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Fórum Central Civel João Mendes Júnior - Processo nº: 583.00.2007.

135799-6

Processo CÍVEL
Comarca/Fórum Fórum Central Civel João Mendes Júnior
Processo Nº 583.00.2007.135799-6
Cartório/Vara 25ª. Vara Cível
Competência Cível
Nº de
2338/2007
Ordem/Controle
Grupo Cível
Ação Procedimento Ordinário (em geral)
Tipo de
Prevenção
Distribuição
Redistribuído em 21/11/2007 às 15h 57m 18s
Moeda Real
Valor da Causa 40.000,00
Qtde. Autor(s) 13
Qtde. Réu(s) 1

Autos n. 583.00.2007.135799-6 25ª Vara Cível do Fórum


Central da Capital Vistos. I. Cuida-se de ação de
inexigibilidade de aporte financeiro c/c pedido de
consignação em pagamento ajuizada por AUGUSTO
PULCINELLI JUNIOR, EDIR TAVARES MINUCELLI, BIAGIO
ADUCCI, REGIANE EMILIO BAIÃO DOS REIS, ANTONIO
GUILHERME LEONE MOLINA, HELDER ZANATTA GIL,
DANIEL PIRES DE CARVALHO, GISLAINE BALENA DE
LIMA, HELENA DE CAMPOS MALACHIAS, FRANCISCO
CARLOS MARTINS DE CASTRO, SANDRA REGINA RESCA
BARRETO, BOANERGES LOMBARDI E EDNA MORIKUNI em
face da COOPERATIVA HABITACIONAL DOS BANCÁRIOS
DE SÃO PAULO – BANCOOP.

Segundo a inicial, os autores, indistintamente, firmaram


com a ré contrato de aquisição de unidade imobiliária
localizada na Rua Francisco Marengo, 1210, Tatuapé,
Conjunto Residencial Jardim Anália Franco.
De acordo com o contrato de adesão firmado entre os
autores e a ré, o empreendimento seria composto de (i)
quatro edifícios, com apartamentos de três dormitórios
com suíte e cobertura duplex, com uma, duas ou três
vagas de garagem; (ii) área comum, piscina, salão de
festas, salão para sauna, ginástica e quadra poliesportiva.
O preço estimado das unidades seria de R$ 89.900,00, em
01-12-2000, a ser quitado da seguinte forma: a) entrada;
b) 54 parcelas; c) 5 parcelas anuais; d) chaves. A ré,
mesmo tendo recebido a totalidade do preço previsto no
pacto, não cumpriu sua parte do contrato, deixando de
entregar, no prazo fixado, as duas últimas torres do
empreendimento e as áreas comuns correspondentes
descritas no contrato.

E mais: diante da situação de paralisação das obras, a ré,


aproveitando-se do momento psicológico favorável a ela,
convocou uma assembleia e deliberou pela cobrança de
aporte financeiro no expressivo valor de R$ 5.738.948,64.

Cada cooperado, assim, ficou obrigado a pagar 48


parcelas que variam de R$ 504,10 para unidades de três
dormitórios (cooperados residentes) e R$ 389,29 para
unidades de três dormitórios (cooperados não residentes).

Entretanto, defendem os autores que, à luz do contrato


firmado e frente aos valores já quitados pelos cooperados
que supre o preço de custo, não há possibilidade de impor
aporte financeiro, motivo pelo qual a cobrança não poderá
ter seguimento.

Assim, pedem a procedência da ação para tornar


inexigível para os autores o aporte financeiro pretendido:

a) por completa falta de previsão contratual;

b) pela ausência de demonstração da necessidade de


aporte em face do aumento dos custos da obra;
c) pelo revelado exaurimento do preço pago pelos autores
para cobrir os custos da obra.

Alternativamente, caso o juízo entenda possível a


cobrança do aporte, requereram a exclusão da incidência:

a) da Tabela Price;

b) da Taxa de Administração e Gerenciamento.

Com a inicial, os autores juntaram os documentos de fls.


