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VOTRE, S.J.; PEREIRA, V.C e GONÇALVES, J.C. (2009).

DESENVOLVENDO A COMPETÊNCIA
COMUNICATIVA EM GÊNEROS DA ESCRITA ACADÊMICA. Niterói, UFF.

DESENVOLVENDO A COMPETÊNCIA COMUNICATIVA

EM GÊNEROS DA ESCRITA ACADÊMICA

Sebastião J. Votre

Vinícius C. Pereira

José C. Gonçalves
2

SUMÁRIO

Unidade 1 – Gêneros e tipos textuais – macro e microestruturas ...........02


Unidade 2 - Coesão textual .....................................................................22
Unidade 3 - Coerência textual .................................................................44
Unidade 4 – Argumentação .....................................................................61
Unidade 5 - Fichamento, resumo e resenha .............................................83
Unidade 6 – Relatório e projeto .............................................................. 99
Unidade 7 – Artigo científico e monografia de conclusão de curso ......119
Unidade 8 – O domínio da norma padrão ..............................................130

NITERÓI

UFF/PROAC/NEAMI - Junho de 2009


3

Unidade 2 - Coesão textual


Apresentando a unidade
Nesta unidade, identificamos, ilustramos e comentamos os recursos mais eficazes para
aumentar a coesão entre as partes dos parágrafos e dos textos.
Antes de iniciarmos propriamente o tema desta unidade, observe a letra de música
abaixo, que muito se relaciona com o assunto desta unidade.

A linha e o linho
(Gilberto Gil)
É a sua vida que eu quero bordar na minha
Como se eu fosse o pano e você fosse a linha
E a agulha do real nas mãos da fantasia
Fosse bordando ponto a ponto nosso dia-a-dia
E fosse aparecendo aos poucos nosso amor
Os nossos sentimentos loucos, nosso amor
O ziguezague do tormento, as cores da alegria
A curva generosa da compreensão
Formando a pétala da rosa, da paixão
A sua vida, o meu caminho, nosso amor
Você a linha e eu o linho, nosso amor
Nossa colcha de cama, nossa toalha de mesa
Reproduzidos no bordado
A casa, a estrada, a correnteza
O sol, a ave, a árvore, o ninho da beleza

O texto acima revela a intimidade entre a linha e o linho, não só no plano da forma (por
causa da estrutura parecida das duas palavras do título), mas também no plano do significado
(devido a ambas as palavras pertencerem ao campo da costura). Observe que o conteúdo
dialoga diretamente com a noção de coesão textual, que estudaremos nesta unidade, afinal é o
fenômeno da coesão que “costura” as partes de um texto, garantindo-lhe coerência e clareza.
Nas próximas seções, você estudará os mecanismos que deve empregar em seus textos, para
que sejam sempre coesos e bem articulados.

Definindo os objetivos
4

Ao final desta unidade, você deverá ser capaz de:


1. compreender a noção de coesão textual e sua importância para uma boa
legibilidade dos textos;
2. identificar as estratégias textuais que asseguram coesão ao discurso;
3. reconhecer e corrigir falhas textuais que comprometam a coesão do discurso;
4. produzir textos mais coesos.

Conhecendo a coesão textual


Muitas vezes, ao escrevermos, temos boas ideias, mas sentimos
dificuldades para relacioná-las. Se não tomarmos cuidado, podemos
acabar por lançar no papel uma série de frases gramaticalmente corretas, mas que não se
relacionam de forma clara entre si. Para que um conjunto de frases se torne um texto, é
preciso que haja coesão: que as ideias se entrelacem, completando-se e retomando-se, de
modo que as frases sigam um fluxo lógico e contínuo, não parecendo blocos isolados. Quando
um texto está coeso, temos a sensação de que sua leitura “flui” com facilidade.
A origem do termo texto remete a tecido: um texto, como um tecido, deve entretecer
seus fios de ideias, de modo que, nos pontos em que essas ideias se tocam, se estabeleça a
coesão textual. Para entender isso melhor, observe o conto abaixo, escrito por Clarice
Lispector. Em sua composição, a autora, para encadear as partes do texto de forma clara e
criativa, utiliza-se de uma série de estratégias linguísticas, de modo a evitar a repetição
sistemática de palavras e a ligar de forma lógica as ideias. Para fins didáticos, destacamos
apenas alguns dos mecanismos de coesão que aparecem nesse texto, os quais serão explorados
mais aprofundadamente ao longo da unidade. Por enquanto, reflita sobre a importância das
palavras em destaque na composição do conto.

Uma esperança
Aqui em casa pousou uma esperança. Não a clássica, que tantas vezes verifica-se ser
ilusória, embora mesmo assim nos sustente sempre. Mas a outra, bem concreta e verde: o
inseto.
Houve um grito abafado de um de meus filhos:
- Uma esperança! e na parede, bem em cima de sua cadeira! Emoção dele também que
unia em uma só as duas esperanças, já tem idade para isso. Antes surpresa minha:
esperança é coisa secreta e costuma pousar diretamente em mim, sem ninguém saber, e não
5

acima de minha cabeça numa parede. Pequeno rebuliço: mas era indubitável, lá estava ela, e
mais magra e verde não poderia ser.
- Ela quase não tem corpo, queixei-me.
- Ela só tem alma, explicou meu filho e, como filhos são uma surpresa para nós,
descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças.
(...)
Foi então que farejando o mundo que é comível, saiu de trás de um quadro uma aranha.
Não uma aranha, mas me parecia "a" aranha. Andando pela sua teia invisível, parecia
transladar-se maciamente no ar. Ela queria a esperança. Mas nós também queríamos e, oh!
Deus, queríamos menos que comê-la. Meu filho foi buscar a vassoura. Eu disse fracamente,
confusa, sem saber se chegara infelizmente a hora certa de perder a esperança:
- É que não se mata aranha, me disseram que traz sorte...
- Mas ela vai esmigalhar a esperança! respondeu o menino com ferocidade.
(...)

Para encadear os acontecimentos da narrativa, mostrando que todos estão relacionados


ao animal chamado esperança, a autora utilizou uma série de palavras e expressões que
remetem à criatura que dá título ao conto: uma esperança, a clássica, que, a outra, o inseto,
ela, entre outras. Assim, o texto não peca pela repetição desnecessária de palavras.
O encadeamento dos fatos referentes a essa criatura também é garantido por outras
palavras, que estabelecem relações de sentido entre os acontecimentos da narrativa; entre elas,
destacam-se e, mas, e então. No trecho “Pequeno rebuliço: mas era indubitável”, a palavra
mas estabelece uma oposição entre as características atribuídas ao rebuliço: pequeno, porém
indubitável.

Exercitando
6

Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 1
Observe o resumo abaixo, referente ao artigo “Pedagogia de projetos”, de Lúcia
Helena Alvarez Leite. Após uma primeira leitura para tomar ciência do sentido global do
texto, destaque, em uma segunda leitura, algumas das expressões que estabelecem coesão
entre as ideias apresentadas no resumo. Proceda de maneira semelhante à apresentada na
análise do conto de Clarice Lispector.

RESUMO: A discussão sobre Pedagogia de Projetos não é nova. Ela surge no início do
século, com John Dewey e outros pensadores da chamada “Pedagogia Ativa”. Já nessa época,
a discussão estava embasada numa concepção de que “educação é um processo de vida e não
uma preparação para a vida futura e a escola deve representar a vida presente – tão real e vital
para o aluno como o que ele vive em casa, no bairro ou no pátio” (DEWEY, 1897).
Os tempos mudaram, quase um século se passou e essa afirmação continua ainda atual.
A discussão da função social da escola, do significado das experiências escolares para os que
dela participam foi e continua a ser um dos assuntos mais polêmicos entre nós, educadores.
As recentes mudanças na conjuntura mundial, com a globalização da economia e a
informatização dos meios de comunicação, têm trazido uma série de reflexões sobre o papel
da escola dentro do novo modelo de sociedade, desenhado nesse final de século.
É nesse contexto e dentro dessa polêmica que a discussão sobre Pedagogia de Projetos,
hoje, se coloca. Isso significa que é uma discussão sobre uma postura pedagógica e não sobre
uma técnica de ensino mais atrativa para os alunos.

