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APELAÇÃO CÍVEL Nº 990.10.

116474-4- Tribunal de
Justiça de São Paulo
(Processo de origem: ação civil pública nº
583.00.2006.167644-1/00 – 37ª Vara Cível Central da
Capital)
Apelante: Cooperativa Habitacional dos Bancários de São
Paulo – BANCOOP
Apelada: Associação dos adquirentes de apartamentos do
Conjunto Residencial Solar de Santana
Parecer da Procuradoria de Justiça de Interesses
Difusos e Coletivos

Egrégio Tribunal de Justiça

Colenda Câmara

Eminentes Desembargadores

Por meio da r.sentença de fls.1322/1332,


a presente ação civil pública foi julgada parcialmente
procedente, para os fins de: (i) declarar a existência de
relação de consumo entre partes; (ii) declarar a nulidade
da cláusula 16ª do contrato padrão, que preveria a
possibilidade de apuração final do preço; (iii) condenar a
Apelante a restituir os valores pagos pelos consumidores
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em razão desta cláusula; (iv) condenar a Apelante a
promover os registros necessários à incorporação da
construção, adotando todas as providências de que trata a
Lei nº 4.591/94 e a Lei de Registros Públicos, necessárias
a garantir aos consumidores habilitados nestes autos, a
outorga de escrituras definitivas dos imóveis
transacionados.
Inconformada, apela a BANCOOP,
tempestivamente, alegando que a presente ação não se
trataria de ação civil pública, mas sim de ação proposta
por Associação, representando os seus associados, pelo
que deveria ser determinado à Apelada o recolhimento das
custas iniciais, fixando-se que esta ação beneficiaria
apenas os cooperados que a ela se habilitaram até a data
da citação.
Sustenta a Recorrente, ainda, que a
relação firmada com os adquirentes de imóveis seria de
cooperativismo, pelo que a lei aplicável ao caso seria a de
nº 5.764/71, e não o Código de Defesa do Consumidor.
Pelo sistema do cooperativismo, em que
se visaria um autofinanciamento, para aquisição de
imóveis a preço de custo, não seria necessário proceder
ao registro prévio da incorporação imobiliária, sendo da
natureza deste sistema, a cobrança de despesas não
previstas na estimativa inicial do preço da obra, não se
podendo, assim, inquinar de nula a cláusula 16º do
contrato.
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Recebido o recurso em ambos os efeitos,
salvo quanto à manutenção da tutela antecipada, recebido
somente no efeito devolutivo (fls.1610).
Interposto agravo de instrumento pela
Recorrente, visando o recebimento de seu recurso
também no efeito suspensivo, no tocante à concessão da
tutela antecipada (fls.1655/1673), foi lhe negado
provimento, por votação unânime, pelo v.acórdão de
fls.1711/1715, tendo sido rejeitados os embargos de
declaração interpostos (fls.1716/1730). Apresentado
recurso especial contra o v.acórdão que negou provimento
ao agravo, foi-lhe negado seguimento, pela r.decisão de
fls.1752/1753, contra a qual consta a interposição de
agravo (fls.1754).
Contra-Razões ao recurso de apelação
apresentadas às fls.1612/1654, sustentando a Apelada a
submissão da Apelante à lei nº 4.591/64, por exercer
verdadeira atividade de incorporação imobiliária, estando,
ademais, a exigir o pagamento de valor residual de seus
“cooperados”, sem a prévia aprovação da Assembléia,
bem como sem a demonstração de sua legitimidade, já
tendo sido antes cobrada e paga pelos consumidores,
quantia a título de apuração final.
É a síntese do necessário. Passo a
opinar.
O recurso merece total improvimento,
pelas razões a seguir expostas.
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1. Legitimidade da Apelada

