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INTRODUÇÃO
O Sistema Financeiro Nacional brasileiro está organizado pela lei 4595/64 e contém
diferentes espécies de instituições financeiras, cada qual desempenhando uma função
específica dentro do aludido sistema. Em especial, interessa aqui examinar as
características mais importantes das entidades que desenvolvem “atividades
bancárias”, que são os chamados bancos comerciais e os bancos múltiplos. Destes
últimos – os bancos múltiplos – interessa aqui examinar apenas sua “carteira
comercial”.
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Primeiramente, é preciso fixar o conceito de poupança. Cada sujeito integrante de
um certo sistema econômico tem uma determinada riqueza patrimonial, não
importando se muito grande ou se muito pequena. Esse sujeito usa essa riqueza para
satisfazer suas necessidades econômicas e também para produzir novas riquezas
econômicas. Portanto, cada indivíduo usa sua riqueza para consumir bens
econômicos e para produzi-los. Quando um indivíduo decide se abster de realizar um
consumo presente, deixa evidentemente de satisfazer uma necessidade econômica
que tem no presente. Essa conduta de abstenção chama-se poupança.2 A razão
essencial pela qual um indivíduo decide poupar (isto é, decide abster-se de um
consumo presente) é sua pretensão de poder dispor no futuro da riqueza poupada. A
poupança representa repressão ao consumo presente para tornar possível o consumo
futuro. Quando o indivíduo poupa sua riqueza presente para usá-la, também no
presente, numa atividade produtiva com a qual espera aumentar sua riqueza no
futuro, diz-se que tal indivíduo realizou um investimento.3 Quer se trate de poupança
propriamente dita, quer de investimento, observa-se que em ambas as hipóteses o
indivíduo considerado absteve-se de realizar consumo presente, de maneira a ter: (i)
riqueza que lhe garanta a possibilidade de consumir no futuro; ou (ii) recursos
disponíveis para investir em atividades econômicas que não só lhe assegurem a
possibilidade de consumo futuro, mas que também lhe aumentem a riqueza futura.
Nesses dois casos, pode-se dizer que tal indivíduo tem riqueza disponível presente e
que está disposto a suportar o sacrifício de não realizar atos de consumo presentes
para poder consumir no futuro ou para aumentar sua riqueza e capacidade de
consumo futuros. Embora os conceitos de poupança e de investimento sejam
distintos, como visto, neste trabalho usa-se o vocábulo poupança para designar a
disponibilidade presente de riqueza econômica que um sujeito tem para poupar ou
para investir.
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atividades econômicas e, ainda, que estejam dispostos a pagar juros ao banco para
terem a disponibilidade presente desses recursos. Nessa hipótese, diz-se que o banco
realizou operação bancária ativa, porque tornou-se credor de um empréstimo que
fez ao tomador de seus recursos disponíveis. Com isto, o banco espera: (i) receber de
volta, no futuro, os recursos emprestados, com os acréscimos pactuados com o
tomador de empréstimo; (ii) dispor, no momento adequado, de recursos necessários
para restituir o valor que ele – banco – tomou emprestado de cada poupador que fez
depósito de poupança naquele banco; e (iii) dispor, no futuro, de um aumento de
riqueza, correspondente à diferença entre o que ele, banco, tiver recebido nas suas
operações ativas e o que houver pago em suas operações passivas.
Todavia, a articulação das operações bancárias passivas e ativas tem efeitos mais
complexos que os acima mencionados. Cada vez que um indivíduo recebe
empréstimo de um banco, passa a ter uma riqueza adicional disponível para
poupança ou para investimento, ou ainda para transferir esses recursos a um outro
sujeito, como por exemplo para alguém que seja seu credor. Portanto, esse sujeito
(ou a pessoa para quem ele vier a transferir os recursos) tende a depositar essa
riqueza disponível, essa “poupança”, num banco comercial ou múltiplo. Se proceder
assim, esse sujeito estará fazendo um “empréstimo” para o banco recebedor do
depósito (estará contratando uma operação bancária passiva). Esse banco, por sua
vez, poderá usar parte desses recursos fazendo outro empréstimo para alguém
(poderá realizar, então, outra operação ativa). Isto evidencia que, sobre um mesmo
valor depositado num banco comercial ou múltiplo, é possível que esse banco realize
diversas operações passivas e ativas. Um exemplo prático certamente deixará esse
mecanismo muito claro.
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período. Assim, tendo em vista essa disponibilidade de R$ 100,00 por 30 dias, o
banco “X” empresta R$ 100,00 ao seu cliente “F” à taxa de juros 5% ao mês,
realizando com este mais uma operação ativa, em que “X” é credor de “F”. Logo, o
banco “X” receberá de seu cliente “F” o valor de R$ 105,00 em 30 dias. E o
encadeamento das operações poderia continuar. Observe-se, então, que o banco “X”
dispunha, inicialmente, de apenas R$ 100,00, que recebera do cliente “A”. Com
lastro nesse depósito de R$ 100,00, o banco “X” fez um total de empréstimos de R$
300,00 (R$ 100,00 para o cliente “B”, R$ 100,00 para o cliente “D”, R$ 100,00 para
o cliente “F”). Em decorrência de suas operações ativas, o banco “X” receberá juros
no montante de R$ 15,00 (R$ 5,00 do cliente “B”, R$ 5,00 do cliente “D” e R$ 5,00
do cliente “F”). Os devedores de empréstimos pagarão ao banco “X” o valor total
principal de R$ 300,00. Cumprindo suas operações passivas, o banco “X” restituirá
aos seus clientes depositantes o valor total de R$ 300,00 (R$ 100,00 para o cliente
“A”, R$ 100,00 para o cliente “C”, R$ 100,00 para o cliente “E”).