Conhecendo os recursos de coesão textual


Para conectar e relacionar as partes de um texto, vários mecanismos
podem ser adotados. A seguir, encontram-se os dois principais tipos de
recursos de que você pode se valer para garantir coesão e legibilidade àquilo que escreve:

1. Coesão referencial
A coesão referencial é estabelecida por meio de expressões que retomam ou antecipam
ideias. Esse tipo de coesão serve para evitar a repetição desnecessária de termos, além de
7

garantir que uma informação nova esteja conectada a outra que já havia sido mencionada. Tal
articulação pode se dar basicamente de duas formas, como estudaremos a seguir:

1.1. Emprego dos pronomes na coesão referencial


Observe o trecho abaixo, retirado do artigo “Esporte e saúde”, de Selva Maria
Guimarães Barreto. Preste atenção ao papel dos pronomes (em negrito) na articulação do
texto.

Esporte e Saúde
Nos cursos de Educação Física está ocorrendo uma revolução, que vem provocando
questionamentos sobre alguns conceitos: o que se tenta expor criticamente hoje é a relação
entre “Esporte e Saúde”. Esta vinculação, infelizmente, não é a mais usual, pois geralmente é
substituída por “Esporte é Saúde” pelo conhecimento popular, uma relação que aparenta ser
uma verdade absoluta, quando não, obrigatoriamente, é. Os novos conceitos trabalhados
relacionam Esporte, Saúde e Qualidade de Vida, de maneira a levantar o debate para
refletirmos sobre os mesmos.
O Esporte, como conceito, é considerado uma atividade metódica e regular, que associa
resultados concretos referentes à anatomia dos gestos e à mobilidade dos indivíduos. Esta é a
conotação que podemos chamar de “Esporte de alto nível”, veiculada nas mídias em geral,
representada por pessoas executando gestos extremamente mecanizados, uniformes, com um
certo gasto de energia para produzir um determinado tipo de movimento repetidas vezes. São
gestos plásticos, muito organizados, moldados e com muitas regras, para que se possa obter
algum resultado prático. O Esporte pode ser encarado, dentro de outras ópticas, tanto como o
Esporte veiculado nas mídias, como uma atividade dentro de um grupo de amigos (na escola,
na rua ou qualquer local).
(...)
8

Você já deve ter passado por problemas enquanto escrevia, porque não queria repetir
desnecessariamente uma palavra. Evitar a reutilização excessiva de determinada expressão
garante elegância ao seu texto, revelando uma elaboração cuidadosa. Os pronomes, como
você viu, são bastante úteis para esse fim, pois permitem o encadeamento de ideias e podem
substituir os termos a que remetem. Observe a seguir como tal recurso foi empregado no
artigo “Esporte e saúde”.

“Nos cursos de Educação Física está ocorrendo uma revolução, que vem provocando
questionamentos sobre alguns conceitos...”

No trecho acima, o pronome que evitou a repetição de revolução. Assim, a autora


ganhou em coesão, pois o trecho, sem o pronome, ficaria da seguinte forma:

Nos cursos de Educação Física está ocorrendo uma revolução. A revolução vem
provocando questionamentos sobre alguns conceitos.

De maneira semelhante, o texto apresenta o período abaixo:

“O Esporte, como conceito, é considerado uma atividade metódica e regular, que


associa resultados concretos referentes à anatomia dos gestos e à mobilidade dos indivíduos”.

Tal frase poderia ser desdobrada em duas outras, mas isso atrapalharia uma leitura
fluente do texto, tornando-o repetitivo. Observe:
9

O Esporte, como conceito, é considerado uma atividade metódica e regular. A


atividade metódica e regular associa resultados concretos referentes à anatomia dos gestos e
à mobilidade dos indivíduos.

Há outros pronomes como esses (pronomes relativos), que ligam duas orações e evitam
a repetição de termos, como você verá a seguir:

• ONDE – Esse pronome relativo, embora empregado com frequência nos textos
veiculados pela mídia, tem um uso bastante restrito: segundo a gramática tradicional, tal
pronome pode apenas indicar a noção de “lugar”.
Exemplos:
O Brasil é um país onde o incentivo à educação é primordial.
A frase está correta de acordo com a norma dita culta, pois o pronome onde retoma a
palavra país, que indica a noção de “lugar em que”.

• CUJO – Tal pronome estabelece, geralmente, relação de posse entre dois


substantivos. Observe que ele deve concordar com o termo que o sucede, o qual não pode vir
acompanhado por um artigo.

Exemplos:
(a) Machado de Assis é um autor cujas obras são estudadas até hoje.
A frase (a) está de acordo com a norma culta, pois cujo está conectando dois substantivos
(autor e obras), estabelecendo entre eles uma relação de posse, pois as obras pertencem ao
autor. Veja agora:

(b) Animais cujos os filhos são amamentados são chamados de mamíferos.


A frase (b) estabelece uma relação de posse entre dois substantivos (animais e filhos),
mas erra ao pôr o artigo os entre cujos e filhos.

• O QUE – Essa expressão não substitui, como os pronomes relativos


anteriormente mencionados, uma palavra, mas sim uma oração inteira. Observe:
Exemplo: A democracia eletrônica permite uma eficaz articulação entre cidadão e
governo, o que facilita processos de consulta pública, como referendos via Internet.
10

Na frase acima, o que evita a repetição não de uma palavra, mas de toda a oração que o
antecede, funcionando como o sujeito do verbo facilitar.

Além dessas, há outras estratégias no uso do pronome que estabelecem coesão entre as
partes de um texto. Observe o exemplo retirado do texto de “Esporte e saúde”:

“Nos cursos de Educação Física está ocorrendo uma revolução, que vem provocando
questionamentos sobre alguns conceitos: o que se tenta expor criticamente hoje é a relação
entre “Esporte e Saúde”. Esta vinculação, infelizmente, não é a mais usual, pois geralmente
é substituída por “Esporte é Saúde” pelo conhecimento popular, uma relação que aparenta ser
uma verdade absoluta, quando não, obrigatoriamente, é”.

Veja que, dessa vez, o pronome não conectou duas orações em uma mesma frase, mas
duas frases diferentes. Geralmente, isso é feito por um pronome como “esse(a)”, “este(a)”,
“isso” ou “isto”. Tais palavras, chamadas pronomes demonstrativos, costumam apontar para
outra ideia no texto, que já tenha sido mencionada ou que ainda será expressa. No exemplo
analisado, o pronome “esta”, ligado a “vinculação”, refere-se à ideia vinculada em “Esporte e
Saúde”, expressão que já havia sido mencionada na frase anterior. No entanto, é preciso
observar que a maioria dos gramáticos tradicionais preferem o uso de “esse”, “essa” e “isso”,
quando o pronome se refere a algo que já foi dito. Assim, uma melhor redação do trecho
seria:

Nos cursos de Educação Física está ocorrendo uma revolução, que vem provocando
questionamentos sobre alguns conceitos: o que se tenta expor criticamente hoje é a relação
entre “Esporte e Saúde”. Essa vinculação, infelizmente, não é a mais usual, pois geralmente
é substituída por “Esporte é Saúde” pelo conhecimento popular, uma relação que aparenta
ser uma verdade absoluta, quando não, obrigatoriamente, é.

Situação semelhante ocorre no trecho abaixo, extraído do mesmo artigo:

“O Esporte, como conceito, é considerado uma atividade metódica e regular, que associa
resultados concretos referentes à anatomia dos gestos e à mobilidade dos indivíduos. Esta é a
conotação que podemos chamar de “Esporte de alto nível”, veiculada nas mídias em geral,
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representada por pessoas executando gestos extremamente mecanizados, uniformes, com um


certo gasto de energia para produzir um determinado tipo de movimento repetidas vezes”.

O pronome “esta” retoma o conteúdo de toda a frase anterior, atribuindo-lhe os novos


sentidos da segunda frase. No entanto, como se trata de remissão a algo que já havia sido dito,
seria mais adequado o uso de “essa”.
Geralmente, os pronomes “este”, “esta” e “isto” referem-se a algo que ainda será
mencionado. Observe a frase abaixo como modelo, pois o pronome “isto” aponta não para
uma informação anterior, mas para algo que se apresenta depois dele: a palavra violência.
Exemplo: O que me assusta no Brasil é isto: a violência.

