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BELÉM-PARÁ
2008
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BELÉM-PARÁ
2008
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Comissão Examinadora
_________________________________________
Profº. Dr. Ariberto Venturini - Orientador
_________________________________________
Profª Drª Marize Duarte - Avaliador Externo
_________________________________________
Profª Drª Nadia Socorro Fialho - Avaliador Interno
BELÉM-PARÁ
2008
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AGRADECIMENTOS
RESUMO
ABSTRACT
CORREA, Ana Maciel Maria. Social Permanence and Change in the Marginal
Community: Colares, UFPA, 2008.
The study it argues thematic of the permanencies and the social changes in the
context of the traditional populations of the Amazônia, in special, to the marginal,
native populations. In general lines, they are inheriting populations of more traditional
practical knowledge and of the Amazon region living and surviving of the extrativismo
of the forests and rivers. Descending right-handers of the aboriginal populations, in
its etno-cultural aspect. In the current organization, they are characterized as:
“destribalizados”, “desculturados” ahead of the process of socialization and social
reordenation provoked by the changes brought for modern factors that come
affecting and leading to a new adaptability between traditional and the modern, while
marks of the regional space. In the last few decades, the Amazonian reality comes
passing for deep alterations, moment where the capitalism it enters and if expands
in the region, promoting the exploration on a large scale of the natural resources, for
the modernization of the transports, the medias, while indispensable conditions to the
capitalist expansion. The modernization process reaches different fractions of the
regional space that of form direct, or indirect, with greater or minor incursion, all the
spaces are reached. They are consequences of this new project of reorganization
and exploration: it fishes it predatory, the exploration of the forest resources,
expulsion of the man of the field, devastation of the environment and threat of
extinguishing of the traditional activities it fishes as it artisan and extrativistas
activities. They are changes that modify the way of life of the Amazonian populations
taking the cultural identity and value, root in addition, giving sprouting to a type of
social organization, in a process of reordenation that modifies practical the traditional
ones and the social context where they are inserted. The study it aims at to portray
the interlacement of the permanencies of the traditionalism and the happened social
changes of the process of present modernization in the city of Necklaces. In the truth,
it is to perceive the historicity of the local populations, oportunization the visibility of
as it comes occurring to the partner-economic reordenation and the forms of
confrontation of situations ace of fishes at this moment this community, by means of
proper mechanisms of adaptation. The present study it characterizes the city of
Necklaces through a social analysis, centered in the recognition that this marginal
community makes of itself, ahead of the changes and consequences alterations for
the social life. To disclose this reality, it was established in the studies of: Boaventura
de Souza related to the continuities and discontinuities gifts in the current society; the
partner-cultural paradigm in addition and the emergency of new paradigms that
portray the differentiated transitorieity of the society with rhythms and social times,
that unchain the identitária spalling and the cultural diversity. In the understanding of
the processes of construction and affirmation of the cultural identity of the marginal
communities, it was referred a theoretical reflection referring to the concepts: history,
daily and identity brought by Giddens authors (2000), Oak and J.P. Grandson (1994),
Cuche (1999), Hall (1994) and Robert Darnton (2002). From the collection of data
next to the population of Necklaces, this express community of clear form its
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perception, regarding what it in the last few decades represents the history and the
life of this city. In last the twenty years, this community comes living deeply a I
transitprocess enters the permanencies of the traditionalism and the changes that
come if operating in this space. This I transit prints it an understanding of that the
time moved, not only the chronological time, but the psychological time that much
discloses the way to be and to live of this community. The cultural one exists that
demarcated for the practical urbanization and the modernization of the traditional
ones that the population of Necklaces still ties, with a foot in the tradition and another
one if trying to firm for the new possibilities to the innovations imposed for modernity,
moment that will lead to a destradicionalization process.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO................................................................................................ 13
CAPÍTULO I - PERMANÊNCIAS E MUDANÇAS NUM CONTEXTO DE
MODERNIDADE.................................................................................................. 18
1.1 Tradição e Modernização: Faces da Agenda Mundial.................................... 21
1.2 A Amazônia: Do local ao global..................................................................... 27
1.3 Populações Ribeirinhas: História e Adaptabilidade Sócio-Ambiental............. 35
1.3.1 O Processo de Reordenação Social........................................................... 35
1.3.2 Relação Homem-natureza e Sustentabilidade............................................ 39
REFERÊNCIAS................................................................................................... 145
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APRESENTAÇÃO
Essa transição engendrada por via da nova ordem social é vista ainda como
algo em construção, quase que indecifrável, sem uma perspectiva de definição final.
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próximo, imediato. Pois todas as relações e produção humana serão marcadas pelo
efêmero e pela imediaticidade.
