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Universidade Federal do Paraná – Mestrado em Ciência Política
Artigo apresentado no Encontro da Associação Internacional de Ciência
Política (IPSA)
São Paulo, fevereiro de 2011.
Abstract:
Several explanations are given to the dynamics of the crisis process in the
authoritarian regimes, which took place in several countries and in different ways.
These crises were the initial step to the political transition to democracy. The research
highlights the importance of conflicts within the regime (between "hard" and "soft"
groups), along with several other factors, such as economic crises, wars, social
mobilization and international pressure. This paper presents a theoretical return of
some of these various explanations, focusing mainly on a historical and comparative
context, attempting to understand the different dynamics of political transition
processes to democracy in Brazil and Argentina, that happened by the crisis in the
authoritarian regime. We compare the transition in Argentina, which occurred to rupture
and rapidly, with a catastrophic crisis inside the regime and beyond it with the transition
process in Brazil, which was developed by transaction and lasted more than a decade
to be materialized. We found to understand the similarities and differences of both
processes.
1. Apresentação
Este artigo foi pensado, primeiramente, como uma forma de expor parte da
minha pesquisa de mestrado, onde analiso as diferenças entre os regimes ditatoriais
militares de Brasil e Argentina na década de 1980. Dou enfoque especial às diferenças
e semelhanças desses dois casos que possam auxiliar na compreensão de seus
derrocamentos (spillover) e suas transições para a democracia, que tiveram dinâmicas
muito distintas.
O caso argentino se trata de uma ditadura relativamente curta, cerca de 7 anos
desde a tomada do poder pelos militares em 1976 (ao deporem a presidenta Isabelita
Perón) até o presidente Raúl Afonsín tomar posse em 1983 depois de eleições livres e
diretas. A ditadura argentina teve uma forte repressão militar, mobilizações populares
importantes e graves problemas econômicos e de política externa, incluindo uma
guerra com a Inglaterra em 1982.
Ao pensarmos no caso brasileiro, a ditadura militar durou mais de 20 anos
desde o golpe de março de 1964 (quando os militares retiraram o presidente João
Goulart do poder), até o governo civil de transição do presidente José Sarney, eleito
em 1985 ainda indiretamente. A primeira eleição livre e direta da nova república
ocorreu apenas em 1989, elegendo Fernando Collor de Melo. A ditadura brasileira
teve uma institucionalização única no continente, baseada em eleições regionais, mas
também em repressão e muitos planos econômicos para enfrentar as diversas crises.
A forma como este artigo está organizado busca entrar nas diretrizes
solicitadas pelos coordenadores do painel, assim, dividi o texto de forma a sublinhar a
importância de três conceitos básicos no estudo de ditaduras, que são: legitimidade,
repressão e cooptação. Apresento o enfoque teórico que adoto, bem como a
contextualização metodológica e temporal da pesquisa. Em seguida, apresento os
dados parciais de minha pesquisa segundo a divisão temática sugerida pelos
professores Merkel and Schmotz.
2. Metodologia
3. Recorte teórico
4.1 Legitimidade
A ditadura militar brasileira foi, sem dúvida, uma das mais bem sucedidas no
que diz respeito à manutenção de sua legitimidade frente à população. Em 1º. de abril
de 1964 os militares brasileiros tiraram do poder o presidente João Goulart e
instauraram o regime autoritário. Entre os anos de 1964 e 1985 vários generais se
sucederam na presidência da república, no entanto mantiveram eleições para os
cargos legislativos e da administração municipal (com exceção das capitais e cidades
de fronteira). A legislação eleitoral foi alterada de forma drástica, com a extinção dos
antigos partidos, a instauração do bipartidarismo e o fechamento de diversos órgãos
representativos, tais como sindicatos.
Em 1967 foi promulgada a nova Constituição brasileira que oficializava alguns
artifícios de governo, tais como os “senadores biônicos” (senadores indicados
diretamente pelos militares e com mandato vitalício) e as indicações do poder
executivo federal para governadores dos estados. As eleições diretas para a Câmara
dos Deputados foram mantidas, apesar de serem muito restritas, já que serviam para
manter sob controle as elites regionais, além de legitimar socialmente o regime. Essas
eleições tiveram as regras alteradas diversas vezes, privilegiando a representação de
estados em que o partido do regime (ARENA) tivesse mais votos. O Congresso foi
fechado diversas vezes durante a ditadura e as prerrogativas legislativas eram muito
restritas. No entanto, o discurso que buscava legitimar o governo militar era o de uma
reestruturação democrática através da doutrina de segurança nacional. O golpe de
estado foi feito em meio à uma séria crise econômica e política no Brasil, assim, os
militares prometiam devolver a paz à sociedade e reestabelecer o crescimento
econômico.