É importante atentar, além disso, para uma construção muito comum em textos
acadêmicos, em que há duas referências consecutivas a termos que foram mencionados.
Exemplo: O Brasil exporta cacau e soja. Esta é plantada na região Sul; aquele, no
Nordeste.
Embora ambos os pronomes em destaque refiram-se a palavras já mencionadas, não se
usam os pronomes “esse”, “essa” e “isso” nesse caso. Convencionou-se que, em situações
como essa, devem-se usar “este”/“esta”/”isto” para apontar para a palavra mais próxima
(“soja”) e “aquele”/“aquela”/“aquilo” para a palavra mais distante (“cacau”).

Exercitando
Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 2
Os trechos abaixo poderiam se tornar mais coesos, caso fosse empregado o recurso da
coesão referencial. Aplique tal estratégia coesiva, unindo as informações em uma única frase.
1. Este é o país. Moro no país.
2. Este é o país. O país se chama Brasil.
3. Não se sabe onde está o livro. Dependo do livro para fazer um trabalho.
4. Perguntei-lhe o nome. Baseou-se no nome para tomar sua decisão.
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5. Os Estados Unidos conduziram uma incursão destruidora no Iraque. Os soldados dos


Estados Unidos alegavam defender sua pátria.
6. O corpo humano é percorrido por um sistema circulatório. Pelo sistema circulatório são
conduzidos os nutrientes às células.
7. O verbo concorda com o sujeito. O núcleo do sujeito não pode ser uma preposição.
8. O Brasil foi descoberto pelos portugueses. Nos navios dos portugueses foi transportado
pau-brasil.

Exercitando
Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 3
Observe os parágrafos abaixo e identifique neles problemas decorrentes do mau uso
das estratégias de coesão referencial.
1 - Giddens descreve o surgimento da Teoria da estruturação a partir do encontro de
várias correntes teóricas com as quais foi se familiarizando nos anos 60, como o Marxismo.
Pontua o seu princípio na continuidade da vida social, em que as estruturas dependem das
ações dos indivíduos e só existem na medida em que as pessoas agem no contexto a partir de
seu referencial interno.
2 - “As feias que me perdoem, mas beleza é fundamental”. Essa citação do poeta
brasileiro Vinícius de Moraes mostra-se não só politicamente incorreta, mas também caduca
nos dias de hoje. A atualidade enxerga a mulher sob uma nova perspectiva, não mais atrelada
à sua constituição física, como um objeto, mas voltada para aspectos como força de trabalho,
produção intelectual e igualdade de direitos. Ela revela, assim, mudanças profundas em sua
constituição.

1.2. Emprego de itens do léxico na coesão referencial


Quando você escreve um texto, interrompe mais de uma vez o processo de composição,
em busca de expressão que substitua alguma palavra que você já utilizou. A coesão lexical
conecta as partes do texto e evita a repetição vocabular, por meio do uso de substantivos,
verbos e adjetivos, o que exige um vocabulário amplo, adquirido com a leitura constante e
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frequentes consultas ao dicionário. Para entender melhor esse tipo de estratégia coesiva,
observe o trecho abaixo, retirado do artigo “Análise da publicidade de medicamentos
veiculada em Goiás – Brasil”, de Johnathan S. de Freitas et alii.

A propaganda/publicidade é um conjunto de técnicas utilizadas com o objetivo de


divulgar conhecimentos e/ou promover adesão a princípios, ideias ou teorias, visando exercer
influência sobre o público através de ações que objetivem promover determinado
medicamento com fins comerciais (BRASIL, 2000). Quando tais técnicas são utilizadas
apenas com a finalidade de ampliar lucros em detrimento da qualidade da informação
veiculada, ocultando ou diminuindo os aspectos negativos e superestimando os benefícios do
produto medicamentoso, surgem questões de cunho ético, uma vez que, podem promover o
uso irracional de medicamentos e, consequentemente, danos à saúde e à economia. (...)
Existem diversos casos em que a propaganda e publicidade de medicamentos têm
apresentado estes produtos como soluções rápidas para diversos problemas de saúde que
acometem a população, sem levar em consideração o risco sanitário intrínseco que todo
produto medicamentoso possui.

Para evitar a repetição desnecessária de palavras, o autor usou expressões como


“produto medicamentoso” e simplesmente “produto” para se referir a medicamento,
garantindo a coesão textual. Veja a seguir algumas estratégias para o bom uso de itens do
léxico a fim de tornar seus textos mais coesos.

1.2.1. Uso de sinônimos


Essa é a estratégia a que mais recorremos enquanto escrevemos, embora nem sempre
seja fácil encontrar um sinônimo. Dificilmente um par de sinônimos pode ser considerado
perfeito, isto é, com um elemento podendo ser trocado pelo outro em qualquer contexto.
Quando você leu o texto acima, deve ter se perguntado por que o autor não usou a palavra
“remédio” para se referir a “medicamento”. Tal substituição não foi feita, pois, como
acabamos de ver, esse não é um par de sinônimos perfeitos. Segundo o Grande Dicionário
14

Português ou Tesouro da Língua Portuguesa, de Domingos Vieira, "Remédio tem um sentido


mais amplo que medicamento. O remédio compreende tudo o que é empregado para a cura de
uma doença. (...) O exercício pode ser um remédio, porém nunca é um medicamento".
Assim, é preciso ter cuidado no uso de sinônimos, especialmente no texto acadêmico, do
qual se espera grande precisão. No texto que estamos analisando, o autor preferiu utilizar
“produtos medicamentosos” como sinônimo de “medicamentos”.

1.2.2. Uso de hiperônimos


Um hiperônimo é uma palavra com sentido mais genérico do que uma outra, chamada
de hipônimo. O significado de um hiperônimo contém o significado de vários hipônimos ao
mesmo tempo, como no caso de “produtos” (hiperônimo) e “medicamentos” (hipônimo),
palavras retiradas do artigo aqui analisado. Ao se referir a “produtos”, o autor nos remete
diretamente a “medicamentos”, único produto que já havia sido citado. No entanto, se o texto
também falasse de cosméticos, seria necessário buscar outra forma de estabelecer coesão, pois
“produtos” engloba tanto “medicamentos” quanto “cosméticos”. Tal relação pode ser definida
da seguinte forma:

medicamentos
produtos

cosméticos

Essa estratégia garante que o leitor recupere a relação entre as partes do texto sem que o
autor precise repetir desnecessariamente palavras. Você deve tomar cuidado, porém, para não
usar um hiperônimo vago demais, como “coisa”, por exemplo. Tal palavra poderia ser
interpretada como se referindo a praticamente qualquer item mencionado no texto, gerando
grave ambiguidade.

1.2.3. Uso de perífrases


A perífrase é uma construção complexa para designar algo para o qual há uma expressão
mais simples. No caso do texto analisado, o autor poderia ter empregado uma perífrase para
remeter a “medicamentos”, escrevendo, por exemplo, “substâncias empregadas no tratamento
15

de uma afecção ou de uma manifestação mórbida”. Para isso, o uso de dicionários e de boas
fontes de consulta é imprescindível, de modo que você possa apresentar informações precisas.
A perífrase permite que você acrescente novos dados ao tópico sobre o qual você está
escrevendo, como propusemos ao criar a perífrase “substâncias empregadas no tratamento de
uma afecção ou de uma manifestação mórbida”. Nesse caso, tal construção acrescentaria ao
texto uma informação sobre a função do medicamento.
O uso das perífrases pode ser útil para você reforçar seu ponto de vista ao longo de um
texto dissertativo. Veja a seguir dois exemplos:
Exemplos:
(a) Deve ser permitido o porte de armas a civis, pois a sociedade está cada vez
mais violenta. É impensável a vida em uma grande sociedade sem esses instrumentos que
garantem a autodefesa do cidadão.
(b) Apesar da crescente onda de violência nas grandes capitais, deveria ser
proibido a civis o porte de armas. É absurdo haver cidadãos comuns portando esses
instrumentos de ameaça à vida e à integridade física do outro.
Em (a), sendo o autor favorável ao porte de armas, valeu-se de uma perífrase (em
negrito) que reforça essa ideia, valorizando as vantagens trazidas por esses instrumentos. Por
outro lado, como em (b) o autor é contrário ao porte de armas, utilizou uma perífrase que
reafirma tal ponto de vista, destacando as consequências negativas do uso desses objetos.

Exercitando
Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 4
Observe o trecho abaixo, retirado do artigo “Edifícios ecológicos”, de Francisco Maia
Neto. Identifique, no texto, os itens lexicais que retomam a palavra em destaque,
estabelecendo com ela coesão referencial.

