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.Ω.
SILVA, André L S. Manuscriptum. Rio de Janeiro, 2009.
Primeira edição
Terceira versão
Quarta impressão
Inverno’09
“Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há
lugar para mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um
desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de
me ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever, eu
me morreria simbolicamente todos os dias. Mas preparado
estou para sair discretamente pela saída da porta dos fundos.
Experimentei quase tudo, inclusive a paixão e o seu
desespero. E agora só quereria ter o que eu tivesse sido e não
fui.”
Clarice Lispector
A hora da estrela
Agradecimentos
Especial
Póstumo
Dioniso (?)
Plus
Advertência!
Prossiga.
A três Amores
.Ω.
kyogen sem farsa, sem lenda nem conto, de uma linda
estrela cujo destino é iluminar-me a existência
louvo pela alegria de irmanar-te, mana querida,
ledo pela graça a mim concedida
y pelo grão-dia do teu nascimento, tua vinda
para perto de minha vida
.Ω.
vim de uma semente graciosa
a qual foi plantada em valorosa terra
local que me acolheu, aqueceu e
é onde encontro tudo de que preciso para
robustecer e continuar vivendo, e quem sabe um dia
inda conseguir retribuir o imenso amor
a mim dispensado, cuja representação ainda
não consegui através das palavras
...Cai
Olhei da janela
está o céu escuro, nublado
e lá vem a chuva
.Ω.
Outonando só
retalhando folhas vá
caindo, caindo
a
i
n
d
o
Metatexti
Script
.Ω.
Aranha
.Ω.
Estupor
.Ω.
S.TTL
momento de inspiração
cuja raridade aparente
vezes me deixa descrente
faço-me fanfarrão
.Ω.
exilé
minha terra
tem paineiras
onde miam carcarás
não sei onde ela fica
se é aqui ou se lá
sei que ela é uma Polis
chamo-a Cudomundópolis
de que gosto
.Ω.
Rascunho
casa, conforto
família, apoio
teto, cobertor
mas, sou ser humano
estou humano
.Ω.
assumo
sou consumista
consumidor
desse consumismo
consumador
que tudo consome
inclusive minha dor
.Ω.
Critiquè
a garotada só se interessa
pela imagem "atraente"
estampada em magazines
e não procura saber os reais
motivos de tudo isso
do jogo de interesses latente
na virilha
.Ω.
ant'agonia
foda-se o natal
idem o ano novo
ibidem o carnaval
comemorar
é
mirar-se
no espelho
todos os dias
e
não
atirar
na
própria
cabeça
sufoco
dor
decepções
desilusões
desespero
até que surge o pequenino
com um sorriso maroto
e a vida é resetada
.Ω.
Aguelomalia
O destino, derradeiro,
Me consome por inteiro
No cume do alcantil
Meu coração explodiu
.Ω.
bizarro
.Ω.
caminhada
- Religare -
:
:
:
:
:
:
:
:politeísmo
budismo lirismo
altruísmo essencialismo
cristianismo teocentrismo
candomblecismo bucetismo
catolicismo niilismo
messianismo todos são trovadorismo
pirucionismo tudo revolucionismo
ocultismo e me dizem diabolismo
racionalismo nada evolucionismo
protestantismo Evoé! discovoadorismo
umbandismo televisismo
concorrencismo desaforismo
puticismo elenismo
criacionismo suicidismo
monoteísmo
Afraid
.Ω.
deorum
igualmente de
um rito
desconhecedor dessas
falâncias
de fato possua
um rito
mas eu queria fazer
uma liturgia
experimentar o momento
do êxtase
.Ω.
Fe
humanizado, pisoteado
jogado, aqui, lá
após, além
ainda me cobram a prática do bem!
.Ω.
aller en enfer
l’enfer est pavé de bonnes intentions
batalho comigo
venço-o
torno-me amigo
disfarço contigo
beijo-o
torno-me inimigo
enquanto ages
com atos nocivos
todos os dias
obliteram-se motivos
aproveito-me disso
viro, reviro, transviro
faço-me omisso
deleito-me no virtual papiro
aparentemente irreal
continuo-a
ode transformacional
.Ω.