32/576. Tutela antecipada concedida a fls. 577,
especialmente para autorizar o depósito em juízo do valor
ofertado.

A ré, devidamente citada, contestou a fls. 629/669.

Em preliminares defendeu:

a) continência e conseqüente incompetência absoluta do


juízo em face da prevenção da 25ª Vara Cível deste
Fórum Central;

b) falta interesse processual. No mérito, outrossim,


aguarda a improcedência da demanda.

Os autores vincularam-se à Cooperativa, tornando-se


cooperados, e assinaram o “Termo de Adesão e
Compromisso de Participação”, com o objetivo de adquirir
um imóvel construído, sob a coordenação de tal entidade,
pelo sistema cooperativo de construção, a preço de custo,
pelo autofinanciamento.

Diante do déficit da obra, cujo preço de custo mostrou-se


durante a execução superior ao preço estimado, não
exerceram seu papel de cooperado, negando-se a discutir
perante a Cooperativa os valores realmente necessários
para a conclusão da obra executada pelo preço de custo,
apesar da transparência e abertura da atual gestão.
Os autores querem a quitação do imóvel pelo mero
pagamento do preço estimado, sendo dispensados de
pagar o denominado aporte financeiro necessários à
continuidade e à conclusão das obras.

O aporte exigido pela cooperativa tem base no contrato e


é regular.

Com a contestação a ré juntou os documentos de fls.


670/934. Réplica a fls. 936/953. A prevenção foi
reconhecida e os autos foram redistribuídos a esse juízo
(fls. 1074/1076).

O feito foi saneado a fls. 1916/1922. Verificado que a


controvérsia está vinculada à prova da quitação do efetivo
preço de custo do imóvel bem como à regularidade da
cobrança do aporte financeiro, determinou-se a realização
de perícias de engenharia e de contabilidade.

A ré não depositou os honorários dos peritos e, diante da


desídia, foi declarada a preclusão da prova, nos termos do
comando de fls. 2033.

Foi designada audiência de instrução, debates e


julgamento, na qual não foram ouvidas testemunhas,
sendo declarada encerrada a instrução e, pelas partes,
reiterados os termos da inicial e da contestação,
respectivamente (fls. 2082).

Os autores juntaram, a fls. 2100/2117, cópia do acórdão


que julgou a apelação nº 0158529-07.2006.8.26.0100,
que deu provimento em parte ao recurso principal
interposto contra a sentença que julgou parcialmente
procedente os pedidos intentados na ação civil pública
ajuizada pela Associação dos Adquirentes de
Apartamentos do Condomínio Residencial Jardim Anália
Franco.

Requerido o levantamento da suspensão prevista no art.


104 do CDC, nos termos do requerimento de
fls.2123/2127, os autos vieram à conclusão.
Autos da medida cautelar nº 583.00.2009.118012-6 em
apenso.

É o relatório. DECIDO. II.

1. DA INCIDÊNCIA DO CDC.
A relação com os autores, chamados de cooperados pela ré, é de consumo,
sem dúvida, conforme firme orientação do Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP, Apelação n. 554.925.4/1-00, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 27-03-
2008, rel. Des. MAIA DA CUNHA; TJSP, Apelação n. 557.572.4/1-00, 4ª
Câmara de Direito Privado, j. 27-03-2008, rel. Des. MAIA DA CUNHA; TJSP,
Apelação n. 303.498-4/5, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 23-04-2008, rel.
Des. JACOBINA RABELO; TJSP, Apelação n. 413.104.4/6-00, 4ª Câmara de
Direito Privado, j. 10-04-2008, rel. Des. FRANCISCO LOUREIRO).

Realmente, o fato de estarmos diante de um instrumento


de adesão e participação em regime cooperativo [ver, por
exemplo, o termo de fls. 36/44] não dispensa, como dito,
a sujeição às normas do Código de Defesa do Consumidor.

Vale dizer, não importa o rótulo que se dê.

