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JUVENTUDE!
Quem nunca chutou uma bola na rua de sua casa? Ou vibrou com a seleção em
uma Copa do Mundo? Quem não se encanta com os dribles de algum craque, que como
um bailarino em campo, encanta a todos com movimentos e ações imprevisíveis, quase
mágicas? Qual time da capital nunca foi assombrado pelo Operário, o fantasma de vila
oficinas?
O futebol faz parte da cultura brasileira. Ele está no nosso dia a dia. Assistimos
a partidas pela televisão, jogamos no vídeo game, tiramos sarro de algum colega quando
o time dele perde, vibramos todos junto quando a seleção vence a Copa do Mundo ou
quando nosso time do coração vence alguma partida ou é campeão. Até quem não gosta
de futebol “sente” sua presença no dia a dia, pois seu simbolismo permeia toda a
sociedade. Através deste esporte e de alguns clubes, preenchemos conosco sentimentos
de identidade e amor.
Porém, por muito tempo achou-se que o futebol era o ópio do povo. Alguns
intelectuais do começo do século XX (1900) falavam que o futebol era o “local onde
almas pequenas podem ser saciadas pelos enlameados idiotas que jogam”. Entretanto,
este esporte tem muito mais para revelar, sendo um elemento central da cultura
brasileira, tornando o país mundialmente conhecido.
Além disso, o futebol pode ser considerado a linguagem universal dos povos,
algo que une diversas culturas, até mesmo aquelas que fora dos campos são inimigas
mortais. Principalmente pela alegria transmitida por este esporte, já que se apresenta
como uma verdadeira caixinha de surpresas, onde um time com uma estrutura menor
tem condições de vencer um time já renomado, como na clássica história de Davi e
Golias. Assim, Paulo Coelho fala que o futebol é como um romance: pois como nos
bons livros, seu final é sempre inesperado.
A juventude sente-se atraída por esse teatro nos campos, por isso muitos deles
estão envolvidos de alguma maneira com o futebol, seja jogando, assistindo ou
torcendo. Desta forma os jovens criam uma maneira característica de torcer, através das
torcidas organizadas. Porém, o que se ouve nos dias atuais sobre essas torcidas é que
seus integrantes são bandidos e pessoas interessadas em espalhar a violência nos
estádios e na cidade. Acompanhe algumas manchetes expressas pela mídia:
Poderíamos acabar este texto aqui e concluir que as torcidas organizadas estão
ligadas somente com a violência, mas vamos mais adiante em busca de novas respostas,
e como nós, queremos que vocês façam o mesmo e se perguntem. Será que torcida
organizada é apenas o que as manchetes nos dizem?
Torcida Organizada: Juventude e identidade
Mesmo que, nas duas últimas décadas, alguns atos ligados à violência praticados
nas pequenas e grandes cidades tiveram como protagonistas membros de torcidas
organizadas. Não se deve atribuir apenas um caráter associado à agressividade e
violência para estas instituições juvenis. Uma torcida organizada é muito mais do que
isso, pois no seu interior encontramos uma grande riqueza cultural: símbolos, cânticos,
ritos, além de ser um local onde o jovem tem toda a liberdade para se expressar. Assim
este torcedor acaba assumindo todo um estilo de vida através destas torcidas.
O surgimento de torcidas organizadas juvenis, no principio estava ligado a
grupos de amigos que se reuniam para incentivar e até mesmo protestar ao seu time do
coração. Assim, desta forma, a repercussão no estádio seria mais impactante e chamaria
mais a atenção, já que um conjunto de torcedores fazem mais barulho do que um
torcedor solitário.
