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PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO1

INTRODUÇÃO - O SISTEMA PORTUGUÊS DE DIREITO TRIBUTÁRIO

1. Direito Tributário substantivo e Direito Tributário adjectivo

O Direito Tributário substantivo tem por objecto o conjunto de normas jurídicas


respeitantes à criação normativa em matéria tributária e é caracterizado por um
conjunto de problemas de natureza marcadamente geral e abstracta (criação de
tributos, interpretação das normas tributárias, etc.).

Em contrapartida, o Direito Tributário adjectivo tem por objecto o conjunto de normas


jurídicas que têm por objectivo executar as normas tributárias substantivas (efectivar a
sua aplicação prática) e assegurar a tutela das pretensões jurídicas e valores
emergentes que resultam das referidas normas substantivas. As normas de Direito
adjectivo assumem, então, um papel instrumental face às outras. Portanto, podemos
dizer que o Direito Tributário adjectivo é composto pelo conjunto de normas jurídicas
que dizem respeito à aplicação normativa em matéria tributária e que, por
conseguinte, têm uma natureza marcadamente individual e concreta.

E quem são, então, as entidades que levam a cabo esta tarefa de aplicação normativa?
Quem são os actores do Direito Tributário adjectivo? São eles a Administração
tributária (entidade pública administrativa), os Tribunais Tributários (entidades
públicas jurisdicionais) e também entidades privadas (v.g., sujeitos passivos de
imposto).

Nota: Por tributo entendemos toda a prestação coactiva com finalidades financeiras.
Os tributos abrangem, então, os impostos, as taxas e as contribuições especiais – v.
art. 4º LGT. Quando nos referimos a “tributo”, estamos a abarcar todas estas
realidades, ao contrário do que acontece quando nos referimos apenas a “fiscal” (uma
vez que neste caso, apenas nos referimos aos impostos).

Assim, não é alheio a esta circunstância o facto de a nossa cadeira se designar

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As disposições legais referidas nesta sebenta estão de acordo com a 3ª Edição das “Licões de
Procedimento e Processo Tributário”, de Joaquim Freitas da Rocha. Não obstante, alerta-se para o facto
de que o Procedimento e Processo Tributário é uma realidade dinâmica, regularmente sujeita a
alterações legislativas.

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“Procedimento e Processo Tributário” e não “Procedimento e Processo Fiscal”, ou
falarmos em “Tribunais Tributários” e não em “Tribunais Fiscais” – estas realidades
dizem, pois, respeito a todos os tributos, e não apenas aos impostos.

2. O conteúdo do Direito Tributário adjectivo

Vimos que o Direito Tributário adjectivo tem por referência a aplicação de normas
tributárias aos casos em concreto, e que tal aplicação terá como principais actores a
Administração tributária, os Tribunais tributários e os sujeitos privados.

O Direito Tributário adjectivo apresenta, consequentemente, um conteúdo tripartido,


baseado nos diferentes actos praticados pelos seus actores:

I. Actos praticados por órgãos da Administração tributária  Actividade


Administrativa Tributária

Como exemplos destes actos podemos apontar a prática de inspecções tributárias, a


liquidação de certos impostos, o indeferimento de uma reclamação graciosa, a
autorização para o pagamento de uma dívida tributária em prestações, etc.

O conjunto dos actos levados a cabo pela Administração tributária e que procedem à
aplicação das normas tributárias ao caso concreto tem o nome de actividade
administrativa – e será desenvolvida no ponto 3 da Parte Introdutória.

II. Actos praticados pelo Tribunal tributário (maxime, o Juiz)  Jurisdição


Tributária

São exemplos deste grupo de actos a verificação da legalidade de um acto do Director


geral dos impostos, o conhecimento de uma impugnação judicial intentada pelo
contribuinte, a resolução de uma oposição à execução fiscal, etc.

A Jurisdição tributária compreende, então, o conjunto de actuações levadas a efeito


pelos órgãos jurisdicionais (Tribunais) em matéria tributária – e será desenvolvida no
ponto 4 da Parte Introdutória.

III. Actos praticados por sujeitos privados (privatização da actividade


administrativa).

São exemplos de actos praticados pelos sujeitos privados a entrega de declarações de


rendimentos, a auto-liquidação de imposto, a prestação de informações, a

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manutenção da contabilidade organizada, a cobrança de IRS ou IRC por retenção na
fonte, etc.

Verifica-se, cada vez com maior frequência, a atribuição de tarefas tributárias a


entidades privadas. É, pois, uma realidade dos nossos dias a chamada “privatização da
actividade tributária”.

3. A actividade administrativa tributária

A actividade tributária consiste na prática de actos por parte dos órgãos


administrativos tributários, numa aplicação das normas tributárias ao caso concreto.

Do ponto de vista jurídico, a Administração tributária deve ser perspectivada como um


verdadeiro sujeito de Direito, ao qual é reconhecida pelo legislador a titularidade de
determinadas situações jurídicas subjectivas merecedoras de tutela. Assim, a
Administração tributária, como titular de direitos e poderes subjectivos, tem, por
exemplo, o direito a exigir do contribuinte juros compensatórios, o poder de proceder
ao apuramento da verdade material, o poder de liquidar os tributos, o poder de rever
os actos tributários praticados, de emitir orientações genéricas, etc.

Naturalmente que a prática de todos estes actos não se faz de uma forma súbita ou
instantânea, antes pressupondo um complexo de passos, uma série gradual de
operações, de onde resulta o carácter eminentemente faseado ou procedimental da
actividade tributária (isto mesmo confirmaremos ao estudar as características do
procedimento tributário).

Ora, e como podemos classificar os actos administrativos tributários (actos da


Administração tributária de aplicação da norma tributária ao caso em concreto e
produtor de efeitos jurídicos na esfera de determinado sujeito)?

- Quanto à sua estrutura, distinguem-se os actos tributários unilaterais (fixados pela


Administração Tributária) dos actos tributários bilaterais ou consensuais (resultantes
de acordos ou contratos fiscais);

- Quanto à sua eficácia, verifica-se a existência de actos tributários definitivos (no


sentido de acto fixador de efeitos jurídicos finais, acto decisório concludente do
procedimento ou acto do mais elevado superior hierárquico (e que, porquanto,
expressa a última palavra da Administração)) e actos tributários provisórios (por
exemplo, os actos de pagamento por conta do imposto ou ainda das retenções na
fonte);

- Quanto ao seu conteúdo, temos os actos tributários positivos (criam um determinado

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efeito na esfera jurídica do contribuinte), e os actos tributários negativos (actos
impeditivos da tributação, como é o caso de reconhecimento de um benefício fiscal
(Cf. art. 65.º e 66.º do CPPT);

Podemos ainda fazer outras classificações dos actos, distinguindo:

- Actos singulares (individuais, com um destinatário individualizado – ex: acto de


liquidação) e actos gerais (com um campo de abrangência potencialmente geral e
abstracto – ex: orientações genéricas);

- Actos de primeiro grau (que consistem na primeira pronúncia decisória da


Administração tributária sobre um determinado assunto) e actos de segundo grau (que
consistem na reapreciação de uma questão, procedendo à sindicância de uma anterior
decisão);

- Actos expressos e actos tácitos (para a distinção, veja-se a fase decisória do


procedimento tributário);

- Actos vinculados (absolutamente vinculados à disposição legal) e actos discricionários


(onde há uma certa margem decisória de escolha e selecção para a Administração
tributária);

- Actos válidos e inválidos.

4. A justiça tributária

Nos termos do artigo 212.º, n.º 3 da Constituição, “Compete aos tribunais


administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham
por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e
fiscais”. Em articulação com este preceito, o ETAF no seu artigo 1.º, n.º 1, prescreve
que “ Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com
competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das
relações jurídicas administrativas e fiscais”. Assim, os tribunais tributários são os
órgãos competentes para dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas
tributárias, que digam respeito a todos os tributos e não apenas aos impostos.

O processo judicial tributário tem por função a tutela plena e efectiva dos direitos e
interesses legalmente protegidos (art. 96º do CPPT). Portanto, o edifício jurisdicional é
uma das traves mestras do edifício garantístico tributário, assentando, para tal, nos
seguintes princípios:

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a) Princípio da Constitucionalidade

Os tribunais tributários devem obediência a todas as normas e princípios


constitucionais, devendo retirar-se do ordenamento jurídico, ou pelo menos não
aplicar, os actos desconformes com à Constituição.

b) Princípio da independência dos tribunais

Apontam neste sentido os artigos 203.º da CRP e 2.º do ETAF que dispõem que “os
tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são independentes e apenas estão
sujeitos à lei”. Daqui resulta:

- Independência Objectiva - a independência dos tribunais em relação ao poder


político e administrativo.

- Independência Subjectiva - garantia de inamovibilidade e irresponsabilidade dos


juízes. Os juízes são “inamovíveis, não podendo se transferidos, suspensos,
aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei” (artigos 3.º, n.º 1 do ETAF
e 216.º, n.º 1 da CRP). Os juízes não podem ser responsabilizados pelas sentenças e
acórdãos que proferem (art. 216.º, n.º 2 da CRP e 3.º, n.º 2 do ETAF), não podendo
existir um clima de desconfiança em relação à função exercida pelos juízes.

c) O princípio da reserva da função jurisdicional em matéria tributária.

De acordo com os art. 202.º 1 da CRP e 1.º, n.º 1 do ETAF, os tribunais da jurisdição
administrativa e fiscal são os órgãos de soberania a quem está reservada a
competência para administrar a justiça em nome do povo e dirimir os litígios
emergentes das relações jurídicas administrativas.

d) O princípio da protecção jurídica dos contribuintes.

A Constituição garante a todos uma tutela jurisdicional efectiva (art. 268.º, n.º 4 da
CRP), i.e., o acesso aos tribunais, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio
judiciário, a uma decisão jurídica em tempo razoável e a um processo equitativo. Para
tal, estão previstos meios de protecção dos direitos e interesses dos contribuintes no
âmbito do procedimento e processo tributário, como por exemplo os meios previstos
nos artigos 145º e 147º do CPPT.

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5. As garantias dos contribuintes

O Direito tributário adjectivo está intimamente ligado às pretensões dos contribuintes


e à defesa destes; assim, não se pode negar ao Direito tributário adjectivo uma função
eminentemente garantística individual. Estamos a falar das “garantias dos
contribuintes”, que se subdividem em:

- instrumentos graciosos, que são aqueles que decorrem perante órgãos de natureza
administrativa  garantias graciosas/administrativas;

- instrumentos contenciosos (ou não-administrativos), que são aqueles que decorrem


perante órgãos de natureza jurisdicional  garantias jurisdicionais/ não
administrativas.

Vamos analisar de uma forma sumária e introdutória cada uma destes tipos de
garantias, sendo certo que, em termos esquemáticos, elas se subdividem da seguinte
forma:

Reclamação
Graciosa
Impugnatórias
Recurso
Hierárquico
Administrativas
Direito à
Informação
Não
Impugnatórias
Direito à
Garantias
Participação

Direito de
Acção

Não Direito de
Administrativas Oposição

Direito de
Recurso

5.1. Garantias administrativas

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a) Garantias administrativas não impugnatórias

i) O direito à informação

O art. 268º, n.º 1 da CRP prevê que “os cidadãos têm o direito de ser informados (…)
sobre o andamento dos processos em que sejam directamente interessados, bem
como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas”; o direito
à informação é, pois, um pilar essencial do edifício da salvaguarda das posições
subjectivas dos contribuintes. Foi, então, consagrado um amplo conjunto de meios que
visam efectivar esse direito, de onde constam:

— o direito de acesso aos processos, arquivos e registos administrativos que lhes


digam respeito (cfr. art. 268.°, n.° 2, da CRP);

— o direito ao esclarecimento em tempo útil das dúvidas acerca da interpretação,


integração e aplicação das normas tributárias (art. 59.°, n.° 3, da LGT);

— o direito a obter uma informação sobre a fase em que se encontra o procedimento


e a data previsível da sua conclusão (art. 67.°, n.° l, alínea a), da LGT);

— o direito à comunicação das denúncias dolosas não confirmadas (arts. 67.°, n.° l,
alínea b), e 70.°, n.° 3, da LGT), para efeitos de eventual processo criminal;

— o direito à notificação dos actos tributários produtores de efeitos na esfera jurídica


dos particulares (art. 268.°, n.° 3, da CRP e 35.º e ss. do CPPT);

— o direito à fundamentação desses mesmos actos, quando afectem direitos ou


interesses legalmente protegidos (art. 268.°, n.° 3, in fine, da CRP);

— o direito à informação prévia, vinculativa para a Administração tributária em relação


ao concreto caso objecto do pedido (arts. 68.° da LGT e 57.° do CPPT);

— o direito a requerer as certidões necessárias à utilização dos meios administrativos e


contenciosos.

ii) O direito de participação

O direito de participação encontra-se prevista no texto da Constituição (art. 267.", n.°


1) e na Lei Geral Tributária, que confere aos contribuintes o direito de participar "na
formação das decisões que lhes digam respeito" (cfr. art. 60.°, n.° l, da LGT). O direito
de participação significa, então, a efectiva possibilidade de os interessados terem a
faculdade de intervir no procedimento tributário.

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Nalguns casos, a participação do contribuinte é absolutamente obrigatória, como, por
exemplo, nos casos de aplicação de "medidas anti-abuso" (art. 63.°, n.° 4, do CPPT) ou
de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos (art. 92.°, n.° l, da LGT).

A participação pode efectuar-se de várias formas, nomeadamente através do direito


de audição antes (i) da conclusão do acto de liquidação, (ii) do indeferimento, total ou
parcial, de pedidos, reclamações, recursos ou petições, (iii) da revogação de qualquer
benefício fiscal ou acto administrativo constitutivo de direitos em matéria fiscal, (iv) da
decisão de aplicação de métodos indirectos de tributação, (v) da conclusão do relatório
da inspecção tributária, etc.

Tal direito poderá ser dispensado quando:

- a liquidação do tributo se efectuar com base na declaração do próprio sujeito passivo


– porque o contribuinte já “participou” na feitura do acto em causa e já serão
absolutamente previsíveis os efeitos desse acto; e quando

- a decisão final do procedimento relativo a pedido, reclamação, recurso ou petição é


favorável ao contribuinte (art. 60.°, n.° 2, da LGT) – casos em que de nada serviria ouvir
o contribuinte, pois o acto a praticar satisfaz por inteiro a sua pretensão.

O direito de audição faz nascer na esfera jurídica da Administração o dever de


considerar todos os novos elementos de facto e de direito trazidos ao procedimento.
Caso contrário, está-se perante uma decisão final deficientemente fundamentada e,
como tal, susceptível de anulação (art. 99.º, al. c) do CPPT).

b) Garantias administrativas impugnatórias

São aquelas através das quais um sujeito põe em crise a conformidade de um


determinado acto da Administração tributária com o ordenamento jurídico e têm
como objectivo proceder à sindicância ou controle desse acto.

Destacam-se duas categorias de garantias administrativas impugnatórias: a reclamação


e o recurso. Podem ser apontados dois critérios para distinguir uma figura da outra:
um critério orgânico e um critério relativo à motivação2.

- Critério Orgânico: A distinção entre a reclamação e o recurso reside no facto de a

2
Note-se que apesar de estes critérios apontarem as diferenças “tendenciais” entre as duas figuras, não
se tratam de critérios absolutos, pois admitem excepções – cfr., por exemplo, o art. 75º e o art. 76º, n.º
1, ambos do CPPT). Assim, existem reclamações que são interpostas para órgãos de hierarquia superior
e recursos que se debruçam sobre a legalidade do acto impugnado. Vamos desenvolver as duas figuras
na parte dedicada aos procedimentos tributários em especial.

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reclamação consistir no pedido de sindicância de um determinado acto de natureza
administrativa junto da própria entidade que o praticou, enquanto o recurso consiste
num pedido de sindicância junto de uma entidade diferente daquela que praticou o
acto (designadamente, o superior hierárquico do autor do acto – e, daí, a designação
"recurso hierárquico").

- Critério relativo à motivação: A reclamação caracteriza-se por analisar a legalidade do


acto, enquanto o recurso se debruça sobre motivos respeitantes ao mérito desse acto.

 Direito de reclamação

O caso mais comum de reclamação em matéria tributária é a "reclamação graciosa" (e,


assim, concluímos desde logo que o direito de reclamação abrange vários tipos de
reclamações, sendo que a mais importante é a reclamação graciosa).

A reclamação graciosa é um meio impugnatório mediante o qual o sujeito passivo


solicita, junto de uma entidade superior, a anulação de um acto tributário, com
fundamento em qualquer ilegalidade. Regra geral, a reclamação é facultativa, mas
existem também situações em que a reclamação é absolutamente necessária em
relação a uma futura impugnação judicial, não podendo esta ser deduzida se não o
tiver sido primeiro a reclamação. Casos de reclamação graciosa necessária:

- situações de impugnação por erro na autoliquidação (art. 131.°, n.os l e 2, do CPPT);

- situações de impugnação por erro na retenção na fonte (art. 132.°, n.os 3 e 5, do


CPPT);

- situações de impugnação por erro nos pagamentos por conta (art. 133.°, n.os 2 e 3, do
CPPT);

- situações de impugnação com base em erro na quantificação da matéria tributável ou


nos pressupostos de aplicação dos métodos indirectos (art. 117.°, n.° l, do CPPT).

 Direito de recurso (administrativo)

Como os recursos se traduzem na possibilidade de impugnação do acto junto do


superior hierárquico do agente que o praticou, generalizou-se a expressão (recurso
hierárquico”, que tem hoje expressão legal.

Os recursos hierárquicos são dirigidos ao mais elevado superior hierárquico do autor


do acto (art. 66.°, n.º 2 CPPT) ou à entidade em quem ele tenha delegado essa

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competência. Isto é assim devido ao princípio do duplo grau de decisão, que impõe
que a mesma pretensão do contribuinte não possa ser apreciada mais de duas vezes
por dois órgãos integrando a mesma Administração tributária.

5.2. Garantias jurisdicionais

Distinguem-se três importantes meios garantísticos a exercer junto dos tribunais: o


direito de acção, o direito de oposição e o direito de recurso (jurisdicional).

a) O direito de acção judicial

O direito de acção judicial – que, em princípio, é irrenunciável (assim, art. 96.°, n.° l, da
LGT) - consiste na possibilidade de propor, junto de um tribunal, uma acção destinada
a proteger determinada posição jurídica resultante de normas substantivas. Segundo o
art. 268.°, n.° 4 da Constituição, "é garantido aos interessados recurso contencioso,
com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos administrativos,
independentemente da sua forma, que lesem os seus direitos ou interesses
legalmente protegidos."

Podemos distinguir dois tipos de situações:

1) Casos em que o sujeito recorre a tribunal independentemente de qualquer


actuação administrativa anterior que queira sindicar. Aqui está-se perante um
verdadeiro direito de acção em sentido restrito. Será o caso, por exemplo, da
“intimação para um comportamento em matéria tributária” (v. art. 147º do CPPT);

2) Casos em que o sujeito recorre a tribunal com o intuito de colocar em crise um


acto anterior praticado pela Administração tributária. Aqui, em vez de “direito de
acção”, parece mais adequada a referência a um “direito de recurso contencioso em
sentido amplo”.

b) O direito de oposição

É o caso, por exemplo, da oposição à execução fiscal. Após a execução ter sido
instaurada pelo órgão competente da Administração tributária, o executado (v. g.,
sujeito passivo de imposto ou responsáveis subsidiários) é notificado para, entre
outras coisas, contestar, respondendo ao "ataque" da Administração.

O estudo aprofundado desta fase processual será efectuado mais à frente, mas fica já
salientado um aspecto: na fase da oposição à execução, em princípio, não é legítimo
invocar qualquer ilegalidade respeitante à liquidação da dívida exequenda.

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c) O direito de recurso (jurisdicional)

Este recurso (que também é, em princípio, irrenunciável) deve ser visto como um meio
de impugnação junto dos tribunais superiores das decisões dos tribunais inferiores
com o objectivo de modificar a decisão recorrida. Distingue-se, pois:

- do recurso hierárquico (em que se procura sindicar uma decisão administrativa


dentro da própria Administração); e

- do recurso contencioso (em que se procura impugnar uma decisão administrativa


junto de um tribunal).

Em matéria de recursos jurisdicionais no âmbito tributário vigora também o princípio


do duplo grau de decisão. Assim, não pode uma mesma decisão jurisdicional (sentença
ou acórdão) ser objecto de mais de um recurso. Por exemplo, uma decisão de um
tribunal tributário de primeira instância apenas pode ser objecto de recurso ou para o
TCA ou para o STA, nunca para um e depois para outro.

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PARTE I - O PROCEDIMENTO TRIBUTÁRIO

1. Noção de procedimento tributário

O procedimento tributário consiste num “conjunto de actos, provenientes de órgãos


administrativos tributários distintos, relativamente autónomos e organizados
sequencialmente, direccionados à produção de um determinado resultado, do qual
são instrumentais” (Joaquim Freitas da Rocha).