Deve-se distinguir uma autêntica cooperativa de uma


pessoa jurídica que assume essa forma sem qualquer
propósito cooperativo.

No julgamento da Apelação n. 166.154.4/9-00, da E.


Terceira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça,
o Desembargador OLAVO SILVEIRA, com precisão,
verberou que essa formação enquadra "um tipo de
associação que muito mais se aproxima dos consórcios do
que propriamente de cooperativa, até porque, via de
regra, nem sempre é o efetivo espírito cooperativo que
predomina nessas entidades".

Em outras palavras, "o associado que a ela adere apenas


para o efeito de conseguir a aquisição da casa própria,
dela se desliga e se desvincula uma vez consumada a
construção".
De fato, "o que se pode observar é que a adesão à
cooperativa é um disfarce de contrato de compromisso
que melhor define a relação entre as partes.

Ou seja, o autor pretendia a casa própria e não


necessariamente a participação na cooperativa" (TJSP,
Apelação n. 299.540-4/6-00).

Repita-se: a contratação questionada, embora celebrada


pelo sistema de cooperativa, submete-se às regras do
Código de Defesa do Consumidor, ao contrário do que
afirma a ré: "COOPERATIVA - Empreendimento
habitacional - Relações jurídicas com cooperados -
Incidência do Código de Defesa do Consumidor - Artigos
2º e 3º do referido diploma legal - Preliminar rejeitada"
(JTJ 157/61).

2. DA APURAÇÃO FINAL – PROPOSTA DE VENDA QUE


INDICA A EFETIVA QUITAÇÃO APÓS O PAGAMENTO DAS
PARCELAS – MATERIAL PUBLICITÁRIO QUE VINCULA A
PREPONENTE – QUITAÇÃO DA UNIDADE APÓS O
ADIMPLEMENTO DAS PARTES – ABUSIVIDADE DA
CLÁUSULA 16ª DO INSTRUMENTO DE ADESÃO –
INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR, À
LUZ DO ART. 47 DO CDC.

A cláusula 16ª do contrato de adesão tratou da


questionada apuração final: “Ao final do empreendimento,
com a obra concluída e tendo todos os cooperados
cumprido seus compromissos para com a COOPERATIVA,
cada um deles deverá, exceto no que se refere a multas
ou encargos previstos no Estatuto, Regimento Interno,
neste instrumento, ou por decisão de diretoria, ou de
assembléia, ter pago custos conforme a unidade
escolhida/atribuída, considerando ainda os reajustes
previstos no presente Termo, bem como aqueles previstos
na cláusula 4.1 e seu parágrafo único”.
Essa cláusula, se bem analisada, não dá o direito de a ré
cobrar qualquer valor que não esteja previsto
expressamente no contrato.

E por quê?

O Plano Geral de Pagamentos está previsto na cláusula


quarta do contrato.

Se tomarmos como exemplo o instrumento firmado pelo


associado Augusto Pulcinelli Junior [ver documento de fls.
35/54], o consumidor neste caso comprometeu-se a
pagar pelo apartamento de três dormitórios a importância
de R$ 89.900,00 (valores calculados em 1º-12-2000),
com a seguinte divisão:

a) valor da parcela de entrada – R$ 5.400,00;

b) parcelas mensais a partir de 05-4-2001 no valor de R$


950,00;

c) parcelas anuais a partir de 06-101-2001 de R$


5.350,00;

d) parcela das chaves de R$ 6.450,00; e) mensalidade do


FGQ de R$ 25,17.

Esse Plano Geral detalhado no contrato de adesão está,


guardadas as devidas proporções, sintonizado com a
publicidade que a ré divulgou para vender as unidades do
Empreendimento.

A propósito, a título de exemplo, muito sugestivo é o


informe publicitário juntado a fls. 433: “Jardim Anália
Franco – O melhor nem sempre custa mais caro.