O que caracteriza a natureza de uma


ação são, fundamentalmente, os pedidos nela formulados
na inicial, bem como a natureza dos interesses nela
envolvidos e que se visa proteger, ou que tenham sido por
ela efetivamente protegidos.
Na espécie, a Apelada não formulou
pedidos visando beneficiar apenas os seus associados,
individualmente identificados nestes autos, e que lhe
concederam expressa autorização (fls.36/635, 681, e
683/702).
Formulou, isto sim, pedidos mais
abrangentes, visando, alguns, beneficiar todos os
consumidores, adquirentes de unidades habitacionais no
condomínio Solar de Santana e, outros, visando beneficiar,
apenas, os seus adquirentes associados (fls.72/73).
Muito embora os estatutos sociais da
Apelada tenham lhe atribuído, como finalidade
institucional, a defesa de seus “associados” frente à
BANCOOP (fls.78/79), o fato é que parte da r.sentença
proferida nesta ação, especialmente aquela que determina
o registro da incorporação imobiliária, beneficiará todos os
adquirentes de unidades autônomas do Condomínio Solar
de Santana, e não apenas os associados da Apelada
(fls.1331/1332), no que está esta ação promovendo a
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defesa de interesses difusos, ou seja, de pessoas
indeterminadas, que já adquiriram ou possam vir a adquirir
unidades habitacionais no condomínio em apreço (art.81, §
único, III, do CDC).
No entanto, mesmo com relação aos
pedidos formulados na inicial, restritos aos consumidores
do condomínio Solar de Santana, associados da Apelada,
e a r.sentença de procedência neste sentido proferida,
esta ação não perde a natureza de ação civil pública, eis
que, neste aspecto, se visa proteger o interesse coletivo
destes adquirentes, ligados entre si, pelo vínculo
associativo, e com a parte contrária, por uma relação
jurídica base, qual seja, pelo mesmo contrato padrão,
intitulado de “Termo de Adesão e Compromisso de
Participação” (art.81, § único, II, do CDC).
Mesmo com relação ao pedido, acolhido
pela r.sentença “a quo”, para que a Apelante tomasse
todas as providências necessárias, para garantir aos
consumidores a outorga de escrituras definitivas de seus
imóveis, muito embora tenha sido feita referência aos
“consumidores habilitados nos autos” (fls.73, “h”), não se
restringiu tal postulação, e nem a r.sentença, aos
associados da apelada, que já se encontrassem
representados nos autos naquele momento processual,
nada impedindo, assim, que venham a ser aceitas novas
habilitações de associados da Apelada, consumidores do
condomínio Solar de Santana, inclusive em fase de
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liquidações e execuções individuais, conforme permite o
art.97 do CDC.
Quanto ao pedido de devolução de
quantias pagas, os interesses protegidos nesta ação
classificam-se, por sua vez, em interesses individuais
homogêneos, nos termos do art.81, § único, III, do CDC,
possuindo origem comum, vez que originados da mesma
cláusula contratual abusiva.
Portanto, muito embora a Associação
possa exercer em Juízo, duas espécies diversas de
legitimidade, quais sejam, aquela de mera representação
de seus associados, nos termos do art.5º, XXI, da CF
(legitimação ordinária), e a de promover ação civil pública
(legitimidade extraordinária), nos termos dos artigos 129, §
1º, da CF, c/c o art. 82, IV, do CDC, verifica-se que esta
ação, em razão da natureza e abrangência dos pedidos
nela formulados, e do quanto foi decidido pela
r.sentença de Primeira Instância, adquiriu contornos
de ação civil pública, devendo ser assim considerada e
tratada, em prol, inclusive, de todos os possíveis
adquirentes do condomínio Solar de Santana, associados
da Apelada, que ainda podem vir a se habilitar nos autos.
A juntada, a estes autos, de documentos
relativos a consumidores individualmente considerados,
deve ser vista apenas como mera faculdade por eles
exercida, sem se excluir, com isto, a possibilidade de
outros virem a ingressar no feito, em fase de liquidações e
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execuções individuais, nos termos permitidos pelo art.97
do CDC.
Existe, ainda, grande interesse social
envolvido nesta ação, em primeiro lugar, pela natureza do
direito a ser protegido, qual seja, o direito à moradia
(sonho da casa própria), essencial para a vida e dignidade
do ser humano.
Conforme recentemente afirmado em
v.acórdão prolatado pela Colenda 4ª Câmara Civil deste
Egrégio Tribunal de Justiça, e relatado pelo eminente
Desembargador FRANCISCO LOUREIRO, em que se
estava analisando a legitimidade de Associação, em caso
similar a este caso, igualmente ajuizado em face da
BACOOP, decidiu-se que: “O direito à moradia tem
estatura constitucional, o que confere relevância do bem
jurídico a ser protegido (parte final do art.82, par.1º, do
CDC)”. ( Apelação Cível nº 994.08.018648-0, julgado em
11.03.2010).
Ademais, o empreendimento Solar de
Santana abrange 3 prédios, contendo um total de 204
unidades habitacionais (fls.843), sendo quatro
apartamentos por andar, de 54m2 ou 66m2 (fls.320), o que
indica um grande número de consumidores, de classe
média baixa, que podem vir a se beneficiar com esta
ação, além de todos os seus familiares, havendo,
assim, interesse social decorrente, também, da quantidade
e baixa condição sócio-econômica das vítimas envolvidas,
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devendo-se lembrar aqui, que a ação civil pública não
prejudica nem impede ações individuais, servindo, apenas,
para beneficiar as vítimas, que podem, em querendo, vir a
nela se habilitar, usufruindo de seus efeitos.
Além do mais, o caso “BANCOOP”,
pelo prejuízo generalizado que tem causado na
sociedade, está a demandar da Justiça uma resposta a
altura, sendo inquestionável o interesse social decorrente
da necessidade de restabelecimento da ordem social e da
credibilidade na Justiça.
Com efeito, a BANCOOP lançou, até
2004, 46 empreendimentos habitacionais, tendo
conseguido amealhar 14.157 “cooperados” (fls.843).
São conhecidos de todos, no entanto, os
problemas que gerou e vêm gerando à enorme massa
destes consumidores, que não têm conseguido obter a
finalização das obras prometidas, e/ou a outorga da
escritura definitiva de seus imóveis, apesar de já terem
pago todo o preço inicialmente ajustado no contrato.
Quer se considere a BANCOOP uma
cooperativa verdadeira, quer não, o que analisaremos
mais abaixo, não há nenhuma dúvida de que causou um
enorme estrago social, deixando inúmeros consumidores
em situação de extrema dificuldade, havendo fortíssimos
indícios de fraude e desvio de dinheiro dos consumidores,
seja para o benefício de seus dirigentes, seja para
campanhas eleitorais de políticos.
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O Ministério Público vem atuando em
duas frentes a respeito desta matéria, quer por meio da
área criminal, quer por meio da Promotoria de Justiça do
Consumidor da Capital, devendo-se registrar aqui, que a
promoção de arquivamento do Inquérito Civil, noticiada às
fls.1082/1123, não foi homologada pelo Conselho Superior
do Ministério Público, que determinou a propositura de
ação civil pública, que se encontra em andamento.
Inquestionável, portanto, o interesse
social envolvido nesta ação, e a legitimidade da Apelada
para a sua propositura, até porque comprovou preencher,
para tanto, os requisitos legais elencados no art.82, IV, do
CDC, conforme se verifica pelo registro de seus estatutos
sociais, no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas
há mais de um ano, e pela finalidade nele contida, de
proteção de seus associados, enquanto consumidores do
empreendimento Solar de Santana promovido pela
BANCOOP (fls.77/85).

