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Sumário do Trabalho:
________. (1912[1913]). Totem e Tabu (trad. de Órizon Carneiro Muniz). Rio de Janeiro:
Imago, 1999.
________. (1920). Além do princípio do prazer. Obras Psicológicas de Sigmund Freud –
Escritos sobre a Psicologia do Inconsciente, v. II, Rio de Janeiro: Imago, 2006.
________. (1933[1932]). Por que a guerra? (Einstein e Freud). Edição Standard Brasileira
das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, v. XXII, Rio de Janeiro:
Imago, 1996, p. 193-197.
KERTÉSZ, Imre (1975). Sem Destino. São Paulo: Planeta, 2003.
LACAN, Jacques (1959-1960). O Seminário, Livro VII: A Ética da Psicanálise. Rio de
Janeiro: Zahar, 1988.
LACAN, Jacques (1969-1970). O Seminário, Livro XVII: O Avesso da Psicanálise. Rio de
Janeiro: Zahar, 1992.
LYOTARD, Jean-François (1988). O Inumano – Considerações sobre o Tempo. Lisboa,
Estampa, 1989.
Poder, Violência e Psicanálise
Helena Conde
1
O Inumano, Lisboa, ed. Estampa.
Realizar um gozo produz a redução do desejo e a plenitude do primeiro levaria à
morte. A Psicanálise, no caso, procura reafirmar o desejo do sujeito cujos meandros são a
sua própria exceção.
Nesse sentido, poderíamos dizer que o homem é constituído, mas não determinado
por esses discursos.
Portanto, apesar de o homem estar inegavelmente incluído em uma perspectiva mais
universal, dada a sua relação com o mundo externo, o sujeito tem um traço de exceção, de
onde se conclui que só se pode estar dentro, em uma perspectiva de assujeitamento, a partir
de alguma coisa que já estava fora, ou seja, o sujeito não tem como pertencer ao grupo,
estar nesse lugar sem já estar fora dele de algum modo.
Freud concebia a guerra como inerente ao humano enquanto ser pulsional e esse
humano, seguindo Lyotard, guarda resquícios de uma inumanidade que lhe é própria. Esta
inumanidade não consegue ser recalcada, visto que é humana, mas está, todavia, fora da lei,
embora a ela remeta.
Talvez, a guerra como a vemos hoje e como a vimos sempre, uma manifestação
clara de violência e imposição de poder à força, seja mesmo da ordem daquilo que não
pode ser recalcado e que, portanto, retorna como um sintoma dentro de um contexto em que
aparentemente há esforços institucionais para a manutenção da paz. A diplomacia seria,
nesse sentido, a própria resistência a esse inumano. Freud em sua última entrevista afirmou
que a maldade é a vingança do homem contra a sociedade, pelas restrições que ela impõe,
talvez, eu diria, pelo seu excesso de humanismo.
Linguagem e gozo fazem parte do inumano que é parte essencial do humano, mas
são muitas vezes recalcados pelo humanismo, por isso que a crítica de Lyotard ao abordar o
conceito de inumano dirige-se precisamente às formas de humanismo.
Com relação especificamente ao sintoma da guerra hoje em dia, poderia dizer que
ele expõe uma contradição, um desequilíbrio, uma subversão dos princípios universais
aparentemente vigentes de respeito às diferenças e à pessoa humana de modo geral. De
maneira semelhante, o sintoma para a Psicanálise interpela a lógica do eu, apontando para a
mesma contradição e desequilíbrio, mantendo, assim, também, um caráter subversivo em
relação a esta lógica.
De fato, o discurso social provoca efeitos subjetivos e sabemos que o sujeito
apresenta-se dividido entre um gozo impossível e a linguagem. Em análise percebemos a
busca repetitiva desse gozo proibido ao ser falante, inalcançável, uma vez que a entrada do
sujeito no simbólico envolve uma certa renúncia inicial ao gozo que é, em si, uma renúncia
em ser o falo imaginário para a mãe, ou seja, a castração significa que o gozo deve ser
rechaçado para poder ser alcançado na escala invertida da lei do desejo.