Criticada mundialmente pela pouca preocupação com o meio ambiente, a China


anunciou recentemente que está investindo em construções ambientalmente responsáveis,
16

tendo sido lançado seu primeiro edifício ecológico, com uma economia de até 70% de energia
e 60% de água, o que lhe valeu uma certificação internacional.
Concebida por profissionais americanos e chineses, esta construção destinada a
escritórios constitui-se no primeiro edifício no país a receber o “LEED”, sigla em inglês de
Liderança em Energia e Design Ambiental, que é um certificado criado por um grupo de
empresários da construção nos Estados Unidos, preocupados com a preservação do meio
ambiente.
Para imaginarmos a dimensão da iniciativa, foi feita uma projeção sobre o impacto que
resultaria se esta tecnologia fosse aplicada em todos os edifícios comerciais na China. A
economia energética obtida anualmente seria equivalente à Usina Hidrelétrica de Três
Gargantas, o megaprojeto chinês do Rio Yangtse, com capacidade de 18.200 megawatts, que
fará com que supere Itaipu, transformando-se na maior usina do mundo.
O projeto contempla iniciativas que começam pelo telhado, cujo terraço acumula 70%
da água da chuva e filtra os agentes poluentes, utilizando espécies naturais de Pequim, além
de painéis solares, que fornecem 10% de toda a energia consumida no edifício.

2. Coesão sequencial
Para que um texto seja coeso, não basta evitar a repetição desnecessária de palavras,
retomando, pelos mecanismos que vimos acima, termos que já haviam sido mencionados. É
preciso também estabelecer relações lógicas entre as ideias expressas, o que é especialmente
importante em gêneros de escrita acadêmica.
Para estabelecer relações lógicas entre as ideias, utilizamos conectivos, como
preposições e conjunções. Observe o trecho abaixo, retirado do artigo “Mensuração da
glicemia em cães mediante a utilização do glicosímetro portátil: comparação entre amostras
de sangue capilar e venoso”, de G. A. S. Aleixo. Atente para os conectivos em negrito e sua
função no encadeamento das ideias.

A glicose é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de energia,


por isso é necessário manter sua concentração no sangue em equilíbrio (BUSH, 2004). Níveis
glicêmicos alterados (elevação ou redução) trazem consequências negativas para o corpo e a
maneira mais adequada de reduzir essas complicações é tentando manter o equilíbrio. Para
isso se faz necessário realizar medições da glicemia (PICA et al., 2003).
17

As diferentes técnicas de monitoramento da glicose no sangue podem ser classificadas


em laboratorial e portátil. A primeira opção é mais confiável, entretanto, por gerar maiores
custos, seu uso fica restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais (PICA et al.,
2003). Outra desvantagem observada é a necessidade de maiores volumes de sangue (três
mililitros) para realizar o teste (GROSS et al., 2002).
Além disso, é preciso muito cuidado e agilidade ao manipular uma amostra que será
submetida à dosagem de glicose no laboratório, pois o consumo desse carboidrato pelos
eritrócitos no sangue ocorre na taxa de aproximadamente 10% por hora em temperatura
ambiente. Esse consumo pode ser ainda mais acelerado se a amostra estiver contaminada com
microrganismos ou em ambientes quentes (COLES, 1984; KANEKO,
1997).

Logo na primeira frase, as duas principais ideias (o aproveitamento da glicose e a


necessidade de manter sua concentração equilibrada) são ligadas pelo conectivo “por isso”. A
escolha de tal palavra estabelece entre essas ideias uma relação de conclusão, de modo que,
em consequência do constante aproveitamento da glicose, seja necessário manter sua
concentração no sangue em equilíbrio.
Observe agora o período: “A primeira opção é mais confiável, entretanto, por gerar
maiores custos, seu uso fica restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais”. Nessa
frase, há mais de um conectivo estabelecendo relações lógicas entre as ideias. A palavra
“entretanto”, por exemplo, indica uma oposição, contrastando a confiabilidade (aspecto
positivo) e a restrição (aspecto negativo) das técnicas laboratoriais de monitoramento da
glicose. Já a palavra “por” indica um valor de causa, de modo que a geração de maiores custos
é o motivo de restringir tais técnicas. Por fim, o conectivo “e” tem valor de adição, somando
os locais a que se restringem as técnicas laboratoriais de monitoramento da glicose: clínicas e
hospitais.
A seguir apresentamos as principais ideias que os conectivos podem acrescentar ao
encadeamento da frase.
18

2.1. Relação de causa-consequência


Essa é uma das relações mais comuns na construção de um texto. É possível estabelecê-
la por uma série de mecanismos diferentes. Como exemplo, vamos retomar uma frase do
texto.
“A glicose é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de energia,
por isso é necessário manter sua concentração no sangue em equilíbrio”.
Conforme você já viu, esse conectivo introduz uma ideia de consequência a algo que
havia sido dito antes. Essa frase poderia também ter sido dita de outras formas. Veja:
Exemplos:
(a) A glicose é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de
energia, logo é necessário manter sua concentração no sangue em equilíbrio.
(b) A glicose é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de
energia, portanto é necessário manter sua concentração no sangue em equilíbrio.
(c) A glicose é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de
energia; é necessário, pois, manter sua concentração no sangue em equilíbrio.
(d) A glicose é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de
energia, de modo que é necessário manter sua concentração no sangue em equilíbrio
Observe que em (c) há uma construção pouco comum na fala cotidiana. Geralmente, a
palavra “pois” é empregada para introduzir uma causa. Na frase que estamos analisando, no
entanto, esse conectivo está introduzindo uma consequência. Para isso, deve ser posicionado
após o verbo da oração em que se encontra.
Outros conectivos que expressam relações de consequência (ou conclusão) são assim,
então, por conseguinte, em vista disso.

Se você inverter a estrutura dessa frase, passando o conectivo para a outra oração, não
haverá mais ideia de consequência, mas sim de causa. Na verdade, essas ideias estão
intimamente relacionadas. Observe:
(a) É necessário manter a concentração de glicose no sangue em equilíbrio,
porque ela é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de energia.
(b) É necessário manter a concentração de glicose no sangue em equilíbrio, pois
ela é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de energia.
(c) É necessário manter a concentração de glicose no sangue em equilíbrio, visto
que ela é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de energia.
19

(d) É necessário manter a concentração de glicose no sangue em equilíbrio, já que


ela é constantemente aproveitada pelas células do corpo como fonte de energia.
Observe que em (b) o emprego da palavra “pois” corresponde ao uso mais frequente na
língua. Nesse caso, para expressar ideia de causa, esse conectivo deve ser posicionado antes
do verbo da oração em que se encontra.
Outros conectivos que expressam relações de causa são dado que, como, uma vez que,
porquanto, por, por causa de, em vista de, em virtude de, devido a, por motivo de, por
razões de.

2.2. Relação de oposição


Observe a frase:
“A primeira opção é mais confiável, entretanto, por gerar maiores custos, seu uso fica
restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais”.
A palavra “entretanto” realça o contraste que há entre a confiabilidade e a restrição da
“primeira opção”. Tal frase poderia ser reescrita de várias outras formas, mantendo seu
sentido básico.
Exemplos:
(a) A primeira opção é mais confiável, mas, por gerar maiores custos, seu uso fica
restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(b) A primeira opção é mais confiável, porém, por gerar maiores custos, seu uso fica
restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(c) A primeira opção é mais confiável, no entanto, por gerar maiores custos, seu uso
fica restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(d) A primeira opção é mais confiável, todavia, por gerar maiores custos, seu uso fica
restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(e) A primeira opção é mais confiável, contudo, por gerar maiores custos, seu uso fica
restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais.