2. Existência de relação de consumo

Quanto a se tratar a BANCOOP de


verdadeira cooperativa, ou de cooperativa de fachada,
deve-se ressaltar, primeiramente, que qualquer que seja a
conclusão que se chegue a respeito deste assunto, não se
deve ter nenhuma dívida, a respeito da existência de
relação de consumo, estabelecida entre a BANCOOP e
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os adquirentes de unidades habitacionais do
empreendimento Solar de Santana.
A jurisprudência do E.STJ vem
reconhecendo a existência de relação de consumo, e a
aplicação do Código de Defesa do Consumidor, entre
Associações e Cooperativas e seus associados ou
cooperados, conforme se verifica nos julgados cujas
ementas seguem a seguir transcritas:

“Processual Civil. Civil. Recurso Especial.


Competência do juízo. Foro de eleição. Domicílio
do devedor. Execução. Contrato de compra e
venda de imóvel e financiamento. SFH.
Aplicação do Código de Defesa do
Consumidor. Empréstimo concedido por
associação a associado.
- Deve ser afastada a aplicação da cláusula que
prevê foro de eleição diverso do domicílio do
devedor em contrato de compra e venda de
imóvel e financiamento regido pelo Sistema
Financeiro de Habitação, quando importar em
prejuízo de sua defesa.
- Há relação de consumo entre o agente
financeiro do SFH, que concede empréstimo
para aquisição de casa própria, e o mutuário.
- Ao operar como os demais agentes de
concessão de empréstimo do SFH, a
associação age na posição de fornecedora de
serviços aos seus associados, então
caracterizados como consumidores.
- Recurso Especial não conhecido.”
(REsp 436.815/DF, Rel. Ministra NANCY
ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
17/09/2002, DJ 28/10/2002 p. 313);

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“CIVIL E PROCESSUAL. COOPERATIVA
HABITACIONAL. TERMO DE ADESÃO PARA
COMPRA DE IMÓVEL. DESISTÊNCIA. AÇÃO
PRETENDENDO O RESSARCIMENTO DAS
IMPORTÂNCIAS PAGAS. RETENÇÃO SOBRE
PARTE DAS PARCELAS DETERMINADA EM
PERCENTUAL INFERIOR AO PREVISTO
CONTRATUALMENTE. CLÁUSULA ABUSIVA.
SITUAÇÃO PECULIAR. OBRA SEQUER
INICIADA. DESPESAS ADMINISTRATIVAS
IRRELEVANTES. CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR, ARTS. 51, II, 53 E 54. CÓDIGO
CIVIL, ART. 924.
I. A C. 2ª Seção do STJ, em posição adotada por
maioria, admite a possibilidade de resilição do
compromisso de compra e venda por iniciativa do
devedor, se este não mais reúne condições
econômicas para suportar o pagamento das
prestações avençadas com a empresa
vendedora do imóvel (EREsp n. 59.870/SP, rel.
Min. Barros Monteiro, DJU de 09.12.2002).
II. O desfazimento do contrato dá ao comprador o
direito à restituição das parcelas pagas, porém
não em sua integralidade.
III. Caso em que, em face das circunstâncias
peculiares da causa, a retenção determinada
pelo Tribunal a quo se fez em parâmetro
razoável.
IV. Recurso especial não conhecido.”
(REsp 403.189/DF, Rel. Ministro ALDIR
PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA,
julgado em 26/05/2003, DJ 01/09/2003 p. 291)

“Ministério Público. Legitimidade ativa. Código


de Defesa do Consumidor. Cooperativa
habitacional. Administração em detrimento
dos cooperados apurada em inquérito civil.
Precedentes da Corte.
1. Tem o Ministério Público, na forma de vários
precedentes da Corte, legitimidade ativa para
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defender interesses individuais homogêneos,
presente o relevante interesse social, assim,
no caso, o direito à aquisição de casa própria,
obstado pela administração de cooperativa
habitacional em detrimento dos cooperados,
como apurado em inquérito civil.
2. Recurso especial conhecido e provido.”
(REsp 255.947/SP, Rel. Ministro CARLOS
ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA
TURMA, julgado em 08/10/2001, DJ 08/04/2002
p. 209);

