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Roberto Leher 1
1. Considerações metodológicas
Para não repassar recursos aos estados a União não hesitou em burlar
a Lei do FUNDEF, corrigindo o valor do custo-aluno-ano conforme um
2
. O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério (FUNDEF) foi instituído pela Emenda Constitucional nº.
14, de setembro de 1996, e regulamentado pela Lei nº. 9.424, de 24 de dezembro
do mesmo ano, e pelo Decreto nº. 2.264, de junho de 1997, e foi implantado
nacionalmente em 1º de janeiro de 1998. O FUNDEF altera a estrutura de
financiamento do Ensino Fundamental no País, subvinculando uma parcela dos
recursos constitucionalmente destinados à Educação. Com a Emenda
Constitucional nº. 14/96, 60% desses recursos (o que representa 15% da
arrecadação global de Estados e Municípios) devem ser destinados ao Ensino
Fundamental. O Fundo estabelece novos critérios de distribuição e utilização de
15% dos principais impostos de Estados e Municípios, adotando o custo-aluno do
ensino fundamental. Como pode ser visto no presente estudo, a correção do
custo-aluno nos períodos Cardoso e Lula da Silva sempre foi abaixo da
determinada pela Lei 9.424/96.
índice inferior ao previsto na referida Lei. A não correção do valor do
FUNDEF provocou um calote da União de R$ 12,8 bilhões no período
1998-2002. Acrescente-se a isso a Desvinculação de Receitas da
União, aprovada em 1994, que ampliou o saqueio governamental das
verbas educacionais. Criada sob o nome de Fundo Social de
Emergência esta medida foi sendo prorrogada sucessivamente (pelas
Emendas Constitucionais 10 [1996], 17 [1997], e 27 [2000]), a
desvinculação acarretou imensos prejuízos ao financiamento da
educação ao desobrigar 20% da receita de impostos e contribuições,
reduzindo a obrigação constitucional do governo federal de aplicação
em manutenção e desenvolvimento de 18% para 14,4%, o que
implicou em uma perda superior a R$ 40 bilhões no período de seu
governo.
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A ruptura ocorreu na Plenária do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, em Porto Alegre-RS,
26 de Janeiro de 2005 – Auditório da Unafisco.
Como destacado em outro artigo4, essa investida sobre a educação
pública vem sendo efetivada por meio de entidades âncoras em que
um pequeno grupo de gestores se reveza na direção das mesmas.
Assim, por exemplo, Milú Villela, do Instituto Itaú Cultural, é
presidente do Museu de Arte Moderna de São Paulo (novembro de
2009), do Faça Parte-Instituto Brasil Voluntário e agora também do
Comitê Executivo do “Compromisso Todos pela Educação”. As
entidades que organizam essa ofensiva ocultam seu caráter
corporativo e empresarial por meio da filantropia, da
responsabilidade social das empresas e da ideologia do interesse
público. As mais relevantes são: a) o Instituto Ayrton Senna
(respaldado por corporações do setor financeiro, do setor agro-
mineral, do setor de agroquímicos, editoras interessadas na venda
de guias e manuais, provedores de telefonia, informática e internet,
engajadas no cyber-rentismo)5; b) a Fundação Roberto Marinho,
principal grupo de comunicação localizado no Brasil (e que não
publiciza seus apoiadores); c) a Fundação Victor Civita, vinculada a
um grupo econômico que, entre outras, edita uma revista que vem
difundindo que a educação é um tema técnico-gerencial (Revista
Nova Escola), apoiada pelas editoras, pelo capital financeiro, agro-
mineral, pelas corporações da área de informática etc.6; d) Grupo
Gerdau que, por meio de Jorge Gerdau Johannpeter, preside o
Movimento e que outrora foi organizador do Movimento Brasil
Competitivo (2001) que, em certo sentido foi o germe do
“Movimento Todos pela Educação” em conjunto com o Programa de
Promoção da Reforma Educacional na América Latina e no Caribe (PREAL)7, Itaú -
Social, que, valendo-se, como as demais, de isenções tributárias,
atua no setor educacional objetivando implementar as parcerias
público-privadas na educação básica por meio das Escolas Charter8.
Compõem ainda o Conselho de Governança da iniciativa outras
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LEHER, Roberto Desafios para uma educação para além do capital. Revista Margem Esquerda,
SP: Boitempo Ed. (no prelo).
5
. Ale (combustíveis), Banco Triângulo, Bradesco Capitalização, Brasil Telecom,
Celpe, Coelba, Cosern, Credicard, Grendene, HP Brasil, Instituto Unibanco,
Instituto Vivo, Instituto Votorantim, Intel, Lenovo, LIDE - Grupo de Líderes
Empresariais / Empresários pelo Desenvolvimento Humano, Martins Distribuidora,
Microsoft Educação, Nívea, Oracle, Santa Bárbara Engenharia, Siemens, Suzano,
Vale de Rio Doce.