Esses aspectos todos mostram como é muito importante que a atividade bancária seja
submetida a um regime jurídico especial. Logo, os contratos bancários em geral e,
em particular, o contrato de abertura de crédito bancário, precisam ser analisados e
compreendidos a partir das normas legais e regulamentares que disciplinam o
funcionamento do SFN e dos bancos comerciais e bancos múltiplos. Disto resulta
que a atividade mercantil bancária está sujeita, atualmente, a intenso processo de
intervenção estatal na disciplina contratual dos diversos contratos bancários
conhecidos. Esses contratos estão submetidos, pois, a um regime jurídico especial.
Por causa disto, há quem sustente a existência de um ramo autônomo do Direito,
denominado Direito Bancário, dadas as particularidades que tal regime jurídico
apresenta.
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O empréstimo tem conceito jurídico preciso. Trata-se da situação em que alguém,
titular de um certo objeto jurídico, transfere seu uso temporário para outra pessoa,
para fim específico ou não, de modo oneroso ou gratuito, ficando obrigado o tomador
do empréstimo a restituir o aludido objeto nas condições estabelecidas no contrato.
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Daí a necessidade de inafastável articulação entre as operações bancárias passivas
e ativas. Essas operações devem ser realizadas pelo banco com observância de todas
as normas legais e regulamentares que disciplinam a atividade bancária e que a
submetem a um regime jurídico especial e diferenciado. Esse regime jurídico
especial, por um lado, visa à proteção do público em geral que “empresta” recursos
aos bancos por meio das operações passivas realizadas por estes e, por outro lado,
pretende assegurar a higidez e confiabilidade de todo sistema financeiro.
Foi visto que o banco, submetido a um regime jurídico especial, realiza operações
passivas e ativas, que devem sempre estar articuladas. As operações bancárias ativas
podem ser de várias espécies, entre as quais têm relevância específica as operações
de crédito.
RIZZARDO explica que crédito é “toda operação monetária pela qual se realiza
uma prestação presente contra a promessa de uma prestação futura.”4
RODRIGUES ensina que “empréstimo é o contrato pelo qual uma das partes entrega
uma coisa à outra, para ser devolvida em espécie ou gênero.”6
6
Um segundo tipo vem a ser a abertura de crédito, de grande frequência,
através do qual o interessado convenciona com o banco a concessão de um
crédito para daí a certo tempo, ou para determinada ocasião, a fim de atender
a necessidade já prevista, ou efetuar pagamentos programados.
(...).
Essas observações de RIZZARDO são importantes por dois motivos, a saber: (i) no
âmbito das operações de crédito, o autor distingue aquelas que se caracterizam como
empréstimo propriamente dito (mútuo) e as que são melhor compreendidas como
operações de financiamento, entre as quais RIZZARDO parece ter incluído a
operação de abertura de crédito; e (ii) permite a aplicação – obviamente supletiva –
das regras do mútuo às múltiplas espécies de operações de crédito, sejam estas de
empréstimo ou de financiamento, embora o autor não tenha justificado tal afirmação.
mútuo
empréstimos outras espécies
contratos de crédito
financiamentos outras espécies
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regra geral à disciplina particular do mútuo (que, como dito, é subespécie do gênero
maior dos contratos de crédito). Não obstante essa realidade, as opiniões doutrinárias
ainda são confusas e, em síntese, não apresentam claramente a distinção apontada. A
controvérsia tem início já nas tentativas de distinguir os contratos de mútuo e de
abertura de crédito bancário. As divergências podem ser resumidas como segue:
c) outro grupo de autores nega o caráter real do contrato de mútuo e, por conseguinte,
diz ser irrelevante distingui-lo do contrato de abertura de crédito bancário;
Entre os contratos reais está, como gênero, o contrato de empréstimo. Deste são
espécies o contrato de mútuo e o de comodato, tanto em direito civil como em direito
comercial. O comodato é caracterizado tecnicamente como empréstimo para uso,
pois tem por objeto coisa infungível que deve ser restituída, ela própria, pelo
comodatário ao comodante. O mútuo, por outro lado, dogmaticamente é
caracterizado como contrato de empréstimo de consumo, uma vez que tem por objeto
coisa fungível que, com a tradição, passa a ser de propriedade do mutuário. Por causa
disto, o mutuário deverá restituir ao mutuante não a mesma coisa que recebeu, mas
sim coisa do mesmo gênero, espécie, quantidade e qualidade. Os escritores têm se
restringido ao exame do mútuo e do comodato como espécies do gênero empréstimo.