Tais espelhos são expressões das instituições, das normas e das ideologias
que sedimentam as práticas sociais. A correspondência entre o que é e o que se
reconhece ser, substancia o processo identitário. Nesse campo se inserem como
elementos fundantes: a ciência, o direito, a educação, a informação e a tradição.
Esses espelhos ou construções sociais refletem o que a sociedade é ou como se vê.
Quando esses “espelhos” ou constructos se alteram, assumem outra conformação e
significação, alcançando certa autonomia e independência. A própria sociedade se
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uma certeza ilusória de que todos os caminhos apontam para a direção de um único
mundo, único mercado, ao mesmo tempo em que fragmenta e destrói os ideários e
práticas locais.
Defronta-se com uma nova agenda mundial, uma era de transição que vem
demarcando uma nova conformação social que não se coloca apenas em oposição
a tradição, mas diante de um processo dinâmico de desincorporação / incorporação
do tradicionalismo, como resposta de uma nova modernidade em que a persistência
e a recriação do tradicional, constituem-se elemento fundante da própria
modernidade e da identidade social. Um processo nem sempre harmônico, pois a
“diversidade cultural, conseqüente da globalização, faz “atiçar o medo e a rejeição
do outro, onde a intolerância e o ódio, os conflitos entre civilizações (denunciam)
confrontos que dominam o futuro do mundo”, (HOUTART, 2002. p.47).
Tal vinculação não se estabelece unicamente "de si para si”, mas é decorrente
de um processo que envolve motivação e sentimento de pertencimento que induz
reutilização constante da tradição. Nesse contexto, a tradição constitui-se referendo
de um dado tempo e lugar e, se impõe na vida cotidiana de uma determinada
comunidade, por expressar uma “verdade” que imprime os rituais e delineia um
tempo social próprio; constituindo-se em marcos desse contexto social. Os rituais e
práticas exprimem-se a autenticidade, como essência verdadeira desse modo de ser
e viver.
A tradição permeia toda a rede de relações sociais sendo vista como “âncora”
que garante sustentabilidade material, cultural e simbólica de uma dada
comunidade.
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Outro fator que vem adentrando nas mais isoladas comunidades e com um
poder de persuasão e transformação é a mídia eletrônica, a Tevê, o rádio, a grande
imprensa que tem levado a vida aos padrões do mundo global e, com ele, o contato
com a diversidade cultural mais ampla, que de certa forma fragiliza o ideário que dá
sustentação ao mundo caboclo e que, a partir de então, passam a se reajustar aos
ideários e as necessidades capitalista, secundarizando ou até abandonando a
identidade cultural local, com a adoção de atitudes de negação e ou
desconsideração do valor, da beleza e importância da cultura local, assimilando um
novo estilo de vida, de organização, o que gera uma dicotomia entre o mundo dos
“mais velhos” e o mundo dos “mais jovens”.
Até o final dos anos de 1950, a região amazônica se retratava por extensas
áreas de terras rurais, em geral terras públicas, devolutas. A vida regional era
eminentemente rural e nesse cenário as populações locais se inseriam de forma
“livre” e “mansa”, no sentido de que dispunham das terras amazônicas sem disputas
e conflitos. O acesso à terra nesse momento estava relacionado diretamente a
própria existências dessas populações tradicionais.
O cenário regional era marcado pela grande maioria da população vista como
“posseiros” abandonados e, fora dos planos de desenvolvimento e da ação do
Estado. Observando-se a ausência da atuação do Estado enquanto elemento
mediador e integrador da vida cotidiana de uma população que não usufrui da
prestação de serviços básicos na área de saúde, educação, no provimento de
construção de estradas e até de órgãos administrativos. Nesse estado de abandono,
essa população vive e sobrevive com certa autonomia em relação à produção de
sua subsistência, na apropriação da terra e na estruturação das relações sócio-
culturais locais. No entanto, a ação do Estado se faz presente junto aos grupos
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Além da perda da terra dos grupos locais são arrancadas as relações diretas
com a floresta, com o rio e as condições de sobrevivência. E, diante da apropriação
e concentração da terra, destruição da floresta, a exploração desordenada dos
recursos naturais e que pelo isolamento em que viviam. A sociedade local
fragmenta-se frente à tantas transformações, e o capitalismo avança sobre o
território regional e seu povo.
A questão de fundo nos debates atuais volta-se para a nova centralidade dos
processos sociais pautados no trabalho, enquanto prática social e sua interferência
na formatação do homem e da sociedade.
do ser social, ainda que sob a aparência de novas práticas produtivas, sob novos
paradigmas que fazem emergir uma nova configuração dos processos produtivos e
reprodutivos da riqueza, do homem e da própria sociedade.
