As opiniões expressas nesta publicação
são da responsabilidade dos autores e não
reflectem necessariamente a orientação
do Ministério da Educação.
24 Dossier
Educação para o
Revista Noesis
Desenvolvimento Sustentável
Redacção Como se pode educar para o desenvolvimento sustentável?
Av. 5 de Outubro n.º 107 – 8.º
Neste dossier reflecte-se sobre as implicações deste conceito e
1069-018 Lisboa
Telefone 217 811 666 mostram-se respostas de algumas escolas a este desafio.
Fax 217 811 863
revistanoesis@sg.min-edu.pt
04 05 Sumário

54 Reflexão e acção
Como usar canções na aula de línguas
Pedro Miguel Dias
A música pode marcar presença
em diferentes momentos de uma
aula de línguas, através do recurso
a materiais autênticos, essenciais
para transmitir uma língua viva.

60 Meios e materiais

62 Visita de estudo
Visitar os três porquinhos…
no Museu do Trabalho Michel Giacometti
Elsa de Barros
O Museu do Trabalho Michel Giacometti desafia
os visitantes mais novos a viverem a história
de “Os três porquinhos”, percorrendo os diferentes
núcleos do museu.

66 Com olhos de ver


A moda, os modos, de modo que…
Adelaide Borges
A imagem de um modelo masculino num desfile serve de ponto
de partida para uma reflexão sobre a forma como a moda
comunica, numa linguagem não verbal, o estilo, a identidade
psicológica e social do indivíduo que a veste.

Destacável
À descoberta da I República
Célia Martins, Elisa Travessa, Ilusinda Logrado,
Isabel Preto e Julieta Mendes
Apresenta um conjunto de actividades
destinadas a alunos dos 2.º e 3.º ciclos do
ensino básico, que poderão ser desenvolvidas
pelos docentes de diferentes áreas curriculares
no âmbito das comemorações do Centenário da
Implantação da República Portuguesa.
Editorial

O TERCEIRO D

“Desenvolver” era o “terceiro D” do programa do 25 de Abril de 1974


e nele tem Portugal estado quase desesperadamente empenhado
desde então.
Mas o “desenvolvimento” com que nessa altura se sonhava foi
sofrendo alterações. Demo-nos conta de que o desenvolvimento
económico era necessário para que houvesse um desenvolvimento
cultural, educativo e da qualidade de vida da sociedade, mas que
também só era possível se houvesse esse outro desenvolvimento
mais qualitativo e centrado nas pessoas.
Por outro lado, mundialmente, questionava-se o modelo de
desenvolvimento económico assente no crescimento do consumo
de energia e recursos naturais. As imagens transmitidas pelos
satélites vieram dar uma consciência global da fragilidade do nosso
planeta. E os países já desenvolvidos questionavam o crescimento
dos outros, dos que estavam, como então se dizia, “em vias de
desenvolvimento”. Estes insurgiam-se: “Gastaram os vossos recursos
e agora não querem que usemos os nossos?!”
O conceito de “desenvolvimento sustentável” parece conseguir
ultrapassar estas contradições e harmonizar o desenvolvimento
económico e a conservação ambiental, o crescimento económico e
o desenvolvimento social, cultural, educativo, o global e o local, a
acção a nível da ONU, dos países e dos indivíduos.
Ora se há aprendizagem em que a escola se envolveu foi na
educação ambiental. Creio que mesmo os críticos mais críticos da
escola reconhecerão que, nas últimas décadas, a escola, sobretudo
do 1.º ciclo, promoveu aprendizagens neste domínio que, aliás,
através das crianças chegaram também a muitos adultos.
A tomada de consciência de que os recursos naturais são finitos,
que o ambiente é um bem a preservar e que todos devemos
contribuir através dos novos “3 R” (Reduzir, Reutilizar e Reciclar)
foi uma mensagem que “passou” bem na escola. Era simples, clara e
racional. Os professores compreenderam-na e foram sensíveis à sua
necessidade. Houve um envolvimento e produção de materiais quer
do Estado quer de ONG empenhadas e activas.
Trata-se agora de dar mais um passo. De combinarmos esta
educação para a protecção do ambiente com as competências
necessárias ao desenvolvimento (o empreendedorismo, a
criatividade e a capacidade de inovar, correr riscos e
tomar decisões ...); a consciência individual com o
conhecimento mundial; a capacitação da
criança a nível local com a
sua capacitação como
“cidadã do Mundo”.

Maria Emília Brederode Santos


06 07 Notícias... entre nós

A Europa dos Resultados


Um dia para Todos - Descobre a Tua Europa
Campanha Global pela Educação convida os professores a participarem na “Sema–na de As duas publicações
Acção” que decorrerá entre 19 e 25 de Abril. “Descobre a Tua Eu-
A organização disponibiliza um caderno de actividades que têm como objectivo ajudar a ropa”, realizadas no
reflexão sobre desigualdades no acesso à educação e sobre o papel fundamental da edu- âmbito do projecto A
cação no desenvolvimento humano, social, político, económico e cultural. :: Europa dos Resulta-
Poderá encontrar mais informação em: www.educacaoparatodos.org dos, uma dirigida a
Mariana Hancock alunos do ensino se-
Campanha Global pela Educação cundário dos cursos
científico-humanís-
ticos e profissionais,
Projecto Já Sei Ler
e outra aos respec-
O projecto, promovido pelo Plano Nacional de Leitura, pretende incentivar a leitura em
tivos professores,
família, através da interacção entre a escola e as famílias dos alunos do 1.º ciclo do ensino
estão disponíveis
básico, disponibilizando materiais e sugestões de actividades.
em formato digital e vão ser distribuídas gratui-
O projecto privilegiará o empréstimo domiciliário de livros da biblioteca escolar adequa-
tamente, a nível nacional, em formato impresso.
dos para a leitura em família, e pode ser realizado a par da troca de livros entre alunos,
Produzidas pela Setepés – Projectos Artísticos
recorrendo à utilização de uma mochila para levar livros para casa, de forma rotativa,
e Culturais, as publicações abordam aspectos
enquanto estratégia de diversificação da leitura. ::
relacionados com os resultados que a União
Para mais informações, consultar www.planonacionaldeleitura.gov.pt
Europeia tem vindo a alcançar ao longo dos
EB
anos, os deveres e os direitos decorrentes da
cidadania europeia e, ainda, o ensino na União
Europeia, entre outros.
Jornais e revistas no Portal das Escolas
O projecto A Europa dos Resultados, promovido
O Portal das Escolas disponibiliza jornais e revistas uma área de jornais e revistas direc-
pela Representação da Comissão Europeia em
cionada a professores registados para ser utilizada em contexto pedagógico.
Portugal, foi desenvolvido em parceria com o
Esta área consiste num arquivo documental histórico, desde 1910, facilmente pesquisáv-
Centro de Informação Europeia Jacques Delors
el, da imprensa escrita, que disponibilizará progressivamente um total de um milhão e
e com a Direcção-Geral dos Assun­tos Eu-
duzentas mil páginas de jornais e revistas do Grupo Impresa, alguns títulos já extintos
ropeus, do Ministério dos Negócios Estrangei-
e outros ainda em circulação, como A Capital, História, O Jornal, Sete, Expresso, Jornal
ros. ::
de Letras e Visão.::
Para mais informações, consultar
Para mais informações, consultar www.portaldasescolas.pt
EB
www.rbe.min-edu.pt
EB

Alterações na educação especial


A Direcção-Geral de Ino­va­ção e de Desenvolvimento Cur­ricular divulga a publi­cação Educação Inclusiva – Da retórica à prática, na qual
descreve as alterações introduzidas, entre 2005 e 2009, na educação especial, tes­te­munhando o trabalho realizado junto das escolas, dos
professores e dos alunos com necessidades educativas especiais.
Para atingir o objectivo de assegurar a to­dos os alunos com necessidades edu­­ca­­­tivas especiais as melho­­res condições para aprendizagens
de qua­li­dade numa esco­­la inclusiva, foram toma­das diver­sas medi­das, nomeadamente a criação de um grupo de
recrutamento de docentes específico para a educação especial e de uma rede de escolas e de agrupamentos de
referência, nos quais existem uni­da­des de apoio espe­cia­lizado, des­tina­das às dife­rentes pro­ble­má­ti­cas.
A implantação de uma rede de Centros de Recursos para a Inclusão e a utilização da Classificação Inter­­nacional
de Funcionalidade, Incapacidade e Saú­de – versão crianças e jovens (CIF - CJ) para a iden­ti­fi­cação dos alunos que
necessitam dos apoios espe­cializados são outras medidas adoptadas neste âmbito. ::
Para mais informações, consultar www.dgidc.min-edu.pt
EB
Educação em números
O número de alunos, de professores
e de pessoal não docente registou um
aumento entre 2006/2007 e 2007/2008,
de acordo com a publicação Educação
em Números – Portugal 2009, divulgada
pelo Gabinete de Estatística e Planea-
mento da Educação.
No referido período, o número de alunos Na pista da República
aumentou de 1 670 763 para 1 701 482, en- A Hemeroteca Municipal de Lisboa organiza percursos temáticos relacionados com
quanto o de professores subiu de 161 090 as comemorações do Centenário da República, ao longo dos quais procura dar a con-
para 163 938. No que se refere ao pessoal hecer os acontecimentos históricos nos locais da cidade de Lisboa onde ocorreram.
não docente, o número cresceu de 75 966 O Roteiro Patrimonial “Associativismo, Educação e Habitação” inclui uma visita aos
para 76 009. centros republicanos, associações e escolas criadas durante a I República, com
É de salientar a descida da taxa de reten­ uma referência às universidades e bairros mais importantes edificados durante este
ção e de desistência nos ensinos básico período, finalizando-se o percurso com uma visita guiada à exposição Lisboa Repub-
e secundário, respectivamente, de 10% licana, patente na Galeria dos Paços do Concelho, até 31 de Março de 2010. ::
para 7,7%, e de 24,6% para 20,6%. Este Para mais informações, consultar www.cm-lisboa.pt
EB
facto repercutiu-se no número de alu-
nos que em Portugal concluíram os
ensi­nos básico e secundário, em termos Afinal há “desenrascanço” estudantil!
globais, verificando-se um crescimento O Gabinete do Desenrascanço Estudantil, em São Miguel de Machede, em Évora, promove
de 192 496 para 214 715. o sucesso escolar dos alunos da zona de uma forma inovadora e surpreendente: até à data,
A diversificação da oferta educativa e todos os jovens que têm frequentado o Gabinete do Desenrascanço têm tido sucesso escolar.
formativa no 3.º  ciclo do ensino básico O projecto está enquadrado no Programa de Bolsas de Estudo Flamiana Salgueiro e surge
e no ensino secundário teve impacto no em 2000, por iniciativa da Suão/Escola Comunitária de São Miguel de Machede, baseado
número de docentes, que registou uma no modelo de aprendizagem PADéCA (Programa de Auxílio ao Desenvolvimento da Ca-
subida de 82 415 para 83 794 nestes dois pacidade de Aprender) de Jean Berbaum. Assenta nos conceitos de «mentorado» (apoio
níveis de ensino. :: de estudantes a estudantes) e de mediação (contacto intermediado entre as famílias e
Para mais informações, consultar as escolas) e é gratuito para os participantes. No entanto, não abdica de algumas con-
www.gepe.min-edu.pt trapartidas de natureza comunitária e intergeracional, uma vez que os jovens retribuem
EB
o apoio, organizando actividades destinadas a toda a comunidade, como, por exemplo, o
projecto comunitário Brigada Assinatura, que consistiu na promoção da aprendizagem
da assinatura por parte dos idosos analfabetos. O Instituto Português da Juventude e a
Segurança Social são parceiros deste projecto. ::
Dora Pacheco e Patrícia Ramalho
Suão – Associação para o Desenvolvimento Comunitário

Regime de Fruta Escolar


O Regime de Fruta Escolar, instituído no âmbito da União Europeia, consiste na
distribuição de uma peça de fruta, pelo menos duas vezes por semana, aos alunos
do 1.º ciclo do ensino básico das escolas públicas.
Os estabelecimentos de ensino podem apresentar às
respectivas direcções regionais de educação propostas de
medidas de acompanhamento, entre as quais se contam
a organização de visitas a quintas, mercados e centrais
hortofrutícolas e o fornecimento de sacos de sementes
destinadas à realização de sementeiras. ::
Para mais informação, consultar www.dgidc.min-edu.pt.
EB
08 09 Notícias... entre nós

A escola, jardineira da sua terra

Roteiro para mudar o Mundo


A Academia Metropolitana da Sustentabilidade,
recen­temente criada, tem como objectivo proporcio-
nar aos cidadãos da área metropolitana do Porto, de
todas as idades, um roteiro de formação prática para O projecto Ajardinamento/Espaços verdes/Horta Biológica mostra aos alunos da
mudar o Mundo, através da sensibilização de embai­ Escola EB 2,3 Teixeira Lopes, em Vila Nova de Gaia, que há dez anõezinhos em
xa­dores da sustentabilidade. cada um deles que os ajudam a etiquetar árvores ou a cuidar da horta biológica ou
  As alterações climáticas são o grande desafio até a fazer a compostagem com restos de frutos e hortaliças que trazem de casa.
do século XXI e uma oportunidade para promover Respondendo a uma necessidade real, os professores que participam no projecto
mudan­ças sociais e económicas. Como é que estas distribuíram por várias turmas diferentes tarefas e envolveram a comunidade na
alterações nos vão afectar? O que podemos fazer, em resolução de um problema: como preservar os espaços amplos da escola, que
casa e nos locais de estudo e trabalho, no dia-a-dia, perten­cem a todos, promovendo ao mesmo tempo a qualidade ambiental e a saúde
para tornar o Mundo um lugar mais ecológico? e contribuindo para formar cidadãos respeitadores do ambiente, que se preocupem
No sentido de dar resposta a estas e em identificar práticas que colocam em risco a sustentabilidade do Planeta.
outras questões, algumas das O projecto é desenvolvido em parceria com a Câmara. A escola pertence ao grupo
acti­vi­dades previstas no rotei- das eco-escolas e os alunos participam de diferentes formas: desde construir
ro de formação da Academia compostores de madeira, para os consciencializar da importância do equilíbrio
Metro­po­litana da Sustentabili- e da diversidade do ecossistema agrícola, até realizar visitas de estudo a ater­
dade incluem uma visita à Casa ros sanitários para perceberem a transformação por que passa o lixo e o
Solar (arquitectura bioclimática que acontece quando este não é tratado. ::
e painéis solares), produção de Eunice Peixoto
Escola EB 2/3 Teixeira Lopes
biodiesel, cons­trução de fornos so-
lares, test drive de veículos eléctricos
e planta­ção de árvores, para compen- Participação de escolas nos Dias da Música 2010
sação de emissões. A edição de 2010 dos Dias da Música, destinada às escolas do ensino
A Academia Metropolitana da Sustentabilidade artístico especializado da música, públicas, do ensino particular e cooperativo e
é uma iniciativa do Centro Regional de Excelência em profissionais, tem lugar nos dias 23, 24 e 25 de Abril, no Centro Cultural de Belém.
Educação para o Desenvolvimento Sustentável da Consagrada ao tema “A Música e as Paixões da Alma”, esta iniciativa pretende
Área Metropolitana do Porto (CRE_PORTO), reconhe­ apresentar em concerto as candidaturas seleccionadas, no âmbito do evento
cido pela Universidade das Nações Unidas, pro- Escolas em Palco nos Dias da Música, cujo tema será “A Peça Favorita”. 
movido, nomeadamente, pela Universidade Católica As escolas podem apresentar propostas de candidatura a uma ou a duas das
Portuguesa, pela Área Metropolitana do Porto e pela seguintes modalidades de participação: composição, sempre no âmbito da música
Direcção Regional de Educação do Norte. :: erudita, e execução de obras de qualquer compositor, de qualquer período da
Para mais informações, consultar consultar história da música erudita. ::
www.creporto.blogspot.com Para mais informações, consultar www.anq.gov.pt
EB EB

O futuro do brincar das crianças


O International Council Children’s Play (ICCP) vai realizar a 25.ª conferência, intitulada Children’s Play:
New Goals for the Future, em Lisboa, entre 17 e 19 de Junho.
A conferência será organizada pela Faculdade de Motricidade Humana e procurar-se-á que o debate de todos os interessados nesta questão
contribua para a definição de novos objectivos e orientações para o futuro do brincar e ajude a prevenir o declínio deste direito de todas as
crianças. Será por isso um momento para se discutir a evolução do brincar e das brincadeiras das crianças, partilhando-se experiências sobre
métodos, projectos e investigações.
Na conferência irão abordar-se os princípios básicos do brincar, para além de se relacionar esta actividade com os seguintes temas: literacia,
design, actividade física, novas tecnologias, recreio, brinquedos, segurança, cidade, aprendizagem, violência, futuro. ::
Para mais informações, consultar o sítio do ICCP: www.fmh.utl.pt/25iccp/
HS
Notícias... além fronteiras

Festival de Verão
Coros, orquestras e bandas de crianças e jovens estão convidados
a participar no II Festival Internacional de Música da Juventude
que vai decorrer na cidade de Bratislava entre 8 e 11 de Julho. Os
concorrentes deverão inscrever-se até ao dia 15 de Abril. ::
Para mais informações consultar
http://www.choral-music.sk/en/festival/detail/5
Presença portuguesa em Havana HS

Sérgio Nogueira e António Costa Valente repre­sen­


taram Portugal no Forum El Universo Audiovisual
del Niño Latinoamericano, que decorreu em Havana As crianças da encruzilhada
entre os dias 7 e 12 de Dezembro. O direito à educação de uma geração de
O Fórum está integrado no Festival de Cinema Lati­ crianças dos países mais pobres poderá
no-Americano de Havana e constitui um espaço de estar ameaçado como consequência da crise
reflexão e de debate sobre as questões actuais da financeira, alerta o relatório de 2010 “Reaching
educação para os media no contexto latino-americano, the marginalized”, da Education for All (EFA).
contando com a participação de delegados oriundos O relatório vem mostrar que a pressão da crise
da América Latina e da Europa. Os dois portugueses nos orçamentos dedicados à educação já está a ter consequências: 72
estiveram presentes por convite da organização, pelo milhões de crianças ainda são privadas do seu direito à educação por
seu reconhecido percurso nesta área: Sérgio Nogueira terem nascido numa região ou numa família desfavorecida.
é docente da Escola EB 2,3 Dr. João de Barros e autor Parte do desafio de responder à marginalização passa pela diversidade
do software didáctico de animação ANIMATROPE e de situações que abrange e pela especificidade de respostas que
António Costa Valente é docente da Universidade de pede, mas é necessária uma abordagem mais ampla, que contemple
Aveiro, director do Cineclube de Avanca e um dos a inclusão social e a redução da pobreza. Caminhos apontados passam
realizadores e produtor da primeira longa-metragem por programas de protecção social, de intervenção precoce e de
de animação portuguesa Até ao Tecto do Mundo. saúde materna, ou medidas como abolir as propinas das escolas e
Os dois profissionais portugueses aproveitaram tam­ garantir o acesso ao material escolar, construir escolas mais perto de
bém a sua estada para conhecer o actual panorama comunidades isoladas ou melhorar a formação dos professores.
cinematográfico cubano ao nível do ensino e da pro­ No prefácio do relatório, a directora-geral da UNESCO, Irina Bokova,
du­­ção e para realizar um workshop de animação alertou para o facto de estarmos numa encruzilhada e para que a crise que
com crianças de uma escola primária com o software se vive poder constituir uma oportunidade única para se desenvolverem
ANIMATROPE. :: sistemas educativos efectivamente capazes de promover a integração,
Sérgio Nogueira pondo fim a todas as formas de marginalização. ::
Escola EB 2, 3 Dr. João de Barros HS

O Facebook nos exames!


Alunos dinamarqueses do ensino secundário realizam exames de final de ano com recurso à Internet,
seguindo um novo sistema de exames que está a ser testado em catorze escolas piloto.
Durante o exame, os alunos podem aceder a qualquer sítio que considerem pertinente para a realização
da prova e pretende-se que sejam capazes de navegar até à informação necessária para desenvolver as
questões do enunciado. De acordo com o Ministério da Educação dinamarquês, os exames devem ser um
reflexo da rotina dentro da sala de aula e a rotina dentro da sala de aula deve ser um reflexo do que se
passa fora da escola. E, neste momento, o uso da internet na vida quotidiana é inegável e incontornável.
Por isso, o Ministério gostaria de alargar este novo sistema de exames a todas as escolas do país em 2011.
A questão de os alunos poderem mais facilmente copiar é encarada de forma muito pragmática.
É proibido enviar mensagens online durante a realização do exame e os professores confiam na
integridade dos alunos, considerando que as consequências são suficientemente dissuasoras. ::
HS
10 11 Diário de um professor

Diário de
Susana Dolores
Professora de Língua Portuguesa na Escola EB 2,3 D. Jorge de Lencastre,
Susana Dolores respondeu ao desafio que lhe foi lançado para ter um pé
na escola e outro na Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ)
de Grândola. O contacto com esta realidade paralela ao mundo da escola
deu-lhe um outro olhar sobre os alunos e transformou grandes problemas
a nível escolar em pequenos problemas comparados com a realidade com
a qual se deparou.

Sexta-feira 24 de Julho
Uma proposta surpreendente
Último dia de trabalho antes do início das férias. Ano lectivo encerrado,
relatórios entregues, papéis arrumados, pensamentos virados para o
descanso que se aproxima… E de repente, uma proposta perfeitamente
inesperada por parte da Direcção do Agrupamento – ser a representante
do Ministério da Educação na Comissão de Protecção de Crianças e
Jovens (CPCJ) de Grândola. Socorro! O que é que eu faço? Na minha
cabeça, o ano lectivo seguinte já estava mais ou menos definido: tinha
sido seleccionada, juntamente com a coordenadora do Departamento
de Línguas, para a implementação na escola dos Novos Programas de
Português, o que implicaria uma redução no número de horas lectivas,
mas iria, obviamente, dar continuidade às turmas que leccionara no
ano anterior. E agora? Aceitar o cargo na CPCJ implica ter apenas
meio horário na escola, isto é, uma única turma. Por outro lado,
não aceitar significa dizer não a um novo desafio, com sérias
probabilidades de vir a arrepender-me mais tarde. E achava eu
que ia ter umas férias tranquilas… Socorro!
Terça-feira 1 de Setembro
Um ano diferente
Início de mais um ano lectivo. Dei por mim a pensar numa
professora da faculdade (confesso que já não me lembro do
nome) que uma vez nos disse que pertencia ao grupo, cada vez
mais reduzido, de “parvos” que estão no ensino por gosto. A
verdade é que eu, quase duas décadas depois, ainda continuo
a incluir-me nesse grupo. E é por isso que, neste início de ano
lectivo, não consigo deixar de me sentir um pouco apreensiva.
Aceitei a proposta da Direcção e vou dividir o horário entre
a CPCJ e a escola. Ou seja, eu, que sempre fui professora a
tempo inteiro, vou agora ser professora apenas a meio tempo. É
muito estranho! Mas, por outro lado, ter apenas uma turma vai
permitir-me ter mais disponibilidade para preparar materiais
e actividades e, claro, para corrigir as resmas de trabalhos que
costumo pedir aos alunos. Decididamente, este vai ser um ano
diferente!