Por isto, encontram dificuldades para diferenciá-los de outras figuras do gênero
operações de crédito. Apegados às espécies tradicionais do mútuo e do comodato,
tentam os autores aproximar as novas figuras contratuais de crédito bancário ao
paradigma do mútuo, que lhes é mais conhecido. Todavia, as novas figuras
contratuais de crédito bancário nem sempre são redutíveis às figuras conhecidas de
empréstimo (o mútuo e o comodato). É certo que os novos contratos bancários
podem muitas vezes ser enquadrados no gênero “empréstimo”, mas, em certos casos,
também podem ser qualificados como espécies do gênero “financiamento”. Deve ser
observado que a legislação atinente aos contratos bancários frequentemente faz
referências a nomes de operações bancárias que, contudo, não estão tipificadas nessa
mesma legislação no que diz respeito aos elementos estruturais desses novos
contratos. Isto quer dizer que, no mínimo, há previsão legal de contratos de crédito,
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que ora se caracterizam como contratos de financiamento, ora como contratos de
empréstimo. Nessas circunstâncias, não é correto querer reduzir todos os contratos de
crédito bancário ao paradigma dos contratos de empréstimo e, mais especificamente,
ao contrato de mútuo. Portanto, é preciso entender que o contrato de mútuo é espécie
do gênero de contratos de empréstimo que, por sua vez, é espécie do gênero mais
amplo de contratos de crédito. O contrato de abertura de crédito bancário, por outro
lado, é espécie do gênero contratos de financiamento e estes, então, são espécie do
gênero contratos de crédito. Esquematicamente, tem-se:
mútuo
empréstimos outras espécies
contratos de crédito
financiamentos contratos de abertura de crédito
outras espécies
O contrato de empréstimo não tem por objeto necessário o dinheiro. Podem ser
emprestados outros bens, fungíveis ou não. O mutuante deve entregar ao mutuário o
bem objeto do empréstimo e o mutuário, por sua vez, deve restituir aquele objeto (ou
o seu equivalente) ao mutuante. Por causa disto, historicamente o contrato de mútuo
foi concebido como contrato real. Não basta o consentimento das partes para formar
o contrato de mútuo, sendo exigida também a tradição do bem objeto do mútuo pelo
mutuante ao mutuário. Assim, a traditio é considerada elemento essencial para a
formação do contrato de mútuo. ALVES 10 diz que eram quatro os contratos reais
conhecidos no Direito Romano: mútuo, comodato, depósito e penhor. Modernamente
tem sido combatida a concepção arcaica dos contratos reais. Argumenta-se que o
formalismo dessa tradição é incompatível com as exigências da vida contemporânea,
em que se busca a simplificação na celebração de contratos num ambiente de
relações jurídicas massificadas. Tanto isto é verdade que, ao longo dos séculos,
foram sendo cada vez mais simplificadas as formas da traditio de bens que precisam
circular rapidamente no ambiente econômico, como pondera LOPES.11
9
RIZZARDO14 se manifesta dizendo que “há mútuo sempre que alguém entrega a
outrem uma certa quantidade de coisas fungíveis, para que a consuma,
comprometendo-se este a devolver, na forma e no prazo avençados, não as próprias
coisas recebidas, mas coisas ou bens equivalentes em quantidade, qualidade e
gênero.”
a) acordo de vontade entre os contraentes, que devem ter capacidade tanto geral
como específica para transmitir e adquirir o domínio do objeto mutuado, seja para
fins de entrega como de restituição;
e) ter forma escrita, embora não solene, para atender às necessidades de prova do
contrato.
Em decorrência dessa configuração do mútuo, produz ele efeitos jurídicos típicos que
podem ser resumidos nos termos seguintes:
14
RIZZARDO, op. cit., p. 23.
15
BULGARELLI, Waldírio. Contratos mercantis. São Paulo, Atlas, 1981, p. 247.
16
MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. Rio de Janeiro, Forense, 1990, p. 363.
17
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro, Forense, 1990, v. 3, p.
239.
18
GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro, Forense, 1987, p. 349.
10
c) feita a tradição do objeto do mútuo, o mutuário deve pagar ao mutuante os juros e
encargos convencionados, mesmo que não queira aproveitar as vantagens que o
contrato lhe proporciona;
19
LOPES, op. cit., p. 345 e ss.
20
LOPES, op. cit., p. 348.
21
LOPES, op. cit., p. 348.
11
fora, ter-se-ia de atribuir igual caráter real ao contrato de locação, o qual,
entretanto, se forma independentemente da tradição da coisa locada. A
entrega é execução do contrato; a obrigação de entregar dá nascimento a um
crédito líquido e certo em favor do mutuário. CARRARA é a esse propósito
incisivo ao dizer: para nós, no negócio contratual nada mais existe do que
mainifestações concordantes de vontades e direitos e obrigações, conhecidos
pelo ordenamento jurídico. A entrega da coisa está fora do negócio; ela é o
adimplemento de uma obrigação, é parte da execução, elemento de um outro
negócio – o liberatório.”
Mas LOPES22 teve que se curvar ao direito positivo. Aponta os códigos francês,
português, argentino e o alemão como exemplos de leis civis filiadas expressamente
à doutrina clássica realista. No que concerne ao direito civil brasileiro, o autor teve
esperança de que a doutrina consensualista do contrato de mútuo pudesse ser mais
largamente aceita. Pondera o autor:
22
LOPES, op.cit. p. 349 e ss.
