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Kultur Dokumente
Introdução à Antropologia
Cultural
WEBMissionary
Antes de ler este material saiba que ele foi digitado em português de Portugal,
por isso contém algumas palavras e expressões que não existem em português
do Brasil. Tente ler este material aproveitando o seu conteúdo, que é de
altíssimo nível para quem estuda missões interculturais.
1
ÍNDICE
0. 0 MUNDO EM QUE VIVEMOS, 5
1. A ANTROPOLOGIA CULTURAL, 11
O LABORATóRIO DO ANTROPóLOGO, 21
GEOGRÁFICA, 44
DESAFIO E RESPOSTA, 57
COMPLEXOS CULTURAIS, 59
3
2.4. Aspectos universais da cultura, 67
CULTURAL, 67
5
O MUNDO EM QUE VIVEMOS
0 mundo humanizado
FORÇA BIOLÓGICA
(HOMEM)
CULTURA
MUNDO NATURAL
MUNDO ARTIFICIAL 0
FORÇA BIOLóGICA
(HOMEM)
CULTURA
MUNDO NATURAL
8
MUNDO ARTIFICIAL
MUNDO NATURAL
coisas materiais
Artefatos
MUNDO ARTIFICIAL
coisas espirituais
Sócio-fatos
Mentefatos
9
Os objetos do mundo da mão são os artefatos, objetos produzidos a
partir da matéria, objetos materiais como, por exemplo, um cesto, um
barco ou um vaso de cerâmica; os sociofactos são os objectos sociais
criados para regular a prática social dos membros duma comunidade,
como um interdito, uma norma de comportamento, um aperto de mão,
uma cerimónia de casamento. Os sociofatos sã o puros objectos de
comunicação que só têm funcionalidade quando exclusivamente
praticados pelos actores sociais. Os mentefatos são objectos espirituais
produzidos pelo espírito; tal como os sociofatos pertencem ao mundo do
cérebro, não implicando, necessariamente,’ a comunicação social, a vida
em grupo, para existirem e serem produzidos - uma canção, um poema,
uma lei científica são mentefatos.
10
É este o mundo que nos rodeia, um mundo de idéias, um mundo de
coisas. 0 homem produtor de objectos, símbolos e conceitos, rodeia-se
de uma intrincada rede simbólica de comunicação que reproduz, no
exterior, a complexidade do seu próprio sistema nervoso; através dos
outros (receptores de mensagens) situa-se a si mesmo como sujeito
(emissor de mensagens) e determina, fora de si, o seu lugar no mundo
social e físico. Representa o seu papel dentro dum mundo artificial que
não deixa de se tornar mais complexo, acumulando continuamente
novos elementos de cultura porque as culturas emigram com os homens
e deixam traços no mundo inteiro. As invenções, as descobertas e as
práticas mais eficazes são adoptadas pelos povos mais diversos e a
cultura constitui-se como cumulativa.
...................................................................................
................................
cultivou campos,- mas, quando pensamos neles, estes objectos são, eles
próprios, máquinas destinadas a produzirem inércia a um ritmo e numa
proporção infinitamente mais elevada que a quantidade de organização
que implicam. Quanto às criações do espírito humano, o seu sentido não
existe senão em relação a ele, e elas confundir-se-ão com a desordem
quando ele tiver desaparecido. Se bem que a civilização, encarada no
seu conjunto, possa ser descrita como um mecanismo prodigiosamente
complexo em que seríamos tentados a ver a oportunidade que o nosso
universo teria de sobreviver se a sua função não fosse senão fabricar o
que os físicos chamam entropia, isto é, inércia. Cada palavra trocada,
cada linha impressa, estabelecem uma comunicação entre dois
interlocutores, tomando estacionário um nível que se caracterizava
anteriormente por um
locais bem localizados do seu cérebro, todos aqueles que são mestres da
língua, todos aqueles para quem as palavras têm um sentido, todos
aqueles para quem existem altitudes de alma e correntes no
pensamento, aqueles que são o espírito da época, e que denominaram
essas correntes do pensamento, eu penso nas suas precisas
necessidades, e nesse movimento de autómato que atira a todos os
ventos o seu espírito - são uns porcos.»
10
o z,
.... ......
(@ A_ ANTROPOLOGIA CULTURAL
12
ções de antropólogos americanos, alemães, franceses e da Península
Ibérica. Os antropólogos ingleses e americanos desenvolvem o
funcionalismo, numa perspectiva de estudo das instituições dos povos
«primitivos actuais»,- a geração de funcionalistas da primeira metade do
século cria escola e empurra o academismo escolar e a investigação
inglesa e americana para a Antropologia Social. Em França, os mesmos
objectivos de estudo de comunidades primitivas eram visados pela
ciência dos povos e dos seus costumes - a Etnologia - e pela Etnografia,
levantamento sistemático de hábitos, crenças, folclore, testemunhos
culturais e sociais.
HOMEM
SER INDIVIDUAL
SER CULTURAL
SER SOCIAL
Antropologia Física
Antropologia Cultural
Antropologia Social/Sociologia
Antropometria
Craniometria
Genética
Paleontologia Humana
Antropologia Racial
Etno1og@a, Emografia
ra a
Ergologia A@(jijeoIogia
Folclore
Emo musicologia
História
Etno-SocioIogi
Política
Estética
Moral
Direito
Economia
Religião
Mitologia
Arte
Demografia
Esquema das ciências humanas e sociais (In M. lima, «Int. à
Antropologia Cultural»
13
1. 1.2. O CAMPO DE ACÇãO DA ANTROPOLOGIA CULTURAL
*/*
Herdeira dos conceitos de cultura, civilização e progresso criados pelo
Iluminismo e, ainda, de todo um enorme material recolhido nos três
séculos de imperialismo marítimo europeu, a Antropologia Cultural
centrou-se na constatação da diferença das outras raças e culturas em
relação às do homem branco colonizador. É, pois, uma Antropologia do
homem branco que se institui como ciência positiva(*), distinguindo-se
das outras ciências sociais e humanas pelo seu objecto - o homem como
produtor cultural - e
inglesas, 1898
14
niscências nas suas instituições, da sua origem sueca, holandesa,
russa, polaca ou irlandesa. A Inglaterra, vendo-se obrigada a deixar as
colónias e o seu campo de acção privilegiado - as ilhas do Pacífico -
estuda o seu meio rural e as franjas urbanas, mantendo sob concessão
temporária trabalhos de investigação esporádicos na América do Sul e
no Próximo e Médio Oriente.
k lu IGRUfim &Tis--TIM:
«Então, quem poderia estudar livremente hoje em dia a vida real do Irão,
do Camboja e do Alganistão? Não falo dos observadores ocidentais, mas
dos etnólogos autóctones e nacionais.- que «jovem nação» não veria aí
uma forma de espionagem ou de subversão?
15
0 objecto e o método da Antropologia Cultural J
16
No panorama das ciências sociais contemporâneas o antropólogo ocupa
assim um
17
destas. E as grandes casas agrícolas da região que absorviam, até há
pouco tempo, quase toda a mão-de-obra local, pertencem a uma dezena
de famílias quase todas residentes numa vila próxima. Estas famílias
possuem entre si 54% da área da freguesia e auferem 55% do
rendimento colectável da mesma. 42% do rendimento colectável cabe
aos três principais latifundiários. As principais produções da freguesia
são o trigo, a azeitona e a lã de alguns rebanhos.
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Idealmente, um homem é soberano e independente e detém a
responsabilidade de uma família. Deve ser corajoso sem ser temerário,
firme nos seus propósitos sem ser obstinadamente teimoso, e dotado de
bom senso e sabedoria da vida que lhe permi .tam estabelecer
compromissos sem, aparentemente, sacrificar a sua independência. 0
acesso aos direitos e deveres da hombridade (qualidade de ser homem)
faz-se pelo casamento. Um homem solteiro permanece para sempre um
«rapaz» e o status moral de um «rapaz» é inferior ao de um homem.
Quando um grupo de homens vacila perante um empreendimento,
mostrando tibieza ou falta de sentido das responsabilidades, ouve-se às
vezes um deles dizer: «Então, somos homens ou somos rapazes?»