Os elementos constitutivos desta noção são:

a) O procedimento é composto por um conjunto de actos, e não por um único acto


complexo;

b) Os actos que compõem o procedimento devem ser provenientes de órgãos


administrativos tributários distintos (e, note-se, para que o acto seja válido e eficaz, o
órgão administrativo que o pratica tem que ser competente para tal);

c) Os actos do procedimento devem ser relativamente autónomos, isto é, cada acto


deve ser independente dos outros, deve ter uma função única no iter procedimental,
apesar de estar conectado aos demais; assim, evita-se a prática de actos inúteis,
repetidos ou simplesmente dilatórios;

d) Os actos que compõem o procedimento devem estar organizados sequencialmente,


isto é, devem estar submetidos a uma ordem e encontrar-se apresentados de uma
forma pré-determinada e sequenciada;

e) Os actos que compõem o procedimento estão orientados para a produção de uma


decisão administrativa (um acto administrativo, um regulamento, um contrato
administrativo). Assim, os actos do procedimento dirigem-se à produção dessa
decisão, têm uma decisão meramente instrumental relativamente a esta; portanto, só
a decisão final do procedimento produz efeitos administrativos – os actos que
compõem o procedimento produzem efeitos meramente sequenciais.

1.1. Procedimento e Processo

Sabendo nós o que significa procedimento tributário, queremos distinguir esta


realidade do processo tributário, que também compõe o objecto de estudo da nossa
cadeira.

Não há qualquer noção legal completa de procedimento ou processo3; o CPPT limita-se

3
Não obstante, veja-se o art. 54º, n.º 1 da LGT, relativamente ao procedimento.

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a referir os actos que são compreendidos no procedimento (art. 44º do CPPT) e no
processo (art. 97º do CPPT), e a referir-se às finalidades deste último (art. 96º CPPT),
quase o mesmo fazendo a LGT.

a) Pontos de contacto entre o procedimento e o processo tributário:

I. O procedimento e o processo estão sujeitos a exigências constitucionais e legais, sob


pena da sua invalidade (anulabilidade ou nulidade, conforme os casos). Isto é, tem de
haver sustentabilidade constitucional e legal das actuações administrativas e
jurisdicionais. Por exemplo, um acto tributário de liquidação pode ser anulado se o
direito de audição do interessado não for respeitado (cfr. art. 60.° da LGT) e o processo
de impugnação judicial pode ser considerado irregular se não for dada vista ao
Ministério Público (art. 121º do CPPT).

2. O princípio do contraditório, mediante o binómio acção/reacção, assume uma


importância fundamental quer no procedimento, quer no processo. Daqui resulta, por
ex., o direito de contestação do representante da fazenda pública no processo de
impugnação judicial (cfr. art. 110.° do CPPT).

3. Carácter marcadamente público das actuações procedimentais e processuais.

b) Pontos distintivos entre o procedimento e o processo tributário:

1. Critério que apela à espécie dos interesses em causa. No procedimento estariam


exclusivamente em causa os interesses do autor do acto (Administração tributária)
enquanto no processo estariam em causa os interesses do destinatário do acto (v.g., o
sujeito passivo ou outro interessado).

No entanto, este critério não é totalmente correcto, já que há procedimentos em que


os interesses em jogo são do destinatário do acto (é o que acontece, por ex., com o
procedimento de reconhecimento de benefícios fiscais – v. art. 65º e segs. do CPPT),
bem como existem processos em que os interesses são do próprio autor do acto (ex.
paradigmático do processo de execução fiscal – art. 148º e segs. do CPPT).

2. No procedimento não existiria qualquer litígio entre as partes, o que já aconteceria


no processo.

No entanto, também este critério merece a nossa crítica uma vez que existem
procedimentos em que há um fundo litigioso (é o caso dos procedimentos
impugnatórios como a reclamação graciosa e o recurso hierárquico) e existem
processos jurisdicionais sem fundo litigioso (é, por exemplo, o caso do divórcio por
mútuo consentimento).

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3. “Critério da Vontade Exteriorizada”. O procedimento é uma forma típica de exte-
riorização da vontade dos poderes legislativo e administrativo, enquanto o processo é
a forma típica de exteriorização de vontade do poder jurisdicional. Este é o critério que
verdadeiramente distingue o procedimento do processo tributário.

Em conclusão, podemos encarar o procedimento tributário como o conjunto de actos


exteriorizadores da vontade dos agentes tributários e o processo tributário como o
conjunto de actos concretizadores da vontade dos tribunais tributários.

2. As fases do procedimento, em geral

O procedimento consiste numa série de actos integrados numa sequência ordenada


previamente determinada, que é a seguinte:

Fase
Fase da Fase Fase
Integrativa
Iniciativa Instrutória Decisória
de Eficácia

a) Fase da iniciativa

É a fase do impulso procedimental, da iniciativa da Administração ou do contribuinte,


previsto na LGT no art. 69º e 70º.

1. Podemos estar perante uma iniciativa administrativa ou uma iniciativa dos


contribuintes (iniciativa não administrativa). Não está tanto em causa a natureza
jurídica de quem inicia o procedimento, mas a circunstância de tal entidade ser, ela
própria ou uma superior sua, competente para decidir. O exemplo de um
procedimento tributário de exclusiva iniciativa administrativa é o procedimento de
orientações genéricas (art. 55.° do CPPT), e um exemplo de procedimento da iniciativa
dos contribuintes é a reclamação graciosa (art. 69.° do CPPT).

2. Podemos estar perante uma iniciativa oficiosa ou não oficiosa. A primeira é aquela
cuja decisão de iniciar não está na disponibilidade do sujeito propulsor (v.g., quando
estão em causa interesses públicos de superior relevo) enquanto a segunda está
subordinada à vontade do sujeito propulsor. O procedimento de aplicação de métodos
indirectos de tributação constitui um exemplo de uma iniciativa oficiosa.

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3. Relativamente aos procedimentos de iniciativa administrativa não oficiosa, podemos
estar perante uma iniciativa provocada ou não provocada, consoante a iniciativa seja
ou não provocada pelo sujeito propulsor. Nos procedimentos de iniciativa provocada,
a iniciativa é efectivada mediante pedidos, petições ou propostas, como acontece por
ex. nas situações de revisão dos actos tributários por iniciativa da Administração mas a
pedido do contribuinte (cfr. art. 78.° da LGT).

Oficiosa
Administrativa
Provocada

Não Oficiosa
Iniciativa Não
Provocada
Não-
Administrativa Não Oficiosa

b) Fase instrutória

Na fase instrutória, os órgãos administrativos tributários competentes e os restantes


interessados procurarão trazer os elementos de prova necessários e fixar os interesses
de cada um a valorar, em ordem a uma adequada decisão.

"A direcção da instrução cabe, salvo disposição legal em sentido diferente, ao órgão da
Administração tributária competente para a decisão" (art. 71.° da LGT). Mas se "a
instrução for realizada por órgão diferente do competente para a decisão, cabe ao
órgão instrutor a elaboração de um relatório definindo o conteúdo e objecto do
procedimento instrutório e contendo uma proposta de decisão, cujas conclusões são
obrigatoriamente notificadas aos interessados em conjunto com esta" (n.° 2, do artigo
71º da LGT).

"O órgão instrutor pode utilizar para o conhecimento dos factos necessários à decisão
do procedimento todos os meios de prova admitidos em direito" (art. 72.° da LGT, que
consagra o “princípio da plenitude probatória”), "podendo designadamente juntar
actas e documentos, tomar declarações de qualquer natureza do contribuinte ou
outras pessoas e promover a realização de perícias ou inspecções oculares" (art. 50.°
do CPPT). Nesta fase, poderão então ser exibidos os documentos, actos de inspecção,

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visitas a locais determinados, emissão de actos consultivos como pareceres,
informações, etc., além de que poderão intervir órgãos administrativos, peritos,
contribuintes, avaliadores, testemunhas, etc. É, pois, uma fase de intervenções
múltiplas e de prática de actos de natureza diversa.

Em relação aos documentos e declarações apresentados pelos contribuintes,


prescreve o art. 75.°, n.° l, da LGT que "presumem-se verdadeiras e de boa-fé as
declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os
dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas
estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal"4.

Merece aqui especial destaque a regra prevista no n.° l do art. 74.° da LGT, nos termos
da qual "o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Administração
tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque". Deve-se ainda ter
presente que:

- Quando os elementos estiverem em poder da Administração tributária, o ónus da


prova considera-se satisfeito caso o interessado tenha procedido à sua correcta
identificação junto daquela;

- No caso da determinação da matéria tributável por métodos indirectos (arts. 87.º e


ss. da LGT), compete à Administração tributária o ónus da prova da verificação dos
pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso
na respectiva quantificação – assim, art. 74º, n.º 3 da LGT.

Esta fase (e em rigor, todo o procedimento) deverá estar concluída o quanto antes, de
acordo com o princípio da celeridade. Assim, o procedimento de iniciativa do
contribuinte será arquivado obrigatoriamente se "ficar parado mais de 90 dias por
motivo a este imputável", devendo a Administração tributária, até 15 dias antes do
termo desse prazo, notificar o contribuinte, por carta registada, e informá-lo sobre os
efeitos do incumprimento dos seus deveres de cooperação (art. 53.° do CPPT).

4
No entanto, refira-se que essa presunção cessa, nos termos do n.° 2 do mesmo artigo quando:

i) as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados


de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo;
ii) o contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação
tributária, salvo quando nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações;

iii) a matéria tributável do sujeito passivo se afastar significativamente para menos, sem razão
justificada, dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica previstos na presente lei."

16
c) Fase decisória

Nesta fase, o órgão competente manifesta uma vontade livre (sem coações),
esclarecida (sem erros) e ponderada (que levou em atenção os elementos de prova
produzidos na fase anterior). Caso contrário, o acto tributário correspondente terá um
vício e poderá ser anulado.

Não obstante o procedimento estar subordinado a um princípio geral de


obrigatoriedade de decisão (art. 56.°, n.° l, da LGT), existem situações em que a
Administração tributária não está obrigada a decidir; tal sucede quando (art. 56º, n.º 2
da LGT):

- a Administração tributária, se pronunciou há menos de 2 anos sobre pedido do


mesmo autor com idênticos objecto e fundamentos;

- tiver sido ultrapassado o prazo legal de revisão do acto tributário (art. 78.° da LGT).

Nesta fase, o interessado tem ainda a possibilidade de exercer o seu direito de


participação no procedimento, nomeadamente através da sua audição. O exercício de
tal direito, oralmente ou por escrito, deve ser efectuado no prazo (não inferior a 8 nem
superior a 15 dias) a fixar pela Administração tributária em carta registada a enviar
para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte (art. 60.°, n.° 3, da LGT),
devendo-lhe ser comunicado o projecto da decisão e sua fundamentação (n.° 4).

A decisão do procedimento poderá ser expressa ou tácita; vejamos:

a) Decisão expressa — deferimento ou indeferimento expressos

A decisão será expressa quando for feita por meio directo de manifestação da vontade
(palavras, escrito, etc.). Resulta, pois, de uma vontade manifestada inequivocamente
num dado sentido.

A decisão expressa pode assumir a forma de decisão positiva ou negativa, tratando-se


de um deferimento no primeiro caso e de um indeferimento no segundo. Note-se que
a decisão expressa negativa (indeferimento expresso, que assume uma relevância
prática muito grande, pois é em relação a eles que, em regra, os interessados
pretendem reagir) deve estar devidamente fundamentada e ser susceptível de
impugnação.

b) Decisão tácita — deferimento ou indeferimento tácitos

17
A decisão será tácita quando não há uma manifestação de vontade expressa por parte
da Administração tributária, mas apenas o decurso do tempo; a decisão será, então,
tácita quando a decisão se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam.
Assim, nas situações em que o órgão decisor, estando obrigado a decidir, nada diz,
deve ser atribuído ao silêncio um valor declarativo tácito.

A decisão tácita pode dar lugar a uma manifestação de vontade positiva (deferimento
tácito) ou negativa (indeferimento tácito). Pode-se encontrar na lei procedimental
tributária casos quer de indeferimento tácito, quer de deferimento tácito.

No caso em que o interessado solicita algo, a regra é a do indeferimento tácito para


efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicia (art. 57.°,
n.° 1 e n.º 6 da LGT).

Contudo, existem casos de deferimento tácito, que apenas serão de admitir quando a
lei expressamente os prever. Vejamos alguns exemplos:

i) O procedimento de ilisão de presunções (art. 64.° do CPPT). "As presunções


consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário"
(cfr. art. 73.° da LGT) e, assim, o interessado pode "solicitar a abertura de
procedimento contraditório próprio" (art. 64.°, n.° l, do CPPT) mediante uma petição
nesse sentido. Se a essa petição não for dada qualquer resposta no prazo de 6 meses,
a petição considera-se tacitamente deferida;

ii) A reclamação dos pagamentos por conta. Estes pagamentos podem ser objecto de
reclamação graciosa quando o sujeito passivo entenda que são indevidos (art. 133.°,
n.os l, 2 e 4 do CPPT). Decorridos 90 dias sem que a reclamação tenha sido decidida,
considerar-se-á tacitamente deferida;

iii) No quadro do procedimento de informações vinculativas, e caso o interessado faça


o pedido com carácter de urgência apresentando uma “proposta de enquadramento
jurídico-tributário”, esta considera-se “tacitamente” convertida em informação
vinculativa, nos termos do art. 68º, n.º 8 e n.º 9 da LGT;

iv) O relatório final de inspecção. O pedido de sancionamento do relatório final da


inspecção considera-se tacitamente deferido se não houver resposta da Administração
no prazo de 6 meses (art. 64.°, n.° 3, do RCPIT).

Resta acrescentar – e agora estamos apenas a referir-nos à decisão expressa – que


além do princípio da obrigatoriedade de decisão, existe o princípio de obrigatoriedade
de fundamentação (art. 77.°, n.° l, da LGT).

18
Expressa
Indeferimento
Tácito
Regra (Art. 57º,
Decisão n.º 1 e 5 LGT) (V.
tb. 106º CPPT)

Art. 64º, n.º 3


CPPT
Tácita

Art. 133º, n.º 2


Deferimento e n.º 4 CPPT
Tácito
Apenas nos
casos previstos Art. 64º, n.º 3
na lei: RCPIT

Art. 68º, n.º 8 e


9 LGT

d) Fase integrativa de eficácia

Uma vez proferida a decisão, torna-se necessário que essa decisão produza plena e
integralmente os seus efeitos, ou seja, que se torne plenamente eficaz. Isto é, em
princípio estamos perante uma decisão que existe e é válida, mas que ainda não está
apta a desencadear todos os seus efeitos jurídicos de uma forma completa – e é à
produção desses efeitos que se destina esta fase.

Diz-nos o art. 268º, n.º 3 CRP que “os actos administrativos estão sujeitos a notificação
aos interessados, na forma prevista na lei (…)”. Assim sendo, nos termos do art. 36.° do
CPPT "os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos
contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente
notificados", o que se conjuga com o art. 77.°, n.° 6, da LGT, segundo o qual "a eficácia
da decisão depende da notificação".

19
No procedimento tributário, os actos integrativos de eficácia limitam-se,
essencialmente, à comunicação do teor do acto decisório ao interessado,
encontrando-se divididos em dois grandes grupos:

- notificação (art. 35.°, n.° l, do CPPT)5, que tem lugar quando o destinatário do acto
está individualizado;

- publicação6, que tem lugar quando o destinatário do acto ainda não está
individualizado.

Esta matéria será desenvolvida aquando do estudo do princípio da publicidade dos


actos.

3. PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AO PROCEDIMENTO TRIBUTÁRIO

Antes do estudo das regras aplicáveis a cada procedimento em particular, convém


estudar os princípios que são o alicerce, o fundamento dessas regras – são os
princípios que conformam as regras do procedimento tributário. Alguns dos princípios
aplicáveis ao procedimento tributário estão consagrados na lei. Vejamos, então, quais
são esses princípios.

3.1. O princípio da legalidade da actuação administrativa

Este princípio impõe a conformidade da actuação administrativa ao que está previsto


na lei (lei em sentido amplo). Assim, refere o n.° 2 do art. 103.° da CRP que as garantias
dos contribuintes são "determinadas" por lei, acrescentando o n.° 3 desse art. que a
liquidação e a cobrança se devem fazer nas formas previstas também na lei.

5
Diferente da notificação é a citação — no âmbito do processo de execução fiscal — que se destina a
dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a
esta, pela primeira vez, pessoa interessada.
6
Um exemplo de tal publicação pode ser encontrado no art. 56.º do CPPT. a propósito das circulares
emanadas no âmbito do procedimento de orientações genéricas.

20
Por sua vez, a LGT, no seu art. 8.°, n.° 2, alarga tal sujeição à lei às matérias
respeitantes à "regulamentação das figuras da substituição e responsabilidade
tributárias", "definição das obrigações acessórias", e às "regras de procedimento e
processo tributário".

3.2. O princípio da verdade material

O objectivo fundamental de toda a actuação procedimental em matéria tributária


consiste em alcançar a tributação justa e igualitária de todos os contribuintes. Assim, a
verdade material em matéria tributária implica o conhecimento e aceitação total do
princípio da igualdade na tributação, na sua dimensão estruturante de respeito pela
efectiva capacidade contributiva dos sujeitos.

Este princípio está previsto no art. 55º LGT, quando este art. refere que a
Administração tributária deve exercer as suas atribuições no respeito pelos princípios
da justiça e da igualdade.

O princípio da verdade material tem como importante corolário o princípio da


cooperação, nos termos do qual "os órgãos da Administração tributária e os
contribuintes estão sujeitos a um dever de colaboração recíprocos" (art. 59.° da LGT),
presumindo-se sempre a boa-fé das suas actuações (idem, n.° 2). Só é possível alcançar
a verdade material se existir uma efectiva colaboração por parte da Administração
tributária, no dever de esclarecer "os contribuintes e outros obrigados tributários
sobre a necessidade de apresentação de declarações, reclamações e petições e a
prática de quaisquer outros actos necessários ao exercício dos seus direitos, incluindo
a correcção dos erros ou omissões manifestas que se observem" (art. 48.°, n.° l, do
CPPT e art. 59.°, n.° 3, da LGT); e por parte do contribuinte, no dever de cooperar "de
boa-fé na instrução do procedimento, esclarecendo de modo completo e verdadeiro
os factos de que tenha conhecimento e oferecendo os meios de prova a que tenha
acesso" (art. 48.°, n.° 2, do CPPT), nomeadamente mediante "o cumprimento das
obrigações acessórias previstas na lei e a prestação dos esclarecimentos que esta lhes
solicitar sobre a sua situação tributária, bem como sobre as relações económicas que
mantenham com terceiros" (art. 59.°, n.° 4, da LGT)7-8.

7
Note-se que o dever de cooperação no procedimento existe também para “os serviços,
estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, do Estado, das Regiões Autónomas e das
autarquias locais, as associações públicas, as empresas públicas ou de capital exclusivamente público, as
instituições particulares de solidariedade social e as pessoas colectivas de utilidade pública" – art. 49.°
do CPPT.
8
A propósito do dever de prestação de esclarecimentos, o EBF prescreve no seu art. 8.° que "as pessoas
titulares do direito aos benefícios fiscais são obrigadas a declarar, no prazo de 30 dias, que cessou a
situação de facto ou de direito em que se baseava o benefício, salvo quando essa cessação for de

21
Quando tal colaboração, sendo exigida ou exigível, não é prestada, desencadeia-se
uma série de consequências, nomeadamente:

— a aplicação de métodos indirectos de avaliação, designadamente mediante a


tributação através de indícios ou presunções (arts. 87.º, al. b) e ss., 88.°, 89.º e 89,°-A
da LGT);

— a perda de benefícios fiscais (art. 14.° n.° 2. da LGT e art. 12.°, n.° 2, e n.º 4 do EBF);

— a aplicação de um agravamento à colecta (art. 77.° do CPPT ou art. 91.°, n.° 9, da


LGT);

— a responsabilidade do sujeito passivo que se nega a prestar colaboração poderá dar


lugar a uma responsabilidade disciplinar, contra-ordenacional (arts. 113.°, 116.° e ss.
do RGIT) ou até criminal (por exemplo, art. 103.°. n.° l, al. a) e b), do RGIT);

— a suspensão dos prazos impositivos de celeridade processual e consequente não


exigibilidade do seu respeito (art. 57.°. n.º 4, da LGT).

3.3. O princípio da celeridade

As questões jurídicas, litigiosas ou não, devem ser resolvidas em tempo útil (“Direito
que tarda não é verdadeiro Direito”). Este princípio exige que o procedimento seja
concluído num prazo razoável, o que comporta duas dimensões:

- simplicidade e economia procedimental, através da prevalência das acções


desburocratizadas e da proibição da prática de actos inúteis ou dilatórios (art. 57.°, n.°
l, da LGT e art. 69.°, alíneas a) e b), do CPPT), sendo o procedimento da iniciativa do
contribuinte obrigatoriamente arquivado se ficar parado mais de 90 dias por motivo a
este imputável (art. 53.°, n.° l, do CPPT);

- rapidez de actuação, mediante o estabelecimento:

- de um prazo de duração máxima do procedimento tributário: 6 meses, nos


termos do art. 57.°, n.° l, da LGT9 (recorde-se que nos casos em que o procedimento

conhecimento oficioso". O art. 14.°, n.° 1 da LGT determina que "a atribuição de benefícios fiscais ou
outras vantagens de natureza social concedidas em função dos rendimentos do beneficiário ou do seu
agregado familiar depende (...) do conhecimento da situação tributária global do interessado".
9
Esse prazo não é absoluto, pois existem situações em que um outro prazo pode ser previsto pelo
legislador. Cfr., por exemplo, o art. 66.°, n.° 5, do CPPT, nos termos do qual "os recursos hierárquicos
serão decididos no prazo máximo de 60 dias", ou o art. 92.°, n.° 2, da LGT. nos termos do qual o

22
tributário não seja concluído no prazo referido de 6 meses, presume-se o
indeferimento da respectiva pretensão para efeitos de recurso hierárquico, recurso
contencioso ou impugnação judicial (indeferimento tácito)10); e

- de um prazo máximo para a prática de actos procedimentais: 10 dias, salvo


disposição legal em sentido contrário (art. 57.°, n.° 2, da LGT; e art. 67.°, n.º 2, da LGT).

