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Sumário
Introdução
Conclusão
1
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
Dr. Nelson Célio de Mesquita Rocha
Introdução
A autoridade da Bíblia provém do seu próprio autor, que é Deus.1 O Senhor fala
através da Escritura. Aí está a base de sua autoridade: é a Bíblia a Palavra de Deus.
Aqueles que escutam ou lêem a Escritura, encontram o poder da majestade divina,
que é superior aos desejos e conhecimentos humanos. Todos nós somos incapazes de
compreender os mistérios de Deus sem termos sido iluminados pela divina graça.
Essa iluminação se dá através do “testemunho interno do Espírito Santo”. Deus é
suficiente no testemunho do seu ser revelado na Sua Palavra, que opera no coração
das pessoas, confirmado pelo testemunho interno do Espírito Santo.
Está confirmado que Deus fala ao ser humano através da Escritura, e é
verificado pelo Espírito Santo agindo em seu interior. O exegeta deve estar certo de
que é assim mesmo, convencido da autenticidade da Bíblia e que na sua autonomia,
comunica a verdade. Tem de haver da parte do exegeta reverência e humildade no ato
de recorrer à Bíblia.2 O Senhor tem estabelecido um tipo de conexão mútua entre a
certeza de Sua Palavra e de Seu Espírito.
É preciso considerar como certo o que se pode afirmar sem titubeios, sobre o
conceito de uma inspiração sobrenatural das Escrituras. Mas, o Espírito não
transformou a Escritura numa dificuldade, de se entender o Seu ensino. Por isso,
aqueles que a interpretam, devem estar conscientes de
alguns pontos fundamentais.
1
KRAUS, Hans-Joachim. Calvin’s Exegetical Principles. Published by them in vol. 79 (1968),
329-41. Tradução: Nelson Célio de Mesquita Rocha, RJ, setembro de 1998.
2
Cf. KRAUS, Hans-Joachim. Calvin’s Exegetical Principles. Published by them in vol. 79 (1968),
329-41.
3
O texto em epígrafe se fixa apenas a um resumo retirado do original em inglês.
2
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4
O habitat lingüistico específico do autor significa a sua maneira de escrever. O porquê da sua
linguagem, a sua forma, que denotam a sua intenção. Se o exegeta não tiver essa percepção, não
conseguirá entender e muito menos passar a mensagem adiante.
5
Diante disso, o que importa é o fato do escrito ter sido inspirado por Deus, pelo Seu Espírito, e não
a pessoa que foi tomada por Deus, pois ela foi apenas um mero instrumento para que o registro
fosse elaborado.
3
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Calvino utilizou o trabalho feito por David Kimchi, Abraham ibn Ezra e Raschi, para
determinar o sentido real de uma escritura.
“As palavras são claras, mas eu não concordo com os outros exegetas que não
hesitaram em tomar a palavra semente para referir-se a Cristo, assim, o sentido
real transformou-se: fora dos descendentes da mulher surgirá aquele que
esmagará a cabeça da serpente. Esta visão, de qualquer maneira eu devo
concordar, fazendo mais violência à palavra semente. Quem pode insistir que
este substantivo coletivo aqui se refere tão somente a uma pessoa? Prefiro usar o
real sentido como sendo a contenda contínua entre Satã e homem, mas no curso
do tempo a humanidade será vitoriosa”.
6
É importante saber que a Escritura não necessita da opinião de quem quer que seja, e de quem
esteja diante dela, pois a Bíblia tem a sua mensagem peculiar. O que se precisa fazer é extrair dela a
mensagem para toda vida.
4
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As diversas formas.
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somos mais sábios do que a sabedoria de Deus. Em Cristo, “temos todos os tesouros
da sabedoria e do conhecimento” (Col.2.3).
Deve-se considerar que, Jesus Cristo é observado como o critério que explana
toda a verdade canônica, ou ser assumido o conteúdo de um conhecimento prévio,
que nos conduz em nosso trabalho de interpretação.
Tem sido freqüentemente argumentado que Calvino aboliu a distinção entre
Antigo e Novo Testamento, mas não existe base para essa afirmação. Pelo contrário,
há uma similaridade entre o Primeiro e o Segundo Testamento. O método exegético
de Calvino foi fundamentado em estudos humanísticos, e foi mais estritamente
orientado para a história do que a de Lutero.
A interpretação cristológica dos comentários de Calvino no Antigo Testamento
vê para o futuro o cumprimento de promessas e profecias, e eram seus comentários
do Novo Testamento como fatores determinativos para a exegese, com um
movimento em direção a Cristo, baseado sempre na convicção de que a clareza da
Sagrada Escritura está firmada somente em Cristo.
Os princípios exegéticos em questão fazem parte do trabalho elaborado por
Calvino. A exposição feita por Calvino modificou as avaliações gerais sobre a
exegese bíblica da Reforma; e esse trabalho formou de modo aprofundado o perfil
dos métodos exegéticos posteriores.
8
Por João Luiz Correia Jr. [O texto a seguir foi extraído, com permissão do autor, da obra "Chave
para análise de textos bíblicos: com exercício de análise." São Paulo: Paulinas, 2004, pp. 7-9 (no
prelo, com carta de aceite).]
9
"Não se "sai" do texto (ex-egese, do grego ago, "conduzir / guiar") trazendo um sentido puro nele
recolhido, como um mergulhador traz um coral à superfície do mar ou como se tira um objeto de
um cofre. Antes, a partir de um horizonte vivencial novo que repercute significativamente na
produção de sentido que é a leitura, "entra-se " no texto (eis-egese) com perguntas que nem sempre
são as de seu atuor". CROATTO, J. Severino. Hermenêutica bíblica: para uma teoria da leitura
como produção de significado. São Paulo: Paulinas; Porto Alegre: Sinodal; 1986, p.59.
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■ Seguem abaixo alguns pontos fundamentais que nos ajudam a fazer exegese de
texto das Sagradas Escrituras:
2.1. Delimitação da perícope
o “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua
alma e de toda a tua força”; e instrui para que estas palavras sejam
lembradas em todo momento do cotidiano.
o O Deus zeloso proíbe que Israel siga outros deuses e, em uma passagem
paralela (Deut 7.5), ordena que os israelitas destruam os ídolos e tudo o
que está relacionado com eles, quando tomarem posse da terra
prometida. E isto confirma o que foi dito no artigo anterior: a confissão
10
Cf. WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. Sinodal/Paulos,
1998. Parte do Glossário. É um manual que vale muito considerar para o estudo exegético.
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Foi em sua atividade terrena e em sua pessoa que Jesus Cristo revelou a Deus de
uma maneira definitiva e absolutamente nova aos “homens de boa vontade”.
Revelação que chocou e ainda choca judeus, muçulmanos, testemunhas de Jeová e
outros grupos religiosos que ainda insistem em viver sob a tutela de Moisés. Para os
que recusam receber a graça, ela permanece sem efeito e a “dureza do coração”
aumenta, como aconteceu com o Faraó do êxodo.
Mesmo uma exegese simples e resumida como essa, seria suficiente para mostrar
que também as passagens de João 10.30 e 17.3 dizem algo diferente do que as
prédicas dos unitarianos as fazem dizer, citando-as de forma isolada e situando-as na
perspectiva da própria crença deles.
A exegese requer que o intérprete tenha uma visão global da Escritura, de sua
história da salvação, já que a interpretação é feita sempre a partir do detalhe em
direção ao todo e do todo em direção ao detalhe; e que tenha um conhecimento
suficiente a fim de determinar em que situação histórica, religiosa, cultural e social
esses termos e conceitos foram usados e com que finalidade. Portanto, a exegese
confiável rejeita a forma generalizada de usar passagens isoladas, interpretadas
segundo a significação atual dos termos e conceitos e sem relacioná-los com o todo
da Escritura, como fazem trinitarianos e anti-trinitarianos em sua prédica apologética.
Por “delimitação da perícope” trata-se de observar o corpo da perícope, em sua
delimitação interna e externa.
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b’. Quem me enviou quer que eu faça isto: que nenhum daqueles
que o Pai me deu se perca,
a’. Mas que eu ressuscite todos no último dia.
■ Façamos a distinção entre gênero literário e estilo, ainda que de modo sucinto.
Toma-se aqui por base para a presente análise reflexiva o conteúdo da obra de
Uwe Wegner, um completo manual de metodologia para a exegese do Novo
Testamento.11
11
WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. São Leopoldo:
Sinodal; São Paulo: Paulus, 1998, pp. 147, 168-170. Embora esta parte se refira à exegese do NT,
pode-se aplicar também à exegese do AT o seu método.
