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E
METODISMO
SÃO PAULO
ÍNDICE
PREFÁCIO
INTRODUÇÃO
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
PREFÁCIO
Li, com prazer, os originais deste livrinho. Por diversos motivos. Primeiro,
porque escritos por um companheiro de ministério, cujo curriculum vitae, vencido
até aqui, venho acompanhando desde o princípio. Depois, porque fruto de esforços
com que ele sempre vence nos empreendimentos que toma a peito, e da piedade
sincera e profunda que, como apanágio de seus dias, ele cultiva em termos
estritamente evangélicos. Enfim, porque campo cultural de suma importância para
nós, quando nos confrontamos com o dilema do “sim ou não,” em face do convite
que o Filho de Deus nos faz, tocante à redenção - campo cultural que ele lavra com
muita prudência e circunspecção.
Não podemos jamais negar que Deus predestinou muitas coisas para certas
esferas da vida humana, sobretudo no curso das coisas materiais. Assim, quem não
comer e beber, há de sucumbir, e quem, de grande altura, se lançar no espaço
desarmado de páraquedas, há de morrer ao tocar o solo. Isso, para não referir à
inalterabilidade dos grandes fenômenos físicos das estações, das luas, das chuvas,
dos raios, em que quase não podemos interferir, senão para nosso resguardo de
seus efeitos. Assim, deu Deus seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crê,
não pereça, mas tenha a vida eterna. Até aí vai a predestinação de Deus. Todavia,
comer e beber, como lançar-nos, de grande altura, ao espaço e, ainda, crer no Filho
Unigênito, é atitude que depende de nós. E aqui é que está nosso livre arbítrio,
nossa liberdade, seguidos de nossos deveres e conseqüentes responsabilidades.
Minhas observações acabaram por dar razão aos meus amigos missivistas,
levando-me a escrever as notas que ides ler. Trata-se de trabalho simples, sem
propósitos de erudição; coisa que nem de leve possuo. Quis torná-lo acessível ao
maior número de pessoas, para, assim, prestar melhor serviço. Limitei-me a meia
dúzia de páginas sobre cada capítulo, ou pouco mais, quando poderia escrever
centenas. Se me aprofundasse no estudo, faria obra volumosa, de maior custo e de
interesse, talvez, só para uma pequena elite. Em todo caso, as picadas ficam
abertas.
2. O INTERCÂMBIO COMERCIAL.
3. A VIDA SOCIAL.
4. A SITUAÇÃO POLÍTICA.
Um de seus erros mais graves foi o de querer extinguir pela força a influência
das idéias protestantes, já em franco progresso no seio do povo. Por essa causa, em
1523, dois frades agostinhos, respondem a inquérito em Bruxelas, sendo a seguir
queimados. São eles, Henrique Voes e João Esch, os dois primeiros mártires da
Reforma. Centenas de outros vieram depois. No mesmo ano surge o Novo
Testamento em holandês, traduzido de Lutero. Os germes do misticismo de Kempis
e de Wessel, se despertam. Reacende-se na alma dessa gente amante da liberdade o
desejo de conhecer a nova fé. Querendo Filipe apagá-la com mão de ferro, mais ela
se incendeia. Inquisição, execuções, emprego de força militar, tudo se torna em
vão. O povo se une, os nobres se arregimentam, marinheiros e pescadores se
convertem em terror para as hostes espanholas. A causa adquire foros de
nacionalidade. Combate-se o inimigo em terra e no mar. Pela pátria e pela fé
renuncia-se a tudo. Quando Leiden já não pode resistir ao sítio, Guilherme de
Orange manda arrombar os diques e inundá-la. Mas a vitória cabe, por fim, aos
nacionais. Em homenagem ao seu heroísmo, a cidade foi premiada com uma
universidade (1575).
5. O FATOR POLÍTICO-RELIGIOSO.
2. O PREPARO ESCOLAR.
Foram seis anos úteis os que Armínio passou em Leiden. Estudou Teologia,
Filosofia, Hebraico, Literatura e outras disciplinas, sempre com assiduidade, gosto
e aproveitamento. Seu exemplo tornou-se notório. Ministros do Evangelho e
autoridades civis se interessaram por ele. Novas portas se lhe abrem! Mandam-no
então a Genebra, a Roma do protestantismo, para cursar a universidade. A Câmara
do Comércio assumia a responsabilidade pela manutenção do estudante, o qual
entrava pela casa dos vinte e um anos por essa época.