Terça-feira 15 de Setembro
O reencontro com os meus meninos
14h55. Primeira aula de Língua Portuguesa com o 9.º A, turma que acompanhei, como professora e
directora de turma, ao longo de todo o terceiro ciclo e que tem, neste ano lectivo, apenas uma cara nova, o
Diogo.
Confesso que este é para mim o momento mais aguardado dos três anos. Por um lado, vamos trabalhar
Camões e Gil Vicente, o que me agrada sempre bastante. Por outro, iniciar as actividades, depois de
dois anos de trabalho conjunto, é bem mais fácil: as apresentações estão feitas, as regras definidas, a
metodologia de trabalho já não é segredo para ninguém. Portanto, “mãos à obra e vamos começar a
trabalhar que o 9.º ano espera por nós!” Resposta imediata: “Trabalhar?! Já na primeira aula?!” Era
inevitável. Afinal, há coisas que nunca mudam…

Quinta-feira 17 de Setembro
Um outro olhar
Início do trabalho na CPCJ. Reunião da Comissão
Restrita.
Primeiro contacto com alguns dos casos
acompanhados pela Comissão. Aqueles jovens que
eu, enquanto professora, estava habituada a ver, até
aqui, apenas como alunos aparecem agora como
elementos de agregados familiares, muitas vezes
extremamente complexos, com vivências bem pouco
adequadas à sua condição de jovens. E a partir daí,
olhamos para eles numa perspectiva completamente
diferente. Saber distinguir um verbo transitivo de
um verbo intransitivo torna-se um mero pormenor,
quando na nossa frente está uma criança para a qual
os maus-tratos (físicos ou psicológicos) são uma
constante.
12 13 Diário de um professor

Parece-me agora que vão ser muitos os momentos de frustração. Há situações que, por mais que nos
custe, não conseguimos alterar e outras que, por serem insustentáveis, se alteram, mas sem certezas de
melhoria. Como diz o presidente da Comissão, na escola, as nossas decisões traduzem-se em aprovações
e reprovações que podem ter repercussões na vida do aluno, mas a este nível, uma decisão interfere
mesmo, directamente, na vida da criança ou do jovem. Imagino que tenhamos de ficar contentes com as
pequeninas vitórias e aprender a viver com as desilusões.

Quarta-feira 23 de Setembro
Procuram-se ideias brilhantes
8h30. Aula de Formação Cívica. Há que dar continuidade ao projecto/concurso promovido pelo Instituto
Nacional para a Reabilitação, “Escola Alerta – acessibilidade a todos”.
No ano lectivo 2006/2007, alguns alunos da turma já haviam participado neste projecto, tendo feito
o levantamento, na escola e na comunidade, de algumas barreiras arquitectónicas que impediam ou
dificultavam o acesso a pessoas com incapacidade física. No ano lectivo anterior, quando os desafiei para
uma nova participação, surpreenderam-me com uma sugestão inovadora: encarar a questão da igualdade
de oportunidades numa perspectiva completamente diferente, focando o trabalho num dos alunos da
turma portador de síndroma de Asperger. Ainda tentei alertá-los para as dificuldades de um projecto
deste género, mas confesso que me deixei contagiar pelo entusiasmo de alguns alunos. O problema é que
nem sempre o entusiasmo vem acompanhado de ideias brilhantes, nem da dose necessária de espírito de
iniciativa e por isso, volta e meia, lá tenho de recorrer ao sermão para tentar pôr toda a gente a trabalhar.
No entanto, independentemente do resultado final (Um livro? Uma exposição? Uma apresentação em
PowerPoint?), a reflexão que os alunos vão fazendo e a vontade de transmitir informações e vivências
justificam, na minha opinião, todos os sermões que entretanto foram necessários.

Segunda-feira 2 de Novembro
De cá para lá, de lá para cá
Estou na Comissão, mas entre atendimentos,
abertura de processos e envio de correspondência, a
minha metade de professora não consegue deixar de
pensar que já estamos a meio do primeiro período e
que amanhã é o conselho de turma intercalar do 9.º
A. Preciso de preparar a reunião. E de elaborar uma
ficha de avaliação para a competência da leitura. E
de corrigir as fichas sobre conhecimento explícito da
língua. E as de compreensão oral. E de inventar mais
frases para os exercícios de divisão e classificação
de orações. E de convocar alguns encarregados de
educação. E de continuar a leitura/análise dos Novos
Programas de Português. E de fazer as actividades
propostas pela formadora. Trabalho! Trabalho!
Trabalho!
Começo a perceber que aquela minha teoria de que,
neste ano, iria ter mais tempo para preparação e correcção de materiais era um bocadinho utópica.
Aliás, é frequente ter de correr (literalmente) da escola para as instalações da CPCJ e vice-versa. E muitos
dias, depois de ter contactado na Comissão com alguma situação mais complicada, corro para a aula,
ansiosa por ouvir os comentários (e os disparates) típicos de jovens sem outros grandes problemas para
além da “preguicite” e de alguma falta de responsabilidade.
Bloco de notas

Não deixa de ser curioso, quando ouço colegas


comentar problemas de comportamento de alguns Situações de risco
alunos, perceber que dou por mim a sorrir e a
pensar que, de facto, as nossas prioridades não
podem ser sempre as mesmas. Sofrem, por vezes,
mudanças.

Sexta-feira 18 de Dezembro
Língua Portuguesa ou…
Matemática?
O tempo voa... É tempo de avaliar o trabalho
desenvolvido. Há muito que os alunos perceberam
que fazer a auto-avaliação não é dizer a nota que
gostariam de ter. Nem sequer dizer qual a nota
que acham que merecem. A auto-avaliação é uma
tarefa demorada e para a qual precisam de uma
calculadora. Há que pegar no portefólio e, com
De acordo com a lei de protecção de crianças e jovens
base nas pilhas de trabalhos feitos, calcular as
em perigo (Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro), a criança
percentagens para cada uma das competências e
ou o jovem está em perigo quando se encontra numa
provar que a nota pretendida é merecida.
das seguintes situações:
São aulas em que há sempre braços no ar a pedir
ajuda: “Professora, falta-me a ficha sobre a divisão
• Está abandonada ou vive entregue a si própria;
de orações!”; “Professora, onde é que eu arquivo a
• Sofre maus-tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de
notícia?”; “Professora, dá-me uma percentagem de
abusos sexuais;
214% para a leitura!” Perguntas e mais perguntas!
• Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à
E ainda o aluno com síndroma de Asperger
sua idade e situação pessoal;
que, volta e meia, me trata pelo nome, e cujas
• É obrigada a actividades ou trabalhos excessivos
perguntas fogem, muita vezes, ao assunto que
ou inadequados à sua idade, dignidade e situação
estamos a tratar. O que seria de mim sem o meu
pessoal ou prejudiciais à sua formação ou
par pedagógico das sextas-feiras?
desenvolvimento;
Percorremos quilómetros para tentar “apagar
• Está sujeita, de forma directa ou indirecta, a
todos os fogos”: a ficha sobre a divisão de
comportamentos que afectem gravemente a sua
orações estava esquecida no caderno de Estudo
segurança ou o seu equilíbrio emocional;
Acompanhado, a notícia, obviamente, arquiva-
• Assume comportamentos ou se entrega a actividades
-se no separador da escrita, e os 214% afinal
ou consumos que afectem gravemente a sua saúde,
não eram mais de 21.4%... (Nada mau para uma
segurança, formação, educação ou desenvolvimento
competência cujo total é 30%.)
sem que os pais, o representante legal ou quem tenha
Entre fichas, dúvidas e calculadoras, vê-se o
a guarda de facto se lhes
orgulho que cada um tem no seu portefólio. Houve
oponham de modo
quem se esmerasse. “Inês esmiúça o Português”,
adequado a remover
da Inês, claro, ou o “Do ler ao escrever”, da
essa situação. ::
Rafaela, são só alguns exemplos. Espero, no
entanto, que os pais não vejam apenas a parte
estética, mas tenham (à semelhança do que
é pedido aos filhos) um olhar crítico sobre as
produções e reflexões dos respectivos
educandos. ::
14 15 Lá fora

Cooperação europeia
em educação e formação:
o Quadro Estratégico para 2020
A aprendizagem ao longo da vida constitui o
princípio orientador do quadro estratégico para
o desenvolvimento dos sistemas de educação e
formação até 2020, nos países da União Europeia,
integrando todos os níveis de educação e ensino.
Texto de Teresa Gaspar
Ilustração de Dinis Mota
No contexto da Estratégia de Lisboa, os Estados-membros acordaram,
em 2001, desenvolver a cooperação europeia em matéria de educação
e formação, tendo fixado objec­tivos comuns a serem alcançados no
horizonte de 2010.
Os progressos realizados com o programa de trabalho Educação e
Formação 2010, apesar de lentos, parecem indicar uma melhoria geral
dos sistemas de educação e de formação nacionais, designadamente
nos domínios da aprendizagem ao longo da vida, da modernização do
Na reforma do ensino
ensino superior e na aquisição de competências essenciais em todos os
níveis de ensino e formação, bem como na adop­ção do quadro europeu na União Europeia, muito
de competências essenciais enquanto referência para as reformas já foi alcançado mas ainda
curriculares em curso.
há muito para fazer.
No sentido de aumentar a eficácia da cooperação euro­peia encetada,
o Conselho Europeu, realizado em 12 de Maio de 2009, definiu um
quadro estratégico para o desenvolvimento dos sistemas de educação e
formação até 2020 nos diferentes países da União Europeia.
Numa breve síntese, apresentam-se de seguida os objec­tivos e resultados
alcan­ça­dos com o programa de trabalho Educação e Formação 2010 e o
Quadro Estratégico para a Educação e Formação 2020.

Os objectivos comuns do programa Educação e Formação 2010


Num comunicado divulgado no final de Novembro de 2009, intitulado “Reforma do ensino na União
Europeia: muito já foi alcançado, mas muito há ainda para fazer”, a Comissão Europeia apresentou
o balanço dos progressos realizados pelos Estados-membros no que respeita às cinco principais
metas definidas para 2010:
1. Redução da percentagem de alunos de 15 anos com fraco aproveitamento em leitura para
menos de 20%;
2. Redução do abandono escolar precoce para não mais de 10%;
3. Aumento da taxa de jovens de 22 anos de idade com ensino secundário completo para 85%;
4. Aumento de 15% dos diplomados em matemática, ciên­cias e tecnologia e redução das
desigualdades de géne­ro;
5. Participação de pelo menos 12,5% de adultos em acções de aprendizagem ao longo da vida.
16 17 Lá fora

Quadro estratégico para a Educação


e Formação 2020
Em Portugal, os indicadores Face a estes resultados, o novo quadro reforça a importância
relativos às taxas de abordagem da cooperação europeia nos domínios da educação, formação e
investigação como factor essencial para que a União Europeia
escolar precoce e de conclusão do
possa tornar-se a economia do conhecimento mais avançada
ensino secundário apresentam os do Mundo.
maiores desvios relativamente às A aprendizagem ao longo da vida constitui o princípio
médias europeias. orientador de todo o quadro, incluindo a aprendizagem em
todos os contextos – formal, não-formal e informal – e integra
todos os níveis, desde a educação pré-escolar e escolar até ao
Apesar de todos os países terem feito esforços para ensino superior, educação e formação profissionais e educação
melho­rar os seus resul­tados, apenas a meta relativa de adultos.
ao aumento dos diplomados em mate­mática, ciências Dada a diversidade europeia e a responsabilidade nacional
e tecno­logia foi alcançada, tendo-se verificado, pelo de cada Estado-membro sobre os seus sistemas de educação
contrário, o agravamento da situação dos alunos de 15 e formação, a cooperação nesta área continuará a utilizar
anos com baixo nível de literacia. o método aberto de cooperação que inclui, para além da
A redução da taxa de abandono escolar pre­coce, o adopção de indicadores de referência e abordagens comuns,
aumento do número de jovens que concluem o ensino o intercâmbio de boas práticas, a apresentação periódica
secundário e a par­ticipação de adultos em acções de de relatórios e difusão de resultados, bem como o pleno
apren­di­za­gem ao longo da vida registaram progressos, aproveitamento dos programas comunitários relacionados
não tendo sido, porém, alcançados os valores de com a aprendizagem ao longo da vida.
referência. Os objectivos estratégicos definidos para o período de
No que respeita a Portugal, são os indi­ca­dores relativos 2010/2020 são os seguintes:
às taxas de abandono escolar precoce e de conclusão do 1. Tornar a aprendizagem ao longo da vida e a mobilidade
ensino secundário que apresentam os maiores desvios uma realidade;
rela­ti­va­mente às médias europeias – 35,4% de jovens 2. Melhorar a qualidade e a eficácia da educação e da for­ma­ção;
entre os 18 e os 24 anos desistiram da escola ou da 3. Promover a igualdade, a coesão social e a cidadania activa;
formação profissional, contra 14,9% na média nos países 4. Incen­tivar a criatividade e a inovação, incluindo o espírito
da União Europeia, e apenas 54,3% concluiu o ensino empreendedor, a todos os níveis da educação e da formação.
secundário, sendo a média europeia de
78,5%. A concretização dos objectivos será acompanhada por
benchmarks1 euro­peus e, no sentido de tornar mais eficaz a
cooperação, o período até 2020 será dividido em ciclos de
trabalho (o pri­meiro será de 2009 a 2011), definindo para cada
ciclo os domínios prioritários de cooperação entre os Estados-
mem­bros. ::

Indicadores e critérios de referência para o desempenho médio


1

europeu.
Nos diagramas seguintes, apre­sen­ta-se uma breve síntese
do Quadro Estra­té­gico para a Educação e For­mação 2020 aprovado:

Listagem dos benchmarks europeus para 2010 e para 2020

2010 2020

Redução da percentagem de alunos de 15 anos com fraco Competências básicas − redução para menos de 15% dos alunos de 15
aproveitamento em leitura para menos de 20%. anos com fraco aproveitamento em leitura, matemática e ciências.
Percentagem de abandono escolar precoce não superior a 10%. Abandono precoce da educação e formação – percentagem de alunos que
abandonam o ensino e a formação deverá ser inferior a 10%.
Aumento da taxa de jovens de 22 anos de idade com ensino Educação pré-escolar – frequência de pelo menos 95% das crianças entre
secundário completo para 85%. os 4 anos e o início da escolaridade obrigatória.
Aumento de 15% dos diplomados em matemática, ciências e Conclusão do ensino superior – percentagem de adultos de 30 a 34 anos
tecnologia e redução das desigualdades de género. com nível de ensino superior deverá ser de pelo menos 40%.
Participação de pelo menos 12,5% de adultos em acções de Participação de adultos na aprendizagem ao longo da vida – pelo menos
aprendizagem ao longo da vida. 15% de adultos entre os 25 e os 64 anos.

Domínios prioritários para a cooperação europeia (2009 a 2011)

Objectivos Prosseguimento de trabalhos Cooperação a desenvolver


estratégicos

1. Tornar a apren- – Estratégias de aprendizagem ao longo da vida e – Intensificação da mobilidade dos alunos ao nível
dizagem ao longo da reconhecimento e validação de aprendizagens do ensino superior e de outros níveis de ensino
vida e a mobilidade – Quadro Europeu de Qualificações e ligação aos
uma realidade sistemas nacionais de qualificação
2. Melhorar a qualidade – Aprendizagem de duas línguas além da língua materna – Investigação e boas práticas para o desenvolvi-
e a eficácia da – Desenvolvimento profissional dos professores e forma- mento de competências básicas nos domínios
educação e da dores e qualidade da formação inicial da leitura, da matemática e das ciências
formação – Governação e financiamento, promovendo a moderni- – Consideração das necessidades do mercado
zação do ensino superior, a qualidade da Educação e de trabalho “Novas competências para novos
Formação Profissional (EFP) e a sustentabilidade do empregos”
investimento público
3. Promover a – Abandono precoce da educação e da formação, – Educação pré-escolar: generalização da igual-
igualdade, a coesão melhorando as medidas de prevenção e investindo na dade de acesso e da qualidade da educação e
social e a cidadania cooperação­entre os sectores educativo geral e profis- apoio aos docentes
activa sional – Migrantes: aprendizagem mútua de boas práti-
cas de ensino
– Alunos com necessidades especiais: promoção
da educação inclusiva
4. Incentivar a inovação – Competências-chave transversais e sua integração – Desenvolvimento de métodos inovadores de
e a criatividade, nos currículos escolares e de formação, bem como nos ensino e aprendizagem e de formação com
incluindo o espírito processos de avaliação recurso a TIC
empreendedor, – Desenvolvimento de parcerias entre os estabe-
a todos os níveis lecimentos de ensino e formação e as empre-
da educação e da sas, as instituições de investigação, os actores
formação culturais e as indústrias criativas
18 19 Entrevista José Morais

José Morais
Da equipa convidada pelo Plano Nacional
de Leitura (PNL) para realizar o estudo sobre os níveis
de referência de desenvolvimento da leitura e da escrita,
José Morais, coordenador do estudo, e duas colaboradoras,
Cristina Carvalho e Isabel Leite, explicaram à Noesis quais
os principais objectivos do projecto, como está a decorrer no
terreno e qual o impacto esperado no sistema de ensino.

Entrevista de Elsa de Barros


Fotografias de Jorge Padeiro
Níveis de referência
para melhorar a aprendizagem
da leitura e da escrita
Qual o principal objectivo do estudo
sobre os níveis de referência de
desenvolvimento da leitura e da
escrita? do conhecimento preciso da ortografia
O objectivo é definir, para cada ano das palavras, para além da composição
de escolaridade, do 1.º ao 6.º, níveis escrita. estuda a fonologia e, sobretudo, a
de leitura e de escrita que as crianças Qual o primeiro aspecto que metafonologia, ou seja, a reflexão
devem atingir no final do ano lectivo. pretendem testar? sobre a linguagem, examinando,
Uma vez que temos de ter em conta Uma das ideias fundamentais é que a em particular, a capacidade de as
as diferentes habilidades que fazem linguagem escrita é uma representação crianças representarem os fonemas
parte ou estão associadas à leitura e da linguagem oral. O sistema de com qualidade. Utiliza tarefas que
à escrita, concebemos uma bateria escrita que utilizamos representa implicam várias operações: pode ser
alargada de testes para verificar o uma estrutura da fonologia da língua, subtrair um fonema (ou uma sílaba,
desempenho das crianças. que são os fonemas. Para aprender o para comparação) a uma expressão, ou
Quando é que o estudo teve início? sistema alfabético, as crianças aos 5, inverter a ordem dos fonemas numa
O estudo foi proposto há dois anos 6 anos são levadas a reflectir sobre expressão, tarefa mais complexa que,
pelo PNL. A primeira aplicação dos a estrutura fonológica da língua e geralmente, não está ao alcance das
testes foi em 2008 e só no final do tomam consciência, juntamente crianças no 1.º ano.
ano lectivo de 2010 estará completa a com a aprendizagem das letras, da É possível dar um exemplo
recolha dos dados. Depois, segue- existência de unidades fonológicas. concreto?
-se uma fase de análise desses dados, Começam a perceber que em “ba”, “da” A Cristina Carvalho realiza um teste
que vai ser importante, porque e “ga” há qualquer coisa que é comum onde são dadas duas palavras, por
foram testadas centenas de crianças e qualquer coisa que é diferente. A exemplo “Dona Isaura”. É pedido à
e aplicados cerca de 30 testes, em questão é chegar à representação criança que isole o primeiro som de
diferentes domínios. mental isolada dessas consoantes e cada uma delas para formar a sílaba
Como é que a equipa se organizou associá-las às respectivas letras. que resulta da sua junção – que, neste
para começar a trabalhar? Como é que abordam as questões da caso, será “di”. Pretendemos testar o
Antes de preparar os testes, definimos fonologia e da metafonologia com as que acontece se a segunda palavra
três grandes sectores. É por isso crianças? for “inglês” (em, por exemplo, “falo
que estão três pessoas no grupo de O estudo inclui a percepção da fala inglês”): será que a criança vai pegar
trabalho: a Cristina Carvalho centra- para termos a certeza de que as em “i”, a letra (então dirá “fi”), ou em
se na fonologia e na metafonologia, crianças discriminam bem a nível “in”, o som (nesse caso, dirá “fin”)?
incluindo a consciência dos fonemas; puramente perceptivo. Estudamos Importa verificar em que momento do
a Sandra Fernandes, nas habilidades também a memória fonológica, uma processo de aprendizagem a criança
relacionadas com o reconhecimento vez que pode haver diferenças entre deixa de apelar ao som e passa a
e a identificação de palavras escritas, as crianças na capacidade de reter as ter como referência a letra, ou se,
culminando na compreensão de expressões na memória fonológica pelo contrário, apela sempre à letra,
textos; e o Luís Querido, nas questões a curto prazo. A Cristina Carvalho independentemente do som da palavra.
20 21 Entrevista José Morais