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A. Gênero Literário
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o Como “gêneros maiores” podem se destacar os dos Evangelhos, dos Atos dos
Apóstolos, das Cartas (Epístolas), e do Apocalipse.
o Como “gêneros menores” podem-se encontrar uma multiplicidade, tais como:
homologias (repetição das mesmas palavras, conceitos, figuras, no mesmo
discurso); doxologias (fórmula de louvo à glória de Deus; enunciado de uma
opinião comumente admitida), liturgias, catálogos de virtudes e vícios e outros
encontrados nas Epístolas e no Apocalipse.
B. Estilo
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evangelhos emprega o termo neste sentido. Mc o faz ainda por outras duas
vezes (9.11,28).
VERSÕES
DO
ANTIGO
TESTAMENTO
1. A BÍBLIA EM PORTUGUÊS
■ Traduções completas
2.1. Tradução por João Ferreira de Almeida. Por conhecer o hebraico e o grego,
usou os mss., dessas línguas para sua tradução. Quanto iniciou o
empreendimento era pastor protestante. Almeida utilizou-se do Textus
Receptus, que representa os mss. do grupo bizantino, possivelmente o mais
fraco entre os mss. gregos. Primeiramente traduziu e editou o N.T. publicado
em 1681, em Amsterdã, Holanda. Essa tradução apresentava muitos erros.
Almeida mesmo fez uma lista de dois mil erros. Muitos desses erros foram
feitos pela comissão holandesa, que procurou harmonizar a tradução de
Almeida com a versão holandesa de 1637. A dificuldade de Almeida é que
não havia papiro algum e os unciais (mss. em letras maiúsculas) eram
poucos. Esta a razão porque teve que lançar mão de fontes inferiores. Ele
utilizou-se da edição de Elzevir do Textus Receptus, de 1633. As edições
mais modernas muito progrediram na tradução. Com base nesta tradução
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4. Escolha de um Texto
Será que às vezes substituímos o texto bíblico pelas nossas
próprias idéias e opiniões? Quando vamos interpretar um
trecho da Sagrada Escritura, estamos cientes de que
precisamos respeitá-lo?12
Quando abordamos o texto bíblico, deixamos que ele nos
conduza ou, ao contrário, impomos a ele um
direcionamento?
É de fundamental importância ter a consciência de que a
Bíblia é um livro vivo, não porque nos conduz à salvação,
mas porque cada um dos escritos que a compõem passou
por um longo processo de formação e possui uma história digna de uma biografia.13
Precisamos aprender a ler. Mas, o que é ler? Sabemos ler a Bíblia? Cada vez que
a tomamos nas mãos, lembramo-nos de que a Bíblia é uma obra literária?
Esse questionamento nos insere diante de algo que é de suma importância: a
questão do método. Isso quer dizer: quais sãos os instrumentos de que lançamos mão
para ler a Sagrada Escritura?
12
Cf. DA SILVA, Cássio M. Metodologia de Exegese Bíblica. São Paulo: Paulinas, 2003, p. 21.
13
Cf. Ibid., p. 22.
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O que é um texto?
Do latim textus = tecido, trama.
Para compreendermos o significado de um texto é preciso abordar algumas
características de um texto literário. Antes de qualquer coisa, convém lembrar que o
texto pode ser decomposto em elementos menores, chamados FRASES. Estas por sua
vez, decompõem-se em elementos menores ainda: as PALAVRAS. Assim, as
palavras se articulam e interagem em frases, que, por sua vez, se articulam e
interagem no texto.14
Os fatores que concorrem para a articulação e a interação desses elementos
pertencem a distintos aspectos lingüísticos. Vejamos a seguir:
A configuração sonora
do texto, as assonâncias. Os signos lingüísticos
menores e suas
propriedades, as
categorias gramaticais
Fonético (verbos, substantivos,
etc.).
Aspectos
Estilístico Lingüísticos Morfológico
A elegância do texto
(mais poético ou não,
mais redundante ou Sintático
não).
A articulação das
palavras no todo, como
estrutura.
Outra das qualidades do texto é a sua DELIMITAÇÃO. Um texto precisa ter
começo, meio e fim. A ciência bíblica utiliza um termo clássico para designar uma
unidade literária que preenche tais requisitos: PERÍCOPE.15
14
Cf. DA SILVA, Cássio M. Metodologia de Exegese Bíblica, p. 24.
15
Cf. DA SILVA, Cássio M. Metodologia de Exegese Bíblica, p. 24.
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Delimitação da Perícope
Início da Perícope
Começo
Várias perícopes formam um texto mais complexo, e assim por diante, até
compor um livro.
Nenhum texto é uma unidade isolada, mas se insere no amplo contexto do
processo da comunicação lingüística. Também, todo texto é construído sobre um
sistema sígnico determinado. Assim, tanto o autor quanto o leitor devem ter um
sistema sígnico comum, para que o processo comunicativo aconteça. No caso da
Bíblia, é mister levar em consideração as distâncias entre autor e leitor: tempo,
espaço, cultura, língua, etc.16
O texto, após sair das mãos do autor, tem vida própria, é autônomo. Eis o que
acontece com a Sagrada Escritura. E tendo em vista que a comunicação entre autor
16
Cf. Ibid.
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■ O texto massorético
Os livros que o povo judeu, no fim do século I d.C., considerou como livros
santos (Bíblia judaica, Antigo Testamento dos protestantes, livros deuterocanônicos
do Antigo Testamento para a Igreja católica) foram conservados em sua língua
original (aramaico para uma grande parte de Daniel e algumas passagens de Esdras,
hebraico para todo o resto).
22
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■ Alterações textuais
É certo que determinado número de alterações diferenciam o texto
protomassorético do texto original.
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■ Crítica textual
Que forma de texto escolher? Noutras palavras, como chegar a um texto
hebraico o mais próximo possível do original? Alguns críticos não hesitam em
"corrigir" o texto massorético cada vez que ele não lhes agrada, seja por motivo
literário, seja por motivo teológico. Por reação, outros se atêm ao texto massorético,
mas quando ele é manifestamente insustentável, procuram encontrar numa ou noutra
das versões antigas uma variante que lhes pareça preferível. Esses métodos não são
científicos, sobretudo o primeiro. São perigosamente subjetivos.
Atualmente, um melhor conhecimento da exegese targúmica e das literaturas
antigas do Oriente Próximo permite explicar certas passagens até hoje obscuras.
Mas a solução verdadeiramente científica consistiria em fazer com a Bíblia
hebraica o que se faz com o Novo Testamento e com todas as obras da Antiguidade:
um estudo bastante minucioso do conjunto das variantes, estabelecendo "a árvore
genealógica" dos testemunhos que possuímos - texto massorético, múltiplos textos de
Qumran, Pentateuco samaritano, versões gregas da Septuaginta (com suas três
revisões sucessivas), da Quinta (de Orígenes), de Áquila, de Símaco, de Teodocião,
versões aramaicas dos targumin, versões siríacas peshitto, filoxeniana, siro-hexaplar,
harqleana, versões latinas antigas e Vulgata de Jerônimo, versões coptas, armênias
etc. - e assim, sem nenhuma conjetura subjetiva, restabelecer o arquétipo à base de
todas as testemunhas.
Geralmente esse arquétipo remonta ao século IV a.C. Em alguns casos
privilegiados (certas passagens das Crônicas), pode-se provar que o arquétipo assim
obtido é o próprio original. Quase sempre o arquétipo está separado do original por
um período mais ou menos longo, e então se está obrigado, para passar do arquétipo
ao original, a recorrer a algumas conjeturas, com a aplicação prudente de princípios
críticos bem estabelecidos.
Infelizmente, os textos de Qumran ainda não estão todos publicados, e o trabalho
crítico exige tanta competência e pesquisa que ele levará ainda várias décadas. Por
isso, para evitar as fantasias de correções falaciosas, os responsáveis pela Bíblia -
Tradução Ecumênica decidiram seguir, o mais perto possível, o texto massorético,
24
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esclarecendo-o pelo trabalho dos grandes exegetas judaicos da Idade Média: Rashi,
Ibn-Ezra, Qimhi etc.
■ Para os judeus
Para ler a Bíblia (= "Lei escrita"), o judaísmo elaborou sua própria tradição
interpretativa durante o período rabínico clássico, do século II a.C. ao século VIII da
nossa era.