Precisamos, no entanto, ser verdadeiros e dizer que, nessa época, suas novas
idéias já não se coadunavam inteiramente com as da Igreja Reformada. Mesmo
assim, continuava gozando da estima geral, tanto que, em 1594, as autoridades o
chamaram para colaborar no plano de reforma das instituições educativas locais.
Não era coisa fácil para Tiago Armínio deixar o seu rebanho. Amsterdã
queria-lhe bem, estando ele já identificado com os habitantes. E, além disso, nunca
aspirara a ser professor na Faculdade de Teologia. De outro lado, alguns colegas o
consideravam elemento perigoso à formação das novas gerações de ministros.
Armínio não podia ser culpado pelas idéias de outros, inclusive dos alunos,
mas seus contendores não pensavam assim e lhe atribuíam verdadeiros disparates.
Que fazer, então? Quando possível, chamava-os para uma conferência pessoal, de
modo a discutirem francamente o assunto em foco. Se alguém tivesse razões mais
fortes e coerentes, aceitá-las-ia porque seu desejo era descobrir a verdade.
Um desses detratores foi o clérigo Festes Hommius. Reuniram-se os dois,
convertendo-se aquele ao ponto de vista de Armínio. Outras vezes teve que sair a
público para se defender, ou comparecer perante as autoridades, ou ainda,
responder por escrito. Difamaram-no até no estrangeiro, especialmente na
Alemanha, França, Inglaterra e Savóia. Sem querer, despertavam interesse por suas
opiniões e o faziam conhecido.
Havia, de fato, diferença entre ambos, porque Gomarus dava toda a ênfase à
graça de Deus, mas negava o valor da fé como o elemento do lado humano. Armínio
procurava conciliar as duas coisas. Por fim o Conselho achou que a controvérsia
não era de muita importância. O essencial seria a tolerância mútua, desde que
houvesse bom espírito nos dois. Gomarus, porém, carecia deste sentimento, motivo
pelo qual muitos diziam: “É preferível comparecer perante o tribunal divino com a
fé do pastor Armínio do que com a caridade do teólogo Gomarus.”
5. O FIM DA JORNADA.
Viu-se obrigado, por isso, a retirar-se para a cidade natal e ali submeter-se
aos cuidados de um médico. Durante este lapso de tempo, os amigos traduziram
suas obras do latim para o vernáculo e escreveram algumas outras. O fogo da
controvérsia se alastrou mais intensamente, obrigando-o a comparecer de novo
perante as autoridades civis e a discutir, mais uma vez, com Gomarus, chefe dos
reacionários.
As discussões foram verbais, mas cada um teria que apresentar, depois, por
escrito, as suas razões, para ulterior decisão do Sínodo a convocar-se para breve. A
doença progrediu sem que os clínicos a pudessem atalhar. Para seus inimigos isto
constituía prova evidente de castigo divino. Os amigos, no entanto, lamentavam os
padecimentos de Armínio, o qual sofria tudo piedosamente e orava sempre pelos
seus e pela Igreja. Repetia com fervor Hb 13.20-21:
“Ora, o Deus da paz, que tornou a trazer dentre os mortos a Jesus nosso
Senhor, o grande Pastor das ovelhas, pelo sangue da eterna aliança, vos
aperfeiçoe em todo o bem, para cumprirdes a sua vontade, operando em vós
o que é agradável diante dele, por Jesus Cristo, a quem seja a glória para
todo o sempre. Amém.”
AS DOUTRINAS ARMINIANAS
Por mais original que alguém nos pareça, descobrimos, ao analisarmos suas
idéias que elas refletem um conjunto de fatores e circunstâncias. Nunca brotam
simplesmente da razão. Algo lhes estimulou o aparecimento. Isto para nada dizer
do muito que se recebe por herança, direta ou indiretamente. Foi assim com os
grandes pensadores, filósofos, moralistas, sociólogos, políticos, etc. E Tiago
Armínio se inclui nessa regra.
1. A RESPEITO DE DEUS.
2. QUANTO À PREDESTINAÇÃO.
Como conciliar tudo isso com a perfeição moral de Deus? Culpar ao homem
por falta que lhe fora determinada, seria injustiça, quando a justiça é um dos
fundamentos da glória de Deus. Nem Ele pode, por ato arbitrário de Sua vontade,
salvar ao injusto, como não pode condenar ninguém independentemente de sua fé.