Os resultados preliminares levam a crer que,


inicialmente, não deve ocorrer a interferência da
ortografia nesta operação. Em anos mais avançados,
mesmo com a instrução “queremos saber o que
resulta dos dois primeiros sons”, é comum que o
conhecimento da ortografia suplante essa instrução,
resultando na junção das duas letras e não dos dois
sons iniciais. Entre estas duas situações, há um
percurso que nos interessa estudar.
Qual o segundo aspecto que pretendem estudar?
A Sandra Fernandes ocupa-se de um outro sector
que incide nas habilidades relacionadas com o
reconhecimento e a identificação das palavras
escritas e, ainda, com a compreensão de textos. inconscientemente, o que é válido sobretudo para as regras mais
Para estudarmos a identificação das palavras complexas. Após o ensino destas regras elementares e de outras, como
escritas, temos de considerar também um tipo as relativas à pronúncia do “c”, do “g”, do “s” e das consoantes nasais
de sequência de letras a que chamamos pseudo- em função do seu contexto, é importante haver uma prática cada vez
-palavra. Por exemplo, a partir da palavra janela, mais intensiva de leitura, para consolidar aquilo que já se conhece e o
podemos criar a palavra “jinela”, que não existe processo de descodificação se tornar cada vez mais rápido. É a partir
em português, mas que seria perfeitamente do momento em que a criança não encontra mais dificuldades que
possível, de acordo com as regras de organização descobre o prazer da leitura.
e de sequência dos fonemas da língua. Quando Quais os outros aspectos estudados?
se apresentam à criança pseudo-palavras, A Sandra Fernandes ocupa-se de outras tarefas, porque ler também
podemos ter uma medida da sua capacidade de é compreender textos. Assim, temos tarefas diferenciadas tendo em
descodificação, porque ela nunca viu essa palavra conta os diversos tipos de textos, que incidem, nomeadamente, sobre
escrita. Isto porque, quando se trata de leitura habilidades que condicionam a compreensão, como o conhecimento
de palavras, pode haver um recurso à memória de vocabulário, o conhecimento sintáctico e morfológico e, ainda,
ortográfica que não passa pela descodificação. a fluência na leitura. Para verificarmos a evolução desta última,
Quais as tarefas que pedem à criança para testamos a criança na leitura de textos, contando quantas palavras lê
realizar neste âmbito? correctamente por minuto (no final do 1.º ano a criança deve ser capaz
Pedimos à criança que faça leitura de palavras e de ler em média 60 a 80 palavras por minuto), e também na leitura de
de pseudo-palavras, considerando vários aspectos: palavras isoladas e de pseudo-palavras.
temos de saber se conhece as letras do alfabeto, Qual é o terceiro aspecto do estudo?
ou se já tem conhecimento de certos grupos O Luís Querido ocupa-se da escrita, que passa pelo estabelecimento de
de letras que representam grafemas, que estão um léxico ortográfico no nosso cérebro.
associados a um fonema, como por exemplo Como foram seleccionadas as escolas que integram o estudo?
o “ch”, que corresponde a um fonema, mas se Escolhemos três agrupamentos em função do rendimento escolar
escreve com “c” e “h”. dos alunos, tendo em conta os resultados das provas de aferição: uma
A dificuldade é que ao mesmo som pode escola com um nível de desempenho alto, outra com médio e outra com
corresponder o ch ou o x... baixo. Inicialmente, começámos a trabalhar com escolas do 1.º ciclo,
Com certeza. As regras elementares de com alunos dos 1.º, 2.º e 4.º anos. Depois, neste segundo ano lectivo,
correspondência grafema-fonema que intervêm estamos a testar o 3.º ano (que era o 2.º), o 5.º ano (que era o 4.º) e duas
na leitura devem ser explicadas. Mas também há turmas de 6.º ano de cada uma destas escolas. Trata-se de um estudo
regras que são apreendidas através da prática da parcialmente longitudinal: há coortes de crianças que só são testados
leitura, das quais tomamos conhecimento quase duas vezes, há coortes como o do 6.º ano neste ano lectivo que só são
estudados uma vez, e há coortes que são testadas quatro
vezes, por exemplo duas no 4.º ano (no ano passado) e
Há conhecimentos e regras
duas no 5.º (este ano). que não podem ser deixados
As escolas seleccionadas estão inseridas em para a criança descobrir
diferentes meios socioeconómicos?
As escolas foram escolhidas tendo em conta o
– têm de ser ensinados,
rendimento escolar dos alunos, mas verifica-se que existe têm de ser explícitos.
uma correlação entre este e o nível socioeconómico
das famílias. A confirmação da influência do nível que a aprendizagem se processa no nosso cérebro, quais as
socioeconómico não foi uma surpresa, o que não melhores estratégias para a criança aprender a ler e a escrever, os
esperávamos era que na mesma turma houvesse mecanismos que tem de adquirir e por que ordem deve fazê-lo.
diferenças tão significativas entre as crianças. No 1.º ano, Há uma ordem privilegiada: chegar à identificação das palavras
estas diferenças talvez se possam explicar por aquilo que escritas pressupõe que se compreendeu o princípio alfabético e
antecede a entrada na escola, como o facto de as crianças que se adquiriu mecanismos de descodificação. E, sobretudo, há
terem frequentado o pré-escolar ou a forma como os pais uma noção fundamental: a necessidade de uma instrução directa,
preparam os filhos para a leitura. porque há conhecimentos e regras que não podem ser deixados
O que se pode fazer para lidar com estas diferenças e para a criança descobrir – têm de ser ensinados, têm de ser
optimizar a aprendizagem da leitura e da escrita? explícitos.
O grande desafio é a formação de professores. O que dizem os estudos mais recentes sobre o ensino da
Actualmente, sabe-se muito mais sobre o processo de leitura?
aprendizagem da leitura e da escrita no plano científico, Têm sido realizados muitos estudos. Os professores têm de
sobre os processos psicológicos inerentes à leitura e à ser informados sobre as melhores estratégias para as crianças
escrita que decorrem no cérebro da criança. É necessário aprenderem a ler. Aquela ideia de que um professor tem como
melhorar não só a formação científica dos estudantes que referência apenas a sua experiência profissional não faz sentido
vão ser professores, como também a formação contínua, porque o que é importante não é a experiência de um professor,
fazendo uma reciclagem dos docentes. mas sim de um conjunto de professores, e dos estudos que têm
O que precisam os professores de saber para estarem sido realizados sobre estas questões.
bem preparados para ensinarem a ler e a escrever? Onde entra a parte do prazer na leitura?
Primeiro, precisam de conhecer como é que a língua O prazer surge quando já se sabe ler e escrever. À medida que
funciona, o que é a fonologia, o que representa o sistema a criança faz as aquisições fundamentais para progredir na
alfabético, como está organizado o código ortográfico descodificação da leitura, abre caminho para compreender
da língua. De seguida, necessitam de saber como é aquilo que está a ler e vai descobrindo o prazer de ler.
22 23 Entrevista José Morais

Qual o papel das famílias?


Os pais podem ter um papel importante. Ao lerem um
livro, podem ir apontando com o dedo para que as
crianças se apercebam de que lemos da esquerda para a
direita, da separação entre as palavras, etc. E, depois, há Como é possível ter em conta os diferentes pontos de partida
um aspecto essencial: se os pais não lêem, qual o valor dos alunos na definição de objectivos?
que as crianças vão atribuir à leitura? O facto de os pais Temos de fixar um ideal realista, ou seja, um ideal que tenha em
terem gosto pela leitura é algo que se transmite aos conta as condições de aprendizagem, o nível de desenvolvimento
filhos. É importante que existam em casa livros, revistas cognitivo das crianças e as características do código ortográfico
e jornais e que as crianças vejam os pais a ler. do português. Este ideal realista destina-se a crianças que
Qual a opinião sobre o PNL? tiveram uma certa preparação antes de entrarem no 1.º ciclo e
O PNL tem sido extremamente importante para que foram ensinadas de forma correcta durante o processo de
incentivar a leitura, apetrechar as escolas com livros e aprendizagem. Valia a pena repensar o último ano da pré-primária,
promover a articulação com as bibliotecas escolares. Mas apostando-se numa instrução pré-escolar na verdadeira acepção
é fundamental que se saiba mais sobre a forma como as do termo. De acordo com os dados do PNL, há crianças que
crianças aprendem a ler e a escrever, em português, ao estão a iniciar a escolaridade que não conhecem nenhuma letra e
mesmo tempo que se estabelecem objectivos que devem outras que conhecem todas. Claro que não estão em igualdade de
ser alcançados em cada ano de escolaridade. circunstâncias.
Quais as principais dificuldades que têm As metas podem não ser as mesmas para todas as crianças?
encontrado na definição de objectivos? Falou-se em estabelecer níveis de referência do 1.º ao 6.º ano.
Há grandes diferenças entre as escolas e também Pensámos distinguir várias fases no 1.º ano, não definindo
entre as crianças dentro da mesma turma, o que cria apenas o que se deve alcançar no fim do ano, mas também
dificuldades na definição de objectivos. Assim, atingir aquilo que deve ser obtido ao fim de três meses. No entanto,
os mesmos objectivos pode constituir um trabalho recusamo-nos a imaginar que vamos definir ideais realistas que
muito diferente para os professores, no caso de terem sejam diferentes segundo o rendimento da escola ou o meio
uma turma maioritariamente constituída por alunos socioeconómico. Porque definir um ideal para crianças de um
com pouco contacto com a leitura, ou de terem uma meio socioeconómico baixo e outro para crianças de um meio
turma em que os alunos estão familiarizados com socioeconómico superior significa introduzir uma discriminação
a leitura. O mesmo objectivo representa um desafio que é inaceitável. Temos de estabelecer um único ideal, que pode
completamente diferente nestas duas situações. ser mais difícil de atingir em algumas escolas.
Qual vai ser a vantagem para o sistema educativo do
estabelecimento destes níveis de referência?
É importante saber o que a criança deve atingir em determinado
momento do seu percurso, porque permite ao professor saber se
a aprendizagem se está a processar como deve ser. Dá também
ao professor uma ideia melhor do conjunto de competências que
devem ser desenvolvidas ao longo do processo de aprendizagem.
Como preparar os professores para trabalharem, na prática,
com estes níveis de referência?
O ideal era que houvesse uma formação a nível universitário em que
se formassem x professores para darem formação aos outros, para
que, em poucos anos, fosse possível dar uma formação a toda a rede
de professores. Também há a ideia de fornecer materiais para que
os docentes possam aplicar testes que lhes permitam avaliar várias
competências específicas nas crianças, designadamente naquelas
que não estão a acompanhar as aprendizagens. ::
Perfil José Morais
Equipa do estudo sobre os níveis de
referência de desenvolvimento da leitura e
Do direito para a psicologia da
da escrita:
leitura. Começou por se inscrever em
José Morais – Professor emérito Direito, na Universidade de Lisboa, mas
da Universidade Livre de Bruxelas. desistiu no final do 2.º ano, em 1963,
Responsável científico pelo estudo. altura em que passou à clandestinidade,
Luísa Araújo – Universidade de Lisboa. por motivos políticos.
Responsável pelo grupo de trabalho em 24 horas para decidir o que queria
Portugal (no estrangeiro em 2010). estudar. Em 1968, saiu clandestinamente
Isabel Leite – Universidade de Évora. de Portugal e foi para a Bélgica, onde se
Actualmente, coordenadora do grupo. matriculou na universidade, apesar de já
Cristina Carvalho – Estudante de correr o mês do Novembro. Com apenas
24 horas para escolher, consultou o livro
doutoramento na Faculdade de Psicologia
onde estavam todos os cursos, com todas as cadeiras, seguiu uma vontade que
e de Ciências da Educação da Universidade
já tinha… e optou por Psicologia.
de Lisboa. Ocupa-se das competências
A grande descoberta. No 2.º ano, a Psicologia Experimental representou
fonológicas e metafonológicas na
uma descoberta, quando percebeu que, através do método experimental, havia
aprendizagem da leitura. maneira de tratar questões filosóficas. Ficou deslumbrado com esse trabalho e,
Sandra Fernandes – Assistente na no 3.º ano, o professor da cadeira convidou-o para ser aluno assistente.
Faculdade de Psicologia e de Ciências O caminho para a leitura. O doutoramento foi sobre a questão da
da Educação da Universidade de Lisboa. especialização hemisférica, sobretudo no campo da linguagem. Ainda antes
Ocupa-se das habilidades relacionadas de terminar a tese, o grupo em que trabalhava da Universidade Livre de
com o reconhecimento e a identificação Bruxelas interessou-se pelas questões da leitura e, a partir de 1976, começou a
das palavras escritas, assim como com a aprofundar esta temática.
compreensão de textos. O primado do princípio alfabético. Na experiência mais directa no ensino de
Luís Querido – Estudante de crianças portuguesas que viviam na Bélgica e com os próprios filhos, confirmou
aquilo que sabia da literatura relativamente à importância do princípio
doutoramento na Faculdade de
alfabético.
Psicologia e de Ciências da Educação da
Fascínio pelo que se passa no cérebro. Os avanços da tecnologia realizados
Universidade de Lisboa. Ocupa-se do
nos últimos 15 anos permitem compreender melhor o que se passa no cérebro,
conhecimento da ortografia e da escrita.
através de métodos como a ressonância magnética e a técnica de estimulação
magnética transcraniana, entre outros.
Este grupo é assistido por uma equipa de A escolha foi… a Bélgica. Depois do 25 de Abril, em 1975/1976, veio
especialistas: Arlette Verhaeghe (Faculdade para Portugal para a então criada Faculdade de Psicologia, mas ao fim de
de Psicologia da Universidade de Lisboa), três meses decidiu que voltava à Bélgica, porque as condições em que fazia
Armanda Costa (Faculdade de Letras da investigação científica eram melhores. Manteve o contacto com Portugal e com
Universidade de Lisboa), São Luís Castro a Universidade de Lisboa, onde chegou a ser professor e a proferir conferências,
(Faculdade de Psicologia da Universidade do tendo-lhe sido atribuído o título de doutor honoris causa em 2000.
Porto), João Batista Oliveira (Instituto Alfa e Membro do Observatório Nacional de Leitura. Durante 12 anos foi membro
Beto, Brasil) e Paulo Ventura (Faculdade de do Observatório Nacional da Leitura, em França, que tinha como objectivo
analisar a literatura científica sobre a aprendizagem da leitura e elaborar
Psicologia da Universidade de Lisboa).
relatórios para o Ministério da Educação francês, entre os quais se destaca o
A comissão científica do PNL tem
relatório que influenciou os programas do ensino primário de 2001/2002.
acompanhado as várias fases de
O convite do PNL. Em 2008 foi convidado pelo PNL para coordenar um estudo
desenvolvimento do estudo e tem feito
sobre os níveis de referência de desenvolvimento da leitura e da escrita, cujas
observações e sugestões relevantes. conclusões vão ser relevantes para o sistema de ensino português. ::
24 25 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

educação para O
desenvolvimento sustentável

A reflexão sobre o que significa educar para o desenvolvimento sustentável é o


pontapé de saída deste dossier. Viriato Soromenho-Marques clarifica princípios
orientadores para a abordagem desta matéria na escola.
Na rubrica “No terreno”, Manuel Carvalho Gomes apresenta o panorama
das actividades neste momento em Portugal e, em entrevista, Luísa Schmidt
defende que as escolas se devem assumir
como laboratórios de
sustentabilidade.
E porque há práticas que
merecem ser destacadas,
Alexandra Forte e um
grupo de alunos de Área
de Projecto do 12.º ano da
Escola Secundária Dr. Ginestal
Machado orienta uma visita
guiada à ilha imaginária
Siscoália.
Apesar da distância que os separa,
mostra-se que os alunos abraçam o
desafio do desenvolvimento sustentável com o mesmo entusiasmo, quer sejam
alunos da turma do 9.º A da Escola EB 2,3 Dr. José Pereira Tavares, de Pinheiro
da Bemposta, quer sejam alunos do Clube do Ambiente da Escola Francisco
Ornelas da Câmara, nos Açores.
26 29 Questões e razões
O que significa educar para
o desenvolvimento sustentável?
Viriato Soromenho-Marques

30 33 No terreno
Educação para o Desenvolvimento Sustentável:
das teorias às práticas.
Manuel Carvalho Gomes

34 37 Feito e Dito
O pontapé na porta
Entrevista a Luísa Schmidt
Teresa Fonseca e Helena Skapinakis

38 41 Recursos

42 45 Prática em destaque
Siscoália – A ilha sustentável
Teresa Fonseca

46 49 Na sala de aula
Um projecto à medida dos alunos
Helena Skapinakis

50 53 Repórter na escola
Vamos proteger!
Manuel Carvalho Gomes
26 27 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Questões e razões

QUE SIGNIFICA
EDUCAR PARA O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL?
Com excessiva modéstia, tem decorrido em Portugal a Década da Educação para
o Desenvolvimento Sustentável, proclamada pelas Nações Unidas (2005-2014).
Com a excepção da Comissão Nacional da UNESCO e de algumas fundações e
organizações não-governamentais, as tentativas de estabelecer uma orientação
para a sustentabilidade nas políticas públicas de ambiente e educação acabaram
por fracassar. Um vazio que se sente mais numa altura em que os ‘riscos sistémicos’
da insustentabilidade se tornaram visíveis com as alterações climáticas.
Texto de Viriato Soromenho-Marques1
Ilustrações de Dinis Mota

Neste ensaio visa-se: a) esclarecer do que falamos investimento. Cada um desses pilares tem uma natu­
quando usamos o conceito de desenvolvimento sus­ reza específica: são qualitativamente diferentes, não
ten­tável; b) sugerir alguns princípios para a elaboração podendo ser amalgamados numa igualdade numé­
de intervenções pedagógicas nesta matéria. rica, que colidiria com a sua essência particular. Se
confrontarmos a análise do novo conceito de sus­
> Desenvolvimento sustentável: tentabilidade com uma das clássicas concepções da
origens e significados filosofia ocidental chegaremos a resultados surpre­en­
Desde 1987 que o consenso mundial em torno da dentes. É o caso do contributo que pode ser reti­rado
necessidade de uma transição para um modelo de da teoria aristotélica da causalidade, que se encontra
desenvolvimento sustentável tem vindo a crescer. dispersa por várias obras do Estagirita. Que poderia
Mas qual é, efectivamente, o significado desse con­ dizer Aristóteles sobre o desenvolvimento susten­tável2?
cei­to? Embora não tenhamos ainda uma teoria Certamente que nos recordaria que o desenvolvimento
completamente consistente, registam-se algumas sustentável não é uma coisa, mas um processo
convergências. Uma delas, porventura a mais decisiva, dinâmico de transformação, ao qual se poderia aplicar
consiste em assinalar a existência de um triângulo a sua teoria das quatro causas:
da sustentabilidade, cujos vértices são os pilares • Causa eficiente: indica o princípio da mudança.
social, ambiental e económico. A discussão sobre • Causa material: identifica aquilo de onde algo
estratégias de sustentabilidade tem sido conduzida surge, ou mediante o que algo chega a ser.
sob o paradigma do que poderíamos designar como • Causa formal: a ideia ou o modelo que inspira
o triângulo equilátero: a tese segundo a qual cada a transformação, aquilo que já é, idealmente,
um desses pilares deve ter um peso e uma relevância antes de se plasmar na realidade concreta.
idênticas. É o modelo do equal footing. • Causa final: o fim, o telos, a realidade concreta e
Essa visão parece-me incorrer num erro colossal. Na discreta para a qual o processo de transformação
verdade, a sustentabilidade não obedece ao modelo de tende.
Tordesilhas, nem consiste numa negociação sindical
sobre salários, ou numa reunião de accionistas Se aplicarmos este quadro con­cep­tual ao desen­vol­
para discutir a repartição de lucros ou as verbas de vimento sustentável, deparamos com este resultado:
28 29 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