Primeiramente "Lei oral" ou "tradição dos antigos" (porque transmitida de
mestre a discípulo sem a mediação escrita), essa tradição foi codificada e posta por
escrito na Mishiná (que, com o seu comentário, a Guemará, forma o Talmud) e nas
diversas coletâneas midráshicas.
Ela se desenvolve essencialmente sobre dois pontos: a interpretação livre e
homilética, visando alimentar a reflexão religiosa (Hagadá) e a definição das regras
de conduta cotidiana (Halaká). "Lei escrita" e "Lei oral", texto de referência e
interpretação ininterrupta, constituem a tradição religiosa viva do judaísmo.
"Se existe uma coisa no mundo que mereça o atributo de divino, é a Bíblia. Há
inúmeros livros sobre Deus. A Bíblia é o livro de Deus. Revelando o amor de
Deus pelo homem; ela nos abriu os olhos, a fim de que pudéssemos ver que
aquilo que tem um sentido para a humanidade é, ao mesmo tempo, o que é
sagrado para Deus. Ela mostra como a vida de um indivíduo pode se tornar
sagrada, e sobretudo, a vida de uma nação. Oferece sempre uma promessa às
almas honestas quando perdem o ânimo, enquanto os que a abandonam vão de
encontro ao desastre".19
19
HESCHEL, A., Dieu en quête de l'homme, Paris, Seuil, 1968, p. 263 [port: Deus em busca do
homem, São Paulo, Paulinas, 1975].
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■ Para os cristãos
O Antigo Testamento só é antigo em relação ao Novo, isto é, a nova aliança
instaurada por Jesus Cristo. Mas não se deve exagerar a diferença entre ambos, como
se a antiga aliança e a literatura que dela dá testemunho tivessem caducado.
Essa visão das coisas, que foi a de Marcião no século II, reaparece
periodicamente na história da teologia. Ora, ela atinge mortalmente o próprio Novo
Testamento.
O Antigo Testamento foi a única Bíblia de Jesus e da Igreja primitiva. Como
livro da educação judaica, de algum modo, moldou a alma de Jesus. Este assumiu os
valores do AT como fundamentos do seu evangelho: não veio para "ab-rogar" a Lei e
os profetas, mas "para cumpri-los". Cumpri-los era primeiramente levá-los a um
ponto de perfeição no qual o sentido primitivo do; textos se superassem a si mesmo,
para traduzir em sua plenitude o mistério do Reino de Deus. Cumpri-los era também
fazer entrar na experiência humana o conteúdo real das promessas que polarizavam a
esperança de Israel. Era desvendar o sentido definitivo de uma história ligada a uma
educação espiritual, mostrando sua relação com o mistério da salvação, consumado
pela cruz e ressurreição de Jesus. Era enfim dar à oração que aí se expressava uma
riqueza de conteúdo que ultrapassassem os seus limites provisórios. Sob todos estes
aspectos. Jesus cumpriu em sua pessoa as Escrituras que estruturavam a fé de Israel.
Por isso a Igreja apostólica encontrou nas Escrituras o ponto de partida
necessário para anunciar Jesus Cristo. À luz da Páscoa, ela não somente rememorou
os feitos e gestos de Jesus, a fim de compreender o seu sentido profundo; também
releram todos os textos antigos que the recordavam a história preparatória, com suas
peripécias contrastantes, suas instituições provisórias, seus sucessos e fracassos, seus
pecadores e santos. Não se encontravam esboçados, anunciados e prefigurados já no
Primeiro Testamento a mensagem de Jesus, sua missão redentora, a constituição e o
mandato da Igreja? Por isso os livros do Novo Testamento, sem perder de vista as
lições positivas contidas nos preceitos do Antigo, habitualmente reinterpretam os
20
ZAOUI, A., Catholiyues, juifs, orthodoxes, prntestants lisent la Bihle Introductions ìt la
Bible, t. I, Paris, Cerf, 1970, p 76.
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21
Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, p 74.
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menos rica.
O “Método” deve ser compreensível, imitável e controlável com elementos ao
alcance das mãos de quantos têm certa familiaridade com a disciplina que se
dedicam.
O termo “histórico” implica reconhecer que os textos bíblicos foram concebidos
e compostos em tempos idos, que se desenvolveram num processo histórico e que,
por conseguinte, a relação com aquele tempo tem provavelmente algo a dizer sobre o
sentido de tais textos, embora possam ter ainda vida e sentido atuais.
A palavra “crítico”, tal como se costuma interpretar, significa estabelecer
distinções e com base nelas poder julgar os diversos aspectos do texto ligados à
história: o processo de constituição do texto, a identidade do autor, o tempo da
composição, a relação com outros textos contemporâneos, e a referência do conteúdo
do texto à realidade extra-textual (por exemplo, a história política, social e religiosa
que o texto subentende).
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■ Pressuposições
Pressuposições são idéias, hipóteses ou fatos que aceitamos ou carregamos
conosco antes de iniciar nossa análise de um texto. O bom exegeta procura libertar-se
ao máximo deles para que a sua compreensão do texto não seja distorcida pela sua
pré-compreensão. Um exemplo prático ajuda a ver a importância das pressuposições.
Se um exegeta pressupõe que "milagres não podem acontecer", todo seu estudo dos
evangelhos e de Atos vai
revelar ceticismo quanto aos fatos narrados e vai procurar explicá-los por meio de
causas naturais, ignorância do povo, erro do escritor, etc. As pressuposições vão guiar
nossa capacidade de entender e explicar o texto.
Por outro lado, as pressuposições existem e sempre existirão. O que importa é a
sua validade. O critério da validade de uma pressuposição é a sua base cristológica,
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que Jesus Cristo é o filho de Deus. Devemos ler a história do Novo Testamento com a
pressuposição cristológica revelada pelos escritores. Esta é uma pressuposição básica
para entender o Novo Testamento, e até mesmo o Velho, tomadas as devidas
precauções. A pressuposição cristológica é válida para sempre.
Quando as nossas pressuposições são iguais às pressuposições dos escritores do
Texto Sagrado, temos as melhores condições possíveis para entender o que eles estão
falando e escrevendo. Não há um raciocínio em círculo aqui. A fé em Cristo, mantida
pelos escritores do Novo Testamento, precedeu a obra escrita que produziram sob a
influência do Espírito Santo. Logo, para que possamos acompanhar o pensamento
desses homens, precisamos participar da fé que tiveram.
Ver o texto como o autor o viu é o nosso alvo. Buscando as pressuposições do
autor, não entraremos em choque com ele. Encontrar as pressuposições do escritor
pode ser a chave para não introduzir nossas idéias no texto. Cristo é o princípio de
unidade e da verdade na interpretação da Bíblia.
■ ESTRUTURALISMO
Metodologia científica aplicável ao estudo do texto literário a partir de princípios
universais que governam o uso da linguagem, isto é, a partir de todos os elementos
que o constituem e que estão relacionados entre si por um sistema único, de
significação a que se chama estrutura.23 Segundo Roland Barthes, trata-se de uma
“atividade” que tem um fim específico: “O fim de toda a atividade estruturalista, seja
ela reflexiva ou poética é de reconstituir um ‘objeto’, de maneira a manifestar nesta
reconstituição as regras do funcionamento (as ‘funções’) deste objeto.” 24
O estruturalismo não é uma corrente exclusiva dos estudos literários: podemos
encontrá-lo na psicologia, na sociologia, na antropologia, na filosofia, na psicanálise
e na lingüística. Na psicologia, a noção de estrutura (Gestalt) aparece no princípio do
século XX e Jean Piaget publica em 1968 um livro fundamental nesta área Le
Struturalisme; na sociologia, Talcott Parsons, em Structure and Process in Modern
Sciences (1960), apresenta-nos uma visão ontológica da estrutura social; na
antropologia social, a primeira referência é Lévi-Strauss, cuja Antropologia
Estrutural (1958) há de ser decisiva para o nascimento da teoria estruturalista na
literatura; na filosofia, Louis Althusser tentou uma interpretação estrutural da obra de
22
Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, pp 109-122.
23
Carlos Ceia, ESTRUTURALISMO, E-Dicionário de Termos Literários, coord. de Carlos Ceia,
ISBN: 989-20-0088-9, <http://www.fcsh.unl.pt/edtl> (23 de abril de 2009).
24
“A Atividade Estruturalista”, in O Método Estruturalista, de Luc de Heush et al., Rio de
Janeiro, 1967, p.58.