Os prazos referidos "são contínuos e contam-se nos termos do Código Civil" (art. 57.°,
n.° 3. da LGT). Os prazos suspendem-se no caso de a dilação do procedimento ser
imputável ao sujeito passivo por incumprimento dos seus deveres de cooperação (art.
57º, n.º 3 e n.º 4 da LGT).

3.4. O princípio da disponibilidade e do inquisitório

Já vimos que o principal objectivo das actuações procedimentais tributárias deve


consistir na descoberta da verdade material. Mas na prossecução desse objectivo, as
actuações estão ou não na disponibilidade da Administração tributária? A este
propósito podemos falar no princípio do inquisitório.

O princípio do inquisitório é aplicável à Administração tributária. O art. 58.° da LGT


dispõe que "a Administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as
diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade
material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido". Os órgãos que
integram a Administração Tributária estão, pois, obrigados a tudo fazer no sentido de
assegurar a melhor realização possível do interesse público (art. 266° da CRP), pelo que
dificilmente se poderia aceitar que a marcha do procedimento pudesse estar ao sabor
de uma vontade não vinculada.

Nestes termos, recai sobre a Administração tributária um verdadeiro dever de agir,


que tem como consequências:

- ao nível da iniciativa: alguns procedimentos podem ser instaurados oficiosamente. É


o que se passa, nomeadamente, no procedimento de fixação da matéria tributável por
métodos indirectos (arts. 87.° e ss. da LGT);

- ao nível da instrução: a Administração não se deve cingir aos elementos

procedimento de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos "deve ser concluído no
prazo de 30 dias contados do seu início (...)". Cfr., ainda, art. 36.°, n.os 2 e 3, do RCPIT.
10
Estão previstos, contudo, alguns casos de deferimento tácito - Cfr, por ex., o art. 64.°, n.° 3, do CPPT.
Esta matéria já foi estudada na fase decisória do procedimento tributário.

23
apresentados, mas antes deve diligenciar no sentido de trazer para o procedimento
todos aqueles que lhe pareçam indispensáveis à descoberta da verdade material,
mesmo que desfavoráveis aos seus interesses de carácter patrimonial;

- ao nível da possibilidade de pôr termo ao procedimento: não deve ser admissível a


desistência administrativa no âmbito do procedimento tributário;

- a não actuação da Administração quando está legalmente obrigada a agir pode


consubstanciar uma violação do princípio da vinculação à verdade material.

3.5. O princípio da participação e do contraditório

O princípio da participação dos destinatários dos actos nos procedimentos que lhes
dizem respeito tem em vista assegurar a sua co-responsabilização nas decisões
adoptadas11. A participação tem diversas dimensões jurídicas:

(i) participação enquanto direito fundamental, assumindo uma configuração positiva


que consiste no direito de exigir dos órgãos administrativos medidas que promovam
exequibilidade/viabilidade do direito (promovendo, nomeadamente, a audiência, o
contraditório, a oposição);

(ii) participação enquanto garantia dos contribuintes, que assume uma configuração
negativa ao impedir que os contribuintes sejam lesados por actuações administrativas;

(iii) participação enquanto princípio respeitante à estrutura do procedimento. O


procedimento deve ter uma estrutura bilateral, assente em mecanismos de
participação diversos, no âmbito dos quais o direito de audição e de contradição
(resposta e defesa) assumem uma importância fundamental.

É precisamente no âmbito destes direitos de contradição que surge o princípio do


contraditório sem que, contudo, se confunda com o princípio da participação. A dife-
rença fundamental entre ambos os princípios reside na circunstância de o princípio da
participação ser muito mais abrangente do que o do contraditório, na medida em que,
ao contrário deste, não se revela apenas nas situações em que se coloca o problema
da resposta do interessado (o no n.° 2 do art. 45.° do CPPT parece apontar neste
sentido, ao referir que "o contribuinte é ouvido oralmente ou por escrito, conforme o
objectivo do procedimento"), mas também influencia, motiva e ajuda o órgão
competente a tomar a decisão correcta.

11
Cfr., por exemplo, o que refere a LGT acerca da participação dos contribuintes nos procedimentos de
avaliação indirecta (art. 82.º, n.º 3 da LGT) e de revisão da matéria tributável fixada por métodos
indirectos (art. 92.°, n.° 1 da LGT).

24
3.6. O princípio da confidencialidade

Se por um lado, "os cidadãos têm (...) o direito de acesso aos arquivos e registos
administrativos" (art. 268º, n.º 2 da CRP), por outro, a todos é reconhecido o direito à
reserva da intimidade da vida privada e familiar (art. 26.° da CRP e art. 80.° do CC)12.
Assim sendo, quid iuris se alguém solicita à Administração tributária informações sobre
a situação de uma determinada pessoa perante o Fisco? Privilegiamos o direito à
informação ou a reserva da intimidade?

Ora, a solução passa pela compatibilização das duas soluções (como, aliás, resulta da
parte final do art. 268º, n.º 2 da CRP) mediante a figura jurídica do sigilo.

Assim, em inúmeras situações, o ordenamento jurídico impõe um verdadeiro dever de


sigilo profissional a determinadas categorias de profissionais relativamente a factos
não públicos de que tomaram conhecimento no exercício das suas funções. Pense-se,
por exemplo, nos advogados, agentes bancários e, para o que nos interessa,
funcionários da Administração tributária, que têm acesso a muitos factos, actos e
relações que os contribuintes têm de lhes expor para efeitos de cumprimento das suas
obrigações tributárias. Por este motivo, "os dirigentes, funcionários e agentes da
Administração tributária estão obrigados a guardar sigilo sobre os dados recolhidos
sobre a situação tributária dos contribuintes e os elementos de natureza pessoal que
obtenham no procedimento" (art. 64.°, n.° l, da LGT)13.

A violação do dever de sigilo é punida com pena de prisão ou multa (art. 91.° do RGIT).

Contudo, este dever de sigilo cessa — devendo a Administração tributária prestar as


informações solicitadas aos devidos órgãos competentes —, nos termos do n.° 2 do
art. 64.° da LGT, nos casos de:

- autorização do contribuinte para a revelação da sua situação tributária;

- cooperação legal da Administração tributária com outras entidades públicas (v. g.,

12
Este direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar é ainda sustentado por outras garantias
constitucionais (como os direitos à inviolabilidade do domicílio e da correspondência e à protecção dos
dados informáticos).
13
Do mesmo modo prescreve o art. 22.° do RCPIT que "o procedimento da inspecção tributária é
sigiloso, devendo os funcionários que nele intervenham guardar rigoroso sigilo sobre os factos relativos
à situação tributária do sujeito passivo ou de quaisquer outras entidades e outros elementos de
natureza pessoal ou confidencial de que tenham conhecimento no exercício ou por causa das suas
funções". Cfr. também o art. 127.° do CIRC.

25
Ministério público, Procuradoria Geral da República, Assembleia da República,
ministérios, Ordem dos Advogados, etc. ...);

- cooperação da Administração tributária com as administrações tributárias de outros


países, desde que tal resulte de convenção internacional a que o Estado Português
esteja vinculado, e esteja assegurada reciprocidade da prestação de informação; e

- colaboração com a justiça nos termos do Código de Processo Civil e Código de


Processo Penal, nomeadamente, mediante solicitações judiciais.

Uma última nota se impõe. Estivemos a abordar o dever de sigilo que impende sobre a
Administração tributária – sigilo fiscal! Por vezes, é a Administração que, por exemplo
no âmbito de um procedimento de inspecção tributária, tem de tem de pedir
informações a outras entidades (onde os bancos assumem especial relevo); ora, o
acesso a informação protegida pelo sigilo profissional, bancário ou qualquer outro
dever de sigilo legalmente regulado (sigilo extra-fiscal) depende, em regra, de
autorização judicial.

3.7. O princípio da imparcialidade

A Administração tributária está igualmente subordinada a um dever de imparcialidade


(cfr. art. 55.° da LGT). Significa isto que:

a) na fase da instrução,

- não deve o órgão instrutor e/ou decisor da Administração intervir no procedimento


na qualidade de defensor intransigente desta, mas na qualidade de defensor do
interesse público;

- são levados ao procedimento todos os elementos probatórios que se lhe afigurem


necessários e úteis à descoberta da verdade material, mesmo que desfavoráveis aos
interesses patrimoniais da Administração.

b) na fase da decisão, esta deverá reflectir uma ponderação igualitária dos interesses
em causa.

3.8. O princípio da obrigatoriedade de pronúncia ou de decisão

Prescreve o art. 56.° da LGT que "a Administração tributária está obrigada a
pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam
apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas

26
ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver
interesse legítimo". É natural que o interessado espere da parte da Administração uma
resposta em tempo útil.

A Administração tributária está, então, obrigada a pronunciar-se acerca de tudo o que


lhe seja apresentado pelos interessados, mas não está obrigada a decidir. Como
resulta do próprio artigo, a Administração tributária está obrigada a pronunciar-se (a
responder) acerca de tudo o que lhe seja apresentado pelos interessados, nem que
seja para dizer que não aceita o peticionado, mas não está obrigada a decidir. Se tal
acontecesse, ter-se-ia de iniciar um procedimento e proceder à audiência dos interes-
sados sempre que fosse apresentada um qualquer pedido, requerimento ou petição.
Portanto,

Decisão
Dever de
Ponúncia
Resposta

Dever de resposta e de decisão não se confundem. Este último exige, nomeadamente,


a observância de requisitos relativos à legitimidade de quem solicita, à competência do
órgão decisor e à tempestividade do requerido. Tal dever também não existirá se "a
Administração tributária se tiver pronunciado há menos de dois anos sobre pedido do
mesmo autor com idênticos objecto e fundamentos" [art. 56.°, n.° 2, alínea a), da LGT].

E quais as consequências para a não actuação da Administração neste contexto?

- No caso da Administração não se pronunciar – situação em que a Administração deve


responder, embora não deva decidir -, o interessado pode (se a sua petição for
razoável...) lançar mão de um processo judicial de "intimação para um
comportamento" (art. 147.° do CPPT), uma vez que houve uma prestação jurídica
(resposta) omitida.

- No caso da Administração não decidir, estando obrigada a fazê-lo, vale a presunção


de indeferimento tácito.

3.9. O princípio da obrigatoriedade de fundamentação da decisão

Impõe-se à Administração um verdadeiro dever de fundamentação das suas decisões,


nos termos do art. 77.°, n.° l, da LGT. Resulta deste art. que todas as decisões
procedimentais tributárias devem ser fundamentadas – as decisões favoráveis devem
também ser fundamentadas e não somente as decisões procedimentais desfavoráveis

27
(ao contrário do que parecia resultar do disposto no art. 268º, n.º 3 da CRP; no
entanto, como o regime previsto na LGT é mais garantístico do que aquele que resulta
da própria CRP, deve a LGT sobrepor a sua solução neste concreto caso).

Essa fundamentação abrange quer o dever de motivação (i. é, a exposição dos motivos
e razões que conduziram à tomada daquela decisão, nomeadamente quando existirem
espaços discricionários), quer o dever de justificação (ou seja, a referência ordenada
aos pressupostos de facto e de direito que suportam essa mesma decisão).

Essa fundamentação deve ser feita de uma forma:

- oficiosa, o que significa que ela não está dependente de pedido do interessado;
consiste num verdadeiro dever de agir dos órgãos administrativos tributários;

- completa, no sentido de que a Administração deverá indicar todos os elementos


necessários à tomada de decisão, não sendo de admitir fundamentações parciais ou
incompletas;

- clara, o que significa que a fundamentação não deve fazer apelo a demasiados
conceitos e expressões técnicas nem deverá conter obscuridades, ambiguidades ou
contradições;

- actual, devendo ser totalmente efectuada no momento da decisão e não


posteriormente; e

- expressa, o que quer dizer que, em princípio, ela não poderá ser feita por remissão
para anteriores decisões ou pareceres. No entanto, face ao disposto na parte final do
n.º 1 do art. 77º da LGT admite-se que a fundamentação seja feita por remissão
quando essa remissão seja expressa.

A falta destes requisitos — fundamentações incompletas, obscuras, abstractamente


remissivas — e a falta da própria fundamentação, constitui uma ilegalidade, sus-
ceptível de conduzir à anulação do acto em causa, mediante meios graciosos ou
contenciosos (Cfr. art. 99.°, alínea c), do CPPT).

3.10. O princípio da publicidade dos actos

Este princípio relaciona-se com a fase integrativa de eficácia. Segundo este princípio,
todos os actos administrativos e tributários devem ser publicitados, pelo que nenhuma
decisão do procedimento poderá produzir efeitos sem que o seu destinatário tenha,
ou possa ter, dela conhecimento.

O referido acto de publicidade pode consistir quer num acto geral (publicação), quer

28
num acto individual (notificação).

a) Publicidade mediante publicação

Trata-se de um acto geral, no sentido em que os seus destinatários não estão


individualizados. Poucos são os procedimentos cujo acto final não seja um acto
administrativo comunicado mediante notificação ao interessado. Contudo, no
procedimento de orientações genéricas, este termina com uma circular administrativa,
circular esta que deverá ser dada a conhecer mediante a sua inserção numa base de
dados, organizada especificamente para o efeito (Cfr. arts. 55.° e 56.° do CPPT).

b) Publicidade mediante notificação

Noção e tipos de notificação

A notificação é um acto individual, na medida em que o seu destinatário já se encontra


individualizado. Na grande maioria das situações, a publicidade é efectivada através da
comunicação individual de um acto ao seu interessado, podendo tal comunicação
individual, como é sabido, revestir a forma de notificação ou de citação. Em rigor,
apenas as notificações têm relevância procedimental, pois as citações apenas
relevarão no contexto de um processo jurisdicional de execução fiscal (n.° 2 do art.
35.° do CPPT, e ainda arts. 188.º e ss. do CPPT).

De acordo com o art. 35.º do CPPT, a notificação é o acto pelo qual se leva um facto ao
conhecimento de uma pessoa e pode revestir a forma de notificação pessoal ou
notificação não pessoal (consoante, respectivamente, seja ou não feita de “viva voz”,
na própria pessoa do interessado). A notificação não pessoal, por seu lado, poderá ser
feita por meio de éditos (notificação edital) ou por via postal. Esquematicamente:

Pessoal
Notificação Edital
Não Pessoal
Postal

29
No caso de um sujeito passivo de imposto, torna-se extremamente importante
conhecer o seu domicílio fiscal, cuja comunicação é obrigatória (art. 19.°, n.° 2, da
LGT), assim como a sua modificação, sendo esta absolutamente ineficaz se não for
devidamente comunicada (art. 19.°, n.° 3, da LGT e art. 43.°, n.° 2, do CPPT) – isto é, se
a modificação não for comunicada, essa modificação não produzirá efeitos em relação
à Administração tributária, não lhe sendo, portanto, oponível. Quanto aos sujeitos
passivos não residentes, existe uma obrigação de nomeação de um representante
residente em território nacional (art. 19.°, n.° 4, da LGT), consistindo a sua falta uma
contra-ordenação fiscal punível com coima (art. 124.° do RGIT).

Nos termos do art. 36º, n.º 1 do CPPT e do art. 77º, n.º 6 da LGT, a notificação tem um
efeito meramente declarativo (e não constitutivo); isto é, o acto tributário existe e é
válido, sendo que a notificação é uma condição de eficácia do mesmo (só com a
notificação é que o acto poderá começar a produzir efeitos jurídicos).

O regime das notificações em matéria tributária

Existem requisitos que as notificações devem respeitar para ser válidas.

Tenhamos presente que as notificações em matéria tributária assumem geralmente a


forma de notificações postais, uma vez que as notificações pessoais (arts. 38.°, n.os 5 e
6, e 192.° do CPPT) e editais (art. 249.° do CPPT) apenas têm lugar excepcionalmente
(ie, quando a lei expressamente o preveja ou quando a entidade que a elas proceder o
considere adequado)14.

Em matéria de validade das notificações, deve-se distinguir os requisitos formais dos


requisitos materiais ou substanciais.

(i) Requisitos formais. Prendem-se, naturalmente, com a forma que deve revestir a
notificação, devendo ser aqui distinguidas três situações:

— a notificação de actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária


dos contribuintes (ex.: a comunicação da alteração de regime em sede de IVA, ou a
comunicação de que o contribuinte deixa de estar isento de um determinado imposto)
ou a convocação para assistirem ou participarem em actos ou diligências, devem ser
efectuadas mediante carta registada com aviso de recepção (art. 38º, n.º 1 do CPPT).
Neste caso, a notificação considera-se efectuada na data em que o aviso de recepção

14
Quanto às notificações em matéria tributária feitas a mandatários (v. g., advogados) e a pessoas
colectivas, cfr., respectivamente, arts. 40.º e 41.º do CPPT.

30
for assinado pelo próprio. Se o aviso for assinado por terceiro presente no domicílio, a
notificação tem-se por efectuada na pessoa do notificando, presumindo-se que esse
terceiro lhe entregou a carta (art. 39.°, n.° 3, do CPPT)15;

— a liquidação de impostos periódicos – isto é, aqueles cujo facto constitutivo não tem
natureza ocasional - feita no prazo legalmente previsto deverá ser efectuada por
simples via postal (art. 38.°, n.° 4, do CPPT);

— todos os restantes actos deverão ser comunicados por carta registada, que, assim,
parece configurar-se como a regra nesta matéria (v. art. 38.°, n.° 3, do CPPT)16. A
notificação considera-se efectuada no 3.° dia posterior ao do registo (ou no primeiro
dia útil seguinte a este, quando esse 3.° dia não seja útil — art. 39.°, n.° l, do CPPT).

(ii) Requisitos substanciais. Aqui estamos a referirmo-nos ao conteúdo das


notificações, que deverão sempre conter, segundo o art. 36.°, n.° 2, os seguintes
elementos:

— a decisão;

— os fundamentos da decisão;

— a indicação da entidade que o praticou, com indicação de eventual delegação ou


sub-delegação de competências);

— os meios de defesa; e

— o prazo de reacção contra o acto notificado.

Na falta dos requisitos referidos, o interessado pode requerer (gratuitamente) a


notificação dos elementos que tenham sido omitidos. Tal requerimento pode ser feito
no prazo de 30 dias, ou no prazo de reclamação, recurso ou impugnação que caiba da
decisão em causa, se tal prazo for inferior aos 30 dias – cfr. art. 37º do CPPT.

Em todo o caso, e como decorrência do que já referimos, a ausência de notificação ou


a notificação juridicamente mal efectuada terá como consequência a ineficácia do acto
em causa e não a sua invalidade.

15
Quanto às situações de devolução ou não assinatura do aviso de recepção, vale o n.° 5 do mesmo
artigo.
16
Neste caso, e no da liquidação de impostos periódicos feita no prazo previsto legalmente as
notificações ainda poderão ser feitas por internet, quando possa haver posterior confirmação da
mensagem enviada (art. 38.°, n.° 8, do CPPT).

31
3.11. O princípio do duplo grau de decisão

Uma mesma pretensão do contribuinte não pode ser apreciada por mais de dois
órgãos integrando a mesma cadeia hierárquica (como forma de assegurar, na medida
do possível, alguma celeridade para obter a última palavra). O que significa que:

- só se pode recorrer administrativamente uma vez;

- após uma segunda decisão administrativa desfavorável, o acto tributário considera-se


verticalmente definitivo, estando assim aberta a porta para o controlo jurisdicional17.

Este princípio tem o seu âmbito de aplicação no quadro dos procedimentos petitórios
— nos quais se pede algo: a anulação de um acto, a sua revogação, o reconhecimento
de um benefício, etc. — e naqueles casos em que o particular, no seguimento de uma
decisão desfavorável, e antes de recorrer ao tribunal, procura uma "segunda opinião"
dentro da Administração, quer essa "segunda opinião" seja obrigatória (recurso
necessário - cfr., por exemplo, arts. 86°, n.° 5, da LGT e 117.° do CPPT), quer o não seja
(recurso facultativo - cfr. arts. 66.°, n.° 2. e 76.°, n.° l, do CPPT).

A este propósito prescreve o art. 47.° do CPPT, no seu n.° l, que "no procedimento
tributário vigora o princípio do duplo grau de decisão, não podendo a mesma
pretensão do contribuinte ser apreciada sucessivamente por mais de dois órgãos
integrando a mesma Administração tributária", e, como modo de efectivar esse duplo
grau, estabelece a regra de que "o pedido de reapreciação da decisão deve, salvo lei
especial, ser dirigido ao dirigente máximo do serviço ou a quem ele tiver delegado essa
competência"18. Para estes efeitos, considera-se que a pretensão é a mesma em caso
de identidade do autor e dos fundamentos de facto e de direito invocados (art. 47.°,
n.° 2).

