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DVD Grátis
Sábado, 5 de Março de 2011, Ano XXII, nº 7637, 1,60€
Directora: Bárbara Reis
Nova colecção de Animação
Directores adjuntos: Nuno Pacheco, Manuel Carvalho e Miguel Gaspar Pantera Cor-de-Rosa 7.º DVD
Directora executiva Online: Simone Duarte. Directora de Arte: Sónia Matos
www.publico.pt
Fora da caixa
Revolta na Líbia
A batalha
sangrenta por
Ras Lanuf
a Os rebeldes obrigaram as tropas de
Khadafi a recuar e travam uma bata-
lha sangrenta pelo controlo da cidade
de Ras Lanuf. c Paulo Moura, en-
viado especial, Mundo, 30 a 35
António Câmara conversa
com os leitores hoje, às 11h,
em www.publico.pt
Cinco famílias
vão mostrar aos
leitores como se
vive em tempo
A alma gémea existe? 60% dos de crise Págs. 24
a 28 e online
portugueses acreditam que sim PUBLICIDADE
62 65 72 39 % % % % VERBIER
Seja responsável. Beba com moderação
Estão contra a adopção de Acham que o casamento é Acreditam que a Internet Dizem que temos filhos mais
crianças por casais gays equivalente à união de facto facilita a infidelidade tarde por razões económicas www.carlsberg.pt
2 • Público • Sábado 5 Março 2011
Destaque
Sondagem A família, mais do que a carreira, é central na vida dos portugueses
à união de facto
com o que era há 30 anos?
Não Sim
13,9% 86,1%
e esforçamo-nos
menos por mantê-lo Quais são as principais
diferenças?
16,8%
Falta de educação 7,5%
“Um grande amor na vida”? Seis em cada dez dizem Maneira de viver 7,3%
que existe. E a maioria dos que acreditam na alma Menos convivência familiar 7,3%
55 ou mais anos
211 34,7 34,5
67,6% 21,4% 52,4% 47,6%
112 7,9%
(527) (478)
32,5%
290 33,8 34,9
60,7%
Ns/nr 55 ou mais
8,1%
35-54 anos
170 Não Sim 35-54 anos Sim Não Filhos por estado civil
32,3%
322 602
32,0% 59,9% Com filhos Sem filhos
312 55 ou mais
16-34 anos União de facto
52,4% 47,6%
57,6%
16-34 anos
Divorciados/as
26 130 85,7% 14,3%
84 55 ou mais anos
13,1% 61,6% Separados/as
80% 20,0%
26,9% 35-54 anos
Viúvos/as
199
Ns/nr
4,0 88,9% 11,1%
57,7% 27
14,1% Há quantos anos está casado/a
Não Sim ou vive em união de facto?
16-34 anos 19,9% 76,1%
vida mais solitária do que antigamente 73,1%
72,7% 41 e mais Até 10
69,2%
67 20,8% 17,5%
31,8%
31 a 40 11 a 20
16-34
21,6% 18,9%
35-54
55 ou mais 21 a 30
21,1%
18,9%17,8% 17,1% 55 ou mais anos 35-54 anos
Destaque
Sondagem Forma como se partilham tarefas em casa é satisfatória
c ou a viver em união de facto (29,8 de facto. E tem relações duradouras – que se calhar não fazem à noite, quan-
por cento dizem que têm a certeza,
12,8 por cento acham, simplesmente,
quatro em cada dez estão casados há,
pelo menos, 31 anos.
Crianças do chegam a casa, com a família. E
acabam por criar relações de maior
que, “em princípio”, não vai aconte- A satisfação com a forma como lá Seis em cada dez estão contra adopções intimidade do que aquelas que têm
cer). As principais razões apontadas
são, por ordem decrescente, “estar
em casa se partilham as tarefas é a re-
gra – sendo certo que os homens estão por casais de pessoas do mesmo sexo com o marido ou com a mulher.”
