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PAULO C. ABRANTES *
Universidade de Brasília
C.P. 04661
70919-970 BRASÍLIA, DF
BRASIL
abrantes@unb.br
INTRODUÇÃO
que têm os primatas, para usar categorias relacionais, em especial para compre-
ender relações sociais entre terceiros (terceiras partes) em um ambiente social.
Há controvérsia, contudo, quanto aos resultados de experimentos com chim-
panzés, quando comparados com crianças entre três e seis anos, de um lado, e
com adultos autistas, de outro. Alguns pesquisadores afirmam que os chimpan-
zés estariam no limiar da teoria da mente. Mithen (1998, pp. 130-1) parece atri-
buir aos chimpanzés uma teoria da mente. Ver também Premack (1988).
9 Para Sterelny, essa integração das diferentes áreas do conhecimento cientí-
também adequados para descrever outros tipos de sistemas cognitivos. Ver nota 29.
saltar desde já o duplo uso que é feito da PS por Godfrey-Smith e Sterelny: co-
mo uma descrição da arquitetura dos sistemas intencionais e como base para as
nossas habilidades de interpretação. No parágrafo que antecede esta nota, esse
duplo uso é bastante patente.
14 O adaptacionismo foi alvo de muitas críticas, que podem ter sido evocadas
car “as operações cognitivas ordinárias” dos indivíduos, suas crenças (estados
mentais) particulares etc. (1998a, p. 24). A tese da complexidade ambiental é
aplicada somente à filogenia da cognição e não à sua ontogenia. Como já ressaltara
Tinbergen, diferentes questões podem ser colocadas a respeito de um padrão
comportamental (ou de uma estrutura), e a tese da complexidade ambiental não
pretende responder a todas elas. Godfrey-Smith distingue, além disso, aquelas
capacidades mentais que são teleonomicamente primárias, das secundárias (os
qualia, por exemplo, incluir-se-iam nesta última categoria). A tese da complexi-
dade ambiental, como interpretada por ele, pretende explicar somente as primei-
ras – porque a cognição existe e não tudo o que ela faz (essa distinção corresponde
a diferentes concepções de função, mencionadas na nota 15; ibid. p. 21). Godfrey-
Smith admite que a “cognição” envolve muitos processos – percepção, repre-
sentação, emoção, consciência etc. – e que a tese da complexidade ambiental não
pretende explicar a existência de todos eles, mas somente a dos mais “básicos” e
“teleonomicamente primários”, que possibilitam aos organismos exibir um
comportamento complexo. A interpretação mais fraca da tese da complexidade
ambiental, sustentada por Godfrey-Smith, e que ele denomina de interpretação
teleonômica, transforma aquela tese em uma “hipótese adaptacionista” e externalis-
ta. A interpretação instrumental da tese da complexidade ambiental, atribuída a
Dewey, torna esta tese forte demais pois a cognição é vista, em todas as suas ma-
nifestações e papéis, como visando exclusivamente a fins teleonômicos (como a
sobrevivência, a saúde, a reprodução etc.) não deixando espaço para outras fun-
ções que possam ser desempenhadas pela economia dos agentes cognitivos, e
não diretamente relacionadas com a “resolução de problemas comportamentais”
(Godfrey-Smith ibid., p. 23).
19 O termo ‘plasticidade’ estará sendo usado tanto para qualificar o comporta-
mento (enquanto característica fenotípica), como é o caso aqui, quanto para quali-
ficar o desenvolvimento, em discussões que farei nas próximas seções. Por uma
questão de fidelidade aos textos originais mantive, neste artigo, essa ambigüida-
de, que poderia, no entanto, ser evitada adotando-se o termo ‘flexibilidade’ em
um dos casos, por exemplo, flexibilidade no comportamento/flexibilidade feno-
típica. Godfrey-Smith admite, entretanto, em uma resposta a Sober, que nem
toda plasticidade fenotípica depende da cognição. Muitos organismos mesmo
estando, por assim dizer, abaixo da fronteira cognitiva, também exibem essa
plasticidade. De toda forma, Godfrey-Smith é explícito em seu objetivo de “sub-
linhar as continuidades em vez de as descontinuidades” (1997, p. 584).