12
O contrato de abertura de crédito bancário, como contrato atípico que é (porque a lei
não lhe dá o delineamento estrutural mínimo), está genericamente autorizado pelo
art. 425 do novo Código Civil. O Código Civil de 1916 também não se ocupou desse
contrato.
RIZZARDO, cita ainda Luis Alberto Delfino Cazet, que diz que a abertura de crédito
bancário “es aquel contrato por el que um banco se obriga mediante un comisión, a
poner a disposición de una persona determinada suma cierta de dinero, o a realizar
otras prestaciones por las que este pueda obtenerlo a su requerimiento, em un solo
momento, escalonada o por fracciones según sus necesidades, por un cierto período
de tiempo o por tiempo indeterminado, sin que se obligue a usar el credito
concedido.”
13
GOMES ainda acrescenta que o crédito pode consistir em aceite, fiança ou aval.
Também o conceito acima transcrito é impreciso, na medida em que não indica se o
creditado tem obrigação ou faculdade de usar o crédito que lhe foi aberto pelo banco.
3) ser o objeto desse contrato não o bem fungível em si mesmo, mas sim a
disponibilidade do crédito para obter o bem desejado pelo creditado ou pelo terceiro
por este indicado;
COVELLO29 observa que quando o banco tiver que colocar à disposição do cliente
ou de terceiro certa importância pecuniária, deixa inequívoco que, concluído o
28
MIRANDA, op. cit. p.
29
COVELLO, op. cit. , p. 191/192.
14
contrato, tem que conceder o crédito. Assim, o creditado adquire de imediato “o
direito de dispor da soma pecuniária quando quiser.” Veja-se o que disse esse autor:
“O que mais embaça a matéria é não se atender, desde todo o começo, a que
no contrato de abertura de crédito quem está com o valor ainda não prestou e
não se fez, portanto, credor. Em vez disso, credor é quem nada prestou e pode
exercer, conforme o contrato, ou o uso, a lei, o direito, a pretensão e, se o
creditador se recusa a adimplir o que prometera, a ação.”
GOMES31 chama a atenção para o fato de que o crédito permanece aberto por tempo
determinado ou não, podendo ser utilizado de pronto ou parceladamente, pelo cliente
ou por terceiro que ele indicar. O banco não transfere a quantia ao creditado. Apenas
a coloca à disposição do creditado, permanecendo tal quantia no caixa do banco até
que o creditado a solicite nas condições previstas no contrato. Diz o autor que a
essência do contrato de abertura de crédito bancário
30
MIRANDA, op. cit. p.
31
GOMES, op. cit. p. 364/368.
32
MARTINS, op. cit. p. 521.
15
5) é oneroso, porque o creditado deve pagar ao banco uma remuneração pela abertura
de crédito;
De fato, como alerta PEREIRA34, não se deve confundir o mútuo com o contrato de
abertura de crédito bancário. Neste último, o creditador se obriga a efetuar a tradição
33
RIZZARDO, op. cit. p. 39.
34
PEREIRA, op. cit. p. 245/246.
16
da quantia como ato de execução do contrato, ao passo que no contrato de mútuo
esse ato de entrega é essencial à formação do contrato, não sendo, portanto, ato de
sua execução. Além disso, no mútuo, o acordo de vontades das partes é simultâneo à
operação jurídica da tradição do objeto mutuado, enquanto que na abertura de crédito
o creditado tem a liberdade de usar ou não o crédito aberto durante o período previsto
e no limite do pactuado. O mutuário, por sua vez, tem a obrigação de receber o bem
que lhe é traditado e com isto se esgota seu eventual direito contra o mutuante.
LOPES35 entende que mútuo e abertura de crédito bancário diferem na estrutura, nas
respectivas finalidades, na forma de execução e, principalmente, porque no mútuo a
restituição se processa pela devolução ao mutuante de coisa equivalente à que foi
objeto do contrato, ao passo que na abertura de crédito tal devolução pode ser feita
em mercadorias, em títulos creditícios, em dinheiro ou outros bens.
17
imagine-se que o banco abra ao cliente um crédito de R$ 1.000,00 por trinta dias.
Nesse período, o cliente saca contra o banco R$ 700,00. Ao final do prazo de
vigência contratual, o banco cobrará desse cliente o valor de R$ 700,00 com os
acréscimos pactuados. Nenhum depósito que o mesmo cliente tenha feito em sua
conta no mesmo período será utilizado para liquidar ou abater aquela dívida de R$
700,00 ou seus acréscimos.
18
o prazo contratual. Só depois desse fato é que terá um retrato completo dos saques e
depósitos realizados pelo cliente e poderá calcular os juros e encargos devidos em
cada período. Daí a necessidade de o contrato de abertura de crédito bancário
rotativo ser complementado por outro documento – o extrato do período – para que
ambos (contrato e extrato) formem um só título executivo complexo. Por isto mesmo
é que esse extrato é o instrumento de liquidação do crédito do banco. Esse extrato
tem que ser elaborado com rigorosa observância dos critérios contratuais objetivos
fixados pelas partes para a determinação do valor principal da dívida, dos juros
pactuados e dos demais encargos devidos. Na exata medida em que tal extrato
cumpra essas exigências, o cliente tem obrigação moral e contratual de aprová-lo,
seja de modo expresso (o que é raríssimo), seja tacitamente (o que retrata o costume
vigente nessa matéria).