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resto da população como possuindo privilégios que intrinsecamente as
distingam do resto da população. Filho da filosofia da Revolução
Francesa, o Alentejo de hoje é «terra livre e alodiab), habitada por
homens que «nascem livres e iguais em direitos» e que têm consciência
disso. Há um plano de existência e de consciência em que o trabalhador
rural se considera igual ao latifundiário. Mas essa igualdade ideal é
contradita por um sistema económico, social e político que não só
estabelece grandes disparidades de riqueza como coloca um homem, em
muitos contextos da vida, na dependência de outros. E essa
dependência, não obstante os benefícios que possa por vezes acarretar
ao dependente, diminui a sua estatura moral. Como se diz em Vila
Velha.- «Isso que eu peço não é favor - minha vergonha me custa. »
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C2,---OlIABORATóRIO DO ANTROPÓLOGO
2. 1. A cultura e as culturas
A cultura e as culturas
Herbert Marcuse
22
Ora este programa genético no Homem tem como conclusão um sistema
nervoso, instrumento das suas relaçõ es com o meio inanimado e
animado, instrumento das suas relações sociais, das suas relações com
os i .ndivíduos da mesma espécie que povoam o nicho onde ele vai
nascer e desenvolver-se. A partir daíele encontra-se inteiramente
submetido à organização deste meio. Mas o nicho não penetrará e não
se fixará no seu sístema nervoso a não ser de acordo com as
características estruturais deste. 0 sistema nervoso responde
primeiramente às necessidades urgentes, que permitem a manutenção
da estrutura do organismo. Depois disto responde ao que chamamos
‘@ouIsões-, o princípio do prazer, a procura do equilíbrio biológico. (..)
23
Diferentes respostas culturais ao mesmo obstãculo: a captação de
peixes
24
nosso desejo de ser amado. Nascidos prematuramente (longo período da
infância) penduramo-nos a qualquer elemento do mundo exterior que
nos traga satisfação.
0 homem nasce apenas com o capital biológico. Mas o homem morre só.
A cultura é esse universo de objectos materiais e simbólicos, carregados
de sentido e
informação, herdados pela comunidade e por esta transmitidos aos seus
membros, que se tomam seus portadores - e eventualmente seus
produtores - em vida.
0 triângulo biocultural
SER BIOLóGICO
C. eC.-2 25
A sociedade tem portanto um papel a representar: transmitir com um
sentido, a informação cultural de que é depositária, porque o homem só
se define como tal inserido numa sociedade e numa cultura. Robinson
Crusoé(e) na sua ilha isolada restaurou a sua cultura memorizada para
uma sociedade imaginária; os meninos-lobos da índia ou o menino-
selvagem, vítima, em França, da tentativa de inserção na sociedade
humana, são apenas projectos de homem e não reconhecem como sua a
sociedade humana que rejeitam.
LI omãi qe dava pulus era 1 omãi qe dava pulus grades. El pulô tantu qe
saiu pêlo tôpu. Isto feito, levei o papel ao meu tio Maurício, que estava
sempre a ler jornais. 0 tio Maurício olhou para o meu, escrito e foi-se
embora com ele sem me dar palavra. Dois dias mai.s tarde reuniu-se o
/// Conselho de Família por causa do Pequeno.»
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A criança tem dificuldade em rejeitar os modelos culturais e sociais que
lhe são impostos, pois que, recusando-os, nega a própria família, o seu
único lugar de segurança. Estes modelos vêm carregados de violência
simbólica (revestidos da autoridade que permite canalizar a mensagem,
legitimando-os). No texto, a autodeterminação da crianca, aprendendo a
ler sem ajuda, não é mais do que a imitação dum modelo a seguir, o tio
Maurício.
Cultura e Personalidade
«A minha verdade, o meu carácter e o meu nome estavam nas mãos dos
adultos,aprendera a ver-me com os olhos deles; eu era uma criança,
esse monstro que eles fabri-
tacto entre uma criança nascida nos bairros de lata de Nanterre e uma
outra nascida numa família burguesa do 16 ‘ Bairro (Paris). A influência
do meio, num e noutro caso, acabará por criar, quase sempre, como
resultado, automatismos de comportamento, de J.uízos, de pensamento,
como se diz, que tanto num como noutro caso não serão mais do que
automatismos. Os que são adquiridos no meio burguês são geralmente
favoráveis a
uma ascensão hierárquica, passando a maior parte das vezes por uma
escola. Fornecem àquele onde são inculcados, uma linguagem, uma
atitude, hábitos, juízos de acordo com
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recipientes e deixar para sempre a região. Os pais e os vizinhos,
consternados com a ideia de serem assim abandonados, suplicam ao
homem para não partir e não os deixar, para não destruir os seus
próprios bens - e acalmam-no dando-lhe tudo o que ele dese,ia. É
apenas porque toda a educação dos Arapesh tende a minimizar a
violência e a
Comportamentos universais
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«A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons
rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem nenhuma cobertura.
Nem estimam nenhuma coisa cobrir nem mostrar suas vergonhas; e
estão acerca disso com tanta inocência como têm em mostrar o rosto.
Traziam ambos os beiços de baixo furados e metidos por eles ossos
brancos, de compridão duma mão travessa, e de grossura dum fuso de
algodão, e agudos na ponta como furador.
Metem-nos pela parte de dentro do beiço; e o que lhe fica entre o beiço e
os dentes é feita como roque de xadrês, e em tal maneira os trazem ali
encaixados que lhes não dá paixão, nem lhes torva a fala, nem comer
nem beber.»
Cultura e Linguagem
30
meios de expressão irracionais, mas ganhará em lógica e coerência
interna do discurso, desligando-se cada vez mais do mundo material que
tenta representar. Com a difusão da escrita, as variantes individuais
decrescem progressivamente, o organismo bolectivo ultrapassa o
individual - e aparece materializado na cidade, no país.
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«É difícil ajuizar acerca do estádio em que se encontra a humanidade
actual, em que apenas uma geração separa mui .tos dos seus
representantes do tempo dos artesãos, dos lavradores, das bodas de
aldeia, dos teatros ambulantes, enfim, de todo um aparelho social cujos
vestígios influenciam ainda uma parte importante do globo. E contudo,’
de ano para ano, a exteriorização acentua-se, existindo já milhões de
homens que representam qualquer coisa de novo para o etnólogo. Estes
homens dispõem de um número mínimo de práticas sociais
indispensáveis para garantir o seu movimento quotidiano, de uma
infraestrutura de evasão pessoal pré-condicionada pelas férias pagas,
pelas estradas, pelos hotéis ou pelos parques de campismo, por umas
quantas semanas anuais em
«Vivemos, (...) como que numa partícula de pó que gira em tomo de uma
estrela banal, no canto mais remoto duma galáxia escura.
fluir das eras. Sabemos agora que o nosso universo - ou, pelo menos, a
sua encarnação mais recente - tem entre 15 e 20 mil milhões de anos. 0
tempo decorrido desde a
Grande Explosão (Bíg Bang).
32
No início deste universo não havia galáxias, nem estrelas, nem planetas,
nem vida, nem Civilizações, apenas uma bola de fogo uniforme e
radiante que preenchia todo 0
0 universo em expansão
0 planeta Terra
33
A vida, «propriedade pela qual corpos individuais se multiplicam», surge
praticamente com a formação da Terra, parecendo indicar que são
precisamente essas condições de formação do planeta que podem
acarretar, embora por acaso, a organização desta.
Enfim, um ser vivo arriscou-se fora da água, não um animal: sem dúvida
uma dessas algas que o refluxo abandonava na vasa das margens terá
encontrado o meio de ir vivendo entre as duas marés. E pouco a pouco,
no espaço de trezentos milhões de anos, avançaram pela terra dentro
florestas pantanosas de fetos gigantes, atingindo às vezes a
A era mais antiga, sem vestígios orgânicos, mas que por dedução se
admite ter tido a existência dum tipo de vida menos complexo que o dos
primeiros invertebrados a deixarem traços, é a Era Crl;otozóica, da «vida
oculta», que inclui o período pró-câmbrico,nesse período teriam surgido
já as algas verdes que ao produzirem oxigénio deram origem à atmosfera
- o céu da Terra.
34
No final da Era Paleozóica as plantas marinhas adaptam-se à vida na
terra; diminuem as trilobitas e surgem os peixes com placas e escamas,
os peixes placodermes.
Trilobitas
kl_
Peixes placodermes
35
As espécies tomam as formas actuais que terão no Quaternário. É no
Terciário que surge o homem, talvez há cerca de sete milhões de anos.
.0
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Quaternário
Terciário
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37
Os mamíferos
38
Os Primatas: Cinomorfos, Antropomorfos e Hominídeos
arborícolas
Austrolopitecídeos
Oreopitecos ?
HoZZiZos
Queniopitecos? Ramapitecos?
NDriopitecídeos 9 @’oôo
Grupo do procônsul
pr
Mioceno
13 milhões
de anos
39
«Temos vindo a assistir ao longo desenvolvimento da raça humana.