Trinité
rapidamente derreto
minhas entranhas saem
a pele se torna carmesim
meus músculos contraem
perdi a direção do reto
.Ω.
Paradigma
.Ω.
Pasto
.Ω.
demasia
amar demasiadamente
apesar de,
na realidade,
descrente
Plat.
amor... paixão...
.Ω.
Saudade
.Ω.
Delírio
.Ω.
Clamor
.Ω.
Solidão
.Ω.
Minha Família
.Ω.
Andréa Terra
.Ω.
Camila Gomes
estudiosa e sonhadora
chamei-a por muitos "nomes"
da natureza e dos animais defensora
fez-me também sonhar
quando intimei-a a ler uns rascunhos
e ela me escreveu como resposta (a lápis):
carãnnnnlho
.Ω.
Danielle Gonçalves (em memória)
.Ω.
Dayse Castro
.Ω.
Diego Fróes
.Ω.
Evandro Carlos
.Ω.
Geise Correa
.Ω.
Gisele Fernandes
.Ω.
Juliana Vasquez
.Ω.
José Galdino
grande mano
de igual coração
sorriso fácil
e cara de pastelão
de habilidosa destreza
em dedilhar o diminuto
violão
.Ω.
Márcia Santos
.Ω.
Marta Batista
a simpatia em pessoa
de ar distraído
e fácil sorriso
que me fez gargalhar
ao vê-la copiar do quadro
um meu poema
com tamanha empolgação
que pensara tratar-se de palavras
de bom autor
.Ω.
Renata Baptista
.Ω.
Sérgio Henrique
transmite tranquilidade
mãe coruja de duas lindas princesas
além de grande incentivadora
a estudante de Latim
de cabelo carmesim
descobri que é cantora
.Ω.
Suellen Estevam
.Ω.
Tiago Estrella
amigo
inexplicável
amigo
inexprimível
amigo
inolvidável
amigo
inestimável
amigo, amigo, amigo
Zandréa Lauria
A feijomante
Senhora respeitável, diziam. O adjetivo fora conquistado
em razão de uma vida humilde, numa casa modesta, e sem
família. Embora só, tinha excelente reputação. Nunca se metera
em negócios alheios nem provocara discórdia na vida de outrem.
Havia sempre um sorriso no rosto, cuja função principal era
encobrir os efeitos das adversidades. Desde moça jovem,
trabalhou e construiu aos poucos o que hoje possui.
D. Feitora, como era conhecida, pelo sobrenome,
habitava uma casa simples, de cinco pequenos cômodos. “É o
suficiente!”, nas palavras dela. Nem pouco, posto que acolhia
tudo aquilo de que ela precisava, nem muito, uma vez que não
sobrava espaço inútil. A casa da rua Canhota, nº 27, tornou-se
conhecida e bastante procurada. Os visitantes chegavam ao
estreito portão de ferro e pressionavam o interfone, ansiosos,
sem reparar no aviso que ficava logo acima de um quinto da
metade do mesmo. O informe constava de uma advertência:
ocupado. Quando o placar estava assim assinalado, o visitante
tinha a opção de aguardar ou voltar depois. E a frente da casa,
desse modo, nunca ficava vazia.
A senhora da qual falamos neste instante não aparentava
a idade que tinha. No último aniversário, comemorou 63 anos.
Sim, estimado(a) leitor(a), havia marcas, não só em seu rosto,
mas também no corpo, da chegada da velhice. Entretanto, podes
crer ou não, a impressão, assim como esta pequena observação,
são minhas, o vai-e-vem do sorriso parecia funcionar como
alongamento facial. E, nesta ginástica, seu semblante foi
favorecido, do mesmo modo que a pele, cuja palidez parece ter
sido conseguida pelo uso constante de protetor solar. Era
franzina; parecia uma fina escultura de vidro. Difícil até para
abraçar.
Mas seus dotes físicos se escondiam em suas atitudes:
gostava de cuidar de si e dos outros. Dos outros quando era
solicitada. E foi dessa maneira que descobriu um singular dom:
podia se comunicar com feijões em busca de soluções para
diversas situações. A quem não agradou a leitura desta última
frase, peço perdão. Prossigamos. Lídia Feitora convidara uma
amiga para almoçar em sua casa.
