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SOBRE UM POBRE HOMEM RICO

Adolf Loos (1890)

Quero lhes contar de um pobre homem rico. Tinha dinheiro e bens, uma mulher fiel que, com um beijo na testa, o
livrava das preocupações que traziam os negócios, de um bando de filhos, que teria causado a inveja do mais pobre
dos seus trabalha-dores. Seus amigos o adoravam, pois tudo o que empreendia prosperava.
Mas hoje a situação é muito, muito diferente. E assim aconteceu.
Um dia, disse este homem a si mesmo: “Você tem dinheiro e bens, uma mulher fiel e filhos, pelos quais o invejaria o
trabalhador mais pobre. Mas, você é feliz? Sabe que há pessoas que necessitam de tudo o que lhe invejam. Mas as
preocupações deles são afugentadas por uma grande fada, a arte. E o que é a arte para você? Nem sequer de nome
a conhece. Qualquer adventício pode apresentar o cartão de visita e o seu mordomo lhe abrirá de par em par. Mas
você ainda não recebeu a arte em sua casa. Sei bem que ela não virá. Mas vou a sua procura. Ela deve se instalar e
habitar minha casa como um rei.”

Era um homem de muito vigor, o que pegava, o fazia com energia. Era costumeiro nos seus negócios. Assim, neste
mesmo dia, recorreu a um famoso arquiteto, dizendo a ele: “O senhor me ponha arte, arte entre minhas quatro
paredes. O gasto não importa.”

O arquiteto não deixou que o dissessem duas vezes. Foi à casa do homem rico, jogou fora todos os seus móveis, fez
vir um exército de assentadores de parquê, estucadores, envernizadores, pedreiros, pintores de paredes,
entalhadores, encanadores, instaladores, tapeceiros, pintores e escultores, e zás!, sem se notar, havia prendido,
empacotado, bem guardado a arte entre as quatro paredes do homem rico.

O homem rico era mais do que feliz. Mais do que feliz passeava pelos novos cômodos. Onde quer que olhasse havia
arte, arte em tudo e por tudo. Pegava arte quando pegava a maçaneta, sentava-se sobre arte quando se sentava em
uma poltrona, apoiava sua cabeça em arte quando cansado a apoiava nas almofadas, seu pés e afundava em arte
quando andava pelos tapetes. Se deleitava com a arte com enorme fervor. Desde que seu prato também havia sido
decorado com motivos artísticos, cortava o seu boeuf àl’oignon com energia redobrada.

Elogiavam-no, invejavam-no. As revistas de arte glorificavam o seu nome como um dos primeiros no reino dos
mecenas,seus cômodos foram retratados, comentados e explicados para servir de modelo às cópias.E o mereciam.
Cada recinto constituía uma determinada sinfonia de cores. Parede, móveis e tecidos estavam combinados da
maneira mais refinada. Cada objeto tinha seu lugar adequado e estava ligado aos demais por umas combinações
maravilhosas. O arquiteto não tinha esquecido de nada, absolutamente nada.Cinzeiros, talheres, interruptores,
tudo, tudo havia sido combinado por ele. E não se tratava das artes arquitetônicas vulgares, não, em cada
ornamento, em cada forma, em cada prego estava ex-pressa a individualidade do proprietário. (Um trabalho
psicológico cuja dificuldade qualquer um reconhecerá).

O arquiteto, no entanto, recusava todos os elogios modestamente. Porque, dizia ele, estes ambientes não são
meus. Lá na frente, no canto, há uma estátua de Charpentier. E, assim como eu censuraria qualquer um que
afirmasse ter desenhado uma sala tendo usado apenas uma das minhas maçanetas, do mesmo modo eu não posso
dizer que estes ambientes tenham sido concebidos por mim. Estas eram palavras nobres e conseqüentes. Certo
entalhador, que talvez empapelara sua sala com papel pintado por Walter Crane e que, apesar disto, se atribuía os
móveis que aí se encontravam por tê-los projetado e executado ele mesmo, se avergonhava até o fundo da sua
negra alma ao inteirar-se destas palavras.

Voltemos, depois desta divagação, ao nosso homem rico. Já disse quão feliz era ele. Uma grande parte do seu
tempo ele dedicou, desde então, só ao estudo da sua casa. Logo se deu conta deque devia estudá-la. Havia muito o
que memorizar. Cada objeto tinha seu lugar preciso. O arquiteto tinha agido bem com ele. Tinha pensado em tudo
antecipadamente. Para a menor caixinha havia um lugar definido, feito intencionalmente para ela. A casa era
cômoda, mas, para a cabeça, esgotante demais. Por isso, nas primeiras semanas, o arquiteto vigiou a forma como
atuavam para que não incorressem em nenhum erro. O homem rico se esforçava.

Mas aconteceu que, distraidamente, deixou um livro que tinha na mão na gaveta destinada aos jornais. Ou que
bateu a cinza do charuto naquele buraco da mesa destinado ao candelabro. Quando apanhado um objeto, o
adivinhar e buscar ao antigo lugar que lhe correspondia não tinha fim e certa ocasião teve o arquiteto que consultar
os desenhos dos detalhes para voltara encontrar o lugar de uma caixa de fósforos.

