Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
O Capitalismo
1
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
nobreza da Inglaterra conflitavam, nos séculos XVIII e XIX, com um sistema de trocas
livres que germinara no meio de párias. Vítima de políticas mercantis dedicadas a
beneficiar um seleto grupo, a situação encontrada pelo proletariado inglês era de uma
aflitiva exclusão. O desespero da situação foi satirizado pelo irlandês Jonathan Swift
em Uma Modesta Proposta, que recomendou o canibalismo de infantes como solução
para a superpopulação. Essa massa miserável, encurralada no beco da sobrevivência,
foi salva pela própria originalidade. Similar à água que descobre novos caminhos
quando obstruída, parece que a genialidade humana encontra meios surpreendentes
para desviar-se das adversidades. Uma tragédia não se acometeu sobre a Inglaterra
porque a economia escoou para a marginalidade, e propulsou a formação de uma
indústria voltada para atender as necessidades da massa. Hoje é a burocracia que,
para defender um Estado todo-poderoso, persegue a marginalidade econômica dos
trabalhadores que apenas conseguem encontrar sustento longe das exigências legais.
No século XVIII, as barreiras criadas sobre a livre circulação do trabalho, criticadas por
Adam Smith, dificultavam o trabalhador de “exercer sua indústria em qualquer
paróquia, que não seja àquela a qual pertence”. A desordem gerada por tais leis foi
notada por Adam Smith como “a maior talvez, de todas [as desordens], da política da
Europa”.2 Nos dias de hoje o Estado possui suas modernas barreiras legais e todo o
legislativo empenha-se em criar novas “Leis do Pobre” diariamente. Os encargos
trabalhistas que uma empresa deve arcar por empregado contratado, por exemplo,
equivalem a 102% do total de seu salário. Uma onerosidade excessiva que empurra
quase metade de todos os trabalhadores a buscarem sua sobrevivência na
informalidade trabalhista. Apenas 43,6% dos trabalhadores brasileiros exercem seu
ofício com carteira assinada.3 A evasão informal é o caminho imposto pelo Estado
brasileiro à correnteza do trabalho, mas também é o que tem escorado esse país. Se
fosse repentinamente eliminada do mercado brasileiro toda a massa de trabalhadores
informais, haveria motivo para temores parecidos com os de Swift. A primeira lição a
ser retirada de As Seis Lições não é outra senão a própria retirada das barreiras e
obstáculos jurídicos que empanturram a burocracia enquanto representam verdadeiros
entraves aos empregadores e empregados brasileiros. Ambos jogados na arena, com
centenas de equipamentos legais, por uma política com os antolhos voltados para a
luta de classes. É justamente dessa atração pela luta de classes que passamos ao
segundo tema dos pronunciamentos de Mises.
2
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
O Socialismo
3
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
todos é criticada por Mises, que explica que organizar forçadamente a sociedade
apontando para uma meta única, apenas tende a desorganizar a harmonia que lhe
seria natural.
Friedrich A. Hayek discorre ainda sobre as conseqüências desastrosas do
planejamento central na própria estrutura do Estado de Direito. Há prejuízos de ordens
econômica e moral, pois o plano central substitui a imprevisibilidade dos efeitos das
ações individuais pela imprevisibilidade das ações Estatais, variantes ao humor do
governo. De acordo com o Professor Hayek “Pode parecer paradoxal que consideremos
uma virtude o fato de, em dado sistema, conhecermos menos acerca do efeito
particular das medidas tomadas pelo Estado do que seria o caso na maioria dos outros
sistemas, e que um método de controle social seja considerado superior justamente
por desconhecermos seus resultados precisos. Entretanto, essa consideração é o
fundamento lógico do grande princípio liberal do Estado de Direito. (...) As normas
gerais, as verdadeiras leis, em contraposição às determinações específicas, devem
portanto ser configuradas de modo a atuar em circunstâncias que não podem ser
previstas em detalhe (...) Só neste sentido o legislador será imparcial.” 4 Esse grande
princípio liberal da imparcialidade vem sendo vilipendiado pelos preconceitos socialistas
que, no Brasil, não compõem a ideologia de uma parcela da sociedade, mas formam
uma tradição permanentemente impregnada no próprio significado da política. Mercado
livre para o brasileiro continua cheirando à selvageria. Podemos nunca ter embarcado
num socialismo explícito, mas não há expectativa tangível de que algum dia sairemos
de sua influência teórica sobre nosso eterno gerúndio.
O Intervencionismo
4
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
5
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
ano no país.8 Nada que pareça incomodar o Estado a ponto de suspender sua atenção
das intervenções econômicas. Não basta deixar morrer, têm que morrer pobres.
E ainda há quem acredite na ilusão de que o intervencionismo tem diminuído no
país. Tomam, como exemplo, a desistência do Estado em controlar os preços e a
resolução do grande mal dos anos oitenta.
A Inflação
Eis o mais famoso triunfo das políticas econômicas das últimas décadas. O fim
da inflação. Pelo menos a transposição da inflação monstruosa que alcançava 32,96%
em agosto de 1993, para a domesticada porcentagem de 1,86 no mesmo período do
ano seguinte.9 O resultado formidável garantiu ao então Ministro da Fazenda, Fernando
Henrique Cardoso, a presidência; mas isso não significa que os trilhões inflacionários
acumulados por mais de uma década tenham feito cessar a sua conseqüente
desigualdade econômica; camuflada, como critica Mises, pela noção de nivelamento.
Méritos devem ser dados a FHC por não ter imitado o controle de preços
atacado à exaustão por Mises. Esse método, aliás, foi o principal vício dos planos
Cruzado, Bresser e Verão, cujas maiores façanhas consistiram na escassez de produtos
no mercado, a prática do ágio e a desconfiança do investidor externo. Relação de
causa-conseqüência claramente explicada no capítulo anterior de “As Seis Lições”.