Vimos que a filiacão do homem ao símio pode ser hoje considerada como
muito problemática e que é necessàri .o apelar para um hipotético
antepassado bípede situado aquém da bifurcação que isola os
pitecomortos dos primatas bípedes. Os caracteres humanos são, com
efeito, irredutíveís aos dos símios pois que toda a evolução, do peixe ao
gorila, mostra que a
rencas essenci .ai.s entre os dois tipos de seres que possuem uma mão
de polegar oponível. Os antropIdeos não devem só à posição vertical o
facto de terem a mão livre durante a locomoção, mas também o terem
um rosto curto com caninos frágeis e um cérebro liberto das
condicionantes de suspensão da caixa craniana. Na sequência de
libertações sucessi .vas, a do cérebro estava já realizada no mais velho
testemunho, no australopiteco, que, como vimos, deveríamos denominar
«australantropw). Assim, por mais longe que se procurem os vestígios do
homem-macaco, só encontrámos, até à data, homens. De entre eles, os
mai .s recuados sã o extraordinários. Dos pés ao pescoço não vemos
40
Inicia-se, então, o processo de hominização não necessariamente numa
linha contínua, mas surgindo, à distância, como se o fosse. Este
processo assenta fundamentalmente no fabrico de utensílios, tal como
este assenta na capacidade simbólica, capaz de conceber mentalmente o
projecto dos utensílios; a prática da produção dos instrumentos e a
paralela criação de zonas cerebrais, no córtex, de projecto e controlo do
fabrico manual, apresenta-se como o motor da hominização, implicando
um conjunto de transformações corporais que resultam na bioedia:
coluna vertical e crânio em equilíbrio sobre a coluna, adaptação do pé à
marcha, tórax e bacia óssea para acomodação de órgãos internos na
posição vertical e, finalmente, libertação da mão.
Bipedia
MÃO
41
As provas utilizadas por Darwin foram testemunhos fósseis de
mamíferos da América do Sul e das ilhas Galápagos onde tinham vivido
separadamente do continente americano. A teoria da evolução
assentava, ao tempo, na intuição e não podia aplicar-se a
experimentação. Hoje, a evolução da Genética veio dar validade à teoria
e desenvolver-se a filogenia experimental que estuda rigorosamente as
transformações dos organismos em relação com o meio, legitimando e
actualizando a teoria de Darwin. A filogenia experimental vive da
interdisciplinaridade com ciências naturais e humanas como a Anatomia
e Fisiologia Humana e Comparada, a Psicologia, a Pré-história, a
Paleontologia e a Genética.
42
EVOLUÇAO BIOCULTURAL (A TÉCNICA)
TÉCNICA
1.’ ESTÁDIO
2.’ ESTÁDIO
3.0 ESTÁDIO
4.’ ESTÁDIO
Percussão
Percussão
Percussão
Percussão
perpendicular.
perpendicular.
perpendicular.
perpendicular.
Utensílio sobre
Percussão
Percussão
Percussão
núcleo.
tangencial.
tangencial.
tangencial.
Utensílios/ núcleo.
Núcleo preparado.
Núcleo preparado.
Utensílios sobre
Utensílios s/lasca.
lasca.
Utensílios s/lâmina.
LITENSíLIOS
CHOPPER
CHOPPER
CHOPPER
Lascas, c/costas,
DE PEDRA
(seixo partido)
Biface.
Biface
c/entalhe.
Lasca clactonense.
Lasca clactonense.
Lasca clactonense
Ponta foliácea; c/
Lasca laminar.
Lasca laminar
encaixe.
Machado.
2.2.2. OS DIFERENTES «STOCKS RACIAIS» E A SUA DISCRIMINAÇAO
GEOGRAFICA
As migrações humanas
44
A descoberta da América representa um aspecto totalmente inédito nas
relações humanas, surpreendendo o explorador europeu: por um lado,
um mesmo continente, descoberto em toda a sua longitude num períedo
de tempo muito próximo, apresenta .espantosos contrastes culturais
num povo aparentemente homogéneo na sua diferença em relação ao
europeu- eram as duas grandes civilizações ricas e sofisticadas, o Peru
dos Incas e o Império Mexicano dos Aztecas, com os seus satélites, os
países dominados e sernibárbaros como os Toltecas. Por outro lado,
depara-se-lhe uma imensa população itinerante, num estádio cultural
de colheita e de agricultura errante ou de caça com arco e flecha, uma
cultura tecnologica mente muito limitada que, aprioristica mente, é
considerada como primitiva. Este primitivismo é-lhe atribuído pelo seu
comportamento “moral” e não pelo seu grau civilizacional; os -índios-
são amigáveis, andam nus, estão em contacto directo com a Natureza,
recordando ao europeu o comportamento ingénuo do par primitivo do
Paraíso Terreal; essa cultura torna-se um símbolo dum antecedente
histórico.
Racismo e Etnocentrismo
Não é a prática da escravatura, que caracteriza o imperialismo da Idade
Moderna, a responsável pela noção de hierarquias rácicas.
45
Admitindo que o conceito de raça pode assentar numa diferença
puramente morfolágica entre um único grupo de homens, uma só
espécie, a primeira verificação que se
impoe e que não existe nenhum grupo racial puro, mas uma
miscigenação (a). De todos os grupos, aquele que surge como mais
miscigenado é o grupo branco, onde tanto os
CAUCASóIDES
ou LEUCODERMES
46
embora se mantivessem através das geracões, não eram fixas. Esta
aplicação, na Inglaterra, foi reforçada pelos modos de fala bíblicos,
porque embora a tradução da Bíblia feita pelo rei Jaime não usasse a
palavra «raç a» para se referir aos homens, Foxe, em
1570, escrevia sobre «a raça e os descendentes de Abraão» e, mais tarde,
Milton ahidi@9 à «raça de Satã». As razões pelas quais a palavra
comecou a ter uma utilização crescente merecem um estudo separado,
mas esse facto deve estar associado ao alargamento dos contactos
humanos tomado possível pelo melhoramento nos meios de transporte e
comunicação.
A teoria dos tipos, na sua forma mais pura, estabelece que por debaixo
das variações superficiais na constituição humana há um número
limitado de tipos permanentes de diferente origem. A miscigenação não
tem qualquer efeito, já que os híbridos são no fim de contas estéreis. A
diversidade das formas humanas torna difícil a aceitação desta doutrina,
e muitos dos seus expoentes admitiram algumas possibilidades de
mudança. As suas afirmações implicavam, normalmente, que houve em
tempos raças puras e que os cruzamentos estavam a chegar à
degeneração. Diversas versões da teoria apresentavam o antagonismo
inter-racial como um facto implantado na natureza das racas, ou, pelo
menos, na das raças que tiveram êxito. ( ..)
47
0 racismo é, portanto, uma atitude de rejeição de um grupo humano por
outro, a partir de diferenças biológicas que se associam a diferenças
psicológicas. É uma atitude que tem muito a ver com valores e crenças
muito profundas: no caso do racismo do homem branco contra o homem
negro, instala-se a tendência a associar a cor negra com o mal, o vício,
contrapondo-se a cor branca à claridade, à luz, à razão, ao bem.
Estas convicções vêm a determinar uma prática racista que iria criar
complexos de superioridade nos brancos e de inferioridade nos negros,
que provocariam uma atitude de contra-racismo utilizando argumentos
semelhantes. Ainda hoje o racismo é um elemento da mentalidade geral
que, com maior ou menor intensidade, acaba por surgir em
48
« Todos pensam que eu sou um canibal Mas bem sabem o que são as
línguas
Todos dizem que agora virão Menos turistas Mas bem sabem Não
estamos na América e de qualquer maneira Somos todos tesos
Todos dizem que a culpa é minha e têm medo Mas vejam Os meus
dentes são brancos não rubros Eu não comi ninguém
Canibal ou não canibal Fala Ah! Julgas que és muito esperto E pões-te
todo orgulhoso
Agora vamos ver o que te acontece Qual é a tua última palavra Pobre
homem condenado
Vivam os tomates»
Negro
so
encontrar, no passado, o momento e o indivíduo que contraiu a doença:
o que se considerava uma doenca rácica transforma-se numa doença
individual, transmitida no seio de uma família aos seus descendentes, e
salientando-se, posteriormente, num grupo muito alargado de elementos
familiares. Sempre que uma doença se transmite hereditariamente em
grupos fechados que não se misturam com outros grupos, como os
judeus e
Peru (Incas);
51
A alegada superioridade das culturas não pode atribuir-se às
capacidades psicológicas duma raça, tanto porque não podem
concretizar-se grupos humanos que correspondem ao conceito de raça,
como porque os critérios de superioridade e inferioridade baseiam-se no
desenvolvimento tecnológico e não numa capacidade de resposta a
situações específicas. As culturas tecnologicamente simples que foram
apresentadas, representam apenas aspectos duma cultura que se
especializou em sectores diversos: a aldeia germânica é de levante,
simples, correspondendo a povos seminómadas, famosos - tal como os
homens dos castros - pela sua metalurgia nitidamente superior à grega
ou romana; o povo tupi, caçador e nómada da floresta, especializou-se
na domesticação de plantas venenosas donde retirava veneno para as
suas flechas e azagaias,- os Boximanes conseguem descobrir água no
deserto e captá-la onde quer que ela exista, nos frutos, no estôJ
52
Manifestações raciais nos Estados Unidos
ÁFRICA DO SUL
53
GUILHERME ISMAEL, EM LONDRES
Incidentes peculiares
Racismo é realídade
54
realidade - e não é por acaso que ainda no ano passado o Conselho da
Grande Londres (GLC) desencadeava uma enorme campanha contra o
racismo na capital.