Anteriormente a estas torcidas organizadas compostas por jovens, as torcidas
tinham como componentes pessoas mais velhas, as quais formavam uma banda que
tocava marchinhas de carnaval e outros cânticos para apoiar o time. Porém, esses grupos
de torcedores tinham o apoio e eram patrocinados pela diretoria de seus respectivos
clubes. Sendo assim, eles não possuíam uma postura crítica e independente, sendo
submissos às vontades da direção. Para contextualizar, estes torcedores “da vanguarda”
já existiam desde os anos de 1940 e 1950 nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Já
as torcidas organizadas juvenis, burocratizadas1 e independentes (tais como observamos
hoje) tiveram seu inicio nos anos de 1960 e 1970 nestes mesmos grandes centros
brasileiros, se espalhando posteriormente aos mais diversos cantos do território
brasileiro. Um líder de uma torcida organizada carioca nos conta sobre a origem das
torcidas jovens:
Então, era um pessoal de 40, 50 anos com uma bandinha, que era um pessoal
mais atrelado ao clube, eles faziam o que o clube queria, o time estava mal
eles não protestavam. As torcidas jovens surgiram exatamente nesta época,
começou todo um movimento jovem, até contra a ditadura mesmo, contra a
repressão na época, que começou a criar um espírito diferente nas
arquibancadas, de protestar quando o time está mal e aí começou a surgir
mais ou menos nessa época, em 70. Aí foram denominadas de torcidas
jovens, Torcida Jovem, Força Jovem.
1
Diz que algo é burocratizado quando este apresenta uma estrutura hierárquica definida e rígida, recheada
de normas, regras e condutas a serem seguidas.
Desta maneira o jovem buscava uma voz ativa diante de seu clube, onde ele
tivesse a liberdade de expressar suas opiniões de forma autônoma, sem se submeter à
aprovação ou não dos dirigentes do clube.
É importante salientar o contexto histórico e espacial que também influenciou o
surgimento de torcidas jovens, já que se deu durante o período da ditadura militar (final
da década de sessenta e início da década de setenta). Mediante as repressões causadas
pela a ditadura os jovens procuravam lugares e espaços onde eles pudessem expressar
toda a sua indignação e suas angústias perante a sociedade, sobretudo temas polêmicos.
E encontraram estes lugares nos estádios de futebol, ao se organizarem em grandes
grupos de torcedores e assim se expressar através de cânticos e símbolos subversivos
que as autoridades não eram capazes de censurar.
Hoje em dia, estes mesmos grupos de amigos, que compartilham a mesma
paixão por um clube, ainda se reúnem para incentivar e protestar o seu time de maneira
peculiar (assistindo o jogo em pé, fazendo muito barulho e festa, etc.) e se organizam
em torcidas organizadas. Entretanto, devem-se considerar outros elementos adquiridos
no tempo e no espaço, por exemplo: os simbolismos estampados nas bandeiras,
expressados nas músicas originais e parodiadas que são cantadas durante um jogo, a
territorialidade que se criou e se influenciou no espaço urbano (ou seja, lugares na
cidade onde um torcedor não pode transitar com a camiseta do seu clube, pois corre
risco de ser agredido por torcedores adversários). Enfim, o que queremos mostrar é que
no plano de fundo destas torcidas existem elementos que passam despercebidos por um
primeiro olhar superficial.
Primeiramente é importante destacar a estrutura e a burocracia de uma torcida
organizada. Já sabemos que o amor ao time é a peça fundamental e central. Além disso,
um torcedor organizado precisa ter disposição, pois esta é a fonte que alimenta e move
uma torcida nos estádios de futebol. Sendo assim, quanto maior a “disposição
demonstrada pelo componente, maior prestígio e visibilidade ele vai ganhando entre os
membros mais antigos podendo, a partir daí, construir sua própria carreira dentro da
torcida”, diz a Antropóloga Rosana Teixeira.
A carreira dentro desta organização é bem definida, possuindo um esquema
básico de Presidência, Diretoria, Associados e outros cargos desempenhados durante o
jogo, como por exemplo: o líder da bateria, o organizador do bandeirão, os
compositores, entre outros. Portanto um componente de uma torcida não está mais
condicionado para apenas torcer pelo seu clube, mas também se preocupar com o
funcionamento dela e a lutar pela mesma. Abaixo está uma fala de um torcedor carioca
que esclarece a dinâmica de funcionamento de uma torcida organizada jovem:
A gente vai criando aquelas amizades, a gente vai fechando aquele círculo de
amizades, aquela coisa toda, teve um processo de eleição, me chamaram. (...)