Chegam a ser amorosas, estas cum-
feliz” sozinho (23 por cento), o re- mais satisfeitos do que as mulheres (92 plicidades nas empresas? “Há a noção
ceio de voltar a viver com outra pes- por cento contra 78,6 por cento), o No ano passado, Portugal De resto, sobre nenhum outro de que, se houver sexo, essa relação
soa (18,2 por cento), a idade e o facto que não surpreende ninguém. transformou-se no oitavo país do tema da sondagem se verificam estoira, a amizade acaba, por isso pro-
de se ser “muito independente” (13,6 Apesar de terem filhos (na gene- mundo a aprovar o casamento respostas tão contrastantes entre tege-se a relação – e protege-se a culpa.
por cento). ralidade dos casos), as pessoas têm civil entre pessoas do mesmo os mais jovens e os mais velhos. Fica esta espécie de amor platónico,
Quem já vive em união de facto consciência de que o adiamento da sexo. Como vêem os portugueses “E o que estes dados mostram nem sei como chamar-lhe.”
também não pensa regressar a um maternidade e da paternidade é uma estes casais? À primeira vista, é uma tendência grande de
casamento formal (oito em cada dez realidade que marca o país. E as ra- acham que eles são muito mudança nas gerações mais
têm essa convicção). Porque não traz zões económicas aparecem à cabeça parecidos com os heterossexuais. novas”, diz a socióloga Sofia A infidelidade aumentou?
nada de positivo (afirma metade dos das que justificam este adiamento (39 Mas não devem poder adoptar Aboim. Outra tendência sobressai Para 80 por cento, é igual
inquiridos), porque implica “muita por cento). É no Sul que esta percep- crianças, defendem. das respostas: a elevadíssima
burocracia” (17 por cento). ção é mais forte e entre os jovens dos Números: 33 por cento dos percentagem de pessoas que O último inquérito sobre sexualida-
16 aos 34 anos. inquiridos dizem que as relações não respondem. “É aquela coisa de, publicado este ano pela Bizâncio
Seguem-se as questões relacionadas destes casais são tão duradouras portuguesa do ‘tenho uma opinião (Sexualidades em Portugal), mostrava
Jovens devem fazer sexo com a carreira profissional (15,5 por quanto as dos casais de pessoas menos favorável, mas vou dizer que 17 por cento das pessoas que vi-
antes do casamento cento), o desemprego (12,2 por cento), de sexos diferentes. Entre 37 por que não sei’. Porque sabemos que viam em casal havia pelo menos cin-
a instabilidade no trabalho (11,4). Há cento e 45 por cento, acham que a aceitação do casamento entre co anos confessavam que já tinham
“O grande amor é a grande fantasia”, ainda o facto de hoje os jovens estu- partilham as tarefas da mesma pessoas do mesmo sexo não é sido infiéis. Sofia Aboim, uma das au-
diz Francisco Allen Gomes, psiquiatra darem até mais tarde (8,6). Analisadas forma. E que não há diferenças assim tão positiva.” toras, dúvida do número. “As pessoas
de Coimbra, conhecido especialista todas as respostas (esta era uma per- ao nível da seriedade com que Quando se fala na adopção, não são honestas em relação a estas
na área da sexualidade e na prática gunta aberta), uma conclusão resul- encaram o casamento. Ou da quebra-se a ideia dos direitos perguntas, a percentagem será mais
clínica da sexologia. Mas, quando aca- ta clara: as questões materiais, a falta fidelidade com que se dedicam iguais. A maioria (62 por cento) elevada.”
