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Público • Sexta-feira 6 Maio 2011 • 43

O memorando impõe a revolução que a cobardia política dos nossos líderes políticos nunca faria

Que vergonha. E que grande alívio

F Q
ui reler o programa eleitoral do PS à luz dos lugares para políticos, a despesa descontrolada uer isto dizer que tudo são rosas no
do “memorando de entendimento” de e a ausência de responsabilização. memorando da troika? Claro que não.
Portugal com a União Europeia, o Fundo Só fazendo diminuir o “Estado gordo”, para utili- Portugal tem mesmo de passar por
Monetário Internacional e o Banco Central zar a expressão de Eduardo Catroga, é possível liber- uma cura de austeridade. A experiên-
Europeu. É um exercício penoso, pois o PS tar para a economia os recursos de que esta neces- cia obtida pelo FMI e pela UE na Grécia
(e veremos domingo o que propõe o PSD) mantém- sita. Mas mesmo isso não seria suficiente, só por si, e a especificidade da situação portu-
se fiel ao velho princípio de que os eleitores só votam para retomar o crescimento. Também é necessário guesa permitiram adoptar um plano em que essa
José em quem lhes apresenta a realidade em tons cor-de- diminuir a rigidez do mercado laboral e cortar nos austeridade não penalizará em excesso os contri-
Manuel rosa. Nada que surpreenda: é assim em Portugal des- muitos regimes especiais. É nesse sentido que vão buintes. Basta referir que o aumento previsto da
Fernandes de que temos democracia. Pior: parece ser assim em as alterações previstas na lei laboral (mesmo sem carga fiscal (2,3 mil milhões de euros) é análogo
muito lado, pois, como esta semana confessou Jean- revisão constitucional, o despedimento individual ao do PEC IV para resultados muito mais vastos
Extremo Claude Juncker, presidente do Eurogrupo, “quando tornar-se-á mais simples), as mudanças no regime e ambiciosos.
ocidental as coisas começam a ficar sérias, temos de mentir”. do subsídio de desemprego, a introdução do famoso Contudo, a calibração das medidas de forma a
Ora o memorando de entendimento não mente nem banco de horas, a prioridade aos contratos de em- não castigarem demasiado as famílias só foi possí-
está embrulhado em palavras delicodoces, antes presa e o fim dos benefícios excessi- vel porque foi dado a Portugal mais um ano para
estipula, exige, estabelece metas, fixa prazos. O me- O PEC IV era, na melhor vos por horas extraordinárias. Sem cortar o défice público até três por cento do PIB.
morando é mesmo o programa das reformas que há mudanças como estas nunca a eco- Curiosamente esta medida tinha sido uma proposta
muito se sabe serem necessárias mas das quais se das hipóteses, uma nomia recuperaria a competitivida- de Pedro Passos Coelho aqui há uns meses, uma
tem fugido como o diabo da cruz. de perdida; com estas mudanças os ideia de imediato “arrasada” como sendo irrespon-
Há um ano, quando se tornou claro que os mer-
aspirina para adiar portugueses empreendedores vol- sável, imatura e aventureirista. Nenhum desses
cados não perdoariam aos países que tivessem per- a dor. O memorando tam a ter uma oportunidade. Mais: epítetos foi agora aplicado à troika, mas não deixa
dido o controlo dos seus défices e das suas dívidas, a diminuição da taxa social única de ser significativo como se inventaram medidas
Portugal poderia ter optado por seguir o caminho é um antibiótico que é uma medida, a melhor medida, duras que esta nunca sequer chegou a considerar
agora delineado no memorando. Primeiro, porque ataca a infecção. Por isso para, diminuindo a carga contri- (espero que um dia se faça a história da campanha
o essencial das suas medidas reformistas há muito butiva sobre o emprego, facilitar de intoxicação dos jornais a que se assistiu nas
que eram defendidas pelos especialistas. Depois, Fernando Ulrich tem razão a contratação e ajudar a conter o últimos semanas e a que anteontem se referia o
porque, dividindo a austeridade por quatro anos,
em vez de a dividir por três, como agora sucede-
quando agradece aos que desemprego.A atenção dada pela troika a áreas
editorial do Jornal de Negócios).
Seja lá como for, Portugal tem uma nova oportu-
rá, tudo seria mais fácil e menos penoso, como fizeram cair o Governo como a Justiça ou a Educação tam- nidade. É possível que os 78 mil milhões de euros
ontem a troika reconheceu. Preferiu-se antes a bém se distingue por não incidir de ajuda sejam insuficientes, como já referiram
ilusão (versão benigna), optou-se depois pela im- apenas no corte na despesa: houve a preocupação alguns economistas, caso de Silva Lopes e Jacinto
provisação e guindou-se por fim o ilusionismo do de incluir medidas estruturais, como as relativas aos Nunes. É natural que muito tenhamos ainda de
“great performer” em suprema qualidade política. processos tributários ou à concessão de autonomia discutir e de afinar para levar à prática este plano.
São águas passadas – mas não esquecidas – de um à gestão escolar já em 2012, acompanhada por um Mas, como disse recentemente o mais sensato dos
desgraçado capítulo político a que se espera que financiamento realizado com base no desempenho. membros do Governo, Luís Amado, Portugal tem
os portugueses saibam pôr fim a 5 de Junho. As Da mesma forma se saúdam as medidas destinadas a de compreender que, ao aderir ao euro, aderiu a
águas futuras correrão, para nossa vergonha mas penalizar a aquisição de casa própria e todas as des- uma zona monetária com regras muito exigentes.
também alívio, por entre as estreitas balizas do tinadas a abrir o mercado do arrendamento. Vamos Nela não há espaço para cigarras, todos têm de ser
memorando. Felizmente. ver se é desta que, ao fim de décadas de discussão e formigas. Por isso, ou aproveitamos esta oportuni-
Felizmente?, perguntar-se-á. Sim. E felizmente de danos irreparáveis para as nossas cidades e a nossa dade, ou regressaremos ao espectro da bancarrota.
por este nos impor a revolução que a cobardia po- economia, se liberalizam de vez as rendas. Roubini dixit. Jornalista
lítica dos nossos líderes e o endémico arrastar dos
pés da nação impedia. Vêm de fora dar-nos ordem
porque não entrámos sozinhos na ordem.
Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar

