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RICARDO VEDOVELLO
Instituto Geológico, Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.
RESUMO
Neste trabalho é feita uma análise comparativa da aplicação do método de obtenção de Unidades
Básicas de Compartimentação (UBCs) em três diferentes regiões do Estado de São Paulo. Essas
UBCs constituem a base da elaboração de cartografias geotécnicas e geoambientais , a partir de
sensoriamento remoto, e com objetivo de aplicação em estudos de gestão ambiental. O foco
principal da análise refere-se às correlações entre propriedades e características texturais de
imagens e características e propriedades do terreno, que definem a cartografia e a obtenção das
UBCs.
ABSTRACT
This paper presents an analysis related to application of terrain evaluation techniques, based on
remote sensing. The procedure consists of obtaining Basis Units of Compartmentalization by
systematic interpretation of textural elements in sattelite images. The comparision focuses on
correlation between, both, terrain and photointerpretation proprieties and characteristics. For
this study, the methodology was applied in three differents areas, of São Paulo State, Brazil.
INTRODUÇÃO
Para se elaborar um zoneamento geotécnico, a partir da análise integrada do terreno e com o uso
de procedimentos sistemáticos de fotointerpretação, são definidas três etapas básicas:
Compartimentação Fisiográfica do Terreno; Caracterização Geotécnica; e Cartografia
Temática Final ou de Síntese.
compartimentação fisiográfica do terreno a) seleção do produto de Deve levar em consideração as características espectrais, espaciais e temporais das imagens de satélite, as
sensoriamento remoto características específicas sobre as cenas, tais como ângulo de elevação solar, cobertura de nuvens, azimute
as das imagens e as particularidades das áreas de estudo.
b) compartimentação da Consiste em identificar na imagem divisões fisiográficas em diferentes níveis hierárquicos, através da análise
área de estudo de elementos texturais e tonais das imagens, e conseqüente determinação de Unidades Básicas de
Compartimentação (UBCs).
c) avaliação de Refere-se à análise das propriedades dos elementos texturais utilizados na interpretação e extraídos da
homogeneidade e de imagem para um "overlay". Objetiva identificar possíveis heterogeneidades internas nas unidades, que
similaridade determinem sua subdivisão, ou unidades que devam ser classificadas sob a mesma denominação.
d) trabalhos de campo Objetiva a confirmação e/ou o ajuste de limites fotointerpretados e a confirmação de características
morfoambientais e genéticas atribuídas aos diversos níveis de compartimentação das unidades.
e) elaboração do mapa de Refere-se a elaborado de um mapa onde as diversas Unidades Básicas de Compartimentação (UBCs) estão
Unidades Básicas de identificadas por uma sigla ou código refletindo, ainda, seu contexto fisiográfico e seus níveis hierárquicos de
Compartimentação (UBCs) compartimentação.
a) Identificação dos fatores Devem ser identificados em função dos objetivos do estudo e do caráter do produto a ser obtido. Consiste na
caracterização geotécnica
de análise e das classes dos identificação das propriedades e/ou características fisiográficas do terreno necessárias para a avaliação
fatores pretendida. Contemplam dados e informações sobre rochas, solos, relevo, processos geodinâmicos, águas
superficiais e subterrêneas, e vegetação.
b) Obtenção dos fatores de São obtidos através de trabalhos de campo, levantamento de dados prévios e/ou por correlação com
análise e classificação propriedades texturais das imagens. A forma de obtenção depende do nível de informação pretendido ou
necessário, bem como s recursos operacionais, financeiros e de tempo disponíveis.
c) Sistematização das Devem ser padronizadas e referenciadas em classes pré-determinadas, face a aplicação prevista, e
informações sobre as UBCs armazenadas em tabelas ou banco de dados que as relacionem às respectivas UBCs.
a) definição das classes da Depende, essencialmente, da aplicação pretendida e devem refletir as diferentes situações e/ou condições
Cartografia temática ou
carta final geológico-geotécnicas que condicionam ou limitem a utilização e a gestão de uma dada área.
b) definição dos critérios de Consiste em se estabelecer uma relação entre os fatores geotécnicos, e suas respectivas classes, e as classes
final
análise e classificação das da carta final. Traduz-se em uma regra de classificação que podem ser expressa através de tabelas de
UBCs classificação, estruturas de árvores lógicas ou atribuição de pesos e somatório de valores.
c) cartografia final É obtida através da aplicação da regra de classificação e consiste em atribuir, a cada UBC, uma das classes da
carta geotécnica. Pode ser feita diretamente pelo executor da cartografia ou por meio de procedimentos
informatizados.