0 Jornal, 13.9.85
55
«A bem dizer não há discriminação racial no Brasil como havia nos
Estados Unidos. Nunca se trata um homem ou uma mulher de cor por
«negro sujo». E, no entanto, quase todos os negros são pobres e uma boa
parte dos pobres são negros ou mestiços. Quanto mais miserá veis são
as fa velas mais escura é a pele. Felizmen te, no po vinho, o ódio racial é
estritamente desconhecido.»
0 homem e os homens
«Sou um homem que sonha que é uma borb(,,-,ta, ou uma borboleta que
sonha que é um homem?»
56
ponto que um grande número de populações ditas primitivas se
designam por um nome
que significa ws homens» (ou por vezes - digamos com mais discrição -
os «bons», os «excelentes», os «perfeitos»), implicando assim que outras
tribos, grupos ou aldeias não participem das virtudes - ou mesmo da
natureza - humanas, mas são, quando muito, compostos por «maus», «
perversos», «macacos da terra», ou «ovos de piolho». Chegando-se
mesmo, a maior parte das vezes, a privar o estrangeiro deste último grau
de realidade fazendo dele um «fantasma» ou uma «aparição».
DESAFIO E RESPOSTA
57
Um solo pobre pode permitir o desenvolvimento de técnicas adequadas
ao seu aproveitamento - caso de solos argilosos, junto de rios de cheias
que levantam o problema da captação e disciplina da água das cheias -
dos paradigmáticos exemplos históricos das civilizações dos grandes
rios, que desenvolverarri técnicas hidráulicas e de agrimensura
concomitantes com os problemas que eram levantados pela riqueza dos
aluviões arrastados em águas turbulentas e desastrosas para as
colheitas desde que não fossem disciplinadas pelos diques e canais.
58
indicia a característica mais específica da cultura do homem, a lei da
conservação do tempo e da energia muscular humana- toda a cultura
tende a poupar o esforço e o tempo individual e social.
59
0 conceito básico é o conceito de traço cultural, a mínima porção de
cultura (material ou imaterial) descrita como indivisível. 0 traço cultural
é a pedra-base do edifício consIru ído pela Antropologia Cultural. São
traços culturais, objectos unitários como um utensílio, uma arma, um
objecto de adorno ou, ainda, um rito religioso ou mágico, uma lei, uma
norma, uma canção.
60
A noção de complexo cultural está ligada à ideia de área cultural, zona
onde se verifica a existência de um dado complexo cultural, cumprindo
determinada função e implicando certa actividade. A actividade cultural
caracteriza-se pela técnica de produção.
61
« (... ) a integração espacial do homern que descansa na sua cabana
pouco difere da do texugo na sua toca, ou que o reconhecímento social
se situa próximo dos códigos que permitem aos pássaros estabelecer as
suas relações coni base em sinais existentes na plumagem. Mas já se
ultrapassou a fronteira entre o espaço vivido pelo texugo e o
62
A área onde predomina unia forma de vida idêntica chama-se área
cultural,- a área cultural coincide com determinada região natural, pois
é aí que as mesmas respostas culturais coincidem com os problemas
apresentados pelo meio. A área cultural pode apresentar gradações do
mesmo tipo de cultura e incluir ciclos culturais, onde apenas se mantêm
padrões culturais básicos ou um estilo de vida coincidente com os
grandes complexos culturais. Apesar da manutenção dos padrões
culturais mais significativos, surgem igualmente culturas marginais que
anunciam a ruptura dos principais padrões ou mesmo das estruturas
culturais.
Culturas nacionais
63
«A raça portuguesa, por mais decaída que a consideremos pelo
abastardamento dos elementos que a formaram, é ainda hoje considera
velmen te menos absorvível do que absorvente. Que essa raça realmente
existe é para mim uma verdade que debalde têm por vezes contestado
alguns dos nossos próprios e pessimistas etnógrafos.
e francês.
64
Tem-se a impressão que os Portugueses precisam de emigrar para
desenvolverem todos os recursos da sua nativa e latente capacidade.
Porquê? Porque na sua terra a casta dos políticos, «a mais vil de todas as
castas», como diz Paul Adam, predomi .na; absorve as energias
nacionais na mísera ambição e na reles intriga de partidos,- revoluciona;
revolve até os seus mais profundos alicerces o equilíbrio social- perturba
e enxovalha a serenidade da aplicação e do trabalho; em nome de uma
quimérica igualdade com que incendeia a brutalidade das multidões,
decapita e destrói a influência ponderadora das «elítes», e deturpa,
avilta, emporcalha tudo, afogando num cataclismo de lama a dignídade
de um país inteiro. Mas não é da pútrida infecção da política, é da sã
resistência da raça que eu hoje me ocupo.»
66
destruição da estrutura e a constituição de uma nova. Só os elementos
fixos e imutáveis da estrutura lhe dão o seu sentido próprio. Os
«apports» culturais vindos do exterior não só podem incluir-se como
elementos novos de uma estrutura, sem lhe destruirem o sentido, como
podem constituir estruturas novas que permanecem em relação de
união ou antagonismo com velhas estruturas. Pode perfeitamente
conceber-se a estrutura económica da troca directa existindo
paralelamente a uma estrutura capitalista. Os padrões culturais que se
sobrepõem na sociedade que as comporta, permitem a concepção de
uma sociedade de subgrupos e múltiplos comportamentos, respondendo
entretanto cada um
67
As culturas mais bem adaptadas ao seu meio ambiente são muito
resistentes às inovações técnicas vindas do exterior, pois compreendem
um sistema cultural muito especializado em função dessa adaptação
que cria quadros mentais de rejeição a qualquer mudança.
68
2.4.2. A ECONOMIA: SISTEMAS DE AQUISIÇÃO E DE PRODUÇAO DE
BENS, ORGANIZAÇAO ECONóMICA
«Por toda a parte onde quer que fixemos o nosso olhar não foram só as
superfícies e a
São esses meios que sabem encontrar sempre terra nova no sentido
mais amplo do termo, isto é, novos métodos de aproveitamento do solo e
novos recursos da agricultura. A terra nova que, para ampliação do
espaço alimentar do homem, tem de ser conquistada e desbastada,
encontra-se em pn .melro lugar nas cabeças dos homens e dos
povos. »
69
De acordo com testemunhos etnológicos recentes, os caçadores-
colectores - mais particularmente os que vivem em meios marginais -
consagram em média três a cinco horas diárias (números válidos para
um trabalhador adulto) na produção da sua alimen tacão. Em matéria
de tempo, têm emprego de bancários, e trabalham nitidamente menos
que os operários industriais que desejosos estariam de obter uma
semana de trabalho de
21 a 35 horas! Estudos recentes feitos aos custos de trabalho entre os
agricultores do ti;oo neolítico permitem comparações interessantes.
Assim, entre os Hanunóo, um adulto médio, homem ou mulher,
consagra 1200 horas por ano à agricultura... seja em média 3 horas e 20
minutos por dia. Note-se que estes números não dão conta nem da
preparação, nem dos cuidados com os animais domésticos, nem da
cozinha ou de outras actividades de subsistência a que se dão estas
tribos das Filipinas. ( ...)