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A pluralidade de sentidos que a obra literária faz nascer é uma prova do seu
caráter aberto. A ambigüidade é fundamental para a construção da definição de
literariedade, porque, ao contrário da linguagem comum que reduz a polissemia ao
contexto em que ocorre, a linguagem literária que não nos remete para nenhuma
situação, empurra para o leitor a responsabilidade total da decodificação do sentido.
Assim nasceram algumas das mais divulgadas leituras estruturalistas: as da literatura
fantástica (Todorov), as da literatura tradicional (Greimas), as da poesia anglo-
saxônica (Jakobson) e as de narrativas bíblicas (Barthes).
Quer Barthes em Critique et verité quer Todorov em “Poétique” (in Qu’est-ce
que le structuralism?) procuraram emprestar à teoria da literatura uma forte
componente lingüística, sob a forma de uma poética, ou um grande sistema
metaliterário, que, em última análise, define o que foi o estruturalismo literário.
Todorov, por exemplo em Grammaire du Décaméron (1969), tenta fixar as leis de
uma gramática geral dos elementos que formam a narrativa, apresentando a poética
como ciência da literatura, que inclui formulações do tipo: categorias gramaticais
(agente ou nome próprio, adjetivos, funções sintáticas, etc.), aspecto verbal, sintaxe
narrativa, etc. Sobre a relação personagem/narração, e seguindo muito de perto as
propostas de Pouillon (Temps et roman, 1946), Todorov descreve as perspectivas
possíveis: a visão com (quando o narrador sabe tanto quanto a personagem), a visão
por detrás (quando o narrador sabe mais do que a personagem) e uma visão de fora
(quando o narrador sabe menos - finge saber menos, é mais carreto - do que qualquer
das personagens).
As personagens da narrativa também são objeto de estudos sistemáticos. Um dos
mais populares é aquele que o lituano A. J. Greimas apresentou, a partir dos modelos
de Propp e de Sourieu (Les 200 000 situations dramatiques, 1950). O
desenvolvimento da ciência da narratologia deve muito ao empenhamento dos
teóricos estruturalistas, em particular Greimas, Genette, Barthes e Todorov, que, no
geral, acreditavam que todas as narrativas possuem estruturas comuns, condição
necessária para a fundação de qualquer teoria da narrativa. Genette, que reclamava
ser o estruturalismo mais do que uma metodologia, para ser uma verdadeira
ideologia, no seu Discours narratif (1972), apresenta uma muito divulgada
sistematização de alguns conceitos narratológicos, por exemplo, a distinção na
narrativa entre (1) récit, a ordem dos acontecimentos do texto, (2) histoire, a
seqüência na qual esses acontecimentos ocorreram “realmente”, como podemos
deduzir do próprio texto e (3) narration, o próprio ato de narrar.
As duas primeiras categorias equivalem à distinção clássica dos formalistas entre
“trama” e “história”. Genette também teorizou sobre a perspectiva narrativa,
apresentando um modelo também muito divulgado: o narrador – seguindo o modelo
de Pouillon/Todorov – pode saber mais do que as personagens, menos do que elas, ou
estar no mesmo nível; a narração pode ser também focalizada de formas diferentes:
“não localizada”, feita por um narrador onisciente, exterior à ação, ou “focalizada
internamente”, feita por uma personagem de uma posição fixa, de várias posições, ou
do ponto de vista de várias personagens. Genette utiliza o termo focalização para
33
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25
(Teoria da Literatura – Uma Introdução, Martins Fontes, São Paulo, 1994, pp. 113 e 116).
35
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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■ Anacronia: Hermenêutica
Anacronia - Termo grego que provém de ana- contra e chronos
– tempo.26 Refere-se às alterações entre a ordem dos eventos da
história e a ordem em que são apresentados no discurso. Assim, o
narrador pode antecipar acontecimentos ou informações
(prolepse) ou recuar no tempo (analepse). O uso de anacronias
pode ter vários motivos, como por exemplo a caracterização
retrospectiva de personagens, a reintegração de acontecimentos que não foram
focados no devido tempo ou manter a expectativa do leitor ao fornecer informações
antecipadas.
Quando nos referimos a anacronias, devemos ter em conta a sua amplitude
(dimensão da história coberta pela anacronia) e alcance (distância no tempo a que se
projeta a anacronia - horas, meses, séculos).
As anacronias podem ser externas se a sua amplitude começa e acaba antes do
início da diegese da narrativa primária (narrativa a partir da qual as anacronias se
definem como tal); internas se a amplitude começa depois do início da diegese da
narrativa primária; mistas se a amplitude começa antes do início da diegese da
narrativa primária e termina depois dele. As anacronias internas podem ser
heterodiegéticas quando se referem a uma personagem ou acontecimento que não
figura na narrativa primária, ou homodiegética quando figura.
Exemplo de uma obra que contém anacronias é A Sibila (1954) de Agustina
Bessa Luís. A narração começa depois da morte de Quina e há um recuo no tempo
para contar a sua história, que está repleta de avanços e recuos na ordem dos eventos
da história.
26
Vanda Rosa, ANACRONIA, E-Dicionário de Termos Literários, coord. de Carlos Ceia, ISBN:
989-20-0088-9, <http://www.fcsh.unl.pt/edtl> (23 de abril de 2009).
27
Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, pp 149-170.
36
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
Dr. Nelson Célio de Mesquita Rocha
Parece, portanto, tarefa iniludível de uma reflexão hermenêutica que queira ser
válida para a maioria das pessoas criar uma metodologia de leitura bíblica capaz de
encontrar na Escritura não só a inspiração para uma ação política libertadora, quando
necessária, mas, para além dessa finalidade, limitada teoricamente a um período de
transição, estabelecer a pobreza como chave definitiva de leitura: uma pobreza
entendida como dom de Deus, cultivada voluntariamente e não produto de opressão;
oposta ao consumismo e ponto de partida de liberdade interior, de vontade de
compartilhar os bens da terra, de respeito pelo universo.
O contexto do texto
Em primeiro lugar, deve-se considerar o contexto do próprio texto. Nenhum
texto cai do céu, nem mesmo o texto bíblico. Embora seja inspirado, tenha valor
absolutamente especial para quem crê, surge, mesmo assim, num determinado
ambiente social, político, econômico, cultural e religioso. Assim entendido, pode-se
admitir que também, no caso das Sagradas Escrituras, estamos diante de um texto que
se não de todo, ao menos em grande parte é um produto social. A literatura
introdutória, em grande parte, ajuda a tomarmos consciência desse contexto. Ela nos
proporciona a oportunidade de entrarmos em contato, tanto quanto isso é possível,
com as realidades concretas dos tempos bíblicos.
Compreende-se, assim, inclusive a importância de certas obras que
aparentemente não passariam de curiosidade. É caso de um artigo sobre a técnica
agrícola no plantio de trigo nos tempos bíblicos.
Essa pesquisa, que o autor apresenta nesse breve artigo, constitui-se numa chave
para a compreensão da parábola do semeador (Mc 4,3-9 par.), que até então mais
parecia um enigma do que uma parábola, levando as pessoas a lerem com mais
interesse, não a parábola propriamente dita, mas a alegoria dos terrenos que segue
(Mc 4,13-20).
Este foi apenas um exemplo bem individualizado. Na verdade, existe atualmente
uma literatura muito ampla sobre todos os aspectos da realidade dos tempos bíblicos.
Isso nos permite ter um conhecimento bastante seguro dos processos sociais,
políticos, econômicos e culturais das diversas épocas da história bíblica. O seja, é
possível identificar o chão em que o texto bíblico brotou.
28
Cf. CORETH, E. Cuestiones fundamentales de hermenéutica. Barcelona: Herder, 1972,
especialmente o capítulo IV: El horzonte de la Intelección, p. 95-106.
29
RABUSKE, I. J. Teocomunicação, Porto Alegre, v. 37, n. 156, p. 249-258, jun. 2007.
37
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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O contexto do leitor
Toda essa atenção em relação ao contexto bíblico, contudo, não basta por si só.
No mínimo torna-se necessário considerar ainda o contexto de quem está lendo a
Bíblia. É o contexto do leitor, de quem atualmente está interrogando o texto bíblico e
seu contexto.
Assim como é fundamental o conhecimento do contexto bíblico, é também
indispensável que o leitor tenha consciência do contexto atual, também em suas
dimensões sociais, políticas, econômicas e culturais.