APLICAÇÕES
A estrutura metodológica apresentada tem sido aplicada em diversos estudos voltados a subsidiar
o planejamento e o gerenciamento ambiental de diferentes regiões do Estado de São Paulo. Tais
estudos têm possibilitado avaliar a utilização dos princípios, procedimentos e critérios propostos,
considerando-se as diferentes etapas da cartografia geotécnica e os diferentes objetivos de
aplicação em gestão ambiental. Além disso, a aplicação do método, em diferentes áreas
geográficas e escalas, tem permitido verificar a aplicabilidade do procedimento proposto em
contextos fisiográficos diversos.
No presente trabalho são discutidos os resultados obtidos pela aplicação do método na região de
Ubatuba, na região metropolitana de Campinas, e no município de São Sebastião, no Estado de
São Paulo, em particular no que se refere às etapas: de compartimentação fisiográfica, onde são
obtidas as UBcs; e de caracterização geotécnica.
O estudo na região metropolitana de Campinas (Brollo et al., 1998) teve como objetivo
selecionar áreas para tratamento e disposição final de resíduos sólidos, e contemplou 18
municípios da região. Foram estudados quatro aspectos fundamentais envolvidos na gestão de
resíduos: sócio-políticos, fisiográficos, hidrogeológicos, e climáticos. Os aspectos de caráter
fisiográfico considerados no estudo foram traduzidos nos mapas: de suscetibilidade a processos
de erosão, escorregamentos e inundações; e de vulnerabilidade natural dos aqüíferos à
contaminação. Esses mapas foram obtidos a partir da caracterização, análise e classificação de
um Mapa de Unidades Básicas de Compartimentação, conforme o procedimento metodológico
discutido. Os dois mapas constituem cartas de zoneamento geotécnico sobre as fragilidades do
meio físico com caráter respectivamente de suscetibilidade e vulnerabilidade. A associação dos
dois resulta em uma carta de aptidão do meio físico para a disposição de resíduos, que constitui
uma avaliação sobre uma potencialidade do terreno.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Subzona PNC Grau de estruturação da anisotropia dos alinhamentos de relevo e drenagem pouco evidente.
Zona Paraibuna (PB) Tropia dos elementos de relevo e drenagem de uni a bidirecional, e espaçamento dos elementos texturais
(freqüência) relativamente maior do que o compartimento (PT).
Subzona PBA Grau de estruturação da anisotropia dos elementos texturais unidirecionais é muito evidente.
Subzona PBB Grau de estruturação da anisotropia dos elementos texturais unidirecionais é menos evidente do que a
subzona PBA e apresenta formas de drenagem em arranjos com padrão de treliça.
Zona Paraitinga (PT) Tropia dos elementos de relevo e drenagem de uni a bidirecional, e espaçamento dos elementos texturais
relativamente menor do que o compartimento (PB).
Subzona PTA Grau de estruturação da anisotropia dos elementos texturais de relevo é mais evidente do que na subzona
PTB.
Subzona PTB Grau de estruturação da anisotropia dos elementos texturais de relevo é menos evidente do que na
subzona PTA.
Zona Bocaina (PC) Elementos texturais de relevo e drenagem em arranjos isotrópicos.
Província Litorânica (L) Formas de drenagem arborescentes, meandrantes e anastomosadas.
Zona Escarpas (LE) Alta densidade e freqüência de elementos texturais de relevo e drenagem.
Subzona (LEF) Formas de drenagem em arranjos subparalelos e densidade de drenagem muito alta.
Subzona (LED) Formas de drenagem em arranjos paralelos a pinulados e densidade de drenagem alta.
Zona Morraria (LM) Alta densidade de elementos texturais de relevo e drenagem, entretanto com freqüência relativamente
menor do que na zona LE.
Subzona (LMM) Apresenta as características típicas da zona LM, na qual está inserida.
