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Texto elaborado por Djalma Agripino de Melo Filho como subsídio à sistematização do
Relatório da SVS (Gestão 2007-2008)
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SILVA, Luiz Jacintho da. Vigilância epidemiológica: a perspectiva de quem é
responsável. Disponível em: http://www.comciencia.br/reportagens/2005/06/14.shtml
3
BRASIL. Ministério da Saúde. 100 anos de saúde pública: a visão da Funasa. Brasília (DF):
Funasa, 2004.
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SILVA, op. cit.
desenhadas em âmbito nacional com o propósito de erradicação ou controle de
doenças transmissíveis. Nesse sentido, recursos humanos são capacitados,
procedimentos e rotinas passam a ser normalizados, campanhas educativas
são veiculadas nos meios de comunicação, rede de frio é estruturada em todo
país para acondicionar adequadamente imunobiológicos e laboratórios são
equipados para o diagnóstico das doenças.
Pela Portaria GM/MS nº 55, de 29 de janeiro de 1980, extinguiu-se a
obrigatoriedade da vacinação contra a varíola e nesse mesmo ano foi lançado
o Plano de Ação Contra a Poliomielite, estabelecendo os dias nacionais de
vacinação. Após a adoção dessa estratégia, realizada nos dias 14 de junho de
agosto, verifica-se uma redução significativa dos casos de poliomielite em
todas as regiões brasileiras. Em 1986, somente na Região Nordeste, foi
estabelecido um terceiro dia de vacinação e nesse mesmo ano aprovou-se o
Plano de Ação para a Erradicação da Poliomielite no Brasil (Resolução Ciplan
nº 4, de 6/2/1986).
Em relação à capacitação técnica, estratégias para efetivar esse
propósito, que incluíam cursos de curta duração, foram desenvolvidas em larga
escala em todas as regiões. Nessa perspectiva, cabe destacar a realização, em
1985, do Curso Básico de Vigilância Epidemiológica (Cbve), do Curso Intensivo
de Vigilância Epidemiológica (Cive) e do Curso de Aperfeiçoamento para
Epidemiologistas. Posteriormente, os egressos dos dois primeiros foram
avaliados pela Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz).
A questão do controle e, posteriormente, da erradicação da poliomielite
passou a ser uma prioridade de Governo. Possivelmente em consequência dos
compromissos assumidos pelo Brasil nesse sentido, percebem-se, logo no
início da década de 1980, movimentos de estruturação de um “núcleo”,
localizado o mais próximo possível do poder central (Ministério da Saúde), com
a missão de planejar e comandar, de forma unificada, a implantação e o
desenvolvimento dos novos planos e programas. Em 1981, a coordenação dos
Programas Nacionais de Imunizações e de Vigilância Epidemiológica, desde
1974 sob gerência da Fsesp, ficará subordinada à Secretaria Nacional de
Ações Básicas de Saúde (Snabs), do Ministério da Saúde. Em 1983, ocorre a
criação do Comitê Interorgânico de Controle de Doenças Transmissíveis,
coordenado pela Snabs e integrado por representantes da Fsesp, da Fiocruz,
da Sucam, do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (Inan), entre outros.
Em 1985, finalmente, institui-se o Subsistema Nacional de Controle de
Doenças Transmissíveis.
O registro dos últimos casos de poliomielite no Brasil em 1989 e a
obtenção, em 1994, do Certificado Internacional de Erradicação da
Transmissão Autóctone do Poliovírus Selvagem validam as estratégias e
tecnologias utilizadas, na década de 1980, no combate à poliomielite; reforçam
a necessidade dos investimentos em prevenção primária e legitimam o poder
do Ministério da Saúde e das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde
como protagonistas da política de saúde no país, formulada na época de modo
dicotomizado entre ações curativas, sob responsabilidade do INAMPS, e
preventivas sob gestão do próprio Ministério da Saúde.
Embora se comprove a efetividade das ações implementadas nas
décadas de 1970 e 1980 para o controle das doenças imunopreveníveis, o
modelo de vigilância epidemiológica a elas subjacente, fundamentado na
erradicação da varíola, organizou os serviços que exerciam essa prática de
forma dissociada das transformações verificadas no panorama sanitário
consequentes aos processos de industrialização e urbanização. Além disso, a
marca organizacional era a centralização:
Segundo Sabroza,
5
TEIXEIRA, Carmem Fontes; PAIM, Jairnilson Silva; VILASBÔAS, Ana Luiza. SUS, modelos
assistenciais e vigilância da saúde. IESUS, VII(2), abr./jun., 1998. p.12
6
SABROZA, Paulo. Vigilância em saúde. Disponível em:
http://www.abrasco.org.br/GTs/Vigilancia%20em%20Saude_Sabrosa.pdf
e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (Art. 196)
7
ALMEIDA FILHO, Naomar de. Epidemiologia sem números: uma introdução crítica à
ciência epidemiológica. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1989.