ba, as pessoas hesitam “em meter-se de dinheiro, a crise, são os grandes à relação. Mais: quando se diz que estes casais não devem A sondagem da Intercampus para
noutra”, diz. protagonistas na lista de culpados, na pergunta que direitos devem ter, poder adoptar crianças (o peso o PÚBLICO continha algumas ques-
A razão que está por detrás desse opinião dos portugueses, para que os a maioria (59 por cento) defende é ligeiramente superior entre os tões sobre o tema. Hoje em dia, há
comportamento espelha, na opinião bebés surjam cada vez mais tarde na que devem ter os mesmos que os que se consideram religiosos) e mais infidelidade do que havia an-
do psiquiatra, uma outra grande trans- vida dos casais. outros – ainda que um quarto da apenas 28,3 por cento defendem tigamente? Ou é a mesma coisa, só
formação na sociedade portuguesa: Em média, as mulheres têm hoje população entenda que deviam o contrário. Não é possível que sabe-se mais? As respostas fazem
“As pessoas podem satisfazer as suas o primeiro filho aos 28,6 anos – mais ter menos. Apesar de tudo, a comparar estudos, mas há este sorrir os especialistas. Porque, no es-
necessidades sexuais e afectivas sem quase quatro anos do que em 1991, ideia de que há discriminação é indicador: o Eurobarómetro de sencial, os portugueses respondem
viverem como casal, isso passou a ser segundo o INE. E a percepção mais consensual: 82,4 por cento das 2006 indicava que apenas 19 por afirmativamente a ambas – ainda que
público e aceite. Os filhos falam das frequente é a de que este adiamento pessoas acham que os casais cento dos portugueses admitiam ganhe a segunda, com 80 por cento
namoradas dos pais, vão todos juntos pode prejudicar um bom relaciona- de pessoas do mesmo sexo são a adopção por casais gay. O de “votos”. Se lhes perguntassem se
passar fins-de-semana e isso não sig- mento entre pais e filhos; 42,8 por menos aceites pela sociedade. sociólogo Pedro Vasconcelos eles eram infiéis, diriam que não, diz
nifica que aquela relação vá durar. A cento dizem que é “prejudicial”, ou Os homens, tendencialmente, admite que possa estar a assistir- Pedro Vasconcelos. É um clássico:
sexualidade deixou de ser uma moti- “muito prejudicial”. discriminam mais do que as se a uma maior abertura. Mas “Em inquéritos deste tipo, as pesso-
vação para o casamento.” E num lapso Ainda assim, imperam outros valo- mulheres, os jovens são mais lembra que a discussão sobre as tendem sempre a dizer: ‘Isto agora
de poucas décadas esta ideia está tão res, explica Pedro Vasconcelos. “Os favoráveis a direitos iguais, bem a adopção está “embrionária” é uma desgraça, há mais infidelidade,
arreigada que 69 por cento dos portu- patamares de exigência hoje, para como as pessoas que vivem na depois de ter sido muito intensa as famílias funcionam pior’, apesar
gueses acham positivo que os jovens ter um filho, são outros.” As pesso- Grande Lisboa e no Sul do país. em torno do casamento. A.S. de, ao mesmo tempo, revelarem al-
iniciem a sua vida sexual antes de se as querem dar tudo às crianças, em gum modernismo (aceitam as uniões
casarem – é entre quem tem o ensino muitos casos, querem dar tudo o que de facto, as relações sexuais antes do
superior que o peso dos que concor- não tiveram. E vão esperando para Acha que casais de pessoas do mesmo sexo deviam poder casamento).”
dam com esta afirmação é maior. ter condições, mesmo que o seu ide- adoptar crianças? Uma coisa é certa, diz Gabriela Moi-
Anália Torres nota, no entanto, que al seja o de uma maternidade mais ta, “não há nenhum fundamento para
enquanto o número de casamentos precoce – e ainda é, segundo Sofia nº de indivíduos sustentar que hoje os casais são mais
tem descido, os “recasamentos” têm Aboim. Quando as condições acon- infiéis” – “O que há de diferente, isso
aumentado. “Menos do que noutros tecem, acabam por optar por ter um 000 sim, é que a não exclusividade passou
0,0% % em relação ao
países, é certo, mas isso é natural. só filho. Portugal é, aliás, dos países grupo em causa
a ser razão para desfazer um casamen-
Noutros países existe divórcio há mui- onde os filhos únicos têm mais peso, Dos 16 aos 34 anos to”, o que não acontecia há poucas
to mais tempo.” Ou seja, muitos não recorda Anália Torres. 143 gerações atrás.