Neste caso, ainda que se considerasse a


BANCOOP, uma Cooperativa Habitacional verdadeira,
estariam presentes os elementos que caracterizariam a
sua relação com os “cooperados” como de consumo, nos
termos do art.3º do CDC, posto que estaria a
comercializar um imóvel ou, no mínimo, prestando um
serviço de administração do dinheiro ou da poupança
do consumidor, para aquisição de uma unidade
habitacional, mediante remuneração (preço das
parcelas do imóvel estipuladas no contrato), o que
significaria a prestação de um serviço ou a
comercialização de um produto, no mercado de consumo,
seja para os bancários em geral, seja para pessoas
estranhas a esta categoria, conforme se verifica pela
qualificação dos consumidores adquirentes identificados
nestes autos (fls.36/635, 681 e 683/702).
Ademais, não haveria nenhuma dúvida,
sobre a posição de extrema vulnerabilidade do

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consumidor cooperado nesta relação, uma vez que apesar
de “cooperado”, não tem nenhuma participação na
condução dos negócios da cooperativa e do
empreendimento relativo à sua unidade habitacional,
conforme se pode constatar pelas correspondências de
fls.97/102, que comprovam que as decisões são todas
tomadas unilateralmente pela BANCOOP, e impostas aos
seus associados, sem prévia aprovação em Assembléia.

A BANCOOP, por seu turno, desenvolvia


e desenvolve atividade profissional cada vez mais
abrangente, voltada a grande massa de consumidores,
atuando como verdadeira fornecedora no mercado de
consumo.

Nenhuma dúvida, assim, deve se ter,


quanto à aplicação do Código de Defesa do
Consumidor ao presente caso, sendo inequivocamente
de consumo a relação estabelecida entre a BANCOOP e
seus “consumidores cooperados”, qualquer que seja a
conclusão que se chegue, com relação à caracterização
daquela como cooperativa habitacional verdadeira ou não.

3. Aplicação, também, do Código Civil

Ainda que assim não fosse, no entanto, o


que se admite apenas para efeitos de argumentação,
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também por aplicação de dispositivos do Código Civil,
não poderiam ser consideradas válidas a conduta e a
cláusula abusiva do contrato padrão da Apelante,
questionadas nesta ação.

E isto porque não só o CDC, como


também o Código Civil, limita a liberdade de contratar à
função social do contrato (art.421 do CC); impõe aos
contratantes a observância dos princípios da probidade e
da boa-fé (art.422 do CC); considera nulas as cláusulas
que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito
resultante da natureza do contrato (art.424 do CC); e
determina se adote a interpretação mais favorável ao
aderente, nos contratos de adesão (art.423 do CC).

Aliás, até mesmo o CC de 1916 já


considerava nulas as condições que ficassem sujeitas ao
arbítrio de uma das partes, nos termos de seu art.115, o
que foi repetido pelo art.122 do CC atual.

4. Cooperativa Habitacional de fachada, com o


exercício de atividade de incorporação imobiliária

Após análise de todos os elementos


constantes destes autos, chega-se à conclusão de que a
BANCOOP não se trata de verdadeira cooperativa
habitacional, mas sim de uma empresa criada sob o manto
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de “cooperativa habitacional”, mas efetivamente conduzida
por um grupo de empresários.

Existem características, impostas pela


própria lei nº 5.764/71, que devem se encontrar presentes,
para que uma entidade possa ser efetivamente
considerada uma cooperativa, distinguindo-a de outras
formas de atuação na atividade econômica.

4.I. Em primeiro lugar, temos que o sistema


cooperativista se caracteriza pela possibilidade de
participação efetiva dos cooperados, nos negócios,
condução e destinos da cooperativa, seja através de
seu voto em Assembléias Gerais (art.42 da Lei nº
5.764/71), seja através do voto de Delegados escolhidos
pelos grupos seccionais (art.42, § 3 e § 5º, da Lei nº
5.764/71).

Tanto que o art.38 da Lei nº 5.764/71


estabelece ser a Assembléia Geral dos associados “o
órgão supremo da sociedade, dentro dos limites legais
e estatutários, tendo poderes para decidir os negócios
relativos ao objeto da sociedade e tomar as
resoluções convenientes ao desenvolvimento e defesa
desta...”, estabelecendo, ainda, o art.42 da mesma lei,
que cada associado terá direito a um voto nas

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Assembléias, independentemente do número de suas
quotas partes no capital social.

Assim, pela lei nº 5.764/71, compete à


Assembléia Geral conduzir os negócios da cooperativa,
competindo à Diretoria ou Conselho de Administração, o
cumprimento das deliberações da Assembléia.

No caso da BANCOOP, verifica-se que


quem a conduz são as pessoais que ocupam cargos em
sua Diretoria, e não os “cooperados”, circunstância esta
que pode ser constatada desde logo, pela leitura de seus
estatutos sociais, em que se outorgou à Diretoria poderes
amplos, de decidir o que, no sistema cooperativista,
somente a Assembléia de associados poderia fazer.