Abra e comprove 3 DORMITÓRIOS C/ 1 SUÍTE (4º


dormitório reversível). Sala de jantar/estar com varanda.
Piscina, sauna, sala para ginástica, salão de festas, 1 vaga
de garagem, playground, quadra poliesportiva A partir de
R$ 89.900,00.
Você quita seu Imóvel em até 54 meses sem burocracia”.

Como se vê, sem maiores esforços, nesse informe


publicitário não existe qualquer indicativo sobre eventual
resíduo final.

Também não indica que se tratava de construção a preço


de custo e que o preço enquadrava mera estimativa de
valores.

Com isso, força concluir que, sem dúvida, a cláusula 16ª


do contrato deve ser interpretada em conjunto com o
pactuado na cláusula 4ª.

E, nesse particular, como entendeu a Colenda 10ª Câmara


do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos
da apelação n. 599.558-4/5-00, j. 16-12-2008, rel. Des.
OCTAVIO HELENE, “tanto na cláusula 4ª quanto no
Quadro Resumo, o preço total do empreendimento vem
acompanhado da palavra „estimado‟.

Mas esse adjetivo, por certo, não se refere àquela


questionada „apuração final‟ do preço, como vem
explicitado pela cláusula seguinte, a 5ª, que trata do
reajuste anual das parcelas pré-determinadas, com base
em índice geral do custo da construção civil a ser apurado
pelo índice SINDUSCON.

Então, em nada se confunde com a questionada „apuração


final‟ do preço, porque parcela não conhecida previamente
com aquela correção de valor.

Se é assim, a cláusula que sustenta a ação de cobrança


para esse fim não pode vir tida como válida.

Em primeiro, não se mostra clara para esse fim; em


segundo, se a ela se emprestasse alguma validade deveria
ser sustentada a cobrança depois de decisão em
assembléia dos cooperados, o que não ocorreu, não se
sabendo nem mesmo da exatidão da cobrança, e ainda, se
é devida”.
Com efeito, “em contrato de adesão, como ocorre no
presente caso, tanto a coisa objeto da compra como o
preço devem vir claramente determinados.

Ocultar parcela de preço estipulada em cláusula confusa e


não constante na disciplina geral dos pagamentos, é
questão que afronta a boa-fé contratual.

Bem a propósito, merece, no caso, referência ao art. 489


do Código Civil, que repete disposição anterior, segundo a
qual „nulo é contrato de compra e venda, quando se deixa
ao arbítrio exclusivo de uma das partes a fixação do
preço‟.

Tal disposição reafirma o princípio de que a estipulação


arbitrária do preço por um dos contratantes fere a
consensualidade do contrato, que o aperfeiçoa por
disposição comum de vontades recíprocas.

Esse acordo de vontades quanto ao preço é elemento


essencial na forma do art. 481, do mesmo Estatuto Civil”
(TJSP, Apelação n. 599.558-4/5-00, j. 16-12-2008, rel.
Des. OCTAVIO HELENE), o que gera, por óbvio, a nulidade
da cláusula 16ª.

Como se sabe, os contratos que regulam as relações de


consumo não obrigam os consumidores, se não lhes for
dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de
seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem
redigidos de modo a dificultar a compreensão do seu
sentido e alcance (art. 46 do CDC), lembrando que as
cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira
mais favorável ao consumidor (art. 47 do CDC).

Daí, em complemento: são nulas de pleno direito as


cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações iníquas,
abusivas, colocando o consumidor, assim, em
desvantagem exagerada ou sejam incompatíveis com a
boa fé ou a eqüidade (art. 51, IV, do CDC).
Lembre-se, ainda, visando à proteção do consumidor, de
que o CDC, tratando das cláusulas contratuais, foi
incisivo: 1

) os contratos de adesão escritos serão redigidos em


termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de
modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor (art.
54, § 3º, CDC);

2) as cláusulas que implicarem limitação de direito do


consumidor deverão ser redigidas com destaque,
permitindo sua imediata e fácil compreensão (art. 54, §
4º, do CDC). A dúvida que se formou quanto à aplicação
da cláusula 16ª, notadamente após a análise da cláusula
4ª e os informes publicitários, é forte o necessário para
gerar o acolhimento da pretensão inicial.