Deus é sempre coerente consigo mesmo.
2 Newman, Albert Henry - A Manual of Church History, Vol II: pág. 339.
3. O HOMEM NO CONCEITO DE TIAGO ARMÍNIO.
4. O PROBLEMA DO PECADO.
Armínio estava longe de concordar com estas conclusões. Para ele o homem
era responsável também pela transgressão, e o pecado, um fato irrelutavelmente
real. Porque o homem era livre, pecara e, como pecador, merecia o castigo de sua
má escolha. Deus podia chamá-lo a contas. Ninguém Lhe pode imputar suas
próprias faltas. Cada um é senhor de seu destino. Aquele que se perde, perde-se por
culpa sua.
Para Armínio, o homem salvava-se não porque tivesse sido eleito, e sim ao
contrário. Por aceitar a Cristo como Salvador é que se tornava eleito. A eleição
decorre da identificação do pecador redimido com a obra do Filho eterno de Deus.
6. A OBRA DE CRISTO.
Já, de igual modo, se não podia afirmar tal quanto à doutrina calvinista. Por
ela, Cristo viera salvar aos que Deus de antemão escolhera para isso. Seu sangue
beneficiava a esses somente. Aos reprovados o sacrifício não aproveitava. A obra
expiatória limitava-se, por conseguinte, a um grupo apenas: os predestinados (para
a salvação). Mas, segundo a posição arminiana, a possibilidade da salvação existe
para todos e não depende de determinação (escolha) divina. A vontade humana é
fator “sine qua non”: Cristo redime aos que O aceitam como Salvador. Isto é: salva
aos que queiram ser salvos.
8. A PERSEVERANÇA MISTA.
Armínio parece ter sido mais consistente que os seus seguidores, visto que
eles deram maior ênfase à vontade e aos esforços do homem, com o que tendiam
para o pelagianismo. Foram, por conseguinte, ainda mais liberais do que o mestre.
5) Deus, por Sua graça, assiste ao crente e o ajuda a tudo vencer, caso deseje
o auxílio divino e não permaneça inativo.
A magna assembléia teve lugar na cidade de Dort durante sete meses (13
novembro de 1618 a 9 de maio de 1619), e nela estiveram presentes 84 teólogos e 18
delegados seculares. Diversos governos civis, onde o protestantismo do tipo
Reformado fora admitido, mandaram representantes: a Inglaterra, o Palatinado,
Hesse, Suíça e Bremen. Deixaram de comparecer os da França e Brandenburgo.
O ARMINIANISMO NA INGLATERRA
O ARMINIANISMO NA FRANÇA
2 Hagenbach, Dr. K. R. - A History of Christ. Doctrines - Vol III: págs 108, 109.
Todavia um discípulo, Claude Pajon, professor em 1666 na mesma escola,
não só continuou a sustentar as idéias de Amyraldus, mas avançou ainda mais,
ensinando que a operação do Espírito sobre o intelecto também se faz por meios
externos, tais como os evangelhos, as circunstâncias, etc.
O ARMINIANISMO NA ALEMANHA
Melanchton, não obstante, era quatorze anos mais novo do que Lutero,
provinha de família bem dotada e recebera educação mais aprimorada. Duas
pessoas, portanto, de idades e psicologias diferentes. Mas os dois se completaram.
A calma de Melanchton se contrapôs muitas vezes à impetuosidade de Martinho
Lutero, ao passo que o conservantismo do ex-monge de Wittenberg salvou o
companheiro de descambar com o seu liberalismo para situações perigosas, tal
como sucedeu em Augsburgo ao discutir com os teólogos romanos, por ordem do
imperador Carlos V, os termos da confissão doutrinária do protestantismo alemão.
Tão rígida posição soava mal até no seio da Igreja Reformada, revoltando a
indivíduos bem formados, como o teólogo Johannes Cocceius (1603-1669). Na
controvérsia que este manteve com Voetius, o governo teve novamente que se
envolver. Cocceius foi, também, um dos autores da Teologia Federal, cuja
finalidade era, outrossim, a de suavizar os rigores do calvinismo.