Assim, por exemplo, pode a Diretoria da


BANCOOP, segundo seus estatutos, “lançar
empreendimentos”, “supervisionar, coordenar e dirigir as
atividades da cooperativa”, “assinar contratos”, etc
(fls.111/112).

Tendo-se em vista possuir a BANCOOP


46 empreendimentos de grande porte, com mais de 4.000
“cooperados” (fls.843), seria absolutamente necessário
descentralizar a tomada de decisões, em Assembléias
Seccionais, o que, muito embora tenha sido previsto em

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seus estatutos, o foi de forma a lhe retirar qualquer poder
de efetiva decisão (fls.110).

Com efeito, os estatutos sociais da


BANCOOP atribuíram às Assembléias Seccionais, um
poder de decisão meramente residual, equivalendo a um
nada ou quase nada, na medida em que lhe atribuiu o
poder de deliberar sobre tudo aquilo que já não estivesse
previsto nos seus estatutos, em seu Regimento Interno, no
Termo de Adesão (todos unilateralmente e previamente
elaborados pela BANCOOP), e desde que não se tratasse
de competência da Diretoria ou do Conselho Fiscal (art.49,
II, fls.110).

Ora, a lei das Cooperativas determinou


justamente o contrário, ou seja, que a Assembléia fosse o
seu órgão supremo, responsável pela sua tomada de
decisões, garantindo-se ao cooperado o direito de voto,
em igualdade de condições com os demais,
independentemente da quantidade de cotas partes que
cada um possua no capital social.

Mas não é só pela análise dos estatutos


sociais da BANCOOP, que se chega à conclusão de que
ela não se trata de verdadeira cooperativa.

Encontra-se devidamente comprovado


nos autos, por documentos incontestados e pela confissão

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da própria Apelante, que ela tomava decisões sobre os
empreendimentos, sem consultar previamente a
Assembléia de cooperados, impondo a estes as suas
deliberações, como o fazem os empresários fornecedores
em geral, no mercado de consumo.

As cartas juntadas aos autos às fls.97,


98/99 e 101/102, que a Diretoria da BANCOOP
encaminhou aos seus “cooperados”, não deixam nenhuma
dúvida de que as decisões eram por ela tomadas, sem
qualquer consulta prévia à Assembléia e, pois, aos
“cooperados”.

Tanto que, em tais cartas, nenhuma


referência foi feita à prévia aprovação em Assembléia, de
valores a mais que estavam sendo cobrados dos
“cooperados”, como condição para que lhes fosse
outorgada a escritura definitiva (fls.97, 98/99, e 101/102).

Em contestação, a BANCOOP chega ao


absurdo de tentar convencer, a respeito da
desnecessidade de aprovação em Assembléia, de suas
deliberações a respeito da cobrança de valores a título de
“apuração final”, tendo confessado a falta de aprovação
prévia em Assembléia, das cobranças noticiadas nesta
ação (fls.754/760).

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Alega a BANCOOP, que tal aprovação
prévia seria desnecessária, porque já previsto no contrato
e nos estatutos, a possibilidade de vir a cobrar um valor
final de seus consumidores, além das parcelas
inicialmente estipuladas no contrato.

Ocorre que a se aceitar esta


argumentação, nada mais restaria à Assembléia decidir,
porque tudo, absolutamente tudo, já se encontraria
previsto nos estatutos, no regimento interno, ou no termo
de adesão da Apelante.

Ocorre que em uma verdadeira


cooperativa, as decisões não são impostas
unilateralmente por um grupo de empresários, mas
sim discutidas e aprovadas previamente em
Assembléia, para a qual são regularmente convocados
todos os cooperados.

Em sua contestação, e nos documentos a


ela acostados, também se extrai a prova de que a
BANCOOP realizava apenas Assembléias Ordinárias
únicas, para a tomada de decisões absolutamente
genéricas e centralizadas, sobre todos os seus 46
empreendimentos, das quais não participavam e nem
eram efetivamente chamados os cooperados.

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Realmente, a título de exemplo, examine-
se a Ata da Assembléia Geral Ordinária, realizada em
24.02.2005 (fls.941/942). Dela se pode verificar uma
aprovação meramente genérica de contas da Diretoria, por
supostos 72 cooperados presentes, relativamente a todos
os 46 empreendimentos (fls.1407/1422).

Não consta que existissem Delegados


representando as Seccionais, como permite a Lei nº
5.764/71, nem que Assembléias eram realizadas de forma
descentralizada, tudo sendo genérica e sumariamente
decidido em Assembléia única, dirigida por um pequeno
grupo de pessoas, e da qual não se faziam presentes
cooperados em número suficiente a garantir alguma
legitimidade às decisões tomadas (fls.1407/1422).

Realmente, o comparecimento de
supostos 72 cooperados à Assembléia em questão, frente
ao número muitíssimo mais elevado de cooperados (mais
de 4.000 - fls.843), torna evidente que não havia efetiva
participação dos cooperados nas Assembléias, não sendo
estas divulgadas de forma eficiente a mobilizá-los
(fls.1403/1408).