70
onde se investem novos trabalhos, novas especial izações, uma nova
cooperação -
71
As outras características económicas da comunidade, no sentido em que
a definimos, são as seguintes.-
72
rias e egípcias, de que são casos paradigmáticos o império de Sargão e
de Ramsés 11. 0 império acádio acabará por enfrentar as expedições
militarizadas do Egipto, à procura do minério. Em pouco tempo o metal
é, além de moeda de troca, o produto comercial mais valorizado do
mundo antigo, surgindo na orla das grandes civilizações agrícolas, nas
culturas de margem dedicadas quer à mineração e fundição (civilizações
da Ásia Menor), quer à troca comercial entre as grandes áreas culturais
e nas culturas do corredor palestiniano, como troca. 0 Próximo Oriente
surge como um laboratório onde pode estudar-se a evolução dos
sistemas de aquisição e produção de bens. É aí que surge a
domesticação do gado e das plantas vegetais, cujas técnicas emigram
para o Ocidente e Médio Oriente; é igualmente nos leitos dos rios que se
desenvolve a agricultura baseada na captação das águas das cheias,
arrastando consigo a segunda revolução urbana das grandes cidades,
com teogonias mistas herdadas da justaposição dos mitos das fratrias
exogámicas que se tinham organizado em fortificações urbanas
complementares de agricultores e pastores. Se na primeira revolução
urbana a regra era a troca directa, com a segunda revolução o
0 facto de até hoje ter sido impossível levar à prática o modelo de uma
sociedade sem hierarquias - a abolição radical de hierarquias
estabelecidas também não nos aproximaria em nada deste ideal, pois
novos sistemas hierárquicos se desenvolvem rapidamente
- mostra que provavelmente deparamos aqui com uma disposição inata,
que transpo@tamos sob a forma de herança primata. Nos grupos
individualizados, são as qualidades
74
humanas, tais como espírito de sacrifício, amor ao próximo, sabedoria,
que decidem a
75
«0 casamento (que implica a linguagem) é a primeira cerimônia
verdadeiramente humana. Como muito bem diz Dévereux, ele tem por
função (biológica) «mascarar a hostilidade sob a aliança, afirmar o
entendimento para evi .tar uma luta». Talvez porque seja uma questão
de ter de trabalhar em conjunto. E por um novo abuso de linguagem que
esta cerimônia fundadora, que representa permanentemente a comédia
das origens, é qualificada de rito. Com efeito, os deuses raramente estão
presentes neste acordo tão tipicamente humano, que os cristãos se
obstinam em celebrar ao pé do altar. Significativamente, o casamento é
de todos os ritos ditos de passagem, aquele que menos merece este
nome, pois os deuses evitam intrometer-se,- o que não poderia ser o
caso do nascimento ou da morte. Não é menos verdade que o casamento
é a cerimônia por excelência em sentido biológico.- ela transforma
profundamente a demonstração cerimonial da potência de um macho
dominador em dominação de um sistema simbólico igualitário. »
11 4~
Associação masculina
76
de parentesco (por filiação, assimilação, trocas matrimoniais),
constataremos que o que caracteriza especificamente as sociedades de
linhagem é menos a ausência de tracos característicos de outros tipos de
sociedade - centralização, hierarquização, especialização profissional,
desenvolvimento de grupos, castas ou classes, definidos pela sua
posiçao num si .stema de relações de produção, aparecimento de um
aparelho político e administrativo especializado - que a presença
espectacular, exclusiva, do parentesco.
Para além do parentesco, não há nada,- aliás, ele está em todo o lado.
Por outras palavras: o que caracteriza estas sociedades ditas ---de
linhagem- não é tanto a presença do parentesco como instituição,
representação e racionalização, como modelo aos três níveis da
organização, da lógica e da ideologia - porque esta presença se encontra
em todas as sociedades -, como o facto de o parentesco surgir
imediatamente aqui como modelo exclusivo.
.................................................................
A família
77
0 funcionalismo salienta as funções da família como a reprodução e a
produção económica. Dum modo geral, é unidade de reprodução e
produção, mas este último caso não é permanente, tal como se verifica
nas sociedade primitivas.
I@@5 -homem
0 -mu!her
-casamento -germanidade
Mais ainda do que a família, o parentesco é uma trama social que nunca
corresponde a um comportamento biológico: a explicação das múltiplas
proibições que estão na base de todo o sistema de parentesco é
marcadamente social. 0 ponto de partida para a organização do
parentesco é o interdito do incesto: ao renunciar aos direitos sexuais
sobre a mae, irmas ou filhas, os homens de certa comunidade
conferem~se direitos sobre as
78
formas mais complexas das relações sociais e da economia, com a
criação de gado e a
agricultura; tal não obsta a que nas duas formas sejam sempre os
homens a exercer o controlo de acesso às mulheres. Neste sistema a
autoridade é exercida pelo pai e pelo marido. Há ainda sistemas de
parentesco bilineares, repartindo-se a autoridade e certos direitos
específicos, em função dos bens distribuídos, a representantes dos dois
elementos do parentesco.
A filiação aparece então como uma convenção social e os filhos não são
necessariamente consanguíneos - a própria consanguinidade depende
dos critérios sociais, pode ser atribuída a todos os parentes ou
privilegiar alguns casos.
monlais. »
79
As estruturas de parentesco só perdem a sua posição dominante na vida
social quando surgem as estruturas de classe.
80
quando se conhecem de garotos- ou ---não se tem o mesmo respeito com
as pessoas mais novas como se tem com as pessoas mais velhas---. No
entanto, este facto só em
81
Em contrapartida, verificamos que o tratamento é recíproco: aquando do
tratamento por ---tu- no seio de uma mesma geração consanguínea,
através do tratamento por
11 você- entre o ---ego - e os cônjuges dos respectivos consanguineos
pertencentes a gerações anteriores, por um lado, e aos consanguíneos
do cônjuge e aos respectivos cônjuges, por outro (excepto, conforme já
vimos, no caso dos filhos dos parentes mais próximos do cônjuge a que
o ---ego - dá o tratamento de ---tu-, ao contrário do que acontece com os
respectivos cônjuges). Assim, quando se trata de graus de parentesco
por afinidade, o tratamento por ---você- é recíproco, independentemente
do critério de geração, enquanto o tratamento por ---tu- é recíproco
apenas no espaço de uma mesma geração.
82
constatação.- se bem que os padastros e as madrastas tratem por ---tu-
os seus enteados sempre que a sua relação teve início bastante cedo,
verifica-se que recorrem ao tratamento por ---você- quando a definição
das suas relações de parentesco ocorre numa idade já adulta.»
Grau de parentesco
Colateralidade
Níveis gerais
Você
Tu
NR
Conclusão
Parentes em
Linha de
1.’ grau de
descendência
consanguíneos
directa
Tratamento
1.
-1
por ---você-
2.-
-1
recíproco
1o
i+i
Consanguíneos
Linha de
2.4.4. 0 CONTROLO SOCIAL
0 apoio mútuo adquire deste modo um papel cada vez mais significativo
na evolução dos organi .smos superiores. Dos agrupamentos familiares
nasceram as grandes famílias, as hostes, e por fim os agrupamentos
anónimos fechados dos mamíferos e dos seres humanos. Os meios de
vinculação permaneceram, no fundo, sempre os mesmos e derivam
quanto à sua origem essencialmente do reportório dos tipos de
comportamento que vi.nculam mãe-filho. A relação mãe-filho foi
filogeneticamente, e é no desenvolvimento individual, o centro
cristalizador de toda a vida social. (... ) Através da relação pessoal mãe-
filho desenvolvem os seres humanos a confiança original sobre a qual se
desdobra a nossa atitude sociável fundamental e, assim, de um modo
geral, a capacidade para o «engagement» social.
mata uma pessoa com a qual se está relacionado. Aquilo que vincula as
pessoas é que van.a de cultura para cultura.»
84
Tendo como espírito orientador a Moral, o Direito define as normas que
estabelecem o
0 Estado
85
suficientemente grandes, adultas, maiores, é pura e simplesmente
porque elas recusam o Estado em sentido amplo, Estado definido na sua
figura minimal que é a relação de poder. Por isso, falar das sociedades
sem Estado ou das sociedades contra o Estado, é falar das sociedades
sem Estado, forçosamente; a passagem propriamente não existe, ou
então é à partida possível; e a questão que se entronca nesta é: donde
sai o Estado, qual é a origem do Estado? 0 primeiro acto do homem
de poder é exigir um tributo, um tributo daqueles sobre quem exerce o
poder. 1
dade, vocês têm o poder e nós vamos obedecer-vos», ou então «não, não,
vocês não têm o poder e a prova é que não vamos obedecer» e poderão
tomar os outros por malucos ou matá-los. Ou se obedece ou se não
obedece,- e é preciso que tenha havido este reconhecimento do poder
para o Estado aparecer aqui .e acolá, nas diversas sociedades. De
facto a questão da origem desta relação de poder, da origem do Estado,
desdobra-se no
A questão de cima é.- o que é que faz com que algures, num dado
momento, um ti;0o diga «sou eu o chefe e vocês vão obedecer»? É a
questão do topo da pirâmide.