Se esta nova pronúncia administrativa continuar a ser desfavorável, não poderá ser
emitida uma terceira, restando ao interessado a abertura da via contenciosa.

17
Tal não significa, contudo, que o acto não pudesse já anteriormente ser objecto de controlo em
tribunal. Em matéria tributária, muitas vezes não se exige a definitividade vertical como condição prévia
de acesso ao controlo jurisdicional (pense-se, por exemplo, no acto de liquidação, directamente sujeito
a tal controlo).
18
Cfr. ainda art. 66.°, n.º 2, do CPPT. Uma excepção à regra de que a reapreciação deve ser dirigida ao
dirigente máximo do serviço pode ser encontrada, por exemplo, no art. 3.°, n.° 8, do DL 360/99, de
acordo com o qual as decisões somente podem ser objecto de recurso para o superior hierárquico
imediato.

32
4. AS PARTES NO PROCEDIMENTO

4.1. Pressupostos procedimentais

Para se intervir num procedimento como actor ou como parte é necessário que se
tenha:

a) Personalidade procedimental tributária, que consiste na susceptibilidade de poder


intervir no procedimento, seja a que título for. É, no fundo, a possibilidade de
participar/intervir no procedimento tributário.

A personalidade procedimental tributária resulta da personalidade tributária, que é a


susceptibilidade de ser sujeito de relações tributárias.

b) Capacidade procedimental tributária, que consiste na medida de direitos e


obrigações que, num determinado momento, uma pessoa ou ente equiparado é
susceptível de ter e de exercer pessoal e livremente. É, no fundo, o conjunto de
direitos e obrigações que o interveniente no procedimento possui e pode exercer
pessoal e livremente.

A capacidade procedimental tributária resulta da capacidade tributária (capacidade de


exercício dos direitos e obrigações) - assim, cfr. art. 3.°, n.° 2, do CPPT.

Em princípio, quem tem personalidade tributária tem também capacidade tributária –


é o que resulta do art. 16.°, n.° 2 da LGT. Se assim é, a personalidade tributária está na
base da atribuição quer da personalidade procedimental tributária, quer da
capacidade procedimental tributária.

Com a verificação dos requisitos relativos à personalidade e capacidade procedimental


tributárias, tem-se em vista assegurar que quem intervém no procedimento pode fazê-
lo.

4.2. Legitimidade no procedimento

De acordo com o art. 9.°, n.° l, do CPPT, têm legitimidade para participar no
procedimento tributário:

- a Administração Tributária,

- os contribuintes (sujeitos passivos de imposto, incluindo “outros obrigados


tributários”),

33
- as partes nos contratos fiscais e

- outras pessoas que provem interesse legalmente protegido.

A falta de legitimidade dos intervenientes não acarreta necessariamente um valor


jurídico negativo para o procedimento. Nem os actos procedimentais, nem o próprio
procedimento são inválidos, mas apenas ineficazes em relação àqueles sujeitos. A
legitimidade parece assumir, pois, a natureza de elemento de eficácia (e não de
validade) da pretensão.

4.2.1. A Administração tributária

a) Noção de Administração tributária e enquadramento da sua actividade

Embora em abstracto a Administração tributária possa ser encarada como uma parte
interessada no procedimento – ou seja, enquanto credor tributário que subordina a
sua vontade a um interesse financeiro de arrecadação de receitas públicas e que,
assim, é interessada numa dada solução -,o certo é que a correcta captação do seu
papel passa pela sua consideração como um actor procedimental isento, que aplica o
Direito e prossegue o interesse público na sua vertente de justiça e verdade material.

Neste quadro, a Administração tributária abrange (art.º 1.°, n.°3, da LGT):

— a direcção geral dos impostos (DGCI);

— a direcção geral das alfândegas e dos impostos especiais sobre o consumo (DGAIEC)
- Cfr. DL 360/99 e Portaria 705-A/2000, de 31 de Agosto, que aprovam, res-
pectivamente, a estrutura orgânica e o regulamento orgânico e de funcionamento da
DGAIEC.

— a direcção geral da informática e apoio aos serviços tributários e aduaneiros (DGITA)


- Cfr. art. 20." do DL 205/2006, de 27 de Outubro (que aprova a orgânica do Ministério
das Finanças e da Administração Pública).

— outras entidades públicas legalmente incumbidas da liquidação e cobrança de


tributos;

— o Ministro das Finanças ou outro membro do Governo competente, quando


exerçam competências administrativas no domínio tributário;

— órgãos competentes dos Governos Regionais e das Autarquias Locais quando


exerçam competências administrativas no domínio tributário.

34
A actuação da Administração tributária não é uma actuação livre, mas um actuação
vinculada à Constituição e à Lei; assim:

- a vinculação à Constituição (princípio da constitucionalidade da actuação


administrativa) impõe à Administração tributária a obediência a princípios
constitucionais - legalidade, igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade, boa-
fé –, aos direitos fundamentais previstos na CRP e a uma determinada estrutura
organizatória. No último núcleo apontado, os maiores problemas poderão surgir no
âmbito da delimitação das esferas de competência dos órgãos administrativos em face
das esferas de competência dos órgãos jurisdicionais. Mas aqui vale um princípio de
reserva da função jurisdicional: "toda e qualquer resolução de questões jurídicas deve
ser, em última instância, levada a cabo por um tribunal" (art. 202.° da CRP).

- a vinculação à lei impõe à Administração tributária a obediência à lei em sentido


material, englobando, portanto, qualquer acto normativo de conteúdo geral e
abstracto (lei, decreto-lei).

b) A fixação da competência da Administração Tributária

Para a Administração Tributária agir, ela necessita de competência. Entende-se por


competência o conjunto ou complexo de poderes funcionais legalmente afectos a um
determinado órgão administrativo para este prosseguir as funções que lhe estão
juridicamente atribuídas.

A competência dos órgãos da Administração tributária não é atribuída em bloco nem é


posteriormente exercida de uma forma igual por todos. É, isso sim, uma competência
atribuída por critérios, que são os seguintes:

Competência em razão da matéria

A Administração tributária exerce a sua competência em matéria de tributos e não no


âmbito criminal, cível, constitucional, urbanístico ou qualquer outro.

O legislador — numa enumeração não exaustiva19 — aponta alguns núcleos relevantes


de actuação da Administração Tributária em matéria de tributos, sendo de destacar as
competências para:

— liquidar e cobrar tributos (arts. 78.º e ss. do CPPT);

19
Dado que o art. 10.°. n.° l, alínea j) do CPPT inclui na competência dos serviços da Administração
tributária a “realização dos demais actos que lhes sejam cometidos por lei”.

35
— proceder à revisão oficiosa dos actos tributários (art. 78.º da LGT);

— decidir petições e reclamações (arts. 68.° e ss. do CPPT);

— pronunciar-se sobre recursos hierárquicos (arts. 66.° e 67.° do CPPT);

— reconhecer isenções ou outros benefícios fiscais (art. 65.° do CPPT);

— receber e tratar as petições nos processos de impugnação judicial (arts. 103 e ss. do
CPPT);

— instaurar os processos de execução fiscal (art. 188.° do CPPT).

A competência tributária em razão do território

Várias são as hipóteses de delimitação da competência territorial (art. 10.°, n.° 2, do


CPPT):

1) Em primeiro lugar, a competência pode ser determinada em função da área


onde ocorreu o facto jurídico, sendo competente para a prática do acto em causa o
órgão da Administração tributária desse lugar, sendo irrelevante, por exemplo, o
domicílio de quem o praticou.
Tal verifica-se, nomeadamente, no que diz respeito à competência da
Administração tributária para a aplicação de coimas ( o que pressupõe, naturalmente,
uma infracção tributária) - V. art. 52.°, alínea b), do RGIT.

2) Em segundo lugar, tal competência pode ser determinada em função da área


da residência (domicílio ou sede do contribuinte), sendo competente o órgão da
Administração tributária que se localize na área onde reside o contribuinte.
Exemplo: a competência dos serviços de finanças em matéria de IVA (art. 70.°
do CIVA) ou a competência para a prática de actos de inspecção tributária (art. 16° do
RCPIT).

3) Pode ainda a competência ser determinada em função da área da situação dos


bens (lex rei sitae). Como consequência, será competente para a prática do acto
tributário o órgão da Administração tributária localizado na área onde determinado
bem se situa.
Este critério tem o seu campo de aplicação por excelência no domínio dos
impostos sobre a propriedade de bens imóveis. É o que se passa, por exemplo, em
sede de imposto municipal sobre imóveis no que diz respeito à organização e
conservação das matrizes (art. 78.°, n.º l, do CIMI), à revisão oficiosa da liquidação (art.

36
115.°, n.° 2, do CIMI) ou à apreciação de reclamações (art. 131.° do CIMI).

4) Por fim, a competência pode ainda ser determinada em função da área onde se
deve efectuar, ou efectuou, o acto tributário por excelência: a liquidação.
Este critério é normalmente utilizado nos denominados “procedimentos de
segundo grau”, como a impugnação administrativa ou reclamação do acto de
liquidação, ou o reconhecimento de um benefício fiscal. Por exemplo, nos termos do
art. 65.°, n.° 2, do CPPT, "os pedidos de reconhecimento [de benefícios fiscais] serão
apresentados nos serviços competentes para a liquidação do tributo a que se refere o
benefício...'".

Naturalmente que a aplicação destes critérios depende da escolha do legislador. Por


outro lado, a existência destes critérios não impede a existência de órgãos (os
"serviços centrais") cuja competência abrange todo o território nacional – v. por
exemplo, art. 75.º do CIRS. art. 82.°. alínea b), do CIRC e art. 113.° do CIMI.

A competência tributária em razão da hierarquia

A competência em razão da hierarquia é importante para efeitos de recurso das


decisões (para se saber quem vai reapreciar as decisões com o intuito, por exemplo, de
as revogar ou de as anular).

Assim, por exemplo, se a reclamação graciosa tiver por objecto um acto de


autoliquidação ou de retenção na fonte, ela deve ser dirigida ao dirigente do órgão
periférico regional da Administração tributária (direcção distrital de finanças) - Assim,
arts. 131.°, n.º l, e 132.°, n.º 3, do CPPT -, enquanto que se a reclamação tiver por
objecto pagamentos por conta, já deve ser feita para o órgão periférico local
(repartição de finanças) - Art. 133.°, n.° 2, do CPPT.

A estrutura modelar em termos de hierarquia é a seguinte:

37
Titular Órgão
Ministro (das finanças) Ministério

Secretário de Estado (dos assuntos fiscais)


Secretaria de Estado
(Sub-secretário de Estado)

Director Geral (dos impostos


Direcção-Geral
(Sub-director geral)

Director distrital (de finanças) Órgão Periférico Regional

Chefe da repartição de finanças Órgão Periférico Local

A competência tributária em razão do valor

Por último, determinado órgão da Administração também pode ser, ou não,


competente para praticar certo acto em função do valor da questão jurídica que lhe
está subjacente. Em geral, a competência em razão do valor está associada à
hierarquia dos órgãos em causa, de modo que é legítimo pensar que em alguns casos
os órgãos de hierarquia superior são competentes para conhecer das causas de maior
valor pecuniário ou patrimonial.

Assim, por exemplo, no âmbito do procedimento de Reclamação Graciosa, quando o


valor da causa não exceder o quíntuplo da alçada do Tribunal Tributário, o órgão
periférico local pode decidir de imediato; quando exceder, a reclamação será remetida
para órgão superior – assim, cfr. art. 73º, n.º 4 e 5 do CPPT.

Outros exemplos estão ainda previstos no art. 112º, n,º 1 e 2 do CPPT e no art. 197º
também do CPPT.

O valor da causa é aferido pelos critérios traçados pelo próprio legislador no art. 97º-A,
n.º 1 – e que, embora traçados apenas para o processo, podem ser aplicados
analogicamente no procedimento.

38
Os conflitos de competência

Pode por vezes suceder que da aplicação dos critérios acima referidos surja um
conflito positivo (dois ou mais órgãos consideram-se competentes para decidir) ou
negativo (nenhum órgão se considera competente para decidir) de competência.
Nestes casos, o legislador prevê uma nova série de critérios (art. 11.° do CPPT):

— os conflitos positivos ou negativos de competência entre diferentes serviços do


mesmo órgão da Administração tributária são resolvidos pelo seu dirigente máximo;

— os conflitos positivos ou negativos de competência entre órgãos da Administração


tributária pertencentes ao mesmo ministério são resolvidos pelo ministro respectivo;

— os conflitos positivos ou negativos de competência entre órgãos da Administração


tributária pertencentes a ministérios diferentes são resolvidos pelo Primeiro-Ministro;

— os conflitos positivos ou negativos da competência entre órgãos da Administração


tributária do governo central, dos governos regionais e das autarquias locais são
resolvidos pelos tribunais tributários.

Se da aplicação destes critérios não resultar uma conclusão convincente acerca de


quem seja competente para a prática de um determinado acto procedimental,
considera-se competente o órgão da Administração tributária da área do domicílio
fiscal do sujeito passivo ou interessado, ou do seu representante legal (art. 61.°, n.º 4,
da LGT).

A Incompetência

O desrespeito das regras de atribuição de competência desencadeia uma reacção


adversa do ordenamento jurídico que, em casos normais, passará:

a) Pela remessa das peças do procedimento para o órgão competente.


Pode acontecer que a entidade administrativa incompetente não chegue
sequer a praticar qualquer acto procedimental. Nos casos de violação das regras
atributivas de competência em função da matéria ou do território – por exemplo, se o
sujeito passivo apresentar uma reclamação numa repartição de finanças que não a da
sua área de residência -, o órgão incompetente "é obrigado a enviar as peças do pro-
cedimento para o órgão da Administração tributária competente no prazo de 48 horas
após a declaração de incompetência" (art. 61.°, n.° 2, da LGT). Nestes casos, o
requerimento considera-se apresentado na data do primeiro registo e o interessado
deverá ser devidamente notificado de tal remessa (idem, n.° 3).

39
b) Ou pela consideração do acto em causa como anulável.
Pode acontecer que a entidade incompetente pratique actos procedimentais,
decidindo sem ter competência para tal. Nestas situações, o acto em causa pode ser
atacado quer administrativamente (reclamação graciosa), quer jurisdicionalmente
(impugnação judicial), existindo aqui uma ilegalidade susceptível de conduzir à sua
anulação (Cfr. arts. 70.°, n.° l, e 99.°, alínea b), do CPPT).

4.2.2. Os sujeitos passivos

Em matéria de impostos deve ser feita a distinção entre o sujeito passivo directo e o
sujeito passivo indirecto:

- o sujeito passivo directo, que é a pessoa ou entidade relativamente à qual o


legislador presume capacidade contributiva, ou seja, é o usufrutuário de um
determinado benefício económico (como a percepção de um rendimento, a
titularidade de um património ou a efectivação de um acto de despesa);

- o sujeito passivo indirecto, ao qual é exigido o imposto em algumas situações; é uma


categoria que engloba situações muito diversas como a substituição tributária, a
sucessão tributária e a responsabilidade tributária).

Todos eles - sujeitos passivos directos e indirectos - têm legitimidade para intervir no
procedimento tributário, embora com regras de tempestividade distintas. A título de
exemplo, pode-se referir que o sujeito passivo directo pode reclamar graciosamente
da liquidação dos tributos que lhe digam respeito no prazo de 120 dias a contar do
termo do prazo de pagamento voluntário [arts. 70.°, n.° l, e 102.°, n.° l, alínea a), do
CPPT]; já o responsável subsidiário pode reclamar no mesmo prazo contado a partir da
citação em processo de execução fiscal [art. 102.°, n.° l, alínea c), do CPPT e art. 22.°,
n.° 4, da LGT].

5. OS PROCEDIMENTOS TRIBUTÁRIOS EM ESPECIAL

Se a maior parte dos procedimentos está prevista no CPPT, muitos encontram-se


também dispersos por inúmeros diplomas: a LGT, o CIRS, o CIRC, o CIVA, o RCPIT, o
CIMI, o CIMT, etc.

40
Devemos distinguir os seguintes tipos de procedimentos:

- procedimentos pré-liquidatórios, que têm lugar, em regra, antes da liquidação de


qualquer tributo. Aqui incluem-se os procedimentos de natureza informativa, os
procedimentos de avaliação, o procedimento de reconhecimento de benefícios fiscais
e o procedimento de ilisão de presunções;

- procedimentos de liquidação e cobrança de tributos, que são os procedimentos


nucleares da técnica tributária;

- procedimentos impugnatórios, que são os procedimentos que materializam meios de


reacção – quer do contribuinte, quer da Administração Tributária – a um acto anterior,
já praticado. Aqui se inclui o procedimento de revisão da matéria colectável, o
procedimento de revisão dos actos tributários, o procedimento de reclamação
graciosa, o procedimento de recurso hierárquico e o procedimento de correcção dos
erros da Administração Tributária;

- procedimentos cautelares, que têm por objectivo salvaguardar a posição da


Administração tributária e garantir os créditos tributários.

5.1. Procedimentos de natureza informativa

5.1.1. Procedimentos cujo destinatário da informação é o contribuinte

5.1.1.1 Procedimento de orientações genéricas

Não raras vezes, os destinatários das normas tributárias encontram muitas


dificuldades em proceder à aplicação prática, concreta, daquilo que vem previsto na
lei. Essas dificuldades passam, por exemplo, por não saber se uma determinada
despesa pode ser deduzida no âmbito de um certo imposto ou se um determinado
sujeito pode ser considerado deficiente para efeitos de isenção, etc.

Na tentativa de contornar estas dificuldades, a Administração tributária pode lançar


mão do procedimento de orientações genéricas, previsto nos arts. 55.º e 56.° do CPPT.
O objectivo deste procedimento reside na uniformização da interpretação e
integração das normas tributárias e através dele a Administração tributária pode, por
sua própria iniciativa, emanar directivas ou quadros que devem presidir à aplicação de
determinada norma ou conjunto de normas.

Assim sendo, este procedimento, ao contrário dos outros, não culmina na emanação
de um acto tributário individual e concreto, mas antes na emissão de um acto de
conteúdo geral e abstracto: uma circular administrativa (art. 55.°, n.° 3, do CPPT), que

41
deve ser emanada pelo dirigente máximo do serviço em causa, ou funcionário em
quem ele tenha delegado essa competência.

A circular administrativa que contém uma informação genérica não se trata, pois, de
um mero parecer ou indicação! Trata-se antes de uma verdadeira circular normativa
sobre a interpretação e aplicação de preceitos legais, com efeito vinculativo. O próprio
legislador prevê tal efeito vinculativo ao prescrever, na alínea b) do n.° 4 do art. 68.° da
LGT que a Administração tributária está vinculada "às orientações genéricas
constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza emitidas
sobre a interpretação das normas tributárias que estiverem em vigor no momento do
facto tributário".

Assim, se o contribuinte entregar as suas declarações seguindo as instruções de uma


circular administrativa e, mais tarde, conseguir a anulação do acto de liquidação
subsequente à entrega das ditas declarações, o contribuinte pode ter direito a juros
indemnizatórios, nos termos do art. 43º, n.º 1 e 2 da LGT, pois considera-se que houve
erro imputável aos serviços da Administração tributária (uma vez que está a ser
anulado um acto tributário praticado com base em informações fornecidas pela
própria Administração tributária).

E como chega a circular administrativa ao conhecimento do contribuinte? Isto é, como


é dada publicidade à circular administrativa? Mediante publicação da circular
administrativa numa "base de dados permanentemente actualizada" de acesso
gratuito, livre e directo, ou seja, sem a prévia exigência de palavras-chave ou códigos
secretos - Cfr. art. 56.°, n.os l e 2, do CPPT. Desta forma se garante que os contribuintes
possam ter um atempado conhecimento das orientações genéricas e, assim, que estas
possam ser efectivamente vinculativas20.

5.1.1.2. Procedimento de informações vinculativas

O procedimento de informações vinculativas tem como objectivo facilitar o


cumprimento das obrigações fiscais e encontra-se previsto nos arts. 57º do CPPT e 68º
da LGT. Trata-se de um meio expedito e eficaz através do qual os contribuintes podem
pedir à Administração tributação a prestação de informações sobre (e apenas):

a) a concreta situação tributária dos contribuintes21 ou

20
Também existe uma outra forma de conhecimento das orientações genéricas ou das circulares em
que elas se incorporam: comunicação individual da orientação genérica mediante um requerimento
formulado pelo interessado num determinado procedimento e dirigido ao dirigente máximo do serviço
em causa (art. 56.°, n.os 3 e 4, do CPPT).
21
Prescreve o art. 67.°, n.° l, alínea c), da LGT que "o contribuinte tem direito à informação sobre (...) a

42
b) os pressupostos de quaisquer benefícios fiscais22.

O pedido deve ser feito/apresentado por quem? Pelos próprios sujeitos passivos ou
outros interessados (v.g., ex-cônjuges, ex-sócios), ou ainda pelos representantes legais
de uns ou de outros (art. 68.°, n.º 4, da LGT).