desistem de tentar de novo. 55 ou 45,8% O papel que as novas tecnologias
A sondagem que a Intercampus fez mais anos têm hoje não tranquilizará muito os
para o PÚBLICO revela ainda que a A maioria relaciona-se 50 que vivem preocupados com a for-
maior parte dos divorciados tem filhos sobretudo com colegas 14,5% ma como se comportam os/as compa-
(85 por cento). E a regra é, como seria 68,4% nheiros/as. Sete em cada dez acham
de esperar, que sejam as mulheres a A carreira profissional pode não ser o 327 que a Internet e as redes sociais con-
Dos 35 aos
ficar com eles: 75 por cento das divor- mais importante na vida – antes vem tribuem para que haja mais infidelida-
54 anos Ns/Nr
ciadas têm crianças a cargo. a saúde, em primeiro lugar, depois fa- de. Utilizadoras ou não de Facebook
A adaptação pode não ser fácil, mas mília (especialmente para as mulheres 94 97 Dos 35 aos
e afins – a sondagem não permite des-
9,7% 54 anos
mais de metade dos inquiridos (55 por e para quem vive no Norte) e os ami- 27%
173 trinçar –, a visão geral que as pessoas
cento) diz que, depois da separação, se gos (em especial para os mais jovens 32,8% Sim 216 têm das novas tecnologias não deixa
ajustou bem à nova forma de exercer e para quem vive na Grande Lisboa). 62,1% de ser surpreendente. Mais de metade
as responsabilidades paternais. Já a Mas quase oito em cada dez portu- 284 Não (54,8 por cento) diz que “as novas tec-
percepção dos filhos pode não ser tão gueses respondem afirmativamente 28,3% nologias dificultam o relacionamento
positiva. Pouco mais de um terço dos a esta pergunta: “A vida hoje em dia 624 pessoal”. E mesmo a população mais
inquiridos, que fizeram o exercício de faz com que as pessoas acabem por se 111 62,1% jovem pensa assim, ainda que em me-
se colocarem no lugar das suas crian- relacionar sobretudo com colegas de 23,2% nor percentagem. Contudo, a Inter-
ças, acreditam que elas não avaliariam trabalho/escola?” Dos 16 aos net também serve para “encontrar al-
positivamente a forma como os pais se Allen Gomes considera este “um 34 anos guém por quem as pessoas se possam
saíram no processo de divórcio. dado muito interessante” que reme-
te para uma questão que tem sido ob-
140 297
apaixonar” (defendem 63,9 por cento
dos inquiridos) e “promove encontros
44,9%
jecto de estudo, já neste século, em 56,4% sexuais ocasionais” (77,9 por cento).
Falta de dinheiro explica países como os Estados Unidos, mas, O que concluir? “Mais uma vez, face
55 ou mais anos
adiamento da maternidade tanto quanto sabe, não em Portugal. a estímulos e a coisas relativamente
“As pessoas passam boa parte do seu 265 novas, como as redes sociais, as pes-
A maioria dos portugueses adultos tempo no trabalho, almoçam com os 76,8% soas têm opiniões extremamente am-
é, contudo, casada ou vive em união colegas, sentados, a conversar, algo bivalentes”, diz Sofia Aboim.
6 • Público • Sábado 5 Março 2011
Destaque
Sondagem 30 por cento acham que o casamento é uma união que não se pode dissolver
Estes casais são tão aceites Que direitos devem ter os casais Têm relações tão duradouras Encaram o casamento com
pela sociedade como de pessoas do mesmo sexo em relação como casais de pessoas mais ou menos seriedade
os casais heterossexuais? aos de pessoas de sexos diferentes? de sexos diferentes? do que os outros?
Mais
Igual Ns/nr Ns/nr Menos Ns/nr
1,7% 8,5 Total 59,1% 44 30
7,5% 17,5%
Menos
66,6% Igual Mais
Feminino 15,5%
32,9% 10,2%
Masculino
É entre 25,5% Se o
os jovens 55,2% tema é
21,1% homossexualidade
que a percepção
0,5% 14,9%
da discriminação há mais pessoas
Menos a não responder Mais Igual
é maior: 30,3% 0,6% 15,7%
82,4% Neste caso 5,6% 44,2%
90,7% 0,4% 14%
44%
Por região Menos Igual Mais Ns/nr
Em % São tão fiéis ao companheiro
1,5 5,3
Por idades Em %
13,3
6,8
como casais de pessoas
1,5
6,8 Ns/nr Menos Ns/nr Menos Ns/nr Menos de sexos diferentes?
