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Lucas Franco
Thiago Sette
BELO HORIZONTE
2010
1) O filme “Salve Geral” provoca uma série de reflexões: a ética, a corrupção, o
aumento da participação das mulheres no crime, o amor materno e suas consequências,
a visão da classe média sob os presídios e os bandidos, o abandono do sistema
penitenciário do país, a violência, a falta de controle do Estado em situações
emergenciais, o poder do dinheiro e do crime e a imprevisibilidade do destino, são
questões levantadas no filme. Por abordar tantas facetas de um problema, o filme foi
encarado pela crítica com inconclusivo. O ponto de vista do diretor Sérgio Rezende não
fica claro, e, portanto, não é possível estabelecer uma conclusão. Qual seria a verdadeira
intenção de Rezende com esse filme? Ricardo Calil ao escrever sua crítica, diz: “’Salve
Geral’ é vítima daquela velha mania do cinema brasileiro de querer explicar um país
inexplicável.” (CALIL, 2009). Com isso, o filme se torna vazio; ao terminarmos de
assistir são tantas reflexões a se fazer que acabamos nos perdendo e ficando sem
reflexão alguma.
Fábio Andrade em sua crítica, ao site Revista Cinética, conta que Rezende antes
de iniciar a sessão para a imprensa explica o porquê do título: “: o ‘salve’, segundo ele,
queria dizer ‘recado’. O filme seria, portanto, um ‘recado geral’” (ANDRADE, 2009).
Essa explicação, segundo Andrade serviu para Rezende adicionar uma nota de rodapé
para uma intenção mal cumprida em seu próprio filme. No hotsite de Salve Geral, essa
explicação também consta. Nota-se, portanto, que Sérgio Rezende se preocupou em
explicar a todos os interessados no filme o porquê de seu título. Se ele acreditasse que
seu filme conseguiu passar aos expectadores o que desejava passar, essa explicação não
seria necessária.
A explicação de Rezende poderia ser interpretada também pelo fato dele mostrar
em seu filme diversas questões sociais. Dessa forma, ele estaria dando um “recado
geral” à sociedade de tudo que está acontecendo em nosso país. Somente com esse
“recado geral” seria possível entender o porquê de tantas questões levantadas em um
único filme.
O filme ainda foi acusado por alguns críticos de fazer apologia ao PCC, por dar
voz aos criminosos e mostrar o outro lado do problema, que, na época, foi ignorado pela
sociedade, que só pensava em seus interesses e na sua segurança. Bruno Paes Manso,
jornalista do Estado de São Paulo tratou o filme como polêmico. De certa forma ele tem
razão: polêmico é algo que gera discussão e diferentes opiniões sobre determinado
assunto. Ao assistir o filme podemos imaginar como ele será encarado por diferentes
pontos de vista: terão aqueles que desejarão matar todos os presos ou que entenderão o
lado deles e pedirão por compaixão, ou ainda os que revoltarão com a polícia, que
matou tantos inocentes. Há também aqueles que se colocarão na pele de Lúcia, mãe de
Rafael, e, além de entender tudo o que ela está passando, ainda apoiará suas atitudes,
mesmo que essas sejam consideradas, em outro contexto, erradas. Contudo, o que
podemos perceber, é que a crítica do cinema foi substituída pelo julgamento ideológico;
não se discute mais os filmes, mas a suposta posição política dos diretores. Assim
também foi com “Tropa de Elite”, “Cidade de Deus”, “Ônibus 174” e “O Prisioneiro da
Grade de Ferro”.
No texto “A crítica e o Cinema Impuro”, Luiz Zanin Oricchio questiona como a
crítica pode influenciar na visão de toda a sociedade:
Dessa forma, antes mesmo de assistir ao filme, o espectador já tem uma visão
direcionada e interpreta as cenas como se estivesse sendo feita apologias, por exemplo,
sem ao menos dar ao próprio filme a chance de mostrar-se diferente. Além disso, ainda
citando Oricchio:
Salve Geral trata exatamente disso, se trata de uma ficção a partir de um fato real
que aconteceu na cidade de São Paulo em 2006. Quatro meses após os ataques de São
Paulo, Sérgio Rezende decidiu fazer o filme concluído apenas três anos após o episódio.
Rezende viveu aquela onda de violência e pensou no filme sob uma perspectiva
diferente da que estava sendo tratada pela imprensa e pela sociedade na época. Para não
cair no clichê do “cinema inautêntico, de fabricação de dramazinhos alienados, à
maneira deste ou daquele paradigma consagrado” (SALLES, 2003), Rezende optou por
criar uma história a partir de algo que tinha vivido. Ele opta por criar um cinema
antenado com a realidade em transe no país. Citando Oricchio: “mesmo um filme
esteticamente sofrível poderia ser bom ponto de partida para o entendimento de
determinado momento histórico, não só do cinema, mas da sociedade.” A estética passa
a ser então fator secundário, já que a intenção do filme é expor um momento histórico e
questioná-lo.
Fábio Andrade, em sua crítica, também questiona a estética do filme:
Não existe possibilidade de choque entre o que se filma e como isso é filmado:
quando uma personagem diz que pensa o tempo todo em algo – e aí, de fato, não importa o
que isso seja – Sérgio Rezende já se entrega logo a um hiper-close.
Rezende não esconde que, desde o anúncio da escolha de seu filme, sua rotina foi
pelos ares. A primeira tarefa agora é exibir o longa fora do País. ‘Sei que a própria
Academia promove sessões, mas não sei exatamente como isso funciona, afinal, sou
marinheiro de primeira viagem’, brinca o diretor.
Com essa afirmação, podemos perceber que Rezende tinha outras intenções
antes mesmo de começar a produção de seu filme, quando ainda estava pensando na
história. Outros diretores também não escondem o interesse na estatueta: “‘Agora tem
que esperar o filme ser visto pelo comitê. São uns 200 críticos. É a eles que o filme
precisa agradar’”, diz Barreto, diretor que já se viu em situação igual à de Sérgio
Rezende. A partir dessas declarações, percebemos que o cinema brasileiro não é mais
feito como antes, pelo simples fato de mostrar a arte, com objetivo de expor a arte a
sociedade brasileira uma história digna de reflexões, mas sim pela ambição de conseguir
uma estatueta e reconhecimento no Brasil e no exterior por ter feito um bom trabalho. b
Como já foi citado anteriormente, o filme não ousa muito quando se trata de
movimentos de câmera. A maior parte do tempo é utilizado o close-up ou o plano
americano. Fábio Andrade cita exemplos em sua crítica de algumas cenas em que os
movimentos de câmera são previsíveis:
O diretor não acredita no mistério de seus próprios signos, é forçoso que o mesmo
movimento aconteça na hora de apontar a câmera. Pois se não há crença no mistério dos
signos, não pode existir fora de campo - algo que fica claro tanto na sequência do tribunal
(onde só ouvimos os fragmentos que "interessam"), quanto na cena em que um preso faz
exercícios na barra, saindo e entrando em quadro, calando-se quando não o vemos, e
falando uma nova frase sempre que seu rosto está novamente em close.