próprio conceito de ‘função’ a que me referi na nota 15, mas não poderei tratá-
las aprofundadamente neste artigo. Limito-me a citar um trecho de Godfrey-
Smith: “Explicações funcionais são tentativas de isolar os efeitos ou disposições
de uma estrutura que foram responsáveis pela seleção natural daquela estrutura.
Portanto, asserções funcionais são ‘teleológicas’ somente nesse sentido especifi-
camente darwinista” (Godfrey-Smith 2002, p. 5). Nesta passagem, o conceito de
função adotado é o proposto por Wright.
provenientes dos diferentes canais utilizados (Sterelny 2003b, pp. 23-4; cf. p. 33).
26 O ambiente de um mesmo tipo de sistema cognitivo pode ser transparente
2) Representar o mundo não é nada mais do que ser interpretado (ou in-
terpretável) por pessoas como nós, usando um esquema conceitual espe-
cial. (Godfrey-Smith ibid. id.)
uniformes no uso desses termos em seus vários trabalhos, convém não confun-
dir a coordenação desses dois tipos de fatos, com a integração de ciências, de que
falei anteriormente (ver nota 9), embora estejam relacionadas.
32 As discussões anteriores devem ter deixado claro que a circuitaria não de-
ve ser entendida como uma estrutura a ser descrita pela neurofisiologia, mas sim
no nível propriamente psicológico, e com uma linguagem intencional. Não é,
portanto, um disparate afirmar que uma teoria tão antiga quanto a PS pode des-
crever, em uma perspectiva realista, os fatos de circuitaria-e-conexão (ver Godfrey-
Smith 2004, p. 150). Um outro ponto importante a ser ressaltado é que não está
aqui em questão se os conceitos da psicologia de senso comum são adequados
para descrever outros tipos de sistemas cognitivos, que não agentes como nós.
Sterelny (2003a) e Godfrey-Smith (2003) são explicitamente céticos a esse respei-
to. Ver nota 11.
33 Um outro modo, um tanto equívoco, de formular a TCS é o seguinte:
(1975). Segundo Von Eckardt (1995, p. 300), Fodor acredita que a PS será con-
firmada por uma psicologia científica: “Fodor especula que a psicologia cognitiva
continuará a supor um sistema representacional que seja similar à linguagem de
modo significativo (no sentido de ser avaliável, de ter uma estrutura constituinte,
e de ser composicional)”. Em outra passagem, Von Eckardt afirma: “Fodor
(1987, p. 10) propõe que tomemos a psicologia científica de modo a confirmar
(to vindicate) a Psicologia de senso comum das atitudes proposicionais, somente
no caso em que ‘ela postule estados (entidades, eventos, ou o que for) satisfa-
zendo as seguintes condições: (1) Que (tais estados) sejam avaliáveis semantica-
mente; (2) Que (tais estados) tenham poderes causais; (3) Que as generalizações
implícitas da psicologia de senso comum crença/desejo sejam em larga medida
verdadeiras a seu respeito’ “ (Von Eckardt 1995, p. 306). Aqui a referência é ao
livro de Fodor Psychosemantics. Ou seja, uma psicologia científica futura confirma-
rá, espera Fodor, as duas propriedades básicas dos estados mentais, postuladas
pela PS: (i) são representacionais e; (ii) têm poder causal. É preciso distinguir
essa possível tendência da PS em mover-se em direção a uma psicologia científi-
ca, de uma tendência em direção à neurofisiologia. Essa posição contrasta com a
que sustenta que a PS não necessita de qualquer confirmação pelas ciências (que,
em particular, não tenderia em direção àquelas ciências; Von Eckardt, ibid. p.