Veja que, embora todos esses conectivos expressem basicamente a mesma ideia, têm um
comportamento sintático diferente: à exceção de “mas”, todos os outros têm mobilidade na
oração, podendo ser posicionados em diferentes locais da frase.
Exemplos:
(b.1) A primeira opção é mais confiável; por gerar maiores custos, porém, seu uso fica
restrito aos laboratórios de análises clínicas e hospitais.
20

(b.2) A primeira opção é mais confiável; por gerar maiores custos, seu uso fica restrito
aos laboratórios de análises clínicas e hospitais, porém.
Da mesma maneira que na seção referente às relações de causa-consequência, você tem
a opção de mudar o conectivo de oração para expressar uma mesma oposição. No entanto,
embora a relação entre as ideias continue sendo de oposição, a ênfase muda. Veja:
Exemplos:
(a) A primeira opção é mais confiável, mas seu uso fica restrito aos laboratórios de
análises clínicas e hospitais.
(b) Embora a primeira opção seja mais confiável, seu uso fica restrito aos laboratórios
de análises clínicas e hospitais.
O conectivo “mas” e seus equivalentes, vistos acima, introduzem a oração a que se quer
dar ênfase. O conectivo “embora” e seus equivalentes, vistos a seguir, reduzem a importância
do fato expresso pela oração que introduzem.
Veja agora construções equivalentes às de (b).
Exemplos:
(b.1) Apesar de que a primeira opção seja mais confiável, seu uso fica restrito aos
laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(b.2) Mesmo que a primeira opção seja mais confiável, seu uso fica restrito aos
laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(b.3) Ainda que a primeira opção seja mais confiável, seu uso fica restrito aos
laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(b.4) Posto que a primeira opção seja mais confiável, seu uso fica restrito aos
laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(b.5) Não obstante a confiabilidade da primeira opção, seu uso fica restrito aos
laboratórios de análises clínicas e hospitais.
(b.6) Malgrado a confiabilidade da primeira opção, seu uso fica restrito aos laboratórios
de análises clínicas e hospitais.
(b.7) A despeito da confiabilidade da primeira opção, seu uso fica restrito aos
laboratórios de análises clínicas e hospitais.

2.3. Relação de condição


Observe a frase a seguir, retirada do artigo que estamos analisando: “Esse consumo pode
ser ainda mais acelerado se a amostra estiver contaminada com microrganismos ou em
ambientes quentes”.
21

Nesse caso, o conectivo “se” apresenta a contaminação da amostra como uma condição
para a aceleração do consumo. Veja que, com algumas modificações nos tempos verbais, essa
frase poderia ser escrita de outras maneiras.
Exemplos:
(a) Esse consumo pode ser ainda mais acelerado caso a amostra esteja contaminada com
microrganismos ou em ambientes quentes.
(b) Esse consumo pode ser ainda mais acelerado, desde que a amostra esteja
contaminada com microrganismos ou em ambientes quentes.
(c) Esse consumo pode ser ainda mais acelerado, contanto que a amostra esteja
contaminada com microrganismos ou em ambientes quentes.

2.5. Relação de finalidade


Observe agora o seguinte trecho retirado do texto: “Níveis glicêmicos alterados
(elevação ou redução) trazem consequências negativas para o corpo e a maneira mais
adequada de reduzir essas complicações é tentando manter o equilíbrio. Para isso se faz
necessário realizar medições da glicemia”.
Nesse contexto, o conectivo “para isso” estabelece que a manutenção do equilíbrio é a
finalidade (ou objetivo) das medições da glicemia. Veja, abaixo, como essas ideias poderiam
ser reunidas em apenas uma frase, por meio de diferentes conectivos.
Exemplos:
(a) Para que se mantenha o equilíbrio, faz-se necessário realizar medições da
glicemia.
(b) A fim de que se mantenha o equilíbrio, faz-se necessário realizar medições da
glicemia.
(c) Com o objetivo de manter o equilíbrio, faz-se necessário realizar medições da
glicemia.
(d) Com o intuito de manter o equilíbrio, faz-se necessário realizar medições de
glicemia.

Observe, por fim, que há outras relações lógicas que podem ser estabelecidas por
conectivos, como adição, tempo, conformidade, comparação, proporcionalidade etc.

Exercitando
22

Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 5
Observe abaixo o trecho retirado do artigo “A dependência química”, de Júlio Cruz.
Identifique o valor semântico dos conectivos em destaque e sugira outros que possam
substituí-los, sem acarretar mudanças no significado básico.

A série de capítulos penosos protagonizada pelo ator global Fábio Assunção traz à baila
mais uma vez a discussão da temática que mais tem afligido nossa sociedade nos últimos
anos: a dependência química. Uma síndrome caracterizada pelo uso de substâncias psicoativas
nas quais se incluem o álcool, a maconha, a cocaína e o crack, em troca das sensações de
tranquilidade e de prazer.
Avaliando a intermitente ampliação deste panorama, pode-se perceber quão complexa é
a matéria e constatar que a dependência química já faz parte de nossas estatísticas mais
nefastas, quando grifam o expressivo número de acidentes de trânsito e crimes que têm
origem no uso das drogas.
Levar à sociedade um maior número de informações significará permitir compreender
que a dependência química é uma doença e não uma opção de vida, e que essa doença gera
consequências danosas ao indivíduo e às pessoas que dele estão próximas. Faz-se relevante
compreender que a doença não se inicia com a dependência química, pois, de antemão, o
usuário já se encontra doente existencialmente, indo procurar nas drogas a cura de suas feridas
mais íntimas, fato reconhecido pela Organização Mundial de Saúde.
Por outro lado, a falta de transmissão de notícias precisas acaba gerando conceitos
errados, tanto sobre o usuário da droga quanto sobre o mito que ela tem de solucionar
problemas. Nesse sentido, saliente-se que os familiares do usuário são de fundamental
importância para o aprendizado de quais atitudes se devem tomar perante tal problema,
mesmo porque muitos dos dependentes químicos iniciam seu relacionamento com drogas
exatamente no lugar onde se suporia que estariam mais seguros: dentro de seus próprios lares.

Glossário
• Pronome – palavra que substitui ou acompanha nomes;
23

• Norma dita culta (ou norma padrão) – variedade linguística de prestígio em uma
comunidade, sendo a forma consagrada em textos acadêmicos e jornalísticos;
• Léxico – conjunto aberto de palavras da língua, que abrange todos os substantivos,
verbos e adjetivos, bem como alguns advérbios.

Referências bibliográficas
ABREU, A. Curso de Redação. São Paulo: Ática, 2005.
ALEIXO, G. A. S. Mensuração da glicemia em cães mediante a
utilização do glicosímetro portátil: comparação entre amostras de
sangue capilar e venoso. Disponível em:
<http://www.revistavet.byethost13.com/modules/mastop_publish/files/
files_47d568db4dab7.pdf>. Acesso em 15 jun.2009.
BARRETO, S. M. G. Esporte e saúde. Disponível em:
<http://www.cdcc.usp.br/ciencia/artigos/art_22/esportesaude.html
>. Acesso em 15 jun.2009.
CRUZ, J. A dependência química. Disponível em:
<http://www.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?
uf=1&local=1&source=a2306601.xml&template=3898.dwt&edition=11172&section=1012>.
Acesso em 15 jun. 2009.
CUNHA, C; CINTRA, L. Nova Gramática do Português Contemporâneo. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2001.
FREITAS, J. S. Análise da publicidade de medicamentos veiculada em Goiás – Brasil.
Disponível em: <http://www.farmacia.ufg.br/revista/_pdf/vol2_2/artigos/ref_v2_2-2005_p80-
86.pdf>. Acesso em 15 jun. 2009.
GIL, G. Eletracústico: A linha e o linho. Warner Music, 2004.
KOCH, I. A coesão textual. São Paulo: Contexto, 2008.
LEITE, L. H. A. Pedagogia de projetos. Disponível em:
<http://www.cipo.org.br/escolacomsabor/arq/TanaMesa_Artigo_pedagogiadeprojeto.doc>.
Acesso em 15 jun.2009.
LISPECTOR, C. Uma esperança. In:______. Felicidade Clandestina. Rio de Janeiro: Rocco,
1998.
VIEIRA, D. Grande dicionário português ou Tesouro da língua portuguesa. Porto: Ernesto
Chardron e Bartholomeu H. de Moraes, 1871-1874.
Unidade 3 - Coerência textual
24

Apresentando a unidade
Nesta unidade, você estudará mecanismos que garantem que um texto faça sentido, os
quais evitam ruídos na comunicação entre as pessoas. Para escrever bem, além de ter boas
ideias, é preciso apresentá-las de forma clara, de modo que não se contradigam e não
estabeleçam relações ilógicas entre si.