De tal tipo foi a religião que desde cedo ensinaram aos filhos. A disciplina
era rigorosa. Havia, no lar, regras para quase tudo. Mal começassem eles a falar,
decoravam o Pai-Nosso. As exigências da Igreja, de igual forma, deviam ser
conhecidas e praticadas. Em síntese: o casal Wesley expressava de modo concreto
aquilo em que cria: a justificação como resultado também do esforço individual.
Quando João Wesley saiu do lar pela primeira vez, para ingressar na escola
em Londres, a Charterhouse, levava bem fundas as marcas da educação doméstica.
Por algum tempo deixou de ser tão fervoroso, mas ainda lia as Escrituras, fazia
orações e comungava três vezes ao ano. Nem em Oxford, na universidade, se
afastou dos padrões que cultivara em casa; nem ainda sob o sopro do racionalismo
da época. E, no entanto, sabemos quão curiosa era sua mente, desejando sempre
saber a razão das coisas. Nunca, porém, abandonava um velho conceito, enquanto
não tivesse motivos seguros para deixá-lo. Muitas das modificações que depois nele
se operaram, foram o resultado de conflitos religiosos e não filosóficos, sobretudo
desde Aldersgate.
Quem sabe teria lido algo de Hooker e Baro? As obras de William Laud, de
Ralph Cudworth, e ignoramos quantos mais, estavam ao seu redor, nas livrarias e
nas bibliotecas. Além disso, muitos, dentro da Igreja, já haviam abraçado o
arminianismo. John J. Tigert, na introdução à obra de Caspar Brandt, sobre
Armínio, confirma o que por mais de uma vez temos dito: “Quando João Wesley
estava em Oxford, na terceira década do século dezoito, e foi ordenado diácono e
A resposta de Susana a João Wesley foi: “Essa doutrina, como mantida pelos
calvinistas rígidos, é muito horripilante, e deve ser odiada, porque diretamente
acusa ao Deus Altíssimo de ser o autor do pecado.” E acrescenta: “Penso que você
raciocina bem contra ela, porque é inconsistente com a justiça e a bondade de Deus
deixar alguém sob a necessidade física ou moral de cometer pecado e então puni-la
por ele.” Ela assevera que “Deus tem uma eleição, mas é baseada na Sua
presciência, e de modo alguma derroga (abole, anula) a livre graça de Deus, nem
prejudica a liberdade do homem.”
No Oráculo Ateniense, II, 101, escreveu: “Se Ele fizesse isso, a natureza do
homem seria destruída, os propósitos de recompensas e castigos seriam irônicos, a
pregação seria vã e vã, também, a fé.”
E noutra parte, diz: “Deus fez o homem reto e agente livre. A presciência de
Deus dirige a livre agência do homem, mas não a anula, salvando-o quando Ele
queira ou não, ou condenando-o injustamente.”6
3 Brandt, Caspar - The Life of James Arminius - Trad. Por John Guthrie - Nashville, Tenn. - Pág. 15.
4 Joy, James Richard - O Despertamento religioso de João Wesley - Imprensa Metodita - São Paulo -
Pág. 38.
5 Carta de 18 de agosto de 1725, in Teyerman - Life and Times of John Wesley, Vol. I, Pág. 40.
6 Oráculo Ateniesne, I, 58, citado por Cannon, Op. Cit., pág. 46.
Os eventos futuros viriam demonstrar até onde o pensamento dos pais
influiu na teologia de João Wesley, fundador e organizador do movimento
metodista.
8 - Nunca permitas, sob qualquer hipótese, que se passe um dia sem que
tenhas pelo menos uma hora para a tua vida devocional.
9 - Evita a paixão.
Outro livro que leu, nessa época, foi a obra sobejamente conhecida “A
Imitação de Cristo,” de Tomás Kempis, presente que lhe fez, segundo parece, a
jovem Betty Kirkham, irmã de um colega e sua admiradora. Wesley aprendeu,
através dessa inspiradora obra, que a religião é, acima de tudo, coisa do coração e
que a pureza da alma é essencial para o cristão. Ainda outros incentivos recebeu, no
sentido de cultivar a fé pelo zelo pessoal, como já vinha fazendo, mas agora
correndo o risco de se entregar à reclusão, perigo este que aumentou com a leitura
de novas obras da mesma natureza, tais como “A Vida de Deus na alma do
homem,” de Scougal, e especialmente as duas de William Law: “A Perfeição Cristã”
e “Chamado sério para uma vida devota e santa.” Isto sucedeu em 1727, bem depois
de sua ordenação na qualidade de diácono.