305). Ver também, a respeito dessas duas tendências, as discussões em Rabossi
(2004) e em Perez (2004) que, por sua vez, são tributárias de Baker (1995).
em particular, o realismo com respeito à PS, enquanto uma descrição das causas
próximas do comportamento humano (ver Sterelny 2003b, p.7). Cf. nota 42.
vista naturalista, que é o deles, espera-se que esses dois projetos integra-
dores- o interno e o externo- sejam, ao menos, compatíveis. 40
somente agir com base nelas, é também considerada por Sterelny (2003b) um
fator de sucesso adaptativo. Ele tenta retraçar uma trajetória evolutiva indo de
motivações baseadas em sensações e pulsões (drives), a motivações baseadas em
fins representados – e.g. objetivos de mudar o mundo. Com respeito a essa ca-
pacidade, contudo, ele sugere que a PS provavelmente não descreve acurada-
mente a circuitaria-e-conexão pertinente. Outra propriedade de sistemas inten-
cionais discutida por ele é a capacidade para dissociar meios de fins, de modo
que diferentes meios possam ser explorados para atingir um mesmo fim (Ste-
relny 2003a, p. 262).
42 Stich (2004), em sua resenha do livro de Sterelny (2003b), avalia que este
(de energia) e os custos do erro. Uma análise detalhada tem que mostrar em que
situações essa característica é vantajosa em termos adaptativos, em lugar de uma
maneira inflexível de responder ao ambiente.
... a vida dos grandes símios e do homem pode não requerer muito no
sentido da invenção prática, mas depende de modo crítico da posse de
amplo conhecimento factual da técnica prática e da natureza do habitat.
Tal conhecimento só pode ser adquirido no contexto de uma comunida-
de social – uma comunidade que provê tanto o meio para a transmissão
cultural da informação, quanto um ambiente protetor no qual a aprendi-
zagem individual pode ocorrer. Eu proponho que o papel principal do
intelecto criativo é o de manter a sociedade coesa. (Humphrey 1976, p.
18)
que vai do externo (o ambiente) para o interno (no caso, para a complexidade de
organismos dotados de tais mentes). Ver Godfrey-Smith 1998a, p. 60.
roupagem evolutiva.
haviors. Great apes are neither Skinnerian psychologists nor folk psychologists”.
53 Esses pacotes combinam diferentes teses quanto à: (i) estrutura da PS; (ii)
ontogenia (da PS); (iii) filogenia (da PS); (iv) verdade (da PS). Ver Godfrey-Smith
(2002a).
54 Sobre as práticas de interpretação tomadas como uma característica rele-
dados comportamentais que, por sua vez, geram interpretações. Essas interpre-
tações funcionam como tentativas de descrever acuradamente os fatos de circui-
taria-e-conexão” (Godfrey-Smith 2004, p. 150).
rado em um módulo inato, e não de uma “teoria” da PS. Não é claro se isso o
aproxima do simulacionismo (ver Godfrey-Smith no prelo, p. 10). De toda for-
ma, apresentei o projeto integrador externo como pressupondo a teoria-teoria e
um realismo com respeito à PS.
58 Godfrey-Smith baseia-se na discussão sobre inatismo de Cowie (1999), a
seleção natural) da PS. Não cabe, em um cenário deste tipo, falar em co-
evolução – havendo somente um desenvolvimento da PS.
Uma variante seria admitir a filogenia de uma versão rudimentar
da PS (essa proto-versão da PS, considerada uma teoria, seria inata). Mas
a PS madura, sofisticada, seria aprendida pelo indivíduo, em sua ontogenia,
usando algum mecanismo cognitivo (possivelmente inato) para a apren-
dizagem (e/ou para a geração de teorias; algo como um processador cen-
tral à la Fodor, ou uma inteligência de propósito geral). Esta é a proposta
de Gopnik e Meltzoff, conhecida pela expressão ‘criança-como-cientista’,
já que a criança, ao aprender a PS, agiria como um cientista. 61
pelos indivíduos (e.g. os filhos) – teria também evoluído por seleção de grupo
(do mesmo modo que a cooperação). Esse cenário será desenvolvido detalha-
damente na seção 8.