Definindo os objetivos
Ao final desta unidade, você deverá ser capaz de:
1. compreender a noção de coerência textual e sua
importância para uma boa legibilidade dos textos;
2. identificar as principais estratégias textuais que
asseguram coerência ao discurso;
3. reconhecer e corrigir falhas textuais que comprometam a coerência do discurso;
4. identificar informações implícitas no discurso;
5. produzir parágrafos e textos mais coerentes.

Conhecendo a coerência textual


Talvez você já tenha se deparado com alguma leitura que não
compreendeu muito bem. Isso pode ter acontecido por falta de
familiaridade com o assunto do texto ou por desconhecimento de certas palavras e
construções gramaticais nele encontradas. No entanto, a dificuldade para compreender o texto
também pode ter sido causada por problemas na coerência das ideias que o constituem.
Coerência é uma palavra utilizada no cotidiano com o sentido de “condição para que
algo seja compreensível”. Quando lemos ou ouvimos informações confusas, dizemos que
aquilo não faz sentido, pois está incoerente. Em um contexto mais técnico, coerência significa
a condição para que um texto seja interpretado por um indivíduo em uma situação específica.
Assim, a coerência transforma uma sequência de palavras em texto e não em um
amontoado desconexo de vocábulos. Essa sequência é entendida como texto quando o leitor é
capaz de percebê-la como um todo com significado, que lhe comunica alguma ideia. Compare
os exemplos abaixo para entender mais claramente a noção de coerência.

Exemplos:
(a) Sapato. Água. Estudar. Todavia.
25

(b) Vim. Vi. Venci.


Enquanto em (a) o conjunto de palavras não é capaz de veicular uma mensagem, não
constituindo um texto, em (b), a mensagem é clara e coerente, embora o texto seja
bastante curto e simples.

Um leitor só é capaz de conferir coerência a um texto, isto é, torná-lo coerente, quando


leva em conta os contextos de produção e recepção, pois algumas leituras apenas fazem
sentido se soubermos de antemão quando, onde, para quem e por quem o texto foi produzido.
Dizer, hoje em dia, que a Terra é achatada e plana é absolutamente incoerente, pois não
corresponde à realidade, segundo nosso atual conhecimento de mundo. No entanto, na Idade
Média, tal afirmativa era interpretada como coerente, já que estava de acordo com o discurso
científico da época.
De maneira semelhante, a frase “Navios brasileiros entravam portugueses na Baía da
Guanabara” parece incoerente a um primeiro olhar, se pensarmos que o verbo nessa oração é
“entrar”, referindo-se a uma ação passada. Porém, uma leitura mais atenta confere coerência a
esse texto, percebendo que se trata do verbo “entravar”, indicando uma ação presente.
Agora que você entendeu o que é coerência, precisa compreender quais são as
estratégias que garantirão a seu texto essa qualidade. Na próxima seção, você encontrará
algumas regras que devem ser obedecidas para se redigir um texto coerente.

Definindo as regras de coerência textual

1. Regra da repetição (ou regra da coerência sintática) – Ao longo da exposição das


ideias, é preciso que as partes do texto se conectem entre si, de modo que cada nova
informação remeta à antiga. Dessa forma, ao mesmo tempo em que avança em termos de
conteúdo, o texto deve sempre explicitar a relação de cada nova informação com as
anteriores, para que o leitor não se perca na leitura.
Observe como isso é feito no trecho abaixo, retirado do artigo “A convergência dos
aspectos de inclusão digital: experiência nos domínios de uma universidade”, de Barbara
Coelho Neves. Atente, principalmente, para as palavras em destaque.

“A Sociedade da Informação, formalizada nos inventos de uma série de máquinas


inteligentes criadas ao logo da Segunda Guerra Mundial,
origina novas responsabilidades para todos os atores sociais nela
26

inseridos. Tais responsabilidades representam a necessidade da provisão do fluxo de


informações que permita desde a geração de novos conhecimentos até o efetivo exercício
da cidadania pela sociedade civil.
Várias iniciativas de instituições – mantidas com recursos de origem privada, pública
ou mista de mecanismos nacionais e internacionais – têm contribuído com a criação de
espaços que proporcionam tipos de acessos variados à informação eletrônica”.

No trecho acima, as frases estão bem relacionadas entre si, o que garante coerência ao
texto. A expressão “tais responsabilidades” remete diretamente a “novas responsabilidades”,
presente na frase anterior.
Além disso, a transição entre parágrafos também se dá de forma clara. Apesar de se
dizer geralmente que mudamos de parágrafo quando encerramos um assunto, é preciso
perceber que os parágrafos devem estar relacionados entre si, interligando esses tópicos
distintos. No texto aqui analisado, a expressão “criação de espaços que proporcionam tipos de
acessos variados à informação eletrônica” está intimamente ligada ao parágrafo anterior, pois
funciona como uma solução para a “necessidade da provisão do fluxo de informações que
permita desde a geração de novos conhecimentos até o efetivo exercício da cidadania pela
sociedade civil”.

2. Regra da progressão – ao mesmo tempo em que um texto precisa retomar, por meio
de mecanismos coesivos, termos que já haviam sido mencionados, é preciso que haja
renovação dos conteúdos, com progressão semântica. Assim, o texto avança na condução das
ideias, não se tornando repetitivo.
Observe o mesmo trecho de “A convergência dos aspectos de inclusão digital: experiência
nos domínios de uma universidade”, agora atentando para a aplicação da regra da progressão.

“A Sociedade da Informação, formalizada nos inventos de uma série de máquinas


inteligentes criadas ao logo da Segunda Guerra Mundial, origina novas responsabilidades para
todos os atores sociais nela inseridos. Tais responsabilidades representam a necessidade da
provisão do fluxo de informações que permita desde a geração de novos conhecimentos até o
efetivo exercício da cidadania pela sociedade civil.
27

Várias iniciativas de instituições – mantidas com recursos de origem privada,


pública ou mista de mecanismos nacionais e internacionais – têm contribuído com a
criação de espaços que proporcionam tipos de acessos variados a informação eletrônica”.

O primeiro parágrafo do trecho falava sobre necessidades decorrentes do advento da


sociedade da informação. O segundo reafirma tais necessidades, mas adiciona uma nova
informação: a contribuição de instituições para suprir tal demanda. Assim, o desenvolvimento
do texto avança, ao mesmo tempo em que mantém ligações com ideias anteriores.
Você deve ter percebido que, na construção de um texto coerente, combinam-se as
regras da repetição e da progressão. Assim, deve haver um equilíbrio entre informações
“velhas” (já conhecidas pelo leitor) e novas, sendo os dois grupos expostos de forma
intercalada. Caso contrário, há problemas de comunicação: um texto com excesso de
informações velhas tem baixa informatividade, não agregando conhecimento ao leitor. Por
outro lado, o excesso de informações desconhecidas pelo leitor pode obstruir completamente a
compreensão do texto. Note, no entanto, que as informações serão “velhas” ou novas de
acordo com o leitor, de modo que, ao escrever, você precisa ter bem definido a quem se
destina seu texto, para poder selecionar e organizar bem as ideias.
Para que isso fique mais claro, atente para os exemplos abaixo, retirados de Koch e
Travaglia (2008, p. 86).

Exemplos:
(a) O oceano é água.
(b) O oceano é água. Mas ele se compõe, na verdade, de uma solução de gases e sais.
(c) O oceano não é água. Na verdade, ele é composto de uma solução de gases e sais.

A primeira frase deve ser evitada em um texto acadêmico, pois seu conteúdo é óbvio e
nada acrescenta ao leitor, que se perguntará qual a intenção do autor ao escrever algo formado
apenas por informações por ele já conhecidas. Por outro lado, mesmo que esteja correta, a
terceira construção causará dúvidas no leitor, visto que provavelmente não há nela nenhuma
informação por ele conhecida para situá-lo quanto ao enunciado. Ambas as frases em (c)
veiculam ideias absolutamente novas, o que prejudica a compreensão; se não conhecemos
boas referências do autor, podemos até achar que se enganou enquanto escrevia.
Para um texto acadêmico, a melhor opção seria (b), pois há um equilíbrio entre
informação “velha” (oceano formado por água) e nova (oceano formado por gases e sais).
28

Sempre que tiver de escrever, tenha em mente a importância de balancear trechos com alta e
baixa informatividade, para que a leitura possa fluir com facilidade.