Nas últimas décadas o alcance de áreas mais isoladas pelo capitalismo fez
emergir novas formas de sociabilidade que tende a imprimir instituições, padrões,
valores e idéias do mundo urbanizado. A racionalidade urbana tem-se intensificado
pelos mecanismos da globalização econômica, embora nessas áreas consideradas
mais afastadas e ainda distanciadas da racionalidade capitalista, observa-se a
manutenção das características do mundo rural.
Por conta do papel estratégico tanto militar quanto econômico, Vigia entre 1716
e 1778 apresentava um rápido crescimento populacional retratado por 1761
habitantes. Num processo de contínuo crescimento, pois em 1816 apresenta um
aumento para 3.271 habitantes, considerando-se nessa somatória as populações de
Vigia, Cintra, Vila Nova de El Rei e Colares.
No período que se estende entre 1710 a 1740, a região do Salgado, por seu
dinamismo econômico, passou a ser mais ocupada, mediante a concessão de
sesmarias. Entretanto, a atuação eficiente dos missionários era plenamente
reconhecida. O “poder dos religiosos ofuscava a hierarquia e a fortuna de um
pequeno número de colonos que vinha aumentando seu patrimônio”, (idem, 2004, p.
39).
É esse dinamismo na região do Salgado entre 1722 a 1806, que vai justificar a
distribuição de terras às margens de rios, igarapés e lagos. Com o avanço da
colonização percebeu-se a instalação dos “senhores de roça” e “senhores de
engenho”, que passaram a desapropriar terras dos antigos índios em decorrência da
implantação do cultivo de cana- de-açúcar, cacau e café; mediante a efetivação do
regime sesmarial que fundamentava a aquisição de terras.
que trabalhavam nos pesqueiros eram índios reduzidos, que ganhavam, além da
alimentação que eles mesmos mariscavam os ricos salários de duas varas de pano
d’ algodão”, (HURLEY, 1953, p. 68 e 69).
O saber fazer do pescador não se faz de uma hora para outra, mas é resultante
do acúmulo de experiências e de saberes inerentes a essa atividade que é tão
antiga como o homem da região. Para o pescador que detém esses conhecimentos,
considera-os de fácil aprendizagem. Sua formação se inicia desde pequeno,
escutando, observando e expericiando o fazer dos pais, parentes ou amigos. Um
conhecimento que vai se incorporando no exercício do dia a dia. São vivências a
partir da relação direta com o rio, que se transforma no grande espelho da vida. O
homem e o rio se transformam numa linguagem inseparável. O “homem e o rio
(como) os dois mais ativos agentes da geografia humana da Amazônia. O rio
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São técnicas que dizem respeito aos modos pelos quais os homens, de
maneira tradicional, sabem servir-se de seus corpos como razão prática,
coletiva e individual. Os mais velhos, ao carregarem os mais jovens como
ajudantes de pesca, são os que colocam o prestígio de sua experiência
como modelo de destreza física e no equilíbrio do balanço da embarcação,
na dignidade em partir para o mundo das águas e dele retornarem como
uma aventura sempre necessária, na resistência em perseverar horas, às
vezes, noites a fio, até alcançar o momento certo, na agilidade, precisão e
força para jogar a tarrafa etc., a ser imitado não apenas como um “balé”
sobre as águas, mas como um ato quase mágico, na medida em que o êxito
logrado na captura é de fazer o corpo instrumento em consonância com os
movimentos dos cardumes, (VALÊNCIO, 2006, p. 29).
Essas barcas já pescaram nessa área. Teve um ano eles pescaram aqui.
Nós denunciamos pra Capitania dos Portos, tava prejudicando muito. A
gente ia uma hora dessas, era muito peixe morto em cima da água, piabas
pequenas eles jogavam tudo fora. Eles só pegam as graúdas, exatamente
agora está fazendo falta, tanto para eles como para nós,(idem).
parte do uso e do manejo irresponsável dos recursos naturais que ainda existem no
município e que necessitam serem preservados para a própria continuidade das
espécies naturais e do modo de vida tradicional dessa comunidade ribeirinha e
cabocla.
Nesse ambiente de construção, Agnes Heller afirma que não há vida humana
sem cotidiano e cotidianidade. O cotidiano está presente em todas as esferas de
vida do indivíduo, seja no trabalho, na vida familiar, nas relações sociais, no lazer
etc. (in CARVALHO, 1994. p24). Assim o cotidiano persiste e penetra eternamente
todas as esferas da vida do homem, obedecendo-se os critérios tempo, espaço e
classe social.