Vale a advertência de Cláudia Lima Marques, Antônio


Herman V. Benjamin e Bruno Miragem (Comentários ao
Código de Defesa do Consumidor [Comentários aos arts.
1º a 74 – aspectos materiais], São Paulo, Revista dos
Tribunais, 2004, p. 578): o art. 47 do CDC representa
uma evolução, pois “beneficiará a todos os consumidores,
em todos os contratos, de adesão ou individualmente
negociados, em todas as cláusulas, mesmo as claras e
não contraditórias, sendo que agora a vontade interna, a
intenção não declarada, nem sempre prevalecerá.

Em outras palavras, é da interpretação ativa do


Magistrado a favor do consumidor que virá a „clareza‟ da
cláusula que será estabelecido se a cláusula, assim
interpretada a favor do consumidor, é ou não contraditória
com outras cláusulas do contrato”.

Em reforço, importante mencionar o que restou decidido,


em 24 de março de 2011, pela 4ª Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, rel.
Des. FRANCISCO LOUREIRO, ao julgar a apelação nº
0158529-07.2006.8.26.0100, que deu provimento em
parte ao recurso principal interposto pela Bancoop contra
a sentença que julgou parcialmente procedente os pedidos
intentados na ação civil pública ajuizada pela Associação
dos Adquirentes de Apartamentos do Condomínio
Residencial Jardim Anália Franco, a saber:

“Destaco inicialmente que a BANCOOP, criada pelo


sindicato dos bancários com a finalidade de construir pelo
regime cooperativo moradias aos integrantes daquela
categoria profissional a custo reduzido, em determinado
momento desviou-se de seu escopo original.

Passou a construir em larga escala e a comercializar


unidades futuras a terceiros não sindicalizados ao
sindicato dos bancários. Basta ver as qualificações dos
autores relacionados na inicial, para constatar que a
esmagadora maioria deles não é constituída de bancários.
Parece evidente que ocorreu ao longo de alguns anos
verdadeira migração das atividades da BANCOOP, que
deixou de expressar o verdadeiro espírito do
cooperativismo e passo a atuar como empreendedora
imobiliária, com produtos destinados ao público em geral,
alavancados em forte apelo publicitário.

Ao contrário do que afirma o recurso, portanto, a relação


entre a BANCOOP e os adquirentes de unidades
autônomas futuras é regida pelo Código de Defesa do
Consumidor. Não basta o rótulo jurídico de cooperativa
para escapar, por ato próprio, do regime jurídico cogente
protetivo dos consumidores.

Na clássica lição de Enzo Roppo, embora seja o contrato


um conceito jurídico, reflete uma realidade exterior a si
próprio, porque sempre traduz uma operação econômica
(O Contrato, Almedina, ps. 7 e seguintes).
Tal constatação está intimamente ligada à noção de causa
do negócio jurídico, ou seja, "o fim econômico e social
reconhecido e garantido pelo direito, uma finalidade
objetiva e determinante do negócio que o agente busca
além do fato em si mesmo" (Caio Mário da Silva Pereira,
Instituições de Direito Civil,18a Edição, Forense, vol. I, p.
319).

Após julgar dezenas de casos da BANCOOP, constato que,


sob o falso rótulo de regime cooperativo, lançou dezenas
de empreendimentos imobiliários, com promessa de
entregar milhares de unidades autônomas, expressiva
parte dela não cumprida, lesando uma multidão de
adquirentes. Não vejo como deixar de aplicar o regime
protetivo do Código de Defesa do Consumidor aos
contratos de adesão preparados pela BANCOOP, nem
como acolher o falso argumento de que todos os
adquirentes são cooperados e associados em um
empreendimento do qual não tinham controle, nem
fiscalização eficiente dos custos e muito menos do destino
dos pagamentos que efetuavam. (...) Como acima posto,
entendo que sob singelo rótulo formal de negócio
cooperativo passou a ré BANCOOP a agir como verdadeira
empreendedora imobiliária, com atividade voltada ao
lucro, ampla divulgação publicitária, lançamento de
dezenas de empreendimentos e venda ao público em
geral, e não somente aos bancários, como seria natural.