Não se trata, contudo, de simplesmente armazenar informações sobre a
atualidade. A informação precisa ser trabalhada com um adequado instrumental de
análise. Sem isso, corre-se o perigo de proceder a uma leitura inadequada ou
inclusive ingênua da realidade.
Conseqüentemente, as perguntas que, a partir do contexto atual, forem dirigidas
ao texto bíblico, correrão também o risco de serem irrelevantes, impertinentes ou
ingênuas. Logo, torna-se necessário adquirir um mínimo de instrumentos críticos de
análise da realidade atual.
Desse modo, poderá ocorrer um diálogo frutífero entre o contexto do leitor ou do
grupo de leitores, e o contexto bíblico. O resultado poderá ser que, examinando
determinado texto, surjam ou se realcem aspectos até então completamente ignorados
ou julgados sem importância alguma.
A análise de conjuntura pode tornar-nos sensíveis aos fenômenos de exclusão e
marginalização, bem como de dominação e opressão. O texto não é univocamente
parcial ou imparcial, sendo por isso importante que, a partir da compreensão do
contexto atual, se possam dirigir perguntas adequadas ao texto.
Tais perguntas poderão colaborar na identificação de aspectos que, numa leitura
superficial, poderiam permanecer inexpressivos, ou mesmo poderiam inclusive passar
despercebidos.
E é extremamente importante que, na leitura, possa emergir também a voz dos
subjugados pelo sistema sóciopolítico da época. Para isso, é decisiva a consciência
que o intérprete tem do seu lugar social, ou do lugar social, a partir do qual aborda o
texto.
Quanto à produção literária, a rigor só existem dois contextos possíveis para o
surgimento de um texto: o das classes dominantes e o das classes subalternas. Há
textos bíblicos que têm seu lugar vivencial nas classes menos privilegiadas, até
mesmo nas marginalizadas e excluídas.
Há outros, cuja origem está nas classes dirigentes. Há textos, ainda, que, no
processo de transmissão, sofreram influência de um e de outro ambiente. Assim
sendo, toda a atenção é necessária, para que se possa descobrir com mais rigor
possível, qual a origem social do texto.
É possível inclusive identificar características da literatura produzida em cada
um desses contextos.
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7. O Sitz im Leben
■ “Sitz im Leben” é uma expressão alemã, geralmente traduzida por setting in life
ou situação na vida. De forma simples, pode-se dizer que ela descreve para que
ocasiões certas passagens bíblicas foram escritas, uma questão ligada aos “gêneros
literários” – a Sitz im Leben que um gênero literário tem na comunidade e a Sitz
im Leben que essa comunidade tem na história.
■ O Texto
está
situado
dentro de
uma
■ O
história
Universo
do
Texto Texto
■ O Texto
situado em
seu
Contexto
30
Cf. SIMIAN-YOFRE, Horácio (Org.). Metodologia do Antigo Testamento, p 102 ss.
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8. Estrutura da Exegese
Novos rumos na pesquisa bíblica 31
31
ZABATIERO, Júlio Paulo Tavares. Novos rumos na pesquisa bíblica. Dr. Júlio P. T. Zabatiero
é professor de Antigo Testamento na Escola Superior de Teologia (EST). em São Leopoldo, RS.
Este artigo oferece uma visão panorâmica dos fundamentos teóricos e epistemológicos da pesquisa
bíblica nos períodos chamados de Modernidade e Pós-Modernidade. Estuda as relações da pesquisa
bíblica com a filosofia do sujeito e com a razão instrumental, características de boa parte do
pensamento moderno, descrevendo sinteticamente sua crise paradigmática no presente. Oferece, por
fim, a partir das novas possibilidades abertas pela leitura feminista e pela leitura popular da Bíblia, a
descrição de um possível novo paradigma para a pesquisa bíblica, centrado nos textos e na ação
humana, a partir da incorporação das novas possibilidades epistêmicas contemporâneas. A intenção
do artigo é contribuir para o diálogo teórico em curso no campo da pesquisa bíblica atual.
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interpretação bíblica, que entende a leitora da Bíblia como uma pessoa ‘pública’,
‘transformadora’, ‘ligada’, ou ‘integrada’, capaz de comunicar-se com diferentes
públicos e de buscar transformações pessoais, sociais e religiosas com vistas à justiça
e ao bem-estar”.
Os novos modelos de leitura bíblica, porém, mantiveram-se dentro dos limites
do paradigma da consciência em sua compreensão do sentido textual. Ou seja, não
modificaram radicalmente a concepção sujeito-objeto, nem a dependência do sentido
para com a intenção autoral e a referencialidade extratextual. Neste aspecto, pode-se
dizer que solucionaram apenas parcialmente a crise paradigmática da Modernidade.
Além desses, os dois modelos históricos continuam sendo praticados em
ambientes teológicos. Apesar das distinções radicais, ambos mantêm em comum: a
concepção de sentido (significado = intenção + referente) e texto (documento
histórico); a tarefa de descobrir o sentido verdadeiro do texto em seu próprio
contexto; a distinção entre exegese e hermenêutica, na qual esta depende daquela; a
concepção de história, centrada na descrição dos fatos “como verdadeiramente
ocorreram”; a filologia como guia para a análise semântica do texto.
Os novos modelos, ainda dentro do paradigma do sujeito, permanecem
tributários da exegese histórico-crítica: a) partilham do mesmo espírito crítico do
modelo histórico-crítico, centrado na razão instrumental, embora com um interesse
emancipatório claramente acentuado em distinção ao interesse científico do modelo
histórico; b) baseiam sua interpretação do texto em resultados da exegese histórico-
crítica. Diferem dos modelos históricos em: conceber a história (ciência) como crítica
(não descrição) da história (factual), a partir dos novos sujeitos da leitura; subordinar
a exegese à hermenêutica – a verdade buscada não é a do sentido do texto então, mas
a transformação social no presente.
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EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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referente, leitor/a. A pesquisa do sentido será vista como um diálogo entre discursos,
mediado pelo intérprete = co-enunciador.
Nesse sentido, esta nova proposta se insere no fluxo histórico aberto pelas
leituras feminista e popular da Bíblia, encontrando nelas suas parceiras privilegiadas
(não únicas) de diálogo.
O foco da exegese passa a recair sobre as múltiplas relações do processo de
significação, não mais sobre o texto à luz da intenção e do referente. De acordo com
Knierim, A principal tarefa da exegese será, portanto:
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■ Uma das aporias da teologia bíblica recente é o seu status perante a religião
de Israel. Albertz, por exemplo, afirma a história da religião como disciplina
viável, no lugar da teologia bíblica. Schmidt escreve sua Fé do Antigo
Testamento como um meio-termo entre teologia do AT e história da religião
de Israel. Na leitura discursiva, a religião praticada é o significante da
teologia, que é o significado da religião. Não há oposição, mas
complementaridade – uma não existe sem a outra. Religião vivida é religião
significada, ou, na linguagem de Foucault, uma prática discursiva. A teologia
bíblica passa, então, a priorizar os processos de construção de significado da
fé vivida e as formas como esses significados se relacionam entre si na
Escritura. Rolf Knierim é um dos autores que já têm proposto, no âmbito do
paradigma histórico-crítico, este tipo de metodologia para a teologia bíblica.
Duas obras recentes, no campo da Teologia do Antigo Testamento, por
exemplo, tentam lidar com as novas possibilidades pós-paradigma do sujeito
– as teologias de W. Brueggemann e E. Gerstenberger.
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restrita aos textos canônicos, nem aos textos do povo de Deus) – inclui as
questões da história das tradições e dos processos de leitura intrabíblica.
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32
Cf. as referências utilizadas por ZABATIERO: FIORENZA, Elisabeth S. Rhetoric and Ethic:
The Politics of Biblical Studies. Minneapolis: Fortress Press, 1999. ______. Sharing her Word:
Feminist Biblical Interpretation in Context. Boston: Beacon Press, 1998. ______. Wisdom Ways:
Introducing Feminist Biblical Interpretation. Maryknoll: Orbis Books, 2001. FOUCAULT, M. As
palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo: Martins Fontes, 1981.
______. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996. ______. O que são as luzes? In: MOTTA,
M. B. da (Org.). Arqueologia das ciências e história dos sistemas de pensamento. Rio de
47
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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EXEMPLOS:
Introdução
O futuro sempre foi objeto de preocupações das pessoas de todas as épocas e
lugares.
Desde a mais remota antiguidade, sempre tem havido um fascínio pelas coisas
relacionadas ao futuro.