> Como educar para o desenvolvimento sus-


>DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL tentável?
COMO PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO Ensinar a sustentabilidade faz parte da história e da
prática da educação ambiental. Enquanto sintoma da
Dimensão político-institucional como causa crise da civilização contemporânea, a educação ambiental
eficiente: princípio da mudança, factor foi objecto de iniciativas pioneiras partindo sobretudo
decisivo para a transformação da realidade. dos meios mais informados e empenhados da sociedade
Traduz o consenso e a vontade política e civil. Estes foram os primeiros a compreender que os
operacional de mudança. sinais iniciais de degradação ambiental não poderiam
Dimensão económica como causa material: ser entendidos de forma restrita e fragmentária,
aquilo do qual algo surge, ou mediante o qual algo devendo antes ser perspectivados a partir de um modelo
chega a ser. Traduz a mudança na reprodução interpretativo, epistemologicamente transdisciplinar e
quotidiana das condições de vida numa politicamente despido de preconceitos.
perspectiva da sua continuação e qualificação. Por outro lado, enquanto reflexo de uma visão pros­
Dimensão ambiental como causa formal: é a pectiva, a Educação Ambiental não se limita a reagir
ideia ou o paradigma que dá forma (e condiciona) a perante o curso do real, procurando, antes, suscitar
transformação. Traduz o quadro de conhecimento complexo respostas individuais e colectivas, sociais e institucionais,
que deve modelar a mudança (incluindo os limites e possibilidades que rectifiquem os fac­tores negativos e reforcem as
abertos pela aplicação da nossa representação das leis naturais). tendências positivas em presença.
Dimensão social como causa final: o objectivo visado, o Não surpreende – tendo em conta esta dupla característica
modelo de sociedade pretendida. Traduz o projecto de futuro onde da Educação Ambiental, como sintoma e urgência de
as relações humanas (e dos humanos com as outras criaturas e agir – que a sua história em Portugal se confunda com
ecossistemas) ocupam um lugar central. os próprios alvores da formação de uma política pública
de ambiente, tendo sido, aliás, um dos elementos
Desde logo deparamos com a necessidade de um quarto pilar: catalisadores do desenvolvimento e amadurecimento
o político-institucional. Como é que poderíamos acreditar que desta última. Contudo, a Educação Ambiental nunca se
o desenvolvimento sustentável fosse um efectivo processo de confinou às medidas nesse sentido tomadas pelos poderes
transformação, se não existisse uma causa responsável pelo seu públicos. Pelo contrário, a inter­venção destes foi sendo
desencadear, um agente activo que o promovesse? Verificamos suscitada pela capacidade de iniciativa e criatividade de
também que a dignidade intrínseca de cada um dos quatro pilares múltiplos actores da sociedade civil: desde a intervenção
não se pode configurar no quadro do modelo equal footing, mas fragmentada de agentes edu­ca­tivos às acções mais
no âmbito de um modelo de cooperação e interacção sinergética. sistemáticas e programadas das orga­nizações não
Há muita coisa em jogo na ideia de desenvolvimento sustentável. governamentais.
A possibilidade de recolocar as questões da justiça, da equidade, Educar para o ambiente e o desen­volvimento sustentável
do progresso social, no quadro da crise ambiental e social, (DS) no âmbito escolar convida a ter em conta cinco
constitui o factor crucial de condicionamento das sociedades princípios orientadores fundamentais:
contemporâneas. Também pelo desenvolvimento sustentável
passa a formulação das novas políticas públicas que permitam 1. Educar para uma cidadania interveniente. O desen­
o aumento da coesão social e da solidariedade regional no volvimento sustentável integra-se no âmbito da
plano nacional. Por exemplo, se existe algum futuro para a dimensão prospectiva da edu­ca­ção ambiental. Ao fazê-
União Europeia, ele não estará divorciado da questão da sus­ten­ -lo, constitui-se e transforma-se numa área inte­grante
tabilidade e das políticas comuns a ela associadas. da política de ambiente, a saber, na sua componente de
índole mais preventiva e estratégica, voltada para uma
A Educação Ambiental política de ambiente nacional, na sua história de
quase quatro décadas. Os grandes problemas deverão
nunca se confinou às medidas nesse
ser estudados na dupla perspectiva do diagnóstico e
sentido tomadas pelos poderes públicos. da solução: as alterações climáticas, a diver­si­dade
biológica, os resíduos, a água, os solos, o ordenamento
territorial e urbano, a qualidade do ar, o binómio
intervenção no tempo longo dos ciclos políticos, procurando ambiente-saúde, os indicadores de sustentabilidade
despertar novas mo­dalidades de participação cívica dos nas diversas actividades produtivas, entre outros.
cidadãos, e alimentando – atra­vés da intensificação qualificada
de informação pertinente, bem como da elevação do debate 5. Educar para promover uma sociedade mais coesa e um
público – o processo de construção de consensos estruturais Estado mais eficiente. As medidas, iniciativas, meios
duráveis entre as diversas forças sociais e polí­ti­cas da sociedade materiais e humanos integrantes da Educação para o
portuguesa tendo em vista a identificação dos mais sensíveis DS visam contribuir para o incremento generalizado da
problemas ambientais e a sondagem das necessárias soluções. consciência ambiental, com os novos valores e novas
atitudes a ela inerentes, permitindo uma mudança
2. Educar para uma visão crítica do desenvolvimento. A Edu­cação cultural que exorbite do universo escolar formal,
para o DS deverá contribuir para a mobilização dos mais estendendo-se ao conjunto da sociedade civil e à própria
amplos sectores da sociedade portuguesa em torno do conhe­ cultura política da administração pública.
ci­mento objectivo e aprofundado das matérias concretas
que afligem e condicionam o nosso modelo de civilização, Ninguém está em condições de conhe­cer antecipadamente
contribuindo assim para a criação de valores, políticas quais serão os contornos da sociedade futura. O que sabemos,
e práticas quotidianas, indivi­duais e colectivas, sociais e desde já, é que para a atingirmos da melhor maneira tere­mos
institucionais, indispensáveis para a refor­ma da nossa de desenvolver os dispositivos fomen­tadores da educação
sociedade, no sentido da gradual implantação de um efectivo permanente, da cidadania activa, da administração pública
modelo de desenvolvimento sustentável, sempre aberto à atenta e eficiente, da cultura respeitadora dos patrimónios
rectificação e ao aperfeiçoamento críticos. natural e construído que herdámos do passado e que
deveremos legar às gerações futuras.
3. Educar tendo em conta a experiência internacional. É neste âmbito que o esforço de Edu­cação para
A natureza planetária das questões da crise o DS, levado a cabo por cada docente, muitas
global do ambiente obriga a que nenhuma dimensão ou vezes em con­di­ções difíceis, ganha sentido.
aspecto da diversificada série de respostas e contributos Como uma breve linha na narrativa que
nacionais, regionais e locais possa ser ignorada. Um dos a humanidade está a traçar para evitar
objectivos centrais da Educação para o DS será o de permitir o o colapso, vencendo a crise global do
conhecimento e a circulação das doutrinas, experiências ambiente. ::
e estudos de caso que ocorreram e acontecem a
1
É professor catedrático na Faculdade
nível mundial. Esse repositório de experiências de Letras da Universidade de Lisboa,
deverá servir como alimento para a reflexão leccionando nos cursos de Filosofia e
Estudos Europeus. Coordenador científico
e como ponto de referência para aferir do Programa Gulbenkian Ambiente, desde
Fevereiro 2007. Membro do Grupo de Alto Nível
iniciativas e acções no âmbito nacional. que aconselha o Presidente da Comissão Europeia
no binómio da Energia/Alterações Climáticas. Membro
correspondente da Academia de Ciências de Lisboa, desde
4. Educar integrando as lições da experiência nacional. Abril de 2008. Conferencista em mais de 20 países e autor de uma vasta
bibliografia sobre temas filosóficos, ambientais e estratégicos. Para mais
A Educa­ção para o DS deverá construir-se em articulação dados, consultar: www.viriatosoromenho-marques.com.
com o património de sucessos e revezes do conjunto da 2
Aristóteles, Metafísica, I, 3, 983 ª
30 31 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

No Terreno

Educação para o
Desenvolvimento Sustentável:
das teorias às práticas
A expressão Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) passa a ser usada
regularmente a partir da Conferência de Joanesburgo (2002) e da proclamação da
Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável
(DEDS ou Década) para vigorar entre 2005 e 2014. O seguinte texto pretende
apresentar o panorama das actividades que neste momento acontecem
no terreno, em Portugal, no âmbito da Década.
Texto de Manuel Carvalho Gomes
Ilustrações de Dinis Mota

A DEDS estabeleceu cinco objectivos que integram


os valo­res inerentes ao desenvolvimento sustentá-
vel (DS) em todas as facetas da aprendizagem. Da teoria à prática
A nível da educação, a resposta ao desafio da No panorama nacional, as actividades inerentes à implemen-
DEDS passou pela criação de oportunidades de re- tação da Década têm sido dinamizadas sobretudo pela Co-
flexão mundial sobre temas como a globalização, a missão Nacional da Unesco (CNU), pela comunidade cien-
degradação dos recur­sos ambientais, as alterações tífica e por organizações não governamentais (ONG), como
climáticas, os direitos humanos, bem como pelo a Associação Bandeira Azul da Europa (ABAE), a Associação
reforço dos investimentos na diminuição do anal- Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA), a Liga para a
fabetismo e da pobreza, na promoção da paz e na Protecção da Natureza (LPN) e a Almargem. A elas se deve a
valorização do património cultural. criação de espaços de divulgação, reflexão e, de alguma for-
Destacam-se várias instituições que olharam a pro- ma, monitorização da concretização da DEDS.
clamação da DEDS como uma oportunidade para a A ABAE, por exemplo, fez uma adesão integral aos princí-
melhoria do Mundo e para o aumento da qualidade pios da EDS, no contexto do Programa Eco-Escolas, conci-
e equidade da educação, transformando-a em ins- liando a sua principal finalidade de operacionalizar os prin-
trumento de superação das crises contemporâneas. cípios da Agenda 21 com os objectivos da DEDS. Foi a pri-
Sublinham-se, assim, a nível internacional, as inter- meira instituição portuguesa a fazer a divulgação pública
venções da World Conservation Union (IUCN) e da da DEDS, em Janeiro de 2005, sendo seguida pela ASPEA
rede Environment and School Iniciatives (ENSI), que, nesse mesmo mês, apresentou o Plano de Aplicação
um órgão descentralizado do Centre for Educatio- Internacional da Década, contando para o efeito com a pri-
nal Research and Innovation da OCDE, assim como meira participação oficial da CNU. A Almargem, no âmbi-
os compromissos assu­midos por diversos Estados- to do seu 3.º Encontro Regional, em Novembro desse ano,
membros da ONU ao mais alto nível. também incluiu um painel de reflexão sobre esta matéria.
A CNU organizou o debate público do do-
cumento DÉCADA. Um Contributo para a Antes do lançamento da Década, existiam muitos projectos no terreno, envol-
sua Dinamização em Portugal, em Julho de vendo vários níveis de ensino e que se inscreviam em diversas temáticas trans-
2006, e o Colóquio Internacional Activar o versais. Estes projectos já se enquadravam nos objectivos da EDS, ou passaram
Futuro: Objectivos e Estratégias da Educa- a ser orientados nesse sentido:
ção para o Desenvolvimento Sustentável, ◊ Agenda 21 Escolar (Vários)
em Dezembro de 2006. Apoiou também ◊ Castro Verde Sustentável (Liga para a Protecção da Natureza)
o Ano Internacional do Planeta Terra, que ◊ Coastwatch (Grupo de Estudos e Ordenamento do Território - GEOTA)
decorreu entre 2007 e 2009. ◊ Ecocasa (Quercus)
A nível governamental, registam-se essen- ◊ Eco-Escolas e Jovens Repórteres para o Ambiente (ABAE)
cialmente duas iniciativas no domínio do ◊ Padre Himalaya (Sociedade Portuguesa de Energia Solar-Ciência Viva)
lançamento da DEDS, que tiveram lugar no ◊ Rede de Escolas Associadas da UNESCO (CNU)
dia 16 de Dezembro de 2005: a edição por- ◊ Rede de Projectos do Programa Ciência Viva (Agência Nacional para a Cul-
tuguesa da Estratégia de EDS da Comissão tura Científica e Tecnológica)
Económica para a Europa, ONU (EEDS- ◊ Rede Educação do Consumidor (Instituto do Consumidor)
-CEE/ONU) e o Protocolo de Cooperação ◊ Rede de Lojas do Comércio Justo (Rede Nacional de Consumo Responsável)
para Promover a Educação Ambiental para ◊ Rede Terra Madre (Associação Slow Food Internacional, envolve os Convi-
a Sustentabilidade. vium portugueses)
32 33 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Ciências Educativas, com o apoio da Câmara Municipal de Odi-


velas, em Abril de 2008, que adoptou o tema global das Altera-
É importante aproximar a ciência da ções Climáticas: Ciência e Soluções, explicitamente associando-
se à celebração da DEDS.
sociedade e criarem-se laços entre
No que respeita à investigação, é de salientar o Programa Polar
cientistas, professores e alunos. Português, que envolveu, entre outras instituições, o Centro de
Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa e foi apoiado
pela Fundação para a Ciência e Tecnologia. Este programa in-
tegrou o Ano Polar Internacional (2007-2009) e criou no seu
A partir do ano de lançamento da Década, outras inicia- âmbito o Projecto Latitude 60 com o objectivo de ensinar às ge-
tivas emergiram: rações mais novas a importância das regiões frias para o nosso
◊ Alterações Climáticas Carbon Force (Agência Portu- Planeta. Destaca-se aqui a importância de se aproximar a ciência
guesa de Ambiente) da sociedade e de se criarem laços entre os cientistas, os profes-
◊ Eurolifenet (Centro de Investigação de Tecnologias de sores e os alunos.
Informação para uma Democracia Participativa)
◊ O ambiente é de todos, vamos usar bem a energia Ainda ao nível do ensino superior, deve-se referir a existência de
(EDP - Energias de Portugal) cursos de diferentes níveis que têm como objectivo a promoção
◊ Escola na Natureza (Instituto de Conservação da Na- da sustentabilidade e consequentemente do DS e da EDS. São
tureza e da Biodiversidade, Direcção-Geral de Inova- exemplo os mestrados em Ambiente e Desenvolvimento Susten-
ção e Desenvolvimento Curricular e Direcções Regio- tável (Universidade do Minho), Sistemas Energéticos Sustentá-
nais de Educação) veis (Universidade de Aveiro), Gestão Sustentável dos Espaços
◊ Cidadania e sustentabilidades para o séc. XXI. Cami- Rurais (Universidade do Algarve), ou os doutoramentos em Al-
nhos para uma comunidade sustentável nos Açores terações Climáticas e Políticas de Desenvolvimento Sustentável
(Associação CIDAADS - Centro de Informação, Di- (Universidade de Lisboa), Sistemas Sustentáveis de Energia
vulgação e Acção para o Ambiente e Desenvolvimento (Universidade do Porto) e Energia para a Sustentabilidade (Uni-
Sustentável e Fundação Luso-Americana para o De- versidade de Coimbra).
senvolvimento)
A resposta das escolas
Os especialistas em acção A transformação da escola em pólo de incorporação e difusão
No ensino superior é de destacar o esforço pioneiro da dos valores do DS e em motor de mobilização da sociedade,
Universidade do Minho com a organização, em Maio de através dos alunos, das suas famílias e da restante comunidade
2004, da Conferência Internacional Educação para o De- educativa, é fundamental para a implementação da Década.
senvolvimento Sustentável. Esta Conferência, que teve No ano lectivo 2006-07, foi desenvolvido o Projecto-Piloto Crité-
como principal objectivo preparar a implementação da rios de Qualidade para Escolas-EDS, com o objectivo de avaliar
DEDS, enriqueceu o panorama de reflexão nacional com a adaptação de critérios, definidos internacionalmente, à reali-
as participações, entre outros, dos investigadores Charles dade das escolas portuguesas e caracterizar o seu grau de con-
Hopkins (Canadá), Daniela Tilbury (Austrália) e Edgar cretização. O projecto contou com a colaboração do programa
Gaudiano (México). Eco-Escolas e foi enquadrado num projecto de investigação em
Outra actividade a merecer realce foi o 1º Congresso Am- curso, Educação para o Desenvolvimento Sustentável no Ensino
biente e Sociedade, promovido pelo Instituto Superior de Básico e o exemplo da Geografia.
Os Critérios de Qualidade para Escolas-EDS2 foram propos-
tos pelas redes ENSI e SEED (School Development through
Environmental Education), no âmbito do Programa COME- A meio da Década…
NIUS III e foram apresentados numa lista de 52 critérios, Em Portugal, existe um cenário propício ao desenvolvimen-
organizados em três grupos: to da DEDS, embora muitas das iniciativas tenham surgido
I. Processos de ensino e aprendizagem de forma espontânea.
II. Política e organização escolares Num momento em que iniciamos a segunda parte da DEDS
III. Relações externas da escola (2010-2014), continua imperioso debater e clarificar o que
é pedido (concretamente) à educação quando se diz, por
Estes critérios de qualidade parecem-nos constituir um im- exemplo, que se deve integrar a Educação para o Desenvol-
portante instrumento de convergência entre os planos e as vimento Sustentável nos sistemas educativos formais, em
acções, entre a teoria e a prática, entre o global e o local, e todas as disciplinas relevantes (EEDS3-CEE/ONU, 2006:7),
também entre a Política Educativa e o Projecto Educativo de ou, que as questões do desenvolvimento sustentável e os
Escola ou de Agrupamento. valores que lhe são inerentes devem ser equacionados e in-
A designação Escolas-EDS sintetiza uma acção educativa tegrados nos currículos de todos os níveis de ensino (CN
coerente com os novos desafios colocados à sociedade con- UNESCO4, 2006:25); ou, ainda, que se devem integrar os
temporânea nos domínios ambiental, social e económico e valores inerentes ao desenvolvimento sustentável em todas
que precisamente deram origem à proclamação da Década. as facetas da aprendizagem (PAI5, 2005:5).

Resta deixar a informação de que, no âmbito dos


dez temas sugeridos pela UNESCO para cada um
dos anos da DEDS, o ano 2010 poderá ser dedica-
Os cinco objectivos da DEDs do a sítios do património mundial como lugares
de aprendizagem. ::
– Valorizar a função fundamental da educação e da aprendizagem
na persecução comum do desenvolvimento sustentável.
– Facilitar o estabelecimento de redes, o intercâmbio e a interacção
entre as partes interessadas na EDS. 1
Resolução 57/254 de 2002 da
– Criar oportunidades para aperfeiçoar e promover o conceito Assembleia-Geral das Nações Unidas
de DS, proporcionando a transição para esse desenvolvimento 2
O documento Critérios de
através de todos os tipos de aprendizagem e sensibilização da Qualidade para Escolas - EDS: Guia
opinião pública. para a melhoria da qualidade da EDS, foi
– Fomentar a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem traduzido e publicado em português e foi
no domínio da EDS. feita uma nota de apresentação na Noesis
– Desenvolver, a todos os níveis, estratégias para reforçar as nº73
competências dos cidadãos em matéria de EDS. 3
Instituto do Ambiente (2006). Estratégia
da CEE/ONU para a Educação para o
* Objectivos adaptados do documento da UNESCO, Framework for the Desenvolvimento Sustentável. Adoptada na
UNDESD International Implementation Scheme (pag.24), que pode ser reunião de Vilnius, 17-18 de Março de 2005.
consultado em http://unesdoc.unesco.org/images/0014/001486/148650E.pdf Instituto do Ambiente, Amadora, 33p.
4
CNU (2006). DEDS 2015-2014. Contributos
para a sua dinamização em Portugal. Edição
da CN UNESCO, Lisboa, 46p.
5
UNESCO (2005). Proyecto de Aplicación
Internacional del Decenio de las Naciones
Unidas de la Educación para el Desarrollo
Sostenible. 171 EX/7, Paris, 12 Abril,
2p-Anexo com 60p. Original: Inglés.
34 35 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Feito e dito

O PONTAPÉ NA PORTA
Conciliando a vida académica com o jornalismo,
o percurso de Luísa Schmidt mostra
como cada um pode contribuir para a
sustentabilidade da grande casa onde
vivemos: acredita que é uma urgência
que deve mobilizar todos. Reconhecendo
o papel fundamental da educação,
considera que a escola não pode estar
ausente deste compromisso com as
gerações futuras e defende que só
poderá responder a estas novas
necessidades assumindo-se
como um laboratório de
sustentabilidade.
Entrevista deTeresa Fonseca
e Helena Skapinakis
Fotografias de Jorge Padeiro
Q uando e onde nasceu o con­
ambiente não era prioritário. A questão
da Educação Ambiental ganha outra
ceito de desenvolvimento sus­tentável vez impulso com a criação do Instituto
(DS)? ou água suficientes. Por isso o DS é Nacional do Ambiente, em 1986. Entre­
Surgiu na Conferência de Estocolmo, na fundamental para equilibrar a pressão tanto, por parte do Ministério da
sequência do Relatório Meadows sobre sobre os recursos naturais. Finalmente, Educação começa a haver uma preo­
os “Limites do Crescimento”. Punha-se a vertente da governança, passa por uma cu­pação de integração da Educação
então, em 1972, a questão da capacidade maior aproximação entre governantes e Ambiental nos currículos, matéria que
de resposta do Planeta ao modelo de governados. A Agenda 21 concilia e aplica cria entusiasmo, e alguns professores
desen­volvimento e alertava-se para o conceito de DS nas quatro vertentes e ade­riram. Mas inicialmente era res­
as desigualdades que se faziam sentir. acrescenta uma dimensão que é a Agenda tri­tiva, muito ligada à conservação da
Em 1987, foi publicado o Relatório 21 Local: as comunidades organizarem- Natureza, à separação dos resíduos...
Brundtland, também intitulado “O -se localmente e contribuírem para este Portanto ficou ali acantonada...
Nosso Futuro Comum”, que expande desenvolvimento. Sim, por isso o conceito de EDS entra
o conceito de DS: a necessidade de O conceito de Educação para o dificilmente: do lado do Ministério do
deixarmos para as gerações futuras pelo Desen­­­volvimento Sustentável (EDS) Ambiente havia uma tradição enraizada
menos os mesmos recursos de que nós está muito associado à educação da Educação Ambiental, ligada aos
usufruímos. Houve um momento alto na ambiental... temas estritamente ambientais; do lado
cimeira do Rio de Janeiro de 1992, onde Sim. Isto porque a educação é trans­ da escola, uma visão essencialmente
foi aprovada a Agenda 21, que consagra versal a tudo. Em 2001, a UNESCO curricular. A EDS é mais abrangente.
o conceito de DS e o operacionaliza. lan­­ça a Década da Educação para o Tem de integrar a dimensão ambiental,
O modelo de crescimento económico Desenvolvimento Sustentável, a decor­ mas também a social, a económica e
neoliberal centrava-se na vertente de rer entre 2005 e 2014. A questão am­ sobretudo a governança. Ora, não havia
mercado livre, considerando que o biental que se tornou visível em meados (nem há) grande apetência da parte
“resto” viria por acréscimo. Provou-se dos anos 70, com a primeira crise do do Governo (e isso é importante) para
que era precisa regulação e o conceito petróleo, com as primeiras marés negras integrar este novo conceito a todos
de DS passa por criar um tipo de mediatizadas e a evidente dependência os níveis de escolaridade. Apesar de a
desenvolvimento onde seja possível da energia fóssil, foi o detonador da Educação para a Cidadania abrir uma
equilibrar quatro vertentes. educação ambiental. E é por ela que frente nesta matéria, não é fácil que
Quais são essas vertentes? chegamos à questão do DS. Ora, hoje é esses conceitos e práticas entrem nas
Primeiro, a vertente económica e a da muito importante integrar a dimensão escolas.
coesão social, para que o desenvolvimento social e a dimensão de cidadania no Já há alguma avaliação? Qual é a
não implique desigualdade. Depois a conceito de Educação Ambiental. situação de Portugal?
vertente ambiental, que está hoje, com­ E qual é a situação de Portugal em Há um relatório de avaliação feito pela
preensivelmente, na ordem do dia. As par­ticular? Comissão Europeia sobre como é que
sociedades emergentes (sobretudo a Na verdade, a Educação Ambiental a década está a decorrer nos vários
China e a Índia) querem “ocidentalizar- inicia-se em Portugal em 1973 com a Esta­dos-membros. Inicialmente, a
-se” adoptando o nosso modelo de Comissão Nacional do Ambiente, que Comis­são Nacional da UNESCO con­
con­sumo. No entanto, se assim for, e tinha como missão fundamental a tac­tou-me para constituir um grupo
com o problema do crescimento de­ sua integração nas escolas. Com o 25 que contribuísse para a dinamização
mo­­­gráfico, não irá haver energia, ar, de Abril, os valores eram outros e o da década. Coordenei esse grupo de
36 37 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