86
não se responsabilizavam pelo que pudesse suceder. A disposição
para obedecer diminuía com a ausência da autoridade. ( .. ) As
experiências de Milgram provam que muito provavelmente as
disposições inatas se sobrepõem às impregnações culturaís., A
tendência de obedecer revelado nestas experiências é uma inclinação
perigosa do homem.»
87
0 poder - por muito difuso que seja - implica uma dissimetria no seio
das relações sociais. Se estas se estabelecessem na base de uma perfeita
reciprocidade, o equilíbrio social seria automático e o poder estaria
condenado a definhar. ( ...)
Nas sociedades compostas por linhagens para além das quais não há
chefe comum, e que por essa razão são chamadas acéfalas, segmentadas
ou atomísticas, esse equilíbrio deve-se ao papel dos chefes de linhagem
reunidos em conselho e resolvendo as even- @uais contestações, ao dos
responsáveis pelas cerimônias e ritos da comunidade, as máscaras por
exemplo, ao das classes de idade, etc., que se encadeiam
indefinidamente. As autoridades equilibram-se entre si.
89
A propriedade
PO
90
A educação
sociedade primitiva.
91
pouco a pouco. A sociedade organiza um sofisticado sistema de
distribuição de cultura que, se bem que fundamental para a sua
sobrevivência, é visto acima de tudo como disciplinador das futuras
secções sociais empenhadas no sistema de produção.. a educação é um
mecanismo especializado na reprodução dos grupos sociais, impedindo
que uns
idade e adultos que não são os seus pais, que entram em conflito com
eles e entre si, que dizem e fazem outras coisas. Os heróis encontram-se
no cinema ou na televisão, nas bandas desenhadas e não em redor da
mesa familiar. Investimento mais directo do que nunca nas figuras
históricas. As figuras dos pais, professores primários, professores,
padres, também sofrem a erosão dos fluxos capitalistas. ( ... ) o
capitalismo é de facto um
92
A educação cria o «habitus» - «um produto da interiorização dos
princípios de um arbitrário cultural capaz de se perpetuar depois de
cessar a Acção Pedagógica (que é uma imposição, por um poder
arbitrário, de um arbitrário cultural) perpetuando assim nas várias
práticas os princípios do arbitrário interiorizado.» (Bourdieu e Passeron,
«La Reprocluction»). Os métodos podem evoluir através dos tempos, mais
ou menos permissivos, porém a educação tem de cumprir sempre o seu
papel de controlo social, disciplinando os alunos e criando-lhes quadros
de docilidade que se mantêm ao longo da vida, pois foram interiorizados
no momento próprio na Escola. As,estratégias actuais resultam num
efeito de ressonância (o aluno é apenas um eco da palavra do professor)
e numjogo de espelhos, uma normalização geral do conteúdo a partir da
homogeneização da leitura, da palavra e da escuta.
A sexualidade
que a divisão sexual das tarefas faz da actividade guerreira uma função
masculina. 0 homem deve estar, pois constantemente disponível para a
guerra; de tempos a tempos fá-la efectivamente. É sabido que, em gerai
a guerra primitiva é pouco mortífera, salvo, é claro, no caso especial das
sociedades guerreiras. Nem por isso é menos verdade que, dada a
eventualidade constantemente presente da guerra, a possibilidade de
risco, dos ferimentos ou da morte, está previamente inscrita no destino
masculino. 0 homem da sociedade primitiva encontra-se, pois, por
definição, marcado pela sua condição.- em maior ou menor grau, ele
existe para a morte. Durante o combate, aquela não ati .nge senão
um número reduzido de indivíduos; mas antes da batalha, é igualmente
ameaçadora para todos. Pela medição da morte, existe, pois, uma
relação íntima, uma vi .zi.-
93
Noutros termos desenvolve-se aqui uma proximidade imediata entre
«vida e feminilidade», de acordo com o que a mulher é na essência ser-
para-a -vida. Desde logo se evídencia, na sociedade primitiva a diferenca
entre o homem e a mulher: como guerreiro, o homem é um-ser-para-a-
morte,- como mãe a mulher é um-ser-para-a- vida. ( ...)
que revelam, um pouco por toda a parte, os mitos que fantasiam a idade
do ouro perdida ou o paraíso a atingir como um mundo assexuado,
como um mundo sem mulheres.»
(Esta era um pai que casou ia filha e ela não gostava dele.
94
«0 dispositivo de sexualidade tem como razão de ser não reproduzir-se,
mas proliferar, inovar, anexar, inventar, penetrar os corpos de forma
cada vez mais minuciosa e controlar as populações de maneira cada vez
mais global. Portanto, há que admitir três ou quatro teses contrárias à
que supõe o tema de uma sexualidade reprimida pelas formas modernas
da sociedade.- a sexualidade está ligada a dispositivos recentes de
poder; esteve em expansão crescente desde o século XV11; o dispositivo
que a apoiou desde aí não está ordenado à reprodução; foi ligado desde
a origem a uma intensificação do corpo - à sua valorização como objecto
de saber e como elemento nas relações de poder.
A mulher-objecto
95
A consciência de repressão à sexualidade começa a sentir-se com as
análises de Freud e a libido(*) reprimida será o objecto de estudo teórico
e prático de toda a psicanálise que lhe segue. Da era vitoríana até aos
anos cinquenta, o sexo mantinha-se como um recalcamento, que se
iniciava na própria palavra. As obras de Wilheim Reich e as teorias pan-
sexualistas iriam abalar um pouco a tradição repressiva da sexualidade
que Foucault analisa, E, porém, a subcultura juvenil que se desenvolve
a partir dos anos cinquenta que se torna responsáve( pela crítica
sistemática ao condicionamento da sexualidade.
«0 homem não pode escapar do seu próprio engano não lhe resta
outro remédio senão o de adoptar as condições da sua própria vida; já
não vive apenas num puro universo físico mas sim num uni .verso
simbólico. A linguagem, o mito, a arte e a religião constituem partes
deste universo: formam os diversos fios que tecem a rede simbólica, a
textura complexa da experiência humana. Todo o progresso em
pensamento e em experiência afina e reforça esta rede. 0 homem já não
se pode en, rentar com a realidade de um modo imediato, não pode vê-
Ia, digamos assim, face a face. A realidade física parece retroceder na
mesma proporção em que avança a sua actividade simbólica. Em lugar
de lidar com as pró prias coi .sas, num certo sentido, conversa
constantemente consigo
mesmo. »
social; cada cultura, cada época, forja os seus próprios modelos, os seus
paradigmas, em função da experiência que se lhes depara - pois desde o
homo sapiens que qualquer homem é conceptualmente capaz de
conceber modelos interpretativos que apenas variam de acordo com a
imaginação, os paradigmas herdados pelo grupo e mundo exterior.
96
Os paradigmas de posicionamento em relação ao mundo - as concepções
do mundo do grupo que retratam o real não como ele é, mas como é
concebido - agindo dentro dum mundo humanizado como se este fosse a
realidade vivida, criam as mundividências da comunidade. A
mundividência é a actualização da concepção do mundo, a prática social
que decorre do paradigma interpretativo da natureza física e social.
Mitos e Mitologia
C. e C-5 97
A Criação do Mundo
«Antes de todas as coisas era o Caos, depois veio a Terra, sólido e eterno
assento de quanto existe. E Eros, o mais belo dos deuses imortais, o que
anula os membros,
* que, no peito dos deuses e dos homens, incentiva
* espírito e a sabedoria. Do Caos nasceram Érebro e a escura Noite e, da
Noite, se geraram o Éter e a Luz do Dia. Da Terra se gerou, no princípio,
um ser a ela semelhante Capaz de a cobrir por inteiro, o Céu estelar,
oferecendo aos deuses um assento de nunca antes imaginada felicidade.
Hesíodo, Teogonia
Criação do Homem
plo que nos vem imediatamente à ideia é Malinowski. Afirmo, desde já,
que tenho a
99
Enquanto a concepção de Malinowskí é utilitária, a de Lévy-Bruhl é uma
concepção emocional ou afectiva. Ora o que eu tenho tentado mostrar é
que de facto o pensamento dos povos sem escrita é (ou pode ser, em
muitas circunstâncias), por um lado, um pensamento desinteressado - e
isto representa uma diferença relativamente a Malinowski -e, por outro,
é um pensamento intelectual -o que é uma diferença em relação a Lévy-
Bruh1.