Fernando Henrique conseguiu amansar a inflação porque aprendera algo que
Mises havia esclarecido meio século antes. A causa da inflação não está na elevação
dos preços, mas no aumento da quantidade de dinheiro. O governo do PSDB só resistiu
abster-se da necessidade de emissão da moeda fiduciária ao diminuir seus gastos,
como através das famigeradas privatizações que tiraram dos ombros do Estado o peso
do prejuízo de suas estatais.
Mas quem acha que o fato de termos mantido uma inflação ligeiramente
regulada nos últimos dez anos é o suficiente para dispensar o ensino desse capítulo, e
que a teoria do economista britânico John Maynard Keynes já foi abandonada pela
ideologia dos últimos governantes, ainda não desvendou o fundamento do problema.
O Estado brasileiro continua averiguando a economia somente através da
seguinte questão keynesiana explicitada por Mises: “o que é preferível, um dinheiro
lastreado com desemprego ou a inflação com pleno emprego?” Esse interruptor que,
quando liga a inflação desliga o desemprego, e vice-versa, precisa ser substituído pelo
outro questionamento: “como podemos melhorar a situação dos trabalhadores e de
6
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
O Investimento Estrangeiro
7
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
8
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
Políticas e Idéias
9
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
Estado nada tem a ver com força e coerção. A manipulação da linguagem transformou
os defensores da liberdade em alvos de desprezo ou desconfiança.
Encontramo-nos num vácuo intelectual onde parece que a imbecilidade venceu
a genialidade, como disse Nélson Rodrigues, pela superioridade numérica. A
desinformação esquerdista consegue impedir física e intelectualmente que
pensamentos, como o da Escola Austríaca, tenham acesso ao senso comum brasileiro.
Todo conhecimento que difira das teorias esburacadas, expostas do primário à
universidade como “verdades absolutas”, fica retido numa espécie de filtro cultural.
Essa é a conseqüência de sistemas educacionais suportados pelo Estado. Quem tem o
poder de escolher o que a sociedade deve ou não aprender, jamais permitirá que seja
ensinada qualquer doutrina que coloque em risco esse poder. Se o Estado é quem
promove a educação, as teorias que duvidam da legitimidade do intervencionismo
estatal não poderão ser lecionadas. Por ser excluído das salas de aula, o liberalismo
acabou sendo eliminado dos debates públicos, e só não veio a desaparecer graças ao
refúgio oferecido por escritores comprometidos com a seriedade científica. Foram
esses homens que, mesmo marginalizados, mantiveram viva a tradição do
pensamento liberal.
Se, no campo da ciência política, efetivar uma comunicação tem-se tornado
difícil, o seu exercício foi transformado num palco de atuações canastronas e discursos
fingidos a fim de atender às exigências de determinado grupo de pressão. Esse
conceito, utilizado por Mises na comparação de partidos políticos a “grupos de pessoas
desejoso de obter um privilégio à custa do restante da nação”, eleva-se no cenário
nacional à categoria de definição.
Frédéric Bastiat apresenta o Estado como “a grande fiação através da qual todo
mundo se esforça para viver às custas de todo mundo”.15 Encaixe perfeito às funções
dos grupos de pressão. Se um partido sai em defesa de uma classe, como o PAN
(Partido dos Aposentados da Nação) ou o PCO (Partido da Causa Operária), fica
evidente que uma eventual vitória nas eleições não beneficiará ao conjunto da
sociedade, mas apenas a um determinado grupo. Um candidato a um cargo legislativo,
então, que baseia sua campanha em atender as reivindicações de sua cidade ou
estado, age de forma irreprochável para qualquer eleitor. Se os Estados Unidos do
século passado eram “mais práticos no parlamento”, o Brasil do século XXI é o cúmulo
do funcionalismo.
Mas a decadência não se reserva, com exclusivismo, à pragmática política. O
professor Hans-Hermann Hoppe, um dos mais eminentes defensores da Economia
Austríaca da atualidade, afirma que a economia predominante está num estado de
10
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
Como resultado, o Brasil hoje produz mentes consideradas pelo PISA (Programa
Internacional de Avaliação Estudantil) entre mais inaptas do mundo. Jovens
contraditórios o bastante para reclamar do Estado enquanto o alimentam com a
virgindade de sua alma.
Apesar de todos os fiascos humanos do século XX, compartilho com Mises da
esperança de que nossa civilização, e em especial o Brasil, “sobreviverá respaldada em
idéias melhores que aquelas que hoje governam a maior parte do mundo”. Não é
através da violência das armas que resistiremos à ruína, mas através do poder das
palavras. Quando este momento passar, serão lembrados aqueles que, no meio da
loucura generalizada, perseveraram na busca pela verdade. Esta será a recompensa de
tão honroso trabalho prestado pelo Instituto Liberal e diversos pensadores que,
através da mídia impressa ou virtual, conseguem divulgar as idéias que derrotam
idéias; idéias que, como disse um dos maiores gênios do século passado, podem
iluminar a escuridão.
11
I Prêmio Donald Stewart Jr. – 2004 Diogo Godinho Ramos Costa
Referências
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u57763.shtml>
1990. p. 88-89.
7- Números do IBPT.
9- IPCA, IBGE.
10- KEYNES, John Maynard. Inflacão e Deflação. 2. ed. São Paulo: Nova Cultura, 1985.
p. 300-301.
12- BASTIAT, Frédéric. Frédéric Bastiat. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1989. p. 105.
15- BASTIAT, Frédéric. Frédéric Bastiat. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1989. p. 92.
12