A quem deve ser dirigido o pedido? Ao dirigente máximo do serviço, que é a entidade
competente para proferir a decisão (art. 68.°, n.º l, da LGT).

Qual o prazo de resposta da Administração tributária? A Administração tributária deve


dar uma resposta no prazo máximo de 90 dias, nos termos do art. 68º, n.º 4 da LGT. No
entanto, a informação pode ser prestada com carácter de urgência no prazo de 60 dias
mediante solicitação justificada do requerente (e se o pedido for acompanhado de
uma proposta de enquadramento tributário) – assim, v. art. 68º, n.º 2 da LGT.

Os órgãos administrativo-tributários ficam vinculados à resposta prestada nos


seguintes termos:

a) Trata-se de uma vinculação inter-partes, já que a Administração tributária fica


obrigada a proceder de acordo com a informação que prestou apenas em relação ao
caso concreto objecto do pedido. Desta forma, apenas o concreto destinatário deste
procedimento pode exigir uma actuação da Administração tributária conforme à
informação prestada.
Assim sendo, a Administração tributária não fica vinculada a proceder de
acordo com a informação prestada em qualquer outra situação, uma vez que o
procedimento não tem eficácia erga omnes, mas apenas inter-partes.

b) Trata-se ainda de uma vinculação sujeita a condição, na medida em que ela


apenas se verifica a partir da notificação da informação (art. 57.°, n.° l, CPPT).

c) É uma vinculação relativa e não absoluta, no sentido de que a informação


prestada cede perante uma decisão em contrário dos tribunais (art. 68.°, n.° 14 da
LGT).

sua concreta situação tributária".


22
Note-se que quando o despacho recair sobre os pressupostos de qualquer benefício fiscal dependente
de reconhecimento, os interessados não ficam dispensados de o requerer autonomamente nos termos
da lei (art. 57.°, n.° 2, do CPPT). Além disso, apresentado o pedido de reconhecimento de benefícios
fiscais (cfr. art. 65.° do CPPT) que tenha sido precedido do pedido de informação vinculativa, este ser-
lhe-á apensado a requerimento do interessado, devendo a entidade competente para a decisão
conformar-se com o anterior despacho (na medida em que a situação hipotética objecto do pedido de
informação vinculativa coincida com a situação de facto objecto do pedido de reconhecimento — cfr.
art. 57.°, n.° 3, do CPPT).

43
As informações vinculativas caducam no caso de alteração superveniente dos
pressupostos de facto ou de direito em que assentaram (v. art. 68º, n.º 15 LGT).

De salientar, por último, que as informações prestadas não poderão, a posteriori, ser
alteradas nem revogadas com efeitos retroactivos, em nome do princípio da segurança
jurídica e da protecção da confiança (neste caso, das legítimas expectativas criadas
pelos destinatários das informações). As informações vinculativas também não são
impugnáveis ou recorríveis, uma vez que não incorporam qualquer acto lesivo (neste
sentido, acórdão do STA de 08 de Novembro de 2006).

5.1.2 Procedimentos cujo destinatário da informação é a Administração tributária

5.1.2.1 Procedimento de Inspecção Tributária

a) Enquadramento do procedimento de inspecção tributária

O procedimento de inspecção tributária tem como objectivos (i) a observação das


realidades tributárias, (ii) a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e
(iii) a prevenção das infracções tributárias (art. 2.°, n.° l, do RCPIT)23.

Para a prossecução destes objectivos, e nos termos do art. 2º, n.º 2 do RCPIT, o
procedimento de inspecção tributária compreende, entre outras, as seguintes
actuações:

— a confirmação dos elementos declarados pelos sujeitos passivos;

— a indagação de factos tributários não declarados pelos sujeitos passivos;

— a inventariação e avaliação de bens, móveis ou imóveis, para fins de controlo do


cumprimento das obrigações tributárias;

— a realização de perícias ou exames técnicos de qualquer natureza;

— a promoção do sancionamento das infracções tributárias.

A inspecção tributária deve sempre obedecer aos princípios da verdade material, da


proporcionalidade, do contraditório e da cooperação (art. 5.° e seguintes do RCPIT).

23
A disciplina jurídica do procedimento de inspecção tributária consta do Regime Complementar do
Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), aprovado pelo DL 413/98, de 31 de Dezembro. Nos
termos do art. 4º do RCPIT, aplica-se subsidiariamente a este procedimento o disposto na LGT, no CPPT,
nos demais códigos e leis tributárias (por exemplo, arts. 134.º e 135.º do CIRS), na lei orgânica da
Direcção-Geral dos Impostos e respectivos diplomas regulamentares e no CPA.

44
b) Espécies de inspecção tributária

O procedimento de inspecção tributária pode ser classificado de acordo com vários


critérios.

I. Quanto às finalidades (art. 12.° do RCPIT):

— Procedimentos inspectivos de comprovação e verificação. O que se visa com este


procedimento é a verificação do cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos e
demais obrigados tributários;

— Procedimentos inspectivos de informação. A finalidade destes procedimentos reside


no cumprimento dos deveres legais de informação dos quais a inspecção tributária
seja legalmente incumbida.

II. Quanto ao lugar da realização (art. 13.° do RCPIT):

— Procedimentos inspectivos internos, efectuados exclusivamente nos serviços da


Administração tributária (através da análise formal e de coerência dos documentos);

— Procedimentos inspectivos externos efectuados, total ou parcialmente, em


instalações dos sujeitos passivos ou em qualquer outro local a que a Administração
tenha acesso.

III. Quanto ao âmbito de abrangência material (art. 14.° do RCPIT):

— Procedimentos inspectivos gerais, quando estiver em causa a situação tributária


global dos sujeitos passivos;

— Procedimentos inspectivos parciais, quando estiver em causa apenas algum tributo


ou algum dever dos sujeitos passivos.

c) Os actores do procedimento de inspecção tributária

A Administração tributária

Conforme já foi abordado, para que os actos procedimentais possam ser considerados
válidos, têm de ser praticados pelo respectivo órgão competente. Ora, os órgãos da

45
Administração tributária competentes em matéria de inspecção tributária constam do
art. 16.° do RCPIT e são:

— a Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (DSPIT), relativamente


aos sujeitos passivos e demais obrigados que devam ser inspeccionados pelos serviços
centrais da Direcção-Geral dos Impostos;

— os serviços regionais, relativamente aos sujeitos passivos e demais obrigados


tributários com domicílio ou sede fiscal na sua área territorial;

— os serviços locais, relativamente aos sujeitos passivos e demais obrigados


tributários com domicílio ou sede fiscal na sua área territorial.

De referir que, de acordo com o princípio da confidencialidade já estudado, "o


procedimento da inspecção tributária é sigiloso, devendo os funcionários que nele
intervenham guardar rigoroso sigilo sobre os factos relativos à situação tributária do
sujeito passivo ou de quaisquer entidades e outros elementos de natureza pessoal ou
confidencial de que tenham conhecimento no exercício ou por causa das suas funções"
(art. 22.°, n.° 1 do RCPIT).

Os sujeitos passivos

Além dos sujeitos passivos originários, são também actores do procedimento de


inspecção tributária os demais obrigados tributários — como os substitutos e respon-
sáveis solidários ou subsidiários, os grupos de sociedades e os sócios das sociedades
transparentes — e quaisquer outras pessoas que tenham colaborado nas infracções
fiscais a investigar (art. 2.°, n.° 3 do RGIT).

As pessoas ou entidades visadas pela inspecção podem ser seleccionadas nos termos
do art. 27º, n.º 1 e 2 do RCPIT, que aponta as seguintes formas de selecção:

- de acordo com critérios objectivos de natureza geral ou programática constantes do


Plano Nacional de Actividades da Inspecção Tributária (PNAIT) ou definidos pelo
Director-Geral dos Impostos [art. 27.°, n.° l, alíneas a) e b)];

- mediante denúncia [art. 27.°, n.° l, alínea c)];

- mediante verificação de desvios significativos no comportamento fiscal dos sujeitos


passivos [art. 27.°, n.° l, alínea d)];

- por iniciativa do próprio sujeito passivo ou de terceiro que prove interesse legítimo
(art. 27.º, n.° 2).

46
O visado pelo procedimento de inspecção deverá ser notificado — pessoalmente ou
por via postal (art. 38.° do RCPIT) — com indicação da identificação do funcionário, dos
elementos pretendidos no âmbito do procedimento de inspecção, da fixação do prazo,
local e hora de realização dos actos de inspecção e da informação sobre as
consequências da violação do dever de cooperação (art. 37.°, n.° 2 do RCPIT).

Nas situações de inspecção externa, o início do procedimento deve ser notificado com
uma antecedência mínima de 5 dias por carta-aviso elaborada de acordo com modelo
aprovado pelo Director-Geral dos Impostos24, contendo os seguintes elementos (art.
49.°, n.os l e 2 do RCPIT)25:

— identificação do sujeito passivo ou obrigado tributário objecto da inspecção;

— âmbito e extensão da inspecção a realizar;

— os direitos, deveres e garantias dos visados no procedimento de inspecção.

Tal notificação deverá ainda obedecer às regras a seguir enunciadas:

a) No caso das pessoas singulares, deve-se observar o disposto nos arts. 35.º e ss.
CPPT, com as adaptações resultantes da aplicação do art. 39.° do RCPIT:

. em caso de notificação na pessoa de empregado ou colaborador, deve remeter-se

24
A notificação ao contribuinte do despacho do início da acção de inspecção externa faz suspender o
prazo de caducidade da liquidação do tributo em causa (art. 46.º. n.º l, da LGT). Nos casos em que a
duração da inspecção externa ultrapasse o prazo de 6 meses após a notificação, tal suspensão cessa e
como que se transforma em interrupção, passando-se a contar o prazo de caducidade desde o início.
25
Contudo, deve-se alertar para o facto de que existem situações que justificam uma dispensa de
notificação. Tais situações estão previstas no art. 50.° e são as seguintes:

— se o procedimento visar apenas a consulta, recolha ou cruzamento de documentos destinados à


confirmação da situação tributária do sujeito passivo;

— se o fundamento do procedimento for participação ou denúncia efectuada nos termos legais e estas
contiverem indícios de fraude fiscal;

— se o objecto do procedimento for a inventariação de bens ou valores em caixa, testes por


amostragem ou quaisquer actos necessários para aquisição e conservação da prova;

— se o procedimento consistir no controlo dos bens em circulação e da posse dos respectivos


documentos de transporte;

— se o procedimento se destine a averiguar o exercício de actividade por sujeitos passivos não


registados;

— se a notificação antecipada do início do procedimento de inspecção for, por qualquer motivo


devidamente fundamentado pela Administração tributária, susceptível de comprometer o seu êxito.

47
carta registada com aviso de recepção para o domicilio fiscal do sujeito passivo ou
obrigado tributário, dando-lhe conhecimento do conteúdo da notificação, do dia, da
hora e da pessoa em que foi efectuada;

. nas situações tributárias comuns ao casal, notificar-se-á qualquer dos cônjuges;

. caso a actividade objecto de procedimento de inspecção seja exercida ou se relacione


com apenas um dos cônjuges, a notificação deve ser feita, preferencialmente, na sua
pessoa, ainda que ambos os cônjuges sejam sujeitos passivos de imposto sobre o
rendimento das pessoas singulares (IRS).

b) Quanto às notificações das pessoas colectivas, aplica-se o disposto no art. 40.°


do RCPIT, de onde constam as seguintes regras:

. a notificação na pessoa de empregado ou colaborador, far-se-á mediante a entrega


do duplicado e a indicação que este deverá ser entregue ao representante da pessoa
colectiva;

. se o empregado, colaborador, ou representante do sujeito passivo ou outro obrigado


tributário se recusarem a assinar a notificação, recorrerá o funcionário a duas
testemunhas que com ele certifiquem a recusa, devendo todos em conjunto assinar a
notificação, após o que se entregará duplicado desta à pessoa notificada.

c) No caso de notificação de entidades residentes no estrangeiro, aplicam-se as


regras estabelecidas na legislação processual civil, com as necessárias adaptações,
observando-se o que estiver estipulado nos tratados e convenções internacionais e, na
sua falta, recorrer-se-á a carta registada com aviso de recepção, nos termos do
regulamento local dos serviços postais (art. 41.° do RCPIT).

A falta de colaboração ilegítima dos sujeitos obrigados pode ter como consequência,
não apenas a responsabilidade disciplinar, contra-ordenacional ou criminal da pessoa
em causa, mas igualmente a aplicação de métodos indirectos de tributação (cfr. art.
32º e 10.°, ambos do RCPIT)26.

26
Tal falta de colaboração, contudo, será legítima quando estiverem em causa actuações que impliquem
(art. 63.°, n.° 4, da LGT):

— o acesso à habitação do contribuinte;

— a consulta de elementos abrangidos pelo segredo profissional, bancário ou qualquer outro dever de
sigilo legalmente regulado, salvos os casos de consentimento do titular ou de derrogação do dever de
sigilo bancário pela Administração tributária legalmente admitidos;

48
d) Conteúdo do procedimento de inspecção

Dimensão material dos actos inspectivos

Prescreve o art. 28.° que "no âmbito do procedimento de inspecção e para efectivo
exercício da função inspectiva, a Administração faz uso das prerrogativas previstas no
artigo 63.° da Lei Geral Tributária". Assim, constituem actos inspectivos aqueles que se
consubstanciam nas seguintes actuações:

— aceder livremente às instalações do contribuinte;

— examinar os livros e registos da contabilidade ou escrituração;

— consultar o sistema informático, incluindo a documentação sobre a sua


programação e a execução;

— solicitar a colaboração de quaisquer entidades públicas;

— requisitar documentos dos notários, conservadores e outras entidades oficiais;

— utilizar as instalações dos visados quando forem necessárias à acção inspectiva.

Todas estas actuações deverão ser adequadas e proporcionais ao apuramento da


situação tributária do sujeito passivo (v., assim, art. 63.°, n.° 3, da LGT).

Dimensão espacial dos actos inspectivos

No que respeita aos procedimentos inspectivos externos, quando o procedimento de


inspecção envolver a verificação da contabilidade, livros de escrituração ou outros
documentos relacionados com a actividade da entidade a inspeccionar, os actos de
inspecção realizam-se nas instalações ou dependências onde estejam ou devam
legalmente estar localizados os elementos (art. 34.° do RCPIT).

Dimensão temporal dos actos inspectivos

Quanto ao momento da realização dos actos inspectivos, o art. 35.° do RCPIT estipula a

— o acesso a factos da vida intima dos cidadãos;

— a violação dos direitos de personalidade e outros direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, nos
termos e limites previstos na Constituição e na Lei.

Nestes casos, a diligência só poderá ser realizada mediante autorização concedida pelo tribunal da
comarca competente com base em pedido fundamentado da Administração tributária (n.° 5).

49
regra de que os actos de inspecção se realizam no horário normal de funcionamento
da actividade empresarial ou profissional, não devendo implicar prejuízo para esta.

Contudo, e mediante acordo com os sujeitos passivos ou demais obrigados tributários


e quando circunstâncias excepcionais o justifiquem, poderão tais actos ser praticados
fora desse horário (sendo que na falta de acordo, a inspecção fora do horário normal
de funcionamento depende de autorização judicial).

e) As consequências do procedimento de inspecção tributária

Concluída a prática de actos de inspecção, e caso os mesmos possam originar actos


tributários ou em matéria tributária desfavoráveis à entidade inspeccionada, esta deve
ser notificada, no prazo de 10 dias, do projecto de conclusões do relatório, com a
identificação desses actos e a sua fundamentação (n.° l do art. 60.° do RCPIT)27. Essa
notificação deve fixar um prazo entre 8 e 15 dias para a entidade inspeccionada se
pronunciar e, após a prestação das declarações desta, será elaborado o relatório
definitivo, assinado pelos funcionários intervenientes no procedimento, que deve
conter os seguintes elementos (art. 62.°, n.° 2 do RCPIT):

— identificação da entidade inspeccionada, designadamente denominação social,


número de identificação fiscal, local da sede e serviço local a que pertence;

— menção das alterações a efectuar aos dados constantes nos ficheiros da


Administração tributária;

— data do início e do fim dos actos de inspecção e das interrupções ou suspensões


verificadas;

— âmbito e extensão do procedimento;

— descrição dos motivos que deram origem ao procedimento, com a indicação do


número da ordem de serviço ou do despacho que o motivou;

— informações complementares, incluindo os principais devedores dos sujeitos


passivos e dos responsáveis solidários ou subsidiários pelos tributos em falta;

— descrição dos factos susceptíveis de fundamentar qualquer tipo de responsabilidade


solidária ou subsidiária;

27
Note-se que se tiver sido decretado na pendência de procedimento de inspecção tributária um
eventual arresto de bens, este fica sem efeito se a entidade inspeccionada não for notificada do
relatório de inspecção no prazo de 90 dias a contar da data do seu decretamento (art. 137.°, n.° 2, do
CPPT).

50
— acréscimos patrimoniais injustificados ou despesas desproporcionadas efectuadas
pelo sujeito passivo ou obrigado tributário no período a que se reporta a inspecção;

— descrição dos factos fiscalmente relevantes que alterem os valores declarados ou a


declarar sujeitos a tributação, com menção e junção dos meios de prova e
fundamentação legal de suporte das correcções efectuadas;

— indicação das infracções verificadas, dos autos de notícia levantados e dos


documentos de correcção emitidos;

— descrição sucinta dos resultados dos actos de inspecção e propostas formuladas;

— identificação dos funcionários que o subscreveram, com menção do nome,


categoria e número profissional;

— outros elementos relevantes.

Este relatório definitivo, que poderá ser sancionado pelo Director-Geral dos Impostos
(art. 64.°, n.° 1 do RCPIT)28, produz efeitos vinculativos (inter-partes) para o
contribuinte e a Administração, que não pode proceder em sentido diverso ao teor das
conclusões (art. 64º, n.º 4 do RCPIT):

- relativamente à entidade inspeccionada; e

- nos três anos seguintes à notificação das conclusões do relatório.

5.1.2.2 Procedimento de acesso a informações bancárias

O direito dos contribuintes ao sigilo (à reserva de intimidade da vida privada e familiar)


pode entrar em conflito com o poder-dever de inspecção da Administração tributária
(que prossegue o interesse da justa repartição dos encargos públicos). Portanto,
estamos no âmbito de uma situação em que o dever de sigilo recai não sobre a
Administração tributária, mas sobre outros actores.

Ora, a situação económica do cidadão, espelhada na sua conta bancária, incluindo as

28
O pedido de sancionamento poderá ser efectuado no prazo de 30 dias após a notificação das
conclusões do relatório e identificará as matérias sobre as quais o requerente pretenda que recaia
sancionamento, considerando-se tal pedido tacitamente deferido se a Administração Tributária não se
pronunciar no prazo de 6 meses (art. 64.°, n.os 3 e 4 do RCPIT).

51
operações activas e passivas nela registadas faz parte da esfera da sua vida privada29 e,
por isso, não está sujeita a divulgação livre, mas antes a um dever de sigilo bancário
que impende sobre os membros dos órgãos de Administração e das instituições de
crédito, relativamente à identidade dos clientes, às contas de depósito, aos
movimentos respectivos e às demais operações bancárias. Portanto, a regra é a do
respeito pela intimidade da vida privada dos contribuintes.

Contudo, existem excepções a tal regra, que se consubstanciam em verdadeiras


derrogações ao sigilo bancário. A Administração tributária, no âmbito dos seus
poderes de investigação e de inspecção, pode assim desenvolver todas as diligências
necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes. Ora:

a) em princípio, o sigilo bancário só pode ser derrogado mediante autorização judicial -


é exactamente isto que nos prescreve o art. 63.°, n.° 2, da LGT.

b) contudo, existem casos em que a Administração tributária pode aceder aos dados
cobertos pelo sigilo bancário — que constem de documentos bancários30 — sem
dependência de tal autorização. Estes casos estão previstos no art. 63º-B da LGT, e são
simplificadamente os seguintes:

— quando existam indícios da prática de crime em matéria tributária;

— quando existam indícios da falta de veracidade do declarado ou esteja em falta


declaração legalmente exigível;

— quando se verifiquem indícios da existência de acréscimos ao património não


justificados;

— quando se trate da verificação de conformidade de documentos de suporte de


registos contabilísticos dos sujeitos passivos de IRS e IRC que se encontrem sujeitos a
contabilidade organizada;

— quando exista a necessidade de controlar os pressupostos de regimes fiscais


privilegiados de que o contribuinte usufrua;

— quando se verifique a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e


exacta da matéria tributável e, em geral, quando estejam verificados os pressupostos

29
Cfr. acórdão do TC n.° 278/95.
30
Para este efeitos, e nos termos do n.° 10 do art. 63.°-B da LGT, considera-se documento bancário
qualquer documento ou registo, independentemente do respectivo suporte, em que se titulem,
comprovem ou registem operações praticadas por instituições de crédito ou sociedades financeiras no
âmbito da respectiva actividade, incluindo os referentes a operações realizadas mediante utilização de
cartões de crédito.

52
para o recurso a uma avaliação indirecta.