O
que temos pela frente não é, ao contrário
do que disse ontem Teixeira dos Santos, a A média do crescimento
um “PEC IV desenvolvido”. É muito mais económico é, em Portugal, a pior 1. Crescimento do PIB potencial (em %) 3. Dívida externa bruta em % do PIB
do que isso porque, ao contrário do PEC dos últimos 90 anos. A dívida 250
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IV, não se limita a cortar a eito e de for- pública é a maior dos últimos
6 200
ma cega, antes trata de encontrar remédios para a 160 anos. A dívida externa é, no
4 150
nossa principal doença, isto é, para o que realmente mínimo, a maior dos últimos 120
2 100
nos distingue da Grécia e da Irlanda, como ainda anos (desde que o país declarou
0 50
recordou Nouriel Roubini: a nossa incapacidade uma bancarrota parcial em 1892). O 1999 2010
1900 2008
de crescer. O PEC IV era, na melhor das hipóteses, desemprego é o maior dos últimos
uma aspirina para adiar a dor. O memorando é um 80 anos. Voltámos à divergência
2. Dívida pública portuguesa em % do PIB 4. Taxa de desemprego em Portugal (em %)
antibiótico que ataca a infecção. económica com a Europa, após
Fá-lo de muitas e diferentes formas. Primeiro que décadas de convergência. Vivemos 100 12

tudo emagrecendo o Estado e, sobretudo, tornando-o a segunda maior vaga de emigração 80


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60
menos presente e menos tentacular. O programa de dos últimos 160 anos. E temos a
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privatizações é ambicioso e a ele não escapa sequer o taxa de poupança mais baixa dos
20
Grupo Caixa Geral de Depósitos, que terá de alienar últimos 50 anos. 0
0
a área de seguros. A EDP, a Galp, a PT, a TAP, a ANA, Pois é. As verdades são duras como 1850 2010 1932 2010
os CTT e uma parte da CP não deixarão apenas de ser pedras. E antes de passarmos a um
Fonte: Álvaro Santos Pereira, Portugal na Hora da Verdade
do Estado, em parte ou no todo: o Estado também novo capítulo nas nossas vidas,
perderá todas as golden shares e, ao mesmo tempo, as por mais piedosas que sejam as no Canadá, português optimista quase 600 páginas é esmagadora.
coutadas ocupadas por políticos de pousio. Diminui recomendações para não procurar quanto baste – como demonstram Pode-se não concordar com todas
também, de forma drástica, a infinidade de subsí- culpados, a verdade é que há as suas obras anteriores, O Medo as soluções que Álvaro Santos
dios utilizados pelos Governos para tentar “dirigir” responsáveis por termos chegado do Insucesso Nacional e Os Mitos da Pereira propõe para “vencer a
a economia, são suspensas as PPP e ainda se obriga até aqui e políticas erradas que não Economia Portuguesa – arriscou- crise nacional” – mas se este livro
o Estado (Administração Central e autarquias) a ficar devem – não podem – ser repetidas. se a traçar um panorama global tem, neste exacto momento, uma
longe das obras públicas “de regime”. Não é apenas É por isso que é muito útil ler da nossa situação actual. As frases virtude, é que ninguém poderá
uma dieta, é uma mudança de paradigma, é a des- o mais recente livro de Álvaro com que iniciámos este texto são dizer que não sabia. Não teremos
pedida do modelo dirigista e intervencionista que, Santos Pereira, Portugal na Hora dele. Os gráficos que o ilustram todos a mesma culpa, mas somos
nas últimas décadas, permitiu a multiplicação das da Verdade. Economista “exilado” foram por ele construídos. A todos eleitores e há realidades que
empresas públicas e das “fundações”, a proliferação na Universidade de Vancouver, evidência que reuniu ao longo de não podemos ignorar.

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