O cara que se destaca na torcida ele pode se candidatar. Aí me convidaram
para ser diretor de faixas e bandeiras. Aí, eu aceitei porque eu já fazia esse
serviço, eu ia lá amarrar, cuidava das bandeiras, eu levava. Ser diretor ou não
para a gente não significa nada entendeu? Porque a gente gosta tanto dessa
torcida que a gente se acha meio pai dela, a gente se preocupa tanto que a
gente fica assim ‘vamos organizar’, ‘vamos fazer isso’. Se candidatando você
pode colocar suas idéias melhor.
É importante destacar que os líderes, no geral, são pessoas mais velhas entre 25
e 35 anos, e a garotada ou molecada como são chamados (e em nossa região chamados
de piazada), constitui a maior parte da torcida, são jovens entre 15 e 20 anos que agitam
e fazem “tremer” os estádios, com mensagens de intimidação e de revolta.
Trouxemos como exemplo, algumas características das principais torcidas
organizadas do Rio de Janeiro, e posteriormente do time da nossa cidade (O Operário
Ferroviário de Ponta Grossa), para que você jovem possa compará-las e entender todos
os seus significados, com o intuito de enriquecer a sua visão sobre o tema.
Torcida Fúria Jovem (no centro da Geral) Torcida Trem Fantasma (na “curva do diabo” da geral)
Quadro 04: Mudança na representação do mascote fantasma
A gente vai fazer uma camisa, uma touca, um boné com a foto do Che
Guevara, porque Che Guevara completou 30 anos de morte e a torcida vai
fazer 30 anos em dezembro, vai parecer uma coisa só. A gente se identificou
com a causa dele, ele não se rendeu ao capitalismo, se aliou ao Fidel Castro,
porque ele não queria se integrar ao poder dos Estados Unidos e a gente se
identificou, a gente tem uma lema: Antes morrer de pé do que abaixado.
Estas personalidades estão presentes em escudos, bandeirões e cânticos da
torcida, expressando sentimentos e angústias dos jovens, como podemos ver no quadro
05. Entre algumas personalidades citamos Bob Marley (com o jovem reivindicando
políticas para legalizar drogas ilícitas pela sociedade ocidental, que tem valor cultural
para certos grupos sociais), Che Guevara (símbolo máximo de rebeldia e idealismo
contra o sistema capitalista), Aiatolá Khomeini e Saddam Hussein (símbolos de
resistência contra o poder estadunidense).
Bandeira da Torcida Jovem do Flamengo Bandeira da Torcida Fúria Escudo de uma antiga torcida
do Botafogo “Revolução Operariana”
2
Muambeiro é um termo regional designado pela torcida do Operário aos torcedores do time de Foz do
Iguaçu em detrimento do mesmo fazer fronteira com o Paraguai, e estar ligado de maneira determinante
ao trafico de diversos produtos ilegais que entram sem pagar impostos do Paraguai ao Brasil, através de
Foz do Iguaçu.
A falange é Bixarada
Cascavel não é Ninguém!
Mas no campo lá das bixa
é que somos CAMPEÃO!!!
Sou Humilde,sou povão!
Mas eu amo essa nação!
Nessa terra quem comanda!
É a Torcida do Azulão!
Por fim, a Torcida Trem fantasma, do Operário, compôs mais uma canção para
intimidar e responder aos torcedores do time da fronteira:
3
Em referência as torcidas organizadas do time da capital: Coritiba, Atlético e Paraná Clube,
respectivamente.
papéis coloridos, confeccionar bandeiras, comprar foguetes, fazer efeitos visuais com
fumaça de extintores, etc.
É destaque também o grande orgulho que os torcedores das organizadas têm do
reconhecimento do povão em geral (como chamam quem não faz parte das torcidas
organizadas) da festa de sua torcida organizada. Um exemplo disso é a esperada hora da
abertura do bandeirão pelas torcidas, como destaca este torcedor carioca:
Considerações
Não adianta acabar com as torcidas organizadas pensando que vai acabar com a
violência, este problema social já está enraizado no contexto de muitos jovens
brasileiros, retrato de uma globalização perversa como aponta o Geógrafo Milton
Santos. Portanto, ao noticiarem a respeito de alguma torcida organizada, procure
desvendar o verdadeiro significado que está como plano de fundo destas entidades.