Exercitando
Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 1
Leia atentamente o artigo abaixo, escrito por Beto Albuquerque. Apesar de atender às
normas da gramática tradicional, o texto incorre em uma falha, pois desobedece às regras da
progressão e da repetição, segundo as quais uma parte do texto deve avançar em termos
temáticos, mas sempre relacionando as informações novas ao que já havia sido dito.
Identifique no artigo em questão o trecho em que o autor lança uma ideia inesperada ao leitor,
mas sem explicá-la em mais detalhes ou contextualizá-la em relação ao sentido global do
texto.

Incrível: tem gente torcendo por mortes no trânsito [25/09/2008]


Ao completar três meses de vigência, a lei do álcool zero no trânsito (Lei 11.705/08) já
poupou centenas de vidas no Brasil. Para continuar salvando vidas, a ação dos órgãos de
trânsito nas três esferas de governo federal, estadual e municipal e a conscientização e
mudança de atitude da população são imprescindíveis.
Desde sua entrada em vigor, a lei diminui a incidência de acidentes de trânsito, mesmo
sob muita discussão. A lei é popular, positiva e eficaz mesmo sem campanhas permanentes.
Imagine se o poder público fizer a sua parte! O que é lamentável é assistir a alguns incautos
torcendo pelas mortes no trânsito como forma de fazer valer o seu desejo de beber e dirigir.
O fato é que a perigosa mistura do álcool com a direção, que antes da lei era responsável
por 60% das mortes e após a lei, por 40%, continua muito presente. Um dos efeitos da nova
lei é provocar uma mudança de atitude de todos nós no volante, de forma semelhante à
aplicação das leis que tornaram obrigatório o uso do cinto de segurança e a obrigatoriedade do
uso do capacete pelos motociclistas.
Outro ponto a considerar é que, segundo a Organização Mundial da Saúde, cada país
terá o número de mortes no trânsito que estiver disposto a tolerar. A Lei nº 11.705/08
29

demonstra que a sociedade não está mais disposta a tolerar tantas mortes evitáveis no trânsito.
Mesmo quando há um efeito considerável na redução de acidentes devido à entrada em vigor
de uma lei, esse efeito pode ser anulado após certo tempo, se houver percepção pública de
impunidade e/ou desconhecimento da lei vigente.
(...)

3. Regra da não-contradição (ou coerência semântica) – um texto coerente não pode


contradizer uma informação apresentada por ele anteriormente. Nesse aspecto, é importante
tomar cuidado quando você for apresentar visões opostas acerca de uma mesma questão,
procedimento comum em textos acadêmicos. Para que essa contraposição de perspectivas não
se torne paradoxal, é importante explicitar que se trata de diferentes visões sobre um mesmo
tema, defendidas por pessoas distintas, e não posicionamentos contraditórios daquele que
escreve.
Veja o parágrafo a seguir, retirado do artigo “Concepções de professores de enfermagem
sobre drogas”, de Gertrudes Teixeira Lopes e Halyne Limeira Pessanha. Nele, as visões do
senso comum e de Moutinho (2005) são contrapostas por meio da expressão “quando, na
realidade”, que explicita que esta visão é mais apropriada do que aquela, o que garante
coerência ao texto, não o tornando contraditório.

Exemplo:
“A forma como se aborda habitualmente o tema traz a impressão de que se trata de algo
novo, de um mal contemporâneo quando, na realidade, o uso de substâncias psicoativas é um
fenômeno que acompanha toda a história da Humanidade (Moutinho, 2005). O mesmo pode
ser dito sobre a busca do prazer e a necessidade da satisfação”.

Por outro lado, observe o parágrafo abaixo, retirado do texto de um aluno, o qual
infringiu a regra da não-contradição enquanto escrevia.

Exemplo:
O país tem uma política econômica controversa: enquanto vende para o exterior seu
melhor café, consumindo internamente um produto de baixa qualidade, exporta tecnologia de
mineração. Desse modo, enquanto fazendeiros do café enriquecem, a Vale do Rio Doce
endivida-se com a aquisição de maquinário estrangeiro.
30

O trecho acima se contradiz ao afirmar primeiramente que o Brasil exporta tecnologia


mineradora e depois que a Vale do Rio Doce tem de importar maquinaria. Ambas as
afirmações podem até ser verdadeiras, caso a Vale constitua uma exceção no panorama das
empresas mineradoras brasileiras, mas tal fato precisaria ser claramente expresso no texto
para garantir-lhe coerência.

4. Regra da relação – um texto coerente deve apresentar o que se convencionou chamar


de coerência externa, a adequação à realidade de que fala. Não deve, pois, fazer afirmações
falsas sobre a realidade. Observe o exemplo abaixo de um texto que contraria o princípio da
relação.

Exemplo:
A utilização da tecnologia digital na educação como ferramenta para inclusão social é
um excelente meio para levar o conhecimento e a informação disponível necessários para a
formação da inteligência.

Tal trecho não condiz com a realidade, pois afirma que a aquisição de determinados
conhecimentos é imprescindível para a formação da inteligência. Tal argumento,
erroneamente, conduz à ideia de que sem acesso a um grupo específico de saberes não há
inteligência. Preconceituosa, essa afirmação acarreta a generalização de que pessoas sem
acesso a tais informações não têm inteligência.
Ainda no que diz respeito à regra da relação, um autor deve se preocupar para não
incorrer em um erro de acidente, incoerência que se origina de falsas generalizações, de modo
que um fato particular a um ou mais indivíduos é estendido para toda a classe. Tal
generalização, no entanto, não pode ser provada por argumentos lógicos. Observe os
exemplos abaixo:
(a) Todos os cães são mamíferos.
(b) Nenhum mamífero põe ovos.
A primeira frase apresenta uma generalização sobre a
classificação canina, que corresponde ao que diz a ciência. A
segunda, no entanto, baseada em um conhecimento parcial,
generaliza uma característica que pertence a quase todos os mamíferos, mas não a todos;
afinal, ornitorrincos são mamíferos que põem ovos.
31

Para solucionar problemas como esse, é preciso lançar mão de certas expressões que
relativizem afirmações tão generalizantes. Assim, o uso de a maioria de, boa parte de, uma
parcela ínfima de e de outras locuções mostra que o autor não recorre a falsas afirmativas
universalizantes para defender seu ponto de vista.

Exercitando
Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 2
Os trechos a seguir foram retirados do livro Curso de redação, de Antônio Suárez
Abreu, constando de uma seção de exemplos de incoerência textual, que figuram como
estratégia de humor em O melhor do besteirol, de Petras (1995). Com base nos trechos
abaixo, identifique qual regra de coerência foi desrespeitada, justificando sua resposta.

a. “É realmente apropriado que nos reunamos aqui hoje, para homenagear Abraham
Lincoln, o homem que nasceu numa cabana de troncos que ele construiu com suas próprias
mãos”. (Político, em um discurso, homenageando Lincoln)
b. “Damos cem por cento na primeira parte do jogo e, se isso não for suficiente, na
segunda parte damos o resto”. (Yogi Berra, jogador norte-americano de beisebol, famoso por
suas declarações esdrúxulas)
c. “Substituição de bateria: substitua a bateria velha por uma nova”. (Instrução em um
manual elétrico)
d. “(...) este Conselho resolve: a) que uma nova cadeia seja construída; b) que a nova
cadeia seja construída com os materiais da velha cadeia; c) que a velha cadeia seja usada até
que a nova esteja pronta”. (Resolução da Junta dos Conselheiros, Canto, Mississipi, 1800)
e. “Por que deveriam os irlandeses ficar de braços cruzados e mãos nos bolsos
enquanto a Inglaterra pede ajuda?” (Sir Thomas Myles, falando em um comício em Dublin,
em 1902, sobre a guerra dos Boeres)
f. “Quando um grande número de pessoas não consegue encontrar trabalho, o
resultado é o desemprego”. (Calvin Coolidge, presidente americano em 1931)
32

g. “Acho que os senhores pensam que, em nossa diretoria, metade dos diretores
trabalha e a outra metade nada faz. Na verdade, cavalheiros, acontece justamente o contrário”.
(Diretor de empresa, defendendo os membros de seu staff)

Identificando informações implícitas


Agora que você já conhece os princípios que tornam um texto coerente, precisa entender
a importância de reconhecer informações implícitas em um texto, pois a incapacidade de
percebê-las pode obstruir sua leitura.
Quando lemos, atentamos para uma série de informações que estão claramente expressas
em determinadas escolhas de palavras, certas construções gramaticais etc. Essas informações
ficam claras a uma primeira leitura, pois estão sendo explicitamente apresentadas ao leitor.
Por outro lado, um bom leitor não constrói sentidos a partir só das informações
explícitas, pois deve atentar também para uma segunda camada, mais profunda, de
significação. Essa segunda camada contém as informações implícitas, que não vêm
claramente expressas em um texto, mas são necessárias para sua compreensão. Quando
escreve, um autor deixa determinadas informações sugeridas nessa segunda camada, mas não
claramente ditas, seja por brevidade, ironia ou mesmo necessidade de camuflar certos
posicionamentos, como na época da ditadura militar.
Se um leitor é capaz de identificar e entender o que está implícito no texto, pode
reconstituir, em parte, a intenção do autor. Veja o exemplo abaixo, retirado do editorial
“Efeito prático”, da Gazeta do Povo.