6
. Alfabetização Solidária, Bovespa, Cosac Naify, Editora Ática, Editora Scipione,
EDP, Fundação Bradesco, Fundação Cargill, Fundação Educar DPaschoal,
Fundação Telefônica, Gerdau, Instituto Unilever, Intel, Itautec, Microsoft, OSESP,
Rádio Bandeirantes, SESI.
7
. “As atividades do PREAL são possíveis por meio do generoso apoio da United States Agency for
International Development (USAID), do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), da GE
Foundation, da International Association for the Evaluation of Educational Achievement (IEA) e do
Banco Mundial, entre outros”. (PREAL, Boletim da Educação no Brasil, 2009)
8
. As escolas "charter" são construídas e geridas por entidades privadas,
filantrópicas, mas as matrículas e mensalidades de seus alunos são pagas pelos
Estados que são responsáveis por monitorar seu desempenho. Entre as medidas
previstas, cabe salientar a autonomia para contratar professores, elaborar
currículos próprios e mudar a carga horária.
representações do capital: Fundação Bradesco, Grupo Pão de
Açúcar, FEBRABAN, SESC, ABN Amro, Fundação Educar DPaschoal,
Faça Parte-Instituto Brasil Voluntário, Grupo Ethos, entre outros.
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BRASIL. Lei de Inovação Tecnológica, LEI No 10.973, de 2 de Dezembro de 2004.
Outras medidas relacionadas a esta lei: Lei 11.080/2004 (institui o Serviço Social
Autônomo denominado Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI),
Lei 11.196/2005 (“dispõe sobre incentivos fiscais para a inovação tecnológica”,
“Lei do Bem”) e Lei 11.487/2007 (“altera a Lei no 11.196/05 para incluir novo
incentivo à inovação tecnológica e modificar as regras relativas à amortização
acelerada para investimentos vinculados a pesquisa e ao desenvolvimento”).
10
. Lei no 11.079, de 30 de dezembro de 2004, “institui normas gerais para
licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração
pública”. Esta lei foi insistentemente reivindicada pelo FMI, aprofundando o Plano
Diretor da Reforma do Estado de Cardoso.
ou autor de projeto, processo ou serviço poderá participar dos ganhos
econômicos auferidos pela instituição com a parceria. O horizonte
desejado é a transformação do professor em empresário. O docente
pode se afastar por até 6 anos da universidade para tentar uma
carreira empresarial e até mesmo para constituir uma empresa.
Durante o período de afastamento, é assegurado ao professor o
vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens pecuniárias
permanentes estabelecidas em lei e, ainda, progressão funcional e
benefícios da seguridade.
11
. Instrução Normativa SRF nº. 456, de 5 de outubro de 2004: Art. 1º A
instituição privada de ensino superior, com fins lucrativos ou sem fins
lucrativos não beneficente, que aderir ao Programa Universidade para Todos
(ProUni) nos termos dos arts. 5º da Medida Provisória nº. 213, de 2004, ficará
isenta, no período de vigência do termo de adesão, das seguintes
contribuições e imposto:
I - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); II -
Contribuição para o PIS/Pasep; III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido
(CSLL); e IV - Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
bancada governista, a contrapartida despencou para 4,25% de bolsas
integrais. Vitórias acachapantes dos que fazem da educação um
negócio lucrativo! Outra benesse para o setor empresarial foi a
garantia de isenções tributárias para qualquer instituição que venha
aderir ao programa, independentemente das vagas disponibilizadas.
Por isso, as privadas sempre tentam incorporar o menor número
possível de estudantes ao programa. Com efeito, o percentual de
vagas do ProUni é fortemente descendente, mostrando que, após a
vitória na redução do percentual de vagas previstas em lei, os
empresários aprenderam a burlar, com a conivência governamental,
as contrapartidas legais:
Tabela 1
Tabela 2
Tabela 3
Tabela 4
Tabela 5
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O estudo de Stella Cecília Duarte Segenreich (2009) comprova a significativa
presença desses cursos, particularmente no Norte e Nordeste.
Gráfico 1
Gráfico 2
Gráfico 3
Gráfico 4
Examinado o orçamento da educação em relação ao PIB, no período
em tela, é verificável que o mesmo foi decrescente até 2005,
havendo uma leve elevação em 2006 e 2007, confirmando que a
educação não ganhou espaço nas prioridades do governo Federal.
Tabela 6
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. Projeto de Lei Complementar nº. 92, de 2007 – regulamenta o inciso XIX do
art. 37 da Constituição Federal, parte final, para definir as áreas de atuação
de fundações instituídas pelo poder público. Projeto de autoria do Poder
Executivo.
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. Consultar http://reuni.mec.gov.br.
valor estipulado pelo decreto (Pinto, 2009) e ultrapassa, inclusive,
as privadas mais mercantilizadas, inviabilizando o conceito de
universidade como instituição de ensino, pesquisa e extensão.
Nesse marco somente o ensino massificado pode ser viável.
Gráfico 5
Tabela 7
4. Problemas e desafios
Tabela 10
Tabela 11
Referências
LEHER, Roberto. Desafios para uma educação para além do capital. III Seminário
Internacional Margem Esquerda, Educação e Socialismo, USP, 20/08/2009.