O importante é lutar pela tolerância ao diferente, respeitar a cultura do outro e
assim conseguir viver numa verdadeira sociedade democrática. “Gabriel, O Pensador”,
compôs uma música chamada Rap das torcidas, que expressa o desejo pela paz nos
estádios, onde o futebol potencialize seus aspectos positivos de integração cultural e
minimize os atos de violência de “meia dúzia de babaca”, como destaca o cantor e
compositor:
Rap das torcidas (http://www.youtube.com/watch?v=kjfphi_YP2A)
Domingo eu vou pro Mas desse jeito até ganhando Galoucura e Máfia Azul
Maracanã Ninguém sai campeão Sangue Jovem, Youg Flu
Vou torcer pro time Ninguém sai campeão Criptonita, UJT
Time que sou fã Tem que mudar a
Pois to nessa uma briga Domingo eu vou consciência
depois do portão de entrada Eu vou pro Beira Rio Não basta só torcer
Raça, Fla e Força Jovem Fico junto do meu time
destruindo a arquibancada Até no frio Olha os anjos ai galera
Quero ver meu time Pelé, Garrincha, Dotão
Vendedor de bar e rádio e E mais um granal Beto Dinamite e Cláudio
pilha voando Quando cai mais uma bomba Adão
E o bambu da bandeira na Inocente se dá mal Aílton toca pra Leandro
mão Fogo nas cadeiras E Didi, Vavá, Gerson
E a polícia a polícia quando Destruição de estádio E Valdir
aparece só aparece Um bando de otários Zico tocando pra Nilton
Pra bater pra aumentar o É, um bando de otários Santos e Pepe
caos, a confusão Achando tudo isso legal (to Euzépio, Romário e Bebeto
mal) Barbosa, Tafarel e Carlos
Domingo eu vou, eu vou pro Alberto
Mineirão Violência contra violência Maradona, Bibi,
Torcer pro time, do meu Às vezes é inteligência E Canídia
coração O ataque é a melhor defesa Ricardo Rocha tabela com
Só tem rádio e uma bandeira Quando vem com Falcão
E começa a correria consciência E Reinaldo, Zé de Túlio
Galoucura e Máfia Azul Não há paz sem justiça Sócrates e Túlio Maravilha
Acabando minha alegria E condições sociais Amuru, Ronaldo, Viola e
Acabando minha alegria Mas nesse caso Edmundo
A vítima e o culpado são E todos os craques do resto
Saída de estádio iguais do mundo
Estádio é sempre igual Os motivos da revolta É goooooooooooooooooool!
Sangue no rosto São os mesmos dos dois Da paz! Da galera!
Motorista atropelando lados
Avançando o sinal Então se ligue e direcione o Na Inglaterra, na Argentina
seu revídeo Em Pernambuco ou na Bahia
To ligado Futebol não é violência
E aí em vez de queimar Futebol é alegria
Chega de violência Os seus pseudo-rivais
Quero ver é gol de Vamos lutar Na Itália, na Espanha
placa Mas fumando um cachimbo Na Colômbia ou no Japão
Todo mundo se dá mal da paz Futebol não é violência
Com meia dúzia de Futebol é diversão
babaca (2x)
Meia dúzia de babaca Chega de violência Ceará, na Paraíba
Quero ver é gol de Na Nigéria, em Camarões
placa Futebol não é violência
Domingo, eu vou pro Somos penta campeões
Morumbi Todo mundo se dá mal
Trabalhei uma semana Com meia dúzia de
Pra chegar até aqui O futebol não tem fornica
babaca (2x) Nem cor e religião
Mas quando a bola rola
Também começa a xingação Meia dúzia de babaca Futebol é amizade
Mancha Verde, Gaviões Futebol é união
Comandando a confusão Força Jovem, Facção Jovem
Esperei o tempo todo Fla e Gaviões
Por essa decisão Independente, Mancha Verde