(E) CONCLUSÕES
37
RODRIGUES, op. cit. p. 271.
38
CARNELUTTI,
19
Como esclarecido logo no início deste estudo, a questão proposta deve ser examinada
levando-se em conta o regime jurídico especial das atividades bancárias, que têm
natureza mercantil. A legislação bancária e a comercial freqüentemente tendem a
admitir contratos atípicos, consensuais e não solenes. Por isto, mesmo que não
estejam tipificados na lei os principais contratos bancários (no sentido de que a lei
não delineia a estrutura mínima desses contratos), é fato inequívoco que essa
legislação se reporta a esses contratos pelo menos nominalmente. Assim ocorre com
a lei 4595/64, com a lei 4728/65 e com a lei 6385/76, com suas respectivas
alterações. Nessas leis há referências expressas a operações (contratos) de repasses,
redescontos, swaps, opções, ente outros negócios de mercado financeiro, de bolsa e
de mercado de capitais.
Como já foi dito, não há conceito legal de financiamento, mas a legislação bancária
fornece elementos que permitem concluir, a grosso modo, que o financiamento é a
operação por meio da qual o banco coloca à disposição de alguém recursos e meios
imediatos para a realização de certo objetivo, pretendendo, no futuro, receber de
volta esses recursos e meios com vantagens específicas. É exatamente o que ocorre
com o contrato de abertura de crédito bancário.
Assim, pode-se concluir que todas aquelas figuras contratuais não podem ser,
rigorosamente, equiparadas ou confundidas com o contrato de mútuo. Ao contrário,
precisam ser qualificadas como subespécies da espécie “financiamentos bancários”,
pertencentes ao gênero dos contratos bancários de crédito. Somente assim é que se
consegue dar sentido jurídico próprio às figuras de contratos bancários irredutíveis ao
paradigma do contrato de mútuo.
20
É sabido que a lei – e apenas a lei – pode criar títulos executivos. Nosso regime legal
prevê duas espécies de títulos executivos: os judiciais e os extrajudiciais. Interessam-
nos mais especificamente os títulos executivos extrajudiciais.
Os títulos executivos extrajudiciais estão indicados no art. 585, do CPC, mas tal
dispositivo não esgota a relação de documentos aos quais a lei atribui força
executiva. Há diversos outros dispositivos legais que criaram diferentes títulos
executivos extrajudiciais.
Todo título executivo se presta a cumprir uma função jurídica específica, qual seja,
fundamentar o pedido de movimentação do aparelho judicial estatal para concretizar
em favor do credor o direito expresso no título executivo. A concretização daquele
direito do credor é feita mediante agressão física imediata ao patrimônio do
executado.
Por um lado, o título executivo é formal. Isto quer dizer que o título executivo: (a)
está materializado num documento; (b) tem exata e estritamente o conteúdo inserido
no dito documento.
Assim, o título executivo deve indicar quem é o credor, quem é o devedor, qual é o
direito do credor em face do devedor, qual o conteúdo e limites desse direito, a época
em que o mesmo direito pode ser exigido e em que condições essa exigência pode
ocorrer. O que não estiver declarado no título não faz parte de seu conteúdo e,
consequentemente, não pode ser executado.
De outro lado, o título executivo não é apenas forma, não é abstrato. O conteúdo
do título deve necessariamente corresponder a um negócio jurídico material
verdadeiro, qual seja, aquele negócio que o mesmo título declara ter existido entre as
partes no mundo real.
21
chamada em doutrina de pacto executivo e que, em última análise, garante ao juiz
que a execução é presumivelmente legítima.
Por todas essas razões, ao ser manejada uma execução fundada em título executivo
complexo, a lei exige que todos os documentos que o compõem sejam apresentados,
pois é a partir dessa constelação documental que se poderá aferir o exato conteúdo do
título executivo.
22
Mais uma vez é preciso repetir o que já foi exposto na seção (IV) (E) acima, isto é, o
problema de eventual incerteza, iliquidez ou inexigibilidade da dívida
decorrente de contrato de abertura de crédito bancário só poderá existir em
relação à modalidade de crédito rotativo. É nesse contexto que se passa a
examinar a matéria que segue.
Há outras situações jurídicas em que o sujeito de direito capaz declara sua vontade de
realizar um negócio jurídico e isto basta para desencadear os efeitos dessa
declaração. Nesses casos, a declaração de vontade não precisa ser aceita por aquele
ou aqueles a quem se destinou. Trata-se do que se denomina declaração de vontade
não receptícia, ou seja, declaração de vontade apta a produzir efeitos jurídicos
23
independentemente de seus destinatários concordarem com ela ou não. São exemplos
de declaração de vontade não receptícia a renúncia a direito, a promessa de
recompensa, a emissão de um título de crédito, a confissão de fato jurídico.