Lacan em seu Seminário II (1985: 164-165)2 aponta que a lei não é compreendida
em seu todo pelo sujeito e, nesse sentido, o sintoma também poderia representar o
incompreendido que, por sua vez, só poderia ser desempenhado pelo sujeito (1985: 167)3:
“A censura é isso, visto que para Freud, na origem, isso ocorre no nível do
sonho. O supereu é isso, na medida em que terroriza efetivamente o sujeito, que constrói
nele sintomas eficientes, elaborados, vivenciados, que prosseguem e que se encarregam de
representar este ponto onde a lei não é compreendida pelo sujeito, mas é desempenhada
por ele”.
Existe um paradoxo na própria lei em si, ou seja, algo que implica em que a
proibição funciona para manter a perspectiva de que o gozo seria alcançado se não estivesse
proibido.
Isso é algo que caracteriza a dimensão humana situada nos âmbitos da lei, do desejo
e do gozo.
São Paulo chegou a afirmar que era a lei que criava o pecado, pois ninguém poderia
saber o que seria pecar sem conhecer a lei. Ainda, retomando o exemplo de Totem e Tabu,
o pecado seria aquilo que sustentaria o pacto entre os irmãos e, portanto, a lei. Foi
necessário que nem todos estivessem submetidos à lei daquele pai tirano para que o
assassinato ocorresse e para que todos daí em diante passassem a se sujeitar a uma lei
simbólica.
Aqui é interessante observar, aproveitando o trocadilho, que é, verdadeiramente, a
partir de uma posição de sujeito que uma sujeição à lei pode ocorrer, pois ela se dá já em
2
Tal data se refere ao ano da edição em português utilizada neste trabalho. O ano da referida aula é 1954.
3
Idem.
referência a algo da ordem do simbólico, onde um corte foi feito e uma interdição
estabelecida.
Lacan em seu Seminário VII segue essa idéia e aponta que a lei seria aquilo que cria
e sustenta o desejo, interditando o gozo pela via deste.
Desse modo, o assassinato do pai não abriria o caminho para o gozo, mas reforçaria
a sua interdição e, portanto, enodar-se-ia com o desejo: "Enquanto isso, vemos aqui o nó
estreito do desejo com a lei" (Lacan, Sem. VII 1966/1998: 217).
Finalmente, ao considerar as questões da violência e do poder, a Psicanálise não
pode deixar de levar em conta as relações entre lei, desejo e gozo e a forma como esses
elementos se articulam tanto em termos sócio-culturais, os modos de subjetivação de um
grupo, quanto em termos individuais, sem esquecer que por mais discursos humanistas que
se façam, o inumano, que nos torna justamente humanos, sempre nos habitará.
Referências Bibliográficas:
________. (1912[1913]). Totem e Tabu (trad. de Órizon Carneiro Muniz). Rio de Janeiro:
Imago, 1999.
________. (1920). Além do princípio do prazer. Obras Psicológicas de Sigmund Freud –
Escritos sobre a Psicologia do Inconsciente, v. II, Rio de Janeiro: Imago, 2006.
________. (1933[1932]). Por que a guerra? (Einstein e Freud). Edição Standard Brasileira
das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, v. XXII, Rio de Janeiro:
Imago, 1996, p. 193-197.
KERTÉSZ, Imre (1975). Sem Destino. São Paulo: Planeta, 2003.
LACAN, Jacques (1959-1960). O Seminário, Livro VII: A Ética da Psicanálise. Rio de
Janeiro: Zahar, 1988.
LACAN, Jacques (1969-1970). O Seminário, Livro XVII: O Avesso da Psicanálise. Rio de
Janeiro: Zahar, 1992.
LYOTARD, Jean-François (1988). O Inumano – Considerações sobre o Tempo. Lisboa,
Estampa, 1989.