trabalho e a ideia era criar uma série de embriões na sociedade


que depois viessem a dar resultados. O diagnóstico que
então fizemos, que come­çou em 2005/2006, mostra que, em
termos gerais, pouco se avançou. A nível central não se fez Será que esta falta de coordenação terá a ver com o
praticamente nada. Em Portugal, não temos uma estratégia facto de o DS fazer repensar os objectivos, conteúdos e
de EDS e não há nenhuma directriz à escala governamental. práticas ao nível da educação?
Localmente, algumas escolas (sobretudo do ensino básico) Com base nos estudos feitos, entendemos que as escolas
trabalham nesta área, mas não é numa situação coordenada. devem ser laboratórios de sustentabilidade. Por exemplo,
Não há um programa, como nós propúnhamos no grupo, agora a Parque Escolar está a fazer obras, transformando os
estendido a todos os tipos de formação. estabelecimentos de ensino do ponto de vista do conforto
Quais os sectores da nossa sociedade que estão mais e da eficiência energética. Seria uma óptima oportunidade
envolvidos no trabalho da Década? para levar alunos, professores e funcionários a aprofundarem
As universidades estão pouco envolvidas, o que resulta numa conhecimentos sobre estas matérias e estimular mudanças ao
falta de liderança. Ao nível da formação dos profissionais
dos media, também não há nada. Ao nível das autarquias,
através do projecto ECO 21, liderado pela a Associação
Bandeira Azul da Europa (ABAE), têm-se concretizado
alguns projectos de educação, sobretudo o “Eco-escolas”.
Há também o projecto Carta da Terra, lançado pela
Associação Portuguesa de Professores de Educação
Ambiental (ASPEA). Existem ainda outros projectos que
vão fazendo o seu caminho, mas sem aquela dinâmica que
era precisa para transformar as escolas em laboratórios de
sustentabilidade.
O grupo a que se refere foi o que elaborou o documento
de orientação nacional para a implementação da Década?
Sim. Nesse grupo, juntámos representantes dos Minis­
té­rios da Educação, do Ambiente, da Ciência, de uni­ver­
sidades, das empresas, dos media e das ONG que pudessem
dinamizar estas matérias e fazer um primeiro documento
que fosse depois desenvolvido com outros apoios. Ora
isso não aconteceu. O Governo nunca fez nenhum
documento nesta área e nunca assumiu este como um ponto nível das práticas da comunidade escolar. E, da problemática
de partida e um contributo para a dinamização da Década. da energia, extrapolar para a questão das alterações
Contudo, o trabalho não parou. Arrancaram várias acções climáticas, cujas consequências vão afectar as comunidades,
das ONG e das autarquias e o diagnóstico continuou a ser ao terem um impacto directo sobre a vida quotidiana das
feito: aplicámos um inquérito a organizações (autarquias, pessoas. Estas matérias são novas no quadro das nossas
empresas, universidades, igrejas, etc.) e outro dirigido às preocupações e ainda não temos competências suficientes
escolas, com o apoio do então Instituto do Ambiente (actual para lhes responder.
APA) e da Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Qual é então o papel da escola?
Curricular, verificando-se que não existem programas A escola desempenha um papel importante, porque é o
consistentes nem de educação ambiental nem de educação lugar onde os jovens acedem colectivamente a um dis­
para o desenvolvimento sustentável. curso diferente e enriquecedor. Os novos saberes podem
entusiasmar alunos, funcionários e pro­fes­
sores e levá-los a empenharem-se nas ques­
tões da sustentabilidade. Se não tiver­mos a as esco­las, enquanto infra-estruturas no
sociedade mobilizada, não conseguiremos terre­no, a assumir um papel de mudança,
dar resposta às urgências que estes pro­ arti­culadas com as autarquias, com as
blemas impli­cam. Essa transformação passa organizações não governamentais, com as
por envol­ver os alunos no conhecimento do empresas locais e com os media. O País
que é a sustentabilidade hoje. E se os alunos precisa de mais cooperação...
produzirem eles próprios esse conhe­ci­ Como académica, que importância atri­
mento através do que se chama a ciência bui à vertente jornalística na sua vida?
participativa, integram-no de uma forma O jornalismo é o pontapé na porta e a socio­
mais abrangente e transversal, porque, ao logia é entender como o quarto se arruma. perfil
fazer, aprendem. Isto acontece quando a Estas duas dimensões são importantes, não
escola começa por cuidar dos seus espaços só para compreender a realidade, como Luísa Schmidt atribui o seu
em termos de eficiência energética, de apro­ para agir sobre ela. envolvimento nas questões
ambientais aos tempos remotos
veitamento das águas, do recreio e do seu
da sua infância, aos seus
espaço público... É preciso transformar os
Hoje o conhecimento antecedentes rurais. Para ela,
pro­jectos de educação ambiental, que ainda o viver numa quinta, o ter uma
têm uma forte dimensão recreativa e uma tem de ser integrado, temos forte ligação ao campo, pode
fraca dimensão cívica. Nota-se uma certa de saber cada vez mais, ter sido o clic. Actualmente
distância ao que se passa na sociedade: fize­ investigadora principal do
sobre cada vez mais. Instituto de Ciências Sociais da
mos um inquérito no ano em que o País foi
Universidade de Lisboa (ICS-UL),
assolado por incêndios e praticamente não
o seu percurso profissional
havia projectos sobre o assunto. Há também Mas a forma de comunicar nos media e levou-a, anteriormente, a
uma “infan­tilização”, já que as actividades se no meio académico é diferente... trabalhar na comunicação e
des­tinam sobretudo aos mais novos. Ora, O jornalismo, ao obrigar à síntese e à nitidez, publicidade, tendo, na década
é justamente quando os jovens come­çam influencia a minha ati­tu­­de académica, de 80, abraçado a causa da
defesa do consumidor. No início
a ser pré-adultos que se tornam grandes onde, sem perder a profundidade, tento
dos anos 90, com lixeiras a
consumidores e criam um maior impacto uti­lizar uma lin­gua­gem clara e acessível.
proliferarem, rios poluídos e
ambiental. Julgo que a via da ciência partici­ Enquan­to socióloga do ambiente e da comu­­ desordenamento do território,
pativa, pondo os jovens a participar em nicação, lido muito com cientistas de outras os grupos ambientais passaram
actividades úteis ao bem comum, podia ser áreas disciplinares com os quais é crucial a ter uma grande visibilidade e
um caminho. criar patamares de entendimento. Hoje o trouxeram para a ribalta esta
realidade chocante. Atenta ao
Ainda há muito a fazer... conhecimento tem de ser integrado. Ao
que a rodeava, os interesses de
Sim. As escolas deviam contribuir para o contrário do saber especializado – saber
Luísa Schmidt desviaram-se
sistema nacional de dados e cons­tituir-se cada vez mais sobre cada vez menos –, temos do consumo para o ambiente.
como um laboratório de sustentabilidade, de saber cada vez mais, sobre cada vez mais. Hoje, com o conceito de
assumindo projectos mais ancorados na As ciências sociais ganham um novo papel, desenvolvimento sustentável,
comunidade e apos­tando em parcerias. porque estão a ser muito solicitadas pelos considera que, cada vez mais,
as diferentes áreas em que tem
Assim, garan­tiriam continuidade, não fican­ outros saberes e porque as complexidades
trabalhado se entrecruzam,
do demasiado dependentes do vo­luntarismo das crises estão a reque­rer maior
afirmando em jeito de conclusão:
dos pro­fes­sores, e todos se sentiriam envol­ conhecimento sobre os dife­ren­tes contextos “Afinal, o que está em causa é o
vidos em actividades concretas. Seriam sociais na produção de respostas. :: actual modelo de consumo.”
38 39 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Recursos

Recursos EDS
Desde o lançamento da Carta da Terra, em
2000, até ao recente balanço da educação
ambiental em Portugal, publicado este ano,
que a Educação para o Desenvolvimento
Sustentável tem feito o seu caminho, lá
fora e cá dentro, através de documentos
orientadores destinados a toda a sociedade
e de materiais e sítios para serem utilizados
por professores que queiram lançar-se neste
desafio com os seus alunos.

> SÍTIOS A CONSULTAR

ECO-ESCOLAS – O BLOGUE
http://eco-escolas-portugal.blogspot.com/
Blogue promovido pela Associação Bandeira Azul (ABAE) que pre-
tende ser um espaço de partilha para todos os envolvidos na rede
Eco-Escolas, um programa que tem o objectivo de enco­rajar acções YOUTHXCHANGE
e reconhecer o trabalho de qualidade desenvolvido por escolas, no http://www.youthxchange.net/main/introduction.asp
âmbito da Educação Ambiental/Educação para o Desenvolvimento Sítio promovido pelo United Nations Environment Pro-
Sustentável. gramme (UNEP) e pela United Nations Educational, Sci-
entific and Cultural Organization (UNESCO), dirigido a
DECADA POR UNA EDUCACIÓN PARA LA SOSTENIBILIDAD professores que pretendam abordar o tema do consumo
http://www.oei.es/decada/ sustentável com os seus alunos adolescentes.
Sítio patrocinado pela Organização dos Estados Ibero-americanos Na página inicial, o professor encontra instruções sobre
(OEI) com documentos de apoio e materiais para professores que como navegar pelas nove salas temáticas disponíveis, com
desejem integrar a Educação para o Desenvol­vimento Sustentável exemplos de planos de aula e pistas para integrar este tema
nas suas práticas e com informação sobre vários temas neste âmbito. no currículo específico de cada disciplina.
A secção “Como podemos contribuir?” inclui dois questioná­rios Está também disponível um guião sobre consumo sus-
onde se apresentam linhas de orientação para participar concreta tentável traduzido para português em: http://www.youthx-
e activamente na promoção do desenvolvimento susten­tável como change.net/
cidadãos e como professores. download/guide/text/guide%20text%20portuguese.pdf
YOUNG REPORTERS FOR THE ENVIRONMENT
http://www.youngreporters.org/
rubrique.php3?id_rubrique=31
Young Reporters for the Environment (YRE) é um programa da Foundation for
Environmental Education dirigido a alunos do ensino secundário que queiram
investigar na sua comunidade um tema relacionado com o ambiente. Neste
sítio estão disponíveis documentos de apoio e dicas para orientar os jovens jor-
nalistas na produção dos seus textos e é possível co­operar com outras escolas > Documentos orientadores
dos 17 países envolvidos no programa.
Carta da Terra
OXFAM EDUCATION Declaração de valores e princípios para a
http://www.oxfam.org.uk/education/ construção de um futuro sustentável, cuja
Página do Reino Unido da organização Oxfam, onde se pretende promover a edu- redacção envolveu um processo de consulta
cação para ajudar os jovens a compreender questões globais que afectam as suas a nível mundial. Com o lançamento da Car-
vidas e as suas comunidades, de forma a incentivar modos de vida sustentáveis. ta, em Junho de 2000, estabeleceram-se três
É possível pesquisar recursos por idade dos alunos, tipo, tema ou área curricular. objectivos para esta iniciativa: promover e
Ver também a página da organização em Espanha: apoiar o seu uso educativo, promover a sua
http://www.intermonoxfam.org/es/page.asp?id?4 disseminação, aval e implementação na so-
ciedade civil e procurar apoio por parte das
O PLANETA ENERGIA Nações Unidas.
http://www.oplanetaenergia.eu/#p4 Na página da Carta da Terra (http://www.
O Planeta Energia é uma ferramenta pedagógica para educadores, professores e earthcharterinaction.org/content/) é possível
crianças que pretende, através da arte e da interactividade, sensibilizar para os aceder a planos de aulas e actividades, conce-
temas da energia e das alterações climáticas. O Planeta Energia é uma iniciativa bidos por professores que a utilizaram como
do Centro de Informação Europeia Jacques Delors. ferramenta pedagógica. A página pode ser
consultada em castelhano, francês ou inglês.
REDE LUSÓFONA Texto disponível em http://www.aspea.org/
http://br.groups.yahoo.com/group/RedeLusofona/
Rede lusófona de Educação Ambiental, com ênfase na Carta da Terra e Educação DECENIO DE LAS NACIONES
Ambiental e suas múltiplas dimensões da sustentabilidade planetária. UNIDAS DE LA EDUCACIÓN PARA EL
DESARROLLO SOSTENIBLE: PLAN DE
EDUCAPOLES APLICACIÓN INTERNACIONAL
http://www.educapoles.org/ Plano apresentado em 2005 onde se deli-
Sítio da International Polar Foundation dedicado à educação, que tem como ob- neiam orientações para a aplicação inter-
jectivo sensibilizar os jovens para a importância da região polar no frágil equilí- nacional da Década da Educação para o De-
brio do clima do nosso planeta. senvolvimento Sustentável proclamada pelas
Estão acessíveis pequenos vídeos sobre expedições realizadas; encontram-se Nações Unidas e se definem sete estratégias
animações multimédia, pequenos contos e dossiers dedicados a temas como as para que os países interessados possam al-
regiões polares, o clima e as alterações climáticas, energia e biodiversidade – os cançar os objectivos da Década.
dossiers destinam-se sobretudo a alunos do 3.º ciclo e secundário, nas disciplinas Texto disponível em http://unesdoc.unesco.
de Ciências e Geografia. Para além disso, também está disponível uma galeria org/images/0014/001486/148654so.pdf
de fotografias sobre a vida na Estação Princess Elizabeth, a fauna e os povos do É também possível consultar uma versão em
Árctico, entre outros títulos. inglês.
40 41 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Recursos

Estratégia da CEE/ONU para a Educação para o


Desenvolvimento Sustentável
Documento onde se apresenta a estratégia adoptada em Março de
2005 para incentivar os Estados-membros da Comissão Económi-
ca para a Europa da Organização das Nações Unidas (CEE/ONU) a
desenvolver e a integrar a Educação para o Desenvolvimento Sus-
tentável nos sistemas educativos formais, em todas as disciplinas Década das Nações Unidas da Educação
relevantes, bem como na educação não formal e informal. para o Desenvolvimento Sustentável (2005-
Texto disponível em 2014) – Contributos para a sua dinamização
http://www.apambiente.pt/divulgacao/Publicacoes/ em Portugal
guiasemanuaisAPA/GuiaAgenda21Local/ Documento redigido em 2006 por um grupo de trabalho
Documents/CEE_ONU_educacao_DS.pdf coor­denado por Luísa Schmidt, investigadora do Instituto de
Ciên­cias Sociais da Universidade de Lisboa, que reuniu espe-
Framework for the UNDESD International cialistas ligados a vários sectores da sociedade portuguesa
Implementation Scheme (ambiente, media, ensino, etc.), onde se identificam áreas
Plano apresentado em 2006 para a aplicação internacional da de intervenção prioritária e projectos concretos capazes de
Déca­da da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (DEDS). dinamizar processos de mudança; propõem-se igualmente
Abordam-se os desafios colocados à educação e as implicações acções transversais que envolvem os media, o mercado e as
envolvidas neste conceito; aborda-se igualmente o papel que to- organizações não governamentais.
dos os interessados devem desempenhar na implementação da Texto disponível em
Década e as estratégias a desenvolver. No final, disponibiliza-se http://www.unesco.pt-pdfs-docs-contributosdeds.doc.URL
uma calendarização de actividades que se podem desenrolar ao
longo da Década, propondo-se um tema aglutinador de actividades Critérios de qualidade para Escolas - EDS
e eventos para cada um dos anos da Década. Guia para a melhoria da qualidade
da Educação para o Desenvolvimento
LISTA DOS TEMAS PROPOSTOS Sustentável
­– Património mundial como local de aprendizagem (2010) Documento produzido pelas redes School Development
– EDS na sociedade de informação/conhecimento (2011) through Environmental Education (SEED) e Environment
– Participação dos cidadãos e governança (2012) and School Initiatives (ENSI), traduzido por Manuel Gomes,
– Redução da pobreza e projectos de desenvolvimento que apresenta uma proposta de critérios para serem usados
sustentável (2013) como ponto de partida para reflexões, debates e propostas
– Justiça intergeracional e ética (2014) de trabalho em escolas que escolheram a Educação para
Texto disponível em o Desenvolvimento Sustentável como o fundamento da sua
http://unesdoc.unesco.org/images/0014/001486/148650E.pdf missão e do seu Projecto Educativo.
Texto disponível em
http://www.drel.min-edu.pt-noticias-criterios_de_
qualidade_para_escolas_guia.pdf.url

Ver Noesis n.º 73, rubrica Meios e Materiais, pág. 57.


Educação Ambiental:
balanço e perspectiva para
uma agenda mais sustentável

Second Collection of Good Practices


Education for Sustainable Development
Luisa Schmidt,
Joaquim Gil Nave Colecção dedicada à divulgação de projectos
e João Guerra inovadores desenvolvidos em 2009 nas escolas
Ed. Imprensa associadas da UNESCO em diversas partes
de Ciências Sociais do Globo. Aqui encontram-se exemplos de
(2010) projectos levados a cabo em escolas urbanas e
rurais, grandes e pequenas, bem equipadas e
A partir de dois inquéritos de âmbito com poucos recursos, mostrando como se pode
nacional – um aplicado a um vasto promover a educação para o desenvolvimento
leque de organizações não-escolares sustentável de tantas e diferentes formas.
estatais, privadas e associativas e outro Na apresentação de cada projecto é referido o
aos estabelecimentos de ensino básico contexto que levou à implementação do mesmo,
e secundário portugueses –, os autores os objectivos e a forma como se concretizou, os
apresentam o tipo de projectos de educação resultados que se alcançaram e o impacto que teve na comunidade. Partilham-se
ambiental que se desenvolvem em Portugal, também pistas/sugestões para outras escolas poderem adoptar esses mesmos
dando especial ênfase ao modo como projectos.
estas actividades têm alcançado um papel No capítulo dedicado aos países europeus, é referido um trabalho desenvolvido
relevante na formação para a cidadania em Portugal, na Escola Secundária Dr. Ginestal Machado (Santarém), Na Área de
e na mobilização para o desenvolvimento Projecto do 12.º ano: A ilha sustentável “Siscoália”. ::
sustentável. ::
Luísa Schmidt Texto disponível em http://unesdoc.unesco.org/images/0018/001812/181270E.pdf

Guião de Educação do Consumidor


Guião de Educação Ambiental – conhecer e preservar as florestas
Guião de Educação para a Sustentabilidade – Carta da Terra

Guiões Pedagógicos de apoio à Educação para a Cidadania, editados pela Direcção-


-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular. Com esta colecção pretende-se
disponibilizar um conjunto de orientações e de materiais pedagógicos para apoiar os
educadores e professores no ensino e no desenvolvimento de actividades e projectos
com os seus alunos.

Guião de Educação para a Sustentabilidade – Carta da Terra: ver Noesis n.º 69,
rubrica Meios e Materiais, pág. 57.
Guião de Educação do Consumidor: ver Noesis n.º 70, rubrica Meios e Materiais,
pág. 57.
Guiões disponíveis em http://www.dgidc.min-edu.pt/cidadania/Paginas/
Guioes_Pedagogicos.aspx
42 43 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Prática em destaque

Siscoália
A ilha sustentável
Passo a passo, ano a ano, Siscoália – a ilha sustentável vai ganhando corpo.
Projecto coordenado por Alexandra Forte e realizado na Área de Projecto do
12.º ano da Escola Secundária Dr. Ginestal Machado, estender-se-á até ao
final da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável. A criação
de uma ficção deu lugar a uma realidade – um projecto em desenvolvimento
– com início em 2006 e final em 2015.

Texto de Teresa Fonseca


Ilustrações de Jorge Padeiro
Ao entrar naquela sala de aula da Escola Secundária Dr.
Ginestal Machado, deparamos com os alunos do 12.º A,
curso de Ciências e Tecnologia, em pequenos grupos,
sentados junto dos computadores, a dar corpo aos seus
projectos, fervilhando de entusiasmo. Projectos? Trata-se
do tempo destinado à Área de Projecto. Alexandra Forte,
professora da turma de Física e Química e de Área de
Projecto, rodopia pela sala e, tal como um rádio muda de
comprimento de onda, também ela passa de tema para tema
a fim de dar apoio a cada projecto específico.
Os grupos delinearam os seus projectos, que vão desen­
vol­vendo ao longo do ano lectivo. São todos bas­tante
interessantes, mas foi, na verdade, um deles que despertou
a nossa atenção e nos levou até Santarém. Trata-se de um
pro­jecto de desenvolvimento sustentável que nasceu no
ano lectivo de 2006/2007 e se vai desen­volver ao longo de
toda a Década da Educação para o Desenvolvimento Sus­ anteriores. Vamos dedicar-nos ao sector da economia, criando
ten­tável. as infra-estruturas de turismo para a ilha.” Perante a expectativa
O grupo que este ano lectivo se dedica a dar continuidade ao do que será o produto final, Francisco afirma: “O produto
projecto é constituído pelo Bruno, pelo Diogo, pelo Filipe e final será um modelo virtual de turismo exemplar.” Ao tentar
pelo Francisco. Estes, tal é o entusiasmo, quase se atropelam explicar o suporte informático que utilizam para a criação desse
para explicar aquilo que estão a fazer. Assim, Diogo diz: “O modelo, Bruno declara: “Se existe o jogo SIMS City1, porque
primeiro grupo criou todas as regras.” Filipe acrescenta: não aproveitar essa ferramenta?” Os alunos, preocupados em
“Nós não vamos mexer no que já está feito dos anos esclarecer como desenvolvem o trabalho, mostram plantas de
todo o aldeamento turístico e os resultados das
pesquisas sobre promoção de turismo na ilha,
influência do turismo no ambiente, comércio,
Localização Geográfica: Hemisfério Sul, Oceano Atlântico etc. Francisco remata: “Fizemos estudos de
Área: 638.066 km2 mercado. Apren­de­mos muito...”
Número de habitantes: 37.000.000 Habitantes É extremamente interessante ver como
Repartição da população: 70% Urbana, 30% Rural alunos dife­ren­tes, em anos diferentes, se
Esperança Média de vida: 80 anos entregam inteiramente ao projecto e vão
Moeda: Turos (1ς = €1.20) dando continuidade a uma ideia inicial
P.N.B. por habitante: ς 72.000 que, pelos vistos, tem tido pernas para
Produtos de exportação: andar.
Ouro, pedras preciosas, produtos e serviços
Idioma Oficial: Português Onde tudo começou!
Outros Idiomas: Inglês e Espanhol A um canto da sala, junto a Alexandra Forte,
Grupos étnicos: Latinos, Americanos e Europeus encontra-se Manuel Pedroso, um dos fundadores
Religiões: Todas do projecto que, hoje, aluno de engenharia, veio
fazer o balanço destes três anos de projecto e
44 45 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

avaliar em que medida a ideia inicial – criação de um país que correspondesse


a todos os valores da UNESCO em matéria de desenvolvimento sustentável
– tem sido desenvolvida.
Tanto Alexandra Forte como Manuel Pedroso se sentem orgulhosos dos
caminhos trilhados pelos diferentes grupos que se têm envolvido no projecto,
cuja qualidade foi reconhecida pela UNESCO, sendo apresentado por esta
como um exemplo de uma boa prática a nível mundial de Educação para o
Desenvolvimento Sustentável. Este projecto já foi apresentado em Espanha,
A IDEIA INICIAL no Instituto Severo Ochoa, no México, às escolas associadas da UNESCO, e
em Portugal, a várias escolas secundárias.
Este projecto foi elaborado no âmbito
da área curricular de Área de Projecto
do 12.º ano e visou a Educação para o Era uma vez quatro amigos,
Desenvolvimento Sustentável. A ideia da
ilha surgiu com o intuito de promover o André, o João, o Filipe e o Manuel,
a sustentabilidade a vários níveis
(económico, social e ecológico), visto
curiosos, arrojados e determinados
podermos construir um novo Mundo com
novas leis que respeitem a igualdade,
a justiça e a solidariedade, ou seja, um
Mundo melhor para todos. O conceito Tudo começou a partir da criação de uma história. Afinal foi a construção
de sustentabilidade foi-nos apresentado
através do projecto Escolas Associadas de uma ficção que transformou o quotidiano de alunos, desde 2006 até à
da UNESCO e de imediato quisemos dar actualidade, numa realidade de aprendizagens enriquecedoras.
o nosso contributo para que os jovens de
hoje possam reflectir acerca do Mundo
Um país imaginário. Era uma vez…
actual e imaginar como poderia ser um
Mundo diferente através da nossa ilha. Era uma vez quatro amigos, o André, o João, o Filipe e o Manuel, curiosos,
Um Mundo em que as gerações futuras arrojados e determinados, que pensaram que seria possível, nos inícios do
possam ter os mesmos recursos que as século XXI, criar um país em que todos tivessem qualidade de vida, o ambiente
actuais. Pessoalmente, sempre pensei
fosse preservado e a herança deixada aos vindouros fosse melhor do que aquilo
que o projecto teria repercussões no
futuro ao nível escolar, mas com grande que encontraram. Talvez uma ilha fosse uma ideia mais interessante. Então, à
entusiasmo verifico que se estendeu não semelhança dos navegantes da era dos descobrimentos, fizeram-se ao mar à
só  à escola como também à comunidade, procura de uma ilha que tinha emergido na sequência de um terramoto de
levando assim a nossa mensagem mais
longe. dimensões nunca antes sentidas a nível mundial, lá para os lados da Argentina.
E estes navegantes do século XXI descobriram uma ilha deserta...
Manuel Pedroso Empenharam-se numa colonização especial, com povos de diversas etnias e
(aluno do 12 º ano
várias nações. Aspiraram a um país independente, construído com base no
de 2006-2007)
melhor de cada sociedade do Mundo, tendo a sua moeda, a sua bandeira,
as suas leis e o seu próprio sistema económico e social, regendo-se por
um conjunto de princípios e valores de solidariedade, justiça, igualdade,
liberdade, etc. Em suma, um país criado e desenvolvido segundo todos os
domínios da sustentabilidade.
Neste país imaginário só se utilizaria energia limpa (solar, hídrica e eólica), água
dessalinizada ou das chuvas e transportes eléctricos. Praticava-se agricultura
biológica e as indústrias existentes seriam não poluentes.
Nesta ilha o consumo teria de ser regrado e as receitas
maiores que as despesas. Então Siscoália seria uma ilha
sustentável!