E mais, assuntos de extrema importância,


relativos a pagamentos extras, ao andamento das obras, à
realização de contratos, etc, não eram submetidos à

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Assembléia, mas sim decididos pela própria Diretora,
como uma verdadeira empresa.

Mesmo a aprovação de contas constante


da Ata de fls.941/942, foi feita de forma totalmente
genérica, sem maiores justificativas ou questionamentos,
tudo a revelar a existência de prévio conluio entre os
participantes.

Eventuais Assembléias Seccionais


realizadas, além de raras, quando aconteciam, tinham por
objetivo, apenas, informar o consumidor sobre o que seria
ou fora decidido pela Diretoria, não funcionando, portanto,
como órgão de aprovação e deliberação (fls.91).

Mas além do fato de os “cooperados” não


participarem da condução da cooperativa, sendo esta
efetivamente conduzida por um grupo de pessoas, o que já
bastaria, por si só, para descaracterizá-la como verdadeira
cooperativa habitacional, outros fatores existem, ainda, a
desfigurá-la como tal.

4.II. É que a cooperativa não pode ter objetivo


de lucro (art.3º da Lei nº 5.764/71), podendo se tornar
associado apenas a pessoa efetivamente interessada nos
serviços que ela se propõe a executar (art.29, “caput”, da
Lei nº 5.764/71), estando o exercício das funções de

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Diretoria e Conselho Fiscal restritas a associados (artigos
47 e 56 da Lei nº 5.764/71).

Ademais, não podem ingressar “no


quadro das cooperativas os agentes de comércio e
empresários que operem no mesmo campo
econômico da sociedade.” (art.29, § 4º, da Lei nº
5.764/71), porque, evidentemente, possuem interesses
contrários aos interesses da cooperativa (art.52 da Lei nº
5.764/71).

Neste caso, verifica-se que a BANCOOP


foi fundada por Ricardo Berzoini, inicialmente dirigida por
Luiz Eduardo Saeger Malheiro (fls.90), e em seguida por
João Vaccari Neto (fls.102).

Segundo afirmou a Apelada na inicial,


com base em documentos que juntou aos autos, várias
empresas contratadas pela BANCOOP, seja de
construção, venda, intermediação, publicidade, corretagem
ou incorporação, pertenciam a pessoas que ocupavam
cargos na Diretoria, no Conselho de Administração ou no
Conselho Fiscal da BANCOOP, recebendo, portanto, dos
cofres da cooperativa (fls.41/247).

Portanto, os dirigentes da BANCOOP


eram empresários, que operavam no mesmo campo
econômico da cooperativa, e que, assim, possuíam

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interesses antagônicos ao dela, não podendo ingressar em
seus quadros, nos termos da lei.

Não se vislumbra, portanto, tendo em


vista estas circunstâncias, como se possa aceitar a
alegação de que a BANCOOP não visasse o lucro.

4.III. Mas existe ainda um outro fator, a


descaracterizar a BANCOOP, como verdadeira
cooperativa habitacional.

É que a cooperativa, para ser


considerada como tal, deve ter neutralidade política
(art.4º, IX, da Lei nº 5.764/71).

Não é o que se verifica no caso da


BANCOOP, em que além de ter sido fundada por Ricardo
Berzoini, então Presidente do Partido dos Trabalhadores,
quando também assumiu a Diretoria Financeira da
“cooperativa” (fls.90), foi dirigida por Luiz Eduardo Saeger
Malheiro, de 1996 a 2004, Presidente do PT de Praia
Grande e que concorreu ao cargo de vice-prefeito de Praia
Grande, posteriormente vindo a ser dirigida por João
Vaccari Neto, Diretor Nacional do Partido dos
Trabalhadores, e 2º Suplente do Senador Aloísio
Mercadante.

O contido na Ata da Assembléia


Seccional realizada em 15.06.1998, dá bem a idéia da

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confusão existente entre a BANCOOP e o mundo político,
pois Ricardo Berzoini informa que iria se dedicar.
Prioritariamente, à sua candidatura a Deputado Federal,
sem se afastar de seu cargo de Diretor da BANCOOP,
tendo sido indicado a tanto, por dezenas de dirigentes
sindicais e de associações de bancários (fls.91).

Outra prova desta falta de neutralidade


política, é a doação feita por empresas prestadoras de
serviços a BANCOOP, para a campanha política de
candidatos a cargos eletivos (fls.206/211).

4.IV. Além de não se tratar de verdadeira


cooperativa habitacional, a atividade exercida pela
BANCOOP se caracteriza como de incorporação
imobiliária.

A esta conclusão se chega não só por


tudo o quanto já foi acima exposto, a tornar evidente o
exercício de uma atividade empresarial sob a fachada de
cooperativa mas, também, pela leitura do contrato
firmado com os consumidores, em que se vislumbra todas
as características necessárias, para a caracterização da
então atividade exercida, como de incorporação imobiliária
(fls.354/362), nos termos dos artigos 28, § único e 29,
caput”, da Lei nº 4.591/64.

