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Uma breve reflexão sobre o papel da Educação Especial frente ao processo de inclusão de
pessoas com necessidades educacionais especiais em rede regular de ensino1
Rosana Glat2
Rejane de Souza Fontes3
Márcia Denise Pletsch4
Resumo
A Educação de alunos com necessidades educacionais especiais que, tradicionalmente se pautava
num modelo de atendimento especializado e segregado, tem se voltado, nas últimas décadas para
a chamada Educação Inclusiva. O presente artigo apresenta uma breve discussão sobre o
processo de implantação da Educação Inclusiva no Brasil, analisando o papel da Educação
Especial no âmbito desta política. O argumento aqui apresentado é de que o suporte da Educação
Especial é imprescindível para o êxito da inclusão educacional de alunos com deficiências e
outros comprometimentos. O artigo também considera como objeto prioritário de investigação, a
avaliação das condições reais de inclusão que são oferecidas nas escolas, assim como o
desenvolvimento de estratégias de intervenção que facilitem a implementação desta proposta.
Palavras-chave: educação inclusiva, educação especial, necessidades especiais.
Abstract
The education of special needs students, that traditionally used to be based on an specialized and
segregated model, has turned, in the last decades to the so-called Inclusive Education. This article
presents an short discussion about the process of implantation of the Inclusive Education in
Brazil, and analyzes the role of Special Education in this policy. It is argued here that the support
of Special Education is a priority for the success of the educational inclusion of students with
handicaps and other impairments. The articles also considers as an investigation priority the
evaluation of real conditions of inclusion offered by the schools, as well as the development of
intervention strategies aimed to facilitate the implementation of this model.
Keywords: inclusive education, special education, special needs.
1
Publicado em: Cadernos de Educação 6: Inclusão Social Desafios de uma Educação Cidadã. UNIGRANRIO
Editora, Rio de Janeiro, p. 13-30, nov., 2006. ISSN: 1679-6349.
2
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. E-mail:
rglat@terra.com.br .
3
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). E-
mail: rejanefontes@ibest.com.br .
4
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). E-
mail: márcia_pletsch@yahoo.com.br .
2
regulares, que a eles devem se adequar (...)”, já que tais escolas “constituem os meios mais
capazes para combater as atitudes discriminatórias (...), construindo uma sociedade inclusiva e
atingindo a Educação para Todos (...)” (UNESCO, 1994, p. 8-9, grifo nosso).
Sob este enfoque, a Educação Especial que por muito tempo configurou-se como um
sistema paralelo de ensino, está sendo obrigada a redimensionar o seu papel antes restrito ao
atendimento direto dos educandos com necessidades especiais, para atuar, prioritariamente como
suporte à escola regular no recebimento deste alunado.
No Brasil a tendência para inserção de alunos com necessidades especiais na rede regular
de ensino, embora já presente desde a década de 70 com a instituição de classes especiais nas
escolas públicas, afirmou-se, a partir da metade dos anos 80, com o processo de
redemocratização. As discussões sobre os direitos sociais, que precederam a Constituinte,
enfatizaram reivindicações populares e demandas de grupos até então excluídos dos espaços
sociais. Neste movimento, tomou vulto a luta pela ampliação do acesso e da qualidade da
educação das pessoas com necessidades educacionais especiais (FERREIRA & GLAT, 2003;
GLAT, FONTES & PLETSCH, 2006). A Educação Inclusiva é hoje amparada e fomentada pela
legislação em vigor, e determinante das políticas públicas educacionais tanto a nível federal,
quanto estadual e municipal.
Em âmbito federal, diversas leis e diretrizes institucionais passaram a estabelecer o direito
social de pessoas com necessidades especiais serem incluídas na rede regular de ensino. Por
exemplo, a Constituição Federal de 1988, no inciso III do artigo 208, estabelece que o
atendimento educacional especializado aos portadores de deficiências deve se dar
“preferencialmente na rede regular de ensino”. Já a Política Nacional de Educação Especial
(MEC/SEESP, 1994), em suas diretrizes, destaca o apoio ao sistema regular de ensino no que
tange à inserção de portadores de deficiências, priorizando o financiamento de projetos
institucionais que envolvam ações de inclusão.
Estes princípios estão reafirmados na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDB (Lei nº 9.394/96) e nas Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica
(CNE/CEB, 2001). Outra referência importante é a Política Nacional para a Integração da
Pessoa Portadora de Deficiência (1999) e o Plano Nacional de Educação (Lei nº 10.172/01).