Como Siscoália cresceu…


O que fazer ao longo dos anos? Quais as prioridades? UM PROJECTO PARA A DÉCADA

O grupo fundador estabeleceu as linhas gerais, organizou


No âmbito da área curricular de Área de Projecto do ensino
política e administrativamente o país e criou as infra- secundário (12.º ano), foi implementado em 2006/2007, na
estruturas fundamentais. Escola Secundária Dr. Ginestal Machado (Santarém), um projecto
intitulado Siscoália: A Ilha Sustentável, que visa a sustentabilidade
em todas as suas vertentes.
Um grupo de quatro alunos (André Simões, João Rebelo,
Filipe e Manuel Pedroso) teve conhecimento do conceito de
sustentabilidade através das orientações do projecto das Escolas
Associadas da UNESCO, do qual a professora de Área de Projecto
(Maria Alexandra Forte) era coordenadora. Este grupo de alunos
baseou-se na ideia de um Mundo sustentável e decidiu criar uma
ilha virtual no oceano Atlântico que obedecesse a esse conceito.
Criaram uma nova nação sustentável com novas leis, novas
infra-estruturas e com um novo sistema económico e social.
Assim, foi criada uma possibilidade de os alunos reflectirem num
leque variado de assuntos, tais como: igual acesso à educação e a
cuidados de saúde, um sistema social solidário e justo, fontes de
energia renováveis, um sistema económico sustentável e viável e
um consumo regrado.
O primeiro grupo de alunos a dar continuidade ao Este projecto foi apresentado a nível nacional e internacional para
projecto dedicou-se à sustentabilidade a nível social, promover uma consciência sustentável a nível global, interagindo
criando uma cidade multicultural – Orbis – onde assim com a comunidade e outras escolas. Os resultados deste
projecto foram muito positivos, pois este perdurou, não ficando
todas as etnias viviam em harmonia. Onde todos eram
estanque e confinado ao ano lectivo de 2006/2007, estendendo-se
respeitados nas suas diferenças. até ao presente ano lectivo.
O grupo seguinte envolveu-se na vertente ecológica, Assim, um grupo diferente de alunos, todos os anos, acrescenta
criando um carro solar e utilizando as energias renováveis algo de valioso à ilha, com ideias criativas e um compromisso
colectivo de implementação da sustentabilidade. Já se
como única fonte energética da ilha. A preservação do
percorreram alguns pontos deste conceito: em 2007/2008 foi
ambiente da ilha foi o principal propósito do grupo. criada uma cidade multicultural (Orbis), dando destaque à
O grupo deste ano dedicou-se então à área económica, vertente social; em 2008/2009 foram implementadas na ilha as
com a criação do ecoturismo como fonte de rendimento energias renováveis e uma rede de transportes movida a energia
solar, explorando-se assim a parte ecológica.
da ilha. No presente ano lectivo, um novo grupo de alunos está a criar
E para o futuro? Alexandra Forte afirma: “Para o ano um sistema económico viável e sustentável, implementando o
a proposta é o consumo. Vamos ver se as raparigas se ecoturismo na ilha. Este projecto facilitou ainda a aprendizagem
de novas competências no âmbito das Tecnologias da Informação
envolvem, porque, para pena minha, até à data só se
e Comunicação, pois foi necessário utilizá-las em sala de aula
envolveram neste projecto rapazes.” :: para criar as imagens virtuais da ilha. E ainda, através de um jogo
como o SIMS City, os alunos puderam criar as maquetas virtuais a
1
A utilização deste jogo de simulação no desenvolvimento 3D da cidade, da rede de transportes, energias renováveis, e este
deste projecto mostra como a imaginação e a criatividade na ano lectivo criar as maquetas das estâncias turísticas.
selecção dos recursos não intencionalmente educativos podem
estar ao serviço das aprendizagens. Maria Alexandra Forte
46 47 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Na sala de aula

Um projecto à medida dos alunos


“Qual é o vosso papel? Têm 30 minutos para pensar num projecto que contribua
para tornar o Mundo onde todos vivemos mais sustentável.” Este foi o desafio
lançado aos doze alunos do segundo turno da turma do 9.º A por João Paulo,
professor da disciplina de Ciências Naturais, na escola EB 2,3 Dr. José Pereira
Tavares, de Pinheiro da Bemposta.
Texto de Helena Skapinakis
Fotografias de Jorge Padeiro

stress!” Os três rapazes gostam da ideia e imediatamente Daniel


Magalhães justifica porque é que os alunos sofrem de stress: “Há
No início da aula, o professor envolvera a turma numa troca muitos testes na mesma semana!” “Por vezes até no mesmo
de ideias, onde esclareceram o conceito de “desen­vol­vimento dia!”, queixa-se logo de seguida Daniel Murça. Questionando-
sustentável” e procuraram pistas para perguntas como: O que se sobre a origem desse stress, os jovens decidem investigar se
é a qualidade de vida? A promoção da saúde é importante é apenas consequência da vida escolar, ou se a vida familiar
para a qualidade de vida? Quais as estratégias para viver com também tem influência.
qualidade de vida? Qual a relação entre a nossa qualidade de
vida e o ambiente que nos rodeia? Como manter o conforto,
mas travar o excesso? Como pro­duzir menos lixo? Como
reciclar?
Apesar de as respostas dadas serem as esperadas, era neces­
sário clarificar como todos aqueles aspectos que se discutiam
eram abrangidos pelo conceito de desen­volvimento
sustentável. No entanto, o objectivo daquela aula não era
uma mera troca de palavras: o professor queria espicaçar os
alunos e levá-los à acção. “Qual é o vosso papel? Em grupos,
devem pensar num projecto que envolva a comunidade e
contribua para a promoção da saúde e qualidade de vida
e, consequentemente, para o desenvolvimento sustentável.
Muito importante: deve ser exequível e ter prazos definidos.”
Como ponto de partida, o professor distribui pelos três
grupos que se formaram exemplos de notícias com acti­vi­
dades que envolveram a comunidade. Rapidamente, a troca A mesa do lado é a mesa só com raparigas e elas deba­tem
de ideias invade a sala, enquanto os jovens res­pondem ao ainda que tema escolher e como o abordar. “E se fizés­semos
desafio. uma campanha onde se pudesse trocar lixo por alimentos? As
pessoas trazem pilhas e troca-se por um quilo de arroz”, lança
Uma aula em acção Fátima. Alexandra sorri e tem outra ideia: “E se fizéssemos
O grupo da Catarina, do Fábio, do Daniel Murça e do Daniel uma campanha para ensinar os idosos a separar o lixo?”
Magalhães procura inspiração nos textos distribuídos. Com Filipa tenta dar resposta à colega: “Muitas vezes as pessoas
uma notícia na mão, Catarina comenta: “Nesta fala-se de não fazem a separação porque não têm ecoponto perto da sua
rastreios. Vieram fazer exames gratuitos à população.” Mas casa.” Ana Cata­rina tinha estado em silêncio, mas faz ouvir a
a jovem não fica por aqui e partilha com os colegas a sua sua voz: “E se fizéssemos panfletos sobre isso?”
ideia: “Nós podíamos fazer um inquérito na escola sobre o João Paulo circula pela sala, dando espaço aos alunos para
48 49 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

ensaiarem as suas ideias. “Se usarem panfletos, não estão


É preciso pensar nos detalhes
vocês também a fazer lixo?”, comenta quando se aproxima
das jovens. O professor prossegue, relembrando-lhes o
finais dos projectos para serem
início da aula, onde criticaram a venda de produtos que apresentados à turma.
trazem desnecessariamente uma dupla embalagem, e deixa-
lhes, então, sugestões: “Podem, por exemplo, pen­sar como parte de fora da escola é rápido!” “E se forem todos a limpar
reutilizar esses panfletos. Ou transmitir essa infor­ma­ção ainda é mais rápido”, acrescenta Daniela. Falta, porém, criar
num saco de pano.” um nome para este grupo. Sem hesitar, os jovens começam
então a lançar siglas para o ar, enquanto se divertem com as
possibilidades de interpretação que estas sugerem.

Os retoques finais
Acompanhando de perto o desenrolar dos trabalhos, o
professor dá as últimas sugestões a cada grupo. Todos já
olha­ram para os relógios e sabem que o tempo da aula não
pára. É preciso pensar nos detalhes finais dos projectos para
serem apresentados à turma.
Os jovens que escolheram o tema do stress decidiram
aplicar os inquéritos no terceiro período, antes dos exames
nacionais, e divulgar os resultados no átrio da escola,
embora Catarina realce que estão agora preocupados com
outro aspecto: “É preciso também apresentar medidas de
No entanto, as jovens não estão satisfeitas. Já decidiram combate.” No entanto, o professor, que entretanto se tinha
que querem trabalhar a questão da separação do lixo, mas aproximado, provoca-os com uma simples questão: “Como
não era bem assim que se imaginavam a agir e não queriam vão envolver a comunidade?” Os alunos trocam olhares
contribuir para produzir mais desperdício. Continuam, entre si, sem saber como responder.
então, entre si, a pensar num projecto à sua medida. As As jovens que desenvolviam o projecto da separação
palavras do professor ao apresentar a tarefa estão bem pre­ do lixo tinham também chegado a uma conclusão. Ana
sentes: o projecto pode ser pequeno, mas deve ser exequível, Cata­rina explica: “Vamos criar uma apresentação com
ou seja, elas devem ser capazes de efectivamente o realizar. imagens chocantes de lixo existente na escola e na zona,
O grupo da Daniela, Cátia, Eduardo e Carlos está mais acompanhadas de frases apelativas, para sensibilizar as
avan­çado. Querem contribuir para a preservação da escola, pessoas.” Como queriam dar visibilidade à apresentação,
criando um grupo que limpe os espaços exteriores, uma ou iriam projectar essas imagens no átrio da escola para todos
duas vezes por mês, depois das aulas. Para aliciarem volun­ verem. “E no fim relembramos como se deve separar!”,
tários, pensaram oferecer um lanche no final. “Para eles não conclui Fátima.
se fartarem, podemos variar a recompensa ou, pelo menos, Carlos, do grupo da limpeza da escola, apresenta, orgulhoso,
ir mudando o lanche”, propõe Daniela. a sigla que inventaram: “PAE: Protecção Ambiental Escolar!”
Ao ouvir a ideia destes alunos, João Paulo sorri: “Ainda bem Mas o grupo tinha tido mais ideias e Cátia dá os detalhes:
que as aulas acabam cedo!” Carlos explica porque é que “Para o lanche, pede-se apoio às empresas e os nomes dos
esse pormenor é tão importante: “É que aqui, às cinco, no volun­tários são divulgados.” Entusiasmada, Daniela reforça
Inverno, já é noite.” Eduardo intervém, sentindo que isso não a explicação: “É para dar uma recompensa aos alunos que
é impedimento para que o projecto ganhe asas: “Mas limpar a par­ticipam no projecto!”
É tempo de partilhar os projectos
Faltam dez minutos para a aula acabar. O professor
relembra: “O vosso projecto deve ter uma estrutura que
se aplique a qualquer escola. Não se trata ape­nas do que
vocês, 9.º A, podem fazer, mas do que qualquer turma pode
também desenvolver. Muito bem! Chegou o momento de
cada grupo apresentar o projecto à turma.”
JOÃO PAULO EM DISCURSO DIRECTO
O grupo da Filipa avança primeiro. Explicam aos colegas
a sua ideia de projectar no átrio imagens chocantes
O ensino das ciências reveste-se, obrigatoriamente, de
relacionadas com o lixo que não foi devi­damente tratado. uma componente cívica e de sensibilização ambiental que
Um dos colegas, atento, aproveitou para lembrar: “Quando não pode ser descartada. Se, por um lado, muitos temas
os pais vierem buscar as notas à escola, podem ver o do currículo nos podem facilmente encaminhar para os
trabalho!” Alexandra continua: “E pode ser projectado para temas da preservação ambiental, da gestão sustentável dos
os que vêm ter aulas à noite.” O projecto sobre o stress foi recursos naturais, enfim, do desenvolvimento sustentável,
também melhorado como uma sugestão do Eduardo: “Se por outro lado, os alunos são sensíveis a estas questões e
fizerem esses inquéritos também no segundo perío­do, respondem prontamente, disponibilizando-se a ajudar ou
podem depois comparar os resultados com os inquéritos mesmo a dinamizar actividades, quando são estimulados,
aplicados no final do ano.” Finalmente, o último grupo, desafiados e/ou provocados.
Há, no entanto, diferenças de escola para escola que não
através de Eduardo, apresenta o projecto do PAE.
podem ser ignoradas quando se pretende desenvolver
Já em conversa tranquila na sala de professores, João
um projecto. Na condição de professor contratado, tenho
Paulo comenta a aula. Explica que percebeu que alguns
mudado de escola anualmente e comparo os alunos de
projectos, aparentemente, se afastaram da questão da
escolas de meios rurais e de meios urbanos. Não apenas na
promoção da saúde. Na aula seguinte, pretende regressar resposta aos estímulos, na literacia informática ou na forma
aos trabalhos e debater como é que aquela questão, na de interagir, mas também na sensibilidade em relação ao
verdade, está presente. Pensa também que quando os meio ambiente e aos recursos naturais.
alunos apresentarem por escrito os projectos, num O aluno de meio rural não tem grande preocupação com
exercício que os obrigará necessariamente a explicitar os a poluição atmosférica provocada pelo tráfego rodoviário,
objectivos que pretendem atingir, irão reflectir e perceber mas é sensível à pobreza ou à problemática dos fogos e da
de que forma estão também a contribuir para promover a destruição de habitats pela construção desordenada. Já o
qualidade de vida e a saúde. aluno urbano está mais preocupado com a gestão dos lixos,
No entanto, o seu objectivo para aquela aula era que, a poluição sonora e visual, o estacionamento desordenado e
a violência.
em 30 minutos, os alunos conseguissem pensar numa
Os projectos que se podem desenvolver a nível nacional
actividade concreta, dentro da temática abordada. O
ganham com estas diferentes realidades e sensibilidades,
professor esperava que desta forma se apropriassem
quando se constituem em redes de escolas e se assumem
do projecto que conceberam e se entusiasmassem com
como um espaço próprio onde se complementam as
a ideia de contribuir para tornarem o meio onde vivem ideias e as acções desenvolvidas. A divulgação e avaliação
mais sustentável. Só assim passariam efectivamente à de projectos congéneres tornam-se, desta forma,
acção. Apesar dos desvios, considera que os trabalhos dos fundamentais, por permitirem a criação de materiais
alunos eram “exequíveis e adequados à realidade escolar que podem ser partilhados e reutilizados, em articulação
e social em que vivem”. Por isso, conclui: “As propostas vertical e horizontal, ou que podem mesmo ser adaptados e
responderam às minhas expectativas.” :: apropriados por diferentes escolas.
50 51 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Repórter na escola

“VAMOS PROTEGER!”
Alunos dos 5.º e 6.º anos de escolaridade, em pequenos grupos, mostram como se
contribui para o desenvolvimento sustentável no Clube do Ambiente da Escola
Francisco Ornelas da Câmara, em Praia da Vitória, Açores: portáteis com imagens
a passarem, livros especializados em fauna e flora espalhados sobre a mesa e olhos
atentos, absortos e cheios de energia, que pesquisam sobre plantas e animais.
Texto de Manuel Carvalho Gomes
Fotografias de Ana Maria Bettencourt

De onde vem a curiosidade dos alunos? O inte­


resse em conhecer e preservar o ambiente? É
preciso voltar atrás, a um momento muito espe- Estes pequenos momentos são marcantes na
cial na memória destes jovens. É impossível não vida dos alunos. Os seus gestos assumem outra
sorrir perante o entusiasmo com que mostram as dimensão, quando vêem que a contribuição do
fotografias e contam a história daquela ave que seu clube marca a diferença, neste caso salvando
foi protagonista nas suas vidas. Algumas dessas a vida de uma ave. Sentem que vale a pena tomar
fotografias estão nos seus telemóveis e retratam o uma atitude e empreender uma acção.
momento em que devolveram um cagarro ao seu Álvaro Areias, o coordenador do clube, comenta
meio natural. Este, baptizado carinhosamente que estas situações são frequentes e servem de
de Chiuauá, tinha caído durante a noite no pátio inspiração para os alunos. A Catarina, por exem­
da escola, devido ao encandeamento pelas luzes. plo, escreveu um pequeno conto onde narra a
No dia seguinte, os alunos do clube levaram-no, aventura de duas crianças que salvaram uma
numa caixa própria, para a beira-mar, onde o família de cagarros. Intitulado “Vamos proteger”,
depo­sitaram com mil cuidados. O Chiuauá foi o texto ganhou o 1.º prémio nacional do concur-
foto­grafado em várias poses, como um verdadeiro so Jovens Escritores Modelo, da Texto Editores,
modelo, e depois de ter feito algumas proezas de na categoria ambiente, em 2009. Mas
surf sobre as ondas do mar, levantou a participação destes alunos na
voo e lá foi ele... vida escolar também se alte­
rou, como explica Octávia
com orgulho: “Nas aulas de
Ciências da Natureza, por
exemplo, quando se fala
do ambiente, somos nós,
os alunos do clube, os
que damos respostas mais
completas.”
Uma aposta sem fronteiras comportamentos que esperavam moti- Por vezes, até pedem a chave do clube
No entanto, para além das transfor­m­a­ var, na escola e em casa, quando cria­ e vêm mais cedo: todos sabem o que
ções que são visíveis na escola, é tam- ram o clube, no ano lectivo de 1994/95. devem fazer.
bém importante o conhecimento que os Acrescenta que era uma aposta da esco­
alunos adquirem no clube e que levam la a longo prazo: “Ia ao encontro da Não há só melros e erva
para casa, porque este vai, consequente- minha percepção de que a Educação Neste dia, o trabalho que realizam tem
mente, contribuir para alterar os com- Ambiental era um poderoso meio de um sabor especial: antecede uma saída
portamentos dos que vivem com eles. A formação para a cidadania.” O clube foi de campo. Os jovens fizeram as suas
Gabriela, que, segundo os colegas, nesse assim constituído com o objectivo prin- investigações sobre a fauna e a flora e
dia estava “com as pilhas carregadas”, cipal de sensibilizar os seus elementos e estão prontos para apresentar os resul­
afirmou: “Todos os alunos da escola a comunidade escolar para as questões tados das pesquisas.
deve­riam pertencer ao clube do ambien­ ecológicas que afectam e condicio­nam No início da sessão do clube, Álvaro
te, porque aprendemos coisas que a vida no Planeta e para a necessidade Areias tinha-lhes apresentado o traba­
depois­podem ser aplicadas em casa!” de se participar, de forma empenhada e lho: “Hoje, vamos primeiro identificar
Filipe acrescenta: “Eu, no sítio onde esclarecida, na defesa e conservação do plantas e aves endémicas dos Açores
moro, recolho em baldes a água da chu- ambiente natural dos Açores. recorrendo a bibliografia especializada.
va que escorre pelas telhas para a utili- Os alunos desenvolvem várias activi- Depois vamos seleccionar as que são da
zar na rega das plantas. É uma forma de dades de pesquisas e saídas de campo. ilha Terceira, mas que não constam do
poupar e a água da chuva é melhor para Envolvem-se com entusiasmo nas acti­ nosso banco de imagens, e fazer uma
as plantas do que a água da torneira.” vidades propostas e, no clube, como lista com elas, para as poderem identi-
Ao ouvir Filipe e os colegas, Álvaro referem, não é preciso o professor obri- ficar e fotografar mais facilmente nas
Areias esclarece que este era o tipo de gar ninguém a estar atento à matéria. saídas de campo.”
52 53 Dossier Educação para o Desenvolvimento Sustentável

As saídas de campo são momentos


No entanto, os jovens não param por aqui e querem con-
importantes: permitem articular a
tinuar a trabalhar. Assim, terminada a apresentação dos
resultados da pesquisa, discutem a preservação do priôlo. teoria e a prática.
É um tema ao qual eles são sensíveis, porque esta ave é a
espé­cie mais ameaçada da Europa e só vive numa área res­
trita em S. Miguel. Debatem então o projecto Life Priôlo Verdes são os campos
para estudo e conservação desta ave e encerram mais uma No dia seguinte, tal como fora previamente combinado,
sessão do clube com uma mensagem: “Para a tua vida durar, alguns alunos do clube realizaram uma saída de campo à
do ambiente deves cuidar!” zona geomorfológica do Pico Alto. A saída é orientada por
Paulo Barcelos, presidente da Associação dos Montanheiros,
e conta com o apoio logístico de Luísa Brás, dos Serviços de
Ambiente da Terceira. Ocupado na escola com as suas tare-
fas quotidianas, Álvaro Areias não acompanha os seus alu-
nos. No entanto, estes mostraram-se entusiasmados, aten­tos
e intervenientes e acompanham a visita com um caderno
de campo, que foi elaborado pela Secretaria Regional do
Ambie­nte.
No início do percurso, dirigem-se à nascente do Pico Alto e
observam espécies pertencentes à vegetação natural da ilha
Terceira e espécies introduzidas, algumas delas considera-
das invasoras, como as silvas e a roca-de-velha. Paulo Barce-
los chama a atenção para a capa­cidade de retenção de água
das turfeiras de musgão e para a sua importância no sistema
hidrológico. Atento à expli­ca­ção, Pedro Lima “experimen-
tou” uma espécie de desporto radical: escorregar no solo
Antes de os alunos saírem, Álvaro Areias explica que as tarefas lamacento. Todos riram. Aproveita-se para se abordar a ne-
propostas são sempre recebidas com atenção e todos­ sabem cessidade de se seguirem as regras de segu­rança adequadas
que as saídas de campo são momen­tos importantes. Estas às características de cada itinerário ambiental.
permitem-lhes articular o que pesquisam com a reali­dade que Durante o percurso, os alunos observam as árvores que os
os envolve: articular a teoria e a prática. Por outro lado, dá- rodeiam: possuem folhas perenes, características da floresta
-lhes igualmente a posssibilidade de se familiariza­rem com o laurissilva típica dos Açores e, consequentemente, com um
património ambiental dos Açores, e em especial da ilha Ter- baixo risco de incêndio. Paulo Barcelos alerta para a neces-
ceira, visitando locais­que a maior parte não conhece. No caso sidade de preservação destes espaços: “Nós estamos numa
de Pedro Pereira, por exemplo, este aderiu­ao clube por querer ‘floresta museu’, restrita à região dos arquipélagos da Madei­
conhecer as aves e as plantas, referindo: “Para mim, antes, era ra, Açores, Canárias e Cabo Verde. Na Madeira, é conside­
tudo melros e erva!” rada, desde 1999, património da Humanidade.”