Surge uma notícia capaz de devolver a fé aos que já tinham perdido as esperanças de ver
a ética prevalecer na vida pública: a Advocacia-Geral da União espera reaver aos cofres do
Estado R$ 110 milhões desviados, em todo o país, por meio de licitações irregulares e
superfaturamento na compra de unidades móveis de saúde. (...) Os processos também têm o
importante objetivo de afastar da vida pública aqueles que, comprovadamente, não seguem os
princípios básicos da impessoalidade e da moralidade – essenciais quando se trata de atuar em
nome de toda a sociedade. Felizmente, já não se pode dizer que o Brasil varre toda a sujeira
para debaixo do tapete. Investigações e processos correm às mancheias. Falta-nos agora
acabar com a pizza e extrair efeitos práticos da caça aos corruptos. A recuperação de R$ 110
milhões será um bom começo.
33

Observe que em momento algum do texto o autor fala explicitamente da história


brasileira marcada pela corrupção impune. No entanto, tal ideia está implícita na frase
“Felizmente, já não se pode dizer que o Brasil varre toda a sujeira para debaixo do tapete”. O
emprego da palavra “já” sugere que não se pode mais falar dessa impunidade no Brasil, mas
que um dia isso já foi comum. Segundo o autor, hoje o Brasil não varre mais a sujeira para
baixo do tapete, embora no passado a corrupção passasse despercebida, o que está implícito
no texto. Assim, além de noticiar a recuperação dos R$ 110 milhões, o autor tem a intenção
de criticar o passado de impunidade na corrupção.
No caso acima, apesar de a informação sobre a antiga impunidade não estar
explicitamente apresentada no texto, há uma “pista” (também chamada de marca linguística)
deixada pelo autor, para que percebamos esse sentido. Trata-se, como vimos, da palavra “já”.
Quando o leitor pode se basear em uma marca linguística para entender o que está implícito,
chama-se essa informação implícita de pressuposto.
Por outro lado, há certas informações implícitas que não são sinalizadas por pistas no
texto. Logo, o leitor deve, com seu conhecimento prévio, preencher as lacunas deixadas pelo
autor, de modo a tornar clara a leitura. Nesse caso, chama-se a informação implícita de
subentendido.
É impossível, quando se escreve um texto, explicar absolutamente tudo o que envolve as
ideias expostas. Por motivos de concisão, selecionamos as informações principais e deixamos
a cargo do leitor inferir as outras. Por exemplo, ao relatar o que fizemos durante o dia, não
escrevemos: “Primeiro pus o pé esquerdo no chão; depois o direito; depois o esquerdo; depois
o direito. Depois calcei um pé de chinelo. Depois calcei o outro”. Seria impossível comunicar
qualquer coisa se os textos fossem tão detalhados.
Assim, é tarefa do leitor perceber e reconstruir mentalmente as informações auxiliares
subentendidas, sem que o autor tenha de explicitá-las. Todavia, quem escreve tem de se
preocupar se o leitor tem conhecimento suficiente para preencher sozinho os subentendidos.
Veja que um livro de matemática para a graduação não explica aos alunos como se
multiplicam números, mesmo que isso seja um conhecimento necessário para resolver
34

determinada atividade proposta pelo livro, como, por exemplo, uma equação. Em vez disso, o
autor assume que os alunos sabem multiplicar sem ajuda e não esmiúça esse procedimento.
Todavia, se uma professora do Ensino Fundamental não relembra aos alunos como se
faz uma multiplicação, muitos não conseguem resolver uma equação. Perceba, assim, a
necessidade de avaliar se determinada informação deve estar implícita ou explícita no texto.
Na escrita acadêmica, geralmente escrevemos para pessoas conhecedoras – pelo menos em
termos gerais – do assunto de que trata nosso texto. Assim, por exemplo, em um artigo sobre
Literatura, um aluno universitário não precisa afirmar que Machado de Assis é um autor
brasileiro. Muito provavelmente, o leitor já sabe disso.
Observe agora o uso de subentendidos na construção do trecho abaixo, retirado do artigo
“Europa diverge sobre combate ao aquecimento global”.

Os líderes europeus se reúnem nesta quinta-feira em Bruxelas profundamente divididos


sobre como cumprir suas promessas de combate ao aquecimento global. Mesmo assim, eles
não admitem a hipótese de fracasso do acordo.
A União Europeia está dividida entre os países mais pobres do leste e os mais ricos da
parte ocidental do continente. Apesar das divergências, até o fim de semana os presidentes e
primeiros-ministros precisam tomar decisões-chave para a elaboração de um pacote de leis
sobre alterações climáticas que valerá para os 27 países-membros.
De um lado, estão Polônia, que ameaça vetar o pacote; Alemanha, que não quer que sua
indústria pague para poluir; e a Itália, que considera o plano ambicioso demais. De outro, a
Grã-Bretanha diz que o pacote acabará resultando em ganhos para as empresas.

Ao ler o texto, você provavelmente não se deu conta, mas, caso não soubesse
previamente que Polônia, Alemanha, Itália e Grã-Bretanha são países europeus, esse trecho
não teria feito qualquer sentido para você. Talvez tivesse até achado que os posicionamentos
desses países fossem reações da comunidade internacional (fora da Europa) à reunião da
União Europeia. Assim, perceba a importância de compreender bem o que está subentendido
para ser um leitor eficiente. Às vezes, o subentendido é facilmente recuperável. Caso
contrário, na hipótese de o leitor não ter conhecimento prévio suficiente para entender o que
está implícito, é melhor o autor explicitar suas ideias.
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Exercitando
Antes de avançar para um novo assunto, que tal pôr em prática o que você acabou de
ver na unidade? Se você encontrar dificuldades para realizar a tarefa a seguir, retome o
conteúdo deste capítulo.
Atividade 3
Os tempos verbais são uma espécie de marca linguística que funciona como “pista”
para o leitor, apontando para determinadas informações implícitas no texto. A partir dos
verbos destacados em negrito, identifique que pressupostos seus tempos verbais sugerem.

a.
Manutenção com foco no negócio
Joubert Flores
Não faz muito tempo, quando se falava de manutenção em indústrias, a ideia que se
formava na mente das pessoas era a do conserto de algo, de reparo de alguma falha e, não
raro, envolvia interrupção da produção e a utilização de prestadores de serviços. Era algo que
se fazia reativamente, ou seja, depois de os problemas terem surgido. Prevenção era uma
expressão pouco ouvida em fábricas e manufaturas em geral.
(...)

b.
Boa Sorte, Congresso Brasileiro de Medicamentos
Jávier Godinho
Um dia alguém escreverá, com honestidade e detalhes, a história da indústria de
medicamentos no Brasil. Sendo verdadeiro e criterioso, com certeza, nela incluirá o nome de
Benedito Vicente Ferreira, o Benedito Boa Sorte, o goiano que, durante todo seu mandato de
senador, com unhas e dentes, defendeu no Congresso, contra o apetite insaciável das
multinacionais, os então oprimidos, débeis, incipientes e desprotegidos laboratórios nacionais.
(...)

Referências bibliográficas

ABREU, A. Curso de redação. São Paulo: Ática, 2005.


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ALBUQUERQUE, B. Incrível: tem gente torcendo por mortes no trânsito. Disponível


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<http://portal.rpc.com.br/gazetadopovo/opiniao/conteudo.phtml?tl=1&id=836983&tit=Efeito-
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