6,7 15,1% 13,5 30,5% 23,8 29,9%
78,9 86,4
Mais Mais Ns/nr Menos
Norte Litoral Grande Porto Mais 39,9
0,3% 0,3%
0,9% 11,3%
4,9 15,9
2,7 Igual Igual Igual
9,3 2,1 Igual
77,9% 55,7% 45,5%
9,2
37,3%
83 72,8
16-34 anos 35-54 55 ou Mais
Centro Litoral Interior
0 4,7 Por religião
5,6
Em % Religioso
76,2% Não religioso
89,7 54% No Sul há
mais pessoas
Grande Lisboa 28,2% a dizer que não Mais
1 3,9 17% 17,2% há diferença:
9,8
0,5% 0,5% 6,3% 11,4%
49%
Menos Igual Mais Ns/nr
85,3
Sul
Por que razão temos filhos mais tarde Como se vive o divórcio
As 20 razões mais referidas Foi você que ficou com Adaptar-se à situação O casamento é uma união
a custódia dos filhos? da partilha da custódia foi... que não se pode dissolver
Razões económicas 38,9%
Carreira profissional 15,5% 75% Ns/nr
20
Difícil Concorda Ns/nr
0,9
15% 29%
Desemprego 12,2%
A maioria das
Nem fácil
Instabilidade do emprego 11,4% divorciadas ficam
nem difícil
com a custódia Discorda
Estudar até mais tarde 8,6% dos filhos, o que 10%
59,8%
só acontece com
Vida difícil 7,7% 20% dos homens
Destaque
Sondagem O amor, o namoro e o casamento vistos por três gerações de uma família
“Nenhum rapaz
Maria Alda, Armando Alves, Maria Armanda e Amanda Ribeiro
Destaque
Sondagem O amor, o namoro e o casamento vistos por três gerações de uma família
“Nenhum rapaz
Maria Alda, Armando Alves, Maria Armanda e Amanda Ribeiro
MANUEL ROBERTO
Destaque
Sondagem Entrevista a Sofia Aboim, investigadora do Instituto de Ciências Sociais
“Temos alguma
PEDRO CUNHA
dificuldade em
acompanhar a
modernidade”
A família mudou e as pessoas
acham que foi para pior. Para
a socióloga Sofia Aboim isso tem
a ver com a rapidez das mudanças
o casamento, quer com a Igreja.
Andreia Sanches
Durante muito tempo, achou-se
a Acham que a vida se tornou que a religiosidade das pessoas ia
mais solitária. E que a família cair a pique. Hoje sabe-se que não.
“antigamente era melhor”. As As pessoas continuam a achar,
mudanças registadas nos últimos como se vê, que são religiosas. O
anos, na família e no casamento, que há é uma religiosidade mais
têm sido tão rápidas que os individualizada. As pessoas não
portugueses revelam alguma vão à igreja, ou vão só quando lhes
“dificuldade em acompanhar a apetece, ou podem nem sequer
modernidade”, diz a socióloga Sofia ser católicas – sendo que, em
Aboim. A autora de vários estudos Portugal, a grande maioria dos que
na área da família e conjugalidade, se definem como religiosos define-
investigadora do Instituto de se como católica –, podem estar
Ciências Sociais, em Lisboa, à procura do sentido da vida. Por
escreveu um dos capítulos do detrás de todas estas mudanças
último volume da História da Vida tem que haver necessariamente
Privada. Nesta entrevista, analisa a uma mudança de mentalidades.
sondagem do PÚBLICO. Se estivéssemos a falar de política,
Os resultados desta sondagem ou de ambiente, aí as opiniões são
reflectem muitas das mudanças geralmente mais voláteis. Já as
sociais que se têm registado em mentalidades, o que tem que ver
Portugal. Como é que as lê? com a vida privada, tem tendência
Os anos 90 foram uma década de a mudar lentamente. Ora nós, em
mudanças muito acentuadas, com Portugal, estamos a mudar muito
mais casais a viver em união de rapidamente.
facto, menos casamentos. Agora, o Pode ser negativo?
que aconteceu na primeira década Não diria isso. Estas mudanças têm
dos anos 2000 foi espantoso. ocorrido noutros países, nós temos
Tivemos uma inversão completa, é feito o caminho de forma mais
por exemplo, no que diz respeito ao acelerada.
casamento católico. No ano 2000, Tivemos um regime autoritário
65 por cento das pessoas que se muito prolongado, há traços de
casavam, casavam-se pelo religioso; conservadorismo na sociedade
em 2009, a percentagem caiu para portuguesa, mas, por outro lado, o
43 por cento. Ou seja, entre 1990 facto de as mulheres terem acesso
e 2000 diminuiu seis, sete pontos
percentuais, mas entre 2000 e
a uma autonomia financeira,
por exemplo – e temos uma das
mais nova. Diria que esta é uma
ideia algo conservadora.