O banco de imagens do Clube do Ambiente possui fotografias digi­tais que foram, muitas delas, registadas pelos alunos em
saídas de campo para estudar a biodiversidade. Destaque-se que algumas mereceram o reconhecimento da Universidade
dos Açores, que as utilizou no seu Portal da Biodiversidade, que pode ser consultado em
http://www.azoresbioportal.angra.uac.pt/
O sítio do clube está disponível em http://clubambientefoc.no.sapo.pt/
com informação sobre as suas publicações nos domínios da flora e da avifauna dos Açores
A­o longo da visita, os alunos respondem às questões que o orientador colo- Álvaro Areias visto à lupa
ca e têm também oportunidade de mostrar o que sabem. Para concluir a Álvaro Areias, gestor de toda esta energia, é
questão da bio­diversidade, Paulo Barcelos detém-se diante de uma planta ao mesmo tempo professor de Português e
muito conhecida e explica: “A hortênsia é uma espécie invasora trazida do de História e coordenador do Programa Eco-
Japão há 150 anos. Mas está actualmente com um programa de con­­trolo por Escolas.
No clube, os alunos dizem que ele é “fixe”,
ser fortemente competitiva.”
pois não “briga” com eles.
Nos encontros de ambiente onde tem
“parecem brindeiras”
participado, ao princípio, todos pensam que
No domínio da geodiversidade, o maci­ço do Pico Alto mostra a grande varie-
é professor de Ciências. Depois reconhecem
dade de rochas da ilha Terceira. Num campo de escórias, observa-se a bagaci- que, pelo facto de ser professor de Português,
na, pedra-pomes, obsidianas (vidro vulcânico) e bombas vulcânicas. Ao longo a sua relação com o ambiente tem mais
da visita, Paulo Barcelos tinha chamado a atenção para o facto de não poderem “alma”.
levar nada do que viam para casa: “Este é um espaço que deve ser respeitado.”
No entanto, aqui há muitas rochas e na mão da Ana Carolina é depositado
cuidadosamente um exemplar destas bombas, que é levado para enriquecer
o espólio do clube. Pedro Pereira aproveita para comentar: “Parecem “brindei-
ras!” E, para a reportagem, acrescenta: “É um bolo típico da ilha Terceira, que
parece um pão e que é oferecido como brinde nas festas.”
Em jeito de conclusão, entusiasmado com o desempenho habitual dos alu-
nos em qualquer saída de campo, mesmo sem a sua presença, Álvaro Areias
comenta que o contacto com a Natureza é essencial para fortalecer a ligação
Quanto à responsabilidade
com o património que pertence a todos. E termina, acrescentando que as
social, assumida no âmbito das
suas próprias moti­vações têm origem no facto de ter sido criado em con- questões ambientais, o próprio declara:
tacto com a Natu­reza, “numa terra onde abundam as nascentes e a água cris- “Não hesitarei em afirmar que o meio onde
talina ainda corre nas ribeiras, numa terra onde se avistam as montanhas nasci, cresci e sempre vivi terá tido um
cobertas pela floresta nativa dos Açores e onde o mar é uma constante”. :: papel determinante na génese da minha
sensibilidade ecologista e das preocupações
Nota: A saída de campo foi realizada no âmbito do projecto Cidadania e Sustentabilidades que tenho desde sempre manifestado pelas
para o Século XXI: Caminhos para Uma Comunidade Sustentável nos Açores, financiado questões que dizem respeito à preservação
pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento. do nosso património natural.”
54 55 Reflexão e acção

Como usar canções


na aula de línguas
A utilização de canções nas aulas de línguas pode constituir
uma ferramenta útil para tornar as aulas mais atraentes
e motivadoras para os alunos, cativando a sua atenção e
facilitando a memorização dos conteúdos, através do recurso
a materiais autênticos, essenciais para transmitir uma
língua viva.
Texto de Pedro Miguel Dias
Agrupamento de Escolas de Ferreira do Alentejo
Ilustrações de Dinis Mota

O
uvir música é uma das actividades de tempos livres preferidas pelos jovens,
havendo quem lhe dedique até 40 horas por semana, aproximadamente o
mesmo tempo consagrado à escola. Muitos autores falam da importância
de usar música em contexto educativo e abundam os artigos e capítulos
de livros com metodologias para aplicar essa técnica ao ensino das línguas e de outras
disciplinas.
Importa definir que tipo de música iremos utilizar com os nossos alunos. Há autores
que defendem o recurso à música clássica, mas essa não deverá ser a nossa única
opção: pode ser usada para criar ambiente ou como motivação para a escrita, mas há
todo um leque de actividades que dependem de usarmos música associada a texto, um
requisito natural numa aula de línguas.
Existem ainda métodos de ensino com canções adaptadas ao nível de aprendizagem
dos alunos e estruturadas espe­ci­ficamente para ensinar certos conteúdos, mas poder-
se-ia objectar que essas canções não permitem o efeito de fami­liaridade quando os alu-
nos reconhecem um tema que já ouviram na rádio ou na Internet, além de não serem
mate­riais autênticos, essenciais para transmitir a língua viva.
Assim, e dada a preferência dos jovens pela música pop e rock, consideramos que esta
poderá ser uma ferramenta útil, desde logo por poder tornar as aulas menos monóto-
nas e manter a atenção dos alunos ou poder ser utilizada como “artefacto mnemónico”,
facilitador da memorização.
Globalmente, e excluindo a formação musical propriamente dita, pode­mos falar de qua-
tro tipos de utilização pedagógica para uma peça musical:
actividades distintas e combináveis en-
tre si. Apresentam-se a seguir algumas
sugestões de actividades possíveis, com
destaque para o ensino de um determi-
nado conteúdo linguístico ou cultural.
a) Para controlar a duração de uma actividade: os alunos têm até ao fim da peça Esta proposta de tipologia poderá natu-
escolhida para terminar a realização dessa actividade – uma forma de controlar ralmente ser corrigida e alargada.
o evoluir da aula mais motivadora e menos geradora de tensão;
b) Para criar ambiente: o professor escolhe uma peça musical como motivação para 1. Actividades antes de ouvir a
ou ilustração de um conteúdo a leccionar; por exemplo, um compositor do século canção:
XVI numa aula sobre Camões; ou para criar uma dinâmica específica dentro do > Prever vocabulário usado a partir do
grupo (acalmar, dar energia, etc.); título, artista ou género musical;
c) Para recompensar os alunos: o professor cede uma parte da sua aula para ouvir uma > Prever conteúdo a partir da melodia;
peça musical, no que poderá ser um momento mais descontraído da mesma, assi- > Prever conteúdo a partir de uma il-
nalar uma ocasião especial (um aniversário, uma efeméride, o final de um período ustração;
lectivo) ou marcar uma pausa numa sequência de actividades mais exigentes; > Procurar informação sobre o artista
d) Para ensinar um determinado conteúdo linguístico ou cultural: o professor in- ou sobre dados presentes no texto;
troduz uma peça musical para, nomeadamente, treinar uma estrutura gramatical, > Discutir lista de referências
exemplificar uma modalidade do discurso ou apresentar uma tradição local. culturais, de vocabulário ou de
expressões­relevantes fornecida
Como se depreende, a música pode marcar presença em diferentes momentos de pelo professor.
uma aula, mesmo fora do âmbito estrito da disciplina de Educação Musical, em
56 57 Reflexão e acção

Estas actividades são concebidas para preparar os alunos


para aquilo que vão ouvir, através de imagens, listas de te-
mas, palavras ou expressões fornecidas pelo professor e que
a turma analisa em conjunto, discutindo o seu significado. 3. Actividades de correcção de erros:
As tarefas podem também servir para activar vocabulário que > Corrigir erros gramaticais ou sintácticos, depois
os alunos já possuam ou para treinar a sua capacidade de pre- ouvir para verificar;
visão a partir de alguns dados, pedindo-lhes que especulem > Ouvir e corrigir ao mesmo tempo.
sobre o conteúdo de uma canção baseando-se em pistas como
um fragmento da melodia, o nome do artista, o O professor fornece uma transcrição do texto com erros (por
género musical ou o título da canção. exemplo, palavras trocadas ou verbos mal conjugados), os alu-
O professor pode colocar determinadas nos corrigem-na antes de a ouvirem, aplicando activamente
questões: “Temos uma canção de heavy regras de coerência gramatical, de construção sintáctica ou de
metal, qual será o tema?”, “Esta canção coesão textual, ou corrigem a letra enquanto ouvem a canção,
fala de amor; que palavras treinando o reconhecimento da pronúncia das palavras.
acham que farão parte
da letra?”, etc. 4. Actividades de reorganização da letra da canção:
> Por versos;
> Por estrofes;
> Por segmentos narrativos;
> Pela rima.

A reconstrução da letra, anterior a ou simultânea com a escuta


desenvolve a capa­cidade de apre­ensão do sentido global do tex-
to e de reconhecimento do significado de palavras e expressões
2. Actividades para desenvolvimento e da pronúncia. O professor pode, designadamente, fornecer o
da pronúncia, prosódia e entoação: texto com os versos trocados e os alunos devem organizá-los de
> Ler o texto em voz alta; acordo com o que ouvem.
> Dramatizar a leitura do texto;
> Repetir a pronúncia de palavras ou expressões a 5. Actividades de identificação
partir da gravação; de expressões ou campos lexicais:
> Cantar juntamente com a canção; > Sem texto: anotar ou assinalar a ocorrência de dadas
> Cantar com ou sem acompanhamento instrumental; palavras;
> Transcrever a letra; > Com texto: ler e sublinhar;
> Fazer ditado. > Dar palavras em português, para as encontrar em
inglês no texto;
Tratando-se de peças musicais com um texto, as canções > Encontrar no texto antónimos ou sinónimos de pala-
podem servir para modelar a pronúncia, a prosódia ou a en- vras dadas.
toação de frases ou de segmentos de discurso, tanto numa
língua-padrão como nas suas variantes nacionais, regio­nais Os alunos desenvolvem o seu vocabulário e o reconhecimen-
ou sócio-culturais (calão, por exemplo). to da pronúncia ao registar ou assinalar (com um gesto, por
Ler o texto em voz alta, repetir, cantar com ou sem acom- exemplo) a ocorrência de palavras que obedeçam a um dado
panhamento instrumental podem ser alternativas viáveis às critério (profissões, verbos, etc.). Em alternativa, podem for-
práticas mais clássicas. Ditados ou exercícios que levem os necer-se aos alunos sinónimos ou antónimos, ou os equiva-
alunos à transcrição total ou parcial do texto treinam ainda lentes dessas palavras noutra língua (palavras em português,
o reconhecimento das palavras, da pronúncia e ortografia. para encontrar em inglês no texto, por exemplo).
6. Actividades de preenchimento de espaços:
> Ouvir e preencher;
> Dar instruções para o preenchimento, ouvir para corrigir;
> Escolher a resposta correcta; Os jovens podem ainda trabalhar as frases do texto, modi­
> Completar versos ou estrofes: ficando-as de acordo com as estruturas estudadas (por
– em função da gramática; exemplo, passando frases do discurso directo para o dis-
– em função da rima; curso indirecto).
– em função da lógica narrativa;
– em função do contexto. 8. Actividades para exploração de informação
cultural:
O professor fornece uma transcrição do texto a que faltam pala- > Identificar, analisar e investigar:
vras ou expressões. – datas e acontecimentos históricos;
Os alunos completam a letra enquanto ouvem a canção, treinando – nomes;
o reconhecimento da pro­nún­cia e a ortografia; ou completam-na – dados geográficos;
antes de ouvirem a canção, aplicando activamente as regras da – festividades e tradições;
língua, ouvindo depois a canção para corrigirem as suas respostas. – calão e variantes nacionais, regionais ou
O professor pode fornecer pistas formais (“a palavra em falta rima sócio-culturais da língua.
com o final do segundo verso”) ou gramaticais (“pre­enche com o
verbo work no present con­ti­nuous tense”). Uma canção pode incluir referências a pessoas, locais,
datas­, acon­te­cimentos históricos, tradições e dados geo­
7. Actividades para exploração do conteúdo textual: gráficos, tudo isto a explorar pelos alunos. Por exemplo,
> Decidir se afirmações são verdadeiras ou falsas; “A great day for freedom”, dos Pink Floyd, pode ser o pon-
> Responder a perguntas sobre o texto; to de partida para um trabalho sobre a queda do Muro de
> Escolher a resposta certa; Berlim; ou o instrumental “Aljubarrota”, dos portugueses
> Seleccionar informação no texto; Quinta do Bill, o ponto de partida para uma investigação
> Justificar afirmações com informação do texto; sobre o contexto e as consequências dessa batalha.
> Interpretar o texto; É ainda possível analisar variantes dialectais, regionais
> Modificar o texto. ou nacionais de uma língua, por exemplo comparando
canções portuguesas e brasileiras ou inglesas e ameri-
A letra de uma canção é um texto, passível de ser trabalha­do canas, ou analisando as expressões típicas do Porto
em contexto de sala de aula exactamente como um poema, um presen­tes nas canções de Rui Veloso.
conto ou um texto jornalístico.
Os alunos podem explorar a informação textual recorrendo
à tipologia de exercícios usual para qualquer outro
texto: preencher espa­ços ou quadros com
informação, indi­car se frases são
verdadeiras ou falsas, inter­
pretar afirmações do
texto, etc.
58 59 Reflexão e acção

9. Actividades para desenvolvimento Como se vê, são inúmeras as actividades possíveis: prever
da expressão escrita: o fim dos versos; continuar a canção ou escrever uma
> Prever a terminação de versos ou estrofes letra­ alternativa; escrever sobre o conteúdo da canção,
– em função da gramática sobre­a relação entre letra e melodia, sobre o artista, sobre
– em função da rima o género musical; comparar versões diferentes da mesma
– em função da lógica narrativa canção (por exemplo, “Os Senhores da Guerra” interpre-
> continuar a letra da canção; tada pelos Madredeus e pelos Moonspell); responder a
> responder a questões colocadas pela canção; perguntas colocadas pela canção (por exemplo, quando
> discutir relações com outros textos Joan Osborne canta “What if God was one of us?”); dis-
> outras canções com abordagens opostas ao mesmo tema cutir a relação da can­ção com outros textos (por exemplo,
> textos jornalísticos “Fast Car” de Tracy Chapman e um artigo de jornal sobre
> textos literários: o desemprego) ou com outras artes (uma canção e um
directamente relacionados com a canção filme, um poema ou romance, um quadro); etc.
com a mesma temática da canção
> discutir relações com outros meios (pintura, vídeo, teatro, 10. Actividades para debate oral na turma:
cinema…); > Sobre a apreciação individual da canção;
> descrever a canção > sobre aspectos temáticos da canção;
– aspectos musicais (ritmo, instrumentos utilizados, tom, > sobre aspectos culturais referidos na canção;
etc.) > sobre questões gramaticais;
– personagens > sobre aspectos linguísticos ambíguos;
– tempo e lugar > sobre as relações da canção com outros textos;
– história > sobre as relações da canção com outros meios;
– temática > sobre o género musical.
– linguagem utilizada
– emoções ou sentimentos sugeridos A canção pode servir de motivação para debates envol-
> realizar trabalho de pesquisa vendo toda a turma, permitindo aos alunos desenvolver
– sobre o artista ou banda a sua capa­ci­dade de raciocínio e de argumentação. Pode
– sobre aspectos temáticos da canção discutir-se qual­quer questão linguística ou cultural já
– sobre aspectos culturais referidos na canção referida ou partir da música para questões mais vastas
– sobre questões linguísticas (por exemplo, debater a imagem da mulher numa canção
> escrever uma letra completamente nova sobre a mesma base e num vídeo como “Candy shop”, do rapper 50 Cent). Uma
instrumental mesma canção pode alimentar vários temas: “Gangsta’s
> comparar versões da mesma canção por artistas diferentes Paradise”, de Coolio, aborda a violência urbana, os gangs,
– diferenças na interpretação a falta de expectativas dos jovens e o abandono escolar
– diferenças no texto precoce; a canção tem várias expressões coloquiais e am-
> escrever uma carta bíguas, como “Lyin’ in chalk”, que podem ser analisadas
– ao artista pelo grupo para determinar o seu significado; a
– a um personagem do texto canção foi o tema prin­cipal da banda
– a outra pessoa que tenha ouvido a canção sonora do filme Dangerous
> redigir composição Minds
– sobre a canção
– sobre o artista
– sobre o género musical
– sobre a música em geral
Os alunos ilustram a letra e/ou a melodia da canção, recor-
rendo a dese­nhos, pintura, colagens ou outros meios. Podem
depois expor e com­parar as diferentes interpretações obtidas.
/ Mentes perigosas, pelo que pode levar ao visionamento do Podem ainda observar imagens fornecidas pelo professor e co-
filme e a um debate sobre a relação dos jovens com a escola e mentar a relação entre a peça musical e essas imagens.
o seu próprio futuro.
13. Outras actividades:
11. Actividades de tradução do texto: Durante a escuta:
> Traduzir com dicionário; > Dançar;
> Corrigir uma tradução automática; > Dramatizar o texto;
> Comparar diferentes traduções; > Actuar em playback.
> Analisar falsos cognatos presentes no texto; Depois da escuta:
> Analisar expressões coloquiais e calão. > Transpor estruturas estudadas para novos contextos;
> Cantar letra alternativa com a mesma melodia;
O texto pode ser traduzido, na totalidade ou parcialmente, > Escrever uma mnemónica usando a mesma melodia;
com ou sem recurso ao dicionário. Os alunos podem corrigir …
ou comentar traduções feitas por um tradutor automático ou Trabalhos de projecto:
por outras pessoas, ou comparar as soluções adoptadas por > Elaborar um “cancioneiro” da turma (com ou sem
tradutores diferentes: por exemplo, foram publicados dois tradução);
livros com traduções distintas de poemas de Leonard Cohen, > Organizar um coro da turma;
que os alunos poderiam analisar. Seria ainda possível partir > Elaborar um exercício a partir de uma canção, pelos
das traduções para reflectir sobre questões linguísticas como alunos, para ser resolvido pelo resto da turma.
os falsos cognatos (false friends) ou o uso do calão. …

12. Actividades de ilustração do texto Os alunos podem ainda realizar actividades mais lúdicas como
e/ou da melodia: cantar (com ou sem acom­pa­nhamento), dançar ou fazer play-
> Os alunos produzem ilustração (desenho, back, usar a melodia para escrever uma mnemónica com maté­
fotografia, vídeo…); ria escolar, dramatizar o texto, escrever versões alter­nativas da
> Os alunos recortam ilustrações de canção ou usá-la como ponto de partida para o trabalho da aula,
revistas e jornais; aprofundando os temas abordados, ou para trabalhos de pro-
> Os alunos relacionam o texto com imagens jecto. Por exemplo, organizar um concurso de karaoke ou fazer
fornecidas pelo professor. um cancioneiro da turma, com as suas can­ções preferidas. ::

Bibliografia
ADACHI, Tetsuko (1991). A Musical Approach to Listening Comprehension: Using Popular Songs in an ESL Classroom. Mem. Fac. Educ. Miyazaki Univ. Hum.,
69, pp.1-9.
American Academy of Pediatrics (Dezembro 1996). “Impact of Music Lyrics and Music Videos on Children and Youth”. Pediatrics, 98, 6, pp. 1219-1221.
CRANMER, David e LAROY, Clément (1998). Musical openings: using music in the language classroom, Longman.
EKEN, D. K. (1996). “Ideas for using songs in the English language classroom”. English Teaching Forum, 34(1), 46-47.
ILARI, Beatriz ( Jan./Abr. 2006). “Música, comportamento social e relações interpessoais”. Psicologia em Estudo, 11(1), pp. 191-198.
LEMS, Kristin (Março 1996). “For a Song: Music across the ESL Curriculum”, apresentação no Annual Meeting of the Teachers of English to Speakers of Other
Languages. http://www.eric.ed.gov/ERICDocs/data/ericdocs2sql/content storage 01/0000019b/80/14/92/91.pdf – Consultado em 8/01/2009.
McLean, Alan C. (1983). “Rock as literature: Springsteen’s ‘The River’”. English Teaching Forum, 21, 3, 43-45.
MEDINA, Suzanne L. (2002). “Using Music to Enhance Second Language Acquisition: From theory to Practice”. http://www.forefrontpublishers.com/eslmusic/
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MOI, Claudia Ferradas (1994). “Rock Poetry: The Literature our Students Listen To”. http://www.njcu.edu/cill/vol2/moi.html – Consultado em 12/01/2009.
PALHEIROS, Graça Boal (2004). “Funciones y modos de oír música de niños y
adolescentes, en distintos contextos”. Revista de Psicodidáctica, 17.
PURCELL, John M. (1992). “Using Songs to Enrich the Secondary Class”
http://www.cervantesvirtual.com/servlet/SirveObras/02494943103138163754491/p0000015.htm – Consultado em 14/01/2009.
RAUSCHER, F. H., SHAW, G., & KY, K. (1993). “Mozart and spatial reasoning”. Nature, (365) 611.
60 61 Meios e materiais