Marlene estava em grande aflição: engravidara não sabia
de quem, aos dezoito anos recentemente completados, no início
da carreira profissional, registrada há apenas um mês e meio.
Tinha uma família humilde e conservadora. Esta última qualidade
era o motivo da lamentação, pois chegava ao extremo. Os pais só
liberaram o namoro aos dezessete anos, mas ela descobrira as
delícias dos encontros aos doze. Ou seja, a gravidez foi uma
pequena catástrofe. Pequena para o pai da criança. Catástrofe
para ela. Sempre prendada e muito ocupada com os estudos, sua
reputação era irrepreensível para a família. Até aquele
momento.
Marlene Costa Brava era a amiga convidada de Lídia para
o almoço. A grávida encontrou em Feitora um porto seguro, uma
pessoa confiável, visto que foi das poucas que não alardeou sua
situação; nem a recriminou por isso. Enquanto almoçavam,
Marlene pediu uma solução para a nova amiga. A resposta
recebida não foi exatamente a que ela precisava ouvir, porém
não chegou a ser uma esquivança. E aqui chegamos ao início da
história de dona Lídia Feitora Silva. Esta ouviu, curiosa, o pedido
da outra; foi este, exatamente: “Você podia tirar minha sorte,
sei lá, lendo alguma coisa, esses feijões que estão no prato”. Elas
se entreolharam. A seriedade das pupilas logo foi substituída por
gargalhadas sinceras. Marlene agradeceu pelo almoço, e pela
conversa, e pela amizade também. Despediu-se e seguiu seu
rumo, enquanto a anfitriã pôs-se a arrumar a casa. A frase de sua
convidada ficou latejando em sua cabeça, mas ela não deu
importância. Engoliu um comprimido de paracetamol e deitou.
Em vão. Seus sonhos foram invadidos por feijões, panelas, água,
temperos e todo aparato utilizado para preparar uma boa
feijoada. Levantou-se da cama às 03h54m18s. A madrugada de
janeiro estava bastante agradável. Passeou de um lado para o
outro e foi parar na cozinha, com a intenção de adiantar algum
serviço posterior, embora estivesse sonolenta. Sentou-se; e
quando abriu um pouco mais os olhos reparou que à sua frente
estavam uma panela e um pacote de feijão. Estranhou um pouco
a situação, deu um muxoxo e pensou em se divertir um pouco: já
que estava com a faca e o queijo na mão, consultaria a sorte
reservada a Marlene. Isso mesmo, ela se lembrou da amiga.
Pegou cinco feijões. Mas não quaisquer cinco. Catou os melhores,
os mais vistosos, os sem máculas. Os perfeitos para o sacrifício.
Tomou para si uma panela rasa, cujo fundo estava amassado por
causa das batidas para socar alho. Desculpe-me por isso também!
Colocou os grãos entre ambas as mãos cerradas, na posição de
prece. Encostou a ponta dos dedos na testa, balbuciou algumas
palavras, as quais não escutei porque foram quase um
pensamento, abriu os olhos para mirar a panela e atirou as
leguminosas. Caiu cada uma para um lado. Ela olhou, meditou,
fez que interpretava algo, soltou, com a boca fechada, um hum e
depois um ham. O sono a venceu.
Como era de seu hábito, a jovem Lídia acordou cedo,
arrumou-se com calma e foi trabalhar. Durante todo o dia não
tivera notícia da amiga grávida, o que a deixou um tanto
apreensiva, principalmente por causa de um desabafo de Marlene
durante o encontro anterior, que apenas agora, devido a esta
situação, lembrei-me; e, novamente, reproduzo suas palavras:
“Ai, amiga, 'tô pensando em dar cabo dessa criança. Mas já me
sinto tão arrependida”, ressaltando vivamente o “tão”. O
pensamento foi repelido por várias palavras de conforto e
esperança. Voltemos ao dia de trabalho. O final do expediente
foi marcado pelo encontro das duas. A gestante explicou à amiga
que se sentiu mal e foi levada a uma consulta médica, que
demorou muito por causa de vários fatores ao longo do caminho.