8
HELLER, Agnes. Uma teoria da história. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1993.
p. 211
Os pressupostos do modelo causal subjacente ao conceito são amplos o
suficiente para, pelo menos, sinalizar que o modelo do risco, fundamentado
essencialmente na causa eficiente, deveria ser ultrapassado.
Em síntese, pode-se perceber que o próprio conceito reflete a
ambivalência dos desejos e das atitudes dos atores do movimento sanitário
brasileiro, das décadas de 1970 e 1980, na busca de soluções para refletir e
agir nas dimensões macro e micro da realidade. Ao destacar os determinantes
e condicionantes, o conceito focaliza a dimensão da política e se aproxima do
que se denominaria de promoção da saúde. Mas a finalidade do conhecimento
dessa esfera da causalidade seria “a adoção de medidas de prevenção e
controle das doenças ou agravos”. E, nesse sentido, eclode novamente a
concepção de vigilância epidemiológica, derivada da epidemiologia do risco
cujas características discursivas são: “uma pragmática do controle técnico; uma
sintaxe do comportamento coletivo e uma semântica da variação quantitativa”.9
O desejo de superação dessa vertente sempre caracterizou o próprio
desenvolvimento da epidemiologia no Brasil. Barreto (2002)10 assinala algumas
peculiaridades que o caracterizaram: o reconhecimento de que a epidemiologia
integra o movimento da saúde coletiva; o compromisso com a transformação
das condições de saúde da população; a forte vinculação com as concepções
de determinação social da doença; a visão crítica da teoria original da
transição epidemiológica e a concepção transdisciplinar na compreensão da
produção do processo saúde-doença.
O texto de Teixeira, Paim e Vilasbôas (1998) sobre modelos
assistenciais e vigilância da saúde contribui para compreensão da evolução
histórica das práticas de vigilância e seus respectivos marcos conceituais e por
isso oferece evidências que podem explicar o “hibridismo” expresso no
conceito de vigilância epidemiológica da Lei 8080. Na década de 1980, o
debate sobre os limites e as possibilidades de superação desse conceito no
âmbito da saúde pública se expressa em variações terminológicas como
“vigilância da saúde”, “vigilância à saúde” e “vigilância em saúde”. Em que
pese a oscilação da preposição ( e isso parece que as diferencia), percebe-se,
nesse sentido, a convergência de todas para a “saúde”, um sinal distintivo dos
novos rumos da história da vigilância. Essas discussões tinham como eixo
comum:
9
AYRES, José Ricardo de C. M. Sobre o risco: para compreender a epidemiologia. São
Paulo: Editora Hucitec, 1997. p. 110
10
BARRETO, Mauricio L. Papel da epidemiologia no desenvolvimento do Sistema Único de
Saúde no Brasil: histórico, fundamentos e perspectivas. Rev. bras. epidemiol. [online]. 2002,
v. 5, suppl. 1, pp. 4-17.
11
TEIXEIRA, Carmem Fontes; PAIM, Jairnilson Silva; VILASBÔAS, Ana Luiza. op. cit. p.12-3.
Aires, em 1983, as temáticas sobre planejamento e programação de sistemas
de serviços e sobre programas relativos ao controle de doenças ou dirigidos a
grupos populacionais específicos, incluindo ações de promoção da saúde,
foram abordadas separadamente. A aproximação entre esses temas ocorrerá
com mais nitidez na Conferência da Associação Latinoamericana e do Caribe
de Educação em Saúde Pública (Alaesp), realizada no México em 1987,
quando se recomendou a necessidade de utilizar dados de morbimortalidade
para análise sistemática da situação de saúde e consequentemente identificar
prioridades e avaliar resultados de ações e serviços de saúde. Além disso,
criticou-se a perspectiva do modelo de risco, destacando-se a construção de
modelos causais cuja complexidade exceda os limites da linearidade causa-
efeito e para isso se propôs evidenciar relações entre condições de vida e
trabalho com a situação de saúde. No final da década de 1980 e início dos
anos 90, a OPAS coordena discussões sobre cada um dos níveis de
prevenção, vinculados à medicina preventiva, e verifica que o componente
“promoção” é escasso e o de “prevenção” estava restrito aos programas
tradicionais de saúde pública. No Brasil, o debate sobre a questão da vigilância
ganha fôlego nos congressos de epidemiologia, realizados na década de 1990,
quando se esboçam diversas propostas conceituais.
Essas concepções de “vigilância da saúde” se diferenciam pela
amplitude de seus limites epistemológicos. Há casos em que se propõe uma
ampliação do objeto da vigilância epidemiológica, embora os limites não sejam
tão amplos, pois não preveem “a reorganização do conjunto das ações e
serviços de atenção à saúde, aí incluídas a intervenção sobre determinantes
sociais, de um lado, e a assistência médico-hospitalar, de outro”12. O objeto é
redefinido: de “doentes em populações” para “situações de saúde de grupos
populacionais definidos em função de suas condições de vida” e passa a incluir
12
TEIXEIRA, Carmem Fontes; PAIM, Jairnilson Silva; VILASBÔAS, Ana Luiza. op. cit. p. 15
13
Id. Ib. p. 17.