Subzona (LMI) Formas com as mesmas características texturais da subzona LMM, porém isoladas no meio da zona LB.
Zona Baixadas (LB) Densidade de elementos texturais de relevo e drenagem de muito baixa a nula.
Subzona (LBC) Identificação foi baseada em trabalhos prévios e reconhecimento expedito de campo.
Subzona (LBM) Identificação foi baseada em trabalhos prévios e reconhecimento expedito de campo.
Subzona (LBF) Identificação foi baseada em trabalhos prévios e reconhecimento expedito de campo.
Sobre a relação entre textura na imagem e a hierarquia de compartimentação (Tabela 4), observa-
se que a diferenciação de compartimentos nos níveis hierárquicos superiores tende a ser feita
com base na análise de características texturais relativas a organizações de elementos texturais
(textura, estrutura, forma, lei de organização) das imagens. Já em nível de UBC, a distinção entre
unidades é feita a partir da análise das propriedades das formas texturais. Isso se deve, conforme
já constatado em Vedovello (1993), porque os níveis hierárquicos superiores refletem
organizações fisiográficas dos compartimentos dos níveis fisiográficos inferiores, também
verificadas nas relações de organização dos elementos texturais de imagem.
Tabela 4.– Relações entre características texturais nas imagens e níveis hierárquicos /
taxonômicos de compartimentação
Relações entre Características e Propriedades do Terreno e Feições Texturais nas Imagens
e Uso de Propriedades e Características como Fatores de Classificação Geotécnica
A análise das etapas de caracterização geotécnica dos três exemplos de aplicação apresentados
revela que os fatores de avaliação das UBCs contemplam, de forma variável, tanto características
dos elementos componentes do terreno, como propriedades do terreno (Tabela 5). No exemplo de
aplicação na Região Metropolitana de Campinas utilizou-se, inclusive, características texturais
das imagens para a caracterização das UBCS.
No caso da caracterização através da propriedade da imagem deve-se frisar que sua utilização na
fase de elaboração de um projeto, por estratégia operacional de trabalho, pode ser feita sem
maiores problemas, desde que a correlação entre a textura nas imagens e propriedades ou
características do terreno tenha sido estabelecida corretamente. Entretanto, caso os fatores de
análise e caracterização das UBCs venham a ser disponibilizados como informação da
cartografia para potenciais usuários, essa característica textural deve ser traduzida em termos da
característica ou propriedade à qual serviu para inferência. Afinal, a análise de aspectos texturais
de imagem é uma das técnicas de obtenção dos fatores geotécnicos e não o fator em si, com
significado aplicado.
Embora exista uma correlação entre as características e as propriedades do terreno, e mesmo com
a textura na imagem, são as propriedades do terreno que apresentam a relação mais direta com a
avaliação do comportamento geotécnico que uma dada unidade possa apresentar frente ações e
atividades antrópicas. Assim, quando se consideram características do terreno, ou mesmo da
textura em imagens, o que se está considerando efetivamente, é o significado dessa característica
em termos de propriedades que condicionam ou determinam o comportamento geotécnico da
unidade para a análise considerada. Portanto, quando se realiza uma análise baseada em
características do terreno, os critérios de classificação levam em conta uma relação indireta com
as propriedades do terreno.
Embora se considere, a priori, que se deva buscar uma homogeneidade na forma de expressão
das classes em um mesmo estudo ou avaliação, a opção pela forma qualitativa ou quantitativa
depende de diversos fatores como por exemplo, do nível de precisão e detalhamento necessários
e dos recursos disponíveis para a aquisição de informações em cada estudo.
Em estudos que requeiram grande precisão das informações, a identificação das classes dos
fatores de análise na forma quantitativa tende a ser mais relevante. Em geral, tais estudos
referem-se a análises locais e estão associados a fases de implantação ou intervenção de uma
determinada obra ou atividade. Nesse caso, a demanda por informações precisas se sobrepõe às
restrições de recursos.