João Wesley ainda não estava contente com seu estado espiritual, mas
desejava prosseguir em seus esforços até o encontrar. A influência recebida de Law,
levaram-no a registrar no seu Diário: “Convenceram-me mais do que nunca da
absoluta impossibilidade de ser meio cristão; e eu determinei, pela graça divina,
devotar-me inteiramente a Deus, dar-Lhe minha alma, meu corpo e todo o meu
ser.”8
Tanto se enamorou dos ensinos de Law que, se não fora a realidade da vida e
os conselhos de pessoas experimentadas, João Wesley teria caído num pietismo
errôneo. Uma delas lhe disse, certo dia: “A Bíblia não conhece nada de religião
solitária.” Por isso, quando, em novembro de 1729, deixou a paróquia do velho pai,
onde o estivera auxiliando, e veio assumir seu posto de fellow (tutor) na
universidade, juntou-se ao Clube Santo, que o irmão organizara durante sua
ausência, dando-lhe todo o apóio, sem se descurar (descuidar, abandonar) de
visitar a presos, a enfermos e de ajudar os necessitados. Fazer o bem era tão
indispensável à fé como ler as Escrituras, praticar jejuns, orar ou utilizar-se dos
sacramentos. Wesley queria receber as bênçãos da expiação de Cristo por seus
próprios esforços.
por Cannon.
esperança de salvar minha própria alma,” explicava ele em carta de 10 de outubro,
quatro dias antes do embarque. Mas tanto na ida como na volta, como durante sua
estada ali, haveria de compreender que ninguém encontra paz, até que se renda a
Deus e confie nele tão somente, e que nenhum homem pode justificar-se por si
mesmo. Daí seu regresso à Inglaterra sob a impressão de fracasso!
4. A CONTRIBUIÇÃO DE ALDERSGATE.
Longe esteja de nós julgar que João Wesley não fosse um cristão verdadeiro
antes da experiência de 24 de maio de 1738, na rua Aldersgate. Sua conduta e seu
caráter provam o contrário. Contudo é inegável que algo de importante aconteceu
naquela memorável reunião. O coração de Wesley se aqueceu estranhamente, seu
pensamento recebeu novas luzes, sua vida inflamou-se com maiores poderes.
Passou a ter paz e a sentir-se seguro quanto à sua salvação. Sua teologia adquiriu
um sabor que não possuía antes. Não descambou, entretanto, para o monergismo
teocêntrico, julgando que tudo dependesse exclusivamente de Deus, pois ele bem
sabia de suas lutas para viver os retos princípios do Evangelho.
5. A CONTROVÉRSIA PREDESTINISTA.
Para João Wesley, “a graça é livre em tudo e livre para todos,” o que significa
dizer que é distribuída gratuitamente por Deus a cada pessoa. Não depende de
méritos humanos e nem se particulariza somente a uns tantos. A salvação, por
conseguinte, é de alcance universal, porque a graça foi posta à disposição de todas
as pessoas. Deus seria incapaz de decretar a salvação de uns e a condenação de
outros, porque isso é contrário à Sua natureza e à natureza do homem. Sim,
porque, se uns foram predestinados à ruína e terão necessariamente que viver no
pecado, a culpa por esse mal recai sobre o próprio Deus. O fato de se recusar Ele a
salvá-los, quando a outros concede o privilégio, nos deixa perplexos e nos induz a
conjecturas menos apreciáveis a respeito de Seus sentimentos. O Criador se rebaixa
a nossos olhos, pois mesmo limitados como somos, parece que seríamos incapazes
de agir de semelhante modo.
“Mas se dizeis que não pretendia salvar todos os pecadores,” prossegue João
Wesley, “que chama aos que não podem ir, então representais o Filho de Deus
zombando de suas necessitadas criaturas, por lhes oferecer o que jamais pretendia
dar. Vós o descreveis como dizendo uma coisa e fazendo outra e como praticante de
um amor que não possuía. Ele, em cuja boca não havia malícia, vós o fazeis cheio
de engano, vazio de toda e qualquer sinceridade. Dizes que podes prová-lo com a
Escritura. Acautela-te! Que queres provar com as Escrituras? Que Deus é pior que o
diabo? Não pode ser!”10
- Não, retrucou Wesley, preciso ser salvo por Cristo do começo ao fim.