— quando haja uma recusa de exibição ou de autorização para a consulta dos


documentos bancários por parte de familiares ou de terceiros que se encontrem numa
relação especial com o contribuinte (n.º 2 do art. 63º-B da LGT). Nesta situação, ao
contrário das restantes (previstas no n.º 1 do mesmo art.), o visado deve
obrigatoriamente ser ouvido antes de o acto intrusivo ser levado a efeito

Todas as informações deverão ser solicitadas (ie, o pedido deve ser formulado) pelo
Director-Geral dos Impostos ou pelo Director-Geral das Alfândegas e dos Impostos
Especiais sobre o Consumo, ou seus substitutos legais (sem possibilidade de delegação
— cfr. art. 63.°-B, n.° 4, da LGT), com expressa menção dos motivos concretos que as
justificam.

Além disso, o contribuinte pode reagir interpondo um recurso jurisdicional adequado


(nos termos dos arts. 146.°-A, n.º 2, al. a) e 146º-B do CPPT) que por norma tem efeito
devolutivo em relação ao acto administrativo de acesso aos dados, embora alguns
casos (situações do n.° 2) possam ter efeito suspensivo.

5.2. Procedimentos de avaliação

Avaliar significa fixar o valor de determinado bem ou conjunto de bens, para efeitos
tributários. Ora, existem vários tipos de avaliações tributárias, dos quais vamos estudar
os três tipos mais importantes: a avaliação prévia, a avaliação directa e a avaliação
indirecta.

5.2.1. Procedimento de avaliação prévia

O procedimento de avaliação prévia tem uma dupla natureza avaliativa-informativa:

- Avaliativa porque tem por intuito proceder à avaliação de bens ou direitos que
constituem a base de incidência de qualquer tributo;

- Informativa porque visa fornecer ao sujeito passivo uma informação abstracta,


fidedigna e vinculativa respeitante ao valor desses bens ou direitos. A informação é,
então:

- Abstracta, porque, ao contrário das avaliações que estudaremos a seguir, não


é efectuada propositadamente para efeitos de um acto de liquidação em concreto,
antes podendo ser utilizada para efeitos de vários actos de liquidação (ie, o resultado
da avaliação feita a um determinado bem ou direito pode servir de base a mais do que

53
uma liquidação);

- Fidedigna, pois são utilizados critérios que, com bastante probabilidade,


permitirão o apuramento do valor real do bem ou direito em causa; e

- Vinculativa, porque a Administração tributária deverá respeitar esse valor


durante um certo período de tempo, não podendo calcular tributos respeitantes a
esses bens ou direitos com base num valor diferente. Assim, se o proprietário de um
terreno solicita à Administração tributária a avaliação do valor de tal terreno para
efeitos tributários e o valor encontrado no procedimento for de 1000, não poderá
posteriormente ser liquidado imposto (taxa ou contribuição especial) a partir de um
valor de, por ex., 1300.

Quem tem legitimidade para instaurar este procedimento? Nos termos do art. 58.°, n.°
1, do CPPT, têm legitimidade para instaurar o procedimento os contribuintes com
interesse legítimo nessa avaliação.

Qual o principal efeito deste procedimento? Nos termos do art. 58º, n.º 2 do CPPT, o
principal efeito consiste na já referida vinculação da Administração tributária por um
prazo de 3 anos ao resultado da avaliação. Esta vinculação cessa nos termos do n.º 3
do art. 58º do CPPT - se for interposta reclamação administrativa ou impugnação
judicial do valor resultante da avaliação.

5.2.2. Procedimento de avaliação directa

O objectivo da avaliação directa reside na determinação do valor real dos rendimentos


ou bens sujeitos a tributação (assim, art. 83.°, n.° l, da LGT). É, pois, um instrumento
muito útil na busca da verdade material e do conhecimento da verdadeira capacidade
contributiva do sujeito passivo. Este procedimento diz, pois, respeito ao objecto
mediato da relação jurídica tributária – consiste, por exemplo, na avaliação do volume
de negócios de um estabelecimento comercial, de uma carteira de títulos, dos
rendimentos resultantes da alienação de um bem imóvel, do valor de um terreno, etc.

O que distingue a avaliação directa da avaliação prévia? A avaliação directa, ao


contrário da avaliação prévia, tem em vista um concreto exercício tributário ou um
concreto acto de liquidação (é uma avaliação concreta e não abstracta).

Esta avaliação pode ser efectuada, consoante os casos, pela Administração tributária
ou pelo sujeito passivo (nos casos de autoliquidação). Uma das formas pelas quais se
efectua a avaliação directa é exactamente através dos dados constantes das
declarações apresentadas pelo contribuinte ou dos dados ínsitos na sua contabilidade
ou escrita, dados esses que se presumem verdadeiros e de boa-fé nos termos do art.

54
75.°, n.° l, da LGT.

Levanta-se a questão de saber se a avaliação efectuada pela Administração tributária


pode ou não ser impugnada administrativamente (meios de impugnação graciosos) e
em tribunal (meios de impugnação contenciosos). Tudo vai depender do carácter
definitivo ou instrumental desse acto. Assim:

- sob o ponto de vista horizontal, nos termos do art. 54.° do CPPT, "não são
susceptíveis de impugnação contenciosa os actos interlocutórios do procedimento".
Assim sendo, apenas quando a avaliação directa NÃO for seguida de uma liquidação
será susceptível de controlo jurisdicional imediato;

- sob o ponto de vista vertical, antes de recorrer a tribunal, o sujeito impugnante deve
auscultar a Administração tributária uma vez mais, já que a impugnação contenciosa
"depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a revisão" do acto
(art. 86.°, n.° 2, da LGT). O contribuinte, para tal, pedir um segundo acto de avaliação
— no caso de bens imóveis, arts. 71.° e ss. do CIMI — ou utilizar o procedimento de
revisão dos actos tributários, previsto no art. 78.° da LGT. Só após a decisão
desfavorável é que se abre a via contenciosa.

5.2.3. Procedimento de avaliação indirecta

A) Pressupostos da determinação da matéria tributável por métodos indirectos

Segundo o art. 85.°, n.° l, da LGT, apenas se recorre à avaliação indirecta quando a
avaliação directa dos rendimentos ou dos bens sujeitos a tributação não for possível
ou conveniente. De facto, ao contrário do que acontece com a avaliação directa, o
procedimento de avaliação indirecta já não busca a efectiva verdade material da
tributação, mas apenas uma “verdade material aproximada” – no procedimento de
avaliação indirecta, o objectivo é de determinação do valor dos rendimentos ou bens
tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos. Assim se compreende
o carácter excepcional e subsidiário da avaliação indirecta face à avaliação directa.

Ora, há então situações em que é efectivamente impossível recorrer à avaliação


directa – ou porque as declarações dos contribuintes são inviáveis, ou porque não
oferecem garantias suficientes de veracidade, etc. Nestes casos, é então inevitável
recorrer à avaliação indirecta e é esta que vale, em detrimento da avaliação directa (ie,
verdade material cede perante verdade material aproximada sendo que, em todo o
caso, a avaliação indirecta baseia-se em meras presunções que, como tal, podem ser
afastadas).

A competência para a prática de actos de avaliação indirecta cabe apenas à

55
Administração tributária (e já não ao contribuinte). Nos termos do art. 77.°, n.o 4 da
LGT, "a decisão da tributação pelos métodos indirectos (...) especificará os motivos da
impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria
tributável, ou descreverá o afastamento da matéria tributável do sujeito passivo dos
indicadores objectivos da actividade de base científica ou fará a descrição dos bens
cuja propriedade ou fruição a lei considerar manifestações de fortuna relevantes, ou
indicará a sequência de prejuízos fiscais relevantes, e indicará os critérios utilizados na
avaliação da matéria tributável". Portanto, sobre a Administração tributária recai o
ónus da prova da verificação dos pressupostos de aplicação desta avaliação, cabendo
ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva posterior quantificação –
v. art. 74º, n.º 3, da LGT.

Portanto,

Levada a cabo por: Objectivo:

Avaliação Directa Administração Tributária Alcance da verdade


ou contribuinte material, do valor real dos
rendimentos ou direitos
sujeitos a tributação

Avaliação Indirecta Administração Tributária Alcance da verdade


material aproximada, do
valor presumido dos
rendimentos ou direitos
sujeitos a tributação

Regra: Avaliação Directa.

Avaliação Indirecta é excepcional e subsidiária da Avaliação Directa – art. 85º, n.º 1,


LGT.

No entanto, Avaliação Indirecta tem lugar nos casos previstos no art. 87º da LGT.

Segundo o art. 87.°, n.º 1 da LGT, a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de:

a) aplicação do regime simplificado de tributação;

56
b) impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos
elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria
matéria tributável de qualquer
imposto;

c) a matéria tributável se afastar, sem razão justificada,


justificada, da que resultaria da
aplicação de determinados indicadores
indicadores objectivos da actividade de base técnico-
técnico
científica;

d) os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente


signi
para menos, sem razão justificada, de determinados
determina padrõess de rendimento;

e) se os sujeitos passivos apresentarem, sem razão justificada, resultados


tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante vários exercícios consecutivos;

f) existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre
os rendimentos
tos declarados e o acréscimo de património ou o consumo evidenciados
pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.

Como se pode constatar, não existe homogeneidade material entre as várias hipóteses
de recurso lícito à avaliação indirecta, pois as situações
situações revestem natureza bastante
diferente entre si. No entanto, podemos identificar dois grupos de situações:

Situação
ituação não patológica Situações patológicas

• Composta pela alínea a).


a) • Constituídas pelas alíneas b) a f).

• Neste caso, o sujeito passivo em • Nestes casos, o sujeito passivo


causa nada fez de desconforme com introduz algum factor de ilicitude ou
o ordenamento jurídico, apenas se de desconfiança no procedimento
justificando o recurso a este método tributário, nomeadamente porque
por razões de ordem prática, de violou os deveres de cooperação a
eficaz gestão corrente da actividade que estava adstrito.
comercial ou de serviços e de
simplicidade de cálculos (muitas
vezes destinada a sujeitos com
rendimentos baixos e pouco
habituados a estes “giros”
mercantis).

57
a) A aplicação do regime simplificado de tributação – Situação não patológica

Os sujeitos passivos de IRS e de IRC que auferem rendimentos derivados de actividades


de natureza empresarial (comerciais, industriais, agrícolas, silvícolas e pecuárias) e
profissional (prestações de serviços, propriedade industrial, intelectual e know-how)
são objecto de um conjunto de regras de cálculo do respectivo imposto baseadas na
diferença entre proveitos (ganhos) e custos (perdas). Este é o denominado regime
normal de tributação.

No entanto, o regime normal de tributação acarreta, por vezes, uma série de


operações, registos e demais obrigações que, em face do diminuto valor que as
respectivas transacções envolvem, dos baixos rendimentos dos sujeitos envolvidos e
da sua pouca experiência nestes “giros” mercantis, se poderiam tornar num factor de
entrave ao desenvolvimento do normal desenvolvimento das relações económico-
financeiras. Para certas situações, o legislador criou, então, o denominado regime
simplificado de tributação, que consiste num conjunto especial de regras de
determinação dos rendimentos sujeitos a imposto, baseadas numa estimativa ou
presunção legal (que visa, como o próprio nome indica, uma simplificação das regras
de determinação do imposto em dívida para determinados sujeitos).

Os sujeitos abrangidos por este regime encontram-se previstos no art. 28º, n.º 2 do
CIRS e no art. 53º do CIRC e o cálculo do imposto é feito com as particularidades
referidas no art. 31º do CIRS e art. 53° do CIRC.

b) Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos


indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto –
Situação patológica

Este caso abrange as situações em que não é possível a comprovação nem directa,
nem exacta, da base tributária. A comprovação directa não é possível quando, por
exemplo, não existe contabilidade ou declarações do sujeito em causa, ao arrepio do
que era exigido; a comprovação exacta não tem lugar quando, por exemplo, apesar de
existirem elementos de contabilidade, estes apresentam erros significativos.

Ora, e dado que falamos de uma situação patológica, as circunstâncias que


consubstanciam a adopção da avaliação indirecta neste caso baseiam-se em anomalias
e incorrecções que inviabilizam o apuramento da matéria colectável – é o que resulta
do disposto no art. 88º da LGT. Assim sendo, para que se proceda à aplicação da
avaliação indirecta neste caso, é necessária a verificação de um duplo requisito; é,
pois, necessário:

58
1. Que se verifique alguma das anomalias e incorrecções previstas no art. 88º da
LGT e que são as seguintes:

a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta


ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou
execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses ele-
mentos se deva a razões acidentais;

b) Recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos,


bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;

c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com o propósito de


simulação da realidade perante a Administração tributária e erros e inexactidões na
contabilidade das operações não supridos no prazo legal;

d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de


mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados
através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente
maior do que a declarada.

2. Que exista um nexo de causalidade (uma relação causa-efeito) entre a falha do


contribuinte (que conduziu à existência de uma das anomalias/incorrecções) e a
impossibilidade de determinação da matéria colectável por métodos indirectos – o que
também resulta do art. 88º da LGT, como vimos. Assim, se a falha existir, mas ainda for
possível a determinação da matéria colectável por forma directa e exacta, deve esta
(determinação da matéria colectável por métodos indirectos) ser usada, uma vez que a
avaliação indirecta é sempre subsidiária.

Verificado este duplo requisito, há então lugar à determinação da matéria colectável


por métodos indirectos; essa operação pode ter em conta os elementos enunciados no
art. art. 90.°, n.° 1 da LGT e que são os seguintes:

— as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou


compras e fornecimentos de serviços de terceiros;

— as taxas médias de rentabilidade de capital investido;

— o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas e outros custos


directos;

— os elementos e informações declaradas à Administração tributária e os relativos a

59
empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte (método
das informações cruzadas);

— os custos presumidos em função das condições concretas do exercício da


actividade;

— a matéria tributável do ano ou anos mais próximo(s) que se encontre determinada


pela Administração tributária (método dos últimos exercícios corrigidos);

— o valor de mercado dos bens ou serviços tributados; ou

— uma relação congruente entre os factos apurados e a situação concreta do


contribuinte.

c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar da que resultaria da aplicação de


determinados indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica –
situação patológica

Esta situação diz respeito exclusivamente a sujeitos passivos que exerçam actividades
empresariais (portanto, diz respeito à categoria B de IRS e ao IRC).

Neste caso, já não estamos perante a inexistência ou defeitos formais da contabilidade


e das declarações, mas perante verdadeiros defeitos substanciais das mesmas,
traduzidos no facto de serem apresentados valores que, embora formalmente possam
estar correctos, se afastam de certos valores objectivos tidos como adequados. Estes
valores objectivos tidos como adequados são os “indicadores objectivos de base
técnico-científica”, definidos anualmente nos termos do art. 89º, n.º 2 da LGT.

Portanto, “no caso de a matéria tributável se afastar significativamente, para menos,


sem razão justificada, dos indicadores objectivos de base técnico-científica, a
determinação [da matéria tributável] efectua-se de acordo com esses indicadores” –
art. 90º, n.º 2 da LGT.

Ora, a aplicação dos métodos indirectos com base neste fundamento apenas pode ser
efectuada se cumpridos os seguintes requisitos cumulativos:

1) quando na declaração apresentada pelo sujeito passivo (e na qual se baseia a


liquidação) não constam as razões justificativas do afastamento dos “indicadores
objectivos de base técnico-científica” (art. 89º, n.º 1 da LGT);

2) desde que tenham decorridos mais de 3 anos sobre o início da actividade do sujeito
passivo (art. 89.°, n.° 1 da LGT);

60
3) quando o afastamento é:

- de mais de 30%, para menos, da matéria tributável por declarada pelo sujeito
passivo em relação à que resultaria da aplicação dos indicadores objectivos (e sem
qualquer requisito temporal); ou

— de mais de 15%, para menos, durante 3 anos seguidos, da matéria tributável


declarada pelo sujeito passivo em relação à que resultaria da aplicação desses mesmos
indicadores objectivos.

d) Os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para


menos, sem razão justificada, de determinados padrões de rendimento – situação
patológica

Este grupo de casos diverge do anterior na medida em que:

- Se refere apenas à tributação dos rendimentos das pessoas singulares; e

- O parâmetro comparativo dos rendimentos declarados são determinados “padrões


de rendimento” dos sujeitos passivos (e já não a matéria tributável que resulte da
aplicação de indicadores objectivos de base técnico-científica). Trata-se aqui de
padrões de rendimento, substancialmente elevados, e que permitem adquirir certo
tipo de bens que, aos olhos do legislador, se configuram como “manifestações de
fortuna”. Assim, o raciocínio do legislador é o seguinte:

Há lugar à
Presume-se que
aplicação de
tenham certo
Contribuintes que métodos
padrão de
apresentem indirectos de
rendimentos (que
certas avaliação (por
não foi traduzido
manifestações de forma a tributar
nas declarações
fortuna de acordo com o
apresentadas por
rendimento-
tais contribuintes)
padrão)

As manifestações de fortuna constam da tabela prevista no art. 89.°-A, n.° 4 da LGT (v.,
também, o art. 89.°-A, n.° 2. da LGT):

61
a) imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000;

b) automóveis ligeiros de passageiros de valor igual ou superior a € 50.000 e


motociclos de valor igual ou superior a € 10.000;

c) barcos de recreio de valor igual ou superior a € 25.000;

d) aeronaves de Turismo; e

e) suprimentos e empréstimos feitos, no ano, de valor igual ou superior a € 50 000.

Em relação a cada uma destas manifestações de fortuna, presume-se a existência de


um determinado rendimento-padrão, que será de, respectivamente:

a) 20% do valor de aquisição do imóvel;

b) 50% do valor do automóvel ligeiro de passageiros no ano de matrícula, com o


abatimento de 20% por cada um dos anos seguintes;

c) valor do barco de recreio no ano de registo, com o abatimento de 20% por cada um
dos anos seguintes;

d) valor da aeronave de turismo no ano de registo, com o abatimento de 20% por cada
um dos anos seguintes; e

e) 50% do valor anual dos suprimentos e empréstimos.

Em qualquer destas situações, pode-se recorrer a métodos indirectos de avaliação,


desde que (i) falte a declaração de rendimentos ou (ii), existindo declaração, se
verifique uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento
padrão referido (art. 89.°-A, n.° l, da LGT).

No caso de aplicação de métodos indirectos de avaliação, cabe ao sujeito passivo o


ónus da prova de que os rendimentos declarados correspondem à realidade e de que é
outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas (nomeadamente, herança ou
doação, rendimentos que não esteja obrigado a declarar, utilização do seu capital ou
recurso ao crédito) - art. 89.°-A, n.º 3 da LGT. Isto é, o contribuinte pode afastar a
aplicação de métodos indirectos se provar que os rendimentos declarados
correspondem à realidade e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna
evidenciadas.

A decisão de fixação da matéria tributável é da exclusiva competência do Director-


Geral dos Impostos, ou seu substituto legal, sem possibilidade de delegação (art. 89.°-

62
A, n.° 5 da LGT).

e) Os sujeitos passivos apresentarem, sem razão justificada, resultados tributáveis


nulos ou prejuízos fiscais durante vários exercícios consecutivos – situação patológica

Incluem-se aqui as situações que suscitam maiores suspeitas aos olhos da


Administração tributária: as situações de prejuízos fiscais (isto é, resultados negativos,
em que os proveitos são menores do que os custos) sistemáticos e não justificados.

Não se trata de um qualquer prejuízo, ou de um prejuízo isolado, mas de "prejuízos


continuados". Neste contexto, são abrangidos por tal conceito os resultados
tributáveis nulos ou negativos durante 3 anos consecutivos (salvo nos casos de início
de actividade, em que a contagem deste prazo se faz do termo do terceiro ano) ou em
3 anos, mesmo que alternados, durante um período de 5.

Tem-se aqui em primeira linha de observação os sujeitos passivos de imposto que se


dedicam, de um modo independente, a actividades de natureza empresarial
(comercial, industrial ou agrícola) ou profissional (v.g., prestações de serviços).

f) Existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os
rendimentos declarados e o acréscimo de património ou o consumo evidenciados
pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação – situação patológica

Trata-se de uma situação que, em rigor, pode já ter sido englobada em alguns dos
casos anteriores, embora possam existir situações que justifiquem a autonomização.
Estamos novamente a falar de divergências, aqui entre os valores declarados e
acréscimo de património ou o consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo
período de tributação. Suspeita-se de que o sujeito passivo não cumpriu os seus
deveres de cooperação e cessa, pois, a presunção de boa fé de que gozam as suas
declarações.

Em tal caso, cabe-lhe fazer a prova de que as declarações apresentadas correspondem


à realidade dos rendimentos declarados, e que é outra a fonte das manifestações de
fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciados (cfr. art. 89.°-A da
LGT). Caso contrário, fica sujeito a tributação por presunções ou indícios.

B) Controlo da aplicação dos métodos indirectos

Apesar de a avaliação indirecta ser efectuada pela Administração tributária, o sujeito

63
passivo não é totalmente alheado do acto de fixação de valor. Assim, ele deve:

- participar no acto de avaliação indirecta (exercendo o seu direito de audição antes da


fixação final do valor em causa [arts. 60.º, n.º l, alínea d) e 82.°, n.° 3, ambos da LGT]; e

- mais tarde, e se for caso disso, participar no acto de revisão da avaliação indirecta
(arts. 82.°, n.° 4 e art. 91.°, ambos da LGT).