Por isto, não se pode confundir as declarações unilaterais de vontade que o banco
faz ao elaborar e emitir os extratos de movimentação referidos com os efeitos
(unilaterais ou bilaterais) que podem advir daquelas declarações de vontade. Em
suma, é preciso verificar se as declarações unilaterais de vontade manifestadas pelo
banco são receptícias ou não receptícias em relação ao cliente. É necessário examinar
se tais declarações unilaterais de vontade do banco: (i) seriam suficientes para
atribuir certeza e liquidez aos lançamentos contábeis contidos nos extratos,
independentemente de o cliente aceitar esses efeitos (declaração de vontade não
receptícia do banco); ou se, ao contrário, (ii) seria indispensável a manifestação de
vontade do cliente reconhecendo a certeza e liquidez dos fatos contábeis
discriminados nos extratos (declaração de vontade receptícia do banco).
Ora, o sujeito de direito pode perfeitamente fazer uma declaração de vontade não
receptícia para constituir um título executivo extrajudicial em que figure como
devedor. Tome-se como exemplo a emissão por esse sujeito de uma nota promissória
ou de um cheque. Independentemente de o credor indicado na nota promissória ou no
cheque concordar com o teor da declaração de vontade feita pelo devedor, este
último tornou-se obrigado nos termos retratados no título. No entanto, não parece ser
razoável que um sujeito possa fazer uma declaração de vontade não receptícia para
constituir um título executivo extrajudicial em que figure como credor. Nesse caso, é
indispensável que o sujeito indicado no título como devedor manifeste sua aceitação
da nova situação jurídica em que foi posto. Sem que aceite sua qualidade de devedor,
devedor não será. Por isto, é inadmissível que o banco considere certos e líquidos os
fatos contábeis discriminados nos extratos sem que o cliente manifeste sua aceitação
a respeito desses efeitos. Isto quer dizer que, ao elaborar e emitir os extratos de
movimentação de contrato de abertura de crédito, o banco faz declarações de vontade
receptícias que, por conseguinte, só produzirão o efeito de atribuir certeza e liquidez
aos fatos contábeis ali retratados se o cliente aceitar esses efeitos.
Torna-se necessário, então, investigar quais são as formas possíveis pelas quais o
cliente pode manifestar sua aceitação a respeito dos lançamentos contábeis contidos
nos extratos de movimentação de contrato de abertura de crédito bancário. É intuitivo
que essa vontade do cliente pode ser declarada de modo expresso ou tácito. Mas, em
que momento essa declaração de vontade deve ser feita? É o que se passa a examinar
agora.
24
porque o BACEN impõe ao banco essa obrigação. Não havia, a respeito dessa
conduta, nenhuma liberdade contratual para as partes contratantes. Estas haviam de
se submeter ao regramento intervencionista ditado pelo BACEN. Desse modo, como
já se disse antes, o banco emite os extratos para dar cumprimento a uma norma
regulamentar e a uma norma contratual (esta, decorrente da convenção das partes). A
emissão dos extratos não é um ato puramente potestativo do banco, mas sim o
cumprimento de sua obrigação acima referida. Entretanto, essas considerações não
autorizam a conclusão de que seria legítima a cláusula contratual em que o cliente,
desde a assinatura do contrato, declara reconhecer como certos e líquidos, para fins
de cobrança de dívida, os lançamentos contábeis feitos nos extratos elaborados e
emitidos pelo banco. É verdade e é correto, juridicamente, que o banco elabore e
emita extratos para cumprir seu dever contratual e a norma do BACEN a esse
respeito. Isto não significa admitir que, a priori, os registros contábeis contidos nos
extratos sejam certos e líquidos para fins de cobrança de dívida. É imprescindível
que o banco conceda ao cliente pelo menos uma oportunidade de conferir os
extratos e declarar, expressa ou tacitamente, se concorda ou não com os
lançamentos feitos pelo banco.
25
Se operacionalmente for possível, o banco poderá emitir, também, um
demonstrativo contábil discriminativo do cálculo apontado no extrato. Esta
providência reforçará ainda mais os argumentos acima expostos.
Veja-se o que decidiu a 4ª Turma do STJ por v.u. em 16.06.92, em acórdão de que
foi relator o Min. Barros Monteiro, encontrado in RT 692/165. Do julgamento
participaram Athos Carneiro, Bueno de Souza, Fontes de Alencar e Sálvio de
Figueiredo. A ementa foi a seguinte:
c) a tese defendida pelo relator foi esta: "O extrato reivindicado constitui o
instrumento hábil, através do qual, uma vez aberto o crédito em conta
corrente, se pode verificar em quanto soma o saldo devedor. Este documento
é que conterá os saques, requisições, transferências, recibos e ordens de
pagamento emitidos pela devedora financiada. Em precedente da Turma, de
que também foi relator o E. Min. Athos Carneiro, considerou-se
imprescindível que a inicial da execução, nos casos de abertura de crédito
com desembolsos condicionados, viesse acompanhada do adequado
demonstrativo contábil (REsp 6.949-CE). Concluiu a Corte naquela ocasião
que o 'exequente deveria demonstrar ab initio através da juntada de
demonstrativo adequado, a liquidez do crédito exigido, inclusive como
garantia do direito de defesa a ser exercido através dos embargos";
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Observe-se, primeiramente, que essa questão frequentemente significa - sem meias
palavras - preguiça do juiz em fazer qualquer conta para examinar o demonstrativo
contábil. É essencial que as minutas contratuais padronizadas utilizadas pelos bancos
apresentem critérios objetivos para a determinação do quantum devido pelo cliente.