O meu livro de
política

Jorge Sampaio
Texto Editores (2009)

Uma obra útil e singular que, para além de constituir a desejada


iniciação política, permite também um melhor conhecimento da
história recente de Portugal e de um dos seus principais protagonistas.
“... quando eu tinha 9 anos, um dia, no Inverno, ia conceitos como os de política, Estado, nação,
na rua com o meu pai, que era médico, e reparei Constituição, separação de poderes, democracia,
num grande cartaz todo rasgado, atirado para um vários tipos de governo ou cidadania, sempre com
canto, com um senhor que eu nunca tinha visto (...) exemplos recentes de Portugal e do Mundo.
que parecia estar ali a pedir «não me esqueçam», e A sua intenção, a sua finalidade? Reafirmar a política
perguntei: como “acção esclarecida ao serviço da comunidade, na
- Ó pai, quem é aquele? defesa dos cidadãos e do interesse geral” e promover
- É o general Norton de Matos. (...) a cidadania, porque “sem cidadãos, a política é uma
- Mas quem é ele? – insisti. Mas tive de adiar a minha casa vazia”.
curiosidade, porque ele só me disse, um pouco Esta “cidadania declina-se em vários modos e tem
apressado, «depois explico», e olhou para os lados, de ser redimensionada em função das realidades
como se fosse uma das personagens das histórias d’O do nosso século”, porque, “para além de sermos
Mosquito (...) com medo de que algum espião estivesse nacionais de um determinado Estado, e de sermos
por ali a rondar...” ou não europeus, de sermos do género masculino ou
É assim, através da recordação terna de conversas feminino, de sermos novos ou velhos, somos todos,
com o pai, que Jorge Sampaio, Presidente da antes de mais, cidadãos do Mundo, iguais em direitos
República Portuguesa de 1996 a 2006 e pertencente a e dignidade”.
“uma geração de mudança”, vai propondo aos jovens Uma apresentação da União Europeia e dos seus
de 6 a 14 anos uma iniciação à política. órgãos, um excurso sobre “Portugal no Mundo” e
Entre “as torradas em casa da avó” e uma consulta a defesa da língua portuguesa “para a construção e
do pai no Estoril, entre o jogo Portugal-Inglaterra reforço da identidade, para o exercício da cidadania
no Estádio do Jamor e a aprovação da Declaração plena e para a ampliação da nossa intervenção num
Universal dos Direitos do Homem na Assembleia das Mundo globalizado” constituem a última parte deste
Nações Unidas, entre “um desgosto do tamanho do manual de educação cívica sob a forma de “conto
Mundo” e as correcções linguísticas da mãe, entre as falado” que termina com um apelo aos seus leitores:
recordações de Baltimore e as de Hyde Park, Jorge “Contribuam para que Portugal se orgulhe de vocês!” ::
Sampaio vai explicando, com simplicidade coloquial, M.E.B.S
Livro + CD Áudio Sítio

Portal Insafe
Vamos Cantar os clássicos!
http://www.saferinternet.org
Catarina Molder
Editorial Caminho (2009) O acesso à Internet é cada vez mais universal. A Internet
14,90 e proporciona o acesso a recursos e serviços, facilita a
De uma grande vontade de levar a canção erudita até às comunicação e permite a diversão. A sua utilização segura
crianças nasce a obra Vamos Cantar os Clássicos! é fundamental e deve ser uma preocupação de todos.
Catarina Molder convida as crianças a ouvir algum do repertório Preocupação que não pode ficar de fora da escola e é um
mais emblemático deste género. O toque especial deste trabalho tópico importante para a disciplina de Formação Cívica, como
reside no facto de as canções serem interpretadas em português, aliás está previsto para o 5.º ano.
uma mais-valia para um belo serão passado em família! Recentemente foi lançado o Portal Insafe (http://www.
O CD inclui canções dos mais variados compositores, passando saferinternet.org) no âmbito do Programa Safer Internet, da
pelos portugueses Carrapatoso, Delgado e Lopes-Graça. A Comissão Europeia. Neste sítio encontramos uma descrição
autora, acompanhada ao piano por Francisco Sasseti, dá voz dos projectos nacionais dos diferentes Estados-membros da
a todas as canções, começando por as apresentar de forma UE e temos acesso aos respectivos sites/portais e aos recursos
divertida, para que os ouvintes percebam melhor a canção. Para aí disponibilizados. Nestes sítios a exploração dos principais
além das belas ilustrações, o livro contém as letras e pequenos assuntos relacionados com uma navegação segura é feita
textos que introduzem cada uma das canções. a partir de recursos dinâmicos como pequenos vídeos que,
Desde a canção de embalar de Brahms às famosas Truta e mesmo sendo em língua estrangeira, podem constituir um
Rosinha do Prado de Schubert, passando pelo Lied alemão e a excelente ponto de partida para uma discussão em sala de
mélodie francesa com Fauré e Poulenc, fazem ainda parte desta aula sobre temas como os riscos da publicação de fotos online,
viagem canções luminosas e surpreendentes como o musical de ciberbullying, assédio, ética online, direitos de autor, etc.
Gershwin e a música de sabor brasileiro de Waldemar Henrique. O blogue associado a este portal permite aos interessados
Sozinhas ou acompanhadas pelos pais, as crianças têm a manterem-se actualizados nas temáticas relacionadas com a
oportunidade de conhecer belas obras musicais da chamada segurança na Internet.
música clássica, através de uma obra de elevada qualidade, Também referenciado neste portal, e especificamente
tanto ao nível das traduções dos textos como da expressividade dirigido à comunidade educativa portuguesa, existe o portal
envolvente da voz, em cumplicidade com o piano. www.seguranet.pt, onde pais, professores e alunos podem
Em contexto escolar, os docentes poderão desenvolver um encontrar informação e um conjunto de actividades interactivas
trabalho interessante de audição e interpretação vocal, em torno destas temáticas. Uma série de jogos organizados
instrumental ou corporal das peças musicais, apresentando de acordo com os ciclos de escolaridade permite aprender de
de seguida as respectivas obras interpretadas nas línguas forma divertida e é lançado um conjunto de actividades para a
originais. Como trabalho interdisciplinar, poder-se-á trabalhar comunidade educativa como ponto de partida para participar
os textos em inglês (ou francês), conhecer a obra integral de num concurso.
que faz parte uma canção, preparar uma apresentação pública Boas e seguras navegações!
de uma canção, pesquisar sobre a vida dos compositores... ::
Ana Paiva
Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular
Carlos Batalha
Escola EB 2,3 de Vialonga
62 63 Visita de estudo Museu do Trabalho Michel Giacometti

Visitar os três porquinhos...


no Museu do Trabalho
Michel Giacometti
Como dar a conhecer os diferentes núcleos
expositivos do Museu do Trabalho Michel
Giacometti a crianças pequenas? O serviço
educativo encontrou a solução, desafiando
os visitantes mais novos a transformarem-
se em personagens da história “Os três
porquinhos”... sem terem medo do lobo mau!
Texto de Elsa de Barros
Fotografias de Jorge Padeiro

Percorrer o Museu do Trabalho Michel Giacometti como quem visita as


casas dos três porquinhos, não escapando ao encontro com o lobo mau ao
longo do caminho, foi a solução encontrada pelo serviço educativo para dar
a conhecer o espaço museológico às crianças mais pequenas, de infantários, de
jardins-de-infância e dos 1.º e 2.º anos do 1.º ciclo.
À partida, não parecia tarefa fácil encontrar uma forma cativante de convidar
os mais novos a visitarem os diferentes núcleos expositivos do museu, mostran-
do-lhes o espólio recolhido por Michel Giacometti e a reconstituição do espaço da
antiga fábrica conserveira, com as diversas fases do trabalho dos operários, desde a
chegada da sardinha proveniente da lota até à expedição da lata de conserva.
A animação “E se o lobo aparece...”, baseada na história “Os três porquinhos”,
funciona como o fio condutor para levar os mais novos a visitarem os diferentes
núcleos expositivos do museu, à medida que são convidados a entrar nas casas de
Museu do Trabalho cada um dos porquinhos, desde a casa de palha à de tijolo, passando pela casa de
Michel Giacometti madeira.
Largo Defensores Na peugada dos pequenos visitantes, segue o lendário lobo, um lobo esfomeado
da República, Setúbal que, afinal, não é assim tão mau e está apenas a precisar de uma boa ensinadela
Tel.: 265 537 880 para aprender a não entrar em casa dos porquinhos sem ser convidado.
museu.trabalho@mun-setubal.pt Será que as crianças do Jardim-de-Infância Sonho de Criança, da Junta de
Visitas guiadas, gratuitas, Freguesia do Pinhal Novo, vão ser capazes de dar essa ensinadela ao lobo, en-
sob marcação quanto visitam as casas dos três porquinhos, ou seja os três núcleos expositivos do
Museu do Trabalho?
1. Quem quer
brincar às escondidas?
“Bom dia!”, cumprimentam os três
porquinhos, antes de se apresentarem
aos pequenos visitantes do Museu do
Trabalho. “Eu sou o Cícero e a minha
casa fiz de palhinha”, diz o mais novo
dos irmãos, com ar brincalhão e
despreocupado. O segundo porquinho
entra em cena, afirmando: “Eu sou o
Heitor, fiz a minha casa em madeira e
tenho-a sempre muito limpa.” Já só falta o
terceiro porquinho, que fala em tom sério
e sensato: “Sou o Prático, gosto muito de
Um salto para dentro da história trabalhar e a minha casa fiz em tijolo.”
dos três porquinhos, em quatro etapas Feitas as apresentações, os três
porquinhos lançam o desafio: “Quem
Tudo começa com um convite para as crianças do Jardim-de-Infância Sonho de quer brincar às escondidas?” As crianças
Criança, com dois e três anos, brincarem às escondidas com os três porquinhos aceitam a proposta com entusiasmo e
que aparecem, de repente, à entrada do Museu do Trabalho Michel Giacometti, entram, como por encanto, dentro do
fazendo os mais novos arregalarem os olhos de espanto. conto tradicional, transformando-se
A visita à casa de palha, guiada pelo mais novo e estouvado dos três por­ em personagens da história, com um
quinhos, serve de pretexto para contactar com a colecção etnográfica Michel importante papel no desenrolar dos
Giacometti, que possibilita a reconstituição da vida rural existente há umas acontecimentos.
décadas, através da exposição de alfaias agrícolas e de objectos de uso quoti­ Mas, para tal, é necessário meterem
diano. pernas ao caminho, escadas acima,
A Mercearia Liberdade, com as prateleiras e os balcões construídos em ma- escadas abaixo, aprendendo a enfrentar o
deira, é o cenário ideal para a casa do porquinho do meio que, enquanto medo e o lobo mau, a conhecer as casas
apresenta a sua habitação, mostra aos pequenos visitantes os produtos que dos porquinhos e o espólio do museu,
eram comercializados no tempo dos seus bisavós, chamando a atenção para a enlatar sardinhas... e a dar um final
os instrumentos de medida das vendas a granel, para as balanças e caixas feliz à história da qual acabam por ser as
registadoras de outros tempos. principais protagonistas.
O espaço da antiga fábrica conserveira, com as grandes bancadas de pedra “Uuu... Uuu... Uuu...”, parece que se ouve ao
onde se enlatavam as sardinhas, serve de morada ao porquinho mais velho, longe o uivar de um lobo. Será que vale a
o mais trabalhador e sensato dos três irmãos, que revela às crianças os segre- pena arriscar? A curiosidade é mais forte
dos da indústria de conservas, à medida que concebe uma estratégia ardilosa do que o medo e as crianças dão início à
para alterar o comportamento do lobo mau, ensinando-o, de uma vez para narrativa, ao entrarem na casa de palha a
sempre, a não entrar em casa dos porquinhos sem ser convidado. convite do porquinho mais novo.
64 65 Visita de estudo Museu do Trabalho Michel Giacometti

03
02

01
3. Entrar numa mercearia
de antigamente, na casa de
madeira
“ele é pequenino” e corrige: “Serve As crianças só param de correr à porta
para passar a ferro.” O porquinho da casa de madeira, onde o porquinho
aproveita para esclarecer que a avó do meio as espera, tranquilizando
2. Viagem ao tempo dos colocava carvão dentro do ferro, que Francisco, que faz beicinho com medo
avós na casa de palha tirava da lareira com a ajuda de uma do lobo mau: “Não tenham medo,
“Gosto de descansar e de me tenaz. que o lobo não entra aqui! A minha
espreguiçar!”, confessa o porquinho Com grande orgulho, o porquinho casa de madeira é mais segura. Para a
mais novo, enquanto se enrosca num apresenta o seu bebé Abílio que dorme fazer, fartei-me de trabalhar, carreguei
molho de palha, colocado à entrada de sossegado numa caminha de palha e tábuas, preguei pregos...”
casa. “A minha casa é bem fofinha e conta que acabou de fazer uma sopa Já mais confiantes, as crianças ouvem
tem muitas coisas velhinhas, do tempo de grão para ele comer. Mas assim que a explicação do porquinho, seguindo
dos avós. Querem ver?”, pergunta, se menciona a sopa de grão, ouve-se com o olhar a direcção para onde ele
convidando as crianças a entrarem em o uivar do lobo que se aproxima cada aponta. “Estão a ver estas prateleiras
sua casa. vez mais e, sem se fazer anunciado, muito altas? Fui eu que as construí
Já dentro de casa, o porquinho vai já está à porta de casa do porquinho, e tive de fazer aquele escadote para
buscar uma forquilha e pergunta às queixando-se: “Estou cheio de fome! poder chegar lá acima”, prossegue
crianças se conhecem aquele objecto. Está a apetecer-me uma sopa de grão!” o porquinho, enquanto as crianças
Os mais novos, na verdade, não sabem “Temos de fugir!”, avisa o porquinho observam os artigos existentes na
qual o nome da alfaia agrícola, mas perante a ameaça, e as crianças correm mercearia do tempo dos bisavós,
Francisco constata que “tem dentes”. atrás dele pelos corredores do museu. entre os quais se contam conservas,
Mais à frente, o porquinho segura bolachas, farinha e sabão.
num ferro de engomar antigo e Satisfeito com a obra feita, o porquinho
questiona os visitantes: “E isto, sabem convida as crianças a visitar o seu
o que é?” “É um ferro”, responde escritório, onde lhes mostra o cofre-
Tomás, uma das crianças mais novas forte, a secretária e a máquina de
do grupo. “Serve para regar as flores”, escrever, destacando o armazém que
acrescenta. Beatriz, pouco mais velha, fica logo ao lado, atulhado daquilo a
explica do alto dos seus três anos que que chama “um monte de coisas velhas”.
de conservas, aproveitou para reconstruir o edifício com tijolos e cimento
e, entretanto, aprendeu com as operárias como se enlatavam as sardinhas.
Vendo o interesse das crianças na sua narrativa, propõe: “Querem aprender
a fazer conservas?” A resposta é um entusiasmado coro de “sins”.
Aproveitando a vontade de colaborar dos mais novos, o porquinho mais velho
propõe um plano para dar uma lição ao lobo: “Vamos fazer conservas e, se o
lobo vier aqui, damos-lhas todas para ele comer. Ele vai ficar tão, tão cheio, que
nunca mais entra em nossas casas para almoçar sem ser convidado. Boa?”
As crianças não podiam achar a ideia melhor e ficam muito atentas à

04
explicação para aprenderem a fazer conservas. O porquinho dá uma lata
e quatro sardinhas de borracha a cada uma e ensina como devem ser
colocadas: duas sardinhas em baixo e duas em cima, viradas ao contrário,
para ocuparem menos espaço.
Depois de devidamente esclarecidos, os pequenos visitantes metem mãos à
O aparecimento do lobo à porta do obra e num instante dão por terminada a sua tarefa. O lobo pode chegar a
escritório vem desviar o centro das atenções, qualquer momento e não há tempo a perder! O uivar do lobo a aproximar-
voltando a assustar Francisco, que aperta se causa uma grande excitação, agora que as crianças estão preparadas para
a mão da educadora com força. Uivando colocar o plano em prática. “Ele julga que é muito esperto, mas vai ser muito
de fome, o lobo reclama mais comida, mas bem enganado”, ri-se o porquinho mais velho, com ar trocista.
explica que não é assim tão mau, porque
não comeu a sopa toda, teve o cuidado de Tal como previsto, o guloso do lobo comeu as sardinhas todas e, no fim,
deixar um bocadinho para o bebé, e agora ficou muito mal disposto. “Prometes que não andas mais atrás de nós e
até se contenta com um ratinho pequenino. destes meninos?”, questiona o porquinho mais velho. “Prometo, prometo!”,
O porquinho do meio e as crianças assegura o lobo, agarrado à barriga. “Olha que se voltares a ser maroto
chegam a um acordo com o lobo: este vamos buscar estes meninos à escola para nos ajudarem!”,
deixa-as sair da casa de madeira e, a adverte o porquinho mais velho, propondo, por fim,
seguir, pode entrar para comer o ratinho. que todos festejem a recente amizade com uma grande
Assim que se vêem fora de casa, as roda. Tudo está bem quando acaba bem! ::
crianças não arriscam e... pernas para
que vos quero, para casa do porquinho
Outras visitas guiadas
mais velho, onde talvez se possam sentir,
finalmente, seguras! Introdução ao Museu do Trabalho: Para alunos do 5.º
ao 12.º ano, inclui visita a todos os espaços do mu-
4. Aprender a fazer sardinhas seu, com explicação do funcionamento da antiga fábrica
conserveira e apresentação das três colecções patentes ao
em conserva, na casa de pedra público.
O porquinho mais velho descansa as Mercearia Liberdade: Para todas as idades, conta com a presença de uma
crianças, já depois de estas estarem a salvo personagem da época que propõe a comparação entre os produtos do tempo dos
bisavós e os da actualidade, a exploração dos cheiros e das formas, bem como o
dentro de sua casa: “Não se preocupem desenvolvimento de noções matemáticas, a partir das caixas de medidas e das
que a minha casa é muito forte! Olhem só balanças de dois pratos iguais.
para verem como construí a minha casa: é Mundo Rural (Colecção Etnográfica Michel Giacometti): Para todas as idades,
centra-se na exploração das alfaias agrícolas, acompanhada pela dramatização
de tijolo. Rodrigo, toca aqui e diz como é
dos movimentos do trabalho do campo, pela audição dos sons recolhidos por
que é o tijolo.” Rodrigo não se faz rogado Giacometti e pelo visionamento de filmes.
e afirma, tocando no tijolo: “É duro, forte Indústria conserveira (da lota à lata): Para todas as idades, pressupõe a vivência de
e pesado.” um dia de trabalho na fábrica, no qual os visitantes participam vestidos de
operários, passando por todas a etapas de produção da indústria conserveira,
O porquinho conta que, quando saiu de
desde a chegada do peixe à fábrica até à saída do produto já enlatado. Inclui a
casa da mãe, foi viver para a antiga fábrica apresentação das profissões tradicionais de Setúbal ligadas à indústria conserveira.
66 67 Com olhos de ver

A moda, os modos,
de modo que...
Texto de Adelaide Borges
Coordenadora do Curso de Design de Moda da E. P. Magestil – Escola de Moda de Lisboa

M
uito se tem falado, estudado, conjecturado, sobre o fenómeno da moda,
força alimentadora de várias actividades económicas e profissionais
gerando lucros incomensuráveis.
O que faz impulsionar uma indústria que bianualmente se obriga a renovar
esteticamente, nos desfiles de prêt-à-porter, de haute couture, feiras do sector e imprensa
especializada, utilizando o fascínio da efemeridade a seu favor, propondo estilos,
seduzindo o consumidor, incitando ao desejo, traduzindo mensagens para vender o
produto?
A moda comunica numa linguagem não verbal, o estilo, a identidade psicológica e
social do individuo que a veste. Os seus significados resultam da intenção e expressão
do estilo do designer que a propõe e das múltiplas possibilidades de combinações
e interpretações por parte de quem veste e de quem a vê. Por sua vez, as pessoas
ao apropriarem-se desses significados adaptam-nos às suas próprias intenções, em
determinada época e lugares.
Assim, torna-se necessário que as reacções emocionais e psicológicas, explícitas ou
subliminares, que os diferentes vestuários causam em quem veste e a quem observa
sejam analisadas, entendidas e controladas no processo criativo de moda.
O design de moda, sendo uma das áreas do design, segue os seus fundamentos,
concebendo o produto de moda, vestuário ou acessórios, apresentando cores,
materiais, formas e efeitos, respeitando a sua função, adequando o produto ao
consumidor final, tendo em conta a sua exequibilidade técnica, apoiando a sua
viabilidade.
O processo metodológico consiste na mistura de peças e componentes de vestuário
conhecidos e testados, com uma nova e estimulante abordagem, gerando combinações
e produtos diferentes. A silhueta, a cor e a textura são os pontos-chave do design
de moda, manipulados em diferentes repetições e ritmos, de gradações, materiais,
padrões, detalhes e ornamentos.
Por fim, as novas propostas de roupa adquirem novas interpretações e ideias nas
imagens e identidade que cada marca difunde – em desfiles, catálogos, outdoors, sites,
editoriais de moda.
A moda comunica a todo momento percepções e significados e nós somos todos
ouvidos! ::
Sugestões de actividades

> Mostre a imagem aos alunos


e peça-lhes que:
1. Identifiquem a harmonia
cromática das peças.
2. Apontem analogias e
diferenças no vestuário
convencional masculino
3. Caracterizem as peças de
roupa.
4. Relativamente às
matérias-primas,
identifiquem o tipo de
tecido usado na camisa e
nas calças.
5. Definam a estação para
a qual é a proposta de
vestuário
6. Tendo em conta a atitude
e o acessório, traduzam as
mensagens que pretendem
ser comunicadas.
7. Que consumidor pretende
atrair? Sofisticado ou
rústico? Conservador,
informal ou vanguardista?
De que faixa etária? De que
mercado: baixo, médio,
médio-alto, alto?

> Proponha uma recolha


de imagens com um look
semelhante através de
pesquisa em revistas de moda
e no sítio www.style.com.
Não deixe de ler o próximo número!

Tema do dossier:
Educação para a Saúde
(n.o 81, 2010)

Se tiver sugestões de temas a abordar ou conhecer


práticas de escolas que considere importante divulgar,
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