- Confessais, então, que primeiro fostes despertado pela graça de Deus; não
sois , agora, de um modo ou de outro, guardado pelo vosso poder?
- Então? Deveis ser sustentado a cada hora e a cada momento por Deus,
tanto como a criancinha nos braços de sua mãe?
- Então, senhor Wesley, com vossa licença, vou embainhar minha adaga,
porque todo o meu calvinismo é isso; aí está minha eleição, minha justificação,
minha perseverança final. Aí está, em substância, tudo que creio e do modo como
creio. Assim, em lugar de buscarmos termos e frases que sirvam de fundamento e
contendas entre nós, unamo-nos, por favor, nestas coisas em que estamos de
acordo.”12
Admirável, sem dúvida, o espírito deste moço. Quem dera pudéssemos todos
compreender quão rico é o cristianismo para nele querermos bitolar a mente
humana. Isto nos tornaria mais tolerantes e simpáticos. É o que se nota, por
exemplo, no arminianismo, no metodismo e no calvinismo. Todos eles são sistemas
cristãos, dando um mais ênfase a certa doutrina do que os outros. Às vezes, no
entanto, as diferenças são mais de aparência. Apenas um caso: a importância que o
arminianismo metodista dá a graça de Deus, é fundamental em sua teologia, no que
muito se assemelha ao calvinismo; inúmeras pessoas, todavia, ignoram esta
verdade. Mas, de outro lado, existem diferenças profundas entre os dois, e até entre
o metodismo e o arminianismo, como se verá no capítulo seguinte.
12 Sermões de Wesley - Vol I, págs 125 e 126 - Imprensa Metodista - São Paulo.
A quantos desejam inteirar-se com segurança da teologia wesleyana,
recomenda-se especialmente o exame das Atas das primeiras Conferências do
metodismo inglês (Doctrinal Minutes) que, juntamente com os Sermões de Wesley
e suas Notas Sobre o Novo Testamento, além dos “Vinte e Cinco Artigos,” por ele
redigidos em 1784, para a novel Igreja Metodista, da América, constituem o melhor
repositório de informações relativamente à mencionada teologia. Esses Artigos
nada mais são que uma síntese dos “Trinta e Nove,” da Igreja Anglicana,
escoimados (livres), porém, de elementos calvinistas ou, se quisermos, vistos sob
interpretação arminiana.
CAPÍTULO VI
ARMINIANISMO E METODISMO
I - O ESPÍRITO DO METODISMO:
Daí em diante, não era só o coração que ardia no vulto ímpar de Aldersgate,
mas, também, a teologia resultante daquela maravilhosa experiência, a qual lhe
comunicara vida nova e operante, motivo por que já não mais se confinou aos
limites acanhados de uma universidade ou às paredes frias dos templos. Ao invés
disso, saiu para as ruas e praças públicas, desceu às minas e penetrou nos cortiços
de miseráveis criaturas humanas. O metodismo foi, e ainda é, uma revolução em
marcha.
1Hallevy, E. - “Histoire du Peuple Anglais au XIX Siècle,” em quatro volumes. Vol I, págs. 359, 371
e outras.
inventada por Lord Herbert de Cherbury (1583-1618), e desenvolvida a seguir por
Voltaire, Rousseau, Shaftesbury, Thomas Paine e outros.
Mas Wesley sentiu coisa bem diversa em sua vida, pelo que, podia repetir as
palavras do profeta Isaías: “O Espírito do Senhor está sobre mim...” (Is 61.1-2) , ou
confirmar a experiência de Paulo quando declarou: “O Espírito de Deus dá
testemunho junto ao nosso espírito de que somos filhos de Deus” (Rm 8.16). Seu
velho pai, Samuel Wesley, também lhe dissera: “O testemunho interior, meu filho,
é a prova, a prova mais forte do Cristianismo.” De fato, é o mais importante na
religião. É Deus dando-se a Si mesmo e o homem comprovando-O pela experiência.
É o Infinito penetrando no finito; o incomensurável confinando-se aos rudes
limites do coração humano.