Os contratos celebrados entre a empreendedora


mascarada sob o rótulo de cooperativa e centenas de
adquirentes foram celebrados em meados de 2.001, como
se constata dos documentos que instruem a inicial e a
contestação.

Pelo que se entende da correspondência concludente


trocada entre os adquirentes e a cooperativa, havia a
previsão de construção de quatro grandes torres de
apartamentos.
A primeira delas foi entregue em janeiro de 2.005 e a
segunda e maio de 2.005, com imissão dos adquirentes
na posse das unidades autônomas.

As outras duas torres de apartamento, cuja entrega era


prevista até o final do ano de 2.006, não se encontram
prontas até o presente momento.

Mais grave, passou a COOPERATIVA a exigir dos


adquirentes que já receberam a posse de suas unidades
pagamento de expressiva quantia complementar, sob
argumento de que se trata de resíduo de custeio de obras
no regime cooperativo.

Segundo se extrai dos contratos de adesão que instruem


a inicial, cada unidade tinha um valor total estimado de
cerca de noventa mil reais, com preço diferido ao longo do
tempo, em parcelas mensais, a serem pagas ao longo de
cinqüenta e quatro meses.

Como bem acentuou a sentença, toda a oferta publicitária,


que no regime do Código de Defesa do Consumidor tem
efeito vinculativo e se sobrepõem até mesmo às cláusulas
contratuais, gerava nos adquirentes a justa expectativa de
que o preço era certo e o pagamento diferido em 54
meses.

Faltou à publicidade a indispensável ressalva, com o


mesmo destaque dado ao preço e condições atraentes de
pagamento, de que o adquirente pagaria não apenas o
custeio efetivo de sua unidade, mas poderia ser chamado
a custear também eventual insucesso de outros edifícios
da mesma COOPERATIVA.

Ainda, porém, que se admita que os adquirentes estavam


inequivocamente cientes de que a construção das
unidades ocorreria a preço de custo, em razão de
expressa menção nas cláusulas 16a. e 4a. do contrato,
isso não significa dizer que fica a exclusivo critério da
COOPERATIVA definir qual o saldo residual.
Em data contemporânea à conclusão das obras de cada
torre de apartamentos, a primeira delas no ano de 2.005,
certamente tinha a cooperativa, mais do que ninguém,
controle do custo total da construção e dos valores
recebidos dos adquirentes.

Logo, poderia e deveria, naquele momento, de imissão


provisória na posse, realizar assembléia na qual
demonstraria que eventualmente os custos superaram os
pagamentos feitos pelos adquirentes daquelas unidades,
apresentaria a devida documentação probatória do saldo
devedor e calcularia o resíduo devido por cada unidade.

É certo que no regime cooperativo o preço cobrado pelo


imóvel é calculado com base no custeio da construção do
empreendimento, somado a outras despesas
administrativas, inclusive de inadimplemento de outros
cooperados, todos partícipes de um contrato relacional.
Ainda que se afaste o regime cooperativo do caso em
exame, à vista do caráter nitidamente empresarial que
tomou a BANCOOP, o regime jurídico seria próximo ao de
uma incorporação a preço de custo.

Entendo que não é dado à cooperativa prever, no


momento da celebração do contrato, o valor certo da
unidade futura no Quadro Resumo do termo de adesão.
Essa a razão pela qual o preço é estimado e não fechado
pela empreendedora.

O que não se concebe é que centenas de adquirentes


tenham completado todos os pagamentos que lhes foram
exigidos até a efetiva entrega das obras, no ano de 2.005,
momento em que receberam as chaves e a posse precária
de suas unidades, e se vejam surpreendidos pela
cobrança de suposto resíduo, apurado sem base em
critérios objetivos, apenas com fundamento em rombo de
caixa da empreendedora.