A inserção do homem num contexto social cada vez mais ampliado altera a
ação do homem que não se volta somente para a sobrevivência e a produção de
sua subjetividade. “O homem é ao mesmo tempo singular e genérico, apenas na
vida este ser genérico co-participante do coletivo, da humanidade se encontra em
potência, nem sempre realizável”, (CARVALHO, 1994, p.260). Uma vez que a vida
cotidiana possibilita a emancipação do indivíduo, ao avançar do singular ao genérico
humano, embora se observe que a maioria dos homens não vivencia essa
experiência, mantendo-se “mudo” à relação entre “particularidade” e genericidade.
estilos de vida, a vida moderna, a vida urbana, que se contrapõem aos padrões
locais. É marcante a diferenciação dos “nativos” e do povo que vem de “fora”. No
entanto, é forte a identidade sócio-cultural da comunidade de colares, pois
repousava no sentimento de “pertencimento” e a vida transcorria em torno dos
interesses e necessidades da população local.
pacata tradicional e o “mundo’ que ainda é deles. Sua oposição reflete o desejo de
retardar as possíveis mudanças trazidas pelo fácil acesso à ilha de Colares. Seu
Antônio se insere no grupo que vive no presente, mas se atrelando ao estilo da vida
do passado. Nesse sentido, a tradição continuou a ser apoiada enquanto puderem
ser justificadas, como referencial de uma identidade particular, (GIDDENS, 2000, p.
55).
O Estado busca através de suas políticas sociais sua legitimação frente aos
movimentos e pressões sociais, ao mesmo tempo em que reforça seu domínio e
poder como unidade de força e hegemonia.
O contexto social é assim marcado por um “campo por excelência dessa luta
de articulação / desarticulação, de discussão e prática, como a busca de
participação de igualdade, de justiça e de direito”, (VASCONCELOS, 1998, p.13).
A política social passa a ser inserida nas Constituições Federais nos anos de
1920 e se tornaram mais expressas no governo de Vargas. São políticas que se
inserem no processo da reprodução da força de trabalho, da acumulação e no
âmbito dos direitos sociais. É a partir de 1930, no governo Getulista, a questão
social é reconhecida e assumida pelo Estado mediante a implantação de políticas
públicas.
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Embora essa contracorrente seja uma nova prática não reduz ou anula a
importância dos conselhos e suas funções mediadoras entre o Estado e a
sociedade. Uma vez que garante a participação e os interesses populares através
das discussões, questionamentos e diálogos que se estabelecem na esfera estatal,
que na realidade promovem a publicização da “coisa pública”.
cidade e o descaso das populações ribeirinhas, uma realidade social que vem sendo
desfocada dos processos de construção do conhecimento.
permanências das tradições culturais de seu povo, para que o mesmo mantenha
sempre viva as suas raízes de forma a não perder sua identidade cultural. Ao
mesmo tempo em que identifica como papel da educação, o acompanhamento das
mudanças sociais, no sentido de repassar informações sobre as transformações
sócio-econômicas por que passa a sociedade e o mundo, inserindo-se dessa forma
nesse contexto, também de transitoriedade, com o pé no tradicionalismo e o olhar
focado na modernidade por que passa o mundo globalizado.
No âmbito das políticas sociais, a assistência, a partir dos anos 1980 / 1990
constituiu-se uma política de proteção social se revestindo de garantias a todas que
dela necessitam sem contribuição prévia a provisão dessa proteção.
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Uma política que traz no seu bojo uma visão social mais ampla sobre as
circunstâncias sociais que geram ou estabelecem as diferenças sociais, enquanto
delimitadores tanto para a proteção, quanto para a busca de autonomia. Uma visão
que passa pelo atendimento das necessidades, como também oferece
possibilidades a serem desenvolvidas, tendo em vista a superação de situações de
vulnerabilidades.
São benefícios que alteram, de alguma forma, a vida dos beneficiários, o BPC
pelo valor econômico, ao oferecer as garantias mínimas de subsistência dos
usuários e suas famílias. A Bolsa família embora repasse uma renda menor, garante
um acesso mais ampliado de famílias, ao mesmo tempo em que permite a inserção
dessas famílias em oficinas de capacitação para a geração de trabalho e renda.
Nesse aspecto, a Bolsa Família é o programa que gera maior impacto, pois apesar
do valor do benefício ser menor, reúne um número maior de beneficiários, ao colocar
os membros das famílias diante de possibilidades de emprego e renda. São
possibilidades que nem sempre estão relacionadas às práticas tradicionais do
município como a pesca e a pequena agricultura.