Além disso, o creditado precisa ter, ainda, oportunidade pré-executiva para conferir a
exatidão dos extratos no prazo que pactuou com o banco. Seu comportamento nesse
ponto deve ter significado específico: se não impugnar o extrato, interpretar-se-á sua
conduta como aprovação. De fato, o princípio da segurança e da estabilidade das
relações jurídicas não pode ficar a mercê dos caprichos ou da desídia do devedor
relapso. A pessoa medianamente diligente confere seus extratos bancários
regularmente e apresenta desde logo as impugnações que entender pertinentes.
Uma vez conhecidas as taxas cobradas pelo banco, que precisam ser as constantes do
contrato, simples operações aritméticas permitem à pessoa medianamente esclarecida
e diligente calcular sua dívida e examinar a exatidão do extrato, que obviamente há
de ser elaborado com estrita atenção aos critérios contratuais.
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Como já foi explanado acima, no contrato de abertura de crédito encontram-se, entre
outras, as seguintes manifestações de vontade das partes :
c) a prestação de contas deve ser feita por meio de extratos, que integram o
contrato e formam junto com este um título executivo complexo;
Outro critério que precisa ser levado em consideração é o seguinte: se o extrato for
considerado ilíquido para retratar os saques feitos pelo cliente, também deverá ser
considerado ilíquido para evidenciar os depósitos feitos pelo cliente na conta
corrente. É O PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA PROVA.
Desse modo, sendo o cliente devedor do banco e tendo feito depósitos na conta, esses
mesmos depósitos somente seriam debitados do montante creditado depois de serem
apurados regularmente em processo de cognição. Óbvio que isto não interessaria ao
creditado, que precisaria opor-se opor à cobrança da dívida sem poder deduzir desta
as quantias já depositadas na conta corrente. De fato, em geral o banco utiliza notas
promissórias para garantir a cobrança da dívida oriunda do contrato de abertura de
crédito bancário, teria que cobrar a dívida inteira - sem dedução dos depósitos feitos
pelo cliente - se este viesse a dizer que o extrato é ilíquido.
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“Execução – Legitimidade "ad causam" - Ação proposta por quem não é
titular do direito reclamado - Cisão do direito subjetivo de crédito e da ação
respectiva de cobrá-lo, permanecendo esta com o cedente e integrando
aquele o patrimônio do cessionário - Admissibildade - Princípio da autonomia
de vontade não violador da ordem pública ou de postulados legais - Cessão,
ademais, "pro solvendo", permanecendo em situação de pendência a
responsabilidade do cedente para com o cessionário - Fato que confere
àquele interesse na execução do crédito, a justificar sua legitimação -
Inexistência de ofensa aos princípios dos arts. 75do CC e 6° do CPC.
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III) não impugnou os extratos no prazo em que deveria fazê-lo e de acordo
com as previsões do contrato celebrado com o banco.
Não foi argüido qualquer excesso ou erro de cálculo, seja nas razões do
pedido de anulação da execução (...), seja nas razões do recurso (...) ou na
petição de ordem do mandado de segurança (...).
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próprio contrato, que o título de crédito extrajudicial - Preliminar rejeitada -
Apelo improvido.' (JTARS 59/176)
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No mesmo sentido, encontramos in RT 652/151 uma decisão da lª Câmara Cível do
Tribunal de Alçada do Paraná, por v.u. e cujo julgamento ocorreu em 28.03.89, com
o relatório de Accácio Cambi. A ementa diz:
Nota-se que em quase todas as decisões até aqui referidas a questão sempre é tratada
com vistas à bilateralidade que o extrato deve apresentar, ou seja, é necessário que o
devedor tenha tido oportunidade pré-executiva para conferir os extratos elaborados e
emitidos pelo banco.
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Outro argumento que precisa ser considerado em matéria de execução de contrato de
abertura de crédito bancário é o que se refere aos princípios regentes da atividade
bancária e aos usos e costumes bancários. Evidente que o contrato não pode prever
detalhadamente todas as situações relacionadas com tal operação creditícia. Há
milhões de operações semelhantes feitas todos os dias pelo banco e nem sempre é
possível que o documento contratual discipline situações muito específicas. Nesse
contexto, não é possível formalizar no documento referido todos os atos e
entendimentos das partes.
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a) examina, com profundidade, os mecanismos de funcionamento do Mercado
de Capitais. Tal análise pode, em certa medida, ser aproveitada para as
operações realizadas no mercado bancário;
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- em relação ao extrato bancário, devem ser aproveitados os argumentos da
boa-fé, confiança (aliás, elemento essencial de toda operação de crédito),
celeridade, informalidade, usos e costumes consagrados e de prova
documental que deve ser presumida como idônea, somente podendo ser
desconstituída pelo cliente em ação própria (porque a ilegitimidade do
documento é excepcional num universo de milhões de idênticas operações
não impugnadas).
Ainda no contexto da confiança, lealdade e boa-fé entre as partes pode ser citado
acórdão que decidiu questão em que foi constatada divergência entre o extrato e a
contabilidade do banco. O acórdão está na RT 639/151. É da 3ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Paraná, de 29.11.88 e que com votação unânime, relatada por
Luiz Perrotti, tem a seguinte ementa:
"Por outro lado, não colhe o argumento de que o sobredito documento de fls.