Naquele momento, no final de 2.005, encerrada a


construção daquela torre de apartamentos, deveria
ocorrer a realização de assembléia de apuração de
eventual saldo devedor e cobrado o resíduo dos
adquirentes, com base em demonstrativo objetivo,
acompanhado de documentação probatória dos gastos.

Qualquer gestor de recursos alheios age assim, de modo


que não pode a COOPERATIVA ré escudar-se em regime
associativo para com isso impingir aos adquirentes
cobrança de valores incertos, sem qualquer lastro
objetivo.

Tal conduta da cooperativa acaba por manter os


cooperados indefinidamente vinculados ao pagamento do
preço, sem nunca obter quitação da unidade adquirida.

Ainda que o contrato entre as partes contemple a


cláusula 16ª, de péssima redação e difícil intelecção até
mesmo aos operadores do direito quanto ao seu exato
sentido, a possibilidade de cobrança de eventual saldo
residual, isso não significa possa fazê-lo a conta-gotas, ou
a qualquer tempo, ou sem prévia demonstração objetiva
da composição do crédito.

Basta ver que somente em março de 2.007, quase dois


anos após a entrega da primeira torre de apartamentos, a
COOPERATIVA ré se dignou fazer assembléia específica do
empreendimento, com o fito de cobrar o suposto saldo
residual e reforço de caixa para dar continuidade às obras
das duas torres de apartamentos faltantes (fls. 2.547 e
seguintes).

Note-se, porém, que somente a partir de tal assembléia é


que se adotou providência que seria exigível desde o
lançamento do empreendimento, qual seja, abertura de
conta corrente específica do empreendimento. Pior.

Admitiu a COOPERATIVA a tentativa, ao que parece


baldada, de recuperação de empréstimos solidários, vale
dizer, feitos a outras seccionais, geradores de rombo de
caixa.
Parece claro, portanto, que o saldo remanescente e o
reforço de caixa que se pretende cobrar dos adquirentes
não decorre propriamente de custeio efetivo da obra, mas
sim de empréstimos feitos a outras seccionais e de má
administração de recursos alheios.

Não bastasse, cumpre reconhecer que a conduta da


cooperativa, no caso em exame, fere o princípio da boa-fé
objetiva, na medida em que cria uma situação de
insegurança para os cooperados, surpreendendo-os com
uma nova cobrança, dois anos após entrega da posse dos
apartamentos, sem apresentar justificativa plausível.

Parece óbvio que, decorridos prazo razoável após o


pagamento da última parcela e entrega das chaves, os
cooperados passam a ter a justa expectativa de que
inexistem outros saldos remanescentes. Viola a BANCOOP
com seu comportamento o princípio da boa-fé objetiva, na
função de controle, por agir em venire contra factum
próprio e em supressio.

No venire contra factum próprio, não é permitido agir em


contradição com comportamento anterior.

A conduta antecedente gera legítimas expectativas em


relação à contra-parte, de modo que não se admite a
volta sobre os próprios passos, com quebra da lealdade e
da confiança (Menezes de Cordeiro, Da Boa-Fé no Direito
Civil, Almedina, Coimbra, 1.997, os 742/752; Laerte
Marrone de Castro Sampaio, A Boa-fé Objetiva na Relação
Contratual, Coleção Cadernos de Direito Privado da Escola
Paulista da Magistratura, Editora Manole, p.78/79).

Na suppressio, a situação de um direito que, não tendo


em certas circunstâncias sido exercido, por um
determinado lapso de tempo, não mais pode sê-lo, por
defraudar a confiança gerada (Menezes de Cordeiro, obra
citada, p. 797/823).
O comportamento da BANCOOP foi concludente ao longo
de dois anos, e gerou a justa expectativa e a confiança
dos adquirentes, de que o preço de suas unidades se
encontrava inteiramente pago (cfr. também excelente
artigo de Ricardo Lorenzetti, La oferta como apariencia y
Ia aceptacion baseada em la confianza, Revista de Direito
do Consumidor, n. 35, p. 13).