Uma vez fixado pela Administração o valor dos rendimentos ou dos bens tributáveis a
partir de indícios, presunções ou outros elementos (art. 90.° da LGT), é possível colocar
em crise esse valor através de impugnação graciosa e contenciosa?

a) Do ponto de vista gracioso, o procedimento adequado será o pedido de revisão


da matéria tributável fixada por métodos indirectos, previsto nos arts. 91.° e ss da LGT.
Este procedimento impugnatório não poderá ser utilizado nos casos de aplicação do
regime simplificado de tributação em que não sejam efectuadas correcções (com base
noutro método indirecto). Aqui, o mais adequado parece ser a reclamação graciosa da
respectiva liquidação.

b) Do ponto de vista contencioso, é necessário que o acto seja horizontal e


verticalmente definitivo; assim:

- o acto de avaliação indirecta será horizontalmente definitivo quando não é


seguido de qualquer acto de liquidação (porque, por exemplo, o sujeito passivo
beneficia de uma isenção ou foram apurados, na avaliação, prejuízos fiscais). (Nestes
termos, o acto ao qual se segue uma liquidação não é horizontalmente definitivo, pelo
que não existe a possibilidade de impugnação contenciosa directa, apenas se
admitindo a impugnação do acto de liquidação);

- o acto será verticalmente definitivo se não se pretender atacar o acto de fixação


indirecta do valor em causa por ter alegadamente havido um erro na quantificação ou
nos pressupostos. (Nestes termos, se se pretende atacar o acto alegando erro na
quantificação ou nos pressupostos, o recurso a tribunal não é possível, devendo
previamente ser intentado um pedido de revisão da matéria tributável (arts. 86.°, n.° 5,
91.° e ss. da LGT e art. 117.° do CPPT)).

5.3. Procedimento de reconhecimento de benefícios fiscais

Esta matéria está sobretudo regulada no EBF e no art. 65º CPPT.

64
Consideram-se benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional instituídas para
tutela de interesses públicos extra-fiscais relevantes que sejam superiores aos da
própria tributação que impedem – art. 2º, n.º 1 EBF.

Os benefícios fiscais podem ser automáticos ou dependentes de reconhecimento. Os


primeiros "resultam directa e imediatamente da lei” e os segundos “pressupõem um
ou mais actos posteriores de reconhecimento" (art. 4.° do EBF). O reconhecimento de
benefícios fiscais trata-se, pois, de um procedimento em que, por iniciativa dos
interessados (os beneficiários), se solicita à Administração tributária o reconhecimento
de um benefício, mediante requerimento.

Esse requerimento deve ser apresentado no serviço competente para a liquidação do


tributo a que tal benefício se refere (art. 65.°, n.° 2, do CPPT), e deve ser instruído com
o cálculo, quando obrigatório, do benefício requerido e a prova da verificação dos
respectivos pressupostos (art. 65º, n.º 1, parte final, do CPPT).

O serviço competente emitirá um despacho de deferimento ou de indeferimento,


reconhecendo ou não o benefício pretendido31. Tal despacho é irrevogável, embora
possa ser suspenso32, e tem um efeito meramente declarativo (e não constitutivo) do
direito ao benefício em causa (art. 11.° do EBF), o que significa que os seus efeitos se
poderão produzir retroactivamente (devendo, por exemplo, ser restituído o que
houver sido eventualmente tributado até ao reconhecimento).

De referir, por último, que do despacho de indeferimento de reconhecimento do


benefício pode o destinatário recorrer hierarquicamente (art. 65.°, n.° 4, do CPPT).

5.4. Procedimento de ilisão de presunções

Uma das formas que o legislador encontrou para combater as condutas elisivas dos
contribuintes (na tentativa de “fugir aos impostos”) foi recorrer a presunções.
Inúmeras vezes, não sendo possível atingir a verdadeira e efectiva capacidade
contributiva dos sujeitos, o sistema tributário contenta-se com uma capacidade
contributiva aproximada, baseada em presunções. Ora, as presunções consagradas nas
normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário (v. art. 73.° da
LGT) e existe um procedimento especificamente pensado para o efeito, previsto no art.

31
O reconhecimento não poderá ser concedido "quando o sujeito passivo tenha deixado de efectuar o
pagamento de qualquer imposto sobre o rendimento, a despesa ou o património e das contribuições
relativas ao sistema da segurança social" e desde que a dívida em causa "sendo exigível, não tenha sido
objecto de reclamação, impugnação ou oposição e prestada garantia idónea, quando devida" (art. 11.°-
A do EBF).
32 os
Os casos de suspensão estão previsto no art. 12.°, n. 5 e 6, do EBF.

65
64.° do CPPT.

Refere o n.° 1 do referido art. 64º do CPPT que "o interessado que pretender ilidir
qualquer presunção prevista nas normas de incidência tributária deverá para o efeito,
caso não queira utilizar as vias da reclamação graciosa ou impugnação judicial de acto
tributário que nela se basear, solicitar a abertura de procedimento contraditório
próprio". Portanto, resulta deste preceito legal que o contribuinte tem ao seu dispor
dois meios para ilidir a presunção em causa:

- colocando em causa o acto tributário que se basear nessa presunção (mediante a


reclamação graciosa ou a impugnação judicial do mesmo); ou

- recorrendo ao “procedimento contraditório próprio” que é, pois, o procedimento de


ilisão de presunções. Este procedimento poderá ser aplicado quer para ilidir as
presunções contidas em normas de incidência tributária (como resulta do art.
transcrito), quer para ilidir presunções relativas a outras situações, nomeadamente,
relativas a benefícios fiscais (dado o principio do acesso ao Direito e da salvaguarda
das garantias essenciais dos contribuintes).

Onde deve ser instaurado o procedimento de ilisão de presunções? Este procedimento


deve ser instaurado no órgão periférico local da área do domicílio ou sede do
contribuinte, da situação dos bens ou da liquidação, mediante petição do contribuinte
dirigida àquele órgão, acompanhada dos respectivos meios de prova (art. 64.°, n.° 2,
do CPPT).

Em que prazo deve ser concluído este procedimento? A petição considera-se


tacitamente deferida se não lhe for dada qualquer resposta no prazo de 6 meses, salvo
quando a falta desta for imputável ao contribuinte (art. 64º, n.º 4, do CPPT). Se ao fim
desse prazo a petição é tacitamente deferida, estamos perante uma excepção à regra
do indeferimento tácito das pretensões, prevista no art. 57º, n.º 1 e n.º 5 da LGT.

Quais as consequências que advêm da decisão proferida neste procedimento?

- Se o interessado conseguir ilidir a presunção prevista na norma tributária  afasta,


eventualmente, a tributação respectiva que resultava da norma de presunção;

- Se o interessado não conseguir ilidir essa presunção, e:

- se os prazos de reclamação e impugnação do acto tributário ainda não


tiverem decorrido  a decisão produz efeitos retroactivos, podendo abranger os actos
tributários pendentes.

- Se os prazos de reclamação e impugnação do acto tributário já tiverem


decorrido  a decisão produz efeitos apenas prospectivos.

66
5.5. Procedimento de liquidação

A liquidação, em sentido amplo, consiste no conjunto de actos, juridicamente


enquadrados, que têm por objectivo a determinação e quantificação da obrigação
tributária, abrangendo quer as actuações da Administração tributária (aplicação de
métodos indirectos, aplicação das taxas de imposto, etc.), quer as actuações dos
contribuintes ou de terceiros (declarações, por ex.).

Podemos classificar a liquidação sob o ponto de vista temporal e consoante os sujeitos


que nela intervêm.

a) A liquidação sob o ponto de vista temporal

- Liquidação provisória. A liquidação provisória é aquela que é feita com base nos
elementos declarados pelos sujeitos passivos e que está sujeita a uma averiguação e
controlo posterior. Constitui um meio de propiciar receitas rápidas para os cofres do
Estado uma vez que pode dar origem a um pagamento antecipado (pagamento por
conta ou retenção na fonte com a natureza de pagamento por conta).

- Liquidação definitiva. A liquidação definitiva já é um verdadeiro acto (impugnável) da


Administração tributária de natureza definitiva, unilateral e positiva e que é um
pressuposto do procedimento de cobrança.

- Liquidação adicional. Surge na sequência de uma revisão do acto tributário de


liquidação definitiva (cfr. art. 78º da LGT) e pode ter como origem fundamentos
diversos, como erros nas declarações apresentadas, apuramento de imposto superior
ao devido, etc. A liquidação adicional encontra-se prevista, por ex., no art. 89.° do CIRS
e no art. 91.° do CIRC.

b) A liquidação consoante os sujeitos que nela intervêm

- Autoliquidação. A autoliquidação é levada à prática pelo próprio sujeito passivo que,


por um lado, comunica os rendimentos auferidos e, por outro lado, quantifica a
obrigação tributária propriamente dita através de uma série de operações de cálculo.
Nesta modalidade, a qualificação e quantificação da matéria tributável está nas mãos
do próprio sujeito que aufere os rendimentos; assim, o montante de tributo a pagar ou

67
a receber é o resultado daquilo que o próprio sujeito avalia e estima33.

- Heteroliquidação. Estamos em face de um acto de liquidação que é feito por entidade


diversa do sujeito passivo (a Administração tributária, por regra, ou um outro terceiro).

Ora, quando nos referimos ao procedimento de liquidação, sem mais, estamo-nos a


querer reportar à liquidação em sentido amplo, definitiva e efectuada pela
Administração tributária (heteroliquidação).

O procedimento de liquidação instaura-se com a apresentação das declarações dos


contribuintes, nos termos do art. 59º, n.º 1 do CPPT, sendo a matéria tributável
apurada com base nessas mesmas declarações, nos termos do art. 59º, n.º 2 do CPPT.

E se os contribuintes não apresentarem declarações, ou estas estiverem viciadas?


Nesse caso, o procedimento de liquidação é instaurado oficiosamente pelos serviços
competentes (art. 59º, n.º 7 do CPPT) e com base em todos os elementos que tais
serviços disponham ou venham a ser por eles obtidos (art. 59.°, n.º 1, parte final, do
CPPT). Dado o disposto no art. 59º, n.º 2 do CPPT, a matéria tributável não pode ser
apurada com base em declarações viciadas; no entanto, as declarações que
apresentem erros de facto ou de direito podem ser substituídas nos termos do art.
59.°, n.º 3, do CPPT, e ser assim consideradas para efeitos de liquidação.

5.6. Procedimento de cobrança

A cobrança consiste no conjunto de actos materiais conducentes à arrecadação da


receita tributária. A cobrança dos tributos deve ser efectuada pelas entidades
administrativas que a lei reguladora do tributo em causa designar (art. 79.° do CPPT).

Em regra, o conjunto de actos que compõem a cobrança tem como correspectivo, do


lado do contribuinte, o acto de pagamento. Assim:

Procedimento de Cobrança Acto de Pagamento


Levado a cabo pela AT Levado a cabo pelo Contribuinte

33
No âmbito do nosso ordenamento tributário, os casos mais visíveis de autoliquidação de impostos
estão consagrados em sede de IRC (art. 82.°, alínea a), do CIRC), de IVA (art. 26.°, n.° l, do CIVA) e de
Imposto de Selo (art. 23°, n.° l, do Código do Imposto de Selo).

68
Contudo nem sempre assim acontece, pois:

- pode não se verificar um pagamento integral, mas apenas um pagamento em


prestações da dívida tributária nos termos do art. 42.°, n.° l e 2 da LGT e art. 86º, n.º 2
do CPPT;

- pode extinguir-se a dívida por dação em pagamento, quer antes (no âmbito do
processo conducente à celebração de acordo de recuperação de créditos do Estado),
quer depois de instaurada a execução, e em pedido dirigido ao ministro ou órgão
executivo de que dependa a Administração tributária (arts. 87.° e 201.° do CPPT);

- podemos ainda estar perante uma compensação de créditos tributários, nos termos
dos arts. 89.° e 90.° do CPPT.

Uma classificação importante no âmbito do procedimento de cobrança é aquela que


distingue entre cobrança voluntária e cobrança coerciva, nos seguintes termos:

- Cobrança voluntária é aquela à qual corresponde um acto voluntário e espontâneo


do sujeito passivo. A cobrança voluntária pode ser efectuada dentro ou fora do prazo
legal; se for efectuada fora do prazo legal, acrescem à dívida tributária juros de mora
(art. 86.°, n.° l, do CPPT). Os prazos de pagamento voluntário dos tributos estão
regulados no art. 85.°. n.° l do CPPT.

- Cobrança coerciva é aquela que é efectuada de uma forma coerciva/coactiva -


através da execução do património do devedor, mediante a instauração de um
processo de execução fiscal junto dos tribunais tributários.

5.7. Procedimentos impugnatórios (de segundo grau)

5.7.1. Procedimento de revisão da matéria colectável fixada por métodos indirectos

 Quando podemos utilizar este procedimento?

Quando queremos questionar graciosamente o acto de fixação da matéria colectável


com o recurso a métodos indirectos.
No entanto, este pedido de revisão não pode ser utilizado em todas as
situações de recurso a métodos indirectos; assim, excluem-se:

a) os casos de regime simplificado de tributação (art. 91.°, n.º l, da LGT)

69
b) os casos de avaliação da matéria colectável baseada em manifestações de
fortuna (art. 89.°-A, n.° 6, da LGT acho que é n.º 7).

c) as situações de meras correcções aritméticas que resultem de imposição legal,


ou questões de Direito cujos fundamentos de reclamação não sejam relativos aos
pressupostos de determinação indirecta da matéria tributável (art. 91.°, n.° 14, da
LGT).

 Quais os possíveis fundamentos do pedido de revisão?

O pedido de revisão pode ser apresentado nomeadamente com os seguintes


fundamentos previstos no art. 117º, n.º 1 do CPPT34:

a) errónea quantificação da matéria colectável;

b) não verificação dos pressupostos de determinação indirecta da matéria


colectável.

 Qual o objectivo do procedimento?

Estabelecer um acordo quanto ao valor da matéria tributável a considerar para efeitos


de liquidação (art. 92.°, n.° l, da LGT).

 Tem legitimidade para desencadear este procedimento o sujeito passivo do


tributo em questão, em requerimento fundamentado dirigido ao órgão da
Administração tributária da área do seu domicílio fiscal e apresentado no prazo de 30
dias contados da data da notificação da decisão (de fixação do valor por métodos
indirectos) - art. 91.°, n.° 2 , da LGT. O pedido tem efeito suspensivo da liquidação do
tributo, nos termos do art. 91º, n.º 2 da LGT.

 Qual a tramitação prevista para o procedimento de revisão?

No requerimento que desencadeia o procedimento, o sujeito passivo deve indicar o


perito que o representa, conforme resulta do art. 91º, n.º 1 da LGT. No prazo de 8 dias
a contar desta interposição do pedido de revisão, a Administração tributária designará
um perito seu e marcará uma reunião entre este e o perito indicado pelo contribuinte

34
Nestes casos, o pedido de revisão é necessário nos casos de impugnação judicial, nos termos do
referido art. 117º, n.º 1 do CPPT.

70
a realizar no prazo máximo de 15 dias - art. 91.°, n.os 3 da LGT. (Note-se que quer o
sujeito passivo, quer a Administração tributária podem designar um perito
independente, nos termos do art. 91º, n.º 4 da LGT).

Depois, surge a fase do debate contraditório (v., assim, art. 92º, n.º 1 da LGT) e da
decisão deste procedimento. Como vimos, o objectivo do procedimento consiste em
fixar um acordo (entre peritos) quanto ao valor da matéria tributável a considerar para
efeitos de liquidação; ora:

- Se houver acordo, o tributo será liquidado com base na matéria colectável acordada
(art. 92.°, n.° 3, da LGT);

- Caso não haja acordo, o órgão competente para a fixação resolverá de acordo com o
seu prudente juízo, tendo em conta as posições dos peritos. Se houver um perito
independente, a decisão deverá obrigatoriamente fundamentar a adesão ou rejeição
do seu parecer (art. 92.°, n.° 7, da LGT), sendo esta decisão, ou a liquidação –
entretanto suspensa - susceptível de reclamação graciosa ou impugnação judicial nos
termos do art. 92.°, n.os 1 e 8, da LGT.

5.7.2. Procedimento de revisão dos actos tributários

Este procedimento diz respeito àquelas situações em que o acto tributário vai ser
reapreciado pelo próprio órgão que o praticou, nos termos do art. 78º, n.º 1 da LGT.

 Quem tem legitimidade activa para desencadear o procedimento?

A revisão de acto tributário pode ser feita oficiosamente (por impulso da própria
Administração tributária) ou a pedido do sujeito passivo.

a) O sujeito passivo pode desencadear este procedimento, invocando qualquer


ilegalidade, no prazo da reclamação graciosa, ou seja 120 dias (art. 78.°, n.º l, da LGT).
O facto de a lei estabelecer um prazo de 120 dias para o contribuinte pedir, por sua
iniciativa, a revisão do acto tributário, não exclui a possibilidade de o contribuinte
pedir uma revisão oficiosa no prazo de 4 anos, com fundamento em erro de facto e
não em ilegalidade, conforme resulta do art. 78.°, n.° 7, da LGT.

b) Por seu lado, a Administração tributária também pode desencadear este


procedimento. Se a Administração tributária detectar a existência de um erro, ela tem
por obrigação efectuar a correcção do mesmo, ainda que tal não lhe seja solicitado –
assim o impõe o princípio da verdade material.
No entanto, a Administração tributária só pode desencadear este
procedimento com fundamento em erro imputável aos serviços e no prazo de 4 anos

71
se o tributo já houver sido pago ou a todo o tempo se não o houver sido. Admite-se
também uma revisão com base numa injustiça grave ou notória ou numa duplicação
da colecta, não podendo ser utilizado qualquer outro fundamento, nomeadamente a
ilegalidade do acto impugnado. Permite-se assim a revisão fora dos prazos de
reclamação administrativa (3 e 4 anos, respectivamente), em face da gravidade das
situações (Cfr. art. 78.°, n.os 4 e 6. da LGT).

Esquemática e resumidamente:

Fundamento Prazo Previsão Legal

Ilegalidade 120 dias Art. 78º, n.º 1 da


Revisão a pedido
do sujeito passivo LGT (e art. 70º do
CPPT)

Erro imputável aos 4 anos Art. 78º, n.º 1 da


Serviços (tributo já LGT
pago)

Erro imputável aos Todo o Tempo Art. 78º, n.º 1 da


Revisão Oficiosa Serviços (tributo não LGT
pago)

Injustiça grave ou 3 anos Art. 78º, n.º 4 da


notória LGT

Duplicação da colecta 4 anos Art. 78º, n.º 6 da


LGT

 O procedimento é efectuado a favor de que actor procedimental?

72
A revisão pode ser efectuada a favor da Administração tributária ou a favor do sujeito
passivo; assim:

- Nos casos de revisão a favor da Administração tributária, há lugar, a maior parte das
vezes, a uma liquidação adicional, cuja possibilidade vem prevista em várias normas
dos diversos códigos fiscais - Cfr., por exemplo, art. 89.° do CIRS e art. 91.° do CIRC. Em
rigor, esta possibilidade não se configura como um verdadeiro instrumento
impugnatório ao favor dos contribuintes.

- A revisão a favor do sujeito passivo configura-se como um verdadeiro instrumento


impugnatório para os contribuintes - art. 78.° da LGT (V., também, art. 93.° do CIRS,
art. 95.º do CIRC).

 Quais as possíveis consequências do deferimento do pedido de revisão?

a) O deferimento do pedido de revisão poderá, em abstracto, ter como efeito:

— a anulação do acto tributário (com eficácia ex tunc), com a consequente restituição


do tributo que haja sido pago;

— a sua revogação (que poderá ter eficácia ex nunc);

— a sua reforma (isto é, o acto mantém-se, mas expurga-se/corrige-se a parte viciada);


ou

— a sua conversão (substituição do acto primitivo por um outro).

b) Poderão, ainda, ser devidos juros indemnizatórios ao contribuinte quando:

- a Administração tenha procedido oficiosamente à anulação de um acto tributário e


não tenha nos 30 dias posteriores à sua decisão restituído o tributo já pago pelo
contribuinte – art. 43º, n.º 3, al. b) da LGT;

- o contribuinte tenha solicitado essa revisão e ela se efectuar mais de um ano após o
seu pedido (salvo se o atraso não for imputável à Administração) – art. 43º, n.º 3, al. c)
da LGT.

c) De referir, por último, que o indeferimento do pedido de revisão é susceptível de


impugnação judicial, uma vez que além de estarmos perante um acto lesivo, estamos
perante situações em que se aprecia a legalidade de um acto da Administração

73
tributária (e não o seu mérito ou oportunidade).

5.7.3. Procedimento de reclamação graciosa

a) Enquadramento jurídico

O procedimento de reclamação graciosa, previsto no art. 68º e seguintes do CPPT,


constitui o procedimento impugnatório por excelência: tem por objectivo a anulação
total ou parcial dos actos tributários, com fundamento em ilegalidade dos mesmos.
Vale isto por dizer que sempre que o contribuinte tenha diante de si um acto tributário
(de natureza unilateral, definitiva e impositiva – ie, e por excelência, o acto de
liquidação) que considere desconforme com o ordenamento jurídico, deve lançar mão
deste expediente administrativo.