Atualmente a humanidade está preocupada com o futuro.
Surgem indagações: “Como será o nosso mundo daqui a cinco anos ou dez?”
“Que mundo nossos filhos e netos estarão vivendo?”
Janeiro: Forense Universitária, [s.d.]. p. 335-351. GREIMAS, Algirdas Julien. Da imperfeição. São
Paulo: Hacker Editores, 2002. ______. On Meaning: Selected Writings in Semiotic Theory.
Minneapolis: Univ. of Minnesota Press, 1987. ______; COURTÉS, Joseph (Ed.). Sémiotique:
Dictionnaire raisonné de la théorie du langage. Paris: Hachette, 1986. Tome 2. ______; COURTÉS.
Joseph. Dicionário de semiótica. São Paulo: Cultrix, 1989. ______; FONTANILLE, Jacques.
Semiótica das paixões. São Paulo: Ática, 1993. FUNARI, Pedro P. Lingüística e Arqueologia.
DELTA Revista de Estudos de Lingüística Teórica e Aplicada, São Paulo, v. 15, n. 1, p. 161-
176, 1999. HABERMAS, Jürgen. El discurso filosófico de la modernidad. Madrid: Taurus, 1989.
______. Concepções da Modernidade: um olhar retrospectivo sobre duas tradições. In:
HABERMAS, J. A constelação pós-nacional: ensaios políticos. São Paulo: Littera Mundi, 2001. p.
167-198. ______. O que é a pragmática universal? In: HABERMAS, J. Racionalidade e
comunicação. Lisboa: Edições 70, 2002. p. 9-102. ______. Para uma crítica da teoria do
significado. In: HABERMAS, J. Racionalidade e comunicação. Lisboa: Edições 70, 2002. p.149-
182. MESTERS, C. Por trás das palavras: um estudo sobre a porta de entrada no mundo da Bíblia.
Petrópolis: Vozes, 1974. v. 1. KNIERIM, Rolf. A interpretação do Antigo Testamento. São
Bernardo do Campo: Editeo, 1990. p. 10s. KNIERIM, R. Criticism of Literary Features, Form,
Tradition, and Redaction. In: KNIGHT, D. A.; TUCKER, G. M. (Ed.). The Hebrew Bible and its
Modern Interpreters. Philadelphia: Fortress Press, 1985. p. 123-166. 33 Novos rumos na pesquisa
bíblica. ______. A interpretação do Antigo Testamento. São Bernardo do Campo: Editeo, 1990.
OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Reviravolta lingüístico-pragmática na filosofia
contemporânea. São Paulo: Loyola. 1996. PIXLEY, J. Toward a Militant Biblical Scholarship.
Biblical Interpretation, Leiden, IV/1, p. 72-75, 1996. RENDTORFF, R. The Paradigm is
Changing: Hopes and Fears. Biblical Interpretation, Leiden, I/1, p. 34-53, 1993. RORTY,
Richard. A filosofia e o espelho da natureza. Lisboa: Dom Quixote, 1988. RÜSEN, J. Razão
histórica: teoria da história: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: Editora UnB, 2001.
SANTOS, M. A natureza do espaço. Rio de Janeiro: Hucitec, 1997. SEGOVIA, F. F.
Decolonizing Biblical Studies: A View from the Margins. Maryknoll: Orbis Books, 2000.
SEGOVIA, F. F.; TOLBERT, M. A. (Ed.). Teaching the Bible: The Discourses and Politics of
Biblical Pedagogy. Maryknoll: Orbis Books, 1998. THISELTON, A. C. New Horizons in
Hermeneutics: The Theory and Practice of Transforming Biblical Reading. Grand Rapids:
Zondervan, 1992.
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EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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Explicação do Texto
Ao lermos a Palavra de Deus, descobrimos que há esperança para o nosso futuro.
Jeremias foi um profeta que viveu em dois períodos distintos da história de Judá,
cortados pelo ano de 609 a.C., data da morte do rei Josias. Os anos que antecedem a
este acontecimento estão marcados pelo sinal de otimismo: independência política e
prosperidade, bem como a reforma religiosa.
Os anos que se seguem constituem período de rápido declínio. Judá se verá
dominado, primeiro pelo Egito, depois pela Babilônia.
As tensões internas e as lutas de partidos vão acompanhadas pelas injustiças
sociais e por nova corrupção religiosa. O povo vai caminhando rumo ao seu fim. No
ano 586 Jerusalém cai em poder dos babilônios e o reino de Judá desaparece
definitivamente da história.
Jeremias viveu esses momentos fortes, junto ao povo de Deus. Sua pregação era
um convite ao arrependimento e a uma volta para Deus. Mas o povo continuava
inveterado na prática do mal e depois de todo empenho, Jeremias viu o povo de Deus
sendo arrastado como gado para o cativeiro da Babilônia.
Lá aquele povo sofreu humilhações atrozes, muitos perderam a fé, a motivação
para viver e até a esperança. A prova disto está retratada no Salmo 137.
É numa conjuntura adversa que se ouve a voz calorosa do servo de Deus
alentando a alma daqueles judeus aflitos, apresentando-lhes uma mensagem de ânimo
e restauração das forças: HÁ ESPERANÇA PARA O TEU FUTURO.
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EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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CONCLUSÃO
Hoje, para quem está em Cristo Jesus não pode temer o futuro. Em Cristo somos
perdoados por Deus e acolhidos na força do seu Espírito. Jesus é a concretização da
esperança que tanto aguardavam os crentes do Antigo Testamento.
■ SUMÁRIO
I. INTRODUÇÃO 03
04
II. LEITURA SINCRÔNICA 04
1. Preparação do Texto 07
2. Análise Lingüístico-Semântica 12
3. Estrutura Literária
III. LEITURA DIACRÔNICA 14
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Substantivos
PAL. TEXTO RAIZ TRADUÇÃO DA RAIZ
αγρω ajgrovvς campo, terreno; aparece 36 x no
N.T.
ανθρωπος ====. ανθρωπος homem; ser humano.
αυτοις aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593
αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593
αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593
αυτου aujtovς ele(a); mesmo(a) 5593
βασιλεια basileuvς rei 115
δενδρον . δενδρον árvore 25
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EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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Adjetivos
Αλλην alloς outro/a (155)
µειζον mevgaς grande 194
µικροτερον mikrovς pequeno(a), adv um pouco 46
ο oJ, hJ, tov o/a
Οµοια omoioς semelhante
ον Jovς o(a) qual; que 1.409
παντων pa^ς todo(a); cada
πετεινα (aves) peteinovn pássaro, passarinho, ave
Verbos
αυξηθη aujxavnw eu cresço; eu aumento 22
ελθειν jevrcomai eu vou; venho 632
εσπειρεν speivrw eu semeio 52
εστιν eijmiv eu sou 2.462
γινεται givnomai eu me torno, venho a ser 665
κατασκηνουν kataskhnovw viver, morar, aninhar-se
λαβων lambavnw eu tomo, recebo 257
λεγων levgw eu digo, eu falo
παρεθηκεν parativqhmi eu preparo; coloco diante de
Classes variadas
δε . δε conj. enc. Mas, porém, no entanto; e, também,
398.
εν . εν dat em; entre; dentro de, no meio de; com; por
η jovς o(a) qual; que 1.409
και . και conj e; mas; a saber; adv também; a ponto de
µεν . µεν part correl muitas vezes sem tradução
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EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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■ LEGENDA
■ u Substantivo
■ u Adjetivo
■ u Verbo
■ u Variadas Classes
Estrutura Literária
A força da parábola está no contraste estabelecido pela figura da semente e da
árvore. É interessante observar que o texto não apresenta um estágio intermediário,
isto é, não descreve o desenvolvimento da semente até se tornar árvore, alias isso
pouco importa na mente oriental. O mais importante para ele (o leitor oriental) é ver
de um lado a “sementinha” morta e do outro lado o “esplendor” da árvore viva que
acolhe. Baseado nisso, podemos traçar o seguinte gráfico:
É o caminho entre os dois extremos (morte e vida) é efetuado por Deus. São dois
estágios naturais e inevitáveis, ou seja, uma semente de mostarda lançada na terra se
tornará uma árvore. De igual modo Deus pode tornar a morte em vida. Uma outra
aplicação a ser feita é que aquilo que aparentemente era inexpressivo - o movimento
e ministério de Jesus - se tornaria em algo grandioso que abrigaria a muitos, ainda
que tivesse que primeiro passar pela morte.