sondagem é que acham que a
família está mais unida, e o facto de Sete em cada dez
2009 diminuiu mais de 20 pontos. percentagens mais elevadas de Porquê? haver mais igualdade só há cinco
E porquê? mulheres a trabalhar na Europa Porque implica um imaginário de pessoas a referi-lo. É absolutamente acham que estamos
Porque há um afastamento da – contribuiu para uma mudança que, no passado, havia uma família irrelevante para as pessoas que haja
Igreja, uma menor importância da muito rápida. Houve uma grande muito unida, coesa, feliz, contra um hoje mais igualdade. Para resumir, mais solitários. É a
ritualização do casamento. Nesta mudança feita no feminino. presente muito mais negro. A “falta olhei para todas as respostas [era
sondagem do PÚBLICO, há um As pessoas têm clara percepção de educação” é a segunda grande uma pergunta aberta] e tentei ideia de uma solidão
dado muito interessante: as pessoas das mudanças, nomeadamente ao mudança registada pelas pessoas. perceber se as pessoas achavam
dizem que o casamento católico não nível da família, mas não é certo E o que é que está por detrás disto? que a família tinha mudado para urbana, a família já
acrescenta nada à conjugalidade. que as achem positivas, pois não? É o respeitinho, à portuguesa, melhor ou para pior. E a maior
A resposta é esmagadora (75 por Há uma pergunta na vossa aquele respeitinho hierárquico parte das coisas que são referidas não é tão grande...
cento) e não há diferenças entre sondagem que é: “Quais são as entre homens e mulheres e entre é negativa. Isto nas três gerações
pessoas de diferentes gerações.
E, no entanto, a esmagadora
principais diferenças na vida
familiar?” As pessoas responderam
pais e filhos. É referido sobretudo
pelas pessoas mais velhas da
analisadas [dos 16 aos 34 anos, dos
35 aos 54 e pessoas com 55 anos
Mas não sei se é uma
maioria considera-se religiosa...
O que mostra que a ideia de
o que quiseram. E, se olharmos
para as respostas, há coisas muito
amostra. As pessoas dizem ainda
que há hoje menos convivência
ou mais]. Quando se pede: “Diga
lá, assim, da sua cabeça, no que é
realidade
religiosidade tem vindo a interessantes. A primeira delas é familiar, menos valores do que que acha que a família mudou”, há
transformar-se. Há uma visão muito que acham que a família está pouco havia, mesmo os mais jovens. Não uma visão quase romantizada do
diferente da relação das pessoas unida. Algo que é referido ainda dizem que há mais diálogo; só passado, como se “dantes é que
quer com a vida familiar e com mais, curiosamente, pela geração dois por cento das pessoas nesta fosse bom”, o que, de resto, é uma
Público • Sábado 5 Março 2011 • 11
Destaque
Sondagem Sete em cada dez portugueses culpam as novas tecnologias
7,0
Não sabe/
nete
er
A Int
não responde Discorda
mensagens escaldantes que recebem ... promovem mais
Ana Cristina Pereira encontros sexuais
no Facebook e no telemóvel. Não as Concorda
“Muitos casais vivem apagam. E são descobertas. É como as ocasionais?
cartas de amor de antigamente, que
obcecados com a ideia de se guardavam com um laçarote.”