São chás, sucos, garrafadas, vinhos e ungüentos utilizados para evitar filhos,
interromper gravidez, garantir fertilidade, apressar o parto, como o uso de plantas
nas rezas contra os aborrecimentos, quebrantos nas crianças. No município de
Colares há pessoas que têm conhecimento das propriedades medicinais das plantas
das florestas e que vem repassando esses saberes para as gerações mais jovens.
respeita, mas não se reforça tais práticas naturalistas”, como afirma a diretora da
Unidade de Saúde.
Todo indivíduo tem consciência de fluxo interior do tempo que por sua vez
se funda em ritmos fisiológicos do organismo, embora não se identifique
com estes. O tempo pode ser compreendido como a intersecção entre o
tempo cósmico e seu calendário socialmente estabelecido, baseado nas
seqüências temporais da natureza por um lado e o tempo interior por outro
lado, (BERGER, 2007, p. 44/45).
A construção da vida social se dá num encontro face a face pela luta e pela
dignidade de si e de outras pessoas. É no ambiente comum que a vida cotidiana se
mantém onde as lutas sociais ganham expressões, onde se buscam soluções,
redirecionamentos. É onde as relações interpessoais e o ambiente social constroem
novos projetos; é nesse nível microssocial que se estabelecem novos estilos de
vida, uma nova organização social, embora sem esquecer que na
contemporaneidade o mundo econômico e informacional afeta de forma direta a vida
pessoal e social.
A princípio, para os jovens, o ato foi efeito do uso de bebida e de não terem o
que fazer, pela quebra da rotina; fazer algo diferente, chamar a atenção. Para a
população em geral foi motivo de escândalo, pois foi um fato que ganhou destaque
na mídia local / regional. Além das repercussões negativas, o fato mexeu com os
sentimentos da população local, uma vez que o cemitério, além de lugar santo,
representa o passado daquela localidade. Ele faz referência à história de muitas
pessoas, são vivências que trazem sedimentação à história local.
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Em relação aos jovens que praticaram esse ato, são vistos como vândalos
desordeiros e desrespeitadores dos sentimentos e do valor atribuído a este lugar
considerado santo.
O episódio demonstra que de certa forma há uma quebra da ponte que liga o
passado e o presente, embora a população mais velha ainda se ache referenciada
por esse passado, pelas recordações de familiares e de vivências que dão sentido a
vida social local.
Os símbolos têm a função de trazer para perto o que falta, o que está
distanciado pelo tempo ou pelas práticas sociais. Tem a capacidade de moldurar
uma situação, um contexto, uma cultura. Ao mesmo tempo em que para alguns, sua
quebra ou morte traz o sentido de emancipação dos símbolos e do simbolismo,
oportuniza a busca de novas respostas para perguntas antigas e atuais, a busca de
novos sentidos e significações para preocupações e emoções mais presentes.
O passado, ainda que distanciado, que tenha ido embora com o tempo, sua
reconstrução pode ocorrer em nível simbólico, ao estabelecer ligação com emoções
e sentimentos que imprimem sentido ao preencher lacunas, buracos, provocados
pelo tempo, pelas mudanças instauradas.
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De maneira geral, o jovem se volta para o mundo que não é o local, o mundo
de outras culturas, que trazem outro modo de vida, outros comportamentos, como
por exemplo, o uso de roupas de marca. Ou quando muito se vêem na ociosidade,
não se inserem de fato, nem no novo e nem nas atividades tradicionais.
Ainda segundo esse jovem, os investimentos do poder local deveriam se voltar
para a arte, para o artesanato e o aproveitamento dos recursos naturais, como
folhagens, raízes, sementes tão abundantes na localidade.
É presente em sua memória quando saía para pescar com seu pai, quando
iam fazer farinha. Seu pai era pescador de filhote, espécie hoje rara. “A pesca de
arrastão tem diminuído bastante a quantidade de peixe no município”. Este jovem
ainda rememora o tempo em que havia o "escambo”, não havia muita circulação de
dinheiro, mas se trocava produto por produto, peixe por farinha: farinha por fruta. Era
um tempo em que havia fartura na alimentação para o povo do município. Hoje se
tem dinheiro, mas não se tem muito que comprar”.
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Entretanto diante desse quadro, alguns jovens lamentam em ter que sair
para outras cidades, como Belém, por exemplo, e terem que se adaptar a uma vida
mais agitada, diferente da que eles levam em Colares.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Essa comunidade até a década de 1970 vivia certo isolamento, em que a vida
transcorria num micro mundo, retratada pela atuação de pequenos grupos. O que
lhe conferia padrões eminentemente caboclos.
REFERÊNCIAS
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