Estes, e outros, documentos dispõem sobre a organização dos sistemas de ensino e a formação de
4
Além desses aspectos, um outro fator que dificulta a implantação da proposta é o fato de
que a responsabilidade sobre o processo de aprendizagem dos alunos ditos especiais, mesmo em
situação de inclusão em classe regular, continua sendo da Educação Especial. Em estudo que
analisou o panorama da Educação Inclusiva no Brasil, sob diferentes ângulos, Glat, Ferreira,
Oliveira e Senna (2003) identificaram que,
É interessante observar que apesar desta realidade, alguns autores insistem em pontuar,
direta ou indiretamente, uma dicotomia entre Educação Inclusiva e Educação Especial, como se o
advento de uma modalidade representasse a descontinuidade da outra (GLAT & PLETSCH,
2004; PLETSCH & FONTES, 2006). Entretanto, esta é uma idéia equivocada, pois a Educação
Inclusiva não pode prescindir da Educação Especial, tanto por razões pragmáticas quanto
conceituais. Primeiro porque é inviável, em curto e médio prazo, se reestruturar todo o sistema
atual de formação de educadores para que todos os professores fossem habilitados a trabalhar
também com alunos com necessidades especiais.
E em segundo lugar, a Educação Especial constituiu um arcabouço consistente de
conhecimentos teóricos e práticos, estratégias, metodologias, recursos para auxiliar a promoção
da aprendizagem de alunos com deficiências e outros comprometimentos. A experiência, tanto
brasileira, quanto internacional, vem mostrando que, sem tal suporte, dificilmente a proposta de
Educação Inclusiva pode ser implementada com sucesso (MITTLER, 2003; GLAT & PLETSCH,
2004; PLETSCH & FONTES, 2006).
Indo mais além, sob essa perspectiva, o paradigma que hoje conhecemos por Educação
Inclusiva não representa uma ruptura no modelo de atendimento a pessoas com deficiências ou
outras condições de aprendizagem e desenvolvimento especiais. Mas sim, o desenvolvimento de
um processo de transformação das concepções teóricas e das práticas da Educação Especial, as
quais vêm historicamente acompanhando os movimentos sociais e políticos em prol dos direitos
das pessoas com deficiências, e das minorias excluídas, em geral.
É nesse sentido que se descortina o novo campo de atuação da Educação Especial. Não
visando importar métodos e técnicas especializados para a classe regular, mas sim tornando-se
um sistema de suporte permanente e efetivo para os alunos especiais incluídos na escola regular,
bem como para seus professores. Conforme mencionado, a Educação Especial não é mais
concebida como um sistema educacional paralelo ou segregado, mas como “um conjunto de
medidas que a escola regular põe a serviço de uma resposta adaptada à diversidade dos alunos”
(GLAT & OLIVEIRA, 2003, p.2 ).
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Embora o diagnóstico sobre os fatores que dificultam o processo de inclusão escolar seja
relativamente claro, o mesmo não se pode dizer do conhecimento sobre como efetivamente a
inclusão vem acontecendo no cotidiano das nossas escolas. De fato, poucas são as experiências e
práticas inclusivas estudadas de forma sistemática no Brasil. Faltam pesquisas de campo sobre o
andamento e os resultados desse processo, ainda muito recente na história da Educação deste
país. Os casos de inclusão bem sucedidos de que se têm registro são, em geral, baseados em
relatos de pessoas que conseguiram ser incluídas muito mais pelo seu próprio esforço, de suas
famílias e /ou de seus professores, do que pela ação de uma política pública a elas dirigida. Este
foi outro dado significativo apontado no já citado estudo de Glat et al (2003):
O próprio sistema de ensino não reúne dados que lhe forneça subsídios para
promover a avaliação do processo de inclusão escolar a partir da voz dos
próprios sujeitos incluídos, uma vez que as histórias de vida disponíveis são
baseadas na experiência de pessoas, hoje adultas, que conseguiram se incluir à
sociedade por “imposição” e/ou “insistência”, valendo-se de seus próprios
esforços, em uma época em que não havia políticas públicas que garantissem
seus direitos, tampouco métodos, processos ou recursos de adaptação. Como tais
possíveis informantes, além de terem tido histórias de inclusão diferentes,
constituem um grupo muito pequeno, composto por sujeitos que conseguiram
traçar uma trajetória de sucesso na sociedade, ainda que lutando contra todas as
dificuldades do sistema social, suas vozes não necessariamente auxiliariam na
avaliação do impacto das experiências de inclusão sobre o cidadão deficiente
hoje ingressando no sistema escolar, para o qual as políticas públicas de inclusão
consistiriam na única alternativa para obtenção de voz pública ( p. 61).
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Essas dimensões foram originalmente apresentadas por esses no documento designado por “Índice para a inclusão:
desenvolvendo a aprendizagem e a inclusão na escola” (BOOTH & AINSCOW, 2002) com o objetivo de apontar
itens a serem analisados nas escolas que se pretendem inclusivas, servindo de guia as escolas que procuram melhorar
a aprendizagem e participação de todos os seus alunos no processo de inclusão.
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Bibliografia
AINSCOW, M. Hacia uma educación para todos: algumas formas posibles de avanzar.
Disponível em: www.inclusioneducativa.cl/documentos. Publicado em 200l.Acesso em 12 abr.
2004a.
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BOOTH, T.; AINSCOW, M. Index for inclusion: developing learming and participation in
Schools. Brsitol. Centre for Studies in incluive Education. 2002.