61 Essa posição requer que se considere a PS como uma teoria (e não como
técnicas (como, por exemplo, para uma biologia de senso comum). 66 Ele
argumenta que se as capacidades para a cooperação e para a aprendiza-
gem social são adaptações na linhagem hominídea isso aponta, na verda-
de, para uma interdependência entre a inteligência social, de um lado, e as
inteligências técnicas, de outro, e não para um encapsulamento informacio-
nal, como pressupõe uma arquitetura modular:
temos uma mente que se serve exclusivamente de uma inteligência geral que
processa as informações obtidas pelos módulos perceptuais. Numa segunda
fase, a inteligência geral é acrescida de módulos encapsulados para as inteligên-
cias especializadas: técnica, linguística, social e naturalista. A mente dos caçado-
res-coletores teria essa arquitetura. Numa terceira fase, os módulos seriam desen-
capsulados e as informações passam a circular, possivelmente combinadas por um
processador central com capacidade para metarepresentar, resultando em uma
grande “fluidez cognitiva” (Mithen 1996, p. 114). A hipótese da inteligência so-
cial joga um papel central nessa explicação, mas contrariamente a Sterelny,
Mithen é mais propenso a aceitar a existência de um módulo para a teoria da
mente, mesmo que defenda que seu encapsulamento tenha diminuído na passa-
gem da “mente arcaica” para a “mente moderna” (ibid., pp. 131, 213-25).
68 Godfrey-Smith propõe uma tipologia de construtivismos, e faz uma tria-
aposta que uma vez que um conjunto geral de propriedades orgânicas tiver exer-
cido o seu papel em determinar que alguns padrões ambientais sejam relevantes
e outros não, existirão outras propriedades orgânicas que poderão ser explicadas
em termos desse padrão ambiental. Notar que essa é uma concessão (ao) inter-
nalista, não uma concessão a uma forma forte de construtivismo. O organismo,
em virtude de um conjunto de propriedades orgânicas, faz com que um dado
padrão ambiental seja relevante. Ele não constrói aquele padrão ambiental”
(Godfrey-Smith 1998a, p. 155; cf. pp. 58-9). É claro que a tese da complexidade
ambiental só poderá explicar mentes se qualificações desse tipo forem feitas, rejei-
tando-se formas extremas de não-realismo (metafísico). Ver também as notas 14
e 17.
69 A transparência pode ser o resultado de uma adaptação da espécie a um am-
... que têm vidas sociais mas não culturais, (existindo) somente duas esca-
las temporais em suas histórias cognitivas: a da filogenia e a da ontogenia.
Na compreensão da cognição humana, há uma terceira escala temporal: a
da história de uma cultura, na medida em que uma capacidade cognitiva
é montada ao longo do tempo (evidentemente, com base em adaptações
filogenéticas). À medida que é montada, ela interage com a ontogenia in-
dividual e a transforma. (Sterelny 2003b, p. 160)
a PS, entendida como uma habilidade (craft), chegando a admitir que haja algo de
inato na PS (1998, p. 82). Ver nota 30.
CONCLUSÃO
san (2004).
que estudam o comportamento animal. Ver, por exemplo, Alexander (1974, pp.
334-5); Axelrod and Hamilton (1981, p. 1390). Há pelo menos uma década, con-
tudo, a seleção de grupo vem readquirindo um status científico respeitável, sobre-
tudo no que se refere à evolução humana. Ver, por exemplo, Wilson and Sober,
1994.
BIBLIOGRAFIA