Eis por que o reavivamento metodista produziu tanta agitação nos seus dias
e ainda apela tão fortemente à nossa mente e alma. Entre Deus e o pecador nada
mais se levanta, nem o sacerdote, nem os sacramentos, nem os credos, senão o
pecado. A graça de Deus não é monopólio de ninguém, nem privilégio exclusivo de
quem quer que seja, a não ser, naturalmente, daqueles que já se converteram a
Cristo. Deus quer a salvação de todos. Até a mais vil criatura é objeto do Seu divino
amor. Quantos O aceitarem serão remidos de seus pecados. Jesus Cristo, como
afiançou o evangelista João, “é a propiciação pelos pecados do mundo inteiro” (1Jo
2.2).
II - Distinções Doutrinárias:
1 - O PECADO ORIGINAL.
É um dos problemas de capital importância na teologia cristã.
2 - A PREDESTINAÇÃO.
3 Wesley - Sermões - Vol I, Págs 109 a 11 – Imprensa Metodista - São Paulo - 1953.
O metodismo rejeita os dois determinismos. Wesley cria com o escritor
sagrado que, para Deus, não existe passado e nem futuro. Para ele só há presente.
Tudo é presente. Verifiquemos as suas palavras: “O todo-poderoso, onisciente
Deus, vê e sabe, desde a eternidade até a eternidade, tudo que é, que foi e que será,
através de um eterno agora. Para ele nada é passado ou futuro, mas todas as coisas
igualmente são presentes. Ele não tem, portanto, se falamos conforme a verdade
das coisas, presciência, nem postciência... Ainda quando nos fala, sabendo do que
somos feitos, conhecendo a exigüidade de nosso entendimento, ele se nivela até
nossa capacidade e fala de Si mesmo em termos humanos. Assim,
condescendendo-se de nossa fraqueza, ele nos fala de Seu próprio propósito,
conselho, plano, presciência. Não que Deus tenha necessidade de conselho, de
propósito, ou de planejar Seu trabalho de antemão. Longe de nós imputar isto ao
Altíssimo: medi-lO por nós mesmos! É meramente em compaixão de nós que nos
fala assim de Si mesmo, como prevendo as coisas no céu e na terra e como
predeterminando-as ou preordenando-as.”4
Wesley só concebia a eleição no sentido que “todo o que crer será salvo; o
que não crer será condenado,” porque preferiu viver no seu velho estado. Salva-se
quem aceita a Cristo e se converte a ele; perde-se quem resiste à graça de Deus e
rejeita a misericórdia divina oferecida em Cristo. A salvação, por conseguinte, é
condicional, porque baseada na aceitação ou recusa da oferta divina.
3 - A CERTEZA DA SALVAÇÃO.
7 Pope, William Burt - A Comp. of Christ. Teology - Vol. II, Pág. 445.
que, quando dizemos que somos justificados pela fé, não excluímos as obras
exigidas pela fé, conforme as produz uma frutífera mãe, mas as inclui.”8 Aliás, ele
foi ainda mais enfático e objetivo ao declarar que “sem obras a fé é morta e a
justificação ineficaz” (sine operibus fides mortua et ad justificationem inefficax
est).9
4 - A DOUTRINA DA REGENERAÇÃO.
5 - A SANTIFICAÇÃO.
8 Pope, Op. Cit. - Vol. II - Pág. 444, citando Limborch, in Theol. VI, pág. 4, 32.
9 Hagenbach, Op. Cit - Vol. III, Pág. 116, citando Limborch, in Theol. Chr.VI, Págs 4, 22 e 31.
10 Pope - Op. Cit. - Vol II, Pág. 440.
Como se comporta aquele que um dia foi regenerado?
O crente não mais procede como dantes: já não vive no estado de simples
criatura e sim no de filho dileto de Deus. Isto é, busca viver conforme a vontade do
Pai celeste, sendo-lhe agradável em tudo; procura crescer em santidade para a cada
instante mais se parecer com Ele. A perfeição é um desafio persistente a estimulá-lo
no jornadear em Cristo. Não pára nunca durante a viagem. O novo nascimento foi
apenas o início da caminhada e do desenvolvimento. É preciso prosseguir. Como
dizia o apóstolo Paulo: “Não que já a tenha alcançado, ou seja perfeito; mas
prossigo para alcançar aquilo para o que fui também preso por Cristo Jesus.
Irmãos, quanto a mim, não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que,
esquecendo-me das coisas que para trás ficam, e avançando para as que estão
diante de mim, prossigo para o alvo...” (Fp 3.12-14).