A combinação de: censura; grande crescimento econômico alcançado pelo
regime com o chamado “milagre brasileiro”; abstenção de grande parte da oposição
nas eleições; apoio das elites regionais, que estavam inseridas nos postos de governo
ou nas eleições legislativas; entre outros fatores, garantiram a legitimação do regime
nas urnas, até o ano de 1974, ano em que a oposição (MDB) começou a se fortalecer.
Nestas eleições a oposição conseguiu uma relevante vitória nas eleições legislativas e
o general Ernesto Geisel assumiu a presidência com um discurso de liberalização. No
entanto, essa liberalização foi contraditória. A cada avanço em determinado aspecto,
havia um retrocesso em outros, com formas alternativas de manipulação pelo regime.
Isso só foi possível pelo grande controle sobre o processo de transição que o regime
exerceu e foi também esse controle que possibilitou que o regime guiasse as eleições
seguintes. Com diversos artifícios, leis, decretos e ferramentas de controle, sendo os
mais conhecidos a Lei Falcão (1976) e o Pacote de Abril (1977), que limitavam as
possibilidades da oposição ter representantes eleitos e, inclusive, de fazer campanha
política. O regime garantiu assim sua legitimação através das urnas.
Ao final de 1982, com uma séria crise econômica e denúncias de corrupção,
afloram as crises internas do regime. A ditadura havia sido até este ponto
relativamente estável, entretanto, as críticas crescem, inclusive dentro do próprio
regime, acelerando o processo de abertura. Assim, em 1985, o regime mudou as
regras de composição do colégio eleitoral que elegeria o próximo presidente da
república, sobrerepresentando os estados agrários, nos quais havia uma forte
dominação do partido do governo, garantindo a maioria nas eleições presidenciais de
1985. Entretanto, com a grande crise interna no regime e as dissidências fortemente
organizadas na Frente Liberal (futuro Partido da Frente Liberal – PFL), o Colégio
Eleitoral elegeu Tancredo Neves como o primeiro presidente civil desde 1964 (o
candidato do partido de oposição, PMDB), tendo como vice José Sarney, dissidente do
regime. Apesar de uma grande mobilização pelas eleições diretas, manifesta no
movimento das “Diretas Já!”, o primeiro governo civil foi eleito de forma indireta, via
colégio eleitoral. Além disso, por motivo de doença, Tancredo Neves morre antes de
assumir a presidência, assumindo o governo o vice, José Sarney, que antes era apoio
político da ditadura militar. Em 1986 foram convocadas eleições diretas para
representantes na Assembléia Constituinte, que foi instaurada a partir de 1987 e
promulgou a nova constituição em 1988.
Na Argentina - depois da dura repressão dos anos 1976/1978 - no início do ano
de 1980 a oposição começou novamente a se manifestar, o plano econômico dos
militares para a Argentina já demonstrava sinais de pleno fracasso e no fim de 1980
ressurgiu a CGT (Confederación General del Trabajo) e os líderes partidários (do
Partido Justicialista, PJ e da União Cívica Radical, UCR, principalmente),
reapareceram na cena política. Ao contrário da ditadura brasileira, os militares
argentinos não institucionalizaram a ditadura e seus instrumentos, acabaram
definitivamente com os partidos e cancelaram todas as eleições. Ao mesmo tempo,
não lograram sucesso na parte econômica, o que aumentava ainda mais a antipatia da
população pelo governo.
Seguiram-se na presidência do país o general Roberto Eduardo Viola, depois
Leopoldo Fortunato Galtieri que, em 1982 iniciou o processo da guerra das Malvinas e,
rapidamente, perdeu a guerra contra a Inglaterra em junho de 1982. Aqui, então, o
processo de transição tornou-se claro (FAUSTO e DEVOTO, 2004 p. 457/458).
Quando o general Reynaldo Bignone assumiu a presidência no mês seguinte (julho de
1982), já pode ser considerado um governo de transição não-civil. Convocou eleições
livres e diretas para o ano seguinte, em outubro de 1983, em dezembro do mesmo
ano, 18 meses após o fim da guerra das Malvinas, a Argentina já era governada
novamente por um presidente civil eleito diretamente. As eleições levaram ao poder
Raúl Afonsín da UCR (LINZ e STEPAN, 1999; FAUSTO e DEVOTO, 2004; ROMERO,
2001; PALERMO e NAVARO, 2007).
Romero (2008) argumenta que em nenhum momento, nem mesmo na copa do
mundo de futebol (1978), em que a Argentina foi campeã, o regime logrou alcançar
adesão da população. O Estado argentino tornou-se inoperante, corrupto e
fragmentado, já que as 3 armas dividiram entre si cargos, ministérios e funcionários,
fazendo com que o aparelho estatal fosse paralisado por jogos de poder e falta de um
controle estipulado. Nem mesmo o presidente e sua função escaparam a essa divisão,
já que com a formação da junta militar o poder daquele estava limitado pela atuação
desta.