Para diminuir essa dificuldade, uma das possibilidades que se vislumbra refere-se ao
estabelecimento de uma relação numérica (quantitativa) entre os fatores geotécnicos analisados e
as propriedades texturais da imagem a eles relacionadas. Assim, a realização de estudos
específicos sobre esse aspecto talvez permita que se estabeleçam relações entre "índices
texturais" numéricos, referentes às propriedades dos elementos de textura, e valores absolutos
reais de um determinado fator. Tal relação seria controlada a partir de dados referenciais obtidos
em campo. São estudos de longo prazo, portanto, e que envolveriam recursos provavelmente
superiores aos necessários para a realização de ensaios geotécnicos tradicionais.
Conforme se pode observar nas aplicações apresentadas, a forma e as técnicas de obtenção dos
fatores de avaliação geotécnica e da identificação das diferentes classes desses fatores é bastante
variada. Essas técnicas incluem: ensaios de laboratório; ensaios “in situ”; inferências a partir de
elementos fisiográficos; e inferências a partir de outros dados (geoquímicos, de sensoriamento
remoto, etc.).
A opção por uma ou várias das formas de obtenção de fatores geotécnicos depende: do contexto
de desenvolvimento de um dado estudo; dos objetivos da aplicação e, consequentemente, do
nível e precisão necessários para as informações. Observa-se, entretanto, que para a aquisição de
um dado fator de análise, não basta simplesmente identificá-lo e definir a forma de sua obtenção
pois, conforme se verifica nos exemplos considerados, a obtenção de um dado fator, as vezes por
uma mesma técnica de aquisição pode apresentar abordagens conceituais, terminológicas e
metodológicas bastante diversificadas.
Um exemplo de fator que ilustra bem essa diversidade refere-se aos solos ou materiais
inconsolidados. Conforme sintetizado na Tabela 6, o levantamento de informações sobre esse
elemento do meio físico pode ser feito através de diferentes abordagens, conceitos e
terminologias, determinados em função das diversas áreas técnicas que tratam dos solos:
Mecânica de Solos, Geologia de Engenharia, Pedologia, entre outras.
FATOR EXEMPLO DE CLASSES UTILIZADAS TÉCNICA DE ESTUDO APLICAÇÃO
AQUISIÇÃO
Tipo de Material Determinadas com base no tipo de material predominante do Inferência a partir Ubatuba Potencialidade
inconsolidado perfil de alteração, em termos de composição textural dos solos. das imagens
Ex.: argiloso; argilo-arenoso; areno-argiloso; arenoso,
Tipo de Material Determinadas com base na descrição e variação dos perfis de Levantamento e Campinas Suscetibilidade e
inconsolidado solo. Ex.: textura areno-siltosa nos horizontes superficiais (SS), descrição de Vulnerabilidade
passando para areno-argilosa nos horizontes residuais (SR) e campo
para argilosa ou silte argilosa nos horizontes saprolíticos (Sp)
Tipo de Material Determinadas com base no tipo de material predominante do Levantamento e São
inconsolidado perfil de alteração, em termos de composição textural dos solos. descrição de Sebastião Vulnerabilidade
Ex.: argiloso; areno-argiloso; areno-siltoso; arenoso. campo
Tipo de Material Determinadas com base no tipo de material predominante do Levantamento e São
inconsolidado perfil de alteração, em termos de composição textural dos solos. descrição de Sebastião Suscetibilidade
Ex.: argiloso; argilo-arenoso; areno-argiloso a síltico- campo
argiloso; arenoso a areno-siltoso.
Tabela 6 – Diferentes formas de abordagem do fator material inconsolidado, para as áreas estudadas.
Outro ponto que merece ser estudado mais a fundo, relacionado à caracterização geotécnica,
refere-se à determinação dos fatores que sejam realmente básicos, e portanto suficientes, para a
classificação das unidades geotécnicas. Tal preocupação deriva do fato de que certos fatores
apresentam uma associação mútua entre suas classes, ou seja, a ocorrência de uma dada classe de
um dado fator implica na ocorrência de uma outra classe de um outro fator. Assim, em se
confirmando tal correlação, a análise de apenas um dos fatores seria suficiente para avaliar as
unidades geotécnicas para a finalidade considerada.
CONCLUSÕES
Tais aspectos permitem ampla aplicabilidade do procedimento para estudos e atividades práticas,
relacionadas à definição, operacionalização e gerenciamento de políticas e instrumentos de
gestão ambiental, em particular relacionados à gestão de grandes áreas territoriais.
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