Onde as artes aplicadas tinham conseguido tais triunfos, não podia ficar atrás a música aplicada. Esta idéia
preocupava demais o homem rico. Fez uma solicitação à companhia de bondes, pela qual tentava que seus veículos
utilizassem o motivo de sinos de Parsifal no lugar de sons sem sentido. Na companhia não lhe deram a mínima.
Ainda não davam suficiente acolhida a idéias modernas. De quebra, lhe permitiram pavimentar, por sua conta, a
área em frente à sua casa de modo que todo veículo estivesse obrigado a passar diante dela ao ritmo da Marcha de
Radetzky. As campainhas elétricas das suas salas também foram providas de trechos de Wagner e Beethoven e
todos os profissionais da crítica de arte elogiavam sobremaneira o homem que havia aberto um novo domínio para
“a arte nos artigos de uso.”

Como se pode imaginar, todas estas melhorias fizeram ao homem ainda mais feliz. Mas não se pode esconder que
ele procurava passar o menor tempo possível em casa. É que, de vez em quando, se quer descansar um pouco de
tanta arte. Ou você poderia viver em uma galeria? Ou estar sentado meses inteiros em ‘Tristão e Isolda’? Enfim,
quem lhe censuraria por acudir novamente ao café, ao restaurante ou aos amigos e conhecidos para reunir forças
para estarem sua casa? Imaginara outra coisa. Mas, a arte requer sacrifícios. Já havia feito tantos. Os olhos se
umedeciam.

Pensava em muitas coisas velhas pelas quais tinha tido tanto carinho e que, de vez em quando, davam saudade. A
poltrona grande! Seu pai sempre descansara nela. O velho relógio! E os quadros! Mas a arte o exige! Antes de tudo,
não esmorecer!

Uma vez, celebrara seu aniversário. A mulher e os filhos o encheram de presentes. As coisas lhe agradaram demais
e lhe deram uma alegria cordial. Logo chegou o arquiteto para comprovar se tudo estava em ordem e dar respostas
a questões difíceis.

Entrou na sala. O dono veio contente ao seu encontro, pois tinha muitas perguntas a fazer. Mas o arquiteto não
percebeu a alegria do dono. Tinha descoberto algo muito esquisito e empalideceu: “Mas que sapatilhas o senhor
está usando!”, exclamou com voz penosa.O dono olhou seu calçado bordado. E respirou aliviado. Desta vez se
sentia totalmente inocente. As sapatilhas tinham sido confeccionadas fielmente de acordo com o desenho original
do arquiteto. Por isso replicou com ar de superioridade: “Mas, senhor arquiteto, esqueceu-se? As sapatilhas, o
senhor mesmo as desenhou!”“Certamente!”, trovejou o arquiteto, “mas para o quarto. O senhor está estragando
todo o ambiente com essas duas horríveis manchas de cor. O senhor não se dá conta?”O dono da casa
compreendeu imediatamente.

Tirou rapidamente as sapatilhas e se alegrou tremendamente de que o arquiteto não achara insuportáveis também
suas meias. Dirigiram-se ao quarto onde o homem rico pôde voltar a calçar as sapatilhas. “Ontem”, começou
timidamente, “comemorei meu aniversário. Os meus me encheram de presentes. Mandei chamá-lo, querido senhor
arquiteto, para que nos aconselhe sobre qual é a melhor maneira de dispor os objetos.” A cara do arquiteto se
alargava visivelmente. Então estalou: “Como lhe ocorre deixar-se presentear com alguma coisa! Eu não lhe
desenhei tudo? Eu não pensei em tudo? O senhor não precisa de mais nada. O senhor está completo”. “Mas”,
permitiu se replicar o dono da casa, “ainda vou poder comprar-me alguma coisa!”. “Não, o senhor não pode! Nunca
mais e nada mais! Só me faltava esta. Coisas que não foram desenhadas por mim. Não fiz o bastante permitindo o
Charpentier? A estátua que rouba toda a fama do meu trabalho! Não, o senhor não pode comprar nada mais!”. “E
se meu neto me der um trabalho do jardim de infância?”. “Pois o senhor não pode aceitá-lo!”

O dono da casa estava estupefato. Mas ainda não se dava por perdido. Uma idéia, já a tinha, uma idéia!:“E se
quisesse comprar-me um quadro da Secessão?”, perguntou triunfante. “Experimente pendurá-lo em algum lugar. O
senhor não vê que não há lugar para mais nada? O senhor não vê que, para cada quadro que eu lhe pendurei, eu
compus uma moldura na parede, no muro? Não pode deslocar um só quadro. Experimente o senhor colocar um
novo quadro.” Então produziu-se uma mudança no homem rico.
O homem feliz se sentiu de repente profunda, profundamente desgraçado. Viu sua vida futura. Ninguém podia
proporcionar-lhe alegria. Deveria passar sem desejos diante das lojas da cidade. Para ele já não se criava mais nada.
Nenhum dos seus podia lhe dar seu retrato, para ele já não existiam mais pintores, mais ofícios manuais. Estava
podado do futuro viver e respirar, devir e desejar.

Ele sentia: Agora devo aprender a vagar com meu próprio cadáver. Certo: Completo! Acabado!

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