Este procedimento não tem, em princípio, efeito suspensivo da liquidação que se está
a reclamar (cfr. art. 69.°, alínea f), do CPPT]), o que quer dizer que o contribuinte,
mesmo reclamando, deve proceder ao pagamento do tributo em causa, sob pena de
se poder confrontar com um processo de execução fiscal35. Por outro lado, a
instauração da reclamação faz interromper o prazo de prescrição da obrigação
tributária (art. 49.°, n.° l, da LGT).

Como se processa a apresentação do pedido de reclamação?

- A reclamação deve ser apresentada pelo contribuinte, pelos substitutos ou


responsáveis, nos termos do art. 68º, n.º 1 do CPPT, e sob forma escrita (embora, em
casos de manifesta simplicidade, o possa ser oralmente), nos termos do art. 70º, n.º 6
do CPPT.

- Deve ser apresentada/entregue junto do serviço periférico local da área do domicílio


ou sede do contribuinte, da situação dos bens ou da liquidação (art. 70º, n.º 6 do
CPPT) ou por transmissão electrónica de dados (art. 70º, n.º 7 do CPPT).

- Deve ser dirigida ao órgão periférico regional (art. 73.°, n.° l, do CPPT), cujo dirigente,
em princípio, é competente para decidir (art. 75.° do CPPT). (Verifica-se, pois, uma
dualidade competencial quanto ao órgão a quem entregar e quanto ao órgão que vai

35
Contudo, tal efeito suspensivo pode ser conseguido se for prestada garantia adequada. Tal garantia
deve (i) ser requerida pelo contribuinte juntamente com reclamação, e (ii) prestada no prazo de 10 dias
após a notificação para o efeito pelo órgão periférico local competente.

Para este efeito, uma "garantia adequada" será a que for prestada nos termos do art. 199." do CPPT,
podendo consistir numa garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de
assegurar os créditos da Administração tributária.

74
decidir a reclamação).

b) Fundamentos da reclamação

A reclamação graciosa visa, como já foi referido, a anulação de actos tributários. Mas
pode ser deduzida com que fundamentos?

Nos termos do art. 70.° do CPPT, "a reclamação graciosa pode ser deduzida com os
mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial". Ora, o art. 99º do CPPT
aponta como fundamento para a impugnação judicial “qualquer ilegalidade”,
designadamente (isto é, enumeração não exaustiva):

— a errónea qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais


e outros factos tributários [art. 99.°, alínea a) do CPPT];

— a incompetência [art. 99.°, alínea b) do CPPT];

— a ausência ou vício da fundamentação legalmente exigida [art. 99.°, al. c) do CPPT];

— a preterição de outras formalidades legais [art. 99.°, alínea d) do CPPT];

— e, como se trata de uma enumeração não exaustiva, acrescem como fundamentos:

(i) a duplicação da colecta;

(ii) a inexistência do facto tributário.

Em face da relevância prática destas questões, podemos agrupar os fundamentos


relativos a questões de facto e os fundamentos relativos a questões de direito.

Fundamentos relativos a questões de facto

Integram-se aqui as questões relativas ao facto tributário, nomeadamente a sua


errónea qualificação, a sua errónea quantificação, bem assim como a sua inexistência.

A errónea qualificação dos factos tributários diz respeito àquelas situações em que a
Administração tributária usou uma deficiente qualificação jurídica dos mesmos. Assim
acontece, por exemplo, no caso de um sujeito passivo auferir um rendimento de
capitais e ser qualificado pela Administração tributária como uma mais-valia ou um
sujeito passivo auferir uma pensão que foi erradamente qualificada como rendimento
do trabalho dependente.

75
A errónea quantificação dos factos tributários diz respeito a questões técnicas de cariz
contabilístico, tais como as questões relacionadas com o cálculo de uma indemnização
para efeitos de sujeição a imposto ou com a quantificação a partir de métodos
indirectos.

A inexistência do facto tributário verifica-se em casos de violação das normas de


incidência tributária ou sobre o conteúdo dos benefícios fiscais.

Fundamentos relativos a questões de direito

Enquadram-se nestes fundamentos as questões relativas a:

— incompetência da Administração tributária, já estudada;

— ausência ou vício da fundamentação do acto tributário, já estudados;

— preterição de outras formalidades legais, como por exemplo (i) a inexistência de


informação pelos serviços de fiscalização, (ii) as irregularidade da composição e
funcionamento das comissões, (iii) a inexistência da acta de uma reunião de peritos,
(iv) a falta de notificação do vogal dos contribuintes, (v) a preterição do direito de
audição, etc.;

— a duplicação da colecta, entendendo-se que esta existirá quando, estando pago por
inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro de igual
natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo (v. art.
205º do CPPT).

c) Tempestividade

O prazo-regra para a interposição da reclamação graciosa é de 120 dias a contar do


termo do prazo para pagamento voluntário, nos termos do art. 70.°, n.° l, e art. 102.°,
n.° l, alínea a), ambos do CPPT.

No entanto, existem alguns prazos excepcionais (sendo que “lex specialis derogat
generali”); temos, designadamente, os prazos previstos para as hipóteses de
reclamação necessária - art. 131.°, n.º l (dois anos), o art. 132.°, n.º 3 (dois anos), e o
art. 133.°, n.° 2 (trinta dias), todos do CPPT.

De salientar que a interposição da reclamação graciosa interrompe o prazo para a


interposição da impugnação judicial, uma vez que é possível usar este meio processual
após o indeferimento da primeira.

76
d) Tramitação do procedimento

A reclamação é apresentada no órgão periférico local, que procederá à instauração e à


instrução do procedimento (art. 73.°, n.° 2, do CPPT), em prazo não superior a 90 dias,
com os elementos que tiver ao seu dispor (e que, em princípio, se reduzirão a provas
documentais - art. 69.°, alínea f), do CPPT).

E quem decide a reclamação?

I. No caso do valor da causa não exceder o quíntuplo da alçada do tribunal


tributário de 1.ª instância e a questão a resolver seja de manifesta simplicidade, o
órgão periférico local decidirá de imediato após o fim da instrução (art. 73.°, n.° 4, do
CPPT);

II. Nos restantes casos, o órgão periférico local elabora uma proposta
fundamentada de decisão (art. 73.°, n.° 2 do CPPT) e remete a reclamação para o
dirigente do órgão periférico regional (art. 73.°, n.° 5 do CPPT), que é a entidade
competente para a decisão nos termos do art. 75.°, n.° l, do CPPT.

Quanto à decisão propriamente dita, podemos focar alguns pontos importantes:

1. Se a decisão for desfavorável, o sujeito é notificado do projecto de decisão para


exercer o seu direito de audição, oralmente ou por escrito, num prazo não inferior a 8
nem superior a 15 dias [art. 60.°, n.° l, alínea b), e n.° 6 da LGT).

2. Há situações em que o órgão decisor se pronuncia sobre a reclamação


interposta e há casos em que o órgão decisor nada diz (casos em que há, apenas, o
decurso do tempo). Assim sendo,

77
Consequentemente, o acto
tributário é total ou parcialmente
anulado e:
- devem apagar-se os seus
efeitos com eficácia ex tunc,
Deferimento - deve-se restituir o que haja sido
Expresso da prestado,
pretensão do
contribuinte - e caso se prove ter havido erro
imputável aos serviços, devem
pagar-se juros indemnizatórios
desde a data do pagamento.
Órgão decisor (cfr. art. 43º, n.º 1 da LGT e 61º,
pronuncia-se sobre n.º 3 do CPPT).
a pretensão do
contribuinte. Em
que sentidos o pode
fazer?

Consequentemente, o acto
tributário mantém-se no
ordenamento jurídico,
Indeferimento
produzindo os seus efeitos, e
Expresso da
podendo mesmo ser aplicado
pretensão do
um agravamento à colecta
contribuinte
quando se considere que a
reclamação foi infundada (cfr.
art. 77º do CPPT).

78
Em regra, entende-se que a Consequentemente,
reclamação foi indeferida o acto tributário
(indeferimento tácito da mantém-se e
pretensão). É o que resulta do continua a produzir
art. 57º, n.º 1 e n.º 6 da LGT e o efeitos.
art. 106º do CPPT.
Órgão decisor não
se pronuncia sobre
a pretensão do
contribuinte. Qual
o sentido a atribuir Pode também entender-se que
a esta actuação? a reclamação foi deferida
(deferimento tácito da Consequentemente,
pretensão do contribuinte). É o o acto tributário é
que acontece, por exemplo, anulado, com os
nas situações de reclamação efeitos já
dos pagamentos por conta, nos assinalados.
termos do art. 133º, n.º 4 do
CPPT.

e) Impugnação da decisão

A via normal de colocar em crise a decisão administrativa de indeferimento da


reclamação graciosa será a impugnação judicial, que deverá ser apresentada nos
seguintes prazos:

- 15 dias, nos casos de indeferimento expresso da reclamação graciosa (art. 102.°, n.°
2, do CPPT);

- 90 dias nos casos de indeferimento tácito da reclamação graciosa [art. 102.°, n.° l, alí-
nea d), do CPPT];

- 30 dias nos casos de reclamação graciosa prévia necessária nos casos de:

. impugnação por erro na autoliquidação (art. 131.°, n.os l e 2, do CPPT);

. impugnação por erro na retenção na fonte (art. 132.°, n.os 3 e 5, do CPPT);

. impugnação por erro nos pagamentos por conta (art. 133.°, n.os 2 e 3, do CPPT).

79
Não obstante, no caso de indeferimento da reclamação graciosa, o interessado pode
ainda recorrer hierarquicamente, no prazo de 30 dias (artigo 66º, n.º 2 do CPPT). No
caso de indeferimento do recurso hierárquico, a decisão é objecto de recurso
contencioso (aqui utilizada no sentido de impugnação judicial), salvo se de tal decisão
já tiver sido deduzida impugnação judicial com o mesmo objecto (Cfr. art. 76.°, n.os l e
2, do CPPT). A referida impugnação judicial do indeferimento do recurso hierárquico
poderá ser deduzida:

- no prazo de 90 dias a contar da notificação, se o indeferimento do recurso


hierárquico tiver sido feito expressamente - assim, art. 102.°, n." 1. alínea e), do CPPT;

- no prazo de 90 dias a contar do momento em que o recurso se considera tacitamente


indeferido, se tiver havido lugar a um indeferimento tácito do recurso hierárquico -
assim, art. 102.°, n.º l, alínea d), do CPPT.

g) As reclamações graciosas necessárias

Temos vindo a referir-nos à reclamação graciosa como um meio de carácter


impugnatório ou recursivo com natureza facultativa. Esta natureza facultativa permite
que o sujeito passivo possa lançar mão da reclamação graciosa apenas se assim o
entender ou, alternativamente, utilizar a impugnação judicial com o mesmo fim.

Todavia, existem situações em que o sujeito passivo, se quiser recorrer à via judicial,
deve primeiro esgotar a via administrativa, lançando mão dos meios graciosos que o
legislador coloca ao seu dispor, conseguindo a definitividade vertical do acto e, só
então, abrindo o canal contencioso. Estamos a falar de casos em que as reclamações
têm natureza necessária – são as reclamações necessárias, também designadas por
reclamações prévias. São três as situações mais importantes de reclamações
necessárias - as autoliquidações, as retenções na fonte e os pagamentos por conta.

Reclamação em caso de autoliquidação

Nos casos de autoliquidação, o próprio sujeito passivo procede à declaração,


quantificação e entrega da obrigação tributária, impendendo sobre si próprio o dever
de cálculo do tributo devido. Ora, o próprio sujeito passivo pode vir a concluir que não
efectuou as referidas operações convenientemente – seja porque omitiu deter-
minados proveitos ou custos, porque avaliou mal a situação de facto ou simplesmente
porque fez mal as contas. Compreende-se que, se tal suceder, o contribuinte possa
impugnar em Tribunal a liquidação feita por si próprio.

80
Nesta situação, o legislador não lhe permite o acesso directo à via contenciosa,
obrigando-o a esgotar primeiro as vias administrativas, impondo-lhe a utilização da
reclamação graciosa. Refere, assim, o art. 131.°, n.° l, do CPPT que "em caso de erro na
autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação
graciosa dirigida ao dirigente do órgão periférico regional da Administração tributária,
no prazo de 2 anos após a apresentação da declaração."36

Apenas assim não será se o fundamento impugnatório consistir exclusivamente em


matéria de Direito (v. g., interpretação de conceitos indeterminados) e a
autoliquidação tiver sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela
Administração tributária. Nestes casos, a reclamação já terá natureza facultativa37.

Em qualquer dos casos, havendo indeferimento da reclamação, o contribuinte pode


sempre intentar a impugnação judicial subsequentemente (no prazo de 30 dias) - cfr.
art. 131.°, n." 2, do CPPT.

Reclamação em caso de retenções na fonte

No caso de o substituto entregar um imposto superior ao devido – tendo efectuado


retenção a mais -, e o montante entregue a mais não for descontado nas entregas
seguintes da mesma natureza (porque, por exemplo, não existem mais entregas nesse
ano), o substituto deve reclamar graciosamente e só após o indeferimento desta
reclamação é que poderá impugnar judicialmente (no prazo de 30 dias) - cfr. art. 132.°.
n.os 2 e 3, do CPPT.

No caso de impugnação efectuada pelo substituído, esta será obrigatoriamente


precedida de reclamação nas situações de retenções a título definitivo. Nas retenções
a título de pagamento por conta (retenções a título provisório), o acerto será feito, a
final, com a liquidação definitiva resultante do englobamento dos rendimentos anuais
– cfr. art. 132º, n.º 4 do CPPT.

Reclamação em caso de pagamentos por conta

Quando os pagamentos por conta que foram efectuados são considerados indevidos,
tais pagamentos são susceptíveis de impugnação judicial com fundamento em erro

36
De facto, nestas situações ainda não existe propriamente um conflito de pretensões entre o credor
tributário e o sujeito passivo que justifique a entrada em cena de um órgão jurisdiconal (até por força do
princípio da economia dos meios processuais).
37
Uma vez que a Administração já se “pronunciou” sobre a matéria.

81
sobre os pressupostos da sua existência ou do seu quantitativo. No entanto, tal
impugnação depende, aqui, de prévia reclamação graciosa para o órgão periférico
local da Administração tributária competente, no prazo de 30 dias (Cfr. art. 133.°, n.os l
e 2, do CPPT). E caso a reclamação seja expressamente indeferida, o contribuinte
poderá impugnar em Tribunal, no prazo de 30 dias.

Importa lembrar que este é um dos poucos casos em que se prevê um deferimento
tácito — nos termos do art. 133.°, n.° 4, do CPPT "decorridos 90 dias após a sua
apresentação sem que tenha sido indeferida, considera-se a reclamação tacitamente
deferida".

5.7.4. Procedimento de recurso hierárquico

O recurso hierárquico é uma garantia administrativa impugnatória que consiste em


solicitar ao superior hierárquico da entidade que praticou um acto uma nova
apreciação sobre o mérito deste. Consequentemente, o objectivo da interposição de
tal recurso não é a anulação do acto (pois não há qualquer vício que o inquine), mas a
sua revogação. Assim,

Aprecia o quê? Órgão Competente Objectivo

Reclamação Graciosa A legalidade da Em princípio, o Anulação do acto


decisão dirigente do órgão tributário
periférico regional
da área do domicílio
ou sede do
contribuinte, da
situação dos bens ou
da liquidação (art.
75º, n.º 1 do CPPT)

Recurso Hierárquico O mérito da decisão Superior Hierárquico Revogação do


da entidade que acto tributário
praticou o acto

 Regras relativas à competência

O recurso hierárquico deve ser dirigido ao mais elevado superior hierárquico do autor

82
do acto de que se recorre nos termos dos arts. 66º, n.º 2 do CPPT e 80º da LGT
(embora deva ser entregue junto do órgão recorrido).

 Regras relativas a prazos

O recurso hierárquico deve ser interposto no prazo de 30 dias a contar da notificação


do acto de que se recorre, nos termos do art. 66º, n.º 2 do CPPT. Recorde-se ainda
que, tal como acontece com a reclamação graciosa, a interposição do recurso
hierárquico faz interromper o prazo de prescrição das obrigações tributárias (art. 49.°,
n.° l, da LGT).

 Classificação dos tipos de recurso hierárquico:

a) Quanto à projecção do recurso hierárquico sobre os efeitos do acto recorrido


(isto é, saber se o acto do qual se recorre vai continuar ou não a produzir efeitos
enquanto o recurso hierárquico é apreciado), temos:

- Recurso hierárquico com efeito meramente devolutivo se a sua interposição não


impede o acto recorrido de continuar a produzir os seus efeitos (acto recorrido
continua a produzir efeitos);

- Recurso hierárquico com efeito suspensivo se a sua interposição impede, até à


decisão, que o acto recorrido produza efeitos (suspende-se a produção de efeitos do
acto recorrido).

b) Quanto à relação do recurso hierárquico com a posterior possibilidade de


controlo jurisdicional, distingue-se:

- Recurso hierárquico necessário, quando seja indispensável para atingir a via


contenciosa (isto é, quando seja inevitável recorrer hierarquicamente para que,
posteriormente, se possa recorrer contenciosamente);

- Recurso hierárquico facultativo, quando não seja indispensável para atingir a via
contenciosa, podendo o interessado recorrer a tribunal mesmo que não recorra
hierarquicamente.

Nos termos do art. 67.°, n.° l, do CPPT, "os recursos hierárquicos, têm natureza
meramente facultativa e efeito devolutivo"38. O recurso hierárquico funciona assim

38
Como exemplo de um recurso hierárquico com efeito suspensivo, pode apontar-se o previsto no art.
75.°, n.° 2, do CIVA.

83
como uma espécie de "filtro administrativo", na medida em que evita o recurso
imediato a tribunal e dá ao superior hierárquico a possibilidade de revogar o acto do
inferior hierárquico.

 Decisões sujeitas a recurso hierárquico

a) Todas aquelas em que a lei prevê expressamente essa possibilidade, como, por
exemplo, os casos de reclamação graciosa indeferida (art. 76.°, n.° 2, do CPPT) ou de
não reconhecimento de benefícios fiscais (art. 65.°, n.° 4, do CPPT)

b) Aquelas em que a lei não prevê qualquer outra possibilidade de controlo


administrativo (ie, por um critério de exclusão de hipóteses), como acontece com as
correcções meramente aritméticas da matéria tributável resultantes de imposição
legal (art. 91.°, n.° 14, da LGT).

 Consequências da decisão proferida no recurso hierárquico

a) se houver um deferimento do recurso, o acto recorrido, em princípio, será


revogado;
b) se o recurso for indeferido, o acto recorrido mantém-se, abrindo-se a via
contenciosa.

5.7.5 Procedimento de correcção dos erros da Administração tributária

O interessado que lançar mão deste procedimento não pretende “impugnar” qualquer
acto da Administração – no sentido de atacá-lo com fundamento em ilegalidade,
buscando a sua anulação -, mas tão somente solicitar a sua correcção/reparação pelo
facto de ele ter sido emanado com base num erro material e manifesto, mas não
particularmente grave.

Este procedimento poderá, então, ser usado, por exemplo, numa situação em que o
contribuinte, apresentando uma matéria colectável de EUR 32 567 e sendo-lhe
aplicada uma taxa de 12%, é-lhe notificado na liquidação um valor a pagar de EUR 39
008 e não de EUR 3908.

Portanto, a reparação/correcção que se pretende é no sentido de adequação da


declaração emitida à efectiva vontade da Administração, pelo que o acto que enferma
este tipo de erro continua no ordenamento, apenas sendo corrigido para o rumo que

84
deveria ter seguido inicialmente.

Este procedimento encontra-se previsto no art. 95º-A e seguintes do CPPT, constando


a legitimidade, prazos e forma do pedido do art. 95º-B e a competência para a decisão
do art. 95º-C.

5.8. Procedimentos cautelares

Os procedimentos cautelares têm por objectivo salvaguardar a posição da


Administração tributária e garantir os créditos tributários, naquelas situações em que
existe um fundado receio (i) de frustração da cobrança dos créditos tributários ou (ii)
destruição ou extravio de documentos ou outros elementos necessários ao
apuramento da situação tributária dos sujeitos passivos e demais obrigados
tributários. Assim, os procedimentos cautelares são, por natureza, urgentes.

Os procedimentos cautelares (art. 51.°, n.º 3 da LGT) que podem ser adoptados pela
Administração são:

— apreensão de bens, direitos ou documentos (por exemplo, a apreensão de veículos


ou de mercadorias); ou

— retenção de prestações tributárias a que o contribuinte tenha direito, até à


satisfação dos créditos tributários (por exemplo, retenção de um reembolso a que o
contribuinte tenha direito).

Num caso ou no outro, deve-se respeitar o princípio da proporcionalidade (n.° 2 do art.


51º da LGT) e a decisão administrativa é susceptível de controlo jurisdicional, mediante
impugnação — a apresentar no Tribunal Tributário, no prazo de 15 dias após a sua
realização ou o seu conhecimento efectivo pelo interessado, quando posterior — com
fundamento em qualquer ilegalidade (art. 144.º do CPPT).

85

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