24
Realmente, por meio de tal contrato,
denominado “Termo de adesão e compromisso de
participação”, a BANCOOP, intitulando-se responsável
pela implantação e construção de futuro conjunto
residencial “Solar de Santana”, se compromete a entregar
ao consumidor uma de suas unidades habitacionais,
mediante o pagamento de um preço, dividido em parcelas
(fls.354/355).

Ora, isto nada mais significa do que a


promessa de entrega futura de uma unidade habitacional a
ser ainda construída, mediante o pagamento de um preço,
típica atividade de incorporação imobiliária, nos termos dos
dispositivos legais acima citados da lei específica.

Assim, como “Nas declarações de


vontade se atenderá mais à intenção nelas
consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”
(art.112 do CC), deve-se considerar que o contrato padrão
objeto destes autos, consubstancia verdadeira atividade de
incorporação imobiliária, tendo a BANCOOP criado a
fachada de “cooperativa”, para fugir das várias exigências
legais impostas àquela atividade empresarial.

Realmente, enquanto as cooperativas


não podem sofrer “interferência estatal em seu
funcionamento” (art.5º, XVIII, da CF), as incorporadoras só
podem comercializar frações ideais de um terreno,

25
vinculando-as a unidades autônomas a serem construídas,
após comprovarem o preenchimento de uma série de
requisitos legais, perante o Cartório de Registro de Imóveis
competente, os quais visam evitar danos ao consumidor
(art.32, da Lei nº 4.591/64).

Assim, a incorporadora deve comprovar


possuir idoneidade financeira, estar quite com o
pagamento de impostos, possuir título de propriedade
devidamente registrado, autorização dos órgãos
competentes, ter feito o cálculo de custo geral da obra e da
construção de cada unidade autônoma, ter calculado as
áreas da edificação, etc (art.32 da Lei nº 4.591/64), tudo
de molde a demonstrar a sua capacidade de levar a bom
termo o empreendimento, sem danos ao consumidor.

Somente após o preenchimento e


comprovação destes requisitos, é que o incorporador
obtém o registro da incorporação imobiliária, podendo, a
partir daí, comercializar unidades habitacionais a serem
construídas (art.32, caput, da lei nº 4.591/64), sob pena de
contravenção penal (art.66, I, do mesmo diploma legal).

Resta evidente, assim, que a BANCOOP,


neste caso, visando burlar o cumprimento da lei, criou a
fachada de cooperativa habitacional, para poder praticar
atividade de incorporação imobiliária, sem o cumprimento
dos requisitos legais.

26
4.V. Quanto ao fato de as unidades
habitacionais já terem sido entregues neste caso aos
consumidores, faltando a regularização de seus títulos de
propriedade, nem por isso se torna desnecessário o
registro da incorporação, e tudo o mais que for necessário,
nos termos da Lei nº 4.591/64, para se garantir aos
consumidores que já pagaram as prestações previstas no
contrato, o recebimento das escrituras definitivas de suas
unidades habitacionais.

Em se tratando de verdadeira atividade


de incorporação imobiliária, o registro imobiliário desta
deve sempre ser feito, ainda que após a entrega das
unidades, pois se trata de pressuposto lógico e necessário,
estabelecido pela lei, para o registro das escrituras das
unidades autônomas (art.32 da lei nº 4.591/64).

Uma interpretação diversa da desta,


significaria permitir a comercialização de frações ideais de
um terreno, para entrega futura de unidades autônomas,
sem o prévio registro da incorporação, na certeza de que,
uma vez entregues as unidades, tal registro não mais se
tornaria necessário.

O registro prévio da incorporação é


necessário, não só para proteção do consumidor, no
momento da compra de um imóvel ainda não construído
ou em construção, como para permitir o registro de seu

27
título aquisitivo, no Cartório de Registro de Imóveis, de
forma regular, o que ainda não ocorreu neste caso.

Correta, assim, a r.sentença “a quo”, ao


determinar a realização do registro da incorporação.

5. Cláusula e prática contratual abusivas

A cláusula 16ª do contrato padrão firmado


entre a Apelante e os consumidores é nula de pleno
direito, quer sob o ponto de vista do CDC, quer sob o
ponto de vista do Código Civil (fls.362).

Primeiro, porque ela foi redigida de forma


a gerar dúvidas de interpretação, não ficando claro o seu
conteúdo e alcance (fls.362).

Se por meio dela, a Apelante se arroga o


direito de vir a cobrar do consumidor, ao final do
empreendimento, uma quantia extra, correspondente à
diferença entre o que pagou e o custo final da obra, é certo
que tal não ficou claro em sua redação, conforme se pode
verificar: “Ao final do empreendimento, com a obra concluída e
tendo todos os cooperados cumprido seus compromissos para com
a cooperativa, cada um deles deve, exceto no que se refere a
multas e encargos previstos no Estatuto, neste instrumento, ou por
decisão da diretoria ou da assembléia, ter pago custos conforme a

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unidade escolhida/atribuída, considerados ainda os reajustes
previstos no presente Termo”. (fls.362)

Assim, é de se aplicar aqui o disposto no


art.46 do CDC, segundo o qual “Os contratos que regulam
as relações de consumo não obrigarão os consumidores,
se não lhes for dada a oportunidade de tomar
conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os
respectivos instrumentos forem redigidos de modo a
dificultar a compreensão de seu sentido e alcance”.