Portanto a razão por que se escolheu a raia é que ela é um animal que,
considerado de um ou outro ponto de vista, é capaz de responder -
empregando a linguagem da cibernética - em termos de «sim» ou «não». É
capaz de dois estados que são descontínuos, um positivo e outro
negativo. A função que a raia desempenha no mito é - ainda que,
evidentemente, eu não queira levar as semelhanças tão longe - parecida
com a dos elementos que se introduzem nos computadores modernos e
que se podem utilizar para resolver grandes problemas adicionando uma
série de respostas de «sim» e «não».
Apesar de ser obviamente errado e impossível (dum ponto de vista
empírico) que um peixe possa lutar contra o vento, dum ponto de vista
lógico pode-se compreender por que razão se utilizam «imagens» tiradas
da experiência.
100
concepção ensamento
3, um penWalinowski
relação a
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S, e,
leitura da narrativa.
101
Esquema do pensamento mitico(a) e racional(b)
sangue pletórico das veias, que é aqui sugerido pelo violeta, estado
superlativo do ver melho).
L.) Comer o bifteck a sangrar representa, pois, tanto uma natureza como
uma moral.»
Concerto dos Rolling Stones Para a juventude que acorre aos seus
concertos, os ídolos do rock representam os demiurgos dum «espaço e
tempos sagrados», que desliga do real - que é contestado - o seu público
de fõs. A força do estereótipo heróico dos rockistas, a sua imagem de
forç a, a música violenta e criadora, a contestação das letras, o recriar
da violência dos elementos e do imaginário do criação do mundo pelo
jogo de luzes constituem todo um universo de mitemas clássicos. A
vivência mítica é tão intensa que os concertos por vezes atingem a
violência da destruição total.
102
A mitologia é o conjunto de mitos que se constituem num universo
coerente de explicação para a comunidade. As sínteses mitológicas
surgem quando há assimilação de outras culturas, por aliança,
conquista ou emigraçã o dos homens: a união das tradições míticas, a
própria natureza ideológica do mito impõe uma unidade ou explicação
global, que a síntese tenta estabelecer, criando-se um fio condutor. As
mitologias organizam-se ou tendem a organizar-se em famílias de deuses
que recriam os momentos históricos da comunidade, se bem que sem
historicidade temporal, pois é característico do mito o seu
tempo estrutural.
Religião e Magia
104
A festa surge nas fratrias como a saída para a troca das mulheres;
habitualmente inimi -
Ritos e rituais
Procissão católica
106
0 ritual mágico difere do ritual religioso, se bem que religião e magia
apresentem conotacões de sentido e ritual, o que permite uma certa
ambiguidade de interpretação, principalmente nos tempos mais
recuados, sem que haja acesso directo a documentos pelo historiador ou
antropólogo. 0 ritual mágico pretende introduzir o sagrado no profano de
forma violenta, coagindo o sagrado a manifestar-se a favor ou contra,
conforme a intenção. 0 mágico através do ritual controla forças
favoráveis que por sua vez controlam forças desfavoráveis, coagindo-as a
agir. É o fundamento de toda a mitologia de gênios bons e maus, de
contos de fadas e duendes.
Figura social, com seu estatuto específico aceite pelo grupo, o feiticeiro
não se integra na sociedade; imbuído do sagrado, rodeado dos seus
espíritos protectores, ele é um homem perigoso, pois o sagrado destrói e
mata. Vive separado do grupo, que receia ser contaminado. Atitudes que
ainda marcam a mentalidade, de modo inconsciente, como o
107
Arte, Folclore, Música e Teatro
109
Tal como nas sociedades tradicionais, a arte popular combina a tradição
musical com a dança - herança das narrativas rituais, onde a música e a
dança permitiam a passagem para o sagrado através do transe. Os
instrumentos populares tradicionais são habitualmente de sopro como a
flauta de percussão, com cordas, e os tambores - equivalendo às
operações técnicas primitivas do martelar e do serrar.
110
Cura do Bicho, feridas e borbulhas malignas no corpo. «Talha-se com as
seguintes palavras, em Perafita, Matosinhos:
Eu que talho?
- Bicho, bichão, aranha, aranhão, Eu talho o bicho de toda a nação Pelo
poder de Deus do milagroso S. Silvrestre Tudo o que faço, preste.» (Idem)
«Mulheres fumadoras» Nos concelhos de Mértola, Alcoutim, Almodôvar e
Lagoa, as mulheres, geralmente depois dos 50 anos, entregam-se ao
vício do tabaco.
explicação é possível.»
112
crescimento das forças produtivas e da luta de classes. 0 motor da
dinâmica seria o crescimento das forças de produção que, alterando-se,
arrastaria inevitavelmente a modificação do sistema social; sobre estas
duas alterações elaboravam-se as superstruturas políticas, do que
resultava a segregação das classes económicas.
Conservantismo e modernização
As respostas culturais de uma dada sociedade provêm sempre duma
relação dialéctica entre os homens e o seu meio geográfico. São estas
respostas culturais que determinam as instituições mais fortes e mais
conservadoras da sociedade, quando a comunidade pôde sobreviver com
o aparelho técnico que produziu. É este sentimento de segurança,
veiculado pela tradição que permite que a resposta a influências do
exterior surjam numa perspectiva idiossincrática(,,).
113
Ao contrário das culturas superadaptadas ao meio, as outras culturas
são mais susceptíveis de se tornarem abertas a influências estranhas.
Como as influências do exterior entram habitualmente através das
instituições ideológicas e políticas, estas sociedades mais desadaptadas
ao aparelho económico e técnico, constituiram igualmente instituições
mais flexíveis.
114
0 contacto cultural - e portanto a dinâmica cultural - está muito
dependente desta ocorrer por vontade própria da sociedade, do seu
dinamismo interno, ou por imposição externa. Nos casos de difusão
cultural, há assimilação de «apports» externos, em termos de mudança
da infraestrutura e, alterando-se esta, também se altera a
superstrutura. Nos casos de contacto cultural forçado, como da
aculturação, pode surgir o fenômeno do pseudomorfismo ou a simples
destruição da infraestrutura e da superestrutura, sem que outras, de
acordo com o ambiente geográfico-natural e o imaginário tradicional, os
115
0 crescimento cultural. As orientações da cultura
116
Os sociólogos actuais duvidam da eficácia duma Contracultura nas
sociedades industrializadas nos tempos de hoje,- os casos históricos da
Concracultura cristã no mundo romano, impondo-se como cultura
oficial com a queda daquele, é hoje verdadeiramente apenas um caso
histórico.
117
«Designou-se por democracia de ---Massas- o traço fundamental que
determina as formações políticas contemporâneas. (.. J Pretendemos
esboçar aqui os seus elementos
Que salda?
118
(3. A ANTROPOLQGIA CULTURAL PORTUGUES,@
01
120
Pina, o «Jornal da Primeira Viagem de Vasco da Garna», de Alvaro Velho,
«0 Livro d(.., Duarte Barbosa», «A verdadeira informação das Terras de
Preste João das indias» do Padre Francisco Alvares, a « Informação de
algumas causas dos costumes e leis do Reino da China», anónimo, o
«Itinerário», de Antônio Tenreiro, «As lendas da india», de Gaspar Correia,
«0 Tratado sobre a China do Sul», de Galeote Pereira, o «Tratado em que
se
C. eC.-6
121
3.2. Nomes da Antropologia Portuguesa
122
.. ... .....
Moo
RABALHOS PRÃTICOS
4. 1. Leitura de textos
UMA INSTITUIÇÃO
0 NAMORO EM 1815
- Sim? pois olhe que daquele magricelas não pode sair grande doutor!
Acho que um
homem assim não tem boas as memórias, nem sustâncias para saber lá
aquelas cousas da justiça. .. Ele lá entrou... Quer vossemecê ver que a
delambida da rapariga anda de namoro com ele!...
vós outras plebeias, não, porque não tendes nada senão a vossa
honrazinha.» Ora que lhe parece isto? Dá mesmo vontade de lhe
responder: « Vá-se daí, sua porca; se Vossa Excelência tivesso o miolo no
seu lugar não consentia que lhe estivesse um herege lá do fim do mundo
a beliscar as pernas, e a pôr-lhe os beiços no cachaço!» Fora com as
libertinas!
- Tem razão, tia Bernarda ... a religião é cá só para os pobres. As ricas
o que querem é ir à igreja mostrar os asseios ... Disse outro dia um
pregador na Vitória, que a casa de Deus estava sendo uma feira, e que
Nosso Senhorpusera as pelicanas fora do templo. . .