Mas a perfeição cristã é mais do que isso, porque, como graça especial de
Deus, o crente pode recebê-la num instante e a qualquer momento em sua vida, no
conceito wesleyano. Os calvinistas, porém, admitem que seja alcançada somente no
72.
momento da morte ou após ela. Os arminianos holandeses concebiam-na mais ou
menos conforme os metodistas wesleyanos, mas não lhe deram tanta importância
quanto estes. As igrejas “Holiness” e de “Jesus Nazareno” sustentam ainda a
posição mantida por João Wesley, considerando-a de capital relevância.
6 - O CONCEITO DE DEUS.
Razão, por isso, teve João Wesley quando, numa carta ao Dr. Conyers
Middlenton, escreveu que o cristão é feliz por saber que o “Criador de todas as
coisas é um ser de imensa sabedoria, de poder infinito para executar todos os
desígnios de Sua sabedoria, e de não menos infinita bondade para dirigir todo o
Seu poder para benefício de todas as Suas criaturas.” Deus está disposto a
distribuir as bênçãos de Sua justiça, santidade e perfeição a quantos cumpram as
condições que para tanto estabeleceu, disse Wesley noutra ocasião em um de seus
sermões.14 Deus é o mesmo sempre: não muda.
7 - A TRINDADE.
Discordam, contudo, a respeito das relações das três pessoas entre si. Os
seguidores de Wesley são fiéis ao credo Niceno-Constantinopolitano, que definiu
esse magno problema da economia divina, considerando-as de idêntica essência e
com idênticos atributos e, ainda, co-eternas.
Foi a posição adotada pela Igreja Anglicana e igualmente por João Wesley,
tanto assim que, na revisão dos “Trinta e Nove Artigos” ele a manteve: “Na unidade
desta Divindade há três pessoas de uma substância, poder e eternidade: o Pai, o
Filho e o Espírito Santo.” A Igreja Metodista do Brasil, no capítulo que trata das
doutrinas, revela-se nesta questão, digna continuadora do movimento wesleyano,
pois no Art. I, inciso 1, lê-se: “Há um só Deus vivo e verdadeiro, eterno, sem corpo
nem partes; de poder, sabedoria e bondade infinitos, criador e conservador de
todas as coisas visíveis e invisíveis. Na unidade desta divindade, há três pessoas da
mesma substância, poder e eternidade - Pai, Filho e Espírito Santo.”
De tudo quanto foi dito, formulemos uma síntese global, que nos permita ver
de relance o quadro analisado e mais facilmente reter as evidências apontadas.
3 - Ireis permitir, então, que vos lembre alguns pontos em que o metodismo
e o calvinismo se ajustam bem. Um deles é o da corrupção da natureza humana,
após o pecado. De sorte que, quando Adão caiu, toda a raça humana caiu com ele.
Outro ponto é o da absoluta necessidade da graça de Deus, sem a qual o homem é
incapaz de buscar a salvação. A iniciativa é de Deus e também a sua realização.
Ainda outro está na interpretação que os dois sistemas dão aos sacramentos,
considerando-os não apenas símbolos, mas também meios pelos quais a fé recebe
alimento e o fiel mais se edifica em Cristo. Ambos rejeitam a transubstanciação e a
consubstanciação.
Para Wesley e seus seguidores a expiação e a graça são universais. Cristo fez
tudo que dependia de Si para redimir a humanidade do pecado, Sua obra foi
extensa, perfeita, completa, única e abrange a todos os homens, como vemos, por
exemplo, em Jo 3.16; Rm 5.18 e Hb 8.10.
Não existe mensagem mais confortadora e mais entusiasta. Ela nos ensina o
verdadeiro sentido da fraternidade, porque nos ajuda a ver em nosso próximo um
irmão pelo qual Jesus também derramou o Seu sangue. Ela nos faz cônscios de
nosso dever de anunciar o Evangelho por todas as partes. Ela nos constrange a
batalhar por um mundo de paz e de boa vontade, de justiça e de respeito para com
todos os homens. “O metodismo,” disse alguém sabiamente, “é uma revolução em
marcha.”
Deus o permita!
BIBLIOGRAFIA
SCHAFF - History of the Christ. Church - Ch. Scribner’s Sons - N. York - 1882.
TEYERM AN. LUKE - The Life and Times of the Rev. John Wesley - 3 vols. - New
York - Harper & Bros. - 1872.
VAN GELDER, H. A. - Histoire des Pays-Bas du XVI siècle à nos jours - Libr. Colin.