14
PAIM, Jairnilson Silva. A Reforma Sanitária e os modelos assistenciais. In: ROUQUAYROL,
M. Zélia. Epidemiologia & saúde. 4ª Ed. Rio de Janeiro: MEDSI, 1993. p. 455-66.
estratégico-situacional, da programação em saúde, da história natural da
doença (níveis de prevenção), da educação em saúde, do movimento
ecológico.
Essa proposta prevê um conjunto de intervenções nos problemas de
saúde que vão desde as políticas públicas transetoriais até as ações
programáticas e o desenvolvimento da oferta organizada em unidades de
saúde. Nessa perspectiva, a vigilância da saúde propõe
15
TEIXEIRA, Carmem Fontes; PAIM, Jairnilson Silva; VILASBÔAS, Ana Luiza. op. cit. p 17-8.
16
Abrasco. Comissão de Epidemiologia. Relatório do Seminário "Propostas para o Centro
Nacional de Epidemiologia - Cenepi". Rio de Janeiro, s/n. Disponível em:
http://www.abrasco.org.br/GTs/Cenepi.pdf
Entre 1990 e 1993, o Cenepi foi protagonista no âmbito nacional da
política de vigilância, prevenção e controle de doenças. Entre as ações mais
relevantes desse órgão, destacam-se:
17
Brasil. Ministério da Saúde. Vigilância em saúde no SUS: fortalecendo a capacidade de
resposta aos velhos e novos desafios. Brasília (DF): Ministério da Saúde, 2006. p.10.
18
BARRETO, Mauricio L. Papel da epidemiologia no desenvolvimento do Sistema Único de
Saúde no Brasil: histórico, fundamentos e perspectivas. Rev. bras. epidemiol. [online]. 2002,
v. 5, suppl. 1, pp. 4-17.
acúmulo de problemas e retardaram o desenvolvimento científico,
tecnológico e organizacional na vigilância, na prevenção e no controle
de doenças.19
19
Brasil. Ministério da Saúde. Vigilância em saúde no SUS: fortalecendo a capacidade de
resposta aos velhos e novos desafios. op, cit. p. 10-11.
captação de notificações, manejo e análise de dados e informações
estratégicas relevantes à pratica da vigilância em saúde, bem como congregar
mecanismos de comunicação avançados; f) implementação, de forma
hierarquizada, da Rede de Laboratórios, com equipamentos adequados,
suprimento oportuno de insumos e profissionais capacitados; g) fortalecimento
do PNI - Programa Nacional de Imunizações; h) desenvolvimento de
mecanismos ágeis e eficientes de informação e comunicação; i) ampliação da
cobertura e da qualidade dos sistemas de informação em saúde de base
nacional; j) fortalecimento da capacidade de análise da situação de saúde e da
avaliação do impacto de políticas e programas de saúde; k) melhoria nos
indicadores de morbimortalidade de algumas doenças transmissíveis e l)
desenvolvimento de ações de promoção da saúde para reduzir fatores de risco
das doenças e agravos não transmissíveis.
No biênio (2007-2008), quando o SUS completa 20 anos, a gestão da
SVS buscou, por um lado, consolidar as conquistas e os avanços
anteriormente alcançados e, por outro, desenvolveu estratégias e tecnologias
inovadoras com o propósito de controlar de modo mais efetivo “causas”,
“riscos” e “danos”, descritos de forma hierarquizada no modelo de vigilância da
saúde de Paim. Nesse sentido, a racionalidade do planejamento passou a ser
um dos fulcros da gestão e o “olhar transversal” contribuiu para consolidar a
integração da vigilância com a área assistencial e da saúde ambiental com a
saúde do trabalhador, fortalecer as estratégias intersetoriais no
desenvolvimento da política de promoção da saúde e estabelecer pactos e
parcerias com setores acadêmicos, movimentos sociais, gestores e
trabalhadores de saúde e cidadãos. Nesse período, desenvolveu-se um
conjunto de ações decisivas para eliminação de mais uma doença
transmissível no território nacional: a rubéola e requalificou-se de forma
substancial o Programa Nacional de Controle da Hanseníase, incluindo
reformulação dos objetivos e meios de trabalho. Cabe também destacar a
quebra de patentes de medicamentos essenciais ao tratamento da aids, os
maiores investimentos no controle da dengue e de outras doenças
transmissíveis, a expansão da Rede CIEVS para todo território nacional e a
criação da carreira de pesquisador no Instituto Evandro Chagas.
Tomando-se simbolicamente a quantidade de anos de existência do
SUS, elencaram-se 20 destaques, vinculados à vigilância em saúde, do
período 2007-2008, para serem apresentados de forma mais detalhada nesta
primeira parte do Relatório de Gestão. Essas ações mais avultantes foram
selecionadas, fundamentalmente, por sua vinculação com as prioridades
estabelecidas pelo Ministério da Saúde, pela Secretaria de Vigilância em
Saúde, pelo Pacto pela Vida para 2008 (Portaria no 325, de 21 de fevereiro de
2008) e pelo Programa Mais Saúde: direito de todos (2008-2011).