Ao terminar seu relato, Marlene escutou da amiga umas palavras
firmes e convictas, dizendo para ela não fazer absurdo algum,
pois os pais, embora com certa dificuldade, a acolheriam e
forneceriam toda assistência necessária a ela e à criança. A
futura mamãe ouviu tudo com os olhos atentos, a boca
entreaberta e os ouvidos totalmente voltados para aquela
profecia. Digo profecia porque foi exatamente isto que ela
pensou quando Lídia terminou de falar.
E eis que tudo se cumpriu.
Os anos se passaram, e o que começou por brincadeira,
sarcasmo, ou o que for, se tornou sério. Rendeu frutos. Tanto
para os clientes quanto para D. Feitora, cuja índole não a
permitia ostentar os dons materiais.
Suspeito de que estejas curioso(a), prezado(a) leitor(a),
para saber um pouco mais sobre as consultas da feijomante. E
concedo uma parte do que sei.
D. Maria era esposa valorosa. Virtudes e defeitos a
compunham, como a qualquer ser humano. Às vezes os defeitos
excediam a todo entendimento, principalmente depois de
casada, status adquirido após sete anos de namoro. O marido
estava, oito anos após ter contraído o matrimônio, enfadado com
as balburdias, que se tornaram cotidianas. Chegou a conversar
duas vezes sobre separação, divórcio, ou qualquer coisa que o
valha. A esposa percebeu, depois de insinuação sobre um possível
diálogo abordando o mesmo tema anteriormente citado, que nem
os filhos, um casal de adolescentes, seriam motivo suficiente
para manter o torniquete, responsável pela manutenção do
casamento, ativo. A solução foi uma consulta com a famosa
feijomante.
— Feijomante!?
— Sim. Muito boa, preço accessível. Vamos lá. E cedo,
porque tem fila.
Filas, filas.
D. Maria chegou exclamativa ao lado da pessoa que a
conduziu até lá. Sentou-se e começou a contar a história de sua
vida, acentuando o namoro e o casamento. “Ah! vida de casada”,
suspirou. D. Feitora ouviu tudo atentamente. Finalizada a prosa
da cliente, a leitora de feijões deu movimento ao seu trabalho.
Tomou os cinco maravilhosos grãos negros, encerrou-os entre as
mãos, encostou a ponta dos dedos na testa, sussurrou para seus
próprios ouvidos e dispensou os feijões graciosamente, como num
movimento do Lago dos Cisnes. Esperou que o alimento descosido
tomasse posição. Fitou-os longamente, com o olhar pulando de
um para o outro.
— Hã... latitude 0º, com longitude em 35º, posição
vertical a 136mm e horizontal a 135mm. Noroeste 25”, com o
centro em 18” e leve caimento para a esquerda.
E assim discursou, eloquente e eficaz, a posição de cada
um dos cinco grãos. A habilidade com os números se desenvolveu
com o trabalho de operadora de caixa da juventude. E
conservou-se graças à ideia de informar aos clientes a posição do
seu material de trabalho como uma espécie de introdução ao
resultado investigativo.
D. Lídia não costumava entregar o resultado da leitura
oralmente aos seus clientes. Seguindo a primeira parte, pela qual
ela dizia a posição dos feijões, retirava-se da mesa, deixando o
cliente engolindo a seco, pasmado com a precisão matemática da
consultoria. Nenhum deles questionava esta atitude.
Aguardavam, aflitos, o parecer. E ele vinha em forma de carta, a
qual parecia psicografada, pelas maneiras de a feijomante
escrever: uma mesinha separada no canto da sala, mão esquerda
na testa e a direita marcando o papel.
O resultado da consulta de D. Maria? Ei-lo abaixo
reproduzido.
O MENINO MILAGREIRO
Quand'alguém precisava
Largava tudo e ajudava
Sendo ainda pueril
Não sabia discernir
O verdadeiro espetacro
Do real simulacro
Com intenção sempre boa
Acudia gente à-toa
aluno da Faculdade de
Letras, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro,
matriculado no curso de
Português / Latim (migra-do
da almejada área técnica de
processamen-to de dados e
outros cursi-tos de
informática);