Ainda que se admita, como quer a


Apelante, que tal cláusula contratual tenha sido redigida de
forma clara, a indicar a possibilidade de cobranças de
diferenças ao final da obra, o que se admite somente para
efeitos de argumentação, continuaria a mesma a ser nula
de pleno direito, por colocar o consumidor em posição
de extrema desvantagem frente ao fornecedor, sendo
incompatível com a boa fé, com a equidade e com a
probidade (art.51, IV, § 1º, I, II e III do CDC e 422 do CC).

Trata-se, na realidade, de cláusula que


prevê uma condição potestativa, pois submete uma parte
ao puro arbítrio da outra, o que, desde 1916, já era
considerado nulo e ilícito, nos termos do art.116 do CC
então vigente, assim tendo continuado a se considerar,
nos termos do art.122 do CC atual.

29
Realmente, permitir-se simplesmente ao
fornecedor, a cobrança de qualquer quantia que entenda
devida, ao final da construção do empreendimento, para
cobrir eventual diferença, por ele unilateralmente
apurada, entre o que foi pago pelo consumidor, de acordo
com o contrato, e o custo final da obra, coloca o adquirente
em posição extremamente vulnerável e insegura, já que o
submete à possibilidade de cobranças infundadas, e
com relação as quais não possui meios de verificação
e controle, já que nem sequer constou de tal cláusula
contratual, os critérios e parâmetros que seriam levados
em consideração, para apuração da diferença a ser
cobrada, ficando, assim, o consumidor, complemente
submetido a cumprir uma decisão unilateral do fornecedor,
como condição para receber a escritura definitiva,
condição esta, aliás, estipulada na cláusula 17ª do mesmo
contrato (fls.362).

Tal cláusula contratual é nula, ainda, por


implicar em renúncia, pelo consumidor, de direito que
possui, de não vir a ser submetido à variação do preço de
forma unilateral (art.51, I e X do CDC e 424 do CC).

E tanto tal cláusula é nula e contrária à


boa fé que, com base nela, vem a BANCOOP praticando
graves abusos contra o consumidor.

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Nesse sentido, verifica-se, neste caso,
que como se já não bastasse ter a BANCOOP cobrado
uma diferença dos consumidores, a título de “apuração
final”, em julho de 2003, quando já era prevista para data
próxima a finalização das obras (fls.98/99), voltou a cobrar
destes mesmos consumidores nova diferença, em março
de 2006, a título de “apuração final” do valor de custo das
obras, esclarecendo que, somente após o seu pagamento,
seria outorgada, a cada um, a escritura definitiva do imóvel
(fls.101/102).

Estas cobranças não foram submetidas


à prévia aprovação dos consumidores, nem
devidamente justificadas e comprovadas, violando,
assim, de forma flagrante, o princípio da boa fé e a função
social do contrato, constituindo-se, ainda, em prática
abusiva, por implicar na exigência, do consumidor, de
vantagem manifestamente excessiva, já que não previstas
tais cobranças no plano de pagamento geral do contrato,
(art.421 e 422 do CC, e 39, V do CDC).
Correta, portanto, a r.sentença “a quo”, ao
condenar a Apelante a tomar as providências necessárias
para a outorga das escrituras definitivas das unidades
habitacionais, independentemente do pagamento de
resíduos (vide tutela antecipada de fls.709, confirmada
pela r.sentença “a quo” – fls.1332).

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6. Jurisprudência deste E.Tribunal de Justiça

A jurisprudência deste E.Tribunal de


Justiça vem, sistematicamente, dando ganho de causa ao
consumidor ou à Associação dos Consumidores, em
hipóteses análogas à presente, quer reconhecendo a
existência de relação de consumo entre a BANCOOP e os
seus “cooperados”, quer considerando que se trata de
efetiva atividade de incorporação imobiliária, quer
considerando abusivas as cobranças de resíduos a título
de apuração final do custo do empreendimento (Embargos
de Declaração nº 994.08.039854-2/50001, julgados em
25.02.2010, pela 4ª Câmara de Direito Privado; Apelação
Cível nº 990.10.035494-9, julgada pela 6ª Câmara de
Direito Privado, em 08.04.2010; Apelação Cível nº
994.09.336.810-6, julgada pela 4ª Câmara de Direito
Privado, em 25.03.2010; Apelação Cível nº
994.09.341322-3, julgada pela 3ª Câmara de Direito
Privado, em 23.03.2010; Apelação Cível nº
994.08.018648-0, julgada pela 4ª Câmara de Direito
Privado, em 11.03.2010, e Outros).

7. Conclusão

Assim sendo, por todas as razões


expostas, opina esta Procuradoria de Justiça seja negado
provimento ao recurso de apelação da BANCOOP,
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mantendo-se a r.sentença de Primeira Instância, em toda a
sua integridade, por medida de Justiça.

São Paulo, 27 de abril de 2010.

DORA BUSSAB CASTELO


Procuradora de Justiça
Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos

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