9 apresenta-se desprovido de qualquer valor probante, pois, como cediço, o
traço marcante da relação entre os clientes e o banco está na confiança,
sendo comum, nos dias atuais, até aplicações por telefone."
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(E) ANÁLISE DE DECISÃO HISTÓRICA SOBRE O TEMA
Aderiram à tese favorável ao banco: Ary Belfort, Oliveira Lima, Álvaro Lazzarini.
Luis de Macedo, Nelson Hanada, Pereira da Silva, Toledo César, Negreiros
Penteado, Jorge Tannus, Pinto de Sampaio, Pinheiro Rodrigues, Ruy Camillo,
Minhoto Junior, Orlando Gandolfo, José Osorio, Ferreira da Cruz, Furquim
Rebouças, Benini Cabral, Alexandre Loureiro, Fonseca Tavares, Cunha Bueno e
Oetterer Guedes.
d) a tese sustenta, ainda, que todo título executivo tem dois elementos: a
declaração de existência de obrigação que deve ser satisfeita por via
executiva; e a ordem de execução;
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retratado; 5) pode-se ser titular de um direito sem que se tenha o título
(documento);
g) anota a evolução dos títulos executivos desde a Idade Média. Para facilitar
a agilidade no comércio, precisava-se de documentos que dessem a certos
créditos tutela mais fácil e rápida que a de um processo ordinário. Confissão
do devedor perante notário público equivalia à confissão feita perante o juiz.
Desse instrumento público de confissão passou-se gradativamente para os
títulos executivos extrajudiciais. Por fim, a lei processual passou a enumerar,
taxativamente, quais os documentos privados dotados de força executiva;
i) a tese examina, também, que o art. 585, II, do CPC, considera título
executivo "o documento público, ou o particular assinado pelo devedor e
subscrito por duas testemunhas, do qual conste a obrigação de pagar quantia
determinada (...)". Entende que a expressão "quantia determinada" é
restritiva para fins de se identificar qual documento pode ser considerado
título executivo;
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créditos (...). Desse modo, ficam expressa e plenamente assentados a certeza e
a liquidez do saldo da conta". Comentam esses dados como seque:
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Ou melhor, se surge o contrato de abertura de crédito para atendimento de
alguma situação econômica e social, que o tome ajustado a esses novos
condicionamentos, não se lhe poderia retirar o caráter de liquidez, fazendo-se
com que o direito se contivesse, se restringisse a uma estrutura anterior em
que as relações poderiam se constituir em meio a menor celeridade.”
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sentido autêntico definido a partir de dois contextos: o da frase e, sobretudo, o
contexto real ao qual a frase se refere. Por isto, a interpretação deve
corresponder à lógica razoável;
Cabe ponderar, nesse ponto do presente estudo, que seria possível argumentar
que, pelo menos até o penúltimo movimento do creditado, o extrato foi aceito
por ele. Por exemplo, se após sucessivas movimentações, o extrato indicar um
saldo de 10 e, sobre esse saldo, o creditado fizer nova movimentação, pode-
se sustentar que admitiu que até a penúltima movimentação a conta estava
correta. Vale também ponderar a respeito dos efeitos da quitação que pode
decorrer da aprovação do extrato.
A tese contrária ao banco não é desprezível. Aderiram a ela: Rafael Granato, Rangel
Dinamarco, Carlos Antonini, Arthur de Godoy, Paulo Shintate, Penteado Manente,
Nelson Altemani, Jorge Almeida, Renan Lotufo, Nelson Schiavi e Olavo Silveira.
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que alguém pudesse ser juridicamente atingido em seu patrimônio sem prévio
consentimento. Por volta do ano 1000, surge o título executivo como
elemento conciliador das duas tendências. É ele um juízo de probabilidade de
que o crédito existe quando a execução é feita. A probabilidade resulta ou da
declaração do devedor ou da autoridade do Estado;
g) diz que o requisito da liquidez dos créditos em execução tem por finalidade
dar ao juiz segurança de que está agredindo legitimamente o patrimônio do
executado;
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k) diz que a função econômica do crédito bancário é menos relevante que o
risco que se tem ao admitir a execução ilegítima contra o executado. Diz que
os bancos devem ser criativos para encontrar solução que corresponda aos
seus interesses, sem usar o Judiciário como instrumento dos lucrosos
negócios bancários.
Nesse sentido, o STJ proferiu muitas decisões, entre as quais, apenas para fins de
referência, cita-se o Recurso Especial nº 85.877, oriundo do Paraná, em que foi
relator o eminente Ministro Barros Monteiro (também relator dos Recursos Especiais
nºs 55.354-7, do Rio de Janeiro, 60.233-5, de Minas Gerais e 74.441, também de
Minas Gerais) o Recurso Especial nº 11.037-0, proveniente do Distrito Federal,
relatado pelo insigne Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira.
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1º - no contrato, o creditado atribuirá ao banco a obrigação de lhe prestar
contas dos créditos, débitos e demais lançamentos efetuados na conta corrente
do cliente;
RENATO SEIXAS
ADVOGADO
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