Ademais, não há nos autos prova cabal e circunstanciada


sobre a origem e a especificação do novo saldo devedor.

As notificações e atas de assembléias mencionam os


valores dos supostos créditos, mas nada esclarecem sobre
a sua composição, a forma de cálculo, e os documentos
que a amparam.

Com efeito, não há prova do descompasso entre o custo


das obras e os valores pagos pelos adquirentes, que
justifique a cobrança de tão expressivo resíduo, que
monta, somado, a milhões de reais.

Na realidade, o que parece ocorrer é que a BANCOOP


lançou dezenas de outros empreendimentos habitacionais,
que não conseguiu entregar e, em razão de administração
ruinosa, pretende agora diluir o prejuízo entre todos os
cooperados. Evidente que o regime cooperativo pressupõe
o rateio integral dos custos entre os associados.

Tal rateio, porém, não diz respeito a todo e qualquer


empreendimento lançado pela cooperativa, mas está
circunscrito àquelas unidades, de determinado conjunto
habitacional.

Ao admitir-se tal cobrança, os cooperados permaneceriam


indefinidamente obrigados perante a cooperativa, jamais
quitando seu saldo devedor e pagando preço superior aos
verdadeiros custos de seu conjunto habitacional.
São estas as razões que me levam a manter a
procedência do pedido de inexigibilidade do valor residual
e de reforço de caixa cobrado dos adquirentes”.

Ademais, saliente-se que a ré não se desincumbiu de


refutar os fatos constitutivos do direito dos autores, haja
vista que o juízo, no despacho saneador (a pedido da
própria ré – fls. 1616/1922), deferiu a realização de prova
pericial contábil e de engenharia.

Contudo, como se vê, as referidas provas tornaram-se


preclusas em decorrência do não recolhimento, pela ré,
dos honorários provisórios dos peritos (fls. 2033).

Portanto, afastada a incidência da cláusula 16ª do


contrato e configurado o adimplemento, pelos autores, na
qualidade de consumidores, dos valores previstos nos
contratos de adesão, deve a demanda ser julgada
procedente para declarar inexigíveis os aportes financeiros
propostos pela ré, com o devido levantamento das
quantias consignadas nos autos.

III. Posto isso e considerando o mais que dos autos


consta, JULGO PROCEDENTES os pedidos (demandas
principal e cautelar) nas ações ajuizadas por AUGUSTO
PULCINELLI JUNIOR, EDIR TAVARES MINUCELLI, BIAGIO
ADUCCI, REGIANE EMILIO BAIÃO DOS REIS, ANTONIO
GUILHERME LEONE MOLINA, HELDER ZANATTA GIL,
DANIEL PIRES DE CARVALHO, GISLAINE BALENA DE
LIMA, HELENA DE CAMPOS MALACHIAS, FRANCISCO
CARLOS MARTINS DE CASTRO, SANDRA REGINA RESCA
BARRETO, BOANERGES LOMBARDI E EDNA MORIKUNI em
face da COOPERATIVA HABITACIONAL DOS BANCÁRIOS
DE SÃO PAULO – BANCOOP para DECLARAR a abusividade
da cláusula 16ª do contrato de adesão que trata da
“apuração final”, com a conseqüente inexigibilidade dos
aportes financeiros propostos pela ré, autorizando-se, no
mais, o levantamento das respectivas quantias
consignadas em juízo pelos autores.
Em razão da sucumbência, condeno a ré ao pagamento
das custas, das despesas processuais e dos honorários
advocatícios, arbitrados em R$ 20.000,00 (vinte mil
reais), com atualização a partir do ajuizamento da ação,
em atenção ao disposto no § 4º do art. 20 do CPC. P.R.I.
São Paulo, 1º de junho de 2011. GILSON DELGADO
MIRANDA Juiz de Direito

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