No breve governo de Viola os empresários, que durante longo período estavam
fragmentados e desconfiados do governo militar, foram incluídos no governo, mas
essa inclusão acabou junto com o governo de Viola. Assim, os empresários, muito
afetados pela crise econômica, apoiaram, cada vez mais fortemente, a oposição ao
regime. Com os conflitos internos entre os próprios militares, não havia coesão de
pensamento, discurso e atuação, fazendo com que a sociedade legitimasse ainda
mais os movimentos contra a ditadura.
Em 1981 acabou a proibição aos partidos e a Organização Multipartidária foi
formada por peronistas, radicais e pequenos partidos – apesar de frágil e sem líderes
(ou com os mesmo líderes de 1975), essa organização se comprometeu a não
colaborar com o regime e não aceitar uma democracia tutelada. Junto com os demais
movimentos que tomavam fôlego, até 1982 a oposição cresceu e fez-se notar.
Desde 1980 os militares buscavam uma saída política, mas com as divisões
internas, que se agravaram na presidência de Viola, a qual a marinha se opôs, essa
saída tornava-se cada vez mais distante. Viola começou o diálogo com a sociedade –
principalmente empresários – e preocupava-se com uma eventual transição política.
Mas não obteve sucesso nem em deter a crise, nem em negociar com a sociedade.
No final de 1981, Viola adoeceu e foi retirado do cargo por seus opositores e assumiu
a presidência o general Leopoldo Fortunato Galtieri. Este não tinha tradição política,
mas havia passado tempos nos Estados Unidos e apontava para laços estreitos com
esse país, o que lhe garantia uma imagem de alguém que poderia “salvar” a ditadura.
Seu ministro da economia foi Roberto Alemann, que aprofundou a crise,
transbordando os protestos de empresários e sindicatos. Alemann anunciou um
programa de privatizações (inclusive do subsolo) que despertou a contrariedade dos
próprios militares. Assim, o governo Galtieri encontrou enorme resistência, culminando
com uma grande manifestação da CGT em março de 1982 (cf. PALERMO e NAVARO,
2007, LINZ e STEPAN, 1999; FAUSTO e DEVOTO, 2004; ROMERO, 2001).
Nesse contexto, volta à tona o conflito com a Grã-Bretanha pela questão das
ilhas Malvinas, que existia desde 1833, mas que nunca havia sido priorizada, pela
força do oponente e pela impossibilidade de a Argentina agir de fato nesse setor. Com
Galtieri e o suposto apoio dos Estados Unidos essa idéia parecia a solução para vários
problemas: a unificação das forças armadas para um objetivo comum; a conquista da
legitimidade do regime pela obtenção de um reclamo antigo da população; a conquista
de passagem para o Pacífico – perdida no conflito com o Chile em 1978. Além disso,
não passava pelos planos militares uma guerra, mas apenas uma ocupação, com o
apoio efetivo dos Estados Unidos e então uma negociação com a Inglaterra.
A ocupação ocorreu em 2 de abril de 1982, com o exército argentino vencendo
poucas tropas de defesa da Inglaterra que ficavam nas ilhas. Após esse fato e de uma
visita do secretário de Estado estadunidense houve uma ampla adesão social à
iniciativa. No entanto, a guerra era contra a Grã-Bretanha de Margareth Tatcher, que
precisava tanto quanto os militares argentinos de legitimação. A reação contra a
Argentina veio dura. A Inglaterra teve apoio da comunidade européia e da
Organização das Nações Unidas (ONU), foram postas severas sansões econômicas à
Argentina e ela foi considera nação agressora. Os Estados Unidos se retiraram das
negociações com o começo dos ataques ingleses e colocou sansões à Argentina,
também oferecendo apoio logístico à Inglaterra. A guerra começou, mas as
informações que chegavam à população argentina eram apenas de vitórias, o que, a
princípio, fez com que a população apoiasse o governo. A oposição, nesse momento,
já colocava a questão de um governo de transição no pós-guerra, principalmente a
União Cívica Radical e seu líder, Raúl Alfonsín. Em 14 de junho a Argentina foi
vencida e o governo comunicou a rendição, que deixou mais de 700 mortos. Os
militares exigiam a renúncia de Galtieri.
A partir dessa derrota a ditadura argentina perde de vez sua legitimidade e não
consegue mais tecer nenhuma negociação com a oposição e os partidos. Convoca
então eleições e o governo militar argentino termina de forma abrupta e traumática
para todo o país. Ao contrário do que houve no Brasil, a falta de legitimidade do
governo fez com que as negociações fossem inviáveis e, até hoje, os responsáveis
pela ditadura vem sendo julgados e condenados.
4.2 Repressão
4.3 Cooptação
5. Considerações finais
Referências:
CARDOSO, Fernando Henrique - Autoritarismo e democratização. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1975.
MARENCO DOS SANTOS, André. - Para não levar perro-gato por lebre. O que
realmente aprendemos comparando países. Porto Alegre: Humanas, 1997.
STEPAN, Alfred (org.) - Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.