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A pelicanas são as fidalgas... Olhe lá... aquela sumeiga, que ali mora,
será fidalga?
- Acho que sim. 0 pai era o senhor arcebispo de Barroso, e a mãe ouvi
rosnar que era uma das tais pelicanas...
- Eu sou da sua ideia... isso era volta de alcofeira, que vinha saber se lhe
poderia entregar alguma cartinha daquele fidalgo que mora à Vitória, e
que tem o nariz apurado para as moças como gato para bofes. Há-de
ser isso...
Muitas vezes o pároco faz aos noivos uma prédica para lhes lembrar os
seus deveres, lavrando depois na sacristia o respectivo assento, sendo
as despesas pagas pelos padrinhos.
0 regresso, sendo possível, deve ser feito por caminho diferente daquele
que foi utilizado para a ida (para não voltar atrás, desfazendo o que está
feito).
Junto dos arcos colocavam duas cadeiras e uma mesa, cobrindo esta
com toalha branca e, aí, em duas salvas de prata, dispunham doces
numa e noutra dois cálices, um
0 noivo dava depois à noiva o copinho de vinho, que ela bebia, tomando
ele o de água.
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Os convidados, por sua vez, para ajudarem às despesas da homenagem,
lançavam dinheiro na salva vazia, à medida que passavam.
- Para dar felicidade, é bom para a noiva que ela, no seu dia grande, leve
vestida uma peça de roupa usada e leve escondida em qualquer bolso
uma cabeça de arruda com cinco dentes.
- Mas é de mau gosto que o enxoval dos noivos tenha cores azuis ou a
noiva se apresente com vestidos pretos.
ci onai s.
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Esta superstição da peneira também é utilizada para outras
adivinhações; por exemplo, para saber do êxito de um namoro,
- Entende o povo que «quem casa, quer casa» e, por isso, os recém-
casados devem ter casa própria.
«Entre marido e mulher não metas a colher», é ditado que serve para
mostrar que ninguém deve intrometer-se nos seus problemas - «entre
casados, ninguém se meta».
ENDOCULTURAÇÃO
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para os tiros do ladr,@o-fidalgo, ou Lugers pesadissimas, inchando o
bolso ou pesando nas axilas, à Michael Shaynne. E mais espingardas.
Espingardas, espingardas de Ringo, de Wild Bill Hitchcock, ou de
Samblgliong, até à sobrecarga final. Armas, em resumo, rneu filho,
muitas armas, só armas. São o que te dará o teu Natal.
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tornar-lhes a idade madura. Em cada monstrozinho que acciona os
agulheiros do seu caminho -de~ ferro em miniatura, vejo o futuro
director do campo da morte! Ai dos que gostam das colecções de
automoveizinhos, que a indústria dos brinquedos lhes propõe,
horrendos, em réplicas perfeitas, com o porta-bagagens que abre e os
vidros que deslizam para cima e para baixo - tertificante, terrificantejogo
para futuros sargentos de um exército electrónico, que hão-de premir
sem paixão o botão vermelho de uma guerra nuclear!
Mas talvez isto não seja tudo, e não será realmente tudo. Não te
permitirei que dispares o teu Coft só a título de descarga nervosa, de
purificaçã o lúdica dos instintos primor diais, ficando para depois a
depuração do acontecido, a pars construens, a comunicação dos valores.
Procurarei dar-te algumas ideias, desde o momento em que comeces a
disparar escondido atrás de um sofá.
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todo o mundo, trabalhai alegremente! Hoje vamos brincar à decapitação
de Maria Antonieta! Pedagogia perversa? Quem o diz? Os que fazem um
filme acerca do herói Fra Diavolo, lacaio como outro não houve a soldo
dos agrários e dos Bourbons? Alguma vez
teus anos mais jovens, vou confundir-te um tanto as ideias, mas hás-de
chegar lentamente às tuas próprias convicções. Depois, em adulto,
pensarás que era tudo uma fábula, captichinho vermelho, gata
borralheira, as espingardas, os canhões, o homem contra o homem, a
bruxa contra os sete anões, os exércitos contra os exércitos. Mas se por
acaso, quando fores grande, tiveres ainda por dentro as figuras
monstruosas dos teus sonhos infantis, as bruxas, os cow-boys, os
exércitos, as bombas, as mobilizações forçadas, talvez não tenhas
assumido, nesse caso, a devida consciência crítica perante as fábulas
nem aprendido a mover-te criticamente no interior da realidade. »
Umberio Eco, Diário Mínimo, 1964
4.2. Vísitas
Os castros (ests. X VI, X VIII e XIX) eram, em geral, limitados por fossos,
muralhas ou
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Em alguns castros, como no de Sabroso, havia no centro das habitações
urna pedra sobre a qual provavelmente se fixava lima haste para
suporte da cobertura da casa. Esta cobertura era talvez de colmo, ou
argila e madeira e, só nos romanizados, seria, multas vezes, de telhas.
Também, em alguns, a porta da habitação se abriria nur77 alpendre ou
vestíbulo (Sabroso, Santa Oleia, etc.). Os pavimentos seri .em o solo
natural, barro sern cozedura, ti@*o1o ou até - apenas nos mais ricos e
romanizados - mosaicos, sendo notáveis os de Conímbriga.
Das muralhas, como das paredes das habitações, raro restam porções
intactas, quase sempre existem apenas pedras dispersas e entulho. Em
Conimbriga, porém, a muralha está em grande parte conservada.
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INDúSTRIA E REPRESSÃO SEXUAL NUMA SOCIEDADE PADANA
0 texto tem de ser lido como uma paródia, de sinal negativo: é uma
expedição melanésia que se debruça com o seu aparelho conceptual e
padrões culturais específicos, sobre a nossa conhecida sociedade
industrial dos anos sessenta - mas incompreensível para os melanésios.
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Mas também o'método da nova corrente antropológica podia dar lugar a
graves equívocos; como, por exemplo, quando o investigador,
exactamente por ter reconhecido a dignidade de cultura ao «modelo»
estudado, se limitava a colher sem crítica os documentos históricos
directamente produzidos pelos próprios índigenas submetidos à
descrição, daí deduzindo as características próprias do grupo.
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bos. A notícia destas aquisições é fornecida pelas habituais mensagens
hieráticas matutinas, nas quais podemos seguir dia após dia uma
verdadeira crónica deste gênero de aquisições gastronómicas; dessas
crónicas sobressai que são particularmente apreciados os estrangeiros
de cor, os de alguns ramos nórdicos e grande quantidade de sul-
americanos. Tanto quanto nos foi possível reconstituir, as vítimas são
devoradas em formações colectivas compostas por diversos indivíduos,
segundo receitas complicadas que se vêem publicamente expostas nas
ruas, onde nos apresentam uma espécie de posologia
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Mas a pergunta que o investigador coloca é a seguinte.- serão a
confusão e a frustracão realmente efeito de uma decisão pedagógica
consciente, ou, pelo contrário, concorre
ESQUEMA: FEIJOADA
Uma Romaria: o Senhor de Matosinhos hoje.
PRIMEIRO ASPECTO
Não havendo excesso sexual, nos tempos de hoje, ainda são recentes
(até à década de 30) os casamentos combinados na Feira dos Moços. De
resto como em qualquer romaria os contactos entre rapazes e raparigas
mantêm-se como praxe, e estreiam-se roupas novas.
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GLOSSÁRIO
ALUCINAÇÃO
CHAUVINISMO
CIÊNCIA POSITIVA
DARWINISMO SOCIAL
EPISTEMOLOGIA
ESTRUTURALISMO
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EVOLUÇÃO DARWINISTA
EXORCISMO
FUNCIONALISMO
INVERSÃO DE VALORES
MISCIGENAÇÃO
PULSÕES
PARADIGMAS
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REPRODUÇÃO SOCIAL
ROBINSON CRUSOÉ
AUTORES CITADOS
ARTAUD, ANTONIN
BALLANDIER, GEORGES
BARTHES,ROLAND
BENEDICT, RUTH
EIBEL-EIBESFELIDT, IRENÃUS
141)
FOUCAULT, MICHEL
LABORIT, HENRI
LEROl-GOURHAN, ANDRÉ
LÉVY-BRUHL, LUCIEN
LÉVI-STRAUSS, CLAUDE
MALINOWSKI, BRONISLAW
SAI---1LINS, MARSHALL
BIBLIOGRAFIA
Obras Gerais
141
TRABALHOS DE ANTROPOLOGIA E ETNOLOGIA, Porto
Obras Específicas
142
@s;
1987
1 o EDIÇÃO
2500 exemplares