Forma
Muito tem se discutido sobre a forma da parábola, discussões estas que indagam
se uma parábola possui em sua mensagem somente um centro ou foco, e se os
detalhes são relevantes para a mensagem. Jesus, ao interpretar as parábolas do
Semeador e do Joio e Trigo (Mt 13), mostrou-nos a importância tanto do centro como
dos detalhes. Deste modo, se pudermos extrair quaisquer interferências na
interpretação das parábolas, a relação feita entre o foco/centro e os detalhes do
texto, a possibilidade de aproximar da idéia original da mensagem será bem mais útil.
Com isso segue-se a seguinte proposta de estruturação de parábola do grão de
mostarda em Mateus:
55
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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Sitz im Leben
Podemos fazer esta análise a partir de dois pontos de vista:
Mensagem
Deus estava fazendo grande coisa na terra por meio de Jesus. A mensagem de
Jesus estava reunindo um grupo de pessoas marginalizadas que seriam a comunidade
idealizada por Deus para promover a justiça e acolher os injustiçados das diversas
partes do mundo. O milagre da transformação já estava ocorrendo, isto é, aqueles
insignificantes e exclusos eram arrebanhados e fortalecidos. Aquilo que parecia estar
morto começa a dar sinais de vida; aquela pequena semente já apodrecida começava a
germinar para se tornar grande e indispensável na tarefa de abrigar a muitos.
Por trás de tudo isso está a ação de Deus. É ele que transforma a morte em vida, o
fraco em forte, o pequeno em grande. Um reflexo dessa idéia da ação de Deus se
evidencia no apóstolo Paulo que diz aos coríntios: “Deus escolheu as cousas loucas
56
EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
Dr. Nelson Célio de Mesquita Rocha
Encontramos neste bloco textual (Mt 13.31,32) um relato que diz respeito ao
Reino de Deus. Mas não é só isto. O texto possui o antes e o depois, possui também
uma relação teológica com seu contexto bem como com toda a Escritura. O presente
trabalho tem por fim mostrar a relação da perícope em epígrafe com seu contexto,
seja ele próximo, remoto ou com a Bíblia.
A) Contexto Próximo
Trataremos aqui da relação do texto de Mateus 13.31,32 com seu meio mais
próximo, mostrando que ele está totalmente amarrado aos seus vizinhos.
Perícope Anterior
A partir do assunto, podemos ver que há uma relação muito grande entre os
textos. Compreendendo o bloco dos vv. 24-30, esta perícope é conhecida como a
“parábola do joio”. A primeira relação está no fato de que ambas são “parábolas” -
grego “ παραβολη∗ν ” - uma figura de linguagem encontrada na boca de Jesus.
Grosseiramente falando, “é uma narração alegórica que encerra uma doutrina
moral” [1]. Esta, por sua vez, tem como figuras ilustrativas o “joio” - grego “
ζιζα&νια ” - e o “trigo” - grego “ σι∼τον ” - e aquela diz respeito ao “grão de
mostarda” - grego “ κο&κκω/ σινα&πεω" ” - é notório a qualquer pessoa o fato de
que ambas as ilustrações parabólicas são relacionadas à agricultura, ao produto da
terra, apontando inclusive, para o fato de que o contexto era o mesmo.
Também o tema é o mesmo “Reino dos céus” - grego
“βασιλει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” -. Na parábola do joio o tema aparece no primeiro
versículo (v. 24) da perícope, semelhantemente à do grão de mostarda (v. 31).
Percebe-se que se trata do mesmo tema entendendo assim o forte relacionamento
entre os dois textos.
Do ponto de vista gramatical, os dois textos começam com a mesma oração:
“Outra parábola lhes propôs dizendo: o reino dos céus é semelhante…” - grego “
Αλλην παραβολη∗ν παρε&θηκεν αυ∗τοι∀ λε&γων: δοµοι&α ε∗στι∗ν ν& βασι
λει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” - , evidenciando o mesmo tempo verbal e pessoa que
passa a nortear o texto.
Do ponto de vista da aplicação, também há uma relação entre as parábolas, a do
“joio e do trigo” tratam dos problemas na implantação do reino, sugere a pergunta:
“Por que tantos conflitos?” [2], já na seqüente parábola, a do “grão de mostarda”, a
sugestão é: “Será que tudo falhou? Não, é grande a luta.” [3], uma mensagem de
apoio e incentivo àqueles que lutam pela implantação do referido reino.
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EXEGESE DO ANTIGO TESTAMENTO
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Perícope Posterior
Semelhantemente à perícope anterior (vv. 24-30) a posterior possui um grande
grau de proximidade com a perícope analisada.
Formada unicamente pelo v. 33, a, chamada, parábola do “fermento” apresenta
de igual modo a anterior uma forte relação com a parábola do grão de mostarda.
A começar pelo fato de que também o v. 33 diz respeito a uma parábola - grego
“παραβολη∗ν ” - como no caso anterior.
Se, diferentemente dos casos anteriores, a parábola do “fermento” - grego “
ζυ&µν/ ” - não trata ilustrativamente de derivados agrícolas (Joio e trigo, grão de
mostarda), semelhantemente fala de algo que era do dia a dia da comunidade, “grão
de mostarda” - “κο&κκω/ σινα&πεω" ” - e fermento eram extremamente comum
até mesmo aos mais indoutos. Conclui-se portanto que os assuntos eram comuns.
Do ponto de vista do tema, não há nada de novo, igualmente ao caso anterior,
também a parábola do fermento fala do “reino dos céus” -
“βασιλει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” - (v. 33, segundo hemistíquio).
A observar pelo lado gramatical e da redação, também o narrador joga o discurso
para a mesma pessoa (Jesus v. 1) e este se dirige ao mesmo auditório: grão de
mostarda (v. 31 a): “Outra parábola lhes propôs dizendo…” -
Αλλην παραβολη∗ν παρε&θηκεν αυ∗τοι⎯∀ λε&γων: - fermento (v. 33 a):
“Disse-lhes outra parábola…”. - Αλλην παραβολη∗ν ε∗λα&λησεν αυ∗τοι⎯": -
Observe que o redator final do texto não tem a mínima preocupação em relevar o
destinatário do presente discurso devido sua confiança de que não há dúvidas de
sobre quem se refere, é como se os textos tivessem uma vida própria mas ao mesmo
tempo amarrados ainda ao início do discurso (v. 10). A partir deste fato, percebe-se
que, além das pessoas serem as mesmas, também o tempo verbal das parábolas são
iguais.
Quanto a aplicação, há também uma forte relação entre as duas parábolas. Se na
parábola do grão de mostarda há uma forte evidência de mostrar o crescimento do
reino (as aves do céu que vem aninhar-se), na parábola do fermento também há o
sentido do poder transformador do reino e de que o fermento faz tomar novos rumos
a massa, rumo de crescimento.
Não há dúvidas, as duas perícopes estão de mãos dadas e formam uma seqüência
muito importante dentro do propósito do Evangelho da implantação do reino.
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Apêndice
Observe a relação da perícope da parábola do grão de mostarda com seu contexto:
Capítulo
Mateus “agrupa aqui as 7 parábolas referentes ao reino dos céus” [4]. Parábola
significava “lançar duas coisas semelhantes uma da outra; colocar uma coisa do lado
da outra para estabelecer a semelhança ou distinção … seu objetivo era fixar as
verdades nas mentes dos ouvintes” [5]. Como vimos, Jesus tinha um propósito todo
pedagógico no uso das parábolas e Mateus as agrupa no capítulo 13 onde a parábola
estudada exegeticamente se encontra. Observe o quadro:
Versíc. Parábola
01-23 Parábola do semeador
24-30 Parábola do joio e do trigo
31-32, 36- Parábola da mostarda
43
33 Parábola do fermento
44 Parábola do tesouro
45-46 Parábola da pérola
47-50 Parábola da rede
Podemos ver que o texto estudado tem uma relação muito forte com o restante
do capítulo.
Abre-nos espaço até mesmo para compreendermos aqui estrutura uma quiástica:
Observe o exemplo:
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Livro
Mateus “registra de maneira explícita o ensino de Jesus quanto a ensinar por
parábolas… …explicando até porque Ele fala por parábolas” [6] (Mt 13.34-35). É
explicito a força do Evangelho nesta área e a perícope da exegese expressa sua
relação com o restante do livro em ser uma parábola.