Não concorda
Sim. E é no Grande Porto e
nem discorda
descobrir se o outro lhe é A escritórios de advogadas como Ri- na Grande Lisboa que esta
infiel”, diz terapeuta familiar. ta Sassetti chegam cada vez mais casos ideia está especialmente
de divórcio resultantes de infidelida- instalada
Vigiam-se na Internet Concordam Concordam
des descobertas nos computadores e Concordam
nos telemóveis. Um estudo britânico 81,9% 83%
80,7% dos inquiridos do 75,9% dos que 77,9%
a Antes, a suspeita podia nascer responsabiliza o Facebook por 20 por dos dos que
Grande Porto têm
dos excessos do conta-quilómetros, cento dos divórcios. Em Portugal, não homens 75,3% das têm ensino 80,9 % dos que têm
da conta bancária, do horário. Ago- há estudos. Os portugueses, todavia, mulheres ensino secund. do 6º ano ao 9º ano
superior
ra, qualquer rede social pode fazer parecem convencidos dos poderes 71,4% dos que têm
disparar o alarme. Comenta dema- (maléficos?) das novas tecnologias: Inst. primária
Discordam
ou menos
siado as fotografias ou as palavras 55,4 por cento concordam e 16,2 por
de alguém? O que escreve? E como cento concordam completamente 81,3% 38,1% das pessoas
dos inquiridos da em união de facto
reage o outro? As novas tecnologias com a ideia de que contribuem para Grande Lisboa
introduziram algumas mudanças na o aumento da infidelidade. Esta cren- 13,4% das pessoas
casadas
forma como as pessoas se relacionam ça é mais forte no Norte litoral. E mais
umas com as outras. Sete em cada fraca entre divorciados. Discordam 15,2% das pessoas
dez portugueses consideram-nas um Para Gustavo Cardoso, especialista 34,9% dos que têm entre solteiras
16 e 34 anos
combustível para a infidelidade. em tecnologias de informação, não 5,1 29,6%
Não há quem não tenha uma histó- tem sentido culpar as novas tecno- 28,9% 35-54
ria para contar. Basta lançar o repto logias: “A lógica das redes sociais é 22,6%
na mais popular rede social, o Face- multiplicar as relações fracas e apro- 55 ou mais 5,5
book, para as coleccionar. Ora, leia fundar as relações fortes.” É inegável ... dificultam o 14,3
esta: “A melhor foi a de uma colega que a Internet alarga o universo de relacionamento pessoal
de trabalho que estava a meio do ex- pessoas acessíveis. A paixão, porém, com outras pessoas? Discordam
pediente. Ligou o Facebook e leu um requer bem mais do que isso. Tem de ... contribuem para
33,4% dos 8,6
daqueles posts de perguntas acerca de haver uma certa predisposição para a homens que haja mais
A maioia das pessoas 24,6%
amigos na página do marido. Era qual- viver. “Se as pessoas querem ser infi- acham que sim infidelidade?
quer coisa como: ‘P: Quando é que X éis, tanto podem sê-lo saindo à noite,
é mais mal disposto? R: Ao pequeno- como indo ao Facebook”, enfatiza. “É 11,2 É uma evidência para
almoço.’ Ela perguntou-nos o que possível ser mais infiel no Facebook? sete em cada
achávamos que aquilo queria dizer. É. Até se pode ter seis janelas abertas dez pessoas
Foi um pé-de-vento lá em casa.” ao mesmo tempo.”
Concordam
54,8% Concordam
O desconfiado pode vigiar o perfil 56,4 % dos que têm entre
do companheiro. “Hoje, ao contrá- “Redes agudizam conflito” 51,4% dos 16 e 34 anos
rio do passado, a não exclusividade é Se pode ser mais fácil começar, tam- homens 55,2% dos de 35-54 anos 71,6%
razão para desfazer um casamento”, bém pode ser mais difícil terminar 57,9% das
mulheres 53% dos
nota a terapeuta familiar Gabriela Moi- um namoro. Há até quem saia do Fa- de 55 ou Concordam
ta. “E muitos casais vivem obcecados cebook para controlar a tentação de mais anos
64,2% das Concordam
com a ideia de descobrir se o outro lhe espreitar o perfil do ex. Eliminá-lo da pessoas divorciadas 74% dos
é infiel. Controlam os telemóveis, o lista de amigos não chega: o ex apare- 47,6 % das pessoas homens
Facebook, a Internet, tornam a vida, cerá, como um fantasma, via comen- em união de facto 69,4 % das
mulheres
a sua e a do outro, terrível.” tários feitos a amigos comuns. 72% das pessoas casadas
Na Internet, como fora dela, nem Maria Tomé, 35 anos, já assumiu
7,6
sempre o que parece é. Só para lançar um namoro no Facebook. Mudar o
17,4 74,2% das pessoas
a confusão, lembra a psicóloga Catari- estado de “solteiro” para numa “re- solteiras