Quanto ao tema - “Reino dos céus” “ βασιλει&α τω⎯ν ου∗ρανω⎯ν ” - da
perícope, segundo um programa de computador com uma Chave Bíblica que
correlaciona palavras, só no Evangelho é encontrado em 27 versículos tal expressão.
Hei-los:
Mateus 3.2; 4.17; 5.3, 10, 19; 7.21; 8.11; 10.7; 11.11; 13.11, 24, 31, 33, 44, 47,
52; 16.19; 18.1, 3, 23; 19.12, 14, 23; 20.1; 22.2; 23.13; e 25.1.
Sem dúvidas, o texto de Mateus 13.31,32 segue a finca o assunto predominante
no Evangelho.
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em epígrafe, para Storniolo não era reivindicação somente do texto nem também
somente do Evangelho de Mateus, mas de todo o ministério de Jesus Cristo.
Esta mesma perícope é também mencionada por Marcos 4.30-32 diferenciado
apenas por detalhes como: este não faz questão de especificar que um homem plantou
a semente, e usa a expressão Reino de Deus ao invés de Reino dos céus, a introdução
é feita por uma pergunta de Jesus. E também por Lucas: 13.18-19 que também usa a
expressão Reino de Deus, introduz pela pergunta de Jesus, e acrescenta que o plantio
é feito em uma horta. Apesar dos detalhes, a essência é a mesma nos 3 Evangelhos
Sinópticos.
“A frase “vem as aves do céu e se aninham nos seus ramos” (v. 32), se encontra
em diversos textos do Velho Testamento (Ez 17.23; 31.5; Sl 104.12; Dn 4.12,21). É
semelhante a Dn 4.21 na LXX. Estas referências fornecem a explicação da parábola:
Em Ez 17, a “árvore” é o novo Israel. Isto é o Reino dos Céus mencionado na
parábola. Mas, em Ez 31 e Dn 4, a árvore representa os impérios do mundo gentio
(Assíria e Babilônia) respectivamente. Desta maneira a parábola antecipa o
desenvolvimento da igreja…” [8]. Possivelmente tais textos foram usados como pano
de fundo para parábola confirmando assim sua relação com outras partes das
Escrituras.
Para quem escreve Mateus? Como seria essa comunidade? Qual a relação do
texto com a comunidade? São as perguntas levantadas e que nem sempre podem ser
respondidas com precisão. Scheweitzer admite a Palestina ou a Síria como local mais
provável para a comunidade mateana, apesar do Egito e Babilônia serem também
candidatos para essa comunidade, porém em escala menor de probabilidade.
Jerusalém é descartada pelo fato de que a língua grega não seria admitida, e muito
menos textos diferentes dos originais.
Pelo que nos parece, a comunidade de Mateus era afligida por carismáticos (uma
espécie de falsos profetas), por isso, se tornara uma comunidade preguiçosa e
cansada de esperar a vinda do Senhor (24.37-25.35). Havia algumas divisões na
comunidade.
Os mais fracos eram quase que desprezados (18.5-14). No entanto, essa
comunidade era missionária, e, talvez aí se encaixa melhor a mensagem da parábola
do grão de mostarda para a comunidade, que, mesmo insignificante, se torna uma
grande árvore capaz de abrigar os pássaros cansados.
VI. ATUALIZAÇÃO
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Ele provocou o maior impacto que o mundo conheceu. Os seguidores de Jesus eram
formados por um seleto grupo de pescadores rudes, a quem foi outorgado essa
mensagem do reino. De pessoas desacreditadas diante dos olhos humanos, surge o
Reino de Deus. O pequenino grão se transforma em grande árvore. A única
explicação plausível para o fato é o poder divino. Esta árvore então seria a Igreja
(muitos teólogos assim defendem), pois a mesma brotou da morte de sua semente, de
seu fundador; também tem a função magnífica de proporcionar alento e descanso aos
cansados e oprimidos.
A segunda questão é mais individual, pois a mensagem de Jesus se resume no
seguinte: “Quem não tomar a sua cruz e vier após mim não é digno de mim. Quem
acha a sua vida perdê-la-á; quem, todavia, perde a vida por minha causa, achá-la-á”
(Mt 10.38-39).
O reino de Deus é formado por indivíduos que acreditam nisso. Só podem fazer
parte do projeto de expansão do reino pessoas que carregam a própria cruz. A questão
da morte da semente pode estar teologicamente ligada com o fato de que, praticar o
reino é questão prioritária. Alguém que faz parte do reino o coloca em primeiro
plano. Sua própria vida é desvalorizada em favor do reino. Este é mais importante do
que a própria vida.
Quem faz parte do reino procura viver para dar alento às cansadas aves.
Interessante que a partir disso é que se pode enfim abrigá-las, pois necessitam
urgentemente de descanso. O próprio Paulo escreve referindo-se ao fato de que
depois de conhecer o valor do reino não procurava mais fazer a própria vontade, mas
sim a vontade de Deus, para expansão deste reino: “...Não sou mais eu quem vivo,
mas Cristo vive em mim...” (Gl 2.20). Isto figura bem o a questão do entregar-se
complemente de corpo e alma para o projeto de crescimento do Reino.
Embora paradoxais, as duas conotações representam o reino divino, partindo de
um interior individual para um alcance coletivo abrangente. As duas são enfáticas
quanto a transformação. Sem transformação não existe reino. A transformação não
parte do homem, é obra divina. A mensagem: de insignificante à relevante; o
indivíduo: de defunto a alguém com vida.
Nós cristãos contemporâneos é que precisamos acreditar mais no projeto divino
que transforma o pequeno no grande, o insignificante em relevante, o nada em tudo,
a morte em vida.
VII. CONCLUSÃO
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certo alento, pois nem sempre nos sentimos como árvores, prontos e dispostos para
oferecer abrigo, porque muitas vezes, somos como as aves do céu que necessitam
renovar suas forças para prosseguirem voando, e a mensagem cristã são os galhos nos
quais podemos descansar.33
CONCLUSÃO GERAL
33
Cf. a bibliografia utilizada: BÍBLIA SAGRADA. Ed. Revista e atualizada no Brasil. Trad. João
Ferreira de Almeida. Brasília-DF: CIA. Brasileira de Impressão e Propaganda, 1988. BÍBLIA VIDA
NOVA. Ed. Revista e atualizada no Brasil. Trad. João Ferreira de Almeida. 13a ed.São Paulo: Ed.
Vida Nova & Sociedade Bíblica do Brasil, 1990. BUENO, Silveira. Minidicionário da língua
portuguesa. 6a ed. Ed. Lisa S/A: São Paulo, 1992. CHAVE BÍBLICA. Brasília: Sociedade Bíblia do
Brasil, 1990. DAVIDSON, F. O novo comentário da Bíblia: Vol. I. Tradução de: The New Bible
Commentary, Trad. Dr. Russell P. Shedd (Título orig. em inglês). 9a ed. São Paulo: Ed. Vida
Nova, 1990. FEE & STUART, Gordon D. & Douglas. Entendes o que Lês? Um guia para
entender a Bíblia com o auxílio da exegese e da hermenêutica. São Paulo: Ed. Vida Nova, 1986.
FRIBERG, Barbara e Timothy, O Novo Testamento Grego Analítico. 1.a ed. São Paulo: Ed. Vida
Nova, 1987. GINGRECH, F.W./DANKER, F.W. Léxico do NT. Trad: Júlio P.T. Zabatiero. São
Paulo: Ed. Vida Nova, 1984. JEREMIAS, Joachim. As Parábolas de Jesus. Trad: João R. Costa,
7.a Edição, São Paulo: Ed. Paulus, 1976. KISTEMAKER, Simon J. As Parábolas de Jesus. Trad:
Eunice Pereira de Souza. São Paulo: Casa Ed. Presbiteriana, 1992. STORNIOLO, Ivo. O Evangelho
de Mateus: o caminho da justiça: série: Como Ler. São Paulo: 3a ed. Paulus, 1991. TASKER, R. V.
G. Mateus: introdução e comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo 1a ed. Vida Nova. 1980.
TRADUÇÃO ECUMÊNICA DA BÍBLIA: T.E.B. Trad. Ecumênica. 2a ed. São Paulo: Ed. Loyola, 1994.
VIRKLER, Henry A. Hermenêutica: Princípios e Processos de Interpretação Bíblica.
Miami,Flórida, E.U.A.: Ed. Vida Nova. 1987. ZUMSTEIN, Jean. Mateus o Teólogo. Coleção
Cadernos bíblicos. São Paulo: Ed. Paulinas, 1990. pp 57-76.
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